TFG | Nova sede do Museu da Diversidade Sexual - Lucas Zabeu Cunha (FAU-USP)

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nova sede do MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL


NOTA DE PUBLICAÇÃO Este trabalho foi apresentado como Trabalho Final de Graduação (TFG) à FAU-USP como etapa final da minha formação enquanto arquiteto e urbanista, no dia 17 de dezembro de 2018. Tenho orgulho de dizer que também foi um trabalho indicado ao 29º Opera Prima, premiação que reúne os melhores trabalhos de conclusão de curso do Brasil na área de Arquitetura e Urbanismo, em 2019. Dito isso, a demora por publica-lo se justifica na medida que o concurso exige sigilo das propostas, bem como demanda também uma expansão e continuidade de desenvolvimento do trabalho. Por isso, devo dizer que, sim, alguns dos conteúdos sobretudo de representação e diagramação foram revistos no processo de revisão do trabalho pós-entrega. Sobre esta publicação no Issuu: Todos sabem como é difícil transpor uma publicação física para o formato digital sem grandes perdas. Estes caderno foram pensados originalmente como dois volumes impressos diferentes, e com publicações físicas se consegue trabalhar melhor formatos, texturas e volumes, portanto um pouco disso se perdeu na transposição para o meio digital. A meu ver a maior perda foi na capa, que originalmente contava com buraco em forma de triângulo que permitia visualizar um segundo triângulo rosa metálico no interior do caderno. Nesta analogia ao símbolo de condenação nazista dos homossexuais que se tornou, rotacionado, símbolo de resistência, o caráter espelhado do triângulo rosa permitia a quem manuseasse o


caderno se enxergar dentro dele. Este trabalho dispunha de dois volumes físicos originalmente, um caderno-memorial e um bloco de desenhos técnicos. Ambos foram entregues juntos à banca, dentro de um envelope pardo etiquetado - uma citação à maneira que se entregam documentos oficiais e/ou sigilosos/ofensivos. Optei, na conversão para o meio digital, por aglutinar os dois volumes dentro de um mesmo arquivo no Issuu, mantendo, porém, sua separação. Ao final do caderno, se encontra o volume de desenhos, com os cortes, plantas e demais desenhos técnicos entregues com o trabalho. Obrigado e boa leitura!

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nova sede do MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL

Lucas Zabeu Cunha ORIENTAÇÃO Renato Cymbalista Rodrigo Queiroz Maria de Lourdes Zuquim (orientadora metodológica) Trabalho Final de Graduação FAU-USP | Dezembro de 2018


“assim como o espetáculo da vida, o espetáculo do desejo é generoso na proporção direta de sua fragilidade”

- João Silvério Trevisan


AGRADECIMENTOS Ao Luis, por não soltar a minha mão. Ao mestres Rodrigo Queiroz e Renato Cymbalista, meus orientadores, pela paciência, atenção e sensibilidade com as quais me acompanharam e conduziram este processo. Ao Paulo Trevisan e ao Fabio Mariz, por tão gentilmente aceitarem o convite para participar da minha banca. À Maria de Lourdes Zuquim, cujas provocações foram essenciais para o florescimento deste trabalho. Ao Franco Reinaudo, Leonardo Arouca e toda a equipe do Museu da Diversidade Sexual pela gentileza com que me receberam e se dispuseram a conversar. A todos os meus amigos de Sorocaba e da FAU, por estarem sempre ao meu lado nos momentos bons e nos momentos não tão bons da vida. Por acompanharem (muito) de perto o andamento deste trabalho e pela ajuda essencial, agradeço especialmente: Pedro Felix, Maria Eduarda Leitão, Thais Godoi, Bruna Kanashiro, Pedro Fortunato, Víctor Martins, Natalia Mota, Julia Amadio, Marilia Garson, Melina Moscardini, Amanda Ferreira, Victor Sophia, Débora Nojiri, Mariana Gonçalves, Murilo Romeu, Natalia Borges, Amanda Amary, Karen Matsuda, Renan Prado, Victória Baggio. A todos da Figueroa.arq, pela ajuda valiosa ao longo deste trabalho. A os professores, funcionários e colaboradores da FAU-USP que contribuíram direta ou indiretamente com a minha formação. À minha família, por me fazer quem eu sou.


INTRODUÇÃO | 14

ANEXOS | 112


O MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL | 24

MEMORIAL DE PROJETO | 44

BIBLIOGRAFIA | 110


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INTRODUÇÃO


[1] A sigla LGBT é uma abreviação para lésbicas, gays, bissexuais e transexuais. Neste trabalho, para tornar a sigla ainda mais inclusiva, optei por utilizar LGBTQ, adicionando a letra Q, de Queer, já que “queer” neste caso simboliza manifestações de sexualidade, identidade de gênero ou expressão de gênero que não se conformam à heteronormatividade.

Acredito, como muitos, que o TFG é o momento da graduação em que se deve olhar para trás e analisar a experiência de vivência e aprendizado na Universidade como um todo, para aplicá-la em um trabalho de finalização interdisciplinar. Assim, a escolha de propor neste TFG uma nova sede para o Museu da Diversidade Sexual é, além de acadêmica, política e pessoal na mesma medida. Ao longo de toda a minha formação, os museus foram um tema de grande interesse. Neles se entrelaçam os campos da história, da memória e do projeto de arquitetura. Em intercâmbio na Universidade do Porto, tive a oportunidade de cursar em paralelo duas disciplinas do mestrado em museologia. Cheguei do intercâmbio com a ideia fixa de projetar um museu em meu TFG. Mas, afinal, que museu seria esse? Numa pesquisa inicial de museus existentes em São Paulo que ainda não tinham uma sede fixa ou sofriam por problemas espaciais, me deparei com o Museu da Diversidade Sexual (MDS. Enquanto membro da comunidade LGBTQ[1], me encanta a ideia de termos no Brasil um dos poucos museus do mundo ligados a esta temática, e talvez o único de origem no poder público. Ao mesmo tempo, é um consenso a falta de um espaço que comporte plenamente as necessidades da instituição. Um espaço adequado garantiria uma maior representatividade, acolhimento e afirmatividade para a população LGBTQ e sua dura - porém rica - memória. Além disso, em tempos como os atuais, a escolha se deu como um posicionamento político. Episódios como o cancelamento da exposição QueerMuseu, os protestos conservadores gerados pela performance artística do MAM e os ataques raivosos contra a democracia e todo e qualquer tipo de diversidade são exemplos do embate público atual entre, de um lado, uma onda de conservadorismo que assola a sociedade brasileira e, de outro, uma demanda cada vez

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_abaixo Imagem da Parada do Orgulho LGBT de SĂŁo Paulo, na Avenida Paulista, uma das maiores do mundo, chegando a reunir dois milhĂľes de pessoas.


maior por representatividade e igualdade de direitos por parte das minorias. Ao longo do período de desenvolvimento deste trabalho, com a ascensão e eleição de um candidato a Presidente da República que legitima e reproduz o discurso de ódio contra a população LGBTQ e outras minorias, a situação se agravou e adquiriu proporções que no início do processo seriam inimagináveis. Nesse sentido, enquanto homem gay e futuro arquiteto e urbanista, tomo partido na luta pela igualdade de direitos civis e, sobretudo, pelo direito inalienável de amar. Acredito que este trabalho nunca foi tão atual e necessário quanto no momento que vivemos, especialmente em uma universidade pública. É um caminho pertinente para o desenvolvimento do meu TFG, que alia história, memória, luta política e projeto de arquitetura e que me representa frente às ameaças do discurso de ódio e da intolerância. Levo adiante esta proposta.

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A QUESTÃO LGBTQ NOS MUSEUS Atualmente, com a popularização da discussão da temática LGBTQ ao redor do mundo, ela também tem sido apropriada por instituições museológicas como assunto principal ou como temática para exposições temporárias e debates. De acordo com o Museum and LGBTQ Report, da Swedish Exhibition Agency, o Museu da Diversidade Sexual foi o terceiro museu dedicado unicamente à “história LGBTQ”[2] a ser fundado em todo o mundo. A mesma publicação aponta outros dois museus devotados à história LGBTQ o Schwules Museum em Berlim e o GLBT History Museum em San Francisco, além do Leslie Lohman Museum of Gay and Lesbian Art em Nova Iorque, que fica como adendo na lista por ser voltado à arte produzida por indivíduos LGBTQ. Entretanto, com a difusão da discussão e a busca por representatividade por parte da população LGBTQ, a temática tem atingido também os espaços expositivos e museus “tradicionais”. Serão citados rapidamente casos de exposições que de algum modo abordam a problemática da diversidade sexual, em cujo conjunto é possível se observar um certo padrão: ou elas acontecem seguindo a comemoração de alguma data comemorativa para o movimento ou um como resposta acontecimento político relevante para o meio artístico-político. Exemplos de exposições e ciclos de eventos ligados à comemoração de datas importantes para o movimento LGBTQ em espaços tradicionais não faltam, especialmente fora do Brasil. Inclusive, dado que em 2019 completam-se 50 anos da Revolta de Stonewall, já há um movimento de organização de ciclos de palestras e exposições temporárias em museus de importância mundial, como o Tate Modern. Um exemplo mais concreto, dentre muitos outros, seria a exposição Desire, love, identity: exploring LGBTQ histories, do British Museum.

[2] SWEDISH EXHIBITION Agency (Riksutställningar). Museums and LGBTQ Report. Estocolmo: Swedish Exhibition Agency, 2015. p. 28.


19 _acima fachada do Leslie-Lohman Museum of Gay and Lesbian Art, em Nova Iorque. _abaixo fachada do Schwules Museum, em Berlim.


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Organizada pelo museu para comemorar o aniversário de 50 anos da aprovação pelo parlamento britânico do Sexual Offences Act (lei que descriminalizou parcialmente a homossexualidade no país) sua duração foi pensada para coincidir com o mês do orgulho LGBTQ e a Pride Parade de Londres. No outro extremo, temos as exposições que são mais politizadas, organizadas para levantar um debate na sociedade ou como resposta a uma questão em discussão ampla no momento. Foi o caso, por exemplo, das exposições Queermuseu (Santander Cultural Porto Alegre, 2017) e Histórias da Sexualidade (MASP, 2017), que trouxeram para dentro do “sacro” espaço museológico a questão da diversidade sexual. Caminhamos para uma realidade onde se acende cada vez mais a luz sobre a discussão dos direitos e da representatividade LGBTQ, sob todas as óticas de pensamento. Nesse sentido, é benéfica a aproximação dos museus e espaços expositivos tradicionais ao tema. Deve-se ter cuidado, porém, com aproximações superficiais. Tal tipo aproximação não pode se tornar via de regra uma exceção à norma ou um ato comemorativo/efeméride. Numa situação ideal, a questão LGBTQ deve ser incorporada ao cotidiano dos museus como algo normal, quotidiano, refletindo uma sociedade que, idealmente, acolhe e dignifica a diversidade e pluralidade do ser humano.

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_acima Fachada do Gay Lesbian Bisexual and Transgender History Museum, em São Francisco. _meio Peça de divulgação da exposição “Histórias da Sexualidade”, realizada pelo MASP em resposta aos ataques à exposição Queermuseu. _abaixo Peça de divulgação da exposição “Queermuseu”, realizada no Santander Cultural de Porto Alegre e cancelada após ser fruto de indignação de setores conservadores da população.

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MÉTODO E PROCESSO Este trabalho se pretende não como uma monografia acompanhada de projeto, mas como o relato/memorial de um processo que culmina em um projeto autônomo. Uma monografia que englobasse o contexto dos LGBTQ na vida urbana e na sociedade brasileira, as repercussões disso na arquitetura e outras inúmeras questões relevantes para o tema deste trabalho seria uma pesquisa autônoma com assuntos cuja complexidade de abordagem muito ultrapassa o escopo deste TFG. Decidi por apresentar aqui um texto-memorial explicativo, que incorpora as referências, conceitos e pesquisa desenvolvida ao longo do processo quando necessários para justificar, sustentar e/ou explicar o projeto, como Lucio Costa no memorial do anteprojeto que desenvolveu para a Universidade do Brasil[3]. Dessa maneira, será possível focar no produto principal - o projeto de arquitetura - de maneira mais objetiva. Ao invés do tradicional método de “estudar no TFG1 e projetar no TFG2”, optei por realizar as duas coisas desde o começo, de modo que o resultado deste esforço seja de fato o ponto final de um processo contínuo, ainda que não linear, como demonstram os diagramas na página ao lado. A cada novo dado, informação ou ideia, o processo de projeto evoluía, com o desenho e redesenho de alternativas para a solução do problema originalmente formulado.

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[3] COSTA, Lucio. Cidade Universitária. In: COSTA, Lucio. Lucio Costa: registros de uma vivência. Rio de Janeiro: Empresa das artes, 1995. Pp. 172-189.


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DESENVOLVIMENTO LINEAR

PROJETO COMO PESQUISA | PESQUISA ATRAVÉS DO PROJETO


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O MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL


_acima Entrada do Museu da Diversidade Sexual, dentro da estação República do Metrô de São Paulo. _abaixo Interior do Museu da Diversidade Sexual.

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O Museu da Diversidade Sexual foi criado através do decreto nº 58.075, de 25/05/2012 (SÃO PAULO, 2012) pelo Governo do Estado de São Paulo como “Centro de Cultura, Memória e Estudos da Diversidade Sexual do Estado de São Paulo”, então sem o status administrativo de museu. Sua criação foi fruto de um

[4] Entrevista com Franco Reinaudo, diretor do Museu da Diversidade Sexual, no dia 28 de março de 2018. Disponível no Anexo 1 deste caderno.

esforço coletivo por parte de militantes LGBTQ e do Governo do Estado. A denominação “Museu da Diversidade Sexual”, segundo o diretor Franco Reinaudo, ativista LGBTQ de longa data, é uma tentativa de contemplar o tema sem depender de uma sigla que está em constante mudança (GLS, GLBT, LGBT, LGBTQ, LGBTQ+, etc.)[4]. O museu atualmente tem orçamento anual de cerca de 640 mil reais[5], e é gerido desde sua fundação pela Associação Paulista de Amigos da Arte, a APAA, uma Organização Social da Cultura, que presta serviços ao Governo do Estado de São Paulo. Assim que foi criada a instituição, inicou-se a busca por uma primeira sede, temporária, até que se providenciasse um espaço adequado a todas as suas necessidades. O metrô cedeu espaço em uma de suas estações, e a equipe do museu escolheu a estação República para se instalar. Mas por que a República? Especialmente por dois motivos: por um lado, a potência do corredor subterrâneo de passagem do metrô como espaço expositivo aberto para os usuários, e por outro lado a importância da região para a memória da LGBTQ em São Paulo e no Brasil, sendo o local onde ocorreu o assassinato de motivação homofóbica do adestrador de cães Edson Néris, em 2000. Em virtude das restrições espaciais e financeiras, o museu não tem hoje condições de manter um acervo fixo, e atualmente só realiza exposições temporárias, de duração média de dois a três meses. Além disso, também por causa da falta de espaço, a administração do museu não se localiza junto de sua sede, mas na sede da APAA, no Teatro Sérgio Cardoso, no Bixiga.

[5] Idem.


[6] SÃO PAULO. Decreto nº 63.375, de 04 de maio de 2018.

Se por um lado as dificuldades espaciais e orçamentárias são restritivas, por outro lado trazem dinamicidade/performatividade a um espaço já tão potente por sua localização em meio à passagem ininterrupta de usuários do Metrô. O que seria um lugar pouco convidativo e, de certa maneira, um obstáculo no meio do largo corredor – como a delegacia vizinha –, se torna com a presença do museu um espaço de resistência que se reinventa completamente a cada dois/ três meses. Mais recentemente, foi dado à instituição o status oficial de museu, através do decreto nº 63.375, de 04 de maio de 2018. Nele consta: “Artigo 93-B - O Museu da Diversidade Sexual tem por missão preservar o patrimônio sócio, político e cultural da comunidade LGBT brasileira, por meio da pesquisa, salvaguarda e comunicação de referências materiais e imateriais, com vista à valorização e visibilidade da diversidade sexual, contribuindo para a educação e promoção da cidadania plena e de uma cultura em direitos humanos. Parágrafo único - Para fins de perfeita execução do previsto neste artigo, o Museu da Diversidade Sexual tem as seguintes atribuições: 1. formação de acervo, divulgação e publicação de documentos, estudos, relatos, depoimentos e outros materiais referentes à memória e à história política, econômica, social e cultural da comunidade LGBT no Brasil; 2. promoção e apoio a eventos culturais, cursos, conferências, palestras e pesquisas, com o objetivo de promover e divulgar a produção cultural relacionada com a diversidade sexual.” [6]

Dentro da atual situação da instuição, é possível cumprir plenamente - ainda que com dificuldades - apenas a segunda atribuição do decreto. Não há possibilidade de o museu autonomamente formar um acervo e cuidar dele de maneira adequada contanto com as restrições orçamentárias e espaciais com as quais conta hoje.

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_acima, abaixo e acima na página seguinte As imagens mostram como a aparência externa do Museu da Diversidade Sexual muda radicalmente quando muda a exposição temporária que ele abriga.


_abaixo Interior do Museu da Diversidade Sexual.

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A PROPOSTA DE SEDE NA AVENIDA PAULISTA “(...) a questão é que o museu já não cabe lá [na República]. Lá é um espaço incrível, um espaço expositivo muito emblemático, que inclusive nós queremos manter. Mas a verdadeira vocação do museu, além disso, é de ter, de alguma forma, outras atividades de formação, de pesquisa, o centro de memória, o pequeno acervo que nós temos, que precisa ser condicionado em algum lugar. Veja só: a gente fica aqui no [Teatro] Sérgio Cardoso e o museu fica lá... Então, a partir desse cenário, que não cabiam mais as atividades do museu, a gente foi procurar outros espaços. E nessa própria busca, foi quando o próprio Marcelo [Matos Araújo, antigo Secretário da Cultura do Estado de São Paulo] falou: “tem esse casarão na Paulista, vamos conversar com o governador”. E ele foi conversar com o governador, que achou ótima a ideia e declarou isto.” - Franco Reinaudo[7]

A luta por uma sede que contemple plenamente as necessidades da instituição é muito anterior ao decreto. Quando da fundação do museu, a ideia era que a sede no Metrô fosse temporária e viesse a dar lugar a uma sede física permanente que condissesse com as necessidades institucionais. Em 2014 foi oferecido ao museu um dos últimos casarões remanescentes do período do café na Avenida Paulista, número 1919, para o estabelecimento de sua sede definitiva. A iniciativa foi anunciada na Parada do Orgulho LGBT daquele ano, e foi muito bem recebida pela comunidade[8]. Em setembro de 2014[9], lançava-se um concurso de arquitetura para a reforma do imóvel e construção de um anexo, e este conjunto, que totalizaria no máximo 2600m², seria destinado a acomodar a sede definitiva do Museu da Diversidade Sexual. O concurso teve 16 equipes inscritas[10], e foi vencedora a proposta do escritório

[7] Entrevista com Franco Reinaudo, diretor do Museu da Diversidade Sexual, no dia 28 de março de 2018. Disponível no Anexo 1 deste caderno. [8] Fonte: https://noticias. uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/05/04/ no-dia-da-parada-gay-alckmin-anuncia-sede-de-museu-da-diversidade-sexual. htm. Acesso em 18 de setembro de 2018, às 20:35. [9] Fonte: https://www. arcoweb.com.br/noticias/ noticias/casarao-sera-restaurado-para-receber-museu-da-diversidade-em-sp, Acesso em 18 de setembro de 2018, às 20:25. [10] Fonte: Ata da Comissão de Seleção do Edital PROAC n° 13/2014 – Concurso de Apoio a Projetos de Restauração de Imóveis Tombados pelo CONDEPHAAT.


31 _abaixo Corte da proposta do escritório H+F Arquitetos para a sede do MDS na Avenida Paulista.

H+F Arquitetos. O projeto propõe um anexo ao fundo do terreno que interage harmonicamente com o gabarito da construção existente e cria uma praça voltada à Avenida Paulista, com espaço para acolhimento e projeções/eventos externos.


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Perspectiva do projeto desenvolvido pelo escritรณrio H+F Arquitetos para a sede do MDS na Avenida Paulista.

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Perspectiva explodida do projeto vencedor para a sede do MDS na Avenida Paulista, mostrando a divisão programática do edifício.

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ANÁLISE | PROJETO E MUDANÇA PARA A PAULISTA Primeiramente, é necessário comentar as consequências de uma eventual mudança de sede em termos relacionados unicamente à localização. É inegável que, sobretudo depois do surgimento das primeiras Paradas do Orgulho LGBT, a Avenida Paulista se tornou um importante centro de convivência, socialização e até de memória recente para a comunidade LGBTQ de São Paulo e do Brasil. É um lugar onde se pode ver todos os dias da semana casais de gays e lésbicas andando livremente de mãos dadas pelas calçadas. Porém, existem duas questões importantes a serem levantadas: a primeira é relativa a um “recorte de classe” e a segunda é de importância histórica comparativa. Se é verdade que todos os dias se pode ver casais homoafetivos demonstrando seu afeto publicamente na Paulista, também é verdade que é um lugar de ocupação muito segmentada dentro da própria comunidade LGBTQ. Muito rara é a presença de pessoas trans, assim como muito rara é a presença, dentro desse universo de casais, pessoas de minorias étnicas e/ou sociais. Comparativamente, a ocupação da Praça da República e seu entorno por parte da comunidade LGBTQ é extremamente mais variada e abraça um público muito mais diverso. Além disso, é notável que há ali uma concentração consideravelmente maior de lugares de importância histórica para a comunidade LGBTQ (a própria praça, o Largo do Arouche, a Galeria Metrópole, a Av. Vieira de Carvalho, etc.)- do que na Avenida Paulista. O projeto vencedor foi reconhecido pelo júri na ata do concurso como uma “im-


35 [11] Fonte: Ata da Comissão de Seleção do Edital PROAC n° 13/2014 – Concurso de Apoio a Projetos de Restauração de Imóveis Tombados pelo CONDEPHAAT.

portante contribuição à arquitetura do século XXI”[11]. São introduzidas ideias como a construção de um espaço de projeção a céu aberto voltado para a Avenida Paulista e a criação de uma praça acolhedora no espaço entre o casarão e o anexo. Ainda que ganhe em monumentalidade, visibilidade e prestigio, caso construído o projeto para a Paulista se geraria um espaço comparativamente menos performático do que é hoje o espaço na República. Seria ofuscada a capacidade de reinvenção e mutação da sede atual em prol de uma espécie de “normalização museológica” que, na minha opinião, tiraria parte da excepcionalidade que o museu tem desde sua fundação. Assim, o Museu da Diversidade Sexual da Paulista, por ser muito menos dinâmico, se tornaria muito menos atrativo a visitas frequentes e teria muito menos rotatividade de pessoas do que tem hoje. Sabendo dessa diferença, a saída encontrada pelos técnicos do museu foi a de não abandonar o espaço da República caso a sede principal se transfira a Paulista, de modo que fossem mantidos os dois espaços atuando de formas complementares. O projeto tenta criar relações entre decisões no campo da arquitetura e uma eventual representatividade em relação à causa LGBTQ que estas trariam. Isso permeia o texto memorial do projeto, disponível no site do escritório, como na seguinte passagem: “Um centro voltado para a construção do diálogo e do conhecimento deve de algum modo expressar esse caráter através de sua arquitetura, construindo espaços e signos que o representem nas mais diversas escalas de leitura. A relação proposta do novo com as pré-existências busca representar con-


ceitos como respeito e tolerância.

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Como uma grande instalação cinética do artista Jesús Rafael Soto, a trama metálica externa que cobre parcialmente o edifício anexo busca evocar, de maneira sutil, o caráter plural, dinâmico e de resistência que marca o movimento LGBT. A localização do estúdio para coleta de testemunhos em posição destacada provoca uma abertura na trama de fechamento semelhante a um olho ou a um ouvido, abertos a ver e ouvir para conhecer e desconstruir as barreiras da ignorância e do preconceito.” [12]

Disso surgem questões a respeito da relação possível entre arquitetura e representatividade. Qual é a relação possível entre um edifício, sua arquitetura e a questão da diversidade sexual do ser humano? Isso é compreensível para o público no geral?

[12] Fonte: http://www. hf.arq.br/projeto/museu-da-diversidade-sexual/, acesso em 10 de junho de 2018, às 20:30. _abaixo

Perspectiva do projeto desenvolvido pelo escritório H+F Arquitetos para a sede do MDS na Avenida Paulista.


[13] Informações dadas pela historiadora e técnica da UPPH Deborah Neves em palestra na disciplina optativa AUH 247 - Lugares de memória e consciência, ministrada pelos professores Renato Cymbalista e Remom Bertolozzi, no dia 23 de março de 2018.

Um problema jurídico paira sobre a eventual construção da sede do Museu da

[14] Entrevista com Franco Reinaudo, diretor do Museu da Diversidade Sexual, no dia 28 de março de 2018. Disponível no Anexo 1 deste caderno.

Supremo Tribunal Federal, que deu ganho de causa ao proprietário.

Diversidade Sexual no casarão. A técnica Deborah Neves explicou que, quando do tombamento do imóvel, seu proprietário - que diz ainda residir no local apesar de sua situação de quase ruína - entrou com um processo judicial contra o Estado pedindo uma indenização sob alegação de ter sido lesado em seu direito à propriedade, uma vez que o tombamento desvalorizaria o imóvel enormemente. Esse processo correu durante anos na justiça, e chegando inclusive até o

Tempo depois, o Estado entrou com pedido de desapropriação do imóvel, alegando que o transformaria em um equipamento cultural (MDS). Em paralelo, quando foi implementado o novo Plano Diretor Estratégico de São Paulo, que estabeleceu a possibilidade de venda do potencial construtivo excedente de imóveis tombados, o dono do casarão alegadamente vendeu todo o potencial construtivo do lote. O Estado tinha pago, então, um valor altíssimo por um lote onde não se poderia construir mais nenhum metro quadrado para além do já existente. Atualmente, segundo Deborah, corre um processo do Estado contra o dono do imóvel, alegando má fé. De qualquer modo, sem a possibilidade de construir um anexo, se dificulta enormemente o estabelecimento da sede do MDS naquele local.[13] Por outro lado, o diretor do Museu afirmou que ainda existem remotas chances de o projeto da sede na Avenida Paulista sair do papel, uma vez que os processos relacionados ao casarão ainda tramitam na justiça[14]. Na mesma entrevista o diretor reconheceu que o museu voltou recentemente a procurar novos espaços para abrigar sua sede, chegando a entrar em contato com o consórcio responsável pelas obras da Linha Laranja do Metrô para tentar viabilizar a construção de um espaço para o museu na futura estação Higienópolis-Mackenzie.

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ANÁLISE | PLANO MUSEOLÓGICO “(...) O plano museológico, na verdade, como tinha o projeto do espaço já, foi pensado para aquele espaço [da Paulista]. Como isso não aconteceu, a gente não tem ele finalizado, porque ele vai precisar sofrer algum tipo de alteração em virtude de um eventual novo espaço.” – Franco Reinaudo

[15]

Como disse Franco, o plano museológico do Museu da Diversidade Sexual (MDS) foi elaborado tendo um projeto de arquitetura e seu contexto em mente. Por isso, opto aqui por focar a análise mais na ideia geral de que tipo de museu estava sendo pensado, que é o que mais interessa neste trabalho, e não focar em propostas específicas de construção institucional, na medida que essa construção é fruto dos fatores específicos já apontados e, portanto, muito volátil, chegando a ser interrompido junto com a suspensão da mudança de sede para a Avenida Paulista. O “Plano Museológico Institucional” do museu começou a ser desenvolvido em outubro de 2015, por equipe liderada por Maria Cristina Bruno e Kátia Filippini, e o último arquivo que documenta seu desenvolvimento existente na sede do museu data de dezembro de 2015. A museóloga Maria Cristina Bruno é uma das principais teóricas da escola de pensamento museológico do “museu aberto” e foi responsável pela elaboração conceitual dos planos museológicos de praticamente todos os museus mais recentes ligados ao Estado de São Paulo, como por exemplo o Museu do Futebol ou o Museu da Língua Portuguesa[16]. De acordo com essa linha de pensamento, cada museu tem um “conceito gerador” sobre o qual orbita toda a construção teórica e prática da instituição.

[15] Entrevista com Franco Reinaudo, diretor do Museu da Diversidade Sexual, no dia 28 de março de 2018. Disponível no Anexo 1 deste caderno. [16] Fonte: http://www. ceied.ulusofona.pt/pt/maria-cristina-bruno/. Acesso em 10 de novembro de 2018, às 10:35.


39 Pelos arquivos a mim disponibilizados pelo MDS, pude entender empiricamente que esse modo de fazer museus os pensa como instituições educativas, com uma linha de pensamento clara, e determina que o museu se organize em torno de exposições permanentes/de longa duração (5 anos ou mais) menos voltadas a peças ou obras físicas, e mais voltadas ao conteúdo e a uma mensagem a ser passada. Nesse sentido, se faz uso de muitas reproduções, recursos digitais e experiências de imersão sensorial para atingir um objetivo conceitual. No mais, essa linha de pensamento traz consigo a vantagem de baratear os custos de operação do museu, uma vez que praticamente não há acervo e/ou reserva técnica. Graças a isso, por exemplo, o Museu da Língua Portuguesa, incendiado em 2017, poderá ser reconstruído em sua totalidade, pois praticamente nada que se perdeu com o fogo não pode ser reproduzido. Com as demandas atuais presentes no decreto citado anteriormente, que explicitamente apontam para a necessidade de construção e manutenção de um acervo, acredito a ideia de se construir o MDS como um “museu aberto” - e portanto sem acervo - se torna pouco prática e até, pode-se dizer, inviável. Certamente haverá, como disse Franco, a necessidade de se rever essa proposta inicial de plano museológico mesmo caso o museu de fato se instale no casarão, o que, como vimos, é muito pouco provável. Assim, a análise do plano museológico feita para este trabalho se faz necessária para ajudar a entender como seria o museu que estava sendo elaborado em 2015, mas não tem qualquer efeito propositivo prático, uma vez que as demandas da instituição hoje são diferentes das demandas que ela tinha em 2015.

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ANÁLISE | PLANO CURATORIAL O plano curatorial do Museu da Diversidade Sexual, disponível no Anexo 2, foi elaborado juntamente com o plano museológico, em 2015, à época que se finalizava o projeto de arquitetura para a então futura sede na Av. Paulista. João Silvério Trevisan (célebre escritor e ativista LGBT de grande notoriedade) foi a figura convidada para assumir o posto de curador do museu. Autor da mais célebre obra literária sobre a história da homossexualidade no Brasil, Devassos no Paraíso[17], sua função seria coordenar a elaboração da exposição permanente e das exposições temporárias que ocorreriam no museu. O documento ao qual tive acesso, reproduzido no Anexo 2, trata exclusivamente sobre a proposta do curador para a exposição permanente do museu - que ocuparia a maior parte da área expositiva da sede da Paulista - frente à impossibilidade de se prever eixos temáticos temporários contundentes de maneira hipotética. Em uma espécie de introdução, o curador diz que o roteiro temático proposto para a exposição permanente é baseado na estrutura da obra Devassos no Paraíso, escrita por ele, “mas não se pretende restringir a essa obra, que fornecerá apenas um roteiro inicial”. Porém, o que se verifica ao ler o roteiro após ter lido o livro, é que a semelhança entre ambos é realmente muito grande. O roteiro para a exposição permanente do museu se articula em torno de 15 seções, que são uma adaptação das seções existentes no livro, enumeradas a seguir:[18] Seção Introdutória; Seção Inquisição e Homofobia Histórica; Seção Leis e Homofobia Histórica; Seção Higienismo e Homofobia na Medicina; Seção Artes e Homossexualidade; Seção Direitos Homossexuais; Seção Lésbicas; Seção Transgeneridades; Seção Aids e Saúde; Seção Homofobia na atualidade; Seção Religiões; Seção Carnaval; Seção Paradas LGBT; Seção Academia, Internet e

[17] TREVISAN, João Silvério. Devassos no paraíso. Rio de Janeiro: Record, 2000. 586 p. [18] Fonte: Plano curatorial para a exposição permanente da sede do Museu da Diversidade Sexual na Avenida Paulista. Disponível no Anexo 2 deste caderno.


41 _acima Espaço interior do Museu do Futebol, projetado pelo arquiteto Mauro Munhoz. _abaixo Interior do Museu da Língua Portuguesa antes do incêndio.


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Redes Sociais; Seção Bixórdia. No mais, no documento o curador faz sugestões expográficas pertinentes, porém em alguns momentos destoa da proposta do plano museológico, alinhada com a teoria do “museu aberto”. Como já foi apontado neste trabalho, museus como o Museu da Língua Portuguesa e o Museu do Futebol, construídos sob essa ótica, evitam a construção de um acervo físico para o museu, construindo sua narrativa museológica através do uso da tecnologia, experiências interativas/imersivas e reproduções de conteúdo. Ao dizer que pretende incluir, além de “novas aquisições tecnológicas”, “obras artísticas; instalações; fotos; livros publicados e originais (Cassandra Rios, Darcy Penteado, Caio Fernando e outros); jornais e revistas; peças de vestuário de peças teatrais, filmes e telenovelas; scripts; cenários e maquetes teatrais (...)”,[19]

entende-se que o curador pressiona o museu em direção à construção de um acervo, ainda que este possa ser diminuto. Uma estratégia interessante sugerida pelo curador, que é adotada ao longo da obra Devassos no Paraíso, é o uso do “jargão LGBT” na composição dos textos da exposição permanente. Essa maneira de se expressar aproxima o leitor/visitante do museu da obra/exposição, porém deve ser utilizada com parcimônia, como no livro, para não parecer regionalista, um recorte mal-feito ou um exagero de linguagem. A culminação dessa ideia/estratégia inteligente e bem construída é a sugestão de uma seção expográfica chamada Bixórdia, incorporada neste trabalho por se entender uma proposta inteligente, astuta e sobretudo atual, face à recente escandalização de uma questão do ENEM que abordava indiretamente o modo de se expressar de parte da comunidade LGBTQ. Transformada em projeto pelo Estúdio Preto e Branco, que elaborou sugestões audiovisuais para o museu, a ala Bixórdia é assim descrita por eles:

[19] Fonte: Plano curatorial para a exposição permanente da sede do Museu da Diversidade Sexual na Avenida Paulista. Disponível no Anexo 2 deste caderno.


[20] Fonte: Apresentação da proposta audiovisual do Estúdio Preto e Branco, à qual tive acesso nos arquivos do museu.

“Em uma sala teremos numa tela um vídeo passando, que ficará em loop. As imagens vão se alterando como se fosse alguém ‘zape¬ando’ uma televisão, passando por vários canais. Em cada ‘canal’ vamos nos deter por mais ou menos 30 segundos, em seguida pas¬samos pra outro canal. Em cada um deles, um programa diferente estará passando (fictícios): uma cena de novela; o noticiário do dia; uma mesa redonda de futebol; um programa falando sobre música; um filme; um comercial qualquer; uma campanha de vacinação do governo, et cetera. Ou seja, programas “normais” que veríamos se zapeássemos nossa TV em casa. A diferença é que todos esses programas estarão falando no “dialeto” do mundo gay, no dito “bichês”. No entanto os personagens que aparecem na tela, tanto os atores das novelas, quanto o apresentador do telejornal, quanto os participantes da mesa redonda sobre futebol, como todos os outros, não falam “com afetação”, como se diz na gíria, eles falam como falariam normalmente nos programas usuais, apenas as palavras são trocadas para o “bichês”, mas de forma que, mesmo quem não seja homossexual e não esteja acostumado com aquele linguajar, consiga entender perfeitamente o que está sendo dito em qualquer um dos programas. Num mero exemplo, o apresentador do telejornal em vez de dizer “um homem provocou uma briga com sua esposa numa festa”, ele diz, com a mesma pompa de sempre “um bofe deu piti com sua rachada numa azaração”, e segue a matéria, nos mesmos termos, até ser zapeada pro próximo canal (...)”.[20]

Em suma, este era um plano curatorial desenvolvido com um projeto/edifício e proposta museológica em mente. Como neste trabalho pretendo apresentar uma nova proposta do que poderia ser este edifício e, portanto, este museu, faz sentido que não sejam tomados como verdade absoluta o plano museológico e o plano curatorial desenvolvidos em outro contexto.

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MEMORIAL DE PROJETO


O Museu da Diversidade Sexual é um espaço performático. Desde sua sede atual, nas dependências da estação República do Metrô, que se abre indiscriminadamente aos transeuntes em eterna mudança, a própria existência do museu provoca sem dizer uma só palavra. O novo Museu da Diversidade Sexual subverte a hierarquia espacial pré-existente, ao escolher se fazer sobre uma saída do metrô, tomando-a para si. Dentro desse microcosmo, desafiam-se as fronteiras da normalidade. No térreo aberto, sua circulação incorpora o caráter urbano do metrô, e nele se misturam, em pé de igualdade, indivíduos LGBTQ ou não, todos eles apenas mais um. Em tempos de crescente intolerância, esse edifício contribui para a incessante luta pelo direito de ser quem é e amar livremente. . Optei neste trabalho por apresentar o memorial escrito e as perspectivas da maquete eletrônica deste projeto neste caderno e os desenhos (plantas, cortes e elevações) soltos como fichas. Essa escolha se dá para seguir a abordagem que permeou todo o processo de projeto, que foi a de reunir todos os desenhos sobre a mesa de minha casa e observá-los ao mesmo tempo. Essa dinâmica também se repetiu em partes nos atendimentos de projeto, quando por vezes eram vistos e comentados três ou quatro desenhos ao mesmo tempo. Outra vantagem importante da escolha de separar os volumes de texto/imagens das fichas de desenhos do projeto é que se pode visualizar o desenho a que o texto se refere ao mesmo tempo que se lê o texto no caderno, tornando assim o processo de leitura do projeto mais completo.

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ESCOLHA DO TERRENO O projeto aqui proposto para uma nova sede do Museu da Diversidade Sexual é intrinsecamente ligado ao local e ao terreno no qual se escolheu implantá-lo. Face à inviabilização do terreno na Paulista em um futuro próximo, optou-se por propor neste trabalho a manutenção do Museu da Diversidade Sexual na região onde ele já se encontra, ou seja, na Praça da República. Essa escolha foi pautada por motivações distintas entre si que, se observadas como um todo, fazem sentido para a construção de um discurso que termina em projeto. O projeto dessa nova sede deve potencializar ainda mais a instituição e, sobretudo, manter e dar mais força a seus pontos fortes. Nesse sentido, para o desenvolvimento de uma proposta que mantenha a força já existente no pequeno espaço em que hoje se instala o museu, é de central importância uma relação estreita com o Metrô, de modo que a diversidade seja incorporada com mais força no dia-a-dia da metrópole. Mas existem muitas estações de metrô, então por que continuar na República?

. A Praça da República é um dos mais importantes lugares de memória LGBTQ por si só, e se localiza no centro de muitos outros Muitos dos mais importantes lugares de memória LGBTQ em São Paulo se localizam próximo (senão contidos) no eixo Metrópole-República-Arouche. A memória da Praça da República se cruza com a memória LGBTQ a partir do início do século XX. Foi naquela região que surgiram os primeiros shows de transformistas do Brasil, inicialmente frequentados em grande maioria pelo


47 [21] TREVISAN, João Silvério. Devassos no paraíso. Rio de Janeiro: Record, 2000. 586 p. [22] . GREEN, James. Além do carnaval: a homossexualidade masculina no Brasil do século XX. São Paulo: Editora UNESP, 2000. p. 162.

[23] SÃO PAULO em Hi-fi. Direção: Lufe Steffen. Produção: Taís Nardi, Edu Lima e Lufe Steffen. São Paulo: Cigano Filmes, 2016.

público heterossexual e das classes mais abastadas.[21] Nos anos 1930, segundo James Green, a praça já era um dos principais espaços públicos onde havia reunião de homossexuais na cidade[22]. A partir das décadas de 1950 e 1960, com o florescimento de lugares de convivência da população LGBTQ nas imediações (Galeria Metrópole, Paribar, etc.), a Praça da República vira rota dos footings ou tours, que consistiam em percursos realizados a pé por gays para conhecer pessoas e flertar. Como é dito no filme São Paulo em Hi-Fi, os bares, tours e footings desta época, ainda não se caracterizavam como lugares de pegação ou atividade sexual, mas sim como lugares de permanência, flerte e de se conhecer novas pessoas. Neste mesmo período, a interação gay por meio da atividade sexual ficava relegada aos cinemas, banheiros públicos e praças. Com a decadência dos grandes cinemas da aristocracia paulista (como o Cine Barão, Cine Windsor, Cine Marabá, Cine Ipiranga dos anos 1940), localizados na região da República, os mesmos passam a ser cada vez mais ocupados – e até sustentados - pelo público homossexual masculino para fins de pegação.[23] A Praça da República passa, assim, a ser reconhecida pela população no geral como ponto de encontro de homens que tem interesse em homens, seja para atividade sexual, seja para flertes, e eventualmente começa a ser ocupada também pela prostituição masculina e de travestis e transexuais. A partir daí, começam a surgir, na Avenida Vieira de Carvalho (que liga a Praça da República ao Largo do Arouche) bares (Caneca de Prata, Prainha do Arouche, etc.), saunas e casas noturnas ligadas ao público LGBTQ. Com o início de uma separação de classes dentro da população LGBTQ no fim dos anos 1970,


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o centro com o tempo passa a ser considerado lugar de ocupação das “bichas pobres” e das “bichas velhas”, enquanto que as regiões mais próximas à Avenida Paulista, Jardins e pontualmente o Ibirapuera passam a ser considerados lugares onde estavam as “finas”.[24]

[24] SÃO PAULO em Hi-fi. Direção: Lufe Steffen. Produção: Taís Nardi, Edu Lima e Lufe Steffen. São Paulo: Cigano Filmes, 2016. 1 DVD. [25] Idem.

É interessante notar que, apesar dessa distinguibilidade, quando surge a cultura das boates, a região da República e do Arouche se caracteriza também como região dos afters de pegação (festas que começam tarde da madrugada, e para onde vão as pessoas, já muito alteradas, depois de saírem das boates tradicionais), mais notadamente com a boate Val Improviso, localizada no Largo do Arouche, e de propriedade da notória travesti Andréa de Mayo.[25] Frente a um quadro de decadência e abandono, a Praça da República se consolida nos anos 90 como lugar de cinemas ligados ao sexo, e de prostituição, porém na Vieira de Carvalho se mantém um lugar de vida noturna e de fins de semana, com a presença intensa de bares e um aumento no número de saunas e hotéis. Especialmente, foi lá que, no dia 06 de fevereiro de 2000 o adestrador de cães Edson Neris da Silva foi espancado até a morte por um grupo de 18 delinquentes que declararam pertencer ao bando “carecas do ABC”, de inspiração skinhead. Edson andava na praça de mãos dadas com seu namorado (que conseguiu escapar), quando o casal foi atacado. A importância deste caso e deste lugar para a memória LGBTQ decorre - além da brutalidade do crime, que chocou o país à época - do fato de ter sido o primeiro homicídio por homofobia a ser tipificado como crime de ódio no Brasil. Quando foi oferecido um espaço do Metrô para a instalação do Museu da Diversidade, a direção do museu preferiu o espaço na estação República por seu vínculo com a memória de Edson Neris. [26] [27] Entende-se que a implantação de uma sede permanente do Museu da Diversidade Sexual na República seria o ponto alto de um processo de memorialização

[26] CYMBALISTA, R. Mobilizando a memória em lugares de morte. Revista do Centro de Pesquisa e Formação do SESC-SP 5. 2017. p. 27. [27] Entrevista com Franco Reinaudo, diretor do Museu da Diversidade Sexual, no dia 28 de março de 2018. Disponível no Anexo 1 deste caderno.


_abaixo Obra “Meu coração bate como o seu”, do Estúdio Guto Requena, na Praça da República.

formal do lugar já iniciado pelo Estado com os autos do processo que condenou os assassinos de Edson Neris, ou mesmo com a implantação da primeira sede do MDS lá. Tudo isso consta em processos e arquivos oficiais, e, assim, a memória dessa maneira registrada dificilmente consegue ser apagada. É um registro perpétuo. Logo, a construção de uma sede permanente do MDS neste lugar seria o momento de aprofundamento de um processo de memorialização formal que vem acontecendo já há muitos anos. Mais recentemente, em setembro de 2018, a Praça da República foi o lugar escolhido para receber uma intervenção artística ligada à temática LGBTQ. Elaborada pelo Estudio Guto Requena, cujo líder é gay, a obra se chama “Meu coração bate como o seu”, e celebra o aniversário de 40 anos do ativismo LGBTQ na cidade de São Paulo. A intervenção reproduz em caixas de som depoimentos de ativistas LGBTQ e possibilita que o usuário se sente sobre ela para escutá-los. A escolha da Praça da República para a instalação dessa obra ressalta ainda mais seu papel de importância histórica para a população LGBTQ.

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. Viabilidade Face às dificuldades de realização do projeto da Avenida Paulista devido a problemas com a desapropriação do terreno e de custos, este projeto entende que a escolha do lugar de implantação deve levar em conta uma viabilização imediata da proposta. Não se pode novamente ficar refém de um processo sob o qual não se tem controle. Logo, a opção mais lógica seria ocupar com a nova sede do museu um lote que já é público, economizando o dinheiro que se gastaria com a desapropriação e garantindo a viabilidade da proposta.

. A comunidade LGBTQ continua ocupando a região até os dias atuais O eixo Galeria Metrópole-República-Arouche, para além da memória, se mantém um lugar de intensa presença da população LGBTQ até hoje em São Paulo. Essa ocupação existe em diversas esferas: desde a moradia, até a simples passagem, passando por atividades de lazer e de trabalho legal ou ilegal, formal ou informal. Há uma concentração de bares e casas noturnas voltadas ao público LGBTQ na região (especialmente no Largo do Arouche, Av. Vieira de Carvalho e Galeria Metrópole); há uma presença maciça da prostituição masculina e de travestis e transexuais no entorno próximo e na própria Praça da República, especialmente durante a noite; a região é a destinação final da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (que chega pela Rua da Consolação à Praça da República, Avenida Vieira de Carvalho e por fim ao Largo do Arouche); a região abriga mensalmente o Rolezinho LGBT no Arouche, evento organizado pela Prefeitura voltado a jovens LGBTQ que residem nas periferias[28]; no bar Metropol, na Galeria Metrópole, ocorrem exibições ao vivo dos episódios do reality-show RuPaul’s Drag Race, atraindo grande público gay de classe média-alta.

[28] Fonte: http://www. guiagaysaopaulo.com.br/ noticias//prefeitura-de-sp-promove-1-rolezinho-lgbt-no-arouche_. Acesso em 15 de novembro de 2018.


Verifica-se através dos diversos exemplos apresentados o quão diversa – mesmo levando em conta exclusivamente pessoas LGBTQ – é a ocupação da área em questão. Misturam-se pessoas nas condições mais vulneráveis que se pode ter com pessoas de classes média-alta e alta. A implantação de uma sede permanente do MDS neste local se coloca como uma abertura a uma ocupação ainda mais diversa e intensa da área por parte da comunidade LGBTQ. Ou seja, ao escolher se instalar na Praça da República, este projeto toma partido de uma ocupação já existente da região pela população LGBTQ para potencializá-la ainda mais. Ele se propõe, portanto, como um instrumento de diversificação e intensificação da presença dessa comunidade ali ao longo de todo o dia, em todas as ocasiões. Desse modo, a presença da sede permanente do Museu da Diversidade Sexual enquanto equipamento físico com potencial turístico de atração de pessoas para a área, no limite, complementaria a vivência LGBTQ já existente com uma nova camada de ocupação ao longo de todos os dias.

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A relação com o metrô é de suma importância para garantir a força do museu enquanto espaço de afirmação e resistência. A escolha de “onde fazer” ficou entre os dois terrenos localizados de frente para a Praça da República. Ao longo do desenvolvimento de hipóteses projetuais diversas, chegou-se à conclusão que faria mais sentido, como já foi apontado, construir em um terreno que já fosse de propriedade do Estado. A escolha convergiu para o terreno onde hoje se encontra a saída do Metrô para a Rua do Arouche (em amarelo na imagem da página seguinte). Apesar de relativamente pequeno (870 m²), se comparado com o terreno ao lado, aqui se tem a potência da esquina aliada à possibilidade de interligação radical do edifício-sede do museu à dinâmica do metrô. Assim, essa escolha, radical que é, inverte/subverte a ordem prévia na qual o museu era contido no metrô: o museu passa a conter o metrô. A proposta dissolve os limites entre o que é museu e o que é cidade; entre o que é espaço expositivo e o que é cidade.

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_acima Vista do local de projeto (saída da Rua do Arouche da estação República do Metrô) a partir da Praça da República _abaixo Vista do local de projeto (saída da Rua do Arouche da estação República do Metrô) a partir da Rua do Arouche, com a Praca da República à esquerda.

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PROGRAMA DE NECESSIDADES O programa deste projeto foi elaborado livremente tomando como base o programa utillizado para a sede da Paulista. Feita uma análise crítica do que foi pedido no concurso, decidi por adaptá-lo ao contexto e às ideias da minha proposta, de modo que conseguisse formular um programa autônomo e coerente com o que pretendo para o projeto. Em outras palavras, não foi um processo de definição de um programa para depois fazer o projeto, mas sim de retroalimentação entre ambos, assim como foi a relação entre pesquisa e projeto ao longo deste TFG. Isso faz com que não haja para este projeto um programa nos moldes formais - compartimentado, com quadro de áreas mínimas/necessárias -, mas sim um conjunto de espaços e usos que deveriam ser contemplados e levados em conta na hora de desenhar. Levando em consideração que estes usos são mutáveis e que se propõe aqui a manutenção do caráter performático e de constante reinvenção do museu, não faria sentido a proposição de espaços compartimentados, segregados e imutáveis. O resultado é um edifício que assume a incapacidade do programa de necessidades tradicional, rígido e compartimentado, de, como diz Paulo Mendes da Rocha, “amparar a imprevisibilidade da vida”. Proponho, assim, que todos os espaços do edifício se organizem de forma autônoma, sendo o denominador comum entre eles, do subsolo ao último pavimento, a visibilização e o abrigo da diversidade sexual humana, e o estímulo ao convívio e integração entre as pessoas. Portanto, o programa que apresento na imagem ao lado é o desdobramento final do processo descrito acima, e ele não é apresentado em forma de lista, mas sim em um diagrama a partir do corte do edifício, mostrando a divisão dos usos que se propõe para este momento.


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Serão comentados em profundidade três itens do programa aqui proposto. O primeiro item é a decisão – que não é nem somente de programa nem somente de projeto – de condensar a exposição permanente no térreo e, ao mesmo tempo, de propor que 100% da área expositiva “formal” dessa nova sede se dedique a exposições temporárias, como as que acontecem hoje no museu. Dessa decisão decorre uma intervenção sobre o plano curatorial pensado para a sede da Avenida Paulista. Optei por incorporar no projeto, ressignificado, o principal elemento do plano curatorial elaborado por João Silvério Trevisan: a linha de raciocínio e recorte histórico da exposição permanente (condensados) e excluindo-se a parte que se refere ao casarão e à Avenida Paulista. A dita intervenção se dará em dois pontos:

1.

Condensar os eixos temáticos, mantendo 10 dos 15 anteriores, de

modo que a organização se desse da seguinte forma: Seção Introdutória; Seção Inquisição, Leis e Homofobia Histórica; Seção Artes e Homossexualidade; Seção Direitos Homossexuais; Seção Aids e Saúde; Seção Homofobia na atualidade; Seção Religiões; Seção Paradas LGBT; Seção Academia, Internet e Redes Sociais; Seção Bixórdia. Isso possibilita uma exposição permanente mais concisa e com maior foco em sua “missão educativa”, abrindo espaço para que o museu mantenha o caráter performático que tem hoje ao realizar somente exposições temporárias.

2. Descolar a Seção Bixórdia do núcleo duro da exposição permanente, colocando-a no subsolo, junto à passagem do metrô. ‘ Ao fazer isso, se estimula a pulverização dos poucos elementos expositivos fixos


por locais diferentes dentro do edifício, aumentando sua possibilidade de alcance entre o público e dotando a seção da atratividade que tem uma instalação, um happening, junto a um local de fluxo intenso de pessoas (mais sobre esse assunto na pág. 42). A exposição permanente condensada ficaria no térreo, radicalmente pública e aberta, próxima à saída do metrô. Com isso o museu cumpre sua “missão civilizatória”, seu papel educativo básico com maior competência do que cumpriria ao realizar uma grande exposição permanente isolada em um espaço museológico, já que atinge um número muito maior de pessoas – desde os que estão de passagem até os que por algum motivo não se sentem confortáveis para entrar em um espaço expositivo mais formal. Dotar a população em geral de conhecimento da trajetória dos LGBTQs é algo, a meu ver, indispensável para que não se repitam os absurdos aos quais historicamente somos submetidos. O fato de se radicalizar a grande vocação do museu para exposições temporárias tem muito a ver com o tipo de museu que se propõe aqui. Não um museu sem acervo nenhum, que pode se remontar (na linha do Museu do Futebol ou do Museu da Língua Portuguesa), como estava sendo proposto para a Paulista, mas sim um museu cujos espaços expositivos de fato se reinventam e remontam completamente a cada dois ou três meses com a mudança de exposições e cujo acervo fica quase inteiramente voltado à “pesquisa, salvaguarda e comunicação de referências materiais”. O museu continua não tendo grande acervo físico designado exclusivamente à ala expográfica - na medida que exposições temporárias se organizam com peças emprestadas, peças retiradas temporariamente do Centro de Documentação do museu, ou mesmo apenas com módulos interativos - mas ganha muito em relação à atratividade de seu conteúdo e à performatividade de seus espaços. Cria-se uma instituição atrativa e dinâmica; um museu performático que, a cada visita, é ao mesmo tempo o mesmo e outro.

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O segundo item a ser comentado é o aumento significativo de área destinada ao Centro de Documentação e à Biblioteca, se compararmos este projeto com o projeto da sede na Paulista. Desde 2014/2015, as demandas da instituição mudaram muito. No decreto 63.375/2018 de “musealização” da instituição, consta que uma das atribuições da instituição é a formação de acervo (para mais detalhes, ver a pág. 27). Levando em conta que antes se pensava a instituição sem acervo, o texto do decreto simboliza uma mudança de paradigma. O texto indica que o museu terá também o papel de resguardar itens importantes para a memória da população LGBTQ no Brasil e desenvolver pesquisas e levantamentos sobre o tema. Portanto, é proposto um grande espaço de salvaguarda e pesquisa juntamente com uma biblioteca de referência para a questão LGBTQ, com as principais publicações sobre o tema no Brasil e no mundo disponíveis para consulta. Acredito que com essa mudança, o museu passa a ser também um centro de pesquisa de referência para a condição LGBTQ no Brasil, além de criar espaços receptivos de estudo e permanência para a comunidade e para a cidade. O terceiro e último item a ser destacado, um dos pontos mais fortes e incomuns para este programa, extrapola as fronteiras de um espaço museológico tradicional. Trata-se da incorporação no edifício de um espaço transparente e aberto para a cidade para a celebração de casamentos de todos os tipos (para mais detalhes, ver a pág. 92). Não se faz aqui um juízo de valor a respeito da cooptação dos LGBTQs dentro de uma lógica tradicional de formação de família e monogamia, mas sim de um reconhecimento dessa população como um conjunto de indivíduos sociais com direitos iguais aos de todos os outros. Essa igualdade de direitos deve ser celebrada e escancarada. Afinal, se (ainda) podemos nos casar, por que não tornar isso parte do cotidiano das cidades e das pessoas? Como se pode ver a partir da apresentação do programa, optei por começar a


pensar o edifício a partir de um diagrama em corte. Acredito ser esse o melhor caminho por se tratar de um terreno que demanda uma organização espacial majoritariamente vertical. Os espaços foram posicionados em corte de acordo com a seguinte lógica: quanto mais corriqueiro possa ser seu uso público, mais próximo do térreo e do metrô. Nesse sentido, a loja e o auditório foram alocados no subsolo, junto à saída do metrô, e o café, no primeiro piso, de fácil acesso. O espaço de casamentos deveria ter destaque natural e ser visível da calçada e da Praça da República, então naturalmente seu lugar seria na “frente” do terreno e verticalmente próximo à escala do olhar. O centro de documentação e a biblioteca, enquanto espaços também de permanência e acolhimento, funcionam como um divisor de águas entre o programa urbano e o programa institucional. Acima deles, apenas espaços expositivos; abaixo deles, a cidade. Logo, se por um lado o espaço de casamentos adquire protagonismo na escala do pedestre, os espaços expositivos se sobressaem na escala da metrópole.

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A QUESTÃO FORMAL Desde o início deste trabalho, a questão formal sempre foi tratada com muita cautela. Havia sempre a noção de que se, por um lado, fosse feito um projeto que evocasse maior virtuosidade formal, de modo que chamasse atenção, poderia se dizer que havia ali demasiado exagero em razão do tema. Por outro lado, se fosse elaborado um projeto de abordagem mais austera, poderia se dizer que tal aproximação de projeto não satisfazia a questão da representatividade e seria “muito discreto”. A conclusão a que se chegou neste projeto foi a de que ambas as aproximações são “respostas simples para problemas complexos”, cada uma à sua maneira. Em um mundo tendendo cada vez mais para esse tipo de abordagem, de imediato se verifica que para satisfazer problemas complexos são necessárias respostas igualmente complexas, e neste caso não é diferente. O começo do pensamento de uma solução formal se inicia pela busca na teoria da arquitetura por postulações que sustentam uma resposta pertinente à questão formal deste projeto. Bernard Tschumi, em seu livro Architecture and Disjunction, discorre sobre o conceito de “disjunção”: “Apesar de que a noção de disjunção não é para ser vista como um conceito arquitetônico, ela tem efeitos que são impressos sobre o sítio, edifício, e até o programa, de acordo com a lógica dissociativa que governa a obra. Se alguém tivesse que definir disjunção, indo além do seu significado no dicionário, insistiria na ideia de limite, de interrupção.” [29]

A partir disso, foram observados dois projetos como exemplos de edifícios cuja construção formal e espacial ocorre através da interrupção, fratura e dissociação. Apesar disso, são edifícios sóbrios, que abrigam museus de temáticas muito diferentes entre si e muito diferentes da temática deste trabalho, mas que servem de referência por sua abordagem formal.

[29] COTRILL, J. Queering Architecture: Possibilities of Space(s). P. 362, tradução minha.


63 [30] COTRILL, J. Queering Architecture: Possibilities of Space(s). P. 362, tradução minha.

No Museu Judaico de Berlim, o arquiteto Daniel Libeskind constrói a forma da edificação e de suas aberturas através da criação de rasgos e fraturas no volume. Disso resulta uma ambiência de desconforto e disjunção entre as partes coerente com a temática do museu, criada através da não-ortogonalidade dos espaços. No caso do Centro Rosenthal de Arte Contemporânea, da arquiteta Zaha Hadid, o edifício tem uma situação urbana próxima da situação do terreno deste projeto, e encara o a proposta pensando o museu através de um corte dinâmico e da permeabilidade visual vertical entre os espaços. As áreas expositivas são invadidas por rampas formalmente autônomas que as invadem e preenchem um grande vazio central. A solução formal adotada foi pensada de modo que sua complexidade formal decorresse de uma manipulação de fratura/ruptura da massa edificada. Levando em conta a rispidez e brutalidade com que a população LGBTQ foi tratada historicamente, o edifício surge como uma extrusão do terreno que, logo depois, se rasga, se fratura em direção à Praça da República. Isso tudo sem tender ao kitsch como uma proposta de maior virtuosidade formal/cromática tenderia. Sobre a questão da representatividade do projeto, evoco o que diz o teórico J. Cotrill sobre o espaço queer - espaço que afronta a heteronormatividade - o para justificar o partido adotado: “O espaço queer é uma utopia de expressão corporal que não tem um propósito produtivo. (...) [É] uma ‘rede invisível’ de pessoas e lugares com um interior e um exterior” [30]

É possível concluir a partir da citação que no quesito de identificação de um espaço com a comunidade LGBTQ e a diversidade sexual como um todo, trato


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< Ă esquerda Museu Judaico de Berlim, Daniel Libeskind. 1999.


à direita > Centro Rosenthal de Arte Contemporânea, Zaha Hadid Architects, 2003.

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< Ă esquerda Museu Judaico de Berlim, Daniel Libeskind. 1999.


a arquitetura como algo menos importante do que a rede de pessoas e corpos que ocupa este lugar. Nesse sentido, não faço aqui uma associação direta/imediatamente do partido arquitetônico à causa LGBTQ ou à diversidade sexual, na medida que é a ocupação daquele espaço/edifício que o tornará ligado ou não a tal causa. O que eu faço é um espaço radicalmente urbano e público, aberto à ocupação por parte das pessoas que compõem a “rede invisível” de que fala Cotrill. Daí decorre uma necessidade de se fazer ver no projeto o principal elemento em exposição ali: a diversidade de corpos, comportamentos, orientações e gêneros ali presentes. E isso também é incorporado dentro da discussão formal: no Corte Longitudinal, o que se verifica é uma negação da tipificação e padronização das lajes do edifício através de grandes rasgos e aberturas nas mesmas, sempre diferentes entre si. Em dois momentos, as paredes de concreto – que seriam lisas e imperturbadas, se rasgam em finas aberturas que são como cicatrizes. São poucas repetições, as aberturas horizontais e verticais são abundantes, escancarando, de um lado, a paisagem da cidade e de outro a os corpos e a vida que ocupam o espaço do museu. Assim, o novo edifício incorpora a diversidade dos corpos LGBTQ em sua própria paisagem e na paisagem da cidade. O Museu da Diversidade Sexual assume e potencializa em sua materia lidade a performatividade e a ligação íntima com o usuário existente na sede anterior. O processo de construção formal do edifício se deu a partir das 8 operações ilustradas a seguir, cada uma sintetizada em um verbo:

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{1} APROPRIAR

{2} EXTRUDAR


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{3} RASGAR

{4} FLUTUAR


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{5} ENTRANHAR

{6} SUSTENTAR


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{7} PISAR

{8} OCUPAR


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FACHADA E ESTRUTURA O edifício se constrói formalmente a partir de planos de concreto, vidro e alvenaria organizados de maneira disruptiva em relação uns aos outros. Didaticamente, todas as vezes dois planos se encontram, eles são de diferentes materiais. Os planos de concreto possuem função estrutural em todos os casos. Os grandes vãos são vencidos por lajes protendidas e vigas de concreto protendido (item 6, p. 64). O bloco de serviços funciona ao mesmo tempo como suporte de cargas e como contraventamento da estrutura como um todo. Uma demanda também importante para os espaços expositivos, ainda mais temporários, é que haja algum controle de luminosidade para garantir a integridade dos objetos expostos, mesmo se tratando de uma fachada de orientação sudeste. É uma demanda que permeou este projeto, que inicialmente se propunha inteiramente aberto com vidro à Praça da República. A solução encontrada foi a alternância entre, nos andares inferiores, a abertura em vidro e varanda com vista para a Praça da República e, nos mezaninos, a parede que conforma um espaço de luminosidade mais controlável. A ideia é que, como na imagens, as paredes que vedam o mezanino de frente para a praça sejam utilizadas como dois grandes painéis eletrônicos, telas em branco voltadas para a Praça da República. Assim, o museu adquire ainda maior capacidade de expressão pública. Os painéis podem, em determinado momento, extravasar a exposição temporária que lá está ocorrendo através da projeção de alguma obra, bem como podem divulgar os nomes das pessoas que se casaram naquele dia no museu ou, em um momento de crise, honrar e divulgar os nomes dos LGBTQs mortos naquela semana. Tudo é válido. A fachada transborda o museu e se torna um instrumento de visibilização e luta política.


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Perspectivas de um dos paineis eletrônicos na fachada do edifício, em duas ocasiões diferentes: divulgação de uma das exposições temporárias do museu ou exposição dos nomes de casais que celebraram seus casamentos no museu naquele mês.

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CIRCULAÇÃO VERTICAL Através da “divisão programática” dos espaços ao longo do edifício, surgem microcosmos de ambientes com afinidade programática - visíveis no Corte Transversal e no Corte Esquemático - que funcionam como unidades relativamente autônomas (com circulação vertical interna independente). Eles se comunicam entre si somente através dos elevadores e da escada de incêndio, e isto é proposital. Trato aqui os elevadores como um elemento particular do edifício, como não poderiam deixar de ser. Sua importância para este projeto é tão vital quanto a dos espaços expositivos, e explico as razões: Enquanto nos espaços expositivos se realiza a alma do museu - com a proposta radical de haverem apenas exposições temporárias e portanto uma eterna rotatividade e performatividade para a instituição -, nos elevadores é onde acontece o trabalho de base. Não há nada de espetacular nestes elevadores – são peças comuns, padrão, além do elevador de cargas – a não ser o fato de que eles percorrem o edifício, verticalmente, do começo ao fim. Ao fazê-lo, porém, estabelecem uma relação de retroalimentação entre o que até então seriam entidades separadas: metrô e museu. A metrópole invade o museu e o museu invade a metrópole. Isso tem dois efeitos distintos, igualmente importantes: v na página seguinte

1. Nos elevadores pessoas completamente distintas são forçadas a dividirem um espaço por um breve período de tempo. Isso possibilita, por exemplo, que usuários quaisquer do metrô entrem em contato direto

Perspectiva explodida do edifício, mostrando a relação entre a circulação vertical, a passagem subterrânea do Metrô e o museu.


79 e sejam obrigados a suportar a presença de frequentadores do museu, do espaço de casamentos – e toda a diversidade que trazem consigo em seus corpos, gestos e afetos – durante os segundos que durar aquela viagem. O edifício começa a tirar partido dos corpos que o frequentam para construir uma atmosfera de aceitação e visibilidade.

2. Desavisados e/ou pessoas à deriva podem, em um ato de confusão, pensar que estão se dirigindo à saída do metrô, mas na verdade se depararem com uma exposição ou uma biblioteca quando se abrem as portas do elevador, como quando são abertas as cortinas de um espetáculo. Na contramão da extensa maioria da produção contemporânea de espaços urbanos, aqui ao invés de segregar, estimula-se a mistura e integração de pessoas de diferentes classes, credos, etnias, comportamentos e orientações sexuais. E fica tudo bem.

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ESPAÇOS INTERNOS . SUBSOLO - METRÔ, LOJA E AUDITÓRIO | Planta -1 Substitui-se a pequena saída existente do metrô da Rua do Arouche por um amplo espaço subterrâneo que não é nem museu e nem metrô: é cidade. Ali ocorre uma confluência de cores e corpos dos mais variados espectros, possibilitada pela mistura de fluxos advinda da incorporação da saída do metrô pelo edifício proposto. O espaço aberto funciona como uma praça, um largo, por onde passa uma profusão de pessoas; um lugar de encontros e desencontros. Escutam-se, misturado ao burburinho do povo, vozes que dizem palavras incompreensíveis à grande maioria da população: expressões comuns no dia-a-dia da população LGBTQ nas diversas regiões do Brasil. O áudio vem do encontro da parte “nova” com a passarela subterrânea pré-existente, onde aproveita-se um espaço de armazenamentos para montar um ambiente de projeção que abriga o que antes era a Seção Bixórdia (para mais informações sobre esta parte da exposição, ver pág. 42). No centro do espaço, um conjunto de duas peças móveis conforma a loja do museu, aberta a todos. Ao fundo, estabelecendo uma relação de mútua dependência com o todo, está o auditório do museu. Acolhedor aos olhares curiosos e aos transeuntes interessados, o auditório se abre diretamente para a confluência de corpos e fluxos e faz dela sua sala de espera, seu foyer. Com isso, a nova sede do museu se faz sem deixar que se perca a afirmatividade que a inserção da sede anterior perante fluxos diversos e contínuos a fazia ter.

v na páginas seguintes

Perspectiva explodida dos pavimentos do edifício, mostrando a distribuição do programa e dos vazios em planta


83 [31] COTRILL, J. Queering Architecture: Possibilities of Space(s). P. 362, tradução minha.

. TÉRREO | Planta 0 Se propõe um térreo aberto que contribua para trazer a cidade para dentro do museu. Com a absorção do metrô, o projeto, ao invés de segregar, como é corrente na atual produção de espaços no Brasil, cria uma atmosfera de inclusão, misturando os fluxos de usuários do metrô e do museu. Tanto no térreo quanto no subsolo, foram projetados banheiros públicos unissex, evocando o antigo banheiro público da Praça da República, demolido nos anos XX por ser um dos principais lugares de encontros homossexuais em São Paulo.[31] Mais sobre eles e todos os outros banheiros será dito na pág. 98. A decisão de trazer a exposição permanente, reduzida, para o térreo aberto, em meio à confluência de fluxos diversos, tem por objetivo garantir que seja democrática, pública e aberta a “missão educativa” do museu, com uma exposição voltada à informação da população em geral sobre a luta e a história de resistência dos LGBTQs no Brasil e no Mundo. Se organiza a exposição permanente desta nova sede do Museu da Diversidade Sexual em seis placas pivotantes, que possuem dupla função: além de organizarem e servirem de suporte para o conteúdo apresentado, elas funcionam como fechamentos para o museu, separando-o da saída do metrô, que possui horários de funcionamento diferentes. Nessas placas seriam adesivadas as partes da exposição (textos, imagens, etc.) de maneira que possam ser facilmente trocadas em caso de vandalismo ou danificação.

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1. ADMINISTRAÇÃO 2. RECEPÇÃO ADMINISTRAÇÃO 3. BIBLIO | ACERVO E CONSULTA

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3 4 1. ÁREA DE CONSULTA 2. RECEPÇÃO CENTRO DE DOC. 3. PERIÓDICOS 4. EXPO | PEÇAS HISTÓRICAS 5. ÁREA DE LEITURA E TRABALHO

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2 4 1

3 1. CONSERVAÇÃO DO ACERVO 2. ARMAZENAMENTO ACERVO 3. CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO 4. ARMAZENAMENTO | VESTUÁRIO 5. ESPAÇO PARA CASAMENTOS

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1

2 1. RECEPÇÃO 2. ESPAÇO PARA CASAMENTOS

1 2 3

RUA

DO

ARO

5

1. RECEPÇÃO 2. EXPOSIÇÃO PERMANENTE 3. SAÍDA DO METRÔ 4. PRAÇA DA DIVERSIDADE 5. BANHEIRO PÚBLICO UNISSEX

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UCH

CA

BLI

E ÇA

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Ú REP

EXPLODIDA PAVIMENTOS INFERIORES 0

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1. EXPO TEMPORÁRIA 2. EXPO TEMPORÁRIA

1 3

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1. EXPO TEMPORÁRIA 2. EXPO TEMP. | PÉ DIREITO DUPLO 3. EXPO TEMPORÁRIA 4. VARANDA DA EXPOSIÇÃO

4

2 1 1. ESPAÇO MULTIUSO ABERTO 2. BALCÃO DE APOIO

1

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1. EXPO TEMPORÁRIA 2. EXPO TEMPORÁRIA

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1 3

1. SALA DA EQUIPE 2. ÁREA DE DESCANSO 3. WORKSHOPS 4. EXPO TEMP. | PÉ DIREITO DUPLO 5. EXPOSIÇÃO TEMPORÁRIA 6. VARANDA DA EXPOSIÇÃO

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EXPLODIDA PAVIMENTOS SUPERIORES 0

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Perspectiva do subsolo do edifício, da vista de quem vem da passagem subterrânea existente. A circulação e a permanência de pessoas orbitam em torno da loja do museu, e o ambiente funciona como uma antessala para o auditório ao fundo.

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Perspectiva do térreo do edifício, mostrando as placas expositivas pivotantes que abrigam a exposição permanente, a saída do metrô e os elevadores que servem tanto o metrô quanto o museu.

V


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Perspectiva do edifício visto a partir da Praça da República. Se destaca formal e cromaticamente o espaço de casamentos, e cujas atividades podem ser vistas por pedestres que estão na praça.

V


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. ESPAÇO DE CASAMENTOS E CAFÉ | Planta 1 Sobre a esquina, paira um volume quase exógeno ao conjunto, marcado por um painel em sua empena lateral. Ele conforma um portal de entrada para quem vem da praça. Dentro deste volume visualmente aberto a todos os olhares (da Praça da República, do museu, da metrópole) ocorrem durante o dia e a noite celebrações de casamentos de todos os tipos às vistas da cidade, deixando claro que todos a todos os seres humanos deve ser assegurado o direito de amar. Se insere no cotidiano da cidade, em condição de normalidade, uma rotina de celebração de uniões antes condenadas. Num futuro ideal e longínquo onde o casamento igualitário seja algo tão cotidiano e banal que não precise de um lugar de destaque, existe uma variedade de outros eventos ligados à condição LGBTQ que podem ser realizados em um espaço de grande destaque como esse, que conta com suporte do café do museu, localizado no mesmo nível. Por outro lado, a recente ameaça de retirada dos direitos de união igualitária assegurados à população LGBTQ pelo Supremo Tribunal Federal (uma vez que a decisão não possui status de lei) pode ser encarada como algo que invalida essa proposta. Eu discordo, porque, construído esse espaço para casamentos, mesmo que se proíbam novamente as uniões homoafetivas no Brasil, existiria ali um marco físico, real e tangível de que a união igualitária foi legal um dia. O espaço se tornaria um monumento, portanto, adquirindo importância ainda maior do que a princípio teria enquanto espaço para a realização de casamentos.

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. CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E BIBLIOTECA | Plantas 2, 3 e 4

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Dentro do programa do centro de documentação, está previsto um espaço para a coleta de testemunhos em vídeo, que foi localizado oportunamente sob o pé-direito duplo e com ampla vista para a Praça da República e para o espaço de casamentos. Para não atrapalhar o andamento das atividades de pesquisa e salvaguarda do Centro de Documentação, foi pensado no mezanino um espaço de espera onde o visitante pode solicitar os materiais que deseja consultar e estes materiais serão trazidos até ele. Se propõe um espaço autônomo para a biblioteca. Em seu nível inferior, onde fica também a recepção do Centro de Documentação, foram colocados espaços para permanência, estudos e consulta ao acervo, além de uma estante de periódicos que divide o espaço criando pequenos recintos de permanência. No centro, sob o vazio, um pequeno espaço de exposição de peças raras do acervo, em constante mudança. Neste piso, a abertura foi tratada para que fique abaixo da linha de visão (1,5m), de modo que só se possa admirar a paisagem quando se está sentado nas mesas de estudo. Subindo a escada, o visitante se depara com a entrada para a administração de um lado e com a área de estantes e balcão de consultas do outro. Ao fundo, um recorte à altura do olhar traz luz natural para o ambiente, tornando a experiência de se dirigir ao balcão de consultas mais agradável.

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Perspectiva do interior do espaço de casamentos do edifício, de layout flexível. Evidencia-se a vista que se teria da Praça da República a partir dele.

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Perspectiva do piso inferior da biblioteca, onde se localiza o espaço de permanência, estudo e consultas ao acervo bibliográfico (fundo), uma pequena exposição de peças raras do Centro de Documentação sob o vazio e uma estante contendo livros para consulta rápida e periódicos.

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. BANHEIROS | Todas as plantas Neste edifício os banheiros adquirem grande importância para a construção de um ambiente que tensiona as fronteiras da normalidade. Foi utilizado como referência o caso do Museu do Apartheid, em Johannesburgo, que constrói uma experiência sensorial segregatória em sua entrada a partir da divisão obrigatória entre brancos e negros, como o que acontecia no país na época do Apartheid. No caso deste projeto, as entradas dos sanitários constroem de fora uma atmosfera tradicional e divisiva, masculina versus feminina – como é feito comumente –, para, no instante seguinte, negá-la. Ao entrar neste espaço, na grande maioria das vezes pelo lado que julgaria “certo”, o usuário se dá conta que ambos os caminhos levam a um único banheiro, unissex, deixando claro como são frágeis as construções de gênero na nossa sociedade e o quão presentes elas estão no nosso dia-a-dia.

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. ADMINISTRAÇÃO E SALA MULTIUSO | Plantas 4 e 5

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Atualmente, a administração do museu se localiza no Teatro Sérgio Cardoso, e o museu divide espaço com a administração do próprio teatro e da APAA em uma grande sala. A separação entre a administração e o museu de fato é um dos fatores mais problemáticos da situação espacial atual da instituição. Pelo concurso de 2014, a administração do museu seria transferida para a sede da Paulista. Como pretendiam, além da sede permanente, manter a sede no metrô República, essa situação não se resolveria completamente. Este projeto resolve a questão ao se fazer integrado ao metrô e devolver ao poder público o espaço original, de modo que a administração e o resto do museu se localizem num mesmo prédio. Portanto, todos, desde o diretor até o estagiário, trabalham lado a lado, e tudo funciona bem. A meu ver seria uma perda distanciar os diferentes núcleos administrativos do museu e separá-los em ambientes diversos. Assim, proponho aqui a administração como um grande salão repleto de postos de trabalho, mantendo o mesmo número de postos previsto no museu da Paulista, mas de maneira integrada. Os únicos espaços segregados são a sala de armazenamento de uma eventual pequena reserva técnica (complementada pelo espaço de armazenamento e reserva técnicado Centro de Documentação) e a sala de reuniões. Além disso, existe um espaço para os funcionários com armários, copa, mesas e sofás, ligado à administração por uma escada privada, de maneira que se possa facilmente transitar entre um e outro.

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Perspectiva do piso do café, que ressalta a entrada dos banheiros. A sinalização e a divisão entre homens e mulheres à moda tradicional, mas quando se entra no banheiro, se verifica que ambas as entradas servem a um mesmo espaço, unissex.

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. ESPAÇOS EXPOSITIVOS | Plantas 5, 6, 7, 8 e 9 Os espaços expositivos são os ambientes onde a performatividade do museu se manifesta integralmente, na medida que abrigam um dos pontos-chave da proposta de museu aqui apresentada: as exposições temporárias. Disso surgem demandas de flexibilidade e arranjo espacial como a planta livre, o pé-direito mínimo de 5m e o pé-direito duplo em momentos específicos contempladas por esta proposta. As plantas abertas podem ser ocupadas livremente por qualquer exposição temporária que venha a ser feita. Dessa necessidade por pés-direitos duplos em parte do espaço expositivo, tirou-se partido para, com os grandes vazios sucessivos, criar permeabilidade visual interna onde, além observar a exposição em diversos níveis, se pode “ver e ser visto”, atividade que historicamente faz parte da socialização da população LGBTQ. Entre os espaços de exposição, foi previsto um andar livre e aberto, como uma grande varanda para a cidade e para dentro do próprio museu. Nele se pode realizar de tudo: desde eventos ao ar livre – uma vez que foi previsto um pequeno bar/espaço de apoio para isso – até performances e exposições temporárias abertas.


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abaixo V

Perspectiva do pavimento multiuso avarandado, (planta 7). Como espaço multiuso, ali podem se realizar exposiçþes, eventos, rodas de conversa, oficinas, performances, etc. O rasgo no plano de concreto outrora imperturbado emoldura a vista da cidade e controla a entrada de luz.


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Perspectiva do interior de um dos espaços expositivos. A varanda cria um espaço de descanso e contemplação para quem está na exposição, possibilitando que a cidade faça parte da paisagem dos espaços juntamente com a exposição.

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Perspectiva de um dos espaços expositivos com uma sugestão de exposição temporária. Sobressaem a escada como elemento escultural que fratura o espaço e a continuidade visual entre os pés-direitos duplos e as varandas internas que eles criam.

V


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CONCLUSÃO Frente aos tempos que vivemos, de ameaças aos avanços duramente conquistados nas últimas décadas, este projeto é mais do que urgente. É uma resposta. Em resposta à tendência a segregação espacial, projeta-se um espaço radicalmente público. Em resposta aos discursos de preconceito cada vez mais públicos, à desinformação e à ampla difusão de notícias falsas, projeta-se um espaço educativo-expositivo aberto em meio a um grande fluxo de pessoas. Em resposta à intolerância, projeta-se um espaço que induz todos – sem exceção – a coexistirem num mesmo lugar, nem que seja por um minuto. Em resposta à “ordem imposta”, projeta-se, especialmente através da circulação, uma “desordem organizada”. Em resposta a quem quer nos esconder, nos fazemos (muito) visíveis. E resistiremos. Ninguém vai voltar para o armário.


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ANEXOS


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ANEXO 1 | ENTREVISTA COM FRANCO REINAUDO A entrevista transcrita a seguir se realizou no dia 28 de março de 2018, às 15:00, na sala de reuniões da sede da APAA, no Teatro Sérgio Cardoso. Foi entrevistado Franco Reinaudo, diretor executido do Museu da Diversidade Sexual. LUCAS – Eu trouxe alguns pontos pra conversarmos, e vou começar tratando o assunto desde os primórdios do museu. Por que Museu da Diversidade Sexual, como foi escolhido este nome? FRANCO – Ah, por que se escolheu Museu da Diversidade Sexual? Porque a gente pensou bastante nisso, e como naquela época ainda tinha no movimento social uma discussão sobre essa questão da sigla - GLBT, que depois mudou para LGBT, e que agora já tem LGBTQ e LGBTQ+ - a gente achou que se a gente usasse uma sigla talvez a gente não estivesse contemplando toda a diversidade sexual, né? E acho que naquele momento talvez a nomenclatura mais adequada pra esse espaço era a da Diversidade Sexual, também porque ela também não tinha tanta limitação de trabalhr as questões de expressão de gênero, as questões também ligadas com outros tipos de discriminação, como o machismo... E por isso achamos que foi a solução mais adequada, naquele momento. LUCAS – No edital do concurso para a sede da Paulista era dito que o museu teria uma exposição permanente, mas não estava discriminado o que seria exposto nela, mas sim recortes temporais que a norteariam. Não era explicitado nesse edital, porém, que tipo de peças seriam expostas nesse espaço – se haveria um acervo físico ou se seria uma proposta mais ligada ao conceito de “museu aberto”, como no caso do Museu do Futebol ou do Museu da Língua Portuguesa... FRANCO – É, a gente não tinha isso muito definido, porque existe uma questão no plano museológico do nosso museu, e é uma questão um pouco dos novos museus, da dificuldade de se manter um acervo. Então, num primeiro momento, optou-se por não ter um acervo físico, e, se fosse feita uma proposta que incluísse essa questão, isso iria restringir um pouco a forma de desenvolver essa


117 exposição de longa duração. A ideia dessa exposição permanente seria contar a história da população LGBT no Brasil. E ela teria também, num primeiro momento, as questões mais educacionais de falar um pouco sobre esses conceitos: sobre o que é diversidade sexual, o que é orientação sexual, o que é identidade de gênero, e etc. A partir disso, se contaria a história da comunidade. Eu me lembro que a exposição histórica começava com a história da casa [onde seria implantado o museu], dos moradores e seguiria para a história da Paulista e das manifestações. Aí entraria a Parada, para fazer uma ligação temática. Quem deu essa ideia, inclusive, foi o antigo secretário Marcelo Matos Araújo. LUCAS – Você poderia me dizer quantos funcionários tem o museu e qual é seu orçamento? FRANCO – Claro, isso é público! Eu só não sei se vou acertar, porque não me lembro dos dados. Hoje, nós temos dois educadores no museu, um diretor, uma responsável pelo núcleo cultural, um supervisor do educativo, um estagiário do programa de memória do museu e um jovem aprendiz. E o orçamento anual, se não me engano, é por volta de 640 mil reais. LUCAS – Havia uma previsão de aumento considerável no orçamento caso fosse construída a nova sede. Qual seria esse aumento, você tem ideia? FRANCO – Não. Até tem uma questão que é importante se falar, que é a seguinte: a secretaria da cultura é dividida em unidades. Nós fomos criados como centro de referência na unidade de fomento. Então, na verdade, burocraticamente ele ainda não é um museu. Hoje, está correndo o processo de passagem de centro de referência para museu. A ideia é que, quando ele passa a ser efetivamente um museu, aí a estrutura também deve mudar, e o orçamento também, porque


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aí tem uma série de exigências que hoje como centro de referência a gente não tem. LUCAS – Quando estava em discussão a escolha de um lugar para a primeira sede do museu, a estação de metrô foi uma escolha da organização, certo? FRANCO – Na verdade é assim: a história do museu começa a uns sete anos atrás. Eu estava na Prefeitura de São Paulo, na Coordenadoria de Assuntos da Diversidade, mas antes disso, por volta de 2000, existia uma conversa com quem ajudou um pouco na parada – e aí eu vou falar algumas pessoas: Celso Curi, João Silvério Trevisan, Serginho Miguez, Almir, Laura Bacelar, Fátima Tassinari, Ronaldo de Assunção – que uma discussão de criar um mecanismo que possibilitasse a preservação da memória, das histórias, das coisas, porque essa população, por não ter família, por uma série de outras condições esses acervos e essas histórias iam se perdendo, as famílias não davam importância pra isso, e a gente sempre pensou que seria importante se preservar de alguma forma. E aí foram pensadas várias estratégias, desde fazer alguma coisa na internet (já que era na época onde começavam a surgir os portais e etc.), e aí, quando eu assumo a coordenação na prefeitura, vem isso mais forte de ter o espaço físico. E aí nós fomos procurar os espaços, e nessa chegamos à Secretaria Estadual da Cultura, e, lá, as pessoas da Secretaria abraçaram essa ideia, e foram falar com o Metrô, que se ofereceu para ceder um espaço. A escolha da estação República se dá, porque, primeiro, ali é um espaço de circulação da população, tanto de moradia em razão do centro, como também por conta da circulação ali, a gente tem a República, a Vieira de Carvalho, o Arouche, que são lugares frequentados pela população LGBT; e muito também por causa do Edson Neris, que foi assassinado ali na praça, e a gente achou que ali seria importante estabelecer essa relação e esse marco, então foi por isso que foi escolhida a Praça da República, mesmo não sendo o maior lugar... Existiam outras possibilidades, mas a gente achou que era importante estar lá. LUCAS – Houve uma diferença entre essa escolha da estação República do Metrô para a sede “temporária”, e da Avenida Paulista, onde seria a nova sede. Por


que dessa mudança? FRANCO – Não, a questão é que o museu já não cabe lá. Lá é um espaço incrível, um espaço expositivo muito emblemático, que inclusive nós queremos manter. Mas a verdadeira vocação do museu, além disso, é de ter, de alguma forma, outras atividades de formação, de pesquisa, o centro de memória, o pequeno acervo que nós temos, que precisa ser condicionado em algum lugar. Veja só: a gente fica aqui no [Teatro] Sérgio Cardoso e o museu fica lá... Então, a partir desse cenário, que não cabiam mais as atividades do museu, a gente foi procurar outros espaços. E nessa própria busca, foi quando o próprio Marcelo [Matos Araújo, antigo Secretário da Cultura do Estado de São Paulo] falou: “tem esse casarão na Paulista, vamos conversar com o governador”. E ele foi conversar com o governador, que achou ótima a ideia e declarou isto. Só que não se esperava que existia todo um problema do Ministério Público em relação à casa. Porque o que eu sei da história é: o governo perdeu o processo de “desapropriação contrária” (eu não sei como é o nome técnico disso) e o Ministério Público intimou o Governo do Estado a dar uma destinação para o espaço e fazer o restauro. Foi o que foi feito: a gente abriu o edital, foi feito todo o diagnóstico para o restauro do casarão, e o Governo chegou com o projeto e disse que precisaria ser feita a imissão de posse, porque seria a única forma de o poder público poder injetar dinheiro para construir o museu. E o Ministério Público falou que não, que deveria-se pagar o precatório para conseguir entrar, e aí criou-se o imbróglio: porque como o Governo ia pular a fila do precatório e injetar dinheiro em um imóvel privado, inclusive o cara mora lá... LUCAS – Então, de acordo com o que você sabe, isso está meio congelado... FRANCO – É, agora ninguém sabe como resolver isso. Porque é óbvio que o Governo não pode injetar dinheiro em um lugar que é usado como moradia privada, entendeu? E ao mesmo tempo o casarão está ruindo... É isso que a gente sabe. LUCAS – Caso não houvesse o casarão, o museu teria ido para outro lugar?

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FRANCO – Sim, teria. Existia uma grande vontade por parte do poder público de mudar a sede do museu. A gente foi ver várias coisas. Inclusive, quase que a gente foi parar ali perto do Shopping Higienópolis, que tem um casarão ali na esquina... Já tinha se conversado, o Shopping estava de acordo, mas a gente achou que seria trocar seis por meia dúzia, porque o casarão era pequeno. Foram vistos uma série de espaços, inclusive para aluguel... LUCAS – Mas os espaços que eram de interesse eram somente os casarões, ou imóveis ligados ao patrimônio histórico? FRANCO – Não, não. A gente pensou em comprar um terreno pra construir mesmo, mas tinha um recorte geográfico – entre a Paulista e o centro – e eu acho que o museu não tem como estar fora deste circuito, digamos assim. E aí é mais difícil mesmo, né? Achar algum terreno vazio nessa área. LUCAS – A Paulista é um lugar de memória para a população LGBT, ainda que recente... FRANCO – E é um lugar de protesto, de resistência... A gente acha que seria incrível. Mas o circuito fechado na época da procura foi feito também levando em conta os lugares de memória. Eu acho que tem a ver também, quando se cria um equipamento cultural, você tem que ter uma certa circulação, e esta circulação se concentra mesmo. E, por exemplo, colocar o Museu da Diversidade Sexual na Lapa seria difícil, né? Você acaba não garantindo o acesso universal, nesse caso. A gente procurou até outras estações de metrô, que estão sendo construídas, pra ver se conseguia desenvolver um projeto para o museu, como na construção daquela estação da linha Laranja na Rua da Consolação, mas por uma série de fatores não foi possível... LUCAS – Do que se trata esse acervo próprio do museu, que você disse que,


mesmo pequeno, existe? FRANCO – São as exposições que aconteceram no museu. Na verdade, a gente tem um programa que tudo que tem no museu, quando possível, circula pelo litoral e pelo interior do Estado. Então as exposições duram. A gente pede para quem produziu (os autores, os fotógrafos, etc.), uma autorização de uso maior do que só o período da exposição, e isso tem que ficar em algum lugar. Depois disso, por causa dos contratos, as reproduções e obras originais tem que ser devolvidas ou descartadas. LUCAS – Existe alguma interface entre o Museu da Diversidade Sexual e a produção artística LGBT, no sentido de incorporar obras às exposições? FRANCO – Existe! O Museu da Diversidade Sexual não existe sem a comunidade LGBT. E foram estabelecidas algumas estratégicas, como o lugar é muito pequeno e seria meio complicado fazer exposições individuais, criou-se algumas estratégias para atender a demanda imensa que existe. A gente criou dois momentos: o primeiro é a Diversa, uma exposição realizada a cada dois anos. É um chamamento público, qualquer um pode participar, artistas LGBT ou não, com obras cujo tema seja a diversidade sexual, ou seja, orientação sexual, identidade e expressão de gênero. Aí existe uma comissão curatorial que seleciona os projetos e a gente apresenta. Ano passado, surpreendentemente, foram expostos 18 projetos naquele espaço tão pequeno. O outro momento é um processo também pra gente poder mostrar o trabalho, mas é com gente mais conhecida, então a gente chama um curador, apresenta um tema – o tema de última foi “solidão” –, e aí são artistas conhecidos já que apresenta um trabalho ou uma série de trabalhos sobre um determinado tema. Esses artistas também são LGBT ou não, mas, além de se relacionarem com o tema, as obras devem respeitar a temática da diversidade sexual. E a gente respeita a tanto visão “LGBT” quanto a visão “não-LGBT”. Acho que é importante isso pra gente. Então a gente tenta misturar um pouco tudo. Afinal, é diversidade, né? (risos) Eu acho que o museu ali [na estação República] tem uma característica muito importante. Isso é, quando foi feito o primeiro projeto daquele espaço, o cara

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queria fechar aquilo tudo, como se fosse um armário. Era uma porta fechada que você entrava. A ideia era interessante, porque você estava entrando no armário. Só que era como se você fosse falar pra você mesmo, porque, imagina, uma coisa toda fechada lá? Era meio guetizante, sei lá... E a gente resolveu mudar essa proposta, e hoje o museu trabalha de outra forma. A gente costuma deixar a janela todas abertas para as pessoas passarem e mesmo quem é contra, quem não tem tempo de entrar, alguma coisa está captando. E a gente plota aquelas paredes enormes com a mesma função. A gente usa todas as possibilidades que a gente tem de se comunicar com todo mundo que passa lá. Lá passam milhares de pessoas. Então, essa é a forma que a gente tem de estabelecer uma relação com toda essa gente, não importa se é a favor, contra... Inclusive, no Caio [exposição realizada no museu sobre a vida e obra de Caio Fernando de Abreu], a gente colocou um monte de poesias que a pessoa podia passar e levar. Foram distribuídas mais de 15 mil poesias do Caio. Tem exposição que a gente plota texto, as pessoas passam e às vezes param para ler... Outra coisa que eu acho que é importante na nossa estratégia, é que se você for comparar a gente com outros museus, você vai ver que a gente não tem nenhuma barreira pra entrar lá. Isso pode ser um problema, porque, por exemplo, quando você faz uma exposição como a “Solidão”, lá tem obras de artistas conhecidos, coisas de valor, e a gente não tem como garantir a segurança. E a gente deixa claro prx artista: “olha, é por sua conta e risco”, porque a gente não tem grana pra fazer um seguro. É assim, e é muito legal isso, porque as pessoas entram. E entra todo mundo mesmo. Isso que é legal lá; entra morador de rua... Outro dia a gente estava lá e um cara estava tentando tirar a TV da parede. (risos) Quando a gente vai nessas reuniões de museus, todo mundo se preocupa com a questão do público e tal, mas quando você estabelece algum tipo de barreira... Por exemplo, se você for ver o projeto do museu na Paulista, uma das coisas bacanas é que ele tira aquele muro da frente, que não é original da casa, e cria


uma praça. Então, isso é um espaço aberto para as pessoas entrarem e usarem. Isso sempre foi uma questão importante pra nós. Todo museu que você vai tem algum tipo de barreira, uma catraca, e eu acho que as pessoas se sentem um pouco bloqueadas ali, principalmente quem não tem esse hábito de frequentar esses lugares. Essas pessoas veem aquilo e pensam: “isso não é pra mim”. A gente sempre procurou tratar isso do modo oposto ali no museu, já que a gente trabalha com discriminação. LUCAS – Então vocês tem a ideia desse museu como um espaço de inclusão universal, não só pra LGBTs... FRANCO – Claro, ia virar uma praça aquilo ali. A gente queria tomar conta também daquele Parque Mário Covas, que está lá todo cercado... (risos) LUCAS – Mudando um pouco de assunto, o Plano Museológico foi reformulado para fazer o edital do concurso, em 2014? FRANCO – Não, não. O plano museológico, na verdade, como tinha o projeto do espaço já, foi pensado para aquele espaço [da Paulista]. Como isso não aconteceu, a gente não tem ele finalizado, porque ele vai precisar sofrer algum tipo de alteração em virtude de um eventual novo espaço. Só que a Kátia [Fillipini], que é uma das museólogas, acho que está fazendo pós em Portugal... E a [Maria] Cristina Bruno... Mas, enfim, daqui a pouco a gente vai finalizar esse plano. Só estamos esperando um pouquinho pra ver se existe alguma solução pra isso ou se vai ser destinado um novo espaço para o museu. Mas a parte conceitual do plano já existe... LUCAS – Nos arquivos do concurso, constava um plano museológico, mas não sei se é o mesmo... FRANCO – Eu acho que deve ser uma versão preliminar. Eu vou te ceder os arquivos, é tudo público... Acredito que deve ter havido sim um aprofundamento, um detalhamento, mas em essência é aquilo. Quem fez foi a Maria Cristina

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Bruno e a Kátia Fillipini. LUCAS – É uma intenção de vocês manter a tradição do museu de exposições temporárias? FRANCO – Sim, sim, totalmente. A gente achou importante que tivesse áreas em que se pudesse garantir espaços pra outras manifestações, então, teatro, sala de ensaio, sala de reunião para os grupos... A gente gostaria que não fosse um espaço de visitação, mas sim um espaço de convivência, onde se pudesse garantir uma dinamicidade. Por isso do centro de memória, o teatro [auditório]. Isso são coisas que a gente faz lá no museu... Tem atividade cultural, tem cinema... É que lá é muito pequeno, então tem uma série de limitações. LUCAS – O centro de memória que vocês propõem é um centro de documentação, de pesquisa, de ambos...? FRANCO – Ele é um pouco de tudo. Porque é assim, a gente conseguiu uma parceria com o Itaú, com o sistema de referenciamento de acervos. Então a ideia do centro, além de fazer essa pesquisa histórica da população LGBT no Brasil, é também referenciar acervos. Ou seja, não necessariamente a gente tem o acervo, mas pode dizer “olha, tal livro está em tal lugar” ou “tal objeto está com tal pessoa, em coleção particular”, pra que as pessoas não só tenham um lugar que concentra essas informações pra pesquisa, mas também um lugar que tenha essa história contada, pra que se possa disseminar esse conhecimento. E isso está sendo feito de duas maneiras: uma é o Léo [Leonardo Arouca], que cuida desse sistema, pra referenciar os acervos, e a gente tem um programa, que se chama Programa de Memória LGBT, que são coletas de testemunhos. A primeira parte desse programa a gente vai lançar agora. São dez testemunhos, num primeiro momento com pessoas acima de 65 anos, mas a ideia é que esse projeto evolua. Inclusive, se você for ver o projeto do museu na Paulista, tem um espaço lá em cima, que seria um lugar de coleta, aquilo era fosse como um olho, e é onde seria o estúdio de coleta. A gente acha que isso é fundamental pra preservar essa memória. E pode ser usado tanto para exposição quanto para


pesquisa. A gente está montando a próxima exposição, que vai se chamar Com Muito Orgulho, que vai ser sobre as Paradas LGBT no mundo todo, junto com a Associação [da Parada LGBT de São Paulo], então o centro está fazendo toda essa parte de pesquisa histórica. LUCAS – Você acha que hoje, dado o contexto do Brasil e essa onda de conservadorismo cada vez maior, seria feita com a mesma facilidade a criação do Museu da Diversidade, ou o concurso? FRANCO – Olha, o que aconteceu lá no MAM, o que aconteceu lá no MASP, foi legal porque gerou certo tipo de comoção, e aí teve um monte de eventos... Então eu fui num evento falar sobre essa questão. E aí minha fala foi no sentido de dizer: “Eu acho bacana discutir isso, mas a gente [no Museu da Diversidade] sofre isso diariamente. A gente sofre voadora no vidro, bateção de bíblia, gente que vai lá e xinga a gente...”. Então, eu acho importante que as pessoas reajam, mas desde sempre a gente sofre disso. Nada é fácil pra gente. Nunca nada foi fácil. Nada veio gratuitamente. Desde o começo do museu as pessoas ficavam: “Pra quê Museu da Diversidade Sexual? Isso não é preconceito ao contrário? Mas e o Museu Hétero?”. A gente foi indo, foi indo, e como tudo que a gente faz, você deve saber bem, não foi fácil. É claro, quando você diz sobre uma onda de conservadorismo, isso assusta? É claro que assusta! Mas eu acho que também existe uma reação contrária, talvez, né? De as pessoas realmente se posicionarem a favor do museu... Eu não sei te dizer ao certo... Acho ruim? Acho. Mas eu não acho que mudou muita coisa, na verdade. No nosso dia-a-dia, pelo menos... Eu achei engraçado que teve gente que... Quando aconteceu o negócio no MAM, a gente até foi falar com eles, perguntar se precisavam de alguma coisa, aí o MAM falou pra esperar um pouco. Eles estavam muito assustados, e a gente respeitou isso. Aí o pessoal foi contra a gente, sabe? LGBTs falando “Vocês não

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vão se posicionar?”... E aí eu falei: “Querido, a gente se posiciona todo dia. A gente sofre voadora, a gente sofre preconceito...”. É engraçado, porque agora que aconteceu com algum museu tradicional... Quando acontece com a gente, ninguém corre atrás pra ajudar... Puxa, a gente já sofreu tanto isso... Pichação é direto. Ameaça também. É esquisito isso, né? Porque parece que as pessoas pensam “Ah, lá [no Museu da Diversidade Sexual] já é assim. Eles estão acostumados a tomar pau.”. E aí as pessoas vem cobrar posicionamento nosso. Querido, manda o MAM se posicionar ao nosso favor, né?! Cadê? A gente já fez vários boletins de ocorrência lá... LUCAS – Mudando um pouco de assunto, você já ouviu falar de experiências de imersão em museus, como no Museu do Apartheid, em Johanesburgo? FRANCO – Acho, acho sim. Tem uma experiência parecida acho que no Museu do Holocausto, em algum lugar... É uma coisa bem emblemática. Até porque, eu acho que nessa questão do preconceito, falar é uma coisa, e sentir é outra. LUCAS – Mas você acha que nessas exposições de caráter imersivo pode ser um problema as pessoas saírem ofendidas? FRANCO – Sabe, por causa desse negócio de as pessoas se sentirem ofendidas, a gente colocou um belo aviso lá na entrada dessa exposição (risos). Porque sempre reclamam, né? Mas é difícil... Tudo é difícil. Uma foi ótima... A gente teve uma exposição que tratava de moda e diversidade. Era sobre moda, você imagina... Com o Paulo Borges e tal. E aí tinha uma imagem na entrada que era um menino e outro menino atrás. Era só o rosto deles. Uma mulher escreveu uma carta dizendo que a gente estava “promovendo a promiscuidade”, e que por lá passavam crianças e que era um absurdo. O pessoal da Secretaria de Cultura ficou muito assustado, e eles foram lá ver. Chegaram lá e não era nada disso. LUCAS – Na exposição que está lá atualmente está avisado...


FRANCO – Está avisado, mas dá pra ver de fora, né? (risos) E é essa a ideia. Imagina se a gente tivesse fechado tudo aquilo? No começo eu ficava na porta, e era impressionante. Era assim: tinha duas reações absolutamente opostas. Tinha gente que passava e olhava, tirava selfie, ficava feliz, e, ao mesmo tempo, tinha gente que xingava, fazia escândalo. Eu tinha um amigo que falava que você combate o preconceito de três maneiras: pela conversa, pela convivência ou pelo bolso (risos). E é isso que a gente faz todos os dias. A pessoa vê tanto que se acostuma. LUCAS – E a ideia é que o museu se mantenha para sempre gratuito? FRANCO – Sempre que possível a gente vai continuar gratuito. Eu não posso garantir isso. Agora a gente está mais livre, porque não estamos nessa situação jurídica de museu propriamente dito. Eu não sei como funciona essa legislação ou essas coisas que você precisa respeitar na hora que você vira realmente uma instituição museológica. Mas sempre que possível a gente quer que seja gratuito. Eu acho que todo museu que trabalha com esse tipo de questão deve ser gratuito ou deve garantir o acesso ao máximo possível de pessoas, né? Eu acho que a grande função do museu é uma função educativa. Isso é muito claro pra gente. A gente tenta fazer um esforço imenso para que a área educativa seja a mais forte do museu. LUCAS – O museu está em contato com ou tem acordos de cooperação com associações e grupos LGBT? FRANCO – A gente faz bastante atividades com vários grupos. Por exemplo agora, no nosso sistema de memória, a gente tem uma parceria com a Parada [Associação da Parada LGBT de São Paulo] para referenciar todo o acervo deles.

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Tem uma parceria com a OAB Diversidade para isso também. Quando teve uma vigília ali na Praça da República, a gente participou em parceria com o pessoal da Rota da Lâmpada, das Mães pela Diversidade. Uma das próximas exposições do museu vai ser a Queer City [cujo nome foi mudado posteriormente para “Textão”], que vai ser feita em parceria com os coletivos da periferia. A gente tenta sempre que possível estabelecer esse tipo de contato. Temos uma ligação bastante antiga com as lésbicas mais ligadas ao meio editorial. Fazemos vários saraus com elas, e elas são bastante presentes no museu... LUCAS – E quando foram montar a exposição “Histórias da Sexualidade” no MASP, houve algum tipo de contato ou cooperação? FRANCO – Não, nenhuma. Nem nos procuraram. Mas a gente vai fazer junto com a Pinacoteca agora dia 17 de julho um evento chamado Museu Queer. Vai ser sobre como os museus mantém uma relação com a diversidade e a questão LGBT. O pessoal da Pinacoteca é muito legal. Por isso que eu acho que às vezes é só dar um empurrãozinho, porque a gente tem uma relação muito legal com os museus todos. É uma situação bacana que não vai se perder. É por isso que, tudo bem, tem uma onda conservadora aí, mas também tem uma turma aí que não vai deixar isso rolar. Ou vamos resistir, enfim.

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ANEXO 2 | PLANO DE CURADORIA Reproduz-se aqui integralmente o arquivo em PDF recebido contendo o Plano de Curadoria elaborado por João Silvério Trevisan para o Museu da Diversidade Sexual em 2015, quando da elaboração do novo plano museológico e finalização do projeto para a sede na Avenida Paulista. MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL

PLANO DE CURADORIA de JOÃO SILVÉRIO TREVISAN Organização Geral Na organização museológica geral, haverá um recorte cronológico que se se cruza com um recorte temático. Essa formulação parte de um roteiro inicialmente baseado na estrutura da obra DEVASSOS NO PARAÍSO, que oferece uma mirada abrangente sobre a história da homossexualidade no Brasil. De fato, misturam-se aí diferentes disposições estruturais, como galhos que partem de um mesmo tronco. Mas não se pretende restringir a essa obra, que fornecerá apenas um roteiro inicial. Do ponto de vista de equipamentos museológicos e suportes expográficos, o roteiro prevê utilização de tudo aquilo que possa encorpar a documentação histórica e interativa, inclusive novas aquisições tecnológicas: documentos antigos e novos; reproduções de textos emblemáticos; obras artísticas; instalações; fotos; livros publicados e originais (Cassandra Rios, Darcy Penteado, Caio Fernando e outros); jornais e revistas; peças de vestuário de peças teatrais, filmes e telenovelas; scripts; cenários e maquetes teatrais; exibição em vídeo de obras pré existentes, em trechos ou integrais; exibição de pequenas filmagens criadas pontualmente (encenações de cenas da inquisição, personagens antigas e cenas emblemáticas do passado); entrevistas filmadas; entrevistas audiovisuais; computadores para público interagir acessando dados, imagens, gravações e material digitalizado. A estrutura museológica poderá mimetizar um cordão de carnaval ou uma Parada LGBT mas também estabelecer uma “narrativa” lúdica, com diversidade de narradores (vozes) do segmento LGBT. Será usado o jargão da comunidade LGBT de diversos períodos e regiões do país. Esse linguajar comporá, inclusive, Este plano também se abre para criar redes de intercâmbio museológico ou núcleos de pesquisa em todo o país, num duplo objetivo cultural e educativo. Considere-se este um roteiro básico, que deverá, obviamente, receber acréscimos, atualizações e modificações. Não se entendam as seções abaixo como necessariamente salas específicas ou compartimentalizadas; elas poderão se interpenetrar, em certas situações.

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Seções Museológicas Seção introdutória - Estado da questão: terminologia e conceituação didática – diversidade sexual, segmentos LGBT, gênero, identidade de gênero, transgênero e transexual, entre outros. - O machismo no Brasil 1 - Olhares estrangeiros: testemunhos dos primeiros colonizadores e viajantes sobre a homossexualidade no Brasil colonial e escravocrata; 2 - Sexo entre homens e homens-mulheres em etnias indígenas;3 - Vivência estrangeira na atualidade: impacto do Brasil na homossexualidade de estrangeiros aqui chegados.4 Seção inquisição e homofobia histórica - Choque cultural: contrarreforma católica X sodomia tropical; 5 - Implementações: as várias visitações inquisitoriais nos 4 primeiros séculos da colonização portuguesa;6 - Índios, escravos negros e colonizadores brancos perseguidos por sodomia; 7 - Entrevistas com Luiz Mott e Ronaldo Vainfas. Seção leis e homofobia histórica - Ordenações do Reino: Afonsinas, Manuelinas e Filipinas; 8 - Primeiro código penal pós independência brasileira; - Sínodos católicos e variações códigos penais e civis, código penal militar. Seção higienismo e homofobia na medicina9 - Introdução do termo “homossexualismo”; - Prática higienista: documentos, fotos; - Hipóteses científicas, tratamentos e profilaxia anti homossexual; - Confinamento de homossexuais: casos emblemáticos de Febrônio Índio do Brasil e Antonio Chrisóstomo.10

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DEVASSOS NO PARAÍSO – Introdução Cap. 4: O estado de vir-a-ser DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte I, cap. 1 DEVASSOS NO PARAÍSO - Parte III, cap. 7 4 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte I, cap. 2 e 3 5 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte II, cap. 2 e 3 6 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte II, cap. 4 e 5 7 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte II, cap. 2 e 3 8 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte III, cap. 2 9 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte III 10 DEVASSOS NO PARAÍSO - Parte III – Cap. 6 2 3

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Seção artes e homossexualidade (não desdobrei por gêneros)1 - Antecedentes: Gregório de Matos, Adolfo Caminha, João do Rio; - Literatura, artes plásticas, teatro, música popular, cinema, fotografia, televisão, quadrinhos; - Madame Satã: personagem e filme – personagem que pervade múltiplas secções como homossexual, negro, artista, malandro e transformista; - Referências: Mário de Andrade; Cassandra Rios; Dzi Croquetes; Nei Matogrosso; Laerte. Seção direitos homossexuais2 - Primórdios e desdobramentos: fundação; primeiros grupos; jornal Lampião da Esquina; primeiros encontros nacionais; - Leis atuais implementadas e projetos malogrados; - Bancada conservadora e religiosa fundamentalista; - Política e políticos: testemunhos pró e contra direitos homossexuais; - Deputado Jean Wyllys: entrevista, fotos, atividades e propostas; - Novas famílias: entrevistas e fotos. Seção lésbicas - Lesbianismo e feminismo; - Organização de grupos militantes; - Estilos de vida e integração em novas famílias; - Conquista de espaço em esportes de preponderância masculina; - Caso Daniela Mercury: fotos, entrevistas, matérias de jornal. Seção transgeneridades - Perseguições policiais; - Travestis e prostituição na Europa;3 - Estilos de vida (das ruas à política); - Lutas atuais: projetos políticos específicos – mudança de nome, operações para transexuais, espaços profissionais e familiares. Seção Aids e Saúde - Histórico de primeiros casos e primeiras lutas;4 - Pânico e repressão;5 - Luta anti aids governamental e ONGs.

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DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte IV DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte V DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte VI, cap. 3 4 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte VII, cap 1 e 2 5 DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte VII, cap 2 2 3

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Seção homofobia na atualidade - Violências praticadas contra LGBTs: fotos, relatos, entrevistas, matérias de jornal; - Estatísticas disponíveis. - Manchetes jornalísticas homofóbicas: jornal Notícias Populares e outros; - Tratamento para cura homossexual: relatos; - Homofobia internalizada: suicídios e homicídios – casos famosos (Sandra/Handerson Herzer; Genildo Ferreira de França);1 Seção religiões - Religiões afro-brasileiras e homossexualidade;2 - Práticas religiosas e discriminatórias de religiões cristãs; - Casamento homossexual e oposição religiosa. Seção carnaval - Fotos antigas e recentes; - Fantasias famosas: Clóvis Bornay e outros carnavalescos. - Reproduções fonográficas de músicas marcantes da história carnavalesca; - Bandas e blocos atuais com incidência homossexual. Seção Paradas LGBT - Fotos, entrevistas; - Fotos da diversidade de participantes: jovens; idosos; Mães pela Diversidade, transgêneros; cristãos inclusivos; lésbicas motoqueiras; anarco punks; artistas; - Casos emblemáticos: trans crucificada – fotos, entrevistas. Seção Academia, Internet e Redes Sociais - Núcleos de estudo, revistas LGBT e estudos queer: entrevistas; - Grupos e links de atividades pró direitos LGBTs; - Homossexualidades na internet: paqueras, encontros, novas práticas; - Sexualidades inclusivas do futuro. Seção Bixórdia - Será traduzido em espaço museológico a imaterialidade física do variado jargão da comunidade LGBT de diversos períodos e regiões do Brasil.

Curadoria: João Silvério Trevisan São Paulo, setembro/outubro de 2015.

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DEVASSOS NO PARAÍSO – Parte VI, cap. 2 DEVASSOS NO PARAÍSO – Apêndice 1

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TFG LUCAS ZABEU CUNHA


DESENHOS

nova sede do MUSEU DA DIVERSIDADE SEXUAL


CORTE ESQUEMÁTICO


ELEVAÇÃO RUA DO AROUCHE 0 1 2

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CORTE LONGITUDINAL 0 1 2

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PERSPECTIVA EXPLODIDA


CORTE TRANSVERSAL 0 1 2

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SUBSOLO CONSTRUÍDO METRÔ | PASSARELA SUBTERRÂNEA EXISTENTE

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7 1. AUDITÓRIO 2. APOIO | CAMARIM 3. DEPÓSITO 4. LOJA 5. SANITÁRIO PÚBLICO 6. BIXÓRDIA 7. METRÔ

PLANTA -1 | +744,0 0 1 2

5

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1

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1. ESCADA DE ACESSO AO CAFÉ/ESPAÇO DE CASAMENTOS 2. ÁREA PARA EXPO PERMANENTE 3. RECEPÇÃO | GUARDA-VOLUMES 4. NOVA SAÍDA DO METRÔ 5. SANITÁRIOS PÚBLICOS

PLANTA 0 | +747,3 0 1 2

5

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1

2

3

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1. CAFÉ | BALCÃO DE SERVIÇO 2. CAFÉ | ESTAR 3. SANITÁRIO 4. ESPAÇO PARA CASAMENTOS

PLANTA 1 | +752,3 0 1 2

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1

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1. ÁREA DE HIGIENIZAÇÃO | RESTAURO DO ACERVO 2. ARMAZENAMENTO GERAL | PEQUENA RESERVA TÉCNICA 3. ÁREA DE TRABALHO 4. ARMAZENAMENTO | PEÇAS DE VESTUÁRIO 5. SANITÁRIOS 6. ESTÚDIO PARA COLETA DE TESTEMUNHOS 7. ÁREA DE TRABALHO 8. ESPAÇO PARA FESTAS LIGADO AO DE CASAMENTOS

PLANTA 2 | +757,3 0 1 2

5

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1

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3 4

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1. ÁREA DE ESPERA - CENTRO DE DOC. 2. RECEPÇÃO - CENTRO DE DOC. 3. SANITÁRIOS 4. ÁREA DE PERIÓDICOS | PERMANÊNCIA 5. PEQUENA ÁREA EXPOSITIVA - PEÇAS DO C.D. 6. ÁREA DE CONSULTA | PERMANÊNCIA | ESTUDOS

PLANTA 3 | +762,3 0 1 2

5

10


1

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3

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1. SALA DE REUNIÕES 2. ARMAZENAMENTO 3. ÁREA DE TRABALHO - ADMINISTRAÇÃO 4. SANITÁRIOS 5. RECEPÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO 6. ESTANTES DA BIBLIOTECA 7. CONSULTA RÁPIDA 8. BALCÃO DA BIBLIOTECA

PLANTA 4 | +767,3 0 1 2

5

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2 1

4 5 3

6

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1. ESPAÇO DOS FUNCIONÁRIOS 2. ARMÁRIOS DOS FUNCIONÁRIOS 3. WORKSHOP MULTIUSO 4. HALL 5. SANITÁRIOS 6. ESPAÇO EXPOSITIVO | PÉ-DIREITO SIMPLES 7. ESPAÇO EXPOSITIVO | PÉ-DIREITO DUPLO 8. VARANDA | ESTAR E OBSERVAÇÃO

PLANTA 5 | +772,3 0 1 2

5

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1

2

3

1. ESPAÇO EXPOSITIVO 2. SANITÁRIO 3. ESPAÇO EXPOSITIVO SEGREGADO

PLANTA 6 | +777,3 0 1 2

5

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1

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1. SANITÁRIOS 2. ESPAÇO MULTIUSO - VARANDA | EXPO E EVENTOS 3. BAR DE APOIO | LOJA

3

PLANTA 7 | +782,3 0 1 2

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1

2

3

4

1. ESPAÇO EXPOSITIVO 2. SANITÁRIO 3. ESPAÇO EXPOSITIVO | PÉ-DIREITO DUPLO 4. VARANDA | ESTAR E OBSERVAÇÃO

PLANTA 8 | +787,3 0 1 2

5

10


1

2

3

1. ESPAÇO EXPOSITIVO 2. SANITÁRIO 3. ESPAÇO EXPOSITIVO SEGREGADO

PLANTA 9 | +792,3 0 1 2

5

10


PLANTA DE COBERTURA | +797,3 0

5

10

20

30


CORTE LONGITUDINAL 0

10

20


TFG LUCAS ZABEU CUNHA


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