O Alfabeto da Cidadania, Robson Leite

O Alfabeto da Cidadania A pedagogia da fé e da política na construção de um outro mundo possível Robson Leite

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Autor Robson Leite Organização Jornal Missão Jovem Diagramação Wagner Guatimozim Imagens iStockphoto Marcela Baptista (páginas 57, 69 e 73) Revisão Carlos Ferreira dos Santos Capa Miguel Papi

Contato com o autor: contato@robsonleite.com.br © Editora Mundo e Missão - 2013 Rua Joaquim Távora, 686 CEP 04015-011 São Paulo - SP Fone: (11) 5549.7295 - Fax: (11) 5549.7257 Pedidos do Livro: Jornal Missão Jovem Caixa Postal 3211 CEP 88010-970 – Florianópolis/SC (48) 3222.9572 – Fax: (48) 3222.9967 mj@missaojovem.com.br / www.missaojovem.com.br

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Dedico essa obra a dois grandes homens que nos deixaram e com quem tive o privilégio de compartilhar a amizade: Wanderlei Fagundes e Padre João Chribim.

Eles não tiveram a oportunidade de se conhecer, mas tinham muita coisa em comum: em especial o desejo incansável de se dedicar ao próximo, sobretudo ao (mais) pobre e oprimido.

De lutar, através da política, por uma sociedade justa, fraterna e solidária.

De lutar, incansavelmente, pela tão sonhada civilização do bem-viver...

A eles, que estão hoje na Glória do Pai, o meu muito obrigado... Por tudo, mas sobretudo pelo exemplo.

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Este livro se propõe a orientar estudos, encontros e aprofundamentos das comunidades eclesiais de base, círculos bíblicos, grupos de reflexão sobre fé e política e demais movimentos e entidades que busquem fazer da sua atuação, um instrumento para a promoção do bem comum e para a construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária.

Ele foi dividido em capítulo ordenados alfabeticamente, visando, um a um, aprofundar questões e pontos imprescindíveis para que a sociedade se aproxime, cada vez mais, da civilização do amor prometida pelo Cristo no Evangelho.

Ele toma por base o próprio Evangelho e diversos documentos da Doutrina Social da Igreja, da CNBB e do CONIC para fundamentar todas as reflexões constantes nele.

Ao final de cada capítulo, o livro oferece perguntas que têm por objetivo fomentar a discussão, a partilha e o debate dos assuntos tratados. A formação política e social das pessoas, em especial dos mais pobres e necessitados, é um elemento decisivo para a liberação de toda a forma de opressão, principalmente das que são promovidas pelo grande capital. Por isso tudo, esse livro se coloca como um excelente instrumento para realizar essa formação e conduzir as pessoas a terem “fome e sede de justiça”.

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Prefácio

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A Cultura de Paz é uma expressão da realidade do Reino de Deus, que se apresenta como um compromisso vital de cada cristão agrupado em suas comunidades. Sem a compreensão desse fato e a mudança de comportamento, será impossível sinalizá-la e abraçá-la como ideal manifestado em Jesus Cristo e assimilado por Sua Igreja.

A expansão do Reino começa a partir de uma atitude pessoal que pode ser refletida, posteriormente, em diversos campos da vida: no meio ambiente, na sociedade, na saúde coletiva, dentre outros. Essa responsabilidade se fortalece a partir da crescente visão da interdependência eclesial e da responsabilidade universal pela construção de um novo mundo.

Num tempo em que nos preparamos para a Jornada Mundial da Juventude com o Santo Padre, aqui no Rio de Janeiro, percebemos que os jovens têm sido as maiores vítimas dos problemas sociais, políticos e ambientais, que se acumulam desde o surgimento do capitalismo. Essa situação mostra a grande urgência na tarefa que temos como discípulos e missionários do Senhor Jesus Cristo, a saber, ir mais além de um seguimento meramente sentimental, atingindo e transformando esses padrões que promovem tanto a exclusão quanto a morte.

Devemos, portanto, como cristãos, nos empenhar em prevenir situações que possam ameaçar a paz e a segurança, tais como o desrespeito aos direitos humanos, a discriminação e a intolerância, a exclusão social, a pobreza extrema e degradação ambiental, utilizando como principais ferramentas a conscientização, a educação e a promoção dos princípios norteadores do Reino de Deus em que tanto acreditamos: tolerância, solidariedade, respeito à vida e aos direitos individuais, ao pluralismo e o desenvolvimento sustentável.

Estaríamos beirando a blasfêmia, apoiando-nos em discursos vazios para apaziguar os sofridos, falando chavões sobre a Providência de Deus, enquanto apoiamos e mergulhamos nos valores materialistas da sociedade vigente, sem notar que essa mesma sociedade é a negação de tudo o que a Revelação Divina nos propõe como seguimento a Jesus de Nazaré. Mas, se nos envolvermos na criação de um mundo ou de uma comunidade que viva os valores do Reino e a justiça de Deus, então teremos na solidariedade a garantia de que todos tenham pelo menos o mínimo, para levar uma vida digna de filhos e filhas de Deus.

Dito tudo isso, agradecemos ao Deputado Estadual, Robson Leite que, sempre sensível a essas questões inerentes ao discipulado, nos oferece, nessa obra “Cidadania de ‘A’ a ‘Z’: a prática do Bem comum na construção de um mundo novo possível” um texto pedagógico, simples, porém capaz de nos conduzir à

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maturação de vários conceitos determinantes, acerca da responsabilidade eclesial frente às múltiplas situações da atualidade, estimulando-nos a assumir os conceitos da Doutrina Social da Igreja com vistas a atitudes sinceras e coerentes frente aos valores do Evangelho, que vão se tornando cada vez mais escassos em nossos mais variados ambientes.

Dom Nelson Francelino Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro e Moderador Geral da Cúria Arquidiocesana de São Sebastião do Rio de Janeiro

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Sumário Prefácio 9 Amor: a semente na construção de um outro mundo possível 13

A

Bem comum: um dos princípios fundamentais para a coletivização dos sonhos 17

B

Capitalismo: uma fábrica de crises 21

C

Dignidade da Pessoa Humana à luz da opção preferencial pelos pobres 25

D

Educação como instrumento de libertação 29

E

Fome, miséria e má distribuição de renda: o verdadeiro mapa da pobreza e da violência no Brasil 33

F

Guerra pela distribuição de renda 37

G

Honestidade, ética e coletivização dos sonhos: valores esquecidos na sociedade capitalista do consumo 41

H

Imoralidade na política. Qual o nosso papel na mudança desse cenário?

45

I

Juventude: protagonista ou vítima da violência?

49

J

Libertação: não há exercício pleno da cidadania sem o rompimento com qualquer sistema opressor existente na sociedade 53

L

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Movimentos Sociais: um importante e indispensável instrumento de participação popular e cidadania 57

M

Neoliberalismo: o grande obstáculo de uma nova sociedade construída pela cidadania ativa 61

N

Ópio do povo: será esse o papel da religião?

65

O

Política: ela não é fim, mas um meio de construção de um outro mundo possível 69

P

Questionar e ter fome e sede de justiça: o caminho para a construção do Reino 73

Q

Resgatar, reinserir e reeducar ao invés de criminalizar e matar: esse é o caminho para acabar com a violência e construir cidadania 77

R

Sociedade e sistema penitenciário brasileiro: qual caminho queremos?

81

S

Trabalho Escravo: um grande obstáculo na construção da cidadania e da plena dignidade da pessoa humana 85

T

Utopia: o alimento para a construção de uma cidadania plena 89

U

Violência ou vida em abundância?

93

V

Xenofobia, etnocentrismo e preconceito: os obstáculos à construção de um novo mundo possível 97

X

Zelar pela casa e pela vida: o verdadeiro significado da palavra economia 101

Z

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Amor: a semente na construção de um outro mundo possível

A

Dentre os conceitos i­ntimamente ligados à cidadania, podemos, perfeitamente, destacar o amor como um dos mais importantes. Entretanto, normalmente, quando pensamos em amor, a primeira coisa que vem a nossa mente é algo relacionado a sentimento, mas, para a nossa surpresa, não é esse o significado que coloca o amor como esse elemento fundamental na reflexão sobre o sentido da palavra cidadania.

Qual o significado do amor?

Uma das passagens mais desafiadoras do Evangelho é aquela na qual Jesus, ao contradizer o ditado do povo de sua época que afirmava “olho por olho e dente por dente”, ensina a “amar os inimigos”, dando a outra face.

Será fácil amar pessoas que matam e destroem em nome do progresso ou da paz? Será fácil amar políticos e servidores públicos corruptos que não hesitam um só minuto ao praticar atos que desviam dinheiro público para enriquecer seus patrimônios ao invés de salvar vidas em hospitais ou construir um futuro melhor para o nosso país em escolas públicas de qualidade e com profissionais bem remunerados?

Se olharmos o amor através dos olhos do mundo que define essa palavra apenas como sentimento, será praticamente impossível viver essa definição interessante que Jesus Cristo fala no Evangelho. Porém, o significado do amor

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que ele nos traz é outro: É o amor ágape ou, traduzindo para o português, “amor-atitude”.

O amor atitude Essa semântica da palavra amor é muito pouco usada, mas pode ser definida perfeitamente em outra passagem bíblica, mais precisamente na Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, em seu capítulo 13, onde aprendemos que o amor é “bondoso e paciente. Tudo perdoa e tudo crê.”. E acrescenta: “O amor não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade.”. Todos esses conceitos muito bem apresentados nessa carta apostólica nos mostram uma dimensão diferente do amor: a dimensão da atitude. Observe bem que todos esses adjetivos lembram atitude, e não sentimento – bondoso, justo e verdadeiro. Isso nos leva a crer que o sentimento pode até ser involuntário, mas a atitude proveniente dele será sempre uma escolha. Quando alguém nos ofende ou pratica algo de mal contra nós, poderemos até sentir ódio ou rancor, entretanto a atitude de vingança será sempre uma escolha.

A construção de um novo mundo passa pela nossa atitude Isso nos leva a crer que a própria dimensão do amor como sentimento acaba, em função dessa reflexão que fizemos, tornando-se consequência das nossas atitudes e, sobretudo das nossas próprias escolhas. É como diz a música de Beto Guedes: “para melhor juntar as nossas forças, é só repartir melhor o pão”. E, quando falamos em partilha, falamos, mais uma vez, de atitude.

Inclusive, é sempre bom lembrar que, ao contrário do que dizem alguns cientistas políticos e historiadores, já tivemos em nossa humanidade um exemplo perfeito de sociedade em que, de forma concreta, a atitude construiu uma história de profunda solidariedade, pois não havia pobres e indigentes entre eles. Partilhavam tudo o que tinham e davam a cada um de acordo com as suas necessidades. Isso aconteceu nas primeiras comunidades cristãs e encontramos registros dela no livro dos “Atos dos Apóstolos”.

Se a nossa sociedade está, infelizmente, distante dos relatos desse livro citado acima é porque, talvez, estejamos apenas buscando fazer o bem a quem somos motivados pelo sentimento – como os pais, os irmãos, a esposa, o marido ou os filhos – quando, na verdade, deveríamos fazer diferente. Em 14

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outras palavras, fazer o bem independente do sentimento para que, em função dessa atitude, o próprio sentimento seja modificado ou construído como consequência dessa ação.

Observemos, por exemplo, diversos casos de pessoas que se odiavam ou possuíam algum sentimento negativo entre elas e a atitude de alguma delas, – muitas vezes motivada pelo perdão, – modificou essa história construindo uma profunda e sincera amizade. Quantos casamentos, inclusive, foram construídos a partir de um sentimento de rejeição inicial e, pela insistência de uma das partes – através da atitude – o sentimento se modificou e se construiu um “verdadeiro amor”? Baseado nisso, percebemos o quanto podemos – e devemos – agir em prol de um novo mundo através da construção das nossas atitudes.

Ou fazemos uma proposta firme de mudança das nossas atitudes cotidianas para construção de um novo modelo de relações sociais no qual o amor e a solidariedade sejam elementos fundamentais que pautarão as relações nele estabelecidas ou, então, assistiremos, passivos e inertes, à destruição da nossa própria sociedade sufocada em seu egoísmo e sua falta de atitude solidária.

Perguntas para reflexão: 1. A sua comunidade ou grupo costuma construir as ações sócio-transformadoras (projetos sociais) apenas para os grupos com que possui alguma afinidade ou busca-se privilegiar os grupos realmente mais necessitados?

2. Como podemos fazer para formar e motivar mais pessoas nessa perspectiva de agir em prol, única e exclusivamente, do bem comum e do coletivo ao invés dos interesses pes­soais e individuais?

3. Como seria hoje, na prática, “dar a outra face” e negar o “olho por olho, dente por dente”?

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