Estética dos Espaços de Protesto

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ESTÉTICA DOS ESPAÇOS DE PROTESTO rua e internet no impeachment



ESTÉTICA DOS ESPAÇOS DE PROTESTO rua e internet no impeachment

Lívia Gianini Victoria Orient. Giselle Beiguelman

Trabalho Final de Graduação FAUUSP 2017


AGRADEÇO À Giselle Beiguelman, por ter me acolhido nessa jornada, pela orientação generosa e motivacional. À Clice Mazzilli, pelos tantos momentos em que se dispôs a contribuir com este trabalho. Aos professores Sérgio Régis Martins e Graziela Kunsch, pela importante participação na banca. Ao Coletivo Oitenta e Dois e Lucas Dos Anjos, por compartilharem comigo a experiência dos seus trabalhos. À Francielle Araújo, pelo apoio técnico e emocional. Ao Gabriel Pietraroia, pelo carinho, paciência e entusiasmo incondicionais. Sem você esse trabalho não teria saído do papel, literalmente. À Raphaella Caires, por compartilhar tantos sonhos comigo. Aos amigos de Sempre, em especial Manoela Pessoa, Marina


Lane, Mariana Ary, Thiago Pereira, Thomas Kilmar, Victor Menasce e Jean Peguim, pela amizade que transcende tempo e espaço. À Leila de Lacerda e Renan Merlin, minhas almas gêmeas, pelas inúmeras risadas que demos juntos. Aos amigos da FAU, pela cumplicidade, creio que só vocês entendem as dores e delícias de ter habitado o prédio de Artigas. Aux amis d’outre-mer, Marina Navarro, Félix, Marilou, Agathe, Liliane, Nicolas et Antoine, pour tout ce que vous avez fait pour moi, je n’oublierai jamais. Aos meus pais e irmã, Eliana, Pedro e Nara, pelo cuidado e compreensão, e por sempre me motivarem a dar o melhor de mim. À FAU, pela liberdade.



ÍNDICE

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Considerações Iniciais

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Política como campo da estética

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Referências

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Entrevistas

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Exercícios gráficos

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Projeto de expografia

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Considerações finais

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Bibliografia

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Iconografia





CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Este trabalho discute, por meio de um projeto expográfico, a política como campo de produção estética. Compreende-se, portanto, que a discussão estética se expande para além da arte, alcançando a política. Desde as primeiras orientações desse trabalho, foi discutida a possibilidade de escolher alguma manifestação ocorrida nos últimos anos como estudo de caso para o desenvolvimento do tema. Inicialmente foi proposto o exercício de recolher durante algumas semanas todo e qualquer tipo de referência visual que remetesse a alguma manifestação, como forma de mapear a quais veículos e formatos elas estavam mais associadas. Esse primeiro exercício, que resultou na montagem de um banco de imagens próprio, permitiu um conhecimento quantitativo e qualitativo das imagens utilizadas nas manifestações de 2015 e 2016, no qual foi possível constatar que

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essas amostras visuais não se limitaram às ruas, com as performances, lambe-lambes, pixos, músicas, danças, adesivos, bandeiras, balões, infláveis, faixas, cartazes e camisetas, mas também se expandiram com o uso intensivo da internet em forma de memes, twittes, hashtags e selfies. Várias manifestações no período surgiram como potenciais, mas dentre elas, as manifestações relacionadas ao impeachment da presidente Dilma Rousseff se destacaram devido à escala nacional que atingiram, à complexidade da questão que abrangem, a enorme quantidade de conteúdo estético produzido e especialmente o fato de que houve protestos contra e a favor acerca de uma mesma questão. Uma vez feita essa escolha, colocou-se a seguinte questão: como se constituíram as relações de poder e potência através das imagens contidas nessas mídias? Em seguida, buscaram-se mais imagens e vídeos do impeachment, agora com o recorte nas manifestações na cidade de São Paulo, para então procurar identificar os símbolos, os objetos, as cores e demais elementos que caracterizassem cada um dos lados do episódio, tentando verificar se era pos-


sível identificar um movimento a partir de um único elemento. Para auxiliar na identificação das partes do movimento, foram elaborados alguns exercícios gráficos. Para a análise desses elementos gráficos, dois autores foram fundamentais: Jacques Rancière e Ivana Bentes. Para Rancière é justamente no terreno estético que se trava hoje a discussão política. Já Ivana Bentes, através de ensaios sobre mídias insurgentes no Brasil nos últimos anos, discute o conceito de “mídia multidão”. Neste trabalho buscou-se analisar as estéticas resultantes desses embates políticos, sem exaltar ou desqualificar um produto por compartilhar ou não de sua posição política. Finalmente, no trabalho foi feita a opção por sintetizar e expandir essa discussão através de uma exposição dos resultados dos exercícios gráficos e uma instalação de vídeo, que colocam em cena a síntese desses eventos e abrem a discussão do tema ao público. Neste caderno apresenta-se um conjunto de pesquisas e experimentações do processo que envolveu a elaboração do trabalho. Ele reúne o esforço de compreender a relação

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entre estética e política, relata os exercícios gráficos que resultaram nas imagens finais, e esboça a elaboração do projeto expográfico.

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POLÍTICA COMO CAMPO DA ESTÉTICA

As manifestações de junho de 2013 e as do impeachment em 2015 e 2016 surpreenderam o país não apenas pela dimensão popular que atingiram, mas por terem alcançado singularidades no campo da atuação política. A inédita participação massiva de grupos de direita em manifestações de rua, a tomada das redes sociais como espaço de protesto, de reivindicação e debate e a insurgência de linguagens desses conflitos são as principais marcas e heranças desses episódios. As manifestações e protestos no Brasil que explodiram em pós-junho de 2013 são um acontecimento no sentido mais radical dessa palavra, expressam uma crise profunda que é quando não suportamos mais aquilo que suportávamos antes, enxergando então o que é intolerável num determinado contexto

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ou momento. Ao mesmo tempo, é a condição para emergir novas possibilidades de vida, de pensamento político, de formas de convivência. É uma redistribuição dos desejos. (BENTES, p.43)

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Ivana Bentes aponta os períodos de crise política e de representatividade, como favoráveis a demonstrações de descontentamento, assim como um convite a novas propostas de se posicionar politicamente. As novas mídias e meios de comunicação também desempenham papel essencial nesses momentos: No Brasil foram usadas as mais diferentes ferramentas e linguagens (imagens, vídeos, postagens, tweets, hashtags), para criar ondas de mobilização. O que é alterado é o próprio fluxo do tempo, que se torna intensivo, com uma renovada disposição de participação, uma epidemia colaborativa e uma experiência de pertencer a um tempo e espaço singulares. Essa intensidade da comoção e o enga-


jamento são construídos num complexo sistema de espelhamento e potencialização entre as redes e as ruas (BENTES, 2015, p. 50). O uso intensivo da mídia informal, produzida pelo “cidadão comum”, cria uma nova fórmula, uma nova linguagem, que dificilmente é vista nos meios de comunicação formais, representada pelas grandes emissoras de TV e jornais, reforçando a máxima de que “a mídia somos nós”, todos nós somos produtores de mídia. As experiências narradas por novos agentes são subjetivas, singulares e rapidamente compartilhadas e multiplicadas e excedem a oferta de conteúdo dos veículos de comunicação convencionais. A produção se afirma como o princípio de uma nova partilha do sensível, à medida que inaugura uma visibilidade ao mesmo tempo que fabrica objetos. As estéticas resultantes desse engajamento - cartazes, memes na internet, hashtags, vídeos e fotografias - evidenciam uma transversalidade e complementaridade de movimentos e discursos. Segundo Jacques Rancière, atos estéticos como con-

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figurações da experiência, ensejam novos modos do sentir e induzem novas formas da subjetividade política (2005, pg.11). A estética é uma forma de dar visibilidade ao pensamento, ela não reproduz o visível, mas torna visível. Para Rancière é justamente no terreno estético que se trava hoje a discussão política, a generalização do espetáculo e a multiplicação dos discursos. Portanto, estamos constantemente dando visibilidade às relações sociais, culturais e políticas e assim, produzindo no campo da estética manifestações discursivas (PRATA, 2016). Num momento em que as questões em torno da potência das imagens, como forma de conhecimento e pensamento, de comunicação e estranhamento do outro e de si mesmo, tornam-se decisivas para se pensar a sociedade contemporânea, as estéticas insurgentes ganham uma dimensão singular (BENTES, 2015). Como escreve Stela Politano: Ao invés de uma estetização da política, típica dos regimes totalitários, têm-se a politização da estética,


numa libertação para novas interpretações, usos e pensamentos (POLITANO, 2008, p.933) Logo, é nesse momento que ter a posse da câmera torna-se sinônimo de poder, pois dá voz a novos agentes de discurso, instituindo uma outra lógica visual e mental, ao desestabilizar o monopólio de informações. Os registros, sejam por fotos, vídeos ou impressos, são um instrumento de difusão, comparação, questionamentos e releituras, e sua reprodução e compartilhamento são fundamentais para a democratização do pensamento e funcionam como um aliado político.

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A partilha dos espaços

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Sem dúvidas as manifestações de rua foram o primeiro espaço de fomento de estéticas e funcionaram como catalizadores para as demais formas de protesto que surgiram posteriormente. As diversas vezes que os espaços públicos foram ocupados por manifestantes nos anos de 2015 e 2016 já é um dado que impressiona - estima-se que só na capital paulista ocorreram vinte e seis manifestações que se relacionavam com o impeachent nesse período: dezesseis se enquadram como “Pró-Dilma” ou “Contra Temer”, enquanto dez como “Contra Dilma”, “Pró-Temer” ou “Pró-Lava-Jato”. Dentre elas, o ato que se passou no dia 13 de março de 2016, na Avenida Paulista, conquistou o título de maior manifestação política de rua já registrada na cidade, com a presença de 1,4 milhões de pessoas segundo a polícia - ou 2,5 milhões segundo os organizadores¹ -, superando em números as concentrações do movimento Diretas Já, ocorrida em 1984. Os locais onde ocorrem as manifestações são de funda-

[1] Dados disponíveis em: http://especiais.g1.globo.com/politica/mapa-manifestacoes-no-brasil/17-04-2016/contra


mental importância para cada movimento. A escolha é criteriosa e essencial para a construção da identidade ideológica, pois tais qualidades de espaço-tempo são responsáveis por produzirem “bioestéticas”, que são as maneiras de protestar extraídas das relações entre vida-trabalho e arranjo-disposição do espaço social, que vão além dos temas de reivindicação. Pode-se dizer que as manifestações são a transformação do pensamento em experiência sensível da sociedade (RANCIÈRE, 2005). A experiência descrita por Rancière é de um sensorium espaço-temporal “que determina maneiras do estar junto ou separado, fora ou dentro, face a ou no meio de”, faz emergir um “comum”, uma experiência poderosa de organização do tempo, das relações sociais e da vida, que são propriamente políticas, como insiste o autor. Essas experiências, descreve Rancière, traçam mapas do visível, trajetórias entre o visível e o dizível, relações entre modos do ser, modos do fazer e modos do dizer (RANCIÈRE, 2005, p. 59). Certas esferas de concentração se justificam por esse princípio. As manifestações pró-impeachment se organizaram

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aos domingos, “dia de folga” da semana, em uma via ocasionalmente de uso exclusivo para pedestres, sem interferir no direito de ir de vir do cidadão. Por outro lado, o outro núcleo se espalhou em focos diferentes de manifestação, normalmente ocupando vias importantes em horários estratégicos, escolha proposital para desestabilizar o status quo. Muitos dos percursos foram simbólicos - caso do roteiro do largo da Batata até a casa de Michel Temer, no bairro de Pinheiros, e alguns eventos aconteceram em datas específicas, como o aglomerado de pessoas em frente ao apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo, ao mesmo tempo que a avenida Paulista era ocupada pelos manifestantes pró-impeachment. Também vale a pena ressaltar que o centro de São Paulo foi uma região importante para as manifestações de apoio ao governo de Dilma Rousseff, pois estavam associados a outras lutas sociais que tradicionalmente se concentram nessa região, próxima a vários órgãos públicos e sedes de centrais sindicais. Essa distribuição espacial foi fundamental para a visibilidade da manifestação de ambos os grupos. A concentração em espaços lineares (comprimento maior que largura) resulta

esquerda: concentração linear na avenida paulista direita: concentração radial no largo da batata


em uma concentração maior, parecendo estar mais lotada, como na avenida Paulista onde os grandes edifícios em ambos os lados da via limitam os manifestantes. Isso faz parecer que a manifestação tem mais adesão e é mais forte. Em contraposição, a concentração radial do largo da Batata (comprimento e largura aproximados) faz com que a aglomeração fique mais dispersa, fazendo o protesto parecer mais vazia, pois carecem dos mesmos limitantes espaciais da 25


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avenida Paulista, favorecendo a dispersão dos manifestantes pelas ruas adjacentes. Esse tipo de concentração diminui a densidade da manifestação, fazendo-a parecer mais dispersa e menos organizada. Como mencionado anteriormente, foi na ambiência compartilhada nos protestos que germinou grande parte das “bioestéticas”. Mas a partilha completa exige a posse das linguagens. No contexto das redes e culturas urbanas, podemos destacar a diversidade das linguagens e sua incorporação como elemento determinante das novas formas de ação e de política. Tanto a posse como a desconstrução das linguagens de poder foram determinantes na construção de uma inclusão subjetiva.


Instrumentos de protesto

Nas ruas, as manifestações do impeachment pareciam uma espécie de carnaval político: valia-se de todo e qualquer aparato para demonstrar seu descontentamento, sem contar que a própria disposição das massas se relacionava como alas agrupadas entorno de um organizador ou de uma sub-reivindicação em comum. O conjunto da manifestação representava uma síntese, pois era composto pela junção e choque de elementos heterogêneos que compunham uma aparente homogeneidade. As peças desse quebra-cabeça ilustram algumas das estéticas que surgiram desse embate político e se valem de inúmeras técnicas e materialidades para conseguir transmitir uma mensagem. Elas variam de escala, e seu tamanho, quantidade e conteúdo influenciam em seu alcance tanto durante a manifestação quanto posteriormente nas mídias. Se por um lado os bandeirões, bonecões infláveis e balões impactavam pela sua grandeza, outros como as camisetas,

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as pinturas corporais, os pixulecos, os cartazes geravam um volume visual quando multiplicados. O Divisor2de Lygia Pape, de certa forma, se assemelha aos bandeirões das manifestações, pois une os participantes, formando um único corpo que precisa entrar em sincronia para se deslocar, materializando assim uma experiência viva de alteridade. A própria artista classificou a obra como “escultura social”, na qual as pessoas podiam vivenciar uma experiência coletiva e manifestações performáticas, de partilha de movimentos e sensações. Algumas outras performances coletivas utilizaram objetos do cotidiano para a criação de um ato estético, como o panelaço que foi repetido dentro e fora das ruas pelos grupos que apoiavam o impeachment. Como afirma Joana Mussi, em seu livro O espaço como obra, a repetição desses símbolos cria um repertório imagético associado a cada um dos grupos de protesto, contribuindo para a formação de um imaginário que é facilmente assimilado em outras situações, extrapolando a escala local. Situações dinâmicas como as manifestações exigem uma “economia de crítica”, ou seja, o conteúdo deve ser trans-

[2] O Divisor de Lygia Pape, 1968, era uma grande peça de pano de aproximadamente 30m x 30m, com fendas para o público colocar as cabeças.

esquerda: bandeirão em manifestação de apoio ao governo de Dilma Rousseff no largo da batata centro: divisor, Lygia Pape, 1968 direita: faixa em manifestação à favor do impeachment na avenida paulista


mitido da maneira mais rápida e direta. Por isso, os objetos são fundamentais, pois representam uma síntese, tornam visível o invisível e o ruído em dizível, por meio de uma transmissão quase instantânea, um “insight”. Para Rancière, dar visibilidade é uma operação política, logo, utilizar-se de cartazes, bandeiras e outros objetos para decodificar posicionamentos e demandas configura uma ação estético-política. Pode-se dizer então que a potência de um ato pode ser medida pela sua visibilidade. 29


Audiovisual

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Os cartazes, memes, posts, músicas, fotografias e vídeos produzidos pelos próprios manifestantes geram uma mídia-multidão, funcionando como instrumentos de disputa narrativa, em um processo de subjetivação. Os vídeos e imagens se tornaram um dos dispositivos mais influentes de partilha do comum, pois são mecanismos que possibilitam o compartilhamento simultâneo do ato por manifestantes das ruas com manifestantes das redes. Os registros são feitos em regime de urgência e precariedade, no qual o próprio tempo real ganha a qualidade estética de resistência. Não é por coincidência que essas câmeras são um dos primeiros alvos de ataques. Esse cinema insurgente, que emerge dentre revoltas, revoluções, embates, surge fora de lugar, como uma experiência de cinema/audiovisual no limite quando pensamos numa intencionalidade estética

frames extraídos de vídeos na internet em diferentes manifestações


ou no próprio circuito em que essas imagens se inserem (BENTES, 2015, pg 27). São imagens fluidas, sem cortes, roteiro ou edição, que carregam a marca do movimento de quem porta a câmera. A imagem é ofegante, cega, sofre, são imagens-corpos, vidas-linguagens. A associação político-afetiva presente nos vídeos dissolve os territórios das ruas e das redes através de uma dramaturgia singular que produz uma relação outra entre o presente e o espectador, interferindo sua maneira de recepção e percepção. O gesto político se confunde com esse deixar-se, aberto aos acontecimentos e a uma construção partilhada do olhar. As dimensões éticas, políticas e estéticas se tornam indissociáveis nesse tipo de imagem (BENTES, 2015, pg 23). Essa maneira de tornar visível transforma a relação entre

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o fazer e o ver. Os celulares, redes sociais e demais tecnologias de comunicação se tornam a própria forma de mobilização e comoção, e não apenas ferramentas. Esse fenômeno consegue ressignificar os fatos diante da mídia corporativa que cobre os mesmos acontecimentos não do ponto de vista integrado e imerso, mas afastado. São recursos que quebraram o monopólio político-ideológico dos meios midiáticos, e trasnformam em voz o que antes era ruído. 32

Essas tecnologias de comunicação não são apenas ferramentas de descrição, mas sim de construção e reconstrução da realidade. Quando alguém atua através de uma dessas redes, não está simplesmente reportando, mas também inventando, articulando, mudando. Isto, aos poucos, altera também a maneira de se fazer política e as formas de participação social, (SAKAMOTO, 2013, p. 95).


Linguagem da violência

As primeiras manifestações de 2013 foram marcadas pelo combate entre manifestantes e policiais. A forte repressão aos protestos, herança do modelo e mentalidade da ditadura militar, parecia ser a imagem mais relevante a ser divulgada, enquanto as verdadeiras reivindicações eram dissolvidas por trás da polarização que se formava. Ironicamente, o abuso desse poder foi crucial para uma comoção nacional. A população se viu indignada com a divulgação das imagens e vídeos dos ataques feitos a manifestantes e jornalistas, sem nenhuma interlocução. A violência desses atos revisitou o passado oprimido do período militar para ocupar o imaginário da população. Em represália à truculência policial emergiu uma outra linguagem da violência, politizada, a contra-ação dos Black Blocs, grupo que atua atacando os símbolos de corporações, governos e Estados. A tática foi incorporada por vários outros movimentos mundo a fora, como em Seattle, nos Estado Unidos

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em 1999, Egito e Turquia, em 2012, e finalmente ganhando força no Brasil em 2013. É importante ressaltar que utilizam a violência e o ataque a símbolos do capitalismo e destroem e depredam signos e coisas (fachadas de agências bancárias, vitrines de lojas, caixas de banco, anúncios e placas publicitarias, outdoors, etc), sem o objetivo de ferir pessoas (BENTES, 2015, p. 53). 34

Portanto, a ação dos Black Blocs visa atacar os signos e não a agredir outras pessoas ou depredar o patrimônio, como são normalmente retratados pelas mídias corporativas. Seus membros são identificados por uma estética e linguagem em comum: vestem roupas pretas e usam máscaras cobrindo o rosto, formando um bloco negro, assemelhando-se simbolicamente aos policiais. Além disso, exercem uma função de proteção, se colocando entre a massa de manifestantes e a de policiais como um escudo, postura que esteve presente desde sua origem na Alemanha. As ações de ataque e depre-

frames de vídeos da internet relatando a ação dos block blocs


dação foram incorporadas após o protesto de Seattle, em 1999. A ação política violenta dos Black Blocs foi amplamente divulgada nos meios de comunicação alternativos e independentes, representados como uma violência de resistência. De certa forma, esta estética dialoga com a dos vídeos produzidos em estado de urgência, pois ambos são vidas-linguagens. Por outro lado, os meios de comunicação tradicionais utilizaram as imagens de violência dos Black Blocs, com outro sentido: As imagens da cobertura de conflitos e embates entre manifestantes e policiais na mídia tradicional e a produção dessas imagens por novos sujeitos do discurso apontam para uma relação possível entre o estado de exceção e as imagens de “exceção” e para novas formas de controle produzidas pela experiência audiovisual e sensorial, acarretando estados globais de insegurança (BENTES, 2015, p. 125).

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Ivana Bentes ainda ressalta que os Black Blocs fizeram emergir uma estética e pedagogia da violência. Se de um lado ela era utilizada como meio de reivindicação, posicionamento e proteção, do outro, contraditoriamente, abusavam da violência para contê-la. Em 2016, os grupos contra o impeachment tinham associado à polícia a imagem de violência e repressão, enquanto os manifestantes pró, viam nos policiais um símbolo de proteção e heroísmo. Se de um lado os policiais eram hostilizados e atacados pelos Black Blocs, do outro eram ovacionados pela população que utilizava as vestes do exército, pedindo a intervenção militar, tirando fotos e selfies ao lado da cavalaria. São contrapontos como esses que evidenciam a subjetivação na partilha do comum.


Memes

Os memes de internet como conhecemos hoje, são conteúdos visuais compostos por uma imagem, geralmente legendada, de teor irônico, cômico ou crítico. Eles são disseminados nas redes sociais - facebook, instagram, twitter - e canais de comunicação como o whatsapp, através de compartilhamentos sucessivos pelos próprios usuários, que se tornam coautores ao dar um novo contexto as imagens. Porém, o termo meme existe desde 1976, proposto pelo etólogo Richard Dawkins ao sugerir que, assim como na biologia, os genes são responsáveis por transmitir e replicar um conteúdo, haveria um componente que exerceria o mesmo papel no desenvolvimento da cultura, advogando pela tese de um evolucionismo cultural. O termo foi apropriado posteriormente com o avanço dos estudos sobre a mimética, encontrando na definição de Dawkins a caracterização dessa nova dinâmica cultural moderna. Sem exigir muitos recursos, os memes oferecem uma

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plataforma de produção acessível e interativa, pois programas de computador, aplicativos de celular ou outras ferramentas, são o suficiente para construir a micronarrativa. A nova dinâmica do fazer e do circular de informações que os memes propiciam atribui a eles mais do que um caráter puramente visual, mas performático. O que vemos por fim é decorrência da união de diferentes técnicas do fazer com organizações sociais, que resultam em mímeses do nosso presente volátil. A estética dos memes obteve tamanha aceitação popular, que foi fortemente incorporada para tratar dos mais variados temas. Hoje, ela serve como contraproposta à normatização com que são tratados os acontecimentos. É uma forma de resistência crítica nas redes: incita, inspira e problematiza dando voz a novos agentes. Novamente, a questão deixa de ser apenas visual para ser também sobre o potencial de influência cultural e político. Com a crescente crise política no país, o debate fortemente polarizado se intensificou. Discursos rasos e cada vez mais extremistas se apoiaram na construção estética de

exemplos variados de memes na internet


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argumentações mais visuais e de cunho jocoso, resultando em uma abundância imensurável de memes e gifs políticos. Viktor Chagas, professor da Universidade Federal Fluminense e coordenador do grupo de pesquisa sobre memes, explica o potencial político dos memes:

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Os memes possibilitam que as pessoas participem de ações públicas e coletivas mantendo seu senso de individualidade. Os memes políticos ampliam o leque de opções na participação democrática. As pessoas conseguem se expressar de maneira acessível, participam de debates e apreciam o processo (CHAGAS, 2015). O cenário atual cada vez mais propício à cultura cibernética também contribuiu para que os memes alcançassem o mundo da política e assim atraíssem para a discussão aqueles que antes não eram sensibilizados pelos meios tradicionais de comunicação. Finalmente, o meme assume parte de uma nova identi-


dade nacional, não mais submissa a uma única indústria cultural, que, por sua vez, perde sua hegemonia unilateral com a disseminação das redes sociais, plataformas e dispositivos alternativos de publicação e difusão de conteúdo. Essa produção instantânea realizada por uma multidão heterogênea desloca os intermediários clássicos: a corporação jornalística, o jornalista profissional, as agências de notícias, põem em xeque a ‘reserva de mercado’ que existia para os formadores de opinião corporativos e apontam para outros modelos e campos expandidos, em que não se pode pensar o ‘homem’ desconectado de suas próteses e dispositivos. (BENTES, 2015, p. 11)

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REFERÊNCIAS

Além da leitura bibliográfica, fundamental para o desenvolvimento deste trabalho, algumas referências se sobressaltaram às demais e foram essenciais para a construção de um repertório específico. A aproximação desses cinco trabalhos aqui selecionados, somada às teorias estudas, contribuem para a construção de um olhar próprio sobre o tema e orientam os próximos passos desse estudo.

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Bernd e Hilla Becher: tipologias

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Bernd e Hilla Becher foram um casal de fotógrafos que desde os anos 1950 registraram edifícios industriais, poços de mineração, caixas d’água, usinas e silos de grão. Sua particularidade era de sempre os fotografar com a mesma luz, enquadramento e técnica de modo a criar tipologias das construções que evidenciavam suas semelhanças e diferenças. Posteriormente, o casal apresentou as fotografias em um novo formato de painel com nove ou mais imagens em pequeno formato que reforçavam o aspecto de catálogo cientifico de seu trabalho. Sem seus registros as paisagens industriais abandonadas teriam permanecido anônimas. Eles influenciaram a arte contemporânea porque usavam a fotografia como um meio de investigação, considerando-a ao mesmo tempo um documento e uma obra arte. Com suas fotografias, os alemães extraiam as grandes estruturas de seus contextos iniciais, transformando cada frame em um novo objeto. Assim, parece ser justamente a neutralidade do olhar que confere às imagens sentimento.

Tanques de armazenamento de gás, 1983 - 92, Bernd and Hilla Becher


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Michael Wesely: fotografias de longa exposição

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O fotógrafo alemão Michael Wesely é conhecido por realizar experimentações com superexposição de filmes em processos fotográficos analógicos de longa duração. Ele já criou fotografias que levaram cerca de 40 anos para se concretizar, um tempo inimaginável para as imagens instantâneas dos dias de hoje. Seu trabalho busca tornar o próprio ato de fotografar numa ação não tão instantânea quanto o momento que se deseja capturar, ao passo que nem mais o instante capturado já é tão efêmero, pois a imagem possui um rastro de tempo, de vida, de ação. Ela não é mais instante, ela é movimento. Familiarizado com a realidade política brasileira, Wesely aproveitou sua passagem em São Paulo para sair a campo no dia 17 de abril de 2016 e fotografar a votação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Nesta série, o alemão utilizou exposições que variaram de sete minutos a duas horas para registrar

esquerda: vale do anhangabaú, Michael Wesely, 2016 direita: avenida paulista, Michael Wesely, 2016


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as manifestações do impeachment em diferentes pontos da avenida Paulista, onde estava o grupo a favor da condenação e do vale do Anhangabaú, onde estavam reunidos os que eram contra o afastamento. Nas próprias palavras, o fotógrafo alega:

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Uso esses longos tempos de exposição para contar uma história, retratar o fluxo da vida. Esse aspecto da fotografia me interessa muito mais do que um momento decisivo qualquer. É uma mudança de percepção. Essas imagens revelam mais questões antropológicas do que qualquer outra coisa, mostram camadas do tempo.3 As fotografias remetem à cisão democrática e à crise política vivenciadas no país. O que se torna móvel nas suas imagens são os elementos vivos, enquanto a paisagem permanece estática, os corpos contam uma história através do rastro que deixam na fotografia, configurando o registro raro de um momento histórico.

[3] OLIVA, Daigo. Câmera lenta de fotógrafo alemão capta manifestações em SP. Folha de São Paulo, Agosto de 2017.


Sobre Homens e Ratos

Sobre homens e ratos dá o nome da exposição coletiva realizada esse ano em São Paulo, com curadoria de Renato De Cara. A mostra reúne vinte trabalhos de quatorze artistas com diferentes linguagens, como pinturas, gravuras, fotografias, vídeos, objetos e performances, que foram criados a partir da indignação vigente frente aos acontecimentos da hora. Os trabalhos foram selecionados de maneira a promover a reflexão sobre os problemas políticos e sociais que o país enfrenta. A necessidade de dar voz ao atual cenário de crise do Brasil acontece em virtude da situação de imprevisibilidade constante. Dentre os diversos trabalhos, a série de Biba Rigo, que dá nome a exposição, consiste em pinturas feitas sobre capas de folhas de jornal de políticos retratados como animais. Nelson Brissac e Giselle Beiguelman trabalharam sobre os vídeos da delação premiada, editando um conjunto de trechos

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que revela, a partir da postura de descaso e indiferença dos investigados, o desprezo por considerações éticas e sociais das delações. Pio Figueiroa também trabalha sobre o mesmo material. Ele produz retratos dos personagens da Operação Lava Jato sobrepondo vinte e quatro frames retirados dos vídeos da delação. De acordo com o artista, os depoimentos são usados como espetáculo de mídia, assim como o vazamento de informações, parecendo que a estética já determina a acusação. 52

esquerda a cima: lição de anatomia Biba Rigo, 2016 esquerda abaixo: costas quentes, peitos frios Biba Rigo, 2016 direita a cima e abaixo: o pior é infinito #1 Pio Figueiroa, 2017


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Mira Schendel: monotipias

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Myrrha Dagmar Dub foi uma multi-artista suíça, estabelecida no Brasil. Mira Schendel, como adaptou seu nome depois de ter se mudado para São Paulo, trabalhou como desenhista, pintora, escultora, poeta e restauradora. Nos anos 1960, Mira se dedicou a produzir uma série de dois mil desenhos diferentes em monotipia, técnica que se difere de outras gravuras por gerar um único exemplar. Para esse trabalho, a artista criou uma metodologia singular, na qual entintou uma lâmina de vidro e sobre ela colocou o papel para, então, desenhar sobre ele linhas, pelo avesso, usando a própria unha ou algum instrumento pontiagudo. A opção em desenhar pelo verso teve uma importância conceitual para a artista, que pesquisou assiduamente um meio de chegar mais próximo da transparência. O esforço resultou no conjunto que recebeu o nome da própria técnica. Monotipia é uma tentativa de ordenação de uma realidade caótica, apelando para o intelecto, mas com

Monotipias, Mira Schendel, 1964 e1966


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atuação no terreno dos sentidos. O todo forma um mosaico onde cada imagem tem a sua singularidade, o que permite inúmeras relações e interpretações. São os fragmentos do pensamento, resquícios inconscientes que afloram e se materializam em palavras, traços e formas que são também linguagem.4

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[4] LAGOA, Beatriz Rocha. “Um ensaio sobre as monotipias”, Sem data.


Graziela Kunsch: ônibus tarifa zero

Para a 31ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo, a Graziela Kunsch propôs à Prefeitura de São Paulo a implantação de um ônibus gratuito, com letreiro “tarifa zero”, que circulasse sem um percurso informado, durante os três meses da mostra. Ele pegaria passageiros em pontos de ônibus existentes, mas não os levaria ao prédio da Bienal, pois a proposta não era de criar um meio de facilitar o acesso a exposição, mas sim de sugerir às pessoas que o próprio deslocamento também é um lugar, e assim incentivar outras formas de se locomover dentro das cidades. Porém, sem a adesão da prefeitura ao projeto, Graziela convidou representantes de diversos movimentos sociais por acesso ao transporte público gratuito para um workshop na última semana da Bienal. Estiveram presentes o Movimento Passe Livre de São Paulo e de Ribeirão Preto, a Rede de Luta do Transporte no Extremo Sul, e moradores da região de Parelheiros, o Movimento Tarifa Zero BH, e o editor do portal

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TarifaZero.org. Todos os participantes concordaram em doar seus cachês para futuros ensaios de linhas experimentais de Tarifa Zero. A ideia do ônibus sem tarifa e sem destino cria um diálogo direto com os protestos contra o aumento da tarifa que ganharam maior destaque a partir de 2013. A tarifa-zero reivindicada pelos manifestantes propõe que o mover-se pela cidade seja liberto de qualquer amarra econômica, possibilitando acesso democrático à cidade. Graziela vai além da gratuidade da tarifa e propõe uma nova forma de funcionamento, pois se os passageiros não sabem qual o trajeto a seguir, a viagem em si torna-se o fim e não o meio, o que quebra a simbologia do transporte casa-trabalho-casa, e cria um estranhamento sobre uma lógica tão comum e tão enraizada na vida das pessoas. Este esforço de propor novas alternativas incita a imaginação coletiva e aponta para outros horizontes de possibilidades.




ENTREVISTAS

Dentre os muitos profissionais e projetos analisados, tanto nacionais quanto internacionais, dois são reportados na sequência através de entrevistas. A entrevista foi proposta como forma de se aproximar do processo de trabalho e pesquisa de cada grupo, a fim de contribuir para a reflexões sobre esta pesquisa. Estes trabalhos se destacam pela correlação direta com o tema dessa pesquisa, servindo de referências atuais para a construção da narrativa dos processos políticos no país. A princípio a entrevista não havia sido pensada para ser transcrita como parte do relatório de pesquisa, por isso não foi utilizado um gravador. Os trechos aqui reproduzidos são resultantes de anotações pessoais, portanto, não são transcrições exatas das falas. Após redigida, a entrevista foi reenviada para os colaboradores para aprovação na liberdade tomada para

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formalizar suas respostas. Portanto, cabe aqui uma breve explicação sobre quem são esses agentes, quais são suas formas de trabalho e como elas tratam desses embates. Apesar de suas atuações serem diferentes, é perceptível que, de certa forma, ambos contribuem na releitura do processo do impeachment.

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Núcleo de Pesquisa em Participação, Movimentos Sociais e Ação Coletiva (NEPAC) O NEPAC é um laboratório de pesquisa do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). No final de 2016 o núcleo publicou alguns relatórios da pesquisa Montagem de banco de dados e análise sobre protestos mobilizados pelas organizações alinhadas à esquerda e à direita no Brasil (2011-2015), desenvolvida entre julho de 2015 e julho de 2016. A pesquisa não visava focar em uma região ou movimento específicos, mas sim observar o comportamento da sociedade brasileira como um todo em relação a esse tipo de conduta, mapeando suas origens, reivindicações e organizadores. A pesquisa foi encabeçada pela Professora Doutora do curso de Ciências Sociais Luciana Ferreira Tatagiba, porém, a entrevista foi feita com o aluno de graduação do curso, Lucas Antonio dos Anjos Nascimento, que participou da pesquisa.

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Dia 16 de agosto de 2017 às 19h Largo da Batata - Lanchonete da região Presente: Lucas Antonio dos Anjos Nascimento. 1. Como vocês organizaram a montagem do banco de dados? Por que fizeram esse recorte temporal e quais foram as fontes de consulta para sua montagem? 64

Lucas Nascimeto: A equipe dessa pesquisa era razoavelmente grande. Contávamos com a Luciana e mais duas professoras que também auxiliaram e mais outras duas estudantes do curso de graduação. Por uma questão de recursos financeiros, tivemos que nos limitar a uma única fonte de reportagens, o jornal Folha de São Paulo, pois este possui um acervo digital acessível ao IFCH, o que permitiu coletar dados das matérias veiculadas no período estudado. Vale salientar que por tratar-se apenas de uma única fonte para a coleta de dados, nem todos os protestos realizados no Brasil foram noticiados pelo jornal, pois este é


um veículo que circula na metrópole de São Paulo e o seu foco jornalístico cai sobre a cidade e região. Já o recorte temporal foi proposto desde o início pela Luciana, pois ela vinha observando que no ano de 2011, início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, era de se notar uma perturbação no cenário de manifestações no Brasil. A princípio o recorte tinha sido imaginado para estender-se desde o primeiro mandato de Lula, a fim de estudar a relação dos protestos e o governo dos partidos mais de esquerda. Mas percebemos que fazendo um recorte menor e mais recente, chegaríamos em resultados mais significativos. Os protestos de rua são historicamente um meio de reivindicação da sociedade quando estão insatisfeitas com a política do país. As demandas variam de acordo com o contexto e também de acordo com as classes e bases sociais mobilizadas. Utilizamos o software Microsoft Access para montagem e estruturação do banco. Pensamos em categorias e formas de estrutura para o Banco que permitissem não só a coleta, e posteriormente a consulta de dados do período da pesquisa, mas sim que sua formatação servisse de base para outras pesquisas.

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Para que o preenchimento do banco pudesse ser feito em grupo e para que os dados coletados sobre o período fossem preenchidos de forma padrão, criamos um Livro de Códigos com uma série de instruções para seu preenchimento. O Livro de Códigos enquadra-se também como resultado final da pesquisa. A estrutura do Banco de Dados consiste em duas tabelas principais: Tabela Geral (Anexo 1) e Tabela Específica (Anexo 2), onde são preenchidos os dados coletados a partir das notícias do jornal. A Tabela Geral é preenchida com a identificação da notícia, identificação do evento, data de início do evento, as bases sociais mobilizadas, o tipo de ocupação (caso a base social mobilizada seja de trabalhadores), o alvo do protesto, os objetivos do protesto, o âmbito do protesto, sua capilaridade, número de participantes e a data de término. Na Tabela Específica constam as seguintes variáveis: a cidade onde ocorreu o protesto, o local, as organizações que convocaram o protesto, o tipo de protesto, número de participantes e se houve ou não houve depredação, presença da polícia, detidos, feridos e mortos. A maneira como deveriam ser preenchidas as


tabelas, também é resultado de um livreto de padronizações desenvolvido junto com a pesquisa. Essa série de instruções de preenchimento se deu em virtude das falhas da nossa fonte de pesquisa. A forma de notificar cada manifestação não era semelhante e, as vezes, era publicada mais de uma vez a mesma manifestação. A forma final do banco ficou bem satisfatória para o grupo, causando pouquíssimos problemas ao longo da pesquisa. A montagem do Banco de Dados permitiu um conhecimento quantitativo e qualitativo sobre os eventos de protestos no Brasil, no período de 2011 a 2015. O objetivo era analisar as características dos eventos. Através dele notamos que o ano de 2013 foi marcante devido as mobilizações massivas em todo o país. Neste cenário, surgem novos atores políticos, novos métodos de atuação e novas pautas, assim como a disputa das ruas entre mobilizações. 2. Por que vocês não disponibilizaram para acesso o Banco de Dados?

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LN: O banco na verdade ainda está em construção, porque além do recorte temporal ampliado, o grupo também está desenvolvendo outras análises a partir dos dados que foram e estão sendo coletados. Daí que ele não está disponível por enquanto. 3. O que vocês já puderam concluir?

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LN: Cada um dos bolsistas acabou se aprofundando mais em um tipo de análise. Em uma pesquisa como essa é possível se encaminhar para diversos ramos. No meu caso acabei seguindo na relação das classes sociais participantes de cada movimento. Primeiramente, pudemos notar que houve um salto no número de protestos a partir do pico em 2013 quando comparados os anos posteriores em relação aos anteriores. Outro fato interessante que se observa, a partir desse dado, é a disputa social inédita no país. A participação de setores de direita, que tradicionalmente não ocupam os espaços das ruas, explode. Em 2014, esse número aumenta para 2 e em 2015 para 19, na


medida que nos anos de 2011, 2012 e 2013 foi zero. A planilha demonstra que estas ferramentas de reivindicação eram tradicionalmente utilizadas por organizações de esquerda e que, após 2013, como tem sido utilizada por organizações de direita, aponta um enfrentamento político entre essas esferas não apenas no campo institucional, como também fora dele. E esse é um fato inédito no caso brasileiro, pelo menos desde as manifestações que antecederam o regime militar. Outro ponto relevante é a forte participação do MBL (Movimento Brasil Livre) e do Movimento Vem Pra Rua. Duas organizações alinhadas à direita que convocaram os principais protestos pelo impeachment e estão entre as dez organizações mais noticiadas que convocaram protestos nos anos do período estudado, sendo ultrapassados apenas por movimentos tradicionais alinhados à esquerda, como a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra). O fato dessas duas organizações estarem entre as principais notificadas revela que não só há uma participação mais ativa da direita no âmbito político não institucional, mas também evidencia que há uma disputa por este espaço

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político tradicionalmente ocupado por organizações e pautas alinhadas à esquerda, o que demonstra que os novos agentes acreditam que a as ruas são este lugar de reivindicação. Um aumento de 950% entre os anos de 2014 e 2015. Entretanto não há como concluir que as mobilizações do ano de 2013 foram responsáveis pelo aumento de protestos ou pela presença de movimentos alinhados à direita nas ruas. Os motivos que levaram a este cenário devem ser analisados comparando grandes períodos, em um trabalho de análise constante do comportamento dos movimentos e organizações de direita. Talvez esse tenha sido um dos motivos que o acesso ao banco foi suspenso. 4. Você consultou alguma referência para este trabalho? LN: Nós tivemos mais bases bibliográficas para as análises dos dados do que referências de metodologias de cadastramento e, mesmo assim, as consultas bibliográficas foram diferentes para cada bolsista, de acordo com o aprofundamento que foi dado.


Como a nossa pesquisa era muito específica, desenvolvemos um método próprio, que atenderia aos nossos objetivos. Durante o ano da pesquisa eu assisti muitos documentários e li uma série de livros que tratavam sobre o assunto. Os que mais me marcaram foram: A Revolução não será televisionada, documentário que pode ser encontrado no youtube sobre as perturbações políticas na Venezuela em 2002, que depuseram o presidente Hugo Chávez, o qual mais tarde voltaria ao poder por demanda popular; o livro Cidades Rebeldes - Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil, coletânea de textos que refletem sobre essa fase no país; olhei muito para o Occupy Wall Street, um movimento que, assim como as Manifestações de Junho no final de seu período, não possuíam um líder definido e as pautas estavam amplas demais.

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Coletivo Oitentaedois

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Grupo multidisciplinar formado por sete profisionais atuantes nas áreas de arquitetura, urbanismo, artes gráficas, design e audiovisual. Instalados na capital paulista, já estiveram envolvidos em diversos trabalhos significativos, como participação da nova Lei de Zoneamento de São Paulo, foram vencedores do edital da Cidade Gráfica, promovido pelo Itaú Cultural e produziram material audiovisual para a Cosac Naify. A publicação Impeachment - Câmara dos Deputados, projeto independente do coletivo, reúne a transcrição dos discurso de todos os congressistas presentes na sessão do dia 17 de abril de 2016, que aprovou a continuidade do processo de impedimento da então presidenta Dilma Rousseff. Este registro é uma oportunidade de reinterpretar os discursos à medida que são expostos cruamente, descontextualizados, contribuindo para a releitura deste episódio. impeachment - câmara dos deputados, coletivo oitentaedois, 2016


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Dia 28 de agosto de 2017 às 18:30h Rua Bela Cintra, 419 - sede do escritório Presentes: Alexandre Sato, Bruno Kim e Otavio Nagano. 1. Gostaria de começar fazendo uma pergunta geral sobre o coletivo: Quais são suas motivações, objetivos, público alvo, metodologia. 74

Coletivo: Nós trabalhamos com duas frentes principais de trabalho: autorais e “para clientes”, comerciais, podemos chamar. Grande parte dessas primeiras produções são feitas, ou acabam sendo levadas, para as feiras gráficas, como a Plana, a Tijuana, o que acaba de certa forma direcionando nossa linguagem gráfica. Mas foi em 2014, com o edital do Cidade Gráfica, do Itaú Cultural, que ganhamos maior destaque. Tivemos dois trabalhos selecionados, dentre eles o Junho Manifesto, um fanzine com diversas imagens coletadas da internet sobre as manifestações de junho de 2013. Mesclamos à estas imagens, flashs dos vídeos que produzimos sobre as mesmas


manifestações, mas este foi um contexto diferente. Antes de mudarmos a sede para a Bela Cintra, o escritório ficava na esquina da Avenida Paulista com a Consolação. Por coincidência, essa esquina acabou sendo o palco da maioria desses protestos e dos mais reprimidos deles. Fizemos os primeiros vídeos despretensiosamente da janela do escritório, mas logo muitos de nós acabaram se envolvendo diretamente com os atos, então o ponto de vista da câmera desce para o nível da rua, do manifestante, do agente, do nosso próprio. Publicamos todos esses vídeos no nosso canal no youtube, e a repercussão foi maior do que podíamos imaginar. Além das milhares visualizações e compartilhamentos nas redes sociais, nossos vídeos foram publicados em mídias de maior porte, como a UOL e a BBC, me lembro até de um ativista turco ter entrado em contato com a gente por causa de um trabalho que estava relacionando a primavera árabe e a onda de protestos no Brasil. Fizemos o último vídeo na ocasião da manifestação do dia 20 de junho de 2013, convocada em reação a redução da tarifa. Mesclamos imagens dos sete atos realizados até então com áudios recolhidos neste último. Fizemos essa mistura por

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que o que mais interessou não foi o que foi visto, mas o que foi ouvido. Na verdade, o que vimos naquele dia foi bem decepcionante: era como se não fosse mais o mesmo o cenário, o movimento claramente havia se perdido, tanto nos gritos muito abrangentes, as vezes divergentes, tanto na postura e na imagem, também conflitantes. Não era uma heterogeneidade no bom sentido da palavra, mas como se fosse um prenúncio de que de dali pra frente os atos seriam outros. 76

2. Sobre o Junho Manifesto, foi um problema para vocês fazer essa publicação com imagens que não eram suas? Onde foram buscar essas imagens? CO: Na verdade não foi um problema, talvez por que nunca nos pusemos essa questão de não estarmos produzindo com conteúdo próprio. Aliás, uma parte das imagens foi retirada dos nossos vídeos, mas é tudo. De resto, fizemos um compilado de imagens que tiveram grande repercussão nas mídias, desde fotos e vídeos amadores de manifestantes, registrados por celular, até alguns episódios marcantes, como o discurso


do Arnaldo Jabor, o tiro de borracha na repórter da Folha da São Paulo, as mini enquetes no programa do Datena e o anúncio da redução da tarifa pelo Haddad e Alckmin. Escolhemos imagens que ilustrassem essas manifestações e que as identificassem facilmente. O mapa no final e a nota foram acrescentados como outra forma de contextualização do evento, de quem era seu principal agente organizador e a crescente na qual os atos embarcaram. Essas imagens carregam uma potência, no sentido em que contam este episódio a partir de diferentes narrativas: o vídeo-amador, o telejornal, o apresentador bonachão, os cartazes de rua, e tantas outras imagens que não representamos nessa publicação, mas que apesar de tratarem da mesma história, cada um tem uma linguagem específica, o que certamente influencia na nossa percepção desse fato. 3. Na questão das imagens, e também da linguagem utilizada, o trabalho sobre o impeachment se destoa bastante do de Junho e dos outros trabalhos do grupo. Como foi a sua concepção?

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CO: Esse trabalho foi uma resposta rápida à votação na Câmara dos Deputados. A primeira edição saiu semanas depois da votação. Um de nós ao acessar os depoimentos dos deputados, disponibilizados no site oficial da Câmara, viu que eles estavam organizados em uma planilha de Excel. A princípio a ideia era de apenas repaginar a apresentação dos textos para ficarem mais legíveis e acessíveis, depois veio a vontade de tornar aquilo uma publicação oficial, de caráter “documentativo”, de arquivo. Mantivemos a mesma ordem de votação, buscando interferir o mínimo possível na narração. Quando o caderno ficou pronto publicamos um texto-manifesto no nosso site, onde expusemos nossa posição diante do ocorrido. É impossível se manter indiferente diante de uma situação como essa, mesmo quando se opta por se manter neutro, isso já é um posicionamento. O texto do site quebra a mera transposição dos discursos. Além dele, adicionamos algumas imagens ao caderno que para nós tinham o tom irônico. Para nossa surpresa, esse trabalho, até hoje, é o de maior destaque nas feiras gráficas. Com o design simples, nossa hipótese desse sucesso é por que ele toca nessa ferida ainda aberta


que foi o processo de Impeachment, em especial a votação da Câmara. Também, a linguagem e o conteúdo são diretos, nus, qualquer pessoa que pegue esse documento nas mãos entende diretamente sobre o que ele trata. O interessante é notar que esses discursos por si só são muito poderosos, você abre aleatoriamente uma página e certamente irá se surpreender. Para a grande maioria do pública que frequenta as feiras gráficas, os discursos causam indignação, constrangimento, aversão, mas já soubemos de casos de pessoas que fizeram um elogio às falas. De qualquer forma, novamente, é impossível se manter indiferente. Acreditamos que com ambos os produtos, o de junho de 2013 e o da Câmara, podemos de certa forma revisitar o passado. Repensamos no que ele representou, e nos rumos que se desenrolaram. Fazendo um paralelo: quando olhamos para as manifestações de junho de 2013 e para as do impeachment, tanto pró quanto contra, notamos que pouco mudou da maneira de se manifestar. Enfim, a História está em constante disputa. O processo ini-

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ciado em Junho de 2013 não se esgotou e se o impeachment é consequência fatal dele, as manifestações dos estudantes contra o fechamento das Escolas Estaduais iniciadas em São Paulo, também o são. Talvez ali tenhamos algo a aprender. E também ali novos sentidos em disputa para o futuro. São dois lados da mesma moeda. Duas narrativas que emergiram. Qualquer superação do cenário atual só poderá se dar uma vez que haja consciência plena de que novos atores estão no jogo político e de que temos falhado em dialogar uns com os outros. Para uma democracia recente como a nossa e com uma cultura política precária, é mais do que necessário aprender com os erros. 4. Que tipo de referências vocês consultaram para fazer essa publicação? CO: Como dissemos, o livreto foi um reflexo à ocasião, foi um quase sem querer, então não estudamos referências específicas para desenvolvê-lo. Lógico que pessoalmente cada um possui uma extensa carga referencial, mas podemos falar mais de out-


ros trabalhos que dialogam com o nosso. Na última Feira Tijuana, em agosto deste ano, conhecemos o trabalho “Sessão” do poeta carioca Roy David Frankel. Nele, Roy compila e transforma em poemas parte do registro taquigráfico da votação do impeachment na Câmara dos Deputados. Diferentemente do nosso trabalho, este mexe com a edição dos discursos, mas também acaba expondo a política brasileira como uma ridícula paródia de si mesma. 81





EXERCÍCIOS GRÁFICOS

Entendia-se de antemão que uma das questões em jogo nas manifestações pró e contra o impeachment era a disputa por visibilidade, que foi materializada de diversas formas que emergiram como verdadeiros ícones classificando quase instantaneamente cada grupo. Como discutido anteriormente, se a estética é uma forma de dar visibilidade ao pensamento, então que pensamentos se tornaram visíveis nessas manifestações? Para auxiliar a investigação das estéticas presentes nas manifestações, foi recolhida uma série de imagens, vídeos e sites ao longo de todo o período de desenvolvimento desse trabalho. Inspirado no banco de dados mencionado anteriormente na entrevista, foi elaborado um método próprio de catalogação que se baseou na cronologia dos fatos. O banco de dados desenvolvido especificamente para este trabalho foi de crucial

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importância para o desenrolar dessa pesquisa, servindo de base para os seguintes exercícios que resultaram no produto final desse trabalho. Após selecionar algumas imagens do banco produzido, foi realizado um primeiro exercício que consistiu em ressaltar nas fotografias os ícones de cada manifestação. As imagens foram produzidas no photoshop, aplicando o filtro preto e branco nas áreas que não era desejado ressaltar. Juntas, as imagens formam uma espécie de catálogo dos ícones dos protestos do impeachment. Este primeiro exercício possibilitou chegar a algumas constatações: visualmente as manifestações eram de fácil identificação, porém era muito mais fácil identificar os ícones das manifestações pró-impeachment. As peças eram mais diretas, as frases nos cartazes e bandeiras eram curtos e repetitivos, dando uma aparência mais homogênea a multidão. Os objetos eram quase que cômicos, itens de festas e de outros eventos de celebração, como apitos, faixas de cabelo, chapéus e camisetas do Brasil. Contudo, nos dois grupos de manifestantes, o discur-

primeiro exercício: destaque dos símbolos


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so não era único, havia contradições. Enquanto nos protestos de direita divergiam simpatizantes a intervenção militar, e até mesmo se o impeachment seria a melhor solução, do outro lado também havia uma resistência de segmentos em apoiar o levante de bandeiras partidárias. Por meio desse exercício foi possível identificar linguagens insurgentes, como bandeirões, infláveis, pixulecos e camisetas personalizadas, que são por si só uma síntese do seu contexto. Como outra forma de derivação desse primeiro exercício, as imagens foram impressas em preto e branco em papel vegetal com a intenção inicial de materializar o catálogo e criar um jogo de disputa do olhar do observador através da sobreposição das fotos. A intenção foi de explorar nesse exercício justamente a disputa por visibilidade que existiu entre as duas frentes. A partir desses resultados, foram feitas outras colagens, mas dessa vez digitais, utilizando o photoshop para sobrepor de duas a três imagens. Em uma mesma montagem foram colocadas cenas de atos opostos em preto e branco. Essas imagens foram elaboradas com a intenção de serem coladas

segundo exercício: sobreposição de imagens em papel vegetal


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nas janelas do piso do museu da FAUUSP. A intenção, além de criar uma confusão visual, era de desassociar as imagens dos seus respectivos seguimentos ideológicos, a fim de poder observar os objetos registrados nelas sem o teor político. Porém, ficou perceptível que este efeito não era o que se estava buscando, pois enfraquecia a leitura dos símbolos, quando a intenção era de facilitá-la. Aliás, esse método desacordava com a ideia de que as linguagens são insurgências de formas de pensar. Portanto, dos exercícios realizados, o primeiro foi o que mais atendeu a premissa de que a estética é uma forma de dar visibilidade ao pensamento, ao colocar em evidência os símbolos que representam “micro” sínteses dos seus contextos de origem. Este experimento ressalva que a discussão política também ocorre no campo estético, produzindo uma manifestação visual discursiva.

terceiro exercício: colagens digitais


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PROJETO DE EXPOGRAFIA

O desenvolvimento do acervo iconográfico, conforme descrito anteriormente funcionou como instrumento fundamental de estudo e reflexão sobre o tema. Como explicado anteriormente, sua elaboração foi o ponto de partida para esta pesquisa e foi essencial na construção de uma análise quantitativa e qualitativa das estéticas e suas partilhas. Como o banco se mostrou um instrumento propício a impulsionar estas reflexões, exibi-lo seria ainda outra maneira de manter a discussão em aberto, expandindo-a ao público através da exposição. Por sua vez, a função da exposição é entendida aqui não como simples exibição, mas como responsável por colocar algo em presença e debate no cotidiano. Ela é um meio de comunicação através do qual é possível colocar em cena assuntos relevantes em debate. Figura fundamental, porém camuflada, o curador tem

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um importante papel na construção narrativa da exposição, cabendo a ele auxiliar a comunicação entre obra e espectador, a fim de que ela se dê da forma mais enriquecedora possível, seja pelo didatismo, pelas conexões históricas e estéticas, pelo questionamento gerado a partir da montagem da mostra ou pelos desdobramentos que sugere a partir das premissas inerentes à obra de arte. (CHIODETTO, 2013, p.14)

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A curadoria deve sugerir novos pontos de vista, iluminar pontos obscuros da história, desacomodar clichês, ironizar a linearidade das narrativas, gerar abordagens que amplifiquem a potência das obras, imantar o público com a hipótese poética que o artista propõe para olhar o cotidiano (CHIODETTO, 2013, p. 16). A seleção das imagens do banco elaborado foi muito importante para construção narrativa da exposição. Para o curador Eder Chiodetto, toda curadoria exige um posicionamento político, uma tomada de decisão por parte do curador


a respeito de suas crenças e valores. A curadoria é um projeto de comunicação, que trata da articulação de um discurso ideológico em que são realizadas opções estéticas, conceituais e políticas claras para impactar o público de determinada forma (CHIODETTO, 2013, p. 14). Nessa linha, a expografia teve inspiração nos trabalhos do Coletivo Oitenta e Dois, descritos nas entrevistas, que desenvolvem colagens e coleções, a fim de construir um discurso próprio capaz de estimular o leitor a refletir novamente sobre um determinado tema de um outro ponto de vista. Toda imagem, estática ou dinâmica, é uma memória de outra memória. Ao se associar a outras imagens, tornam-se “formas pensantes”, capazes de suscitarem ideias, questionamentos, afirmações e conclusões. A grande variedade de meios onde se trava a disputa ideológica gera uma variedade de estéticas, seja as das ruas com os cartazes, camisetas, gritos e posturas - ou as das redes

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- memes, gifs, hashtags ou twittes. Logo, buscando respeitar suas singularidades, constatou-se que seria mais interessante desenvolver múltiplos métodos de exibição no projeto de expografia, a fim de explorar as qualidades específicas de cada mídia. Portanto, foi decidido retratar os vídeos pela própria linguagem audiovisual, para usufruir dos sons, da dinâmica das cenas e da sequência de acontecimentos narrados. Já para as outras mídias “estáticas” - memes e fotografias - foi determinado que seriam melhor trabalhadas de forma impressa, pois proporcionaria justamente o efeito contemplativo e comparativo por tempo indeterminado. Os diferentes tratamentos às diferentes estéticas exigiram uma proposta mais complexa, porém mais completa do projeto expográfico, portanto, foi feita a opção por dois eixos de desenvolvimento: audiovisual e fotográfico, cada qual tratando das respectivas características. Mesmo escolhendo ambas linguagens, elas se mantêm complementares e não excludentes, pois trabalham de forma equilibrada e mútua quando postas em conjunto. Nesse contexto, a escolha de um local específico que


contemplasse as exigências de cada tipo de instalação já seria o primeiro passo do projeto. Assim, tendo em mente que a exposição se daria junto com a apresentação desse trabalho, o primeiro critério a ser definido foi que ela seria executada no próprio ambiente da FAU. O piso do museu foi eleito como local ideal para o projeto, dada sua vocação propícia para fomento cultural de produção estudantil. Depois do salão caramelo, o museu seria o local do prédio com maior fluxo de pessoas, já concedendo a visibilidade esperada para a mostra. Porém, os dois possuem volumetrias muito diferentes e como o conteúdo a ser exposto não necessitava de um espaço tão avantajado, o museu se mostrou mais adequado, assim como “aconchegante”, contribuindo para maior permanência do público espectador. Além do mais, o piso do museu possui mais infraestrutura que poderia dialogar com a exposição: os pilares, os trilhos de iluminação, as janelas, o guarda-corpo de concreto. Mas o que se mostrou definitivo para a determinação do piso do museu como lugar ideal foi a presença do caracol: estrutura menor, dentro de uma estrutura maior, criando assim outra ambiência particular, ao mesmo tempo que dialoga com

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o restante do espaço. O caracol produz boa retenção de luz, necessária para a montagem de projeção de vídeo, e disponibiliza o restante de espaço para as imagens. Definido o local onde cada parte seria exposta, o passo seguinte foi pensar sobre o como. Questões de materialidade e espacialidade foram surgindo ao longo do processo e geraram investigações, visitas e consultas a papelarias e gráficas. Logo ficou claro que essas duas questões iriam influenciar diretamente em como o espectador iria ler o conteúdo. Como forma de unificar os dois núcleos de trabalho, vídeo e fotografia, optouse por trabalhar com o mesmo material em ambos. Como próximo passo, foi confrontada a questão dos materiais a serem utilizados, e após investigação, a qualidade da transparência chamou a atenção. A transparência pode ser conferida a vários materiais diferentes. Ela é utilizada como propriedade em diversas esferas da arte: como matéria da própria obra artística, caso de O Grande Vidro (original La Mariée à nu par ses célibataires, même), de Marcel Duchamp; na expografia, empregada nos cavaletes de cristal de Lina Bo Bardi no MASP; e como espaço


arquitetônico propriamente dito, como a Neue Nationalgalerie, de Mies Van der Rohe, em Berlim. Em todos esses exemplos foi utilizado o vidro para obter a transparência. Enquanto Duchamp o emprega como suporte para quebrar a opacidade da obra, gerando um fluir de informações ao mesclar o entorno e a peça, Lina Bo Bardi quebra a hierarquia entre as obras nacionais e internacionais do acervo do MASP ao expô-las nos cavaletes, deixando o público livre a interpretações e interações com o espaço, com as obras e com os outros visitantes. Já a obra de Mies Van der Rohe trata de delimitar os espaços de dentro e de fora sem perder o diálogo entre o projeto e o entorno. Para a pesquisadora Stella Politano, a transparência possui um caráter poético. [O vidro] se torna um nada, no sentido mais abstrato, para a visão, para a luz. Misteriosa faculdade de se anular diante da misteriosa faculdade de se ver, em uma magia de ser o que não é ser, de desaparecer, restando este nada que é, em si, um todo. (POLITANO, 2008, p.927)

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Da mesma forma que na galeria projetada por Mies Van der Rohe a paisagem ocupa o seu interior, o Piso do Museu da FAUUSP proporciona uma confluência de cenários de dentro e de fora, o que enriquece as possibilidades de produções artísticas e curatoriais. A transparência configura a liberdade de interpretação, pois permite ao indivíduo interpretar o objeto a partir do seu universo de conhecimento e assimilação daquilo que é proposto. 102

A possibilidade de transparência no fazer histórico e artístico busca, ao meu ver, o rompimento com as finitas possibilidades de olhar, de compreensão e assimilação de um passado que, por ele mesmo, já está imune de uma significação. Os agentes e razões são múltiplos e, a partir de cada época, de cada momento, ganham uma nova reinterpretação (POLITANO, 2008, p. 927). Aqui a transparência é interpretada como finalidade, e não como meio de. Ela se transforma em uma espécie de

esquerda: o grande vidro, marcel duchamp, 1915 -1923 centro: cavaletes de cristal, lina bo bardi, 1968 direita: neue nationalgalerie, mies van der rohe, 1968


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vitrine que coloca no mesmo patamar passado, presente e futuro, tornando-os então sujeitos a reinterpretações. O primeiro passo da produção expográfica foi a seleção das fotografias, todas retiradas do banco de imagens produzido. A intenção é, a partir delas, ilustrar os conceitos desenvolvidos anteriormente, como as manifestações na rua, os cartazes, as bandeiras, os Black Blocs, entre outros. Os trechos com narrativas sobre os vídeos e os memes foram reservados para serem tratados em outra seção. Do total de quarenta e cinco imagens selecionadas, todas receberam o mesmo tratamento que foi feito no primeiro ensaio gráfico. Um ícone de cada uma delas foi ressaltado - o manifestante, a multidão, o objeto - deixando o resto em preto e branco. Nessa parte do processo, o trabalho guarda semelhança ao que Victoria Vesna chama de metaobras, criações do “artista-editor” que usa o conteúdo de grandes bancos de dados como matéria-prima transformada em novas formas de conhecimento e de visualização. Outro partido adotado foi inspirado no conceito de “frase-imagem” de Rancière, que a denomina como o conjunto

corte AA planta com layout da exposição

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1m

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projetor

tela de projeção A expositores

projetor

A


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de partes heterogêneas na composição de uma medida comum. Ela carrega um fluxo de conteúdo, capaz de incitar a continuação de uma narrativa que vai além daqueles fragmentos. Este princípio se traduziu para o trabalho no agrupamento de diferentes imagens que se situam em um mesmo contexto, com o objetivo de contar uma história. Para cada conjunto foi associado um título maior, como “objetos”, “ocupação”, “comportamento”, “polícia”, “cartazes” e “black blocs”, que se correlacionavam, assim como os conceitos. Posteriormente, esses grupos foram reunidos em três maiores: Instrumentos de protesto (cartazes e objetos), Partilha dos Espaços (manifestações de rua e comportamento) e Linguagem da Violência (Black Bloc e polícia). Para transferir esses conjuntos para a exposição, de modo a preservar a ideia de frase-imagem, foi adotado que cada frase imagética seria apresentada na vertical e seria composta por três imagens por coluna (totalizando quinze trios) com a finalidade de preservar uma altura confortável para visualização. Com o mesmo objetivo, determinou-se que cada

planta com indicações da expografia

0

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2m 3m


B projetor trilho de iluminação para apoio dos expositores

A

B

tela

A


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imagem seria impressa em tamanho 18 x 24 cm. Como solução para obter o efeito de transparência, as imagens foram impressas em placas de PTG de 32 x 78 cm, um material semelhante ao acrílico e ao acetato. Assim como nas monotipias de Mira Schendel, as imagens impressas em transparência não possuem mais um único lado, nem frente nem verso, servindo de exercício ao olhar e à compreensão. Por isso, seria importante permitir a circulação em volta das imagens e que em ambos os lados, a visão fosse a mesma. Para tal, as colunas foram deslocadas para o centro do piso do museu, penduradas pelos trilhos de iluminação, posicionandoas de forma intercalada, de modo que fosse possível mesclar as transparências e visualizá-las transversalmente.

posição das imagens nos expositores

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A seguir estão as quarenta e cinco imagens produzidas para a exposição. Elas se encontram agupadas em suas frases imagéticas ordenadas por ordem de fileira e coluna. Podem ser acessadas também pelo Qrcode ao lado ou pelo site flickr.com/people/estetica_dos_espacos_de_protesto

















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Finalmente, o desafio dos vídeos foi confrontado. Pessoalmente foi a produção mais difícil de elaborar, dado a pouca experiência de trabalho com esse tipo de mídia. Porém, a questão acabou sendo contornada com a colaboração de pessoas que trabalham na área audiovisual e foram responsáveis pela edição do vídeo exposto. Foi encontrado no tecido de poliéster um bom equilíbrio entre uma opacidade mínima necessária para a projeção e uma transparência que dialogasse com a materialidade das imagens e mantivesse o mesmo conceito para ambas. No primeiro ensaio foram roteirizados dois vídeos para ilustrar separadamente cada lado da manifestação, cada um deles com cenas dos atos e depoimentos dos manifestantes. Espacialmente, pensou-se em posicionar duas telas, uma de frente para a outra, de modo que cada uma refletisse um vídeo diferente. No entanto, esta configuração, tanto espacial como editorial, causava uma quebra e confundia a leitura dos vídeos, além de reforçar a polarização dos discursos. Dado essas primeiras conclusões, o segundo ensaio unificou os vídeos anteriores. Neste novo estudo, foram

corte BB

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selecionadas cenas para ilustrar a estética das imagens fluidas, produzidas tanto pela mídia corporativa quanto pela “multidão”. Elas reúnem gritos e performances, imagens aéreas e de celular, com uma variada gama de enquadramento, foco e qualidade. Ao se contraporem, as cenas evidenciam as semelhanças e as diferenças de cada lado, através da utilização dos mesmos instrumentos de reivindicação, porém de formar distintas. O vídeo mantém uma certa estética do material bruto, apesar de evidenciar a edição e a montagem de cenas dos diferentes protestos que se sucedem, de modo que o espectador possa ser transportado para as ações de forma sensível, sem saber ao certo que lugares ou datas estão sendo mostrados.

perspectiva do piso do museu com layout da exposição




O QRcode abaixo encaminha para o vídeo da instalação, que também pode ser acessado em vimeo.com/244227105


Para os memes, foi criado um QR Code, instalado no espaço da exposição, que direciona o espectador para o site que reúne uma seleção destes. Isto foi feito para ser mantida a linguagem digital dos próprios memes e também para possibilitar o seu compartilhamento, uma vez que eles já são acessados por um veículo digital. Os memes foram selecionados e organizados de modo a criar uma sequência cronológica dos acontecimentos ao longo do processo de impeachment. 132

QRcode para o site com a seleção de memes, ou é possível acessá-los pelo endereço liviagvictoria.tumblr.com


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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem dúvida foi muito prazeroso executar um trabalho que eu tenha dedicado tanto tempo e afeto para desenvolver. Pude constatar que existe um salto entre idealizar um projeto e executá-lo. Foi um longo processo investigativo de soluções gráficas e materiais para consolidar o resultado final, sempre adaptando o projeto original de acordo com as novas descobertas. Ao longo deste estudo percebo que muitos dos conceitos desenvolvidos pelos teóricos citados não são apenas característicos de um objeto ou de uma mídia específicos, mas que se correlacionam como uma teia de conexões de potências em comum. No descorrer do texto, exemplifico algumas dessas características para desenvolver os conceitos. Qualquer que seja o lugar que as manifestações se inserem, e isso vale para a internet, uma prática estética não se exclue à outra. Elas

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representam e reconfiguram as partilhas dessas atividades. O impeachment teve um grande impacto para o país, que ainda ecoará por muitos anos. Por essa razão me parece ser fundamental enfrentar as complexidades e as contradições desse processo para além dos discursos contra ou a favor. Os vídeos e imagens expostos são uma oportunidade de observar as manifestações dentro da nossa sociedade, e assim manter vivo o debate sobre os nossos direitos e deveres políticos. As redes, por sua vez, tiveram um papel de destaque nesse embate. Elas instituíram uma outra temporalidade e polifonia na política. Precisamos saber navegar e tomar decisões com base nas novas dinâmicas de luta que ressignificam o presente urgente e inventam futuros possíveis. É por isso que ressignificar o impeachment é um dever coletivo.




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FILME WAINER, João. Junho - O mês que abalou o Brasil. TV Folha, 2014.

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Iconografia

pg 23 direita: banco de imagens esquerda: banco de imagens pg 27 direita: banco de imagens centro: www.lygiapape.org.br/pt/obra60.php?i=12 esquerda: banco de imagens 148

pg 47 www.phaidon.com/agenda/photography/articles/2012/november/21/hilla-becher -interviewed-at-paris-photo/ pg 51 direita: www.galeriamezanino.com/mezanino/rascunho-automatico/ esquerda: www.obeijo.com.br/noticias/exposicao-questiona-e-retrata-cenario-politico brasileiro-12774055 pg 53 www.andreamachado.com.br/2014/09/mira-schendel-do-simbolo-ao-silencio-de.html pg 71 www.oitentaedois.com/lab/impeachment/ pg 85 banco de imagens


pg 87

direita: acervo pessoal esquerda: acervo pessoal

pg 89

direita: acervo pessoal esquerda: acervo pessoal

pg 90

direita: acervo pessoal esquerda: acervo pessoal

pg 101 direita: hyperallergic.com/38565/ive-been-to-small-black-door centro: www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/04.040/653 esquerda: www.archdaily.com.br/br/795524/classicos-da-arquitetura-neue-national galerie-mies-van-der-rohe/54e7427de58ece7fc30000db-1_-4-jpg pg 107 - 131 banco de imagens

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Todas as imagens que introduzem os capítulos foram retiradas do banco de imagens montado para este trabalho, sendo as principais fontes: g1.globo.com brasil.elpais.com epoca.globo.com folha.uol.com.br istoe.com.br veja.abril.com.br cartamaior.com.br Os vídeos foram extraídos principalmente das seguintes fontes: youtube.com TViG TV Folha Mídia Ninja Audiovisual pela Democracia_SP




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