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Sabores da Culinรกria Mineira
Isac Godinho 3
Agradecimentos Em primeiro lugar agradeço aos meus pais, Luiz e Ivanilda e ao meu irmão, Lucas. Eles que sempre acreditaram no meu potencial e nunca mediram esforços para que eu pudesse realizar todos os meus sonhos. Só estou finalizando esse projeto por muita força e apoio deles. À toda a minha família, que esteve ao meu lado em toda a jornada, que me deu forças e que contribuiu muito com todo esse meu carinho pela culinária. Aos meus amigos de Viçosa que foram companhia, foram porto segura, que deram conselhos e abraços. Que estiveram juntos tomando uma cervejinha e que me apoiaram mesmo nos momentos que tive que me ausentar e dedicar a esse trabalho. Sem esse carinho, sem dúvidas eu não chegaria até aqui. Às pessoas que contribuíram com esse livro, com entrevistas, informações, conselhos e com apoio. Tudo isso foi essencial. Finalmente, agradeço ao meu amigo e orientador, Felipe Menicucci. Ele comprou minha ideia e embarcou comigo nessa viagem. Sem sua atenção, suas dicas e sua experiência, eu nunca alcançaria esse objetivo. Parafraseando Clarice Lispector, hoje eu sei que quem caminha sozinho pode até andar mais rápido, mas somente quem caminha acompanhado chega tão longe. A todos vocês, minha eterna gratidão!
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“Qual o primeiro ingrediente que se põe na panela? O amor! Depois dele, a compreensão de que nenhum ingrediente vai ao fogo por acaso. Cada um tem sua história, sua lembrança.” (Dona Lucinha)
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Apresentação Minas Gerais é o quarto maior estado do país em extensão territorial e o segundo em quantidade populacional. Falar de culinária mineira não é fácil, uma vez que existem várias formas de escolher, preparar e servir os alimentos, influenciadas por tradições vindas de todos os cantinhos do estado. Trabalhamos aqui com a ideia de que a cozinha é o centro da casa, é nela que tudo acontece. Mais do que um lugar onde se cozinham e se comem os alimentos, é o espaço onde recebemos nossos amigos e familiares, onde confraternizamos, comemoramos e batemos muito papo sobre qualquer tipo de assunto. A partir daí, mostramos a importância da cozinha e da culinária mineira como importante marco da cultura do povo de Minas Gerais. O processo de se alimentar se constrói com o hábito, através de diferentes atividades rotineiras. A cozinha mineira é composta por três grandes povos influenciadores: os indígenas, os africanos e os portugueses. Muitos momentos históricos marcaram a nossa terra, como a corrida do ouro, um período
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de muitas dificuldades, quando muitas pessoas vieram em busca do ouro e do enriquecimento e se depararam com pouquíssima infraestrutura. O período da cana-de-açúcar e os diversos engenhos que se instalaram por aqui com o objetivo de explorar as terras do interior do país e também trouxeram povos e culturas diferentes para essa região. Todos esses fatores influenciaram e ajudaram a construir a culinária mineira e todos eles são objeto de discussão nesse livro. Esperamos que essa leitura alimente a cabeça dos apaixonados pela comida e, quem sabe, ainda deixe a barriga roncando e a boca salivando pelos deliciosos pratos típicos de Minas Gerais. Como bem disse Dona Lucinha, o nome de maior destaque na cozinha mineira, um prato típico é como uma rede tecida ao longo do tempo, ele é se constrói aos poucos, com pitadas de ciência e fé, de lenda e de mito, de história e arte e, claro, para não esquecer, de seus ingredientes mais óbvios. Passe um café bem quentinho, pegue alguns biscoitos ou qualquer quitute de sua preferência e aprecie essa leitura acompanhada do melhor que a culinária de Minas Gerais pode te oferecer.
Bom apetite! 7
Sumário 9 22 34 41 48 55 61 66 73 79 85 92 99 106
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Uma Exaltação Refeições
do
da
Gastronomia
Povo Mineiro
Caderninho
de
História
Quem Faz
Doces
de
de
Receitas: Refeições
Minas
Caderninho
de
História
Quem Faz
de
Receitas: Doces
Quitandas Mineiras Caderninho
de
História
Quem Faz
de
Uma Dose
de
Receitas: Quitandas Pinga
e um
Caderninho
de
História
Quem Faz
de
Jornalista
na
Bom Tira-Gosto
Receitas: Petiscos Cozinha
Capítulo 1
Uma Exaltação da Gastronomia
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N
ossa história começa entre as montanhas da pacata cidadezinha de Tiradentes. O lugarejo com pouco mais de sete mil habitantes é um santuário de cultura e história localizado no Campo das Vertentes de Minas Gerais. A cidade costumeiramente tranquila, ganha uma cara nova e um brilho especial todo ano, quando acontece o Festival de Cultura e Gastronomia de Tiradentes, realizado no fim de agosto ou no início de setembro, há exatos vinte anos. Mesmo sendo acostumada a receber turistas diariamente, nessa época a cidade é inundada por uma infinidade de sujeitos, vindos dos mais diversos lugares do Brasil e do mundo, com os mais variados objetivos. Mas, é claro, sempre prontos para viverem experiências únicas e se deleitarem com a deliciosa comida típica de Minas Gerais. Mais de quarenta e cinco mil turistas visitam a cidade durante os dez dias de evento, muitos se hospedam nos muitos hotéis e pousadas que a cidade oferece, outros preferem fazer um bate e volta, aproveitar as atrações da cidade e pegar a estrada no fim do dia, de volta para suas casas. Mas todos, sem dúvidas, saem do Festival de Cultura e Gastronomia com as energias recarregadas, cheios de história para contar e com muitas lembranças dos deliciosos quitutes criados pelos diversos cozinheiros. O turista, sempre muito atento e curioso, chega à cidade já maravilhado pelas belíssimas paisagens proporcionadas pela famosa estrada real. Ao chegar à
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região central da cidade, uma nova e grata surpresa: ao som do apito e o cheiro da fumaça, lá está a exuberante Maria Fumaça em um passeio pela história a bordo dos antigos vagões da Estrada de Ferro Oeste de Minas. A máquina centenária ainda está em funcionamento e proporciona ao turista um delicioso passeio até a vizinha, e também histórica, cidade de São João Del Rei. Além da Maria Fumaça, o viajante aproveita para admirar a beleza da praça da estação, sua arquitetura histórica em um ambiente calmo e rodeado de árvores. Lugar perfeito para tirar a câmera fotográfica da bolsa e começar a registrar momentos e paisagens maravilhosas que a cidade reserva para seus visitantes. A poucos passos da estação ferroviária o turista já pode começar a se encantar com a exuberância da culinária mineira. É bem ali em frente que fica montada a feirinha livre dos produtores. Toda semana, de sexta a domingo os produtores montam suas barraquinhas e colocam a venda delícias de todo tipo, lá você encontra deliciosos queijos, cachaças artesanais, licores dos mais variados, biscoitinhos caseiros, café moído na hora, vários doces, molhos caseiros de alho e pimenta, mudas de temperos, além de flores e artesanatos que encantam a todos e são a cara de Minas Gerais. A feira vai muito além dos produtos expostos nas bancas dos produtores, um dos bens mais preciosos que o turista pode encontrar ali é a boa prosa com as pessoas da cidade. Sem pressa, os feirantes contam
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sobre a história da cidade, sobre os produtos, sobre outros turistas, sobre o clima e o que mais o assunto render. Um bom papo não vai faltar, como também não faltam ótimas receitas e excelentes indicações de restaurantes e pratos típicos para apreciar durante a estadia na cidade. Seguindo rumo ao centro, o turista atravessa a ponte que corta o Rio das Mortes e passa por inúmeras ruas com suas construções históricas, casinhas simples, com janela de madeira, telhado colonial e muita história guardada dentro de suas paredes. As casas são muito conservadas e bem cuidadas e viram uma atração turística por si só, encantam os olhos e chamam a atenção de mais alguns cliques da câmera fotográfica. Um dos lugares mais conhecidos da charmosa Tiradentes é o Largo das Forras. Ali estão estacionadas as tradicionais charretes, com elas os visitantes podem fazer um passeio mais detalhado e conhecer os principais pontos turísticos da cidade, como a Igreja Matriz de Santo Antônio, o Museu da Liturgia e o Chafariz São José, além de alambiques e lugares onde se produzem doces artesanais. Nesses dias em que o Festival de Cultura e Gastronomia toma a cidade, o Largo ganha uma cara nova. A praça fica lotada de visitantes, os aromas da comida se espalham pelo lugar, dá pra sentir de longe o cheirinho do alho e da cebola na panela. É ali que os visitantes participam de aulas e palestras, visitam vários stands de produtores e começam essa viagem culinária.
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A praça abriga diversos restaurantes e barzinhos que aproveitam a lotação da cidade para oferecerem cardápios especiais, uma musiquinha ao vivo e uma cerveja bem gelada acompanhada de deliciosos tira gostos. O que não falta é opção, o turista se perde em meio a tantos aromas e sabores. E esse é só o começo do passeio. Seguindo a diante o turista passa por mais uma feirinha de artesanato e chega a estrutura principal do festival, montada na praça da rodoviária, esse espaço abriga show de música e as cozinhas dos restaurantes mais renomados do estado, onde chefs cozinham ao vivo e os visitantes podem apreciar dos mais variados tipos de comida. Ali está montada uma enorme praça de alimentação, com várias mesas e cadeiras, para que as pessoas possam escolher dentre tantas opções de refeição e passar momentos agradáveis, apreciando uma boa música, uma belíssima paisagem, a decoração rústica do local e interagindo com outros visitantes, que também estão ali com esse objetivo de se divertir e se encantar com as delícias que a comida de Minas reserva para todos. Mas não são apenas os turistas que vivem momentos mágicos no festival. Ao mesmo tempo, quem trabalha na cozinha também vive experiências únicas e também guarda muitas histórias superinteressantes sobre esse local maravilhoso. Para alguém que trabalha com a culinária, participar de um momento como esse é uma oportunidade única
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de aprendizado e desenvolvimento. O cozinheiro passa dias e mais dias pensando em seus pratos, matutando os ingredientes que vão combinar da melhor forma, fazendo testes, pensando nas proteínas, nas guarnições, nas texturas e em toda a combinação de sabores. Além disso, o cozinheiro tem a oportunidade de colocar seus pratos ao julgamento do público e da crítica especializada. Antes da cidade e das praças se encherem de visitantes, o cozinheiro já tem muito trabalho a fazer. Todo o planejamento da viagem, dos cardápios que serão oferecidos, pensar nos melhores ingredientes, onde comprá-los e como armazená-los para manter a qualidade de seus pratos. Pode até parecer coisa simples, mas essa etapa de planejamento é crucial para que tudo dê certo durante todos os dias de festival. Com tudo planejado, é hora do chef cair na estrada e também vir rumo ao Festival, na charmosa Tiradentes. Os cozinheiros vêm de todos os cantos de Minas e vários deles vêm de outros estados do país, por isso, também fazem uma bela viagem, apreciando as paisagens repletas de serras e se encantam com as belezas naturais do interior de Minas Gerais. Chegando em Tiradentes o trabalho de quem cozinha não para. É tanta coisa pra fazer que as atrações turísticas acabam ficando em segundo plano. A prioridade é montar as cozinhas, pois o festival está para começar e mais de quarenta e cinco mil turistas famintos estão chegando, doidinhos para experimentar
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as delícias preparadas pela equipe da cozinha. Quando começa o festival, as praças se enchem, mas não só de visitantes, a atração principal por ali é a boa e velha comida mineira. Aromas, cores, texturas e sabores que se misturam e trazem a essência do festival. Um cheirinho de tempero, que se mistura com o aroma da cachaça, usada para pururucar o leitão na barraca ao lado, tem também o cheirinho característico das frutas maduras que compõe sobremesas e os mais variados molhos. Nessa hora, quando o cliente começa a chegar, o cozinheiro se desdobra em mil, tem que prestar atenção na ordem dos pedidos, saltear legumes, fritar torresmos e batatas, ficar atento ao ponto da carne, não deixar o molho queimar, além de explicar os pratos para os consumidores, sedentos por informação e esperando comer a melhor comida de suas vidas. Enquanto isso, turista chega na praça, o dia está ensolarado, pedindo um bom petisco e uma cervejinha gelada antes do almoço. Ele anda pelo local e vai se ambientando, o corpo já começa a sacolejar ao som da música que toca no palco, enquanto isso ele passeia por todos os restaurantes ali presentes, olhando atentamente os cardápios, o preparo dos pratos, a carinha de satisfação dos outros clientes. Depois de muito avaliar ele decide pedir de tira gosto dadinhos de tapioca com queijo curado da Serra da Canastra e geleia de pimenta vermelha. Nesse momento, o cozinheiro recebe o pedido,
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aproveita que já tem todo o pré-preparo adiantado e executa todos os processos da forma mais rápida possível, para que o cliente não precise esperar por muito tempo para se deliciar com os dadinhos dourados e saborosos. Quando o prato fica pronto, o turista se apaixona já na primeira mordida, a casquinha crocante e dourada esconde um recheio, macio e suculento, que derrete na boca, enquanto o queijo da Serra da Canastra se repuxa em uma explosão de sabores, que ganham ainda mais força com a ajuda do molho de pimenta vermelha. É tanto prazer, ainda mais acompanhado de uma cervejinha gelada, sob uma tenda que proporciona um alívio do sol de mais de trinta graus que aquece a cidade naquele momento. É como um presente da vida, um sopro de energia, que desperta um desejo ainda maior de experimentar mais comida boa. A banda no palco toca músicas de Gil, Gal e Caetano, enquanto o público se diverte, canta e dança, apreciando as delícias disponíveis. No stand ao lado um chef renomado ensina ao vivo várias receitas diferentes de brigadeiros, que atraem uma multidão no entorno da barraca, curiosos para ver o chef de perto, para aprender as novas formas de fazer esse doce bem brasileiro e é claro para provar o resultado dessa experiência deliciosa.
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Em outro cantinho da praça se encontra um carrinho tuk tuk repleto de comidas gostosas. É uma ação do senac, que visa valorizar os demais serviços da cozinha além do chef, que muitas vezes é visto como protagonista, dando visibilidade para a importância de serviços como o dos garçons, metres e sommeliers. Além disso, o tuk tuk também tinha a missão de promover o projeto Primórdios da Cozinha Mineira, uma ação do senac que busca resgatar e preservar os hábitos alimentares dos primeiros habitantes do estado de Minas Gerais. O projeto trabalha com vários pilares, que buscam regatar receitas e hábitos que haviam se perdido com o tempo e através deles explicar e entender melhor a história da cozinha mineira. Dentre esses pilares que o projeto aborda estão o da horta histórica, o do pomar histórico, das farinhas antigas, pães e quitandas, das receitas tradicionais, da queijaria, da doçaria, das bebidas alcoólicas, cafés e chás, das carnes e outros derivados de animais, e do ambiente utensílios e técnicas. Através dessa iniciativa as pessoas podem conhecer receitas que haviam se perdido há mais de meio século, provar bebidas típicas como os fermentados de laranja e o hidromel e, ainda, conhecer o queijo do Frei Rosário, maturado exclusivamente dentro de uma caverna no
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Santuário de Nossa Senhora da Piedade. Tudo isso, enquanto passeia pelo festival nas encantadoras ruas históricas de Tiradentes. Enquanto isso, o turista já começa a se preocupar com outra decisão que tem pra fazer, decidir qual prato escolherá para o almoço dentre as infinitas possibilidades que os restaurantes do evento oferecem. Mais uma vez, ele anda pela multidão, observando cada barraquinha, cada cozinheiro concentrado em suas atividades, vai olhando os ingredientes nas bancadas, vê gente usando banana, pimenta, queijo, café, carne de porco, de boi, de frango, os mais variados legumes e verduras. Ele vai sentindo todos aqueles aromas e, finalmente, decide pedir um ragu de maçã de peito ao ora-pro-nóbis, servido com angu na manteiga e queijo curado. É uma mistura de sabores incrível, que agrega o ora-pro-nóbis com a carne e o angu de uma maneira incrível. O único desejo é pedir mais um prato e comer aquela delícia em quantidades absurdas. Mesmo estando ambos nessa cidade encantadora e receptiva, o maior contato entre o turista e o cozinheiro é através do paladar, através dos deliciosos pratos que são fruto do trabalho árduo de um e objeto dos desejos do outro. É através da comida que o cozinheiro entrega o melhor de si, todo o seu talento, as técnicas, a criatividade, a mistura de sabores que encantam, e é também através da comida que o turista se realiza, cumpre sua missão de estar ali, conhece um pouquinho mais de Minas Gerais através de seus hábitos alimentares
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e é nesse encontro de almas que a culinária se realiza, podendo proporcionar ao cozinheiro e ao turista essa sensação de dever cumprido e deixar na boca um gostinho de quero mais. Depois de muita comilança, muito passeio, muitas fotos incríveis, que vão abastecer as redes sociais e vão ficar guardadas no livrinho da memória, o sol se põe em Tiradentes, é hora de pegar a bela estrada real e voltar a realidade, de estômago cheio e coração aquecido, porque é o superpoder que a comida sabe exercer sobre as pessoas.
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Capítulo 2
Refeições do Povo Mineiro
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O
hábito alimentar do povo mineiro é marcado por algumas características, como a cozinha sempre cheia, uma mesa grande, onde sempre cabe mais um e uma fartura e diversidade de alimentos que faz brilhar os olhos de qualquer pessoa. Esses costumes estão muito ligados à origem da culinária de Minas Gerais, que tem sua mais forte inspiração e influência nos povos indígenas que aqui habitavam e nos povos africanos que para cá foram trazidos e forçados a trabalhar. Nesses dois povos, uma característica comum é o espírito tribal e comunitário. Muito desse espírito se mostra forte hoje nas mesas fartas e receptivas das casas de Minas. Quando se trata da origem da culinária típica do estado, os marcos iniciais são dos povos indígenas. Deles vieram os principais ingredientes, o conhecimento das plantas presentes na fauna da região e muitos dos utensílios utilizados. As cozinheiras africanas incorporaram a esses alimentos novas técnicas e souberam usar dos ingredientes aqui presentes para criar novos pratos. Veio da criatividade dos africanos a criação de pratos típicos usando o pouco alimento que eles tinham disponível, como a feijoada, feita com aparas de carne de porco e feijão preto, acompanhada de farinha de milho ou de mandioca. Outra influência marcante foi do povo português, que trouxe novas receitas e também alguns utensílios que se combinaram com as tradições regionais. A fartura das mesas que encontramos por aqui também tem grande influência dos colonizadores portugueses.
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Além desses três grandes influenciadores, todo o povo que veio para a região das minas em busca de ouro e metais preciosos deixou sua marca na cultura e na culinária local. Por esse motivo, pode-se perceber na cozinha de Minas Gerais um quê de universalidade, um sabor mágico que encanta a todos que tem o prazer de apreciá-lo. A cozinha dos tropeiros, por exemplo, que saiam viajando longas distâncias para transportando mercadorias e gado, era composta por uma comida ambulante, que deveria resistir a dias e mais dias de viagem. Por isso, a farinha era um ingrediente essencial nesse tipo de comida. As carnes eram conservadas em latas com gordura de porco e tudo era colocado nos embornais desse povo viajante. É deles a origem de um prato muito típico de Minas, o feijão tropeiro. Um prato preparado com feijão, carne de porco, couve e farinha de mandioca. Uma mistura seca, muito saborosa e com uma durabilidade muito maior que a do feijão tradicional. Essa origem simples também traz outra característica marcante da culinária do estado, o aproveitamento máximo de todos os ingredientes. Minas foi uma região que recebeu muitas pessoas no período da mineração do ouro, entre “aventureiros” que buscavam enriquecer e escravos que não tinham a mesma sorte. Todos precisavam se alimentar, dessa maneira, qualquer alimento deveria ser totalmente aproveitado para que conseguisse suprir e alimentar a todas essas pessoas.
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A comida típica de Minas Gerais se baseia em alguns ingredientes que fazem parte de quase tudo que é cozinhado. São peças chaves dessa tradição culinária: o milho, a mandioca, as verduras de folha, o feijão, o leite e seus derivados, acrescidos das carnes de frango e de porco e dos demais produtos que são obtidos através desses animais. O milho já era uma planta muito utilizada pelos índios, consumida de várias maneiras diferentes. Entre os escravos, era a partir desse grão que se fazia o angu, o principal de seus alimentos. Também é muito utilizado na alimentação das galinhas, dos porcos e do gado de leite e de corte, constituindo novos subprodutos a serem utilizados na cozinha. O milho é uma planta muito versátil e tem uma presença muito marcante na culinária mineira até os dias de hoje. Uma das principais características do milho é que este grão pode ser consumido de muitas formas diferentes, sendo cozido, assado, pode virar creme ou pamonha. Moído, na forma de fubá, vira ingrediente para pães, broas e no estimado angu dos mineiros. Ainda pode ser transformado em canjiquinha, em farinha de milho ou ainda comido na forma de conserva. A moagem do milho, que origina o fubá, é um processo muito característico das fazendas do interior de Minas. Ela pode ser feita através dos “moinhos d’água” que são mais comuns, ou de pedra. Esses moinhos são construídos na forma de casinhas simples, que ficam em locais baixos em relação ao curso de
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água, que chega até eles através de regos e bicas bem simples. Desse processo resultam a canjiquinha, o fubá grosso e o fubá mimoso, bem fininho, ideal para as receitas de mingaus e cremes. O angu, feito com fubá, é um dos acompanhamentos mais tradicionais da mesa mineira, vai bem com tudo. É presença indispensável junto com frango com quiabo, com um torresmo, uma costelinha ou mesmo ao lado de qualquer verdura. Em muitas casas o angu é mais um prato feito todos os dias, bem como os já conhecidos arroz e feijão. Uma característica muito importante do angu de Minas Gerais é que ele não leva sal nenhum, é só fubá e água. E por mais que muita gente ache essa ideia um pouco estranha, é desse jeitinho que ele vai bem acompanhando qualquer tipo de comida. O tempero suave, inclusive, também é uma tradição do povo mineiro. Por aqui não se usam muitas especiarias na comida, o tradicional é temperar com sal e alho e bastante moderação, nada de comida salgada. O sal e o alho, em geral, são batidos em pilões de madeira e com esse tempero ainda fresco, são levados a panela. Às vezes, uma folhinha de louro ajuda a temperar e também a salsinha, a cebolinha e as mais variadas pimentas podem trazer um gostinho especial para a comida. Colocar pouco sal na comida é hoje um hábito, mas no passado era uma necessidade. O sal precisava vir do litoral até o interior de Minas, o caminho era distante e montanhoso, o que
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não ajudava em nada na caminhada dos pequenos burrinhos que viajam com toda a carga do tempero no lombo. Além do percurso difícil, muito do sal se perdia com as chuvas e os vendavais enfrentados nos muitos dias de viagem, por isso, quando chegava em Minas o preço do sal era altíssimo, fazendo com que a palavra de ordem na cozinha fosse a economia. Só tempos depois é que foi se descobrir os males que o excesso de sal poderia fazer a saúde, mas aí, a comida mineira já estava em vantagem com seu tempero suave, mas muito saboroso. Outro costume nas casas mineiras era a criação de algumas galinhas no terreiro e de alguns leitõezinhos em um chiqueirinho no fundo do quintal. Era uma maneira mais econômica de prover esses alimentos para a família e hábito rotineiro do interior. Os porcos eram alimentados com as sobras dos alimentos da casa e eram criados até que crescessem e engordassem o suficiente para que pudessem ser abatidos. Geralmente o abate de um porco acontecia em ocasiões festivas, como em aniversários, casamentos ou festas religiosas. O porco fornecia uma quantidade muito grande de carne para a família, mas também dava uma trabalheira. Matar e limpar o porco não era uma tarefa da mais fáceis, era necessário separar os cortes de carne, separar os miúdos, limpar as tripas que seriam utilizados para a confecção de linguiças e chouriços, separar e temperar o sangue, retirar a banha do porco,
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fazer a primeira fritura do toucinho e das demais carnes que seriam guardadas na própria banha do animal, ufa, era tarefa que não acabava mais. Nesses momentos toda a família sem envolvia, cada um ajudando um pouquinho como podia e, se necessário, os vizinhos e amigos também vinham para ajudar nessa missão. No fim, tudo virava lembrança boa, histórias para contar e deliciosos pratos, como o pernil assado lentamente no forno à lenha, a costelinha que acompanhava muito bem a canjiquinha, o torresmo bem crocante com um generoso pedaço de angu e uma couve refogada, e qualquer pedaço do porco podia acompanhar o tradicional ora-pro-nóbis colhido na horta. As galinhas, frangos e galos, que também eram criados na maioria dos quintais viraram parte imprescindível da culinária mineira. O galo já marcava o início do dia, cantando bem cedo e tirando o homem do campo da cama, mostrando que já era hora de pegar firme no serviço. Esses animais, na maioria das vezes, eram alimentados com milho e com folhas de algumas verduras, como a couve, que já haviam passado do ponto. Eles corriam soltos pelos quintais e iam crescendo por ali. As galinhas diariamente entoavam seus cantos, mostrando que já haviam botado algum ovo, que era recolhido pelos moradores e muito bem utilizado para fabricar quitandas ou comido cozido ou frito na hora das refeições. Depois de grandes, esses animais passavam pelo mesmo destino, eram abatidos para alimentar os moradores da casa.
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Uma das comidas mais tradicionais da mesa mineira, feita com esse animal, é o frango ao molho pardo, uma carne suculenta, servida com um molho denso e muito saboroso feito à partir do próprio sangue do animal. Para prepara-lo era necessário limpar bem o pescoço da galinha, tirando todas as penas e penugens, depois era feito um corte certeiro na jugular do animal e todo o sangue era colhido em uma bacia com umas colherinhas de vinagre. Enquanto o sangue ia escorrendo para a bacia, era necessário mexer a mistura constantemente, para não talhar e proporcionar um molho mais homogêneo. O sabor desse prato fica muito melhor quando feito com o sangue ainda fresco, no mesmo dia em que o animal é abatido. Esse é um dos principais motivos para que essa tradição do frango ao molho pardo esteja perdendo a força em Minas. Hoje em dia, a maioria das pessoas não cria mais galinhas em casa e são pouquíssimos os açougues que vendem o frango recém abatido, acompanhado do sangue. Para os restaurantes, outra dificuldade para se fazer esse prato são as exigências sanitárias, pois armazenar uma grande quantidade de sangue por um período maior de tempo não é algo fácil. Em Belo Horizonte, o antigo restaurante Maria das Tranças consegue manter essa tradição de uma maneira peculiar, o dono construiu um abatedouro no andar de baixo do restaurante. Dessa forma, todos os animais chegam lá ainda vivos e são abatidos pouco antes dos preparos dos pratos, possibilitando a produção de
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um delicioso frango ao molho pardo que já é parte da história da culinária mineira. Essa receita vai muito bem com uma quantidade generosa de angu, um bom e velho arroz branco e até mesmo acompanhado de quiabos, recém colhidos na horta das casas mineiras. Falando em horta, essa é mais uma tradição dos cantinhos de Minas, plantar um pouquinho de cada coisa no quintal de casa e ter sempre verduras e legumes fresquinhos para virarem deliciosos pratos. As verduras são simples, mas estão sempre presentes nas refeições das casas mineiras, com muita abundância e complementando perfeitamente outras delícias típicas do estado. As hortas nos quintais possuíam dos mais variados produtos, sempre era possível comer uma verdura ou legume fresquinhos, colhidos na hora. Nas plantações estavam presentes o quiabo, o jiló, a couve, o espinafre, a taioba, a mostarda, a serralha, a salsinha, a cebolinha, pimentas variadas, o cará, o mangarito, cabeças de alho e cebola, ora-pro-nóbis, alface, repolho, batatinhas e amendoim. Perto das cercas ficavam o chuchu, o feijão de corda, o pepino e as abobrinhas, estes aproveitavam das cercas como estaleiros e iam se alastrando por todo o espaço possível. Os legumes e, principalmente, as pimentas colhidas também eram transformadas em deliciosas conservas utilizando cachaça ou vinagre. Além de muito gostosas, as conservas ajudam a preservar o alimento por muito
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mais tempo, como o próprio nome já diz. Além disso, servem também para enfeitar as prateleiras da cozinha e ainda para presentear de maneira bem criativa os visitantes da casa. Além das verduras e legumes, também havia espaço para os chás, plantinhas com poderes medicinais muito cultuadas em Minas Gerais. Sentir qualquer sintoma de doença era sinônimo de tomar um chazinho de alguma erva que certamente resolveria aquele problema. As mais encontradas nas hortas são a camomila, a hortelã, a alfazema, a erva doce, a erva cidreira, o funcho, a losna, o poejo, o boldo, a malva, a melissa, a marcela, o bálsamo, o chapéu de couro, a caninha do brejo, a trançagem, a arruda e a arnica. Além de tudo isso que era produzido nas hortas, as cozinhas também se mantinham da produção das lavouras de milho, mandioca, arroz e feijão, que são essenciais na alimentação cotidiana do povo de Minas. Mas na verdade, essencial mesmo na dieta dos mineiros, um povo muito marcado pela religiosidade, é a gratidão. Seja na mesa rica ou na mesa pobre, na fartura ou nos momentos de aperto, sempre há em
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torno da mesa muito carinho e afeto, há sempre boas lembranças e um sentimento bom de gratidão pela presença do alimento e das pessoas queridas que circundam a mesa e fazem da refeição um momento muito mais importante que o simples ato de se alimentar.
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Caderninho de Receitas . refeiçþes .
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. Frango com Quiabo . Ingredientes - 1 kg de quiabo - 1 frango, cortado em pedaços - 5 dentes de alho amassados - 1 cebola grande - Óleo - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Cheiro verde a gosto
Modo de Preparo Tempere o frango com alho, sal e pimenta e deixe marinar por pelo menos 1 hora na geladeira. Em uma panela grande, refogue a cebola picada em cubos pequenos e coloque o frango temperado, deixando até dourar. Cubra o frango com água quente e deixe cozinhar por cerca de 20 minutos. Lave e seque os quiabos e pique em rodelas finas. Em outra panela, aqueça o óleo e refogue o quiabo, mexendo sempre, até sair a baba, por cerca de 20 minutos. Misture o frango e o quiabo e deixem cozinhar por cerca de 5 minutos para que apure o sabor. Acrescente o cheiro verde e sirva quente.
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. Angu . Ingredientes - 4 colheres (sopa) de fubá - 500 ml de água
Modo de Preparo Em uma panela coloque a água para esquentar. Quando a água estiver morna, coloque o fubá e misture até incorporar na água. Cozinhe em fogo baixo por aproximadamente 15 minutos, mexendo de vez em quando.
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. Ora-pro-nóbis com Carne de Porco . Ingredientes - 1 maço de ora-pro-nóbis - 1 kg de carne de porco de sua preferência cortada em cubos - 1 cebola picada - Óleo - Alho - Sal a gosto - Pimenta do reino a gosto
Modo de Preparo Tempere a carne de porco com o alho, o sal e a pimenta e deixa descansar por pelo menos 30 minutos. Em uma panela, esquente o óleo e frite a carne até dourar, quando estiver dourada, coloque um pouco de água e deixe cozinhar. Quando a carne estiver macia, acrescente o ora-pro-nóbis e refogue por cerca de 3 minutos.
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. Feijão Tropeiro . Ingredientes - 500 g de feijão cozido - 250 g de bacon - 150 g de linguiça calabresa - 1 cebola grande picada - 4 folhas de couve picadas - 4 ovos - 1 xícara de farinha de mandioca - 4 dentes de alho amassados - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Cheiro verde a gosto
Modo de Preparo Em uma panela frite o bacon e a calabresa. Acrescente o alho e a cebola e deixe dourar. Coloque os ovos, o sal e a pimenta e vá mexendo até que os ovos estejam fritos. Acrescente a couve e depois o feijão cozido. Misture tudo e coloque a farinha de mandioca. Finalize com o cheiro verde e sirva quente.
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. Canjiquinha com Costelinha . Ingredientes - 1 kg de costelinha de porco - 250 g de canjiquinha - 1 cebola grande picada - 4 dentes de alho amassados - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Cheiro verde a gosto - Água
Modo de Preparo Tempere a costelinha com o alho, o sal e a pimenta e deixe descansar por pelo menos 30 minutos. Em uma panela com um pouco de óleo coloque a carne e deixe dourar. Acrescente a cebola e também espere até ficar dourada. Coloque água e deixe cozinha, por cerca de 30 minutos. Quando a carne estiver quase cozida, acrescente a canjiquinha e mais um pouco de água, se for necessário. Deixe cozinhar por cerca de 30 minutos e finalize com o cheiro verde.
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. Frango ao Molho Pardo . Ingredientes - 1 frango cortado em pedaços - Sangue colhido de 1 frango - 1 cebola grande picada - 1 colher (sopa) de vinagre - 5 dentes de alho amassados - 100 gramas de farinha de trigo - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Cheiro verde a gosto - Água
Modo de Preparo Tempere o frango com o alho, o sal e a pimenta e deixe descansar por pelo menos 30 minutos. Em uma panela com um pouco de óleo refogue o frango até dourar, acrescente a cebola e depois a água e deixe cozinhar por cerca de 30 minutos. Bata o sangue de frango com a farinha de trigo e o vinagre e coloque a mistura na panela. Deixe cozinhar por cerca de 15 minutos, finalize com o cheiro verde e sirva quente.
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Histรณrias de Quem Faz
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De Minas para o mundo – a história de um chef Hoje, Ronie Peterson Costa é chef executivo do grupo Senac. Mas sua relação com a cozinha já vem de muito tempo. Nascido em Barbacena e morando em um bairro simples, a adolescência de Ronie se resumia em ir para a escola, se divertir com os amigos na rua e ajudar a mãe em casa, sempre que possível. Filho mais velho de cinco irmãos, Ronie sempre teve a tarefa de ajudar a mãe a cuidar dos mais novos, para que ela pudesse trabalhar. Além do trabalho fora de casa, sua mãe também fazia doces para vender e desde os doze anos, o menino se envolveu nesse trabalho para auxiliá-la. Seus dotes culinários começaram a se revelar a partir daí. Ele ficava em casa e cuidava de seus irmãos mais novos, com isso, vinha também a tarefa de cozinhar para alimentar essa tropa inteira. E além da família, a casa estava sempre cheia de amigos, que também saboreavam da comida de Ronie. E foram dois desses amigos, que perceberam a aptidão dele com a cozinha e deram o empurrãozinho que mudou sua vida. Aos dezessete anos, seus amigos José Roberto e Alexandre chegaram na casa de Ronie trazendo uma novidade. Eles haviam feito a matrícula dos três para o curso de cozinheiro do hotel escola Senac Grogotó, o primeiro hotel escola da América Latina, localizado na
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cidade de Barbacena, cujo intuito é formar profissionais com conhecimento teórico e muita prática de mercado. . No início ele conta que entrou no curso mais pela farra e por poder fazer algo diferente ao lado dos amigos, mas nunca pensando que aquilo ali poderia se tornar uma profissão.
Quando, finalmente, chegou na sala de aula ele se deparou com um instrutor muito exigente, seu nome era Antônio José da Costa. Era tanta cobrança do instrutor que Ronie se dividia entre uma certa vontade de largar tudo e não ter mais essa preocupação e, também, o desejo de mostrar que era bom e evitar as reclamações do professor. Foi pouco mais de um mês dentro da sala de aula, até que a turma finalmente conhecesse a cozinha do hotel. E foi aí que a vida de Ronie mudou de uma vez por todas. Nesse primeiro contato, um dos lugares que mais chamou sua atenção foi a câmara fria da pâtisserie, nela ficava todo o estoque de doces que seriam servidos no hotel. Aproveitando que ele e seus amigos conheciam outros estudantes que já estavam em um estágio mais avançado do curso e que trabalhavam diretamente na cozinha, ele e seus colegas puderam ter uma visita mais aprofundada pela cozinha, incluindo experimentar alguns dos doces que estavam armazenados na câmara fria. Ronie conta que foi apresentado para um ‘tal de quindim’, que teve que comer bem rápido, escondido mesmo. Um sabor que nunca mais seria esquecido. O chef conta que nunca tinha comido nada parecido,
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sobremesa para ele era uma rapadura e olhe lá, naquele momento ele se sentiu comendo um manjar dos deuses e o único pensamento que veio em sua cabeça foi “ser cozinheiro é isso? Vou poder comer essas delícias todos os dias? ”. E a partir daí, muito inspirado pelo desejo de comer comida boa que ele mergulhou no universo da gastronomia e há 23 anos se aventura em uma cozinha, sempre ligado ao hotel do Senac. Assim que terminou o curso, Ronie teve a oportunidade de fazer uma prova e se tornou auxiliar de cozinha do hotel. Com o tempo ele ocupou outros cargos, como o de instrutor de prática, onde orientava os alunos em suas atividades na cozinha do hotel, instrutor de formação profissional, onde além das aulas práticas também ministrava aulas teóricas para os estudantes. Depois ele assumiu o cago de chefe de setor, função em que ele comandava sozinho todo um setor dentro da cozinha do hotel, tendo sua própria equipe de cozinheiros, auxiliares e instrutores. Finalmente, chegou ao cargo de chef executivo, que ocupa até hoje. Além das funções como chef, ele também coordena várias atividades educativas do Senac, se dividindo em uma jornada de trabalho entre Barbacena e Belo Horizonte. Outra função extra que ele teve o prazer de desempenhar, foi participar de competições nacionais e internacionais de cozinha, como ‘coach’ de equipe pelo Senac, o responsável por treinar os competidores que fariam as provas em nome do hotel. Nesses
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eventos, o chef pode representar o Brasil, competindo na Inglaterra, na Colômbia, na Alemanha e na edição sediada pelo Brasil, ocupando duas vezes a terceira colocação e ficando uma vez no quarto e uma no quinto lugar. Posições estas vistas como muito satisfatórias pelo chef e pela equipe do hotel, visto que eles competiam com cerca de 40 países em cada um desses eventos. Neste ano de 2017, o Festival de Cultura e Gastronomia de Tiradentes, em sua edição comemorativa de 20 anos, escolheu homenagear a gastronomia mineira e, também as pessoas que contribuem para o seu sucesso. Entre os homenageados no festival, estava o chef Ronie Peterson Costa, que teve seu trabalho reconhecido como alguém que agrega valor à culinária de Minas, utilizando os ingredientes mais tradicionais e típicos do estado, aliados às técnicas da alta gastronomia, produzindo pratos saborosos e bem apresentados, a partir de alimentos simples que encontramos na horta de nossas casas.
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Um jovem humilde, vindo de um bairro simples, começou a cozinhar para ajudar a mãe a cuidar dos seus irmãos e fazer doces para aumentar a renda familiar. Com anos de estudo, dedicação, prática e experiência, esse menino cresceu, conheceu o mundo e pode levar um pouquinho da comida mineira por onde passou, sempre com muito orgulho de onde veio. Perguntado sobre como foi sua escolha pela gastronomia, sua resposta é simples e direta: “Eu não escolhi fazer gastronomia, eu tive a sorte de ser escolhido por ela!”
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CapĂtulo 3
Doces de Minas
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m traço muito marcante da culinária mineira são os deliciosos doces, feitos lentamente no fogão à lenha em um tacho de cobre, misturados com toda paciência e ajuda de uma colher de pau. Mais uma forte tradição que os portugueses, doceiros por excelência, deixaram marcada na história de Minas. Para conhecer um pouco mais do açúcar, principal ingrediente das receitas de doces, é preciso saber como ele é produzido, a partir da cana-de-açúcar. A cana-de-açúcar é muito conhecida aqui no país e parece ser uma planta bem brasileira, mas isso não é verdade. Ela foi trazida pelos portugueses e se adaptou muito bem ao nosso solo, se estabelecendo como uma das principais culturas brasileiras no período colonial. No passado, o açúcar tinha um valor inestimado, chegava até a ser conhecido como ouro em pó. Era um produto tão valioso que, inclusive, constava nos testamentos da época e era legado para os descendentes. Por ter todo esse valor, a cultura da cana foi a principal forma que os portugueses escolheram para povoar o país e chegar ao interior, até então, inexplorado. Dos engenhos portugueses saía o açúcar, que foi uma das principais fontes de riqueza dos colonizadores e, além disso, dava sabor para deliciosas quitandas, licores e, principalmente os doces. É da cana, também, que são originados a rapadura e o melado, que também são produtos muito apreciados pelos mineiros. O primeiro, é usado para adoçar o
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tradicional cafezinho e já foi servido como sobremesa, até mesmo, por Assim Chateaubriand enquanto ele era embaixador do Brasil no Reino Unido. O segundo, é uma iguaria característica das mesas de café da manhã de minas, servido acompanhado de mandioca, cará, ou inhame cozidos, por exemplo. Os portugueses, exímios doceiros, foram os responsáveis por deixar essa tradição doceira marcada na culinária mineira. Juntando-se o açúcar com as variadas frutas encontradas nos pomares daqui, o resultado eram as muitas delícias diferentes. As famílias mineiras eram conhecidas por tentar produzir em suas terras a maioria dos produtos que utilizavam na vida cotidiana. Além das hortas e das criações animais, outro espaço muito importante das casas eram os pomares. Repletos de muitos tipos de frutas, ali se encontrava uma paisagem que ia mudando de cor com o passar do ano. Cada época era marcada pelas frutas da estação, que deixava os pomares coloridos e com os mais característicos aromas. Nos pomares eram encontradas frutas como jabuticabas, laranjas – serra d’água, cravina, lima, Bahia – mexerica, limões, bacupari, jenipapo, jambo, gabiroba, goiaba branca e vermelha, mamão, araticum, amora, romã, pitanga, ameixa, jatobá, abacate, araçá, manga, cagaita e uma variedade de bananas – da terra, ouro, prata, caturra, rosa, d’água. A criançada se ouriçava para comer as frutas fresquinhas, ainda no pé. Enquanto isso, na cozinha a
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missão era aproveitar tudo que era produzido no pomar. Como a durabilidade das frutas era muito pequena, era necessário executar processos que aumentassem o tempo de vida das frutas. A alternativa encontrada foi o uso do açúcar como conservante. Dessa maneira, vários tipos de frutas se transformavam em geleias, compotas, doces e licores. A produção de geleias é um dos processos mais utilizados para conservar as frutas através do açúcar. São geralmente servidas com pães, torradas, bolos e biscoitos ou até usadas na confeitaria, para produzir novas sobremesas. A geleia consiste em frutas cozidas lentamente, em fogo baixo, com água e açúcar, até que a mistura incorpore e adquira uma consistência gelatinosa. Além das geleias, também podem ser produzidos doces cremosos ou com uma consistência mais dura, para serem cortados. Quando cremosos, eles são chamados pelos mineiros de doce de colher, e quando mais firmes, recebem o nome de doces de corte. A diferença no ponto se dá pelo tempo de cozimento e também pela quantidade de açúcar utilizado. Outra curiosidade dos doces de corte é que eles surgiram a partir do cozimento do marmelo com água e açúcar. Por isso, ainda hoje, ele é conhecido como marmelada, mesmo que seja produzido com outras frutas, como a banana, a manga, ou a goiaba. Além disso, esses dois tipos de doces, além das frutas, também podem ser feitos com o leite, produzindo uma
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das delícias mais tradicionais da culinária mineira. Outro tipo muito popular de doce mineiro são as compotas, onde as frutas são cozidas em calda de água e açúcar, geralmente inteiras ou cortadas ao meio. Nesse caso, elas são envasadas em vasilhames de vidro, recebem um tratamento térmico para lacrálas e podem ser conservadas assim, mesmo fora da geladeira. São tradicionais nas festas mineiras, além de serem deliciosos e muito bonitos, servindo de enfeite nas cozinhas e como presente para amigos ou visitantes. Muito comuns nas festas de fim de ano, as frutas cristalizadas também são doces tradicionais da culinária mineira. Para esse doce, parte da água existente na fruta é substituída por açúcar, através do cozimento em uma calda bem concentrada de açúcar e da secagem da fruta no forno. Dessa forma, o doce se torna cristalino e saboroso, podendo conservar as propriedades da fruta por muito mais tempo. Os licores não são um tipo convencional de doce, mas também são feitos a base de açúcar e servem como maneira de conservar frutas por mais tempo. A bebida que é muito comum no encerramento das refeições mineiras é feita por muitos artesanalmente e seguindo as frutas de cada estação. A bebida apresenta um teor alcóolico que varia entre 15 e 54 por cento de álcool e um teor de açúcar sempre superior a 30 gramas por litro da bebida. Fazer licor não é difícil, embora requeira bastante
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tempo para a fermentação da bebida. Algumas frutas são usadas inteiras ou amassadas, em outros casos apenas a polpa é utilizada, ou até mesmo a casca pura. Sempre acompanhada de uma cachaça de qualidade, em um vasilhame de vidro. Depois do sabor já apurado, os licores são envasados nas mais belas licoreiras e passam a enfeitar as cristaleiras da s casas mineiras, sendo retiradas para servir as visitas após o almoço e até mesmo presenteálas com uma bebida artesanal, feita com as frutas do quintal. Cozinhando lentamente, à beira do fogão de lenha, as antigas cozinheiras têm a tradição de sempre mexer os tachos em um movimento de vai e vem, enquanto o doce está no fogo. Depois de retirá-lo da chama, é importante mexê-lo em movimento circular até que ele esfria, para que o doce não desande. Muitas pessoas consideram as sobremesas de Minas doces demais, passando na quantidade de açúcar. Porém, é desse sabor marcante do excesso de açúcar que vem outra tradição da culinária mineira. Por aqui, qualquer tipo de doce é servido com um pedaço bem generoso de queijo minas. Assim, o excesso de açúcar é quebrado pelo sabor salgadinho do queijo e juntos formam uma mistura perfeita de doce e salgado, que quem começa a comer, não quer mais parar.
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Caderninho de Receitas . doces .
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. Doce de Figo . Ingredientes - 1 kg de figo - 2 e 1/2 xícaras de açúcar - Água - Cravos - Sal grosso para limpar os figos
Modo de Preparo Para limpar os figos, coloque-os em um saco junto com o sal grosso e esfregue, até que saia todo o pelo da casca dos figos. Faça um corte em formato de cruz no fundo dos figos, para que a calda penetre. Ferva os figos em água. Quando ferver, deixe por cerca de 5 minutos, retire do fogo e deixe resfriar. Repita esse processo por 3 vezes trocando a água, até que saia todo o amargo da fruta. Em seguida, faça uma calda com água, açúcar e cravo. Quando a calda já estiver grossa, acrescente os figos e deixe ferver por cerca de 15 minutos, retire do fogo, para que a fruta não cozinhe demais e espere esfriar. Repita esse processo por cerca de 5 vezes, até que a doçura da calda penetre nos figos.
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. Doce de Mamão . Ingredientes - 5 xícaras de mamão verde ralado - 3 e 1/2 xícaras de açúcar - Água - Cravo da Índia
Modo de Preparo Rale o mamão e lave bem, para sair o amargo da fruta. Fervente o mamão por 3 vezes trocando a água para que todo o amargo do mamão verde saia. Em uma panela faça uma calda com o açúcar, a água e o cravo. Acrescente o mamão e deixe cozinhar até que fique macio e absorva o doce da calda.
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. Geleia de Goiaba . Ingredientes - 6 goiabas vermelhas maduras - 1/2 xícara de água - 1 e 1/2 xícara de açúcar - 1 colher (sopa) de suco de limão
Modo de Preparo Lave as goiabas, retire as extremidades e descarte. Corte as goiabas ao meio e bata no liquidificador junto com a água. Coe a mistura para retirar as sementes. Em uma panela, junte o suco das goiabas com o açúcar, misture bem e deixe ferver por 30 minutos. Acrescente o suco de limão e deixe ferver até chegar no ponto. Para saber o ponto, passe o dedo no fundo da colher e deve ficar um risco caso a geleia preencha esse espaço, ainda não está no ponto certo. Quando chegar no ponto, retire do fogo, espere esfriar e sirva.
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. Doce de Leite . Ingredientes - 2 litros de leite - 500 g de açúcar - 1 colher (sopa) de bicarbonato de sódio
Modo de Preparo Em uma panela grande, misture todos os ingredientes e leve ao fogo. Cozinhe em fogo baixo até secar, engrossar e chegar na textura desejada. Evite mexer durante o cozimento para que o doce fique pastoso e liso.
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. Licor de Jabuticaba . Ingredientes - 1 kg de jabuticabas maduras -1 litro de cachaça de boa qualidade - 1 kg de açúcar - 2 xícaras (chá) de água
Modo de Preparo Coloque as jabuticabas lavadas e secas em um recip iente de vidro, cubra com a cachaça, feche e deixe curtindo por pelo menos 10 dias. Após as jabuticabas já terem curtido, faça uma calda com o açúcar e a água, misturando até engrossar. Coe a mistura de cachaça e jabuticabas e junte com a calda já fria.
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Histรณrias de Quem Faz
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Os queijos de Dona Catarina, uma tradição de família A história de Catarina Bernardina da Silva começa em Piedade do Rio Grande, uma pequena cidade, com menos de cinco mil habitantes, próxima a São João del Rei. Foi nessa cidadezinha pacata que dona Catarina nasceu há 68 anos, foi lá também que ela aprendeu a fazer o delicioso queijo minas e até hoje tira dos queijos a principal renda da casa. O pai de Catarina vendia leite, mas às vezes, quando havia sobra, ele fazia queijos para conservar o produto por um tempo maior. Foi observando o pai que ela aprendeu a receita, ainda aos 11 anos e nunca mais parou. Toda orgulhosa, ela conta que já faz queijos há 57 anos e que, modéstia à parte, eles são deliciosos e quem comeu, nunca reclamou. Aos 19 anos, dona Catarina se casou com o seu João e os dois resolveram construir a própria casinha e seguir a vida em Barbacena, onde formaram família e até hoje vivem de algumas vaquinhas leiteiras e da produção dos queijos. Três anos atrás Catarina passou por momentos de sufoco, seu marido teve três paradas cardíacas e ficou por muito tempo impossibilitado de cuidar dos animais e de retirar o leite das vacas, como sempre fez. Precisando cuidar do marido, ela resolveu vender as vacas e parar com a produção dos queijos. Com o tempo e com a recuperação de seu João, eles resolveram
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comprar mais algumas vacas aos poucos e retomarem a antiga rotina. Hoje em dia eles têm só 4 vacas e alguns bezerros, mas isso já suficiente para vender um pouco do leite ordenhado e ainda fabricar cerca de 30 queijos por semana. Muito atenciosa, a senhora explica como é sua rotina de produção dos queijos e se orgulha de conseguir fazer tudo muito rápido. Primeiro ela explica que para o queijo ficar mais gostoso, é importante usar o leite “recém-saído” da vaca, ainda morninho. O primeiro passo é misturar o leite com o coalho, responsável pela coagulação, sendo que pra cada 10 litros de leite ela coloca 10 mililitros de coalho, mistura bastante e deixa agir por pelo 20 minutos, até que fique coalhado. Depois ela mistura tudo para quebrar a massa e deixa descansar por mais 20 minutos. Quando termina o tempo de descanso é hora de colocar a massa na forma. Para que o queijo fique mais curado e não solte soro depois de pronto, ao colocar a massa na forma é importante espremer bem para que saia o máximo possível do soro. Outro detalhe importante ao produzir o queijo é a parte de temperar. Ela explica que quando o sal é colocado na massa, a maior parte dele é eliminada junto com o soro, por isso, ela prefere espremer a massa, retirando o soro e só depois temperar. Para isso, ela coloca uma camadinha de sal grosso por cima da massa na forma e deixa agir por umas 3 horas, depois ela vira a
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forma, coloca sal do outro lado e deixa o mesmo tempo, para que o tempero penetre na massa. Depois disso, o queijo já está pronto para ser consumido ou vendido, como é o caso do produto feito por Dona Catarina. Outra curiosidade legal sobre a produção dos queijos é a quantidade de leite usada. Quando o leite tem mais gordura, ela costuma usar 6 litros para cada queijo quando o leite tem menos gordura ela coloca 7 litros para cada um. Dessa forma ela evita que os tamanhos deles sejam muito diferentes. Desde que chegou em Barbacena ela vende seus queijos nas feiras de sábado e domingo e conta que nunca precisou trazer nenhum de volta pra casa. Com o tempo, ela foi fazendo amizade com seus clientes e foi construindo uma freguesia fiel. Hoje em dia, além das vendas na feira, muitos vão até a sua casa para buscar queijos em qualquer dia da semana, ou para encomendar uma quantidade maior e não correr o risco de ficar sem essa delícia.
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CapĂtulo 4
Quitandas Mineiras
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A
palavra quitanda tem origem africana, e se origina de quinda, uma espécie de cesta tradicional em Angola. Nessa cesta são colocadas mercadorias para venda, como biscoitos, ou mesmo frutas e verduras. Geralmente elas são usadas por vendedores ambulantes, facilitando o transporte das mercadorias, ou mesmo por mercadores que trabalham em barraquinhas de feira. Em Minas Gerais a palavra acabou ganhando ouro significado, por aqui, quitanda é tudo que se come acompanhado do bom e velho café. O café foi um dos produtos que mais gerou riquezas no Brasil, as primeiras mudas chegaram no país por volta de 1727 e se estabeleceram muito bem nas terras brasileira. Ainda hoje, Minas Gerais é um dos principais produtores de café no país e a bebida é, sem dúvida, uma das maiores paixões por aqui. Nem pense em visitar a casa de alguém em Minas Gerais e sair sem tomar ao menos uma xícara de café, isso será visto como uma enorme desfeita. Além disso, o momento do cafezinho será uma ótima oportunidade para esticar aquela prosa e ainda experimentar as deliciosas quitandas que só o povo mineiro sabe fazer. As quitandas mineiras são muito conhecidas e apreciadas, é raro sentar à mesa de café da manhã em Minas e não ver uma grande variedade, são diversos sabores de bolos, biscoitinhos caseiros,
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sequilhos, roscas e o tradicional pão de queijo. O famoso pão de queijo se destaca na culinária mineira e já virou marca registrada do estado. Ele surgiu a partir de receitas de biscoito de goma, ou polvilho, com a adição de queijo, outro produto encontrado com fartura e muita qualidade nas terras mineiras. Conta-se que a receita foi criada para aproveitar os queijos que começavam a envelhecer, dessa maneira, as cozinheiras transformavam o queijo velho e duro em um pãozinho macio e muito saboroso, que agradava em cheio todo mundo que experimentava. Uma dica importante para atingir o ponto certo do pão de queijo é o cuidado com a temperatura. Primeiro, ele deve ser assado em forno quente, até que cresça, só então, depois de crescido, é que a temperatura deve ser abaixada para que ele seque em forno mais brando. Minas Gerais se destaca como a maior bacia leiteira do país, tendo, atualmente, uma produção de cerca de nove bilhões de litros de leite ao ano. Com isso, não é de se espantar com o tamanho da produção de queijos no estado. Além da quantidade, os queijos mineiros também são muito conhecidos pelo sucesso que fazem com quem experimenta. O queijo mineiro é conhecido e muito apreciado no país inteiro. Aqui no estado ele vai muito bem acompanhando um cafezinho, ao lado da goiabada, do doce de leite ou de qualquer outro doce, também é um ótimo acompanhamento para broas ou pode ser utilizado para fazer deliciosos pães de queijo, um dos
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quitutes que mais tem a cara de Minas. Nas antigas casas mineiras, na maioria das vezes, o forno a lenha ficava na área externa, ou em um puxadinho construído exatamente para essa finalidade. Por isso, as cozinheiras preparavam vários tipos diferentes de merenda na cozinha e, só depois, levavam tudo para os fornos à lenha. A temperatura do forno, naquela época, era verificada com a própria mão. Se a pessoa colocasse a mão dentro do forno e conseguisse mantê-la por um curto intervalo de tempo, de cerca de cinco segundos, a temperatura estava ideal para assar as quitandas. Como os fogões eram a lenha, o controle da temperatura era feito movimentando as brasas com o auxílio de uma pá. Mas, mesmo assim, toda atenção era necessária para evitar que enormes fornadas de quitutes se perdessem por ficarem tempo demais no fogo. Quando as quitandas ficavam prontas era uma farra, cada uma delas era guardada em uma lata grande
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e abasteciam as mesas de café por um bom tempo, até que fosse necessário preparar mais merendas. A excelência das cozinheiras mineiras em fazer uma enorme variedade de quitandas surgiu com o intuito de aproveitar os produtos que eram produzidos na região como a mandioca e o milho. A farinha de trigo, comum na maioria das receitas vindas com os portugueses, não era produzida por aqui e trazê-la para cá era muito caro e trabalhoso, por isso, ela não era a parte central da maioria das receitas. Só com o passar do tempo que a farinha de trigo se tornou algo comum nas cozinhas mineiras e começou a figurar como um ingrediente frequente das receitas de quitandas. Além da mandioca e do milho, outros ingredientes essenciais para a produção das receitas e que também eram produzidos nas próprias casas mineiras eram a gordura de porco, os ovos, a manteiga, a nata, o leite e o queijo. Esses ingredientes eram muito importantes para dar liga nas massas e fazer com que as merendas
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ficassem macias e saborosas. Com tanta variedade assim, o mineiro se acostumou a essa ideia de ter a mesa farta, também na hora do café. Isso, sem dúvida se tornou um dos grandes atrativos turísticos de Minas. Quem vem para o estado, a trabalho ou a passeio, não perde a oportunidade de provar as deliciosas quitandas que são feitas com muito carinho e muito sabor. Em muitas famílias, as quitandas deixam de ser apenas a merenda que é comida junto com o café e passam a ser o sustento da casa. Há no estado muitas associações de quitandeiras, eventos e festivais específicos para celebrar e manter viva essa tradição mineira. As quitandas são a companhia certa para qualquer hora, do café da manhã ao lanche da tarde, para aquela beliscadinha que todo mundo adora quando passa pela cozinha ou até mesmo para comer acompanhado de uma boa xícara de café enquanto lê um pouco mais sobre a culinária mineira e aprende deliciosas receitas para fazer em casa.
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Caderninho de Receitas . quitandas .
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. Broa de Fubá . Ingredientes - 4 ovos - 2 e 1/2 copos de açúcar - 3 copos de leite - 1 copo de óleo - 2 e 1/2 copos de farinha de trigo - 2 copos de fubá - 1 colher (sopa) de fermento em pó - 100 g de coco ralado
Modo de Preparo Coloque no liquidificador os ovos, o açúcar, o óleo e o leite e bata até virar uma mistura homogênea. Acrescente o coco e o fubá e continue batendo. Finalmente, coloque o fermento e a farinha de trigo e bata até incorporar na massa. Assar em uma forma untada e enfarinhada em forno preaquecido a 180o por aproximadamente 30 minutos.
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. Brevidade . Ingredientes - 1 Kg de polvilho doce - 1 Kg de açúcar - 8 ovos - Forminhas para assar
Modo de Preparo Bater as claras em neve. Acrescentar as gemas aos poucos e seguir batendo. Depois, adicionar o açúcar e bater bem. Por fim, colocar o polvilho e bater até a mistura ficar homogênea. Untar as forminhas e preenchê-las com a massa até a metade, para não transbordar. Levar ao forno preaquecido a 180o por aproximadamente 30 minutos.
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. Bolinho de Chuva . Ingredientes - 1 ovo - 1 xícara de açúcar - 2 e 1/2 xícaras de farinha de trigo - 1 colher de fermento em pó - 1/2 xícara de leite - Açúcar refinado e canela para polvilhar - Óleo para fritar
Modo de Preparo Em uma tigela, bata o ovo com o açúcar. Acrescente a farinha de trigo, o fermento e o leite e misture até incorporar. Em uma panela, aqueça o óleo, em uma quantidade suficiente para cobrir os bolinhos. Com o auxílio de duas colheres, despeje a massa aos poucos no óleo quente e frite até que os bolinhos fiquem firmes. Depois de fritos, polvilhe com o açúcar e a canela e sirva em seguida.
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. Biscoitinho de Goiabada . Ingredientes - 1 kg de farinha de trigo - 1 colher (café) de sal - 3 colheres (sopa) de açúcar - 1 pitada de fermento em pó - 2 colheres (sopa) de margarina - 1 copo de óleo - 2 xícaras de leite - 500 g de goiabada
Modo de Preparo Misturar a farinha, o sal, o açúcar, o fermento e a margarina. Acrescentar o óleo e o leite, misturando levemente até incorporar tudo na massa. Modelar os biscoitinhos, recheando com pedaços pequenos da goiabada. Assar em forno preaquecido a 180o por aproximadamente 30 minutos.
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. Pão de Queijo . Ingredientes - 4 xícaras de queijo minas curado ralado - 4 xícaras de polvilho azedo - 4 colheres (sopa) de margarina - 1 pitada de sal - 2 xícaras de leite morno
Modo de Preparo Misturar o queijo, o polvilho e o sal. Acrescentar a margarina e ir colocando o leite aos poucos. Sovar bem a massa, até que adquira a consistência para modelar os pães. Assar em uma forma untada e enfarinhada no forno preaquecido a 180o por aproximadamente 40 minutos.
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Histรณrias de Quem Faz
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Dona Floripes, uma quitandeira de mão cheia Floripes Oliveira Flores Pinto, nasceu no ano de 1965, em Congonhas, uma cidade histórica que abriga os profetas de Aleijadinho, bem perto da capital mineira. Sua relação com a cozinha é bem antiga e se mistura com sua própria história de vida. Dona Flor já vende suas quitandas há mais de 20 anos e essa é a principal fonte de renda da família, que é toda envolvida com o trabalho. Aprender a cozinhar foi um processo natural para Floripes, segundo ela, foi a própria vida que ensinou. Em casa, sua mãe e sua avó faziam algumas merendas para a família e aquela comidinha do dia a dia e isso já era uma grande fonte de inspiração. Ainda jovem, ela começou a trabalhar como doméstica na casa de uma família no Alto Maranhão, distrito de da cidade onde nasceu. Quando chegava em casa, após o trabalho, a curiosidade e a vontade de cozinhar afloravam e ela ia para a cozinha inventar coisas novas. Sempre muito criativa, ela pegava os rótulos dos produtos, anotava os ingredientes e ia tentar recriar aquelas receitas do seu jeitinho. Depois de cada experiência, a família se reunia na para experimentar os quitutes que saiam quentinhos e cheirosos do forno de dona Floripes. Nem sempre as invenções saiam como ela esperava. Aí o jeito era fazer tudo de novo, coloca mais farinha, diminui o açúcar, acrescenta ovo, ferve o
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leite, ou deixa menos tempo no forno. Nessa hora o instinto de cozinheira sempre entra em ação e no fim saem merendas deliciosas. E é só aí, depois de todos provarem e aprovarem que dona Flor anota as receitas que ela acabou de criar. A ideia de ganhar um dinheirinho com a cozinha surgiu de uma necessidade, quando em 1996, seu marido, Roberto Pinto, perdeu o emprego na empresa de mineração onde trabalhava. O casal, procurando soluções para sustentar a família, começou a vender doces para ter o dinheiro das contas do mês. Com o tempo, foi surgindo uma freguesia fiel e os negócios começaram a crescer. Foi aí que as tradicionais quitandas mineiras mudaram a vida de dona Floripes e de toda a sua família. No começo ela fazia as merendas na própria cozinha de casa, usando seu fogão a lenha e usando no máximo cinco quilos de farinha por semana, um pouquinho de ovo, de leite e dos demais ingredientes. Como tudo que é gostoso faz sucesso, os clientes foram só aumentando, a propaganda de boca a boca do povo ajudou muito nos negócios. Com o passar do tempo a produção dos biscoitos caseiros já tinha virado uma pequena indústria. Dentre broinhas de fubá, biscoitos de polvilho, de sal amoníaco, de nata, de canela, de fubá, de goiabada e de limão, a variedade dos produtos é enorme. Além disso, ela também faz uma infinidade de sabores de bolos que são um sucesso com seus fregueses e nas
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mesas de café da família. Dona Flor é a chefe dos negócios, mas a família inteira sempre se envolveu com a produção das quitandas. Hoje em dia, ela, a filha Carolina e sua nora são as responsáveis pela produção dos quitutes. O marido é quem faz as entregas e a ajuda com as negociações com os revendedores de seus produtos. O filho de Floripes já não trabalha mais com a mãe, pois abriu sua própria fábrica de picolés, mas alguns anos atrás ele e o pai levavam as quitandas para vender na feira, em Congonhas. Acordavam antes das 5 da manhã, separavam os produtos, pegavam a estrada, montavam uma barraquinha junto com os demais feirantes e passavam o dia por lá, até que não sobrasse mais nenhuma merenda. Depois que os negócios cresceram eles abandonaram a feirinha e focaram seus esforços para atender a demanda dos mercados e padarias da região. Com esse crescimento veio outro desafio, a legalização da empresa. Depois que passaram a fornecer produtos para a maioria dos mercados das redondezas, eles precisaram se preocupar em manter os impostos em dia e seguir todas as regulamentações estabelecidas pela vigilância sanitária, para oferecerem um produto certificado e com garantia de qualidade. Para ajudar nessa tarefa a filha mais velha de dona Floripes resolveu estudar nutrição, se formou e hoje é a responsável pelo controle nutricional de todos os
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produtos Bombaça. Falando em Bombaça, temos aí mais uma curiosidade sobre os quitutes de dona Flor. A quitandeira que morava no distrito do Alto Maranhão viu seus negócios crescerem e teve que abandonar a cozinha de casa e construir uma cozinha industrial, para conseguir atender toda a demanda que não parava de chegar. A casa da família não teria espaço para abrigar essa cozinha de maiores proporções e foi aí que dona Flor e o marido resolveram construir um sítio nas terras que pertenciam ao seu sogro, em um vilarejo chamado Bombaça. Na casa nova não faltava espaço para abrigar a cozinha dos sonhos de dona Floripes, todos os equipamentos, utensílios, fornos industriais, armários para armazenamento dos produtos, tudo do jeitinho que ela planejou. Além disso, a localidade serviu de inspiração e foi ela que deu nome às quitandas vendidas por ela. Sempre boa de papo, a quitandeira fez questão de falar sobre a história desse nome, que batiza o vilarejo e também os seus quitutes. Segundo contava seu sogro, há mais de 260 anos, um casal de portugueses, de sobrenome Bombaça era dono de uma enorme fazenda na região. Os dois fizeram uma considerável fortuna a partir da mineração de ouro, mas o vício em jogos de azar fez com que eles perdessem quase todo o dinheiro acumulado. Sem filhos e com a morte precoce
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do marido, Maria Bombaça resolveu dividir as terras em partes menores e vender, para que com o dinheiro recebido pudesse voltar para Portugal. Desde então a família de seu marido é dona de um pedacinho desse vilarejo. Nas terras da família de Floripes estão as ruínas da antiga fazenda do casal Bombaça e para perpetuar esse nome, ela resolveu batizar assim suas quitandas, que há muito já atravessaram as fronteiras do vilarejo e levam o nome Bombaça para toda a região.
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CapĂtulo 5
Uma Dose de Pinga e um Bom Tira-Gosto
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S
e tem uma coisa que o povo mineiro adora fazer é tomar uma bebidinha enquanto troca um dedinho de prosa com os amigos. O jeito mais mineiro para se fazer isso é tomando uma cervejinha gelada ou a boa e velha cachaça, enquanto degusta deliciosos tiragostos feitos com muito amor e seguindo a tradição culinária de Minas Gerais. Atualmente, o ramo das cervejas artesanais vem ganhando o mercado e abrindo espaço para muitos produtores locais investirem nesse ramo que agrada muita gente. Mesmo assim, ainda é a cachaça mineira, com sua forte tradição que se destaca. O processo de produção de uma boa cachaça começa com uma matéria prima de qualidade, por isso é importante que a cana-de-açúcar seja plantada em um solo bom e na época certa. A melhor data para se plantar cana é entre os meses de julho a novembro. Depois desses meses, com o período de chuvas, o solo fica muito molhado e a planta acaba ficando aguada e com pouco sabor. Após o plantio e a colheita de uma cana de qualidade, é hora de fazer a moagem e extrair a garapa, o sumo doce que sai da planta, essencial para a produção da cachaça. Depois da moenda, a garapa vai para tanques de fermentação, onde é acrescida de um fermento, geralmente desenvolvido à base de fubá. O processo de fermentação tem um período menos específico, este varia de acordo com a temperatura, por exemplo. Durante a fermentação, o líquido começa
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a borbulhar, como se estivesse fervendo, quando esse efeito de bolhas cessa, é sinal de que o processo está finalizado. Depois de fermentado, esse líquido sai através de um “pé de cuba” que fica um pouco acima do fundo do tanque, de modo que o líquido fermentado passe, mas o fermento feito com fubá continue no tanque. Quando o processo de fermentação é finalizado, a bebida vai para o alambique em si, onde é aquecida, se transformando em um vapor e depois resfriada, voltando a forma líquida, dessa vez um líquido destilado transparente, a cachaça. Depois da destilação a cachaça costuma ficar dentro de barris de madeira, para descansar e envelhecer para adquirir um sabor diferenciado. O estado de Minas Gerais é o maior produtor de cachaça artesanal do país, alambicando mais de 180 milhões de litros da bebida por ano. Em todo o estado existem cerca de 8 mil produtores de cachaça. Para lidar com essa concorrência enorme, a maioria dos alambiques mantém seus segredos muito bem guardados e não costumam revelar a nenhum visitante. Em uma terra produtora de boa bebida, o povo tem um certo apreço por tomar umas e outras. E é um costume de Minas que onde há uma roda de amigos, conhecidos, familiares ou até mesmo desconhecidos bebericando alguma coisa, tem que haver pelo menos um pratinho com alguns tira-gostos.
Opções de petiscos por aqui não faltam. A carne
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de porco, muito tradicional dessa região é ótima para se fazer deliciosos tira-gostos. Pode ser o torresmo, podem ser pedacinhos de lombo ou pernil, ou podem ser quitutes mais elaborados, como as linguiças feitas com a tripa, a carne e a gordura suína ou os chouriços, feitos também com a tripa, e também com o sangue do porco temperado. O frango, outro animal muito presente na culinária mineira também pode render excelentes petiscos, seja através das coxinhas da asa, os miúdos muito apreciados, como o fígado, coração e a moela, ou ainda o peito preparado como deliciosas iscas empanadas. A água dos rios também traz uma enorme variedade de peixes que podem ser fritos ou assados e incrementam a mesa enquanto se bebe uma cerveja ou cachaça. Os tradicionais queijos mineiros, picados em cubinhos são ótimas pedidas, pode ser o queijo fresco, queijo canastra, queijo meia cura ou mesmo queijo curado. Não há quem reclame ou rejeite essas delícias mineiras. Mas não para por aí, os tira-gostos também podem vir da horta. O jiló pode ser empanado e frito. A sálvia, também conhecida como peixinho ou lambari de horta fica excelente quando empanada e frita. Mas a rainha das plantações que também dá um show quando se trata de tira-gosto é a mandioca.
A mandioca, conhecida como “pão da terra” ou
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como “a mais brasileira de todas as plantas” é muito usada na culinária mineira e é uma herança do povo indígena. Inclusive, seu nome se deriva de uma lenda tupi: conta-se que em uma tribo havia uma pequena indiazinha de pele muito branca, chamada Mani; ela era muito querida por todos na tribo, pois estava sempre alegre e vivia espalhando sua felicidade por aí; um dia Mani ficou muito doente, mal conseguia se levantar de sua rede; o pajé da tribo tentou usar várias ervas para curá-la, fez suas rezas e cânticos, mas nada adiantou, Mani acabou morrendo; como era tradição na tribo, seu corpo foi enterrado dentro da oca em que sua família morava; todos choraram muito com a morte da pequena índia, mas alguns dias depois, onde ela havia sido enterrada brotou uma plantinha diferente de tudo que eles conheciam; os índios descobriram que essa planta possuía uma raiz grossa e de casca firme, que escondia um núcleo branquinho e muito apetitoso; devido a isso eles deram o nome à planta de mandioca, juntando as palavras “Mani”, que era o nome da pequena índia e “oca”, a casa do povo indígena.
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Muito apreciada pelos índios, a mandioca criou
raízes na culinária mineira e se mostrou um alimento muito versátil e nutritivo. Ela pode ser usada de várias maneiras, cozida, frita, assada, ou em forma de purê. Podemos encontra-la na forma de farinha ou de goma, muito usada nos pães e biscoitos, com ela são feitos diversos tipos de bolos. Pode ser transformada no polvilho que rende deliciosos biscoitos e se combinado com o queijo resulta no tradicional pão de queijo. Aqui em Minas Gerais, terra de povo hospitaleiro e que gosta de uma conversa, a cozinha é sempre o lugar mais aconchegante da casa. É nela onde se recebem os amigos e familiares para uma boa prosa, sempre acompanhados de uma bebida gostosa, seja ela uma cerveja, algumas doses de cachaça, um vinho ou um licor. O que importa é que para fazer companhia para uma conversa, uma roda de amigos e bebida de qualidade, não podem faltar os deliciosos tira-gostos de Minas, que ajudam a bebida a descer macia e motivam os amigos para que o papo continue rolando por longas horas.
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Caderninho de Receitas . petiscos .
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. Torresmo . Ingredientes - 1 kg de barriga de porco - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Óleo para fritar
Modo de Preparo Corte a barriga de porco em pedaços, tempere com sal e pimenta e deixe descansar por pelo menos 1 hora. Coloque os pedaços da carne em uma panela e leve ao fogo médio, para que ela solte um pouco da gordura. Quando já tiverem soltado a gordura, abaixe o fogo, tampe a panela e deixe cozinhar na própria gordura até que fiquem macios. Quando a carne estiver macia, retire da panela e deixe na geladeira por cerca de 12 horas. Após o tempo de descanso, aqueça o óleo em uma panela até que esteja bem quente e jogue a carne ainda gelada na gordura quente. Deixe fritar até que fique crocante.
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. Linguiça . Ingredientes - 1 kg de lombo suíno - Tripa de porco - 2 colheres (sopa) de alho amassado - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Cheiro verde a gosto - Óleo para fritar
Modo de Preparo Pique o lombo em cubinhos pequenos e tempere com o alho, o sal e a pimenta. Acrescente o cheiro verde e misture tudo. Coloque a carne temperada na tripa com o auxílio de uma máquina própria ou com o auxílio de uma garrafa PET. Certifique de que as pontas da linguiça estão bem amarradas e depois, frite em óleo bem quente.
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. Mandioca . Ingredientes - 1 kg de mandioca - Sal a gosto - Óleo para fritar
Modo de Preparo Descasque e lave as mandiocas e corte em cubos médios. Em uma panela, coloque as mandiocas para cozinhar em água e sal por cerca de 20 minutos, ou até que fiquem al dente. Após cozidas, frite as mandiocas em óleo bem quente.
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. Jiló Empanado . Ingredientes - Ingredientes - 6 jilós grandes - 2 ovos - 1 xícara de farinha de trigo - 1 xícara de farinha de rosca - 3 dentes de alho amassados - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Óleo para fritar
Modo de Preparo Descasque os jilós e pique em rodelas de aproximadamente 1 centímetro e meio de largura. Deixe os jilós descansarem em um mistura de água e sal por aproximadamente 30 minutos, para que perca um pouco do amargor e para que absorva um pouco do sal. Em uma vasilha bata os ovos, tempere com o alho, o sal e a pimenta. Em outra vasilha tempere a farinha de rosca com um pouco de sal e pimenta. Para empanar, escorra os jilós, passe na farinha de trigo , depois passe no ovo e, em seguida, na farinha de rosca. Em uma panela, esquente o óleo e frite os jilós até que a parte de fora esteja dourada. Sirva quente.
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. Chouriço . Ingredientes - 3 litros de sangue de porco - 250 g de banha de porco - Sal a gosto - Pimenta a gosto - Salsinha a gosto - Cebolinha a gosto - Tripa de porco
Modo de Preparo Misture o sangue, a banha e os temperos. Com o auxílio de um funil (que pode ser feito com uma garrafa PET), coloque a mistura na tripa do porco, amarrando as pontas. Em um panela coloque para ferver uma quantidade de água que seja suficiente para cobrir o chouriço e deixe ferver até que fique consistente. Após o cozimento o chouriço pode ser guardado na geladeira e ferventado ou frito na hora do consumo.
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. Molho de Pimenta . Ingredientes - 100 g de pimenta curtida da sua preferĂŞncia - 1 dente de alho - 1 colher (sopa) de vinagre - 3 colheres (sopa de azeite - Alecrim a gosto - Salsinha a gosto - Cebolinha a gosto - Sal a gosto
Modo de Preparo Bata todos os ingredientes no liquidificador, por aproximadamente 3 minutos, atÊ que as pimentas e os temperos estejam bem triturados. Sirva de acompanhamento para refeiçþes e petiscos.
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Histรณrias de Quem Faz
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Uma dose de cachaça e um dedo de prosa com Seu Eduardo O senhor Eduardo Dutra dos Santos nasceu em 1935, em Lagoa Dourada, uma cidadezinha histórica de 12 mil habitantes, localizada a 150 quilômetros da capital e próximo a São João Del Rei. Hoje, aos 82 anos, seu Eduardo mora em seu sítio, na cidade de Barroso, onde produz a tradicional cachaça Barrosinha. Da infância em Lagoa Dourada até se tornar um produtor de cachaça respeitado, ele passou por muita coisa e por muitos lugares. Ainda jovem foi estudar na Escola Agrotécnica Federal de Barbacena, onde se formou como técnico agrícola. Ao se formar, resolveu seguir por outros caminhos, estudou e foi aprovado no vestibular de odontologia da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, em Diamantina. Depois de terminar a faculdade queria muito ir trabalhar na capital. Mas por não conhecer ninguém por lá, resolveu morar com seu irmão que já trabalhava em Barroso, uma cidade onde não haviam muitos consultórios odontológicos. Sua passagem pela cidade foi curta, menos de 4 anos após sua chegada, seu Eduardo foi aprovado no concurso da polícia militar, para trabalhar como dentista na instituição. Foi então que ele finalmente realizou seu sonho e se mudou para Belo Horizonte. Foi na capital mineira que ele conheceu sua esposa, teve seus 4 filhos e trabalhou como dentista da polícia
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até se reformar, há pouco mais de 30 anos. Depois de todos esses anos de vida agitada na capital, ele decidiu que queria novamente vivenciar a paz e a tranquilidade da zona rural. Foi aí que ele comprou a Fazenda Sagarana, com o objetivo de criar gado e produzir leite para venda. O trabalho com a produção de leite não deu muito certo, ainda em um período de mudança, vivendo entre Belo Horizonte e Barroso, seu Eduardo teve problemas com funcionários, com o controle da produção e com a administração da fazenda, pois não podia acompanhar tudo de perto. Quando parou com a produção de leite, ele começou a pensar o que poderia fazer em suas terras, foi aí que veio a ideia de produzir cachaça, enquanto assistia a um programa de televisão. Mas construir um alambique e começar a produzir cachaça não é uma coisa tão simples e não aconteceu da noite pro dia. Com essa decisão de trabalhar com o alambique, veio a necessidade de estudar profundamente sobre a bebida, conhecer o processo de produção, todas as especificações técnicas, o processo de regulamentação e fiscalização. Após muito tempo de estudo, Eduardo decidiu que produziria uma cachaça orgânica, sem nenhum tipo de agrotóxico ou veneno que pudesse causar algum dano a sua bebida e aos seus consumidores. Para isso ele precisou focar no plantio da cana de açúcar, que é toda plantada em sua fazenda. Outro cuidado importante foi
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a construção das adegas e a compra de equipamentos de qualidade para o seu alambique. Atualmente, com 17 anos de mercado com sua cachaça Barrosinha, ele ainda mantém toda a plantação da cana de açúcar, que ocupa 18 hectares de sua fazenda e consegue ter uma produção média de 3000 litros de cachaça por mês. Além disso, ele já ganhou prêmios diversos, como um reconhecimento de qualidade recebido no Festival de Cultura e Gastronomia de Tiradentes, o selo de qualidade da Associação Mineira dos Produtores de Cachaça de Qualidade (Ampaq) e a classificação entre as 250 melhores cachaças do Brasil, título atribuído pela Cúpula da Cachaça. Além de todo esse reconhecimento, outro índice que demonstra o sucesso da bebida produzida por seu Eduardo foi o recente início do processo de exportação da cachaça. Hoje, ele exporta cachaça para Denver, nos Estados Unidos e para Londres, na Inglaterra. Para conseguir um destaque maior no mercado internacional, ele produziu uma nova linha da bebida, com um nome que remete a um conhecido estilo musical brasileiro, a Bossa Nova. Na cachaça destinada para a exportação, além do novo nome, ele deu uma pequena reduzida no teor alcoólico, que passou dos 42 por cento, da bebida vendida no Brasil, para 40 por cento. Uma das motivações para essa redução é que as distribuidoras que compram a bebida no exterior pagam impostos relativos ao teor alcoólico da bebida,
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com isso, a bebida sai mais barata para os compradores com um percentual de álcool menor. Em seu alambique, seu Eduardo produz tanto da cachaça branca, quanto da amarela. Para dar o tom amarelado para a cachaça, ela passa por um período de pelo menos 1 ano e meio de descanso em barris de carvalho, enquanto a bebida branca é armazenada em tonéis de aço inoxidável. Seu Eduardo se orgulha de dizer que o desperdício é mínimo em sua produção, praticamente todo o insumo é aproveitado. Ele explica que durante a fabricação da cachaça, a primeira parte que é destilada, referente a 10% da produção e conhecida como cabeça, deve ser descartada, pois apresenta um alto teor de substâncias voláteis, que fazem mal a quem consome. Os 10% finais da produção, conhecidos como cauda, também são descartados, por ser uma bebida mais fraca e por ter uma chance maior de conter metais pesados, causadores da famosa ressaca. No alambique de Eduardo, a cabeça e a cauda são armazenadas e passam por um novo processo de destilação, dessa vez com o objetivo de transformá-los em combustível, podendo
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ser aproveitado para abastecer os tratores e máquinas que trabalham na fazenda. Além disso, até mesmo o bagaço da cana moída é utilizado na alimentação do gado, evitando ao máximo o desperdício no processo de produção da bebida. Após muitos anos de trabalho e dedicação a família, hoje em dia, seu Eduardo se dedica a paixão de produzir e apreciar uma cachaça de qualidade, enquanto vai levando uma vida tranquila e sossegada no campo. Sempre muito amigável, adora receber um visitante em seu alambique, para mostrar todo o seu processo de produção e levar uns dedinhos de prosa, enquanto bebe umas boas doses de cachaça.
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CapĂtulo 6
Jornalista na Cozinha
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“Uma das sedes de nostalgia da infância, e das mais profundas, é o céu da boca. A memória do paladar recompõe com precisão instantânea, através daquilo que comemos quando meninos, o menino que fomos. O cronista, se fosse escrever um livro de memórias, daria nele a maior importância à mesa da família, na cidade do interior onde nasceu e passou a meninice. A mesa funcionaria como personagem ativa, pessoa da casa, dotada do poder de reunir todas as outras, e também de separá-las, pelo jogo de preferências e idiossincrasias do paladar – que digo? – da alma, pois é no fundo da alma que devemos pesquisar o mistério de nossas inclinações culinárias.” (Carlos Drummond de Andrade)
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E
screver esse livro, falando sobre a comida e a cultura do povo mineiro e não falar um pouco da minha motivação e meu interesse pessoal no assunto não seria possível. Desde pequeno sempre achei a cozinha o lugar mais aconchegante da casa, se tivesse um fogão a lenha, para sentar ao lado e sentir o calor do fogo, melhor ainda. Poder beliscar algum quitute, tomar um cafezinho, bater um bom papo, sentir o cheirinho dos temperos e ir pouco a pouco aprendendo as técnicas e os truques da arte que é cozinhar. Aprendi a cozinhar bem novo, minha mãe começou me ensinando coisas simples, como fazer um arroz, temperar a salada e fritar um ovo. Curioso, como um bom jornalista, me interessei pela coisa e queria sempre saber mais, aprender mais e cozinhar mais. Me lembro da época que eu comecei a ficar sozinho em casa durante a tarde. Chegava do colégio, minha mãe tinha deixado o almoço pronto no fogão antes de sair para o trabalho, mas eu sempre queria incrementar o que já estava lá. Fazia um molho diferente para a salada, inventava alguma receita de bolinho, ou preparava alguns legumes. O importante era cozinhar. Com o tempo, comecei a aprender coisas novas, pegar receitas na internet, no caderninho da minha mãe e aprender com minhas tias. Sempre queria praticar na cozinha e colocava todos da casa para experimentar.
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Fazia bolos, biscoitos, pãezinhos, tortas, sobremesas, lanches, carnes e tudo mais que aparecesse. Outra inspiração muito grande que tive foi minha avó, Anália. Infelizmente, nunca cheguei a conhecê-la fisicamente, ela faleceu quando meu pai era criança e tinha apenas sete anos de idade. Mas mesmo sem esse contato, a conheci pelas histórias, pelas lembranças boas que todos da família sempre compartilharam. Sempre ouvi que ela era uma excelente cozinheira, fazia deliciosas quitandas e doces maravilhosos. Recentemente, já adulto, pude ler seu caderno de receitas, vi ali seu jeitinho humilde e o carinho que ela dedicava àquele livro e com certeza às comidas que fazia. Pude sentir sua presença e também uma certa predisposição a esse amor que sinto pela cozinha. Ele vem de família. Nas horas vagas, em frente à televisão, estava sempre ligado em um canal de culinária, acompanhando os chefs, anotando dicas e aprendendo um pouco mais sobre os ingredientes, as técnicas, os termos utilizados, ou os utensílios de cozinha. Sempre acompanhei vários tipos de reality shows, desde competições entre confeiteiros, até as famosas disputas de cozinheiros amadores ou profissionais. Na internet não era diferente, sempre acompanhando e anotando as receitas que apareciam no feed do Facebook, seguindo muitos canais de gastronomia do YouTube, lendo sobre o assunto na
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rede, acompanhando blogueiros, assistindo séries e filmes que contam a história de grandes chefs, grandes restaurantes e compartilham esse amor pela comida e pela cozinha. Apesar de nunca ter estudado gastronomia, ou me envolvido diretamente com a profissão, sempre senti um carinho especial por esta área. Me vejo claramente trabalhando em algo que possa aliar a comunicação à culinária, levar a fundo as duas paixões que encontrei na minha caminhada. Deve ser muito prazeroso poder trabalhar despertando lembranças boas que tivemos, sentir os aromas e os sabores da infância que ficam marcados na nossa cabeça. Deve ser melhor ainda poder levar esses sentimentos para milhares de leitores ou telespectadores. Poder sentir a relação afetiva das pessoas com a comida e encontrar outras pessoas que tenham esses mesmos interesses. Sei que a carreira profissional não é do jeitinho que a gente sonha e espera. Por mais que planejemos, são das oportunidades e das nossas decisões, ou indecisões, que ela se constrói. E é atrás dessas oportunidades que eu estou começando a correr. Fazendo esse trabalho tive a oportunidade de conhecer pessoas de vários cantinhos do estado. Ada
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uma delas com suas relações especiais com a culinária. Conheci produtores, cozinheiros, amantes da boa comida, donos de bares e restaurante. Pude também me conhecer melhor, descobrir os meus gostos, experimentar coisas novas, ler ainda mais sobre um assunto que já me interessava e relembrar os bons momentos que a culinária já me proporcionou. Escrevendo esse livro lembrei de quando aprendi a fazer pão de queijo com minha tia, lembrei das receitas que deram errado, mas principalmente das que deram certo. Senti uma saudade daquele tempo. Senti vontade de aprender mais. Quis cozinhar. Fiz deliciosos pães de queijo, esses mesmos que você viu nas fotos. Passei um café bem quentinho para acompanhar. E senti que comer os pãezinhos dessa vez teve um gostinho diferente, um sabor especial. Espero que cada um dos leitores desse livro tenha se sentido tocado de alguma forma, que sinta a vontade de saborear alguns dos pratos apresentados, de testar as receitas e colocar a mão na massa. Que lhes venham lembranças boas de momentos marcados pela comida e que a partir dessa leitura vocês percebam que a culinária vai muito além do que a gente come.
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Este livro é um projeto experimental produzido como requisito para a obtenção do título de bacharel em Comunicação Social/ Jornalismo, na Universidade Federal de Viçosa.
Escritor: Isac Godinho Orientação: Felipe Menicucci Diagramação: Malena Stariolo Revisão: Lívia Martins Soares Fotografia (páginas 1,6, 7, 8, 18, 19 ,27, 32, 33, 41, 48, 52, 66, 68, 70, 71, 85, 88, 90, 91, 106 e 107): Reprodução Fotogtafia (demais páginas): Isac Godinho
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