Andancas

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AnDANรงas



LUIZ sALGADO RIBEIRO

AnDAnçAs //HIsTÓRIAs DE UM JORnALIsTA À MODA AnTIGA//



À minha amada Aninha, sempre companheirona, nessas e em muitas outras andanças. Ao Luiz Eduardo e à Suzana, pelo orgulho que sempre me deram de ser pai de vocês. Ao João Pedro e ao Gabriel, para que um dia possam conhecer, entender e contar a seus amigos, as aventuras deste vovô meio maluco. Aos meus companheiros de espécie em extinção.



Índice

PREFÁCIO ...................................................... 13 APREsEnTAçÃO Motivação preservacionista ......................... 21 CAPÍTULO 1 PRIMEIROs TEMPOs ......................................25 Uma carona para a profissão ......................27 Com o diploma, surge o desemprego ............30 Aprendendo o ofício .....................................33 Paulo, meu primeiro mestre ........................34 O império em decadência .............................36 “Enganação em mão dupla” .........................37 Precariedade...............................................37 Jornal de velhos .........................................39 CAPÍTULO 2 TEMPOs EM MAnAUs .................................... 41 A sorte de um freelancer mal pago ..............43 Tentando editar A Crítica ............................49 A boa safra de más notícias .......................53 A necessidade de ser sintético .....................55 A volúvel opinião pública .............................56 O baile ........................................................60 A primeira censura .....................................63 “Telegramas em código” .............................65 Uma rotativa histórica ................................66 Invertendo letras ........................................68


Que sufoco!..................................................69 Briga com bons resultados............................70 Pirataria na Copa de 1970............................72 Uma reta no mapa.......................................73 Transamazônica, o meu bom caminho.......... 74

CAPÍTULO 3 TEMPOS NO ESTADÃO..................................... 81 Para começar, um terrorista arrependido.....83 Driblando a Censura....................................84 Imprimindo dinheiro....................................86 “Tv e jornalismo não combinam?”................ 87 O difícil começo da Agência Estado...............89 Acertando a pirataria................................ 102 Rádios, uma ilusão..................................... 102 Serviço econômico...................................... 104 Viagem ao futuro....................................... 104 Rédeas curtas............................................ 107 “Inteligência insuficiente”........................... 108 À procura dos “índios gigantes”.................. 110 Disco voador.............................................. 114 A cidade que não existia............................ 115 Assunto pessoal......................................... 116 Trabalhador flechado................................. 120 O “apanha-mensagens”............................... 123 Prêmio Esso de reportagem........................ 129 O outro lado da Transamazônica................ 130 Foca, sempre foca...................................... 131 O Kuarup................................................... 133 “Coitado”................................................... 151 Mudança para a marginal.......................... 152 Cumprindo ordens...................................... 156 Conflito em Santa Luzia dos Perdidos......... 172 Jânio, sozinho............................................ 183 Desvio de rota............................................ 186


CAPÍTULO 4 TEMPOS EM MATO GROSSO........................... 193 Escola, a preocupação................................ 195 O grande susto........................................... 196 Notícias de sobra........................................200 O Projeto Terranova................................... 210 Pioneiro não pode ter saudade.................... 213 PF x Ulisses - o processo que não existiu.... 214 CAPÍTULO 5 TEMPOS EM PINDAMONHANGABA................ 217 Tentando ser burocrata.............................. 219 O erro em dar notícias...............................220 CAPÍTULO 6 TEMPOS NA FOLHA DE S.PAULO.................... 227 A Dixieland Band.......................................229 Pauta ruim, bom repórter.......................... 231 A reforma agrária na economia..................232 O “cônsul”..................................................235 Guerra no sul do Pará................................238 Entrevista com Tancredo............................ 260 O manual de redação................................. 261 CAPÍTULO 7 TEMPOS EM BRASÍLIA.................................. 265 A burocracia das pastas............................. 267 Virei doutor............................................... 268 A concorrência para publicidade................. 269 Especialista em fraudes.............................. 271 O trailler................................................... 272 CAPÍTULO 8 NOVOS TEMPOS EM PINDAMONHANGABA..... 277 Um emprego inconfiável............................. 279


CAPÍTULO 9 TEMPOS NA TELESP......................................283 Cartas de reclamações............................... 285 Celular só para ricos..................................286 Fraudes..................................................... 287 CAPÍTULO 10 TEMPOS NO GOVERNO DO ESTADO................ 291 Lambe­‑lambe da campanha........................ 293 Virei “excelência”....................................... 296 Segundo mandato.......................................300 CAPÍTULO 11 PARA COMPLETAR, UMA CAMPANHA PRESIDENCIAL..............................................303 Coordenando propostas..............................305 SAIDEIRAS ..................................................308 Os “vagabundos”........................................308 “Pradão”, o esquecido.................................308 Opiniões divergentes...................................309 Pão, leite e vietcongs.................................. 311 Escrever, uma loucura............................... 311 GLOSSÁRIO DA ANTIGA IMPRENSA............... 313




Prefácio

POR QUE VOCÊ precisa ler este livro com atenção e se for um jovem jornalista com mais atenção ainda? Primeiro para conhecer a história pessoal e profissional de um homem que caminha para a velhice de bem com a vida e com a consciência tranquila do dever cumprido, por mais que esses termos estejam gastos e, infelizmente, para muitos não queiram dizer quase nada. Servirá para você também ter uma ligeira dimensão do trabalho dos grandes repórteres dos anos 1960, 1970 e 1980, que, salvo as exceções de sempre, fruto de bem‑sucedida marquetagem pessoal, foram sendo esquecidos, embora ainda estejam presentes na vida do País nos arquivos de papel, de áudio e vídeo. Para os mais jovens conhecerem os inacreditáveis desafios que um deles enfrentou e venceu, será uma surpresa incrível nesta época opaca do “ponto com”. Luiz Salgado Ribeiro não quer que sua história fique aprisionada nos arquivos — e nem em lugar nenhum —, daí a principal missão deste livro, que, de certa maneira, é também um convite, uma convocação para os então jovens repórteres daquela época fazerem o mesmo. Libertem suas histórias! Porque se todos os hoje velhos repórteres, os velhos jornalistas, fizerem o que o Salgado fez haverá como resgatar e preservar as histórias, a memória de um período extraordinário, complexo, rico, perigoso e fascinante de nossas vidas e da nossa história. Há muita coisa a ser contada e precisa ser contada por quem a viveu em todas as várias frentes do jornalismo daquela época. Não que as outras histórias – do

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papel do jornalismo no enfrentamento dos anos de chumbo – não tenham sua imensa importância aqui reconhecida, é bom que fique claro. Mas, a bem da realidade, não se deve deixar que só apenas o relato do jornalismo de combate ocupe totalmente a história do jornalismo daquela época. Por quê? Porque por paradoxal que possa parecer dos anos 1960 aos anos 1980, o jornalismo brasileiro, a despeito das dificuldades, censura, prisões, torturas de jornalistas, avançou como nunca tinha avançado até então. Surgem as novidades tecnológicas — do telex à impressão à frio. Há um salto nas telecomunicações. Adotamos novas técnicas: a pauta, o copidesque, as equipes especializadas, a diagramação, a regulamentação da profissão, as escolas de jornalismo. Surgem as revistas semanais de informação. O rádio passa ser jornalístico. A televisão – depois de um período que seria melhor esquecer – vai ao mercado e atrai profissionais da imprensa escrita, consagrados e respeitados. Fomos dando saltos de crescimento e de qualidade, fomos avançando, ocupando cada vez mais espaço e importância na vida do Brasil e dos brasileiros. Esses saltos de qualificação e de qualidade, a bem da verdade, foram colocados prioritariamente a serviço da luta contra o arbítrio e deu a essa luta mais eficiência, amplitude e consistência. É evidente que houve exceções, mas não é de exceções que estamos tratando aqui. Nessa época, novidades e saltos de qualidade à parte, há um grupo de profissionais que – graças a Deus – se destaca, por ser a vanguarda em todos os sentidos que a palavra vanguarda tem: os repórteres, o sal do jornalismo. Todos os grandes jornais e revistas tinham orgulho do seu corpo de repórteres. Um jornal era avaliado, antes de mais nada, pelo resultado do trabalho do seu corpo de repórteres.

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No Estadão havia um corpo de repórteres de primeira linha. Aliás, vários corpos de repórteres: os especiais, geral, saúde, educação, esportes, cultura, tecnologia, política, o de correspondentes nacionais, internacionais, do interior, uma enorme e magnífica máquina de capturar e produzir informações espalhada por todo País e no exterior. No Brasil, distribuídos por todos os Estados, havia 150 repórteres trabalhando todos os dias, o ano inteiro, cobrindo tudo, do arbítrio ao futebol. Com licença que aqui vou fazer um registro e render uma homenagem a quem, no Estadão, bancou tudo isso e muito mais e o muito mais foi a corajosa luta contra a ditadura, a censura, o arbítrio, o dr. Julio Mesquita Neto, que precisa ter a sua história resgatada e contada direito, com o respeito e a consideração que ele merece. Nesse mundão de repórteres, havia uma turma que quase nunca víamos, uns ermitões, uma espécie de legião estrangeira das missões impossíveis, que, na falta de um nome melhor (e qual seria o nome melhor?), eram conhecidos como “repórteres mateiros” pela simples e boa razão de que trabalhavam preferencialmente no mato, no fim do mundo, no Brasil desconhecido. Eram eles que davam conta do mundo inimaginável para os leitores do Brasil e pela repercussão de suas matérias também aos leitores do mundo. Entre os anos 1960 e 1980, o Brasil da inflação do Delfim, do tri, da Ponte Rio Niteroi, da abjeta didatura, da tortura, do boom da música, de Itaipu, do Acordo Nuclear, também vivia algumas sagas: a nova ocupação da Amazônia, a ocupação do Centro­‑ Oeste, novas aventuras como as obras da Transamazônica, Cuiabá­‑Santarém, havia uma guerrilha no Araguaia, os empreendimentos de exploração mineral, Jarí do americano Ludwig, novos Estados, novas cidades, iniciava­

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‑se a discussão da questão ambiental, buscavam­ ‑se tribos desconhecidas, entre elas os temíveis índios gigantes e por ai vai, se é que você pode imaginar o tamanho da dificuldade e o tamanho da coragem desses repórteres para enfrentar e vencer essas dificuldades e levar informações de qualidade aos seus leitores. E lá estavam os “mateiros” do Estadão, apurando, levantando questões importantes para o País, denunciando os abusos, contando as melhores histórias, apresentando um Brasil desconhecido para todos os brasileiros. Nunca se contará com a exatidão necessária a história deste período de ocupação do maior pedaço do Brasil sem se beber nas reportagens desses grandes repórteres que lá estavam, acompanhando tudo. Ficavam semanas sumidos, enfiados no mato, em condições precaríssimas e surgiam com belas, extraordinárias matérias. Lá estavam entre outros, e estamos tratando só do grupo de “mateiros” do Estadão, o grande Lúcio Flavio Pinto, Sérgio Buarque Gusmão, Sérgio Coelho, Raimundo José, Manoel Lima, Mario Chimana, Oscar Ramos Gaspar, Rogério Medeiros e José Marqueiz. É lá estava também o Luiz Salgado Ribeiro e é desse período que trata uma boa parte deste livro: da história de um homem singular. São ótimas histórias: histórias que só os bons, os grandes repórteres sabem contar. Duvido que você não fique com o coração na boca torcendo para que o jovem Salgado cumpra a sua missão na inauguração da Cuiabá­ ‑Santarém; duvido que você não se emocione com a história dos índios gigantes, do Kuarup; duvido que não desperte em você uma profunda admiração pelo Salgado jornalista faz­ ‑tudo do “Xornal da Tera”, no meio do cerrado matogrossense, o primeiro jornal apurado, escrito, produzido, impresso e distribuído por um homem só, na floresta. Ou que não diga com os seus botões 16


“Esse sujeito é maluco e corajoso” ao ler a aventura dele no Paraguai. Por fim este livro serve – notadamente para os jovens jornalistas – para não se deixarem enganar pelas aparências, pela primeira impressão. Explico. Se você não conhece o Salgado e cruza com ele na rua, vai achar que está diante de um corretor de seguros de triciclo, com todo respeito, uma dessas vidas sem riscos que depois de 50 anos está terminando em aposentadoria e muita televisão. Um sujeito um tantinho, um pouquinho para o trôpego, agitadinho lembrando vagamente um playmobil de bigode escovão, uns olhinhos inquietos, de passos rápidos. Ai é que você se engana. Você está cruzando com um leão. No jornalismo ele fez de tudo e bem feito: mexeu com jornal pequeno, jornal grande, estruturou uma agência de notícias, foi diretor de jornal, foi repórter especial, foi um dos melhores “repórteres mateiros” que conheci, foi grande no Estadão, grande na Folha. Como ninguém é perfeito acabou sucumbindo a uma convocação para a vida pública, mas saiu a tempo de cabeça erguida e reputação intacta. Não dá para falar dele sem falar da Ana, a Aninha, inha só no carinho dos amigos, uma gigante, às vezes, ligeiramente insana por acompanhá­‑lo e por ser uma companheira fantástica, uma mulher admirável e que bancou todas as aventuras dele. E criou belos filhos. É o que eu tinha a dizer. Creio que me estendi além da conta. Fica por conta da minha admiração. Por fim um aviso, uma provocação e um convite aos (jovens) jornalistas navegantes descontentes do jornalismo de gabinete, da internet e afins. O Salgado, que 40 anos atrás acompanhou passo a passo e lá no meio da floresta a construção da Transamazônica, está seguindo para lá para fazer uma série de matérias, ou como se diz hoje, revival sobre o que era e o que é hoje aquilo tudo. 17


Então, por que você não toma coragem, larga os teclados, levanta a bunda da cadeira e vai ver como é (era?) o jornalismo de verdade e aproveita para ter delírios com coisas reais, ir para a rua e beber a tempestade e fazer uma matéria como antigamente? Quem sabe você cruza com ele, tem a sorte de cruzar com ele na sua vida como eu tive. São Paulo, janeiro de 2010 Raul Martins Bastos

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