XII Congresso Internacional de Reabilitação do Patrimônio Arquitetônico e Edificado 21 a 24 de outubro de 2014 Bauru (SP), Brasil
O EIXO MONUMENTAL DE JAHU: PARADIGMAS DA ARQUITETURA ECLÉTICA E “MELHORAMENTOS URBANOS” NA REPÚBLICA VELHA
ANDRADE, Lucas Caracik de Camargo 1 1: Arquiteto Autônomo e-mail: lucascaracik@gmail.com
TEMA TEMA 03: Patrimônio dos Espaços Institucionais: o patrimônio ligado ao sistema educacional, de saúde, esportivo, religioso, de infraestrutura urbana e rural, etc. RESUMO A cidade de Jahu, localizada na região central do estado de São Paulo, preserva, ainda hoje, uma grande quantidade de edificações em estilo eclético em sua região central. A cidade, desenvolvida sob a égide do café, em forte relação com a rede ferroviária, que havia se expandido a oeste da província, teve o auge deste desenvolvimento urbano entre as décadas de 1880 e 1920. Edificações residenciais no alinhamento da calçada, com porão elevado e entrada lateral, são algumas das tipologias comuns. Chalés, armazéns e sobrados com térreo comercial também fazem parte deste acervo a céu aberto. Além disso, as ruas de sua região central formam quadras regulares e a malha urbana é uma retícula, formada por ruas alinhadas e ortogonais. E, destacando-se dos gabaritos regulares das edificações ao redor, é notório o projeto de um eixo monumental, evidenciado por seus espaços públicos, praças e grandes edifícios da administração pública e da Igreja. O desenvolvimento urbano da cidade, no período de 1887 (chegada da estrada de ferro) até 1929 (a grande crise), foi excepcional. Assim como São Paulo, capital do estado, cidade cada vez mais cosmopolita, a cidade de Jahu teve sua forma urbana e arquitetura modificadas substancialmente, de acordo com as ideias e conceitos de modernidade e civilização advindos do exterior. Assim sendo, o presente estudo aborda o desenvolvimento urbano e arquitetônico da cidade no período, recriando, através de imagens e documentos, seu eixo monumental e suas principais obras, entre elas, a Praça da República, a Igreja Matriz, o Antigo Paço Municipal e as antigas Estações. Também foi consultada a legislação vigente à época e documentos variados, tais quais os antigos livros de projeto da prefeitura, buscando evidenciar a modificação das tecnologias e hábitos em nossa arquitetura e sociedade que, por sua vez, transpareceram na forma urbana da cidade.
PALAVRAS CHAVE: Jahu; República Velha; Café; Eixo Monumental, Arquitetura Eclética
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1. INTRODUÇÃO O presente estudo tem por objeto a cidade de Jahu, localizada no interior do Estado de São Paulo, entre as décadas finais do século XIX e as décadas iniciais do século XX. Neste período, a cultura do café, em expansão constante ao oeste da província, encontrou boas terras e permitiu grandes avanços e mudanças na economia e sociedade da época. Aos poucos, patrimônios religiosos que haviam sido fundados sobre manchas de terra roxa em meados do século XIX, como Jahu, tem sua paisagem (urbana) drasticamente alterada. As ferrovias seguiam – ou mesmo antecipavam – a chegada do café e o posterior desenvolvimento da lavoura. O escoamento dessa crescente produção, anteriormente realizado em lombo de burros e mulas, agora permitia que povoados e vilas no interior exportassem o café a partir do porto de Santos. Pelo mesmo porto chegavam novos produtos, novos materiais (de construção, inclusive) e parte da nova força de trabalho: o imigrante. As mesmas ferrovias levavam os trabalhadores europeus recém-chegados até o interior da província, onde passariam a viver em colônias, no meio rural, ou, de acordo com suas habilidades e conhecimentos trazidos da terra natal, viveriam e trabalhariam nas cidades, construindo e projetando as novas edificações e espaços públicos das cidades. A arquitetura, que nas capitais já apresentava traços europeus, agora também era produzida nestes mesmos moldes nas cidades interioranas. Algumas delas, como Jahu e Ribeirão Preto, tornaram-se, na visão do professor Carlos Lemos, “verdadeiras projeções da capital” (LEMOS, 1983, p.157). No caso específico de Jahu, a chegada da ferrovia, na década de 1880, facilitou as mudanças e o desenvolvimento já citado. Pouco tempo depois, com a instauração da República e a ascensão dos positivistas ao poder, reformas e remodelações urbanas foram impostas e intensificadas em muitas das cidades do estado. O ideal de modernidade era, então, propagado através de jornais e periódicos, então controlados e editados por membros da aristocracia. O excedente de capital gerado com a produção e venda do café e, também, com atividades comerciais realizadas na cidade, levou os membros dessa elite, muitos ocupando cargos políticos na câmara, a realizar investimentos em embelezamento e melhoramentos urbanos. O poder público, através de códigos de posturas, redesenhava e alterava, profundamente, a malha urbana e os conjuntos de edifícios públicos e particulares, definindo os gabaritos e as dimensões das aberturas, por exemplo. Simultaneamente o desenvolvimento do capitalismo mercantilista trouxe às cidades novos estabelecimentos comerciais, novos produtos e, por conseguinte, novos hábitos, decorrentes das novas relações comerciais e da miscigenação com a nova população imigrada. Paulatinamente nossas cidades foram ligadas à “teia da modernidade”, expressão cunhada pela pesquisadora Heloisa Barbuy (BARBUY, 2006, p. 225). O presente estudo, portanto, inicia-se na década de 1880, quando o desenvolvimento da cidade de Jahu se intensificou, devido, principalmente, à chegada da ferrovia ao povoado e, por conseguinte, ao desenvolvimento da lavoura de café, que contava com preços cada vez mais altos no mercado internacional. O fim do recorte temporal do estudo coincide com o final da década de 1920, quando a
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maior parte das reformas urbanas havia se concretizado, ao mesmo tempo em que o café tem seu valor de venda diminuído em decorrência da crise de 1929. Neste ínterim, a arquitetura eclética, produzida em grande parte por imigrantes, e os “melhoramentos urbanos”, ditados pelos ideais de modernidade, deixaram símbolos indeléveis na cidade, sendo muitos visíveis ainda hoje. No período delimitado, a região central de Jahu foi palco de inúmeras obras públicas e particulares. Suas duas principais ruas, Major Prado e Edgard Ferraz, antigas Rua Da Palma e Direita, respectivamente, delimitam o eixo monumental. Fruto de projetos públicos e particulares, o eixo abarca edificações de grande importância, como o Paço Municipal, a Praça da Repúbica, A Praça da Independência, a Igreja Matriz e a Estação Ferroviária. As edificações e espaços, todos de grandes dimensões, feitos com rigor técnico e artístico, demonstram a imposição de um projeto grandioso, possível graças às condições econômicas, técnicas e sociais à disposição, no período e no espaço delimitado pelo presente estudo. Além disso, no entorno do eixo, próximo às suas principais edificações e em suas ruas transversais, estão as residências da elite, ligada à lavoura de café e ao comércio, e as principais casas de comércio e serviços. O trabalho, então, estuda a área central da cidade de Jahu, principalmente seu eixo monumental e o conjunto urbano e arquitetônico que o circunda, de grande valor simbólico e histórico. Há que se ressaltar que importante registro dos projetos urbanos e arquitetônicos da época, realizados na cidade, encontra-se preservado nos antigos Livros de Projeto da Prefeitura de Jahu, atualmente guardados (e pouco visitados) em mapotecas no arquivo do Museu Municipal. A administração pública de Jahu, a partir do final do século XIX, controlava as construções públicas e privadas, solicitando, aos proprietários e órgãos responsáveis, desenhos de plantas, cortes e elevações dos projetos que se pretendia edificar. A riqueza deste acervo está, principalmente, no registro do pensar e do fazer arquitetônico, previamente expressas em desenhos que passavam, posteriormente, pelo crivo da fiscalização municipal. Também há que se destacar o desenvolvimento de uma “cultura do desenho” entre os artífices por trás de cada fachada e/ou edificação inserida na cidade naquele momento. Majoritariamente cianotipias (blueprints), alguns desenhos contém, além dos traços e elementos necessários à interpretação dos projetos, datas e nomes dos seus artífices e financiadores, importantes dados utilizados na pesquisa. Associando-se a este importante referencial, o estudo buscou imagens e iconografia da época, encontradas em acervos distribuídos pela cidade (e fora dela, quando necessário), no citado Museu Municipal, nos acervos da Prefeitura e, também, nos importantes acervos de memorialistas. Em assim sendo, a presente comunicação trata de um dos períodos mais importantes do município de Jahu e seu desenvolvimento urbano e arquitetônico. Visa-se recriar, a partir da rica iconografia da época e dos documentos disponíveis, a região central da cidade, principalmente seu eixo monumental, até hoje passível de observação em passeios pela cidade. Pretende-se também explorar as características arquitetônicas do casario e das principais obras públicas, e os artífices responsáveis pelas mesmas.
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Dessa forma, espera-se contribuir para ampliar os conhecimento e informações sobre a cidade de Jahu e seu rico patrimônio cultural, que apresenta muitas afinidades e paralelismos com o patrimônio de outras cidades paulistas ligadas à economia cafeeira. Além dos já mencionados acervos municipais, com ênfase no Museu Municipal, para o necessário embasamento teórico foram feitas leituras sobre a arquitetura e urbanismo do período e do espaço/região relativos ao estudo. Ademais, parte fundamental da pesquisa foi realizada in loco a partir da observação direta da área em estudo. 2. O EIXO MONUMENTAL DE JAHU A cidade de Jahu apresenta, em sua região central, uma forma urbana típica das cidades desenvolvidas no início da nossa República, ou seja, ruas paralelas e perpendiculares, quadras regulares e um eixo monumental (Figura 1), que reúne os edifícios e espaços públicos mais importantes da cidade.
Figura 1 Região central de Jahu nos dias de hoje. Em destaque o eixo monumental, ainda perceptivel. A numeração indica os principais edifícios e espaços: 1 – Praça da República, 2 – Praça da Independência, 3 – Igreja Matriz, 4 – Paço Municipal (atual Prefeitura), 5 – Estações Ferroviárias (atual edifício da Estação Rodoviária). Fonte: Google Maps - editado pelo autor.
Evidenciando a organização e o poder por trás dessa concepção, este eixo é carregado de informações sobre a sociedade, economia e técnica da época, da grande à pequena escala. Os edifícios, o casario e os espaços públicos que ali foram projetados e construídos contém materiais, elementos decorativos e formas realizadas de uma nova maneira, até então exclusiva dos grandes centros urbanos. Decorrentes de alterações nas relações de trabalho, juntamente com novas técnicas e materiais, e uma situação econômica propícia, como se deu a partir da chegada do café e da ferrovia à região de Jahu, os construtores, engenheiros e arquitetos (em boa parte imigrantes) então criaram edificações e espaços que correspondiam ao ideal de modernidade e civilização da época. Utilizaram,
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para isso, o vocabulário eclético então em voga na Europa e o adaptaram à tecnologia e à mão de obra e materiais então disponíveis por aqui. Importante ressaltar os ideais de modernidade que, irradiados da Europa (em geral), foram apropriados pela aristocracia e disseminados através da mídia impressa e dos discursos dos políticos locais. Com a chegada da ferrovia e, por conseguinte, com o aumento dos lucros da produção de café e comércio, o processo de modernização da região central da cidade teve os contornos definidos. Os Códigos de Posturas foram reescritos e toda e qualquer obra de melhoramento ou embelezamento era, então, divulgada em jornais e almanaques. Ao mesmo tempo, para que esse discurso de modernização fosse apropriado pela população, os jornais vinculavam artigos de viajantes que por ali passavam com as melhores impressões sobre a cidade e sobre as obras que então ocorriam. Sempre que possível se comparava Jahu às capitais São Paulo e Rio de Janeiro, então modelos de urbanização e modernidade para as cidades do interior (PAIVA, 2001, p. 55). No entanto, há que se destacar que a modernização ocorreu, mas não completamente como esperado pelas classes dominantes. Alguns hábitos rurais da população permaneceram e a população mais pobre, habitante das periferias da cidade, não foi atendida em sua totalidade pelos empreendimentos e melhoramentos que ocorriam no restante da cidade. O eixo monumental, em fins do século XIX, começava a delinear a região central da cidade (Figura 2). A estação da Estrada de Ferro do Rio Claro, inaugurada em 1887, ficava na parte mais alta da cidade e seu portão principal desembocava exatamente à antiga Rua Direita (atual Edgard Ferraz). Esta importante rua era, então, uma das primeiras paisagens captadas pelos viajantes que vinham de trem à cidade. A rua, uma longa e reta descida, era (e ainda é, em parte) emoldurada por casarões da elite cafeeira à direita, e grandes edifícios e espaços públicos à esquerda, nas quadras delimitadas pelo paralelismo entre a Rua Direita e Rua da Palma (atual Major Prado). Um pouco abaixo da estação, seguindo-se o eixo, foi construído, em 1891, o antigo Paço Municipal, um edifício eclético de dois pavimentos projetado pelo engenheiro arquiteto Euclides da Cunha, o famoso autor de “Os Sertões” (Figura 3). A edificação fazia parte dos projetos de melhoramentos urbanos, visando renovar a imagem da administração pública municipal. Em frente ao Paço Municipal, um pouco abaixo devido à declividade do terreno, o platô onde se soergue a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Patrocínio. Em 1895 a nova e definitiva edificação, de grandes dimensões, começava a ser construída, efetivando o eixo também como espaço simbólico. Em 1901 a Igreja foi inaugurada e dois importantes artistas, ambos imigrantes italianos, trabalharam nas pinturas e na decoração de seu interior, são eles: Carlo de Servi e Oreste Sercelli. Mais abaixo, em frente à Matriz, um dos primeiros espaços públicos realizados na cidade, a Praça da Independência (atual Siqueira Campos), inaugurada em 1895. No entanto, foi em 1910 que a Praça passou por importante reforma para se adequar aos ideais vigentes de higiene e civilização, uma vez que, até então, o espaço tinha um caráter eminentemente rural, com cercado de madeira e densa vegetação.
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Figura 2 A Comarca de Jahu em 1888, um ano antes de tornar-se cidade. As duas ruas paralelas que se vê são conformadoras do eixo monumental. À esquerda a Rua Direita e, à direita a Rua da Palma. Entre as duas ruas podese ver o antigo edifício da Igreja Matriz, demolido em fins do século XIX para construção da sua forma definitiva. Ainda é possível notar casas com longos beirais, algumas possivelmente feitas em taipa. Em primeiro plano o pouso de um vaqueiro, demonstrando a forte ligação e a proximidade do meio urbano com o rural, fato que irá mudar com o desenvolvimento econômico e material da cidade nas décadas seguintes. Fonte: Livro “Jahu. Retratos de uma Época. 1900 - 1929”.
Figura 3 Em primeiro plano, o edifício do Paço Municipal e sua aparência classicizante, com austera ornamentação e tipologia que nos remete às antigas Casa de Câmara e Cadeia de dois pavimentos. Ao fundo, à esquerda, a Estação Ferroviária e sua fachada principal alinhada à Rua Direita. Foto tirada da torre da Igreja Matriz. Fonte: acervo do DPH de Jahu.
O último espaço constituinte do eixo, o mais distante em relação às edificações e espaços já comentados, é a Praça da República. Anteriormente denominado Largo do Teatro, era apenas um grande descampado, na planície próxima ao Rio Jahu. A Praça foi então projetada e construída a partir de 1910, com projeto do Engenheiro José Ribeiro da Silva. O espaço delimita o crescimento da área urbana e a
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movimentação da elite em direção ao fundo do vale, que até então edificava suas residências apenas na parte mais alta, próximo ao Paço Municipal e a Igreja Matriz. Além disso, no conjunto de edificações contidas no eixo há paradigmas das principais correntes do ecletismo definidas por Luciano Patetta(In: FABRIS, 1987, p. 14). A Igreja Matriz, em estilo Neo-Gótico, é exemplo claro de historicismo tipológico, enquanto muitas residências ao redor do eixo abusam dos pastiches compositivos, utilizando as formas do passado de forma despoliciada. A Rua da Palma (atual Major Prado), por sua vez, delimita as quadras do eixo devido ao seu paralelismo com a Rua Direita. A rua também apresenta casarões da elite cafeeira em todo o entorno dos grandes edifícios e espaços públicos. Nas ruas transversais ao eixo desenvolveu-se o comércio e os serviços, que também buscavam alinhar-se ao que havia de mais moderno. Grandes vitrines foram construídas nas fachadas e lojas filiais às encontradas nas capitais foram trazidas à cidade (Figura 4), demonstrando não só a busca pela modernidade, mas, também, o crescimento econômico e a crescente importância da cidade em meio às cidades exportadoras de café do estado. Bancos, hotéis, confeitarias e toda a sorte de serviços foram introduzidos na cidade, que até a década 1870 vivia apenas em torno da capela da Igreja Matriz. Era necessário, portanto, adequar e providenciar edificações para abrigar os viajantes e os novos hábitos da população que ia se aburguesando.
Figura 4 Casa Alemã (aberta em 1912), filial da grande loja de departamentos fundada por imigrantes alemães na cidade de São Paulo no final do século XIX . Localizada à Rua Visconde do Rio Branco. Fonte: Livro “Jahu. Retratos de uma época. 1900-1929”.
Sendo assim, já na segunda década do século XX, o eixo e seu entorno apresentavam uma conformação marcante e uniforme. Na região central foram construídas residências em estilo eclético e tipologias diversas. As fotos da época mostram edificações com a fachada no alinhamento da calçada, porões elevados, entradas e jardins na lateral, chalés e algumas residências isoladas no lote (Figura 5). E os Livros de Projeto da Prefeitura Municipal contém registros da concepção e do fazer arquitetônico (Figuras 6 a 8). Lá estão expostos os ornatos das fachadas, as tipologias, os novos programas e a disposição interna de muitas dessas edificações, evidencias do cumprimento dos artigos relativos à simetria e gabarito dispostos nos Códigos de Posturas do município e, também, evidencia da grande
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participação do imigrante na construção da nova cidade, como se pode ver na assinatura com nomes e sobrenomes estrangeiros (principalmente italianos) nos desenhos. Em assim sendo, a produção arquitetônica e urbana ocorrida na região central de Jahu, durante o período da economia cafeeira, deixou marcas que podem ser vistas ainda hoje. O ideal de modernização e os modelos do exterior, então apropriados e propagados pela aristocracia juntamente com o trabalho de construtores (muitos imigrantes) na edificação e concepção dos novos espaços, fazem parte da paisagem cultural que podemos apreender em visita à cidade. A Igreja Matriz, a Praça da República, as ruas alinhadas paralelas e perpendiculares e um grande número de exemplares do casario no entorno permanecem e devem ser preservados (e utilizados). A cidade apresenta potencial turístico se mantiver este conjunto em bom estado de conservação. Para isso deve-se aliar a educação sobre a história a ações afirmativas de restauro e manutenção a uma legislação inteligente, que contemple os possíveis novos usos deste patrimônio e o proteja dos ataques (frequentes) da especulação imobiliária. Figura 5 Vista do eixo monumental e seu entorno. Em primeiro plano a Praça da Independência após a reforma de 1910, projetada pelo Engenheiro José Ribeiro da Silva. Pode-se ver, no centro da praça, um pouco à esquerda, o coreto e, ao redor, bancos e árvores, podadas em topiária, em arranjos simétricos, europeus. Fonte: Livro “Jahu. Retratos de uma época. 1900 - 1929”
Figura 6 Projeto do Hotel Paulista, de propriedade de Tereza de Assis Bueno, à Rua Edgard Ferraz (antiga Rua Direita). Desenho com a assinatura de Domingo Terreri e Irmão. Sem data. O desenho evidencia a necessidade de novas edificações para os também novos hábitos da população. Eram necessários hotéis que pudessem abrigar os viajantes (muitos deles imigrantes) que passavam pela cidade em busca de oportunidades e negócios. Fonte: Livros de Projeto da Prefeitura Municipal, acervo do Museu Municipal de Jahu.
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Figura 7 Projeto de edifício à Rua Edgard Ferraz (antiga Rua Direita) no lote vizinho e de mesma propriedade da figura anterior, sendo uma provável ampliação das dependências do hotel. Nota-se o porão elevado, sob toda a edificação, recurso ligado às questões de salubridade e higiene então desejadas e inseridas no discurso da modernização. Também servia de recurso para elevar a altura das janelas e resguardar os cômodos dos olhares externos. Desenho com a assinatura do Construtor Augusto Franzolin. Sem data. Fonte: Livros de Projeto da Prefeitura Municipal, acervo do Museu Municipal de Jahu.
Figura 8 Projeto de residência à Rua Edgard Ferraz (antiga Rua Direita). Propriedade do Sr. Elias Ferraz Prado. Desenho com a assinatura do Desenhista Construtor Beppino Terreri. Sem data. O conjunto de residências é um exemplo típico de edificação no alinhamento da calçada com entrada lateral e porões elevados. A ornamentação e as aberturas simétricas são características ecléticas reforçadas pelo repertório dos construtores imigrantes e pelas normas municipais severas em relação às fachadas. A platibanda que esconde o telhado, também presente nos outros desenhos expostos, é uma característica da arquitetura do período, que passou a utilizar calhas e tijolos e pôde, então, suprimir os antigos beirais que resguardavam a taipa das fortes chuvas. Fonte: Livros de Projeto da Prefeitura Municipal, acervo do Museu Municipal de Jahu.
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3. REFERÊNCIAS
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