APOSTILA STREET STYLE

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GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO, SECRETARIA DA CULTURA, RECKITT BENCKISER E MAGAZINE LUIZA APRESENTAM:

A MODA E AS ARTES VISUAIS NAS CIDADES

OFICINA DE MODA COM FOCO EM RELEITURAS DA ARTE URBANA

Patrocínio

Realização:


Street Style a Moda e as Artes Visuais nas Cidades. Antes de começarmos queremos agradecer a todos que acreditaram nessa ideia, um projeto cultural conta com muitas mãos, braços e mangas arregaçadas, mãos que tiveram que se juntar para que um sonho pudesse ser tirado do papel e se tornasse realidade. Muitas concorrem pelos créditos dessa conquista entre eles(as) destacamos Rosangela Rubbo, Vivian Berto e Amanda Dumont, sem elas não teríamos cor; Livan Chiroma, Christian Camilo e Diogo Aquino colaboradores queridos e os irmãos Jairo e Jonatas Silva com suas ideias estranhas. Gostaríamos de fazer também um agradecimento especial aos nossos patrocinadores: Magazine Luiza e Reckitt Benckiser por apoiarem a cultura e as artes visuais no interior do estado de São Paulo e à Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo que por meio do Programa de Ação Cultural – ProAC ICMS possibilitou essa conquista. O projeto Street Style existe para resignificar a moda, fazer releituras do espaço urbano, apurar nosso olhar, juntar olhares, trazer identidade para nossa indumentária e ou ornamento, pensar em novas referências que traduzam nossa cultura urbana, repensar o consumo, falar sobre “upcycling”, saber o que as pessoas pensam ser “estilo” para elas, discutir sobre tudo isso e (re)inventar moda. Você está recebendo uma apostila-scrapbook, este será seu caderno criativo daqui pra frente, esperamos ansiosos por suas futuras criações e inversões, esperamos que você faça arte :) Desde já desejamos muito sucesso e uma ótima oficina para você. Equipe Street Style

"Somos todos anjos de uma asa só, podemos andar mas se quisermos voar teremos de nos abraçar."

Luciano de Crescenzo

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O que é moda, e porque ela é importante? Moda, de maneira geral, é a forma como a nossa sociedade, urbana, ocidental e capitalista, se veste. A vestimenta de uma sociedade pode ser usada como proteção, adorno; e sempre significa algo. Em uma tribo indígena, por exemplo, o chefe veste um determinado tipo de adereço para demonstrar sua posição em relação aos demais. Em um grupo cigano, a quantidade de anéis, colares e pulseiras que uma mulher usa significam sua riqueza. Nas religiões afro-brasileiras, os pais e mães de santo vestem-se de determinada maneira indicando a sua posição para os demais devotos. Até a definição de “nu” ou “vestido” muda de uma cultura para outra e ao longo do tempo.

Quem está nua e quem está vestida?

No caso da nossa sociedade, essa definição é extremamente complexa e caótica. Então, em se falando de moda, a nossa forma de vestir e a relação de comunicação que as roupas estabelecem também são complexas. Nem sempre sabemos transmitir mensagens com as roupas que vestimos, porque não sabemos exatamente como será a interpretação dos outros. Qual é a sua interpretação das roupas que essas duas pessoas estão vestindo? Ao contrário de outras sociedades mais homogêneas, nós não conseguimos chegar a um consenso sobre isso. Curiosidade: o que essas duas personalidades têm em comum?

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Por isso, criar moda está normalmente associado a dirigir-se a um público, a um grupo de pessoas que tende a pensar, agir e fazer coisas de maneira parecida – o que o mercado da moda chama de lifestyle, traduzindo, estilo de vida. Mas, na verdade, mesmo dentro de um lifestyle, sempre haverá variações; e um designer deve sempre estar aberto todas elas. Trabalhar com moda é entender o outro e tentar compreender por que ele usa/gosta de tal peça, sapato, maquiagem, corte de cabelo etc. sem julgamentos. Moral da história: quando criamos roupas, devemos sempre ter em mente que elas são feitas para pessoas. Por mais difícil que seja, não devemos julgar o que o outro veste, e devemos estar abertos aos gostos tão diferentes que as pessoas têm. O que é design? Design é um desenho/projeto feito previamente para a confecção de produtos em larga escala. Diferencia-se do artesanato porque não é pensado e fabricado pela mesma pessoa ou mesmo grupo de pessoas. No caso do design, dentro da lógica industrial, uma pessoa pensa, projeta, desenha o produto e outras irão fabricá-lo. Outra característica do design é que ele é pensado a partir da realidade humana. As pessoas têm um problema e o designer irá planejar uma forma de solucioná-lo, criando assim um produto. Por exemplo, você já ouviu falar do design do orelhão, tipicamente brasileiro? A arquiteta Chu Ming Silveira precisava criar uma estrutura na qual as pessoas conseguissem falar ao telefone com boa acústica e serem protegidas da chuva e do sol. Surgiu o “orelhão”, com formato e nome que todos nós reconhecemos!

Problema: Encontrar uma solução, em termos de design

e acústica, para protetores de telefones públicos, que apresentem uma relação custo-performance melhor que a dos já existentes e que se adequem às condições ambientais.

Solução: Criado a partir de uma versão prévia de acrílico, chamada orelhinha, o orelhão deve atender a condições mais desfavoráveis: aplicação externa, a todo tipo de público. Alto nível de ruído nas vias públicas e atendimento a concentração diferentes, para o que foi criado um modelo modular a três níveis, que pode ser facilmente desenvolvido para um número n de orelhões, bastando usar um adaptador adequado.

História do design do orelhão. www.orelhao.arq.br 4


O design de moda é o planejamento de uma coleção de peças de vestuário e/ ou acessórios para ser produzida industrialmente. Não costuma resolver problemas, mas cria produtos que as pessoas se identifiquem e, assim, o usem no próprio corpo. Uma boa coleção deve manter uma coerência criativa: um conjunto de cores, formas e materiais que deem personalidade a ela e conversem com seu público (como vimos, a moda é feita para as pessoas, e não o contrário). Nesta coleção da Laboratório Fantasma, apresentada na São Paulo Fashion Week, veja que as cores, formas e materiais obedecem uma linha criativa, que dá coerência visual. Do mesmo modo, praticamente todas as peças podem ser usadas pelo mesmo público. Veremos como criar essa “coerência” criativa no capítulo sobre design e criação.

A coleção de moda tem coerência. Você sabe dizer quais são os elementos que unem as peças deste desfile da Laboratório Fantasma?

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Arte e sua incidência na moda Você sabe a diferença entre arte e moda? Arte e moda são duas faces de uma mesma moeda. Historicamente, nem sempre a arte foi como é hoje, ou a moda sequer existiu antes do ano 1400. Hoje em dia, arte e moda andam tão misturadas que uma das definições que podemos dar para diferenciá-las é que:

1. Arte é um objeto único, não reproduzível (qualquer coisa pode ser arte,

de um quadro a um grupo de pedrinhas no chão) e não tem necessariamente função alguma. A questão de não ser reproduzível é bem séria na arte – é por isso que alguns quadros chegam a custar milhões de dólares – só existe um deles no mundo. Por exemplo, um quadro do famoso pintor Van Gogh é um quadro do Van Gogh, mesmo que alguém fotografe, faça uma cópia; aquilo seria apenas a reprodução, e não o original em si.

Pensar em um quadro como obra de arte é fácil; o que aumenta o problema é que qualquer coisa pode ser uma obra de arte. Um vestido. Uma fotografia. Um vídeo. Um punhado de areia. Uma pilha de trapos!

Vincent Van Gogh Noite Estrelada

Michelangelo Pistoletto A Venus dos Trapos

Essa “reprodutibilidade” pode ser questionável. As artes técnicas, como o cinema e a fotografia, por exemplo, são reproduzíveis. Porém, isto não faz delas menos arte do que uma pintura.

2. Moda (e design) tem uma função específica em nossa sociedade (nos cobrir, nos adornar e fazer-nos comunicar algo, ajudar com o dia a dia etc.) e é reproduzível em grande escala. É feito o desenho da peça ou do objeto e ele é reproduzido na indústria. Camiseta Nephew.

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Uma das relações mais interessantes que podemos fazer entre arte e moda é trazer os elementos visuais das obras de arte como inspiração para a moda.

Existem inúmeras outras fontes nas quais a moda pode se inspirar. E a arte é só uma delas.

Você sabe olhar uma obra de arte? Normalmente, é a convenção que nos faz olhar de uma determinada maneira. Convenção é um conjunto de regras que compartilhamos e aprendemos indiretamente desde a infância, mas nem sempre temos consciência que as sabemos. Por exemplo, somos ensinados desde pequenos que, quando recebemos um desenho para colorir, devemos pintar dentro das linhas. Dependendo da paisagem, devemos pintar o céu de azul, a grama de verde; o telhado da casa deve ter determinado formado, até a pele das pessoas normalmente é pintada nos tons de bege e rosado. Todas essas 7


são convenções, que não correspondem necessariamente à realidade ou à nossa percepção de realidade. Ou, mesmo que façam parte da realidade, não precisam ser aplicadas na arte. Se você olhar de bem perto, não vai conseguir ver o que está retratado no quadro. O pintor quer trazer à tona a sua percepção com as cores, e não com as linhas. William Turner, “Casa do Parlamento em Chamas” (1835).

Saber quebrar as convenções é uma das maneiras mais incríveis (e difíceis) de ser criativo.

O grafiteiro Crânio – famoso por seus índios “azuis”.

Neste curso, falaremos menos sobre técnica de desenvolvimento de coleção e mais sobre aprender a soltar a criatividade – com peças que já existem.

E o desenho? Todo mundo sabe desenhar. Desenhar significa apresentar ideias no papel de qualquer forma que não seja seguindo uma linguagem escrita. O que entendemos como um “bom desenho” e um desenho “realista” é simplesmente o que segue um determinado conjunto de regras para ficar parecido com o que entendemos por “realidade” (e, como a vestimenta, a própria noção de realidade muda de cultura para cultura). Lembra quando falamos da convenção? A história da arte, por muitos anos, criou modelos ideais de corpos que deveriam ser pintados para que aquela fosse considerada uma “verdadeira obra de arte”. “Ideais” são convenções de formas e acontecimentos supostamente perfeitas na nossa imaginação, mas que não podem existir na realidade. No Renascimento italiano, artistas, como Leonardo da Vinci e Michelangelo, criaram ideais de corpos de pessoas que não existiam. 8


Muitas vezes, um conjunto de técnicas se torna uma convenção para que ela seja utilizável no dia a dia, cumprindo um papel prático. Por exemplo, na moda, existem convenções para se desenhar um croqui, o tipo de desenho que demonstra como deve ser feita uma roupa: comprido, magrinho, às vezes com a mão na cintura etc. Mas aprender a fazer este desenho é simplesmente respeitar e prestar atenção em determinado número de regras. É a mesma coisa para desenhar um mangá: convenções como olhos grandes, traços limpos e riscos expressivos que demonstrem cenas de ação formam o conjunto de regras para que os leitores reconheçam o estilo, e não ser “parecido” com a realidade. Michelangelo - “David” (1504). Embora pareçam à primeira vista, as proporções deste homem não são reais.

Croquis: correspondem a um conjunto de regras para criar códigos visuais compreensíveis na indústria de moda.

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Criando: sketchbook e painel de referências Criar uma peça ou uma coleção de moda não se faz a partir do zero, olhando para uma folha em branco. Como diria Einstein: se 1% é inspiração, 99% é transpiração, ou seja, muito trabalho! Você precisa exercitar a mente e as mãos para começar a criar. E existem duas maneiras de se fazer isso, que podem ser usadas separadas ou combinadas:

Sketchbook O termo, em inglês, significa livro de rabiscos. Em um caderno, você faz rascunhos das ideias que vão surgindo na mente, sem se preocupar se ficarão bons, bemacabados. Bons designers andam com o sketchbook o tempo todo: na mochila, do lado da cama para rabiscar antes de dormir... Quando se tem uma ideia, se rabisca. O sketchbook não tem nenhum compromisso de ser bonito nem compreensível. É uma maneira de jogar para o mundo as ideias que ainda estão sem forma dentro da sua cabeça. O sketchbook é particularmente interessante quando o usamos, ao andar pela cidade à caça de inspiração, como um flaneur. Você sabe o que é um flaneur? É um termo, inventado por poetas e artistas franceses no século 19, que significa andar pela cidade apenas observando as pessoas. Assim, eles tinham inspiração para fazer seus quadros e poemas baseados na vida comum. Hoje em dia, ninguém tem tempo para simplesmente sair andando e observando, mas podemos exercitar nosso olhar de flaneur no dia a dia, indo trabalhar ou estudar, prestando atenção em lugares que antes passavam despercebidos em nosso olha cotidiano.

Painel de inspiração Também conhecido como moodboard, o painel de inspiração é um exercício mais mental do que manual, ao contrário do sketchbook. O painel de inspiração compreende selecionar imagens que tenham a ver com a ideia que se quer criar. Com um tema já pré-definido, procuramos imagens – que podem ser fotos, desenhos, imagens retiradas de filmes e TV, etc – e as combinamos para formar um painel que possa gerar ideias para a criação. Essas imagens podem ser tanto já prontas, retiradas da internet, de livros ou de revistas, quanto criadas por você (suas fotos, seus desenhos...). O painel de inspiração trará referências de formas, desenhos, cores etc. Mas é importante que você já tenha uma ideia clara do que quer fazer antes de montá-lo. Veja o exemplo.

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Para criar o sketchbook ou o painel de inspiração, é preciso ter a mente aberta. Com isso, queremos dizer que o mais recomendado é não ter na cabeça, já de cara, o produto final que você vai produzir neste curso; mas antes exercitar ideias. No final, você verá quais são aplicáveis ou não na peça que iremos customizar. Neste curso, usaremos o sketchbook como técnica criativa.

Exposição das referências artísticas locais A arte atualmente pode nos oferecer várias ideias.

1. Critica Social: A arte,

o cinema e a música têm, no Brasil, uma forte consideração pela crítica social. Essa crítica pode ser social (o racismo, a violência de gênero, homofobia, etc), política (corrupção dos políticos e empresas, narcotráfico, etc), econômica (pobreza, desigualdade na distribuição de riqueza, etc). As críticas tentam sempre expor o poder do mais forte sobre o mais fraco, não faz sentido fazer o contrário.

Hélio Oiticica - “Seja marginal, seja herói” (1968)

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2. Novas estéticas Essas novas

estéticas significam novas formas de ver e de se retratar alguma coisa. Por exemplo, no século 19, um grupo de artistas queria descobrir novas formas de pintar quadros, que tivessem mais a ver com como a luz incide nas paisagens e menos com a forma real das coisas. Nasceram os impressionistas, como Monet, Renoir e Cézanne. Hoje em dia, no mundo de imagens em que vivemos, Ron Mueck – “A garota”. é praticamente impossível criar algo completamente novo, mas pode-se sempre experimentar e apresentar coisas visuais que saiam completamente do padrão. Ou você vê em qualquer esquina uma escultura de um bebê gigante e medonho, como esta de Ron Mueck?

A arte pode servir como referência criativa para a moda e para o design. Ousada, inovadora, sem qualquer compromisso com nenhuma regra. Qualquer forma de arte pode inspirar a moda: pinturas, esculturas, vídeos, instalações, arte de rua, cinema, dança, música. Atenção: para fazer uma criação inspirada na arte, porém, precisamos tomar cuidado com um tema muito recente e que tem trazido muitas controvérsias: o da apropriação. Até pouco tempo atrás, a moda apropriava-se, ou seja, tomava emprestado, como inspiração, manifestações artísticas e culturais de diversos povos e etnias. Por exemplo, um estilista usa o turbante afro-brasileiro como inspiração. Atualmente, porém, é preciso tomar cuidado para não se tornar desrespeitoso com a cultura da qual vem a inspiração. A ideia deste curso é usar as referências artísticas locais para criar, principalmente, a arte de rua (pixo/grafite), mas você pode combiná-las com a referência que quiser, seja uma música que você goste, um filme, uma paisagem da natureza, fotografias que você mesmo tirou. Tudo o que é visual pode virar inspiração direta para a moda. O que não é visual (como a música e a literatura) acaba virando inspiração indireta – ou seja, ajuda a colocar sua mente em sintonia com as ideias que você quer expressar.

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Arte de rua: Pichação e grafite Poderíamos dizer, grosso modo, que a arte humana sempre pintou paredes e muros. As pinturas pré-históricas nas cavernas são um exemplo disso. Os gregos e romanos antigos, além de suas elaboradas esculturas, pintavam muros e paredes antes do quadro ser pensado e inventado. No México e na Bolívia, os muralistas eram artistas contratados pelo governo para pintar a história da nação em muros imensos.

Mural de Diego Rivera no México.

As pessoas pintam paredes pelos mais variados motivos: para homenagear alguém, para destacar seu nome na sociedade, para fazer uma oração para um deus antigo, dentre muitos outros motivos. A partir do século 20, a nossa ideia contemporânea de “beleza” passa a ser asséptica. Asséptico é um termo para limpeza total e harmonia, normalmente associada a formas retas e cores muito claras. Valorizamos paredes brancas limpíssimas, chão de cores claras, muros cinzas e sem detalhe. Isso não aconteceu à toa. A partir do desenvolvimento maior da Revolução Industrial, as peças feitas pelas fábricas, padronizadas e simples, se tornam nosso maior padrão de beleza e perfeição. Além da limpeza, tudo precisa ser útil. E útil comercialmente. O que não é útil dentro do contexto de sociedade e de poder em que vivemos – o trabalho, a produtividade, o otimismo, o progresso – é colocado de lado. E este é o caso de artes consideradas “marginais” como, por exemplo, a pichação e o graffiti. Ambas as artes urbanas nasceram nos bairros de maioria negra e imigrante em Nova York, nos Estados Unidos, nos anos 1960. No começo, tudo tinha a aparência que hoje reconhecemos como a do picho. Na verdade, no inglês, não há a palavra picho, tudo é considerado graffiti. O termo “graffiti” foi cunhado pela imprensa que registrava esse tipo de “vandalismo”, normalmente realizado em trens da linha de metrô. Os grafiteiros chamavam essa arte de “tagging” (etiquetar), “hiting” (bater) e “writing (escrever), nomes que ainda ecoam no graffiti e no picho atual – principalmente o tag, a “assinatura” do pichador pelos muros da cidade.

Graffiti d’Os Gêmeos em Boston, EUA, e vários grafites em Santana, na zona norte de São Paulo.

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Diferenciar graffiti de pichação é coisa do mercado brasileiro, como já dissemos, e pressupõe um juízo de valor sobre essas duas artes. Estudar a arte urbana é considerá-la importante em todas as suas esferas. Há ainda diferenciações a serem feitas, que não são regra e cada artista ou grupo de artista considera de uma maneira. Bombs ou grapichos são normalmente “pichações mais elaboradas”, o meio-termo entre picho e graffiti. Tem grafiteiro que não gosta de picho, pichador que não gosta de graffiti – inúmeras disputas, como existe em qualquer meio artístico. Sob os olhos da lei, tanto o graffiti quanto o picho são considerados crimes. O que pesa para a legislação é a autorização: se o dono, a instituição governamental ou a empresa proprietária do imóvel autorizou a arte, ela está dentro da lei; se for o contrário, será ilegal, não importa seu valor artístico e cultural. Materiais utilizados na pichação/ graffiti: latas aerosol, tintas tipo látex, canetão, giz-de-cera etc. Pixo em um prédio na República, também em São Paulo. Os pichadores normalmente não gostam que chamem o que fazem de arte. No caso dos paulistanos, o que mais interessa é conseguir alcançar os lugares mais difíceis para pixar.

Arte de rua: outros formatos Existem outras formas de usar a rua como arte...

O fotógrafo brasileiro Arnaldo Pappalardo faz “closes” tão próximos da rua que mal podemos distinguir o que está na imagem. A rua vira uma pintura abstrata.

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Sabia que protesto também pode ser arte?

O grupo argentino Taller Popular de Serigrafia organizou protestos usando faixas, entre 2001 e 2005, para exigir a prisão dos líderes militares da ditadura que torturaram e mataram pessoas. A ação deu certo e muitos militares foram presos.

O grafiteiro britânico Banksy usa o estêncil para intervenções rápidas nos muros da cidade. “O que você está olhando?” é o que diz este, desafiando a câmera de segurança... Performances são formas de arte que usam o corpo das próprias pessoas como forma de arte. A diferença do teatro para a performance é que esta acontece nas ruas e não nos palcos, e normalmente de maneira surpreendente e ilegal, como o pixo. Aqui, o grupo de artistas boliviano Mujeres Creando faz uma performance vestidas de noivas sangrentas para falar sobre o feminicídio, o assassinato de mulheres, normalmente por seus próprio maridos. 15


História da arte: inspiração para criar A primeira noção que devemos ter em mente, quando estudamos História da Arte, é que ela não passa de um recorte. Quando falamos sobre determinados artistas de um período da história, ou determinadas obras de arte, estamos escolhendo entre uma infinidade de outras obras e artistas do mesmo período, de todos os lugares do mundo, mas que não foram “escolhidos” dentro deste recorte específico. E este recorte é consolidado, legitimado por museus, exposições, pela publicação de livros, por filmes sobre os artistas, todos os meios que dão a impressão de que a história da arte é uma disciplina única e coerente. Por isso, quando pensamos em História da Arte, é mais comum ressaltar artistas de centros de poder: Europa e Estados Unidos. Na maioria são homens (embora tenham existido muitas mulheres artistas), de uma determinada raça (branca) e classe social mais abastada. Para fins didáticos, nesta apostila não fugiremos da história da arte tradicional – ela pode ser excludente, mas é importante - mas você deve ter em mente que esta não é a única história da arte possível.

Renascimento Iremos começar nosso recorte na história da arte com o Renascimento, o período da história da humanidade que começou mais ou menos em 1500, e cujo centro do mundo cultural era a Itália (no político e econômico, Portugal e Espanha disputavam o protagonismo). O Renascimento nasceu na Itália e é visto como uma retomada da arte antiga, da época dos gregos e romanos. E quais são as características dessa arte? A noção de perspectiva na pintura das paisagens, a idealização do corpo (principalmente o masculino), ou seja, criar corpos perfeitos que na verdade não existem. A ideia de que o quadro é uma janela e de que o que se está pintando é a realidade em si mesma. E que toda grande arte é uma mímese, isto é, uma cópia da natureza. Os temas das pinturas eram quase sempre os mesmos, indo da mitologia grega aos temas religiosos da igreja católica. As regras do Renascimento são extremamente rígidas e não permitem grandes inovações: para ser um grande pintor na época, era necessário sempre copiar e copiar os grandes mestres que vieram antes.

Rafael, Alba Madonna, 1501

Ticiano. O Rapto de Europa, 1542

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Sandro Botticelli, O Nascimento da Venus, 1483


Barroco No século 17, começaram na Europa as reformas protestantes: em vários países, como Inglaterra e na região da Alemanha, surgiram líderes religiosos que queriam se desvencilhar da igreja católica e continuar permanecendo cristãos. Esses movimentos deram origem às várias religiões protestantes que conhecemos hoje. A igreja católica, que não queria perder fieis, iniciou um movimento que ficou conhecido como contrarreforma. E ela se refletiu na arte, no período em que chamamos de Barroco. As características do Barroco são: as zonas muito escuras, em contraste com pontos fortes de luz, o que lhe dá um aspecto quase sobrenatual (essa técnica é conhecida como chiaroescuro, ou claro-escuro). As pinturas e esculturas com muitos elementos, cheias, quase sufocantes – a ideia era o fiel entrar na igreja e quase cair de joelhos. O Barroco é uma arte que queria mexer com as emoções, inspirar os fieis a permanecerem mais fieis, muitas vezes até mesmo através do medo. Sandro Botticelli, O Nascimento da Sandro Botticelli, O Nascimento da Venus, 1483 Venus, 1483

No Brasil, o Barroco foi bem representativo, impulsionado pela descoberta do ouro em Minas Gerais. As igrejas desse período têm altares muito ricos e que não dão respiro.

Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar, em Ouro Preto-MG

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Rococó Se o Barroco é a arte da igreja, o Rococó é a arte dos reis. Neste período, as monarquias europeias estavam mais fortes do que nunca, e os reis eram absolutistas: elas mandavam e desmandavam à vontade, e não havia nada que o povo ou a burguesia pudesse fazer. O rei mais representativo desse período é Luís 14, da França, que ficou conhecido como Rei Sol. Junto com os reis, se desenvolveram as cortes, a nobreza ociosa, que não trabalhava, e uma vida estética baseada no prazer e no hedonismo. O Rococó é isto: o apelo à beleza, ao campo, ao prazer, à vida cortesã, como a moça que balança no quadro de Fragonard expressa muito bem.

Jean-Antoune Houdon, Voltaire, 1778

Jean Auguste Ingres, A Banhista de Valpinçon, 1808

Neoclassicismo

Jean-Antoune Houdon, Voltaire, 1778

A partir da Revolução Francesa, a razão, a austeridade e o trabalho ganham. O homem se sobrepõe a Deus e à religião. Os prazeres e a beleza ficam em segundo plano. A arte clássica do Renascimento volta à tona com roupagem renovada: mais técnica, mais precisa. Algumas pinturas parecem até fotografias, e algumas esculturas parecem a própria pessoa retratada, petrificada. Representações dos “grandes homens” da época, como o filófoso Voltaire, são temas preferidos.

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Romantismo O Romantismo não virá logo depois, mas coexistirá com o Neoclassicismo (e depois vai se tornar protagonista). Ele é o oposto da razão, é a emoção que aflora. E simboliza um novo papel dos artistas na sociedade, papel semelhante ao que eles têm hoje: são rejeitados, estão à parte do nosso mundo, são visionários ou marginais. Se a burguesia cuida dos negócios, os artistas cuidam do mundo estético. Antes não havia muita certeza nessa separação. Os românticos irão retratar o que há de mais problemático na sociedade europeia daquele período. A exemplo do famoso quadro do artista espanhol Goya, que mostra o fuzilamento de rebeldes após as tropas do imperador francês Napoleão dominarem a Espanha.

Francisco Goya, Três de maio, 1808

Theodore Géricault, A Balsa da Medusa, 1819

Modernismo Iremos passar nosso recorte da história da arte para um conjunto de movimentos artísticos na Europa que se convencionou chamar de Modernismo. Ele desejava contrapor-se àquela arte clássica da qual falamos anteriormente, subvertendo o conjunto de regras rígidas de perspectiva, de proporção, de luz etc. O Modernismo foi o momento de revolta total dos artistas. Mas é estranho pensar que ainda hoje o que a maioria das pessoas considera uma “boa arte” ou uma “arte bonita” é ainda associada a padrões da arte clássica.

Pablo Picasso, Guernica, 1937. Tem gente que diz que Picasso não sabia desenhar. Ele sabia, mas queria quebrar com todas as regras que ensinaram desde criança sobre o que era “desenhar bem”.

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Arte como impressão Os impressionistas são considerados os primeiros artistas do modernismo. Eles trabalhavam com uma nova forma de ver e de pintar a luz. Veja neste exemplo do francês Renoir. Se você olhar bem de perto, parecem pinceladas e riscos – e é a impressão desses riscos em nosso olhar que forma a figura.

Renoir, Um Baile no Moulin de la Galette, 1876

Isso é mais latente ainda nas paisagens do arista inglês William Turner: dramáticas, se olhadas de perto não são mais que manchas.

William Turner, Vapor Numa Tempestade de Neve, 1842

Arte como expressão Em contraponto aos impressionistas, vários artistas de diversos lugares da Europa quiseram propor algo diferente: a arte era expressão interior, e não observação do que vem de fora. De dentro para fora, e não de fora para dentro. E muitas vezes essa “realidade interior” é muito perturbada, dependendo do artista. Estamos falando de um período na Europa em que havia muitos conflitos e dúvidas sobre o futuro, e estes conflitos e dúvidas iriam culminar na Primeira Guerra Mundial. No famoso quadro O Grito, do norueguês Edvard Munch, vemos uma pessoa de pé em uma ponte, a gritar, apavorada, com as mãos nos ouvidos. Essa pessoa nos parece mais um fantasma. O fundo amarelado não é um fundo como o veríamos normalmente, mas caótico e perturbado como o que nosso amigo na ponte está sentindo ao gritar. Cores, formas, pinceladas, tudo reflete a dor interior do artista.

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Na França, havia outro artista para quem o interior gritava: Vincent Van Gogh, Sua paisagem mais famosa, A Noite Estrelada, poderia ser uma pacata e pacífica paisagem do campo, onde Van Gogh vivia, mas é um caos de movimento e intensidade, como se tudo estivesse se movendo.

Edvard Munch, O grito, 1893

Vincent Van Gogh, A Noite Estrelada, 1889

Porém, isso não significa que todo o expressionismo seja sempre tão depressivo assim. Henry Matisse tinha outra proposta. Para ele, a arte deveria ser intuição, pintar era algo quase místico e ritualístico. Nada deveria ser planejado, nem proporcional. O quadro é um mundo onde movimento e vida são gerados, e depois passados para o espectador. As cores intensas que Matisse usa também têm a ver com essa intuição. Já o russo Wassily Kandinsky tinha uma ideia diferente de como expressar-se. As formas, para ele, não deveriam ser compreensíveis. Essas ideias são outro movimento que vários artistas estavam estudando: a abstração. Abstrata é uma pintura diferente da figurativa: suas formas não precisam corresponder a algo do mundo real; não se pinta uma paisagem ou um cavalo, mas sim várias formas e cores sem identificar o que elas são.

Wassily Kandinsky, Composição 7, 1913

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Arte como funcional O desenvolvimento das indústrias, das grandes cidades e das máquinas no final do século 19 e no começo do século 20 mudou a vida das pessoas e transformou a sociedade. Foi o começo da criação do mundo em que vivemos hoje e que não existia antes: as horas do dia e os dias da semana são pensados como aproveitáveis para o trabalho, a vida é agitada, e a ideia de que tudo deve “servir para alguma coisa”, ter uma finalidade, principalmente, financeira. Indivíduos que não produzem nem consomem não são úteis para a sociedade. E é claro que esse tipo de novo pensamento influenciou na arte, que se tornou preocupada com o funcional.

Pense no quadro do artista soviético Kazimir Malevich, por exemplo. Este é o quadrado preto sobre um fundo branco. Sim, ele apenas pintou isso. Quer algo que simples, mais funcional do que um quadrado preto pintado sobre um fundo branco? Numa época que estava tentando sair de quadros ricamente pintados para buscar a simplicidade e a essência das coisas, você pode imaginar qual foi a revelação deste quadro. Malevich pintou ainda outros quadros com quadrados pretos, vermelhos, amarelos: cores puras em formas puras. A pintura de Malevich também é, como a de Kandinsky, abstrata.

Kazimir Malevich, Quadrado Preto Sobre Fundo Branco, 1917

Os cubistas são um exemplo mais complexo. Essas formas estranhas e geométricas dos quadros de Pablo Picasso são uma maneira de estudar matematicamente as formas antes de fazer uma pintura. A arte se torna objeto de pesquisa. É tentar ver de outro modo, extrair outras possibilidades. Para os cubistas, as únicas dimensões são a altura e a largura, e as figuras se planificam e reagem de forma diferente com o espaço ao seu redor.

Pablo Picasso, As damas de Avigon,1907

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Há artistas que não estavam interessados no novo mundo caótico e industrial em que viviam. Eles chamam sua arte de metafísica – ela estava silenciosa e pura, longe dos transtornos do mundo. Veja o quadro do italiano Giorgio de Chirico: silêncio absoluto, ninguém à vista, pureza das formas e das cores. Conseguimos ver a matemática e a geometria ali, como nos cubistas, mas a matemática para De Chirico tem mais a ver com buscar proporções absolutamente puras. A De Stijl é uma escola que surgiu Giorgio De Chirico, O Mistério e a na Suíça, cujo principal representante Melancolia de uma Rua, 1914 é Piet Mondrian. Mondrian é mais um dos artistas fundamentais da abstração. Buscando formas puras e precisão geométrica, este artista planejava cuidadosamente as combinações de seus quadros. No Brasil, os movimentos concretismo e neoconcretismo foram fundamentais. Feito principalmente por artistas cariocas e paulistas, estes dois movimentos (com pouca diferença Piet Mondrian, Composição com Largo Plano Vermelho, Amarelo, entre si – o primeiro é mais rígido e o Preto, Cinza e Azul, 1921 segundo, mais permissivo) primavam pelo jogo das formas e cores. É o caso da Pintura 162, de Wllys de Castro – as pinturas dele tinham sequer nome, sendo identificadas por números! Fora de toda essa precisão, os Willys de Castro, Pintura 162, 1956 dadaístas são os grandes rebeldes da arte dessa época. Eles zombavam do funcionalismo e, fazendo isso, levavam a própria arte às últimas consequências. Veja o exemplo do francês Marcel Duchamp. O artista pegava objetos comuns do dia a dia, mexia neles e os colocava nas exposições, como obras de arte. A mais famosa é a do mictório de ponta cabeça, onde ele assinou um psedônimo: R. Mutt.

Marcel Duchamp, A Fonte, 1917

Já Meret Oppenheim forrou uma xícara com pelos, desfuncionalizando totalmente um objeto funcional. Os dadaístas são dados aos absurdos.

Não, Duchamp não estava querendo dizer que aquele mictório era tão belo e perfeito quanto uma obra de arte. Oppenheim não queria que as pessoas achassem os pelos de sua xícara muito belos. Mas estes artistas queriam questionar a própria noção do que era arte. Arte é o belo? É o que está no museu? É o que as pessoas gostam? O que é a arte? Na verdade, as ideias de Duchamp só foram mais compreendidas muitos anos depois, como veremos a seguir. Meret Oppenheim, Objeto, 1936

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O sonho como arte O surrealismo é um dos movimentos artísticos mais reconhecidos do nosso século, talvez porque a ele está associado um pintor muito conhecido: Salvador Dalí. Para os surrealistas, a pintura deveria trazer à tona o que estava na mente. O inconsciente humano era uma descoberta recente que estava se tornando popular nessa época. Veja que é diferente do expressionismo: não se Savador Dalí, A Tentação de Santo Antônio, 1946 mostram sentimentos, mas sim as próprias imagens da mente, e, mais especificamente, as dos sonhos. Este quadro de Dalí parece um sonho maluco com criaturas inexistentes.

René Magritte foi outro representante importante do surrealismo: composições que não fazem sentido e só se tornam possíveis numa pintura (ou num sonho), como este:

René Magritte, O Segredo Duplo, 1927

A América Latina tem uma grande representante do surrealismo: Frida Kahlo. Essa pintora revolucionária pintava seus sonhos – e pesadelos – mais íntimos. Frida sofreu um acidente muito grave quando era jovem e teve que usar um aparelho para sustentar as costas e o pescoço por muito tempo, além de deixar sua saúde extremamente frágil. Vemos estes e outros dramas pessoais em seus quadros.

Frida Kahlo, A Coluna Partida, 1944

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Expressionismo abstrato No pós-guerra (os anos que se seguiram logo após a Segunda Guerra Mundial, que acabou em 1945) os Estados Unidos conquistam um lugar privilegiado no mundo da arte. Seus artistas e movimentos se tornam significativos e influentes. E o principal movimento ficou conhecido como expressionismo abstrato. Este movimento, como o nome diz, mistura expressão e abstração. Um de seus principais artistas é Jackson Pollock. Neste quadro, Pollock faz uma mistura intensa de cores. E ele faz com ação: o artista não pintou propriamente, passando o pincel pela tela, mas jogou as cores livremente – a tela ficava deitada no chão enquanto Pollock passava o pincel cheio de tinta sem encostar, rápida e freneticamente. Então, a performance de pintar o quadro se torna tão importante quanto a obra em si.

Pollock em ação

Jackson Pollock, Number 1, 1950

Na França, Yves Klein foi mais longe. Ele chamava voluntárias que ficavam sem roupa e sujavam seu corpo com tinta azul. O artista então as passava pela tela, segurando-as pelos braços – um pincel nada convencional! Este tipo de pintura de Pollock e Klein ficou conhecida como action painting, pintura de ação.

Yven Klein, Antropometria, 1960.

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Mas nem só de action painting vivia o expressionismo abstrato. Mark Rothko, outro pintor norte-americano, expressava-se de outra forma: por meio das cores. Seus quadros formam conjuntos de cores vibrantes que, mesmo paradas, estáticas, parecem vibrar.

Mark Rothko, Homenagem a Matisse, 1954

Arte pop O expressionismo abstrato foi fundamental nos anos 1950, mas, como aconteceu com vários outros movimentos, ele foi se desgastando, limitando-se em si mesmo. No final dessa década, os Estados Unidos e a Europa passavam por um “boom” muito grande de consumo, e se consolidava o que chamamos de cultura pop: celebridades da TV e da música e o culto da fama pela fama. Nesse contexto nasce a pop art. A pop art é quase um protesto à cultura pop e ao consumismo dessa época. É cheia de ironia e piadas. Este quadro do britânico Richard Hamilton chama-se O que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes? Vemos em uma colagem um homem musculoso e loiro, à maneira da celebridades, uma mulher no estilo modelo e uma casa rica, com direito a empregada doméstica no fundo. Hamilton está ironizando a vida consumista e de fantasia que a maioria das pessoas tinha como ideia de sucesso: para que tudo isso, afinal? 26

Richard Hamilton, O que torna os lares de hoje tão diferentes, tão atraentes?, 1956


Já Andy Warhol estava interessado na cultura das celebridades e nos “15 minutos de fama”, como ele chamava. Todos queriam ser famosos, as atrizes, cantoras e modelos eram o exemplo máximo de beleza e objetivo de vida. Warhol faz uma série de cópias do rosto de uma celebridade, Marilyn Monroe, em várias cores, ironizando a questão da fama. As “cópias” satirizam a ideia de que Marilyn era uma pessoa única mas que, colocada na TV e na grande mídia, víamos apenas sua imagem, copiada o tempo todo e banalizada.

Andy Warhol, Díptico de Marilyn, 1962

Arte como nunca vista antes Chega um momento em que a arte expande todas as fronteiras. É como Duchamp, o artista que levou o mictório ao museu, já havia falado: qualquer coisa pode ser arte. O conceito, a ideia por trás da obra, se torna mais importante que a obra em si. Vamos ver três tipos de arte mais praticados, mas existiram também outras formas.

Performances Performances são atuações, como no teatro, mas sem roteiro e sem palco, normalmente feitas de surpresa em um local. Pode ser feita qualquer ação em uma performance. O mais comum é utilizar um aspecto das nossas vidas que o artista pense que precisa de atenção, e levar este aspecto aos últimos limites. Joseph Beuys fez isso: pegou no colo uma lebre morta, pintou o rosto de dourado e saiu andando pelo museu explicando os quadros para a lebre. Ele estava criticando o mundinho limitado e esnobe de quem vai ao museu de arte para se exibir, sem vivenciar as obras de arte em seu máximo.

Joseph Beuys, Como Explicar Imagens para uma Lebre Morta, 1965.

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Vídeo-arte e tecnologia

O aparelho de vídeo portátil, que antes só poderia ser usado pelas grandes emissoras de TV, chegou à vida das pessoas comuns. É claro que isto deu mais material para os artistas, que aproveitavam as “últimas tecnologias” do meio! Peter Campus rasga, queima e cobre com o creme a própria imagem em movimento, usando recursos do vídeo e dos sintetizadores da época.

Peter Campus, Três Transições, 1973

Instalações

Cildo Meireles, Babel, 2001

Instalações são objetos montados de todo tipo de material. Diferem da escultura porque não são esculpidas, e sim montadas. O brasileiro Cildo Meireles montou uma torre enorme de rádios, gravadores e outros aparelhos ruidosos para criticar os grandes meios de comunicação de massa e a maneira como a informação trafega em nossa sociedade. Mesmo chegando perto dessa torre, os sons todos ao mesmo tempo não nos deixam ouvir nada.

A nova pintura A arte transgrediu e continua transgredindo todas as fronteiras. Não existem mais movimentos consagrados, tudo pode ser criado em qualquer lugar e em qualquer momento. Hoje, a arte tem liberdade absoluta de ser o que quiser. E também os artistas. Pode-se notar que nos anos 1980, porém, a pintura ganhou grande destaque novamente. Até hoje, ela ainda é um suporte fundamental para a arte. Não é só porque existem instalações que não podem existir pinturas. O mesmo artista pode fazer ambas. Entre os principais artistas da pintura mais recente, vale destacar um deles: o nova-iorquino Jean-Michel Basquiat.

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Jean-Michel Basquiat era um artista americano, que começou a carreira muito jovem. Filho de pais imigrantes, Basquiat fugiu de casa cedo e se envolveu no mundo da arte após começar a pichar alguns muros de Nova York com temáticas pop e irônicas, sempre com a assinatura “Samo”. Ele também pintava cartões e os vendia para se manter. Basquiat logo foi descoberto Peter Campus, Três Transições, 1973 por galeristas da cidade devido ao seu desenho confrontador e genial. Este artista era conhecido por misturar perfeitamente a linguagem das ruas – onde ele vivia a maior parte do tempo – e a das grandes artes, já que tinha um repertório muito amplo. Sua mãe o levava sempre ao museu. O sucesso de Basquiat foi instantâneo. Suas exposições eram de enorme sucesso de público e crítica. Era amigo de Madonna e chegou a trabalhar com Andy Warhol, pouco antes de o conceituado artista falecer. Entre as temáticas de Basquiat estavam as ferrenhas críticas à condição de homem negro na sociedade americana, sempre carregadas de ironia. Seus quadros eram violentos e atraentes ao mesmo tempo. Jean-Michel Basquiat, A Ironia do Policial Negro, 1981.

Jean-Michel Basquiat, Africanos de Hollywood, 1983.

Jean-Michel Basquiat, Montando a Morte, 1988.

Jean-Michel Basquiat, Horn Players, 1983

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Era um artista extremamente produtivo. Falecendo muito jovem, com apenas 27 anos, Basquiat deixou nada menos que cerca de mil desenhos e mil pinturas, atualmente valorizadíssimas no mercado de arte. Ao mesmo tempo sofisticadas e acessíveis, as pinturas de Basquiat mostram que não pode haver barreiras entre “alta” e “baixa” arte, entre o certo e o errado, entre o bom e o ruim: desde que tudo isso faça sentido para a expressão do próprio artista.

Simulação de Desenvolvimento da Peça O que é upcycling? É uma maneira de “reciclar” roupas. É pegar roupas que já estão prontas e criar em cima delas. Normalmente o upcycling tem a ver com recriar roupas que seriam descartadas, que já estão fora de moda, desgastadas, velhas etc. Nesse sentido, o upcycling se diferencia da customização, que é simplesmente acrescentar detalhes a roupas que estavam sendo usadas normalmente, sem risco de descarte. O upcycling é importante no momento em que vivemos porque reaproveitar é uma maneira de consumir menos + descartar menos, reaproveitando o que já está pronto.

Técnicas Peças com retalhos/patchs Esta forma de transformação é muito simples, ela pode ser feita em qualquer peça. Patch como customização

Passo 1

Escolher a peça para a customização, pode ser qualquer coisa, saia, blusa, jaquetas, camisetas, camisas etc

Passo 2 Projetar o local onde se fará a interferência Passo 3

Selecionar os patchs (retalhos) para compor i visual projetado

Passo 4 Costurar os patchs a máquina ou a mão. (quando optamos pela costura a mão, as possibilidades estéticas aumentam, pois podemos usar linhas que se destaquem).

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Patchs como upcycling

O uso dos patchs para o upcycling também é muito simples, porem não deve ser confundido com customização, a utilização deles servirá para transformar e não apenas adornar.

Passo 1

Selecione a peças ou peças que deseja transformar

Passo 2

Projete a intervenções que deseja fazer, pense no que aquela (s) peças se transformarão. Faça isso no papel para poder avaliar caminho.

Passo 3 Selecione os patchs que ajudarão a compor a nova peça.

Passo 4

Descosture, corte faça a intervenção pensada no projeto.

Passo 5

Costure a nova peça utilizando os patchs. Pode ser feito a máquina ou a mão.

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Como cortar camisetas e calรงas.

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Efeitos vazados.

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Estamparia manual com carimbos Passo 1 Recorte o E.V.A. conforme seu

desenho escolhido. Não se esqueça que seu desenho será espelhado (com os lados invertidos) no carimbo, por isso, cuidado ao criar letras!

Passo 2 Cole o E.V.A. já no formato de carimbo em uma base rígida. Pode ser, por exemplo, um pedaço de madeira ou a tampa de um pote. Passo 3

Quando você tiver seu desenho final, é hora de sair carimbando-o por aí! Passe um pouco de tinta no E.V.A. pressione-a em um papel para retirar o excesso e você já pode usar!

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www.viladoartesao.com.br/blog/duas-dicas-de-como-fazer-estamparia-com-carimbos/

Estamparia manual com folhas e frutas.

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Pintura com canetas para tecido Essa tecnica pode ser realizada de duas formas: Podemos usar o carbono para transferir o desenho para a peça e depois contornar e pintar. Podemos também usar a criatividade de desenhear a mão livre com a ajuda de um lapis e depois contornar e pintar.

Customizando com água sanitária Passo 1 Crie um projeto visualizando onde irá colocar as manchas. Passo 2 Com um spary borrife nos locais da intervenção. Customizando com água sanitária Passo 1 Crie o projeto determinando como e onde serão as listas. Passo 2 Proteja os pontos que se transformarão em listras com fita crepe Passo 3

Borrife com um spary os locais descoberto, espere secar e retire as

fitas.

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Desenhos Passo 1 Faça seu projeto. Passo 2 Pegue uma canetinha de pintura em tecido, retire a ponta e a almofada com tinta do interior e coloque de molho em agua sanitária até toda a tinta se desprender. Passo 3 Deixe o miolo e a ponta bem embebidos em agua sanitária e recoloque

no corpo da caneta.

Passo 4 Faça o desenho na peça e espere secar.

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Desfiar

Agora é com você, comece a criar e reunir suas ideias aqui, nesse “scrapbook” esperamos e torcemos por suas futuras criações e realizações. Vamos fazer diferente, inovar, recriar, mudar.. Vamos (re)inventar moda.

Equipe Street Style.

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Ficha Técnica: Coordenação Pedagógica: Jairo Silva Direção Cultural: Jonatas Silva Oficineiras: Rosangela Rubbo, Amanda Dumont e Vivian Berto Revisão de Texto: Diogo Aquino Fotografia: Christian Camilo Linha Criativa: Livan Chiroma Designer: Felipe Wolf

Patrocínio

Realização:

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