Revista Ciência Et Praxis nº8

Page 1



ISSN 1984-5782

Revista Ciência et Praxis Volume 04 – Número 08 – Passos (MG) – julho/dezembro de 2011


Disponível também em www.fespmg.edu.br Indexação: Qualis-Capes; Google Acadêmico; Latindex e Sumario.org Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. A t r i b u i


Revista Ciência et Praxis Sumário Editorial • •

Fabio Pimenta Esper Kallas - Presidente do Conselho Curador FESP|UEMG Eduardo Goulart Collares - Diretor do Núcleo de Pesquisa e Extensão FESP|UEMG

Artigos - Ciências Agrárias •

Avaliação do processo de implantação e uso do controle dos custos em sistemas de produção de leite .............................................................................................................................................................. 9-16 Ricardo Ferreira Godinho, Douglas Fernando de Lima Valadão, Amilton José Alves da Silva.

Caracterização do solo e de plantas utilizadas como possíveis bioindicadores da presença dos componentes da escória de níquel ................................................................................................................... 17-22 Marcelo Silveira Ribeiro, João Vicente Zampieron.

Artigos - Ciências Biológicas •

Avaliação da qualidade higiênico-sanitária do leite cru refrigerado produzido em propriedades leiteiras do município de Passos e região ................................................................................... 23-30 Odila Rigolin de Sá, Norival França, Keyla Cristiane Pereira Esper, Karyna Cristilaine Pereira, Neilma Campos Souza, Talita Maria da Silva.

Artigos - Engenharias, Ciências Exatas e da Terra •

Habitação Social e Expressionismo na Alemanha de Weimar ......................................................................... 31-34 Mauro Ferreira.

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas •

Apontamentos sobre a ética e sua importância no contexto familiar, religioso, empresarial e escolar ................................................................................................................................................................................ 35-44 Silvia Cristina Zaparoli, Camilla Silva Machado Graciano.

Artigos - Ciências da Saúde •

A importância de orientar os futuros profissionais da saúde para um atendimento mais humanizado ........................................................................................................................................................................ 45-48 Celia Borges Tonelli, Claudia Cavalcante, Leonice Serafim da Silva, Adriana da Silva Fontes.

Pseudoaneurisma em face diafragmática de ventrículo esquerdo após infarto agudo do miocárdio. ............................................................................................................................................................................ 49-52 Geovane Aquino Formagio Lima, Fernando Farina Figueiredo, Daniela Sica Silva de Araújo.

Artigos de Revisão •

Endometriose em diferentes faixas etárias: Perspectivas atuais no diagnóstico e tratamento da doença ............................................................................................................................................................................ 53-58 Alessandra Bonacini Cheraim Silva, Katia Jaqueline Miguel, Neriane Magalhães Anselmo, Érica Patrícia de Souza Cardoso



Editorial Conselho Curador

Estamos num turbilhão de novos produtos, novas ferramentas, novas tecnologias que fazem com que a geração atual seja atraída pelo inovador, pela comunicação rápida, pelas redes sociais, pela proximidade de todos os povos do mundo. Isto é fruto de investimento em pesquisa e em inovação. O que veremos em 5 ou 10 anos não pode ser previsto. O que era uma ideia há poucos anos atrás, torna-se uma ferramenta de uso mundial como o Facebook. Hoje é necessário pensar diferente, ser desafiador. É necessário olhar as coisas com olho crítico. Inovar. Assim deixaremos de ser usuários de tecnologias desenvolvidas fora de nosso país e passaremos ao protagonismo da história. Temos condições humanas para isso. É necessário buscar nas instituições fomentadoras de projetos de pesquisa os recursos para realizar nossos trabalhos. A FESP acredita que com o lançamento do Professor Pesquisador teremos um fervilhar de projetos e ideias e assim, nossas produções em pesquisa e em artigos poderão crescer e fazer com que nossa instituição seja cada vez mais conceituada e nossos professores cada vez mais reconhecidos. Investir em educação, pesquisa e extensão traz resultados imediatos à nossa comunidade e ao nosso País. Boa leitura.

Fábio Pimenta Esper Kallas Fabio Pimenta Esper Kallas é Docente da Fundação de Ensino Superior de Passos e Presidente do Conselho Curador da FESP. Ciência et Praxis, v.4 n. 8 (2011) julho/dezembro 2011.



Editorial Diretor de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão

O Brasil vive um bom momento em termos de desenvolvimento científico. São muitas as iniciativas governamentais para a formação e desenvolvimento de uma comunidade científica com foco em tecnologia e inovação. O programa Ciência sem Fronteiras, do governo federal e os editais regulares lançados pela Fapemig, em parceria com a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no âmbito do estado de Minas Gerais, são exemplos claros deste esforço. A FESP como a maior instituição em produção científica do Sudoeste Mineiro, deve seguir o mesmo caminho. Os nossos pesquisadores têm desprendido grande esforço no desenvolvimento de projetos de pesquisa, em grande parte aplicados na comunidade. Projetos institucionais e multidisciplinares contribuem para o avanço tecnológico ou para a solução de problemas regionais específicos nas diversas áreas do conhecimento, como: saúde; educação; meio ambiente; engenharia e ciências agrárias. A difusão do conhecimento científico e a divulgação dos trabalhos de excelência desenvolvidos pelos nossos pesquisadores (alunos e professores), entretanto, de forma articulada e regular, é fato novo e foi incorporado no calendário da FESP a partir deste ano. É o caso do FESP INOVA, que ocorreu neste mês de outubro. Mais de 2 mil pessoas acompanharam o evento, que envolveu uma extensa programação, incluindo debates, congresso, mostras, oficinas, palestras, feiras, seminários e mini-cursos. O FESP INOVA teve a proposta de integrar a região à Semana Nacional de Ciência e Tecnologia e apresentar à comunidade os projetos científicos que a instituição está desenvolvendo. O leitor terá a oportunidade de conferir, neste periódico, resultados de algumas das pesquisar que foram apresentadas no evento.

Eduardo Goulart Collares

Eduardo Goulart Collares é doutor em Geotecnia pela Escola de Engenharia de São Carlos (USP), Professor e Diretor de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão da FESP|UEMG



Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

9

Artigos - Ciências Agrárias

Avaliação do processo de implantação e uso do controle dos custos em sistemas de produção de leite Evaluation of the implantation process and the use of the cost control in systems of milk production Douglas Fernando de Lima Valadão1; Amilton José Alves da Silva1; Ricardo Ferreira Godinho2 Resumo: Dentro de um contexto competitivo como o atual cenário da pecuária leiteira, a gestão de custos se constitui numa das ferramentas administrativas mais relevantes. O propósito geral deste trabalho é levantar as facilidades e dificuldades na implantação e uso de um sistema de custos em propriedades assistidas por um grupo de assistência técnica no sudoeste de Minas Gerais. Para que as propriedades sejam mais competitivas e rentáveis, os produtores devem direcionar sua administração para a implantação e uso de um sistema de custos para terem informações precisas sobre os aspectos financeiros, bem como a avaliação de seus processos administrativos e produtivos, para não comprometer seus custos e a qualidade das decisões tomadas. As dificuldades na coleta de dados limitam a capacidade de gerar informações suficientes sobre os custos. Os resultados demonstram a falta de comprometimento dos produtores com as rotinas do projeto, que também precisa de mudanças e adaptações como ferramentas de apoio aos mesmos. Os produtores esperam com o apoio e assistência técnica do Grupo Geapassos aumentar a rentabilidade, aumentar a produção e melhorar a genética do gado. Todos os produtores entrevistados reconhecem os resultados e têm boa perspectiva quanto ao desenvolvimento do projeto. Palavras-chave: Pecuária Leiteira; Sistema de Custos; Administração Rural; Extensão Rural. Abstract: Within a competitive context as the current scene of dairy husbandry, management of costs constitutes one of the most relevant administrative tools. The purpose of this work is to raise the facilities and difficulties in implantation and use of a cost system in properties assisted by a technical support group in southwestern Minas Gerais. With the purpose of being more competitive and profitable, the producers must direct their administration to the implantation and use of a cost system to have accurate information on financial aspects, as well as the evaluation of their productive and administrative proceedings, not to compromise their costs and the quality of the decisions taken. The difficulties in data collecting limit the capacity of generating enough information about the costs. The results demonstrate a lack of commitment of the producers with the routines of the project, which also needs changes and adaptations as tools of support to the same. The producers hope with the support and technical assistance of Geapassos Group to improve profitability, increasing production and improving the cattle genetics. All the interviewed farmers recognize the results and they have a good perspective on the development of the project. Keywords: Livestock Dairy; Cost System; Rural Administration; Rural Extension. INTRODUÇÃO Tradicionalmente, a atividade leiteira é popularmente tida como sendo um negócio de margens de lucro reduzida, ou até mesmo inviável, mas o fato é que a produção leiteira vem crescendo ano a ano, assim como a melhoria de seus índices zootécnicos, como podemos observar no Diagnóstico da Pecuária Leiteira realizado em Minas Gerais em 2005 (GOMES, 2006). Segundo Oliveira (2007) produzir leite é uma atividade rentável mesmo em sistemas menos intensivos na utilização dos recursos produtivos terra, mão de obra e animais, porém exige elevada disponibilidade de terra, o que pode limitar sua adoção em larga escala. Entretanto, este mesmo autor, chama a atenção para a necessidade de identificação de sistemas reais de produção de leite e a caracterização dos indicadores de maior corre-

lação com a eficiência econômica poderá trazer maior embasamento para o debate sobre a viabilidade econômica na pecuária leiteira. Se por um lado o conhecimento dos custos de produção é importante para a gestão da propriedade leiteira, a práxis mostra que contabilizá-lo não é tão comum sob os mais diversos argumentos, embora tais razões sejam pouco pesquisadas, fato este que justifica esta pesquisa como forma de subsidiar técnicos e produtores na implantação de sistemas de custos em suas propriedades rurais. O objetivo deste trabalho é de levantar as facilidades e dificuldades na implantação e uso do controle dos custos em sistemas de produção de leite, em propriedades participantes de grupo de assistência técnica na região sudoeste de Minas.

Discente do curso de Administração de Empresas da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) Docente da Faculdade de Agronomia da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) Email: ricardo.godinho@fespmg.edu.br 1 2


Valadão, Silva e Godinho, 2011

10

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A maior parte das atividades rurais desenvolve-se geralmente de forma irregular durante o exercício, e a administração enfrenta o desafio de atenuar ou remediar a irregularidade natural do curso dos trabalhos, onde o papel do administrador rural é planejar, controlar, decidir e avaliar os resultados visando o uso de uma adequada ferramenta para a implantação de um sistema de custos, que objetive a maximização dos lucros (CALLADO, 2006.). Segundo Santos et al(2008), “sistema de custos é um conjunto de procedimentos administrativos que registra, de forma sistemática e contínua, a efetiva remuneração dos fatores de produção empregados nos serviços rurais”, pois o objetivo refere-se ao uso que se pretende fazer dos dados na formação do custo. Para Santos et al. (2008, p. 39), “uma diferença fundamental entre custo e despesa é a característica em que custo se identifica com o produto que está sendo produzido e despesa se identifica com o período, o exercício, o ano”. Entretanto, é importante ressaltar que é possível conter despesas e não necessariamente custos, fato que a maioria dos produtores, atualmente, não faz distinção. De maneira geral a contabilidade de custos está focada nos custos do negócio e não nas despesas. É relativamente comum saber que a despesa começa no término da produção.

não alcançar o máximo rendimento econômico, considerando o conjunto das atividades produtivas planejadas, visto que os custos são as variáveis que devem receber cuidados especiais (REICHERT, 1998). Segundo Martins e Laugeni (2005, p.2): “a função produção, é entendida como um conjunto de atividades que levam à transformação de um bem tangível em um outro com maior utilidade”. Com o passar do tempo muitos profissionais se aperfeiçoaram na produção desenvolvendo técnicas e formas que têm o papel de gerenciar os processos produtivos e custos, destinados à produção de bens e serviços. Entretanto, a produção teve sua grande evolução com a Revolução Industrial, que começou a substituir o trabalho humano por máquinas. Com isso, deu-se início à especialização dos produtos (MARTINS e LAUGENI, 2005). São vários os fatores que influenciam na produção, sendo o principal deles os custos, que segundo Callado (2006, p. 55.), coloca diversos conceitos de contabilidade de custos. Existem várias diferenciações cuja classificação é feita de acordo com sua característica e natureza, levando os produtores a tentar reduzi-los conforme seu enfoque para maximizar os lucros. A atividade rural necessita de investimentos altos, de custos bastantes elevados, por isso a necessidade de um bom planejamento. Segundo Martins e Laugeni (2005, p.2.):

“Um sistema de custos completo tem atualmente objetivos amplos e bem definidos, que refletem sua importância como ferramenta básica para a administração de qualquer empreendimento, especialmente na agropecuária, onde os espaços de tempo entre produção e vendas, ou seja, entre custos e receitas, fogem à simplicidade de outros tipos de negócios, exigindo técnicas especiais para a apresentação não dos custos, mas dos resultados econômicos do empreendimento”. (SANTOS et al. 2008, p.44).

“Na década de 1910, Henry Ford cria a linha de montagem seriada, revolucionando os métodos e processos produtivos até então existentes. Surge o conceito de produção em massa caracterizada por grandes volumes de produtos extremamente padronizados, isto é, baixíssima variação nos tipos de produtos finais. Essa busca da melhoria da produtividade por meio de novas técnicas definiu o que se denominou engenharia industrial”.

Os princípios básicos da administração que são aplicados à indústria e ao comércio são também válidos, em termos gerais, para a pecuária e agricultura. Entretanto, deve-se ressaltar que essa tem determinadas características que a diferenciam dos demais segmentos, as quais, por isso, precisam ser consideradas e analisadas conforme sua característica, adequando-se ao seu sistema de custo (REICHERT, 1998). Muitos dos fatores de produção, como a terra, por exemplo, que, para a indústria, representa tão somente a base para a instalação do imóvel, para a agricultura e pecuária, é considerado o principal meio de produção, que precisa ser estudado na sua microcomposição, visando à exploração do seu potencial máximo. Variáveis, como o clima, por exemplo, que condiciona todas as atividades produtivas e determina o que pode ser produzido, implicando riscos para a agricultura e dificuldades para a pecuária, não representam muito para a indústria. Portanto, esses condicionantes impõem ao produtor rural certa organização no seu negócio, sob pena de ele

Para a melhoria dos processos é comum a especialização, focada no produto (segmentado) para atender às expectativas do cliente. Com a especialização consegue-se eficiência na produção, mas diante das incertezas do mercado alguns produtores apostam na diversificação, não podendo sair totalmente do foco, pois, podem provocar quedas em ambas as produções. Ao longo desse processo de modernização da produção, cresce em importância a figura do consumidor, este passa a ser o fundamental instrumento de análise. Em um mercado cada vez mais exigente, o consumidor passa a adquirir produtos mais baratos e com qualidade. Pode-se dizer que a procura da satisfação do consumidor é que tem levado as empresas a se atualizarem com novas técnicas de produção, cada vez mais eficazes, eficientes e de alta produtividade (MARTINS e LAUGENI, 2005). As mudanças econômicas ocorridas desde o início da década de 1990 vêm exigindo também rápidos ajustamentos estratégicos e estruturais do setor agroindustrial do leite. A desregulamentação do mercado de leite e,


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

11

Artigos - Ciências Agrárias

posteriormente, a abertura comercial da economia brasileira resultaram em um mercado competitivo em termos de qualidade, produtividade e escala de produção (REIS et al, 2001). Efetivamente a atividade produtiva primária é o segmento mais vulnerável da cadeia agroindustrial devido às limitações tecnológicas e gerenciais. Por não conseguir controlar o preço do produto que vende, o produtor necessita administrar as variáveis que estão sob o seu controle. Trata-se de uma estratégia para tornar seu produto competitivo, atingindo menores custos de produção. O seu resultado econômico em um mercado caracterizado pela concorrência depende do gerenciamento dos custos de produção do leite e dos ganhos de escala. O aumento da eficiência produtiva é fator decisivo para a competitividade do setor leiteiro que, produzindo com menor custo, beneficiará toda a cadeia do leite (REIS et al, 2001). Callado, (2006), dentre suas especificações de custos, mostra a importância da coleta de dados para o processo das informações, que os transforma em dados para mensurar o lucro, avaliação do patrimônio, identificar métodos e ferramentas para controle das operações e tomada de decisão baseada no planejamento tático, estratégico e operacional. Contudo o processo é baseado na fixação de custos estimados para a pecuária leiteira. Na gestão do agronegócio é importante considerar a relação entre custo total e produção que tem por base os fundamentos teóricos ligados à tecnologia, aos preços dos insumos e à busca da eficiência na alocação dos recursos produtivos. O custo total de produção constituise na soma de todos os pagamentos efetuados pelo uso dos recursos e serviços, incluindo o custo alternativo do emprego dos fatores produtivos, com isso será possível alcançar os objetivos (REIS et al, 2001). Quando se fala em contabilidade rural, os produtores a veem como uma técnica complexa, por isso é pouco usada entre eles, é mais utilizada para finalidades fiscais e desestimulada quanto ao uso para geração de informações e aplicação gerencial (CALLADO, 2006). Para Reis et al (2001), “Na teoria do custo, para efeito de planejamento, devese determinar o período de tempo, que pode ser curto ou longo. No curto prazo, os recursos utilizados são classificados em custos fixos e variáveis, sendo fixos aqueles que não se incorporam totalmente ao produto, mas o fazem em tantos ciclos produtivos quanto permitir sua vida útil. Os custos variáveis, por sua vez, têm duração igual ou inferior ao curto prazo e incorporam-se ao produto, necessitando ser repostos a cada ciclo do processo produtivo”.

A contabilidade de custos é uma grande ferramenta que nos possibilita entendimento sobre os custos totais, que constituem a soma dos fixos e variáveis, se obtêm os custos médios ou unitários, que representam o custo de uma unidade do produto. Esses custos fixos e variáveis são ainda decompostos em custos operacionais e alterna-

tivos (ou de oportunidade). Os operacionais constituem os valores correspondentes às depreciações e aos gastos com insumos, mão de obra, manutenção e despesas gerais. Com a soma do custo operacional ao custo alternativo, obtém-se o custo econômico. (REIS et al, 2001). A contabilidade de custos é desenvolvida por meio da coleta e processamento de dados que culmina com a produção e distribuição de informações na forma de relatórios contábeis, capazes de nos mostrar a avaliação geral do negócio e não deixar que as decisões sejam tomadas de forma errônea. (CALLADO, 2006). É muito importante dentro de um sistema de custo saber identificar, registrar e alocar os recursos consumidos na empresa rural, pois cada organização contábil precisa estar ajustada à dimensão da empresa rural, porém há necessidade de identificar o nível de detalhamento e estrutura da empresa rural, para aderir à melhor técnica. (CALLADO, 2006). Sobre o processo de implantação, Callado (2006, p. 56) destaca que “um sistema de contabilidade de custos adotado por uma empresa precisa ser compatível com sua estrutura organizacional, com os procedimentos de manufatura e com o tipo de informações sobre custos que a administração deseja”. “A apuração de custos no agronegócio apresenta uma de suas maiores dificuldades de implantação e desenvolvimento devido à necessidade de rigor no controle de seus elementos de forma a obter uma correta apropriação dos custos” (...).(CALLADO, 2006, p. 56). Portanto, devem ser levados em conta todos os fatores das propriedades, as formas de produção utilizadas e os recursos disponíveis, pois existem as diferenças entre propriedades e produtores, o conjunto dessas ações possibilita o controle e avaliação. Os envolvidos no projeto devem conhecer os fatores que afetam os resultados econômicos, os quais são de extrema importância para tomada de decisão. Se o preço do produto for suficiente apenas para cobrir parte dos custos fixos (e todo o custo variável), a atividade encontra-se em processo de descapitalização e em condições de produzir apenas no curto prazo. Neste caso, pode-se utilizar o custo operacional para análise de rentabilidade do empreendimento, utilizando-se o conceito de resíduo, significando se está sendo viável ou não. Necessitando de uma análise cautelosa no momento para que possa buscar alternativas corretivas na produção e diminuição dos custos. (REIS et al, 2001). A produção de leite a pasto é o sistema mais econômico. A pastagem é a fonte de nutriente mais econômica em qualquer parte do mundo, mas, principalmente, em países em desenvolvimento. Entretanto, se não houver uma boa qualidade dos pastos proporcionará quedas na quantidade da produção de leite. Além do aspecto econômico, a utilização mais racional das pastagens auxilia na preservação dos recursos renováveis e permite a produção de leite sob condições mais naturais (HOLMES,


12

1995 apud SILVA et al, 2008). O benchmarking, abordagem utilizada para comparar firmas ou unidades produtivas, é um instrumento valioso para os produtores, facilitando também o trabalho da pesquisa e da extensão rural, pois, ao serem identificados os sistemas de produção eficientes ou de fronteira (benchmarks), estarão sendo identificadas as melhores práticas produtivas para as unidades ineficientes. (TUPY; YAMAGUCHI, 2001 apud MAGALHÃES e CAMPOS, 2006). Para Leite (2005) entre os insumos requeridos para produzir leite, os alimentos são os mais importantes porque fornecem os nutrientes requeridos para serem transformados em leite e carne. Inadequadas qualidade e quantidade de alimentos podem parar o processo de produção de leite, provocar perda de peso e aumentar os riscos de doenças, abortos e mortes. Assim, alimentação em sistemas de produção de leite é um dos fatores decisórios entre sucesso e fracasso do empreendimento. Isto se deve também ao fato de que no lado econômico, um dos mais importantes fatores de sucesso é o custo de produção, para o qual a alimentação animal contribui com importante parcela. O Estado de Minas Gerais, pela sua posição geográfica central e importância na produção de leite, visto que de cada três litros produzidos no Brasil um vem de Minas, sintetiza a produção nacional, com exceção do extremo Sul. O perfil da produção de leite de Minas corresponde a realidade de, aproximadamente, oitenta por cento da produção do País. Em outras palavras, o diagnóstico da produção do leite de Minas pode, perfeitamente, ser expandido para a produção do Brasil. (GOMES, 1996). Para melhor conhecimento, hoje, o agronegócio no Brasil é considerado como o maior negócio, sendo uma atividade próspera e rentável, é a principal locomotiva da economia brasileira, respondendo por R$ 1,00 em cada R$ 3,00 gerados no país. Mesma proporção mencionada no parágrafo anterior que compara Minas com o restante do país. Este seguimento é responsável por 33% do Produto Interno Bruto (PIB), por 42% das exportações totais e 37% dos empregos brasileiros. Entre 1998 e 2003, a taxa de crescimento do PIB agropecuário foi de 4,67% ao ano (Brasil, 2004 apud RIBEIRO; FAVATO e RIBEIRO, 2007). Com uma visão ampla do segmento fica mais fácil mensurar a potencialidade do agronegócio brasileiro e estabelecer estratégias de prospecção no setor. Segundo Gomes (2006), os produtores não entendem o sistema de pagamento que considera preços diferentes para o leite-cota e leite-excesso. À primeira vista, esse resultado é surpreendente, visto que a prática desse sistema já é antiga na pecuária nacional. Acontece que o produtor não se ajustou a esse sistema pela inconstância de sua aplicação. Em alguns anos é praticado em outros não, dependendo da necessidade menor ou maior da indústria

Valadão, Silva e Godinho, 2011

laticinista. Tal inconstância deixa o produtor na dúvida se deve ou não investir, para fazer uma elevada cota no período da seca e depois se beneficiar na época das águas. Outro indicador financeiro do sistema de produção relacionado aos custos é a taxa de retorno do capital investido, medida pela relação margem líquida/estoque de capital. A margem líquida resulta da diferença entre a renda bruta e os gastos diretos, a remuneração da mão de obra e as depreciações. Em geral, os sistemas menos tecnificados têm baixa taxa de retorno e os mais tecnificados, altas taxas de retorno, porque o capital investido, em relação à quantidade produzida, nos sistemas tradicionais, é maior que nos tecnificados. Por essa razão, o custo fixo médio dos sistemas tradicionais é maior que o do tecnificado (GOMES, s/d.). Com isso, conclui-se que é melhor investir em sistemas tecnificados para a diminuição dos custos. Kaplan e Atkinson (1989) apud Wernke; Lembeck e Heidemann (2008, p.27) mencionam que: “Muitas decisões gerenciais requerem uma análise cuidadosa do comportamento de custos e lucros em função das expectativas do volume de vendas. No curto prazo (menos que um ano), a maioria dos custos e preços dos produtores da empresa, pode, em geral, ser determinada. A principal incerteza não está relacionada com custos e preços dos produtos, mas com a quantidade que irá ser vendida. Nesse sentido, segundo tais autores, a Análise Custo/ Volume/ Lucro (CVL) aponta os efeitos das mudanças nos volumes de vendas na lucratividade da organização”.

No ambiente de elevada concorrência, de incertezas e de redução das margens de ganho em que os produtores de leite estão inseridos, a eficácia nas decisões é fundamental para competitividade do negócio. (OLIVEIRA, et al, 2007). A atividade leiteira tem um papel fundamental no contexto do setor agropecuário, por ser importante na formação da renda bruta da maioria das propriedades familiares e pelo fato de o leite ser um alimento básico da população, servindo de matéria-prima para a geração de diversos subprodutos, como o queijo, manteiga, leite em pó, iogurte, entre outros. Além disso, proporciona uma renda mensal segura e tem um valor social muito elevado. (REICHERT, 1998). “Nos dias atuais, não basta apenas produzir. É preciso atender a um mercado cada vez mais exigente; é preciso ter, sobretudo, qualidade para ser competitivo”. (REICHERT, 1998, p. 84). A atividade da pecuária leiteira exige manter o controle sistemático das atividades na fazenda, incluindo um sistema de análise de custo de produção que gere informações necessárias para a tomada de decisões seguras, rápidas e objetivas, é de fundamental importância para a sustentabilidade e o sucesso no setor, (GOMES, 2007). Gomes (1999) apud Gomes (2007) menciona que a mão de obra familiar tem participação importante no custo de produção da atividade leiteira, em especial do


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

13

Artigos - Ciências Agrárias

pequeno produtor, quando realiza atividades indispensáveis ao desenvolvimento da atividade. Com isso, existem critérios que melhor justificam a disponibilidade da mão de obra em relação a custos, no qual o mercado de trabalho influencia diretamente, pois havendo escassez, o preço aumenta e vice-versa. Daí a necessidade da mão de obra familiar. Segundo Pereira (2003) apud Gomes (2007, p. 25), “assume-se que o custo de oportunidade do capital investido na produção de leite é o quanto esse capital renderia se fosse aplicado no mercado financeiro”. O município mineiro conta com inúmeras facilidades estruturais, como condições geográficas e outros, ainda assim, a administração rural no Brasil se desenvolve dentro de critérios tradicionais, apresentando um baixo padrão de desempenho operacional e econômico. O fato de esses empreendedores se localizarem fora dos centros urbanos contribui para dificultar a participação de especialistas na administração do negócio rural e, mais especialmente, na sua gestão de custos de produção. Assim, os produtores rurais administram suas propriedades utilizando dados empíricos, os quais não se acrescentam à sua administração, fato que prejudica na tomada de suas decisões, por não terem dados suficientes, pois acrescentam deficiências na gestão financeira do seu empreendimento e, principalmente, no setor econômico/financeiro devido à complexidade produtiva. (RIBEIRO; FAVATO e RIBEIRO, 2007). Ribeiro et al (2007, p. 32) mostram que um modelo de Sistema de Informações de Custos tem como objetivo gerar informações suficientes, adequadas e reais para a gestão estratégica dos seus custos de produção, que proporcionam maior controle financeiro e avaliação de desempenho econômico-financeiro sobre o ciclo produtivo e atividades que desenvolve. Sobre estes fatores é possível tomar decisões precisas no gerenciamento do processo produtivo. “Nas propriedades assistidas pelo Grupo de Estudos e Prática do Agronegócio do curso de Agronomia de Passos, ficou evidente a carência de orientação ao produtor na área econômica e administrativa, contraponto ao grande interesse que todos os produtores demonstraram por este tema. As propriedades avaliadas em comum exploram a atividade leiteira, mas seus sistemas produtivos são todos distintos, assim como o sistema de gestão, havendo desde propriedades que possuem amplo sistema de controles de produção e finanças até propriedades que não fazem um único registro. Por outro lado, mesmo as que possuem tais controles, estes não subsidiam satisfatoriamente o processo decisório, sendo comum entre as propriedades a dificuldade de acesso aos muitos ou poucos dados existentes. A prática do planejamento e monitoramento das ações é inexistente em algumas propriedades e realizada insatisfatoriamente em outras. (...). Ficou clara a necessidade de orientação aos produtores quanto aos temas econômicos e administrativos, como forma de melhorar os resultados de seu negócio e, consequentemente, promover a

melhoria da qualidade de vida dos produtores e de todas as pessoas envolvidas”. (GODINHO, 2008, p. 83 - 84).

A falta de conhecimento técnico e a necessidade de ferramentas de gestão financeira, capazes de apoiar a gestão estratégica e o processo de produção nas propriedades rurais, fazem com que cada produtor analise a aplicabilidade de contabilidade de custos nas empresas e utilize as mesmas no setor rural, visto que o ciclo produtivo varia de produtores para produtores, onde a combinação dos recursos disponíveis e o manejo objetivem a maior eficiência para maximização da renda e promover a continuidade dos processos ou a sustentabilidade da pecuária leiteira, com apoio de técnicos em administração o setor desenvolverá métodos no uso de tais ferramentas para a obtenção do êxito nesse processo. (RIBEIRO et al, 2007). Segundo Machado (2005, p.49): “as perspectivas dos clientes, processos internos e crescimento provocam os resultados financeiros”. Devem-se evitar os pontos negativos e explorar os pontos positivos com ênfase no melhoramento. É clara a dificuldade de implantação de um sistema de custos, pois é necessária muita disciplina por parte dos produtores e de todos os envolvidos no processo. Enfim, envolve decisões importantes que são tomadas com base nos dados e informações coletadas compatíveis com sua estrutura, podendo levar os produtores a uma má gestão ou orientação se for distorcidas ou interpretadas incorretamente. MATERIAL E MÉTODOS Os dados para esta pesquisa foram levantados diretamente com técnicos e produtores rurais, integrantes de um programa de assistência técnica viabilizado por meio de um convênio mantido entre a Fundação de Ensino Superior de Passos/FESP e a Cooperativa Agropecuária do Sudoeste Mineiro Ltda/Casmil. O Grupo de Estudos e Prática do Agronegócio atende em média 30 propriedades rurais, e conta com a participação de 8 alunos. Dentre as ações propostas pelo Geapassos, uma das mais relevantes é o diagnóstico técnico, econômico e administrativo, que servirá de base para o planejamento das ações que incidem nos aspectos tais como, controles financeiros, manejo do gado, controle leiteiro, cultivo de milho para silagem, elaboração e implantação de pastejo rotacionado, qualidade do leite, planejamento de safra, nutrição e alimentação e melhoramento genético (SANTOS, 2010). A coleta de dados para a presente pesquisa realizouse por meio de respostas obtidas por formulário com perguntas objetivas e dissertativas. Para o estudo selecionou-se as propriedades participantes de um grupo de assistência técnica na região sudoeste de Minas Gerais, assistidas pelo Grupo de Estudo Prática do Agronegócio do curso de Agronomia de Passos, os formulários foram apresentados pessoalmente aos produtores em


14

suas propriedades. Foram entrevistados 6 técnicos graduandos no curso de Agronomia de Passos que prestam assistência técnica ao grupo Geapassos e 11 produtores para a elaboração da pesquisa. O critério utilizado na seleção dos produtores foi o de selecionar produtores com mais de 1 (um) ano de permanência no Projeto. As propriedades estão localizadas em vários municípios do Sudoeste de Minas Gerais. RESULTADOS E DISCUSSÃO A compreensão do teor do projeto foi relatada por 100% dos técnicos, justificando ter boa orientação pela coordenação do Grupo de Estudo e Prática do Agronegócio do curso de Agronomia de Passos, apontando ainda que há uma preparação para sanar as dúvidas antes de levar o apoio aos produtores. A falta de prática foi apontada por 17% dos técnicos entrevistados, porém ela é adquirida no estágio ao longo do processo de implantação do sistema de custos. Percebe-se que existe a necessidade de um profissional qualificado já no início da implantação, entretanto, no começo, é preciso ter uma avaliação mais rápida e precisa das propriedades para que os técnicos acompanhem e coordenem com maior facilidade e segurança. Ou ter, sistematicamente, um acompanhamento desse profissional junto aos técnicos nas visitas. Em relação às facilidades e dificuldades encontradas pelos técnicos, 100% deles relataram que uma dificuldade é a resistência por parte dos produtores em anotar dados e passar informações. Já nas facilidades, 66% dos técnicos alegaram que as planilhas são uma ferramenta facilitadora na coleta e obtenção de dados para a implantação; 17% dos técnicos revelaram que ao demonstrar a importância de um sistema de custos aos produtores, eles encontraram uma aceitação maior ao projeto e 17% dos técnicos não opinaram. Distorções na implantação, foram relatadas por 34% dos técnicos, justificando que as mudanças no projeto são necessárias para adequar às diferentes situações. Também há distorções nas coletas de dados e descomprometimento dos produtores com as visitas programadas. Outros 66% afirmam não ter distorções. O projeto inicialmente ajuda o produtor a melhorar seu entendimento sobre os custos da produção leiteira. Contudo, há necessidade de adaptações quanto a aplicação, as técnicas e a forma de condução. Sobre a disponibilidade financeira, os técnicos justificaram que as dificuldades são os investimentos a curto prazo. Ao analisar se os produtores tomam decisões com base nas informações coletadas periodicamente no sistema de custos, 100% dos técnicos disseram sim, e além de utilizar dessa ferramenta conciliam a prática, o conhecimento e a experiência. Os técnicos foram unânimes ao afirmarem que os produtores não atendem todas as solicitações técnicas. Já quanto ao comprometimento dos produtores para a im-

Valadão, Silva e Godinho, 2011

plantação de um sistema de custos, solicitou-se aos técnicos uma avaliação de 0 (zero) a 10 (dez), onde zero é a pior nota e dez a melhor. Nas respostas, 33% dos técnicos atribuíram a nota 7, e justificaram encontrar dificuldades em reunir dados, outros 33% avaliaram com a nota 6 e relataram que não existe comprometimento dos produtores em coletar dados; 17% dos técnicos avaliaram com a nota 8 justificando que há interesse em resultados, porém não coletam dados e 17% dos técnicos discorrem que os produtores não gostam de anotar os dados. Avaliando a resistência por parte dos produtores em aderir, relacionar-se e entender as mudanças propostas 66% dos técnicos revelaram não encontrar resistência e 34% dos técnicos relataram encontrar dificuldades, justificando que os produtores são bastante resistentes em relação ao controle e fazer anotações; salientaram também que as resistências são contornadas ao longo do processo de implantação e quando as mudanças necessárias são bem explicadas e discutidas, são aceitas e executadas pelos produtores. As expectativas dos técnicos em relação ao projeto Geapassos, é levar o conhecimento adquirido na teoria e absorver experiência com as práticas, fortalecendo seu crescimento profissional e, ao mesmo tempo, fazer com que os resultados sejam alcançados pelos produtores para que eles caminhem sozinhos após o período de implantação do projeto, atingindo, assim, a satisfação e entendimento dos produtores. Dos produtores entrevistados, 72,7% alegaram compreender a proposta do projeto, justificando já possuir entendimentos de outros projetos de assistência técnica anteriores ao Geapassos e também por ter tido orientações claras dos técnicos, que os ajudaram neste propósito. Já 27,3% dos produtores responderam compreender mais ou menos a proposta, justificando que no primeiro momento tiveram dificuldades e, posteriormente, ao longo do processo se adaptaram e compreenderam. Quanto às facilidades e dificuldades no processo de implantação das orientações do Geapassos quanto ao sistema de custos, 100% dos produtores alegaram que as facilidades são as planilhas para coletas de dados e as orientações técnicas para tomada de decisão. Em relação às dificuldades, 64% dos produtores relataram ter dificuldades em anotar dados por falta de tempo, 18% dos produtores encontraram dificuldades no retorno das soluções propostas pelos técnicos e pela falta de profissionais em outras áreas como veterinária e zootecnia e 18% dos produtores não apontaram dificuldades. Segundo produtores entrevistados, o que pode ser feito para melhorar os custos na produção de leite, seria a otimização da mão de obra,o equilíbrio no preço dos insumos, a união dos produtores por meio de arranjos produtivos locais, o cooperativismo, acompanhamento sistemático dos números, manejo e genética do gado, uso de equipamentos e máquinas na produção, incentivo governamental, seguir as orientações técnicas e


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

15

Artigos - Ciências Agrárias

melhores condições no preço de venda do leite. Os produtores acreditam que a implantação de um sistema de custos ajuda a ter maior lucratividade no seu negócio, e há uma unanimidade na crença de que o projeto aumenta a lucratividade. Quanto ao grau de entendimento sobre os custos da produção leiteira e o que poderia ser feito para melhorar este entendimento, verificou-se que 27,27% dos produtores avaliaram com a nota 10, alegando faltar união no âmbito das cooperativas, precisam confiar mais no projeto e acompanhar as mudanças que ocorrem. Outros 27,27% dos produtores avaliaram com a nota 8, alegando que com maior dedicação, tempo e experiência esse entendimento vem melhorar. Também 27,27% avaliaram com a nota 7, discorrendo que a convivência com o projeto, ajuda governamental e informar-se melhor sobre os custos esclarece o grau de entendimento. Já 9,10% dos produtores avaliaram com a nota 6, dizendo que o auxílio de profissionais especializados neste segmento ajuda a compreender melhor os custos. Outros 9,10% dos produtores que avaliaram com a nota 5, relataram necessitar de mais orientações e esclarecimento sobre os custos. Ao levantar as necessidades para entender melhor os custos de produção percebe-se que os produtores já possuem conhecimento sobre, pois todos avaliaram acima da nota média demonstrando ter entendimento, apesar de necessitarem de ajuda nesse aspecto. Entretanto, ao analisar se o produtor entende o controle de custos apresentados pelos técnicos do Geapassos, 100% dos produtores responderam afirmativamente. Todos os produtores entrevistados alegaram não ter controle sobre os custos antes do projeto, mas que agora o tem, e que o uso das planilhas e coleta dos dados possibilitou aos produtores um melhor acompanhamento, dando condições para que possam tomar decisões de maneira consciente. Em uma avaliação de 0 a 10 onde zero é a pior nota e 10 a melhor, quanto aplicação das orientações técnicas do projeto Geapassos, 18,19% dos produtores atribuíram a nota 10, o que justificam que os técnicos têm boa vontade em ajudá-los, precisão nas visitas e conhecimento técnico, para que o resultado apareça. Outros 45,45% dos produtores avaliaram com a nota 8, justificando que ainda falta um pouco mais de experiência para os técnicos, mas eles estão comprometidos na condução do projeto, com o acompanhamento do resultado da propriedade. Já 36,36% relataram que os técnicos esclarecem as dúvidas estabelecendo controles das atividades, porém o projeto necessita de adequação. Entretanto, nota-se que os produtores não atendem todas as solicitações técnicas, pois os mesmos argumentam faltar tempo e empenho, mas com a chegada dos resultados a tendência é que se dediquem mais ao projeto. Questionados se as mudanças propostas pelos técnicos lhes trazem desconforto, medo e desconfiança,

todos os produtores alegaram que, a princípio, as mudanças geram medo e desconforto, mas ao analisarem as mesmas com os técnicos chega-se a conclusão de que são necessárias e posteriormente adotadas com as explicações e discussões entre técnicos e produtores. Quanto ao grau de comprometimento dos produtores com a implantação das ações propostas e coletas de dados os produtores afirmam ter comprometimento, o que contradiz a opinião dos técnicos sobre este mesmo assunto. Dos produtores, 27,27% relatam estar comprometidos e outros 27,27% dos produtores alegam ter dificuldades no início do projeto, mas com a viabilidade tiveram maior compromisso com o processo. Também 27,27% dos produtores se dizem comprometimentos com o projeto, apesar de não terem tempo e recursos financeiros para atender todas as solicitações técnicas. Os demais 18,20% alegam estar empenhados, apesar das dificuldades ou que possuem pouco conhecimento e falta de tempo, por não ter funcionário e utilizar a mão de obra familiar. Com isso, evidencia-se que alguns dos produtores reconhecem a falta de comprometimento com o projeto. Sobre o que os produtores esperam com o apoio técnico para os próximos anos, vários argumentos foram apresentados, tais como o aumento na rentabilidade, aumento na produção com o auxílio de máquinas e equipamento, melhoria da genética do gado, busca constante pelas melhorias através de profissionais qualificados como veterinários, administradores e zootecnistas. Contudo, verificou-se que todos os produtores tem uma boa perspectiva quanto ao projeto, ressaltando que o mesmo ainda precisa de adaptações, já que muitas diversidades são encontradas nas diferentes propriedades. Ao confrontar as opiniões, percebe-se que os técnicos demonstram uma boa vontade em aproveitar o curso, conciliando teoria e prática simultaneamente, o que ajudará no crescimento profissional de cada um, ao longo de sua formação. Já os produtores alegaram ter bom entendimento e compreensão em relação ao teor do projeto. Também se dizem satisfeitos com o apoio dos técnicos do Geapassos, mas, reconhecem em grande parte que não conseguem atender todas as instruções sugeridas pelos técnicos. Além de sugerir que o projeto necessita de adaptações e melhorias em seu propósito, os produtores reconhecem a sua falta de comprometimento com o projeto, o que é evidenciando pelos relatos dos técnicos e que justificam que esta dificuldade é referente à falta de tempo e demora no retorno das soluções propostas. Ficou evidente que existe uma grande dificuldade em fazer com que os produtores coletem periodicamente os dados, e isso acaba interferindo negativamente nos trabalhos, uma vez que algumas propriedades são distantes e as visitas se limitam em uma vez a cada mês. Já os produtores argumentam que existe dificuldade em anotar os referidos dados, porque o tempo é restrito


16

para desempenhar todas as funções da propriedade, que em sua grande parte, são pequenas e os próprios produtores desempenham os trabalhos do dia a dia e não possuem funcionários, utilizando-se da mão de obra familiar. Em sua maioria, os técnicos dizem que as facilidades encontradas são as planilhas e os produtores evidenciaram também que elas facilitam para tomada de decisão, por serem baseadas nas informações coletadas periodicamente. As variações são necessárias na opinião dos técnicos e produtores, pois são adaptadas de acordo com a propriedade e seu processo, são discutidas antes da execução e tomada de decisão. Ambos esperam melhorar os resultados com a implantação do projeto, pois os produtores relatam que para melhorar é necessário um acompanhamento de um profissional qualificado desde o início do projeto para avaliar as propriedades, facilitando o acompanhamento dos técnicos e solucionando a demora no retorno das soluções necessárias. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os produtores encontram dificuldades nas coletas de dados, que é o principal instrumento para a implantação de um sistema de custos, pois, por meio da coleta de dados é feita a análise e o processamento das informações que demonstram a avaliação geral do negócio para tomada de decisão. As facilidades encontradas são as orientações técnicas e as planilhas propostas pelo Geapassos para coletar dados. Entretanto, a pesquisa evidenciou a falta de tempo e de comprometimento entre os produtores para a utilização da mesma. É notável que exista a necessidade de profissionais qualificados já no início da implantação do sistema de custos para diagnosticar rapidamente as deficiências das propriedades a serem tratadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CALLADO, A. A. C. (organizador). Agronegócio. - 1ª. ed. – 2ª. reimpressão – São Paulo: Atlas, 2006. GODINHO, R. F. (coord.) Grupo de Estudos e Prática do Agronegócio do Curso de Agronomia de Passos – GEAPASSOS. IN: UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS, Extensão na UEMG: uma contribuição para o desenvolvimento de Minas Gerais. Belo Horizonte. Pró-reitora de Pesquisa e Extensão. 2008. GOMES, S. T.. Diagnóstico da pecuária leiteira do Estado de Minas Gerais, 2005: relatório de pesquisa. – Belo Horizonte: FAEMG, 2006. 156 p.: il. GOMES, J. T.. Análise Econômica de duas Unidades de Produção de Leite Bovino no Agreste Potiguar. 2007. Programa de pós-graduação e Zootecnia – Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências Agrárias, Areia, 2007. GOMES, S. T.. Diagnóstico e perspectiva da cadeia produtiva do Leite no Brasil. s.d.

Valadão, Silva e Godinho, 2011

GOMES, S. T.. Sistema de Preço do Leite. 1996. LEITE, J. L. B.. Metodologia de Modelagem para Sistemas de Produção de Leite. 2005. MACHADO, J. R.. Planejando a estratégia de pequenos negócios. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2005. MAGALHÃES, K. A.; CAMPOS, R. T.. Eficiência técnica e desempenho econômico de produtores de leite no estado do Ceará, Brasil. Rev. Econ. Sociol. Rural vol.44 no.4 Brasília Oct./Dec. 2006 MARTINS, P. G. e LAUGENI, F. P. ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO. 2ª ed. Rev., Aumentada e Atual. São Paulo: SARAIVA, 2005. OLIVEIRA, A. S.; CUNHA, D. N. F. V.; CAMPOS, J. M. S.; VALE, S. M. L. R. e ASSIS, A. J.. Identificação e quantificação de indicadores-referência de sistemas de produção de leite. R. Bras. Zootec., v.36, n.2, p.507-516, 2007. REICHERT, L. J.. A Administração Rural em Propriedades Familiares. Teor. Evid. Econ., Passo Fundo, v. 5, n. 10, p. 67-86, maio 1998. REIS, R. P.; MEDEIROS, A. L. e MONTEIRO, L. A. Custo de Produção da Atividade Leiteira na Região Sul de Minas Gerais. Organizações Rurais e Agroindustriais, Lavras, v. 3, n. 2, p. 45-54, jul./dez. 2001. RIBEIRO, E. D.; FAVATO, V.; RIBEIRO, K. C. S.. A aplicação da contabilidade de custos no setor agropecuário: um estudo de caso. In: Revista Mineira de Contabilidade, n° 25 – 1° trimestre 2007. SANTOS, G. J. DOS; MARION, J. C.; SEGATTI, S.. Administração de custos na agropecuária. – 3ª. ed. – 4ª. reimpr. – São Paulo: Atlas, 2008. SANTOS, J.. Estágio Bom para estudantes e produtores. Balde Branco, mar. 2010. SILVA, H. A.; KOEHLER, H. S.; MORAES, A.; GUIMARÃES, V. A.; HACK, E. e CARVALHO, P. C. F.. Análise da viabilidade econômica da produção de leite a pasto e com suplementos na região dos Campos Gerais – Paraná. 2008. WERNKE, Rodney; LEMBECK, Marluce; HEIDEMANN, J. S.. Análise Custo/Volume/Lucro fundamentação teórica. In: REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE. Revista editada pelo conselho federal de contabilidade – ano XXXVII n° 174 – novembro/dezembro 2008.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

17

Artigos - Ciências Agrárias

Caracterização do solo e de plantas utilizadas como possíveis bioindicadores da presença dos componentes da escória de níquel Characterization of soil and plants used as possible bio-indicators of the presence of nickel slag components Marcelo Silveira Silveira Ribeiro1; João Vicente Zampieron2 Resumo: O presente trabalho trata da identificação de plantas potencialmente bioindicadoras dos elementos que constituem a escória de níquel e sua ação no solo. Tal escória é oriunda do processo de fundição da Votorantim Metais, unidade de Fortaleza de Minas (MG). Estudos foram realizados para detectar a ação de alguns elementos químicos no desenvolvimento de plantas, desde a germinação das sementes até o desenvolvimento das raízes, caules e folhas. Sabe-se que o excesso de determinados elementos restringe a biomassa do caule e podem alterar a concentração dos macro e micronutrientes do solo, impedindo o crescimento das plantas. No presente trabalho foram elaborados canteiros com mistura de solo e escória de níquel variando de 0 a 80%. A escória e o solo foram caracterizados via microscopia eletrônica de varredura (MEV), espectroscopia por energia dispersiva (EDS) e por difração de raios-X. A análise via MEV demonstrou que as partículas são irregulares, já na análise via EDS observou-se que o ferro e o silício são elementos predominantes; a difração de raios-X constatou que as fases são formadas basicamente por óxido de silício, óxido de titânio e óxido de ferro. Foram escolhidas as plantas como morango (Fragaria ananassa), pepino (Cucumis sativus) e alface (Lactuca sativa), como possíveis bioindicadores, por apresentarem um curto ciclo de desenvolvimento. Palavras-chave: Escória de níquel; Bioindicador; Caracterização e Monitoramento Ambiental. Abstract: This paper is about the identification of plants as possible bio-indicators of the elements of nickel slag and its action in the soil. This slag is generated from the smelting process at Votorantim Metais, Fortaleza de Minas (MG). Studies were performed to detect the action of some chemical elements in the development of some plants, from seed germination to the development of roots, stems and leaves. It is known that the excess of certain elements restricts the biomass of stem and can alter the concentration of macro and micronutrients from soil preventing plant growth. In the present study beds with a mixture of soil and nickel slag ranging from 0 to 80% were prepared. The slag and soil were characterized by SEM (Scanning Electron Microscopy), EDS (energy dispersive spectroscopy) and X-ray diffraction. The SEM analysis showed that the particles are irregular, in the analysis via EDS showed that the iron and silicon are the predominant and X-ray diffraction showed that the phases are formed basically by titanium oxides, silicon oxides and iron oxides. Plants were chosen as strawberry (Fragaria x ananassa), cucumber (Cucumis sativus) and lettuce (Lactuca sativa) as possible bio-indicators for presenting a short development cycle. Keywords: Nickel slag; Bio-indicators; Environmental Characterization and Monitoring. INTRODUÇÃO Trabalhos têm sido realizados utilizando plantas para detecção da presença de elementos químicos no ambiente. Tais investigações se concentram na observação da ação dos elementos químicos no desenvolvimento, no que diz respeito às características biométricas, como tamanho das folhas, caule, raízes e frutos, sempre tendo em vista a comparação com uma planta referência. A importância de tais trabalhos consiste na utilização de plantas, como bioindicadores para monitoramento biótico e abiótico em relação a interferências no meio que possam vir a alterar o desenvolvimento natural do ecossistema da qual fazemos parte. De acordo com Chatterjee & Chatterjee (2000), o excesso de cobalto, cromo e cobre levou ao metabo-

lismo anormal de couve-flor, o que pode causar efeitos e desordens nos animais que consomem tais vegetais. Tais elementos foram adicionados como sulfato, na concentração de 0,5 mM. Para cada elemento foram observados sintomas, tais como mudança no aspecto foliar em relação à alteração de cores, tamanho e margens com má formação. O excesso de cobre restringiu o crescimento da couve-flor, enquanto o cobalto mostrou uma acumulação nas raízes e no caule e uma ação na concentração de elementos como ferro, manganês e zinco que são micro nutrientes essenciais, levando a alterações no desenvolvimento das raízes e caule, já o cromo tem ação semelhante, quanto ao desenvolvimento das folhas. Na Irlanda foram desenvolvidos trabalhos levando

Discente da Faculdade de Agronomia da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) Docente da Faculdade de Engenharia da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) Email: joao.zampieron@fespmg.edu.br 1 2


18

em consideração concentração de cobre e chumbo, verificando-se que o chumbo teve uma concentração principalmente nas raízes das monocotiledôneas. O propósito principal do estudo foi comparar as concentrações de cobre e chumbo nas raízes e brotos de uma quantidade de espécies de plantas localizados em pântanos ao longo do estuário Suir. O chumbo foi escolhido pelo fato de elevada concentração detectada nestas regiões, enquanto o cobre foi escolhido como indicador de poluição industrial e doméstica (FITZGERALD, et al., 2003). Segundo Lin, & Liu (2003), a germinação de sementes de girassol (Helianthus annuus L.) tratadas com íons cobre (Cu+2) em soluções de concentração de 10-5 M exibiram um aumento de 33% quando comparados com o comprimento das raízes do controle, já as sementes tratadas com concentrações de íons cobre de 10-3 M foram significativamente inibidas em relação ao crescimento dos brotos. O girassol mostrou neste estudo ter uma capacidade potencial para acumular íons cobre sem ser sensível a sua toxicidade. A poluição do solo por metais pesados tem sido uma grande preocupação nos últimos tempos, despertando interesse de alguns estudiosos para tal assunto. Os metais pesados ocorrem naturalmente em baixa concentração no solo, dentre eles podemos citar o cádmio, chumbo, níquel, etc. Entre os metais pesado, o cádmio merece especial atenção devido a sua alta mobilidade nos solos e devido a sua potencial toxidade para os seres vivos mesmo em baixas concentrações. Algumas espécies de plantas têm sido usadas como sensor para detectar a ecotoxidade do solo. Foi verificado que o crescimento e a germinação das sementes são bons indicadores para presença de metais, podendo ser utilizados como fator de bioacumulação (BAF) para metais específicos (AN et al., 2004). Alguns estudos utilizando plantas, tais como milho (Zea mays); trigo (Triticum sativum); pepino (Cucumis sativus) e sorgo (Sorghum bicolor) mostraram que as raízes do sorgo e do pepino são bons indicadores para ecotoxidade dos solos contaminados por cádmio (op cit.). Foi observado em pepinos (Cucumis sativus), que o fator de bioacumulação de um metal é influenciado por outros metais em misturas. O fator de bioacumulação é definido pela concentração do metal nas plantas (miligrama por kilograma de tecido seco) dividido pela concentração do metal no solo (miligrama por kilograma de solo seco). Tais pesquisadores mostraram que combinações de metais resultaram em um decréscimo de toxidade o que pode evidenciar que a bioacumulação pode ser inibida ou melhorada, dependendo das misturas de metais. Assim, combinações ternarias resultaram em um decréscimo de toxidade pelo pepino (Cucumis sativus) (AN et al., 2004). Trabalhos com distribuição de espécies sensíveis devido a contaminantes biodisponiveis no solo foram conduzidos utilizando níquel como metal de referên-

Ribeiro e Zamperion, 2011

cia. Tais ensaios mostraram que a toxidade das plantas e dependente da forma de como o níquel é extraído, o que pode reduzir a incerteza na interpretação dos dados obtidos, relativa à toxidade (SEMENZIN et al., 2007). Alguns organismos que vivem no solo apresentam alta importância ecológica, pois podem ser considerados como indicadores ecológicos para muitos poluentes nos solos. Os solos são sistemas dinâmicos e complexos devido a um número diferente de fatores bióticos e abióticos que determina os efeitos de substâncias potencialmente tóxicas. Estudos com minhoca (Eisenia fétida) evidenciou o efeito da toxidade do níquel, através da investigação da possível resistência ou adaptação, quando exposta a diferentes concentrações do níquel. Tal estudo mostrou um aumento da sensibilidade ao metal, através da mortalidade destas devido ao forte efeito toxico resultante (MALERI et al., 2007). Estudos realizados por Bigorgne et al. (2010) mostraram que Ni, Cr (III) e Cr (VI) podem ser genotóxico para organismos como minhocas (E. fetida), dependendo da propriedade do solo, levando em consideração a interação entre contaminantes. Nesse sentido, o presente trabalho pretende estudar a influência dos principais elementos constituintes da escória de níquel no desenvolvimento de plantas de crescimento rápido, quanto a possíveis alterações nas raízes, caules, folhas e frutos, fatores que poderão determinar a sensibilidade de tais plantas aos elementos citados. MATERIAIS E MÉTODOS • Obtenção da escória de níquel De acordo com Lima & Zampieron (2009), a partir da extração do minério do níquel, via mina subterrânea, este produto é encaminhado para um processo de beneficiamento, onde acontece a concentração dos metais valiosos (Ni,Cu,Co) para o processo de obtenção de níquel. O processo segue as etapas de britagem (quebra dos matacos, ou seja, quebra das pedras grandes), moagem, isto é, fragmentação das partículas para a adequação da malha, flotação, etapa onde acontece a separação dos metais valiosos, dos metais não valiosos. Os metais não valiosos são depositados na barragem de rejeito, e os valiosos seguem o circuito de espessamento (concentração do sólido), e a última etapa da concentração ocorre na filtragem, onde é retirada a umidade da polpa do concentrado, que é transportado para o processo e fundição. Primeiramente foi realizada coleta de amostras de escória proveniente da produção do matte de níquel pela Votorantim Metais, na unidade denominada Mineração Serra da Fortaleza, situada no município de Fortaleza de Minas (MG). Tais amostras foram retiradas de montanhas de rejeito que se encontram alocadas dentro da Mineração Serra da Fortaleza.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

19

Artigos - Ciências Agrárias

• Montagem dos canteiros As amostras de escória foram levadas para fazenda experimental da FESP|UEMG onde foram preparados quinze canteiros (Figura 1). Tais canteiros foram separados em três conjuntos de cinco recipientes, os quais apresentavam, além da escória, solo e esterco, sendo que para cada duas partes de solo foi agregada uma parte de esterco, sendo acrescentado ao fundo do recipiente brita com a finalidade de reter o solo e facilitar a vazão d’água. Cada canteiro foi constituído de solo mais uma porcentagem de escória de níquel dada nas seguintes proporções 0, 20, 40, 60,80% em massa de escória, sendo que o primeiro atuou como controle. Tais canteiros foram monitorados (105 dias), durante o crescimento das plantas. Foi instalado um sistema de coleta d’água utilizando-se recipientes de polietileno tereftalato (PET), os quais foram alojados no solo a fim de preservá-los contra possíveis choques mecânicos (Figura 2). Tais garrafas foram instaladas de forma a isolá-los da luz solar e preservar as propriedades da água coletada. Tais recipientes contendo mistura de solo e escória nas proporções mencionadas anteriormente, foram dispostos em uma área coberta por sombrite. • Seleções de plantas como bioindicadores Foram selecionados três espécies de plantas, baseando-se nas seguintes características: crescimento rápido e possível sensibilidade à composição do solo. As plantas escolhidas foram: alface (Lactuca sativa), pepino (Cucumis sativus) e morango (Fragaria ananassa). O objetivo foi verificar a que apresentaria a melhor resposta em relação aos elementos majoritários (Si e Fe) presentes na escória misturada nas diversas proporções ao solo dos canteiros. Trabalhos têm sido reportados, utilizando algumas dessas plantas como bioindicadores da presença de metais pesados como cádmio (AN et al., 2004). Foi utilizado um termômetro analógico marca HG® BRASIL modelo n° 1168/ 05 IMERSÃO TOTAL, e outro modelo digital de marca TFA, modelo Kat. Nr.30.1026, ambos para determinar uma temperatura média do local de plantio. Para verificar a intensidade de radiação solar foi utilizado um luxímetro digital

Figura 2: Sistema de coleta d’água. marca Minipa®, modelo MLM-1010. Após o desenvolvimento das plantas foram verificadas as dimensões das folhas, caules e raiz utilizando paquímetro marca Mitutoyo; e o número de pseudofrutos de morangos produzidos por tratamento. Tais dados foram transcritos em uma planilha Excel a fim de montar diagramas de bloco. Foi utilizada uma Câmera fotográfica digital marca SONY para obtenção de fotos, evidenciando detalhes dos canteiros e dos respectivos cultivares. • Composições do solo Foi analisada a capacidade do recipiente e observouse que o volume em massa ideal equivalia a 40 kg de terra, que é um material menos denso em relação à escória estudada. Foram preparadas assim composições contendo 0, 20, 40, 60 e 80% em massa de escória (Tabela 1). Foi retirada uma quantidade de solo a fim de realizar caracterizações via raios-x, microscopia eletrônica e espectroscopia por energia dispersiva. Também foram realizadas as mesmas caracterizações para escória de níquel proveniente de dois lotes diferentes, a fim de averiguar possíveis heterogeneidades de composição química. RESULTADOS E DISCUSSÃO O difratograma a seguir (Figura 3) revelou que o solo apresentava silicatos de alumínio e magnésio combinado com alumínio, magnésio e ferro combinado com titânio. A grande maioria das fases apresentadas na figura estão na forma de óxidos, o que é um fator positivo para grandes partes das plantas que têm afinidades para tais elementos. Pelo difratograma de raios-X da amostra de escória do primeiro lote (Figura 4), ou seja, escória proveniente de um processo mais antigo para obtenção de matte de níquel foi possível verificar a preponderância de silicatos de óxido de magnésio e óxido de ferro e também Tabela 1: Composição dos canteiros. Porcentagem de escória Composição dos canteiros (Kg)

Figura 1: Canteiros elaborados na fazenda experimental da FESP.

0

20

40

60

80

Terra e Esterco

40

32

24

16

8

Escória de Níquel

0

8

16

24

32


Ribeiro e Zamperion, 2011

20

Figura 3: Difratograma de raios-X de amostras do solo.

Figura 5: Difratograma de raios –X de escória do lote A2.

silicatos de cobalto. Tal composição de fases apresenta pontos positivos em sua constituição para o desenvolvimento das plantas como a presença do silício, magnésio dentre outros. É importante salientar que o diagrama nos mostra os elementos incorporados nas fases tais como olivine, forsterita, o que implica na baixa disponibilidade dos elementos para as plantas, devido a forte interação decorrente das ligações químicas primárias. Foi realizada uma difração de raios-X na amostra do segundo lote (Figura 5), para fins de comparação da composição da escória oriunda do processo de obtenção do matte de níquel. Pode se observar que a olivine é uma fase dominante, juntamente com oxido de magnésio de cobre. Tais observações demonstram que para cada lote de produção de matte de níquel gera-se escória de composição química diferentes, mostrando com isso a necessidade de caracterizar toda e qualquer coleta de amostras, devido às heterogeneidades constantes verificadas na presente análise.

que as partículas apresentam grande heterogeneidade quanto a sua morfologia e baixo empacotamento, permitindo uma maior permeabilidade do solo, o que é favorável ao desenvolvimento das raízes, o que pode ser observado através do crescimento acentuado da alface bem como morango (Figura 6C). Ainda a alface apresenta um formato irregular o que pode denotar um alto grau de fitoxicidade. O desenvolvimento de algumas plantas como a alface e o morango pode ser justificado pela possível interferência dos elementos constituintes da escória, tais como magnésio e cálcio, que podem ter tido um efeito de correção do alumínio existente no solo, verificado em análises via EDS. Segundo Lopes, (1984), o alumínio impede a absorção dos nutrientes do solo, acarretando um crescimento irregular da planta. Sendo assim, os elementos presentes na escória atuaram de forma benéfica no desenvolvimento das mesmas. No segundo lote pode-se verificar que não há diferenças quanto à morfologia das partículas que compõem a escória de níquel (Figura 7A). Sendo assim, os lotes provenientes das corridas da fundição apresentam como ponto comum a morfologia irregular e o baixo empacotamento o que confirma a permeabilidade e a potencial capacidade de sofrer lixiviação, já que o material é estocado a céu aberto, no pátio de rejeitos.

CARACTERIZAÇÃO VIA MEV DO SOLO E DA ESCÓRIA A análise do solo via Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) mostrou uma característica irregular quanto à morfologia dos seus componentes. Por ser pouco compactado, apresenta aspecto arenoso, o que pode auxiliar na permeabilidade do solo juntamente com a alta quantidade de material orgânico presente, como sugere a micrografia (Figura 6A). Na análise da escória (Figura 6B) pôde-se observar

Figura 4: Difratograma de raios-X do lote A1.

CARACTERIZAÇÃO VIA EDS DO SOLO E DA ESCÓRIA Nas análises para detectar a composição do solo (Figura 7B) foi utilizada a técnica de espectroscopia por energia dispersiva, onde se pôde verificar que há uma quantidade acentuada de alumínio, o que pode restringir o crescimento. Isto é confirmado pelo tipo de vegetação do cerrado, cujas plantas apresentam aspectos de galhos retorcidos e baixa estatura, como já foi citado em observações anteriores. Foram realizadas análises de dois lotes de escória, via Espectroscopia por Energia Dispersiva (EDS), a fim de comparar possíveis diferenças na composição das mesmas. O primeiro lote (Figura 7C) mostrou que o silício e o ferro são elementos predominantes nesse tipo de material. No segundo lote (Figura 7D) pôde-se verificar


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

21

Artigos - Ciências Agrárias

(A)

(B)

Figura 6: (A) Micrografia do solo utilizado nos canteiros; (B) Micrografia da escória de níquel; (C) Foto ilustrando o desenvolvimento da Alface.

(C) uma diminuição na quantidade de silício, o que sugere que este elemento pode ter sido incorporado no processo de fundição para obtenção do matte de níquel, denotando que os processos não ocorrem de forma homogênea. Tais observações permitem afirmar que cada processo ou lote apresenta uma variação na quantidade e na composição dos elementos constituintes da escória, tornando necessário à cada coleta realizar uma caracterização, a fim de ter um controle nas possíveis aplicações de tal escória. Salienta-se ainda que a falta de reprodutividade evidenciada pelas análises do primeiro lote e no segundo lote mostra uma possível barreira para sua aplicação. LEVANTAMENTO DOS DADOS MORFOLÓGICOS DA ALFACE Na alface (Lactuca sativa), o silício e o ferro podem ter contribuído para atenuar os efeitos do alumínio no solo, resultando no sensível desenvolvimento de folhas e crescimento das raízes, quando submetidas a uma

composição até 80% de escória, como pode ser verificado nas medidas biométricas da (Figura 8A). LEVANTAMENTO DOS DADOS MORFOLÓGICOS DO PEPINO Na cultura de pepino (Cucumis sativus), (Figura 8B) notou-se um maior desenvolvimento na raiz e no comprimento dos frutos, o que está de acordo com as pesquisas realizadas por An et al. (2004), que observaram tais efeitos nas raízes da presente planta. No caule do pepino houve um desenvolvimento menor, nos canteiros contendo a escória, o que possivelmente deve-se à forte presença do silício e ferro. Ou seja, pode ter ocorrido inibição do seu desenvolvimento. Verificou-se que na composição com 80%, o caule teve um desenvolvimento melhor, em relação aos demais contendo escória (Figura 8C). Isso pode ter ocorrido devido à localização do canteiro, já que este recebia água das culturas vizinhas.

(A)

(B)

(C)

(D)

Figura 7: (A) Micrografia da escória de níquel lote A2; (B) EDS do solo determinando os elementos constituintes; (C) EDS do primeiro lote de escória; (D) EDS do segundo lote de escória.


, 2011

22

(A)

(B)

(C)

(D)

Figura 8: (A) Dados morfológicos da alface (Lactuca sativa); (B) Dados morfológicos do pepino (Cucumis sativus); (C) Desenvolvimento do caule do pepino em relação a proporção de escória; (D) Dados morfológicos do morango (Fragaria ananassa). LEVANTAMENTO DOS DADOS MORFOLÓGICOS DO MORANGO Quanto ao morango (Fragaria ananassa), nota-se que o melhor desenvolvimento das raízes (Figura 8D), foi obtido a 60% de escória, evidenciando que a raiz atuou como um bom indicador do desenvolvimento mantendo as demais medidas. Os pseudofrutos do morango possibilitaram uma análise mais ampla, pois a quantidade de morangos produzidos é propocional a quantidade de escória utilizada nos tratamentos (Figura 9), o que pode ser decorrente da possível afinidade do morango com silício e ferro existentes na escória. CONCLUSÃO As análises comparativas da escória evidenciaram a heterogeneidade entre os lotes, implicando na necessidade da caracterização de toda e qualquer amostra que for coletada. As micrografias da escória mostraram uma morfologia irregular o que auxilia na permeabilidade do solo. As avaliações via EDS mostraram que o silício e o ferro são elementos predominantes, embora haja diferença de lote para lote. Dentre as plantas escolhidas, as diferenças biométricas em suas partes podem ser consideradas como

bioindicadoras da presença da escória no solo, ou seja, na alface ocorreram nas folhas e raízes, enquanto que o morango apresentou tais diferenças nas quantidades de pseudofrutos e também nas raízes em solos contendo até 60% de escória, e no pepino essas diferenças se apresentaram tanto nas raízes quanto no comprimento dos frutos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AN,Y,J; KIM.Y.M.; KWON.T.I.; JEONG.S.W. Combined effect of copper, cadmium, and lead upon Cucumis sativus growth and bioaccumulation. Science of the Total Environment. Coréia do Sul 2004: v.127, 2004, p. 21-26. BIGORNE.E ; REINECKE, A. J.; REINECKE,S.A. Genotoxic effects of nickel, trivalent and hexavalent chromium on the Eisenia fetida earthworm. Chemosphere, França 2010. CHATTERJEE, J. ; CHATTERJEE, C. Phytotoxicity of cobalt, chromium and copper in cauliflower. Environmental Pollution. India 2000: v.109, 2000, p.69-74. FITZGERALD, E. J. ; CAFFREY, J.M ; .NESARATNAM,S.T; MCLOUGHLIN, P. Copper and lead concentrations in salt marsh plants on the Suir Estuary, Ireland. Environmental Pollution. Irlanda 2003: v.123, 2003, p.67-74. LIN, J.:JIANG,W.; LIU,D. Accumulation of copper by roots, hypocotyls, cotyledons and leaves of sunflower (Helianthus annuus L.) Bioresource Technology. China 2003: v. 86, 2003, p. 151-155. LIMA, R. L.; ZAMPIERON, J.V. Avaliação da escória de níquel como possível matéria prima para pigmento cerâmico.Ciência et Praxis, v2, n.4, 2009 LOPES, A. S. Solos Sob “Cerrado”: Características propriedades e manejo. Piracicaba: Associação Brasileira para pesquisa da potassa e do fosfato, 2° Edição, 1984, 162. MALERI.R.A; REINECKE.A.J; REINECKE.S.A. A comparison of nickel toxicity to pre-exposed earthworms (Eisenia fetida, oligochaeta) in two different test substrates. Soil Biology & Biochemistry. Africa do Sul 2007: v. 39, 2007, p. 2849- 2853.

Figura 9: Quantidade de frutos em relação a quantidade de escória.

SEMENZIN.E.; TEMMINGHOFF.E.J.M.; MARCOMINI.A. Improving ecological risk assessment by including bioavailability into species sensitivity distributions: An example for plants exposed to nickel in soil. Environmental Pollution. Italia 2007: v. 148, 2007, p. 642-647.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

23

Artigos - Ciências Biológicas

Avaliação da qualidade higiênico-sanitária do leite cru refrigerado produzido em propriedades leiteiras do município de Passos e região Evaluation of the hygienic-sanitary quality of the refrigerated raw milk produced in milk farms in the municipality of Passos and region in Minas Gerais Odila Rigolin de Sá1; Norival França1; Keyla Cristiane Pereira Esper2; Karyna Cristilaine Pereira2; Neilma Campos Souza2; Talita Maria da Silva2 Resumo: O volume de produção mundial de leite, correspondeu a 583.401.740 mil toneladas litros, deixando o Brasil como o quinto maior produtor mundial de leite, com 29,112 mil toneladas litros produzidos em 2009. Com estimativa de aproximadamente 30,7 mil toneladas litros para 2011. Segundo a EMBRAPA (2011) em 2009 a produção de leite em Minas Gerais atingiu 7.931.115 mil de litros, com estimativa para 2010 de aproximadamente de 8.231.295 mil litros, participando com 27% da produção brasileira, deixando Minas Gerais em primeiro lugar na produção de leite por Estado. O presente estudo teve como objetivo avaliar a qualidade higiênico-sanitária do leite cru refrigerado produzido em 11 propriedades leiteiras do Sudoeste Mineiro. Foram coletadas 110 amostras de leite cru refrigerado. Juntamente com as coletas das amostras foi aplicado um questionário pré-estabelecido e por observação “in locu”. Os resultados para coliformes totais, 104 amostras (94,54%) apresentaram valores elevados. Para coliformes termotolerantes, 68 amostras (61,81%) apresentaram contaminadas pelo grupo fecal. Já na contagem bacteriana total, 14 amostras (12,72%) apresentaram contagens superiores ao limite estabelecidos pela Instrução Normativa 51 (2002) que é até 100.000 UFC/mL.Em relação ao sistema de ordenha foi encontrado cinco propriedades com circuito fechado com fosso, quatro com circuito fechado sem fosso e duas com circuito aberto com animal no mesmo nível da ordenha. Apesar da maior parte dos produtores terem afirmado realizar práticas de higienização antes, durante e após ordenha foram verificados médias de CBT acima da legislação permitida e contagem de coliformes elevados nas propriedades leiteiras. Portanto, torna-se evidente a necessidade de adoção de medidas que visem melhorar a qualidade do leite antes de submetê-lo a qualquer tratamento térmico. Palavras-chave: Análises microbiológicas; Leite. Abstract: The volume of the world milk production corresponded to 583, 401,40 thousand tons/liter, putting Brazil as the fifth biggest milk producer in the world with 29,112 thousand tons/liter produced in 2009, estimating about 30,7 thousand tons/liter for 2011. According to EMBRAPA (Brazilian Enterprise for Agricultural Research) the milk production in Minas Gerais reached 7,931,115 liters in 2009, estimating about 8,231,295 liters for 2010, participating with 27% of the Brazilian production, putting Minas Gerais at first position when it comes to milk production in each state. This present study had the objective of evaluating the hygienic-sanitary quality of the refrigerated raw milk produced in eleven milk farms in the Southeastern Minas Gerais. 110 samples of refrigerated raw milk were collected and together with the sample collect a pre-established questionnaire was given and also “in loco” observation. The results for total coliforms, 104 samples (94,54%) presented increased values. For thermotolerant coliforms 68 samples presented contaminated by the fecal group. In the Total Bacterial Count, 14 samples (12,72%) presented counting superior to the established limits by the Normative 51 (2002) which is 100,000UFC/mL. Regarding the milking system, five milk farms were found with closed circuit with a hole, four with closed circuit without a hole and two with open circuit with animals on the same point of milking. Although most of the farmers affirmed that they have hygienic practice before, during and after milking, averages of TBC above the permitted legislation and elevated coliform counting were checked on the milk farms. Therefore it is evident the necessity of adopting measures to improve the milk quality before submitting it to any thermical treatment. Keywords: Microbiological Analyses; Milk.

1 2

Docente da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG). Email: odilarigolin@yahoo.com.br Dicente do Curso de Ciências Biológicas da Fundação do Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG)


24

INTRODUÇÃO A produção de leite no Brasil é considerada uma das principais atividades agropecuárias, que fornece alimento à população. Sua importância socioeconômica pode ser constatada pela posição que ocupa no agronegócio brasileiro, ou seja, é um dos principais setores de geração de renda nacional e arrecadação tributaria. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) 2011, o volume de produção mundial de leite, correspondeu a 583.401.740 mil toneladas litros, deixando o Brasil como o quinto maior produtor mundial de leite, com 29,112 mil toneladas litros produzidos em 2009. Com estimativa de aproximadamente 30,7 mil toneladas litros para 2011. Segundo a EMBRAPA (2011) em 2009 a produção de leite em Minas Gerais atingiu 7.931.115 mil de litros, com estimativa para 2010 de aproximadamente de 8.231.295 mil litros, participando com 27% da produção brasileira, deixando Minas Gerais em primeiro lugar na produção de leite por Estado. A exigência do aumento do padrão de qualidade na obtenção do leite e derivados foi crescente no Brasil, a partir dos anos 90, com o objetivo de ser nivelado aos padrões do Mercosul e a industria de lácteos, além de atender à demanda crescente dos consumidores por produtos de qualidade a custos compatíveis. O Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite (PNMQL), regulamentado em 2002, representou para o setor lácteo um grande avanço com destaque para a modernização da legislação nacional. A mudança de maior impacto foi refrigeração do leite na fonte de produção e o seu transporte a granel regulamentado pela Instrução Normativa n°51, de 18 de setembro de 2002 (BRASIL, 2002), que permitiu a redução dos custos operacionais de produção e perdas por qualidade. Segundo a Instrução Normativa n°51 de 18 de setembro de 2002 (BRASIL, 2002), o processo de coleta de leite cru a granel consiste em recolher o produto em caminhões isotérmicos construídos internamente de aço inoxidável, através de mangote flexível e bomba sanitária, acionada pela energia elétrica da propriedade rural, pelo sistema de transmissão ou caixa de câmbio do próprio caminhão, diretamente do tanque de refrigeração por expansão direta ou dos latões contidos nos refrigeradores de imersão. O tanque de refrigeração por expansão direta deve ser dimensionado de modo tal que permita refrigerar o leite até temperatura igual ou inferior a 4°C no tempo máximo de 3 horas após o término da ordenha, independentemente de sua capacidade. Por sua composição, o leite é considerado um dos alimentos mais completos em termos nutricionais e fundamentais para dieta humana, mas pela mesma razão, constitui num excelente substrato para o de-

Rigolin-Sá et al., 2011

senvolvimento de uma grande diversidade de microrganismos, inclusive os patogênicos. Daí a qualidade do leite ser uma constante preocupação para técnicos e autoridades ligadas à área de saúde, principalmente pelo risco de veiculação de microrganismos relacionados com surtos de doenças de origem alimentar (LEITE JR; TORRANO; GELLI, 2000; TIMM et al., 2003). A disponibilidade de nutrientes no leite, sua alta atividade de água e seu pH próximo na neutralidade torna-o meio extremamente favorável ao crescimento microbiano. A ação das bactérias ou de suas enzimas sobre os componentes lácteos causa várias alterações no leite e seus derivados. Esses defeitos incluem sabores e aromas indesejáveis, diminuição da vida de prateleira, interferência nos processos tecnológicos e redução do rendimentos, especialmente de queijos (HICKS et al., 1982; CHAMPAGNE et al., 1994). Muitas bactérias contaminantes do leite cru produzem enzimas extracelulares (proteases e lipases) termorresistentes, cuja atividade residual afeta a qualidade dos produtos finais, mesmo na ausência de células bacterianas viáveis (Muir, 1996; Chen et al., 2003). A contaminação bacteriana do leite cru pode ocorrer a partir do próprio animal, do homem e do ambiente. Exceto em casos de mastite, o leite ejetado apresenta baixo número de microrganismos, que não constituem riscos à saúde. Do ponto de vista tecnológico, os microrganismos de maior importância são os que contaminam o leite durante e após a ordenha. Essa contaminação é variável, tanto qualitativa quanto quantitativa, em função das condições de higiene existentes (Froeder et al., 1985). A obtenção do leite de vacas sadias, em condições higiênicas adequadas, e o seu resfriamento imediato a 4ºC são as medidas fundamentais e primárias para garantir a qualidade e a segurança do leite e seus derivados. Microorganismos indicadores são grupos ou espécies de microorganismos que, quando presentes no alimento, podem fornecer informações sobre a contaminação fecal, com provável presença de patógenos ou com deterioração potencial do alimento, além de poderem indicar condições sanitárias inadequadas durante o processamento, produção ou representados principalmente pelos gêneros Klebsiella, Escherichia, Citrobacter e Enterobacter e que fermentam a lactose, produzindo ácido e gás quando incubados a 35º C por 24-48h (Silva et al., 1997). Os coliformes fecais pertencem ao grupo dos coliformes totais que continuam fermentando a lactose, produzindo ácido e gás quando incubados a 44,5ºC +/- 0,5º C por 24h (Silva et al., 1997). A Instrução Normativa 51/2002 assumiu grande importância educadora no agronegócio do leite


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

25

Artigos - Ciências Biológicas

fluido, evidenciando a valorização da qualidade do leite e a punição da má qualidade ao longo da cadeia produtiva do campo até a mesa, pela via de mercado. O produtor é incentivado a melhorar, porque participa de programas de pagamento por qualidade, e o consumidor mais consciente, passou a exigir da indústria produtos com certificados de garantia de qualidade e rastreabilidade. A análise laboratorial mais utilizada para monitorar a qualidade microbiológica do leite cru é Contagem Bacteriana Total (CBT). A CBT quantifica o número total de bactérias presentes no leite cru, mas não identifica grupos específicos de bactérias que se proliferam quando há falhas nos processos de produção, ordenha e armazenamento. Além da CBT, outras análises podem ser utilizadas para avaliar a qualidade do leite, como a contagem de coliformes. A contagem de coliformes é utilizada em programas de qualidade como indicador de contaminação fecal, a partir do solo, cama dos animais e água contaminada. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) estabeleceu padrões e normas para a produção de leite no país, envolvendo a CBT (BRASIL, 2002). As normas estão contidas na Instrução Normativa no51 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), de 18 de setembro de 2002 que entrou em vigor em 1° de julho de 2005 na região sul, sudeste e centro-oeste; o produtor de leite teria de atender às exigências da Instrução Normativa n°51, de 18 de Setembro de 2002; no caso da região sudeste, até o ano de 2011, mas de acordo com a Instrução Normativa 62/2011 que altera a Instrução Normativa 51/2002 foi prorrogada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento o prazo até julho de 2012. O presente estudo teve como objetivo avaliar a qualidade higiênico-sanitária do leite cru refrigerado produzido em 11 propriedades leiteiras do Sudoeste Mineiro. MATERIAL E MÉTODOS Foram realizadas no período de julho a novembro de 2011, coletas em 11 propriedades leiteiras, localizadas no Sudoeste do estado de Minas Gerais, com amostras mensais em duplicata totalizando 110 amostras. As propriedades foram classificadas de acordo com a sua produção mensal: (A) produtora de 11.000 litros/dia, localizada em São João Batista do Glória; (B): produtora de 2.300 litros/dia, localizada em Passos; (C) produtora de 500 litros/dia, localizada em Passos; (D) produtora 450 litros/dia, localizada em Passos; (E) produtora de 1.700 litros/ dia, localizada em Passos; (F) produtora de 1.250 litros/dia, localizada em Passos; (G) produtora 2.500 litros/dia, localizada em São João Batista do Glória;

(H) produtora 2.200 litros/dia, localizada em Passos; (I) produtora 650 litros/dia localizada em Passos; (J) produtora de 750 litros/dia, localizada em Passos e (K) produtora de 1.300 litros/dia, localizada em Passos. As amostras de leite foram coletadas em tanques resfriadores. De cada propriedade leiteira, as amostras foram coletadas em frascos estéreis contendo conservante azidiol para análises microbiológicas e para contagem da Unidade Formadora de Bactérias (UFC). Depois de coletadas, as amostras foram conservadas em recipientes isotérmicos com gelo reciclável, com temperatura de refrigeração (4ºC) e encaminhadas para análises laboratoriais no Laboratório de Análises Ambientais e Produtos Alimentícios - LAAPA, localizado na Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) (S 20º43’31.02” W 46º36’42.07”). Para a análise de coliformes totais e termotolerantes, foi utilizada a técnica de tubos múltiplos onde foi utilizado para coliformes totais o meio Caldo Lactosado Verde Brilhante e Bile 2% (VBLB) com incubação a 35°C durante 24-48 horas. Tubos de VB positivos foram repicados para tubos com caldo E.coli, utilizado para determinar a presença de coliformes termotolerantes (E. coli). Após a incubação a 45°C durante 24 horas foi registrado o número de tubos com crescimento positivo para a presença de coliformes termotolerantes (turbidez e gás) e determinado o NMP/ mL como descrita no Compedium of Methods for the Microbiological Examination of Foods (Vanderzant & Splittstoesser, 1992) e os resultados foram obtidos na tabela Bacteriological Analytical Manual, 1984. A Contagem Bacteriana Total avalia a contagem de microorganismos Mesófilos Aeróbios Estritos ou Facultativos. A técnica de contagem consistiu em quantificar um grupo de bactérias, presentes no leite por meio de inoculação da amostra em placas e, posteriormente, incubação à temperatura de 32(±1)oC, por 48 horas. O meio de cultura utilizado nas placas foi o Plate Count Agar (PCA), que apresenta nutrientes que permitem a multiplicação bacteriana. O resultado foi obtido pela contagem das colônias e expresso em Unidade Formadora de Colônias (UFC) (PRATA, 2001). Juntamente com as coletas das amostras, foi aplicado um questionário pré-estabelecido e por observação em “locu” nas propriedades para o conhecimento das características de produção leiteira das propriedades. O questionário foi respondido pelos próprios proprietários. RESULTADOS E DISCUSSÃO O controle da qualidade do leite se inicia com uma ordenha feita com condições adequadas de higiene, em local arejado e adequado para tal procedimento (SANTOS e FONSECA, 2007). Existem basicamente dois


26

tipos de ordenha: a mecânica e a manual. A primeira é do tipo balde ao pé ou circuito fechado e a segunda pode ser com ou sem a presença da cria. Independente do sistema, os equipamentos de ordenha e os tetos dos animais devem ser devidamente higienizados e desinfetados para que não cause aumento da carga microbiana do leite após a sua ordenha (SANTOS e FONSECA, 2007). O controle higiênico-sanitário dos rebanhos e da ordenha é fundamental para se garantir a composição ideal do leite e reduzir o risco de transmissão de agentes de doença. A temperatura e o período de tempo de armazenagem do leite são extremamente importantes, uma vez que estes fatores estão diretamente ligados com a multiplicação dos microrganismos presentes no leite, afetando, conseqüentemente, a contagem bacteriana total (GUERREIRO et al., 2005) Segundo YAMAMURA (2008), a eficácia do pré e pós-dipping pode ser influenciada pelo tipo de anti-séptico, pela presença de matéria orgânica, pela falta de reposição do produto e pelo tipo de aplicador utilizado. O pré-dipping pode prevenir a contaminação do equipamento de ordenha por microrganismos de origem ambiental encontrados na superfície do teto e o pós-dipping, de microrganismos adquiridos durante o processo de ordenha. Foi observado que a eficácia de anti-sépticos, como o iodo, é influenciada pela presença de matéria orgânica, como fezes e leite, incorporados ao produto pela limpeza incorreta dos tetos. A não-higienização dos tetos com água antes da ordenha e a utilização de aplicador com retorno do anti-séptico estariam associados à maior ocorrência da infecção. A temperatura dos tanques refrigeradores nas propriedades A, B, C, D, E, F, G, H, J e K estão todas entre 4º a 7ºC, enquanto somente a propriedade leiteira I encontrou-se com temperatura elevada de 10º a 20ºC (Tabela 1). A qualidade do leite está diretamente relacionada à saúde, alimentação e manejo dos animais, com a qualificação da mão-de-obra, higiene dos equipamentos e utensílios utilizados durante a ordenha, bem como o transporte adequado até a indústria (PINNA e LIZIEIRE, 2000). No manejo após a ordenha apenas duas propriedades leiteiras possui FreeStall enquanto que as outras o manejo é feito no pasto ou no cocho do curral (Tabela 1). Em relação ao sistema de ordenha encontraram-se cinco propriedades com circuito fechado com fosso, quatro com circuito fechado sem fosso e duas com circuito aberto com animal no mesmo nível da ordenha. Apesar de representar um importante aspecto na tecnificação, a adoção de ordenha mecânica não indica necessariamente uma melhoria na qualidade do leite já produzido, já que suas tubulações

Rigolin-Sá et al., 2011

podem representar fontes adicionais de contaminação caso não ocorra uma higienização adequada (KLUNGEL, SLAGHUIS e HOGEVEEN, 2000). No que concerne à alimentação, a maioria das propriedades fornece silagem e ração como principal fonte de volumosos para seus animais, apenas uma propriedade (A) fornece TRM (ração total). Quanto as raças dos animais ordenhadas encontrou-se duas propriedades (A e K) animais da raça Holandesa e em três propriedades (E, F e H) da raça Girolanda sendo que na propriedade leiteira (E) também encontrou-se búfalas compondo o rebanho. Nas demais propriedades as raças são variadas. No quesito de práticas de higiene adotadas durante a ordenha, 10 produtores responderam que utilizavam práticas de higienização no momento da atividade. Verificou-se que 6 realizavam pré e pósdipping como práticas rotineiras durante a ordenha do leite, os demais realizavam apenas o pré-dipping sendo que uma propriedade (F) realizava as práticas rotineiras com bezerro ao pé. A presença do bezerro ao pé durante a lactação diminui a incidência de mastite, pelo esgotamento da glândula mamária, com diminuição do leite residual e consequente redução do crescimento de microrganismos causadores da doença (ZEGARRA et al., 2007; BRANDÃO et al., 2008). Por outro lado, Brito et al. (2000) relataram a ocorrência de maiores níveis de infecção da glândula mamária quando há o manejo de bezerro ao pé. Apesar da maior parte dos produtores terem afirmado realizar práticas de higienização antes, durante e após ordenha foram verificadas médias de CBT acima das permitidas pela legislação e contagem de coliformes elevados em algumas propriedades leiteiras. Este fato provavelmente ocorre devido os funcionários responsáveis pelo manejo de ordenha que, mesmo conhecendo as boas práticas de produção, ainda não se conscientizaram da sua real importância para a produção de leite de excelente qualidade e manutenção da saúde animal. Das 110 amostras de leite cru refrigerado coletadas, todas foram avaliadas para a contagem de coliformes e contagem bacteriana total. Para coliformes totais, 104 amostras (94,54%) apresentaram valores elevados. Para coliformes termotolerantes 86 amostras (78,18%) apresentaram contaminados pelo grupo fecal. Já na contagem bacteriana total (CBT) 40 amostras (36,36%) apresentaram contagens superiores ao limite estabelecido pela Instrução Normativa 51 (2002) alterada pela Instrução Normativa 62/2011 que é até 100.000 UFC/mL. A grande quantidade de amostras contaminadas por coliformes faria com que a CBT estivesse com mais amostras fora do padrão, uma vez que não tenha prática de higiene. Mas sabemos que Hogan et


Tipo de Ordenha

Circuito Fechado (Fosso)

Circuito Fechado (Fosso)

Circuito Fechado (mesmo nível)

Circuito Aberto (mesmo nível)

Circuito Fechado (mesmo nível)

Circuito Fechado (mesmo nível)

Circuito Fechado (Fosso)

Circuito Fechado (Fosso)

Circuito Aberto (mesmo nível)

Circuito Fechado (mesmo nível)

Circuito Fechado (Fosso)

Propriedades L/dia

A 11.000

B 2.300

C 500

D 450

E 1.700

F 1.250

G 2.500

H 2.200

I 650

J 750

K 1.300

Pre-dipping e Pós-dipping

Pre-dipping e Pós-dipping

Pre-dipping

Pre-dipping

Pre-dipping e Pós-dipping

Bezerro ao pé

Pre-dipping

Pre-dipping

Pre-dipping

Pre-dipping e Pós-dipping

Pre-dipping e Pós-dipping

Pré-dipping e Pós Dipping

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

Não

Sim

Não

Não

Sim

Sim

Teste da Caneca

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

Não

Sim

Não

Não

Sim

Sim

Teste de CMT

Freestaal e Pasto

Cocho

Cocho

Pasto e cocho

Cocho

Pasto e Cocho

Cocho

Pasto

Cocho

Cocho

Dentro e Fora do Freestall

Manejo após a ordenha

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

Sim

Higienização

4a7

4a7

10 a 20

4a7

4a7

4a7

4a7

4a7

4a7

4a7

4a7

Temperatura (°C)

Holandesa

variada

Variada

Girolanda

Variada

Girolanda

Girolanda e Búfala

Variada

Variada

Variada

Holandesa

Raça

Sim

Não

Não

Não

Não

Não

Não

Não

Não

Não

Sim

Free stall

Silagem + ração

Silagem

Silagem + ração

Silagem + ração

Silagem + ração no cocho

Controlada

Silagem + milho

Variada

Silagem + ração + caroço de algodão

Silagem + milho

TRM Ração Total

Alimentação

Tabela 01: Características de produção e de ordenhas das propriedades estudadas no município de Passos e São João Batista do Glória (MG).

Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

Artigos - Ciências Biológicas

27


28

al. (1998) afirmaram que a CBT é influenciada pela umidade e temperatura do ambiente. No entanto, devemos considerar que se a temperatura dos tanques de refrigeração de cada propriedade leiteira durante a coleta estivesse dentro dos padrões estabelecidos pela IN 51 (2002), pode-se dizer que a contaminação se deu por falta de higiene na ordenha e armazenamento. A contaminação dos produtos lácteos por bactérias CBT pode originar-se do suprimento de água de qualidade inadequada, deficiências de procedimentos de higiene e mastite (ENEROTH, et al, 2000). Portanto, procedimentos de higienização empregados na cadeia produtiva do leite constituem pontos críticos para a obtenção de uma matéria-prima de alta qualidade. Programas de Qualidade na cadeia produtiva do leite garantem o consumo de produtos saudáveis, com bom valor nutricional, e sem dúvida são a garantia da qualidade e da inocuidade dos produtos oferecidos aos consumidores, o que também promove a diminuição de perdas durante a produção, originadas principalmente por matérias-primas de baixa qualidade e pela falta de padronização dos produtos. A ocorrência de resultados elevados pode indicar existência de falhas generalizadas nos procedimentos de ordenha e refrigeração do leite na propriedade (BRAMLEY E MCKINNON, 1990; MARSHALL, 1991; MURPHY E BOOR, 1998; SORIANO et al 2001). A suposição de falhas na higiene de ordenha reforçase pelos resultados obtidos no estado de Goiás por Andrade (1997) e Dias Filho (1997) que constataram procedimentos inadequados por parte dos ordenhadores e comprovaram sua relação com a qualidade do leite. A falta de realização adequada da limpeza e sanitização do tanque de refrigeração também contribuem para o comprometimento da qualidade microbiológica do leite (MENDONÇA et al., 2001a). No entanto, Bueno et al. (2004) verificaram que em 41,21% de 859 tanques de refrigeração de leite de uso individual, no estado de Goiás, o leite estava com temperatura superior a 4oC no momento de captação pelo caminhão e que a contagem bacteriana total do leite refrigerado e conservado durante 48 horas acima de 7oC era significativamente maior do que a do leite refrigerado e conservado em temperaturas inferiores a esse limite. Segundo Pereira & Rigolin-Sá (2006) estudos de análises de leite e queijo na região da Canastra, MG mostraram que constantes orientações higiênicosanitárias dos produtores e um trabalho de extrema importância, para que estes obtenham o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF) e possam comercializar legalmente seus produtos em todo território nacional e internacional.

Rigolin-Sá et al., 2011

CONSIDERAÇÕES FINAIS O controle higiênico-sanitário dos rebanhos e da ordenha é fundamental para se garantir a composição ideal do leite e reduzir o risco de transmissão de agentes de doença. A quantificação bacteriana do leite cru auxilia na avaliação dos procedimentos de ordenha e armazenamento do leite na propriedade leiteira e ao mesmo tempo, permite inferir os prováveis efeitos adversos sobre o rendimento industrial e segurança alimentar do leite. Apesar da maior parte dos produtores terem afirmado realizar práticas de higienização antes, durante e após ordenha foram verificadas médias de CBT acima das permitidas pela legislação e contagem de coliformes elevados em algumas propriedades leiteiras. Portanto, torna-se evidente a necessidade de adoção de medidas que visem melhorar a qualidade higiênico-sanitária do leite antes de submetê-lo a qualquer tratamento térmico. Há muitos aspectos que devem ser empregados para melhorar a qualidade do leite produzido, tais como campanhas educacionais, profissionais capacitados e incentivos aos produtores de leite. Ações educacionais e um comprometimento mais efetivo dos serviços de inspeção também são importantes ferramentas a serem utilizadas como uma forma de auxiliar a melhora das condições produtivas e influenciar positivamente a qualidade do leite produzido e consumido no Brasil. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, M.A. Mastite Bovina Subclínica: prevalência, etiologia e freqüência de patógenos isolados das mãos de ordenhadores e teteiras, e testes de sensibilidade a drogas antimicrobianas. 1997. 113 f. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) – Escola de Veterinária – Universidade Federal de Goiás, 1997. APHA - American Public Health Association. Compendium of methods for the microbiological examination of foods. 3.ed. Washington ; 1992. BRAMLEY, A.J.; McKINNON, C.H. The microbiology of raw milk. In: ROBINSON, R.K. Dairy Microbiology: The microbiology of milk. 2. ed. Barking: Elsevier Science Publishers, 1990. p.163-208. BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Regulamentos Técnicos de Produção, identidade, qualidade, coleta e transporte de leite. Instrução Normativa N° 51, de 18 Setembro de 2002. Brasília, 2002. BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa Nº 62 de 29 de Dezembro de 2011. Disponível em: www3.servicos. ms.gov.br/iagro_ged/pdf/1824_GED.pdf. Acesso em 31/01/2011


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

29

Artigos - Ciências Biológicas

BUENO, V.F.F.; MESQUITA, A.J.; NEVES, R.B.S.; MANSUR, J.R.G.; OLIVEIRA, J.P.; ROSA, A.F.L. Influência da temperatura de armazenamento e do sistema de utilização do tanque de expansão na qualidade microbiológica do leite cru. Revista Higiene Alimentar, v. 18, n. 124, p. 62-67, 2004. BRANDÃO, F.P. et al. Influência da presença do bezerro no momento da ordenha sobre o desempenho produtivo e incidência de mastite subclínica em vacas mestiças holandês-zebu e desempenho ponderal dos bezerros. Revista Ceres, v.55, n.6, p.525-531, 2008; BRITO, J. R. F.; PAIVA E BRITO, M. A. V.; VERNEQUE, R. S. Contagem bacteriana da superfície de tetas de vacas submetidas a diferentes processos de higienização, incluindo a ordenha manual com participação do bezerro para estimular a descida do leite. Ciência Rural, Santa Maria, v. 30, n. 5, p. 847-850, 2000. CHAMPAGNE, C. P.; LAING, R. R.; ROY, D. et al. Psycrhrotrops in dairy products: their effects and their control. Crit. Rev. Food Sci. Nutr., v. 34, p. 1-30, 1994. CHEN, L.; DANIEL, R. M.; COOLBEAR, T. Detection and impact of protease and lipase in milk powders. Int. Dairy J., v 13, p. 255-275,2003. DIAS FILHO, F. C. Perfil do produtor e características das propriedades rurais que utilizam ordenhadeira mecânica na bacia leiteira de Goiânia – GO. 1997. 63 p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Veterinária – Universidade Federal de Goiás, 1997. ENEROTH, A.; AHRNÉ, S.; MOLIN, G. Contamination of milk with Gram-negative spoilage bacteria during filling of retail containers. International Journal of Food Microbiology, v. 57, p. 99-106, 2000 a. EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa agropecuária. Gado de Leite. 2011. Disponível em: www.cnpgl. embrapa.br/nova/informacoes/estatisticas/producao/ tabela0240.php. Acesso em: 31/01/2011 FROEDER, E.; PINHEIRO, A. J. R.; BRANDÃO, S. C. C. Variação da qualidade microbiológica do leite cru tipo C da Região de Viçosa. Rev. Inst. Lat. Cândido Tostes, v. 40, p. 55-68, 1985. FAO. Food and Agriculture Organization. Food Outlook. June 2011. Milk and Milk products. 104p. Disponível em: www.fao.org HOGAN, J.S.; HOBLET, K.H.; SMITH, K.L.; TODHUNTER, D.A.; SCHOENBERGER, P.S.; HUESTON, W.D.; PRITCHARD, D.E.; BOWMAN, G.L.; HEIDER, L.E.; BROCKETT, B.L.; CONRAD, H.R. Bacterial and somatic cell counts in bulk tank milk from nine well managed herds. Journal of Food Protection, v. 51, n. 12, p. 930-934, 1988. HICKS, C. L.; ALLAUDDIN, M.; LANGLOIS, B. E.; O`LEARY, J. Psychrotrophic bacteria reduce cheese yield. J. Food Protec., v. 45, p.331-334, 1982.

KLUNGEL, G.H.; SLAGHUIS, B.A.; HOGEVEEN, H. The effect of the introduction of automatic milking systems on milk quality. Journal of Dairy Science, v. 83, n. 9, p. 1998–2003, 2000; LEITE JR, A. F. S.; TORRANO, A. D. M.; GELLI, D. S. Qualidade microbiológica do leite tipo C pasteurizado, comercializado em João Pessoa, Paraíba. Revista Higiene Alimentar, São Paulo, v. 14, n. 74, p. 45-49, 2003. MARSHALL, J. Differential diagnosis of high TBC. In Practice, v. 13, n. 5, p. 198-201, 1991. MENDONÇA, A.H.; SOUZA, M.R.; CERQUEIRA, M.M.O.P.; PENNA, C.F.A.M.; CAMARGOS, C.R.M. Estudo de fatores que influenciam a qualidade do leite cru, submetido à coleta a granel. Revista do Instituto de Laticínios “Cândido Tostes”, v. 56, n. 321, p. 289293, 2001. MURPHY, S.C.; BOOR, K.J. Raw milk bacteria tests and elevated bactéria counts on the farm: a review. PANAMERICAN CONGRESS ON MASTITIS CONTROL AND MILK QUALITY, 1998, Merida. Proceedings... , 1998. p. 232-235. MUIR, D. D. the shelf-life of dairy products: 1. Factors influencing raw milk and fresch products. J. Soc. Dairy Technol., v. 49, p. 24-50m 1996. PEREIRA, K. C; RIGOLIN-SÁ, Odila. Avaliação da qualidade higiênico – sanitária do queijo canastra, leite cru e água utilizados na sua produção na região de São Roque de Minas-MG. Passos/MG, 2006. Projeto (Aprovação pela Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG), Departamento de Microbiologia, Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). PRATA, L. F. Fundamentos de Ciência do Leite._ Jaboticabal, UNESP. 2001.287p. PINNA, M.H.; LIZIEIRE, R.S. Leite de qualidade. Revista do Conselho Federal de Medicina Veterinária, Brasília, v. 21, p. 47-51, 2000; SILVA N.; Junqueira VCA, Silveira NFA. Manual de métodos de análise microbiológica de alimentos. São Paulo: Varela, 1997. SORIANO, C.; MICHEO, C.; MENDIEIRA, V.A.; TABERA, A.; STEFANO, A.; CASASNOVAS, G.; PURRÁN, P.; CORRADETTI, A.; CARABAJAL, S. Evaluación de la calidad de leche de tanque de tambos de la Cuenca Mar y Sierras. Veterinaria Argentina, v. 18, n. 179, p. 654-667, 2001. TIMM, C. D.; GONZALEZ, H. L.; OLIVEIRA, D. D.; BUCHLE, J.; ALEXIS, M. A.; COELHO, F. J. O.; PORTO, C. Avaliação da qualidade microbiológica do Leite pasteurizado integral, produzido em micro-usinas da região sul do Rio Grande do Sul 2003. Revista Higiene Alimentar, v. 17, n. 106. P,88-93.


30

US FOOD AND DRUG ADMINISTRATION (FDA), Bacteriological Analytical Manual (BAM) Online, Revision July 2003. Disponível no site: http://vm.cfsan.fda.gov/ebam/bam-toc.html (acesso em 16/10/2008).

VANDERZANT, C.; SPLITTOESSER, D.F. Compendium of methods for the microbiological examination of foods. 3.ed. Washington: American Public Health Association, 1992.1219p.

Rigolin-Sá et al., 2011

ZEGARRA, J.J.Q. et al. Aspectos da produção leiteira em pequenas unidades de produção familiar no assentamento Mutirão Eldorado em Seropédica, Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciência Veterinária, v.14, n.1, p.12-18, 2007.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

31

Artigos - Engenharias, Ciências Exatas e da terra

Habitação Social e Expressionismo na Alemanha de Weimar Social habitation and Expressionism in Weimar’s Germany Mauro Ferreira1 Resumo: O trabalho busca apresentar a extraordinária experiência da produção de habitações sociais em Berlim, na Alemanha, durante a República de Weimar, e a vinculação dos arquitetos expressionistas, especialmente de Bruno Taut, com esta produção e o excepcional ambiente político e cultural daquele período histórico. Grandes conjuntos habitacionais, com projetos elaborados por importantes arquitetos modernistas alemães, foram construídos na capital alemã e nas principais cidades do país ao longo dos poucos e conturbados anos de existência da República de Weimar, até a ascensão do nazismo. Palavras-chave: Habitação Social; Bruno Taut; Arquitetura Social. Abstract: This study presents the extraordinary experience in the production of social habitations in Berlin, Germany, during the Republic of Weimar, and the adherence of expressionist architects, especially Bruno Taut, to this production and the exceptional political and cultural environment of that historical period. Great Housing Blocks, with projects elaborated by important modernist German architects, were constructed in the German capital and in the principal cities in the country along the troubled years of the existence of the Republic of Weimar, up to the rise of Nazism. Keywords: Social Habitation; Bruno Taut; Architecture. INTRODUÇÃO Durante a breve República de Weimar na Alemanha, no período imediatamente posterior ao final da I Grande Guerra, ocorreu uma extraordinária experiência decorrente da vinculação dos arquitetos expressionistas alemães com a produção de habitações sociais em massa. Utilizamos, para estas análises, principalmente as tramas criadas pelos textos contidos no livro organizado por Lionel Richard, intitulado Berlim, 1919-1933: a encarnação extrema da modernidade, vinculando-o ao ambiente político e cultural daquele período histórico. Grandes conjuntos habitacionais, com projetos elaborados por importantes arquitetos modernistas alemães, foram construídos na capital alemã e nas principais cidades do país ao longo dos poucos e conturbados anos de existência da República de Weimar, até a ascensão do nazismo. A questão da moradia nos países europeus de industrialização tardia, como é o caso da Alemanha, foi inicialmente tratada como uma questão sanitária, objeto de legislação e regulamentos específicos. As chocantes condições de moradia dos trabalhadores no século XIX, cuja descrição clássica parte, sobretudo do texto de Engels, “Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”, que demonstra de forma incisiva as péssimas condições de moradia e de vida, se repetia em todas as grandes cidades industriais européias, e Berlim não foi exceção. A moradia social tornou-se uma questão relevante para os arquitetos modernistas, porém “a guerra de 1914 tinha eliminado toda possibilidade de oferecer soluções simbólicas a conflitos sociais que se torna-

vam cada vez mais ásperos. O grande capitalismo aparecia como o maior responsável pela catástrofe que tinha desenganado as ilusões progressistas; o progresso técnico, inserindo-se nas velhas estruturas sociais, tinha instaurado uma sorte de novo feudalismo; o problema social se configurava doravante sob um aspecto mais social do que técnico, como problema das novas classes que o industrialismo tinha criado e que não podiam permanecer mero e passivo instrumento de produção” (Argan 2000:166).

Com esta leitura, a arquitetura racionalista, que se coloca como solução possível destas contradições, tende a apresentar alternativas standartizadas para a produção do ambiente construído, consideradas como uma espécie de defesa da democracia, da igualdade e da dignidade humana. ORIGENS DO EXPRESSIONISMO ALEMÃO Descendente tardio do movimento britânico Arts and Crafts, a Werkbund foi fundada em 1907. Seu objetivo era erradicar do cotidiano materiais de má qualidade e imitações, produzindo objetos limpos e honestos, uma vez que um dos principais problemas enfrentados pela indústria alemã para conseguir e ampliar novos mercados era a má qualidade dos seus produtos. Isto fazia com que a sua pauta de exportações fosse bem menor que da França e Inglaterra, além do próprio estigma da má qualidade de seus produtos, que prejudicava sobremaneira sua penetração nos mercados europeus. Foi nesta mesma época que o arquiteto Peter Behrens uniuse à AEG, a poderosa indústria da eletricidade alemã. Herman Muthesius, então diretor do Colégio Comercial

Arquiteto, professor e pesquisador da FESP|UEMG, Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela EESC-USP Email: mauroferreira52@yahoo.com.br 1


32

de Berlim, fundou a Deutscher Werkbund, a partir de diretrizes emanadas do governo alemão, depois de viver um período na Grã-Bretanha, observando a forma com que se organizava a poderosa indústria inglesa, seu design e sua arquitetura. O objetivo principal da instituição era superar as limitações para o desenvolvimento industrial do país, partindo de normatizações e controle de qualidade. É importante ressaltar que a Alemanha Imperial era hostil ao movimento modernista que se iniciava, embora não fosse uma ditadura, o que permitia ao modernismo alimentar-se da oposição do Imperador e dos centros universitários militaristas e anti-semitas. Como pano de fundo, travava-se um debate aceso entre os intelectuais sobre o papel da arquitetura e do design, em dois aspectos críticos: a estética da construção de máquinas e a estética do projeto de produtos. A fundação da Werkbund teve uma acirrada oposição do movimento de artes e ofícios alemão, que considerava as ideias propugnadas por Muthesius e seus parceiros como importadas, não autenticamente germânicas, levando a discussão ao campo das possibilidades de uma arte nacional, da constituição de uma identidade local. Os debates na Werkbund introduziram e popularizaram a idéia de padronização enquanto uma virtude, e da forma abstrata como base da estética do design de produtos, embora houvesse uma tensão constante entre aqueles que queriam desenvolver “objetos tipo”, como os industriais, e os artistas e artesãos, que defendiam a forma como uma expressão individual. Com a eclosão da I Guerra Mundial, sob pressão das necessidades militares, o DIN-format começou a ser aplicado a uma gama cada vez maior de produtos industrializados. A mostra da Werkbund, em 1914, às vésperas da I Guerra Mundial teve como um dos pontos altos o pavilhão construído pelo arquiteto Bruno Taut, para a indústria alemã do vidro que, segundo suas próprias palavras, “era um espaço encapsulado por prismas de vidros”. O edifício parecia um cristal mágico. O pavilhão poligonal de vidro era um manifesto, visando exibir as qualidades e a natureza do material que anunciava, pela transparência na arquitetura e pelas possibilidades que o vidro trazia à nova arquitetura. Unido ao poeta Paul Scheebart, Taut procura estimular uma busca cultural com sua construção de vidro que implica em superar a arquitetura imperial, que realçava as tradições prussianas. O uso do aço e do vidro, da exploração da cor e da luz eram instrumentos para que um novo jeito de viver se estabelecesse, com a arte e a cultura estruturando a vida social. No final dos anos 20, Taut contribuiu para um grupo de trabalhos enciclopédicos sobre a arquitetura moderna com a única obra de veio “popular”, mostrando a viabilidade da construção de conjuntos habitacionais de qualidade. Escreve o livro Die Stadtkrone, em parte

Ferreira, 2011

uma polêmica contra o planejamento urbano avançado, com sua ênfase no planejamento residencial, zoneamento e ideais da cidade-jardim. Para Taut, as cidades deveriam conter sempre um edifício central simbólico, visível de todos os pontos da cidade, nos seus desenhos uma torre de vidro, alegoria religiosa às catedrais góticas, tal como tinha imaginado o pavilhão de vidro do Werkbund, expressando seu caráter de utopia para a cidade moderna. Em 1911, o crítico de arte e poeta Worringer havia cunhado o termo expressionista para descrever a pintura pós-impressionista. O Expressionismo, porém, que viria a dominar a cultura de Weimar, surgiu e amadureceu no Império. A pintura de Kandinsky, a primeira peça teatral expressionista, a literatura experimental, as primeiras obras de arquitetura de Gropius, surgiriam antes da I Guerra Mundial. Ou seja, o expressionismo faria sucesso em Weimar, mas surgiu antes da criação da República. Para De Fusco (1970:196), “o expressionismo na arquitetura diferencia-se da experiência pictórica sua contemporânea não apenas devido ao atraso com que normalmente um movimento de vanguarda se manifesta na arquitetura em relação às outras artes, mas também devido a alguns elementos particulares. Enquanto na pintura ele é individualista e protestatório, na arquitetura, devido ao desenvolvimento técnico, à expansão profissional e à conjuntura econômica, ele tenta a colaboração e procura uma cultura reformista cujo equivalente político é a socialdemocracia.”

Para este autor, o classicismo expressionista de Peter Behrens é o exemplo mais significativo desta almejada relação entre a arte e a sociedade, frustrado pela irrupção da I Guerra Mundial, onde a Alemanha será a grande derrotada, juntamente com seu principal aliado, o império austro-húngaro. Com a crise política decorrente da derrota e o fim da Guerra, a consequência será a queda do Império e a destituição do Imperador, mas a Revolução socialista que parecia tão próxima com a agitação política do final da guerra foi abortada. Os republicanos se voltaram uns contra os outros, social-democratas contra comunistas e socialistas, uma das razões apontadas, mais à frente, para o próprio fim da República, para sua própria incapacidade de resistir ao avanço do nazismo. As condições impostas pelos Aliados à Alemanha derrotada, através do Tratado de Versalhes foram sempre consideradas humilhantes e trouxe profunda decepção aos mais diferentes setores políticos alemães, caldo de cultura que permitiria a vigorosa expansão das ideias nazistas. Na verdade, a criação da República de Weimar tem sido apontada muito mais como uma espécie de golpe preventivo da social-democracia contra os comunistas, que planejavam criar na Alemanha uma república socialista soviética. O assassinato de Rosa Luxemburgo e


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

33

Artigos - Engenharias, Ciências Exatas e da terra

Karl Liebknecht se insere nesta luta, vinculadas à manutenção do status que, onde as estruturas de poder do judiciário se mantiveram inalteradas mesmo com a República. O novo governo manteve os juízes do Império desaparecido, assim como o velho exército prussiano, cuja atuação favorecia a direita no espectro político. Propriedades expropriadas no início da república foram devolvidas ou indenizadas regiamente, frustrando as expectativas de mudança pela esquerda. As condições de vida da população nas principais cidades alemãs após a revolução industrial foram bastante agravadas ao final da I Guerra Mundial, em função de um conjunto de fatores, que incluem, dentre outros: a concentração de soldados desmobilizados, a destruição material, o aumento do custo de vida e a migração decorrente das perdas territoriais da Alemanha exigidas no Tratado de Versalhes. Politicamente, os anos anteriores à guerra foram marcados pela organização do operariado em sindicatos e partidos, principalmente em torno do social-democrata. As preocupações sociais do período, de caráter reformista, levaram às discussões sobre o homem novo e a cidade do futuro, que mobilizaram arquitetos e artistas em torno da chamada “neues bauen”, a nova construção. O Expressionismo, com seu vanguardismo humanista, de certo modo, assustava os alemães nacionalistas e conservadores. O Expressionismo contrapunha-se, de certa maneira, também aos futuristas, que viam na guerra a purificação e higienização do mundo, pois era essencialmente um movimento pacifista, humanista. Os expressionistas, militantes políticos de esquerda e contrários à guerra, organizaram-se em torno da Arbeitsrat fur Kunst (Conselho dos Trabalhadores para a Arte), que se fundiu ao chamado Novembergruppe, criado já em novembro de 1918, mal terminara a Guerra. Suas metas eram a democratização da arte e da arquitetura, e suas bandeiras de luta incluíam a estatização da construção, a dissolução das academias, o fim do controle do Estado sobre o ensino de arquitetura, a transformação dos museus em estabelecimentos de educação popular, a destruição dos monumentos sem valor artístico. Afirmam que a arte não deve ser mais privilégio de uma minoria, mas a alegria e a vida das massas. Preparavam-se para a revolução que acreditavam que viria, incluindo Bruno Taut e Walter Gropius, seus principais animadores, que já eram arquitetos relativamente conhecidos na cena alemã. Taut escreve então o manifesto que prega a arte total, a união de todos os ofícios e artes na arquitetura, a gesamtkunstwerk, que vai influenciar decisivamente a constituição da Bauhaus. O principal argumento utilizado por Taut é que somente seria possível uma nova unidade cultural através de uma nova arte da construção, em que cada disciplina separada contribuísse para a forma final, não havendo mais fronteiras entre a pintura, a escultura, tudo seria

uma só coisa, a arquitetura. Taut, assim como os planejadores soviéticos, preconizava a dissolução das cidades e o retorno da população ao campo, porém seu socialismo anárquico se chocava com a dura realidade de Weimar, onde a pragmática necessidade social de abrigar as pessoas justificava soluções padronizadas e standartizadas, diferentes das fantásticas soluções em vidro que utilizara nos seus projetos utópicos, principalmente em seu livro sobre uma arquitetura alpina. É verdade também que pouco se construía na Alemanha no imediato pós-guerra, tamanha a crise econômica. Os arquitetos, então, tinham que lidar com a falta de projetos e com a vontade de construir outro tipo de sociedade e uma nova arquitetura, o que explica a profusão de propostas em debate, em sua maioria de caráter utópico. Segundo Banham (1975:421), é Taut, com suas teorias, que vislumbra o futuro: “tecnicamente, sua visão antecipa grande parte do que iria acontecer nos anos 20, inclusive conceitos tais como um novo relacionamento entre casa e jardim por meio do uso de paredes de vidro e de divisões móveis”. Já para Argan (2000:189), “o utopismo do Grupo de Novembro era vanguarda porque tinha uma forte carga ideológica, queria ser a arquitetura do povo para o povo; porque proclamava a liberdade absoluta da arte e libertava a arquitetura da servidão ao Estado e às classes dominantes; porque destruía, com todo conformismo acadêmico, a concepção tradicional do espaço perspectivo em três dimensões, na qual o edifício está como um objeto sobre a mesa; porque considerava a construção como um feixe de forças ativas, empaticamente expressivo das forças do espírito ou, mais positivamente, da aspiração da sociedade a compor num equilíbrio dialético suas próprias contradições; porque afirmava as grandes possibilidades estéticas dos novos materiais de construção, como o aço, o cimento, o vidro e, por extensão, a luz e a cor; porque, envolvendo toda a comunidade e considerando o edifício como uma grande cidade, fundava arquitetura e urbanismo. Todas essas teses programáticas passam à arquitetura racional”.

Ou seja, no entendimento de Argan, a utopia expressionista vai irrigar e fecundar o racionalismo da Bauhaus, que se tornaria uma das mais importantes experiências da arte, da arquitetura, do design e do ensino no século XX. Já o Novembergruppe, por sua extrema politização, apesar de conseguir reunir expressionistas de todos os matizes, não teve como manter essa unidade, que pouco durou, as fantasias de cooperação fraternal logo desapareceram entre pintores, escultores, cineastas, músicos, teatrólogos e arquitetos, em parte também pela permanente crise econômica que afetava Weimar. Mas nem por isso o ambiente cultural e artístico deixava de produzir, havia uma efervescência cultural, principalmente na capital Berlim, que se tornara uma das principais da Europa.


34

O filme “O Gabinete do dr. Caligari” iniciou uma moda dos filmes expressionistas embebidos numa luz tênue, com cenários estranhamente pintados e os atores movimentando-se como sonâmbulos. O cinema vai criar um mundo tridimensional, fantástico, uma revolucionária arte de massas, um triunfo da fantasia em plena crise econômica. Na pintura, a técnica dos expressionistas era conscientemente primitiva, com cores fortes, simples e agressivas, distorções cruéis da figura humana, todas as descobertas antes da guerra, mas aplicadas com grande vigor e extremismo. No teatro, os expressionistas eram hostis às regras clássicas, produzindo peças excêntricas e muitas vezes difíceis de serem entendidas, com personagens pretensamente universalistas, desprovidos de nomes próprios. O avanço do debate artístico na Alemanha produz a chamada Nova Objetividade (em alemão, Neue Sachlichkeit). É a corrente artística e literária que se segue ao expressionismo. Figurativa na pintura, orientada para aspectos documentais. Na literatura, é o culto dos fatos objetivos, tendo predominado na Alemanha de 1924 a 1932, aproximadamente. Os anos da Nova Objetividade buscaram a realidade, pedia realismo de cenário, narração acurada, retorno às falas naturais e um idealismo sóbrio. Foi um movimento pela busca da clareza e da simplicidade. De outro lado, a cultura de massas, comandada por capitalistas e ideólogos da direita, principalmente através da UFA (Universumfilm) produzia filmes e filmes alegres e superficiais, que distraiam a massa da política, do desemprego e da miséria provocada pelo desastre econômico, principalmente nos últimos quatro anos de Weimar. CONCLUSÕES A produção de habitações de interesse social na Alemanha entre as duas guerras mundiais, principalmente durante a República de Weimar, é uma experiência bastante significativa, tanto do ponto de vista quantitativo quanto qualitativo. Os conjuntos de edificações efetuados em Berlim tiveram efeito demonstrativo das potencialidades da racionalização da construção, de uma nova arquitetura e de novos modos de viver da classe operária naquele país. Arquitetos que assumiram posições de destaque na constituição de um corpo teórico que embasasse a chamada arquitetura moderna tiveram contribuições importantes neste processo, como Walter Gropius, Bruno Taut e Martin Wagner. A produção cultural expressionista, que serviu de base para o debate teórico da chamada arte total ou a integração das artes na arquitetura, foi sendo absorvida pela industrialização e pela racionalização, com o objetivo de reduzir o espaço interno das moradias e garantir acesso à habitações dignas, que incluíram ainda espaços coletivos arejados, insolados e abertos a áreas verdes programados para a prática de esportes; conver-

Ferreira, 2011

giram também com as novas formas de vida, que incluía a liberação da mulher do trabalho doméstico e a viabilização de encontros, indispensáveis à vida coletiva e à democracia. Todas estas inovações foram dramaticamente impactadas pela crise econômica e social da Alemanha no período de Weimar. Trata-se de uma rica e pouco difundida experiência para os arquitetos brasileiros, efetuada num momento de extrema radicalização política e, por isso mesmo, efêmera e interrompida pela ascensão do nazismo ao poder. No entanto, a força destas idéias ainda é tamanha que até hoje suas principais diretrizes e propostas ainda vigoram, sem que os administradores públicos e arquitetos contemporâneos tenham encontrado alternativas qualitativas e quantitativas similares e que não sofram de descontinuidade na aplicação das políticas públicas de habitação social, especialmente num país desigual como o Brasil. BIBLIOGRAFIA

FREITAS, C.G.L. (coord.). Planos Diretores Municipais: integração regional estratégica – roteiro metodológico. Porto Alegre: ANTAC, 2007. (Coleção Habitare) ARGAN, G. Projeto e destino. São Paulo: Ática, 2000. BANHAM, R. Teoria e projeto na primeira era da máquina. São Paulo:Perspectiva, 1975. BONDUKI, N.G. Origens da Habitação Social no Brasil: arquitetura moderna, lei do inquilinato e difusão da casa Própria. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. DE FUSCO, R. Storia dell’architettura contemporânea. Roma: Editori Laterzi,1981. A Idéia de Arquitetura. Lisboa: Martins Fontes, 1984. EISNER, L.H. A Tela Demoníaca – as influências de Max Reinhardt e do Expressionismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. FRAMPTON, K. Historia crítica de la arquitectura moderna. Barcelona: Gustavo Gilli, 1985. FRASSON, A. S. Habitação Social e Arquitetura Moderna, a apropriação dos conjuntos residenciais dos IAPs (1940-2000). São Carlos: EESC-USP, 2000 FRAY, M. A arte na era da máquina. São Paulo:Perspectiva, 1976. GAY, P. A cultura de Weimar. Rio de Janeiro:Paz e Terra, 1978. HERF, J. O modernismo reacionário: tecnologia, cultura e política na República de Weimar e no Terceiro Reich. Campinas: Unicamp, 1993. MACHADO, C. E. J. Um capítulo da história da modernidade estética: debate sobre o expressionismo, São Paulo: Unesp, 1998. NOGUEIRA, A. P. O habitar no espaço periférico: conjuntos de habitação social. São Paulo: FAUUSP, 2003. PEHNT, W. La Arquitectura Expressionista. Barcelona: Gustavo Gilli, 1983. RICHARD, L. (org.). Berlim, 1919-1933: a encarnação extrema da modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1993. TAUT, B. Costruire: la nuova edilizia abitativa. Bologna: Zanichelli, 1983.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

35

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

Apontamentos sobre a ética e sua importância no contexto familiar, religioso, empresarial e escolar Notes on ethics and its importance in the family, religious, business, and school contexts Silvia Cristina Zaparoli1; Camilla Silva Machado Graciano2 Resumo: O presente estudo, realizado através de reflexões teóricas, apresenta apontamentos teóricos e conceituais sobre ética e enfatiza a mesma em alguns contextos sociais, destacando o contexto familiar, religioso, empresarial e escolar, além de expor como a ética está vinculada à ação humana e qual sua contribuição no desenvolvimento e na capacidade do homem em estabelecer relações saudáveis e responsáveis no meio em que vive. Seu objetivo é apurar através das reflexões teóricas obtidas, o papel da ética e sua intervenção nos contextos familiar, religioso, empresarial e escolar, nos quais o homem está inserido. O contexto do estudo foi iniciado com uma retrospectiva histórica e alguns conceitos atribuídos à ética sob a visão de vários autores. Em seguida foi destinado um tópico específico para a abordagem do papel da ética no contexto familiar, religioso, empresarial e escolar. Finalmente foram realizadas as considerações finais apontando os pontos relevantes sobre todo o contexto estudado. As reflexões alcançadas poderão contribuir para futuros estudos buscando propiciar um convívio digno do ser humano em sociedade. Palavras-chave: Ética; Contexto Social; Ser Humano. Abstract: This study, through theoretical reflections, presents theoretical and conceptual notes on ethics and emphasizes the same in some social contexts, highlighting family, religious, business, and school contexts, and show how ethics is linked to human actions and what their contribution to the development and to the man’s ability to establish healthy and responsible relationships in the environment where he/she lives. Its goal is to establish through theoretical reflections obtained, the role of ethics and its intervention in family, religious, business, and school contexts in which man is placed. The context of the study began with a historical overview and some concepts attributed to ethics in the view of several authors. Then a specific topic to address the role of ethics within the family, religious, business and school context was assigned. Finally some conclusions were made pointing out the relevant points about the whole context studied. Reflections achieved may contribute to future studies seeking to provide a decent human being living in society. Keywords: Ethics; Social Context; Human Being. INTRODUÇÃO Para se viver em sociedade, é imprescindível para o ser humano seguir normas e possuir um comportamento ético no meio em que vive. A individualidade e a realidade de cada ser humano são diferenciadas, da mesma forma que cada sociedade possui suas particularidades, as quais são respeitadas pelos indivíduos que a compõe. O ser humano está inserido num conjunto de regras e valores impostos pela sociedade desde seu nascimento e, atualmente a ética encontra-se presente em diferentes contextos sociais que ele vive, visando gerar parâmetros que influencie o comportamento humano. Atualmente, a ética vem sendo discutida proporcionalmente em todo mundo em relação à formação do caráter do ser humano, e para refletir sobre os valores que a mesma aborda em alguns contextos sociais, o presente artigo dará ênfase no contexto familiar, religioso, empresarial e escolar, estruturando-os em tópicos distintos. No desenvolvimento destas reflexões, inicialmente

buscou-se apresentar o contexto histórico da ética, seus conceitos e a distinção entre ética e moral, visando esclarecer e facilitar a interpretação da ética nos contextos sociais que serão estudados nos tópicos posteriores, focando-a em sentidos mais restritos. Na seqüência, o primeiro contexto a ser estudado é “O papel da ética na família”, pois este pode ser considerado um dos contextos sociais mais importantes na vida do ser humano. É através da família que a pessoa vai formando sua personalidade e adquirindo valores que serão postos em prática nos demais contextos sociais que irá freqüentar no decorrer de sua vida. O contexto familiar proporciona ao ser humano crescimento, realizações e troca de saberes. O segundo contexto “Falando um pouco sobre ética e religião” expõe o relevante papel que a ética tem quando se aborda a religião. Esta pode ser considerada como uma das poucas instituições que esteve sempre presente na sociedade e que permanece até os dias atuais, resistindo a todos os períodos históricos.

Professora de Ensino Médio. Especialista em Metodologia e Didática do Ensino Superior e Graduada em Letras pela Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) 2 Docente do curso de Serviço Social e na Pós-Graduação em Metodologia e Didática do Ensino Superior pela Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) Email: mila-machado@bol.com.br 1


Zaparoli e Graciano, 2011

36

O terceiro contexto aborda a ética nas empresas, enfatizando que estas vêm desempenhando não apenas uma função econômica, mas também uma função ética na sociedade. No quarto e último contexto destacou-se “A contextualização da ética na escola”, apontando a relevância que a ética possui na formação de bons cidadãos e sua colaboração na educação, pois a escola pode ser considerada um espaço que contribui na reafirmação de valores que já existem no contexto familiar do ser humano, ou no mínimo, tentar iniciar alguma formação de valores necessários para a convivência do mesmo em outros contextos sociais. Diante desta contextualização, o presente estudo tem como objetivo apurar através das reflexões teóricas obtidas e dos apontamentos feitos pelos diversos autores mencionados, o papel da ética e sua intervenção em alguns contextos sociais em que o homem está inserido. Acredita-se que estas reflexões poderão contribuir para futuros estudos buscando propiciar um convívio digno do ser humano em sociedade, conforme apresentado nos contextos sociais deste artigo. METODOLOGIA A metodologia utilizada para a realização deste estudo foi a pesquisa bibliográfica, a qual desenvolveu-se através de consulta a livros, publicações periódicas, Internet, leis e Parâmetros Curriculares. De acordo com Gil (2002, p. 45), pesquisa bibliográfica é aquela que se desenvolve através de material já elaborado, como por exemplo, os livros, que são as suas principais fontes, destacando que “A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente”. APONTAMENTOS HISTÓRICOS E REFLEXÕES CONCEITUAIS SOBRE A ÉTICA Para se estudar ética é necessário, primeiramente, possuir o mínimo de conhecimento sobre o comportamento que envolve o ser humano e seu dia-a-dia, bem como a sociedade em que vive. Ponchirolli e Lima (s/d, p. 68) dizem que “É preciso educar a mente para sentir a ética penetrando e transformando nosso corpo por inteiro. A ética só se torna eficaz à medida que os tomadores de decisões adquirem a capacidade de se indignar diante de ações ou fatos que antes não lhes afetavam”. “O termo “ética” existe desde a antiga Grécia, onde era usado por pessoas que se disponibilizavam a investigar as questões sobre o comportamento humano e também a vida em sociedade, por isto as questões éticas e sociopolíticas (isto é, de cidadania) envolvem direitos e deveres, justiça e injustiça, lei e punição, proibição e liberdade, responsabilidade e marginalidade, conduta pessoal e relacionamentos humanos, e se fa-

zem presentes em nosso cotidiano” (GOUVÊA, 2002, p. 11).”

O autor destaca ainda que a “ética” em seu sentido mais restrito, vem da cultura dos antigos helenos, surgindo durante o iluminismo ateniense, conquistando lugar a partir do século V antes da era cristã. Fazendo uma retrospectiva histórica sobre a ética, D’Assumpção (1998) fala que existe um vínculo entre os conceitos morais e a realidade humana social, que está sempre sujeita à mudanças, onde as doutrinas éticas não são consideradas de modo isolado, e sim dentro de um processo de mudança e de sucessão, o qual faz parte de sua própria história. Esse vínculo com a moral primitiva surgiu através do próprio homem, na antiguidade, onde a sobrevivência básica se constituía na norma ética fundamental, resumindo-se em trabalhar para comer, matar para não morrer. O autor ainda relata que com a evolução, o homem primitivo foi aderindo às novas realidades sociais e criando novas realidades éticas, modificando ou até mesmo anulando as anteriores, surgindo, então, a “Ética Grega”. Relata também o autor, que a Ética Grega influenciou o mundo ocidental através dos filósofos que introduziram novos posicionamentos no decorrer da história, como por exemplo, os Sofistas, que convenciam pela argumentação, e para eles não existiam nem verdade nem erro e as normas eram transitórias (D’ASSUMPÇÃO, 1998). Destaca-se também Sócrates, que, segundo o mesmo autor, rejeitava o relativismo e o subjetivismo dos sofistas, mas considerava como saber fundamental o saber a respeito do homem, sendo sua ética racionalista e resumida em: “O homem age retamente quando conhece o bem, e, conhecendo-o, não pode deixar de praticá -lo; por outro lado, aspirando ao bem, sente-se dono de si mesmo e, por conseguinte, é feliz”. Outro filósofo de grande influência foi Platão que privilegiava a relação Homem-Estado, enquanto afirmava a dualidade Corpo-Alma, e em sua ética existia uma estreita unidade da moral e da política, pois para ele o homem se formava espiritualmente somente no Estado e mediante a subordinação do indivíduo à comunidade. Gouvêa (2002, p. 15) diz que Platão poderia ser indicado como “pai” da ética, pois esta ocupa lugar de destaque na filosofia platônica, estabelecendo a ideia de bem como sendo a principal e maior dentre todas as ideias, e afirma que “Não se trata de exagero. Mesmo o cristianismo, o islamismo e o judaísmo moderno são calcados no platonismo e não existiriam na forma atual, sem ele”. Posteriormente destaca-se Aristóteles, discípulo de Platão, que “tornar-se-ia a base de toda a reflexão ética ocidental”, mas, D’ Assumpção (1998) diz que Aristóteles se opunha a seu mestre, Platão, pois, para ele a ideia não existia separada dos indivíduos concretos, ele considerava que o homem enquanto tal só poderia viver na cidade, pois era por natureza um animal político, ou seja, social. Com a decadência do mundo antigo greco-romano, surgiram os Estóicos e os Epicuristas, para os quais


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

37

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

a moral não mais se definia em relação à cidade, mas ao universo (cosmos). O problema moral era colocado sobre o fundo da necessidade física, natural, do mundo. Assim, o homem passou a buscar seu bem neste mundo, e procurou em si mesmo, ou nos amigos, a tranqüilidade da alma e a auto-suficiência. Com este pensamento se desfez a unidade moral e política daquela sociedade surgindo a Ética Cristã, essencialmente Teocêntrica (Deus), fazendo a junção das relações do homem com o seu criador e do modo de vida prático que este homem devia seguir para alcançar a sua salvação, extinguindo as diferenças entre os homens, sendo todos considerados iguais perante Deus, mesmo sendo estes escravos, cultos, livres ou incultos. O cristianismo teve uma profunda marca na Idade Média, pois defendia uma igualdade real de todos os homens, sendo a semente da modificação radical, que se processou no decorrer da história (D’ASSUMPÇÃO, 1998). O autor discorre também sobre a Moral Burguesa, que foi caracterizada pela exploração do Homem pelo Homem, iniciando assim o Capitalismo. Posteriormente, embasada na Revolução Industrial, a Ética Moderna chega contrapondo-se à ética teocêntrica da Idade Média, tornando-se antropocêntrica, isto gerou mudanças na economia, na ordem social e na religião, quando surgiram os movimentos reformistas, separando-se a razão da fé, a natureza de Deus, o Estado da Igreja e até mesmo o homem de Deus, tornando-se essencialmente antropocêntrica. Finalmente, relata o autor, que aproximadamente no século XIX, a Ética Contemporânea teve o seu início devido às violentas mudanças ocorridas em toda a humanidade, sendo o Existencialismo, o Pragmatismo, a Psicanálise, o Marxismo, o Neopositivismo e a Filosofia Analítica, suas principais correntes. Neste momento, enquanto a política, a arte e a ciência adquirem cada vez mais autonomia, a ética e a religião perdem a hegemonia que exerciam sobre a sociedade tradicional, a economia assume o papel dominante ficando a ética a ela subordinada. Predomina-se então a regra da procura do “melhor produto”, sendo considerado o que dá mais lucro e não o que é melhor para o Ser Humano. A tecnologia se transforma na deusa dos tempos modernos, fazendo nascer a Ética da Manipulação, que era regida pelos grupos dominantes da época, onde se afirmam: “assim é que deve ser” (D’ASSUMPÇÃO, 1998). Os apontamentos históricos realizados neste tópico foram essenciais para abordar a ética nos contextos sociais em que o ser humano está inserido hoje, pois, é necessário fornecer subsídios para que se alcance uma consciência crítica e possibilite ao indivíduo a realização de sua auto-avaliação nos fatos ocorridos no seu cotidiano. Dando prosseguimento, é necessário também definir e compreender os conceitos de ética para se iniciar qualquer reflexão da mesma nos contextos sociais, buscando possível clareza na sua interpretação.

Sendo assim, Neto e Liberal (2002, p. 33) citam que: “A ética é uma atitude arraigada no homem que não é válida apenas para uma única pessoa, mas que busca situar todos os seres humanos. Ela contribui, também, no refletir e no pensar dos códigos, normas e condutas humanas.”

De acordo com Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (FERREIRA, 2008, p. 383), “ética é o estudo dos juízos de apreciação que se refere à conduta humana, do ponto de vista do bem e do mal, ou ainda o conjunto de normas e princípios que norteiam a boa conduta do ser humano”. Para Matos (s/d) a “ética” é a ciência da moral ou valores e tem a ver com normas sob as quais vive o ser humano e a sociedade, podendo estas variar de uma cultura para a outra. O termo “ética” confunde-se muitas vezes com o termo “moral”, mas, apesar de terem um fim semelhante, são bem distintos, tendo como finalidade colaborar para que o homem seja um cidadão de bom caráter e humanamente íntegro. Barroco (2008) entende que a ética faz parte da prática social do ser humano, sendo o mesmo motivado a agir eticamente em seu cotidiano, subentendendo assim, que o ser social é produto de si mesmo, pois surge da sua natureza e suas capacidades são construídas por ele próprio. De acordo com Boelter (2008) a moral é considerada o conjunto de crenças, princípios e regras que circundam o comportamento humano, dominando os valores, ou seja, aquilo que deve ser buscado (o bem) ou de que se deve afastar (o mal). Ferreira (2008, p. 563) destaca a moral como “o conjunto de regras de conduta ou hábitos julgados válidos, quer universalmente, quer para grupo ou pessoas determinadas”. Analisando a diferença entre os termos, nota-se que as duas palavras, na maioria das vezes, são empregadas como sinônimos, pois indicam um significado comum e remetem à idéia de costume (CAMARGO; FONSECA, s/d). Para Gouvêa (2002) atualmente a distinção entre estes dois termos já está bastante difundida, e isto é benéfico para a reflexão teórica sobre questões éticas, assim, visando propiciar melhor entendimento dos dois termos, expõe-se a diferença entre “ética” e “moral”. A Enciclopédia livre, Wikipédia (s/d), aponta que a ética diferencia-se da moral, “pois enquanto esta se fundamenta na obediência a normas, tabus, costumes ou mandamentos culturais, hierárquicos ou religiosos recebidos, a ética, ao contrário, busca fundamentar o bom modo de viver pelo pensamento humano”. Em uma distinção mais precisa, Silva (2006) diz que a moral tem um caráter prático imediato enquanto a ética é uma reflexão filosófica. Para Filho (2005) a diferença entre os conceitos é que a ética refere-se ao lado pessoal e profissional, enquanto a moral refere-se mais ao comportamento pessoal. Assim, diante dos conceitos e distinções expostos, conclui-se que a diferença entre os termos “ética” e


Zaparoli e Graciano, 2011

38

“moral” pode ser entendida como sendo a moral tudo que acontece, e a ética o que deveria acontecer, o que se confirma nas palavras D’Assumpção (1998) quando menciona que a ética é a norma, enquanto a moral é a ação. “Ser uma pessoa eticamente consciente (ou meramente ética) significa importar-se com a possibilidade da existência de e com a tentativa de encontrar valores e também de tentar viver segundo princípios e padrões de conduta inteiramente calcados na razão, lembrando que estes valores, princípios e padrões terão que ser, por definição, universais (GOUVÊA, 2002, p. 13).”

Acredita-se que as reflexões obtidas sobre ética e moral poderão facilitar o estudo direcionado da ética no contexto familiar, escolar, empresarial e religioso que serão expostos a seguir. Destacando-se o papel da ética no cotidiano do ser humano enfatizando seu princípio na família, na qual se encontram os primeiros educadores na formação do caráter do indivíduo. A religião, as empresas, que representam aqui o ambiente de trabalho, e a escola, vem reforçar os alicerces que foram iniciados pela família, pois as formas de pensar e de viver fazem parte desta ética, ajudando na construção do senso crítico do ser humano e inserindo-o na vida coletiva da sociedade ou do país. O PAPEL DA ÉTICA NA FAMÍLIA “No círculo familiar, nas salas de aula, nas ruas, nos morros, nas seitas religiosas, nas gangues de jovens, nas torcidas organizadas, enfim, nos mais diversos espaços sociais, diferentes valores morais, éticos e políticos constroem diferentes concepções de mundo e de homem (OLIVEIRA, 1996, p. 33).”

As diversas instituições sociais, como por exemplo, a empresa, a escola, a religião, entre outras, desempenham seu papel na formação moral e no desenvolvimento de atitudes veiculando valores ao lado da família, pois esta é o primeiro espaço de convivência do indivíduo, que logo ao nascer já se relaciona com regras e valores da sociedade na qual está inserido. Os indivíduos, durante toda a sua vida ou por determinados períodos transitam por estas instituições (BOELTER, 2008). A família é o primeiro contato do indivíduo e imprescindível na sua formação, ressaltando ainda, que não basta a família inserir o afeto como elemento principal dos vínculos familiares, pois, conforme nos aponta Dias (2007, p. 113), “além do afeto, é impositivo invocar também a ética, que merece ser prestigiada como elemento estruturante da família”. É competência dos pais, que são os primeiros educadores, formarem o caráter do indivíduo visando o desenvolvimento de sua consciência crítica e possibilitando a avaliação de seus atos. Assim, a família exerce o papel de mediadora entre a criança e a sociedade, viabilizando sua socialização, pois os cuidados e estímulos necessários ao crescimento e desenvolvimento da criança são fornecidos pela família (ANDRADE et al, 2005). Neste sentido Vieira (s/d) defende que a família é

responsável e colaboradora na socialização dos filhos, através de esclarecimentos, criando o desenvolvimento do seu senso crítico e respondendo aos seus questionamentos, visando à construção de uma nova mentalidade e buscando uma sociedade melhor. Focando este contexto, destaca-se o que diz Machado (2010) quando relata que a consciência ética e moral vêm com a família, sendo esta responsável pelos valores éticos e morais de seus filhos quando os mesmos aprendem o que é certo e o que é errado, gerando uma bagagem de informação para o período escolar. Os pais devem impor limites e incutir responsabilidade aos seus filhos. Neto e Liberal (2002, p. 45) afirmam que “A ética está impregnada no agir humano e, por isso, é tão complexa quanto a vida”. Sendo assim conclui-se que a ética está no contexto familiar desde sempre e quando o ambiente familiar possui um clima de boa qualidade e respeito mútuo, seus valores também o serão. Dias (2007) entende que com as mudanças que vêm acontecendo na concepção de família, somente o afeto já não é suficiente para a permanência dos vínculos familiares, é necessário inserir a ética no meio familiar, pois esta deve ser considerada como elemento estruturante da família, portanto, é dever do pai participar de forma direta, e auxiliar sua esposa, na educação dos filhos na busca de uma convivência sadia e pacífica. Andrade (2005, p. 64-65) considerando um dos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma que “A família é o elemento natural e fundamental da sociedade” e diz também que a família é o núcleo social mais forte que existe e resiste ao atual cenário da vida humana “porque é, antropologicamente, a mais profunda transmissão da vida, de partilha de gerações, de desenvolvimento da personalidade, de mais informal e eficaz instituição de proteção social, de afeto e de escola de trabalho. Uma verdadeira unidade natural, econômica, cultural e educativa”. As palavras de Vieira (s/d) podem ser introduzidas neste contexto quando o mesmo menciona que, uma sociedade feliz está ligada a famílias bem estruturadas, mesmo não sendo economicamente prósperas, mas, felizes. O autor relata também que a família ainda é um referencial insubstituível, que a conduta das pessoas é gerada no ambiente familiar, pois, esta é a instituição primária do indivíduo caracterizada pela convivência de pais e filhos. A família é responsável pela socialização dos filhos, bem como pela transmissão do patrimônio cultural. É obrigação dos pais orientarem os filhos para um comportamento social ético e ajudá-los a desenvolver seu senso crítico, argumentando e respondendo seus questionamentos. Fazendo uso das palavras de Machado (2009), conclui-se, após o estudo do terceiro tópico, que os princípios éticos da base familiar são parâmetros que norteiam a vida de seus membros em todas as situações e caminhos, proporcionando base para uma existência digna, produtiva, com segurança e paz. A família deve


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

39

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

assumir a responsabilidade ética fundamentada no valor do ser humano, com direitos e deveres, visando educar, reeducar e direcionar para o bem, colaborando na construção de uma sociedade mais justa e de paz . A família é a primordial na porcentagem que constitui o todo de uma sociedade, pois é no seio da família que o ser humano aprende a ser “verdadeiramente humano”. “Nos marcos de uma visão confirmadora do existente, os processos educativos desenvolvidos na família e nos primeiros níveis escolares levam primeiro a criança a conhecer o que ela não deve fazer. Segue valendo, como princípio geral, a norma ética do senso comum: seu direito termina quando começa o do outro (OLIVEIRA, 1996, p. 39).”

FALANDO UM POUCO DE ÉTICA E RELIGIÃO Caminhando harmonicamente com a ética, a religião contribui na formação do homem, fazendo com que este perceba a existência do mal e reestabeleça a relação entre Deus, homem e natureza (COUTO, 2008), portando é imprescindível mencionar a relação ética e religião dentro desse contexto. “Numa sociedade pluralista, como a que nós vivemos, é fundamental a existência de valores éticos definidos, [...] de modo que venham a oferecer um modelo de vida alternativo à sua sociedade (GEISLER, 1984, p. 7).”

A religião é uma das mais antigas instituições humanas e permaneceu presente na sociedade subsistindo a todos os períodos históricos, e na atualidade, ainda faz parte da construção da existência humana (COUTO, 2008). Karl Jaspers (1994 apud ORTIZ, 2001, p. 60) considera que “as religiões universais tiveram um papel fundamental na história dos homens, elas constituiriam uma espécie de ruptura com o passado das sociedades anteriores”. As práticas religiosas, em tempos pré-históricos, já eram interligadas a leis ou tabus que impunham aos indivíduos um comportamento específico. A religião servia para manter as pessoas bem comportadas e obedientes através de sansões ou punições, entretanto o fato de que a religião possa ter fornecido tais sansões para obter um comportamento moral não significa que a moralidade deva ter, necessariamente, uma base religiosa (ALMEIDA, 2006). Dias (2007) esclarece que tais sansões e penalidades deixaram de ser impostas pela religião e passaram a ser impostas pelo Estado. O cristianismo tem for influência na formação ética do indivíduo. A pessoa de Jesus Cristo tornou-se parâmetro de princípios éticos-morais. Bonhoefer (1991, p. 54) diz que: “A igreja é o lugar onde se proclama e acontece o processo em que Jesus Cristo toma forma. A ética cristã está a serviço desta proclamação e deste acontecimento”. O alvo de toda reflexão sobre “ética” parece centrarse na noção do bem e do mal, do certo e do errado, e a ética cristã consiste em sustentar este saber, pois “a noção do bem e do mal constitui, portanto, a separação de Deus” (BONHOEFER, 1991, p. 15).

Na ética Cristã, o ponto de partida, de acordo com o autor acima mencionado, “é o corpo de Cristo, a forma de Cristo na forma da Igreja, a formação da Igreja de acordo com a forma de Cristo”, sendo a Igreja de Cristo uma só em todas as gerações. “Cristo não amava, como o especialista em ética, uma teoria sobre o bem; amava, isto sim, o ser humano real”. Crer no Cristo encarnado, crucificado e ressuscitado é o fundamento de toda realidade humana, e isto faz com que o ser humano assimile a forma de Cristo, afastando assim a ética abstrata e remetendo-se a uma ética concreta, a qual “está além do formalismo e da casuística; enquanto formalismo e casuística partem da luta do bem com o real, a ética cristã pode partir da reconciliação já acontecida do mundo com Deus e com o ser humano Jesus Cristo, da aceitação do ser humano real por parte de Deus” (BONHOEFER, 1991, p. 52-53). Santos, em seu artigo “A moral e a ética cristão”, expões que a ética cristã, assim como a ética, representa costumes ou atos realizados pelos cristãos, além de ser também ensino, mandamento, diretriz, enquanto costumes e atos são flexíveis e variáveis, e muitos deles são baseados nas Escrituras Sagradas. A ética cristã é normativa, uma vez que se baseia em normas estabelecidas pelo criador, como por exemplo, os Dez mandamentos, que constituem o primeiro tratado de ética dado pelo Senhor, visando regular o comportamento humano mediante o cumprimento dos seus deveres para com Deus, com o próximo e para consigo mesmo (SANTOS, s/d). Matos (s/d) aponta o teólogo “Emil Brunner” para relatar que os fundamentos da ética cristã são encontrados nas Escrituras do Antigo e Novo Testamento e são interpretados pelos cristãos como revelação especial de Deus aos seres humanos é a ciência da conduta humana que se determina pela conduta divina. Em todos os momentos da vida o indivíduo precisa tomar decisões que afetam outras pessoas e a ele mesmo, encarando seus valores e deveres, por isso a ética é importante para a vida diária do cristão. De acordo com Gouvêa (2002, p. 15) “Quase tudo que se entende como ética cristã é, na verdade, fruto da absorção por parte da moral cristã de noções advindas da filosofia helenista” e, noção de criação, noção de mandamento divino e noção do pecado, são contribuições desta tradição para o desenvolvimento da reflexão ética ocidental. A autora ainda destaca que “O mandamento é o princípio ético universal compreendido ou assimilado na forma de um comando divino. Dizer que algo é um mandamento divino significa, em linguagem religiosa, que isto deve ser reconhecido como princípio ético universalmente válido” (p. 16), e entendê-lo como universalmente válido para a tradição judaico-cristã é estabelecer diferenças entre normas meramente religiosas, que estão presentes em toda e qualquer religião, e os mandamentos da tradição judaico-cristã, os quais estabelecem valores sociais universais.


Zaparoli e Graciano, 2011

40

“No lugar marcado em todas as outras éticas pelo contraste de dever e ser, ideia e realização, motivo e obra, aparece, na ética cristã, a relação entre realidade e concretização, passado e presente, história e acontecimento (fé) ou então, para declinar o nome inequívoco do assunto em lugar do conceito ambíguo, a relação de Jesus Cristo e do Espírito Santo (BONHOEFFER, 1991, p. 108).”

De acordo com Barth (2007), algumas formas religiosas e crendices retornaram com novas forças, e atualmente é possível ver diversos templos e formas religiosas, tanto in loco quanto via satélite. O retorno ao esotérico, ao sagrado, ao demoníaco e o culto ao mal são fenômenos da pós-modernidade, cada indivíduo professa sua crença e a manifesta de acordo com as suas exigências e necessidades momentâneas, ele vive a religião numa mistura de vários aspectos buscando o sentido da vida. “Muitas pessoas estão totalmente mergulhadas na fé, organizam a vida a partir dela e não abrem mão da participação ativa [...] outros são totalmente indiferentes a uma única instituição religiosa [...] Muitos simplesmente se limitam a afirmar crer numa “energia universal”, no “ser superior” [...]. Ao lado disso tudo, cresce o número daqueles que se denominam “sem religião”, o que não significa que sejam ateus (BARTH, 2007, P. 102).”

A religião está presente em espaços públicos e privados possuindo um grande poder de influência e veiculação de valores, assim como os meios de comunicação, sendo nestes espaços que os indivíduos compartilham valores, normas e modelos de comportamento, nos quais se integram através de suas relações cotidianas (BOELTER, 2008). Através da reflexão deste contexto foi possível entender que os laços entre ética e religião são necessários e, atualmente existe uma revalorização da fé na relação do homem com o sagrado. Esta instituição pode ser considerada como pilar dos valores éticos que possibilita ao ser humano buscar um sentido espiritual para a vida. A VISÃO ÉTICA NAS EMPRESAS As empresas necessitam focar os valores que defende, pois, sua postura ética deve ser independente dos fatores externos. Apesar de muitas empresas se mostrarem preocupadas em estabelecer a ética em seu contexto, são poucas as que levam a sério, esquecendo até o significado da palavra (EDUARDO BOTELHO, 2000, p. 5 apud TERRA, 2008). A ética empresarial pode ser entendida, de acordo com a Wikipédia (s/d), a Enciclopédia livre, como “um valor da organização que assegura sua sobrevivência, sua reputação e, consequentemente, seus bons resultados”. Para Moreira (1999, p. 28, apud, OURIVES, 2006, p. 3), a ética empresarial é “o comportamento da empresa - entidade lucrativa - quando ela age de conformidade com os princípios morais e as regras do bem proceder aceitas pela coletividade (regras éticas)”. A preocupação em utilizar a ética dentro das empresas vem crescendo cada vez mais, e são várias as empresas que já estão aderindo a um código de ética interno

para nortear as práticas da sua organização (MONTEIRO; ESPIRITO SANTO; BONACINA, 2005). As pessoas que possuem uma formação ética, segundo Neto e Liberal (2002, p. 49), conseguem um melhor funcionamento em suas organizações. Os autores afirmam ainda que “Os gestores de empresas, sindicatos, do Estado e de organizações têm ainda um árduo caminho a percorrer para descobrir a importância e a complexidade da ética na formação e informação”. “Cresce hoje a consciência de que o processo produtivo necessita de pessoas dotadas de uma certa consciência ética e não apenas de uma formação técnica para manusear e fabricar máquinas e equipamentos. As organizações funcionam melhor nas mãos de pessoas que possuem uma formação ética (NETO; LIBERAL, 2002, p. 49).”

A preocupação das empresas, bem como dos profissionais que nelas atuam com relação a ética é concentrarse no cumprimento das obrigações legais, de acordo com as normas preestabelecidas e centrar-se em ter clientes satisfeitos, pois a relação empresa e cliente nas últimas décadas é responsável pela sobrevivência e até mesmo pelo fracasso de várias empresas no país (TERRA, 2008). Neto e Liberal (2002, p. 42) afirmam que “A formação profissional e a educação são exigências para a realização de qualquer atividade profissional, desde a mais simples até as mais complexas”. Na prática, a inserção da ética nas organizações é mais complexa do que na teoria. Muitas empresas buscam implantar a ética visando obter respaldo nas ações internas e melhoria na qualidade dos serviços, bem como a qualidade da empresa mediante às necessidades dos funcionários que nela trabalham. Terra (2008) defende que é necessário convicção, vontade política e competências para concretizar e objetivar as ações empresariais, o que pode ser realizado através de um Código de Ética. Afirma ainda que vários erros estão propícios a acontecer quando a empresa não possui um código de ética definido e/ou quando possui mas não integra a ética constante em seu código para suas tomadas de decisões. As empresas se referem à introdução de um código de ética para respaldo, ou melhor, diz que “trata-se de uma espécie de mapa de valores e princípios, conduzindo a empresa ao cenário de negócios onde existem regras significativas de cidadania, eficiência de gestão, honestidade no uso dos recursos e respeito no tratamento com os seus vários interlocutores” (INSTITUTO ETHOS, 2000, p. 34). Todo código de ética é um instrumento de grande valia quando as pessoas que aderem a ele se comprometem com o seu conteúdo. O código de ética empresarial deve ser concebido pela própria empresa, e nele deve ser expressa a cultura da empresa, orientar as ações de seus colaboradores e explicitar a postura da empresa frente ao público com o qual interage (WHITAKER, 2006). Seguindo este contexto, Monteiro; Espírito Santo


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

41

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

e Bonacina (2005) destacam a intervenção da cultura na ética empresarial quando mencionam que “a cultura da empresa, que pode ser definida como um conjunto de valores, convicções, metas, normas e maneiras de resolver os problemas na organização, pode sugerir nos seus colaboradores atitudes éticas ou antiéticas” (p. 238), pois ela será o “reflexo” de seus colaboradores no desempenho interno de funções. Não existe uma fórmula única para se estruturar um código de ética empresarial, como informa o Instituto Ethos (2000), cada empresa escolhe a metodologia mais adequada, mais conveniente e importante de acordo com o seu ciclo de vida, anseio dos acionistas e também dos funcionários. Para alcançar sucesso na implantação de um Código de Ética numa empresa são necessárias intervenções nas diversas esferas de relacionamento, e ainda, um conjunto de ações acerca do comportamento das pessoas, que é a mais difícil de todas as esferas (INSTITUTO ETHOS, 2000). “Para que um Código de Ética seja bem-sucedido, sua concepção deve envolver todos os interlocutores com os quais a empresa se relaciona. É essa cumplicidade e transparência que levará os participantes desse processo a contribuir e dar vida às intenções presentes na origem do documento (INSTITUTO ETHOS, 2000, p. 8).”

De acordo com Whitaker (2006) existem algumas razões que estão levando as empresas a implantarem códigos de ética, como, aumentar a integração entre os funcionários da empresa; favorecer ótimo ambiente de trabalho para se obter boa qualidade na produção; proteger interesses públicos e de profissionais que contribuem para a organização; agregar valor e fortalecer a imagem da empresa, entre várias outras; e completa afirmando que “a credibilidade de uma instituição é o reflexo da prática efetiva de valores como a integridade, honestidade, transparência, qualidade do produto, eficiência do serviço e respeito ao consumidor”. Ao analisar a ética nas organizações, foi possível perceber que a implantação do código de ética realmente traz benefícios e que a conduta ética aplicada interna e externamente através de seus colaboradores, quer sejam do setor administrativo ou dos serviços gerais, gera resultados na produtividade, no atendimento, na administração bem como no relacionamento através dos direitos básicos necessários. Costa (2007, apud DENNY, 2001, p. 276) confirma as palavras citadas acima quando diz que “se as empresas agirem de forma ética podem estabelecer normas de condutas para seus dirigentes e empregados, exigindo que ajam com lealdade e dedicação”. Souza Neto (1999, apud NETO; LIBERAL, 2002, p. 49) ressalta que “A ética pode contribuir para melhorar a qualidade do trabalhador, à medida que focaliza como uma de suas metas prioritárias o desenvolvimento humano e econômico”.

“As transformações de nosso mundo não cessam de tornar mais aguda a necessidade de uma reflexão ética, precisa, informada, que se refere à história, que argumenta, analisa e revém aos grandes problemas (CANTO-SPERBER, 1998, p. 17 apud RIOS, 2003, p. 49).”

CONTEXTUALIZANDO A ÉTICA NA ESCOLA “A ética é um eterno pensar, refletir, construir. E, na escola, sua presença deve contribuir para que os alunos possam tomar parte nessa construção, serem livres e autônomos para pensar e julgar, para problematizar constantemente o viver pessoal e coletivo, fazendo o exercício da cidadania (Brasil, 1998, p. 24).”

Na época do regime militar, no período em que as escolas brasileiras pouco falavam de ética, ficando a formação do caráter do aluno sob a responsabilidade da disciplina de Moral e Cívica. Isso mudou com o decorrer dos anos, atualmente as escolas visam somar esforços, onde alunos, professores, funcionários e pais são agentes importantes na relação ética e escola, sendo necessária a atenção aos fatos, acontecimentos e problemas, bem como às soluções para resolvê-los, para formar cidadãos conscientes de seus deveres e direitos (OLIVEIRA, s/d). Atualmente a soma de esforços dos agentes formadores das escolas que são os alunos, professores, funcionários e pais, é essencial na relação “ética e escola”, portanto é importante estarem atentos aos fatos, acontecimentos e problemas, bem como às soluções para resolvê-los, visando a formação de cidadãos conscientes de seus deveres e direitos (OLIVEIRA, 2001). O Ministério da Saúde (2002, p. 535) diz que “O trabalho escolar lida com os valores, as crenças, os mitos e as representações que se têm sobre a própria relação do saber-fazer-ser educador e educando”. Por ser uma política pública de direito institucional, a educação abrange desde a democratização do ensino até sua qualidade, e precisa ser compreendida no contexto econômico, social e cultural em que se insere. É relevante a interação dos profissionais da educação com os alunos com os quais lidam e também com as famílias, a fim de conhecê -los, saber quais são suas dificuldades, seus planos, medos, anseios e potencialidades (STOPA; MUSTAFÁ, 2010). Parreira, Barros e Souza (2010, p. 61) dizem que o papel da educação é conduzir e preparar o indivíduo para o mundo. Ela detém a finalidade ética, “que é a capacidade de transcendência de si mesmo e das condições sócio-históricas de vida” e prosseguem dizendo que “enquanto fenômeno processual tem como finalidade o desenvolvimento da consciência humana acerca de si e da realidade objetiva na qual o ser humano está inserido” . Libâneo (1991, p. 100 apud RIOS, 2003, p. 52) ressalta que “Por intermédio do gesto de ensinar, o professor, na relação com os alunos, proporciona a eles, num exercício de mediação, o encontro com a realidade, considerando o saber que já possuem e procurando articulá -lo a novos saberes e práticas” e acrescenta também que é


Zaparoli e Graciano, 2011

42

possível possibilitar aos alunos a formação e o desenvolvimento de capacidades além de habilidades cognitivas. Boelter (2008) diz que seria viável que todos os membros de uma sociedade frequentassem a escola, pois é uma instituição que veicula e estabelece hierarquia de valores na vida do ser humano fazendo com que amplie sua formação moral, sua capacidade de julgamento e a consciência de como realizam escolhas. Santos (s/d, p. 1) ressalta como problema na sociedade brasileira contemporânea, entre vários outros, o “como educar para o respeito às diferenças e para o respeito a todos os seres humanos, sem violência. Essa questão é central para ética”. “Educar é extrair do presente a espécie e a potência de crescimento que este encerra dentro de si. Esta é uma função constante, independente da idade. A melhor coisa que se pode dizer a respeito de qualquer processo especial de educação, como o do período escolar formal, é que ele torna o indivíduo capacitado para receber posterior educação, torna-o mais sensível às condições de crescimento e mais capaz para delas tirar vantagens. Aquisição de habilidades, posse de conhecimentos, conquista de cultura, não são fins, são antes balizas de crescimento e meios para a sua continuação (OLIVEIRA, 2001, p. 225 apud DEWEY, op. cit., p. 183).”

O Ministério da Educação (BRASIL, 2004) aponta a ética como um dos quatro eixos (Ética, Convivência Democrática, Direitos Humanos e Inclusão Social) focados no trabalho com as escolas, a qual é levada ao ambiente escolar através de reflexões e discussões, mostrando seus valores, seus fundamentos e sua importância no desenvolvimento humano e suas relações com o mundo. No ambiente escolar, o aluno encontra espaço e oportunidade para desenvolver o diálogo, aprender a ser solidário, a ouvir e ser ouvido, a submeter suas idéias ao juízo dos outros. O educador deve fazer bom uso destas oportunidades realizando o trabalho pedagógico para que tenha sentido e significado para quem aprende e para quem organiza o processo (ZANDONADI, 2010). A autora fala também que é possível e necessária a construção da cidadania no espaço escolar, e este é o objetivo principal da ética na educação. Contribuir para a cidadania de um indivíduo ou resgatá-la significa assumir a causa dos direitos humanos como direitos de todos, e o espaço escolar proporciona situações para que tudo aconteça. Nesse contexto, Pereira e Silva (2008, p. 27) expõem claramente que a escola é o elo para a concretização da cidadania de muitos indivíduos quando diz que “A instituição educacional é uma das e, talvez, a mais importante responsável pela formação ética do indivíduo. Formação essa significativa para se exercer a cidadania de fato”. “Aprender a ser cidadão é, entre outras coisas, aprender a agir com respeito, solidariedade, responsabilidade, justiça, não violência; aprender a usar o diálogo nas mais diferentes situações e comprometer-se com o que acontece na vida coletiva da comunidade e do país. Esses valores e essas atitudes precisam ser aprendidos e desenvolvidos pelos alunos e, portanto, podem

e devem ser ensinados na escola (Brasil, 2001, p. 13).”

A contribuição da ética na escola é o seu comprometimento com a formação do indivíduo, visando o exercício da cidadania (BRASIL, 1997). Oliveira (2001, p. 212) menciona que “a escola, como espaço educativo é importante no processo formativo das crianças e dos jovens” e também quando diz que “A ética na escola vem sendo a menina dos olhos de muitos educadores” (s/d, p. 427). Para Hack e Gomes (2002, p. 55) despertar o ser humano para os valores essenciais da vida faz com que os diferentes povos e culturas busquem seus próprios valores. Os autores salientam ainda que “princípios éticos e educacionais definem os valores porque visam alcançar objetivos comuns: formar hábitos, costumes, comportamentos para a convivência social, e ao mesmo tempo informar o cidadão e fazê-lo consciente de seu compromisso social como participante solidário”. A ética, regras e valores que o indivíduo necessita podem ser transmitidos através de organizações institucionais (escolas), dos professores, dos livros didáticos e através do comportamento dos próprios alunos. Para que esses valores se interajam deve haver respeito com a individualidade de cada indivíduo, bem como com a sua realidade e da sociedade em que vive, tamanha é a interferência da diversidade social e cultural (BOELTER, 2008). A educação, para os autores Hack e Gomes (2002, p. 56) é entendida como meio de realização do homem, pois prepara a pessoa para habilitação profissional e para a própria vida através da convivência social. Os valores culturais, religiosos e éticos que são transmitidos e apreendidos preparam o educando para uma vida digna e de boa qualidade propiciando assim que exerça uma cidadania consciente, sendo de sua responsabilidade discutir esses valores estabelecendo diretrizes para a convivência social. “A educação deve ser julgada não tanto pelo que o homem possui em conhecimento, mas sim pelo que é e pelo que faz” (p. 56). De acordo com o Ministério da Saúde (2002, p. 533) “além de a escola ter uma função pedagógica específica, tem uma função social e política voltada para a transformação da sociedade, relacionada ao exercício da cidadania e ao acesso às oportunidades de desenvolvimento e de aprendizagem”. Quando os valores no conteúdo escolar e no exercício do ato de educar são valores humanizadores, constata-se que acontece a educação ética, que pode ser eficiente enquanto processo formativo, que é realizado no dia-a-dia e pode ser efetivado através de atividades práticas, possibilitando viver realmente esses valores dentro ou fora da sala de aula (BOELTER, 2008). “A escola, é assim, a agência de socialização na qual os indivíduos experimentam pela primeira vez um sistema institucionalizado de diferenciação com base na realização individual, o qual procura incutir a aceitação das regras de competição próprias da estrutura social e econômica” (AFONSO, 2005, p. 24).”


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

43

Artigos - Ciências Humanas e Sociais Aplicadas

Para finalizar, é importante ressaltar, conforme Andrade (2005, p. 68), que “quando o sonho de uma educação de qualidade para todas as classes sociais for efetivado em nossa sociedade, haverá suporte ideal para que as famílias desenvolvam melhor o seu papel social enquanto núcleo familiar e instituição”, por isso, o tópico três deste artigo enfatiza a família e o papel da ética em seu contexto. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após realizar o estudo do contexto histórico da ética e identificar através de pesquisas o papel da mesma na empresa, na escola, na família e na religião, foi possível concluir que o debate em torno da ética está cada vez mais presente nestes contextos. Os vínculos afetivo-familiares, o respeito, a tolerância, o aprendizado entre outros são fundamentais para a vivência e convivência em grupos sociais. Assim sendo, as escolhas realizadas no decorrer da vida, tanto no âmbito profissional quanto nos demais, estarão diretamente ligadas à formação de cada indivíduo, podendo estas propiciar resultados positivos e/ou negativos. Contudo, detectou-se também que ética tem a ver com regras, valores e princípios, verificando assim, pautando-se que cada instituição possui sua especificidade sendo possível filtrar a importância da mesma em cada uma delas. Quando se menciona empresa ética, é possível concluir que as pessoas que nela trabalham são éticas e buscam a excelência e também que seus fundadores possuem princípios e valores éticos na cultura da organização. A família, mesmo sendo a menor das instituições, é a mais importante por ser a base de todas, como já foi dito anteriormente. Conclui-se que realmente esta instituição possui um papel de intermédio entre o indivíduo e a sociedade sendo capaz de prevenir muitos males detectados nesta relação. Em relação à “escola e ética”, foi possível enfatizar que princípios éticos na educação visam o bem comum, pois a escola é um ambiente propício para desenvolver no indivíduo aptidões, bom senso, diálogo, responsabilidade, ou seja, desenvolver valores necessários para o indivíduo exercer sua cidadania. Portanto, fica claro que a escola contribui efetivamente na formação moral e ética de seus alunos. No contexto “ética e religião” detectou-se que a relação do homem com Deus é uma relação muito antiga, que resistiu e ainda resistirá ao tempo. O campo ético da religião é bem complexo, mas ainda assim, é possível observar que esta relação se atém aos valores regidos pelas igrejas e a conduta de seus seguidores, os quais retêm uma crença religiosa. Ao fomentar a fé nos ensinamentos cristãos, a igreja consegue manipular os princípios e até mesmo atos de seus seguidores. É importante, principalmente para as pessoas leigas, buscar esclarecimentos, quer seja através de livros, artigos e reportagens, ou através do auxílio de outras pessoas com quem se viva em sociedade, como por exem-

plo, seus professores. Para finalizar, as sábias palavras de Rio (2003, p. 62) definem e ressaltam o valor de todo este contexto ético para a vida do ser humano quando diz que: “Aprender é preciso, para viver. É preciso aprender a viver. E este viver não é algo abstrato, mas algo que transcorre na polis, na sociedade organizada, na relação com os outros”. O ser humano que carrega consigo ou traz de sua infância estes conceitos certamente, em sua vida adulta, irá aprimorá-los e aplicá-los para viver em um mundo melhor e contribuir para a construção de um mundo melhor, mais justo, solidário e ético. REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. Moralidade, ética e religião. 2006 ANDRADE, L. M. S. O. P. A importância de uma educação de qualidade no processo de inclusão social das famílias, na sociedade atual. In: Educar: prática em ação. 2. ed. ISEP/UEMG. Abril, 2005. ANDRADE, S. A.; SANTOS, D. N. S.; BASTOS,

A. C. B.; PEDROMÔNICO, M. R.M.; FILHO, N. A. F.; BARRETO, M. L. Ambiente familiar e de-

senvolvimento cognitivo infantil: uma abordagem epidemiológica. In: Revista Saúde Pública. vol. 39, n.4. São Paulo. 2005. AFONSO, A. J. Avaliação educacional: regulação e emancipação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2005. BARROCO, M. L. Ética: fundamentos sócio-históricos. V. 4. São Paulo: Cortez, 2008. BARTH, W. L. Homem pós-moderno, religião e ética. Teocomunicação. Porto Alegre, v.37, n. 155, mar. 2007. BOELTER, A. Ética na educação. 2008. BONHOEFFER, D. Ética. 2. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1991. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: apresentação dos temas transversais, ética. Brasília: MEC/SEF, 1997. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares nacionais: Terceiro e quarto ciclos; Apresentação dos temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998, 436. BRASIL. Ministério da Educação - Secretaria de Educação Fundamental. Ética e cidadania no convívio escolar. Brasília: MEC/SEF. 2001. BRASIL. Ministério da Educação. Programa de Desenvolvimento Profissional Continuado. Ética e cidadania: construindo valores na escola e na sociedade. Brasília: SEIF/SEMTEC /SEED/SEESP. 2004. CAMARGO, E. C. C.; FONSECA, J. A. L. A ética no ambiente escolar: educando para o diálogo. COSTA, I. L. Ética, ética Empresarial, Moral E Responsabilidade Social. Publicado em 23/05/2007.


44

COUTO, A. A importância da religião e da ética na educação. 2008. D’ASSUMPÇÃO, E. A. Comportar-se fazendo bioética para quem se interessa pela ética. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. DIAS, M. B. A ética na jurisdição de família. In: Revista Brasileira de Direito Constitucional. n.9. jan./ jun. 2007. FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio: o minidicionário da língua portuguesa. 7.ed. Curitiba: Positivo, 2008. FILHO, M. N. Qual a diferença entre moral e ética? In: Recanto das Letras. Publicado em 13/08/2005. GEISLER, N. L. Ética cristã: alternativas e questões contemporâneas. Sociedade Religiosa Edições Vida Nova: São Paulo. 1984. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. GOUVÊA, R. Q. Ética e cidadania: a busca humana por valores solidários. In: LIBERAL, M. M. C (org.). Um olhar sobre ética & cidadania. São Paulo: Editora Mackensie, 2002. HACK, O. H.; GOMES, A. M. A. Reflexões sobre educação, ética e cidadania a partir do pensamento reformado. In: LIBERAL, M. M. C (org.). Um olhar sobre ética & cidadania. São Paulo: Editora Mackensie, 2002. INSTITUTO ETHOS. Formulação e implantação de código de ética em empresas: reflexões e sugestões. Agosto, 2000. MACHADO, M. A. L. Ética, escola e família. 2010. MACHADO, M. C. Ética começa em casa. 2009. MATOS, A. S. de. As bases bíblicas da ética cristã. Instituto Presbiteriano Mackenzie. MENIN, M. S. S. Valores na escola. In: Educação e Pesquisa. São Paulo: vol.28, n.1, 2008. MINISTÉRIO DA SAÚDE. A promoção da saúde no contexto escolar. In: Revista Saúde Pública. 2002: 36(4): 533-535. MONTEIRO, J. K.; ESPIRITO SANTO, F. C. e BONACINA, F. Valores, ética e julgamento moral: um estudo exploratório em empresas familiares. In: Psicologia Reflexão e Critica. vol.18, n.2, 2005. MOREIRA, Joaquim Manhães. A Ética Empresarial no Brasil. São Paulo. Pioneira, 1999. NETTO, J. C. S.; LIBERAL, M. M. C. de. Apontamentos para uma compreensão da ética na dinâmica das transformações sociais. In: In: LIBERAL, M. M. C

Zaparoli e Graciano, 2011

(org.). Um olhar sobre ética & cidadania. São Paulo: Editora Mackensie, 2002. OLIVEIRA, R. J. Ética e educação: a formação do homem no contexto de crise da razão. In: Revista Brasileira de Educação. Mai/Jun/Jul/Ago 1996, n.2. OLIVEIRA, R. J. Ética na escola: (re)acendendo uma polêmica. In: Educação & Sociedade. Ano XXII, vol.22, n.76, out. 2001. OLIVEIRA, R. J. Identidade, alteridade e educação: pensando problemas contemporâneos. ORTIZ, R. Anotações sobre religião e globalização. Revista brasileira de ciências sociais. v.16 n.47. Out.2001 PARREIRA, L. A.; BARROS, J. M. P. de; SOUZA, T. M. C. Estado, governo e instituições: um olhar sobre a educação brasileira. In: PIMENTEL, R. C (org.). Estado, economia, trabalho e sociedade: o mosaico de uma nação. Franca: Unifran, 2010. PEREIRA, E. A.; SILVA, E. L. Educação, ética e cidadania: a contribuição da atual. Revista Eletrônica de Educação, v. 2, n. 1, jun. 2008. Artigos. ISSN 19827199. Programa de Pós-Graduação em Educação. PONCHIROLLI, O.; LIMA, J. E. S. Ética empresarial. Coleção Gestão Empresarial. RIOS, T. A. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor qualidade. ed. 4. São Paulo: Cortez, 2003. SANTOS, G. A. Ética e educação. Programa ética e cidadania: construindo valores na escola e na sociedade. SANTOS, J. A moral e a ética cristã. SILVA, P. Moral e ética. Escola Secundária Domingos Rebelo. 2006. STOPA, R.; MUSTAFÁ, P. S. Política educacional e serviço social: possibilidades e desafios. In: ALMEIDA, D. S. O. Educação e ensino: temas para o debate. Franca: UNESPFCHS, 2010. TERRA, L. Etica nas empresas. Publicado em: 09/10/2008. WIKIPÉDIA. A enciclopédia livre. Ética empresarial. WHITAKER, M. C. Por que as empresas estão implantando códigos de ética?. Publicado em 16/08/2006. VIEIRA, F. X. M. A família e o compromisso com a ética e a moral. ZANDONADI, C. Cidadania e ética na escola na busca da formação moral. Publicado em:21/10/2009.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

45

Artigos - Ciências da saúde

A importância de orientar os futuros profissionais da saúde para um atendimento mais humanizado The importance of guiding future health professionals to practice a more humane assistance Celia Borges Tonelli1, Claudia Cavalcante1, Leonice Serafim da Silva1, Adriana da Silva Fontes2 Resumo: Este trabalho foi desenvolvido por profissionais da área da saúde, que estavam se licenciando para a prática do magistério através do curso de Formação Pedagógica da UTFPR, e foi desenvolvido com alunos do curso técnico em enfermagem com o objetivo de sensibilizar os futuros profissionais para a prática de uma enfermagem mais ética, solidária e humana, preparando-os para saber lidar com a morte de pessoas sob seus cuidados no ambiente hospitalar. Através de práticas simples de humanização e mudanças em pequenos hábitos, este projeto proporcionou mais segurança aos alunos do curso técnico e proporcionou também mais motivação às futuras professoras para o exercício do magistério, mostrando que a educação pode fazer a diferença. Palavras-chave: Humanização da Assistência; Enfermagem; Morte. Abstract: This work was developed by health professionals, who were licensed for the practice of teaching through the teacher training course UTFPR, and was developed with students of technical nursing, with the aim at raising awareness for future professionals of a more ethical, solidary, and human nursing practice, to prepare them to cope with people’s death under their care in the hospital. Through simple practices of humanization and small changes in habits, this project provided more security to the students of the technical course and also provided more motivation for future teachers to the practice of teaching, showing that education can make a difference. Keywords: Humane assistance; Nursing; Death. INTRODUÇÃO Este projeto foi desenvolvido por alunas do curso de formação pedagógica da UTFPR, que são enfermeiras atuantes e, que visualizaram no curso, uma oportunidade para se dedicarem também ao exercício do magistério através da obtenção da licenciatura na disciplina profissionalizante de enfermagem. Foi aplicado a alunos do curso técnico em enfermagem, com o intuito de ajudar os futuros profissionais da área da saúde a adotarem práticas mais humanizadas durante o atendimento ao paciente. A humanização do atendimento de enfermagem envolve aliviar, confortar, ajudar, fornecer, promover, restabelecer, restaurar, salientando que a cura pode ou não acontecer. O cuidado passa a ser, então, imprescindível em todas as situações de enfermidades, incapacidades e durante o processo de morte, constituindo-se num atendimento calcado em princípios éticos e de valorização do ser humano em processo de adoecimento (BEDIN, RIBEIRO, BARRETO, 2005). Segundo o ex- Ministro da saúde, José Serra (2001), um hospital, com uma boa direção e uma boa equipe, funciona bem. Mas, com condições idênticas de trabalho, consegue melhores resultados se houver compromisso da liderança, qualidade na gestão, competência e criatividade da equipe. Os bons resultados dependem, em grande medida, da capacidade de o hospital oferecer

um atendimento humanizado à população. Para tanto, é necessário cuidar dos próprios profissionais da área da saúde, constituindo equipes de trabalho saudáveis e capazes de promover a humanização do serviço. Para SIQUEIRA et al. (2006), dentre os aspectos negativos do comportamento dos profissionais da saúde, destacaram-se as condutas mediadas por insensibilidade afetiva, o cuidado tecnicista, a ansiedade dos profissionais na rotina diária com pacientes graves, a alta rotatividade destes profissionais, o elevado número de absentismo, a insatisfação no trabalho, a exigida agilidade na assistência e a grande demanda. Indicadores de que há emergente necessidade de investir na prática humanizada de enfermagem, objetivando a melhor condição de vida possível para o paciente e seu familiar. Segundo Brunner & Suddarth, (2005), a enfermagem é o elo consistente no sentido de promover a compreensão da doença e o processo de morte, bem como tornar o evento mais controlável para o paciente e para a família. O paciente e a família precisam de assistência para solucionar os problemas e prosseguir através do trabalho em relação ao luto. Para Bifulco & Iochida, (2009), embora, o despreparo dos profissionais de enfermagem em lidar com a morte tem como causas além dos aspectos cultural, espiritual e pessoal, o ensino nos cursos que reforçam a formação técnica – cientifico dos futuros profissionais,

Enfermeira e discente do Programa especial de Formação Pedagógica, Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Campus Campo Mourão). Email: tonelli40@hotmail.com 2 Docente da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR (Campus Campo Mourão) 1


46

propiciando pouco espaço para a abordagem dos aspectos emocionais, espirituais e sociais do ser humano, deixando lacunas e impulsionando o profissional a acreditar que somente a vida, a cura, restabelecimento são características de um bom cuidado. A morte é abordada de forma superficial (AGUIAR, 2006) e o despreparo dos profissionais chega a ser preocupante. Nesse sentido, muitas vezes a morte pode ser associada como derrota, perda, frustração, justamente o oposto da meta dos cursos de enfermagem. Segundo Bretas (2006), a morte não é somente um fator biológico, mas um processo construído socialmente. Assim, a morte está presente em nosso cotidiano e, independente de suas causas ou formas, seu grande palco continua sendo os hospitais e instituições de saúde. Ela incomoda e desafia a onipotência humana e profissional, pois os profissionais da área da saúde são ensinados a cuidar da vida, mas não da morte (SALOMÉ et al, 2009), tratando o paciente muitas vezes, como um instrumento de trabalho, por falta de sensibilidade e despreparo emocional da equipe. Esse comportamento pode ser devido a sua formação, pois muitos cursos na área da saúde, não possuem uma disciplina curricular que trate do assunto de forma não defensiva. Os profissionais de saúde sentem-se responsáveis pela manutenção da vida de seus pacientes, e acabam por encarar a morte como resultado acidental diante do objetivo da profissão, sendo esta considerada como insucesso de tratamentos, fracasso da equipe, causando angústia àqueles que a presenciam (CÂNDIDO, 2009). Para conviver com esses sentimentos, os profissionais utilizam de estratégias como o distanciamento do paciente tornando-se “menos humanas para desenvolverem um bom trabalho”(ROSA et al, 2006). Já algumas buscam na religiosidade a minimização do sofrimento, o apoio, o conforto possibilitando um suporte aos pacientes e familiares para que estes superem seus conflitos tanto físicos como emocionais e espirituais (BARBOSA et al, 2011). Motivados pelo contexto apresentado elaboramos este trabalho com o intuito de junto aos estudantes do curso técnico em enfermagem, desenvolvermos práticas mais humanizantes, contribuindo assim para reduzir seus medos e melhorar o atendimento do serviço prestado ao paciente, pois é no processo de formação do futuro profissional que se enraízam valores e atitudes de humanização. DESENVOLVIMENTO DO PROJETO Este Projeto teve a duração de 30 horas e foi realizado no Colégio Estadual Polivalente, na cidade de Goioerê (PR), nas turmas do 1º, 2º e 3º períodos, do Curso pós-médio em Técnico de Enfermagem, cuja duração é de 4 períodos. Este curso tem como principal clientela, pessoas da cidade e região, com aptidão para a área da saúde, mas

Tonelli et al., 2011

cuja maioria não tem acesso ao ensino superior no curso de Enfermagem por não existir o curso em Universidades públicas da região e procuraram o curso a fim de serem inseridos no mercado de trabalho, melhorando seu padrão de vida e sua escala social. Com a intenção de motivar o aluno para o exercício de sua profissão, mostrar a sua importância no processo de tratamento do paciente e dar-lhe mais segurança em lidar com pacientes em fase terminal foram realizadas várias atividades com os alunos, entre as quais: dinâmicas de grupo, aulas expositivas, debates, trabalhos em equipe e realização de palestras sobre os temas: Percepção da Enfermagem perante a Morte; Morte e Luto no contexto hospitalar; Sensibilização da Enfermagem perante a Morte; A Morte e o Morrer e também Ética na Enfermagem. Discutiu-se também sobre os 20 “sonhos” a serem conquistados no decorrer da sua vida. O trabalho foi acompanhado por uma psicóloga da instituição objetivando avaliar as mudanças na conduta dos alunos participantes do projeto. A primeira atividade foi desenvolvida em grupo de até 5 alunos, onde foi simulada uma situação do dia a dia, para mostrar ao aluno, como ele deve agir. • 1º Momento Inicialmente os alunos foram orientados para confeccionar um personagem de qualquer sexo e idade utilizando os materiais disponíveis e após, atribuir características que o identifiquem, tais como: nome, profissão, hábitos diários, nome dos familiares, estado civil, roupas que gosta de usar, ou seja, deveriam “dar vida” a esse personagem. • 2º Momento Após esse tempo os alunos são convidados a apresentarem seus personagens uns aos outros (10 minutos para cada grupo); De posse desse conhecimento o professor deverá desenvolver um pouco a história de cada um dos personagens determinando que durante a trajetória de vida dos mesmos ocorreram adversidades que os levaram à internação hospitalar. Após esta apresentação, as professoras distribuem aos alunos alguns equipamentos e artefatos de manutenção da integridade vital nos seus (agora) “pacientes” e mostra como utilizar. • 3º Momento Foi solicitado que os alunos saíssem da sala e apagassem algumas luzes para deixar o ambiente na penumbra; Dispor a mesa da sala na posição horizontal e colocar o material de preparo do corpo pós-morte ao lado; Colocar um lençol sobre a mesa. Vestir um jaleco (esse exercício poderá ser realizado no laboratório de enfermagem, utilizando maca e/ou leito, biombo, simu-


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

47

Artigos - Ciências da saúde

lando a unidade do paciente). Solicitar que entre o primeiro grupo, que disponha o paciente na mesa (leito) e notificar aos mesmos que “aquela” pessoa não resistiu aos ferimentos e foi a óbito; Desenvolver com a participação dos alunos a técnica de preparo do corpo pós-morte; e assim sucessivamente com os outros grupos. • 4º Momento Discussão com os alunos sobre como foi criar um personagem, cuidar do mesmo quando de seu adoecimento, receber a notícia do óbito e preparar o corpo. Discutir temas como mecanismos de defesa, adoecimento, perda, saúde/doença, respeito ao próximo, cuidado e morte. Com a finalidade de levar o aluno a compreender o comportamento do seu paciente em fase terminal e de como confortá-lo foi realizado debates sobre “Os 5 Estágios da Dor da Morte” (KÜBLER-ROSS , 1994) (Quadro 1). Os materiais utilizados para o desenvolvimento das atividades foram: data show, filmes e slides; flip chart; TV e livros sobre o tema para pesquisa e debates. A (Figura 1) mostra uma dinâmica onde o aluno do curso aprende a interagir com o paciente. Os mesmos também foram treinados a preencher um formulário de óbito e puderam compreender a importância deste documento, pois é a partir deste documento que a família pode questionar como se deu a morte. CONSIDERAÇÕES FINAIS Inicialmente foram diagnosticados que as dificuldades, angústias e insegurança geradas no cotidiano da equipe de enfermagem se dão pela falta de habilidades para lidar com diversas situações no atendimento ao paciente, entre os quais como abordar o tema “morte”. Os problemas identificados pelo grupo foram os mesmos problemas enfrentados pelas enfermeiras há anos atrás, indicando provavelmente que boa parte dos cursos de formação na área da saúde ainda não estão atualizados para esta prática humanizante. Inicialmente foi observado também, por parte de alguns alunos, falta de comprometimento com a ética e o cuidado desenvolvido de maneira holística para com o ser humano. Quadro1: Cinco estágios discretos pelo qual as pessoas passam ao lidar com a perda, o luto e a tragédia, segundo KÜBLER-ROSS, (1994). Estágio 1º. 2º. 3º. 4º. 5º.

Fase Negação e Isolamento Raiva Barganha Depressão Aceitação

Figura 1: (a) A aluna serve como molde para marcar as dimensões do corpo humano; (b) desenho representando um paciente, onde os alunos anotam as características do mesmo. O desenvolvimento do projeto foi de extrema importância para a nossa formação e para sensibilizar os educandos para a prática de uma enfermagem mais ética, solidária e humana. Os alunos se mostraram bastante motivados ao identificar práticas simples e mais humanas no atendimento ao paciente. E, também, reconheceram que a humanização melhora a qualidade do atendimento prestado. Surge a necessidade de se repensar e reavaliar os conteúdos que estão sendo ministrados durante a formação do futuro profissional, quanto à qualidade do ensino e dos profissionais que estão sendo formados e encaminhados para o campo de trabalho, sendo imprescindível que os alunos recebam uma formação mais humanista (BEDIN; RIBEIRO & BARRETO, 2005). Para Mafra & Deoprá, (2009), os graduandos do curso de enfermagem estão indo a campo de estágio sem o preparo ideal sobre a temática morte e morrer, e dizem se sentirem despreparados para lidar com o tema. Com isso viram a importância de um preparo psicológico quando ainda na graduação dos mesmos, para que se torne um profissional disposto a encarar qualquer situação, inclusive o processo de morte- morrer. Consideramos, portanto, importante à inserção do tema humanização nos cursos na área da saúde, pois poderá contribui para a formação de um profissional mais preparado, e assim contribuir para a melhoria no atendimento ao paciente. É no processo de formação dos alunos que se podem enraizar valores e atitudes de respeito à vida humana, indispensáveis à consolidação e à sustentação de uma nova cultura de atendimento à saúde. Para nós, futuros professores da área de enfermagem, a aplicação deste projeto com os alunos foi essencial à formação deles e à nossa formação, pois nos mostrou que o professor pode fazer a diferença na for-


48

mação do aluno, propiciando-nos uma reflexão sobre a importância do trabalho do professor. REFERÊNCIAS AGUIAR, I.R.; VELOSO, T. M. C.; PINHEIRO, A. K. B.; XIMENES, L. B. O envolvimento do enfermeiro no processo de morrer de bebês internados em Unidade Neonatal. Rev. Acta Paul. Enferm. São Paulo, v.19, n2, 2006. BALLONE, G.J. - Lidando com a Morte - PsiqWeb Psiquiatria Geral. 2002. Disponível em: <http://gballone.sites.uol.com.br/voce/morte1.html>. Acesso em, 10/10/2010 BARBOSA, C. S. P.; MARCOLINO, E. C.; SOUZA, F. F.; MAGALHÃES, F. C.; LEITE, R. F. B. Percepção da morte no olhar do enfermeiro. XV Encontro Latino Americano de Iniciação científica e XI Encontro Latino Americano de Pós-Graduação do Vale do Paraíba. .Disponível em: <http://www.inicepg.univap.br/cd/ INIC_2011_futuro/anais/arquivos/RE_0578_0588_01. pdf>. Acesso em: 02/11/2011. BEDIN, E.; RIBEIRO, L. B. M.; BARRETO, R. Ap. S. S. – Humanização da assistência de enfermagem em centro cirúrgico. Rev. Eletr. Enf., v. 07, n. 01, p. 118 – 127, 2005. Disponível em: <http://www.fen. ufg.br/revista/revista7_1/revisao_04.htm>. Acesso em 31/10/2011. BIFULCO, V. A.; IOCHIDA, L. C. A formação na graduação dos profissionais de saúde e a educação para o cuidado de pacientes fora de recursos terapêuticos de cura. Rev. bras. educ. med. vol.33 no.1 Rio de Janeiro Jan./Mar. 2009. Disponível em: <http:// w w w. s c i e l o . b r / s c i e l o . p h p ? s c r i p t = s c i _ a r t t e x t&pid=S0100-55022009000100013>. Acesso em 23/10/2011. BRETAS, José Roberto da Silva; OLIVEIRA, José Rodrigo de; YAMAGUTI, Lie. Reflexões de estudantes de enfermagem sobre morte e o morrer. Rev. esc. enferm. USP, São Paulo, v.40, n.4, 2006. Disponível em: <http://www.ee.usp.br/reeusp/upload/pdf/279.pdf>. Acesso em 31/10/2011.

Tonelli et al., 2011

BRUNNER & SUDDARTH. Tratado de enfermagem Médico- cirúrgica. São Paulo: Guanabara Koogan, 2005. CÂNDIDO, J. A morte sob a ótica da enfermagem. 2009. Disponível em: <http://www.webartigos.com/ artigos/a-morte-sob-a-otica-da-enfermagem/22408/>. Acesso em 21/07/2010. KÜBLER-ROSS, E. Sobre a Morte e o Morrer. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1994. 291p. MAFRA, V. A; DALPRÁ, L. R. O processo de morte-morrer sob a ótica do graduando de enfermagem. Disponível em: <http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_22989/artigo_sobre_o_processo_de_mortemorrer_sob_a_%C3%93tica_do_graduando_de_enfermagem>. Acesso em 02/11/2011. ROSA, A. F.; LUNARDI, V. L.; BARLEN, E. D.; LUNARDI FILHO, W. D. Percepções dos Enfermeiros Frente aos sentimentos de que vivência o Processo de morrer e morte. Ciência, Cuidado e Saúde. Maringá, V. 5, n. 2, p. 204-211, 2006. SALOMÉ, G, M; CAVALI, A.; ESPÓSITO, V. H. C. Sala de emergência: o cotidiano das vivências com a morte e o morrer pelos profissionais de saúde. Rev. bras. enferm. vol.62 n.5, Brasília, Sept./Oct. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672009000500005>. Acesso em: 23/10/2011. SERRA, J. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde. Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar – Brasília: Ministério da Saúde, 2001. SIQUEIRA, A. B., FILIPINI, R.; POSSO, M. B. S; FIORANO, A. M. M.; GONÇALVES, S. A. Relacionamento enfermeiro, paciente e família: fatores comportamentais associados à qualidade da assistência - Disponível em: <http://site.fmabc.br/admin/files/revistas/31amabc73.pdf>. Acesso em: 17/08/2011.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

49

Artigos - Ciências da saúde

Pseudoaneurisma em face diafragmática de ventrículo esquerdo após infarto agudo do miocárdio Pseudo-aneurysm in diaphragmatic face in left ventricle after acute myocardial infarction Geovane Aquino Formagio Lima1; Fernando Farina Figueiredo1; Daniela Sica Silva de Araújo2 Resumo: O presente estudo relata o caso de um paciente de 56 anos, sexo masculino, com diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM), tratado com reperfusão química, que evoluiu no terceiro dia de internação com novo episódio de precordialgia de forte intensidade, e mantinha supradesnivelamento do seguimento ST em eletrocardiograma (ECG). Foi submetido à cineangiocoronariografia que identificou oclusão de ramo posterior esquerdo e lesão compatível com pseudoaneurisma de ventrículo esquerdo, confirmado pelo ecocardiograma. A equipe em conjunto com o paciente optou pelo tratamento clínico. O paciente segue em acompanhamento no ambulatório de cardiologia. Palavras-chave: Ventrículo Esquerdo; Infarto Agudo do Miocárdio. Abstract: This study reports the case of a 56-year-old patient, male, with a diagnosis of acute myocardial infarction, treated with chemical reperfusion, which evolved on the third day of hospitalization with new episode of intensive precordial pain and held ST segment over-elevation in electrocardiogram. It was submitted to cineangiocardiography which identified the left posterior branch occlusion and pseudoaneurysm compliant lesion of the left ventricle, confirmed by Echocardiogram. The team along with the patient opted for clinical treatment. The patient follows being monitored in cardiology clinic. Keywords: Pseudoaneurysm; Left Ventricle; Acute Myocardial Infarction. INTRODUÇÃO O pseudoaneurisma do ventrículo esquerdo é uma complicação mecânica rara do infarto agudo do miocárdio. Ocorre quando aderências preexistentes entre o pericárdio e o epicárdio são capazes de conter o sangramento de uma ruptura cardíaca (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998; CATHERWOOD et al., 1980; SANTOS et al., 2005). Tem como características um formato sacular, orifício estreito, paredes formadas por tecido fibroso e pericárdico, fluxo em seu interior podendo conter trombos (CATHERWOOD et al., 1980; PACHECO et al., 2005). Em suas paredes não há tecido muscular, o que o diferencia do aneurisma ventricular verdadeiro. Discinesia e trombos podem estar presentes tanto no pseudoaneurisma como no aneurisma verdadeiro (OTTO; STRATTON, 1988; CATHERWOOD et al., 1980). O pseudoaneurisma pode se desenvolver após um infarto do miocárdio transmural, cirurgia cardíaca, trauma ou infecção. Está frequentemente associado a sinais e sintomas como insuficiência cardíaca congestiva, angina e dispnéia. Alterações do segmento ST e na radiografia de tórax, como alargamento da área cardíaca e massa paracardíaca, também são frequentes (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). O ecocardiograma (ECO) é um exame útil na maioria dos casos. O ECO transesofágico pode ser capaz

de definir o diagnóstico em cerca de 75% dos casos, com uma acurácia semelhante à ressonância magnética (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). O risco de ruptura do pseudoaneurisma está entre 30% e 45% (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998), com maior propensão para ruptura secundária entre 10 dias e 3 meses após o infarto agudo do miocárdio (IAM) (CSAPO et al., 1997) . O reparo cirúrgico é o tratamento de escolha, pelo risco de ruptura, hemopericárdio e morte (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998; PACHECO et al., 2005; SANTOS et al., 2005). Os pseudoaneurismas tendem a aumentar rapidamente de tamanho, o que os torna propensos à ruptura. A mortalidade cirúrgica está entre 7 e 23% (SANTOS et al., 2005). A mortalidade é alta e está diretamente relacionada a uma função ventricular ruim ou necessidade de substituição da valva mitral, e não está relacionada a dificuldades técnicas no reparo cirúrgico (PRÊTRE et al.,2000). MATERIAL E MÉTODO Estudo realizado em paciente admitido no Hospital Beneficência Portuguesa de Ribeirão Preto, na enfermaria de clínica médica, com diagnóstico de infarto agudo do miocárdio. A pesquisa teve como fonte de consulta o prontuário médico e as bases de dados PubMed, Wiley Online Library, ScienceDirect.

Discente do curso de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Docente da faculdade de Medicina da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP); Cardiologista e ecocardiografista Hospital Beneficência Portuguesa de Ribeirão Preto (SP). Email: danisica@hotmail.com. 1 2


50

A assistência médica dispensada ao paciente levou em consideração os recursos disponíveis e as evidências científicas atuais. RELATO DE CASO Paciente, 56 anos, sexo masculino, admitido no serviço de pronto atendimento com queixa de dor retroesternal em repouso há 4 horas e meia, do tipo aperto, de intensidade 8 em 10, que irradiava para região axilar esquerda, associada à sudorese e sensação iminente de morte, sem outros sintomas concomitantes. Hipertenso em uso de propranolol (40 mg 12/12 horas), hidroclortiazida (100 mg/dia) e ácido acetilsalicílico (100 mg/ dia). História familiar de coronariopatia. Ao exame encontrava-se em regular estado geral, pressão arterial de 130x80 mmHg, frequência cardíaca de 63 batimentos por minuto (bpm) e saturação de oxigênio 97% com cateter de oxigênio 3L por minuto. Exame cardiopulmonar estava normal. O eletrocardiograma apresentava ritmo sinusal com frequência cardíaca de 69 bpm, supradesnivelamento do segmento ST em DII, DIII e aVF e bloqueio completo de ramo direito. A CKMB sérica da admissão era de 68 U/l. O paciente foi internato em UTI onde foi submetido à trombólise química com streptoquinase (1.500.000 UI) em uma hora apresentando durante a infusão bradicardia e níveis pressóricos adequados. Apresentou melhora da dor anteriormente referida. No terceiro dia de internação o paciente referiu novo episódio de precordialgia, e mantinha elevação do segmento ST em DII, DIII e aVF. Foi submetido, então, a uma cinecoronariografia e ventriculografia que identificou: oclusão de ramo posterior esquerdo e imagem sugestiva de pseudoaneurisma de ventrículo esquerdo em face diafragmática do coração (Figura 1) Para melhor avaliação do pseudoaneurisma foi rea-

Figura 1: Estudo angiográfico com imagem característica de pseudoaneurisma em face diafragmática de ventrículo esquerdo.

Lima, Figueiredo e Araújo, 2011

lizado um ecocardiograma que indicou: fração de ejeção de 50%, falha da musculatura ventricular esquerda localizada entre as paredes inferior e septal com 0,5 cm de largura e comprimento não mensurado sugestiva de pseudoaneurisma (Figura 2). O paciente se mantinha estável hemodinamicante e foi transferido para a enfermaria onde permaneceu assintomático por um período de duas semanas. Por se apresentar assintomático, e tratar-se de um pseudoaneurisma de pequeno tamanho, recebeu alta hospitalar e aguarda reavaliação da equipe de cirurgia cardíaca. O paciente segue em acompanhamento em ambulatório de cardiologia.

Figura 2: Imagem ecocardiográfica com pseudoaneurismo em parede inferior de VE, sem fluxo através do mesmo. DISCUSSÃO A ruptura cardíaca constitui 4-24% das complicações após infarto agudo do miocárdio. A ruptura da parede livre do ventrículo esquerdo frequentemente está associada ao hemopericárdio e tamponamento cardíaco, levando à morte súbita (HUNG; WANG; CHERNG, 1998). Raramente uma ruptura cardíaca pode evoluir com a formação de um pseudoaneurisma cardíaco, quando aderências entre o epicárdio e o pericárdio previamente existentes são capazes de conter o sangramento, confinando-o em uma pequena área adjacente (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998; HUNG; WANG; CHERNG, 1998; CATHERWOOD et al., 1980). A incidência do pseudoaneurisma é baixa, apontada como 0,23% a 0,5% em estudos retrospectivos de pacientes submetidos a cateterismo cardíaco (CSAPO et al., 1997). O pseudoaneurisma pode se desenvolver após infarto transmural do miocárdio (55%), cirurgia cardíaca (33%), trauma (7%) ou infecção (5%). Pseudoaneurismas pós-cirúrgicos são mais frequentes após cirurgias de troca de valva mitral e aneurismectomia de ventrículo esquerdo (VE) (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). O local mais envolvido é a parede posterior (43%), seguida da lateral (28%), apical (24%) e inferior (19%).


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

51

Artigos - Ciências da saúde

A localização difere da localização típica dos aneurismas verdadeiros, que envolvem as faces diafragmáticas e póstero-lateral em apenas 4% dos casos (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). O pseudoaneurisma é assintomático em apenas 12% dos casos, onde fora identificado em exames de rotina. Os sintomas e condições associados mais frequentes são: insuficiência cardíaca congestiva (36%), angina (30%), dispnéia (25%), arritimias (5%). Sopro cardíaco esteve ausente em 30% dos casos (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). Cerca de 95% dos pacientes podem apresentar alguma alteração no ECG ou no Raio-x de tórax. No exame radiográfico podemos encontrar alargamento da área cardíaca (44%), massa paracardíaca (31%) ou ambos (22%). No ECG alterações não específicas do segmento ST estavam presentes em 74% dos casos, e supradesnivelamentos do segmento ST em 21% (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). A elevação persistente do segmento ST em área previamente infartada pode estar associada à presença do pseudoaneurisma. (CSAPO et al., 1997). • Métodos diagnósticos A angiografia do ventrículo esquerdo e das artérias coronárias é considerada o melhor exame disponível para o diagnóstico de pseudoaneurisma de VE. Achados angiográficos que ajudam a distinguir falsos aneurismas incluem um orifício estreito levando a um aneurisma sacular e ausência de artérias coronárias nas áreas adjacentes (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). A ventriculografia contratada pode sugerir o pseudoaneurisma pela identificação de seu orifício estreito, mas nem sempre pode descartá-la quando uma cavidade aneurismática é encontrada (PRÊTRE; et al..,2000). A sobreposição de imagens também pode dificultar o diagnóstico. Os trombos que podem acompanhar os pseudoaneurismas podem dificultar a entrada do contraste impedindo sua correta avaliação (OTTO; STRATTON, 1988). São características do pseudoaneurisma no ECO: orifício estreito quando comparado a seu diâmetro, descontinuidade abrupta entre o pseudoaneurisma e o miocárdio normal adjacente, paredes formadas por tecido fibroso e pericárdio, ausência de camada muscular. Discinesia e trombos podem estar presentes no pseudoaneurisma assim como no aneurisma verdadeiro (OTTO; STRATTON, 1988; CATHERWOOD et al., 1980; PACHECO et al., 2005). Em 115 pacientes avaliados com ECO 2D, este exame foi útil em 65% dos casos, e definiu o diagnóstico de pseudoaneurisma em 26% dos casos (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). Segundo Frances, et al. (1998), o ECO transesofágico foi capaz de definir o diagnóstico em 75 % dos

casos. O ECO transesofágico e a ressonância magnética apresentam uma acurácia de 75% no diagnóstico do pseudoaneurisma quando comparados à angiografia. Este mesmo estudo afirma que o ECO 2D foi útil em 65% dos casos de pseudoaneurisma e definiu o diagnóstico em 26% dos casos. • Tratamento e prognóstico A sobrevivência após um pseudoaneurisma pós -IAM é rara devido à pequena espessura de suas paredes, e relativa desorganização do hematoma intracavitário (HUNG; WANG; CHERNG, 1998). Pseudoaneurimas têm propensão para ruptura secundária entre 10 dias a 3 meses após um IAM (CSAPO et al., 1997). O risco de ruptura do pseudoaneurisma está entre 30% e 45% (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). Pseudoneurismas pequenos e assintomáticos apresentam um curso mais estável, com menor risco de ruptura (PRÊTRE et al., 2000). Caso haja a opção por acompanhamento clínico do paciente, a presença de expansão demonstrada por ecocardiografia, ou aparecimento de sintomas favorece a decisão pelo tratamento cirúrgico (PRÊTRE et al.,2000). O reparo cirúrgico do pseusoaneurisma pós-IAM tem sucesso em 80% dos casos (CSAPO et al., 1997). Em casos agudos um retalho epicárdico ou sintético pode ser utilizado em tecido com necrose recente de forma eficaz e confiável, a fim de evitar excesso de tração local. Em casos crônicos o colo do pseudoaneurisma pode ser fechado diretamente devido à existência de fibrose do tecido, capaz de suportar a tensão. A presença de trombos pode tornar necessário o pinçamento da aorta e fazer necessária a utilização de circulação extracorpórea (SANTOS et al., 2005; PRÊTRE et al.,2000). Encontramos altas taxas de mortalidade em pacientes submetidos à cirurgia (23%), bem como naqueles tratados clinicamente (48%). Este mesmo estudo afirma que a melhora das técnicas cirúrgicas pode ter diminuído o índice de mortalidade para próximo de 10% (FRANCES; ROMERO; GRADY, 1998). Pseudoneurismas crônicos são aqueles identificados com mais de 3 meses após um infarto do miocárdio ou cirurgia cardíaca. Em 10 a 20% dos casos estes pseudoaneurismas são descobertos incidentalmente, e em sua maioria foram detectados após sintomas como angina, e insuficiência cardíaca (PRÊTRE et al., 2000). Pseudoneurismas pequenos e assintomáticos apresentam um curso mais estável, com menor risco de ruptura. Caso haja a opção por acompanhamento clínico do paciente, a presença de expansão demonstrada por ecocardiografia, ou aparecimento de sintomas favorece a decisão pelo tratamento cirúrgico (PRÊTRE et al., 2000).


Lima, Figueiredo e Araújo, 2011

52

CONCLUSÃO O pseudoaneurisma do ventrículo esquerdo é uma complicação mecânica rara, mais frequentemente associado ao infarto do miocárdio. Seu diagnóstico requer grande suspeição clínica e confirmação por exames de imagem, visto que esta condição não apresenta sintomatologia específica. A persistência da dor ou supradesnivelamento do segmento ST, e alterações na radiografia de tórax podem ser indícios desta condição. O tratamento clínico pode ser uma opção nos casos de pseudoaneurismas pequenos e assintomáticos, entretanto a presença de sintomas ou aumento da lesão demonstrada por exames de imagem favorecem a decisão de tratamento cirúrgico. REFERÊNCIAS

CATHERWOOD E.; et al. Two-dimensional echocardiographic recognition of left ventricular pseudoaneurysm. Circulation – Journal of the American Heart Association, v. 62, p. 294-303, 1980. CSAPO K.; et al. Postinfarction Left Ventricular Pseudoaneurysm. Clinical Cardiology, v. 20, n. 10, p. 898-903, 1997. HUNG M. J.; WANG C. H.; CHERNG W. J. Unruptured left ventricular pseudoaneurysm following myocardial infarction. Heart (British Heart Journal), v. 80, p. 94-97, 1998.

FRANCES C.; ROMERO A.; GRADY D. Left ventricular pseudoaneurysm. Journal of the American College of Cardiology, v. 32: n. 3, p. 557–61, 1998. OTTO C. M.; STRATTON J. R. Postinfarction left ventricular pseudoaneurysm: Echocardiographic diagnosis and prolonged survival in three patients. Clinical Cardiology, v. 11, n. 3, p. 189-192, 1988. PACHECO J. B. C.; et al. Diagnóstico e evolução de pseudoaneurisma de ventrículo esquerdo pós-infarto do miocárdio. Revista Brasileira de Ecocardiografia, v. 18, n.1, p. 63-68, 2005. PRÊTRE R.; et al. Surgical Treatment of Acquired Left Ventricular Pseudoaneurysms. The Annals of Thoracic Surgery, v.70, p. 553-557. SANTOS L. A. S.; et al. - Coexistência de múltiplas complicações mecânicas decorrentes de episódio único de infarto agudo do miocárdio: tratamento cirúrgico com sucesso. Brazilian Journal of Cardiovascular Surgery; v. 20, n.4, p. 438-440, 2005.


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

53

Artigo - revisão

Endometriose em diferentes faixas etárias: perspectivas atuais no diagnóstico e tratamento da doença Endometriosis in different age groups: perspectives on the current diagnosis and disease treatment Érica Patrícia de Souza Cardoso1; Neriane Magalhães Anselmo1; Katia Jacqueline Miguel2; Alessandra Bonacini Cheraim Silva3. Resumo: A endometriose é uma patologia ginecológica crônica em sua maioria benigna, caracterizada pela presença de tecido endometriótico fora da cavidade uterina. É uma das principais causas de dor na região pélvica e infertilidade em pacientes na idade reprodutiva, estima-se que existam milhões de mulheres acometidas no mundo, em países industrializados é considerada uma das principais causas de hospitalização ginecológica. Através deste artigo buscamos descrever a patologia da endometriose juntamente com seu diagnóstico e tratamento, comparando o desenvolvimento em faixas etárias diferentes de acordo com suas manifestações, destacando suas principais características na mulher adolescente e adulta, visto que em estudos ascendentes à patologia era tratada como a doença da mulher moderna tendo predomínio de casos em mulheres adultas. Assim, através de estudos de revisão bibliográfica, concluímos que a endometriose afeta todo o período da vida reprodutiva da mulher desde a menarca na fase da adolescência até a menopausa, sendo necessário um diagnóstico precoce para a implantação de um tratamento eficaz a paciente, pois normalmente a doença é descoberta em mulheres adultas com problemas de fertilidade, não ocorrendo um acompanhamento adequado durante o amadurecimento da paciente, podendo acarretar danos irreversíveis ao aparelho reprodutivo feminino. Palavras-chave: Endometriose; Faixa Etária; Adolescente; Mulher Adulta. Abstract: Endometriosis is a chronic gynecological disease in its most benign, characterized by the presence of endometrial tissue outside the uterine cavity. It is a major cause of pelvic pain and infertility in patients of reproductive age, it is estimated that there are millions of women living in the world, in industrialized countries is considered a leading cause of gynecologic hospitalization. Through this article we seek to describe the pathology of endometriosis along with its diagnosis and treatment, comparing the development in different age groups according to their manifestations, highlighting their main characteristics in adolescent and adult women, since studies in the ascending condition was treated as the disease of the modern woman with a predominance of cases in adult women. Thus, through studies of literature review, we conclude that endometriosis affects the entire period of the woman’s reproductive life from menarche in adolescence through menopause, early diagnosis is necessary for the implementation of an effective treatment to patients because they usually the disease is discovered in adult women with fertility problems and there was no proper monitoring of the patient during ripening, which may cause irreversible damage to the female reproductive tract. Keywords: Endometriosis; Age; Adolescent; Adult Woman. INTRODUÇÃO A endometriose é uma patologia ginecológica crônica que se manifesta em mulheres em idade reprodutiva sendo caracterizada pela presença de tecido endometriótico fora da cavidade uterina. É uma das principais causas de dor na região pélvica e infertilidade em pacientes na idade reprodutiva, estima-se que existam milhões de mulheres acometidas no mundo, em países industrializados é considerada uma das principais causas de hospitalização ginecológica. Os focos de células endometriais são estimulados por hormônios ovarianos e se implantam em diversos locais, sendo o mais comum peritônio, ovário, reto, bexiga, tuba uterina e ureteres, desenvolvendo um suprimento vascular capaz de

possibilitar o seu crescimento no local em que o tecido se implantar (LIMA; ROSA E SILVA; MOURA, 2006; AMARAL et al., 2009; CROSERA et al., 2010; BELLELIS et al.; 2010 ). A paciente com endometriose pode apresentar um quadro clínico variável, podendo até mesmo ser assintomáticas. No entanto, grande parte apresenta manifestações clínicas de intensidade variada, podendo apresentar dor pélvica, que é o sintoma mais comum, dismenorréia (dor na região pélvica em forma de cólicas), dispareunia (dor durante a relação sexual), disquesia (dor associados ao ato de defecação), dor ovulatória, fadiga e também problemas intestinais durante a fase menstrual, as quais tendem a aparecer durante o perí-

Discente de Biomedicina da Faculdade de Uberaba (UNIUBE) Docente de Biomedicina da Faculdade de Uberaba (UNIUBE) 3 Docente do curso de Biomedicina da Fundação de Ensino Superior de Passos (FESP|UEMG) e da Faculdade de Uberaba (UNIUBE). Email: cheraim@hotmail.com 1 2


54

odo menstrual e pré-menstrual causando fortes dores, havendo melhora após o termino da menstruação. Algumas mulheres ainda apresentam quadros de infertilidade (AMARAL et al., 2009; BELLELIS et al.,2010; NÁCUL; SPRITZER,2010). Essas manifestações clínicas prejudicam a qualidade de vida da mulher, afetando tanto a vida pessoal como a profissional, devido às fortes dores geradas pelos focos de células endometriais. A endometriose não tem cura, o tratamento busca diminuir os focos endometrióticos aliviando as dores na tentativa de melhorar a qualidade da vida da portadora da doença (SCHINDLER, 2011). Não tem sido fácil estabelecer a real incidência da patologia, determinando a idade correta em que a endometriose pode se desenvolver, mas novos estudos confirmam a presença de uma variação de faixa etária da mulher com endometriose, atingindo adolescentes, mulheres jovens adultas e pré-menopausadas, ou seja, a mulher esta suscetível da menarca a ultima menstruação (GYLFASON et al.; 2010; SANTOS et al.;2012). Este estudo busca demonstrar a patologia, comparando o desenvolvimento em faixas etárias diferentes e suas manifestações, destacando suas principais características na mulher adolescente e adulta, dentro do contexto ginecológico. DETERMINAÇÃO DA FAIXA ESTÁRIA A determinação correta da faixa etária da endometriose na mulher tem passado por novas análises e estudos, sendo identificada a presença de algumas dificuldades para se estabelecer uma incidência real quanto à idade e as primeiras manifestações, algumas exemplificações seriam o acesso a saúde que ocorre na maioria dos países de forma desigual, a determinação de estudos sobre grupos fechados não sendo possível avaliar de forma correta a extensão da doença, outro fato é que muitas pacientes são assintomáticas por longos períodos e acabam tendo o seu achado por coincidência, ou o ocultamento dos sintomas faz com que a mulher só seja diagnosticada após longos períodos a partir do desenvolvimento dos primeiros sintomas (GYLFASON et al.; 2010; SCHMIDT; HERTER, 2002; SEPUCRE ; AMARAL, 2007). Segundo SANTOS et al. (2012), as manifestações clínicas da endometriose podem afetar a vida das pacientes no trabalho, nas relações pessoais e na fertilidade, por isso a demora para o diagnóstico é prejudicial e como consequência pode manifestar prejuízos, altos gastos com a saúde em internações hospitalares e exames, mas também prejuízos indiretos como o afastamento de inúmeras mulheres jovens em períodos mais produtivos. No Brasil em 2001 foi relatado uma média de 7 anos para o efetivo diagnóstico de endometriose, no presente estudo foi avaliado um período de 3,4 anos entre o inicio dos sintomas e seu diagnóstico, talvez esta diferença apresentada possa ser devido a importância das mulheres terem o conhecimento sobre a doença

Cardoso et al., 2011

e seus sintomas. Mas infelizmente ainda há dificuldades do diagnóstico em algumas regiões e pacientes provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS), que enfrentam maiores dificuldades a chegarem aos cuidados de hospitais-escolas com atendimentos terciários. ENDOMETRIOSE NA ADOLESCÊNCIA Através de estudos atuais hoje e possível se observar o desenvolvimento puberal e maturidade sexual cada vez mais precoce, onde a o aparecimento da menarca por volta dos 11 anos. A adolescência é um período com intensas modificações físicas e psicológicas, pode ser dividida em inicial (10 a 14 anos), média (14 a 17) e tardia (acima de 17 anos). Há desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários e surge a menarca, configurando a transição da infância à idade reprodutiva. Emocionalmente há a formação do caráter e essas jovens que precisam ser orientadas, para diminuir dúvidas e incertezas, no que se refere à sexualidade feminina. É de extrema importância para o ginecologista esteja preparado a atender e orientar estas jovens pacientes, pois após o pediatra ele tem a responsabilidade de direcionar a saúde destas pacientes quanto a sexologia, doenças infecciosas, fisiologia genital, sintomas entre outras patologias como a endometriose (GIORDANO; GIORDANO, 2009). Desta forma devemos trabalhar diretamente com a prevenção da patologia é ter consciência de que sua manifestação começa na adolescência, não se pode determinar e quantificar com eficácia os casos, mais através de novos estudos pode ser analisado que mulheres adultas afirmam a manifestação dos sintomas pélvicos antes dos 20 anos, tendo uma proporção de cerca de 70% das adolescentes, explicando a manifestação do principal sintoma a dismenorréia e sangramentos irregulares (BROSENS; BENARGIANO, 2011; SEPUCRE; AMARAL, 2007). A demora em diagnosticar a endometriose na adolescência ainda é maior sendo em média de 10 anos. Sendo assim, os ginecologistas e imagenologistas devem ficar sempre atentos para qualquer tipo de achado em exame bimanual procurando nódulos palpáveis, queixa de dores pélvicas, sintomas como a presença de dor à mobilização uterina, observar pelo toque se a posição anatômica do útero é retrovertido, ou se há um aumento considerável do volume ovariano, estas ocorrências, mesmo não sendo específicas para a doença, são sugestivas e quando encontradas precisam ser investigadas (ARRUDA et al., 2010; NÁCUL; SPRITZER,2010). Os principais relatos de sintomas nesta fase começam com estágios leves, aumentando as manifestações com a idade, a dismenorréia é caracterizada por cólicas fortes na região do abdômen, que se manifestam durante o período menstrual podendo se estender até o período intramenstrual, a dor tem manifestação intensa normalmente no primeiro dia do ciclo ocasionando sintomas como náusea, cefaléia e diarréia, estas alterações ocorrem sem causa aparente e atuam de duas maneiras, cíclica ou não


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

55

Artigo - revisão

cíclica, já em adultos a dor na maioria das vezes é cíclica, podendo haver um aumento da dor ao longo do tempo, as quais podem permanecer durante todo o mês, tendo a manifestação de problemas intestinais e sintomas vesicais. Cerca de 90 % das mulheres possuem cólicas, em algumas as cólicas interferem nas suas atividades habituais prejudicando o seu bem estar. (SCHMIDT; HERTER, 2002; SEPUCRE ; AMARAL, 2007). Os ginecologistas devem estar atentos aos achados visualizados por videolaparoscopia em adolescentes, as quais podem revelar lesões atípicas como; lesões avermelhadas, pápulas claras e lesões glandulares, um estudo com pacientes jovens e adultos com endometriose revelou que as adolescentes possuem lesões vermelhovivo, sendo menos comum lesões em pólvora. O número de focos de células endometriais não determina a intensidade da dor sentida pela paciente. Mas as lesões avermelhadas são mais ativas produzindo uma maior quantidade de prostaglandinas, o aumento de prostaglandina faz com que haja contração intensa do músculo liso que incluem contrações do miométrio e intestinas, o que explica por que adolescentes com endometriose sentem mais dor do que pacientes adultas (SEPUCRE; AMARAL, 2007; BELLELIS et al.; 2010). Ainda não há um tratamento definitivo para essa enfermidade, sendo assim as adolescentes com endometriose precisam realizar o tratamento por todo o período da vida reprodutiva de forma eficaz, pois se não houver um acompanhamento ocasionara um aumento progressivo dos focos de células endometriais. É importante que a fertilidade da adolescente seja preservada, sendo a escolha do tratamento realizado, e analisado pelo médico correlacionando a idade da paciente e o estágio em que a doença se encontra (SEPUCRE; AMARAL, 2007; BELLELIS et al.; 2010). Segundo BROSENS e BENARGIANO (2011) na adolescência a mulher é mais suscetível e oferecer uma janela de oportunidade para a manipulação hormonal da endometriose, as atuais recomendações do Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia, apresentam o inicio de um tratamento com anti-inflamatórios não -esteróides e cíclicos contraceptivos orais combinados (COCs) em adolescente com dismenorréia continua acima de 3 meses, apesar destas intervenções, deve se fazer o diagnóstico por exames e pela laparoscopia. A utilização de contraceptivos orais combinados cíclicos é recomendada para evitar a regressão dos implantes no momento da cirurgia laparoscópica. Adolescentes identificadas com endometriose devem ser tratados por cauterização cirúrgica, ou tratamento a laser. Todas as adolescentes que são diagnosticadas pela laparoscopia e confirmadas histologicamente com endometriose deve ser colocada em terapia supressiva para inibir a progressão da doença ate o momento do desejo de se engravidar. A primeira linha de recomendação para os pacientes com idade inferior a 16 é COCs contínua.

Para os pacientes com mais de 16 anos de idade, deve se administrar COCs contínuo ou um agonista de GnRH. Os agonista de GnRH não são geralmente recomendados para os pacientes com idade inferior a 16 dadas preocupações quanto a mineralização óssea. ENDOMETRIOSE NA MULHER A endometriose através de vários autores vem sendo comparada a doença da mulher moderna, sendo diagnosticada normalmente em mulheres com crises de dor pélvica ou que tentam engravidar sem sucesso na fase adulta, a infertilidade é considerada neste caso em mulheres que possuem relacionamentos estáveis e tentam engravidar sem uso de métodos anticonceptivos por pelo menos um ano. A endometriose é a principal causa de infertilidade em mulheres acima dos 25 anos, onde estudos demonstram que de 30% a 40% das mulheres inférteis possuem endometriose em níveis variados (BROSENS; BENARGIANO, 2011; MATTA; MULLER, 2006). A endometriose pode ser classificada de acordo com os critérios da American Society for Reproductive Medicine (ASRM) sendo classificada de acordo com a profundidade dos implantes e os tipos de aderência no tubo ovariano, dependendo do estágio em que a doença se encontra. Sendo assim a endometriose pode ser estágio I (mínima), estágio II (leve), estágio III (moderada) e estágio IV (severa) (LIMA; ROSA E SILVA; MOURA, 2006; NÁCUL; SPRITZER, 2010). Mesmo sem a realização da videolaparoscopia é possível suspeitar que a mulher possua endometriose tendo como base exames físicos e ginecológicos bem realizados. Deve-se avaliar bem a duração da dor sentida pela paciente. Mulheres que possuem grande sangramento menstrual e não respondem a tratamento com anticoncepcionais, com historia familiar de endometriose possuem grande chance de desenvolver a doença, devido à predisposição genética. Algumas anormalidades no trato genital também podem levar ao desenvolvimento da doença (SEPUCRE ; AMARAL, 2007). No exame físico se recomenda uma avaliação pélvica no período menstrual, quando é mais fácil a percepção a sensibilidade da paciente. Nódulos dos ligamentos uterossacros e fundo-de-saco vaginal posterior, são encontrados em cerca de um terço de casos. Pode se observar uma alteração no tamanho dos ovários e retroversão uterina. Esta retroversão não é um fator etiológico da endometriose (PASSOS et al., 2006). O método ouro para diagnosticar a endometriose é a videolaparoscopia, pois é o mais acurado na determinação da patologia em adolescentes e adultos. Mas por ser uma forma invasiva, deve ser feita sobre orientações e critérios estabelecidos pelo médico. Por este método as lesões podem ser vistas em seus diferentes estágios, aspectos e evoluções. A lesão típica é encontrada com pigmentação azul escura (powder-burn) nos ovários, na superfície do peritônio, na bexiga e nos ligamentos uterinos


56

entre outros. Cada vez mais se pesquisa e busca novos métodos para somar ao diagnóstico rápido e menos invasivo como a micro laparoscopia, assim como as técnicas descritas a cima, tem como papel fazer um mapeamento da dor pélvica, a diferença e que nesta técnica se usa anestesia local (ABRÃO; PODGAEC; DIAS JR, 2007; PASSOS et al., 2006; SEPUCRE ; AMARAL, 2007). O diagnóstico por imagem tem proporcionado avanço para detecção da doença, como a ultra-sonografia pélvica pelo diagnóstico ovariano, em pacientes adultos é comum encontrar endometriomas, mais raramente é encontrado em adolescentes. A ultrassonografia é um excelente método de diagnóstico de endometriose, sendo possível diagnosticar os focos de células endometriais em estágios iniciais, outro método é a ultra-sonografia transvaginal especializada com o preparo retal que pode demonstrar e sugerir uma maior profundidade da doença, de forma retrocervical ou septo retovaginal (SEPUCRE; AMARAL, 2007). A Ressonância Magnética Nuclear tem sido adotada como uma forma mais sofisticada, mais que não ultrapassa a qualidade da ultrassonografia, podendo ser útil no diagnóstico da endometriose profunda por se detectar massa pélvica. Tem boa funcionalidade o método endo-endoscopia retal (ecocolonoscopia) usada em casos de suspeita da profundidade da doença, sendo também um exame de custo e disponibilidade de pouco acesso (BELLELIS et al.; 2010; PASSOS et al., 2006). O marcador Laboratorial biológico mais utilizado para o diagnóstico e monitoramento da endometriose é o CA-125, trata-se de uma glicoproteína que tem origem epitelial, podendo ser encontrado no epitélio normal e neoplásico de origem endometrial, endocérvice, nas Tubas Uterinas e células cancerosas no ovário. Sua dosagem deve ser realizada do primeiro ao terceiro dia do ciclo menstrual, quando superior a 100 Ul ml a endometriose é caracterizada como em estágio avançado. Porém, apenas com os níveis elevados de CA-125 não é possível fechar o diagnóstico, pois ele também se encontra elevado em outras patologias. É necessária a realização de outros exames como videolaparoscopia e ultrassonografia, correlacionando com os sintomas sentindo pela mulher, para que então seja possível fechar o quadro da doença. Infelizmente ainda não há um marcador sérico especifico apenas para a endometriose. Esse é o grande alvo de pesquisadores, que buscam métodos de diagnósticos não invasivos, que preservem a fertilidade da adolescente e sejam menos traumáticos. Porém, ainda não se descobriu nenhum marcador sérico que seja especifico apenas para a endometriose (ABRÃO; PODGAEC; DIAS JR, 2007; SEPUCRE; AMARAL, 2007; AMARAL et al.; 2006). Ainda não se tem um tratamento ideal para a doença, mas existem procedimentos terapêuticos recomendados, os quais podem ser medicamentoso, cirúrgico ou uma associação entre os dois. O tratamento da en-

Cardoso et al., 2011

dometriose deve ser feito de acordo com os sintomas da paciente, o estágio em que a doença se encontra e a idade da paciente, visando melhorar a qualidade de vida, diminuindo as fortes dores e eliminando os focos de células endometriais (AMARAL et al., 2009). A gravidez e a menopausa estão associadas à resolução da dor pélvica que é um dos principais sintomas da doença. Os anticoncepcionais combinados (AC) vêm sendo utilizados como tratamento inicial para a dor pélvica. O tratamento medicamentoso é de fácil administração e pode ser utilizado por períodos prolongados fazendo com que haja condições hormonais semelhantes a que ocorre durante a gestação, amenizando os sintomas. Porém pode haver alguns efeitos colaterais como ganhos de peso, hipertensão e sangramento anormal (SEPUCRE; AMARAL, 2007; NAVARO; BARCELOS; SILVA, 2006; YAMAL; GAITÁN, 2008). Em alguns casos é recomendado o tratamento cirúrgico, que visa retirar o tecido endometrial, delicadamente para evitar a formação de novos focos endometriótico. O tratamento cirúrgico é realizado no intuito de remover as lesões endometrióticas, sendo indicado apenas para mulheres que não respondem a tratamento medicamentoso. O tratamento para o endometrioma é a laparoscopia, no entanto esse tratamento cirúrgico possui dois riscos, a cirurgia excessiva com a remoção do córtex ovariano, e quando a cirurgia é incompleta onde há recorrência da doença. A remoção cirúrgica dos endometriomas pode ser prejudicial para a função ovariana devido a estresse mecânico, processos inflamatórios e prejuízos da vascularização os quais causam traumatismo. Em mulheres jovens ou com desejo de engravidar deve-se optar por cirurgia conservadora podendo ser realizada a retirada do cisto ou a exérese da pseudocápsula realizando análise histopatológica para confirmar o diagnóstico. Após remoção cirúrgica mulheres portadoras da doença apresentam melhora em ate 80% dos sintomas, porém, pode haver recorrência após algum tempo. Em pacientes com endometriose leve e infertilidade, a remoção cirúrgica dos focos de endometriose parece melhorar a fertilidade (NÁCUL; SPRITZER, 2010; FRANKFURT et al., 2009). O tratamento cirúrgico pode ser dividido em duas categorias, conservador preservando a fertilidade da paciente, ou radical levando a histerectomia. Se a histerectomia for realizada em pacientes jovens é recomendada a utilização de reposição hormonal, porém antes se deve analisar o risco benefício (NAVARO; BARCELOS; SILVA, 2006). Tendo sua importância no diagnóstico a laparoscopia atua também no tratamento através da destruição de focos endometrióticos, com a eletrocauterização ou laser, a fim de diminui os focos de células endometriais melhorando a sintomatologia e fertilidade da paciente, visto que cerca de 30 a 50% das mulheres portadoras dessa patologia se tornam inférteis (AMARAL et al., 2009, CROSERA et al., 2010).


Ciência et Praxis  v. 4, n. 8, (2011)

57

Artigo - revisão

CONSIDERAÇÕES FINAIS A endometriose por um longo período foi conhecida como a doença da mulher moderna, pois com a chegada de novos tempos, com a industrialização e urbanização a mulher passou a ter mais oportunidades no mercado de trabalho, estudo e formação acadêmica, como conseqüência passou a buscar primeiramente sua carreira profissional, deixando relacionamentos, casamentos e gravidez em segundo plano, este novo modelo de vida acarreta a um quadro de menos filhos, onde a mulher fica mais exposta a vários ciclos menstruais. Alguns sintomas clínicos da patologia podem levar anos para se manifestarem, por isso o diagnóstico em sua maioria e realizado em mulheres adultas com problemas de fertilidade, levando a algumas pacientes a ter danos irreversíveis na parte anatômica feminina e nas funções dos seus órgãos reprodutivos. O que foi constatado através deste trabalho e que esta patologia não é exclusiva da mulher na fase adulta, ela está presente na vida da mulher desde a menarca na fase da adolescência. Este fato, não tem sido fácil de ser confirmado, tendo em vista à dificuldade de se chegar à confirmação do quadro na adolescência, à precariedade no atendimento a maioria da população que depende do SUS (Sistema Único de Saúde), pela aplicação de estudos direcionados a grupos pequenos que não proporcionam uma incidência real da doença, não se estabelecendo uma idade certa do início do desenvolvimento da endometriose. Mas através de estudos e relatos podemos observar a presença de uma variação de faixa etária ma mulher, onde se atinge as adolescentes, mulheres jovens adultas e pré-menopausadas. Analisando o crescimento da doença na população, buscamos através deste, conscientizar as mulheres quanto à faixa etária acometida e novas perspectivas de diagnóstico e tratamento, sendo visto que a doença causa dores, infertilidade, depressão, frustrações, e angustia, acarretando uma má qualidade de vida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRÃO, Mauricio Simões; PODGAEC, Sergio; DIAS JR, João Antonio. Endometriose, a mulher moderna e o Brasil. Prática Hospitalar, ano IX, n. 50. São Paulo, 2007. AMARAL, Vivian Ferreira et al. Positive correlation between serum and peritoneal fluid CA-125 levels in women with pelvic endometriosis. São Paulo Medical Journal, v.124,n.4,São Paulo, 2006. AMARAL, Vivian Ferreira; LAGO,Eduardo Andreazza Dal;KONDO,William; SOUZA,Luiz César Guarita;FRANCISCO,Júlio César. Desenvolvimento de modelo experimental de endometriose em Ratas. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões,v.36,n.3, Rio de Janeiro, 2009.

ARRUDA, Maurício de Souza; CAMARGO, Márcia Martos Amâncio; CAMARGO JR, Hélio Sebastião Amâncio; TEXEIRA, Sandra Regina Campos.Endometriose profunda: aspectos ecográficos. Femina, v.38,n. 7, Campinas ,2010. BELLELIS, Patrick; DIAS JR, João Antônio;PODGAEC, Sergio;GONZALES, Midgley; BARACAT, Edmund Chada; ABRÃO, Maurício Simões. Aspectos epidemiológicos e clínicos da endometriose pélvica uma série de casos. Revista da Associação Médica Brasileira, v.56, n.4,São Paulo,2010. BROSENCE, Ivo; BENAGIANO, Giuseppe. Endometriosis, a modern syndrome. The Indian Journal of Medical Research, v.133, n.6, pg.581–593. 2011. CROSERA, Ana Maria L.Vieira;VIEIRA,Carlos Henrique Fontana; SAMAMA, Marise; MARTHINHAGO, CiroDrech. UENO, Joji.Tratamento da endometriose associada à infertilidade - revisão da literatura. Femina,v.38,n.5, São Paulo, 2010. ANCO,Bianca;BARBOSA,Caio Parente. Avaliação dos níveis basais de FSH em pacientes inférteis com endometriose profunda de ovário tratadas cirurgicamente. Revista Brasileira de ginecologia e obstetrícia,v.31,n.7,Santo Andre,2009. GIORDANO, Maria Vicente; GIORDANO, Luiz Augusto. Contracepção na adolescência. Revista Adolescência & Saúde, vol. 6, n. 4, Rio de Janeiro, 2009. GYLFASON; Jon Torfi; KRISTJANSSON, Kristijan Andri; SVERRISDOTTIR, Gudlaug; JONSDOTTIR, Kristin; RAFNSSON, Vilhalmur; GEIRSSON, Reynir Tomas. Pelvic Endometriosis Diagnosed in an Entire Nation Over 20 Years. American Journal of Epdemiology, vol. 172, n.3, 2010. LIMA, Andréa Pereira;ROSA E SILVA, Alzira Amélia Martins;MOURA,Marcos Dias; Concentrações de FSH, LH, estradiol, progesterona e histamina no soro,no fluido peritoneal e no fluido folicular de mulheres com e sem endometriose .Revista Brasileira de ginecologia e obstetrícia,v.28,n.11,Rio de Janeiro,2006. MATTA, Adriana Zanona; MULLER, Marisa Campio. Uma Análise qualitativa da convivência da mulher com sua endometriose. Psicologia, saúde & doenças, v.7, n.1, Rio grande do sul, 2006. NÁCUL,Andrea Prestes; SPRITZER, Poli Mara. Aspectos atuais do diagnóstico e tratamento da endometriose.Revista Brasileira de ginecologia e obstetrícia, v.32, n.6, Rio de janeiro,2010. NAVARRO, Paula Andrea de Alburquerque Salless;BARCELOS, Ionara Diniz Santos;SILVA,Julio Cesar Rosa.Tratamento da endometriose.Revista Brasileira de ginecologia e obstetrícia,v.28,n.10, Rio de Janeiro,2006.


58

PASSOS, Eduardo Pandof et al.Endometriose.Rotinas em ginecologia. 5ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. p.119-125. SANTOS, Tânia Vieira Mara; PEREIRA, Ana Gomes Maria; LOPES, Reginaldo Guedes Coelho; DEPES, Daniela de Batista. Tempo transcorrido entre o início dos sintomas e o diagnóstico de endometriose. REVISTA EISTEIN, vol. 10 n. 1, pg 39-43. São Paulo, 2012. SCHINDLER,Adolf. Diagnostico no tratamento a longo prazo da endometriose. Saúde da Mulher Int J ,v.3,n.175, Alemanha, 2011. SCHIMIDT, Ellen; HERTER, Liliane Diefenthaeler. Dismenorréia em adolescentes escolares. Adolecencia Latinoamericana, v 3, n.1, Porto Alegre, 2002. Disponívl em: . Acesso em: 18 out.2011.

Cardoso et al., 2011

SEPULCRI, Rodrigo de Pinho; AMARAL,Vivian Ferreira. Endometriose pélvica em adolescentes: novas perspectivas. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstretrícia – Femina, V. 35, N.6, Rio de Janeiro, 2007. YAMAL, Ivonne Jeannete Diaz; GAITAN, Alef Tsade Sanabria. Tratamiento de La endometriosis I y II: revision de la literatura. Revista colombiana de obstetrícia y ginecologia, v.59,n.3, Colombia,2008.




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.