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AGITAÇÃO MARGINAL
Sem o glamour do centro histórico e com uma enorme concentração de centros culturais, os arredores do Minhocão reivindicam sua independência
HACKEAR O CENTRO? São Paulo está se fechando: há cada vez mais leis restringindo as possibilidades – e, principalmente, os horários – de uso de seus espaços urbanos. Convencidos de que nós, cidadãos, podemos propor as melhores formas de utilizar as ruas, os produtores culturais por trás do ‘Baixo Centro’ acreditam que a cidade precisa ser reaberta, ‘hackeada’. E essa pegada tecnológica tem relação com a origem do grupo, articulado em torno da Casa da Cultura Digital (CCD), um espaço de trabalho em que vários empreendimentos – como o coletivo Garapa, a Esfera (do Ônibus Hacker), e a Agência Pública (veículo que publica o Wikileaks no Brasil) – dividem quatro casas de uma vila operária do início do séc. 20 na Barra Funda. Mas o CCD não é o comando do ‘Baixo Centro’. É apenas seu lugar de nascimento – e uma influência.
Andressa Vianna e Lucas Pretti, dois dos vários idealizadores do ‘Baixo Centro’
Isso se soma a uma outra influência, mais antiga: a contracultura. Quando amadureciam a ideia do ‘Baixo Centro’, vários de seus organizadores estavam lendo um livro sobre o grupo holandês Provos (saiba mais no box da pág. 12). O resultado prático é um projeto para levar ao entorno do Elevado Costa e Silva 10 eventos, em um festival a ser realizado em março do ano que vem. E, seguindo a lógica da internet de unir em rede vários pontos dispersos, criar uma plataforma online para conectar os espaços culturais da região (confira o mapa na pág. 14). Mas a realização do festival ainda não está garantida. Enquanto buscam os recursos para viabilizá-lo, os criadores aceitam trabalho voluntário, doações e sugestões. A nossa? Nada de desobediência civil. Vamos ocupar as ruas, mas com a prefeitura do nosso lado.
DANÇARINOS DE RUA
FESTIVAL DOS FESTIVAIS
O mote dos idealizadores do ‘Baixo Centro’ é que ‘as ruas são para dançar’. O lema foi emprestado do movimento Provos, criado na Holanda em 1965, no despertar da contracultura, e depois materializado em forma de revista. Contrário ao tráfego de veículos motorizados em Amsterdã, o grupo distribuiu pela cidade 50 bicicletas, pintadas de branco, para uso público. A ação se tornou símbolo do movimento e inspirou o uso de cores na expressão de ideais da contracultura ao redor do mundo – como o verde dos hippies de São Francisco. A história do Provos virou livro, publicado no Brasil pela Conrad (R$ 31).
Conheça alguns dos eventos sugeridos pelos organizadores. E não seja tímido, apresente as suas (mais na pág. 17) 1) Apresentação de peças de teatro em uma tarde de domingo no Elevado Costa e Silva. 2) Passeio de coletivos de bike, organizado pelo movimento Bicicletada (http://bicicletada.org). 3) Roda de samba e choro em meio a um piquenique no Largo do Arouche, em uma tarde de sábado. 4) Uma exposição de fotos nas vigas do Elevado, do projeto ‘Que ima-
gem você levaria para Marte?’, que tem curadoria da jornalista Gabriela Allegro. 5) Passeio pela região para visitar os locais com arte de rua já mapeadas pelo projeto Arte Fora do Museu (http://arteforadomuseu.com.br). 6) Cortejo do grupo Ilú Obá de Min,que promove avalorização deculturas de matriz africana e afro-brasileira, com música e dança. 7) Construção do Carrinho Multimídia, com internet sem fio, som, luz, e equipamento de projeção, para funcionar como sede itinerante do movimento.
CADÊ ‘BAIXO CENTRO’?
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Nada de esperar até março para incluir o ‘Baixo Centro’ na sua programação. Conheça um dos 25 coletivos culturais que já existem por lá
#OCCUPY MINHOCÃO
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1 – Ilú Oba de Mim Al. Eduardo Prado, 342, Santa Cecília 2 – Cia. São Jorge de Variedades - Casa de São Jorge R. Lopes de Oliveira, 342, Barra Funda 3 – Casa da Cultura Digital R. Vitorino Carmilo, 459, Barra Funda 4 – Galeria Baró / Emma Thomas R. Barra Funda, 216, Santa Cecília 5 – Theatro São Pedro R. Barra Funda, 171, Santa Cecília 6 – Teatro Escola Macunaíma R. Adolfo Gordo, 238, Santa Cecília 7 – Funarte Al. Nothmann, 1.058, Campos Elísios 8 – Instituto Pensarte Al. Nothmann, 1.029, Santa Cecília 9 – Folias da Arte R. Ana Cintra, 213, Santa Cecília 10 – Filhos da Santa Largo Santa Cecília, Santa Cecília 11 – Galeria Pilar R. Barão de Tatuí, 389, Santa Cecília 12 – Centro Cultural da Espanha R. Dr. Martinico Prado, 474, Consolação 13 – ONG Ação Educativa R. Gen. Jardim, 660, Consolação 14 – Teatro Paiol R. Amaral Gurgel, 164, Consolação 15 – Aliança Francesa R. General Jardim, 182, República 16 – Instituto Polis R. Araújo, 124, República 17 – Escola da Cidade R. General Jardim, 65 - República 18 – SESC Consolação R. Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque 19 – TUSP – Teatro da USP R. Maria Antônia, 294, Consolação 20 – Matilha Cultural R. Rêgo Freitas, 542, República 21 – Galeria da Rua R. Rêgo Freitas, 454, República 22 – Cia do Feijão R. Dr. Teodoro Baíma, 68, República 23 – Teatro de Arena Eugênio Kusnet R. Dr Teodoro Baima, 94, República 24 – Centro Cultural Consolação R. da Consolação, 1.897, Consolação 25 – Academia Internacional de Cinema R. Doutor Gabriel dos Santos, 142, Higienópolis
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Inaugurado em 1970, o Minhocão alterou a dinâmica dos bairros do entorno. Hoje, em meio à decadência, oferece também uma possibilidade de integração social
ARQUIVO AE
‘ELEVADO 3,5’/DIVULGAÇÃO
VEM DANÇAR
Pretérito perfeito
Presente complexo
O Teatro Paiol – um dos pontos de partida para a articulação que acabou virando o ‘Baixo Centro’ – foi aberto em novembro de 1969 pelo atores Perry Salles e Miriam Mehler (foto, em cena em 69). Na época, o Elevado ainda não fora construído e a região de Vila Buarque e Santa Cecília era mais segura e frequentada por um público em busca de cultura. “O centro era ótimo naquela época. Era uma região de teatros”, afirma Miriam, que hoje tem 76 anos e ainda trabalha como atriz. Na década de 80, o comando do teatro passou para Paulo Goulart, mas o espaço não resistiu à degradação dos arredores, causada em grande parte pela construção do Minhocão. Fechou no começo dos anos 1990, virou cinema pornô e hoje está à venda. Um grupo de produtores culturais, muitos deles envolvidos no ‘Baixo Centro’, quer reformar e reabrir o Paiol, com uma administração coletiva. Miriam diz que acha “fantástica” a iniciativa. “Eles são jovens, e corajosos”, afirma. Com o trabalho, o Paiol pode voltar a ser um centro de cultura da região, como foi há 40 anos.
A antropóloga e cineasta Maíra Buhler lançou em 2007 o documentário Elevado 3,5 (foto). Codirigido por Maíra, João Sodré e Paulo Pastorelo, a produção apresenta a história do Minhocão e o cotidiano de alguns dos cidadãos que moram na vizinhança dos 3,5 km da construção. A ideia da produção veio durante a época de faculdade, quando ela e seus colegas de direção tinham um laboratório de fotografia na região e perceberam o potencial cinematográfico do local. Na opinião de Maíra, o Minhocão é uma cicatriz no meio da cidade: “Como obra é uma tragédia, mas sua construção desvalorizou os arredores e permitiu que pessoas que não teriam como habitar o Centro mudassem para lá”. Defensora da integração social consequente da inauguração do Elevado Presidente Costa e Silva em 1970, ela ressalta a necessidade da melhoria da qualidade de vida dos habitantes do entorno. “É preciso cuidar da área, desde que isso não seja sinônimo de exclusão de moradores ‘desagradáveis’ para o Estado e sim fruto de um diálogo democrático”, diz Maíra.
As ruas são suas. E o festival ‘Baixo Centro’ também. Sugestões de eventos, braços para colar cartazes e doações (em dinheiro ou espécie) só dependem de você
começo do ano. Como o americano Para os organizadores do ‘Baixo CenKickstarter, o site mais conhecido do tro’, o festival (e o próprio movimengênero, o Catarse permite finanto) só faz sentido se você quiser ciar projetos bacanas com a que ele aconteça – e fizer ajuda do próprio público-alalgo para torná-lo viável. O festival ‘Baixo vo. Cada ideia tem 90 dias Natural, portanto, que Centro’ só sai do para se viabilizar. Se em vez de sair atrás de papel se o público quiser - e topar 100% do valor pedido não patrocínio junto a empreajudar a financiar for captado, os doadores sas ou de uma verba ofirecebem seu dinheiro de cial, eles tenham optado volta. O Baixo Centro tem até pelo financiamento colabora18/1 para levantar R$ 54.747. Abra a tivo. A ferramenta escolhida foi o mão, vai: bit.ly/bcentro. Catarse, site brasileiro criado no
R$ 56 mil é o valor pedido no Catarse para fazer o festival ‘Baixo Centro’. O orçamento total é de R$ 96.280 e está detalhado no site, para facilitar doações em espécie. Se um projetor for emprestado, o valor do aluguel é cortado do valor total.
R$ 10 é o valor mínimo para participar do financiamento. Mas há recompensas para quem doar mais: R$ 20 garante ao doador foto no site e no carrinho multimídia; R$ 50 dá direito a mais uma camiseta e ao livro ‘CulturaDigital.BR’.
R$ 15 mil é o valor indicado para empresas, que prevê como contrapartida uma página exclusiva de patrocínio no site, 50 camisetas e uma performance do carrinho multimídia. Para garantir a pulverização das doações, apenas duas cotas neste valor estão disponíveis.
Faça+ Dinheiro não é a única forma de contribuição. Você pode doar materiais e até trabalhar. Entre em contato no Facebook (on.fb.me/baixo_ centro) ou no grupo de emails (bit.ly/ grupo_centro).
Saiba+ Quer saber mais sobre o ‘Baixo Centro’? Assista aos dois vídeos já divulgados pelos organizadores do evento: um teaser do festival (bit.ly/baixo_video ) e ‘as ruas são para dançar’ (bit.ly/ ruas_centro).
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MUDANÇAS NO CAMINHO