I Ăľ a d d t c p e t o d E
m p r e e c e r o i f e r e o r p r e n s s r a b a O r
s s s c a s e n s o s e t n o l h u m e v e r t o n L a m p e
impressĂľes
O tempo é hemorragia de energia vital. Paul Zumthor Constituído pela angústia, à primeira vista de uma brevíssima análise, o ser contemporâneo é “sem tempo” e escorre por entre os desvãos de uma miséria que já não se pode nomear. Orum surge como território nômade entre corpos, tempos e lutas - que também são da constelação dos corpos - proporcionando o agenciamento entre corpo-tecnológico, corpo-guerra e corpo-ancestral; mas antes que adentremos estes territórios discursivos para além das terminologias, é importante observar que a performance de Everton Lampe, surge como para obscurecer a contemporaneidade diatópica dos grandes centros urbanos, habitat de semióticas selvagens e afetos propagandísticos, proporcionando com isto o choque de nossas corporeidades vertiginosas.
CORPO-TECNOLÓGICO Cada vez mais o íntimo humano é permeado por aplicativos. Quantas vezes não recorremos aos smartphones e ou computadores para se obter uma direção, um mapa que nos conduza ou ainda, conduções outras para os desejos freudianos de toda a mass media urbana? Esses territórios de relações subjetivas promovem ao meu ver, uma espécie de mutação maquínica, ou seja, tornam-se esses objetos tecnológicos, extensões de sentidos do corpo-humano, como por exemplo, ao acessar um mapa quando me sinto perdido sem que me dê engolido totalmente por aquela geografia ao meu redor, acesso-o não como guia, mas como sentido. Quando a voz do google maps diz vire a esquerda, sigo-a como se fosse eu quem dita a direção e não o objeto celular conectado ao aplicativo. Poderíamos ir mais além ao analisar as correntes ideológicas proliferadas pelas/nas mídias sociais, elas também agem como sentido, só que o político e o existencial. Essas extensões fundidas ao corpo-humano nos conduzem às lógicas do capital a medida que são instáveis e efêmeras na timeline. Orum performa toda aquela que está em busca de um campo de atuação humana e precisa urgentemente pensar esse novo corpo indivíduo e social nos territórios hostis e repelentes como as grandes cidades tomadas pelas correntes de gentrificação.
Outras qualidades importantes no guerrilheiro urbano são as seguintes: que possa caminhar bastante; que seja resistente à fadiga, fome, chuva e calor; conhecer como se esconder e vigiar, conquistar a arte de ter paciência ilimitada; manter-se calmo e tranquilo nas piores condições e circunstâncias (...)
Ismael Ivo em “Erendira: a documentary of Ismael Ivo's Biblioteca do Corpo”, diz que uma Erendira é sobre a capacidade de sobreviver, e é isso que nos dá tesão em criar. O corpo-guerra que habita os territórios urbanos, rurais e marítimos, demonstra com o passar dos séculos a sua exímia capacidade de sobrevivência, mas que ao longo das últimas décadas vem sofrendo baixas significativas quando de fronte com a soberania do capital, tão responsavelmente administrada pelo estado. De acordo com Giorgio Agambem, tal característica é própria do governo público somado ao privado; o estado de exceção age sobre tudo no corpo considerado como fora, ou excedido de uma ideia de corpo maior/ padrão, tendo assim, a sua “retomada” ou inserção ao meio no qual mesmo nunca tendo pertencido será obrigatoriamente incluído, através da violência de forças normativas e hegemônicas. Ao meu ver, Everton Lampe através da performance de Orum, dança com os corpos fadigados dessa biopolítica, questionando ora a real representatividade das lutas das quais nos posicionamos, ora convidando-nos a se posicionar, porém, ao meu ver uma fenda não se revela muito bem ao perguntarmos de que maneira esse corpo-guerra excedido se reerguerá para um corpo-guerra-social, correndo então o risco de Orum se tornar um “paraíso” ideológico?
CORPO-GUERRA
Carlos Marighela
CORPO-ANCESTRAL
1 Caetano Veloso, O estrangeiro, 1989
POR LUCAS BERNARDI
Parte da luta por territórios em nosso continente, atravessou as fronteiras dos séculos pela oralidade. Reconheço um certo fascínio pela ideia de “Carne no mundo” cunhada por Merleau-Ponty ao se referir ao ser humano sensível e seus territórios interiores, e, permito-me aqui um exercício de superação deste conceito às lutas dos povos indígenas, quilombolas e trabalhadores sem-terra que tanto se constituem como carne no mundo, mundo ávido pelo sangue dessas carnes. Na perspectiva que é a minha, Orum, emprega esse corpo-ancestral - tão presente em nós brasileiras como educação política para o pensar e desenvolver de outros corpos, do contrário, sem o conhecimento de uma nação de diversos corpos-ancestrais, continuaremos fadadas ao cristianismo e ao eurocentrismo, com corpos amordaçados, fragmentados e isolados, para no fim nos restar o estrangeiro e “o macho adulto branco sempre no comando1”.