Aplicação de fluidos alternativos de refrigeração comercial

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Aplicação de Fluidos Alternativos em Sistemas de Refrigeração Comercial Por Julian Massayoshi Ubukata

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or determinação do Protocolo de Montreal, a produção e o consumo de CFCs foi extinto em 2010 e os HCFCs vem sendo amplamente reduzidas ano a ano, a partir de cotas pré-definidas e diferenciadas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. A mudança de processos industriais foi fundamental para que esses objetivos fossem alcançados. Para tanto, CFCs foram substituídos na fabricação de vários equipamentos por fluídos alternativos, como Hidroclorofluorcarbonos HCFCs e Hidrofluorcarbonos HFCs, no entanto os CFCs remanescentes e essas substâncias alternativas ameaçam a saúde climática do planeta. Conforme o Protocolo de Montreal, países desenvolvidos devem reduzir o uso de HCFCs em 75% até 2010 e em 99,5% até 2020. Mas a produção global desses gases é crescente nos países em desenvolvimento, porém sua produção foi congelada em 2013. A eliminação dos HCFCs em países em desenvolvimento está prevista para 2040. Nos anos 90, a indústria passou a produzir, comercializar e usar HCFCs, considerados totalmente seguros para a camada ozônio, no entanto, foram incluídos entre as substâncias controladas pelo Protocolo de Quioto, já que contribuem para o aquecimento global, tais exigências atingem o setor de refrigeração industrial e comercial, uma vez que reduz significativamente a disponibilidade do R22 no mercado. Desde então, a indústria de refri-

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geração tem procurado substitutos para os refrigerantes CFCs, HFC e HCFCs. A utilização de refrigerantes naturais como o CO2, hidrocarbonetos e amônia vem ganhando importância no mercado brasileiro, equipamentos desenvolvidos para a substituição dos CFCs, HFC e HCFCs já fazem parte da realidade de algumas instalações no Brasil, em especial as voltadas à refrigeração comercial. Essa tecnologia está alinhada a tendência mundial na busca pela sustentabilidade e estão direcionando vários segmentos industriais e comerciais como o de supermercados a ir em buscas das soluções “verdes” com a utilização de refrigerantes ecológicos como o Dióxido de Carbono – CO2 e soluções alternativas com a de fluído secundário para determinadas aplicações. 1. Aplicação do CO2 como Fluido Refrigerante O CO2 (dióxido de carbono – R-744) foi um dos primeiros fluidos refrigerantes aplicados para sistemas de refrigeração e foi amplamente utilizado até os meados da década de 30 do século XX. Com o surgimento dos fluidos CFCs e HCFCs, o CO2 foi perdendo mercado até ser praticamente extinto no início dos anos 60. Com os problemas ambientais e o estabelecimento dos Protocolos de Montreal e de Kyoto, o CO2 ressurge como uma alternativa promissora a ser utilizada em muitas aplicações, nos vários setores de refrigeração. No início dos anos 90, os livros antigos sobre tecnologia de refrigeração, com várias aplicações utilizando CO2, foram reabertos. Com o desenvolvimento tecnológico dos últimos anos, novos conceitos surgiram propiciando assim o renascimento do CO2 como fluido refrigerante natural. Um dos principais responsáveis pelo “reavivamento” do CO2 foi o Prof. Gustav Lorentzen (1915-1995) do Instituto de Tecnologia da Noruega (NTH), em Trondheim, que propôs e desenvolveu com sua equipe várias aplicações e sistemas utilizando CO2 como fluido refrigerante. Já no


final dos anos 90, surgem nos mais variados setores da refrigeração, várias aplicações comerciais utilizando CO2 como fluido refrigerante, seja em sistemas com ciclos sub-críticos, para baixas temperaturas (abaixo de -30 ºC e até -55 ºC), em cascata com outro fluido refrigerante, seja em sistemas com ciclos transcriticos para médias temperaturas (acima de -15 ºC), sistemas de ar condicionado (principalmente no setor automotivo) e bombas de calor. Vejamos de uma forma simplificada a visão histórica da aplicação do R744 na refrigeração: ÂÂ 1850 – Proposta de usar o CO2 como refrigerante (Alexander Twinning, Patente Britânica). ÂÂ 1869 – Primeira máquina de fabricar gelo nos USA (Thaddeus Lowe). ÂÂ 1882 – Aplicação do CO2 em sistemas de refrigeração na Europa (Carl Linde, W. Raydt). ÂÂ 1886 – Patente compressor CO2 por Franz Windhausen. ÂÂ 1890 – Produção compressor CO2 de Hall, favorito para aplicação naval. ÂÂ 1897 – Primeiros refrigeradores CO2 produzidos pela Sabroe. ÂÂ 1910 – Primeiros refrigeradores domésticos com CO2 (Sabroe). ÂÂ 1920 – 1930 Pico na utilização do CO2 como refrigerante em sistemas de refrigeração. ÂÂ 1930 – Substituição do CO2 pela Amônia (NH3) e R12 (considerado um gás seguro na época). ÂÂ 1993 – Reinvenção da tecnologia de CO2 (Gustav Lorentzen) 2.1 Características do CO2 Em comparação com outros sistemas convencionais utilizados nessas aplicações, a elevada capacidade volumétrica de refrigeração do CO2 permite uma redução significativa do custo dos compressores, da tubulação e da carga de refrigerante do sistema frigorífico. Mesmo sendo aplicado em maiores solicitações de carga térmica, o potencial do CO2 resulta na utilização de compressores de tamanhos normalmente encontrados em aplicações comerciais e industriais de pequeno, médio e grande porte. Por outro lado, sua elevada pressão de trabalho e mesmo quando o equipamento está parado, exigirá que o projeto da instalação e das medidas de segurança sejam feitos com critério especial. Este trabalho trata das propriedades termodinâmicas do CO2, seu uso como refrigerante, dos componentes frigoríficos disponíveis atualmente e em particular, com maior atenção, das aplicações dos compressores semi-herméticos utilizados na condição subcrítica com CO2 no setor de refrigeração comercial para supermercados. Alguns desses pontos podem serem apontados abaixo:

Vantagens do CO2: ♦♦ Maior economia energia. ♦♦ Fluido ecológico, não destrói a Camada de Ozônio e possui um potencial de aquecimento global desprezível (GWP=1). ♦♦ Fonte disponível na natureza (CO2). ♦♦ Custo de bombeamento muito baixo com CO2 em MT. ♦♦ Melhor COP com DX em LT. ♦♦ Tolerante às altas temperaturas ambiente / condensação. ♦♦ Redução dos diâmetros da tubulação com CO2. ♦♦ Redução da carga de refrigerante com CO2. ♦♦ Baixo custo do refrigerante CO2. ♦♦ Elevada entalpia de evaporação CO2. ♦♦ Menor temperatura de descarga (estágio de alta e baixa pressão). ♦♦ Baixa relação de compressão & aumento vida útil dos compressores com CO2. ♦♦ Alto grau de líquido sub-resfriado com CO2. ♦♦ Maior rendimento frigorífico de todo o sistema. ♦♦ Menor volume deslocado com tamanho menores dos compressores de CO2. ♦♦ Rack e instalação mais compacta com menor número compressores. ♦♦ Evaporadores mais compactos e eficientes. Desvantagens do CO2 ♦♦ Necessário compressores com maiores deslocamento volumétrico com R134 a no estágio de alta (condensação); ♦♦ Necessário maiores diâmetros de tubulação (linhas de sucção) com R134a, porém será somente no estágio alta (condensação) onde o trecho tubulação é menor; ♦♦ Necessário um nível técnico mais elevado para realização do serviço de instalação, manutenção e operação do sistema; ♦♦ Perda potencial da eficiência dos sistemas MT e LT em caso de uma elevação na temperatura do estágio de alta; ♦♦ Aumento da pressão CO2 em caso da parada total da instalação, podendo provocar a perda do refrigerante; ♦♦ Necessário utilizar controles extra de segurança (válvulas segurança, sensores CO2, entre outros. 2. Aplicação de Fluído Secundário Algumas soluções adotadas para solução deste problema é empregar um sistema de refrigeração por expansão-indireta, utilizando fluidos secundários, de forma que o sistema primário de refrigeração irá promover apenas o resfriamento do fluido secundário e este será o fluido refrigerante que irá promover a refrigeração final. Os fluidos secundários são fluidos térmicos que apresentam certas características desejáveis: alto calor espe-


Artigo cífico, boa condutividade térmica, não tóxico, baixos impactos ambientais, ser inerte quimicamente, disponível a preços razoáveis. A água possui essas propriedades, caracterizando-se como um ótimo fluido secundário. Entretanto, a água congela a 0 °C e a grande maioria dos processos industriais trabalham com temperaturas bem abaixo do ponto de fusão da água. Por esse motivo, adiciona-se um agente anti congelante que é misturado a água, formando uma solução capaz de solidificar a temperaturas inferiores a da água pura. Os anti congelantes são compostos totalmente miscíveis em água. Os tipos mais comuns são as salmouras (sais de cloreto de cálcio, cloreto de sódio, cloreto de magnésio, carbonato de potássio) e os alcoóis (metanol, etanol, etilenoglicol, propilenoglicol, glicerol). Atualmente, os alcoóis estão tendo forte presença como soluto para fluidos secundários a base de água por alguns terem baixa atividade corrosiva ou nenhuma corrosividade. As salmouras perderam o seu espaço devido ao seu forte poder de ionização, gerando processos eletrolíticos de corrosão. As soluções de água e anti congelante exibem diversas características físico-químicas, além de propriedades termofísicas (ponto de fusão, massa específica, calor específico, condutividade térmica, viscosidade, fator de eficiência de transferência de calor) distintas da água pura. O grau de variação dessas propriedades é proporcional à adição de soluto na água: quanto maior a quantidade, maior a alteração. Supõe-se inicialmente que quanto maior a concentração do anti congelante, menor o ponto de fusão da solução, onde o seu uso principal é para alterar esta propriedade.

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3.1 Características do Fluído Secundário O glicerol merece destaque como um anti congelante se tratando da condutividade térmica e massa específica, além de não ser tóxico e com alta disponibilidade no mercado, entretanto, possui uma inércia térmica baixa e com pequenas reduções no ponto de fusão. O etilenoglicol é um fluído que apresenta propriedades intermediárias mais adequadas como aditivo em fluidos secundários, justificando o seu grande uso comercial e industrial, apesar de ser tóxico. O propilenoglicol tem características termofísicas próximas ao do etilenoglicol, porém menores, exceção ao seu alto calor específico. Pode ser uma alternativa ao etilenoglicol como anticongelante atóxico. Em sistemas de média temperatura, não houve a necessidade de pesquisas para o tipo de fluído intermediário a ser utilizado. Já haviam diversas instalações utilizando solução aquosa de propileno glicol. E como a quantidade de propileno glicol é muito pequena na solução (aproximadamente 20%), as propriedades físicas e termodinâmicas são muito semelhantes às da água. Quanto à corrosão, a solução aquosa de propileno glicol apresenta níveis de corrosão muito baixos quando em contato com cobre ou latão, estes índices permanecem baixos também para aço carbono, porém hoje temos grandes aplicações com tubo PPR (Polipropileno Copolímero Random). Soluções aquosas também são compatíveis com a quase totalidade dos materiais utilizados em instalações normais de refrigeração, tanto nos seus equipamentos, como para vedação de juntas e ligações. A principal precaução é evitar o contato com:


• zinco; • aço galvanizado; • ferro fundido cinzento; • água com excesso de cloro; • água com excesso de sulfatos. Quanto à toxicidade, o propileno glicol grau USP é utilizado principalmente em indústrias alimentícias, cosméticas e farmacêuticas. Ou então na sua versão aquosa é um produto totalmente atóxico (utilizado na composição de ração animal). Atende a todas as especificações da Farmacopéia Brasileira e Americana, também é permitida a sua utilização como aditivo direto ou indireto em alimentos. Quanto à flamabilidade, o propileno glicol em soluções com concentração acima de 80% tem ponto de fulgor de 102 °C. Abaixo desta concentração é um produto não inflamável. Vantagens do propileno glicol A utilização de sistemas de refrigeração indireta (com uso de refrigerante secundário) resulta em vantagens significativas. Um dos primeiros impactos desta escolha é a considerável redução da carga de refrigerante, que pode chegar até 40% da carga de refrigerante, segundo Kazachki e Hinde (2006), ou até 85% da carga do sistema convencional (Palm, 2007), conduzindo à instalação de sistemas de refrigeração muito mais compactos e com um menor potencial de impacto ambiental. Outro ganho gerado desta prática é o confinamento do refrigerante primário à “casa de máquinas” o que simplifica o circuito do refrigerante, obtendo-se um funcionamento (e, conseqüentemente, uma temperatura de resfriamento) mais estável e seguro. Segue alguns pontos significativos: ♦♦ Consumo menor de energia; ♦♦ Ausência de rotina de degelo para sistemas de média temperatura; ♦♦ Ausência de controle de temperatura para balcões e câmaras; ♦♦ Menor quantidade de fluído refrigerante no sistema e muito menor possibilidade de vazamentos; ♦♦ Simplicidade da instalação e em decorrência menores custos de manutenção preventiva ou corretiva; ♦♦ Maior confiabilidade de funcionamento (menos ocorrências de manutenção); ♦♦ Sistema de controle simplificado; ♦♦ Viabilidade na utilização de refrigerantes não condenados pelo “Protocolo de Montreal”; Desvantagens do propileno glicol Ao custo adicional referente à instalação de uma bomba de circulação e de um trocador de calor intermediário soma-se a operação na dificuldade de se compatibilizar as características e limites operacionais dos refrigerantes

secundários com as necessidades da instalação. Fluidos convencionais como água, propileno glicol e óleo, amplamente utilizados em diferentes ramos da indústria como fluidos secundários, apresentam deficiências entre as quais encontram-se a elevada temperatura de congelamento, no caso da água, e a baixa condutividade térmica e elevada viscosidade, no caso dos óleos e do etileno glicol. Alguns pontos são abordados abaixo: ♦♦ Espaço físico maior na central térmica para instalação dos equipamentos; ♦♦ Área de troca térmica maior nas serpentinas resfriadoras de câmaras e balcões em sistemas de média temperatura; ♦♦ Necessário compressores com maiores deslocamento volumétrico; ♦♦ Temp. do propileno glicol limitada a -4 ºC vs. -6 ºC CO2; ♦♦ Maior potência de bombeamento do Propileno Glicol; ♦♦ Maior investimento inicial na tubulação Propileno Glicol; ♦♦ Elevados diâmetros tubulação Propileno Glicol. 3 CONCLUSÃO A atual demanda por sistemas de refrigeração com menor impacto ambiental trouxe um novo foco aos fluídos refrigerantes e secundários para o transporte do frio. Em favor dos fluídos secundários estão a significativa redução da carga necessária de refrigerante sintéticos, com alto GWP, tal medida representa imediato paliativo para o impacto ambiental. Já para aplicação de CO2 como fluído refrigerante, o resultado é a redução da emissão de poluentes a zero, já que o CO2 não destrói a Camada de Ozônio e possui um potencial de aquecimento global cerca de 3,26 mil vezes menos que o R404A. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] www.spm.com.br/site/pt/content/publication/view.asp? id=105 - site na internet, 21/08/2012. [2] www.unep.fr/ozonaction/information/mmcfiles/6266-p-uso_fluidos_naturais.pdf – site na internet, 21/09/2012. [3 MEDEIROS, BARBOSA & FONTES (2010) HOLOS, Ano 26, Vol. 4 74 Propriedades Termofísicas de fluídos secundários à base de álcool para termoacumulação. [4] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE – MMA - Uso de Fluidos Naturais em Sistemas de Refrigeração e Ar Condicionado – Publicação Técnica. 2008.

*Julian Massayoshi Ubukata é graduado em Tecnologia em Manutenção Mecânica Industrial e Analista de Engenharia de Aplicação na empresa Heatcraft do Brasil


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