Parasitas maquiavélicos Na Natureza, também há oportunistas e corruptos, criaturas especializadas em viver à custa dos outros. Alguns chegam mesmo a escravizar subtilmente uma população inteira. Estes são os mais impiedosos.
A Wolbachia, uma bactéria da família da famosa Escherichia coli, que faz parte da flora intestinal vulgar, poderia ser considerada o pior parasita da natureza, pois infeta quase 70 por cento dos invertebrados terrestres: insetos, piolhos da humidade, ácaros, vermes, nematodes… De facto, algumas estimativas sugerem que poderia haver 20 milhões de espécies afetadas. Porém, a Wolbachia é um parasita intracelular que só passa de um hospedeiro para outro por intermédio dos ovos, uma limitação que levou essas bactérias a manipular em seu proveito a biologia reprodutiva das vítimas com maior eficácia do que nós próprios fazemos com os ratos de laboratório, apesar das grandes conquistas humanas em matéria de engenharia genética.
Pequenas armas de manipulação em massa A lista de canalhices que a criatura faz às vítimas é arrepiante. Em muitos casos, assassina os machos, normalmente quando se encontram nas fases larvares, pois são para a bactéria verdadeiras prisões, dado que não se transmite pelo esperma. Deste modo, beneficia as bactérias da sua espécie que estão dentro das fêmeas, que costumam devorar os cadáveres dos irmãos. No caso dos machos de outras espécies, como o isópode terrestre Armadillidium, transforma-os em fêmeas ao inibir nos embriões o desenvolvimento de uma glândula que produz uma hormona masculinizante. Além disso, a Wolbachia também desenvolve a partenogénese nas fêmeas, isto é, a reprodução assexuada, sem necessidade de machos, e dificulta o êxito dos acasalamentos dos hospedeiros que não lhe convêm (os que se produzem entre machos infetados e fêmeas não afetadas): liberta uma toxina no protoplasma do espermatozoide a fim de o matar. Diminuir a procriação de fêmeas não infetadas beneficia as que alojam a bactéria, pois isso reduz a competição que têm de enfrentar para sobreviver. Devido a estas táticas, a percentagem de fêmeas afetadas nas populações de hospedeiros é muito elevada. Comprovou-se, recentemente, que a bactéria esteve prestes a extinguir uma espécie de borboleta, pois a proporção do género era de 99 fêmeas contra um macho. Felizmente, uma mutação que confere resistência ao
parasita, surgida por casualidade, fez com que aquela proporção seja, agora, de seis para quatro. A propagação da mutação foi extremamente rápida, e o caso tornou possível observar um caso de evolução praticamente em direto. (…)
Os vírus podem manipular até os mamíferos Controlar o simples e fraco cérebro de um invertebrado talvez não tenha muito mérito, mas outros parasitas comandam circuitos nervosos completamente, incluindo os cérebros dos mamíferos. Por exemplo, os vírus da raiva conseguem alcançar outros hospedeiros ao combinar duas estratégias: a migração de parte do vírus para a saliva e a invasão em massa do cérebro, onde promovem comportamentos agressivos. Os indivíduos afetados desenvolvem tendência para morder de forma indiscriminada, permitindo aos vírus colonizar um novo organismo, ao passar da saliva para o sangue. Essa faculdade leva os cientistas a estudar o cérebro dos animais raivosos a fim de descobrir os circuitos neuronais da agressão. Por enquanto, já verificaram que o hipocampo, uma zona primitiva do campo que regula as emoções, é o principal alvo do vírus da raiva. Seguramente, o exemplo supremo do controlo mental é aquele exercido pelo protozoário Toxoplasma gondii, que inibe um comportamento muito específico dos hospedeiros. O retorcido parasita faz várias vítimas entre os mamíferos, incluindo o Homem, pelo que pode ser perigoso se atacar um feto, cujo sistema imunitário ainda não está desenvolvido. Todavia, prefere os roedores e apenas se reproduz sexualmente no intestino dos gatos. De facto, essa é uma razão pela qual se aconselha as grávidas a não manterem contactos próximos com os bichanos. (…) A. M. J. C. , “Parasitas maquiavélicos”, in Superinteressante, nº 131, Março de 2009 (texto com supressões)
O princípio do sensacionalismo Cidadão PULITZER Por detrás do prémio que reconhece a excelência jornalística, esconde-se a biografia de Joseph Pulitzer. Profissional ambicioso e incansável, conseguiu que as histórias sobre o homem da rua ocupassem as primeiras páginas e transformou o jornalismo no verdadeiro quarto poder.
Tinha um caráter inquieto e aventureiro, marcado pela procura da perfeição e pela intolerância face à mediocridade. Filho de um comerciante de cereais, de ascendência judaica, e de uma bela dama austro-húngara católica, Joseph Pulitzer nasceu a 10 de abril de 1847, na cidade húngara de Mako. Depois de combater ao lado das forças da União na Guerra da Secessão norte-americana, mudou-se para Saint Louis, no Missouri, onde existia uma vasta comunidade alemã. Trabalhou ali como tratador de mulas, pedreiro, criado e estivador, até que Carl Schurz, um dos editores de um jornal local, o Westliche Post, o contratou como redator. Decidido a aproveitar a oportunidade, Pulitzer demonstrou algumas das aptidões que iriam definir a sua personalidade: trabalhava das dez da manhã às duas da madrugada, escrevia compulsivamente e não hesitava em deslocar-se onde fosse necessário para recolher pessoalmente dados sobre determinado acontecimento. “Sou repórter do Westliche Post. Dê-me os dados”, repetia incansavelmente, segundo as testemunhas. O seu entusiasmo era tal que, em 1878, comprou com as suas poupanças o diário local Saint Louis Dispatch, transformando-o num autêntico flagelo da corrupção. Já o anunciara, no editorial publicado no primeiro dia como diretor, ao assegurar que o jornal “não servirá um partido, mas o povo; não será um órgão do republicanismo, mas da verdade; não apoiará a Administração, mas irá criticá-la”. As palavras devem ser inseridas numa época em que os jornais, mais do que dar notícias, serviam de porta-vozes para um partido ou um político em concreto. Pulitzer inverteu a situação. E não foi a única revolução que operou no jornalismo. Aumentou o formato do diário para poder incluir mais conteúdos; incorporou publicidade em massa, com o objetivo de conquistar independência económica e política; concentrou-se em dar notícias e contar histórias sobre pessoas comuns e denunciou subornos e irregularidades cometidas pelas autoridades públicas. Em poucos meses, o Saint Louis Dispatch era o diário mais lido.
ANJO e DIABO Boa parte do êxito deveu-se ao caráter perfecionista de Pulitzer, que escolhia pessoalmente os seus jornalistas, exigindo-lhes o máximo, além de uma fidelidade e uma disponibilidade totais (tinham mesmo de colocar o interesse do diário acima das próprias famílias). “O sr. Pulitzer era o homem mais abominável do mundo para ter na redação de um jornal, de manhã, durante uma hora. O resto do dia, era um maldito chato”, comentava, numa entrevista, um dos seus homens de confiança. Em contrapartida, Pulitzer concedia-lhes regalias inusitadas para aqueles tempos, como duas semanas de férias pagas por ano, manutenção do salário em caso de doença, presentes no Natal… No entanto, sempre se opôs à sindicalização dos tipógrafos que trabalhavam para ele. No seu entender, a tiragem diária era incompatível com greves. (…) In revista Superinteressante, nº162, pp. 74-75, 2011, texto com supressões
WEBGRAFIA http://textosintegrais.blogspot.pt/2011/12/teste-10-ano-textos-dos-media.html