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entrevista São Paulo, segunda-feira, 24 de agosto de 2015
“Precisamos exercer pressão”
ONG defende manifestações por direitos sociais divulgação
vas manifestações este ano? Nós estamos pensando em voltar às ruas, com foco bem votado para questão da redução da letalidade, que é a causa principal que nós abraçamos e também a questão do legado dos Jogos Olímpicos para a favela. Com relação as manifestações focadas no impeachment da Dilma nós tomamos a decisão de não ir às ruas, somente se a culpa da presidente fosse comprovada seria um ato de bravura, de espírito cívico da presidente renunciar.
eurico cruz - A Organização Não Governamental Rio de Paz foi criada em 2007 como
o intuito de lutar pelo direito da igualdade social e pela redução da criminalidade. A ideia surgiu do teólogo Antônio Carlos Costa, após a chacina de 28 de dezembro de 2006, quando 19 pessoas foram mortas no Rio de Janeiro em ação orquestrada pelo narcotráfico. Diante do fato, Costa disse ter se conscientizado de que não poderia mais admitir que a desigualdade social continuasse a crescer na cidade e tivesse reflexos ainda maiores, como conta no livro Convulsão Protestante. Como a política desenvolve causas e efeitos em todos os setores que vivemos, a ONG protesta não só contra chacinas e causas de letalidade, como a manifestação realizada na Avenida Paulista, na quinta-feira, 20, em menção aos 18 assassinatos entre Osasco e Barueri, mas também na cobrança contra a corrupção de todo e qualquer partido. Em 2011, a ONG colocou 594 vassouras em frente ao Congresso Nacional, uma para cada um dos 513 deputados federais e 81 senadores, com pedido pelo fim do voto secreto e do combate à corrupção. Atualmente, a ONG faz trabalhos sociais em favelas do Rio de Janeiro e vê a realização das obras das Olímpiadas de 2016 como um problema moral. “Uso do dinheiro do contribuinte deve seguir uma lista de prioridade. O prioritário é a necessidade humana, a começar pela vida do pobre”, disse Costa. Metrô News - Diante de tantas crises éticas e morais no Brasil, você acredita que é possível construir uma sociedade mais justa? Antônio Carlos Costa - Se eu não acreditasse na possibilidade do homem superar a si mesmo a ponto de aprender a tratar o próximo com respeito e assim desenvolvermos modelos mais justos de sociedade, eu desistiria da luta. Eu não creio em utopia, não acredito que a natureza humana nos permite viver sem os juízes, os desembargadores, sem a polícia, mas nós podemos alcançar um nível de civilidade muito maior do que o que fizemos até hoje. A educação é uma das causas desses problemas? Não há a mínima dúvida que historicamente essa tem sido a falta do Estado brasileiro. Como consequência disso surge a desigualdade social igualmente histórica que funciona como parceira do crime. O modelo de sociedade em que vivemos hoje joga o ser humano um contra outro. Tem coisas que levam o homem a prati-
car atos injustificáveis. Existe atualmente um número cada vez maior de minorias que buscam direitos iguais. Isso não causa uma separação entre as classe por conquistas reais para todos? Lutar pelo direito das minorias, de certa forma, é lutar pelo direito de todos, contudo, percebe-se no País que dificilmente nós vemos o brasileiro lutando pelo direito de todos. O que você está dizendo corresponde à verdade dos fatos porque em geral nós lutamos por aquilo que nos interessa. Isso vai contra uma ampla conjugação de esforços maiores. Nós vivemos num País no qual não só o direito de minoria digna é desrespeitado, mas no qual os direitos universais não estão sendo respeitados. Como você avalia a democracia no Brasil? Hoje a nossa democracia é de expectador, ela funciona para quem governa, para o povo ela se define ao ponto de votar.
Impeachment - Costa se diz contrário a esse tipo de manifestação
Por isso nós temos as maiores aberrações políticas, sem espíritos republicanos, que trabalham sem metas e não se sujeitam a padrões de excelência. Não prestam contas. De fato nós estamos vivendo uma crise de representatividade, uma vez que eles trabalham mais para seus partidos políticos que funcionam mais como balcão de negócios do que como políticos que legislam em prol do povo. Existe um excesso de
“O que representaria para as favelas do Rio de Janeiro se essa mobilização fosse feita a favor do pobre? O que aconteceria?”
partidos políticos no Brasil? Não há a mínima dúvida. Viraram empresas. Não têm face, não há princípios ideológicos e, claro, não têm agenda. São siglas que não fazem a mínima diferença. Isso poderia ser resumido a dois partidos. Você pega a agenda, o discurso ideológico, você compara um com outro, nada muda. E como se conserta uma situação dessas? Nós precisamos de uma democracia participativa, com pressões na rua. Em 2013, isso ficou muito claro, eu não sai das ruas, nunca inalei tanto gás lacrimogêneo. E ficou muito claro o pânico que aquilo causou aos governantes. Sem esse elemento, nós não vamos conseguir vencer os elementos que estão contra nós, a sétima economia do mundo e o 79º em Índice de Desenvolvimento Humano. A ONG deve realizar no-
Qual o principal problema que a ONG percebe com a preparação da Olímpiada no Rio de Janeiro? A Olímpiada é um problema moral porque você não pode pensar em usar verba pública sem seguir uma agenda de prioridades, porque é prioridade, no Rio de Janeiro, atacar as causas da desigualdade e não podemos nos dar o luxo de fazer um movimento dessa magnitude sem beneficiar as classes mais desfavorecidas. Isso faz a sociedade pagar com seu próprio sangue. Isso joga um ser humano contra o outro. Nada contra os jogos, contra às Olímpiadas, contudo é lamentável perceber que o pobre está a parte dessa situação. E como o senhor acha que esse investimento deveria ser feito? A gente fica diante dessa questão. O que representaria para as favelas do Rio de Janeiro se essa mobilização das Olímpiadas fosse feita a favor do pobre? O que aconteceria?