Mais espesso que a água

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Luís Quintais nasceu em 1968 em Angola. É antropólogo social de profissão, leccionando presentemente no Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra. Publicou o seu primeiro livro de poesia, A Imprecisa Melancolia, em 1995. Em 1999 publica na Cotovia Lamento, a que se segue Verso Antigo (2001) e Angst (2002). Com Duelo (2004) recebe os prémios Pen Clube de Poesia e Prémio de Poesia Luís Miguel Nava. Em 2006 publica Franz Piechowski ou a analítica do arquivo, ensaio sobre o visível e o invisível na psiquiatria forense. No mesmo ano, surge Canto Onde, o seu anterior livro de poesia.



MAIS ESPESSO QUE A ÁGUA


Título: Mais espesso que a água © Luís Quintais e Edições Cotovia, Lda., Lisboa, 2008 Concepção gráfica de João Botelho ISBN: 978-972-795-269-4


Luís Quintais

Mais espesso que a água

Cotovia



Índice

I Mente Do gelo Inocência Gaguez Manhã Uma viagem O agon, de outro modo Stimmung Psicogeografia Dor Aprendiz Shadowplay That damn sorrow O inviolável em nós Linha Inferno Leviatã

p. 13 14 15 16 17 18 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31

II Tempo Monk Lembrando Chet

35 36 37

Regra Invisível Tédio Urbanismo

41 42 43 44

III

7


IV Lascaux Depois da escrita Metal e melancolia Da noite examinada

47 48 49 50

Óbito Dias Ingmar Bergman (1918-2007) Eliot na Ilha de Páscoa A luz restante Canyon Os teus Um álbum de fotografias Um lugar improvável Nuvem de Oort

53 54 55 56 57 58 59 60 61 62

Sobre a terra Deriva Rasto Ela

65 66 67 68

V

VI

VII Ave Montanha Eclipse Jardim Deserto Passos Tecto Fantasma A música

71 72 73 74 75 76 77 78 79 8


VIII Obscurecer Um poema Vidro Agosto ou Turim Estante Memória de Paulo Valverde, Lisboa, anos 90 Inner darkening 40

83 84 85 86 88 89 90 91

IX Uma destruída presença Depois do extermínio Europa de Leste

95 97 98

X Natureza Zoo Blakeano Armadilha Borges (1) Borges (2) Borges (3) Borges (4) Borges (5) Borges (6) Borges (7) Mergulhão

101 102 103 104 105 106 107 108 109 110 111 112

Homenagem à adjectivação Anjo Tu Horário Água, fogo lento

115 116 117 118 119

XI

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A fome Ecolalia

120 121

XII Subjectivas mesas

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I



Mente

Uma coisa-movimento, assim, ao abrir a porta, e dentro a mĂşsica de a lembrar.

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Do gelo Para JG Ballard

À psicologia profunda tudo devemos. Acima de todas as coisas, devemos-lhe o que não comunica, o que a inocência e o esquecimento traem. É à ímpia hipótese que tudo devemos: a do negro icebergue evolutivo que no cérebro espelha abominações e que nos faz balbuciar o seu fogo e o seu reino. As lições do gelo são a melhor explicação da arte das cesuras e dos caprichos: o que não fará certamente a cidade, o que não compõe um segredo que não seja a plena paixão do ilegível.

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InocĂŞncia

A ruĂ­na das nossas vidas imaginadas acolhe-nos, inocenta-nos.

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Gaguez

Todas as línguas do mundo se sujaram. Fomos condenados à gaguez triunfal pela qual procuramos ainda dizer o que nos foi recusado. Na mínima dor colhemos os frutos que alimentam o nosso sangue, a corrente que nos prende à furiosa morte. A metáfora da alma será ainda a melhor dádiva deste corpo tão eficiente e tão pobre. Assim nos saciamos.

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Manhã

Começas a manhã com o significado litúrgico a conquistar o que jamais poderá ser dito. Desloca o teu mundo para a vigília em que se desdobram os dias. Tomado por um grito que assalta a anónima cilada do porvir, o rumor planetário eclipsa-se nas movediças matérias deste vácuo. É imperfeita a manhã, e o metafísico mal, grandiloquente e de trágicos assentos, já não virá hoje, crês.

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