Estudo de viabilidade técnica fly manso versão 1

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Estudo de viabilidade na implantação da Pesca Esportiva de Fly no rio Manso, MT.


LP AMBIENTAL - PROJETOS E CONSULTORIA Programa de Desenvolvimento do Turismo de Pesca Coordenador Dr. Thomaz Lipparelli - Consultor / Ictiólogo FICHA TÉCNICA Autor Thomaz Lipparelli Colaboradores Paulo Henrique Franco, Henrique Matsunaki, Helio Pompeu Fridericci, José Antonio Paes e Maria Inês Pachowistck Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Estudo de viabilidade na Implantação da Pesca Esportiva de Fly no rio Manso, Estado de Mato Grosso, Brasil. Lipparelli, T. LP AMBIENTAL Projetos e Consultoria - Brasil, Março de 2016. 1a Edição. 1. Estudo de viabilidade. 2. Pesca Esporiva de Fly. 3. Rio Manso. 4. Índice de Risco Ecológico. ISBN 338.9087.231 CDD 00228.91000.78886.

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Sumário Introdução Contexto Área de estudo Métodos Índice de Risco Ecológico – IRE Etapas do IRE Análises hidrológicas Resultados Discussão e recomendações Conclusões Referências

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Apresentação Esta publicação traz os resultados do estudo de viabilidade na implantação da Pesca Esportiva de Fly no rio Manso, um primeiro passo para o fortalecimento desta modalidade esportiva no Estado de Mato Grosso. A necessidade de ações governamentais, integradas às iniciativas privadas, é de extrema relevância, sobretudo na readequação da oferta dos destinos de pesca, visto que a pesca esportiva requer efetivas medidas de proteção ambiental, apoiadas por pesquisas que garantam a manutenção dos estoques pesqueiros, e na necessidade de se ampliar e melhorar a qualidade das estruturas necessárias para viabilizar a prática da pesca esportiva de fly em todo o território nacional. Além disso, considera-se fundamental a qualificação profissional e o estudo permanente do perfil da demanda dos pescadores esportivos de fly que atuam em todo o território nacional. No Pantanal a pesca esportiva de fly associada ao turismo, vem ganhando espaço e pode se tornar em uma importante fonte geradora de desenvolvimento local, atraindo investimentos e auxiliando na melhoria de importantes indicadores sociais, econômicos e ambientais. Diante destas argumentações e informações complementares, avaliar a viabilidade técnica em se fomentar o desenvolimento da pesca esportiva de fly no rio Manso - MT e a viabilidade desta modalidade se tornar uma atividade econômica alternativa para os pescadores profissionais e ribeirinhos, são os principais objetivos deste estudo.

Prof. Dr. Thomaz Lipparelli Biólogo, Mestre e Doutor em Zoologia pela UNESP Rio Claro Especialista em Biologia da Reprodução de Peixes Neotropicais Consultor em Meio Ambiente

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Introdução A pesca amadora é uma atividade lúdica milenar, vinculada a recreação e ao lazer. Nos últimos anos, tornou-se uma importante atividade econômica, geradora de trabalho e renda em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Em sua modalidade "esportiva" quando praticada em grupo, proporciona o bem estar social e, individualmente tem ação reparadora, física e mental. Por estas e outras características, a pesca amadora em sua modalidade esportiva, tornou-se um dos pilares de desenvolvimento do turismo de baixo impacto em todo o mundo. No contexto global, a força motriz da pesca esportiva é inquestionável, seja na índustria, comércio e na prestação de serviços, direta ou indiretamente vinculados ao setor. Alguns países já expressam, em seus índices de desenvolvimento, os benefícios que a pesca esportiva representa às suas economias. Recentemente, cientistas e gestores de pesca, em eventos internacionais, já apontam benefícios econômicos, sociais e ecológicos que a pesca esportiva tem proporcionado em seus países, e a necessidade emergencial em se quanlificar estes benefícios. A pesca com mosca ou Fly Fishing é uma submodalidade da pesca esportiva, e se destaca no cenário nacional e internacional pelas suas inovações. Nela são utilizadas iscas artificiais, confeccionadas artesanalmente com diferentes produtos naturais ou artificiais, com o objetivo de reproduzir forma e cores de insetos e outros pequenos animais, comumente encontrados na natureza e que são presas potenciais de diferentes espécies de peixes. Esta submodalidade envolve amplo estudo e treinamento, sobretudo no lançamento destas iscas (casting).

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O comportamento do pescador esportivo de fly fishing é dinâmico e diferenciado. São pessoas que respondem rapidamente às inovações de mercado, permanentemente motivados em conhecer novos destinos de pesca, criando expectativas que necessitam ser atendidas. No cenário globalizado este atendimento passa pela oferta de novas opções de roteiros de pesca, que se adaptam às suas necessidades pessoais e de grupo, seus desejos e preferências. O pescador esportivo de fly impulsiona o mercado, seja adquirindo pacotes de viagens, equipamentos de pesca, vestuários apropriados e leitura especializada. Permanentemente motivados em sair de suas rotinas, conhecer novos costumes e culturas, injetam volumosos recursos financeiros em localidades distantes, contribuindo com a redução da pobreza e a inclusão social. O pescador esportivo de fly é um formador de opinião, extremamente criterioso e exigente, seja na segurança, na qualidade dos serviços e produtos adquiridos e mais recentemente, quanto a qualidade do ambiente onde irá exercer seu hobby. Neste contexto, o comportamento do pescador esportivo de fly em campo também é diferenciado. Pelo caráter esportivo, a prática de capturar e soltar (catch & release) o peixe capturado é uma regra, que exige uma qualificação técnica e procedimentos adequados para reduzir minimamente todo e qualquer estresse ao animal capturado e que garanta a sua sobrevivência após sua soltura. A prática do "pesque e solte", tem se popularizado em outras submodalidades da pesca esportiva, e adotada na legislação pesqueira em diferentes localidades como medida eficaz na promossão à conservação dos recursos pesqueiros. Esta prática vem ganhando a devida atenção de gestores e cientistas de pesca em todo o país, sobretudo em localidades cujo cenário de redução dos estoques pesqueiros atua diretamente na retração econômica local. Indubitavelmente, o volume de publicações técnicas e científicas internacionais que apontam os benefícios do "pesca e solte", vem aumentando nos últimos anos, proporcionando novas perspectivas à pesca esportiva, ao turismo local e sobretudo, à conservação dos recursos pesqueiros mundiais. Uma iniciativa inédita no Brasil foi a iniciativa da Associação das Comunidades Indígenas do Baixo Rio Negro (ACIBRN) e a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) em explorar a pesca esportiva no rio Marié, afluente do Rio Negro, ao longo da TI Médio Rio Negro I, no noroeste do Amazonas que promete trazer emprego e renda para comunidades indígenas por meio da exploração do turismo de pesca esportiva sustentável.

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Área de estudo A Bacia Hidrográfica do Rio Manso está localizada no Estado de Mato Grosso, possui uma área aproximada de 10.553 km2 e é formada principalmente pelos rios Manso, Casca, Quilombo e Roncador - pertencentes à bacia do Rio Cuiabá. Distante de Cuiabá, cerca de 100 km, o lago do rio Manso, formado devido à construção da barragem - APM Manso - Aproveitamento Múltiplo de Manso, possui aproximadamente 427 km2 de área alagada para cota máxima, foi concebido com quatro objetivos principais de acordo com Chiletto (2005): regularizar o nível do rio Cuiabá, fomentar o turiso através do lago, incentivar a irrigação do Cerrado e, gerar energia elétrica. HIDROLOGIA O rio Manso é um dos principais afluentes do rio Cuiabá, sendo responsável por uma área de drenagem de aproximadamente 10.553 Km², o que representa cerca de 40% da Bacia Hidrográfica do rio Cuiabá e cerca de 2% da área da bacia formadora do Pantanal, ou seja, da bacia do Paraguai. (SONDOTÉCNICA, 1987). Nasce na Serra Azul do estado do Mato Grosso e percorre um vale sinuoso, recebendo tributários de várias partes. Tem sentido Leste – Oeste, tomando o rumo sudoeste quando atinge planos e falhas, seguindo em direção ao rio Cuiabá, que se localiza perpendicularmente às estruturas geológicas subjacentes e ao seguimento do rio Manso. Seu principal afluente pela margem esquerda é o rio Casca. O rio Manso é um rio meândrico, com pouca correnteza, entre sua confluência com o rio Casca. À jusante da foz do rio Casca, o rio Manso adquire características de rio de planície, aumentando a largura e reduzindo a declividade, permanecendo assim até a confluência com o rio Cuiabá. De um modo geral o rio manso possui águas mais profundas, quentes e alcalinas, de maior condutividade, altas concentrações de nutrientes, e maior diversidade de grupos fitoplanctônicos, enquanto o rio Casca tem águas mais ácidas, e com alto teor de material em suspensão. (SONDOTECNICA, 1987).

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A Bacia Hidrográfica do Rio Manso (BHRM) possui um reservatório próximo ao Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, que, fechado para inundação, no período de novembro de 1999 a fevereiro de 2000, apresentou rápido enchimento inundando, além do trecho do rio Manso, à montante da barragem, as porções inferiores do rio Casca, Palmeiras, e Quilombo, totalizando uma área inundada de 427 km² na cota máxima. O reservatório em questão é integrante da Usina de Aproveitamento Múltiplo de Manso – APM manso, cuja finalidade principal é a geração de energia hidrelétrica, e está em operação desde janeiro de 2002. A BHRM possui em média 733 cursos de água, sendo que deste total, 77,6% são de ordem 1, ou seja, nascentes; aproximadamente 39% são intermitentes, e, devido ao fato de a bacia estar localizada em região com definição de duas estações bem marcantes, seca e úmida, há redução significativa da contribuição das nascentes no período de estiagem, uma vez que passa a ter menor número de tributários nesse período, o que pode ocasionar grandes diferenças sazonais das vazões resultantes. Possui perímetro de aproximadamente 533 km e de acordo com estudos morfométricos realizados por Andrade et.al (2008), pode-se afirmar que a bacia possui tendência a forma alongada, o que evita em condições normais de precipitação, o surgimento de enchentes. Em bacias com forma circular há maiores possibilidades de chuvas intensas ocorrerem simultaneamente em toda sua extensão concentrando grande volume de água no tributário principal (cheias rápidas) o que não ocorre em bacias alongadas

Hidrografia da área de estudo e o reservatório Aproveitamento Múltiplo de Manso (Xavier, et al., 2009).

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VEGETAÇÃO

Segundo Chiletto (2005), as formações de Cerrado ocupam grande parcela do estado do Mato Grosso (cerca de 13% de sua superfície), estendendo-se para a porção sul e sudoeste do Planalto dos Parecis, na Chapada dos Guimarães, na Depressão Cuiabana, no Planalto Taquari/Alto, Araguaia, nas depressões do Alto Paraguai-Guaporé, nas planícies e Pantanal Mato-grossense. Em relação a área de estudo, a vegetação é caracterizada por três tipos principais: a Floresta Tropical de transição, o Cerrado e a mata de galeria. Situada em maior concentração ao norte do estado, corresponde ao prolongamento da Floresta Amazônica, a Floresta Tropical ocorre em regiões baixas e ao longo de córregos e rios. Geralmente constituídos de árvores de grande porte (15m), com copas não muito densas e raízes pouco profundas. Em razão da antiga e significativa ocupação nessa porção do estado, esta formação encontra-se hoje muito alterada, havendo poucas manchas remanescentes. Constituindo-se de uma vegetação típica local, o cerrado domina as partes elevadas e conseqüentemente os divisores de águas. São formados por árvores de pequeno porte com caules retorcidos e o solo é coberto por gramíneas ralas. Em meio a vales e ao longo de cursos de água, pode-se encontrar a mata de galeria. A região apresenta condições bastante contrastantes entre as estações do verão e inverno. O verão é essencialmente quente e chuvoso, enquanto o inverno é menos quente e seco. No verão os sistemas de massas de ar predominantes nesse período, deslocam-se para o norte durante o inverno, e este, caracteristicamente seco, possui temperaturas mais amenas em virtude da freqüente invasão das massas de ar frias originárias das áreas extratropicais.

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CLIMA

A área de estudo está submetida ao domínio de climas equatoriais e tropicais quentes, com pequena variação térmica sazonal anual (IBGE, 1989). Sendo uma das principais propriedades climáticas desta realidade o fato de estar situada em uma área de transição entre climas tropicais continentais recobertos de cerrado e climas equatoriais continentais recobertos com floresta amazônica. Da mesma maneira a localização continental distante entre 1.400 e 2.000 km do oceano Atlântico, lhe confere padrões climáticos sazonais, com alternância entre uma estação úmida (de novembro a abril) e uma estação seca (de maio a setembro). De acordo com SEPLAN (2001), os climas relacionados à área de estudo têm suas características relatadas a seguir: • IIIA2a: clima representativo para a região, com predomínio do topo da Chapada dos Guimarães, com altitudes variando entre 600 e 700 metros, temperatura mínima variando entre 17 e 18 graus, máximas variando entre 29 e 30 graus, com uma média de 5 meses de seca e um total de precipitação anual de 1.650 a 1.990 mm. • IIIC7: Clima representado para a região como sendo característico de serras e nascentes do Alto Cuiabá. Possui temperaturas mínimas variando entre 18,3 e 19,9 graus e máximas variando entre 30 e 31,8 graus. Possui total de precipitação variando entre 1.600 e 1700 mm/ano em elevações que variam de 300 a 550 metros de altitude. • IIID3a: clima da região denominada ―Baixada Cuiabana‖ ou ―Depressão Cuiabana‖, esta localizada sob altitudes variando de 200 a 300 metros, com precipitação anual variando entre 1.400 e 1.600 mm, temperaturas mínimas entre 19,8 e 20,4 graus e máximas variando entre 31,8 e 32,4 graus. Possui média de 5 meses de seca por ano.

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A importância de se adotar a bacia hidrográfica como unidade territorial está ligada ao fato de que suas características estão intimamente relacionadas com a produção de água. A área de uma bacia hidrográfica tem influência sobre a quantidade de água produzida, e a forma e o relevo atuam sobre a taxa ou sobre o regime desta produção de água, assim como sobre a taxa de sedimentação. O padrão de drenagem, por sua vez, afeta a disponibilidade de sedimentos e a taxa de formação do deflúvio. O Modelo Numérico de Terreno da BHRM possui altitudes variando de 220 metros na foz do rio Manso ate 860 metros de altitude na cabeceira, em Campo Verde, e em Nova Brasilândia. Possui uma elevação média na bacia de 540 metros. Observa-se que grande parte da BHRM é evemente ondulada, como o aplainamento da baixada cuiabana. Um relevo mais acentuado é encontrado na região do município de Chapada dos Guimarães. Observa-se que o rio Manso possui seu trecho basicamente, sem grandes acidentes. Somente na região próxima à cabeceira, no trecho correspondente entre aproximadamente 540 e 860 metros, é que se nota uma variação mais abrupta de altimetria. E essa variação, está resumida em apenas aproximadamente 19,63 Km de distância, o que representa apenas uma pequena parcela diante da elevação longitudinal de todo o restante do rio, dentro da BHRM.

Altimetria da área de estudo e o reservatório Aproveitamento Múltiplo de Manso (Xavier, et al., 2009).

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Contexto A pesca esportiva é uma atividade praticada por pessoas de todos os extratos sociais, de todas as idades e em todo o mundo. Estimativas apontam, por exemplo, que nos EUA são 40 milhões de aficcionados, 30 milhões no Brasil e 5 milhões na Argentina. A sua grande maioria, são obrigados a viajar e demandam serviços para o desenvolvimento da atividade e por isso, são enquadrados como turistas. O I Congresso Internacional de Pesca Esportiva e Turismo, realizado na Argentina em 2002 apontou, em uma análise geral, que a pesca esportiva esta dotada de vários elementos que a fazem de uma ferramenta válida e merecedora de maior atenção para o desenvolvimento de inúmeras regiões, sobretudo: a) Porque é uma atividade amigável com o meio ambiente. O crescimento do turismo mundial esta centrado nas atividades geradoras de baixo impacto ambiental e ao ar livre. Os conceitos modernos aplicados a pesca esportiva implica uma integração com a natureza; b) Porque contempla aproxidamente 25% da população adulta e de todos os extratos sociais. Também é uma atividade que incorpora pessoas do sexo feminino e crianças, a partir do avanço da "pesca sem morte". As pessoas de idade avançada também a praticam, tanto pela modernização dos equipamentos e dos meios de transporte; c) Porque tem uma alta capacidade na distribuição do turismo. O turismo se caracteriza por concentrar-se em destinos de grande atração ou hábiamente divulgados. A pesca esportiva garante uma maior distribuição espacial, uma vez que os locais de sua prática estão distantes dos centros urbanos e concentradores de turistas, expandido as possibilidades de seus benefícios a áreas marginais; grande diversidade de espécies e destinos em distintas latitudes e ecossistemas. e) Porque a qualidade dos serviços prestados responde ao nível de demanda de cada um dos segmentos que compõem o mercado. 15


A pesca esportiva tem se transformado em uma importante atividade de lazer em diferentes culturas (COWX, 2002; COOKE & SUSKI, 2004), d) Porque possuem um amplo calendário de pesca. A partir de uma transformando-se em um importante segmento turístico em diversos países (ALBANO; VASCONCELOS, 2013; STOECKL, GREINER, MAYOCCHI, 2006), destacando-se como atividade de importância social e de geração de renda para grandes economias (PITCHER e HOLLINGWORTH, 2008), como aos EUA (MUONEK e CHILDRESS, 1994; SIEPKER et al., 2007), Austrália (MCLEAY et al., 2002; BROADHURST et al., 2005), União Europeia (AAS et al., 2002; VEIGA et al., 2011), e inclusive ao Brasil (FABRI, 2006; HOLLEY et al., 2008; SOBREIRO et al., 2010). Estimativas apontam 730 milhões de praticantes da pesca esportiva em todo o mundo (ARLINGHAUS et al.,2009). Estados Unidos O mercado norteamericano é um dos mais promissores, com cerca de 40 milhões de pescadores esportivos e com alta capacidade de consumo de serviços e produtos relacionados. O principal destino dos pescadores esportivo norteamericanos na América do Sul, é a Argentina. Estes pescadores são predominantemente praticantes da modalidade fly / catch & release (moscas/ pesque e solte). Dados da Secretaria Nacional de Turismo e Esporte da Argentina (2009), 70% dos pescadores esportivos oriundos dos EUA, 70% viajam em primeira classe e entre 50% a 60% realizam uma segunda viaje no intervao de dois anos. Seu tempo de permanência na Argentina é em média duas semanas, dos quais três dias são gastos em Buenos Aires. Segundo a Direccion de Pesca del Chubut (uma das provincias na Argentina) 67% dos visitantes estrangeiros que visitam o noroeste desta província, são pescadores esportivos norteamericanos, que injetam na ecomonia local mais de US$ 200 milhões/ ano. Holanda A Holanda é um dos paises europeus com maior número de aficcionados da pesca esportiva, dados não oficiais apontam mais de 4 milhões de pescadores esportivos. Estes pescadores possuem alto poder aquisitivo e desenvolvem a pesca esportiva em média duas vezes ao ano, em sua maioria na Europa. A Argentina destaca a Holanda entre os paises com maior número de pescadores esportivos que praticam a pesca de fly / catch & release na região da Patagônia, cujo principal atrativo é a pesca controlada de salmonídeos. Curiosamente, esta mesma

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justificativa é dada aos pescadores brasileiros que visitam a Patagônia.

Espanha O número de pescadores esportivos espanhóis ultrapassa a 1 milhão. A sobrepesca em águas continentais e em suas costas, faz com que estes pescadores esportivos procurem outros paises europeus para a sua prática. Estes pescadores são atraídos para o continente sul-americano sobretudo pela facilidade do idioma, e tem seu principal destino a Argentina. Os espanhóis são muito atentos a qualidade dos serviços oferecidos, a organização e cuidados aos recursos pesqueiros; provavelmente, este sejam os principais diferenciais oferecidos pela Argentina que agradam os Espanhóis. Japão O mercado é um dos mais expressivos e extremamente disputado pelos principais destino de pesca mundial, pelo alto poder aquisitivos dos pescadores. Os pescadores esportivos japoneses são predominantemente composto por pessoas de terceira idade, aposentados e que são estimulados a viajar em função da alta densidade populacional residente. A pesca, para estes, é uma ferramenta milenar anti stresse e fortemente estimulada pelas empresas nipônicas. O Japão é tradicionalmente um país vinculado a pesca industrial, esportiva e ao consumo de pescado. Sua concepção moderna esta sendo incorporada nos últimos anos com o crescente número de revistas e programas de televisão especializados. Há um grande número de instrutores (guias) de pesca em todo o país. As estimativas oficiais apontam que são mais de 20 milhões de pescadores esportivos japoneses que viajam ao exterior, sobretudo para a Ásia, América do Norte, América Central, Oceania, Ilhas do Pacifico Sul, África e América do Sul, nesta ordem de preferência. Na América do Sul o destino preferido é a Argentina. Homens e mulheres da terceira idade compõem o mercado que mais viaja e foi considerado pela Secretaria Nacional do Turismo e Esporte da Argentina como um dos segmentos mais interessantes, estratégicamente, para a pesca esportiva argentina. Outro segmento relacionado a esta demanda, são os altos executivos de diversas empresas japonesas que residem nos países sul-americanos.

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Turismo de pesca A pesca amadora vinculada ao turismo, tem causado grande impacto na economia local, sobretudo na criação de trabalho e renda. Sua expansão foi significativa na década de 90, tornando-se uma atividade geradora de 200 mil empregos diretos e indiretos, movimentando 1 bilhão de reais por ano (FABRI, 2006; HOLLEY et al., 2008). Nos últimos 20 anos, a atividade tem apresentado forte crescimento em âmbito nacional. O que era uma atividade de lazer transformou-se em uma indústria limpa, movimentando milhões de reais anualmente, em segmentos tão diversos como: a importação e exportação de equipamentos de pesca, a aquicultura, o turismo e a mídia especializada (SCHORK et al., 2010). Em 2010 estimativas apontavam a existência de cerca de 25 milhões de pescadores esportivos brasileiros (SCHORK et al., 2010). A prática da pesca amadora é muito antiga em todo território nacional; entretanto o conceito de "turismo de pesca" é uma estratégia recente do mercado nacional em classificar os diferentes segmentos turísticos a partir de elementos de identidade, oferta e suas características operacionais. Esta tentativa de enserir a pesca amadora como componente turístico, descreve a modalidade como algo sustentável, de grande viabilidade ambiental, passível de ser planejada e regulamentada. A tentativa do poder público em construir um marco regulatório para o "turismo de pesca" fundamenta-se em dois pilares: são movimentos turísticos em larga escala que ocorrem em territórios específicos em razão da presença de espécies singulares de peixes e, o pescador amador tem um perfil diferenciado em função de sua atividade turística ser motivada pelo usufruto dos recursos naturais de forma sustentável. Assim, preliminarmente, o "turismo de pesca" comporta-se como um segmento do turismo que se efetiva no mercado em função da prática da pesca amadora, incluindo como elementos acessórios o receptivo, operação, agenciamento, transporte, hospedagem, alimentação, eventos e atividades complementares.

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Outras tipologias do turismo tem interfaces com a pesca amadora, em particular o "turismo rural" e o "ecoturismo". No primeiro, em razão da pesca amadora ocorrer em áreas rurais, distante dos grandes centros urbanos, no contexto da ruralidade ribeirinha; no segundo, os vínculos existem em função da pesca amadora ser de baixo impacto, contribuir com a geração de emprego e renda em nível local, e pelo fato dos seus praticantes atuarem em áreas de elevado valor paisagístico e natural, contemplando e usufruindo das belezas locais.

Piraputanga Brycon microlepis Perugia, 1894 (Foto Fazenda Barra Mansa)

Peixe de hábito onívoro que se alimenta de pequenos peixes, frutos, flores e insetos. Habita pequenas correntezas, remansos de corixos e embaixo de plantas frutíferas. Pode atingir 50 cm de comprimento e 3 Kg de peso. Espécie apreciada pela culinária regional e considerada "game fisher " pelos pescadores esportivos de fly.

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Marco regulatório O primeiro documento direcionado à pesca no Brasil foi o Decreto No. 447 de 19 de maio de 1846 (revogado) que pioneiramente buscou regulamentar a permissão da pesca, a catalogação de embarcações e efetivar a devida matrícula de pescadores atuantes nesse ramo de atividade. Na legislação brasileira, a pesca é regulamentada basicamente pelo Decreto -Lei nº 221, de 28 de fevereiro de 1967 e posteriores alterações. Contudo, com o lançamento deste Decreto-Lei, a atividade de pesca foi conceituada e regulamentada sendo oficialmente definida, classificada, e categorizada de acordo com sua finalidade,entendo-se que: a ―pesca é todo ato tendente a capturar ou extrair elementos, animais ou vegetais que tenham na água seu normal ou mais freqüente meio de vida‖, podendo a pesca efetuar-se com fins comerciais, desportivos, ou científicos. A legislação pesqueira vem sendo permanentemente alterada, preocupando-se não só com a espécie alvo da pesca, bem como com os fatores que venham a propiciar a formação de estoque pesqueiro nos recursos hídricos do país com a garantia da reprodução e existência das espécies de peixes, em particular, durante o defeso, conhecido também como piracema. A manutenção da qualidade do meio ambiente aquático, sua preservação e conservação, são preocupações da legislação vigente, devidamente amparada pela Constituição Federal de 1988, que estabeleceu: Art. 225. "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial do à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade e o dever de defendê-lo e preservá-lo para os presentes e futuras gerações".

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A partir deste norteador, em quase todos os setores da economia cresce a preocupação com os recursos naturais, sua preservação, e conservação, em razão do aumento da conscientização ambiental e das ações de vários governos para resolver seus problemas ambientais, particularmente após a ECO-92, e, guiando-se pelas recomendações da Agenda 21. Nessa tendência mundial, a pesca esportiva não poderia ficar de fora, orientando-se pela necessidade inerente em se adotar práticas mais sustentáveis, sobretudo junto as comunidades e grupos residentes em áreas de inestimável valor ambiental, bem como para os adeptos e praticantes da pesca esportiva. A atenção da gestão pública brasileira para a pesca amadora evidenciou-se em 1998, a partir de uma parceria entre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), o Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR) e pela cooperação técnica do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), criou-se o Programa Nacional de Desenvolvimento da Pesca Amadora (PNDPA). O Programa Nacional de Desenvolvimento da Pesca Amadora – PNDPA teve por objetivo, transformar a pesca amadora em instrumento de desenvolvimento socioeconômico e de conservação ambiental. Sua atuação foi decisiva na criação e fortalecimento dos instrumentos legais voltados para a pesca amadora e na manutenção cultural e dos interesses de populações ribeirinhas. No entanto, as práticas e visões de orientação ao setor dependeria também do fortalecimento das políticas ambientais e de reposicionamentos no mercado. A disposição de governos, mercado e setores da sociedade civil na análise de suas necessidades e consequências das práticas de implementação, gerou uma pespectiva inversa do consenso, qual seja, a de que o poder público deveria ser unicamente responsável pelas ações, estratégias, inovação e tecnologia, que resultassem na sustentabilidade da pesca esportiva, como algo realizável, viável, exequível e efetiva na redução dos impactos negativos causados. Assim, diante desta realidade distorcida, impossibilitou a manutenção do PNDPA.

comprometeu e

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A pesca esportiva ganha seu devido reconhecimento dada pela Portaria IBAMA nº 4, de 10 de março de 2009 - que estabeleceu normas gerais para exercício da pesca amadora em todo território, definindo em seu artigo 2º. I - Pesca Amadora – aquela praticada por brasileiros ou estrangeiros com a finalidade de lazer, turismo e desporto, sem finalidade comercial; II - Pesca Esportiva – modalidade de pesca por brasileiros em que é obrigatória a prática do pesque e solte, sendo vedado o direito à cota de transporte de pescadores, prevista na legislação.

Entretanto, a Portaria IBAMA nº 4, de 10 de março de 2009 foi revogada pela Lei Federal 11.959, de 29 de junho de 2009, estabelecendo a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca, definindo no seu Artigo 8o as modalidades de pesca em "comerciais" e "não-comerciais": I – comercial: a) artesanal: quando praticada diretamente por pescador profissional, de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, desembarcado, podendo utilizar embarcações de pequeno porte; b) industrial: quando praticada por pessoa física ou jurídica e envolver pescadores profissionais, empregados ou em regime de parceria por cotas-partes, utilizando embarcações de pequeno, médio ou grande porte, com finalidade comercial. II - Não Comercial: Cientifica: quando praticada por pessoa física ou jurídica com finalidade de pesquisa cientifica; Amadora: quando praticada por brasileiro ou estrangeiro, com equipamentos ou petrechos previstos em legalização especifica , tendo por finalidade o lazer ou o desporto; De subsistência: quando praticada com fins de consumo doméstico ou escambo sem fins de lucro e com a utilização de petreches previstos em legislação especifica.

Apesar da ausência de um marco regulatório nacional para a pesca esportiva, vem sendo normatizada sob o rótulo de "pesca amadora" - uma atividade permissível de ser praticada por indivíduos que abatem seu pescado e os transportam às suas cidades de origem, observando o direito à cota de trasporte, prevista na legislação. Contrariamente, a pesca esportiva é a modalidade em que é obrigatória a prática do pesque e solte, sendo vedado o direito à cota de transporte por pescadores.

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Apesar do "turismo de pesca" ser considerado de baixo impacto, não está livre de críticas. Diversos segmentos da sociedade responsabilizam o segmento como responsável por graves impactos ambientais, sobretudo por ter entre seus clientes "pescadores amadores" que descumprem as normas de acesso aos recursos pesqueiros, ou quando tais práticas colocam em risco alguns ecossistemas considerados "críticos" para as diversas fases do ciclo de vida e reprodução das espécies de peixes (ALBANO & VASCONCELOS, 2013; COOKE & COWX, 2004). Não há dúvidas que a falta de um marco regulatório que diferencie "pesca amadora" de "pesca esportiva" compromete ainda mais o desenvolvimento do turismo de pesca no Brasil. Apesar das dificuldades o "turismo de pesca" vem se destacando como opção de desenvolvimento para determinadas regiões, especialmente pela capacidade de promover a conservação dos recursos naturais nos destinos turísticos. Para tanto, o planejamento e a operacionalização desse segmento deve ocorrer de forma integrada entre gestores públicos, ambientais e de turismo, órgãos fiscalizadores, comunidades locais, prestadores de serviços turísticos e demais parceiros da iniciativa privada.

No contexto de se criar novas alternativas para o desenvolvimento do "turismo de pesca", a pesca esportiva de fly pode se tornar uma fonte significativa de renda para o Estado e comunidades locais. Para o primeiro, pela criação de novos impostos e pelo elevado índice de consumo por servicos e produtos; para o segundo, injetando expressivos volumes de recursos, gerando novos empregos, aumentando a renda per capita local e principalmente, reduzindo a dependência do extrativismo e da "pesca amadora". A pesca esportiva de fly, em todos os países que a possuem, fomenta o desenvolvimento local dos chamados ―sítios de pesca", ou seja, locais especialmente projetados para a prática sustentável da pesca esportiva de fly, onde pescadores devidamente autorizados, usufluem de um conjunto de atividades de suporte, devidamente certificados e comprometidas quanto a necessidade em preservar rios, lagos, açudes, represas, suas matas ciliares e demais elementos do seu entorno, da conservação das diferentes espécies de peixes, inclusive para a sua própria continuidade. A modalidade de pesca chegou no Brasil há pouco mais de cinquenta anos. Existem atualmente, nos dados do registro da atividade de pesca amadora do MPA, cerca de pouco mais de 4 mil pescadores amadores que se declaram como mosqueiros, expressão típica que descreve os pescadores esportivos de praticam esta modalidade da pesca esportiva. O número de adeptos desta modalidade vem crescendo cerca de 20% ao ano.

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A pesca amadora Pelas suas peculiaridades, os pescadores amadores podem ser classificados como generalistas, já que podem interromper suas estratégias de pesca mais facilmente, mudar de espécie-alvo, de petrechos, de métodos e sofrer menos com as adversidades oriundas de ocorrência ou mesmo ambientais. O maior atrativo para quem a pratica é o peixe, em quantidade e peso adequado. As espécies - alvo são selecionadas conforme a sazonalidade e período de atividade (diurno e noturno). A socialização entre amigos, proporcionada pelas viagens coletivas aos destinos de pesca, tornou-se um atrativo a mais de quem a pratica. Os operadores do "turismo de pesca" reconheceram este comportamento e suas potencialidades econômicas, oferecendo ao mercado, pacotes especiais para atendimento a esta demanda. Na pesca amadora a escolha de dos equipamentos (petrechos de pesca) está relacionada ao ao tipo e sazonalidade dos recursos, período de atividade (noturno e/ou diurno), e às condições ambientais locais. Seus petrechos de pesca são diversificados e pouco seletivos que incluem: varas (caniços), carretilhas, molinetes, sonares (ecosondas), anzóis (em grande parte com farpa), iscas artificiais, garatérias, chumbadas, alicate de contenção, bicheiros, puças, tarrafas para captura de iscas, linha de mão, espingarda de mergulho ou arbalete com qualquer tipo de propulsão e qualquer tipo de seta, etc. O tipo de linha, tipo e tamanho de anzóis pode variar, conforme a espécie, o tipo de isca e o local. O uso de "chumbada" e o grande volume de perda em uma pescaria tornou-se uma preocupação ambiental recente, apesar da existência de "chumbadas ecológicas" fabricadas com argila, areia e pó de pedra, tornando-as biocompatíveis com o fundo dos rios.

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A pesca amadora pode ser exercida em várias modalidades, seja embarcada, desembarcada ou mesmo subaquática. Na modalidade embarcada, o tipo de embarcação utilizada influencia diretamente o tamanho da equipe, tempo de duração das viagens e a capacidade de desembarque de pescado. No "turismo de pesca" tem se popularizado em algumas regiões, os chamados "barco hotel" - embarcações espaçosas que permite acomodar, em alguns casos, até 80 pescadores. A estrutura disponibilizada, permite armazenar um grande volume de pescado, já que muitas possuem sistema de refrigeração (câmaras frias) de grande porte. A manutenção da refrigeração do pescado consome um grande volume de combustível e/ou energia elétrica. Apesar dos custos elevados de manutenção destas embarcações, a opção de atrair "grupos de pesca" viabiliza suas operações, tornando acessível os valores praticados pelos pacotes turísticos por pescador. Entretanto, dada a calagem e a força propulsora, estas embarcações tem uma navegabilidade limitada. O uso de lanchas motorizadas de apoio, tornou-se uma alternativa prática que garante uma permanente e ampla movimentação do grupo pela área de pesca, visando alcançar os locais de difícil acesso e de maior piscosidade. A pesca com ancoragem da embarcação (apoitar) é prática comum, seja nas margens ou no canal do corpo d'água. Esta prática, geralmente resulta em conflitos com outros usuários do sistema, sejam pescadores profissionais, ribeirinhos, fazendeiros ou até mesmo outros pescadores amadores, que os reconhecem como invasores de seus sítios de pesca. A pesca amadora de barranco é a modalidade mais simples e mais praticada em todo o mundo. Tem suas limitações impostas ao acesso ao local, tipo e as condições do solo, presença ou ausência de vegetação ciliar, profundidade aproximada do corpo d'água, se for água corrente sua velocidade, presença de obstáculos visíveis e submersos, entre outros. Na ausência de acomodações próximas e na possibilidade de passar muitos dias no local, os pescadores delimitam a área a ser ocupada, retirando os obstáculos (inclusive pequenos desmates) que possam dificultar a montagem de seus acampamentos. O armazenamento e a incineração dos resíduos gerados, assim como as latrinas, tem se tornado uma preocupação maior em decorrência dos sérios riscos sanitários que causam ao meio ambiente e ao homem. Na pesca amadora subaquática, ou caça submarina, tem sido praticada como "esporte de aventura" por utilizar-se de equipamentos e técnicas de mergulho livre, ou seja, em apneia. No caso dos praticantes do mergulho autônomo (com equipamentos para respiração subaquática) tem restrições legais, quando não proibidas a sua prática. Em todos os casos, a pesca subaquática se utiliza de um arpão, este solto ou armado em um arbalete ou em uma arma pneumática, para capturar os peixes.

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Apesar de polêmica, seus defensores apontam como a modalidade de pesca amadora que causa menos impacto ambiental, se praticada em apneia, graças a possibilidade de seleção dos animais (sendo possível a escolha da espécie, tamanho) e baixa geração de resíduos. A eficácia da captura de peixes, seja na pesca amadora embarcada e não embarcada é resultante do uso de certos equipamentos, muitas vezes selecionados por tentativas e erros. Em algumas ocasiões, os pescadores amadores dependem do conhecimento empírico de pescadores profissionais ou ribeirinhos para o sucesso de suas pescariais. Independente da submodalidade, o pescador amador raramente interage com a comunidade local; quando a faz é pela necessidade em adquirir iscas-vivas ou algum item de consumo em falta, ou na disputa pelo recursos, estabelecendo em alguns casos, conflitos por interesses comuns. Fazem uso de iscas artificiais e, sobretudo de iscas naturais, muitas vezes transportadas por longas distância e quando armazenadas em condições precárias, as perdas tornando-se um custo adicional. Seus anzóis preferencialmente possuem farpas - que podem causar estresse e dilacerações ao serem retirados do animal, além de riscos de acidentes aos próprios pescadores. São motivados a embarcarem o pescado e à transportá-los, observando as cotas e tamanhos mínimos previstos na legislação e, a existência de grandes volumes de gelo para a manutenção do pescado. O tempo de duração das pescarias, nas diferentes modalidades amadoras apresentadas, depende invariavelmente da produtividade local, das limitações impostas pela legislação (ex. cota de captura) e da capacidade de armazenamento, conservação e transporte do pescado. A redução das "cotas de captura", associada a redução da piscosidade dos rios, também contribuiu com a redução do tempo destas pescarias, o que causou, no primeiro momento, uma redução do turismo de pesca. Neste cenário de redução dos estoques pesqueiros e a instituição de normas mais rígidas, incluindo o estabelecimento de cotas de captura e a proibição de captura de certas espécies, o turismo de pesca encontrou na pesca esportiva uma alternativa que assegurou os investimentos já realizados. A prática do "pesca e solte" e a redução de cotas de captura influenciado a "migração" de pescadores amadores para a pesca esportiva, seja pelas mudanças nas legislações que impuseram novas regras e punicões, seja pela mudança de postura frente a redução dos estoques pesqueiros.

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A pesca de fly Os pescadores esportivos de fly podem ser classificados como especialistas, já que atuam intensivamente em ambientes específicos, sob espécies e métodos prédefinidos. Por estas peculiaridades, seus investimentos são maiores e inflexíveis, uma vez que eventos adversos dificultam a mudança de estratégias, o que implica em riscos pessoais e econômicos. Para o pescador esportivo de fly, os atrativos principais são espécies esportivas e a contemplação da natureza ao seu entorno. Nesta modalidade, as pescaria ocorrem unicamente no período diurno, já que a visibilidade no arremesso é fator determinante nesta modalidade. As espécies são escolhidas por sua "esportividade", ou seja, por desempenharem força bruta ou astúcia em sua captura. O que exige técnicas de captura específicas e elaboradas. Os chamados "peixes esportivos" (game fish) podem despertar interesse ao pescador esportivo em uma região ou nenhum interesse em outra região; isto demonstra que as espécies alvo são definidas conforme o contexto regional. Entretanto, independente da região a contemplação e a interação com a paisagem e seus elementos, é fator primordial nesta modalidade. O número de pescadores esportivo de fly formadores de "grupos de pesca" é relativamente pequeno, pois sua prática e técnica de lançamento das "moscas" limita o número de pescadores, embarcados ou não. Os pescadores de fly investem em sua formação técnica, participado de cursos, treinamentos, workshop e seminários específicos sobre a modalidade e acessam um grande volume de publicações que tratam de suas técnicas. São participantes de feiras de pesca e similares, sempre em busca de informações, produtos e serviços.

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Nesta modalidade, o uso de pequenas embarcações motorizadas é opcional. As embarcações preferidos são voadeiras ou bass trackers de alumínio, bass boats de fibra de vidro e principalmente, inflatable boots (botes infláveis) com um barqueiros e dois pescadores por barco.Quando atuam desembarcados (em barranco), as equipes são reduzidas e extremamente seletivas ao local de pesca. Preferencialmente atuam em áreas abertas, águas rasas, de corredeira e sem obstáculos que garantam o perfeito lançamento e recolhimento de suas moscas. Os equipamentos utilizados pelo pescador esportivo de fly são extremamente seletivos, quanto a espécie - alvo e seu tamanho. O equipamento é composto por vara (longa e flexível), carretilha, backing (linha reserva), linha (linha da mosca), líder, tippet e a mosca (anzol sem farpas) na ponta. Pode variar de tamanho dependendo do peixe que se quer capturar, a numeração do equipamento vai de #0 a #15. Seus anzóis (moscas) são construidos artesanalmente, com o uso de penas, pêlos, linhas e outros materiais sintéticos que emitam quanto a forma e coloração, pequenos artrópodes, peixes e frutas existentes no local e que compõem a dieta das espécies-alvo. A técnica consiste em equilibrar o peso da linha e da mosca e arremessa-la ao ponto desejado, através de movimentos constantes e sincronizados de "vai e vem" ou "chicotear". Outra característica desta modalidade é que na maioria dos casos o próprio pescador confecciona sua mosca.

No rio Manso, a jusante da PCH, serão utilizados botes infláveis e não motorizados. Não haverá ancoragem (apoitar) e a flutuação será lenta, silenciosa e unidirecional (rio abaixo); quando muito, um pequeno motor elétrico será acionado para aproximação das margens, travessias de pequenas correntezas ou para contornar obstáculos. 30


O Pesque e Solte (Catch & Release) é o ato de capturar o peixe, admirá-lo, fotografá-lo e devolvê-lo rapidamente à água, zelando para que os impactos sofridos não comprometam sua sobrevivência. Este é um procedimento de caráter obrigatório, adotado nesta modalidade no mundo todo.

A ausência de farpas nas "moscas" reduz o estresse e possíveis danos durante a captura dos peixes. A sensação de que o peixe escapa facilmente nos anzóis sem farpa não corresponde à realidade. Mesmo nos peixes esportivos e saltadores, cabe ao pescador manter a linha tensionada. Outra prática no fly é o uso de anzóis feitos com material de rápida corrosão, que em caso do animal escapar e levar consigo o anzol, poucos dias se solta. Na modalidade esportiva com fly não se faz uso de "chumbada", o que reduz os riscos ecológicos da modalidade. O contato com a comunidade local é desejável, sobretudo para se conhecer os ambientes preferenciais e hábitos dos peixes encontrados na localidade. Pelas especificidades que a modalidade impõe ao pescador esportivo, raramente são estabelecidos conflitos com outros pescadores. Nos chamados "sítios de pesca de fly" a comunidade local atuam como voluntários na fiscalização ambiental, já que são dependentes da integridade ambiental e da manutenção da pesca esportiva, como garantia de trabalho e renda.

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Síntese comparativa Parâmetros

Pesca Amadora

Pesca Esportiva de Fly (*)

1. Perfil dos pescadores 1.1. Classificação 1.2. Estratégias de pesca 1.3. Adversidades do meio 1.4. Escolha da área de pesca 1.5. Período de atividade 1.6. Espécie-alvo

Generalistas Diversificada Muito flexível Flexível Diurno e noturno Diversificada

Especialistas Especializada Pouco flexível Determinante Diurno Específica

2. Modalidades 2.1. Embarcada 2.2. Desembarcada 2.3. Subaquática / Apnéia 2.4. Subaquática / Mergulho Autônomo 2.5. Pesca e solte

Sim Sim Sim Sim Opcional

Sim Não Não Não Sim

3. Estratégias de organização 3.1. Número de participantes / equipe 3.2. Período de permanência / viagem 3.3. Estrutura de apoio

10 (média) 7 dias (média) Fixa

3 (média) 4 dias (média) Fixa / Móvel

4. Equipamentos e técnicas 4.1. Petrecho de pesca 4.2. Anzol 4.3. Chubada 4.4. Embarcações a motor 4.5. Embarcações infláveis 4.6. Refrigeração do pescado 4.6. Barco Hotel 4.7. Tarrafas / captura de isca 4.8. Sonar / localização de cardumes 4.9. Ancoragem da embarcação

Diversificado Com farpa Sim Sim Não Sim Sim Sim Sim Sim

Especializado Sem farpa Não Não Sim Não Não Não Não Não

5. Impactos ambientais 5.1. Resíduos sólidos 5.2. Combustíveis 5.3. Iscas-vivas 5.4. Resíduos sanitários 5.5. Montagem de acampamentos 5.6. Pesca predatória 5.7. Poluição atmosférica/incineração 5.8. Erosão de margens 5.9. Poluição sonora/ruído de barcos 5.10. Ocupação de áreas de praia

Sim/alta Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim

Sim/reduzida Não Não Sim Não Não Não Não Não Não

Sim Sim

Não Não

6. Participação em conflitos 6.1. Pelo recurso pesqueiro 6.2. Pela área de pesca (*) Rio Manso - MT

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Conceito: Impacto Ambiental A terminologia "impacto ambiental, na maioria das vezes é associada a algum dano à natureza, como a mortandade de peixes após o vazamento de produtos químicos no mar ou no rio ou, quando qualquer imagem "choca" ou "impacta" a opinião pública. Essas situações, tratam, indubitavelmente, de um impacto ambiental derivado de uma situação indesejada, que é o vazamento de um produto químico. Na literatura há inúmeros conceitos de impacto ambiental, como por dexemplo: "Qualquer alteração no meio ambiente em um ou mais de seus componentes - provocada por uma ação humana " (Moreira, 1992). "O efeito sobre o ecossistema de uma ação induzida pelo homem" (Westman, 1985). "A mudança em um parâmetro ambiental, num determinado período e numa determinada área, que resulta de uma dada atividade, comparada com a situação que ocorreria se esssa atividade não tivesse sido iniciada" (Wathern, 1988). "Qualquer modificação do meio ambiente, adversa ou benéfica, que resulte, no todo ou em pate, das atividades, produtos ou serviços de uma organização" (Norma NBR ISO 14.001: 2004). A Resolução CONAMA No. 1/ 86 em seu artigo 1o. estabelece impacto ambiental como: "Qualquer alteração das propriedades físicas, químicas ou biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas, que direta ou indiretamente afetem: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividade sociais e econômicas III - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; IV - a qualidade dos recursos ambientais".

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Se impacto ambiental é uma alteração do meio ambiente provocada por ação humana, então é claro que tal alteração pode ser benéfica ou adversa. Mais que isso, todo e qualquer projeto poderá trazer diversas alterações ambientais, sejam negativas e/ou positivas. No presente estudo estamos considerando todo e qualquer impacto que poderia ser causado pela ação humana, que implique: 1. Supressão de certos elementos do ambiente, a exemplo: a) supressão da vegetação, dos recursos pesqueiros, etc; b) destruição de habitats; c) destruição de componentes físicos da paisagem (ex. escavações); d) supressão de referências físicas à memória da população; e) supressão de elementos ou componentes valorizados do ambiente (paisagensm, cavernas, etc); 2. Inserção de certos elementos no ambiente, a exemplo de: a) introdução de uma espécie exótica (ex. patógenos); b) introdução de componentes construídos (rodoviais, edifícios, áreas urbanizadas, etc); 3. Sobrecarga (introdução de fatores estressantes, além da capacidade de suporte do meio, gerando desequilíbrio), a exemplo de: a) qualquer poluente; b) introdução de uma espécie exótica (exemplo: predadores) c) redução do hábitat ou da disponibilidade de recursos para uma data espécie; d) aumento da demanda por bens e serviços públicos (ex. educação, saúde, etc) Neste relatório, "impacto ambiental" é o resultado de uma ação humana, que é sua causa. Há de se tomar todo cuidado com a noção de impacto ambiental como resultado de uma determinada ação ou atividade, não o confundindo com ela. Assim, a atividade pesqueira não é um impacto ambiental; a pesca causa impactos ambientais.

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Conceito: Risco ambiental O efeito de um impacto pode ser positivo ou negativo. Já o efeito de um risco é sempre negativo, adverso. Os estudos de risco incluem sempre o conceito de probabilidade; os de impactos, não necessariamente. O risco é conceituado como a contextualização de uma situação de perigo, ou seja, a possibilidade da materialização do perigo ou de um evento indesejado ocorrer. Uma substância perigosa não identificada e armazenada em recipientes mal vedados representa um risco maior do que uma situação em que há identificação clara da substância, quando as pessoas que a manuseiam conhecem sua periculosidade e há procedimentos de segurança para o seu manuseio. Como definido pela Society for Risk Analysis, risco é o potencial da realização de consequências adversas indesejadas para a saúde ou vida humana, para o ambiente ou para bens materiais. Risco pode ser definido de modo mais formal como o produto da probabilidade de ocorrência de um determinado evento pela magnitude das consequências. São vários os conceitos de riscos, mas um ponto comum entre eles é a inclusão da noção de probabilidade. Assim, o risco também é definido como a medida da probabilidade e da severidade de efeitos adversos. O grau do risco é função do efeito adverso que pode resultar de uma ação particular. Entre os diferentes tipos de risco existentes, podemos citar o econômico, o de vida e saúde e o risco ambiental.

RISCO AMBIENTAL O risco ambiental pode ser classificado de acordo com o tipo de atividade, exposição (instantânea,crônica), probabilidade de ocorrência, severidade, reversibilibilidade, visibilidade, duração e a ubiqüidade de seus efeitos (Sors, 1982). No concontexto da gestão governamental, o risco ambiental pode ser também classificado como: saúde pública, recursos naturais, desastres naturais, e introdução de novos produtos.

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Para a Organização das Nações Unidas para a Proteção Ambiental (United Nations Environmental Proteccion - UNEP), o risco ambiental pode ser classificado como: • Risco direto: probabilidade de que um determinado evento ocorra, multiplicada pelos danos causados por seus efeitos. • Risco de acidentes de grande porte (catástrofe): caso especial de risco direto em que a probabilidade de ocorrência do evento é baixa, mas suas conseqüências são muito prejudiciais. • Risco percebido pelo público: a percepção social do risco depende em grande parte de quem é responsável pela decisão sobre aceitá-lo ou não.

TIPOS DE RISCOS AMBIENTAIS A pesca, como atividade de risco, pode causar danos ambientais, seja no transporte e armazenamento de produtos químicos, o lançamento de resíduos sólidos e líquidos (poluentes) e até mesmo a introdução de patógeno ou organismos exóticos. Essas situações podem causar danos materiais, ao ecossistema, à saúde humana e, não raramente, causam os três tipos de danos. Dentre os chamados riscos ambientais das operações pesqueiras, destacam-se os chamados Riscos Tecnológicos Ambientais (RTA) Os Riscos Tecnológicos Ambientais (RTAs) incluem todos os problemas relativos aos contaminantes ambientais, lançados por vazamentos ou explosões, que de uma maneira ou de outra, traz sérios riscos à saúde humana e aos ecossistemas. É fundamental ressaltar que os RTAs podem ser controlados tanto na probabilidade de ocorrência quanto nas conseqüências. Na presente avaliação de impacto ambiental, a preocupação com o risco normalmente se refere a riscos tecnológicos; dentre destes, são os riscos agudos os que mais chamam a atenção. No entanto, em muitos casos, riscos crônicos podem ser mais significativos que os agudos, como no exemplo de incinerar o lixo, caso onde, embora possa haver perigo de explosões ou vazamento de substâncias, são os eventuais danos à saúde que podem se manifestar a longo prazo a grande fonte de preocupação e, frequentemente, de polêmica. O reconhecimento de uma situação de risco depende de inúmeros fatores, dentre os quais inclui-se o tipo de risco. No âmbito dos riscos tecnológicos das operações pesqueiras, é mais fácil reconhecer um risco agudo do que um risco crônico.

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Tal situação decorre primordialmente do que fato de que, no primeiro caso, há facilidade em se estabelecer uma relação entre causa e efeito, o que não ocorre na maioria das situações de risco crônico. Ademais, o efeito é imediato, enquanto nos casos de risco crônico, como o nome diz, manifesta-se a médio ou longo prazo, como é o caso da introdução de espécies exóticas ou patógenas. O vazamento de combustível de uma embarcação traz efeitos imediatos e visíveis, ao passo que a liberação contínua de pequenas quantidades de poluentes pode não só trazer efeitos a longo prazo, mas também tornar incerta a conexão entre causa e efeito. Em tal situação, o reconhecimento das situações de risco é mais difícil. Ressaltamos ainda que a compreensão e aceitação do risco que se corre nas atividades pesqueiras, depende das informações fornecidas, dos dispositivos de segurança existentes, do retrospectivo da atividade e dos meios de informação.

ACEITAÇÃO DO RISCO

Como considerar se um risco é aceitável ou não? Para alguns, um risco é aceitável se houve algum benefício, enquanto outros sofrerão seus efeitos. Acumular resíduos perigosos, por exemplo é ótimo, desde que o armazenamento seja longe de nossas residências. Outros assumem que os benefícios deveriam suplantar os riscos. Os que praticam esportes perigosos com veículos, consideram que o prazer de dirigir suplanta o risco - ou, talvez, substimem o risco que correm. A maneira como as pessoas reagem ao risco nem sempre reflete sua probabilidade. Por exemplo, a probabilidade de morrermos vitimados por um ataque terrorista em um avião é pequena, se compararmos com a probabilidade de morrermos em um acidente de ônicus que faz o trajeto até o aeroporto. Entretanto, a maioria dos viajantes, estão mais preocupados com um possível ataque terrorista - ou, talvez, não estejam. A matemática tampouco responde a essa questão. Pode, sim, nos dar uma boa idéia dos perigos envolvidos em alguma atividade e, ainda, nos fornecer importantes subsídios para debate. O simples fato de que a matemática produz pequenas probabilidades de risco não significa que este seja imediatamente aceitável.

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Análise de risco Muito dos impactos negativos somente se manifestam em caso de anormalidade das operações. As consequências do mau funcionamento operacional da atividade pesqueira podem ser mais significativas do que os impactos decorrentes de seu funcionamento normal, os quais os chamamos de "riscos ambientais". O risco ligado a "acidentes" é legitimamente uma preocupação que deve ser levada em conta na análise dos impactos ambientais causados pela pesca. ESTIMATIVA, AVALIAÇÃO E GERENCIAMENTO DE RISCO A estimativa do risco é uma tentativa de estimar matematicamente as probabilidades de um evento e a magnitude de suas consequências. A avaliação do risco é a aplicação de um juízo de valor para discutir a importância dos riscos e suas consequêcias sociais, econômicas e ambientais. Já o gerenciamento de riscos é um terno que, para esse autor, engloba o conjunto de atividades de identificação, estimação, comunicação e avaliação de riscos, associado à avaliação de alternativas de minimização dos riscos e suas consequências. Se risco é entendido como a conjungação da probabilidade de que ocorra uma falha com a magnitiude das consequências, então o gerenciamento de riscos deve agir sobre ambos. Assim, medidas de prevenção de acidentes devem ser associadas a considerações sobre localização das operações de pesca. Avaliação de riscos é uma atividade correlata à avaliação de impacto ambiental, mas as duas se desenvolveram separadamente. ANÁLISE DE RISCO Em análise de risco, costuma-se diferenciar os conceitos de "perigo" e "risco". Perigo é definido como uma situação ou condição que tem potencial de acarretar consequências indesejáveis. O perigo é uma característica intrínseca a uma substância (natural ou sintética), uma instalação, um artefato ou um procedimento inadequado, por exemplo. Dentre as fontes de risco, há uma preocupação especial com as substâncias químicas perigosas, definidas pelo Convênio 174 da OIT como "toda substância ou mistura que, em razão de suas propriedades químicas, físicas ou toxicológicas, seja só ou em combinação com outras, represente um perigo". Há classificações internacionais de periculosidade de substâncias químicas e cada uma tem um código, conhecimento como "número ONU", que a identifica.

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Método de análise de risco O planejamento das operações da pesca esportiva com fly no rio Manso busca orientar ações de manejo, de forma a preservar um conjunto representativo e funcional dos ecossistemas, que garanta a manutenção dos estoques pesqueiros no longo prazo, da vegetação local e os produtos providos pelos serviços ambientais, ao mesmo tempo em que visa a minimizar o conflito entre os diferentes e legítimos interesses dos ribeirinhos e da sociedade em geral. Toda e qualquer atividade humana provoca alterações no meio ambiente que geralmente comprometem a integridade dos ecossistemas, levando à diminuição das populações ou extinção local de espécies vegetais e animais, redução da qualidade da água e outros serviços ecossistêmicos importantes para toda a sociedade. Há evidências de que a retirada completa de vegetação natural à margem de um rio, por exemplo devido à agricultura, aumenta a erosão do solo e a entrada de sedimentos na água devido à perda da função protetora da mata ciliar. Consequentemente, os sedimentos carregados pela água fazem com que plantas e algas que dependem da luz para fotossíntese sejam reduzidas ou eliminadas. Com a retirada das árvores, menos frutos cairão, reduzindo a disponibilidade de energia e alimento para os peixes, o que pode afetar o tamanho de suas populações ou mesmo levá-los à extinção, principalmente aqueles que dependem de um determinado alimento. A atual legislação não exige a elaboração de estudos de risco e planos de gerenciamento de riscos para atividades turísticas, apesar de serem atividades que causam impactos ambientais significativos. O sucesso de implantação da pesca esportiva com fly, depende da avaliação criteriosa dos principais impactos e riscos ambientais desta mobilidade. Este diagnóstico deverá fundamentar regras que se garantam a manutenção da biodiversidade e estabilidade do ecossistema. Identificar quais os fatores extressantes das operações de pesca são essenciais para o seu sucesso. No entanto, é preciso também avaliar qual o grau de risco ecológico que as áreas serão submetidas, evitar ou minimizar os impactos negativos, seja adotando medidas de recuperaçãou ou agindo rapidamente para evitar sua degradação. 41


Índice de Risco Ecológico – IRE Diante do contexto, faz-se necessário a utilização de um método que permita avaliar o grau de risco a que está sujeita a integridade dos ecossistemas com a implantação desta modalidade de pesca. De acordo com Karr et al. (1986) e Mattson & Argermeier (2007), pelo menos cinco aspectos funcionais devem ser avaliados na determinação do risco ecológico e que, se alterados, podem comprometer fortemente a integridade de um ecossistema aquático (Figura 5): I. II. III. IV. V.

Fontes de energia; Regime hídrico; Qualidade da água; Interações bióticas; e Estrutura física dos habitats.

Figura 5. Integridade ecológica de ecossistemas aquáticos e seus atributos chave. Modificado de Karr et al. (1986) e Mattson & Argermeier (2007). A integridade do rio Manso tem sido mantida pela qualidade de suas águas, pela manutenção de suas fontes de energia, pelo equilíbrio dinâmico das interações entre espécies e seu meio, pela manutenção do regime hidrológico e da estrutura do hábitat (canal e vegetação ripária). Toda e qualquer elemento estressor externo, poderá colocar em risco a integridade ecológica deste ecossistema. Identificar essas forças estressoras, a sua severidade, frequência e a sensibilidade deste ecossistema é fundamental em uma análise de risco. 42


INDICE DE RISCO ECOLÓGICO (IRE) O grau de risco a que um dado ecossistema está submetido pode ser avaliado, considerando as seguintes variáveis: I. A severidade de um dado estressor quanto ao grau de alteração ou distúrbio potencial que este pode provocar em cada um dos aspectos funcionais considerados; II. A frequência com que um dado estressor provoca alteração ou distúrbio nos aspectos funcionais. Com base neste arcabouço teorico, Mattson & Argermeier (2007) propuseram o Indice de Risco Ecológico (IRE), que permite avaliar o estresse a que um determinado ecossistema ou unidade territorial esta submetido. O IRE permite identificar quais são as áreas com maior risco ecológico para um determinado tipo ou conjunto de estressores e orientar decisões e ações de conservação. Permite também, apontar qual a vocação de uma determinada área ou determinar quais são os principais fatores de estresse em uma região, indicando ações focadas e mais efetivas para mitigar esses estresses. Logo, o IRE é o produto entre a severidade de um dado estressor, como definida acima e o número de ocorrencias (frequência), deste mesmo estressor na unidade de estudo considerada. Sua representação matemática pode ser expressa como: IRE (i) = F(i) . S(i) (i) = identificador do estressor. F (i) = frequencia do estressor i na bacia analisada. S (i) = severidade do estressor i na bacia analisada. Fato importante é que a magnitude do impacto de um dado estressor não é sempre a mesma em qualquer local: ela pode variar em função do próprio ecossistema. Por exemplo, a poluição causada por vazamento de combustível, pode resultar mais dano em ecossistemas em água parada ou lenta (onde tenderá a se acumular), do que em ecossistemas lênticos, como os rios de corredeiras que tenderão a dissipar o poluente. Considerando esta possibilidade, foi considerada uma outra variável: III. A sensibilidade de cada ecossistema em relação a um determinado estressor.

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Essa variavel pode atenuar ou acentuar a severidade de um dado estressor em funcão do ecossistema ser mais ou menos resistente ao impacto, obtendo-se o Indice de Risco Ecologico (IRE) para um dado estressor, que pode ser expresso como: IRE (i) = F(i) . S(i) . Z(i) (j) (i) = identificador do tipo de estressor

(j) = identificador do tipo de ecossistema F(i) = frequencia do estressor i S(i) = severidade do estressor i. Z(i) = sensibilidade do ecossistema j ao estressor i.

Pode-se, ainda, com base no IRE, calcular o Índice de Risco Ecológico Composto (IRE-C), que e o somatorio dos IRE por estressor especifico. Ele permite uma visao integrada dos riscos a que cada bacia esta submetida. A representacao matematica do IRE-C pode ser expressa como: IRE - C (k) = Σ IRE (i) (k) (i) = identificador do tipo de estressor (k) = identificador da bacia hidrografica ou unidade territorial de analise.

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Metodologia do IRE A elaboração do IRE passou por diferentes etapas até o seu cálculo final (Figura 6). De posse das ameaças à integridade ecológica (mapeamento das ameaças), foram atribuídos valores de severidade a partir do impacto potencial de cada estressor da modade, calculando-se as frequências de cada estressor. A partir destes dados, calculou-se o IRE-T (Índice de Risco Ecológico específico por ameaça) e o IRE-C (Índice de Risco Ecológico Composto). Dada a inexistência de mapas contendo a heterogeneidade ambiental da região, foram identificadas duas unidades ecológicas (represa e calha natural) a partir do cruzamento das variáveis ambientais: clima, geomorfologia, vegetação e unidades hidrologicas. Também foram incluidas avaliaçõess qualitativas da bacia e dos estressores, como atributos das informações espaciais obtidas por meio de consulta com especialistas. Para o cálculo do IRE, utilizamos informações bibliográficas dos principais estressores da pesca amadora / esportiva sob os ecossistemas aquáticos da bacia. Uma lista prévia de estressores foi elaborada e submetida a especialistas Ad Hoc que selecionaram e avaliaram os principais estressores. Para a seleção e avaliação dos principais estressores, considerou-se o conhecimento técnico destes especialistas Ad Hoc. A seleção dos estressores foi feita a partir da analise de uma lista onde foram consideradas 13 fontes relevantes de estresse, causadas pela pesca amadora / esportiva aos ecossistemas aquaticos da Bacia do rio Paraguai. Os estressores foram avaliados individualmente pelos especialistas quanto a sua severidade, como fonte de impacto direto sobre os aspectos funcionais dos ecossistemas aquáticos, citados anteriormente. A severidade dos estressores foram avaliados pela sua significância (disturbios e danos). Assim, a severidade dos estressores foram classificados nas seguintes classes: I - distúrbios e danos não significativos; II - distúrbios e danos pouco significativos; III - distúrbios e danos moderadamente significativos; IV - distúrbios e danos significativos e V - aos distúrbios e danos muito significativos. A sensibilidade dos ambientes aos aspectos funcionais frente aos impactos causados pelos estressores tambem foi avaliada. Para cada uma das variaveis ambientais, foi atribuida uma classe, como baixo, medio ou alto impacto, com valores 1, 2 e 3, respectivamente. O valor final de severidade e de sensibilidade para um determinado estressor, e a sensibilidade de cada variavel ambiental, é composto pela soma de todos os valores atribuidos.

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Identidicação das ameaças à integridade ecológica do ecossistema

Mapeamento das ameaças

Atribuições dos valores de severidade a parti do impacto potencial de cada estressor no sistema

Consulta a especialistas AdHoc

Atrbuição dos valores de sensibilidade dos ambientes hidrológicos em relação aos estressores, considerando as variáveis ambientais.

Consulta a especialistas AdHoc

Cálculo das frequências de cada estressor Considerando os ambientes hidrológicos

Frequência de cada estressor nos ambientes hidrológicos

Cálculo do IRE - T Índice de Risco Ecológico específico por ameaça

Cálculo do IRE-T (múltiplas pontuações)

Cálculo do IRE-C Índice de Risco Ecológico Composto

Cálculo do IRE- C

Validação dos índices Índice de risco ecológico total e composto

Consulta AdHoc com especialistas

(informações espacializadas)

Preenchimento dos valores de severidade espacialização dos valores por ambiente.

Preenchimento dos valores de sensibilidade Espacialização dos valores por ambiente.

Operação da atividade

IRE-T = severidade x sensibilidade x frequência

IRE - C (k) = Σ IRE (i) (k)

Validação do IRE - T e do IRE - C Valores do IRE para cada ambiente hidrológico

Figura 6. Etapas da análise de risco das operações

Tabela 2. Análise de severidade por estressor. Neste caso foram considerados como principais ambientes o Reservatório e a calha do rio a jusante do reservatório. Impactos

(Estressores)

1. Alteração do regime hidrológico 2. Supressão

3. Inserções

4. Sobrecarga

Severidade do impacto 1 Baixo 2 Médio 3 Alto 1 Baixo 2 Médio 3 Alto 1 Baixo 2 Médio 3 Alto 1 Baixo 2 Médio 3 Alto

Sensibilidade ao ambiente Reservatório Jusante 3

3

2

2 1

2 2

2

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Essas analises foram feitas com tabelas que foram distribuidas, analisadas e validades por cada especialista. Ao final, foi feita uma análise de consistencia das respostas dos especialistas, para se avaliar o numero de respostas discrepantes. O resultado final é apresentado nas Tabela 2, com os estressores selecionados. De acordo com a opinião dos especialistas, foi avaliado como cada variável ambiental e impactada com relação a severidade (distúrbios e danos) dos estressores. A sensibilidade foi calculada a partir dos valores atribuidos para cada variavel ambiental, tambem em relação aos estressores.

Uma vez estabelecida a lista de estressores (impactos) e seus indicadores (efeitos), os valores de severidade associados foram calculadas frente as frequencias de ocorrência dos estressores para cada uma das unidades hidrológicas. Os valores obtidos foram posteriormente escalonados para: ―0‖ sem ocorrência na unidade hidrológica; ―1‖ baixa ocorrência; ―2‖ media ocorrência; e ―3‖ alta ocorrência. Para a separação dos valores de ocorrência nessas quatro classes, foi utilizada a curva de distribuição de frequências e o algoritmo de Jenks (1977), que busca identificar um conjunto de classes com a menor variância intragrupos possivel. Uma vez calculada a frequência e tendo disponível a sensibilidade e severidade, foi possivel calcular o IRE de cada estressor, que é a multiplicação simples dos três fatores. Como forma de garantir que o resultado expressa a realidade local, foi feita uma reunião de validação dos resultados com os especialistas AdHoc, que indicaram correções e ajustes necessários. As Tabelas 3 e 4 mostram os impactos e a severidade de seus indicadores, nas duas unidades ecológicas (reservatório e a jusante do reservatório), devidamente validados.

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Tabela 3. Principais impactos, sua severidade e seus indicadores no Reservatório. Impactos

(Estressores)

Peso

Efeitos

(Severidade)

(Indicadores)

2.93 2.89

1.12

1. Bloqueio de rotas migratórias de peixes. 2. Modificações na composição e estrutura de assembléia de peixes. 3. Alteração das condições físicas e químicas da água. 4. Alteração da qualidade e a quantidade de hábitats para a fauna e flora aquática. 5. Alteração na disponibilidade de recursos alimentares. 6. Sucessão de espécies da fauna e flora aquática. 7. Extinção de espécies de peixes endêmicas.

2. Supressão

2.77 2.65 2.15 2.14 1.45 1.16

1. 2. 3. 4. 5. 6.

Alteração no volume / Recursos pesqueiros. Alteração da Vegetação ripária. Formação de pastagens. Modificações de habitats. Destruição de componentes de paisagem. Destruição de elementos ou componentes valorizados do ambiente.

3. Inserções

2.58 2.67 2.88 2.15 1.68 1.14 1.11

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Introdução de espécies exóticas (peixes). Introdução de espécies exóticas (patógenos). Esportes náuticos. Frentes de ocupações. Acessos viários. Edificações ribeirinhas. Urbanização.

4. Sobrecarga

2.95 2.90 2.78 1.93 1.56

1. 2. 3. 4. 5.

1. Alteração do regime hidrológico

2.61 2.57 2.54 1.49

1.34

Pesca predatória. Emissão de poluentes. Espécies exóticas (predadores). Redução de hábitat. Redução de disponibilidade de recursos para certas espécies. 6. Aumento da demanda por bens e serviços públicos (saúde, educação).

Tabela 4. Principais impactos, suas severidades e seus indicadores a jusante do Reservatório.

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Estressores (Impactos)

1. Reservatório

Peso

Indicadores

2.93 2.85

1. Bloqueio de rotas migratórias de peixes. 2. Alteração do comportamento erosivodeposicional. 3. Alteração do transporte de sedimentos. 4. Alteração da produção primária no rio e planívie fluvial adjacente. 5. Alteração das condições físicas e químicas da água. 6. Alteração da qualidade e a quantidade de hábitats para a fauna e flora aquática. 7. Alteração na disponibilidade de recursos alimentares. 8. Sucessão de espécies da fauna e flora aquática. 9. Modificações na composição e estrutura de assembléia de peixes. 10. Extinção de espécies de peixes endêmicas.

(Severidade)

2.54 2.40 2.39 2.21 1.81 1.20 1.17 1.11 2. Supressões

2.63 2.53 2.21 1.95 1.10 1.04

(Efeitos)

1. Alteração no volume / Recursos pesqueiros. 2. Alteração das áreas alagáveis (Floodlands ou Washlands). 3. Alteração da Vegetação ripária. 4. Modificações de habitats. 5. Destruição de componentes de paisagem. 6. Destruição de elementos ou componentes valorizados do ambiente.

3. Inserções

2.23 2.12 1.56 1.11 1.06 1.03

1. 2. 3. 4. 5. 6.

4. Sobrecarga

2.21 2.14 2.11 2.04

1. 2. 3. 4.

1.25

Introdução de espécies exóticas (peixes). Introdução de espécies exóticas (patógenos). Esportes náuticos. Frentes de ocupação. Acessos viários. Edificações ribeirinhas.

Pesca predatória. Emissão de poluentes Redução de hábitat. Redução de disponibilidade de recursos para certas espécies. 5. Aumento da demanda por bens e serviços públicos (saúde, educação).

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Resultados Com potência instalada de 212 MW, a Usina Hidrelétrica de Manso foi projetada para atender ao conceito de uss múltiplos do reservatório e da água. O reservatório atinga uma área de 427 Km2 nos municípios de Chapada dos Guimarães e Nova Brasilândia. Os efeitos do reservatório pode ser avaliados Pontos Fortes e Pontos Fracos. Pontos Fortes: com a implantação da represa houve a regularização dos ciclos de secas e cheias do rio Cuiabá, contribuindo para a redução dos danos socioeconômicos. A implementação de programas ambientais, por FURNAS, são fatos concretos, tais como Monitoramento Hidrológico, da Ictiofauna e Limnológico e da qualidade da água e os de manejo e conservação da fauna. A região transformou-se em potencial turístico, aliouse o encanto das águas com as belezas das paisagens do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães, com uma supervalorização das terras em torno da represa (Siqueira & Henks, 2014). Pontos Fracos: com o alagamento da área de 427 km² houve alteração abrupta nas características ambientais da região. Deslocamento de cerca de 500 famílias tradicionais da região para outros locais, perdendo assim laços familiares, culturais, religiosos, etc.

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Em comparação com diversas outras hidrelétricas, a Usina Hidrelétrica de Manso gera pouca energia em consideração a área alagada. Muitas espécies da fauna local foram dizimadas, mesmo os poucos exemplares que se conseguiu resgatar, muitos morreram por não se adaptarem ao novo habitat. Muitas espécies da flora local desapareceram, ficando submersas, com o tempo apodreceram, tornando a água turva e mal-cheirosa, emitindo gases de efeito estufa. O desaparecimento de locais de potencial turístico, como o ―Salto do Fogoió‖, a inexistência de um sistema de transposição para peixes (escada ou elevador) na barragem da represa, vem ocasionando o total desaparecimento de espécies de peixes que outrora eram comum à montante da barragem, como dourados, jaús, piraputangas, pacus, pintados, entre outros, comprometendo sobremaneira uma das principais fontes de alimentação dos ribeirinhos. Com o aumento do turismo houve um aumento considerável de acúmulo de lixo em toda região. As Atividades garimpeiras foram totalmente extintas, deixando assim centenas de famílias sem a sua principal fonte de subsistência (Siqueira & Henks, 2014).

O RESERVATÓRIO E SEUS IMPACTOS Os represamentos, independente de suas finalidades, são construídos para alter a distribuição natural das vazões no tempo e no espaço, comprometendo sensivelmente os aspectos da dinâmica dos rios que são fundamentais para a manutenção das características dos ecossistemas aquáticos (WCD, 2009). O reservatório do Manso ocupa uma área de 427 Km2 e 72 metros de altura, cujo fechamento ocorreu no ano de 1999. Embora a UHE Manso produza inegáveis benefícios sociais e econômicos para o Estado de Mato Grosso, seus impactos ambientais foram consideráveis. Com a implantação da represa houve a regularização dos ciclos de secas e cheias do rio Cuiabá, contribuindo para a redução dos danos socioeconômicos (Siqueira & Henks, 2014). Entretanto, é também inconstestável a observância dos impactos negativos que seu reservatório causa sobre o ambiente, a sociedade, a cultura e mesmo a setores da economia. Muito embora saiba dos inúmeros benefícios que houve com a implantação da Usina de Manso, com a implantação de vários empreendimentos de lazer como condomínios náuticos, atividades de pesque e pague e loteamentos rurais, devemos destacar também os inúmeros pontos negativos como o desaparecimento de sítios arqueológicos, jazidas minerais, o habitat de centenas de espécies diferentes de animais, além da remoção dos lares de 464 famílias tradicionais da região (Siqueira & Henks, 2014). 52


Resumidamente a formação deste reservatório, resultou na mudança hidrológico do rio Manso de um estádo lótico para uma condição lêntica ou semilêntica. As condições físicas e químicas da água propiciaram mudanças na qualidade e quantidade de hábitats para a fauna e flora aquática. Foram formados novos hábitats e à perda de outros. Entre os novos, destacam-se bancos de areia, galhadas submersas, bancos de macrófitas e, principalmente, a zona pelágica. Entre os perdidos destacamse as lagoas marginais, canais, remansos, poções e corredeiras. Três tipos de habitats majoritários foram formados no reservatório: (1) litorâneos, incluindo a foz de tributários; (2) pelágicos, ao mais conspículos pela sua extensão; (3) demersais (profunda). Contudo, a distribuição da ictiofauna é desigual, sendo a ocupação quase totalmente restrita à região litorânea. desencadeando mudanças nas relações tróficas, na base da produção primária e na ciclagem de nutrienbtes. A fauna de peixes é um dos componentes mais evidentes da diversidade biológica quando o assunto é o represamento. É natural que assim o seja, dada a importância social e econômica desses recursos, que estão associados a atividades de pesca (profissional e amadora) e uma importante fonte de proteína animal para a alimentação humana. É um recurso natural não visível e os efeitos mais danosos de um represamento ocorrem de maneira silenciosa, exceto nos casos de grandes mortandades (Agostinho et al., 2007). As mudanças hidrológicas podem causar sérios impactos sob as espécies migradoras e endêmicas, com feflexos simultâneos sobre a pesca e a biodiversidade. No primeiro grupo, encontram-se os grandes peixes e mais desejados por pescadores. No segundo, a biodiversidade sofre um grande golpe com a extinção de espécies, seja local ou global. O processo de sucessão de espécies é muito comum nos represamentos (Agostinho et al., 2007). Após a formação do reservatório, a fauna de peixes a se estabelecer é primariamente dependente da fauna preexistente na região alagada. Dado ao caráter transitório das condições ambientais, as espécies de peixes generalistas serão mais bem sucedidas, já que apresentam maior flexibilidade quanto às suas necessidades alimentares e reprodutivas, ajustando-se mais facilmente às variações e disponibilidade alimentar e à alternância nas condições ambientais. Esta alteração do ecossistema, também proporcionou modicações na composição e estrutura de assembléia de peixes. No primeiro momento, algumas espécies desapareceram ou diminuiram drasticamente o tamanho de suas populações (reofílicas), enquanto outras proliferaram rapidamente. As espécies com capacidade de explorar a região pelágica, provavelmente se ajustaram; o mesmo ocorreu para as espécies que exploram habitats litorâneos de águas estagnada

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Não há dúvidas que o represamento proporcionou a formação de um novo ecossistema, alterando profundamente a disponibilidade de recursos alimentares para as espécies nativas de peixes. Informações gerais da ictiofauna do reservatório do Manso foram obtidas pelo Núcleo de Pesquisas Limnológicas, Ictiologia e Aquicultura (NUPÉLIA), da Universidade Estadual de Maringá. Os trabalhos de campo ocorreram entre os anos de 2000-2001, cuja captura por unidade de esforço (CPUE) apontou em número (N) 29,9 e em peso (P) 3,9 (ind. ou Kg/ 100 m 2 de rede/ 24 h). A riqueza total (S TOT) foi de 153 espécies e de dominantes foi 15 espécies (S DOM, espécies que quando somadas perfizeram entre 80 e 90% das capturas em número de indivíduos) (Agostinho et al., 2007). As espécies de peixes que dominaram as assembléias do reservatório do Manso (espécies que juntas corresponderam de 80 a 90% do número total captura) foram: Acestrorhynchus pantaneiro, Astyanax abramis, Auchenipterus nuchalis, Brycon microlepis, Galeocharax knerii, Hemiodus semitaeniatus, Leporinus friderici, moenkhausia intermedia, Pimelodus maculatus, Prochilodus lineatus, Salminus brasiliensis, Schizodum borelli, Serrassalmus marginatus, Triportheus nematurus e Triportheus paranensis.

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IMPACTOS À JUSANTE DO RESERVATÓRIO As comunidades presentes em um rio - como sistema natural, são resultantes de um longo processo evolutivo, cujas espécies têm seus ciclos de vida fortemente associados à dinâmica do regime hidrológico (Junke et al., 1989). As modificações hidrológicas do rio Manso, induzida pelo represamento, alterou os componentes físicos, químicos e biológicos dos diferentes ecossistemas que o compõe. O represamento afeta o hidrográfico natural, atenuando e retardando os picos de cheias. A redução das cheias a jusante do reservatório é o principal impacto para a integridade biológica das planícies de inundação, afetando a ictiofauna, tanto direta (migração, desova e desenvolvimento inicial), quanto indiretamente (produtividade de áras riparianas, planícies de inundação) (Agostinho et. al., 2007). As comunidades vegetais riparianas, por exemplo, responsáveis por aportes importantes de alimento, abrigos e nutrientes, são controladas pela interação cheias-sedimentos e muitas espécies que habitam a região dependem de aquíferos rasos, que são recarregados sazonalmente pelas cheias, para o crescimento e germinação. Embora haja o controle da vazão, incluindo época, frequência e intensidade dos pulsos, a variabilidade da descarga é a principal fonte de impacto da mata ripária no trecho a jusante do reservatório. Os procedimentos operacionais do reservatório da PCH Manso resultam em um regime de vazão altamente variável, com alterações lentas, que podem se propagar a vários quilômetros a jusante, até que sejam atenuadas. Uma evidência de efeitos erosivos do regime de vazão são os orifícios circulares (pipping) que aparecem nas margens dos rios a jusante. Esses orifícios são provocados por mudanças rápidos do nível da água, o que gera um gradiente hidráulico elevado na água do lençol freático das margens. A saída dessa água remove as particulas dos locais por onde passa e gera uma forma particular de erosão (Souza Filho et. al., 2004). Durante nossas atividades de campo, não presenciamos a formação de pipping nas margens do rio Manso.

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Necessidades emergenciais, destinadas a atender picos de demanda energética representa um grande risco a integridade biológica da bacia. Nessas ocasiões, pode ocorrer a exposição parcial ou, em casos extremos, total do leito do rio a jusante, promovendo grandes mortandades. Fato este ainda não ocorrido na região. O caráter catastrófico dessas ocorrências dependa da amplitude da variação, da presença de planíceis alagáveis a jusante e do relevo do leito do rio (Agostinho et. al., 2007). O controle da vazão atenua a intensidade das cheias, com vazões mínimas sendo elevadas e as máximas reduzidas. Este processo ocasiona perdas significativas de hábitats, sobretudo nas áreas alagadas, ao perder sua dinâmica sazonal, enquanto outras não serão alagadas (redução da vazão durante a época de cheias), o que causa uma perda da conectividade do rio com sua várzea (Ward & Standford, 1995). As alterações nos níveis mínimos e máximos impostos pelo represamento e os pulsos artificiais gerados por liberações de água em épocas equivocadas, em termos ecológicos, são reconhecidos como responsáveis pela destruição da vegetação ripária. As áreas alagáveis (floodlands ou washlands), que são áreas baixas adjacentes ao rio, também foram alteradas pois não se relaciona com a dinâmica do sistema atual. Outras efeitos também são relevantes nesta análise, como a retenção de sedimentos e nutrientes, o bloqueio de rotas migratórias de peixes e a qualidade física e química de suas águas. Atualmente o rio Manso utiliza a área que foi formada por diferentes processos geomorfológicos naturais, ligeiramente encaixado, permitindo que a superfície do fundo do vale se coloque entre 3 a 4 metros acima do nível médio do rio. Os processos associados com a inundação da planície fluvial relicta têm recorrência menor que os processos de construção contemporânea do sistema atual, que se dão dentro da calha do rio. Assim, alterações no regime hidrológico do rio tem comprometido os processos de inundação. O rio, a medida que se distancia do reservatório, gradativamente retoma o processos de sedimentação na planície fluvial e em algumas situações, abandona mais rapidamente a planície adjacente e esta intensifica o processo de ressecamento (terrestrealização). A vegetação ripária mostra marcantes gradientes transversais na composição específica quanto ao grau de umidade sazonal que esta sujeita. Uma resposta gerada pelas alterações nos níveis máximos e mínimos impostos pelo represamento e os pulsos artificiais gerados por liberação de água.

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As frentes de ocupação se deram de maneira diferenciada ao longo do rio Manso. Pode-se observar a jusante do reservatório, por imagem de satélite, um grade avanço na supressão vegetal nas áreas alagáveis que sofreram o processo de ressecamento, sobretudo para ampliação de áreas de pastagem. Alguns remanescentes florestais foram mantidos por força da legislação ambiental, sobretudo em terras ocupadas por estabelecimentos agropecuários. Os estudos conduzidos em diferentes planícies de inundação, têm demonstrado que o fator ambiental de maior relevância no controle da reprodução dos peixes e recrutamento de novos indivíduos aos estoques explorados, inclusive em reservatórios, é o regime de cheias (Agostinho et. al., 2007). Sabe-se da existência de um alto grau de sincronia entre as cheias os principais eventos do ciclo reprodutivo das espécies (maturação dos ovócitos, migração, desova e desenvolvimento de juvenis), como também pela alta correlação entre o sucesso de recrutamento e a época, duração e amplitude das cheias (Agostinho, 2004; Agostinho et. al., 2004). Entretanto, as espécies respondem de forma diferenciada ao regime de cheias. O grau de dependência da elevação de nível do rio é menor nas espécies sedentárias que cuida da prole do que nos grandes migradores que buscam os trechos altos da bacia para a desova e cujos jovens habitam as áreas alagads durante as fases iniciais de desenvolvimento (Agostinho et. al., 2001). Uma característica notável a jusante do reservatório é a expressiva transparência da água. Sabe-se que a retenção de sólidos em suspensão e nutrientes é uma característica comum aos reservatórios (Agostinho et. al., 2004) e que tendem a empobrecer as áreas a jusante. Esta menor carga de sólidos confere à água evertida uma maior capacidade carreadora ou erosiva, facultando-lhe promover alterações morfológicas e granulométricas nos hábitats de jusante, com consequência sobre algumas espécies (Agostinho et. al., 2007). A maior transparência da água, por outro lado, pode elevar a mortalidade por predação dos ovos e larvas de peixes. Considera-se, neste ponto, que as espécies de peixes migradoras desovam durante o período de chuvas e se beneficiam da turbidez da água para a proteção da prole contra os predadores visuais (Agostinho et. al., 2003). Sabe-se que a qualidade da água liberada pelos reservatórios é certamente distinta daquela do rio natural, sendo determinada pelos processos limnológicos que ocorrem ao londo do trecho represado e, em razão de estratificações verticais, pela posição da tomada d'água na barragem. Assim, espera-se que os processos metabólicos no reservatório do Manso tende a produzir efluente com baixa concentração de oxigênio, alta de amônia ou gás sulfídrico.

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A posição da tomada d'água é altamente relevante, dado que a maioria dos reservatórios (inclusive da UHE Manso) apresenta-se, pelo menos sazonalmente, estratificado. Nesses casos, espera-se que as liberações superficiais tendem a atuar como retentoras de nutrientes e exportadoras de calor, enquanto liberações de fundo podem exportar nutrientes e reter calor. As mudanças na qualidade da água a jusante do reservatório podem afetar os peixes em três situações: (i) por exceder os limites de tolerância da espécie; (ii) inibindo processos biológicos reprodutivos e alimentares e (iii) alterando o balanço competitivo e as relações predador - presa (Petts, 1986). Contudo, a inexistência de estudos na região, não nos permite avaliarmos estes efeitos. A barreira física interposta pela barragem aos movimentos migratórios de peixes é o impacto mais evidente na região de estudo, dado que geralmente resulta no acúmulo de grandes cardumes de espécies migradoras nas imediações da eclusa e, devido à elevada vulnerabilidade, atrai contigentes para a pesca predatória.

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TURISMO DE PESCA NO RIO MANSO: IMPACTOS E EFEITOS A sustentabilidade da pesca amadora deve ser entendida aqui como a exploração econômica que permita tanto resiliência dos sistemas naturais envolvidos como também a preservação deste importante destino que, como afirma Plog (2001), tem um sentido vital à atividade, pois ao constituir sua própria motivação é inevitável que sua exploração predatória comprometa sua realização. Neste sentido é fundamental nesta análise revisitarmos os conceitos de impacto e efeito, sendo o primeiro o que se vê e o segundo o que se sente. Como efeitos do turismo de pesca, onde se insere a pesca amadora em sua modalidade esportiva, podem ser entendidas todas as modificações que ocorrem no meio, seja econômico, social e ambiental - a partir do seu desenvolvimento, afetando principalmente os locais onde ocorra a modalidade. Esta perspectiva permite que as avaliações de mudaças sejam estendidas para além das localidades receptoras, visto que o suporte da atividade demandada, muitas vezes, o consumo de bens e/ou serviços realizados distantes do ambiente turístico, mas que provocam pressões ambientais que só ocorreram devido às novas demandas específicas da atividade. Assim, a necessidade de importar bens de consumo, para atender as exigências de turistas estrangeiros terá efeitos imediatos - aumento da extração de recursos naturais, por exemplo - sobre as áreas onde serão produzidos, o que, do mesmo modo, situam-se além das fronteiras do ambiente receptor. Os efeitos por sua vez podem ter tanto caráter positivo como negativo, produzindo respectivamente ganhos e/ou perdas de bem estar. Porém suas origens situam-se num processo complexo de mudanças que ocorrem a partir da interação entre pescadores, comunidades e receptores (Ruschmann, 1977). Inúmeros autores que estudam os efeitos do turismo concordam que esta não é a atividade que mais, nem tão pouco a única, que gera consequências adversas aos ambientes onde se realiza. A associação inevitável entre a atividade do turismo de pesca e os impactos e/ou efeitos ambientais é dada pela necessidade do pescador em visitar o local de produção - que representa o próprio produto - para que o próprio consumo se realize. Além de que toda transformação econômica ou social, qualquer que seja sua natureza, irá alterar as relações entre o homem e o ambiente, e os efeitos negativos não são responsabilidade única do turismo (Ruschmann, 1977). Os efeitos da pesca amadora na área de influência da UHE Manso (reservatório) estão apresentados em categorias (indicadores) que emergem de fatores estressores (impactos) (Tabela 5). 59


Tabela 5 . Principais estressores causados pelo turismo de pesca, sua severidade e seus indicadores na área de influência do reservatório da UHE Manso. Impactos (Estressores)

Peso

(Severidade)

1. Econômicos 2.12 2.08

1.97 1.86 1.56 1.16

2. Sociais 1.78 1.68 1.12

2.25 1.67 1.17 1.11

3. Culturais 1.43 1.19 1.08 1.03

1.37 1.19 1.17 1.02

4. Ambientais 2.87 2.22 2.18 2.15 1.14 1.12

Efeitos

(Indicadores)

1. Efeitos positivos 1.1. Geração de trabalho e renda. 1.2. Fortalecimento da economia local. 2. Efeitos negativos 2.1. Pressão inflacionária. 2.2. Dependência excessiva. 2.3. Competição com outras atividades econômicas locais. 2.4. Efeito demonstração.

1. Efeitos positivos 1.1. Aproximação social. 1.2. Qualificação da mão-de-obra local. 1.3. Engajamento da comunidade com o turismo de pesca. 2. Efeitos negativos 2.1. Conflitos com outros usuários do Sistema. 2.2. Efeitos de demonstração. 2.3. Alteração da moralidade. 2.4. Saúde.

1. Efeitos positivos 1.1. Valorização do artesanato local. 1.2. Valorização da herança cultural. 1.3. Orgulho étnico. 1.4. Valorização e presença do patrimônio Histórico. 2. Efeitos negativos 2.1. Destruição do patrimônio histórico natural. 2.2. Descaracterização do artesanato local. 2.3. Vulgarização das manifestações culturais. 2.4. Arrogância cultural.

1. Efeitos negativos 1.1. Pesca predatória. 1.2. Redução populacional das espéciesalvo da pesca esportiva. 1.3. Introdução de espécies exóticas (peixes e patógenos). 1.4. Comercialização de iscas-vivas sem origem declarada. 1.5. Destruição da vegetação ripária. 1.6..Emissão de poluentes.

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ANÁLISE: IMPACTO ECONÔMICO E SEUS EFEITOS Esta é a categoria que mais tem recebido a atenção nos estudos de impactos e/ou efeitos da exploração das atividades turísticas. Um dos fatores que muito tem contribuído para isso é a relativa facilidade em obter dados quantificáveis para a análise, além de que a ênfase a tais efeitos têm grande importância no fomento dos investimentos que alavancaram o desenvolvimento. O impacto econômico do turismo de pesca na região, podem ser classificados em três categorias, seguindo o modelo de Cooper et. al.(2001): a) direto: representa a renda gerada pelos gastos diretos dos turistas em produtos turísticos; b) indireto: diz respeito à renda criada pelos gastos que o setor realiza em bens e serviços ofertados pela economia como um todo; c) induzido: entendido pelos gastos da renda adicional gerada pelo aumento dos níveis de renda de toda a economia que resultaram dos efeitos diretos e indiretos. Os efeitos por sua vez podem ser positivos e/ou negativos e sua extensão pode variar de uma localidade para outra. Para tanto os seguintes fatores devem ser considerados: a) A natureza dos equipamentos e dos recursos e sua atratividade para os turistas; b) O volume e a intensidade dos gastos dos turistas nas destinacões; c) O nível de desenvolvimento econômico da destinação; d) A base econômica da destinação; e) O grau de distribuição e de circulação das despesas realizadas pelos turistas na destinação; f) O grau de adaptação do local à sazonalidade da demanda turística.

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EFEITOS ECONÔMICOS POSITIVOS a) Geração de trabalho e renda (Peso: 2.12) O desenvolvimento do turismo de pesca tem gerado recursos financeiros para as localidades receptoras em toda a extensão do reservatório da UHE Manso, proporcionando a elevação da renda local. Para o caso do turismo internacional com a adoção da modalidade esportiva com fly, significa a entrada de moeda estrangeira. Além de contribuir positivamente na balança comercial, essas divisas serão transformadas em faturamento para as empresas, empregos, renda familiar e receita extra para os cofres públicos. No nível interno (turismo de pesca doméstico) além dos resultados positivos apontados para a forma internacional, a redistribuição interna de renda pode colaborar para a diminuição das desigualdades regionais no Estado de Mato Grosso. No entanto, o que irá determinar a amplitude do efeito será o valor numérico do multiplicador, determinado pelas propensões marginais a consumir e a importar das economias locais. b) Fortalecimento da economia local (Peso: 2.08) A formação de um fluxo de renda vinculado ao turismo de pesca, tem estimulado investimentos produtivos e a geração de empregos em toda a região de influência do reservatório. A construção de aparelhagem turística hotéis, pousadas, áreas de lazer, restaurantes, etc., além de gerar efeito positivo direto, esta estimulando outros investimentos, sobretudo no comércio local. Isto porque a exigência de infraestrutura, básica ou sofisticada, permite a cooptação por outros investimentos que não estão ligados direta ou indiretamente à atividade do turismo de pesca. Fundamentalmente de característica pública, e, portanto indivisível, estas obras e serviços - estradas, comunicação, rede elétrica, saneamento, etc. atraem empresas de outros setores. Por ser uma região pouco desenvolvida, a criação de postos de trabalho tanto no ambiente rural como nos centros urbanos de pequeno porte - geralmente com forte vínculo com o setor primário - tende a frear as migrações para os grandes centros urbanos da região, sobretudo para a capital do estado.

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EFEITOS ECONÔMICOS NEGATIVOS Os efeitos negativos são decorrentes de determinantes inerentes aos mercados descentralizados. O aporte de fluxos monetários a esta região propicia o desenvolvimento das chamadas "forças de mercado" que estão se ajustando ao longo do tempo. Este ajuste difere de um local para outro, dependendo do grau de desenvolvimento da economia e sociedade local. As empresas e as populações com maior tradição e experiência neste mercado, muitas das distorções e imperfeições tendem a ser menores do que aqueles com menor tradição e experiência no setor. Assim, aportes de investimentos iguais tendem a gerar comportamentos desiguais no mercado; tem residido aí a natureza de muitos dos efeitos negativos da atividade na região. Dentre os principais efeitos negativos destacam-se: a) Pressão inflacionária (Peso: 1.97) o aumento da demanda por produtos e serviços tendem a elevar seus preços trazendo prejuízos às populações locais, que em geral possuem poder aquisitivo menor. O mercado imobiliário, por exemplo, tende a sofrer especulações, promovendo uma valorização excessiva dos imóveis e aluguéis. b) Dependência excessiva (Peso: 1.86) O turismo de pesca não pode ser fonte exclusiva e nem mesmo, em muitos casos, ter prioridade máxima sobre as demais atividades econômicas. Dentre os fatores, destacam-se: a instabilidade da demanda e a sazonalidade inerente a esta atividade. A concentração temporal da oferta limitada a determinadas épocas do ano, concentrando em períodos curtos de tempo, oferta e demanda, provocando, em geral, fortes flutuações do mercado. Isto tem provocado de um lado escassez de oferta na chamada alta temporada e, por outro lado, escassez de demanda na baixa. O período de defeso, por exemplo, tem provocado o fechamento de aparelhos - hotéis e pousadas, por exemplo - e desemprego na região. c) Competição com outras atividades econômicas locais (Peso: 1.56) Certas comunidades ao longo das margens do reservatório vivem ou têm suas atividades econômicas ligadas fundamentalmente à extração de recursos naturais condicionalmente renováveis, sofrem consideráveis quedas no seu bem-estar pela concorrência com o turismo de pesca. Esses recursos dependem de ciclos naturais de renovação e podem ter seu equilíbrio rompido pelo aumento da extração que tende a atingir taxas superiores àquelas que permitem a sua renovação natural. Os estoque podem atingir níveis que inviabilizem a atividade econômica dos residentes e da própria atividade turística. Um exemplo neste caso são os pescadores profissionais da região, constituídos por moradores ribeirinhos que tem a pesca sua única atividade econômica. 63


d) Efeito demonstração (Peso: 1.16) Este efeito diz respeito à tendência das pessoas e/ou comunidade em imitar formas de consumo diferentes das habituais. Suas implicações não são apenas econômicas. No que toca a este setor, a tentativa dos residentes de imitar o consumo dos "turistas", que em geral possuem padrões mais elevados em variedade e sofisticação principalmente, tende a pressionar a oferta. Em mercados pouco diversificado, como é o exemplo local, o desvio de recursos para atender a demanda pode significar a escassez de produtos básicos e a elevação de seus preços. A importação de produtos mais sofisticados, por sua vez, drena recursos para fora da comunidade e os benefícios perdem espaço para os custos com consequências negativas para o bem-estar geral da comunidade. Como toda atividade econômica, o turismo de pesca envolve custos e benefícios. Portanto, as decisões sobre os investimentos de recursos produtivos nesta atividade em toda a área do reservatório, precisam levar em conta as alocações produtivas dos mesmos recursos em atividades alternativas - como é o caso da pesca esportiva com fly. Isso vem crescendo em importância na medida em que aos custos econômicos convencionais - refletidos em mercados - passaram a acrescentar-se custos que não são apreendidos pelo mercado local. Esses custos são sentidos pela observância dos efeitos do turismo de pesca sobre as sociedades receptoras, sua cultura, sua política e o seu ambiente.

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ANÁLISE: IMPACTO SOCIAL E SEUS EFEITOS O desenvolvimento do turismo de pesca, principalmente a partir da década de 1980, constitui-se em um dos fatores responsáveis pela mudança na vida das comunidades ribeirinhas no Pantanal. A relação entre a pesca amadora e profissional assumiu, desde o princípio, aspectos contraditórios produzindo ora benefícios externos - externalidades positivas, ora custos custos externos - externalidades negativas. Se por um lado o turismo de pesca significa oportunidade de emprego e renda, de outro impôs custos ao provocar prejuízos aos meios de sobrevivência dos moradores ribeirinhos.

EFEITOS SOCIAIS POSITIVOS a) Aproximação social (Peso 1.78) Este é um efeito positivo do turismo interno. A circulação interna tende a aproximar as regiões e pessoas, estimulando o sentimento de cidadania e reforçando a cultura e a coesão nacional. Quando a comunidade toma consciência de suas referências culturais próprias dá-se o que se chama de patrimonialização: a materialização dos costumes, da tradição, dos modos de ser e viver de uma comunidade. Entende-se aqui como patrimônio todas as esferas da natureza em que o homem vive e atua, que ele usa ou transforma para atender a suas necessidades matérias (de sobrevivência) e simbólicas (subjetivas, de satisfação, de conhecimento) e os bens culturais por ele produzidos, resultantes de sua ação no meio em que habita. Esses bens, materiais e imateriais, expressam a valorização do que fomos, do que somos e de onde estamos e, dessa forma, enquanto legado cultural para gerações futuras, expressam, consolidam e revelam a identidade de um povo. O fenômeno do turismo de pesca pode ser avassalador em uma comunidade ribeirinha se não planejado. Esse fenômeno entretanto, está intrinsecamente ligado à exposição ao outro. Tanto turistas e pescadores esportivos, como moradores locais confrontam suas identidades e sua cultura quando tratamos de deslocamentos humanos para o lazer. No morador local, ele despertaria um sentimento de pertencimento e de orgulho, de preservação. No turista e pescador esportivo, ele suscita, em um primeiro momento, a curiosidade, o desejo de conhecer, de sair de seu contexto e se encontrar com o outro e sua diversidade.

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b) Qualificação da mão-de-obra (Peso: 1.68) O desenvolvimento da pesca esportiva e, consequentemente, do turismo de pesca na região, está condicionado ao desenvolvimento social na região. Isso explica a necessidade da qualificação da mão-de-obra local para as oportunidades que estão por vir. Bons exemplos não faltam. Uma colônia de pescadores que vive no interior do Parque Nacional do Superagui, localizado no litoral norte do Paraná, descobriu uma forma de preservar as riquezas naturais e valorizar a cultura local. Moradores de uma das maiores áreas preservadas de Mata Atlântica do Brasil, os pescadores são parte de um projeto de turismo sustentável que tem qualificado a mão-de-obra, e gerado renda. Por dois anos consecutivos (2014-2015) os pescadores frequentaram workshops sobre hospitalidade e cursos sobre como gerir os recursos do turismo e se preparam para desenvolver novas atividades e preservar a biodiversidade do parque. A qualificação profissional faz parte do projeto Economia Solidária e Turismo no Litoral do Paraná e resulta de uma parceria entre o Ministério do Turismo (MTur), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e a Universidade Federal do Paraná - UFPR, com recursos no valor total de R$ 434,8 mil do MTur. c) Engajamento da comunidade com o turismo de pesca (Peso:1.12) A iniciativa inédita no Brasil, promovida pela Associação das Comunidades Indígenas do Baixo Rio Negro (ACIBRN) e a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) está gerando emprego e renda para comunidades indígenas por meio da exploração do turismo de pesca esportiva sustentável, no Rio Marié, afluente do Rio Negro, no noroeste do Amazonas. Isto demonstra a potencialidade que o turismo de pesca, quando bem conduzido, pode mudar a realidade local, com a geração de trabalho e renda.

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EFEITOS SOCIAIS NEGATIVOS a) Conflitos entre usuários (Peso: 2.25) Na área de influência da UHE Manso, existe entre os pescadores amadores e profissionais uma visão mútua de responsabilidade sobre a diminuição dos estoques pesqueiros, que para os amadores, estaria ocorrendo porque os profissionais fazem uso ilegal de redes e práticas predatórias, embora estes se defedem alegando que o aumento de amadores está acabando por inviabilizar sua atividade face a intensa movimentação que realizam dentro do reservatório. Entendemos que qualquer análise que se proponha interpretar e / ou oferecer indicativos para solucionar os problemas na relação turismo de pesca e pescadores profissionais, deve-se considerar os aspectos econômicos e ambientais que se relacionam com a questão. A especificidade do recurso econômico natural (peixes), de renovação condicionada ao manejo, objeto das distintas atividades econômicas (amadora e profissional) tem pontos de convergências que necessitam de análise. É conveniente estabelecer uma distinção entre os usuários (agentes econômicos) que atuam neste sistema. Embora concorrentes em termos de bens explorados os dois usuários distinguem em termos econômicos. Enquanto para o pescador amador (turista) o produto é a pescaria - com foco no lazer e bem estar, para o profissional é o pescado tendo o foco sua comercialização. Portato, o pescador amador (turista) realiza seu capital no momento em que extrai o pescado, o profissional no momento em que o comercializa. Esta distinção é fundamental pois de um lado um gera riqueza (trabalho e renda) e ao outro explora o recurso para obtenção de renda. A relação conflituosa entre estes usuários envolve duas falhas de mercado: externalidade e recursos de propriedade comum. A primeira expressa-se no tipo consumo-produção, indicando que os custos da pesca profissional tem sido elevados pela exploração da atividade turística pesqueira sem que, no entanto, haja qualquer tipo de ressarcimento. O segundo constituindo um bem econômico - recurso natural potencialmente renovável - cujas presenças são: presença de Custo de Oportunidade (CO) e Direito de Propriedade do Consumidor (DPC) e ausência do Direito de Propriedade do Produtor (DPP), mesmo porque este não existe já que o recurso é produzido naturalmente.

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Dentre as várias falhas de mercado que afetam os recursos ambientais estas são predominantes, pois a ausência do DPP tende conduzir a explorações excessivas dos recursos naturais (Garrod & Willis, 1999). A combinação destas duas falhas tem conduzido à explotação ineficiente dos recursos pesqueiros colocando a atividade em risco de colapso no reservatório da UHE Manso, pois esta comprometendo a sustentabilidade desses recursos, fato já observado em outros reservatórios. A avaliação das externalidades produzidas pelo turismo de pesca na região é bastante difícil de ser realizada, quer por falta de dados quer pela dificuldade técnica em obte-los, face a abrangência e às características que assumem. No entanto, há uma percepção nas avaliações empíricas e reforçadas pelas entrevistas feitas junto a pescadores profissionais e empresários do turismo de pesca local. Estes tem acumulado quedas em suas renda quer pela diminuição na produção, quer pelo aumento dos custos operacionais das atividades e pela diminuição do bem - estar destes usuários. Isto tem ocorrido de duas formas: uma direta, expressa pela diminuição dos estoques e outra indireta, pela movimento intenso nas áreas de pesca com consequências sobre a produtividade. Não há dúvidas que a pesca no reservatório, seja profissional ou amadora, constitui o fator direto de alterações dos estoques pesqueiros no reservatório. Quanto maior o número de pescadores, mais peixes serão extraídos, não importando o objetivo a que se destina o pescado. Embora a deficiência de dados, a diminuição dos estoques é uma evidência demonstrada nas declarações feitas pelos pescadores, mesmo entre aqueles que não relacionam ao aumento do turismo de pesca. Esta queda deve aumentar o esforço de captura, pressionado para cima os custos já que o tempo dedicado à pesca tende a ser elevado. Com isso aumenta-se também o Custo de Oportunidade (CO), observado de forma mais nítida nos casos dos pescadores ribeirinhos, ao invés de aumentar o tempo de pesca, tem dedicado maior atenção às culturas de subsstência - lavoura e a criação de pequenos animais.É interessante observar que a diminuição tem sido seletiva. Esta e uma característica em reservatórios onde há grande variedade de espécies e as pescarias são multiespecíficas. Este fator combinado ao manejo inadequado ou a sua ausência, pode produzir custos sempre previsíveis.

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Tem sido observado no reservatório que o desequilíbrio causado pelo excesso de esforço sobre poucas espécies favoreceu uma maior captura de piranhas (Serrasalmus marginatus e S. maculatus) na medida em que provocou desequilíbrios no ecossistema, ao diminuir a predação e a concorrência natural. Estes peixes trazem sérios prejuízos aos pescadores profissionais e amadores, pois seus ataques provocam a destruição dos petrechos de pesca, exigindo reposições mais frequentes. Um aspecto positivo que esta sendo observado na região é a aproximação entre as modalidades, inclusive com investimentos dos pescadores profissionais no sentido de explorar o turismo de pesca vendendo seus serviços, como guia de pesca e /ou piloteiro, disponibilizando seus conhecimentos sobre a pesca e a região. Isso, ao mesmo tempo, proporciona alternativas de ganhos econômicos e contribui para diminuir a pressão sobre os estoques, transformando-se em uma alternativa econômica de manejo dos recursos pesqueiros no reservatório. Porém, ao recair sobre a pesca a motivação principal da realização do turismo de pesca as dificuldades de sua realização, que podem ocorrer com a diminuição dos estoques, irão afetar a disposição a pagar estes agentes, pois há indicios que o benefício marginal é decrescente e se medidas de contenção não forem tomadas, os custos marginais superem os benefícios, mesmo que estes se mantenham constantes ou possam até cair. A externalidade positiva tende assim a se anular com o abandono e a substituição da área pelos turistas, face à perda de motivação dada a queda na piscosidade

b) Efeito demonstrativo (Peso: 1.67) Este efeito diz respeito ao estímulo às comunidades receptoras de imitar os padrões comportamentais dos turistas. Esse fenômeno, já diagnosticado em outras áreas de pesca no Brasil, pode conduzir desde a importação de produtos caros e hábitos, como também jogos, bebidas e drogas. Para Archer & Cooper (2001) deve-se considerar também o chamado "efeito de confrontação" ocasionado pela impossibilidade dos residentes em atingir níveis de prosperidade semelhante aos turistas, criando situações de hostilidade e conflitos entre as partes.

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c) Alteração da moralidade (Peso: 1.17) A busca de meios para se adequar a novos padrões de consumo pode gerar aumento da prostituição e da criminalidade. A lógica do comércio sexual em inúmeras localidades de pesca no Brasil é muito mais complexa do que se pode imaginar e acaba por articular a dinamização da economia urbana, por meio de uma série de atividades informais que estão inseridas no que se denomina "rede de rentabilidade sexual". Os trabalhos de campo realizados em alguns destinos de pesca no Brasil, levam a perceber que garotas de programa e turistas exercem um poder simbólico na rede de rentabilidade sexual, em virtude de dinamizarem, sobretudo, as atividades inseridas no ―circuito inferior da economia urbana‖, onde se inclui a criminalidade. Várias atividades informais são acionadas pelos turistas, contribuindo para a manutenção de algumas famílias. Essas atividades voltadas para o turista garantem a sobrevivência de muitos sujeitos que encontram na abertura da pesca alternativas para obter algum tipo de renda necessária à manutenção social e econômica. Esses sujeitos inseridos no ―circuito inferior da economia urbana‖ englobam-se em uma situação dinâmica criada pela alta temporada da pesca e se tornam ―um elemento fundamental da vida urbana‖ , tornando-se, assim, sujeitos preponderantes no processo de composição da produção econômica local. Assim, a relação garota de programa e turista transforma esses sujeitos em ―agentes da produção material do espaço‖, orientando o processo de reprodução econômica espa cial que envolve diferentes trabalhos formais e informais. De certa maneira, tais atividades acabam dando notoriedade social aos sujeitos que, no fechamento da pesca, não conseguem se inserir em outras atividades que lhes permitam a reprodução no mesmo padrão da alta temporada. Nesse sentido, evidenciamos que o turismo sexual expressa em seu cerne uma vasta complexidade no que tange ao aspecto da dinamização da economia urbana local, desvelando uma vasta rede de rentabilidade sexual, que abrange distintos tipos de prestação de serviços formais ou não. Segundo Calixto & Pimentel (2015) em um trabalho realizado em Rosana (SP) os entrevistados ao relatarem a relevância da presença das garotas de programa para a efetiva vinda dos turistas e, a partir disso, a importância que os mesmos exercem na dinamização da economia urbana, nem sempre conseguem perceber que também fazem parte, mesmo que indiretamente, da rede de rentabilidade sexual. Portanto, essa realidade nos dá parâmetros para compreendermos e analisarmos a rede de rentabilidade sexual sob o prisma de uma produção multifacetada do turismo sexual. Ou seja, pudemos verificar que o comércio sexual não se restringe unicamente ao agenciamento do corpo. Por meio desse agenciamento, se consolidam diferentes tipos de serviços inseridos na rede de rentabilidade sexual, tendo como desdobramento a dinamização da economia urbana.

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d) Saúde (Peso: 1.11) Doenças contagiosas podem contagiar turistas e nativos. Muitas doenças tropicais, endêmicas inclusive, principalmente oriundas de áreas menos desenvolvidas economicamente, podem atingir locais onde já foram erradicadas, a exemplo da cólera e malária. Por outro lado, populações receptoras são menos resistentes que as de turistas - que podem ser os agentes do contágio - o que poderá causar estresse social e econômico.

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ANÁLISE: IMPACTO CULTURAL E SEUS EFEITOS

EFEITOS CULTURAIS POSITIVOS a) Valorização do artesanato local (Peso: 1.43) O desenvolvimento do turismo de pesca pode resgatar o artesanato da comunidade local na medida que é incentivado pelas demandas criadas pelos turistas que buscam levar lembraças que identificam o lugar visitado. Ao mesmo tempo que formas antigas de produção material são resgatadas, a população local enriquece e dão significado às suas vidas; b) Valorização da herança cultural (Peso: 1.19) O interesse dos turistas pela cultura local favoreceu a (re) valorização de muitas culturas, em suas diferentes formas de manifestação a exemplo das artes, artesanato, música, gastronomia, etc. c) Orgulho étnico (Peso: 1.08) Fruto do processo desencadeado pelo interesse turístico nas mais diferentes formas de cultura, o orgulho étnico significa o resgate e a valorização dos grupos nativos, que em geral significa minorias. Com o interesse sendo dispertado, pode ocorrer um processo de revalorização e resgate da identidade étnica. d) Valorização e preservação do patrimônio histórico (Peso: 1.03) Talvez os aspectos mais valorizados pelo turismo de forma geral sejam os prédios e monumentos históricos. Muito procurados pelos turistas, passam a receber atenção por parte dos governos e instituições privadas, que restauram e conservam o patrimônio histórico, principalmente frente a possibilidade de exploração econômica que o turismo significa.

EFEITOS CULTURAIS NEGATIVOS a) Destruição do patrimônio histórico natural (Peso: 1.37) O acesso massivo de turistas pode comprometer as estruturas históricas, quer pela excessiva circulação, quer por atos predatórios. Entretanto, este efeito não foi identificado nas pesquisas.

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b) Descaracterização do artesanato local (Peso: 1.19) O artesanato pode perder a função original, utilitária, na medida em que objetiva unicamente atender à demanda dos turistas que o utilizam como peça de decoração. Esta preocupação deve ser compartilhada com o órgão gestor do turismo de Mato Grosso. c) Vulgarização das manifestações tradicionais (Peso: 1.17) As cerimônias tradicionais e os costumes transformaram-se em shows que distorcem seus conteúdos e significados tradicionais. Entretanto, não foi diagnostico este efeito nas pesquisas conduzidas. d) Arrogância cultural (Peso: 1.02) Quando são criados locais separados para os turistas, distanciando-os do contato direto com a população local. Este efeito não foi identificado no local.

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ANÁLISE: IMPACTO AMBIENTAL E SEUS EFEITOS Os problemas ambientais decorrentes das operações turísticas são marcados pela diversidade, magnitude e complexidade, envolvendo aspectos políticos, sociais, ambientais e econômicos de grande relevância. Ao analisarmos os impactos e seus efeitos, verifica-se que, para a formulação de um plano de gestão da pesca esportiva para toda a bacia do rio Manso, deve ocorrer um levantamento aprofundado, sobretudo a situação da atividade e dos demais setores que compartilham os recursos naturais na região. O uso público do reservatório, já apropriada pelo turismo de pesca, é anterior a sua realização, o que torna difícil definir os problemas ambientais que tem e o que não tem origem no turismo de pesca. A natureza, em seu curso histórico e por possuir dinâmica própria, se faz e refaz, modificando as paisagens geográficas naturais e aquelas construídas pelo homem, podendo assim dficultar a identidicação precisa dos agentes responsáveis pelas mudanças, mesmo que consideremos que o fato de que a ação humana possa acelerá-las; a complexidade das interações que a atividade envolve dificulta o dimensionamento exato dos limites de seus efeitos, tornando complexo o monitoramento e o rastreamento para além dos efeitos que transponham seu ambiente imediato de realização efetuado, a montante ou a jusante do reservatório, outros meios relacionados, de modo que as alterações só são sentidas após um certo período de tempo, de forma que muitos impactos acabem por ser desconsiderados quando de seus estudos para a implantação de atividades turisticas. Por fim, para um exato monitoramento da atividade existe um aspecto de caráter metodológico que implica em definir, por exemplo, os indicadores e as respectivas variáveis que devem ser utilizadas para medir os efeitos, atribuindo valores aos indicadores. O fechamento das comportas da Usina Hidroelétrica de Manso (UHE Manso) em 1999, bem como as consequências do represamento sobre a produção dos estoques fizeram diminuir a demanda do turismo de pesca na região. A falta de um ordenamento pesqueiro de transição e de um monitoramento das populações de peixes antes e após o fechamento das comportas, também comprometem uma análise pontual das verdadeiras causas da redução do turismo de pesca. Entretanto, com o represamento, algumas espécies permaneceram no reservatório e aumentaram seus estoques, outras desapareceram ou diminuíram drásticamente.

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As análises preliminares apontam que o principal efeito ambiental do turismo de pesca, tenha sido a redução dos estoques. Entender quais as forças que estariam atuando nesta redução, sobretudo em certas espécies é fundamental para a implantação de um plano de gestão de pesca no reservatório. Na ausência de dados avaliou-se, teóricamente, os prováveis motivos da redução destes estoques. EFEITOS AMBIENTAIS NEGATIVOS a) Pesca Predatória (Peso: 2.87) Entende-se como "pesca predatória" aquela exercida quando o usuário (pescador) ao exercer sua atividade, não atende as regras e normas estabelecidas pelo poder público. Entretanto, uma das causas desta situação é o próprio poder público, responsável pela gestão e proteção dos recursos pesqueiros, não fiscalizam adequadamente a atividade pesqueira, são tolerantes a certas práticas de pesca e, invariavelmente, tomam decisões paliativas e desconectadas à realidade local. Muitos destinos de pesca perdem sua estrutura econômica e social pela simples negligêbncia do poder público , que além de colocar em risco a estabilidade dos recursos pesqueiros, também o faz no contexto econômico e social. As deficiências técnicas das políticas de gestão também são responsáveis pelo incremento da pesca predatória, quando não se define os procedimentos de monitoramento dos estoques, autorizam petrechos de pesca sem o devido estudo de impacto ambiental, não interpretam adequadamente os indicadores de sobrepesca e de redução dos estoques e quando não realizam projetos para a recuperação dos estoques. A falta de clareza dos instrumentos jurídicos de combate à pesca predatória, tem estabelecido insegurança jurídica aos usuários do sistema., comprometendo investimentos públicos e privados. Enquanto a pesca predatória alcança níveis assustadores em nossos rios, a gestão pesqueira está sendo construída por meio de Resoluções, com embasamento técnico e científico limitado, baixa representatividade dos atores, conduzidas por um excessivo apego ideológico e, não raramente, em manobras tendenciosas e excludentes.

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Urge no combate à pesca predatória na região do Manso: 1) um aumento efetivo da fiscalização por parte do poder público; e) aplicação intempestiva da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98) a todo e qualquer usuário que venha transgredir a legislação e 3) um esforço coletivo para a construção e consolidação de novas regras de combate à pesca predatória a fim de se manter a estabilidade ambiental, econômica e social. b) Redução populacional de espécies (Peso: 2.22) A redução populacional pode estar relacionada a um excessivo esforço de captura sob populações reduzidas ou sub-dimensionadas. Entender a função crescimento desenvolvido pela biologia, se constitui um dos elementos básicos da teoria do uso sustentável dos recursos renováveis. Para entendermos como ocorre a variação da população de peixes, este modelo permite estabelecer uma relação entre a taxa de crescimento da população de peixes - entendido como estoque (E) e o seu nível - volume de estoque (VE). Teóricamente admite-se que um cardume de peixes, enquanto inexplorado, irá variar em população em função apenas dos determinantes naturais numa relação que pode ser expressa pelo gráfico da Figura abaixo.

Variação da população de peixes. Fonte: Adaptado de Mueller, 200, parte III, p.96. A variação da população (VP) por período de tempo dado pelo eixo vertical é função da população de peixes (P), que corresponde ao saldo do crescimento vegetativo subtraído à migração - quando houver, no caso no reservatório. Em condições naturais, a população crescerá até atingir um nível máximo (P+) definido naturalmente pela capacidade de carga do habitat e que corresponde ao ponto de equilíbrio natural do cardume naquele ecossistema específico. 77


Qualquer ponto de P significa um volume de variação possível correspondente ao seu ponto de rebatimento em Vp. Qualquer variação da população (Vp), causado pela pesca ou qualquer outro motivo, representa, também no intervalo P - / P + , a quantidade que será naturalmente reposta no período considerado. A variação máxima possível (Vpm) - reposição ou recrutamento - é dada em P*, Vpm. Este constitui o ponto aquém do qual o incremento do cardume é crescente e além do qual torna-se decrescente até atingir o estoque máximo da capacidade de suporte - ponto de equilíbrio natural. Assim o ponto P - e P + constituem os volumes populacionais mínimos e máximos que permitiriam a existência e continuidade da espécie em análise. P - constituindo a população mínima viável, também seria pouco desejável já que qualquer alteração no ecossistema, poderia conduzir a espécie em análise à extinção. Ou seja, para um modelo de gestão da pesca, seja amadora ou profissional exemplar, qualquer população de peixes abaixo de P + existiria um excedente que poderia ser continuamente capturados, sem que no entanto a capacidade de resiliência seja comprometida. Lembramos que os Modelos Teóricos de avaliação dos estoques foram desenvolvidos com vistas a determinar sua situação bem como a capacidade de produção de excedentes, dentre os quais merecem destaque os modelos holísticos e analíticos. Estes se diferenciam fundamentalmente pelo tipo de dados que utilizam. Os modelos holísticos são mais genéricos e trabalham com a biomassa total, necessitando de informações de captura total por espécie ou Captura Por Unidade de Esforço (CPUE), requerendo assim informações de um certo número de anos ininterruptos. a CPUE constitui-se ao mesmo tempo num parâmetro de produtividade, pois estabelece uma relação da produção por unidade de trabalho considerando uma unidade de tempo. Esta relação é expressa da seguinte maneira:

CPUE =

produção total no pesqueiro por pesca

(No de pescadores) x (tempo efetivo de pesca/dia)

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Os modelos analíticos de projeção revestem-se de maior complexidade. Estes modelos exigem volumes consideráveis de cálculos, simplificado pelo modelo de Beverton & Holt (1957). Para os autores, sua utilização requer dados mais pormenorizados, são modelos estruturais por idade e utilizam conceitos de taxa de mortalidade, crescimento individual e crescimento médio em comprimento e peso. Por outro lado, permitem prever alterações ou comportamento do estoque futuro; prever acontecimentos caso sejam alterados fatores como redução do esforço e proibição do defeso; incorporar fatores econômicos como preço e rendimento por captura. A grande vantagem desses modelos reside no fato de que é possível avaliar o ponto exato da curva onde o estoque se encontra em um dado momento, permitindo um maior controle sobre sua exploração. Infelizmente não encontramos análises que relacionem estas duas perspectivas para as populações de peixes explorados no reservatório da UHE Manso. Chamamos a atenção para a necessidade de um planejamento técnico para a exploração sustentável da pesca amadora no reservatório, já que o mercado livre pode conduzir o esgotamento total do recurso, como tem acontecido em outros represamentos de UHE. Entretanto, há métodos indiretos que permitem diagnosticar a existência de mecanismos atuando na redução dos estoques, entre eles: a) Síndrome de Linha de Base Inconstante b) Sobrepesca c) Mudanças de espécie-alvo

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SÍNDROME DE LINHA DE BASE INCONSTANTE A Síndrome de Linha de Base Inconstante foi descrita por Ainsworth et al. (2008). Os autores consideram que a pesca faz com que se reduzam as populações, estabilizando-as em seguida a um nível de equilíbrio inferior àquele apresentado antes do início da sua exploração. Entretanto, há uma tendência dos pescadores mais antigos recordarem maior abundância em tempos passados, que os pescadores mais jovens. Esta é uma situação chamada de Síndrome de Linha de Base Inconstante – uma condição cognitiva perigosa em que cada geração de pescadores aceita um padrão mais baixo de abundância de recurso como normal. Durante nossas entrevistas com pescadores profissionais locais, observouse que esta síndrome esta presente de forma significativa, pois 87,5 % dos entrevistados consideram que os estoques pesqueiros não teve alteração nos últimos 2 anos. Por outro lado, 95% pescadores profissionais com mais de 10 anos de atividade, apontaram que haviam mais peixes há 10 anos atrás, na data da entrevista. Os dados não são conclusivos mas são indicadores da ocorrência da Síndrome de Linha de Base Inconstante nos pescadores que atuam no Manso. Apesar de uma expressiva parcela da comunidade científica e gestores de pesca reconhecerem a ocorrência da Síndrome de Linha de Base Inconstante, pouco ou absolutamente nada tem sido feito para reverter a situação, optando-se nos ordemamentos pesqueiros pelo esgotamento do recurso como estratégia de sobrevivência social.

SOBREPESCA A FAO em seu relatório de 2008, afirma que "a pesca mundial se aproxima dos seus limites quando se detecta a tendência natural de reduzir os níveis de captura". Porém, na prática, muitos gestores pesqueiros, pressionados pelas chamadas "forças políticas, econômicas e sociais", desconsideram as recomendações técnicas e científicas (quando existem) e flexibilizam as normas de acesso aos recursos, potencializando o problema. Neste cenário de reduções, os pescadores burlam as regras estabelecidas (favorecidos pela fiscalização ineficiente ou inexistente) e passam a utilizar métodos ilícitos e predatórios para manterem suas capturas e ganhos a um nível anterior.

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Quando a pesca se aproxima dos seus limites, a sobrepesca já impera e expõe seus efeitos ambientais, sociais e econômicos, apesar das estatísticas produtivas estarem apontando uma certa "manutenção" dos níveis de exploração. A sobrepesca pode ser diagnostica por duas vertentes: recrutamento e crescimento. Sobrepesca de Recrutamento Segundo a FAO (1988) se houver exploração comercial dos adultos reprodutores (desovantes) sem observar limites, não haverá novos descendentes e, conseqüentemente, não será mantida a taxa de renovação da população (recrutamento) e a isso, chama-se de Sobrepesca de Recrutamento. Para coibir a sobrepesca de recrutamento e garantir um aumento das taxas de recrutamento e estabilização dos estoques pesqueiros, inclue-se no ordenamento pesqueiro: a) período de defeso e b) restrição de artes e petrechos de pesca. Entretanto, os sintomas de ocorrência de sobrepesca de recrutamento em um sistema explorado são: a) ocorrência de pesca predatória (pesca no período de defeso, uso de petrechos proibidos, etc) e b) redução dos estoques pesqueiros explorados. Determinadas artes de pesca e petrechos utilizados no rio Manso pode estar selecionar peixes maiores, causando uma redução nas classes de maior tamanho da população explorada. Isto pode comprometer a agregação de desova, onde os membros maiores e sexualmente maduros do estoque estão sendo pescados. Com a pesca contínua, o tamanho médio dos peixes torna-se menor, e os peixes são capturados antes que eles possam amadurecer. Isso resulta em uma redução geral no tamanho médio da população adulta, ou seja, menos peixes e menores estarão inseridos no processo reprodutivo. Com a redução da biomassa de reprodutores, concomitantemente, haverá uma redução no numero de larvas e juvenis a ponto de comprometer a manutenção destas populações, pela redução da entrada de novos indivíduos na população (recrutamento). Sobrepesca de Crescimento Para a FAO (1988) Se houver pesca predatória de jovens e de pré-adultos (imaturos), não será possível que eles atinjam o tamanho no qual o rendimento em peso seja máximo e que mantenha a taxa de recrutamento da espécie. Esta situação é definida como Sobrepesca de Crescimento.

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O principal instrumento para inibir a ocorrência de sobrepesca de crescimento é inserir no ordenamento pesqueiro, a definição do tamanho mínimo de captura (L50) da(s) espécie(s) sobrepescadas. Este procedimento garante um aumento da taxa de recrutamento da(s) espécie(s) e do(s) estoque(s). Entretanto, os sinais de ocorrência de sobrepesca de crescimento é a redução do tamanho médio de maturação sexual (indivíduos menores e maduros) e redução do(s) estoque(s) das principais espécies-alvo, seja da pesca esportiva como da profissional. A sobrepesca de crescimento é caracterizada quando a taxa de pesca, que causa uma perda de biomassa do estoque, torna-se maior do que a biomassa obtida em razão do crescimento. Isto ocorre quando os peixes são capturados com um tamanho médio menor que o tamanho que iria produzir o máximo rendimento por recrutamento. Ou seja, cria-se uma instabilidade populacional porque muitos peixes imaturos são capturados, antes de atingirem um tamanho em que o máximo crescimento e produtividade seriam oferecidos ao estoque. Alguns "sinais" de sobrepesca estão sendo detectados, sobretudo pelo redução do tamanho das espécies alvo que estão sendo continuamente capturadas a partir da formação do reservatório.

MUDANÇAS DE ESPÉCIE - ALVO A diminuição da captura de uma espécie-alvo (causada pela sobrepesca de recrutamento, associada à redução do tamanho do peixe (causada pela sobrepesca de crescimento) é inaceitável economicamente, o que tem ocasionado a mudanças de espécies-alvo. A mudança de espécies – alvo é uma estratégia comercial de sobrevivência dos pescadores profissionais, em conseqüência da existência de sobrepesca de recrutamento + sobrepesca de crescimento em uma população superexplorada. Na mesma sequência, a pesca amadora acompanha a tendência da oferta - procura e se adapta a realidade local.

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É possível inibir a síndrome de linha de base inconstante, a sobrepesca e a mudança de espécies - alvo ao se propor políticas de manejo que incorpore critérios ambientais, tanto para atender as necessidades das populações humanas, que dependem diretamente desta atividade, como para a conservação do patrimônio genético das espécies exploradas pela pesca. Entretanto, são medidas que passam por restrições de acesso - o que não é compreendido e aceito por todos os atores envolvidos. Urge a necessidade de investigações detalhadas para uma análise mais conclusiva, que possa subsidiar um manejo adequado. Há necessidade de uma prévia avaliação do estoque pesqueiro existente, do esforço de captura empregado e da capacidade de suporte do meio, sob o risco de colapsar o turismo de pesca no rio Manso, seja à montante ou à jusante do reservatório.

d) Introdução de espécies exóticas (peixes e patógenos) (Peso: 2.18) A introdução de espécies exóticas de peixes é a segunda causa mundial de perda de biodiversidade em ambientes aquáticos. De acordo com as definições adotadas pela Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica (CDB, 1992) na 6ª Conferência das Partes (CDB COP-6, Decisão VI/23, 2002), uma espécie é considerada exótica (ou introduzida) quando situada em um local diferente do de sua distribuição natural por causa de introdução mediada por ações humanas, de forma voluntária ou involuntária. Se a espécie introduzida consegue se reproduzir e gerar descendentes férteis, com alta probabilidade de sobreviver no novo hábitat, ela é considerada estabelecida. Caso a espécie estabelecida expanda sua distribuição no novo hábitat, ameaçando a biodiversidade nativa, ela passa a ser considerada uma espécie exótica invasora. Essas definições fornecidas pela CDB são utilizadas como referência para a construção de bases legais e de políticas públicas pelos países signatários da Convenção, como o Brasil, e são adotadas como base pelo Programa Global de Espécies Invasoras (Gisp). Por meio do Decreto n° 2, de 03 de fevereiro de 1994, o Brasil estabeleceu um compromisso legal com a CDB comprometendo-se a adotar e aplicar, no seu território, as ações e os princípios da Convenção. No âmbito das espécies exóticas invasoras, isso quer dizer que o País deve ―impedir que sejam introduzidas e deve controlar ou erradicar espécies exóticas que ameacem ecossistemas, hábitats ou espécies‖ (art. 8h da CDB, 1992). A mensagem desse artigo foi transposta para a Lei de Crimes Ambientais (art. 61 da Lei Federal n° 9.605/98), que considera crime ambiental a disseminação de doenças ou pragas ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas.

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As introduções de espécies podem ser voluntárias, quando há alguma intenção de uso da espécie para fins específicos; ou involuntária, quando a introdução ocorre acidentalmente, como no caso de pragas agrícolas e vetores de doenças — vírus e bactérias (CDB COP-6, Decisão VI/23, 2002). Frequentemente, a introdução voluntária de uma espécie exótica pode levar à introdução acidental de outras espécies a ela associadas, como é o caso de parasitas associados aos peixes introduzidos em atividades de piscicultura. Tais parasitas, introduzidos acidentalmente, podem comprometer a sanidade ambiental da piscicultura e causar novas doenças em ecossistemas naturais. Introduções intencionais de espécies são motivadas por diversas razões que tangem fins sociais, econômicos e até ambientais. Espécies foram e são introduzidas para embelezar praças e jardins, para uso na agropecuária, como alternativa de renda e subsistência para populações de baixa renda, para controle biológico de pragas e por outras razões. Alguns dos casos mais graves de invasão biológica no Nordeste do Brasil são consequências de introduções voluntárias. Um caso emblemático é o do tucunaré (Cichla ocellaris) e da tilápia (Oreochromis niloticus) em rios, lagos e açudes, o que certamente resultou em diversas extinções locais de espécies, com perda de biodiversidade em escala regional (Rosae Groth, 2004). Essas introduções foram intensificadas por programas de governo que, por meio do Departamento de Obras Contra a Seca (Dnocs), do Ministério da Integração Nacional, levaram à introdução de 42 espécies de peixes e crustáceos em aproximadamente 100 reservatórios de água doce no Nordeste. O tucunaré também foi introduzido acidentalmente em águas pantaneiras e um dos efeitos foram detectados foi a redução populacional de certas espécies de peixes de pequeno porte (forrageiros) que vivem em baias marginais do rio Piquiri (divisa dos estados de Mato Grosso do Mato Grosso do Sul). A disseminação de espécies exóticas invasoras também pode representar problemas e custos à saúde humana em função da entrada de patógenos e parasitas exóticos. O platelminto Schistosoma mansoni, agente causador da esquistossomose e provavelmente originário da África, foi disseminado pelo mundo e já infectou mais de 80 milhões de pessoas, sendo 3 milhões só no Brasil (Who, Três caracóis de água doce (Biomphalaria glabrata , B. tenagophila e B. straminea) são os responsáveis por sua transmissão no Brasil. Na tentativa de controle biológico das populações desses caracóis, foi introduzido o caracol-da-malásia (Melanoides tuberculata), que compete por alimento com os caracóis hospedeiros e devora seus ovos. Entretanto, o caracol-da-malásia é um hospedeiro intermediário de outros parasitas, especial mente um trematódeo causador da paragonimíase (Paragonimus sp.), que também afeta o homem.

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Não há dados publicados quanto a introdução de espécies de peixes e patógenos no rio Manso, de forma intencional ou não. Não há um diagnóstico das pisciculturas que atuam na região. e) Comercialização de iscas-vivas sem origem declarada (Peso 2.18) Com o crescimento da infra - estrutura da pesca amadora no Pantanal houve uma maior procura por iscas vivas, um item que tornou-se parte da cadeia produtiva do turismo de pesca. Consequentemente em função desta demanda, muitos ribeirinhos e pescadores profissionais se especializaram na captura e comercialização destas iscas, tornando-se uma importante atividade de trabalho e renda. Além do pescador de iscas, surgiu o atravessador de iscas - uma categoria formada por comerciantes que adquirem as iscas dos pescadores e as comercializam, inclusive no atacado, no mercado local ou a outros estados. A tuvira se tornou a principal isca-viva comercializada, sobretudo pela sua baixa seletividade, podendo capturar uma série de peixes predadores / carnívoros de diferentes familias e tamanhos. Com excessão as espécies onívoras,como pacu e piavuçu, que são capturados com carangueiros. O jejum e alguns cascudos, são utilizados para capturar grandes predadores migradores, como o pintado, cachara e o dourado. limítrofes entre nosso pais e outros da américa do sul, onde a gasolina com chumbo é amplamente contrabadeado. O consumo de iscas-vivas sem origem declarada é preocupante, sobretudo porque são frutos de exploração não autorizada pelo órgão ambiental competente. Essas iscas-vivas podem ter sido capturadas no período de piracema, e armazenadas para o momento de abertura da pesca. Trtata-se de uma atividade predatória e que precisa ser combatida.

f) Emissão de poluentes (Peso 1.12) Chumbo O uso de chumbadas na pesca amadora e profissional é preocupante. Estudos realizados no Canadá, revelaram que a perda de chumbada de pesca é estimada em 500 toneladas anuais, representando 14% de todo chubo não recuperável que é depositado no meio ambiente canadense. Os animais silvestres, essencialmente aves piscívoras e outras aves aquáticas, ingerem as chumbadas durante sua alimentação, seja por confundi-las com seus itens alimentares, seja por triturar ou consumir iscas de pesca com a linha e o peso a ela preso. Pesos menores que 50g e 2cm são geralmente ingeridos pelos animais silvestres. A ingestão de um único peso de chumbo, que contém vários gramas do metal, é suficiente para expor um pato ou outra ave a uma dose letal de chumbo.

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Segundo os autores, a ingestão de chumbadas tem sido documentada para 10 diferentes espécies silvestres no Canadá e 23 espécies nos Estados Unidos, incluindo patos, garças, pelicanos, cormorões e outras. Há evidências de que, para algumas espécies de patos, a ingestão de chumbadas é a única fonte relevante de exposição e contaminação por chumbo e a causa mais importante para aves adultas no leste do Canadá e nos Estados Unidos, superior até às mortes associadas ao aprisionamento em redes de pesca, a traumas, doenças e outras causas. Ainda conforme esses autores, algumas medidas regulatórias têm sido adotadas para reduzir o uso de chumbadas, tanto no Canadá como em outros países. Assim , em 1987, a Grã-Bretanha baniu o uso de chumbadas pesando menos que 28,35 g. Os Estados Unidos baniram o uso de chumbadas em três Refúgios Nacionais de Vida Silvestre e no Parque Nacional Yellowstone e estudam outras medidas. Os estados americanos de New Hampshire, Maine e New York estabeleceram regulamentos proibindo o uso de chumbas a partir de 2000, 2002 e 2004, respectivamente. Em 1997, o Canadá aditou norma proibindo o porte, para pescadores pescando em parques nacionais e áreas de vida silvestre, de chumbadas de pesca pesando menos que 50g. Os autores consideram, entretanto, que essas últimas medidas são de alcance geográfico muito limitado, uma vez que cobrem menos que 3% da área canadense e afetam apenas 50.000 dos cerca de 5,5 milhões de pescadores amadores, portanto menos que 1%. Atualmente, a maioria dos pescadores amadores canadenses continuam a usar chumbadas, embora eexistam numerosas alternativas viáveis ao chumbo como estanho, aço, bismuto, tungstênio, ver6amica e argila, das quais as três primeiras são as mais comumente comercializadas naquele país. No Brasil, parece que o problema não desperta tanta atenção. Uma das poucas referências aos efeitos ambientais das chumbadas foi o artigo encontrado em http://www.webpesca.com.br, intitulado "Materiais cerâmicos não poluentes substituem o chumbo na pescaria" de autoria de José de Ribamar Frota Caldas, segundo o qual "um pescador perde entre 150 a 300 gramas de peso de chumbo (chumbada) em uma pescaria. Apenas na região do Pantanal de Mato Grosso, dados de órgãos estaduais ligados à preservacão ambiental estimam que em uma temporada de pesca cerca de 40 toneldas desse metal pesado se acumulem no fundo das águas. Entretanto, não há estudos nesta área.

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O Laboratório Interdisciplinar de Eletroquímica e Cerâmica (LIEC), integrado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e do Instituo de Química da Universidade Estadual Paulista (UNESP), de Araraquara, desenvolveram um produto que pode substituir as chumbadas atualmente em uso. As "chumbadas ecológicas", comno ficaram conhecidas esses pesos, são fabricadas com argila, areia e pó de pedra, os quais são biocompatíveis com o fundo dos rios e lagos. Essas chumbadas cer6amicas compõem-se quimicamente de 30% de alumina, 45% de sílica, 15% de ferro e 10% de cálcio. Devido à diferença de densidade, as chumbadas cerâmicas precisam ser maiores que as tradicionais de chumbo, o que não impede que sejam usadas da mesma forma, com a vantagem de, por serem maiores, não se enroscarem nos mesmos lugares que as menores feitas de chumbo. As chumbadas cerâmicas perdidas no fundo de rios e lagoas deterioram-se mais rapidamente, não contaminando a água, o solo e os animais. O produto já é comercializado no Brasil.

Mercúrio Com elevadas concentrações de mercúrio, algumas espécies de peixes encontradas no Lago do Manso não são recomendadas para o consumo humano. A constatação foi feita por pesquisadores do Departamento de Química da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) e da Uppsal University da Suécia. A primeira análise dos peixes foi feita em 1999, ainda nos rios Manso e Casca, antes da construção da usina hidrelétrica. A evolução na presença do metal foi confirmada em avaliações posteriores em 2005 e 2011. Na última delas, a concentração detectada foi 8 vezes maior da permitida pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Sabemos que esse é um processo natural devido à grande quantidade de plantas que ficou submergida no lago. Ocorre um processo de putrefação desta floresta, que libera o mercúrio na água. Ele é incorporado às algas e outras plantas, que são consumidas pelos peixes. Estes mesmos peixes servem de alimento para outras espécies, como o Dourado, Pintado, Cachara e Piranha, que acabam tendo alto teor do metal. As espécies herbívoras, como o Pacu e a Piraputanga, têm baixo teor porque só se alimentam de plantas. Já os peixes carnívoros têm concentração mais alta porque se alimentam de outros peixes que já estão contaminados‖. Dados para 2012 apontaram que o Dourado apresentou um teor de quase 5 mil nanogramas de mercúrio (Unidade de Medida), já a piranha foi de 2.900 nanogramas, 10 vezes mais do que em 1999, quando era de 265 nanogramas. 87


Apesar de preocupar a contaminação não oferece grandes riscos para a população. Isso porque a pesca no Manso não é tão expressiva quanto em outros rios. Quando este peixe é ingerido em pequenas quantidades, esporadicamente, o mercúrio é diluído no organismo e não tem intoxicação. Quando ingerido em excesso, o mercúrio se aloja no sistema nervoso central do ser humano e causa complicações, que podem ser leves ou graves dependendo do nível de intoxicação. Entre os sintomas estão insônia, tremores, redução do campo visual, até a impotência da pessoa. A empresa Furnas Centrais Elétricas incorporou ao monitoramento da qualidade da água do lago de Manso, análise de concentração de mercúrio como condicionante para a renovação da licença de operação da usina. Entretanto, não conseguiu-se acesso aos relatórios submetidos ao órgão ambiental licenciador de MT.

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Considerações finais do IRE Para a manutenção e viabilidade futura da pesca esportiva no rio Manso (MT) é necessário que ocorra a gestão sustentável do setor com atenção às espécies e aos ecossistemas aquáticos e, que tenha significado econômico e social para as localidades onde será praticada, sob a pena desta modalidade produzir o declínio das populações de peixes, da mesma forma que a pesca comercial ocasionou em diferentes regiões. A intermediação do Estado sob a forma de políticas públicas que restringem a capacidade dos agentes econômicos de causar danos ambientais e que interferem na trajetória ―natural‖ do sistema econômico esta presente nos modelos de gestão mais bem sucedidos no mundo todo. Mas agora, é preciso ir além da regulação pura e simples. É preciso restringir o atual ―leque de opções‖, às atividades econômicas que não respeitam a resiliência dos ecossistemas, para evitar imposições futuras, sem escolha, de restrições físicas que possam comprometer o atendimento das necessidades de pescadores, agentes econômicos e o bem estar de toda a população, conforme previsto na Constituição Federal em seu Art. 225. É claro que esse novo modelo de gestão não deva chegar ao extremo, de dar à governança da economia uma orientação política ―ecológicamente correta‖, em que a defesa de valores ambientais e da natureza se torne um objetivo absoluto e determinante. Mas implica que este novo modelo defina os limites do possível, dadas às limitações ambientais conhecidas a cada novo estágio de desenvolvimento futuro da pesca no Rio Manso.

Thomaz Lipparelli, Dr. Coordenador dos estudos.

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