Entre o perene e o intermitente

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entre o perene e o intermitente arquitetura emergencial como apoio a vĂ­timas de desastres no CearĂĄ


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Universitária Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

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Paiva, Maiara Lacerda. Entre o perene e o intermitente : arquitetura emergencial como apoio a vítimas de desastres no Ceará / Maiara Lacerda Paiva. – 2019. 173 f. : il. color. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Centro de Tecnologia, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Fortaleza, 2019. Orientação: Prof. Me. Bruno Melo Braga. 1. arquitetura emergencial. 2. arquitetura efêmera. 3. desastres. 4. seca. 5. enchente. I. Título. CDD 720


entre o perene e o intermitente arquitetura emergencial como apoio a vĂ­timas de desastres no CearĂĄ

banca examinadora: Prof. Me. Bruno Melo Braga orientador | DAUD UFC

Prof. Dr. Renan Cid Varela Leite professor convidado | DAUD UFC

Me. Matheus Conque Seco Ferreira arquiteto convidado

Maiara Lacerda Paiva Fortaleza, junho de 2019

3


Pelos caminhos que me levaram à

à Bela, à Quel, à Debs, à Isa e à turma

arquitetura e pelos que surgiram a

de 2013, pelas risadas no caminho

partir dela, eu agradeço:

do

Benfica,

às

mangueiras

à

minha

família,

sobretudo

aos

pelas e

conversas pelas

sob

demais

experiências compartilhadas.

meus pais, que buscaram me guiar pelos melhores percursos, mas me

ao Bruno, ao Igor, ao Luiz, ao Perdigão,

dando a liberdade de escolhê-los. E

à Júlia, ao Fred e à Raquel, por

provavelmente pelos ensinamentos

transmitirem a paixão pela arquitetura

transmitidos, da experiência do meu

e pela cidade, e por me abraçarem em

pai e da sensibilidade da minha mãe,

uma rede de vivências que marcaram

eu escolhi a arquitetura.

e evoluíram profundamente o meu caminho.

ao

Bruno,

pelas

conversas

compartilhadas em sala, no escritório,

ao Ademir, ao Carlos Bruno, ao Daniel,

na padaria ou no Nilmar, e a quem

à Juliana, ao Mário, à Thaís e à Yuka,

dedico minha grande admiração pelo

por reafirmarem o quão prazeroso

saber, pelo humor e pela compreensão

pode ser trabalhar com arquitetura, por

durante esse processo.

deixarem o dia leve.

ao Lucas, pelo cuidado, paciência e

à Yuka, pelas conversas intercaladas

confiança nos momentos de dúvida,

de risadas todas as manhãs, e à Thaís,

pela presença nas salas de estudo

pela companhia nos percursos, agora

ou no banco sob às árvores, por me

vistos com um filtro mais sensível do

lembrar da importância das pausas

que antes.

para poder prosseguir. ao Beto e à Raquel, do DNOCS, que me à Bibs, à Brendinha, à Carol e à Mari,

apresentaram desvios para que, assim,

por tornarem essa trajetória mais

eu pudesse encontrar o ponto final que

agradável até nas noites não dormidas,

eu desejava.

por oferecerem suporte nos momentos mais difíceis, por traduzirem o melhor

ao Ian, da Impacto, pela paciência com

de uma amizade.

as minhas inúmeras questões e pela constante solicitude.

4


ao DAUD e aos seus professores, que me permitiram ver a cidade e as pessoas que nela circulam sob uma nova ótica, através de um olhar mais preocupado

com

realidades

antes

distantes, criando em mim anseios por mudanças.

5


Ă­ndice


08

14

42

01 | introdução

02 | desastres

03 | arquitetura

justificativa

ambientais

e emergência

objetivos

natural + social

alternativas possíveis

no Brasil

premissas e categorias

metodologia

no Ceará

58

66

90

04 | o perene

05 | o intermitente

06 | a proposta

o subjetivo no perene

conceitos e classificações

perenes intermitências

referências

histórico

o programa

emergências intermitentes

a materialidade

referências

o projeto

140

166

168

07 | a implantação

08 | considerações

09 | bibliografia

enchente

finais

seca

7


introdução


INTRODUÇÃO

pe·re·ne (latim perennis, -e) adj. 2 g. 1. Que dura para sempre. Eterno, perenal, perpétuo. 2. Que dura muito tempo. Duradouro, permanente. 3. Que não se interrompe. Contínuo, incessante, ininterrupto, perenal.

in·ter·mi·ten·te (latim intermittens, -entis, particípio presente de intermitto, -ere, deixar livre, deixar um intervalo) adj. 2 g. 1. Que tem interrupções ou paragens. 2. Cujos intervalos são desiguais.

9


Momentos de cheias e de secas, intermitentes ou perenes. Assim como os rios, é a cidade ou o sertão. Sob influência da água, vive o cearense, seja pelo excesso ou falta dela. Sob influência do homem, a água perde seu curso natural, transformando-se em problema, quando, na verdade, este problema é o poder. O poder de poucos.

Transpassando o contexto de desastres ambientais no Ceará, o trabalho busca mostrar como a arquitetura pode servir de suporte a uma comunidade vítima desses fenômenos, analisando seus efeitos e temporalidades. O objeto de estudo se define, então, como infraestruturas emergenciais de apoio, efêmeras ou permanentes, variando de acordo com o evento. Assim como os rios, pode ser a arquitetura.

10


INTRODUÇÃO

01 JUSTIFICATIVA

Considerando a área do território

onde, a população foi atingida pelo

brasileiro, compreende-se que são

rompimento de uma barragem em 2015,

diversos os tipos de clima e relevo,

poluindo rios e impedindo trabalho

apresentando, algumas regiões do

de pescadores da região. Mesmo

país, uma topografia mais acidentada,

com o prejuízo imensurável, poucos

um solo mais seco. Quando associada

moradores foram indenizados e nem

a fatores socioeconômicos, percebe-

todos recebem auxílios financeiros.

se que a ocupação dos terrenos mais

(VEJA, 2017)

propensos a sofrerem com desastres ambientais ocorre pela população

Embora os desastres ambientais mais

mais carente e desamparada pelos

comuns no Brasil não apresentem a

órgãos públicos.

magnitude de eventos ocorridos em outros países, como Chile e Japão,

Em busca de locais centrais ou com

os quais sofrem com terremotos e

alguma

se

tsunamis, a capacidade de prevenir

submetem a viver em áreas de risco,

e de controlar seus efeitos se dá com

ocupando as regiões que mais exigem

maior dificuldade em nosso país.

atenção do poder público e que,

Enquanto outros lugares se utilizam

contraditoriamente, são as menos

da arquitetura para reduzir danos,

priorizadas.

o Brasil negligencia a precaução e

infraestrutura,

muitos

desconsidera as possibilidades de um Além de

de

moradia

condições serem

precárias

ignoradas,

os

projeto que garanta o mínimo apoio do Estado às vítimas.

responsáveis também se abstém da preocupação com as perdas após

Nesse contexto, explorar a arquitetura

incidentes de desastres ambientais,

como forma de assistência a vitimas

deixando vítimas sem perspectivas de

de

melhoria e sem demais alternativas.

compreendendo os fatores ambientais,

A exemplo disto, pode-se citar o

atrelados

caso de Mariana, em Minas Gerais,

considerando tecnologias disponíveis.

desastres a

mostra-se questões

relevante, sociais,

e

11


02 OBJETIVOS

O trabalho apresenta como objetivo geral o desenvolvimento de um projeto arquitetônico de infraestruturas emergenciais para as vítimas de desastres ambientais, adequado à realidade cearense. Busca-se, assim, demonstrar a capacidade da arquitetura de intervir em situações extremas, constituindo uma forma de apoio aos atingidos, além de se explorar as possíveis variações da forma de acordo com o uso e o contexto. objetivos específicos

metodologia

1. analisar os tipos de desastres naturais nos contextos brasileiro e cearense, bem como a relação entre

pesquisa

áreas de risco e seus ocupantes;

desastres ambientais, de forma geral e

2. definir um caso específico, em termos de tipo de desastre e lugar, atendendo a uma demanda possível,

bibliográfica

acerca

dos

específica; contato com profissionais do DNOCS¹ e da Defesa Civil

para o posterior desenvolvimento do projeto das infraestruturas de apoio; 3. investigar a relação entre arquitetura e desastres naturais; 4. estudar tipos e referências de arquitetura emergencial, de caráter efêmero e permanente; 5.

desenvolver

o

projeto

das

infraestruturas, bem como instruções referentes ao processo de execução;

análise de conceitos e classificações referentes a modulação, pré-fabricação e flexibilidade; análise de referências projetuais visitas à empresa Impacto e estudo dos seus sistemas estruturais;

6. simular a implantação desse modelo

triagem de terrenos com base no

em um contexto real

diagnóstico das áreas mais propícias para ocorrência de desastres ¹ Departamento Nacional de Obras contra as Secas

12


INTRODUÇÃO

03 METODOLOGIA

O início deste trabalho descreve o contexto de desastres ambientais no Brasil e, de forma mais específica, no

desastres ambientais

Ceará, bem como as medidas do Estado perante eventos desse caráter. Através da compreensão dos fenômenos e

BRASIL

de seus efeitos sobre a população, determina-se os desastres e os locais

CEARÁ (definição dos desastres e locais)

cujas demandas o projeto atende. Após a abordagem dos desastres ambientais, parte-se para o estudo

arquitetura e

da arquitetura emergencial, tratando

emergência

de como ela pode atuar de diferentes formas, com caráter permanente ou efêmero, para prover melhorias às vítimas.

o perene

Para o desenvolvimento do projeto, definem-se os programas e o método construtivo

a

serem

utilizados,

o intermitente

considerando as especificidades de cada contexto e a disponibilidade dos recursos. Por fim, exemplifica-se a implantação das

infraestruturas

de

apoio

a proposta

em

terrenos de diferentes situações, selecionados através do diagnóstico das regiões mais críticas e outros critérios.

a implantação

13


desastres ambientais


DESASTRES AMBIENTAIS

01 NATURAL + SOCIAL

“Para

o

reconhecimento

federal,

desastre é o resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um cenário vulnerável, causando

grave

perturbação

ao

funcionamento de uma comunidade ou sociedade, envolvendo extensivas perdas e danos humanos, materiais, econômicos

ou

ambientais,

que

excede a sua capacidade de lidar com o problema usando meios próprios”. MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, 2012

Desastres ambientais costumam ser associados geográficos.

unicamente A

a

fatores

influência

destes

“Separar

processos

sociais

dos

aspectos - tais como as condições de

processos

clima e relevo ou a proximidade de

ambiguidade

um território do encontro de placas

solucionar

tectônicas - determina os tipos de

recentes de ecologia urbana têm

incidentes catastróficos com uma

reconhecido uma relação dialética

maior probabilidade de ocorrência. No

entre natureza e os processos sociais

entanto, para a melhor compreensão

que a constituem. Eles sugerem que

dos desastres e suas consequências,

o ser humano modifica a natureza

é essencial interpretá-los como a

enquanto simultaneamente a natureza

combinação de dois agentes: condição

influencia suas as formas de ocupação

natural e contexto social.

do território”.

naturais

produz

equivocada. este

dilema,

uma Para

estudos

FREITAS, 2004, p. 02

15


Denota-se que o contexto social em que

comuns nos países mais pobres. Já as

um país está inserido pode propiciar

nações de poder econômico elevado

um

da

garantem tais serviços de forma eficaz,

situação. Alguns casos demonstram

prevenindo contra danos ainda mais

nitidamente como este fator interfere

catastróficos à sua população. (UNITED

nos

como

NATIONS OFFICE FOR DISASTER RISK

ao comparar

REDUCTION, 2016 apud IANDOLI, 2017)

agravamento

danos

à

considerável

população,

alega Iandoli (2017), dois

eventos ocorridos em nações

de

condições

socioeconômicas

contrastantes: Haiti e Nova Zelândia. Apesar de ambos os desastres citados corresponderem

a

terremotos

de

mesma magnitude, no primeiro país, registrou-se 223 mil óbitos, enquanto no segundo, não houve nenhuma morte. (UNITED NATIONS OFFICE FOR DISASTER RISK REDUCTION, 2016 apud IANDOLI, 2017) Desse modo, verifica-se que os países desenvolvidos são menos afetados pelos desastres naturais que os países em desenvolvimento. Este fato decorre em razão da frágil governança de riscos, da carência de sistemas de aviso prévio efetivos e da falta de mecanismos de proteção civil, sendo estas deficiências

tabela 01: recomendações da ONU fonte: Iandoli (2017)

16


DESASTRES AMBIENTAIS

01. sistemas de aviso prévio 1.1. sistema de monitoramento e previsão meteorológica 1.2. sistemas pré-identificados de aviso (ex. sirenes específicas)

02. governança de riscos 2.1. atuar antes, durante e depois de um desastre natural 2.2. integrar as diferentes esferas governamentais 2.3. designar tarefas para líderes comunitários e para a iniciativa privada

03. mecanismos de proteção civil 3.1. rede de resposta a catástrofes com o envio de ajuda imediata à população afetada (pagamentos, serviços, materiais etc.) 3.2.

depende

de

um

sistema

econômico

consolidado e de uma rede de comunicação e transporte que permita que comunidades próximas não afetadas tenham a condição de ajudar aquelas atingidas pelo desastre 3.2. defende também a existência de uma infraestrutura que acolha desabrigados e feridos

17


Órgãos

internacionais,

como

a

valores

totais,

porém

habitantes

e o Banco Mundial, desempenham

dificuldade em recuperar as perdas.

papel relevante na melhoria dos

Através do indicador de queda de

sistemas de proteção contra desastres.

consumo, identifica-se com clareza

Estudo lançado pelo Banco Mundial,

a parcela da população mais afetada

chamado “Inquebrável”, questiona a

e,

forma de mensurar o impacto de um

concentram-se nas vítimas e não em

desastre natural. Em vez de se calcular

uma região específica. (FÁBIO, 2016)

um evento desse caráter, o estudo propõe que a medição se realize com base na queda de consumo resultante. (FÁBIO, 2016) Pode-se mudança

compreender confrontando

melhor

tal

situações

de desastres em áreas de padrões socioeconômicos opostos. Em bairros de

alta

renda,

as

consequências

desses eventos podem significar um prejuízo

econômico

significativo

para os proprietários de imóveis, mas também há uma maior probabilidade de estes agentes se restabelecerem. Já nas favelas, os danos materiais não são equivalentes ou mais altos

apresentam

seus

Organização das Nações Unidas (ONU)

os danos ao patrimônio gerados por

18

em

consequentemente,

os

extrema

esforços


DESASTRES AMBIENTAIS

02 NO BRASIL

O Brasil apresenta-se em uma posição

Enquanto, no Nordeste, a seca se

geográfica

catas-

configura como um problema bastante

proporções,

presente, no Centro-Oeste, os incêndios

tróficos como são

onde de

eventos

grandes

terremotos de

e

ocorrência

Majoritariamente,

tsunamis, improvável.

os

naturais

verificados

decorrem

em

função

desastres no de

país

florestais Diversas

são

mais

regiões

recorrentes.

também

sofrem

com problemas de chuvas intensas e

alagamentos,

constantemente

fatores

acompanhados de deslizamentos de

hidrometeorológicos. Além disso, a

terra, como se verifica no Sudeste do

multiplicidade de biomas, devido à sua

Brasil. (MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO

grande extensão territorial, impacta

NACIONAL, 2012)

na variedade dos perigos naturais frequentes.

(PEDROSO

e

HOLM-

NIELSEN, 2017)

Embora

os

eventos

ambientais

previamente citados não apresentem a mesma magnitude de terremotos,

Dentre

os

desastres

ambientais

tornados e tsunamis, no Brasil, eles

relatados no Brasil, destacam-se: seca

são potencializados em virtude da

e estiagem; alagamentos e chuvas;

conjuntura socioeconômica na qual

deslizamentos

ventos;

o país está inserido, envolvendo uma

granizo; incêndio; e ressaca marítima.

ineficaz administração do território

A frequência de tais eventos varia

e

de acordo com a situação geográfica

contexto,

- englobando as características de

se

clima, relevo, hidrografia, vegetação -

interferência

do local considerado. (MINISTÉRIO DA

ambiente e ao processo de urbanização

INTEGRAÇÃO NACIONAL, 2012)

desequilibrado. (FREITAS, 2014)

de

terra;

dos

recursos os

naturais.

desastres

profundamente

Nesse

revelam-

vinculados

humana

ao

à

meio

19


No Brasil, as medidas de precaução contra desastres e de assistência a vítimas são determinadas pela Lei n° 12.608 (2012), a qual:

“Institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil - PNPDEC; dispõe sobre o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil - CONPDEC; autoriza a criação de sistema de informações

e

monitoramento

de

desastres”.

Dentre os objetivos da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, pode-se destacar: 01. reduzir os riscos de desastres; 02. prestar socorro e assistência às populações atingidas por desastres; 03. recuperar as áreas afetadas por desastres.

20


DESASTRES AMBIENTAIS

03 NO CEARÁ

Para o presente trabalho, definiu-

DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, 2012)

se como área de estudo o Estado do Ceará. Verificou-se, a partir de dados

No caso das enchentes, observa-

do Ministério da Integração Nacional,

se

que, no período de 2003 a 2015, o Ceará

mais prejudicada corresponde aos

apresentou maior ocorrência de secas

moradores de áreas de risco, os quais,

e enchentes. (ALMEIDA e MARIANI,

em virtude da atuação restringente do

2016)

mercado imobiliário sobre a cidade

que

formal, No caso das enchentes, a pesquisa foca

a

parcela

vivem

da

população

precariamente

nas

áreas ribeirinhas. (FREITAS, 2014)

nos limites de Fortaleza, considerando que as problemáticas urbanas a serem

No contexto da seca, os impactos

analisadas

mais

relacionam-se profundamente com

evidentes no cenário da capital. Nos

a concentração fundiária, em que o

tópicos seguintes, serão apresentadas

acesso à água nos momentos de crise

maiores informações sobre cada um

limita-se a uma parcela mais abastada

dos fenômenos citados.

de proprietários de terra, enquanto os

apresentam-se

pequenos agricultores perdem seu Além dos fatores geográficos que

meio de produção. (OGAWA, 2017)

propiciam a recorrência das secas e enchentes no território cearense, como

Ademais,

é

interessante

a irregularidade do regime de chuvas

que, embora enchente e seca se

e a impermeabilização do solo, tais

caracterizem,

desastres são intensificados por uma

perspectiva, como fenômenos opostos

questão de disparidade socioespacial,

- já que o primeiro está relacionado à

associada aos limites de acesso à terra

maior intensidade das precipitações

e à distribuição de água. (MINISTÉRIO

pluviométricas, enquanto o segundo

sob

uma

pontuar primeira

21


se associa à ausência de chuvas por

3.1. Enchentes

um período prolongado - eles podem ser estreitamente conectados no que

Segundo

o

Ministério

do

Meio

diz respeito às suas vítimas.

Ambiente (2007), a enchente consiste em um processo natural dos corpos

Segundo Matos (2012), em virtude

hídricos, em que seus níveis de água se

de prejuízos causados pela seca,

elevam e podem transbordar do canal

ocorre o êxodo rural, processo no

principal, resultando em inundações. A

qual as pessoas mais afetadas por

interferência antrópica, entretanto, faz

esse desastre, comumente de baixa

com que esse fenômeno se caracterize

renda, passam a ocupar áreas de

como um desastre ambiental, uma vez

risco dos centros urbanos, visto que

que as áreas inundáveis passam a ser

estas são as mais desvalorizadas pelo

ocupadas ou que a vazão das cheias é

mercado imobiliário. Essas ocupações,

obstruída de alguma forma, geralmente

geralmente

pelo acúmulo de lixo em bueiros.

situadas

em

regiões

ribeirinhas ou encostas de morros, são gravemente atingidas na ocorrência

As enchentes urbanas configuram-se,

de enchentes.

portanto, como uma decorrência da urbanização desequilibrada, bastante

22

Nesse contexto, é possível observar

evidente na cidade de Fortaleza.

uma concentração de investimentos

Conforme Freitas (2014), o mercado

na capital cearense, motivada pelo

imobiliário atua de modo a gerar a

crescimento populacional resultante

desvalorização de áreas de dunas ou

das migrações, o qual demanda tais

de margens de corpos hídricos, devido

recursos. Contudo, este mesmo fator

ao alto custo envolvido para urbanizá-

estimula o processo de êxodo rural,

las, enquanto o território relativo à

visto que as áreas interioranas não

cidade formal, disponível sob valores

recebem a mesma assistência do

elevados, se torna inacessível para

Governo Estadual.

famílias de baixa renda.


DESASTRES AMBIENTAIS

Dessa forma, estimula-se a ocupação

A solução encontrada pela Defesa

irregular das áreas de risco próximas

Civil para as vítimas consiste em

a bairros mais elitizados, com melhor

abrigá-las em instituições públicas,

infraestrutura, já que a população mais

como escolas próximas a comunidade

carente depende das oportunidades de

afetada. Essa alternativa, contudo, não

emprego que esses locais concentram.

garante espaços providos de mínimo conforto e privacidade, visto que as

Como

resultado

fenômeno,

pessoas precisam, geralmente, dormir

diversas famílias em situação de

no chão do local, e tem acesso limitado

vulnerabilidade

gravemente

a banheiros e cozinha. Além disso, a

afetadas pela perda de seus bens

utilização de instituições desse tipo

materiais

de

para emergências prejudica o seu

doenças em caso de enchente. Tal

uso padrão, impedindo, por exemplo,

desastre

na

a realização de aulas enquanto as

moradia, deixando diversas famílias

famílias lá estiverem abrigadas (figura

desalojadas (figura 01).

02).

e

desse são

pela

impacta

proliferação diretamente

figura 01: enchente no Jangurussu e Conjunto Palmeiras fonte: G1

23


figura 02: famílias alojadas em escola na Sabiaguaba após enchente fonte: Diário do Nordeste

figura 03: barraco imerso após cheia do Rio Cocó no Conjunto Palmeiras fonte: O POVO

24


DESASTRES AMBIENTAIS

A partir da análise dos mapas 01, 02, 03

Essas informações tornam-se mais

e 04, pode-se identificar as possíveis

claras no mapa 04, com a sobreposição

áreas mais suscetíveis às enchentes,

dos mapas 02 e 03. Pode-se afirmar,

e que sofreriam com uma recuperação

assim, que os bairros verificados com

mais lenta.

índice de pior situação provavelmente sofreriam com uma maior dificuldade

A classificação dos bairros no mapa

de recuperação após uma enchente.

02 aponta a concentração de renda na porção norte da cidade, correspondente

A exemplo disso, cita-se o Conjunto

a bairros nobres, como Meireles e

Palmeiras, bairro na regional VI, onde

Aldeota. Em contraste a tal fato, nota-

está situada a barragem do Rio Cocó.

se que as regionais V e VI apresentam

Em fevereiro de 2019, após fortes

os índices mais baixos (ver mapa 01).

chuvas na capital cearense, o nível de água da barragem se elevou, causando

Ademais, verifica-se os dados relativos

uma enchente que deixou dezenas

ao acesso à rede de esgoto (mapa 03),

de famílias desabrigadas (figura 03).

visto que a proliferação de doenças

As famílias foram encaminhadas,

com a ocorrência de enchentes está

então para o centro cultural Cuca

vinculada à ausência de saneamento

Jangurussu e para escola em bairro

básico. É observado que, assim como

próximo. (COSME, 2019)

no mapa 02, as regionais V e VI são avaliadas de forma bastante inferior em relação às demais, havendo uma disparidade

significativa

entre

as

áreas norte e sul de Fortaleza.

25


mapa 01: regionais de Fortaleza SER I

SER IV

SER II

SER V

SER III

SER VI

Sercefor (Centro)

N 0

fonte: Fortaleza em Mapas

26

2.5

5 km


DESASTRES AMBIENTAIS

mapa 02: classificação por renda (R$) 2700 - 3375 2025 -2700 1350 - 2700 675 - 1350 0 - 675

N 0

2.5

5 km

fonte: Fortaleza em Mapas

27


mapa 03: acesso Ă rede de esgoto (%) 80 - 100 60 - 80 40 - 60 20 - 40 0 - 20

N 0

fonte: Fortaleza em Mapas

28

2.5

5 km


DESASTRES AMBIENTAIS

mapa 04: áreas mais críticas (sobreposição dos mapas 02 e 03) melhor situação

pior situação

N 0

2.5

5 km

fonte: Fortaleza em Mapas

29


3.2. Secas

das chuvas nesses locais. (MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, 2012).

A seca, segundo o Ministério da Integração Nacional (2012), consiste

Ainda que se demonstre como um

em um fenômeno associado à ausência

evento de causas naturais, os impactos

de chuvas por um período prolongado,

da

potencializado pela baixa capacidade

população são de causas políticas

de retenção de água no solo. Seus

e

impactos

diretamente

de combate à seca se concretizam,

na produção, no meio de trabalho do

primordialmente, através de grandes

homem do campo.

obras hídricas, as quais privilegiam

interferem

seca

sobre

uma

socioeconômicas.

determinada As

medidas

os latifundiários em detrimento dos Este tipo de desastre ocorre mais

pequenos agricultores (CAMURÇA et

frequentemente

al., 2016).

Semiárido,

na

região

caracterizada

do pela

vegetação da caatinga e por chuvas

Acerca

das

principais

políticas

concentradas entre fevereiro e maio, a

públicas de combate à seca, destacam-

qual contempla os seguintes estados:

se três períodos, segundo Matos (2013):

Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do

Norte,

Paraíba,

Pernambuco,

1. 1870 - 1940: abastecimento de água

Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais.

do semiárido através de grandes

(CAMURÇA et al., 2016)

construções de açudes e infraestrutura; 2. 1950 - 1970: aproveitamento racional

30

Além desta, as regiões Sul e Sudeste

dos recursos hídricos associado à

podem também sofrer com a ocorrência

criação de programas de reestruturação

de secas, devido ao fenômeno La Niña,

econômica,

responsável pela diminuição irregular

Nordeste (BNB) e Superintendência

como

Banco

do


DESASTRES AMBIENTAIS

de

Desenvolvimento

do

Nordeste

Aos pequenos agricultores, o acesso

(SUDENE);

aos recursos dessas políticas públicas

3. A partir dos anos 70: programas de

faz-se limitado, impossibilitando a

apoio vinculados às áreas produtiva

sua produção e agravando a situação

e social, como o Programa de Apoio

de desemprego e fome no semiárido

ao

o

nordestino (figuras 04 e 05). Então,

Programa Educação no Meio Rural,

em busca de alternativas, as famílias

os quais, apesar de apresentarem

sertanejas

avanços, foram descredibilizados pela

gerando fluxos migratórios que variam

corrupção e pela descontinuidade

a cada período, acompanhando a

entre gestões.

demanda de trabalho do local de êxodo.

Pequeno

Além

das

Produtor

hídricas

e

abandonam

sua

terra,

que

Além dos fluxos dentro do Ceará,

priorizavam a produção dos grandes

principalmente do interior para a

agricultores,

benefícios

capital, também se destacam fluxos

quando

interestaduais. Na transição do século

em situação de emergência, logo

XIX para o XX, o ciclo da borracha leva

despertaram o interesse desta classe,

muitos cearenses para o Amazonas; a

como afirma Matos (2013):

partir de 1930, São Paulo passa a receber

garantidos

obras

Rural

outros ao

estado,

os fluxos migratórios, devido ao ciclo "Tamanho valor social e cultural da

do café; entre 1950 e 1970, observa-

seca foi logo percebido e explorado

se a mudança para a construção de

pelas elites nordestinas, sobretudo para

Brasília, bem como das Rodovias

obter a benevolência das autoridades

Transamazônica

na negociação de dívidas e concessão

e

de verbas públicas."

industrial do Sudeste passa a atrair o

após

1960,

e o

Belém-Brasília; desenvolvimento

sertanejo. (MATOS, 2013)

31


figura 04: famĂ­lias enfrentam perda de safra por conta da seca no Nordeste fonte: G1

figura 05: busca pela ĂĄgua em terrenos distantes das residĂŞncias fonte: O Globo

32


DESASTRES AMBIENTAIS

Em oposição às ações de combate à seca, desenvolvem-se novos métodos de convivência com o Semiárido, contemplando práticas sustentáveis de produção agropecuária, em união com a ecologia. "Articuladas à emergência de um novo paradigma de sustentabilidade, ocorrem mudanças nas concepções e perspectivas de intervenção no Semi-árido

brasileiro,

como

um

espaço onde é possível construir ou resgatar relações de convivência com base na sustentabilidade ambiental, na qualidade de vida das famílias sertanejas e no incentivo às atividades econômicas apropriadas." SILVA, 2007, p. 475

A

formulação

convivência

dos

com

projetos o

de

Semiárido,

diferente das políticas de combate à seca, são de iniciativa de organizações da sociedade civil e órgãos públicos de pesquisa e extensão, os quais priorizam o contato direto com os moradores do sertão cearense, ao contrário das proposições governamentais. (SILVA, 2007)

33


Uma das organizações mais atuantes

Dentre as ações desenvolvidas pelo

na implementação de políticas de

ASA, destacam-se:

convivência com a seca é a Articulação do Semi-Árido (ASA). Seu objetivo é

1.

P1MC:

Programa

Um

Milhão

colaborar com o desenvolvimento

de Cisternas, o qual consiste na

da comunidade rural, através da

construção de cisternas com placas de

promoção de ações integradas, da

cimento nas residências rurais para o

utilização de tecnologias adequadas

armazenamento da água das chuvas

de produção, da luta pelo acesso à

(figura 08);

terra e do uso sustentável dos recursos naturais (figura 06). (SILVA, 2007)

2. P1 + 2: Programa Uma Terra e Duas Águas, que objetiva não só realizar construção

de

diversos

tipos

de

cisternas e barragens na comunidade rural, como também proporcionar a capacitação das famílias sertanejas, através de cursos de gerenciamento da água; 3. Programa Sementes do Semiárido: promove a construção de bancos de sementes, enaltecendo a cultura do estoque de sementes crioulas, ou nativas (figura 07). (ASA BRASIL, 2015)

34


DESASTRES AMBIENTAIS

figura 06: prรกtica da agroecologia fonte: Projeto Semiรกrido Vivo

figura 07: armazenamento de sementes crioulas fonte: Projeto Semiรกrido Vivo

figura 08: Programa Um Milhรฃo de Cisternas fonte: ASA Brasil

35


Com o intuito de constatar quais

Além disso, é possível verificar, através

municípios

apresentam

do mapa 08, que a maior parte do

maior vulnerabilidade ao fenômeno

território cearense, compondo um

das

total de 136 municípios, apresenta

cearenses

secas,

verificou-se

aspectos

relativos à precipitação pluviométrica,

deficiência

em

infraestruturas

de

à suscetibilidade à desertificação e

apoio, com índice de desenvolvimento

à existência de infraestruturas de

municipal (idm) abaixo de 31%.

apoio. Nos mapas a seguir, é possível compreender

a

influência

destes

Em contraste a tal fato, observa-

fatores no território estadual com

se

clareza (ver mapas 05, 06, 07 e 08).

município de

que

Fortaleza

é

o

apresentando

desenvolvimento

único índice

máximo,

Analisando o mapa 06, percebe-se

demonstrando uma concentração de

nitidamente a diferença climática

recursos do governo na capital.

entre as regiões interioranas, onde predomina o clima semiárido, e as

Por fim, sobrepondo as informações

litorâneas,

demonstram

dos mapas 06, 07 e 08, verifica-se, no

pluviométrica

mapa 09, que alguns munícipios se

consideravelmente mais elevada. As

encontram em situação alarmante,

regiões de uma reduzida quantidade

apresentando

de chuvas - como Litoral Oeste/Vale

todas as categorias e mostrando uma

do Curu, Serra de Inhamus e Vale do

provavél necessidade de intervenção

Jaguaribe - coincidem com as áreas

dos órgãos responsáveis.

uma

mais

as

quais

precipitação

suscetíveis

a

desertificação,

como mostra o mapa 07.

36

baixos

índices

em


DESASTRES AMBIENTAIS

mapa 05: regiões de planejamento do Ceará Grande Fortaleza

Centro Sul

Sertão de Crateús

Litoral Oeste | Vale do Curu

Vale do Jaguaribe

Sertão de Sobral

Litoral Norte

Serra de Ibiapaba

Sertão Central

Litoral Leste

Serra de Inhamuns

Maciço de Baturité

Cariri

Sertão de Canindé

N 0

25

50 km

fonte: Ipece

37


mapa 06: precipitação pluviométrica (mm) 1.200,01 a 1.522,90 1.000,01 a 1.200,00 800,01 a 1.000,00 600,01 a 800,00 400,01 a 600,00

N 0

fonte: Ipece

38

25

50 km


DESASTRES AMBIENTAIS

mapa 07: municípios suscetíveis à desertificação 1.200,01 a 1.522,90

áreas suscetíveis à desertificação (ASDs):

1.000,01 a 1.200,00

1 - ASD Irauçuba | Centro Norte

800,01 a 1.000,00

2 - ASD Jaguaribe

600,01 a 800,00

3 - ASD Inhamuns

400,01 a 600,00

N 0

25

50 km

1

2

3

fonte: Ipece

39


mapa 08: infraestruturas de apoio (idm) 100,00 31,31 a 49,50 19,28 a 30,98 00,00 a 18,77

N 0

0km

fonte: Ipece

40

25

50 km

50

100


DESASTRES AMBIENTAIS

mapa 09: áreas mais críticas (sobreposição dos mapas 06, 07 e 08) melhor situação

1 - Miraíma 2 - Irauçuba 3 - Independência 4 - Arneiroz

pior situação

N 0

25

50 km

1 2

3

4

fonte: Ipece

41


arquitetura e emergĂŞncia


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

01 ALTERNATIVAS POSSÍVEIS

Perante

os

possíveis

desastres

ambientais, é fato que as organizações responsáveis,

muitas

vezes,

não

conseguem articular a melhor forma de lidar com as consequências. As vítimas, quando recebem algum tipo de suporte pelo governo, geralmente precisam se estabelecer em instituições públicas, ambientes sem qualidade de espaço para tal função, caracterizando-se pela perda de conforto e de privacidade. Diante de situações como essas, arquitetos internacionalmente reconhecidos, como Shigeru Ban, Toyo Ito e Alejandro Aravena, produziram alternativas

viáveis

para

garantir

o bem estar de comunidades que sofreram

algum

tipo

de

evento

catastrófico. Consideraram, para a realização desses projetos, aspectos como a possibilidade de participação dos moradores no processo, facilidade de acesso aos materiais empregados e tempo de entrega.

43


1.1. Tubos de papel na arquitetura de

um espaço melhor àquelas pessoas,

Shigeru Ban

ele evitou um grave problema de desmatamento,

decorrente

da

“Aliás, é necessário dizer que não

necessidade de abrigos de madeira

existem ‘desastres naturais’: não é

para mais de 2 milhões de habitantes,

o terremoto que mata as pessoas,

os quais foram substituídos pelo seu

mas o desabamento do prédio, e isso

projeto com material reciclado. (BAN,

é responsabilidade dos arquitetos.

2015)

No entanto, não estamos lá após o desastre, pois ficamos muito ocupados

No ano seguinte à catastrófe de

trabalhando para os ricos. Pensei que

Ruanda, a cidade de Kobe, no Japão, foi

deveríamos usar nossa experiência

atingida por um terremoto, deixando

para lidar melhor com essas situações

um grande número de mortos e de

e foi por isso que comecei a trabalhar

desabrigados. Dentre as vítimas, havia

em áreas de desastres.”

um grupo de refugiados vietnamitas BAN, 2015, p. 17

Após

44

algumas

experiências

com

reunidos em uma igreja sem teto, dormindo sob lonas plásticas, sem o mínimo de conforto. Shigeru Ban

construções de tubos de papel em

projetou

exposições temporárias, Shigeru Ban

aquela

buscou aplicar seus conhecimentos

papel

em serviço a comunidades afetadas

inicialmente provisória (figuras 12 e

por eventos catastróficos. Em 1994,

13). Esta foi, após dez anos no mesmo

construiu

refugiados

local, alugada e transportada para

em Ruanda (ver figura 09), momento

Taiwan, onde houvera um terremoto,

em que o país sofria com intenso

e lá se estabeleceu como equipamento

conflito entre povos. Além de garantir

comunitário permanente. (BAN, 2015)

abrigos

para

e

construiu,

comunidade,

junto abrigos

com de

(figuras 10 e 11) e uma igreja


ARQUITETURA E EMERGĂŠNCIA

figura 09: abrigos para refugiados em Ruanda fonte: ArchDaily

figura 10: abrigos de papel em Kobe, JapĂŁo fonte: Shigeru Ban Architects

figura 12: interior da igreja de papel em Taiwan fonte: Shigeru Ban Architects

figura 11: interior dos abrigos de Kobe fonte: Shigeru Ban Architects

figura 13: exterior da igreja de papel em Taiwan fonte: Shigeru Ban Architects

45


Além

1.2. Home-for-All

disso,

registros

do

desenvolvimento deste projeto foram Após o desastre de 2011 no Japão, o

expostos no Pavilhão Japonês da

qual envolveu terremoto, tsunami

Bienal de Veneza, em 2012, como

e acidente nuclear, um grupo de

exemplificam as figuras 14, 15 e 16.

arquitetos se reuniu para oferecer

(HOME-FOR-ALL, 2013)

suporte às comunidades afetadas. Liderado por Toyo Ito, Kazuyo Sejima, e

O projeto de Rikuzentakata (figura 17)

Riken Yamamoto, o projeto Home-for-

teve como premissa a reutilização

All contava também com uma equipe

dos troncos de árvores derrubadas

de profissionais voluntários para que,

pela tsunami para criar um ambiente

juntamente com as vítimas, pudessem

familiar de conversas, relaxamento e

reconstruir equipamentos de abrigo,

lazer. Além de levar para a arquitetura

lazer

uma característica original da região,

e

integração,

fortalecendo na

antes bastante arborizada, o projeto

recuperação pós-catástrofe. (HOME-

ressignificou algumas das marcas

FOR-ALL, 2013)

deixadas pelo desastre. (HOME-FOR-

comunidades

e

ajudando

ALL, 2013) Dentre as obras realizadas através do Home-for-All, destaca-se a de

46

Rikuzentakata, a qual contou com a

“Home-for-all para despertar, envolver

participação de Sou Fujimoto, Akihisa

e cativar memórias dos lares perdidos.

Hirata e Kumiko Inui. O processo

Um lugar para pessoas em busca

projetual do equipamento considerou

de uma casa para se reunir, dividir

questões levantadas pelos habitantes

refeições e apoio, e assim, reavivar o

do local, os quais também estavam

senso de comunidade.”

presentes na sua construção.

[tradução livre]

ITO et al., 2012, p. 125


ARQUITETURA E EMERGĂŠNCIA

figura 14: Home-for-All na Bienal de Veneza fonte: ArchDaily

figura 16: Home-for-All na Bienal de Veneza fonte: ArchDaily

figura 15: Home-for-All na Bienal de Veneza fonte: ArchDaily

figura 17: Home-for-All em Rikuzentakata fonte: Home-for-All

47


1.3. O provisório e o permanente de

A outra proposta consistiu em um

Alejandro Aravena

exemplo de construção incremental. A Habitação Villa Verde (figuras 21

Em 2010, o Chile sofreu com um

e 22) apresentava como princípio a

terremoto

tsunami,

priorização dos componentes mais

deixando milhares de desabrigados.

complexos na execução, elevando o

Constitución, cidade na costa do

padrão da obra e tornando o futuro

país, foi uma das mais atingidas pelo

habitante

desastre, sendo cenário de soluções de

metade da casa, caso quisesse ampliá-

habitação do escritório ELEMENTAL,

la. (ARCHDAILY, 2016)

seguido

de

responsável

pela

outra

de Alejandro Aravena. (ARCHDAILY, 2016)

Ambos os projetos serviam a vítimas de desastres e envolviam a participação

No modelo provisório, foi desenvolvida

dos futuros moradores, mas eles

a Casa ELEMENTAL Tecnopapel (figura

se

18). O abrigo, cuja obra poderia ser

materialidade e execução do projeto.

finalizada em dez dias, tinha como premissa a reutilização das partes para uma solução final, usando placas moduladas de OSB e poliestireno (figuras 19 e 20). Desse modo, além de garantir isolamento térmico, a edificação permitia a reaplicação das placas em uma obra futura. (ARAVENA, 2011)

48

diferenciavam,

sobretudo,

pela


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

figura 18: Casa ELEMENTAL Tecnopapel fonte: ArchDaily

figura 19: esquema de painéis de montagem fonte: ArchDaily

figura 20: Casa ELEMENTAL em corte fonte: ArchDaily

49


figura 21: obras da Habitação Villa Verde fonte: ArchDaily

figura 22: Habitação Villa Verde fonte: ArchDaily

50


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

02 PREMISSAS E CATEGORIAS

Coerente com o caráter de emergência,

usuários, ambientes e até programas.

a vantagem fundamental para essa

Muitas vezes, o caráter flexível é

tipologia arquitetônica consiste na

estabelecido

velocidade de execução. Tal fator

modulação, a qual auxilia também

engloba não somente o tempo de

nos outros fatores elencados, como

construção

montagem rápida e custo reduzido.

da

edificação,

como

em

função

de

uma

também a produção e o fornecimento dos materiais utilizados, o que aponta,

Segundo Anders (2007), um produto

frequentemente,

de

para

um

solução

envolvendo a pré-fabricação.

arquitetura

emergencial

pode

ser desenvolvido de dois modos: pela construção in loco ou pelo

Além disso, o baixo custo faz-se

fornecimento de kits. O primeiro

necessário em uma produção de

método remete ao uso de matéria-

grande escala, a qual visa atender à uma

prima

quantidade possivelmente elevada de

reutilização desta pela população após

vítimas. O valor reduzido na realização

seu restabelecimento. A segunda tática

dessas

também

costuma ser reproduzida através de

pelos recursos disponibilizados pelos

elementos pré-fabricados e portáteis,

órgãos governamentais, normalmente

considerando, ainda, aspectos culturais

responsáveis

e

a serem incorporados para uma maior

reconsolidação dos grupos atingidos

aceitabilidade das vítimas. Tais kits

por desastres.

podem ser classificados, como sugere

obras

justifica-se

pela

assistência

local,

podendo

haver

a

Kronenburg (apud Anders, 2007), nas Outro aspecto significativo para um

seguintes categorias: module, flat-

objeto

pack, tensile e pneumatic.

consiste

arquitetônico na

emergencial

flexibilidade,

na

sua

capacidade de se adaptar a diferentes

51


Module: as unidades emergenciais

Tensile: considerado bastante flexível

chegam ao local de implantação no

pela capacidade de abranger grandes

seu estágio final, prontas para serem

áreas, esse sistema se caracteriza por

utilizadas. Elas podem ser totalmente

uma estrutura normalmente composta

independentes ou conjugadas.

de uma membrana tensionada presa à uma armação rígida. Como exemplo

Flat-pack: as

unidades

quando

finalizadas,

assemelham-se

ao

típico desse sistema, pode-se citar a tenda.

sistema module, mas a diferença se encontra no processo de montagem

Pneumatic: assim como no sistema

(e desmontagem), visto que estas são

tensile, essas estruturas se constituem

divididas peças menores e mais leves,

de uma membrana sob tensão, porém,

a fim de facilitar seu transporte.

em vez de uma armação rígida, a pressão é exercida pelo ar. (ANDERS, 2007) A seguir, serão apresentados alguns exemplos de arquitetura emergencial, destacando-se

suas

características

e

os

principais métodos

empregados na sua construção.

52


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

Abrigo Teatina-Quincha

arquiteta: Alexia León

O projeto consiste em um refúgio

localização: Deserto Sul, Peru

temporário para vítimas de terremotos,

área construída: aprox. 8 m²

sendo

materialidade: bambu + barro

orgânicos, permitindo o seu reuso e

tempo de obra: não informado

construção pela mão de obra local.

método: construção in loco

(ARQ, 2011)

construído

com

materiais

figura 23: abrigo Teatina-Quincha fonte: Architecture Today

53


Escola Modular

arquiteto: Sebastián Irarrázaval

Após a escola da comunidade ter

localização: Retiro, Chile

sofrido danos estruturais devido a

área construída: 12 m² (módulo)

um terremoto, utilizou-se contêineres

materialidade: contêiner

para a rápida montagem de um novo

tempo de obra: (+projeto) 75 dias

espaço capaz de atender aos alunos.

método: module

(ARQ, 2011)

figura 24: Escola Modular fonte: ED

54


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

Abrigo de emergência

arquitetos: N. Gonsalves e N. Martoo

O abrigo, desenvolvido para a Exibição

localização: qualquer

de Brisbane,

área construída: não informada

em tamanho manuseável, cortadas a

materialidade: madeira

laser e acopladas por encaixes. Possui

tempo de obra: 1 dia

painéis transparentes, translúcidos e

método: flat-pack

opacos para seu fechamento. (CONRAD

constitui-se de peças

GARGETT, 2013)

figura 25: abrigo de emergência fonte: Conrad Gargett

55


Shelter Frame Kit

arquiteto: S. Elias + B. LeBel

O abrigo, projetado na década de 80,

localização: variável

é utilizado de modo universal ainda

área construída: 25 m²

hoje, por ser uma estrutura barata

materialidade: plástico

e de rápida montagem. Além disso,

tempo de obra: não informado

faz-se bastante flexível, já tendo sido

método: tensile

usada como clínicas temporárias e para atividades de redesenvolvimento. (ARCHITECTURE

FOR

HUMANITY,

2006)

figura 26: Shelter Frame Kit fonte: World Shelters

56


ARQUITETURA E EMERGÊNCIA

Ark Nova Concert Hall

arquiteto: Isozaki + Kapoor

Posterior aos desastres de 2011 no

localização: Japão (variável)

Japão, arquitetos propuseram uma

área construída: não informado

sala de concertos inflável, que pudesse

materialidade: plástico

transitar pelas regiões afetadas, a fim

tempo de obra: não informado

de levar entretenimento às populações.

método: pneumatic

(DEZEEN, 2013)

figura 27: Ark Nova Concert Hall fonte: Dezeen

57


o perene


O PERENE

01 O SUBJETIVO NO PERENE

Os

traços

de

arquitetura

forma a incluir a comunidade no

permanente podem ser percebidos,

processo. Na concepção da ideia ou

inicialmente, pela materialidade do

na execução da obra, a proximidade

edifício. A ideia de resistência ao

criada entre o usuário e o objeto

tempo e às intempéries se conecta

arquitetônico

rapidamente com o uso de materiais

que se desenvolva a afeição capaz de

pesados, como pedra ou concreto.

garantir sua perenidade.

Entretanto, quando se aborda uma

Transmitindo

arquitetura

que

o físico, pode-se admitir que, mais

objetive ser duradoura, a velocidade

necessário do que usar materiais

da construção é um quesito tão

considerados fortes e pesados, é se

significativo quanto a durabilidade

apropriar de matéria-prima local, de

do edifício. Dessa forma, pode-se

fácil acesso, que, em junção com outros

abdicar da premissa de que o perene

elementos, possa assegurar conforto

está necessariamente associado com

ao ambiente projetado.

de

uma

emergência

é

fundamental

o

sentimento

para

para

materialidade mais robusta. A Nesse

caso,

arquitetura

o como

que

define

permanente

uma se

seguir,

exemplos planejadas

apresentam-se de

arquitetura para

alguns perene,

atender

às

torna a necessidade do seu programa

necessidades de comunidades em

para uma comunidade e o apreço que

situações críticas.

os seus usuários desenvolvem pela edificação. Entende-se, então, a importância de pensar no projeto emergencial

de

59


02 REFERÊNCIAS

1.1. Escola Guinea-Bissau, MAPA e MV

A coberta, a qual se volta para o

Arquitectos

“impluvium”, gerar

é

responsável

por

forma ao edifício diferente

Desenvolvido para uma área de cheias

da produção tradicional, de coberta

em uma comunidade carente em

aparente

Bissau, o projeto da escola se baseia

Apesar do caráter volumétrico novo, as

no respeito às tradições, utilizando

técnicas construtivas são as mesmas

técnicas

locais

e

envolvendo

os

com

conhecidas

cumeeira

pela

central.

comunidade,

habitantes na sua construção, porém

estimulando a participação desta no

com uma nova proposta formal, mais

processo. (MAPA, 2010)

adequada ao clima e ao programa solicitado. (MAPA, 2010)

Além

disso,

a

materialidade

da

obra consiste em blocos de adobe, A edificação cria seu próprio platô

produzidos pela comunidade local,

(figura 28), se elevando do nível do

os quais são dispostos de modo a

solo e criando um

criar espaços de permeabilidade nas

vazio central,

o qual é chamado de “impluvium”

paredes,

e reconhecido como o coração da

ar e

escola. Esse espaço, que consiste na

No perímetro do prédio, protegendo

área não elevada em meio ao platô,

ainda mais a edificação da incidência

gera diferentes percepções e funções

solar, colocam-se galhos de árvores,

dependendo das condições climáticas.

unificando externamente os espaços

Em épocas de chuva, ele enche e se

abertos do interior. (MAPA, 2010)

torna em um reservatório de água a céu aberto (figura 29). Quando o clima está seco, ele se configura em um pátio para o lazer das crianças. (MAPA, 2010)

60

permitindo

passagem

de

controlando a entrada de luz.


O PERENE

figura 28: visĂŁo da escola elevada sobre platĂ´ fonte: MAPA ARQ

figura 29: "impluvium", no centro da escola fonte: MAPA ARQ

61


1.2.

Protótipo

Pós-Terremoto

para

processo. (ARCHDAILY BRASIL, 2018)

Moradias Rurais, AL BORDE + El Sindicato Arquitectura

Além da modulação do projeto, a utilização de materiais passíveis de

No contexto de pós-terremoto no

serem encontrados em todo o país são

Equador, ocorrido em 2016, o protótipo

fatores que intuitam a auto-construção,

de moradias rurais tem com objetivo

possibilitando uma variedade maior de

se adaptar às diferentes fases de uma

formas, fachadas e usos. (ARCHDAILY,

emergência (figura 30). Construído de

2018)

forma progressiva, o projeto permite ampliações verticais e horizontais,

O projeto concretiza, portanto, as

além

etapas de recuperação após castástrofe,

de

adaptação

a

variados

programas. (ARCHDAILY, 2018)

com a evolução de um abrigo a uma moradia permanente, de desabrigados

Os

arquitetos

planejaram

duas

ampliações, sendo a primeira delas um módulo igual ao original. Já a segunda, constitui a união entre os dois módulos já executados, como mostra a figura 31. (ARCHDAILY, 2018) A estrutura das moradias rurais é pré-fabricada em madeira laminada, permitindo

uma

construção

mais

rápida. Também é dispensada a mão de obra especializada, envolvendo a participação dos moradores no

62

a uma comunidade integrada para possibilitar a reconstrução do local.


O PERENE

figura 30: protótipo pós-terremoto para moradias rurais fonte: ArchDaily

figura 31: planta e esquemas do protótipo fonte: ArchDaily

módulo inicial

ampliação 1

ampliação 2

63


1.3. Protótipo de babaçu para pequenos

“V”, a fim de captar e armazenar a água

agricultores, Estudio Flume

da chuva. (SOUZA, 2016)

Como uma forma de auxiliar no

O

desenvolvimento

comunidades

uma modulação, a qual reduz o

autossustentáveis no sertão brasileiro,

tempo de construção e possibilita o

reduzindo, assim, a situação de pobreza

crescimento da unidade. Além das

característica, o projeto oferece um

unidades produtivas relacionadas à

local de apoio a pequenos agricultores,

agro-floresta, como beneficiamento

construído com matéria-prima e mão

de sementes e extração de polpa, a

de obra local (figura 32). (SOUZA, 2016)

modulação do protótipo prevê uma

de

projeto

foi

pensado

seguindo

unidade de serviço, com depósito e O babaçu, cuja palha foi utilizada

áreas molhadas (figura 33). Após a

para proteção da edificação, é uma

montagem da estrutura mínima, é

planta predominante nas regiões de

possível que os agricultores, com as

clima seco, simbolizando o êxodo

instruções de montagem, ampliem

rural comum a tais locais. A junção

a edificação de acordo com suas

do babaçu com a estrutura de madeira

necessidades. (SOUZA, 2016)

para definir a materialidade do edifício garante um fácil acesso a matériasprimas de baixo custo. (SOUZA, 2016) Além

disso,

foram

empregadas

algumas estratégias de adaptação ao clima seco, como a coberta dupla elevada, gerando um colchão de ar e tornando o interior mais fresco, e em

64


O PERENE

figura 32: protรณtipo de babaรงu para pequenos agricultores fonte: ArchDaily

figura 33: planta do protรณtipo fonte: ArchDaily

65


o intermitente


O INTERMITENTE

01 CONCEITOS E CLASSIFICAÇÕES

Para

compreender

efêmera,

faz-se

a

arquitetura

essencial

o

efemeridade de uma obra vinculase,

portanto,

à

tecnologia

da

entendimento prévio de dois conceitos:

desconstrução, e não da construção,

configuração e objeto. O primeiro diz

pois o interesse no objeto está nas

respeito à cena em que um objeto

estratégias utilizadas para desintegrá-

arquitetônico

lo de um determinado lugar.

está

implantado,

incluindo o edifício, o seu entorno, o mobiliário, entre outros elementos. Já

Paradoxalmente, as tecnologias ado-

o segundo, remete ao próprio edifício,

tadas nem sempre correspondem ao

ao projetado e construído. A distinção

tempo planejado (ou real) de um projeto

entre esses dois termos é necessária

construído. Paz (2008) cita dois casos

para redefinir a ideia de arquitetura

em que essa contradição demonstra-

como sinônimo de espaço construído,

se mais evidente, de maneiras opostas:

visto que a arquitetura efêmera separa

o Pavilhão do Brasil na Exposição

o objeto de sua configuração. (PAZ,

de Osaka (1970), elaborado por Paulo

2008)

Mendes da Rocha e sua equipe (figura 34); e o Palácio de Cristal (1851), de

Além disso, Paz (2008) declara que

Joseph Paxton (figura 35).

“o critério definidor da arquitetura efêmera não é a durabilidade potencial

O primeiro projeto foi executado com

do

sua

uma estrutura de concreto armado,

durabilidade real”. Uma arquitetura só

materialidade notoriamente durável,

efetiva seu caráter efêmero a partir

mesmo com o conhecimento de que a

do momento em que ela deixa o local

edificação seria demolida a posteriori.

de origem, para ser destruída - pelo

Já o segundo, desenvolvido para a

homem ou por processos naturais

Exposição

- ou realocada. O entendimento da

alcançou

objeto

construído,

mas

Universal uma

de

Londres,

popularidade

que

67


ocasionou

sua

desconstrução

e

“(...) o futuro invade o presente – o

remontagem em um novo local, sendo

conhecimento prévio da deterioração

utilizado como museu e mantendo a

do construto ou de seu deslocamento

estrutura essencialmente efêmera por

implica em fazer o projeto e a

85 anos. Paz (2008) afirma, então, que:

construção ocorrência.”

figura 34: Pavilhão do Brasil fonte: ArchDaily

figura 35: Palácio de Cristal fonte: ArchDaily

68

que

viabilizem

sua


O INTERMITENTE

Desse modo, entende-se que, dentro

peças previamente projetadas, as quais

do que se considera efêmero, uma

seguem regras específicas de encaixe.

arquitetura pode ser transitória -

O fato de essas peças não serem

quando é deslocada - ou não - quando

produzidas in loco garante, além de

é destruída. Partindo do princípio

uma maior velocidade na construção,

de que a categorização de uma

uma redução dos desperdícios de

arquitetura portátil ocorre em virtude

materiais nos canteiros de obra. (PAZ,

dos seus métodos de desconstrução,

2008)

Paz (2008) classifica-a com base em três diferentes táticas (usualmente

A compactação consiste em retirar

aplicadas

ao máximo os espaços vazios de uma

em

conjunto):

partição,

compactação e rigidez.

edificação, correspondentes às áreas de vivência. Desse modo, resume-

A partição se refere à divisão de

se o objeto em sua materialidade

um objeto arquitetônico em peças

construtiva,

menores, facilitando seu transporte.

anulação

De acordo com Paz (2008), este método

vez que, como afirma Paz (2008), “a

valoriza tanto a desmontagem como

arquitetura não é composta somente

a remontagem da edificação, pois

de paredes, mas é também o espaço

considera que os encaixes devem

entre estas”.

resultando

como

na

sua

arquitetura,

uma

ser pensados para ambas as etapas, evitando o emprego de uma mecânica

O método da

que

primeiro

se subdividir em duas principais

processo ou o rápido desgaste dos

formas: dobradura ou inflação. A

elementos de encaixe.

primeira tática pode ocorrer como

viabilize

apenas

o

compactação pode

uma armação móvel - como peças que Além disso, a pré-fabricação dos

rotacionam em uma estrutura para

componentes se aplica à tática em

comprimi-la - ou como uma casca

questão, em virtude da necessidade de

flexível, correspondente à utilização de

se obter uma unidade maior a partir de

dobraduras em uma superfície rígida

69


-

funcionando,

simplificadamente,

partição

como uma folha de papel que se estabiliza com vincos. Já na inflação, o objeto se firma e se recolhe através do controle do ar. (PAZ, 2008) Na rigidez, o objeto é tratado como uma

única

peça,

sendo

a

sua

solidez fundamental para torná-lo portátil. Nesse processo, o espaço interior da arquitetura é conservado, determinando seu porte e, desse modo, restringindo o seu deslocamento. Paz (2008) explana que, diferente dos

compactação

outros métodos, na rigidez, o tipo de transporte utilizado constitui um fator limitante, influenciando na forma projetada. “Cabe dizer que à arquitetura portátil recaem incumbências mais severas que na arquitetura sedentária. Pois ninguém pode negar que o desgaste do material é maior com seu contínuo movimento. E que essa construção, ainda

assim,

não

pode

descurar

daquelas qualidades elementares que buscamos no ambiente construído, perene ou temporário.” PAZ, 2008

70

rigidez


O INTERMITENTE

Não sendo portátil, a arquitetura efêmera pode ainda assumir um caráter de perecível, considerando sua evidente deterioração dentro da escala humana de tempo. Essa qualidade era,

anteriormente,

relacionada

a

precariedade das construções, vide os exemplos de habitações primitivas e indígenas, as quais empregavam materiais provenientes da natureza e, portanto, biodegradáveis. Contudo, a partir do século XX, buscou-se interpretar a arquitetura como um produto presente no ciclo da natureza, ressignificando o conceito de perecível para o equivalente a sustentável. (PAZ,

arquitetura

arquitetura

efêmera

emergencial

partição

flat-pack

2008)

compactação (dobradura)

compactação (inflação)

rigidez

tensile

pneumatic

module

71


02 HISTÓRICO

Historicamente,

é

possível

notar

2.1. Vernacular

diferentes enfoques na implementação da arquitetura efêmera. Ela pode ser

As primeiras construções efêmeras

identificada

primórdios

eram justificadas pela necessidade

da humanidade até os dias atuais,

do homem de mudar o local de abrigo,

sendo interessante compreender o

seja por busca de alimento ou por

processo que envolve os objetivos

mudanças climáticas, visto que ele

de sua utilização, a qual ocorria,

ainda não dominava a agricultura

primeiramente,

maneira

ou a domesticação de animais. Das

natural, como modo de sobrevivência,

habitações vernaculares de caráter

passando por uma aplicação crítica

transitório,

ao sistema dominante e se tornando

Anders (2007): a tenda africana das

uma solução sustentável para diversos

tribos nômades do deserto (figura 36), a

problemas sociais.

tenda tipi dos índios norte-americanos

desde

de

os

uma

destacam-se,

segundo

(figura 37) e o yurt asiático (figuras 38 e 39). Conforme

Meneses

(2007),

elas

apresentam as vantagens de serem desmontáveis e de peso reduzido, o que facilita o transporte, além de se

mostrarem

bastante

flexíveis,

possibilitando a criação de divisões internas, como é o caso da tenda dos nômades da África, e a capacidade expansão da estrutura, como no yurt da Ásia.

72


O INTERMITENTE

figura 36: tenda africana fonte: National Geographic figura 37: tenda tipi fonte: Wikimedia Commons

figura 38: yurt asiรกtico fonte: National Geographic

figura 39: yurt asiรกtico fonte: National Geographic

73


2.2. Uso militar e pós-guerra

Sob uma outra ótica, esses conflitos geraram

uma

nova

preocupação,

os

desabrigados,

A evolução da arquitetura efêmera,

considerando

segundo Anders (2007), também foi

vítimas das destruições da guerra.

consideravelmente influenciada por

Anders (2007) explana que, após a

conflitos militares, sobretudo as duas

Segunda Guerra Mundial, os esforços

Grandes Guerras. O desenvolvimento

se

de

abrigos portáteis para os refugiados,

estruturas

transportáveis

foi

voltaram

para as

a

criação

possibilidades

de

essencial para melhorar as condições

explorando

de

dos soldados, tanto no que se refere

novas técnicas de pré-fabricação e de

a moradia em campo como em

produção em massa.

assistência médica. Dentre os arquitetos que buscaram O abrigo Nissen Hut (figura 40),

por essas inovações, Anders (2007)

projetado

Nissen,

destaca o alemão Buckminster Fuller.

substituiu as barracas tradicionais

Tendo desenvolvido diversos abrigos

e foi amplamente utilizado durante

efêmeros

a

Guerra

desejava também projetar nos tempos

Mundial. Além da maior qualidade

de paz, idealizando habitações que se

de espaço, este abrigo apresentava

utilizassem da proposta de produção

outras

em

Primeira

pelo

e

Capitão

a

vantagens

Segunda

que

facilitaram

para

massa,

e

fins

militares,

explorando,

como

sua difusão, tais como sua estrutura,

preceitos, o baixo custo e o peso do

de componentes simples de fabricar

edifício. A exemplo disso, há a Wichita

e de transportar, e sua modulação,

House (figura 41), projeto dos anos

permitindo

40, constituída de elementos leves e

uma

montagem

rápida. (ANDERS, 2007)

mais

industrializados, capaz de ser montada por seis homens em um só dia.

74

ele


O INTERMITENTE

Assim como Buckminster Fuller, outro

desuso e mal uso. Para o arquiteto

arquiteto de influência significativa

inglês, o tempo seria um dado essencial

para

na concepção do projeto.

os

grupos

que

exploravam

arquitetura efêmera foi o inglês Cedric Price. Com o objetivo de produzir

“Não necessariamente a obsolescência

uma

e

implicaria na previsão da demolição

portátil, ele aliou aos seus projetos

ou eliminação de um edifício ou

tecnologias da indústria. O Fun Palace

infraestrutura, mas na abertura de

(figura 42), de 1961, proposto por Price,

possibilidades para a transformação,

representa a aplicação dessas ideias,

além do próprio projeto, pensado

através do desenho de uma estrutura

não como objeto acabado mas como

de aço constituída de elementos

uma

móveis (pisos, paredes, coberturas

aberta à transformação exigida pelas

e passarelas), os quais poderiam ser

contingências ao longo da vida do

reposicionados conforme a função

edifício (...)”

arquitetura

mais

flexível

desejada para o edifício. (ANDERS, 2007)

plataforma

potencialmente

MACIEL, 2015, p. 24

A arquitetura efêmera de Cedric Price e dos seus seguidores apresentava uma crítica ao sistema dominante da época, questionando o tempo de existência de um objeto construído. Segundo Maciel (2015), Price acreditava que a arquitetura a ser construída deveria considerar a obsolescência do objeto, incluindo

o

seu

desaparecimento,

75


figura 40: abrigo Nissen Hut fonte: The Nissen Hut

figura 41: Wichita House fonte: ArchDaily

figura 42: Fun Palace fonte: Interactive Architecture Lab

76


O INTERMITENTE

2.3. Archigram e os Metabolistas

as duas propostas consideravam o deslocamento do objeto, visto que

Sob influência de Price, formou-se

a Cápsula de Chalk era constituída

na Inglaterra o grupo Archigram.

de partes desmontáveis e o Living

Seus

Pod de Greene poderia se tornar uma

integrantes

desenvolveram

projetos na escala do edifício e da

caravana.

cidade, enfatizando a portabilidade, a adaptabilidade e a efemeridade.

No que se refere à escala urbana,

Suas propostas envolviam conceitos

Meneses (2007) afirma que os conceitos

de

ficção

de efemeridade e de flexibilidade são

consumo,

aplicados em propostas de uma cidade

sendo consideradas radicais e, muitas

autônoma, onde prevalece a rápida

vezes, inviáveis de serem realizadas.

obsolescência

(MENESES, 2007)

Um dos exemplos mais famosos de

cibernética,

científica

e

automóvel,

cultura

do

de

seus

elementos.

proposta para metrópole é a Plug-in Na escala do objeto, segundo Meneses

City (1964), de Peter Cook, membro

(2007), destacam-se projetos como a

do grupo Archigram (figura 45). Este

Cápsula (1964), elaborada por Warren

projeto consistia em uma estrutura de

Chalk (figura 43), e o Living Pod (1966),

grande porte em grelha, com duração

criado por David Greene (figura 44).

estimada de 40 anos, que receberia

Ambos consistiam em habitações pré-

as cápsulas pré-fabricadas, as quais

fabricadas móveis, preocupadas com

seriam retiradas e substituídas em

a comodidade e com a flexibilidade

períodos de 3 ou 4 anos, enfatizando o

do espaço interno, adaptando-se às

caráter efêmero da metrópole.

necessidades do morador e, sobretudo no primeiro caso, funcionando no estilo “faça você mesmo”. Além disso,

77


figura 43: Cรกpsula de Chalk fonte: The Archigram Archival Project figura 44: Living Pod fonte: Nomads USP

figura 45: Plug-in City fonte: ArchDaily

78


O INTERMITENTE

As propostas do grupo Archigram,

em Tóquio, e o Plano para a Baía de

entretanto,

são

Tóquio (1960), desenvolvido por Kenzo

controversas

por

consideradas autores

como

Tange. (MENESES, 2007)

Kenneth Frampton. A contradição ocorre a partir da análise de que os

O edifício de Kurokawa (figura 46),

arquitetos ingleses, que se apoiam nas

de acordo com Meneses (2007), “é a

influências de Buckminster Fuller e de

aplicação prática da ideia de cidade

Cedric Price, desenvolveram projetos

no espaço e da lógica de agregação

que consideravam a leveza, o tempo,

de células pré-fabricadas”. A torre

a questão de uma arquitetura como

era

infraestrutura, porém, sem alcançar

industrializadas,

um estágio de execução das ideias,

conectavam a um volume estrutural e

com propostas irrealizáveis. (MACIEL,

infraestrutural, possibilitando seu uso

2015)

de forma individual - com o módulo

constituída

de

144

as

cápsulas

quais

se

singular - ou familiar - com a junção Já no Japão, os Metabolistas surgiram,

de módulos.

em 1960, com projetos que saíam do campo teórico e que consideravam

Seguindo o preceito da obsolescência

sua

programada,

exequibilidade.

Também

vale

como

aponta

Maciel

ressaltar que o país passava por um

(2015), tais cápsulas deveriam ser

crescimento populacional exacerbado,

substituídas a cada 25 anos, porém,

fato que refletiu nas proposições

diferente do que o projeto previa, não

arquitetônicas da época. Na escala do

houve a continuidade de produção dos

edifício e da cidade, os projetos mais

módulos industrializados. Acarretou-

relevantes são, respectivamente, a

se, assim, no desuso geral da edificação,

Torre de Cápsulas Nagakin (1971),

a qual possuía sistemas totalmente

elaborada por Kurokawa e construída

integrados às cápsulas, dificultando,

79


nesse ponto, a flexibilidade do objeto arquitetônico. (MACIEL, 2015) No Plano para a Baía de Tóquio (figura 47), Kenzo Tange parte da ideia de promover um crescimento urbano direcionado ao mar, e não ao interior da cidade. O projeto consiste na implantação de vias a partir de um eixo principal de mobilidade, estabelecidas em três níveis sobre a água da baía e elevadas em relação à malha viária existente. Dentre os pontos defendidos por Tange para a exploração do espelho d’água da baía como área do plano urbanístico, ressaltam-se a vantagem de evitar aterros e outros desgastes causados ao tecido urbano original, comumente ocasionados em obras viárias desse porte, e a intenção de impedir a especulação imobiliária sobre zonas de expansão da cidade. (MACIEL, 2015)

figura 46: Torre de Cápsulas Nagakin fonte: ArchDaily figura 47: Plano para a Baía de Tóquio fonte: Cronolofia de Urbanismo UFBA

80


O INTERMITENTE

2.4. Exposições Universais

Meneses (2007) destaca uma obra de exposição pensada a partir do

De acordo com Paz (2008), era comum,

seu caráter efêmero, realizada em

em um primeiro momento, que as

estrutura

grandes exposições se utilizassem

Alemão, da Exposição de 1967, em

de

Montreal (figuras 48 e 49). Projetado por

construções

contraditoriamente

de

tempo

o

Pavilhão

de

Frei Otto e Rolf Gutbrod, o pavilhão era

existência dos pavilhões para tal

composto de oito mastros e coberturas

uso, considerando a materialidade

translúcidas

durável e intransportável. Ao fim dos

uma

eventos, as estruturas eram, então,

desenvolvimento em peças menores e

demolidas.

com

previamente fabricadas permitiu o seu

os avanços tecnológicos, surgiram

transporte e a sua montagem em um

algumas propostas que se firmavam

local diferente da origem da produção.

no

da

Além disso, seu uso se estendeu para

estrutura, demonstrando um foco mais

além da Exposição, servindo de palco

sustentável.

para eventos locais na Câmara de

princípio

ao

alvenaria,

tensionada:

Posteriormente,

de

reutilização

em

iluminação

PVC,

permitindo

zenital.

O

seu

Montreal. figura 48: Pavilhão Alemão fonte: ArchDaily

figura 49: Pavilhão Alemão fonte: ArchDaily

81


A arquitetura efêmera, de acordo com Paz (2008), apresenta como foco a “elegância da síntese”. Quanto menor o número de peças para uma maior versatilidade

de

ambientes,

mais

eficaz será o projeto. Associados a tal premissa, a arquitetura efêmera também

engloba

princípios

de

modulação, de montagem rápida, de mobilidade e de flexibilidade, os quais podem ser perfeitamente incorporados a arquitetura emergencial.

“Como rede entre o desconstrutivismo que surgiu no final do século XX e a arquitetura da marginalidade, o vínculo entre design, improvisação, transferência tecnológica e reciclagem pode fornecer algumas chaves para uma arquitetura de emergência .” ALCOLEA e TÁRRAGO, 2011, p. 78 [tradução livre]

82


O INTERMITENTE

03 EMERGÊNCIAS INTERMITENTES

Assim como na arquitetura perene,

edificação, utilizando-se dos métodos

a premissa de envolver os futuros

já mecionados (partição, compactação

ocupantes no processo também é

e rigidez). Além disso, é fundamental

um fator importante para os projetos

que a execução da obra não exija mão

emergenciais efêmeros. Isso pode

de obra especializada, a fim de que a

ocorrer a partir da utilização de um

comunidade possa ser integrada ao

sistema de montagem facilitado ou

processo.

de práticas construtivas vernaculares, já conhecidas pelos habitantes. A

Através

da

seguinte

materialidade e as técnicas aplicadas

objetos

arquitetônicos

vão caracterizar o objeto efêmero como

para

contextos

portátil ou perecível, sendo a primeira

pode-se

a mais frequentemente utilizada em

arquitetos traduzem as premissas da

projetos de caráter emergencial.

efemeridade, mais especificamente da

reconhecer

análise

de

temporários emergenciais, como

os

portabilidade, para o projeto. No caso de emergências intermitentes, que são passageiras mas que voltam a acontecer após certo período, é mais adequado tratá-las a partir de uma

arquitetura

com

materiais

de

transportar,

efêmera duráveis

portátil, e

fáceis

possibilitando

sua

reutilização em outro cenário. Desse priorizar

modo,

o

aspectos

projeto que

deve

viabilizem

a desmontagem e remontagem da

83


04 REFERÊNCIAS

4.1. Casas temporárias de madeira pré-fabricada, Shigeru Ban Architects Nas casas construídas para vítimas de terremoto em Kumakoto (figura 50), projeto em colaboração com universidades japonesas, a escolha pela

madeira

pré-fabricada

foi

justificada pela redução do tempo de obra no local, bem como da sua utilização como revestimento final, dispensando, assim, outros materiais. (SHIGERU BAN ARCHITECTS, 2016) Percebe-se, nas maquetes do projeto, a criação de ambientes externos de convivência, através do afastamento de dois módulos habitacionais (figuras 51 e 52). Tal decisão é capaz de gerar maior integração entre as famílias, ajudando na recuperação pós-desastre. A união dos módulos se realiza através da configuração de armários onde haveria reentrâncias, com melhor aproveitamento do espaço (figura 53).

84


O INTERMITENTE

figura 50: casas temporárias em Kumakoto fonte: Shigeru Ban Architects

figura 51: modelo físico do projeto fonte: Shigeru Ban Architects

figura 52: modelo físico do projeto fonte: Shigeru Ban Architects

figura 53: planta das casas temporárias fonte: Shigeru Ban Architects

85


4.2. Abrigo transitório Liina, Aalto

O abrigo foi projetado no sistema

University Wood Program

flat-pack, que se baseia na partição da

edificação

para

facilitar

seu

O abrigo Liina é designado como uma

deslocamento. A estrutura é composta

resposta a desastres pelo mundo,

de painéis sanduíche pré-fabricados

preferencialmente em climas frios,

de madeira, fixados com o uso de

com

madeira

fitas de nylon (“liina”, em finlandês),

passível de ser reaproveitada. De

como mostra a figura 54. Após estável,

execução rápida, pode ser construído

a construção recebe uma lona para

por duas pessoas em seis horas com

proteção contra chuva e incidência

ferramentas

solar (figura 55). (ARCHDAILY, 2011)

uma

estrutura

comuns.

de

(ARCHDAILY,

2011) A modulação do edifício garante sua A área de 18 metros quadrados é

flexibilidade, permitindo a expansão

destinada a famílias de cinco pessoas,

ou redução do abrigo de acordo com

por um período de cinco anos até a

as

reconstrução da comunidade após

(ARCHDAILY, 2011)

os desastres. O abrigo comporta dois dormitórios

semi-privados,

uma

cozinha e um espaço para jantar, estar e trabalho (figura 57). Além disso, o projeto inclui um espaço externo de sete metros quadrados. O mobiliário é todo em madeira (figura 56), devido à intenção de tornar a obra mais sustentável

através

do

material

reutilizável. (ARCHDAILY, 2011)

86

necessidades

dos

moradores


O INTERMITENTE

figura 54: uso de fitas de nylon para fixação da madeira fonte: ArchDaily

figura 55: abrigo Liina após finalização com lona fonte: ArchDaily

figura 56: interior do abrigo com mobiliário em madeira fonte: ArchDaily

figura 57: planta dos abrigos Liina fonte: ArchDaily

87


4.3. Protótipo Puertas - Moradia de Emergência, Cubo Arquitectos O projeto de caráter emergencial tem como premissa a reutilização do material de uma arquitetura efêmera em uma futura obra permanente. Para as 36 portas de painel OSB, se prevê o uso de divisórias na construção posterior (figura 58). (GARCÍA, 2010) Além

disso,

materiais

a

utilização

pré-fabricados

de

objetiva

uma construção mais rápida, com possibilidade de ser executada em oito horas por 7 pessoas e desmontada em 45 minutos. (GARCÍA, 2010) O

módulo

separa

os

ambientes

de dormir e de estar, gerando um espaço de convivência central, que se comunica com o meio externo (figuras 59 e 60). A coberta independente garante sombreamento e ventilação da edificação, além de sua extensão possibilitar

o

prolongamento

do

volume do edifício, criando novos espaços definidos pelo usuário (figura 61). (GARCÍA, 2010)

88


O INTERMITENTE

figura 58: Protótipo Puertas fonte: ArchDaily

figura 59: interior do Protótipo Puertas fonte: ArchDaily

figura 60: acesso como espaço de convivência fonte: ArchDaily

figura 61: planta do Protótipo Puertas fonte: ArchDaily

89


a proposta


A PROPOSTA

À arquitetura, atribui-se um grande poder de transformação social. Por vezes, aplicada de forma utópica, dela se espera a resolução de questões complexas, atribuindo ao arquiteto e urbanista uma responsabilidade de gestor das cidades. Apesar de uma mudança profunda na estrutura social depender de inúmeros fatores, muitos deles desvinculados

“Ao mesmo tempo, a ideia de utopia

do que a arquitetura engloba, ela

tida no passado foi abandonada, a

certamente tem potencial de melhorar

medida que nos tornamos céticos

contextos adversos, de alcançar o bem

de qualquer grande solução para o

estar da forma mais viável.

problema. Ao invés disso, nós nos focamos no poder transformativo de

O que este projeto almeja, portanto,

pequenas intervenções e seu potencial

é explorar a arquitetura como apoio

para disseminação. Por essa razão,

mais do que como solução; é buscar

nós agora chamamos de consciência

ajudar pessoas a conviverem com

social o que antes chamávamos de

o problema, amenizando o efeito de

utopia. Isso implica em uma mudança

situações adversas.

de escala (projetos menores) e também significa que a arquitetura não mais clama possuir o poder de mudar nenhum dado problema social.” CARRANZA E LARA, 2014 [tradução livre]

91


01 PERENES INTERMITÊNCIAS

Atuando sobre os contextos de secas

de emprego, migram para os centros

e de enchentes no Ceará, o projeto

urbanos, ocupando, usualmente, zonas

de infraestruturas emergenciais de

de maior fragilidade ambiental. Desse

apoio visa se adequar aos diferentes

modo, estas pessoas se submetem

cenários, adaptando-se às variantes

a

de clima e considerando os efeitos de

atingidas por enchentes.

altas

probabilidades

de

serem

cada desastre para com suas vítimas. Em síntese, tem-se que as enchentes apresentam efeitos sobre a moradia das vítimas, as quais vivem em áreas de risco no meio urbano e, em eventos do tipo, perdem seus pertences e podem

ficar

desabrigadas.

Ceará

as

secas afetam a produção do meio rural, impossibilitando os pequenos agricultores

de

se

manterem

enchente

seca

moradia

produção

meio urbano

meio rural

economicamente, além de estarem diretamente associadas à fome das famílias mais carentes. Além disso, pode-se inferir, de acordo com o que foi explanado no capítulo 2, que os problemas ocasionados pela seca exercem influência sobre os

92

efeitos das enchentes. As vítimas do

êxodo rural

primeiro evento, motivadas pela busca

ocupação de áreas de risco


A PROPOSTA

No que diz respeito à temporalidade,

locais, até ela se reestabelecer em

os

de

local fixo. No caso das secas, o objeto

forma particular, sendo esta uma

arquitetônico deve funcionar como

característica

suporte, tornando-se essencial para

desastres

se

apresentam

primordial

para

a

elaboração do projeto de emergência.

o

Apesar de ambos se configurarem

agricultores e para a substituição

como

de projetos de combate à seca para

perenes

intermitências,

se

fortalecimento

repetindo ao longo dos anos, a duração

métodos

e, consequentemente, os efeitos para a

semiárido.

de

dos

convivência

pequenos

com

o

população se diferem. Compreende-se, A

metaforicamente, com um dor aguda,

apresentam caráter efêmero, em um

havendo

evento de enchente, ou permanente,

pico

consequências

se

as

infraestruturas emergenciais de apoio

um

pode

que

relacionar,

e

enchente

portanto,

de

ocorrência

severas,

porém

em contexto de seca.

passageiras. Já a seca se vincula a uma dor crônica, prejudicando de forma constante e interferindo no modo de viver. Assim, assume-se que a arquitetura pode oferecer apoio às vítimas de maneiras distintas. Para a emergência das enchentes, há a necessidade de um objeto provisório, que ajude na recuperação da comunidade por um tempo determinado pelas autoridades

93


desastres

arquitetura

enchente

seca

problema

problema

agudo

crĂ´nico

objeto

objeto de

provisĂłrio

suporte

efĂŞmera

permanente

emergencial

94


A PROPOSTA

02 O PROGRAMA

“Incorporar o programa ao nosso

Na situação de enchente, em que o

âmbito

recuperar

prejuízo está associado à moradia,

interesse

propõe-se os seguintes programas:

significaria

definitivamente pelo

o

acontecimento.

Projetar

os

abrigos

(dormitórios),

banheiros

programas nos permitiria mantermo-

e centro comunitário. Este último

nos

necessidades

inclui refeitório, salas de atendimento

públicas para assim retroalimentar

médico e psicológico, administração e

constantemente

ambições

serviço - cozinha e depósito, podendo

privadas. Nos permitiria construir

ainda servir de espaço para reuniões

nossa própria demanda e decidir sobre

da comunidade.

sua

próximos

pertinência.

às

nossas

Construiria

uma

noção de arquiteto crítico e propositivo

Para o contexto da seca, os objetos

de maneira simultânea.”

permanentes

[tradução livre]

módulos, os quais buscam atenuar os

FAIDEN, 2012, p. 07

prejuízos

consistem

em

socioeconômicos

três

através

de propostas de convivência com o semiárido. São eles: casa de sementes, apoio para emigrantes e centro de O

processo

projetual

engloba

também a criação do programa de

agroecologia,

o

qual

contempla

atividades de produção e de ensino.

necessidades. Primeiro, foi preciso entender os desastres e como eles afetam as suas vítimas. Então, a partir destes conhecimentos acerca dos seus efeitos, pode-se determinar espaços e funções, garantindo melhor assistência aos usuários.

95


03 A MATERIALIDADE

Seguindo as premissas da arquitetura

3.1. O sistema de container plástico da

emergencial,

Impacto

a

materialidade

do

projeto se resolve através dos seguintes requisitos:

Desenvolvido pela empresa Impacto com o intuito de reduzir o elevado

1. modulação,

déficit

habitacional

2. flexibilidade

modelo

3. montagem rápida

rápida,

4. portabilidade

transportados. Utilizado em canteiros

5. materiais de fácil acesso

de obra, estandes de vendas e até

6. não necessária a mão de obra

hotéis (figuras 64 e 65), o sistema do

especializada

container plástico demonstrou sua

propõe com

brasileiro,

uma

materiais

o

construção facilmente

eficiência em construções provisórias Considerando tais características e

ou permanentes. (IMPACTO, 2016)

optando por tecnologias locais, definese, então, a aplicação do sistema

O

modelo,

baseado

no

método

de container plástico da empresa

construtivo flat-pack, se constitui de

cearense Impacto, o qual, com cinco

um simples sistema de encaixe entre

pessoas, permite a montagem de

perfis metálicos, os quais também

36 metros quadrados em um dia.

podem ser fabricados em PVC, e painéis

(IMPACTO, 2017)

de plástico,

preenchidos de EPS ou

de lã de vidro. A estrutura metálica guia e une a construção das paredes e pisos, ambos de peças plásticas, assim, como a coberta, conforme mostram as figuras 62 e 66. (IMPACTO, 2016)

96


A PROPOSTA

O container plástico também permite o

A facilidade de manuseio das peças,

posicionamento de esquadrias dentro

sem

da modulação (imagem 63), as quais

dispensa mão de obra especializada,

se encaixam nos perfis do mesmo

promovendo, assim, a participação das

modo que os painéis da parede. A

comunidades na execução do projeto.

flexibilidade garantida pelo sistema

Além disso, a utilização de peças pré-

possibilita

conforto

fabricadas garante uma obra sem

térmico, já que as esquadrias podem

desperdícios, promovendo benefícios

ser dispostas para obter ventilação

tanto econômicos quanto ecológicos.

cruzada. (IMPACTO, 2016)

(IMPACTO, 2016)

melhorias

de

figura 62: modelo de container plástico da Impacto fonte: Impacto

necessidade

de

ferramentas,

figura 63: peças que formam o container plástico fonte: Impacto

97


figura 64: obra realizada com container plรกstico fonte: Impacto

figura 66: montagem do container plรกstico fonte: Impacto

98

figura 65: Hotel Vale das Nuvens fonte: Impacto


A PROPOSTA

0,10

0,89

figura 67: esquema de painéis e placas

3.2. A modulação

imagem produzida por Bianca Feijão e autora

O módulo inicial se define a partir do

painel plástico

painel plástico que forma a parede. Este possui dimensões de 84 cm x 53 cm, sendo intercalados por perfis

perfil vertical

perfil horizontal

horizontais e verticais, conforme se observa na figura 67. A soma das medidas dos painéis com a distância até os eixos dos perfis metálicos determina, então, o módulo de 89 cm em planta (figura 68) e 54 cm em altura. 4

0,53

0,8

perfil vertical painel plástico

0,10

0,89

GSEducationalVersion

0,10

0,89 figura 68: módulo construtivo imagem produzida por Bianca Feijão e autora

99


3.3. As instalações

vazio para passagem de cabos elétricos

As

instalações

hidrossanitárias

e

elétricas conectam-se normalmente à rede pública de distribuição e coleta, podendo se utilizar do auxílio de biodigestores para o tratamento de esgoto.

figura 69: perfil vertical da Impacto imagem produzida pela autora

Em relação às instalações elétricas, o sistema da Impacto prevê a passagem de cabos, os quais ficam embutidos nos perfis verticais (figura 69). Além disso, a estrutura da coberta, também com perfis metálicos, permite a passagem de fios para flexibilizar os pontos de iluminação. Já

no

caso

das

instalações

hidrossanitárias, entretanto, é preciso que estas fiquem aparentes, interna ou externamente (figura 70).

No contexto do semiárido, onde os edifícios são perenes, recomendase a construção de cisternas para armazenamento e distrubuição de água, devido ao seu limitado acesso.

100

figura 70: instalações hidrossanitárias fonte: Impacto


A PROPOSTA

3.4. As superfícies

sem

necessidade

de

ferramentas

ou parafusos, considerando que a Como forma de explorar possibilidades

modificação é facilmente executada,

formais que possam gerar uma maior

segundo corpo técnico da Impacto.

apreensão dos edifícios, além de promover melhorias no desempenho

Além disso, determina-se que o piso

térmico e acústico, utiliza-se, nas

seja de placas plásticas, também

paredes, o revestimento de painel de

utilizadas no modelo da Impacto, as

madeira de partículas orientadas -

quais se encaixam nos perfis metálicos

OSB (Oriented Strand Board).

horizontais do piso.

Dentre as vantagens do material, destacam-se sua eficiência ecológica e seu baixo custo, visto que ele se

perfil original

compõe de pedaços pequenos de madeira, geralmente reflorestada. O seu processo também garante maior densidade

e,

consequentemente,

maior rigidez e resistência à água. (NASCIMENTO et al., 2015)

adição de haste para segurar o painel de OSB

Seguindo o princípio de facilidade de montagem através de uma construção em encaixes, desenvolve-se, neste trabalho, a proposta de uma alteração nos perfis metálicos (figura 71), para que estes recebam os painéis de OSB

novo perfil painel plástico painel de OSB figura 71: proposta de alteração no perfil vertical imagem produzida pela autora

101


3.5. A montagem Primeiramente,

é

necessário

realizar a nivelação, caso desejada, e a compactação do terreno onde o módulo será implantado (1). A partir disso, pode-se posicionar a estrutura de base e, em seguida, a fixação do piso de placas plásticas (2). O terceiro passo consiste na montagem dos perfis verticais, os quais sem encaixam na estrutura de base por pequenos montantes (3). Então, dispõe-se os painéis plásticos que

constituem

as

vedações

do

módulo. Eles se encaixam na estrutura de perfis metálicos (4). Como acabamento, pode-se colocar os painéis em OSB e as esquadrias escolhidas (5). Por fim, monta-se a estrutura do teto, que recebe a coberta (6).

102


A PROPOSTA

1. nivelamento do terreno

2. posicionamento da base e do piso

3. montagem dos perfis verticais

4. disposição dos painéis plásticos

5. colocação dos painéis OSB

6. montagem da estrutura do teto e

e esquadrias

colocação da coberta

103


04 O PROJETO

Para cada situação de desastre, propõe-

como pátios, os espaços criados através

se três módulos de infraestruturas

de aberturas ao exterior caracterizam e

de apoio, adequando-os de maneira

diferenciam os módulos das enchentes

específica aos contextos em que são

e das secas.

inseridos. As adaptações projetuais são realizadas a fim de obter uma

No cenário da enchente, os vazios

melhor performance no que se refere

atuam como as varandas dos módulos,

ao condicionamento ambiental da

de

edificação, e, assim, garantir espaços

programa de cada um e ao número de

que proporcionem bem estar aos seus

usuários que recebem. Considerou-se,

usuários. Apesar das modificações

para tal decisão, o contexto geográfico

formais, a arquitetura dos módulos se

de Fortaleza, cidade litorânea em

comunica através da sua materialidade

que se indica o uso de varandas nas

e dos seus espaços criados.

edificações.

Os painéis de OSB, usados em ambos

No contexto de seca, referente ao sertão

os cenários de enchente e de seca,

cearense, evidencia-se a importância

promovem a unificação dos módulos,

de aberturas internas, para colaborar

ao mesmo tempo em que a pintura

na exaustão do ar quente. Cria-se,

de alguns deles ressalta verticais nas

então, pátios internos nos módulos

fachadas. A cor aplicada não ocorre de

desse cenário, que podem se expandir

forma aleatória, mas com a finalidade

por além do módulo ou se contrair para

de marcar as esquadrias e tornar o

o centro.

tamanho

correspondente

ao

processo construtivo mais intuitivo, visto que as peças são pintadas antes

Os vazios representam não apenas

da construção.

uma solução de conforto ambiental para climas tropicais e áridos, como

104

Para além da materialidade, o projeto

também a configuração de um espaço

se desenvolve e se unifica, sobretudo,

de convivência e de contato do usuário

pelos vazios. Ora como varandas, ora

com o seu entorno.


A PROPOSTA

contexto: enchente

contexto: seca

vazios como varandas

vazios como pátios

módulo: abrigos

módulo: casa de sementes

módulo: banheiros

módulo: apoio para emigrantes

módulo: centro comunitário

módulo: centro de agroecologia

105


Outras

técnicas

também

foram

intenções são inversas para litoral e

aplicadas ao projeto com o intuito de

sertão. No primeiro caso, a ventilação

proporcionar maior bem estar aos

é primordial para o conforto da

usuários através do condicionamento

edificação,

ambiental.

o uso de grandes esquadrias com

definindo-se,

portanto,

venezianas. O contrário ocorre no A coberta varia de acordo com o

meio rural, onde evita-se a entrada de

cenário. Para o clima tropical, contexto

vento, por este ser quente e repleto de

das enchentes tratadas, projeta-se

poeira. Para isso, os módulos da seca

uma coberta aparente com beirais

são providos de esquadrias menores e

mais extensos. Já para o caso do sertão

de vidro, objetivando apenas a entrada

das secas, a coberta se recolhe para o

de luz natural.

interior do edifício como uma escolha formal, visto que a falta de chuvas

Considerando as possibilidades que

dispensa grandes beirais.

uma arquitetura permanente oferece, bem como os requisitos da emergência,

Além disso, o piso eleva-se do terreno

definiu-se

para as infraestruturas situadas em

paredes duplas nas infraestruturas da

Fortaleza, pois, desse modo, se permite

seca, preenchidas in loco com terra

a circulação de vento sob a edificação,

(figura 72). Desse modo, é possível

resfriando o ambiente interno. Com

reduzir

o mesmo objetivo, mas realizando

dificultando a passagem de calor do

o método oposto, os módulos para

exterior para o interior do edifício.

a

ainda

a

existência

transmitância

de

térmica,

emergência de seca encostam no solo. Isso se justifica pelo fato de o solo

preenchimento com

apresentar temperatura mais baixa

0,89 terra

transmite para o interior do edifício.

retirada do local

0,10

que o meio externo, e assim, o frio se

No que se refere ao fechamento, as

0,10

0,89

figura 72: esquema de parede dupla imagem produzida pela autora

106


A PROPOSTA

contexto: enchente

contexto: seca

coberta aparente com beiral

coberta escondida

piso elevado do solo

piso sobre o solo

grandes esquadrias com venezianas

pequenas esquadrias de vidro

107


A 0,60

5,34

0,60

0,60

2,67

2,67

0,60

0,60

4.1. Módulos para enchente

painel de madeira OSB 15mm

4.1.1. Abrigo

perfil vertical

2

O módulo do abrigo é composto de dois

painel plástico da Impacto

dormitórios para quatro pessoas cada, incluindo espaços de convivência. Suas entradas se alternam, a fim de que o fluxo de pessoas seja dividido em uma

painel plástico da Impacto

4,45

implantação com fileiras de módulos

lado1a lado, ocasionando também uma

painel de madeira OSB 15mm

B perfil vertical de canto

volumetria com reentrâncias.

1 Além disso, o módulo do abrigo apresenta duas variações: dormitório para

oito

pessoas

e

dormitório

acessível. painel de madeira OSB 15mm 0,89

2

perfil vertical de cruzamento

0,60

painel plástico da Impacto

A

0

108

0.1

0.2 m


A

A PROPOSTA

0,89

A

0,60

2 0,60

5,34 2,67

2,67

0,60

0,60

0,60

0,60

B 4,45

1 2

6,54

B

1

6,54 4,45

B

2

1

B 1 0,60

2,67

0,60

2,67

0,60

5,34

0,60

A

0,60

A

0,89

0,60

2

0

0.5

1m

1. dormitório 4 pessoas (11,04 m²) 2. varanda (2,24 m²)

planta abrigo para 2 famílias de 4 pessoas

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.64.74.100

109


2

1

2

0

0.5

1m

1. dormitório 8 pessoas (22,50 m²) 2. varanda (2,24 m²)

110

planta abrigo para 1 família de 8 pessoas


A PROPOSTA

3

1 i = 6,85%

i = 5,55%

2

3

1. dormitório 4 pessoas (11,04 m²)

4

0

0.5

1m

2. dormitório acessível (11,04 m²) 3. varanda (2,24 m²) 4. rampa (9,75 m²)

planta abrigo acessível

111


+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

0

0.5

1m

corte AA

+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

0

112

0.5

1m

corte BB


A PROPOSTA

4.1.2. Banheiros

Um módulo único para banheiros garante a concentração das instalações

Nas

primeiras

os

banheiros

ideias

do

hidrossanitárias,

facilitando

a

testados

construção e proporcionando maior

individualmente, para cada abrigo,

economia à obra. Além disso, obtém-

como

maior

se um melhor aproveitamento da área

privacidade. Entretanto, as vantagens

determinada pela modulação, criando-

em unir tais ambientes em um único

se espaços com maior flexibilidade

bloco superaram os benefícios de

quando independentes dos espaços do

individualizá-lo.

abrigo.

forma

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.63.73.100

foram

projeto,

de

garantir

113


12,50 0,50

1,30

1,78

0,89

0,89

0,22

0,80

1,78

4

1,78

3 i = 7,10%

i = 7,10%

12,90

2,67

2

2

2,67

A

5

i = 7,10%

3

1,78

B

1,78

i = 7,10%

0,22

4

1. vestiário feminino | masculino (24,87 m²) 4. varanda (20,32 m²) 2. vestiário acessível (6,50 m²)

5. rampa (22,53 m²)

3. banheiro acessível (2,75 m²)

6. caixa d’água | depósito (18,75 m²)

GSEducationalVersion 114 GSPublisherVersion 241.64.74.100


C

A PROPOSTA

5,34

0,60 0,40

4,45

1

2

3

4

5

6

7

1 8 9 10 12 13

4,45

11

6

14

A 1

C

B

0

0.5

1m

planta banheiros + caixa d’água 115


+ 0,50m 0,00m

painel de madeira OSB perfil horizontal com haste para fixação de OSB

perfil horizontal com haste para fixação de OSB

piso em placa plástica

forro em placa plástica

perfil horizontal de sustentação do piso

painel de madeira OSB

0

116

perfil horizontal de sustentação da coberta

0.1

0.2 m

noisreVlanoitacudESG 001.47.46.142 noisreVrehsilbuPSG

0

0.1

0.2 m


A PROPOSTA

+ 7,66m + 7,66m

+ 2,70m + 2,70m

+ 0,50m + 0,50m 0,00m 0,00m

0

0.5

1m

corte AA 117


+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

2,70m ++2,70m

0,50m ++0,50m 0,00m 0,00m

0

0.5 1 m

corte BB

2,70m ++2,70m

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.63.73.100

0,50m ++0,50m 0,00m 0,00m

0

0.5 1 m

corte CC

+ 2,70m

118


A PROPOSTA

4.1.3. Centro comunitário

No mesmo bloco, encontram-se a sala de administração e as salas de

Este

módulo

tem

como

espaço

atendimento médico e psicológico,

principal o refeitório, o qual se abre para

que visam colaborar na recuperação

o meio externo e se comunica, pelo uso

das vítimas.

de grandes esquadrias de correr em painel OSB, com as demais edificações

O bloco possui acessos nas duas

emergenciais. Fazendo-se a utilização

fachadas,

de um mobiliário flexível, o espaço

localização central deste em um

também pode ser aproveitado como

terreno. As varandas contornam todo

local de reuniões da comunidade.

o edifício, enfatizando o caráter de

visto

que

se

prevê

a

ponto de convivência. Como apoio ao refeitório, existem os ambientes de serviço: cozinha e

AXO 01 depósito.

1:200

Havendo necessidade de

realização de reuniões, o mobiliário pode

ficar

guardado

no

segundo

espaço.

119

AXO 01

ucationalVersion blisherVersion 241.65.75.100

200

1:200


A 2,00 1,78

4,45

4,45

0,22 1,10

i = 7,05%

3,56

1,78

3,70

0,60

0,22

2

2,67

3

4

1,10 0,22

i = 7,05%

A

0,60

3,70

1,78

2,67

8,90

16,30

B

EducationalVersion PublisherVersion 241.65.75.100

120

1. refeitório (116,16 m²)

5. cozinha (26,46 m²)

2. atendimento médico (14,90 m²)

6. depósito (11,04 m²)

3. atendimento psicológico (11,04 m²)

7. varanda (118,29 m²)

4. administração (11,04 m²)

8. rampas (24,30 m²)


A PROPOSTA

26,25 22,25 4,45

8

2,00 4,45

4,45

1,78

0,22

i = 7,05%

5

B

6

1

7

8

i = 7,05%

0

1

2m

planta centro comunitรกrio 121


0

0

1

2m

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.65.75.100

122 GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.65.75.100

1

2m


A PROPOSTA

+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

corte AA

+ 2,70m

+ 0,50m 0,00m

+ 2,70m

corte BB

+ 0,50m 0,00m

123


telha termoacústica

i = 5%

perfis horizontais para sustentação da coberta

placa plástica na cor branco para forro

painel de madeira OSB 15mm com pintura esquadria em alumínio natural com veneziana perfil vertical para sustentação dos painéis plásticos e de OSB

painel plástico preenchido de EPS - 84cm x 53 cm placa plástica na cor branco para piso painel de madeira OSB 15mm natural

perfis horizontais para encaixe das placas do piso e dos perfis verticais estrutura de escoramento para elevar o módulo do terreno

124 GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.65.75.100


A PROPOSTA

125


4.2. Módulos para seca 4.2.1. Casa de sementes A casa de sementes funciona como espaço

para

e

preservação

armazenamento de

A

um

sementes

nativas para uso futuro, auxiliando significativamente na manutenção da

0,20

pequenos agricultores.

3,56

0,20

0,20

0,20

11,08

da cultura de estoque e da produção de 5,34

O módulo conta com uma área de armazenamento, em bombonas e em

1,78

1,78

garrafas, e uma de serviço, com copa e banheiro. Entre esses espaços, criase um pátio interno, que funciona Nesse uníco ambiente, se utiliza uma

1 B

2

3,96

3,96

como entrada e local de permanência.

1,78

sombreamento e da comunicação com

A

0,20

0,20

o exterior.

1,78

janela em veneziana, em virtude do

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

126


A PROPOSTA

painel de madeira OSB 15mm

perfil vertical de cruzamento

painel plástico da Impacto

painel de madeira OSB 15mm

perfil vertical de canto

perfil vertical de canto

preenchimento com terra

painel plástico da Impacto

perfil vertical de cruzamento

preenchimento com terra

0.1

0.2 m

0

0.2 m

A

11,08

11,08 1,78

0,20

0,20

3,56

5,34

1,78

3,56

0,20

0,20

5,34

0.1

A

0

B

B

3,96

1

B

1

2

4

1. armazenamento de sementes (17,96 m²)

A

A

0,20

1,78

4

ationalVersion sherVersion 241.73.84.100

3

1,78

3

0

0.5

1m

2. pátio interno (12,10 m²) 3. copa (2,75 m²) 4. banheiro (2,75 m²)

planta casa de sementes 127

2


0

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

128

0.5

1m


A PROPOSTA

+ 3,40m + 3,40m

+ 2,70m + 2,70m

0,00m 0,00m

0

0.5

1m

corte AA

+ 3,40m + 3,40m

+ 2,70m + 2,70m

0,00m 0,00m

corte BB

129


4.2.2. Apoio para emigrantes Uma vez que a seca também é

0,20

1,78

responsável pela migração de pessoas 0,70

do campo para a zona urbana, o projeto

0,20

também considera a necessidade de um apoio para viajantes, funcionando como uma parada de ônibus e ponto de

1,78

encontro para caronas.

3

O ambiente de espera é aberto ao meio externo, facilitando o acesso se estende, protegendo o pátio que se

5,38

em qualquer horário. A sua coberta

C

0,70

0,20

outro volume do módulo.

1,78

prolonga e que divide os banheiros do

130 GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

3


A

B

A PROPOSTA

11,08 3,56

2

5,34

0,20

1

B

A

C

0

0.5

1m

1. área de espera (17,96 m²) 2. pátio interno (12,10 m²) 3. banheiro (2,75 m²)

planta apoio para emigrantes 131


+ 3,40m + 3,40m

0,00m 0,00m

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

132

0

0.5

1m

0

0.5

1m

corte AA


A PROPOSTA

+ 3,40m + 3,40m + 2,70m + 2,70m

0,00m 0,00m

0

0.5

1m

corte BB

+ 3,40m + 3,40m + 2,70m + 2,70m

0,00m 0,00m

corte CC

133


4.2.3. Centro de Agroecologia produção

do

meio

rural

está

0,20

A

agrículas

são

repassadas

1,98

do sertanejo, visto que as técnicas entre

1,78

profundamente vinculada à cultura

O projeto do centro de agroecologia

0,89

1,45

gerações.

objetiva, então, promover a maior 1,78

transmissão destes conhecimentos e, desse modo, incentivar e preservar as práticas locais de produção. Ele possui espaços de desenvolvimento

A 2,67

capacitação.

5,11

11,97

de atividades agrícolas, bem como de

O pátio central conecta todos os ambientes,

funcionando

também

134

GSEducationalVersion

4,45 0,20

0,20

1,78

1,45

como local de permanência.


A PROPOSTA

1. entrada (7,03 m²)

4. extração de polpa (14,90 m²) 7. administração (8,77 m²)

2. pátio interno (34,16 m²) 5. viveiro de mudas (14,90 m²)

8. depósito (5,70 m²)

3. copa (10,27 m²)

9. sala de aula | palestras (24,07 m²)

B

6.banheiro (2,75 m²)

11,97 3,76 3,56

0,89

1,89

1,28

1,78

1,78

6

6

3

3,76 3,56

0,20

7

8

A

4

2

9

5

1

0

0.5

1m

B

0,20

1,28

planta centro de agroecologia 135


GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

136 GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.73.84.100

0

0.5

1m

0

0.5

1m


A PROPOSTA

+ 3,40m + 2,70m

+ 3,40m + 2,70m 0,00m

0,00m

corte BB

+ 3,40m + 2,70m

+ 3,40m + 2,70m 0,00m

corte CC 0,00m

137


telha termoacústica

i = 5%

perfis horizontais para sustentação da coberta

viga metálica inclinada para sustentação da coberta

esquadria em alumínio natural e vidro painel de madeira OSB 15mm natural painel de madeira OSB 15mm com pintura na cor branco placa plástica na cor branco para piso perfil vertical para sustentação dos painéis plásticos e de OSB

painel plástico preenchido de EPS - 84cm x 53 cm

perfis horizontais para encaixe das placas do piso e dos perfis verticais

138 GSEducationalVersion GSPublisherVersion 241.65.75.100


A PROPOSTA

139


a implantação


A IMPLANTAÇÃO

As

emergenciais

obtidas pelos mapas já apresentados,

propostas devem ter a capacidade de

outros critérios relativos ao nível de

se adaptar às variantes de terreno e

emergência e à viabilidade de acesso

de número de usuários. Desse modo,

para as comunidades.

a

infraestruturas

implantação

apresentada

neste

trabalho corresponde a um exemplo

As implantações seguem uma lógica

de instalação do objeto arquitetônico,

específica, mas passíveis de sofrerem

a qual pode variar, dependendo da

adaptações conforme sua localidade.

demanda. Nesse caso, para melhor compreensão das

orientações

de

implantação,

utilizam-se dois exemplos de cada situação de desastre, em áreas de conformação diferente. Na situação de enchentes, são escolhidos dois terrenos em Fortaleza, em áreas próximas a comunidades em áreas de risco. No caso das secas, a implantação é realizada em zonas residenciais de assentamentos rurais, de forma esquemática, visto que os limites entre lotes são indeterminados. Para determinação dos lugares a receber as infraestruturas, analisouse,

bem

como

as

informações

141


01 ENCHENTE Para um conjunto de infraestruturas

O

de apoio para vítimas de enchentes, é

localizado de modo mais central, a fim

ideal que o terreno seja relativamente

de facilitar o seu acesso (2).

próximo

à

comunidade

centro

comunitário

deve

ser

afetada,

facilitando o acesso.

Próximo

ao

centro

e

marcando

grupos de abrigos, ficam os banheiros Depois de escolhido o terreno, as

(3). As caixas d’água, próximas a

orientaçãoes

estes, funcionam como elemento de

para

implantação

consistem em, primeiramente, traçar

identificação de cada conjunto.

uma malha no sentido da ventilção

142

predominante (a qual, em Fortaleza,

Por fim, posicionam-se os abrigos em

corresponde a Leste-Sudeste), bem

grupos de até quatro módulos, para

como

esta

evitar extensos corredores. A locação

primeira, a qual será a base para

dos abrigos deve considerar a geração

o

edifícios,

de caminhos aos outros equipamentos

considerando a fachada de maior lado

e também de vazios, criando, assim,

e o posicionamento das esquadrias (1).

espaços de integração e lazer (4).

uma

perpendicular

posicionamento

dos

a


A IMPLANTAÇÃO

figura 73: vazios entre abrigos como áreas de lazer imagem produzida pela autora

1. criação da malha

2. centro comunitário

3. banheiros

4. abrigos e vazios

143


1.1. Escolha dos terrenos 1.1.1. Áreas mais críticas

1.1.2. Áreas mais críticas

A análise se inicia pela identificação

A partir disso, verifica-se que algumas

das áreas mais afetadas por enchentes

das áreas possuem assentamentos

em período recente, de acordo com

totalmente em área de risco, como

Santana (2019). São elas:

apontado no mapa 10, correspondendo

- Heráclito Graça;

aos seguintes bairros:

- Conjunto Palmeiras;

- Conjunto Palmeiras;

- Lagamar;

- Bom Jardim;

- Bom Jardim;

- Aeroporto;

- Bairro São Geraldo;

- Parangaba.

- Aeroporto; - Parangaba.

Percebe-se, inclusive, que a maior parte dos locais citados se encontra

Estas áreas sofrem influência de

nas regionais V e VI, com exceção do

diferentes corpos hídricos, como o

Aeroporto. Como já analisado, essas

Rio Cocó, no Lagamar e no Conjunto

áreas estão entre as mais propícias a se

Palmeiras, o Rio Maranguapinho, no

desestabilizarem com um desastre de

Bom Jardim, e a Lagoa da Parangaba,

enchentes, em virtude do baixo poder

no bairro de mesmo nome.

aquisitivo das famílias ali presentes e do acesso restrito à rede de esgoto.

144


A IMPLANTAÇÃO

mapa 10: identificação de assentamentos irregulares totalmente em área de risco

1 - Parangaba

parcialmente em área de risco

2 - Aeroporto

não especificado

3 - Bom Jardim

corpos hídricos

4 - Conjunto Palmeiras

N 0

1

2.5

5 km

2

3

4

fonte: Fortaleza em Mapas

145


1.1.3. Presença de terrenos vazios

1.1.4. Áreas dos vazios

Um terceiro critério consiste em

Muitos dos vazios analisados limitam

verificar

vazios

sua utilização para infraestruturas

clas-

de emergência, em virtude da área

sificados como ZEIS de vazio - tipo 3

reduzida e da dificuldade de implantar

(ver mapa 11), pela sua destinação, já

todos os equipamentos de forma

prevista na legislação municipal, a

adequada, seguindo as orientações

projetos sociais. Acerca dos bairros

elencadas.

próximos,

a

existência

de

preferencialmente

mencionados, tem-se que: - Conjunto Palmeiras: existem ZEIS

Define-se, então, dois terrenos em

tipo 3 em bairros próximos, como o

bairros diferentes, com base na sua

Passaré;

área e possibilidade de abrangência de

- Bom Jardim: as ZEIS de vazio

outras comunidades próximas:

encontram-se em bairros próximos, a aproximadamente dois quilômetros de

Terreno 1: área de 13.210 m² no bairro

distância

Manoel Sátiro, próximo ao Bom Jardim.

- Aeroporto: as áreas destinadas a ZEIS tipo 3 estão, em sua maioria, ocupadas

Terreno 2: área de 7.690 m² no Passaré,

por outras edificações;

abrangendo comunidades do Conjunto

- Parangaba: assim como no Aeroporto,

Palmeiras e das proximidades do

muitas das ZEIS já são utilizadas por

Castelão,

outros proprietários, mas ainda se

assentamentos em áreas de risco.

verifica a existência de vazios.

146

onde

também

existem


A IMPLANTAÇÃO

mapa 11: vazios urbanos assentamentos irregulares zeis tipo 3 terrenos sub ou não utilizados

N 0

2.5

5 km

fonte: Fortaleza em Mapas

147


1.2. Implantação | Terreno 1

de modo que se gera uma via interna de acesso ao centro comunitário,

A extensa área do terreno próximo ao

situado no centro do terreno e também

Bom Jardim permitiu a implantação

próximo a Travessa José Onofre.

de 5 conjuntos de abrigos + banheiros. Para cada banheiro, existem 14 ou 15

Além disso, as fileiras são distanciadas

módulos de abrigo, o que garante um

em 4,50 metros, partindo dos eixos

total de 30 famílias por agrupamento.

estruturais.

Tal relação se define, em uma situação

espaços de convivência são gerados

de emergência, da seguinte forma:

pela exclusão de alguns módulos de

Percursos

menores

e

abrigo em suas fileiras, facilitando - 1 vaso sanitário para 10 residentes;

o acesso aos demais equipamentos

- 1 lavatório para 10 residentes;

e

- 1 chuveiro para 30 residentes.

comunidade.

promovendo

a

integração

(ANDERS, 2007) No caso do projeto, o número de lavatórios é limitante, com 12 deles para 120 habitantes, correspondendo a 15 módulos de abrigo para um módulo de banheiros. A respeito das conexões com o entorno, o terreno se situa ao norte da Rua Estrada do Siqueira, uma via coletora.

centro comunitário

Determina-se, portanto, que a entrada

banheiros + caixa d’água

principal para o conjunto será pela Rua Cento Quatro, ao leste do terreno. A instalação dos abrigos ocorre, então,

148

abrigos espaços de convivência esquema de setorização

da


A IMPLANTAÇÃO

R.

Ce

nt oQ

ua tro

Tv. Jos éO nof re

N 0

10

20 m

planta de implantação | terreno 1 149


1.2. Implantação | Terreno 2

a existência de áreas de lazer, espaços que não só servem uma função social,

O terreno 2 possui uma área mais

como também organizam o espaço,

reduzida em relação ao terreno 1, já

dividindo os conjuntos de abrigos +

que parte do local foi desconsiderada

banheiros.

devido à grande quantidade de árvores. Ainda assim, é possível criar espaços

O projeto, tanto em módulo quanto em

de qualidade, aproveitando os vazios

implantação, ressalta a importância

gerados pelas edificações.

dos vazios para o bem estar individual e coletivo.

As fileiras de abrigo se mantém com um máximo de 4 módulos, e se distanciam, assim como no primeiro terreno, a cada 4,50 metros. Dessa forma, permite-se a fácil comunicação entre as diferentes infraestruturas. O

acesso,

pela

Travessa

Menor

Jerônimo, é enfatizado pelo centro comunitário, mas de forma silenciosa, em virtude do espaço de convivência criado sob as árvores existentes. Esta via se comunica melhor com a via arterial mais próxima, ao sudeste do terreno, visto que a Rua M se encontra

centro comunitário

atualmente em péssimo estado de

banheiros + caixa d’água

limpeza e pavimentação. Também se possibilita, através da exclusão de alguns módulos de abrigo,

150

abrigos espaços de convivência esquema de setorização


Tv .M

en or

Je

rô n

im o

A IMPLANTAÇÃO

R.

M

N 0

10

20 m

planta de implantação | terreno 2 151


figura 74: centro comunitรกrio imagem produzida pela autora

152

figura 75: refeitรณrio imagem produzida pela autora


A IMPLANTAĂ‡ĂƒO

figura 76: conjunto de abrigos com vista do banheiro ao fundo imagem produzida pela autora

153


02 SECA As infraestruturas de apoio para

Posiciona-se o centro de agroecologia,

vítimas da seca tem a função de

próximo a uma maior quantidade

promover, em um assentamento rural,

de casas e de forma mais central na

as condições de convivência com o

comunidade (1).

semiárido. Próximo ao centro, mas também A escala de implantação é mais

englobando

áreas

mais

distantes

abragente, considerando um conjunto

devem ficar as casas de sementes (2).

de casas próximas dentro de um

154

assentamento rural. Convenciona-se,

O apoio para emigrantes, localizado

assim, a instalação dos equipamentos

nas periferias, baseia-se no acesso

baseadas em raios de distância do

às vias principais, que conectam

centro da comunidade e em acessos

o assentamento a zonas urbanas,

às rodovias principais.

considerando o êxodo rural (3).


A IMPLANTAÇÃO

figura 77: centro de agroecologia imagem produzida pela autora

1. raio de instalação do centro de agroecologia: 200m

2. raio de instalação da casa de sementes: 350m centro da comunidade rural

3. raio de instalação do apoio para emigrantes: 500m

4. sentido preferencial da implantação

Recomenda-se, também que a fachada de maior dimensão se volte para norte ou sul, já que a incidência solar ocorre

N

mais fortemente no leste e no oeste (4). 155


2.1. Escolha dos terrenos

e Itapajé; - Independência: próximo a Crateús,

2.1.1. Áreas mais críticas

Boa Viagem e Tauá; - Arneiroz: próximo a Tauá.

De

acordo

com

os

parâmetros

elencados no capítulo 2 (mapa 09),

2.1.3. Situação de emergência definida

observa-se que os municípios mais

pela Secretaria de Segurança Pública

suscetíveis a sofrerem com a seca,

e Defesa Nacional

de acordo com dados de precipitação pluviométrica,

infraestruturas

de

De

acordo

com

a

Secretaria

de

apoio e risco de desertificação, são:

Segurança Pública e Defesa Nacional

- Miraíma

(2019),

- Irauçuba

mencionados, o único que se em

- Independência

situação de emergência por estiagem

- Arneiroz

ou seca é Irauçuba, sendo, portanto, o

dentre os municípios já

local escolhido. 2.1.2.

Proximidade

de

municípios

com bom Índice de Desenvolvimento

2.1.4. Acesso a outros municípios

Municipal (idm) Irauçuba

apresenta

cinco

assen-

Após a análise dos locais em situação

tamentos rurais federais de norte

mais crítica, busca-se identificar a

a sul (mapa 12). Para exemplo de

existência de municípios próximos

implantação, opta-se pelos que se

que

infraestruturas

conectam melhor com os municípios

de apoio, baseadas no Índice de

do segundo critério analisado. Define-

Desenvolvimento Municipal (idm).

se, então, os assentamentos:

ofereçam

- Saco Verde, ao norte, próximo de

156

Verifica-se, então, que:

estradas para Sobral e Itapajé;

- Miraíma: próximo a Sobral e Itapipoca;

- Águas Mortas, ao sul, próximo a

- Irauçuba: próximo a Sobral, Canindé

Canindé.


A IMPLANTAÇÃO

mapa 12: possíveis fluxos assentamentos rurais estaduais

Irauçuba

assentamentos rurais federais

municípios próximos com bom idm

manchas urbanas

estradas pavimentadas 1 - Assentamento Saco Verde 2 - Assentamento Águas Mortas

N 0

25

50 km

1 2

fonte: Ipece

157


2.2. Implantação | Saco Verde A

zona

habitacional

do

assentamento

caracteriza

por

Saco sua

escolhida Verde

se

conformação

linear, em uma estrada de terra que se conecta, ao sul, com uma rodovia federal. Dessa forma, adota-se o centro da comunidade como o ponto mediano entre início e fim das residências observadas na via. Próximo a tal ponto, escolhe-se um terreno vazio para

a

instalação

do

centro

de

agroecologia, com intuito de tornálo um equipamento comunitário de relevância e fácil acesso. As funções vinculadas do centro de agroecologia e da casa de sementes justificam

a

implantação

deste

segundo próximo ao primeiro, servindo como uma extensão das atividades. No entanto, a casa de sementes pode atuar de forma independente, e por isso, se propõe uma segunda unidade no outro extremo da comunidade, atendendo a outras moradias. Por fim, o apoio para imigrantes tem local definido de acordo com os acessos, situando-se, dentro do raio determinado, na porção sul, onde se acessa a rodovia que leva às zonas urbanas próximas. 158

centro de agroecologia casa de sementes apoio para emigrantes


A IMPLANTAÇÃO

N 0

50

100 m

esquema de implantação | Saco Verde 159


2.3. Implantação | Águas Mortas No assentamento Águas Mortas,

a

zona residencial trabalhada configurase em uma forma poligonal, pelas bifurcações existentes nas vias. Próximo a uma área descampada, possivelmente utilizada como praça, é determinada a instalação do centro de agroecologia. Seguindo a ideia de espalhar as casas de sementes, uma delas funcionando como

extensão

do

centro

de

agroecologia e outra abrangendo outra porção da comunidade, definem-se, respectivamente, suas instalações ao nordeste e ao oeste da área mostrada. No caso dos apoios para emigrantes, nota-se que as vias se comunicam com rodovias federais em dois pontos: na saída noroeste e na saída sul. É determinado, então, um módulo para cada um destes pontos.

centro de agroecologia casa de sementes apoio para emigrantes 160


A IMPLANTAÇÃO

N 0

50

100 m

esquema de implantação | Saco Verde 161


162


A IMPLANTAĂ‡ĂƒO

figura 78: apoio para emigrantes imagem produzida pela autora

figura 79: casa de sementes imagem produzida pela autora

163


164


A IMPLANTAĂ‡ĂƒO

figura 81: pĂĄtio interno do centro de agroecologia imagem produzida pela autora

figura 80: centro de agroecologia imagem produzida pela autora

165


consideraçþes finais

166


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao

projeto,

cabe

apresentar

possibilidades. Mostrar alternativas que promovam o bem estar, mesmo em situações extremas, e ainda que as respostas pareçam não vir. As

infraestruturas

emergenciais

são uma demonstração de como a

arquitetura

pode

colaborar

na

reestruturação

das

vítimas

de

desastres,

e

sobretudo,

de

como

é fundamental a sua condição de adaptabilidade ao contexto de quem ela visa atender. Os casos de seca e enchente serviram de exemplos para afirmar o potencial que

concerne

à

arquitetura

de

assistir e de renovar, bem como de se transformar, se adequando a cenários de necessidades distintas. O que guia o percurso do objeto, acima da configuração geográfica na qual ele se insere, são as pessoas. Suas carências e vontades determinam os caminhos do projeto, o que vai e o que permanece.

167


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173


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