Memorial Aimorés

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M E M O R I A L A I M O R É S LAUP VII


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“ lugares de memória, ou seja, espaços que brotam para bloquear a ação do esquecimento, fixando um conceito, imortalizando o que pereceu, corporificando o imaterial. ” Pierre Nora 2


L I N H A

C R O N O L Ó G I C A

1 8 7 5

1 962 1 9 35

1 995 HISTÓRICO

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A doença de Hansen identificada 1875 pelo cientista que dá nome a doença, já é relatada há séculos com diversos nomes. Entretanto, no Brasil a disseminação das informações sobre o tratamento ou o interesse pela mudança de métodos se dá muito tardiamente, nesse contexto, no ano de 1935 é criado o Instituto Lauro de Souza Lima, como a colônia Aimorés colocada como cartão de visitas do modelo de internação norte-americano chamado Carville, baseado no controle profilático e no isolamento compulsório dos diagnosticados com hanseníase. O modelo empregado então para com os diagnosticados é marcado pela maneira traumática com que se dava, ainda que com um espaço muito bem equipado e possuidor de uma beleza singular, o internato carrega o estigma de um local sofrido e marcado pela segregação.


LOCALIZAÇÃO EM BAURU

20 17

“Tinha-se de tudo aqui, Mas não tinha liberdade. Isso aqui era como uma gaiola de ouro a gente tem saudade pela beleza mas sente tristeza porque ficava asilado, não podia sair nunca” -Nivaldo Mercúrio Ainda que lentamente, os avanços médicos e humanistas possibilitaram que em 1962 a internação compulsória deixasse de ser regra, para que 33 anos depois a luta contra a hanseníase se tornasse gratuita. Hoje a doença foi erradicada na maioria do mundo, evidenciando, presente ainda em locais com baixo índice de desenvolvimento humano, demonstrando a relação entre fatores sociais e a prevalência da enfermidade

RECORTE: INSTITUTO LAURO DE SOUZA LIMA E VILA AIMORÉS

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1 KM

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I M P L A N T A Ç Ã O Propostas de Intervenção

saídas de emergência banheiros

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200m

Por conta da tipologia encontrada ao longo de todo complexo Aimorés, optou-se por não interferir de maneira impositiva na linguagem existente trabalhando dialogicamente, por isso, grande parte do caminho foi cavado de modo que não se sobrepusesse , nem as construções nem a paisagem. O programa previsto conta com incentivo ao desenvolvimento do comércio local, alimentado pela movimentação turíWWstica atraída pelo memorial e pelo parque ecológico nas proximidades.


C O N C E P Ç Ã O Diretrizes Projetuais CAMINHO DE VOLTA

SETOR I PARTE

SETOR II PARTE

SETOR III III PARTE

Considerando a história da hanseníase, especificamente no interior paulista surge a ideia de criar a memória da área onde situa-se o Instituto Lauro de Souza Lima. O memorial alinha-se com o ideal do projeto, enquanto conceito, quando coloca-se como bloqueio à ação do esquecimento, e mais que isso, materializa fragmentos dos sentimentos, das sensações e vivências dos internos, como uma máquina de metáforas. O projeto baseia-se num que caminho que entende e recria três

supostos momentos de pessoas em embate com sua condição enferma. Espera-se que as formas, texturas, luzes e sombras sejam lidas menos com os olhos, e com consequente a ativação dos outros sentidos haja a conexão sinestésica com as memórias contidas no espaço, a partir dos setores onde respectivamente são colocadas a confusão; gerada pela descoberta da doença, a necessidade de separação dos seus e da vida cotidiana e por fim a libertação através da descoberta da cura, ou como para muitos; a morte.

VISÃO GERAL DA INTERVENÇÃO

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C O N F U S Ã O Setor I A primeira etapa do percurso foi concebida com a ideia de refletir a doença e a história de todas as pessoas que viveram naquele local, sendo isoladas da sociedade para viver em um ambiente completamente novo e desconhecido, precisando assim seguir novos caminhos em suas vidas, isso se mostra no projeto pelos percursos que se dividem, podendo conduzir as pessoas por ambientes que causam sensações distintas, como alívio em passagens mais abertas ou angústia em caminhos que se estreitam e se afundam na topografia, além dos jogos de luz e sombra que criam novas experiências na percepção do espaço.

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A materialidade utilizada no projeto busca refletir o processo da doença na pele ao longo do tempo, dando uma ideia do material se transformando e se tornando ruína. Os materiais “permitem que nossa vista penetre em suas superfícies e nos capacitam para que nos convençamos da veracidade da matéria. Os materiais naturais expressam sua idade e história (...) Toda matéria existe num continuum do tempo; a pátina do desgaste adiciona a enriquecedora experiência do tempo aos materiais de construção.” (PALLASMAA) Assim, os caminhos buscam essas sensações temporais associadas aos processos de transformação da vida.


S E P A R A Ç Ã O Setor II Na segunda etapa, logo de início, dois caminhos que não se encontram são apresentados. A dualidade criada no percurso materializa a ruptura dos futuros internos com o universo em que viviam. Ao se adentrar no espaço, o fio d’agua direciona à separação: um deles leva a saída e o outro a enfrentar os processos da doença. Neste último, são encontrados totens que remetem a memória dos ex-internos e que possuem em sua configuração sinos acoplados, sendo estes, elementos que Idade Média sinalizavam a chegada dos enfermos. Após a experiência sonora o próximo passo é se adentrar no túnel onde o indivíduo enfrentará um

processo árduo. Uma vez que este setor representa a transição entre o último contato do enfermo com o externo e o caminho que irá percorrer sozinho para no fim chegar a morte, a água, elemento de ligação entre o plano material e astral, passa a estar presente no trajeto.

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L I B E R T A Ç Ã O Setor III A intenção projetual e sensitiva da ultima parte do trajeto remete a cura ou a morte, no sentido do repouso e fim do sofrimento teoricamente até ali vivenciado. A clareira final, com sua vegetação esparsa e um caminho simples que passa por um espelho d’agua após um túnel, foi inspirada em uma parte do livro “O Deserto dos Tártaros” de Dino Buzzati: “E, subtamente, os antigos terrores caíram por terra, os pesadelos afrouxaram-se, a morte perdeu seu vulto enregelante, transformando-se em coisa simples e de acordo com a natureza. O major Giovanni Drogo, consumido pela doença e pelos anos, pobre

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homem, forçou o imenso portal negro e deu-se conta de que os batentes caíam, abrindo espaço para luz” . A abrupta transição entre claro e escuro, estreito e largo tem como intenção principal transmitir a sensação de alívio. Depois do alívio o próximo sentimento que busca-se despertar é a tranquilidade, assim a clareira é um espaço voltado para contemplação e descanso. No fim do caminho, encontram-se as ruínas do antigo cemitério da vila Aimorés.


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