Caderno de Textos I Seminario de Formação Politica e Organização do Coletivo Desgovernar

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CADERNO DE TEXTOS 1º Seminário de Formação Política e Organização do Coletivo Desgovernar Outubro de 2014


Caderno de Textos do 1º Seminário do Coletivo Desgovernar Outubro/2014

Apresentação "Você faz parte de tudo. Aprende, não perde nada das discussões, do silêncio. Esteja sempre aprendendo por nós e por você. Você não será ouvinte diante da discussão, não será cogumelo de sombras e bastidores, não será cenário para nossa ação!" (Bertold Brecht - Precisamos de você) Bem vindx ao 1º Seminário de Formação Política e Organização do Coletivo Desgovernar. Você tem em mãos o nosso primeiro caderno de textos - uma compilação de textos escritos por nós nas 4 edições da Revista Desgovernar e em nosso blog, além de alguns textos clássicos como "Sobre a dualidade de Poderes" do Lênin e "Às mulheres trabalhadoras" da Alessandra Kollontai. Para nós, sem as necessárias reflexões e críticas constantes, nossa militância torna-se, assim como o conjunto da vida no capitalismo, refém de um “produtivismo”, uma lógica “tarefeira”, que nem sempre prioriza a compreensão da realidade para transformá-la. Por isso, dedicamos tempo e disponibilidade militante à tarefa de nos formarmos coletivamente, a partir da socialização de experiências militantes, acompanhamento direto e reflexão teórica. Para nós, a formação política não é um emaranhado de conteúdos desconectados da prática, mas a apreensão, questionamento e redefinição de conceitos (categorias) que representem o movimento da realidade, ampliando nossa compreensão do real e capacidade de transformá-lo. Não construiremos outro mundo radicalmente diferente sem um questionamento profundo das formas de produzir e demais relações sociais no capitalismo. Para esse Seminário pensamos uma dinâmica a ser proposta para cada ponto, e cada um dos textos selecionados servirá de provocação para os debates. Em primeiro lugar propomos um pacto coletivo de disciplina e responsabilidade com a dinâmica, o tempo e os temas acordados. Os temas propostos e o textos são: 1 - Apresentação da dinâmica e proposta do seminário (9:00) Texto: "Desgovernar, um manifesto pelo fim da barbárie"

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2 - Ser socialista hoje? A conjuntura e a tarefa dos socialistas revolucionários (9:30) Texto: " Para uma critica total da sociedade burguesa " .................. 4 2 - O Coletivo Desgovernar e as tarefas da conjuntura (11:30) Texto: "Quem Somos?" "Sobre a dualidade de poderes" (V. I. Lenin)

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3 - O mundo que queremos - opressões étnico-racial, de gênero e a LGBTs (14:00) Texto: "Onde a Esquerda guarda o seu racismo" .................. 9 "Às mulheres trabalhadoras" (A. Kollontai) ................. 12 Em seguida, teremos os espaços de auto-organização das frentes do Coletivo (15:00) e a Plenária Final (16:00). Fique com a gente até o final, se organize para desgovernar!

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Texto 1 - Desgovernar, um manifesto pelo fim da barbárie

Vivemos tempos sombrios. Aparentemente governados pelas coisas. Mercadorias nos tomam como mercados, mercados nos tomam como mercadorias. Os homens e mulheres caminham pela terra na busca desenfreada por excedentes, que mesmo aos que não têm o básico se impõe pelo consumo de suas forças vitais. A forma capital parece tomar todos os espaços do planeta. Destruição da razão, destruição do desejo, do sonho e sobretudo da possibilidade humana de governar-se, de dirigir-se aos seus desejos. Vivemos a destrutividade capitalista em seu momento mais desenvolvido. Diferente do que dizem os “novo desenvolvimentistas” do PT, e parte da esquerda fora do governo, não existe nenhuma possibilidade de desenvolvimento capitalista sem destrutividade do mundo e avanço nos níveis de exploração. Negros, mulheres, imigrantes, gays, somos classificados como menos para gerarmos mais excedente. Somos os que recebem mais baixos salários e nossa pele justifica o aumento do refugo humano nas prisões e o extermínio em massa. Somos homens e mulheres descartáveis governados por uma lógica que nos é estranha. A lógica capitalista tudo governa, nossas formas de amar, de viver e até de morrer, nossas visões de mundo são portanto impregnadas deste modo de pensar que naturaliza os (des)governos do capital e de sua burguesia decadente. Esta ordem não têm muitas possibilidades a oferecer. O caráter histórico emancipatório dela se esgotou. Mas fomos acostumados a eternidade das coisas como são. A esquerda também é governada por essas formas de pensar o mundo que eternizam o hoje. Possuíamos as fórmulas prontas de adaptação do mundo ao socialismo, que necessariamente consideravam a mudança na forma de distribuir as riquezas. Por isso, confundimos qualquer pequena mudança no horizonte da distribuição como progressivo e deixamos de questionar os fundamentos do modo de produzir capitalista que não tem outro fim senão gerar excedente. A historicidade se perdeu e inventamos diversas fórmulas prontas, ossificamos as divergências entre tradições teóricas da esquerda do século XIX e as adaptamos de forma patética as políticas medíocres que conseguimos propor. Alguns de nós ao buscar romper com o horizonte medíocre da adaptação e do reformismo mentiroso foram chamados de Desgovernados. Assumimos: queremos nos desgovernar e nos autogovernar coletivamente. Governada (pelo capital) é a esquerda que não se vê governada quando reproduz as hierarquias desta sociedade capitalista em sua organização e relação com movimentos sociais baseando-se em conhecimentos teóricos que não dispõe, para justificar o injustificável à um movimento que se proponha autogestionário. Governados estão também os teóricos Marxistas que tratam algumas categorias como eternas e não vivem as agruras de nosso tempo histórico. Com essa revista, nosso convite é outro: Desgovernar! Porque tudo que é sólido desmancha no ar.

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Texto 2 - Para uma critica total da sociedade burguesa “Na construção da sociedade burguesa e da construção ideológica do indivíduo, o preço foi a destruição da pessoa, seja pelo terror pequeno-burguês jacobino e a destruição da pessoa pelo terror burguês das minas e fábricas de Manchester. Dessa forma, interrompeu o processo de critica da discriminação e da desigualdade para reafirmar a fé em algo superior, não mais Deus, mas o Estado. Assim, a burguesia substituiu Deus pelo Estado. Abaixo d’Ele devem se prostrar igualmente todo o mundo social, Ele borra as diferenças de classe, a diversidade só é aceitável dentro d’Ele, a luta é a luta por meio d’Ele, n’Ele. Da mesma forma que o terror foi necessário a burguesia durante a revolução francesa para restauração da ordem, da mesma forma esse mesmo Estado vive na tensão de provocar um novo terror. O terror cômico. O terror reacionário, o terror para manter aquilo que não se sustenta de outra forma, de manter o capitalismo a qualquer custo, ao custo de todas as vidas, ao custo de todas as construções de sua própria sociedade. A democracia, erguida como bandeira da razão natural do indivíduo, é mantida por um Estado que suprime o indivíduo. O Estado brasileiro, intitulado “Democrático de Direito”, afirma os valores consagrados pela revolução burguesa, enquanto dirige à parte especifica da população o terror do caveirão, da internação compulsória, choque de ordem e das remoções, e a qualquer grupo insurgente a contenção violenta com prisões arbitrarias, cerceamento da liberdade e pela repressão. O desenvolvimento do capitalismo no Brasil, desde a constituinte, se americanizou. Transformou a democracia em sinônimo de forma de governo, esvaziando a “grande política” e carregando consigo um setor do movimento socialista que deseconomisciza o debate sobre Estado. Conferindo uma falsa autonomia do elemento político em relação ao econômico, ele despolitiza o debate sobre os fundamentos materiais da dominação. Esta divisão entre político e econômico foi base para a defesa da coalizão de classes como estratégia política. Os objetivos da luta de classe foram substituídos pelas lutas por reformas democráticas e pela construção de uma etapa democrático-burguesa da revolução socialista no Brasil. O PT, a CUT e demais sujeitos em luta nas décadas de 80 e 90 nascem negando, em parte, este taticismo etapista. Não superam, contudo, no seu programa, um gradualismo da revolução socialista e uma flexibilidade em relação ao Estado burguês que desaguou no abandono do socialismo. Sob o manto do antineoliberalismo e da consolidação da democracia burguesa centenas de trabalhadores foram jogados no limbo do transformismo petista. As bandeiras democráticas operadas por setores populares figuram desde o início na experiência do PT. Estas bandeiras ampliaram a expectativa dos trabalhadores em pactos com a classe burguesa,fazendo-os subestimarem a capacidade de cooptação da burguesia no Brasil. É possível afirmar que a democracia burguesa ganhou estabilidade no Brasil com a ampliação de suas possibilidades de consenso nos últimos anos. Isso, entretanto, foi conquistado sem descartar a coerção dos segmentos subalternos, pelo contrário incrementando-a.

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A coerção exige cada vez mais Estado, tencionando a contradição entre Estado e sociedade civil, entre a polícia burguesa e os indivíduos da sociedade burguesa. São duas contradições que se chocam: o Estado burguês contra a própria sociedade burguesa, e ambos contra os trabalhadores. As tensões decorrentes dessas contradições estouraram nas ruas do Brasil em 2013. Apesar disso muito consenso foi produzido pelos rearranjos do social-liberalismo na ultima década, de inspiração no pós-consenso de Washington, com políticas de mitigação da miséria e investimento na superexploração do trabalho principalmente nos setores de infraestrutura e ampliação dos postos de trabalho no setor de serviços. No Brasil temos assistido a um consenso de Washington repaginado, mesmo que seja apresentado como uma versão farsesca de um “novo desenvolvimentismo”, ou sinicamente como etapa democrática da revolução Brasileira. É necessário afirmar que a democracia não é uma possibilidade para o capital. A construção de uma sociedade socialista não se dará sem a destruição das instituições da democracia burguesa. Não se trata de eliminar o elemento da luta parlamentar ou institucional, mas de construir sínteses que superem o etapismo e gradualismo distributivista hegemônico na esquerda hoje. Ao primeiro sinal de recrudescimento da Burguesia, no pós jornadas de junho, grande parte da esquerda socialista e revolucionária apela, de forma equivocada ou oportunista,às bandeiras democrático-burguesas. As proposições de políticas públicas tentam “canalizar a insatisfação popular”, partidos de esquerda tentam surfar na indignação com uma fraseologia mais ou menos resumível em: “somos indignados como vocês, nós te representamos”. Infelizmente a lição rebelde das ruas se dilui na lição adaptada do institucionalismo de esquerda ou da abstração dos direitos humanos burgueses. Não negamos a necessidade de denunciar o autoritarismo burguês, contudo essa mera denuncia não aponta para a superação do atual estado de coisas. Discordamos de quem não adjetiva democracia, afirmamos que vivemos uma democracia burguesa com possibilidades emancipatórias esgotadas. O Estado burguês não é flexível como pensam reformistas bem intencionados ou ex-petistas arrependidos, a democracia não é em abstrato e somente é revolucionária no bojo de uma estratégia de ruptura socialista. Em suma: A sociedade socialista não será construída senão sobre os “escombros da velha sociedade”.

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Texto 3 - Quem somos?

O coletivo desgovernar surgiu em 2013 após as jornadas de junho, fruto de experiências militantes no PSOL, no movimento estudantil e sindical. Inicialmente, nos agrupamos em torno da construção de uma Revista, que em suas edições apresenta nossos acúmulos e debates. Cientes da insuficiência da revista como expressão desse projeto coletivo, nos constituímos como coletivo pois acreditamos que a cisão entre teoria e prática é incompatível com o que há de mais elementar na tradição do comunismo. Ser militante da desgovernar é sobretudo acreditar que a militância nos diversos movimentos hoje é essencial para construir a sociedade futura sem opressões e exploração que defendemos, sem, no entanto, deixar que essa militância se resuma a luta corporativa, pura e simples, ao contrário, ela deve contribuir pedagogicamente para a construção de um projeto revolucionário que se sobreponha aos interesses particulares dos diferentes grupos na sociedade. Para construir esse projeto, defendemos a necessidade de uma ferramenta partidária que supere as experiências partidárias existentes, mas não as ignoramos. O que nos reuniu foi uma experiência militante nos movimentos referenciada na esquerda não governista, particularmente em posições próximas ao PSOL. Atuamos junto ao campo que participam alguns coletivos que compõe a esquerda partidária – PSOL, PCB, PSTU – assim como grupos anarquistas e outros militantes e coletivos que não se identificam a priori com nenhum dos grupos organizados, que negam a farsa democrático burguesa (sobre o nome de democrático e popular ou democrático de direito) e buscam na militância concreta apontar para a superação da fragmentação da esquerda e do corporativismo dos movimentos em quem participamos. A construção dessa superação passa, em nossa concepção, pela articulação desse setor e disputa dos rumos dessa reorganização a partir dos descontentes e insubordinados desse amplo campo político. Para isso, é importante fazer a critica do institucionalismo e reformismo presente em muitas das organizações, quando não identificam que um projeto emancipatório por dentro do Estado burguês não é capaz de construir a plena emancipação humana. Além disso é preciso negar o espontaneismo que acredita cegamente que as coisas dão certo por si só, sem preparação ideológica e política capaz de reverter a ordem opressora que nos educa a ser explorados. Essa negação da preparação política e ideológica apenas colabora para nossa dispersão e nos desorganiza. Acreditamos na atualidade da revolução socialista e na possibilidade do futuro comunista da humanidade a partir dela. Nosso projeto revolucionário pressupõe um estado socialista que restrinja os privilégios da burguesia. Defendemos que nossa autonomia nos diversos movimentos deve ser o germe da construção de nosso autogoverno. Portanto somos radicalmente contra a utilização de movimentos como correia de transmissão de organizações externas aos movimentos e defendemos que o alinhamento e a unidade que devemos construir deve ser orgânica e superar a fragmentação pelo debate político coletivo, pelo convencimento e pela solidariedade militante cotidiana, não por adesão ou disputa de torcida. O papel das organizações de esquerda deve ser sobretudo elaborar e socializar conhecimentos sobre a realidade assim como pensar a estratégia revolucionária necessária a superação da ordem do capital. Ser da desgovernar é apostar que é possível construir essa alternativa. Estamos abertos a tod@s que toparem esse projeto conosco!

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Texto 4 - Sobre a dualidade de poderes (V. I. Lênin)

A questão fundamental de toda a revolução é a questão do poder de Estado. Sem esclarecer esta questão nem sequer se pode falar em participar de modo consciente na revolução, para já não falar em dirigi-la. Uma particularidade extremamente notável da nossa revolução consiste em que ela gerou uma dualidade de poderes. É preciso, antes de mais nada, compreender este fato; sem isso será impossível ir avante. É necessário saber completar e corrigir as velhas «fórmulas», por exemplo, as do bolchevismo, porque, como se demonstrou, foram acertadas em geral, mas a sua realização concreta revelou-se diferente. Ninguém antes pensava nem podia pensar na dualidade de poderes. Em que consiste a dualidade de poderes? Em que ao lado do Governo Provisório, o governo da burguesia, se formou outro governo, ainda fraco, embrionário, mas indubitavelmente existente de fato e em desenvolvimento: os Sovietes de deputados operários e soldados. Qual é a composição de classe deste outro governo? O proletariado e os camponeses (vestidos com a farda de soldado). Qual o caráter político deste governo? É uma ditadura revolucionária, isto é, um poder que se apoia diretamente na conquista revolucionária, na iniciativa imediata das massas populares vinda de baixo, e não na lei promulgada por um poder de Estado centralizado. É um poder de um gênero completamente diferente do poder que geralmente existe nas repúblicas parlamentares democrático-burguesas do tipo habitual imperante até agora nos países avançados da Europa e da América. Esta circunstância é esquecida com frequência, não se medita sobre ela, apesar de que nela reside toda a essência do problema. Este poder é um poder do mesmo tipo que a Comuna de Paris de 1871. Os traços fundamentais deste tipo são: a fonte do poder não está numa lei previamente discutida e aprovada pelo parlamento mas na iniciativa direta das massas populares partindo de baixo e à escala local, na «conquista» direta, para empregar uma expressão corrente; a substituição da polícia e do exército, como instituições separadas do povo e opostas ao povo, pelo armamento direto de todo o povo; com este poder a ordem pública é mantida pelos próprios operários e camponeses armados, pelo próprio povo armado; o funcionalismo, a burocracia ou são substituídos também pelo poder imediato do próprio povo ou, pelo menos, colocados sob um controlo especial, transformam-se em pessoas não só elegíveis mas exoneráveis à primeira exigência do povo, reduzem-se à situação de simples representantes; transformam-se de camada privilegiada, com «lugarzinhos» de remuneração elevada, burguesa, em operários de uma «arma» especial, cuja remuneração não exceda o salário normal de um bom operário. Nisto, e só nisto, consiste a essência da Comuna de Paris como tipo especial de Estado. Esta essência foi esquecida e deturpada pelos Srs. Plekhánov (chauvinistas declarados que traíram o marxismo), Kautsky (os homens do «centro», isto é, os que vacilam entre o chauvinismo e o marxismo) e, em geral, todos os sociais-democratas, socialistas-revolucionários, etc, hoje dominantes. Escapam-se com frases, refugiam-se no silêncio, esquivam-se, felicitam--se mutuamente mil vezes pela revolução, não querem refletir no que são os Sovietes de deputados operários e soldados. Não querem ver a verdade manifesta de que, na medida em que esses Sovietes existem, na medida em que são um poder, existe na Rússia um Estado do tipo da Comuna de Paris.

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Sublinhei «na medida», pois é apenas um poder embrionário. Pactuando diretamente com o Governo Provisório burguês, e fazendo uma série de concessões de fato, cedeu e cede ele próprio posições à burguesia. Porquê? Talvez porque Tchkheídze, Tseretéli, Steklov e C.a cometem um «erro»? Tolices. Assim pode pensar um filisteu, mas não um marxista. A causa é o insuficiente grau de consciência e de organização dos proletários e dos camponeses. O «erro» dos chefes mencionados reside na sua posição pequeno-burguesa, em que obscurecem a consciência dos operários em vez de os esclarecerem, lhes inculcam ilusões pequeno-burguesas em vez de as refutarem, reforçam a influência da burguesia sobre as massas em vez de libertarem as massas dessa influência. Daqui deveria já ficar claro porque é que também os nossos camaradas cometem tantos erros ao formular «simplesmente» esta pergunta: deve-se derrubar imediatamente o Governo Provisório? Respondo: deve-se derrubá-lo pois é oligárquico, burguês, e não de todo o povo, ele não pode dar nem paz, nem pão, nem plena liberdade; não se pode derrubá-lo agora pois sustenta-se graças a um acordo direto e indireto, formal e de fato, com os Sovietes de deputados operários e, em primeiro lugar, com o principal Soviete, o de Petrogrado; de uma forma geral não se pode «derrubá-lo» pelo meio habitual, pois assenta no «apoio» que presta à burguesia o segundo governo, o Soviete de deputados operários, e este governo é o único governo revolucionário possível, que expressa diretamente a consciência e a vontade da maioria dos operários e camponeses. A humanidade não criou e nós não conhecemos ate hoje um tipo de governo superior nem melhor que os Sovietes de deputados operários, assalariados agrícolas, camponeses e soldados. Para se tornarem o poder, os operários conscientes têm de conquistar a maioria para o seu lado: enquanto não existir violência contra as massas, não haverá outra via para o poder. Não somos blanquistas [N21], não somos partidários da tomada do poder por uma minoria. Somos marxistas, partidários da luta proletária de classe contra a embriaguez pequeno-burguesa, o defensismo-chauvinismo, a fraseologia, a dependência em relação à burguesia. Criemos um partido comunista proletário; os melhores partidários do bolchevismo criaram já os seus elementos; unamo-nos para o trabalho proletário de classe e de entre os proletários, de entre os camponeses pobres, um número cada vez maior colocar-se-á do nosso lado. Porque a vida destruirá dia a dia as ilusões pequeno-burguesas dos «sociais-democratas», dos Tchkheídze, Tseretéli, Steklov, etc., dos «socialistas-revolucionários», dos pequenos burgueses ainda mais «puros», etc., etc. A burguesia é pelo poder único da burguesia. Os operários conscientes são pelo poder único dos Sovietes de deputados operários, assalariados agrícolas, camponeses e soldados, pelo poder único preparado pelo esclarecimento da consciência proletária e pela sua libertação da influência da burguesia, e não por meio de aventuras. A pequena-burguesia — os «sociais-democratas», os socialistas-revolucionários, etc., etc. — vacila, dificultando este esclarecimento, esta libertação. Tal é a verdadeira correlação das forças de classe, que determina as nossas tarefas. Assinado: N. Lenine.

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Texto 5 - Onde a esquerda guarda o seu racismo? “Querem sempre nos manter no mesmo nível do início e a descarada hipocrisia que aqui no Brasil não há racismo(…) É menor o nosso grau de escolaridade Poucos negrxs possuem curso universitário Construímos escolas e universidades Falamos aqui o mesmo vocabulário Negrxs vamos conquistar o que nos pertence Fortaleçam a corrente irmãos Nós somos bons e inteligentes, unidos, contentes Punhos forte dessa nação” Unidade Punho Forte

Há alguns anos, uma peça publicitária do projeto “Diálogos contra o racismo” do IBASE chama atenção com o slogan “Onde você guarda seu racismo? ” . Houve muito suspense antes do subtítulo “Não guarde, jogue fora!” aparecer pela primeira vez. Essa campanha causou muito impacto, era verdade, a atitude comum de um sujeito sistematicamente oprimido, no tipo de sociedade que temos, é tentar esquecer ou naturalizar as opressões sofridas. Trazer à tona as situações de opressão cotidiana é muito importante para o avanço na construção de uma sociedade socialista sem racismo. De forma breve esse texto revirou nosso baú de memórias para relembrar as argumentações racistas de esquerda e a postura de reprodução incessante do racismo nas organizações de esquerda no Brasil.e temos, é tentar esquecer ou naturalizar as opressões sofridas. A essa altura, se você está pensando: -“Mas por que racismo na esquerda? Por que não fala da direita?” Você pode não ser de esquerda(rs espero que seja), pode não ter entendido, ou ter muito racismo naturalizado em você mesmo. Não há como crer que um projeto de direita, burguês, decadente, que nasce com a absolutização do homem branco, heterossexual, produtivo e religioso, possa avançar para uma sociedade emancipada e por isso decidi nesse texto falar dos racismos na esquerda socialista. Para abrir nosso baú, listo abaixo algumas formas de expressão desse racismo que figuram ainda no senso comum da esquerda Brasileira. Vale ressaltar que a maior parte do fundamento deste racismo encontra-se no desagregado e gelatinoso senso comum da maior parte da população e foi constituído como ideologia, como uma visão fragmentária e instrumental da realidade, obstaculizando a percepção da realidade. Anti-racismo subalterno- Muitas organizações políticas da esquerda socialista possuem seus “departamentos”, “setoriais” ou “secretarias” que tratam da questão racial. Essa existência é um avanço no que diz respeito a possibilidade de auto-organização dos negrxs algumas vezes, outras vezes representa a transformação das lutas do povo negro em um conjunto de bandeiras abstratas. Acabam ignorando que a questão racial é central para compreender as particularidades da formação social do Brasil.

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O Anti-racismo subalterno também opera com ações afirmativas quando estas são restritas a formalidade de cotas nas direções. Não desprezo que seja importante a defesa de cotas nas direções como forma de estimular a formação de quadros políticos negrxs, contudo, sem que haja de fato protagonismo do conjunto de negrxs nessas organizações e sem que se aprofunde o debate até o desconforto de quem se descobre reproduzindo o racismo, essa medida pode servir para reforçar os rebatimentos do mito da democracia racial em menor escala. “Somos uma organização que tem negrxs na direção não somos racistas.” A Esquerda integradora- Parte da esquerda é contra a “auto-organização” dos negrxs no interior das suas organizações e nos movimentos sociais com a justificativa de que isso criaria cisões no interior das organizações. Essa esquerda contraria a razão dialética e a historicidade como forma de conhecer a realidade, não percebem que a tal cisão racial já existe, é um dado da realidade que apenas se acoberta ao ignorarmos que o conjunto de militantes negrxs dessas organizações sofrem constrangimentos diversos da realidade social que os militantes brancos não conhecem a não ser pelos relatos e pela literatura. A existência de algo que foge ao controle do homem branco médio de esquerda o apavora, a possibilidade de ser identificado como “ racista” o aborrece. É exatamente na perda de poder do homem branco que se incide no debate racial, não em busca de uma natureza equilibrada entre negrxs e brancos, mas na possibilidade de desvelar e frear as determinações que conferem xs negrxs um lugar de subalternidade na sociedade e nas organizações de esquerda. O “Classismo” racista- Parte da reprodução do racismo nas organizações de esquerda hoje é justificada por um pretenso apelo ao “classismo” e a determinação econômica da realidade. Ao contrário de Marx que compreende o real como “síntese de múltiplas determinações” esses sujeitos eliminam todas as determinações do real que não sejam visualizáveis na atividade produtiva. Esse Classismo racista chega até a reproduzir o olhar do senso comum que repete a ladainha “isso é pobreza, não é racismo” fazendo a ligeira mudança “Isso é classe e não racismo”. Comportam-se como se fosse possível cindir determinações políticas, econômicas e sociais e como se a história não se movesse com a subordinação em dado momento de um elemento e depois sua preponderância e como se sumissem as determinações históricas na letra da lei ou com “vontade política”. Quem quiser falar de auto-organização da classe que trabalha e da destruição do capitalismo no Brasil não pode ignorar que os negrxs são a maior parte do exército industrial de reserva permanente do capital, que justifica a “superexploração” do trabalho, mecanismo generalizado que permite o “crescimento econômico” dependente. Quem acredita que o comunismo é a expressão maior da democracia, superando o nosso tempo histórico, não pode ignorar que há mecanismos complexos de reprodução do racismo incorporados a forma de produzir e se reproduzir do Capital . Enquanto esse classismo negar as particularidades da forma de viver e sobreviver do povo negro ele não apontará para nada diferente de outra sociedade hierarquizada com o homem branco no topo da pirâmide. A Esquerda politicamente incorreta- A Incidência do discurso pós moderno sobre o movimento negro por vezes confunde a esquerda que quer se confundir. Ainda há os que acham que alimentar uma linguagem opressora, com piadas racistas e brincadeiras etnocêntricas não têm nada a ver com racismo. Não tem nada relacionado coma correção da política mas com nosso direito, como povo negro, de viver sem ter que ouvir de nossos com companheiros o discurso de nossos opressores. Não se trata de um louvor a uma linguagem asséptica e neutra, ao contrário é a consciência de que não existe linguagem neutra que deve nos mover a vetar expressões racistas de nosso vocabulário.

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Haveria ainda muitas outras manifestações de racismo na esquerda para listarmos, contudo, o objetivo desse texto já pode ser cumprido se o seu leitor jogar fora seu racismo ou pelo menos se reconhecer que tem racismo para ser jogado fora.

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Texto 6 - Às mulheres trabalhadoras (A. Kollontai)

Camaradas trabalhadoras, Durante muitos séculos a mulher esteve oprimida e privada de direitos. Durante muitos séculos, ela não era mais que um apêndice do homem. O marido dava de comer à sua esposa, e por isso ela estava submetida à sua vontade, e resignação levava a privação de direitos, à sua escravidão na família e no lar. A Revolução de Outubro emancipou a mulher. Agora uma camponesa tem os mesmos direitos de um camponês, uma trabalhadora tem os mesmos direitos de um trabalhador. As mulheres em todas as partes tem direito a voto, podem optar por ser membras dos Soviétes e comissárias, e inclusive Comissária do Povo. Mas, ainda que as mulheres tenham os mesmos direitos sob a lei, a vida, em contrapartida, não foi liberta: a operária, a camponesa, ainda estão submetidas à servidão aos seus afazeres domésticos, sendo ainda uma escrava de sua própria família. O objetivo dos trabalhadores agora consiste em organizar a vida de tal maneira, que permitisse tirar a tarefa de cuidar dos filhos dos ombros das mulheres, para facilitar-lhes o trabalho e tirar da servidão doméstica a operária e a camponesa. A classe operária está interessada em liberar às mulheres também nessas áreas. O trabalhador deve entender que uma mulher é um membro da família proletária, assim como ele mesmo. No fim das contas, a mulher trabalha como o homem. Um terço de todas as riquezas do mundo foi criada pelas mulheres; na Europa e na América, o número de trabalhadoras chega a 70 milhões de pessoas. Na sociedade Comunista o homem e a mulher devem ser iguais! Sem a igualdade para as mulheres, não há Comunismo. Sendo assim, ao trabalho, camaradas trabalhadoras! Emancipem-se! Construam creches, maternidades, ajudem os Soviétes a construir restaurantes públicos, ajudem o Partido Comunista a construir uma nova e luminosa vida! Seu lugar é junto daqueles que lutam pela emancipação dos trabalhadores, pela igualdade, a liberdade e a felicidade de seus filhos. Seu lugar, operárias e camponesas, está junto à revolucionária bandeira vermelha do vitorioso Comunismo mundial!

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