O IMPÉRIO DAS 12 LUAS O início
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Parte 1 O chão do Castelo do Rei Vir, em Melina num Continente chamado Sirvia, tremia como se estivesse sendo acometido por um terremoto de magnitude até aquele dia nunca visto. Apesar de ser uma construção bastante forte composto de pedras grandes recolhidas numa praia bem próxima e devidamente acondicionadas com uma forte argamassa de pó de lava do Monte James misturado com banha de Baleias além de uma goma retirada das muitas árvores de Candiú, todas as paredes iam apresentando fissuras grandes a cada pedra que as atingia lançadas pelas catapultas em formação bem atrás do exército de Noor. No entorno do Castelo existia uma população enorme de pescadores, comerciantes, lavadeiras, além das casas dos guardas do Rei e suas famílias. Era estimada uma população que girava em torno de 15 mil habitantes que agora, ardia em chamas desde o pé do Monte James até as margens do Rio Car o qual desaguava nas águas quentes de Melina . O povo de Melina é um povo que vive socialmente isolado do resto do continente. Basicamente a população de Melina é formada por índios locais que estão ali desde o início dos tempos. Eles praticamente ocupavam grande parte da Sirvia porém com o avanço das navegações, imigrantes de outros continentes e de ilhas próximas foram chegando e se acomodando. Muitos combates foram travados por posse de terra e aquela gente foi se deslocando mais ao sul onde o clima é mais ameno até se instalarem ao pé do Monte James. A população foi pega de surpresa, ainda em suas casas no momento em que uma forte tempestade com fortes raios assolou a cidade. Parecia até que os Deuses estavam colaborando com os intrusos e com todo aquele barulho dos trovões encobriu a chegada da infantaria de Noor que, às centenas atacaram a população pelo Leste e pelo Oeste ao mesmo tempo. 2
Quando os primeiros gritos de pavor foram ouvidos, as pessoas abriam as portas de suas casas para verem o que estava acontecendo e os soldados Rãmm aproveitavam para matar os curiosos e adentrarem em suas casas roubando o que encontravam de valor, exterminando os outros moradores e ateando fogo em cada canto daquele lugar. Os Rãmm são uma espécie de meio homem meio macaco nativos daquele território. Até a chegada de Noor, eles não eram domesticados e chegaram a ser caçados como alimento e como ‘bichos de estimação’. Era notória a rápida reprodução da espécie e muitos comerciantes de carnes e de alimentos chegaram a criá-los em fazendas visto sua rápida reprodução, desenvolvimento e o delicioso sabor de sua carne. Enquanto as casas eram invadidas e exterminadas pela infantaria Rãmm, os paredões do Castelo eram escalados pelos arqueiros e apesar do alarme acionado, os soldados que defendiam a fortaleza nada puderam fazer, pois além de ser um número reduzido de homens, pois eles já estavam se preparando para a troca da guarda e muitos já se lavavam nos banheiros ou se trocavam nos vestiários da guarda. Todos foram mortos e os assaltantes alcançaram os portões de entrada que então foram abertos para que a outra parte da infantaria adentrasse o Castelo. Como as portas de entrada das alas do Rei Vir bem como de seus familiares eram fortemente trancadas, Noor deu a ordem que fossem utilizadas as catapultas certeiras, fortemente armadas com bolas de um granito fortíssimo que agora batia com uma força estremecedora nas paredes das salas fazendo com que a massa corrida aplicada nesses ambientes para reforçar e embelezar as salas, caísse aos pedaços grandes no chão de mármore. --- Senhor, vamos ‘bater em retirada’ pela ala norte... --- Preciso acolher toda a minha família, minhas esposas do Arem, meus filhos... --- Senhor, não há tempo pra isso... --- Tem de haver tempo... 3
--- As paredes dos aposentos do Arem já foram destruídas... as mulheres que resistiram foram executadas... --- Como assim... --- A guarda foi atacada e nossos homens não resistiram... --- Meu povo... --- Eles já foram aprisionados e estão sendo retirados pelo exército de Noor... Antes de qualquer outra reação do Rei Vir um estrondo impressionante se abateu na sala do trono, onde estavam, e a grossa porta de Cedro juntamente com parte da parede a qual ela estava chumbada veio abaixo. Atrás do estrondo uma centena de soldados armados com Tacapes cravejados de ferros pontudos nas pontas tomou conta do lugar. Cercado por aqueles monstros o velho Rei Vir ficou acuado e encostado na parede que havia resistido intacta até que o comandante do assalto, um Gigante Grey, vestido fortemente com armadura e capacete que não possibilitava ver seu rosto entrou no local segurando sua enorme espada de que pingava sangue pelo fio. --- Venha ver a sua cidade Vir --- e agarrando o Rei pelo seu pescoço o arremessou para uma das janelas da sala. --- Seu reino caiu. Sua população que resistiu está morta e queimada, suas riquezas foram confiscadas e agora, você é um prisioneiro de Noor. Com o rosto suado de medo e de pavor vendo tudo aquilo ao seu redor o Rei Vir deixou cair lágrimas de seus olhos. Sua cidade estava em chamas e tudo que se ouvia era o ‘craquelar’ das madeiras das casas em chamas, alguns gritos dos sobreviventes feridos e o chiado dos Urubus famintos que ou voavam em círculo sobre as ruínas ou já dilaceravam a carne ensanguentada dos moradores mortos. --- Preferia estar morto a ver essa carnificina... --- Um dos soldados se aproximou rapidamente do Rei e quando ameaçava aplicar um golpe com seu tacape foi empurrado pelo comandante que gritou... --- Não... eu dou as ordens e eu sei bem o que deverá ser 4
feito criatura inútil... O ser olhou para ele com uma cara de poucos amigos até que o comandante chegou mais perto e falou agora em tom um pouco mais baixo. --- Não cometa erros... sua vida não vale nada para mim... faça algo que eu não ordene e terá seus braços pregados numa cruz a beira do mar esperando apenas que a maré suba para te devorar... O soldado, mesmo que grunhindo baixo, piscou seus olhos que estavam arregalados e baixou a guarda saindo devagar de perto do Rei e de seu comandante. Mesmo sendo criaturas fortes e cheias de vitalidade, os Rãmm tinham certa inteligência fato esse que os levou a serem domesticados e treinados para a luta, todavia muitos deles ainda viviam em fazendas e em casas de família para serem abatidos e servirem de alimento ou simplesmente para servirem de divertimento. --- Coloquem-no numa das carroças fechadas e vamos retirar todo o resto que presta para alguma coisa daqui do Castelo e de toda região antes de partirmos... ainda é cedo até que a luz do dia acabe. As poucas almas vivas que sobraram pelas vilas e pelas casas da região foram exterminadas de vez ou capturadas e colocadas nas centenas de carroças fechadas que já se posicionavam na estrada, estacionadas na direção da saída. Outras carroças foram chegando e nelas eram depositadas toneladas de alimentos salgados em conserva, apetrechos de ferro, prata e ouro, armamentos, tonéis de vinho de figo, material de caça e pesca, o óleo de cozinha e óleo de queimar e muitas roupas e fardas da população e dos guardas. De alguns lugares mais distantes ainda ouvia-se gritos de terror de mulheres que presenciavam seus filhos serem mortos ou capturados pelos soldados sedentos por sangue e sofrimento. O forte cheiro de sangue e de material queimando tomava conta de toda cidadela e os soldados mais corpulentos diver5
tiam-se arremessando ao fogo das casas os corpos de pessoas mortas ou semimortas que encontravam pelo caminho. A um aviso de Noor, foi dado um toque de retirada. Um guerreiro Rãmm, se postou no alto de uma árvore e portando um chifre retorcido tocou alto e todos aqueles que ainda estavam pelas vielas vieram para a formação de retirada. Uma enorme trilha de poeira se levantava pela estrada de terra que circundava o Monte James, deixando para trás um rastro de fumaça que aos poucos, com a chuva que caia, ia apagando o fogo. Nenhum movimento de vida restara naquele local, ao menos era o que eles pensavam.
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Parte 2 Muito distante daquilo tudo, numa aldeia situada ao nordeste da Sírvia, acontecia naquele instante uma reunião entre as tribos Crendes e Margos. Esses dois povos, apesar de dominarem em conjunto toda a região norte do continente, já guerrearam muito entre si por um motivo único, as geleiras do norte. Toda água potável da Sírvia vinha das geleiras ou, logicamente, das chuvas. Do norte do continente, as geleiras formavam dois grandes rios, um deles era o Rio Car que atravessava todo o continente pelo lado leste fazendo vários pequenos rios e riachos que banhavam a maioria das plantações de trigo, cevada e bilbi, uma espécie de milho que tinha um sabor mais adocicado e amanteigado e desde os primórdios foi a base da alimentação do povo da Sirvia. Do lado oeste, as geleiras alimentavam o Grande Candiú, um rio que recebeu o mesmo nome da planta que mais crescia em todo o continente e servia para a retirada da goma que dava liga a massa das construções, sua madeira era macia e ao mesmo tempo forte o bastante para ser utilizada em construções e em armas e arcos. O fruto do Candiú era abundante o ano todo. Eram pequenas bolas vermelhas de 10 centímetros de diâmetro que nasciam grudados nos galhos e dela era retirado o óleo das sementes e com a polpa eram confeccionados molhos e saladas. O Grande Candiú serpenteava todas as montanhas do lado oeste e em alguns locais formava lagos enormes de água muito límpida onde a população de peixes era enorme. Às margens de um desses lagos, o Lago Ow estavam as Terras de Noor. A localização das Vilas daqueles dois povos, Crendes e Margos, era simplesmente estratégico mesmo porque, uma verdadeira barreira separava a região norte do resto do continente. Era a Faixa de Pântano, um lugar de trânsito perigoso cheio de poços de areia movediça, criaturas ferozes e vários insetos com veneno mortal. Não se sabe até hoje o porquê da proliferação 7
dessas espécies somente naquela região, dizem os estudiosos da época que é por causa da umidade e do solo que é irrigado por lençóis de água gelada gerando vida nos subterrâneos do norte. Muitas lendas da Sirvia vêm daquela região. Dizem que ali há milhares de anos viveu uma população de demônios e que a região era muito quente. Dizem também que as geleiras eram vulcões que constantemente estavam ativos até que numa dessas erupções o céu se cobriu de uma imensa massa de pó e fuligem e por milhares de anos o sol ficou encoberto então, a lava resfriou e as chuvas congelaram os vulcões fazendo com que os demônios não suportassem deixando livre aquela região que segundo dizem, foi um mundo de sofrimento. Até hoje, nada disso era totalmente confirmado por ninguém. Os Crendes são um povo vegetariano. Eles cultivam verduras e sementes nas encostas das geleiras e nas margens norte do Grande Candiú. É um povo bastante trabalhador que aprendeu a lidar com as dificuldades do frio do Norte, os perigos da Faixa de Pântano ao sul de sua aldeia e a força das águas do Grande Candiú que fica a oeste daquelas terras. São da raça humana, com pele muito branca e são bastante fortes. O trabalho na comunidade é exclusivamente ligado à subsistência e eles estocam grandes quantidades de alimento. Colhedores de algas atravessam o Grande Candiú quase em sua nascente onde as águas são geladíssimas e a correnteza é intensa visto que as águas ainda descem das montanhas. Do outro lado do Grande Rio eles atravessam uma enorme faixa de planície que fica entre as geleiras e as Montanhas do Oeste até alcançar o mar. Ali eles cultivam enormes plantações de todo tipo de alga que é a principal fonte de alimentação daquele povo. Por essas dificuldades e o risco que toda essa empreitada traz, a população de homens na tribo tem diminuído consideravelmente nos últimos anos e assim, guerreiros, agricultores, cultivadores de algas são em sua maioria formada por mulheres. Existe no local aproximadamente 15 mulheres para cada homem e uma grande preocupação entre eles é que esse pequeno número de homens vem caindo a cada ano. 8
Os Margos têm ao oeste da sua aldeia o Rio Car e ao leste o Mar gelado da Sirvia, rico em peixes e quase sempre com águas tranquilas. São exímios navegadores e descendentes de escravos que foram trazidos de Noa pelo Rei Noor II, isso há mais de 500 anos. Vivem da pesca e do cultivo de raízes. São excelentes fabricantes de material de barro cozido e constantemente caravanas de Margos seguem pelas estradas para o centro da Sírvia onde comerciam seus utensílios, peixes salgados, e roupas feitas com fibras de Bambu de Noa, trazidos por seus ancestrais de sua terra natal. --- Nos reunimos aqui hoje para discutir a situação de migração entre nossos povos --- disse Lilly, a Rainha do povo Crende e continuou mesmo aos sussurros negativos por parte dos Margos --- Temos visto intrigas entre pessoas que não aceitam a mistura de nossos povos, as crianças pacíficas de Crende aprendendo lutas e violência com crianças Margo, temos detectado constantemente saques de alimentos e de óleo dos nossos depósitos e isso não poderá mais acontecer... --- Lilly tem alguma comprovação de que esses saques foram feitos pelo povo pacífico Margo? --- Questionou Aiua, o Chefe Margo com seus olhos arregalados. Uma das características dos Margos que os diferenciavam de todas outras populações do continente era a pele deles, azulada escura, quase cor de petróleo, além de seus olhos esbugalhados e um físico bastante avantajado. A média de altura dos adultos Margos é de 2 metros. --- Temos relatos de várias pessoas que presenciaram não só as brincadeiras estúpidas entre as crianças além de verem Margos saqueando os depósitos na calada da 1ª noite. Aquele Mundo recebia a luz de dois Sóis. Pela manhã nascia o primeiro e grande Sol que fazia o dia até se pôr. Então era a primeira noite. Horas depois, um segundo sol, bem menor, nascia no mesmo horizonte do primeiro, todavia sua trajetória é rápida, praticamente metade de um dia comum, era a segunda noite e só iria aparecer novamente com o Sol grande, mas dessa 9
feita encoberto por esse maior. --- Nossas fronteiras são e sempre foram abertas, não há porque fecharmos agora, depois de tantos anos sem discórdias... --- Qual então seria sua proposta Rainha? --- Penso eu que ambos os povos devem ficar de vigília... devemos nos ater a educação de nossos descendentes e punir conjuntamente aqueles que interferirem a essas regras de convivência...punir com a morte e que ela seja exemplar! Lilly foi momentaneamente aplaudida pelo seu povo que ouvia atentamente até continuar. Muitos de nós, Margos e Crendes sabemos bem quem são essas pessoas... --- Daremos então nomes aos bois... --- Não --- interrompeu a Rainha --- é tempo de conversarmos cada Chefe com seu povo e assim darmos uma última chance a esses indivíduos... --- A Rainha vai fazer a mesma coisa com sua gente? --- Aiua sabe bem como educo minha gente... As pessoas que estavam ali assistindo aquela conversa se entre olharam uma vez que sabiam dos métodos de educação que a Rainha Lilly aplicava para aqueles que desviassem das normas gerais impostas por ela. Apesar de jovem, Lilly era firme e forte quando desafiada. --- Muito bem --- disse Aiua --- passaremos a nos vigiar e assim iremos manter nosso convívio. Todos bateram os pés descalços no chão. Aquela era uma forma de aplauso e de concordância dos povos do Norte. A população Margo e Crende foi se dispersando e Lilly se aproximou de Aiua, ainda que sentada na esteira. --- Notícias do Sul não são nada boas. --- Sim... uma caravana que voltou do comércio de Nor disse que as invasões e os saques voltaram a acontecer. O Rei Noor já domina todas as terras do sul exceto Melina, o que deve fazer nos próximos dias, se é que já não o fez. --- Qual será sua estratégia? Para que alguém precisa viver em conflito? Por causa de terras? 10
--- Lilly, nós que sempre navegamos por outros continentes temos visto atrocidades com todos os povos, tudo por poder. Nosso mundo está cheio de subdivisões e os grandes chefes de grandes nações não admitem verem os outros seguindo suas vidas em paz... eles querem o domínio... --- Mas para que isso? Amanhã todos iremos partir para outros mundos ...vamos morrer... --- É a tal da história Lilly --- disse Aiua baixando a cabeça e fazendo com o dedo indicador um grande círculo a sua frente continuou --- é a história que fica que eles querem... deixar um legado de conquista...de poder... acham que com isso, os filhos de seus filhos sempre se lembrarão de quem foram seus pais e seus avós... --- Aiua... temo que logo estarão aqui... --- disse Lilly colocando o dedo indicador no Norte do círculo feito por Aiua na terra. Os dois ficaram olhando aquele círculo sem saber ao certo o que fazer e seus olhos, apesar de baixos, mostravam certo temor do que poderia acontecer com seus povos. --- Unidos somos mais fortes... --- Estou de acordo Lilly...totalmente de acordo --- O Pântano é nossa barreira de segurança ao sul. As Geleiras do Norte são praticamente intransponíveis. Resta-nos a guarda pelos flancos, Leste pelo Mar e pelo Rio Car e a Oeste também pelo Mar e pelo Grande Candiú. --- Temos de nos ater a essa guarda. --- Como faremos isso? --- Vamos pensando nisso com mais calma. --- Sim...sem muita calma pois não sabemos do amanhã. Os dois se levantaram e se cumprimentaram. Aiua seguiu pela trilha que levava a ponte do Rio Car até alcançar suas terras.
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Parte 3 A costa oeste da Sirvia é formada por uma enorme cordilheira de montanhas altíssimas e bastante perigosas. O Noroeste do Continente, entre uma faixa de montanhas um pouco mais baixas desde o mar, passando pelo Grande Rio e contornando o Lago Don está o maior povoado ali estabelecido. Candiú tem uma população de aproximadamente 100 mil de habitantes que vão desde nativos do Continente até um enorme numero de imigrantes que ali chegaram através do Porto de Candiú localizado no extremo Noroeste. Desde os primórdios das primeiras travessias oceânicas, o Porto de Candiú foi estrategicamente construído em águas tranquilas que acompanham uma correnteza marítima circular o que facilita a chegada de barcos de todos os tamanhos naquele lugar. Candiu tem policiamento, Escolas que contam com livros e professores experientes, Serviço Médico para a população e o maior Mercado de negócios. O abastecimento de água vem do Rio e de dessalinizadoras construídas perto do porto o que trás conforto a população local. Lá, também funcionam o Fórum e um presídio. Candiu conta com grande parte de suas ruas pavimentadas com pedras, parques de águas e campos de lazer onde as pessoas levam as crianças e suas famílias nos dias de folga. Tudo isso poderia ser bem melhor não fosse a corrupção no governo do Rei Nasser e dos representantes do povo os quais são escolhidos pelo Rei e após apresentação ao povo são aclamados Conselheiros do Rei. Também é uma tradição o povo escolher o Rei por aclamação e assim, Nasser assumiu o governo após a morte de seu pai o Rei Messindidato a sucessão. Ele era o único e dizem que o pai não queria ver Nasser no governo, pois sabia de suas más intenções. O pai tentou de tudo e até convocou uma eleição popular para saber quem o povo queria com a coroa assim que ele morresse, mas nada disso deu certo, dias antes das eleições o Rei Messia, pai de Nasser, foi encon12
trado morto em sua cama quando iria completar 91 anos e desde os 15 com a coroa, mesmo sem aprovação popular. Em pouco mais de 2 anos Nasser mudou muitas leis e tirou quase todos os direitos do povo o qual perdeu a chance de assistir as sessões políticas e de eleições dos atos governamentais que eram feitos em praça pública. Apesar disso, o Rei Nasser ainda era bastante querido da população e todas as vezes em que aparecia no Mercado, nas Praças ou na sacada da Casa do Governo para falar sobre seus feitos ele era ovacionado pelas pessoas mais comuns. As Montanhas de Candiú abrigavam um dos maiores aliados e amigo pessoal do Rei Nasser, o Mago Sirio. Suas magias eram incontestáveis e tanto políticos como Reis e Chefes de Tribos não o intimidavam. Segundo as lendas e conversas populares Sirio tem mais de 120 anos e ele está no mais alto grau de curandeirismo o que em muitas ocasiões salvou prisioneiros, camponeses, escravos e toda gente necessitada em toda a Sirvia. Sirio formou diversos outros Magos entre eles o Noor IV, o Rei das Terras de Nor. Nos dias de hoje eles não se falam mais visto os casos de desavenças e desacordos entre eles. Dizem que Noor usa a Magia para o mal, o lado negro das trevas e os desafios da morte. Na última batalha entre eles, Sirio quase cegou Noor com sua magia fazendo com que bandos de Corvos do Pântano atacassem seu rosto. Daí para frente, nunca ninguém mais viu o rosto de Noor, pois ele passou a usar uma máscara negra sem os olhos, apenas com orifícios nas narinas e na boca, mas mesmo assim ele consegue ninguém sabe como, enxergar até nas noites mais escuras. Sirio não tem, a menos que saibam ,uma casa fixa. Sua residência são as cavernas das Montanhas do Oeste na região de Candiu. Parece mentira do povo, mas as maiores tempestades na Sirvia sempre começam nas Montanhas do Oeste e as pessoas falam que são a ira do Mago que ele despeja sobre os campos. De todas as partes da Sirvia as pessoas necessitadas le13
vam e depositam oferendas nas cavernas dessas montanhas como que agradecendo ou pedindo graças ao Mago Sirio. As montanhas são perigosas e muitas dessas pessoas não voltam ou voltam com sérios ferimentos e as pessoas falam que esse é o preço da ajuda do Mago. Em toda Sirvia, sempre que precisam ou pedem alguma coisa o povo se vira para as montanhas do Noroeste e com as mãos estendidas fazem suas orações e seus pedidos, como se esse fosse o seu Deus vivo. Hoje, o Porto de Candiu estava particularmente movimentado. Ouviram falar que um outro Mago estava vindo de Marigaa, um Continente distante para conhecer um pouco mais as populações da Sirvia. Pouco antes da chegada da segunda noite uma grande embarcação despontou por trás da Ilha Si, porta de entrada do Porto de Candiu. O burburinho foi geral e além da grande aglomeração de pessoas de todas as partes, o próprio Rei Nasser veio receber o novo visitante. Assim que a embarcação se aproximava do Porto, algo muito estranho se iniciou. Alguns trovões foram ouvidos vindos das Montanhas e do alto mar começou um vento Noroeste, daqueles que os pescadores dizem ser “o vento de ficar casa”... Quanto mais o barco se aproximava, mais os ventos sopravam fortes e com eles chegavam nuvens carregadas de água. O mar ficou agitado a ponto de dificultar a parada da embarcação. Muitas das pessoas que ali estavam olhavam para as montanhas e diziam “é a ira de Sirio” e logo depois ‘batiam em retirada’ para dentro de suas casas. --- O que está acontecendo? --- Não sabemos Rei Nasser... as pessoas dizem que é coisa de Sirio... --- Ai ai Sirio --- gritou o Rei --- esse homem tem poderes suficientes para alterar os ventos... --- e assim que ele disse isso um forte estrondo de trovão veio do topo das montanhas e uma chuva nunca vista começou a cair. 14
Tempestades são bastante normais na Sirvia toda. O Continente não é tão grande e sua localização é propícia para correntes de ventos que quentes do Sul e se encontram com as geleiras do Norte. --- Venha meu Senhor... --- Não vou ...não é uma chuva que vai me tirar daqui --disse o Rei se escondendo sobre o toldo de uma das barracas que não saíram voando com o vento. --- O barco parou e as amarras mesmo com dificuldade foram atadas aos pilares do cais. A lateral do barco ainda batia forte no porto devido as marolas que vinham do alto mar e se encontravam com as que vinham da praia. Mais amarras foram atadas por todos os cantos do convés castigado pelas ondas. Assim que a rampa foi colocada surgiu uma figura grande, com uma capa cor de vinho que cobria seu corpo e um capuz escuro que não revelava seu rosto. Vagarosamente ele chegou a ponta da prancha, olhou para o céu e estendeu seus braços ao alto. A chuva foi então diminuindo, as fortes ondas passaram a se aplainar, os ventos foram cessando aos poucos até que tudo se tornou como era, minutos antes de acontecer. A figura encapotada desceu a rampa e pisou em terra firme ...ajoelhou-se e beijou o solo da Sirvia. --- Quem é esse homem que ama tanto a minha terra a ponto de beija-la? --- exclamou o Rei Nasser. --- Sou um simples visitante senhor meu Rei. Venho de terras distantes e delas lhe trago uma pequena lembrança. --- e estendeu as mãos que até então estavam vazias e nela surgiram dois pequenos seres verdes que pulsavam como um coração. --- O que vem a ser isso? --- Nós o chamamos de Sapos. São criaturinhas magníficas que devoram insetos e não causam mal às pessoas. O Rei, um pouco receoso, foi logo colocando os dois seres em suas mãos... --- Não precisa temer Senhor... eles são do bem --- Que presente simpático. Outros viajantes trazem ouro, 15
prata, perfumes, tapetes e comidas e você, inusitadamente me trouxe dois sapos. Sim um Sapo é o macho e o outro é a fêmea. Em breve eles irão se reproduzir. --- Te agradeço em nome do povo de Candiu...Sr.... --- Pode me chamar de Vlater , sou seu servo. Vim conhecer a tão falada Sirvia, suas matas, suas plantas e sua gente. Já é noite, vou procurar um local para descansar e amanhã mesmo vou partir para minhas pesquisas. --- Sr. Vlater, posso te oferecer banho, comida e descanso nessa noite em meu Palácio. --- Isso não será incomodo meu Rei Nasser? --- Nã... não... lógico que não... temos muitas acomodações, venha comigo em minha carruagem. O homem ainda encapuzado entrou na carruagem após a oferta do Rei e ambos seguiram para o Palácio. Da janela do transporte, Vlater afastou o capuz de seus olhos e olhou em direção as Montanhas. Era como se ele já soubesse quem estava ali.
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Parte 4 Durante todo um dia e uma noite mesmo com aquela enorme tempestade, a comitiva do Comandante Gigante Grey atravessou as florestas desde Melina até as Terras de Nor. O Rei Vir e outras centenas de reféns capturados estavam exaustos da caminhada a pé além de alguns tantos com ferimentos que foram levados em carroças puxadas por cavalos selvagens devidamente adestrados, mas que hora ou outra empinavam deixando cair a carga de feridos que mais uma vez eram simplesmente arremessados de volta as carroças pelos fortes soldados Rãmm. Muitos não suportaram a viagem e mortos, foram deixados pelo caminho para serem devorados pelas feras famintas da floresta e muitos outros, eram despedaçados pelos soldados que também os devoravam deixando suas enormes bocas ensanguentadas. --- Levem-nos para o depósito --- gritava o Gigante Grey --- lá eles descansarão da viagem e serão alimentados para depois poderem nos servir. Aos poucos, os reféns eram colocados amontoados num enorme galpão de madeira, quente, sem a mínima ventilação e os Rãmm colocavam baldes com restos de alimentos em coxos. A fome e a sede eram tanta que aquelas pessoas pegavam aquela comida com as mãos e a devoravam sem ao menos saber do que se tratava. --- O Rei Vir deverá me acompanhar --- disse ele Retirado da carroça onde estava o Rei Vir era puxado por dois soldados que seguiam logo atrás do seu comandante. Entraram no Palácio e seguiram até a sala do Rei Noor VII. Assim que a porta da sala foi aberta o Rei Noor se levantou e disse em tom sarcástico: --- Ora ora quem é que veio me visitar --- mesmo com sua máscara horrenda, que cobria seus olhos, Noor podia ver melhor que todas as pessoas ali presentes. 17
O Rei dirigiu seus olhos para os braços de Vir que estavam fortemente amarrados e as cordas caíram a seus pés. Vendo aquilo os soldados rapidamente se aproximaram com suas armas do Rei Vir até que Noor disse em tom de atenção. --- Podem deixa-lo, aqui ele não fará mal algum ...retirem-se soldados. Ouvindo aquela ordem os soldados que estavam na Sala do Trono ainda olharam para o Comandante Grey o qual reforçou... --- Vocês não ouviram seu Rei?...retirem-se. Após todos os soldados saírem Noor chegou perto Vir dizendo. --- Você tem ideia do porque está aqui? --- Eu preferia estar morto a estar aqui... --- Não --- disse Noor voltando para seu trono --- morto você não vale nada. Sei do seu poder Vir e quero você comigo à partir de hoje... juntos, poderemos ter toda a Sirvia e então, poderemos criar nosso povo nativo sem a interferência de culturas distantes, sem medo do que essas criaturas que invadem todos os dias nossas terras podem nos fazer... Vir baixou a cabeça sem nada falar. --- Você está cansado meu amigo... vou deixa-lo descansar essa noite e então, voltaremos a conversar amanhã. --- Você ainda fala em criar nosso povo com decência? Só pode ser uma piada. Seu comandante e seus soldados destruíram minha aldeia, mataram centenas do meu povo e arrastaram outras centenas por um dia e uma noite sem o mínimo escrúpulo e você ainda vem me falar de união... --- Deixe-me a sós com ele Grey... --- Mas Senhor... E só numa ameaça de olhar o Comandante se virou e saiu da sala. --- Você sabe das minhas forças Vir... sabe o quanto eu preciso de sua ajuda... você será meu Comandante, meu braço direito... você sabe melhor que qualquer um como lidar com o inimigo e com as tropas... já estivemos juntos em tempos não 18
muito distantes e conquistamos o que queríamos... --- Eu prometi a mim mesmo nunca mais entrar num combate... --- Você sabe que ele chegou não é mesmo? --- Nem ele nem você me dão mais medo do que as serpentes do Pântano... a morte hoje para mim é só uma consequência da vida. Rapidamente Noor levantou de seu trono e se aproximou de Vir. Você vai me ajudar, por bem ou por mal... eu não queria estar nos seus pensamentos e nos seus olhos em ver o que restou do seu povo sofrendo até a morte... é isso que você quer? Vir então se ajoelhou e disse. --- Meu povo e eu somos um só... preferimos a morte do que seguir suas ordens... --- Vou te dar uma noite de descanso... amanhã voltaremos a conversar... --- e gritou --- Grey Imediatamente as portas se abriram e lá estava o Gigante Grey e seus soldados. --- Levem-no daqui... deixem que se lave, coma e durma... amanhã pedirei novamente sua presença. A um olhar do Comandante os solados levantaram Vir e quando estavam o levando Noor disse a eles. --- Sem violência... eu quero ele inteiro amanhã... --- Sim senhor meu Rei. Em tempos passados, Vir e Noor foram parceiros de uma luta sangrenta contra os povos Cangi, um continente a Leste da Sirvia formado basicamente por seres deformados. É na verdade uma grande ilha vulcânica que se formou após os grandes terremotos. Da costa Leste da Sirvia, esse pequeno continente pode ser visto a olho nu nos dias mais claros. Prisioneiros de muito tempo atrás eram levados para lá e ali eram depositados a mercê das feras, das plantas venenosas e sem saída pois as marés no entorno dessa grande ilha tendem a arremessar quem quer que se aproxime em suas rochas pontudas. Os prisioneiros eram colocados em embarcações pequenas e eram empurrados pelos navios até alcançarem essas marés. Daí para frente a cor19
renteza fazia o resto do serviço. Os poucos que chegavam vivos eram devorados pelas feras marinhas ou terrestres porem, muitos deles sobreviveram e se adaptaram ao ar venenoso daquele vulcão mesmo com sequelas que os transformaram em verdadeiros monstros. Uniram-se e se multiplicaram durante anos. Aprenderam a navegar e há alguns anos, pela mesma costa Leste que os levou, eles voltaram a Sirvia e durante anos, até pouco tempo atrás todos os Reis e Chefes de Tribos da Sirvia se uniram para dizima-los. Noor e Vir mesmo que ainda jovens, lutaram juntos pelo sul e conseguiram conter o avanço dessas criaturas no continente. Muitos deles ainda estão nas florestas e no Pântano, mas desunidos eles não são grande problema. Ao menos até hoje!
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Parte 5 Melina estava novamente resfriada. Após o ataque mortal passaram-se alguns poucos dias e o ar, que até então estava carregado do cheiro da morte foi se dissipando. O movimento ali era pouco, mas contrário à expectativa do Gigante Grey e de seus soldados, ali ainda existia muita vida. Muitas mães se esconderam nos porões juntamente com seus filhos e agora, passado aquela verdadeira carnificina eles poderiam sair de suas ‘tocas’ para tentar recompor suas casas, ajudar algumas pessoas feridas que ainda mostravam suspiros de vida e enterrar com alguma dignidade os mortos. Din e Jessica, dois irmãos e jovens adolescentes foram os primeiros a chegar ao Castelo do Rei Vir. Atravessando os escombros, saltando por corpos em decomposição eles foram vendo se ali existia vida --- Alguém ai... alguém ai... --- Venha por aqui Jessica... cuidado com esses arcos que eles podem desabar a qualquer momento... Com a ajuda de paus e pedaços de lanças retorcidas eles foram abrindo as portas. Passaram pela sala do trono, pelos quartos e banheiros sempre aos gritos... --- Alguém esta ai... nós viemos ajudar... alguém está ai... Num momento eles ouviram um ruído e ambos pararam se entreolhando... --- Você ouviu? --- Ouvi... ouvi alguém chamando... --- Espera... silêncio... De uma das portas no fundo de um corredor vinham alguns pedidos de ajuda... não era só uma pessoa... eram várias vozes... Rapidamente eles chegaram até bem perto da porta e bateram nela com os ferros que tinham nas mãos... aguardaram Alguém bateu do lado de dentro... um som seco, distante da porta... 21
--- Venha... vamos fazer uma alavanca aqui na fechadura --- encaixando os dois pedaços de ferro bem perto do trinco e puxando com toda força para trás --- força Jé... força... A porta rangeu e depois de um estalo ela se abriu... algumas pedras da parte de cima do batente caíram quase atingindo os pés dos dois... --- Cuidado Jé... tem muitas pedras do lado de dentro... vamos ter de tira-las uma a uma... --- Quem está ai dentro? --- Somos empregados do Rei... aqui é o depósito de alimentos... – respondeu uma voz do lado de dentro. --- Vocês estão vendo pedras na frente dessa porta? --- Sim... estamos... --- Retirem elas com cuidado, comecem pelas de cima... nós estamos retirando as que estão desse lado de fora. O depósito de alimentos ficava numa parede falsa, logo depois da porta de madeira. Quando uma das pedras arremessadas por uma das catapultas atingiu o local aquelas pessoas estavam lá dentro e por sorte não conseguiram sair, nem os soldados notaram que ela existia. Mesmo depois desse tempo todo, elas estavam bem alimentadas e hidratadas uma vez que alimentos ali é o que não faltava. As pedras foram retiradas e agora eles já podiam tocar as mãos das pessoas que estavam ali bem como ouvir normalmente o que eles falavam. --- Nossa...que sorte a de vocês ficarem presos aqui... --- Nem vimos ao certo o que aconteceu... estávamos pegando os materiais para fazer o café do Rei e da guarda quando essa pedra destruiu tudo... --- Nossa cidade foi totalmente destruída --- dizia Jessica enquanto retirava as pedras --- as casas foram queimadas e nossos familiares foram mortos ou feitos escravos pelos soldados do Rei Noor... As pessoas que estavam do lado de dentro começaram a chorar e a gritar de desespero. Agora sabiam que seus filhos, maridos e esposas não estavam mais ali com eles. 22
Finalmente as ultimas pedras foram retiradas e as pessoas de dentro da sala puderam então sair dali. Eram 4 empregadas e dois meninos que ajudavam na cozinha. Eles se abraçaram aos prantos e agradeceram seus salvadores. --- Venham ver uma coisa --- disse Din levando-os em direção a uma janela que dava para a aldeia --- vejam o que restou Os seis ex-prisioneiros foram à janela e ficaram pasmos com o que viam. Uma das mulheres, olhando por cima para sua casa começou a chorar orando em direção as montanhas pediu ajuda para seus familiares e seu sofrimento. Jéssica viu um movimento numa Praça logo abaixo da janela... gritou. --- Oi pessoal... oi pessoal... tem pessoas vivas aqui em cima... subam aqui os que puderem... tragam cestos para recolhermos alimentos... Rapidamente várias pessoas foram chegando lá em cima e todos se ajudando retiraram vários alimentos para consumo que ali estavam. --- Venham, vamos levar tudo isso lá para a Praça... temos embutidos queijos e pães que podem ser consumidos imediatamente. Vamos levar também as carnes salgadas e as conservas para serem preparadas para aqueles que vamos achando com fome. Acho que muita gente está presa e ferida. --- Vocês sabem aonde são guardados as ervas e os remédios medicinais? --- Eu sei --- disse um dos meninos --- venham comigo, fica logo ali atrás. Em poucos momentos a agitação na Praça era imensa. Mais de duzentas pessoas foram saindo de esconderijos em suas casas e foram se juntando aos outros todos se ajudando a fazer e servir comidas, limpar e passar remédio nos feridos, tentar encontrar mais sobreviventes e consolar aqueles que perderam seus familiares. A noite, as ruas do entorno da Praça já estavam razoavel23
mente limpas, a maioria dos mortos foram enterrados e várias casas e abrigos já estavam prontos para o descanso noturno principalmente dos mais velhos e dos feridos. --- A noite chegou --- disse Din --- você acha que existe algum perigo deles voltarem Jé? --- Lógico que não... eles já tem o que queriam, nosso Rei. --- Eles sabem do segredo da Fenda? --- Com certeza é isso que eles querem saber de nosso Rei... --- E se ele contar? --- Que conte... salvando a sua pele e de nossa gente que ele conte o que quiser – respondeu Jessica em tom nervoso e áspero. Din e Jessica foram criados praticamente sozinhos. Sua mãe faleceu cedo, quando eles ainda eram crianças e o pai foi quem mais os instruiu e deu recursos para que eles tivessem a inteligência que tem hoje. Quando o pai deles ainda estava vivo, Din o ajudava na fabricação e distribuição de vidros, pescava com ele e quando alcançou a adolescência, Din viajava muito para todos os cantos da Sirvia, principalmente para Candiu e Nor, onde mantinham negócios com diversos comerciantes locais. Aos poucos as pessoas foram se acomodando, as fogueiras se apagando e milhões de estrelas surgiram no céu. Não havia a menor probabilidade de chuva e as pessoas se acomodaram por todos os cantos, unidas com medo das feras da floresta, mas tão cansadas que foram adormecendo aos poucos até restar apenas o “criquilar” dos grilos e o piar das corujas que observavam tudo dos galhos mais altos das árvores.
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Parte 6 O Sol já estava forte e Vlater caminhava sozinho há horas pelas praias ao Norte de Candiu. Ele nunca esteve naquele Continente e mesmo assim parecia conhecê-lo nas palmas de suas mãos. --- O Sol está forte --- pensou ele --- preciso parar um pouco em alguma sombra, comer algo e descansar um pouco. Vlater observou uma pequena caverna nas rochas da montanha que se aproximavam do mar e seguiu até aquele local, antes disso colheu algumas frutas das muitas árvores de Candiu que encontrava pelo caminho que são abundantes o ano todo. Essa árvore é excepcional e seu fruto é bastante pitoresco. Assim que você colhe aquelas bolas vermelhas coladas nos galhos elas murcham no mesmo instante e quanto mais tempo ficam fora dos galhos mais elas vão se parecendo com ameixas secas. Elas murcham e vão escurecendo a olhos vistos e ficam carnudas e doces. Se você gosta mais do caldo da fruta deve comê-la assim que a retira da árvore, se prefere mais seca deve aguardar algum tempo. Se você quer comê-la fresca e caudalosa mais tarde, deve-se retira-la da árvore e deposita-la dentro de um recipiente com água fresca, com isso, ela leva uns dois dias até começar a murchar. --- Engraçado as coisas que o Rei Nasser me disse ontem --- pensava ele enquanto provava das frutas, sentado numa pedra dentro daquela caverna --- aquele homem não sabe o quanto poderia fazer pelo seu povo... ou sabe sim, mas prefere fazer só aquilo que lhe convém para continuar tendo a notoriedade entre a população. Ele poderia muito bem expandir aquela cidade, reformar o porto que já está sucateado e quem sabe, melhorar o comércio em toda Sirvia --- parou de pensar assim que ouviu ruídos na praia. --- Vocês podem colher as Algas enquanto nós vamos recolhendo uns frutos do Candiu para secar. --- São vozes de mulheres --- pensou Vlater 25
Eram as cultivadoras de algas da Aldeia Crende. Mulheres nuas, com seus corpos nus mergulhavam nas ondas, sumiam durante um tempo e voltavam carregando maços de algas colhidas no fundo do mar. Outras recolhiam essas algas e as lavavam com água doce colocando-as em cestos de vime com tampa para não secarem demais ao sol quente. Vlader sentiu que estava vendo o que não deveria e saiu da caverna falando: --- Olá... Logo apareceram algumas guerreiras ,armadas de lanças de bambu, da areia da praia, logo intimaram o estranho. --- Desculpem --- disse ele --- não vim incomodar... só estava descansando um pouco aqui nessa caverna. --- De onde você vem forasteiro? --- Venho de muito longe... vocês com certeza nunca ouviram falar da minha terra --- disse ele se aproximando sem medo daquelas moças --- mas eu já ouvi falar muito do povo Crende... --- E o que quer por aqui? --- Estou aqui numa missão bastante delicada e gostaria de conversar com vocês. --- Pode começar... --- disse uma das agricultoras com ar de desconfiança --- Será que poderíamos seguir até a sua tribo? Era para lá que eu estava indo. As mulheres se entreolharam meio que sem saber o que fazer... --- Ainda temos de colher frutos e algas... --- disse uma delas --- Mais do que já tem --- disse ele fazendo um gesto com a cabeça e olhando para os cestos de algas e os baldes de frutas... Elas se viraram, e viram surpresas que ambos estavam lotados de algas e frutas frescas... --- Como você fez isso? É magia? --- Apenas uma ajuda...vem chuva por ai... e vai ser forte! O Sol se escondeu atrás das nuvens e um vento começou 26
a soprar do mar naquele exato momento... --- Vamos nos apressar --- disse uma das moças já pegando um dos cestos e colocando na cabeça... --- peguem os alimentos e ...você, siga-nos a distância. A caminhada era longa desde a Praia até a Aldeia e por vários momentos elas paravam para descansar ou se hidratar e olhavam para trás e viam que o homem encapuzado ali estava, em pé, apenas segurando um grande cajado, olhando para baixo, como se fosse uma estátua, sem nada falar, sem nada comer ou beber, ele somente as acompanhava à distância. Horas depois que o grupo saiu da praia eles chagaram debaixo de uma tempestade torrencial, as pessoas da pequena aldeia levavam suas poucas crianças para dentro de suas casas, cortavam rapidamente folhas de Palmeiras para reforçar a cobertura dos telhados evitando goteiras e estavam assustadas com os raios e trovões que vinham do céu. Aquela era uma região perigosa quando se tratava de tempestades. No pé das Geleiras do Norte já havia ocorrido vários casos de deslizamento e avalanches e muitas vidas se perderam com isso. No momento de correria, Lilly saiu de uma das malocas e viu o homem parado em pé, na chuva, no meio do terreiro principal. Ele levantou a cabeça, olhou de dentro do gorro de sua capa para ela e levou as duas mãos ao céu, uma delas segurando seu cajado... a chuva foi cessando, até que se tornou uma garoa fina, os ventos pararam. As pessoas foram então saindo de suas casas e todos passaram a observar aquele homem grande que agora abaixava seus braços e vagarosamente voltava a olhar para o chão encharcado. --- Quem é você forasteiro? --- Perguntou a chefe do grupo O homem se aproximou até uns 3 metros de Lilly e disse com uma voz tranquila e amena. --- Vim conversar com você, Guerreira Lilly. --- Como sabe meu nome? --- Conheci seus pais, seus avós e seus bisavós... pode27
mos conversar? Lilly não sabia ao certo o que fazer, mas diante a tranquilidade que ele transmitia ela cedeu e disse a ele. --- Venha comigo! --- Os dois caminharam por todo o terreiro e chegaram a um galpão maior usado para festas, reuniões e refeições em dias de festa. Era um local bastante agradável enfeitado com folhagens, estantes com pratos e utensílios, uma enorme quantidade de comida pronta em travessas de barro ainda aquecidas pelas brasas do fogão a lenha. --- Somos pessoas simples, mas temos o que oferecer --disse ela --- aceita comer e beber? --- Sim... aceito ! Lilly foi até o fogão e fez um prato com arroz cozido com algas, molho salgado de Candiu, pedaços de tomate fresco e uma fatia de pão de milho assado com ervas. Colocou num copo um pouco de suco de mangas e qual não foi seu espanto quando se virou e viu que o homem estava sentado a mesa sem a sua capa e seu capuz. Era um homem lindo. Aparentava ter 30 ou 35 anos. Cabelos longos, olhos negros que brilhavam muito e uma barba rala que cobria parcialmente a pele morena de seu rosto. Ela ficou parada um tempo olhando para ele, o qual olhava para suas mãos sobre a mesa e depois se aproximou colocando prato, copo e talheres a sua frente. --- É o que temos aqui. --- Só posso agradecer --- disse o homem enquanto começava a comer. --- Você fez a chuva parar... como fez aquilo? --- Quando se respeita a natureza ela corresponde a nossos pedidos --- disse ele enquanto comia delicadamente --quando você planta suas algas, você respeita os limites do mar, das marés, das próprias sementes... você dá chance a vida e ela te corresponde te dando seus frutos saciando sua fome... basta saber acelerar as coisas... a chuva iria parar uma hora ou outra... nós sabemos disso, eu apenas pedi para que o tempo dela 28
terminar naquele momento... --- Você é um mago? --- disse ela enquanto se sentava e via que varias outras mulheres e os poucos homens da tribo também se aproximavam do homem. --- Me chamam de Vlater... alguns dizem que sou louco, outros dizem que sou contra os deuses, outros me chamam de Mago. --- Você disse lá fora que conheceu meus pais, avós e bisavós .... como pode isso? Você não deve ser muito mais velho do que eu... --- Conheci todos eles... você não vai entender isso, ao menos por enquanto. Melhor deixarmos essa sua dúvida para uma conversa mais longa, em outro momento... --- E o que você veio fazer aqui nesses confins? --- Algum de vocês já ouviu falar da Fenda? Elas se entreolharam como quem nem sabe o significado de Fenda... --- Eu ouvi falar dela! --- disse uma voz alta que vinha da porta do salão...era Aiua da Tribo dos Margo --- eu sei do poder das ‘quatro’. --- Aiua --- Disse Lilly se levantando da mesa --- que faz aqui? --- A tempestade derrubou parte da ponte sobre o Rio Car... várias casas em nossa Vila foram danificadas... temos feridos e muita gente em desespero... vim pedir ajuda sua Lilly... nossos remédios eram poucos e o que tínhamos foi levado pela enxurrada que desceu da Montanha... Vlater terminou de comer, afastou seu prato olhou para Lilly e agradeceu com a cabeça... se levantou e disse. --- Eu posso ajudar Aiua...caso queira! --- Vamos minha gente --- disse Lilly --- peguem as ferramentas e as cordas. Todos saíram carregando escadas, ferramentas e material necessário para a ajuda. Vlater era muito forte e carregou consigo uma enormidade de cestos com raízes e essências de cura... 29
O caminho em trilhas que levava de Crendes a Margo é bastante íngreme em alguns trechos e muitos escorregavam e caiam nessa trilha. Vlater sempre se manteve firme, mesmo com os muitos quilos que carregava, inclusive com rolos de corda em seus ombros ele seguia, prestando ajuda e animando os outros. Lilly o observava atentamente, ela é uma pessoa desconfiada, mas naquele momento ela o observava com muita admiração.
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Parte 7 Assim que o Rei Noor adentrou na sala do trono notou que o seu prisioneiro, o Rei Vir estava ali na porta. De mãos atadas e olhando para o chão sem a mínima chance de reação. --- Vir, quero conhecer a Fenda... O Rei Vir olhou para ele e sorriu sem abrir sua boca --- Você vai morrer ali Noor, aquilo não é um lugar de diversão... --- Se você me levar até lá eu solto todos os prisioneiros do seu povo... --- Eu sei bem o que você quer... aquilo que dizem a Fenda oferecer... a vida eterna... --- É exatamente o que eu quero e você sabe bem disso... --- Noor... a Fenda não passa de uma lenda popular. O lugar onde dizem ela estar é uma cratera de milhares de anos que guarda gases tóxicos... as pessoas têm visões quando aspiram aquele ar... muitos morrem antes de pedir socorro... --- A Fenda proibida! Esse nome me estimula... os Magos dizem que ali estão todos os segredos da vida e da morte, eu já não sou uma pessoa jovem Vir, nós já passamos da metade de nossas vidas ... é hora de arriscar... --- Não Noor... --- disse o Rei Vir enquanto se levantava e se aproximava de Noor --- ambos sabemos das lendas... das escritas dos pergaminhos... Para entender melhor essa questão, sabe-se que no centro do Continente da Sirvia, um local praticamente inexplorado, cheio de perigos e de criaturas fantasmagóricas, existe uma fenda enorme cavada na pedra sólida. Desde os primórdios dizem que aquilo é uma porta para o inferno e tantas e tantas pessoas que foram explora-la nunca mais retornaram. A lenda virou uma história real e todos aqueles que tem algum conhecimento sobre aquele lugar nem imagina se aproximar dele. 31
Há muitos anos foram descobertos manuscritos em uma língua estranha ao povo da Sirvia. Esses pergaminhos atravessaram os continentes e nunca se soube do verdadeiro significado do que está escrito ali. Nos manuscritos estão pintados planetas, rotas estelares, seres com carcaças estranhas, tubos que entram e saem dos corpos, criaturas e materiais nunca vistos nesse mundo, que parecem ter luz própria. Os mais idosos não comentam nada sobre isso e quando indagados sobre a Fenda, sempre procuram desconversar ou dizem que não sabem de nada daquilo. Muitos dos jovens nunca ouviram falar desse pergaminho ou desse local todavia, sabem que a região central da Sirvia é uma área proibida. Quem quer viajar do norte para o sul ou vice e versa são aconselhadas a irem por mar, seja na costa Oeste à qual tem um acesso difícil ou pelas praias do Leste onde o Mar é menos agitado e o terreno daquela costa é mais plano facilitando paradas para descanso ou abastecimento de alimentos e água. --- Vamos juntos ver isso meu amigo Vir... você tem de me ajudar... --- Ambos morreremos lá e você bem sabe disso... Bastante irritado o Rei Noor caminhou até uma bancada onde estavam algumas bebidas e comidas e com os braços empurrou tudo aquilo para longe gritando em seguida... --- O que eu faço ou o que não faço de minha vida é problema meu Vir... você não pode me ocultar de algo que você saiba... o que restou de seu povo está prestes a morrer...você não tem pena deles? --- Eu quero estar junto do meu povo... você não tinha o direito de fazer o que fez somente por um luxo seu de conhecer a vida eterna... que não existe! Bastante irritado Noor foi até Vir e agarrando-o pelo cabelo levou-o até as escadarias do Palácio Real dizendo --- Você prefere ver seu povo morto? É isso que você prefere? Então é o que vai ver... 32
--- Noor...pare com isso... você conhece os perigos... Chegando perto do galpão onde o povo de Melina estava aprisionado Noor jogou o pobre homem ao chão e gritou em direção aos guardas Rãmm... --- Tragam as ‘lindezas’ do Rei --- disse Noor em tom irônico. Logo se abriram as portas do galpão e surgiram 3 guardas, cada um trazendo uma das esposas do Arem de Vir... --- O que você vai fazer Noor? Você quer mais sangue? --- Você pediu isso... você não me dá o que eu quero mas eu te dou o que você pede... --- e passando seu indicador no próprio pescoço Noor fez um gesto aos soldados que mais que rápido esfaquearam aquelas mulheres pelas costas sem a mínima piedade. --- Nããããoooo...--- gritou o Rei Vir --- elas não... --- e se ajoelhou aos prantos... --- Veja Rei Vir --- levantando a cabeça de seu prisioneiro --- veja... elas são deliciosas... O Rei Vir ficou impressionado com o que via. Outros Rãmm haviam se aproximado das mulheres assassinadas e despedaçavam seus corpos com suas garras e seus dentes afiados, rasgando a pele de suas cabeças com os dentes ferozes... Vir se ajoelhou e começou a chorar com a cabeça entre seus joelhos. --- Você pediu isso Vir... --- Disse o Rei Noor --- Eu vou com você Noor... mas liberte meu povo... --- Lógico, essa é exatamente a minha ideia... libertar todos eles assim que voltarmos... --- Você sabe que nós nunca voltaremos --- gritou Vir enquanto se levantava e era seguro por dois soldados. --- Nós vamos voltar sim... essa será a sua comprovação de amor pelo seu povo. Vir se ajoelhou novamente e com os braços estendidos para as Montanhas de Candiu gritou. --- Ó nosso Deus, ajude meu povo das mãos desse homem... 33
--- Levem-no para dentro... hoje a noite iremos combinar nossa partida. Vir foi colocado em seu quarto e a imagem que não parava de passar por seus pensamentos era aquela dos Soldados Rãmm devorando aquelas mulheres... ele foi ao toalete e de joelhos vomitou por desespero. Para o Rei Vir, a Fenda sempre foi um lugar surpreendente. Sem que ninguém soubesse em várias ocasiões ele chegou perto daquele lugar e aquilo tudo intrigava aquele homem. Ali, ele encontrou artefatos que nunca soube bem o que era. Peças com detalhes nunca vistos naquele mundo em que vivem. Ele sempre achou que aqueles artigos rebuscados já tiveram vida própria e de certa forma, não pertenciam ao seu mundo. Ele analisava tudo isso e reservava numa espécie de ‘esconderijo’ para quando retornasse, continuava seus estudos sobre aquilo tudo. Noor, não se sabe como, sabia disso tudo e agora, depois de tantas conversas que teve com Vir e sempre recebeu respostas negativas, resolveu que fosse à forma da violência. O que mais incomodava era a forma que ele teria de conduzir essa expedição, Noor, há muito tempo estava obstinado com isso e o Rei Vir sabia que essa obstinação não o traria de volta, fato esse que caso ocorresse, seu povo não teria novamente a liberdade. --- Preciso conter minha ira...a vida do meu povo depende disso --- pensou Vir enquanto se sentava numa banqueta e olhava pela janela o galpão onde sua gente estava aprisionada --- são pessoas que eu amo demais e não posso deixar que sofram mais do que já sofreram...como pode um amigo de infância fazer isso comigo e com minha gente... A primeira noite foi chegando e o Rei Vir, encostado numa parede ao lado da janela adormeceu...
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Parte 8 Nem bem o sol nasceu e Nasser estava subindo pelas encostas das Montanhas de Candiu. Ele acordou assustado com uma espécie de pesadelo onde o Mago Sirio tentava alcançar seus braços num grande e profundo buraco e o chamava incansavelmente aos gritos. --- Venha... me de sua mão... venha Nasser... --- É um chamado de Sirio --- pensou ele assim que acordou suando --- preciso vê-lo... algo está para acontecer e ... deve ter a ver com a revelação... As Montanhas eram íngremes e perigosas e pesar disso, Nasser as conhecia muito bem. Em tempos passados ele e Noor caçavam ali. Desde sua adolescência as Montanhas eram o seu passatempo, mesmo com os apelos de seus pais, escondido de todos, ele subia naquele local em busca de aventuras. Ninguém sabia ao certo o local onde o Mago Sirio estava instalado, acham que não existe até hoje um local definitivo, mas Nasser sempre chegava perto do topo e gritava o nome de seu amigo, aguardava um pouco e ele aparecia entre as árvores. Foi o que aconteceu novamente dessa vez. --- Olá Mago Sirio... sonhei que você me acudia... O Mago, como sempre fazia se aproximou e beijou seu amigo no rosto. Eles tinham laços de amizade bastante forte. --- Você me parece preocupado... --- Outro discípulo chegou --- disse o Mago enquanto encostava-se a uma pedra. --- Eu... eu... o recebi em minha casa... --- disse Nasser temendo não ser um procedimento correto. --- Eu vi. Você sabe muito bem o que todos nós tememos. Noor, aquele velho Rato do Inferno está com Vir em suas mãos. Ele tomou seu povo como refém e espera chegar até a Fenda. --- Não... não sabia disso... --- Pois é... muitas mortes vão ocorrer... --- Vlater é outro que procura a Fenda... 35
--- O mistério daquele lugar está prestes a ser revelado e se isso acontecer será o fim dos tempos. Você sabe bem disso, as pessoas procuram a vida eterna e ali, a presença da morte e de outras dimensões é presente... o destino de toda nossa gente pode estar por um fio. Aos poucos, sabe-se que a Fenda não é um local tão desconhecido. Sabe-se que a magia brota naquele local e que revelações importantes para essa humanidade, a qual nem é só de humanos, pode estar em jogo. É um local que outrora fora selvagem, depois passou a ser santo e hoje, é mágico, cheio de acontecimentos que não são desse mundo e que pode alterar toda a vida existente. --- O que deveremos fazer? --- Eu vou seguir até lá, não posso deixar que outros, sejam desse mundo ou de outro tenham os poderes existentes na fenda para serem usados contra nós. --- Quero ir com você Sirio... --- Foi exatamente para isso que eu te chamei aqui. Vou precisar e muito da sua presença... assim que tivermos ‘elas’ em nossas mãos teremos o mundo. --- Partiremos assim que você ordenar. --- Antes dessa partida, preciso consultar alguns astros, estaremos indo para bem perto deles, mas farei isso da forma mais rápida possível. Venha comigo... Sem entender muito aonde estariam indo Nasser se levantou de onde estava e seguiu o Grande Mago. Numa certa altura da caminhada para o espanto dele, o Mago que caminhava logo a sua frente a menos de 4 metros desapareceu... Nasser parou, olhou ao redor e só via plantas ao seu lado e pedras sua frente... --- Venha amigo... --- era a voz do Mago que falava --mais três passos a sua frente... Ainda procurando o Mago e meio receoso daquilo tudo, Nasser deu mais 1... 2... e 3 passos... era como se ele houvesse atravessado um portal... Sirio estava bem a sua frente, caminhando a 4 ou 5 metros, como se nada tivesse acontecido... Nas36
ser olhou para os lados e viu as mesmas plantas enquanto a sua frente, logo a frente de Sirio, havia uma grande abertura que levava a uma caverna bastante iluminada... --- On...onde estamos... --- perguntou ele. --- Esse é o meu lugar... aqui faço meus experimentos... vejo tudo e ouço tudo... entre... sem receios... Apesar da antiga amizade entre Nasser e o Velho Mago, aquilo nunca antes havia sido revelado. Sempre que se encontraram foi na floresta ou nas pedras nas proximidades de onde estava há poucos instantes. A caverna era imensa. Um pé direito de aproximadamente 30 a 35 metros se elevava até uma espécie de cúpula natural com folhas ou algo parecido que deixava a iluminação do dia passar. Ao redor, centenas de frascos grandes de um vidro bastante transparente guardavam em um líquido espesso diversas criaturas que não se moviam, mas olhando de perto, Nasser percebeu que pareciam estarem vivas, soltavam bolhinhas de ar pelas bocas ou por seus corpos... alguns deles pareciam se mover vagarosamente. Do lado oposto eram armazenados vasos e mais vasos, centenas deles. Plantas conhecidas e outras das quais Nasser nunca tinha as visto. Avermelhadas, roxas, suculentas, carnívoras, iluminadas, algumas até faziam pequenos ruídos como se fosse uma mosca voando. Ao centro do grande salão, devidamente arrumadas estavam estantes repletas de livros de todos os tamanhos e de todas as línguas. O Mago se aproximou de um deles e disse. --- Veja isso! --- abrindo um desses livros com cuidado --- São códigos... não entendo... --- É uma escrita da qual você nunca ouviu falar. Ela também é de um outro mundo do qual você jamais imaginou existir... --- De onde é? --- Você já observou o céu à noite? --- Si... sim... várias vezes... 37
Uma das características do povo da Sirvia era a Astronomia. Esse povo há muito tempo desenvolveu a fabricação de vidros à partir da fina areia de suas praias. Além de assarem muito bem seus apetrechos de barro, o vidro está presente em todas as casas do continente seja em vasos, talheres, janelas, recipientes e ... as lentes. Isso começou com a descoberta do vidro ali. Os habitantes perceberam que bem perto do Monte James, ao sul do Continente, o calor daquele Vulcão vitrificou diversos materiais com o seu calor. Até hoje com sua lava incandescente o James expele material em temperaturas que passam dos 2 mil graus e com isso, aquele é um forno natural utilizado principalmente pelo povo de Melina, mas vários outros habitantes inclusive de outras aldeias, vendo que aquele era um achado lucrativo para troca nos mercados, resolveram se instalar no pé do Monte, onde confeccionam matérias e artefatos de vidro e os enviam para os vários pontos da Sirvia. --- Veja essa arte --- disse o Mago enquanto apontava para um desenho grande numa das paginas do livro antigo --você já viu isso? --- Sirio, meu amigo, minha capacidade não vai além de apenas me maravilhar com as cadentes e com as Luas que nos cercam --- disse Nasser sobre as 12 Luas que ficavam girando em volta do Planeta. --- Pois bem meu caro, a Fenda é uma passagem... uma passagem para esse mundo... misterioso e desconhecido e... principalmente... de onde não conhecemos o caminho de volta... existindo até a possibilidade de acontecer o que é o meu maior medo... Nasser olhou para o desenho e perguntou de certa forma com pavor... --- Qual é esse seu medo? --- Que esse portal não engula somente aqueles que querem conhecê-lo mas sim, todos nós... --- Co...como assim to...todos nós? --- Tudo que você conhece... as pessoas, as casas, as plantas, o mar, o vento e a chuva... tudo que está nessa sala e fora 38
dela... seria o fim dos tempos.
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Parte 9 Durante a noite, com as chamas das fogueiras e o barulho das conversas, muita gente foi chegando até a Praça Principal de Melina. Alguns já reconstruíam seus lares, crianças já brincavam e corriam de lá para cá e dava para notar ali a imensa capacidade que a população tinha em se esconder dentro de suas casas. Com as diversas erupções do Monte James, desenvolveu-se entre os cidadãos empreiteiros da cidade a construção de cápsulas fechadas sobre as casas. Lá, guardavam água, alimentos e roupas para que, quando ocorresse de o vento estar vindo do sul, do Mar e as nuvens de poeira invadissem o povoado, aqueles abrigos serviam de refúgio aos habitantes. Foi ai que os Soldados Rãmm não conseguiram ver toda essa gente que ouvindo os primeiros gritos perceberam que algo não estava certo e assim, correram e se trancaram nesses abrigos. Tudo tinha sido muito rápido desde a chegada deles na entrada da cidade e o grande aviso foram os enormes granitos lançados de catapultas que atravessavam assobiando por cima das casas e batiam nas paredes do Castelo fazendo grandes estrondos. Din e Jéssica comandavam a limpeza e ordem. Apesar de jovens, eles estudaram na melhor escola de Candiu e conheciam como ninguém o que significava as palavras, ordem e tolerância. Seu pai era um comerciante de vidros prontos e sempre viajava pelo Continente. Muitas e muitas dessas vezes ele carregava os filhos junto uma vez que sua esposa veio a falecer cedo, vítima de uma grave infecção após ter sido picada por um Sordão, um inseto daquela região que se prolifera nas paredes da cratera do Vulcão e já fez milhares de vítimas. --- Já refizemos várias das residências que foram danificadas. Acho que agora temos uma nova e perigosa empreitada... --- Disse o jovem menino que era observado por todos. 40
--- Acho que é a coisa mais importante para o momento... --- disse Jéssica --- Teremos de recompor nossas forças de luta, juntarmos as armas que acharmos no Palácio e faremos uma expedição a Nor, onde iremos libertar nosso povo e nosso Rei. --- É muito arriscado isso... --- dizia uma senhora --- Senhora, todos perdemos parentes e amigos, mas muitos ainda estão vivos e tenha certeza, não estão recebendo um tratamento de visita. Um homem forte que estava trazendo muita madeira queimada que foi trocada de sua casa largou o material e gritou --- Eu sou o primeiro a concordar! Todos olharam para ele. --- Refiz minha casa... não encontrei os corpos de minha esposa e de meu dois filhos... temo que se eles ficarem lá por mais tempo eu nunca mais os verei. Não me importo de perder a minha vida, pois sem minha família ela não vale nada. --- Eu também vou... --- E eu também... Logo, a maior parte dos homens da cidade estava reunido e alistado para a empreitada. --- Bem, já temos gente suficiente, acho que mais que isso só poderia atrapalhar --- disse Dim --- acho que agora é seguirmos até o castelo e revirar aquilo tudo em busca de armas. Iniciou-se uma busca pelas dependências do Palácio. Os funcionários que ali trabalhavam indicaram os locais onde poderiam ter armas guardadas e todos seguiram juntos enquanto outros ficaram na praça auxiliando no atendimento aos feridos e na reconstrução mais algumas casas. --- Venham --- disse aquele menino que foi resgatado no depósito secreto, ele que levava a comida para os soldados e conhecia aquelas dependência nas palmas da sua mão --- é por aqui. Entrando numa porta ao lado da sala do trono existia uma escadaria em espiral, tanto para cima como para baixo. --- O que tem lá em cima? 41
--- Esse é o acesso às torres... pode ser que lá existam armas dos soldados que estavam na guarda. --- E para baixo? --- Lá em baixo ficam os alojamentos, banheiros e armários dos soldados... --- Muito bem. Jéssica você segue que metade do grupo lá para cima e o resto vem comigo aqui em baixo. Feito isso lá foram eles, sem pressa, mas num passo firme pois muitas das paredes tinham pedras soltas e a qualquer movimento mais brusco tudo aquilo poderia desabar. Assim que o grupo que desceu as escadas chegava na parte mais interior um deles disse. --- Parem um pouco... acho que estou ouvindo vozes... Todos ficaram atentos esperando ouvir alguma coisa até que, de uma parede logo atrás de onde eles estavam eles ouviram algo... --- Tem alguém ai! --- Disse um dos homens. Dim se aproximou da parede e começou a bater nela com uma pedra e gritou --- Tem alguém ai? No mesmo instante ouviram vozes dentro daquela sala --- Nossa, essas pessoas estão ai há 4 dias... devem estar fracas --- Melhor derrubarmos a parede, o acesso pelo corredor que leva a porta de entrada está obstruído... --- Sim... mas vamos fazer isso com cuidado --- Alguém tem uma marreta ou um machado? --- Eu tenho --- disse Jéssica e o grupo que havia subido as escadas --- Jéssica... --- Nossa, achamos muita coisa lá em cima... os homens estão carregando as armas e mais suprimentos em sacos, eu vim chamar vocês para nos ajudar, mas vejo que vocês precisam de mais ajuda aqui... --- Sim... ouvimos vozes através dessa parede... --- Tenho aqui uma marreta pesada que eu achei... 42
--- Deixe que eu bato... Um homem bastante forte começou a bater e logo a parede estava furada... Dim se agachou e colocou a cabeça e qual não foi sua surpresa ao ver que uns 20 soldados vivos o observavam de dentro da sala... --- Esperem um pouco... vamos tirá-los daí... afastem-se O homem forte continuou a bater na parede até que pelo buraco as pessoas que ali estavam pudessem atravessar. --- Muito obrigado amigos... --- disse um dos guardas... --- Foi muita sorte vocês terem sobrevivido... --- Sim...muita sorte... temos feridos aqui e viemos pelos corredores desde o refeitório até aqui... nossa próxima parede a ser quebrada seria exatamente essa, mas já não tínhamos mais forças então resolvemos descansar um pouco, foi quando ouvimos vozes e as batidas na parede... --- Vocês são soldados? --- Sim... assim que iniciou o bombardeio de pedras estávamos nos preparando para entrar na guarda e ai, tudo veio abaixo e não pudemos ver nem fazer mais nada... --- Que sorte a de vocês... --- Muita sorte, mas sentimos não poder ter ajudado... --- Bem, nosso Rei e parte de nossa gente foi capturada e agora são reféns de Noor... viemos atrás de armas para o resgate... --- Venham, vamos voltar até o alojamento... armas é o que não falta, só não temos mais água nem comida. --- Ótimo, alguns de vocês peguem os feridos e levem até a praça principal, lá encontrarão remédios e muita comida... o resto, venha comigo e vamos buscar essas armas. Lá fora já estava escuro e as pessoas se juntaram para conversar e discutir como seria feito o resgate... cansados, todos logo adormeceram.
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Parte 10 Vlater aparentemente tinha uma boa experiência em obras e em resgate. Ele comandava vários homens da aldeia dos Margos e tudo que ele pedia para que os outros fizessem eram nitidamente tarefas extremamente necessária para a resolução. Com pás, ele retirava montanhas de neve que se cumulavam na frente das casas, entrava e ajudava homens, mulheres e crianças a saírem ilesos dali, ao menos o tempo necessário para que ele verificasse os danos e organizasse os devidos reparos. Aiua olhava impressionado como aquele homem não parava e por várias vezes chegou perto de Lilly e perguntou. --- De onde surgiu esse homem? Lilly então olhava para o homem, já bastante molhado e sujo de lama e dizia. --- Não sei meu amigo, ele simplesmente apareceu... do nada! Até que os reparos fossem feitos e os feridos medicados passaram-se horas e num momento em que ele ainda estava recolhendo as cordas e as enrolando em seus braços Lilly e Aiua se aproximaram dele e disseram --- Só temos a te agradecer, mas não temos nada para pagar por essa sua ajuda... --- Eu não quero pagamento... faço isso pela necessidade --- Você mal chegou e já te convocamos para um trabalho tão árduo... --- Acho que ainda há muito que fazer, mas no momento acho que deveríamos descansar um pouco... Lilly olhou para o terreiro e viu que as pessoas tinham organizado um grande jantar para todos. --- Você deve parar agora... todos nós vamos parar e vamos nos limpar para comermos e depois descansarmos a noite. --- Vou agradecer pela comida... todo esse trabalho me 44
abriu o apetite. Unidas naquele momento as mulheres e os poucos homens da Aldeia dos Crendes se juntaram ao povo Margo. Muita comida estava colocada numa espécie de oca sem paredes no meio do terreiro bem onde estavam os feridos e que agora já tinham sido levados a aposentos mais cômodos. --- Temos água encanada trazida do Rio Car. É uma água limpa, mas está bem gelada. --- Vou me lavar, depois volto para jantar com vocês. Vlater foi até onde tinha deixado seu casaco com gorro e seu cajado e depois de pegá-los foi até o local onde Aiua disse ter a água para o banho. A mesa estava colocada para os habitantes das duas aldeias. Numa parte da mesa travessas de vegetais crus e cozidos, arroz enrolado com algas e bolinhos de milho assados. Do outro lado tinham carnes de aves assadas na fogueira, farinha de Tauá, uma raiz muito comum na região, amendoim cozido pães feitos de milho e de Tauá. A noite estava agradável, ao menos para aquela região fria, nessa noite, particularmente, não estava tão frio. As luas iluminavam o terreiro e chegavam a fazer sombras fortes nas laterais das barracas. Dizem por ali que ‘a chuva espanta o frio’ e naquela noite não foi diferente, a temperatura era de aproximadamente 10 graus. Aos poucos todos iam se servindo e se acomodando em algum canto para fazer sua refeição. Vlater fez um prato com quase tudo que tinham servido e estava caminhando para um canto quando ouviu Aiua falando. --- Vlater... sente-se aqui conosco! Valter olhou e numa mesa com bancos corridos estavam Lilly, Aiua e mais umas 3 pessoas. --- Não quero incomodar... --- nem bem acabou de falar e Aiua disse --- Sente-se aqui homem, você nos ajudou muito... precisamos conversar... Durante o jantar todos conversaram sobre as comidas, 45
como eram cultivados, colhidos, como eles preparavam os temperos deliciosos. Falaram sobre a vida das duas comunidades das intrigas e dos trabalhos que realizaram juntos sobre a educação que davam aos filhos. Lilly ficou um pouco incomodada em comentar que os homens de sua aldeia morrem bem mais cedo que as mulheres e as poucas crianças que nasceram nos últimos anos eram quase todas do sexo feminino... disse que isso era um problema sério e se isso continuasse, o legado dos Crendes iria terminar em breve, quando a última mulher morresse. --- O Mago Sirio me persegue --- disse Vlater quando indagado se ele tinha ocasionado àquela tormenta destruidora --ele bem sabe que estou no Continente e sei que ele não me quer por perto. --- Sirio e Nasser nunca querem ninguém por perto --disse Aiua --- Amanhã cedo gostaria de conversar com vocês dois numa trilha no Pântano... --- No Pântano? --- pensou Lilly --- Sim... sei o que vocês estão pensando, mas nada de mal irá acontecer... A Noite chegou e cada um deles se acomodou num canto e adormeceram. Eles sabiam que teriam grandes novidades no dia seguinte.
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Parte 11 Noor entrou nos aposentos onde estava o Rei Vir e logo foram chegando empregados com dezenas de sacolas, frasqueiras, material de cozinha, alimentos, etc. --- Noor --- disse Vir --- Acho que você não está entendendo... nós não estamos indo a um passeio nem a um ‘picnic’ no campo... isso só vai atrapalhar... --- Mas temos de comer e beber, teremos de dormir, relaxar para um próximo dia... vamos levar alguns soldados que nos ajudarão com isso! --- Eu conheço bem o lugar. O terreno não é propício para grande pesos e com todos esses odores de alimentos não iremos caminhar 5 quilômetros floresta a dentro sem sermos abordados por criaturas ferozes que além de atacar a comida ira atacar a nós mesmos. --- E como você acha que devemos proceder? --- Só eu e você. Partiremos hoje ao início da segunda noite quando o tempo estará mais fresco e alcançaremos a floresta logo ao amanhecer. Ganharemos mais tempo com isso. --- E como iremos nos alimentar? --- Você é quase um Mago Noor. Será possível que tantos anos de experiência ao lado de Sirio você não aprendeu que a floresta está repleta de ervas e de frutas. Lá encontraremos riachos com água fresca e potável. Noor olhou para todas aquelas bagagens e pensou melhor, a sala estava repleta de material. --- Guardas... tirem tudo isso daqui... --- Eu poderei acompanhá-los? --- perguntou o Gigante Grey Noor olhou para Vir com um semblante de questionamento, olhou para Grey e disse. --- Você vai com a gente... vamos nós três... desça e prepare um de seu soldados para que assuma a guarda da cidade quando não tivermos a sua presença aqui. 47
--- Sim Senhor meu Rei --- disse Grey enquanto ordenava a retirada de todas as malas e materiais da sala. Vir cresceu naquela região da Floresta. Apesar de ter nascido em Nor, seus pais, mercadores de vidro e de outros materiais, constantemente seguiam para a região de Melissa e do Monte James. Com o tempo acabaram se instalando ali até que o local foi recebendo imigrantes da Siria e de outros Continentes e cresceu o suficiente para se tornar uma Aldeia independente onde o primeiro Rei dela foi seu pai. Com a morte dele, Vir foi aclamado Rei pela população e até hoje controla aquele lugar e a sua população. Ele é uma pessoa bastante centrada e procura dirigir os rumas daquelas vidas com a colaboração de conselheiros do povo e de toda a gente que ali se instalou. --- Qual será o nosso plano? --- Sente-se aqui... --- disse Vir abrindo um grande mapa da região --- Sairemos de Nor, como já disse, logo no início dessa noite. Caminharemos pelas estradas que levam ao Leste até chegarmos a beira da Floresta ao amanhecer, para isso teremos de apertar o passo e faremos paradas apenas para rápido descanso. Quando o Sol estiver clareando a região, seguiremos pela Floresta até alcançarmos o sul da Fenda. O caminho em mata fechada é menos cansativo, pois as árvores encobrem o sol, mas o número de criaturas não diminuirá. Essa região, como você bem sabe, tem uma enorme população de criaturas tanto de dia como à noite... ao menos caminhando de dia poderemos observar melhor esses perigos. Vir olhou para Noor e ele estava de cabeça baixa... --- Em que está pensando? Noor levantou sua cabeça, levou suas duas mãos te a parte de trás da cabeça e repentinamente retirou a máscara que cobria seu rosto... --- Por todos os Deuses --- exclamou Vir ao olhar para o rosto do Rei Noor --- Há muito tempo você não via meu rosto não é mesmo 48
amigo? O rosto de Noor era uma coisa medonha. Com o uso contínuo daquela máscara, sua pele tinha diversos ferimentos causados pela umidade e pela falta de luz. Seus poros se alargaram e aquilo parecia uma massa de farinha branca e crua. Seus lábios, tinham inchamentos nas partes superiores perto das narinas e seus olhos, foram rasgados quase se orelha a orelha deixando uma cicatriz profunda onde dava para ver a cartilagem da parte superior do nariz e o osso da face bastante exposto. Noor não tinha glóbulos oculares. A retina propriamente dita ficava presa pela da pálpebra que nunca piscava e as glândulas lacrimais formavam uma massa líquida amarelada próxima aos seus olhos. --- Isso foi uma obra de Sirio... --- disse o Rei em voz baixa --- Você não enxerga nada? --- Vejo vultos, mas tenho a capacidade da percepção de presença. Minha audição é bastante aguçada e consigo perceber uma agulha caindo no chão a dez metros de distância... para mim não há dia e noite... sempre vejo um acinzentado escuro no meu horizonte, mas mesmo que você esteja atrás de mim se movendo lentamente consigo ouvir s dobras de suas roupas se torcendo, o caminhar descalço de um Monge sutil, ou a respiração de qualquer ser vivo que me rodeia. Mesmo após ter visto o que Noor fez e está fazendo com o Povo de Melina, Vir sentiu pena daquela criatura afinal eles foram criados juntos em Nor e como já foi dito, lutaram juntos na guerra contra os invasores Canji ainda quando seus pais eram vivos e reinavam seus povos. --- Você tem certeza que quer ir naquele lugar Noor? --- Não tenho mais nada a perder meu caro... lá, tenho certeza que reencontrarei luz e depois poderei viver em paz... preciso das cartas. --- Ali não existe cura... só morte e vestígios de um mundo diferente do nosso... --- Esse mundo conhece melhor a magia da cura... --- Como é que você pode ter tanta certeza disso? 49
--- Você bem sabe disso meu caro... --- disse Noor retirando um artefato do bolso de seu casaco e mostrando a Vir... --- isso não é nosso... como pode alguém ter o conhecimento para fazer uma coisa dessas e não ter o conhecimento da cura, da vida eterna... me diga... O artefato eram duas argolas grossas de ferro que estavam uma passando dentro da outra, como dois elos de uma corrente. --- Guardo isso como um amuleto... veja... não existem marcas de união, isso foi esculpido por alguém que tem poderem maiores do que qualquer Mago que conhecemos...tenho certeza que é o poder ‘delas’... Apesar de já conhecerem e fabricarem o ferro bruto, o povo da Sirvia ainda não contava com grandes fundições de ferro e de aço. Fabricavam barras à partir do metal e delas a afinavam para confecção de pontas de flechas, lâminas de espadas e material pontudo para uso na agricultura. Era um ferro ainda bastante deficiente, cheio de impurezas que muitas vezes se quebrava quando utilizado. --- Liberte os prisioneiros do meu povo Noor... eu te imploro... --- Não... nunca --- dizia ele enquanto voltava a amarrar a máscara cobrindo seu rosto --- essa é minha única certeza que você me guiará... --- Solte o povo e eu te dou a minha palavra de que darei a minha vida pela sua... --- Eles vão ficar bem... antes de anoitecer e de partirmos você poderá vê-los... estão recebendo banho, comida e bebida e estão bem acomodados... na nossa volta eles poderão então voltar para Melissa. Vir se conformou com aquilo. Ele sempre conheceu a teimosia de Noor, desde a juventude, sabia que quando ele diz uma coisa e mesmo que veja estar errado ele nunca volta atrás. --- Vamos nos preparar e descansar --- disse Noor --- antes do anoitecer eu venho aqui e então partiremos. Sem dizer nada Vir concordou com a cabeça, ele não tinha 50
nada ali para arrumar a n達o ser a roupa que vestia. Deitou-se na cama e procurou descansar um pouco.
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Parte 12 Assim que Lilly despertou e foi a beira de um pequeno riacho, ainda na Aldeia Margo notou que Vlater auxiliava uma família de moradores na reconstrução de sua casa à qual foi quase que inteira colocada abaixo por causa do gelo que desceu das Geleiras do Norte trazidas pelo Rio Car. Aiua estava no telhado da casa e enquanto Vlater preparava folhas grandes de Palmeira para a cobertura, outros homens iam passando as mesmas para que ele as colocasse com as devidas amarras de forma que o vento não as tiraria do lugar e nem a água da chuva entrasse na parte de dentro da casa. --- Olá pessoal... --- Bom dia Lilly, acordou com o barulho? --- Não...que nada... acordei com fome e estou louca para saber o que Vlater vai querer com a gente --- disse Lilly sem notar que Vlater se aproximava dali trazendo mais folhas de Palmeira. --- Vocês querem conversar agora? --- Vamos lá --- disse Aiua já descendo do telhado --- Vamos --- afirmou Lilly --- Venham comigo --- disse Vlater gentilmente já caminhando em direção ao Pântano enquanto os dois o seguiam. A trilha não era demarcada. Poucas pessoas passavam por ali uma vez que todos sabiam dos perigos do Pântano. Assim que sairam da trilha e começaram a sentir o terreno úmido e arenoso Vlater parou e esperou que eles se aproximassem. --- Toda vida de vocês e de sua gente corre perigo... vocês sabem disso? Os dois ficaram olhando para o homem enorme sem saber o que dizer --- Soubemos que Noor invadiu Melissa e fez diversos reféns --- disse Aiua que sempre sabia das notícias uma vez que seus mercadores andavam por todo o Continente. 52
--- Duas expedições estão se formando nesse exato momento... Noor e Vir formam uma delas e a outra e bastante perigosa é formada por Nasser e o Mago Sirio. --- Para que são essas expedições? --- Vocês já ouviram falar da Fenda não é mesmo? --- Si...sim... eu já ouvi muitas histórias daquela região --- disse Aiua --- já até passei lá por perto mas, como já soube também de muita gente que se aproximou daquele lugar e nunca mais retornou, nunca me atrevi a chegar muito perto, mesmo porque nosso povo não acredita daquilo que falam que ali moram os demônios... --- Eles tem razão Aiua... --- E afinal o que alguém pode querer tanto num lugar onde vão encontrar com demônios? --- perguntou Lilly --- Sabe Chefe Lilly --- disse Vlater --- Demônios para a maior parte do povo é uma palavra bastante mística ligada à morte, a sofrimento, coisas ruins... isso nem sempre é verdade... a crença nos demônios pode estar ligada a uma natureza mortal ou divina que podem agir ou interferir em inspiração ou aconselhamento. Os dois chefes ficaram olhando para Vlater meio que sem compreender onde ele queria chegar. --- Não tenho certeza, mas eu vim de muito longe para chegar a esse lugar, essa fenda. --- E o que você quer da gente? --- Quero a companhia de vocês... --- O que a gente ganha com isso Vlater? A morte? --- Não sei bem ao certo o que vocês ganhariam, mas sei que se essas pessoas chegarem lá sem alguém por perto para vigiá-los poderá iniciar um triste fim para a vida desse planeta. --- Como assim? --- Aquela Fenda tem algo a ver com tudo que a gente conhece e o que não conhecemos. Os Sois, as doze luas, as estrelas, a água dos rios, as Montanhas, as plantas e os serem que caminham por todos os cantos. A Fenda pode ser uma resposta para muita coisa ruim que ocorre, e se essa resposta for do co53
nhecimento de mentes do mal, essas mentes poderão usar de uma forma equivoca e assim, exterminar toda a vida. --- Me diga uma coisa --- disse Lilly --- fale em poucas palavras o que nós vamos fazer lá... --- Vamos interceptar o mal... vamos salvar o povo de vocês e todos os outros povos... não sei ao certo o que encontraremos mas, tenham certeza que se eles encontrarem antes de nós... será o fim. Aiua e Lilly ficaram pensativos, sem saber ao certo o que fazer. --- Vejam isso --- disse Vlater cravando seu cajado no chão arenoso. Num momento uma fumaça de vapor começou a sair da terra e nessa fumaça eles podiam ver imagens de pessoas, muitas pessoas que corriam desesperadamente numa só direção... não havia som mas dava para notar que as pessoas gritavam apavoradas ao correr... de repente, num piscar de olhos, uma chama muito clara apareceu onde as pessoas estavam correndo e todas elas eram queimadas vivas, ainda correndo e gritando, até que a chama se dispersou e só restaram centenas de corpos carbonizados no chão... tudo se apagou e restou uma fumacinha de vapor que logo sumiu com o vento. Boquiabertos os dois levantaram a cabeça que olhava aquelas fixamente aquelas cenas e olharam para Vlater que mantinha sua cabeça virada ao chão, ai ele disse. --- Esse será o fim de todas as espécies, inclusive da de vocês. --- Quando iremos partir e como chegaremos até esse local? --- perguntou Lilly --- O caminho até lá é muito longo, mas existe uma passagem que nos levará até a entrada norte da fenda. --- Onde é essa passagem? --- perguntou Aiua Vlater se virou para a imensidão do Pântano e apontou seu cajado dizendo --- É por ali... teremos de atravessar o Pântano e chegaremos até ela. 54
--- Como passaremos pelo Pântano? Esse lugar é misterioso... quem se atreveu a tentar passar por ele nunca mais foi visto --- disse Lilly --- Saberemos quando e como atravessar. --- E quando partiremos? --- O mais rápido possível... amanhã cedo, assim que o grande Sol nascer... iremos nós três e carregaremos só aquilo que é extremamente necessário. Já era hora do almoço na Aldeia Margo quando os três reapareceram pela mesma trilha de onde tinham partido. As pessoas paravam um pouco o trabalho para fazerem suas refeições. Lilly chamou sua gente que ali estava para ajudar e se sentaram bem debaixo de um grande Candiu onde ela disse que partiria e em breve iria retornar. Aiua, da mesma forma, chamou seus conselheiros e alguns dos mais velhos da tribo e se sentou na Oca aberta para conversar com eles. Vlater por sua vez, pegou um pedaço de carne que estava numa tigela de barro e sentou-se num canto sozinho onde passou a comer olhando para a mata que ficava antes do Pântano... quieto... apenas comendo e observando...
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Parte 13 Din, Jessica e um pelotão de 20 homens formado por 12 guardas do Palácio de Vir e 8 homens fortes da própria população saíram pela manhã em direção a Nor. A rota que eles resolveram seguir era caminhar pelo sul do Continente, pelas praias planas que vão de Melina até a Foz do Grande Candiu, quando ele deságua no Mar. Depois, construiriam embarcações com Bambu, que é bastante abundante naquela região e pelo Rio iriam seguir até a entrada sul de Nor. Apesar do Sol forte, eles seguiram pelas praias e vez ou outra eles se refrescavam no Mar. --- Estamos chegando na Foz do Candiu --- disse Din aos seus comandados --- Vamos descansar um pouco --- dizia Jessica --- ao menos o tempo de comermos alguma coisa e respirarmos um pouco. Daqui, teremos de remar contra a correnteza por quase 15 quilômetros e teremos de estar com todas as nossas forças. --- Ótimo... acho que aqui é um bom local para essa parada --- disse Din apontando para um aglomerado de árvores altas. As armas e os materiais foram descarregados e alguns deles caminharam até Foz do Rio onde as águas se encontram com as do Mar e ali, por causa da correnteza, vários cardumes de peixes pequenos ficam parados até conseguirem subir um pouco o Rio e assim fazerem a desova. Din ascendeu uma pequena fogueira e eles começaram a cozinhar milho enquanto conversavam. --- Din --- perguntou um dos homens --- eu fico pensando em qual foi a finalidade do Rei Noor fazer o que fez com nossa gente... não vejo um porque disso... --- Verdade... eu também não posso imaginar isso --- disse outro homem --- Sabem... eu tenho uma ideia --- falou um soldado do Rei Vir 56
--- O que você acha? --- Mesmo que a gente não queira, sempre que estamos de guarda no salão do trono acabamos ouvindo as conversas entre as pessoas que ali estão. Como eu sou um guarda mais velho, quase sempre sou designado a ficar ali fazendo uma espécie de escolta ao Rei todas as vezes em que ele recebe visitas, mesmo que sejam pessoas amigas... --- Eu sei disso... acho que é uma forma de demonstrar o poder do Rei... acho que para impressionar as pessoas... mesmo sendo o Rei Vir a pessoa boa que todos nós sabemos que é... --- Exatamente isso... muitas vezes o Rei me chama perto da mesa e me dá pão com carne e já aconteceu até dele me dar um copo com aguardente de Figo, imaginem... Os homens que foram pescar voltaram com a rede e um cesto pequeno contendo mais de 2 dúzias de peixes pequenos, do tamanha de sardinhas. --- Olha... vocês conseguiram bastante --- disse Jessica que se prontificou a ajudar espeta-los em varas de Assa peixe, uma árvore comum que tem os galhos bem úmidos e não se incendeiam com facilidade. --- Bem, continue dizendo --- perguntou Din ao homem que falava, agora com todos prestando a atenção nele. --- Pois é, como eu dizia a gente escuta, mesmo que sem querer as conversas do Rei e numa dessas vezes que eu estava na guarda do salão eis que surge o Rei Noor VI com aquela sua máscara horrorosa. Ele estava um pouco irritado e chegou falando em um tom de voz um pouco mais alterada com o Rei e no momento que eu me aproximada deles o Rei se virou para mim e disse “não se preocupe... conheço bem esse cidadão e sei muito bem o que ele está querendo há muito tempo”. --- O Rei Vir faz de tudo para não entrar numa briga... Todos ali concordaram com a cabeça. --- E ai? --- Muito bem, fiquei ali por perto e prestei ainda mais atenção no que eles falavam, agora em tom de voz mais baixo e o Rei Noor queria porque queria convencer o Rei Vir a levá-lo a 57
algum local que ele não queria ir de jeito nenhum... --- Que lugar será esse? --- Calma...eu chego lá... --- continuou o soldado --- eles discutiam que o tal local num prestava para coisa boa, conversaram sobre as amizades de infância, sobre seus pais que eram bastante amigos até que numa certa altura dessa conversa Noor disse... “eu quero que você me leve até a Fenda” Todos eles pararam o que estavam fazendo. Jessica se levantou devagar e disse --- A Fenda é um lugar amaldiçoado... lá em casa meu pai sempre dizia que perdeu um monte de amigos naquele lugar e que era para a gente nunca se aproximar dali... como nós mesmos, crianças ainda perdemos vários conhecidos, aprendemos e crescemos com o pensamento de que ‘nunca deveríamos chegar nas imediações da Fenda’. --- Acho que isso aconteceu em todas as famílias de Melina... --- Eu ainda digo mais, acho que isso aconteceu em todas as casas da Sirvia --- Pois é... foi isso que aconteceu --- completou o guarda --- Vocês acham que Vir foi obrigado a levar Noor até aquele lugar? --- Olha Din, certeza nós não temos, mas essa é uma grande possibilidade... quando contei isso ao guarda que iria me render ele me disse que já não era a primeira vez que Noor colocou Vir na parede fazendo esse pedido. --- Vocês falando isso agora, eu tenho quase certeza que foi o motivo para tal assalto... Os peixes ficaram assados e todos começaram a comer em silêncio. Todos ali receberam educação até para não comentar nada sobre a Fenda e o medo sempre prevalece nas pessoas de bem --- Nós poderemos verificar isso... --- disse Jessica enquanto todas a olharam um pouco assustados. --- O que você quer dizer minha irmã? --- Mais cedo ou mais tarde saberemos do que realmente 58
aconteceu... e se soubermos que Noor raptou nosso Rei e nosso povo para levá-los até a Fenda? --- Mas... o que ele faria com essas pessoas ali? --- Essa é a pergunta que estamos nos fazendo desde o início dessa nossa conversa... --- Você está pensando em... --- Sim --- disse Jessica prontamente --- estou pensando em salvar nosso Rei e nossa gente caso esse crápula chamado Noor tenha levado eles para a tal Fenda --- Bem, nem sabemos então se eles estão em Noor... --- Eu sei onde fica a Fenda --- disse um dos homens --- Esperem um pouco --- falou Din --- vocês estão querendo mudar a nossa empreitada e acham que antes de irmos para Nor deveríamos ir para a Fenda? Todos ficaram se entreolhando com ar de dúvidas. --- Nosso povo e nosso Rei foram levados para Nor --- disse Jessica em tom firme --- acho que estamos no caminho certo... devemos seguir até Nor e ali, depois de resgatar nossa gente ou ao menos saber para onde foram levados tomaremos outra decisão... acho que não devemos nos desviar desse objetivo. --- Você está certa Jessica --- disse Din e os outros concordaram --- vamos começar a cortar Bambus para fazermos as Balsas... nosso destino será entrar na próxima noite em Nor e libertar a nossa gente... caso não estejam lá iremos então atrás deles onde quer que estejam. Todos se levantaram e com lanças e facas afiadas confeccionadas com vidro de alta qualidade começaram a cortas Bambus e Cipós para a fabricação das Balsas.
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Parte 14 A noite estava fria, mas bem iluminada por 6 das 12 luas daquele Planeta. Nasser e Sirio partiram assim que o Sol se escondeu. Uma Balsa, previamente chamada por Nasser, os atravessou das Montanhas de Candiu pelo Lgo Don até o início da Mata onde ambos foram deixados e seguiram pelas trilhas abertas da chapada. Em linha reta do lago Don para o Leste eles iriam chegar ao Norte da enorme fenda em uma noite e um dia de caminhada acelerada, caso nada acontecesse. Apesar da idade bastante avançada o Mago Sirio caminhava à frente carregando a tiracolo um embornal e sempre se apoiando em seu cajado de madeira. Nasser caminhava atento logo atrás e carregava uma pequena mochila nas costas ale de trazer nas mãos uma lança com ponta de vidro, um presente que recebeu de um mercador de vidros há muitos anos atrás. --- Foi uma boa ideia a sua termos atravessado uma boa parte da mata pelo Lago Don --- disse o Mago sempre caminhando a frente --- ganhamos várias horas de caminhada e chegamos no meio da Planície sem correr perigos desnecessários. --- Pensei isso ontem à tarde e logo pedi ao meu chefe de navegações que providenciasse a embarcação. --- Tomara que quando chegarmos lá os ventos estejam do Norte para o Sul ou de Oeste para Leste, ai não teremos de vestir máscaras para nos protegermos dos gases. --- Você acredita em grandes perigos Sirio? --- Pode esperar pelo pior meu caro... a Fenda é um lugar bastante cheio de perigos e de mistérios... ali existe o desconhecido e esse será nosso grande desafio. --- Me diga Sirio... você já esteve na Fenda? --- Já estive, algumas vezes... --- E o que encontrou ali? 60
--- Além de objetos e de criaturas que eu nunca havia as visto, encontrei o medo... --- Você teve medo? --- Todos têm medo do desconhecido, ainda mais quando ele se posta a nossa frente e passamos a conhecê-lo... a Fenda produz alucinações nas pessoas, é um lugar com muita magia e muita energia de todas as estrelas que podemos ver nas noites mais limpas. Não sei se você me entende Nasser... --- Acho que ainda não entendo mesmo... --- Quando eu te disse que caso Noor chegue lá e domine a Fenda, então seu poder será sobre nós e sobre nossas vidas e de todos aqueles que conhecemos e isso poderá ser o fim dos tempos... Aos poucos ambos chegavam perto da e as sombras da primeira noite vinham com eles. Nasser não falava nada, mas chegava a ficar arrepiado em pensar o que poderia acontecer com ele. --- Espere um pouco --- disse o Mago --- O que foi Sirio... --- Sssshhhh... não fale nada e não se mexa... Nasser e Sirio permaneceram imóveis até que, mesmo na penumbra do lusco fusco perceberam que os arbustos ao lado de onde estavam começou a se mexer. --- Que será que é isso? --- pensava Nasser Repentinamente o arbusto parou de sacudir e ambos sentiram que alguma criatura ou algumas criaturas das quais eles não podiam ver os rodeava. Era como se um cachorro cheira a gente nas pernas sem emitir som... a gente sente a respiração da criatura encostando na nossa pele e nas nossas roupas. Vagarosamente Sirio virou a cabeça e olhou para Nasser que tinha o rosto transfigurado de medo, sem saber o que fazer. Nasser sem mexer a cabeça levantou os olhos e viu que Sirio o fitava e piscava os olhos lentamente... ele permaneceu ali... parado... podia ouvir o batimento de seu coração somente sentindo que aquela ‘coisa’ estava ao seu lado. Passaram-se alguns segundos, ou minutos e Nasser com 61
a lateral dos olhos notou que a relva a sua direita estava amassada, como se ali houvesse um animal ou algo a amassando contra o chão, deveria ter um diâmetro de 1 metro mais ou menos. A criatura o observava, mas não conseguia identificar o que era então, não atacou. A relva se ergueu sozinha e aquela respiração começou a ir embora pelo mesmo arbusto por aonde chegou. Assim que tudo voltou ao normal Sirio chegou bem perto de Nasser e disse bem baixo --- Você sentiu? Nasser somente acenou que sim com a cabeça. --- Ouvi falarem que se chamam Orbs... dizem que são espectros, almas de serem que já morreram e que vagam por todas as estrelas e planeta... alguns são destruidores de vidas... acho que esses eram alguns desses... se fossem outros que chamam de ‘famintos’, teriam nos devorado... ou ao menos nos atacado... sentem cheiro de carne a muitos metros e ficam enlouquecidos... acho que demos sorte, mas vamos seguir com muito cuidado, ainda mais sem luz para enxergarmos a distância. A primeira noite foi terminando e logo estaria escuro novamente. O vento frio cortava a pele e tanto o Mago como Nasser se cobriram com tocas quentes de lã de Lhama. --- Vamos Nasser, teremos de entrar na Floresta e procurar um abrigo seguro... se é que existe algum lugar seguro nessa Floresta. Os dois caminharam ainda por mais uma ou duas horas até entrarem na Floresta Negra. Nasser esteve ali naquela região por uma ou duas vezes, mas nunca foi tão longe. Ele saia sempre com seus soldados para caçarem criaturas Rãmm selvagens só por diversão e treino com arco e flecha. Hoje, seu maior medo era encontrar uma daquelas criaturas que ele chegou a ferir sem matar pois ele sabe que os Rãmm tem uma memória enorme para reconhecer tanto comida como seus antigos predadores. --- Vamos parar por aqui Nasser --- disse o Mago apontando para uma pequena elevação de pedras --- aqui, ao menos 62
a nossa retaguarda estará protegida e se alguma coisa se aproximar só poderá ser pela nossa frente. --- Vamos acender uma fogueira? --- Não...de forma alguma... a fumaça e a claridade só podem servir de chamariz para saberem exatamente onde estamos. --- Estou com fome. --- Melhor comermos frutas frescas para não soltar cheiro... qualquer coisa poderá chamar a atenção dessa coisas que não temos a mínima ideia de suas intenções. A noite chegou de vez. Nem a luz das Luas atravessava aquela barreira de árvores logo acima deles. Aos poucos barulho de insetos rasteiros e voadores, pássaros da noite e mamíferos que brigavam ou uivavam à distância podiam ser ouvidos. Nasser e o Mago comeram frutas sem deixar que uma só gota escorresse ou caísse em suas roupas, tudo para não despertar fome em possíveis feras que poderiam vir a atacá-los. Nenhum dos dois dormiu, o Mago apenas fechava seus olhos e entrava numa espécie de transe para tentar descansar um pouco. Nasser apenas mantinha os olhos abertos para o nada. Ele não via dois dedos à frente de seus olhos. Pensou em tudo naquele momento, até nos olhos do Rei Noor que ele assistiu o Mago Sirio golpea-lo com sua magia deixando-o cego.
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Parte 15 Naquela mesma noite em que Sirio e Nasser partiram em direção a Fenda, Vir, Noor e seu fiel escudeiro o Gigante Grey também deixaram Nor em direção ao mesmo desconhecido. Antes disso, Noor levou Vir até onde estavam quase cem reféns do povo de Melina os quais foram capturados naquele mesmo dia em que a cidade foi invadida e o Rei Vir feito prisioneiro. Lá, Vir se comprometeu a voltar a salvo e trouxer com ele o Rei Noor o qual confirmou diante todos que nesse dia em que eles chegassem, todos seriam colocados em liberdade e que ele pagaria com material e sérvio de seus guerreiros para a reconstrução das residências e do Castelo de Melina. Diante do Rei Vir, Noor chamou o responsável pelo ‘alojamento’ dos reféns e ordenou que os mesmos fossem bem tratados com alimentos, água, frutas e que tivessem paz nas noites de sono. Vir, bem como as pessoas de seu povo, não acreditou muito naquela ‘jura’ que foi feita diante todos eles, mas ao menos, até aquele momento, eles vinham sendo bem tratado, ao menos foi o que disseram ao seu Rei quando dessa visita. Nor fica ao lado da margem leste do Grande Candiu e assim, eles caminharam até um certo ponto de partida e depois seguiram montados em cavalos devidamente selados e com material acondicionado para a jornada. Nas celas foram colocados cestos com alimentos, ferramentas e algumas ervas medicinais de primeiro socorro para caso acontecesse alguma coisa durante a expedição. --- Com sorte, chegaremos ao próximo anoitecer nas margens da Fenda. Com os cavalos fortes poderemos fazer somente uma parada para descanso e depois seguiremos em frente. --- Será que é bom chegarmos no meio da noite na Fenda? --- Por mim, tudo é noite meu caro, você é nosso guia e 64
você dará as ordens para que tudo corra bem. Noor estava alegre demais para uma expedição de tanto risco. Para ele, já com a idade avançada e todos os problemas que tinha, aquilo era uma fuga dos afazeres comuns no comando da sua nação e de seu povo. Vir seguia a frente, com o cavalo caminhando a passos curtos. Ele sabia que não adianta acelerar o passo naquele terreno e acabar tendo uma pata quebrada no animal. Noor vinha logo atrás e o Gigante seguia um pouco mais distante, mas sem perdê-los de vista. Ele preferia manter essa distância para observar os movimentos ao redor do seu Rei, coisas de Comandante de Guerra. --- Me parece que vai chover --- disse Noor --- Sim, acho que você tem razão, o dia clareou, mas continuamos com sol encoberto e o ar bastante úmido, é bem capaz que chova mesmo e acho que isso é bom, os animais se refrescam e não será necessária uma parada tão longa para descanso. Tudo corria bem, a chuva caiu bem amena, quase uma garoa. Foi quando eles começaram se aproximar da Floresta que ouviram um barulho estranho. Todos pararam e ficaram pensando o que seria aquilo. --- Parece uma roda de madeira girando sobre um chão de madeira --- disse Noor --- Que esquisito esse barulho meu Senhor... --- Calma... façam silêncio --- disse Vir enquanto olhava para o alto e cheirava o ar como se estivesse farejando alguma coisa. Num movimento muito rápido Vir desceu do cavalo e puxou o Rei Noor da sela do seu animal... ambos caíram no chão, quase sobre as patas dos animais e quando o Gigante ia chegando perto para segurar Vir pois imaginava que ele fazia algo de mal com seu Rei, Vir gritou para todos --- Abaixem suas cabeças... colem o rosto na terra e se puderem nem respirem O Gigante logo entendeu o recado e fez o que o Rei Vir tinha falado. 65
Aos poucos o céu acima deles foi ficando amarronzado quase negro... aquele barulho passou a ter um volume e uma vibração ensurdecedora... Vir gritou... --- Não se mexam... são abelhas assassinas... Nem bem ele terminou a frase e já começaram a sentir o vento e a vibração dos bilhões de asas batendo perto de suas cabeças e de seus corpos. Os cavalos começaram a dar patadas neles... com certeza estavam sendo atacados pelo enxame. Os três ficaram imóveis, mal respiravam e não levantavam sequer um dos olhos para ver o que estava acontecendo. O barulho das asas não cessava e num momento, um dos cavalos caiu de lado bem sobre uma das pernas do Gigante o qual apenas gemeu seco... --- UUUuuugh... --- Vir levantou um pouco a sua cabeça e viu o cavalo caído totalmente coberto por abelhas. --- Pobre animal --- pensou ele --- tem seus minutos contados Aos poucos o barulho foi diminuindo, as vibrações cessando e num certo momento voltou a ser aquele mesmo pequeno ruído que eles ouviram antes de tudo acontecer. --- Você está bem Noor? --- Sim, um pouco sujo e assustado mas estou bem. Eles se levantaram e perceberam que o Gigante estava preso por um dos cavalos que caiu sobre sua perna. --- Calma --- disse Vir --- vou te ajudar a sair daí. --- Com um pedaço de galho que estava perto deles Vir conseguiu suspender um pouco o animal até que o Gigante pudesse retirar sua perna debaixo dele. --- Será que quebrou? --- Acho que não Senhor Rei, dói um pouco, mas acho que foi pelo peso do animal. --- Esse cavalo está morto --- disse Vir --- os outros bateram em retirada e é bem capaz de estarem mortos não muito distantes daqui. 66
--- Perdemos dois terços de nossos suprimentos --- disse Noor --- Não há problemas, estamos bem e poderemos continuar caminhando afinal, a Floresta está logo ali, já podemos avistá-la e lá dentro os animais não iriam conseguir seguir conosco mesmo. --- Você está bem Gigante? --- Um pouco tonto... minha perna dói mas acho que não foi nada de grave... além disso, quando o cavalo caiu sobre mim algumas abelhas me picaram, sinto os inchaços, mas nada que vai me derrubar --- disse o Comandante Militar com sua voz imponente procurando esconder a dor que sentia. --- Melhor ficarmos aqui essa noite... acho que estaremos mais seguros do que dentro da Floresta... assim que o Sol nascer continuaremos nosso percurso. Vir falou isso e percebeu que o Comandante largou seu equipamento no chão e desabou. --- Deixe-o dormir --- disse o Rei Noor enquanto se acomodava no pé de uma grande árvore --- acho que todos nós estamos cansados. O som do enxame ainda dava para ser ouvido, mas aparentemente estava longe, quem sabe em volta dos outros dois cavalos que fugiram. --- Tomara que esses bichos tenham corrido para bem longe --- pensou Vir --- o cheiro de sangue e de carne fresca vai atrair criaturas famintas... Ele olhou para a silhueta de Noor e notou que ele também estava dormindo... em alguns segundos pensou em fugir, voltar para Nor e resgatar seu povo prisioneiro, mas logo esse pensamento se foi... ele sabia que sozinho não teria a menor chance. Melhor aguardar outra hora!
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Parte 16 --- Nossa meus amigos, não sei ao certo se é melhor andar por esse Pântano de dia ou a noite --- dizia Aiua enquanto levantava seus pés que colavam no terreno úmido e arenoso. Vlater seguia na frente, praticamente sabendo onde pisava. Lilly olhava para ele e ficava abismada como ele conhecia tudo aquilo, mesmo sem ser nativo dali muito menos do Continente da Sirvia. --- Quem será esse homem? O que será que realmente o atrai para essa Fenda de modo a nos persuadir e nos convencer de seguirmos com ele nessa jornada? Que outros poderes ele esconde? --- pensava ela enquanto se recordava das imagens refletidas naquela fumaça que saiu do seu cajado. De certa forma, Vlater estava cheio de razão. O Pântano esconde grandes perigos que muitas vezes são invisíveis, mesmo de dia, mas ao menos com a luz do Sol eles poderiam enxergar algumas saídas mais prováveis desses perigos eminentes. Eles já estavam nas imediações do meio da faixa de Pântano quando de repente Aiua, o qual estava um pouco mais para trás, começou a gritar apavorado. --- Socorro... socorro... estou preso... --- Venha... vamos ver isso... --- disse Vlater largando sua mochila ali onde estava e passando as pressas por Lilly que ficou momentaneamente sem reação. --- Calma amigo... não se mova... --- Eu estou preso até a cintura... Aiua estava dentro de um banco de areia movediça. Eles são bastante comuns naquela região. --- Espere um pouco... vou pegar um galho forte para tirar você daí Rapidamente o Mago olhou para os lados e observou que não havia árvores, somente arbustos baixos e os mais altos eram aqueles que ‘treparam’ em pequenas arvorezinhas frágeis que não suportariam o peso de uma pessoa com o porte grande 68
de Aiua. --- Meu cajado --- disse ele voltando até o ponto onde tinha deixado seus pertences. --- Lilly.... me ajude Lilly... --- gritava o chefe apavorado. --- Espere sem se mexer... Vlater já está retornando... --- Aqui está... tente alcança-lo... --- dizia Vlater enquanto esticava o máximo seu braço segurando o cajado... --- Não consigo... está muito longe... --- Você não consegue fazer algo melhor Vlater... ele já está com o peito coberto... Vlater então olhou para Lilly e disse. --- Você deve confiar em mim... --- Sim... está bem... que devo fazer? --- Você é mais leve do que eu... deite-se aqui na beirada e vá rastejando até alcançar a mão dele... quando estiver segurando-o eu puxo vocês dois pelo seu tornozelo... --- Mais que rápido Lilly se agachou e começou a entrar na piscina de areia enquanto Vlater, de joelhos na beirada ia acompanhando seus movimentos. --- Devagar... a areia engole materiais com pontas e com superfícies pequenas... com seu corpo chapado a força da areia não é suficientemente grande para sugá-la. A essa altura, a boca de Aiua já estava quase que coberta e ele não conseguia mais gritar. Lilly se aproximou o máximo dele e esticou seu braço o mais que pode. --- Segure firme Aiua --- gritou ela O homem segurou o braço de Lilly pelo pulso e ela fez o mesmo em seu braço gritando. --- Pode puxar Vlater... Com seus joelhos meio que afundando na beirada da areia Vlater segurou firme a canela de Lilly e começou a puxar. A cabeça de Aiua estava totalmente submersa e Vlater sabia que ele não viveria muito tempo sem poder respirar. Aos poucos o corpo de Lilly foi sendo puxado e com ele Aiua ia conseguindo colocar a cabeça para fora da areia respirando fundo quando isso acontecia. 69
--- Força Vlater --- gritava Lilly --- força Sem receios Vlater segurou a moça pelas coxas e a puxou para a margem trazendo consigo o homem de pele negra escura ora com o corpo inteiro coberto daquela massa de areia fina... --- Você está bem? --- disse Vlater ajudando Aiua a retirar a areia de sua boca e narinas para que ele pudesse respirar novamente aliviado. --- Estou bem --- dizia Aiua cuspindo areia e passando as mãos em sua cabeça. --- Temos de ter muita atenção quando caminhamos no Pântano... vou providenciar um cajado para cada um de vocês, é mais seguro ir testando o caminho onde vamos pisar. Lilly havia sentou levantado e estava retirando a areia grudada em suas vestes. Num momento ela levantou sua saia de couro de Lhama e viu as marcas de areia deixadas pelas mãos de Vlater em suas pernas. --- Desculpe tê-la tocado... não havia outra alternativa --disse Vlater ainda ajoelhado ao lado dela enquanto observava a mulher se limpando. --- Não tem problema Vlater --- disse ela. Lilly era uma moça jovem e bonita. Suas roupas compridas que a protegiam do frio de sua região não deixavam a mostra um corpo exuberante e sensual. Ela ainda era virgem, como tantas outras em sua Tribo. Os poucos homens que ali restavam se relacionavam com as mulheres mais velhas e mais maduras para tentarem engravidá-las. As mais novas eram deixadas cheias de energia para as tarefas mais cansativas como trabalhar na agricultura, nos sítios de algas que eram bastante profundos e exigiam um bom fôlego e para o cuidado com as poucas crianças que nasciam, quase todas meninas. --- Falta muita até a passagem? --- Perguntou Aiua --- Acho que estamos na metade do percurso... mas daqui para a frente o solo do Pântano se funde com o da Floresta e fica um pouco mais fácil caminhar. --- Vamos seguir em frente? 70
--- Acho melhor descansarmos... essa foi por pouco... será que tem água por aqui para eu me limpar? --- Ali Aiua --- disse Vlater --- onde eu estava quando você começou a gritar existe um fio de água que umedece toda essa área... vamos juntos e descansamos um pouco por lá. Os três seguiram unidos pela trilha já aberta anteriormente por Vlater. Às vezes notavam movimentos nos arbustos e nas árvores pequenas, mas nada que interrompesse a caminhada, agora com o dobro de atenção onde pisavam. Lilly seguia atrás de todos e vez ou outra passava sua mão sobre suas coxas a pouco tocadas fortemente pelo Mago misterioso.
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Parte 17 Entre a noite maior e a menor, as Luas fazem com que pareça dia, porém com uma iluminação que não deixa sobras, confunde os olhares e não se sabe ao certo o que é planta, pessoa, animal... As balsas feitas de Bambu por Din, Jessica e seus homens ficaram encobertas pela vegetação alta no sudoeste das Terras de Nor. Havia pessoas nas ruas e por ser uma cidade bastante populosa, ninguém ficava observando ou notava quem era da cidade ou quem não era. --- Din, você conhece bem a cidade e deve imaginar onde eles estão --- disse um dos homens. --- Vamos fazer assim, eu e Jessica estávamos conversando e temos quase certeza que eles estão no Galpão Grande perto do Castelo de Noor. Ali o acesso não é tão vigiado uma vez que o Mercado Municipal fica logo ao lado. --- Então não teremos problemas de chegar até eles. --- Sim, mas chegar é uma coisa, libertá-los e retirar mais de cem pessoas de lá de dentro sem que sejamos vistos é outra coisa. --- Como faremos isso? --- Meu plano é o seguinte... eu vou até lá com a Jessica e vocês ficam nas imediações, na área do mercado que está aberto olhando as mercadorias, quem sabe até fingindo que são mercadores de vidros e oferecendo produtos para entrega futura... --- Certo... --- Muito bem... vamos ver a possibilidade de retirar as pessoas aos poucos e uma vez liberadas elas podem seguir para a estrada até Vigilia. Lá, poderão ficar em segurança até que todos sejam libertados e então, nos encontraremos com todos e seguiremos para Melina da mesma forma como viemos, pela praia. Vigilia é uma parada que foi construída quando o comér72
cio de vidro de Melina começou a crescer. Ali existem Pousadas que fazem comida e tem aposentos para aqueles que vem do Monte James com mercadorias e querem descansar antes de exporem suas mercadorias no Mercado ou para aqueles que já venderam suas mercadorias e resolvem descansar antes de seguir viagem --- E os Soldados Rãmm? --- Trouxemos comida e tabaco suficiente para chamarmos a atenção deles... os Rãmm são loucos por tabaco. O plano estava perfeitamente entendido por todos eles. Din e Jessica seguiram para o Mercado e ficaram olhando as mercadorias, experimentando frutas dos comerciantes e observando o Grande Galpão. Na porta, tinham dois guardas Rãmm que conversavam na língua deles e ao que parecia eles se divertiam. --- Din... puxe assunto com eles, ofereça tabaco e guloseimas... eu vou pela lateral e entro pela abertura do telhado. Din foi se aproximando dos Soldados e quando estava quase ao lado dos dois ele retirou tabaco do seu bolso, colocou um chumaço dentro de um pito e se aproximou do fogo de uma barraca que comercializava peixinhos fritos pegando uma brasa ascendeu e ficou ali dando algumas baforadas. Os soldados que o observavam ficavam apreciando ele fazer círculos com a fumaça que saia da boca e farejavam para cima como que querendo sugar um pouco daquela fumaça. Din olhou disfarçadamente para eles e fez um gesto meio que oferecendo a piteira e logo eles dois se aproximaram fazendo ruídos de prazer. Os Rãmm não são criaturas do mal. São como cachorros, se bem tratados são amigos e companheiros. O problema é que para ser um Soldado do Rei, o Comandante os doutrinava e os ensinava a serem grossos e rudes os espancando até que aprendessem obedecer a seu mestre. --- Querem umas baforadas? --- perguntou Din Soltando ruídos amigáveis eles foram pegando o pequeno cachimbo e sugando e soltando fumaça pela boca e pelas nari73
nas. Din observou que Jessica passava sorrateiramente por trás deles e logo chegou até a parede lateral que segurava o telhado de palha. Ela subiu nessa parede como se fosse um inseto e Din chegou a sorrir. Os Soldados olharam para ele e também sorriram passando o cachimbo um para o outro e soltando fumaça pela boca e pelas narinas sem parar. Lá dentro, Jessica viu seus camaradas que ficaram atônitos e ela colocou o dedo na frente da boca pedindo silêncio a eles. --- São só esses guardas ai da porta? --- Sim Jessica... eles acabaram de deixar a comida aqui e só voltarão amanhã bem cedo --- disse um rapaz antigo amigo dos irmãos. --- Ótimo, o plano é o seguinte... Enquanto Din se divertia com os dois guardas retirando frutas secas do bolso e oferecendo a eles para dar tempo dele encher novamente a piteira, Jessica ia ajudando seus companheiros a saírem pelo telhado agora com a ajuda de um banco colocado sobre uma mesa do lado de dentro. Seus amigos do lado de fora espiavam e vinham ao encontro daqueles que saiam do Galpão. Eles os cumprimentavam como se fossem velhos amigos e os abraçavam, pegavam as crianças no colo e brincavam com elas e depois saiam do local acompanhando-os até a estrada que levava até Vigilia. Não demorou nem meia hora e todos estavam livres. Jessica foi a última a sair e deu a volta pro trás de Din e do meio do Mercado chamou ele como quem chama um parente. --- Ei Din --- o rapaz olhou para ela --- vamos para casa! Din deu mais uma olhada para os Soldados e balançou os ombros como quem diz, ‘é minha mulher sempre a me chamar’. --- Tomem --- disse ele dando um saquinho cheio de tabaco para os dois Soldados --- fique para vocês! Os dois ainda agradeceram e voltaram a seus postos rindo alegres e soltando fumaça sem parar. --- Foi mais fácil do que imaginávamos --- disse Jessica 74
--- E o Rei Vir? Onde está ele? --- Eles me disseram que o Rei Noor o levou para a entrada da Fenda. --- Mas o que ele quer naquele lugar? --- Nenhum deles sabe! O Rei Vir veio ontem no fim do dia ver como eles estavam sendo tratados e disse que estava indo com Noor e com o Gigante Grey até a Fenda, mas que após levá-lo até lá ele voltaria e o próprio Rei Noor disse que todos seriam libertados assim que eles retornassem a Nor. Os irmãos caminharam pelas ruas da cidade até Vigilia e lá encontraram parte de seus amigos, outra parte já havia seguido pela praia rumo a Melissa. --- Obrigado Din --- disse uma das mulheres que estava presa abraçando seu marido que veio junto com Din ao seu resgate. --- Somos todos irmãos, temos de nos ajudar... sempre... vamos para a praia e de lá seguimos para Melina. Teremos de recompor nossas defesas e de lá, após fazer isso, vou atrás do nosso Rei que está nesse momento sendo levado até a Fenda. --- Eu vou com você --- disse Jessica. --- Acho arriscado Je... --- Não é não, eu já estive algumas vezes ali brincando e conheço um pouco do local. --- Muito bem... vamos para casa enquanto é noite... amanhã cedo eles vão perceber que não existem mais prisioneiros e nem sei o que acontecerá... --- Acho que não vai acontecer nada --- disse um dos homens que estava preso --- sem o Comandante Gigante Grey esses outros homens e os Soldados Rãmm não sabem o que fazer. --- Verdade... mesmo assim é bom nos precaver! Felizes eles andavam a beira mar, pois estavam voltando para casa. Seis luas estavam baixas e refletiam sua luz nas ondas pequenas que iam e vinham nas areias claras e finas.
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Parte 18 Conforme Nasser e Sirio se aproximavam mais e mais da enorme Fenda, o ar ficava mais carregado, mais denso e espesso, era como uma névoa de fumaça que cercava aquela região ao menos naquele momento. --- Meu Mago --- disse Nasser enquanto contemplava aquilo que via a sua frente --- que cena impressionante. Nasser se referia a uma enorme cratera que aparecia a sua frente. Assim que saíram da Floresta Negra, ambos começaram a subir as encostas de uma montanha razoavelmente alta. Ela era constituída de material queimado parecendo carvão em pedaços e ainda estava quente o suficiente para eles sentirem o calor não muito intenso sobre seus pés, mesmo calçando botas grossas de couro. Assim que ambos alcançavam o todo desse monte, a clareira negra pode ser vista por inteiro. Era como se uma bola imensa de pedra em chamas tivesse caído do céu produzindo assim aquele enorme buraco com aproximadamente 3 ou 4 quilômetros de diâmetro. Nada era vida daquele ponto de vista nenhum ser, nenhuma planta, não se via água de rios ou de lagos mesmo que em pequenas quantidades, o único movimento era de uma fumaça negra em vários pontos e outros focos de fumaça branca esverdeada aqui e ali. Lá do topo, olhando para trás notava-se que a Floresta Negra tinha aquele nome, pois sua vegetação era mesmo enegrecida com o pó que em alguns momentos rajava pelas encostas internas da cratera jogando para fora algumas nuvens negras da terra fina queimada. Deveria ter uma profundidade de 400 ou 500 metros e dali de onde estavam notaram diversas cavernas que se formavam nas paredes inferiores. --- Que faremos agora Sirio? --- Vamos descer... --- disse ele cutucando a terra das margens 76
superiores da encosta talvez para verificar se eram firmes para a descida. --- Vamos... agora? --- perguntou Nasser um pouco receoso. --- Nós não viemos aqui somente para apreciar a paisagem desoladora. Venha, vamos começar a descer por aqui. Nasser não era um guerreiro. Na verdade ele nunca esteve num conflito armado. Cresceu dentro do Castelo e não era um grande conhecedor da vida comum das pessoas. Ali ele estudou com professores contratados por seus pais, suas brincadeiras eram somente dentro do Castelo e seus amigos eram os soldados da guarda, seus tios, parentes que visitavam muito esporadicamente e os filhos desses parentes os quais acompanhavam os pais na visita ao Rei. --- Quero só ver na hora de subir de volta --- disse Nasser que dava um passo e escorregava dois ou três com a terra fofa que desabava com o peso de seu corpo. --- A gente vai dar um jeito meu amigo...não se desespere antes do tempo. Na medida em que eles desciam o paredão, em alguns pontos com mais de 45 graus, o cheiro forte de queimado e de enxofre se misturavam e isso causava ânsia e tosse fazendo com que eles paravam no meio da escalada com crises de tosse ou para cuspir montes de saliva salgada que se acumulava em suas bocas. --- Coloque isso Nasser --- disse Sirio passando ao amigo um pedaço de pano grosso que ele umedeceu com água que carregava em seu embornal. Depois ele preparou outro pano e amarrou também na sua cabeça na altura das narinas e da boca. --- Procure respirar pelo nariz... --- dizia ele Passando a metade da descida, eles pararam e se entreolharam quando ouviram ruídos estranhos. --- Você ouviu isso? --- Ouvi sim... --- Que será? Pessoas? --- É o que parece, mas deve ser o eco de gritos de aves ou de insetos, não é possível que existam pessoas nesse lugar. 75
--- Isso é bem esquisito Sirio. Assim que Nasser falou aquela frase algo incomum começou a acontecer no momento em que ele voltou os olhos para o Grande Mago. Sirio estava na ponta dos pés, na ponta de uma grande pedra que estava enterrada na areia negra. O Mago mantinha os braços abertos em cruz e a cabeça voltada para o céu esfumaçado. Nasser, atrás do Mago não conseguia ver suas feições, mas percebia que ele falava alguma coisa em voz muito baixa, como se fosse uma oração, cochichando consigo mesmo. --- Que está acontecendo Sirio? Você está bem? --- disse ele enquanto caminhava dando a volta no Mago para então poder vê-lo de frente. Olhando para o chão para não escorregar na descida íngreme, ouvindo aquele sussurrar, ele parava um pouco e a cada momento em que olhava ao Mago percebia que seus braços estavam cada vez mais elevados ao céu. --- Sirio... trata-se de uma oração? O mago continuava falando agora um pouco mais alto, mas eram palavras e termos que Nasser não compreendia. Quando ele chegou bem perto do Mago, pela sua frente ele observou algo mais surpreendente ainda. Sirio estava com os olhos abertos, mas sua íris não estava dentro dos olhos, estava escondida, somente a pele branca do glóbulo aparecia enorme e esbugalhada. --- Pelos Deuses --- pensou Nasser --- que estará acontecendo? Sirio continuava falando frases que não eram compreendidas por Nasser, agora em tom de voz mais alta, quase que falando normalmente em tom de conversa palavras do idioma deles misturadas com outras palavras desconhecidas, ele dizia... --- Junto com el acádio, el elamita es una de las lenguas más perdurables Del oriente... aprenda isso... los primeros elomoparlantes desarrollaran um sistema de scritura pictográfica e ideográffica proprio... aprenda isso... --- O que você está falando meu amigo --- perguntava inutilmente Nasser ao seu amigo Mago. Algo começou a acontecer e isso causou mais espanto ainda em 76
Nasser. O Mago que até então falava tudo aquilo na ponta dos pés começou a levitar. Seus pés se ergueram do chão a quase um metro e sua face enrugada começou a se esticar, tomar uma forma que não aparentava mais ser a do Mago. Apavorado com tudo aquilo, Nasser começou a tentar subir a encosta de volta ao ponto de partida, mas logo percebeu que isso era impossível... a cada passo que ele dava, mesmo cravando seu cajado no chão de terra fofa, seus pés desciam dois passos e aos poucos ele viu que estava se afastando para baixo, bem abaixo do Mago que continuava flutuando e falando aquelas palavras incompreensíveis. --- Sirio --- gritava ele --- Sirio me ajude --- continuava gritando e tentando se segurar com as mãos na terra da encosta, mas sem que conseguisse superar aquela força que parecia puxá-lo para baixo. Já quase sem forças ele caiu com o peito no chão e vagarosamente foi sendo levado pela terra roliça até o fundo da cratera de onde não podia mais ver seu amigo, mas ainda ouvia o que ele dizia agora em voz alta. --- Encontramos también ante una lengua aglutinante, que tampoco tiénes relaciones evidentes con el sumério o el elamita... Eram palavras desconhecidas para Nasser e ele ficou ali parado, escutando aquilo tudo sem saber o que fazer. Em sua mente passavam frases como “nunca vá até a Fenda”, “naquele lugar as pessoas encontram a morte”, “fique longe da Floresta Negra”. Eram frases ditas por seus pais e pelos professores que lhe ensinaram os conceitos da vida, da honestidade, da governabilidade, coisas que Nasser, um chamado corrupto por parte da população, não havia aprendido corretamente. --- Porque eu nunca quis ouvir as pessoas que quiseram me ensinar? Porque eu tinha de me tornar Rei da forma como aconteceu? Eu queria agora ser um cidadão comum de Candiu que volta para casa depois de um dia de pesca, espera que a sua esposa prepare os peixes enquanto se lava com água fresca e depois se senta para jantar com ela e com seus filhos... que fazem orações 77
de agradecimento aos Deuses... que sabem do objetivo do seu próximo dia... que lutam para pagar seus pesados impostos a um Rei que só quer ter boa vida, boas comidas e bebidas... como eu queria... --- dizia Nasser em voz baixa, conversando consigo mesmo. Aos poucos ele percebeu que não sabia se aquilo era sonho ou realidade. Ele abria os olhos e via o céu escuro, esfumaçado, sem aves a voar e o ruído de um diálogo estranho, de uma voz mais estranha ainda que continuamente falava. --- ...a una lengua , que sorprendentemente resultaba ser indoeuropea... Então ele adormeceu ouvindo aquilo. Parte 19 Assim que estavam chegando perto da parte sul da Fenda, Noor, Vir e o Gigante Grey se depararam com os dois cavalos que haviam fugido. Eles estavam em pé, bem perto da encosta negra como carvão. --- Vejam... os animais que fugiram --- disse Grey --- Espere... não consigo vê-los nem senti-los... alguma coisa está errada --- O que pode estar errado Noor? --- Vir, eu perdi meus olhos e não minha capacidade de ver a magia da vida... --- Quer que eu os pegue meu Rei? --- Não...espere um pouco... esses animais estão mortos --- Mas estamos vendo eles Noor... --- Vocês não estão vendo eles... Grey se achava um grande guerreiro e sempre foi um grande cavaleiro. Ganhou muitos e muitos torneios entre cavaleiros da Siria e de outros continentes assim, resolveu se aproximar dos animais que estavam de costas para ele. --- Grey... não se aproxime --- gritou Noor Naquele momento em que Noor falou aquilo o Comandante que estava indo na direção dos animais se virou e ia falar alguma coisa quando olhando para seus parceiros de expedição 78
que estavam logo atrás dele viu Vir gritando e apontando para os animais. --- Cuidado Grey... olhe... Grey nem bem se virou e os animais estavam olhando para ele. Com as feições deformadas não se pode dizer que eram cavalos. A cabeça deles era afinada e seus olhos estavam enormes e com as pupilas alaranjadas. Eles olhavam para Grey com uma boca cheia de dentes pontudos meio aberta soltando uma baba amarelada. --- Não se mexa com rapidez Grey --- dizia Noor --- venha vindo para cá de costas e o mais devagar que puder... --- Posso jogar uma pedra neles... --- Não faça isso Vir... ou todos nós morreremos aqui. Grey começou a agir da forma que Noor dizia... vagarosamente ele dava passos curtos para trás e mesmo assim aquelas criaturas o seguiam na mesma velocidade... lentamente. --- Muita calma Grey --- dizia Noor em um tom de voz bem baixo --- de-va-gar O Gigante era pesado e seus passos não eram leves... ele movimentava a sua perna ferida arrastando-a no chão e a cada passo daqueles os animais abriam e fechavam suas bocas nojentas, farejando o seu sangue. --- Não está dando certo Noor --- dizia Vir --- os animais estão seguindo ele e vindo para perto de nós... --- Calma... vamos nos afastar nós também... na mesma velocidade de Grey Grey então, ao dar um passo para trás tropeçou numa pedra que estava atrás dele e caiu de costas no chão. Foi o tempo de Noor falar mais alto... --- Levante e corra Grey --- gritou ele mais forte --- levante e corra... Mas não deu tempo. Assim que Grey apoiou as mãos na terra negra os dois animais ficaram com os pelos arrepiados, abriram suas bocas enormes e começaram a despedaçar aquele homem que só podia gritar. --- Nãããooo... saiam daqui... aaaahhh... 79
--- Venha Vir... me ajude a subir nessa árvore... Vir pegou Noor pelas costas e o puxou com toda sua força. Os dois subiram como se fossem dois ratos pelo tronco grosso até chegarem numa altura segura e lá de cima, Noor ouvia os ruídos e Vir podia ver os animais estraçalhando o corpo de Grey que já estava morto e não soltava mais nenhum ruído. --- Eles arrebentaram o Comandante Noor... --- Não pudemos fazer nada... vamos ficar em silêncio... ao menos assim acho que eles tomarão outro rumo. O terreno negro aos pés dos cavalos tinha se tornado vermelho sangue. Seu corpo estava em pedaços irreconhecíveis e os dois animais ainda pisavam aqueles pedaços como que querendo esmagá-los até sumirem. Um ruído de apito começou a soar cada vez mais perto. Os cavalos levantaram suas cabeças cobertas de sangue e partiram correndo na direção norte da cratera. Logo chegaram outras criaturas, dezenas delas. Eram Pelores, criaturas carnívoras que foram perseguidas por anos pelos criadores e pela população da Sirvia. São uma espécie de Porcos do Mato que mataram muitas Vacas, Lhamas e todo tipo de criação que viam em sua frente. Houve relatos de mães que viram seus filhos sendo comidos por essas feras e o Rei Messia, pai de Nasser, vendo que os comerciantes de carnes estavam desesperados com a diminuição de seus rebanhos colocou prêmios para quem trouxesse cabeças de Pelores para ele. As pessoas saiam para caçar e eles quase foram extintos. Os que restaram encontraram um refúgio nas imediações da Floresta Negra uma vez que pouquíssima gente chegava até ali, justamente por medo dos acontecimentos e sumiços na Fenda. --- Eles estão comendo o pobre Grey --- sussurrou Vir no ouvido de Noor --- Eu sei... esses eu vejo e os sinto... Vamos nos manter aqui em cima em silêncio e procurando não nos mexer... essas criaturas sobem em árvores como essas e são famintos por carne. Se sentirem nossa presença a aqui teremos o mesmo fim de Grey. 80
Não demorou muito tempo até que aqueles animais deixassem o chão limpo como se nada tivesse acontecido ali e aos poucos eles foram voltando para a Floresta, quem sabe em busca de mais alimentos. --- Agora somos só nós dois Vir. --- Sim... você quer mesmo seguir em frente? --- Eu vou seguir... caso você queira voltar eu escrevo uma carta para meu sub comandante pedindo para libertar seu povo. Vir chegou a pensar em voltar para casa. Ele era um homem que prezava a honra e a palavra das pessoas e nunca poderia deixar Noor, aquele que um dia foi seu amigo de verdade ali, sozinho, entregue aos perigos da Fenda. --- Vou seguir com você Noor... nós viemos aqui para entrar na Fenda e vamos até o fim. --- Obrigado amigo... me envergonho do que ordenei que fizessem com seu povo... prometo retribuir em dobro todas as perdas que vocês tiveram. --- Será que podemos descer? --- Sim... já não ouço mais os grunhidos deles. Pelo sul a entrada da Fenda era mais plana e assim que eles chegaram ao topo da cratera puderam observar as cavernas a uns 100 metros abaixo de onde eles estavam. --- Aquelas são as entradas... --- Então vamos... com cuidado --- dizia Vir já deslizando pelas pedrinhas negras roliças que levavam ao fundo da cratera. Noor deslizava logo atrás, quieto, parecia meio atordoado. Vir observou seu amigo e perguntou. --- Você está bem Noor? --- Não sei... sinto algo estranho no ar... ouço um sussurrar dentro de mim como se alguém de algum lugar distante quisesse conversar comigo, num idioma que desconheço. Algum tempo e vários escorregões depois ambos chegaram até a entrada de uma dessas cavernas, a maior de todas. Ela não era tão escura como imaginaram, fachos de luz 81
entravam por pequenos orifícios das paredes iluminando parcialmente o chão que era formado do mesmo material das encostas escorregadias. No fundo desse túnel dava para notar que existia uma luz vermelha intensa que tinha altas e baixas intensidades. --- Deve ser fogo Noor... --- Acho que você tem parte da razão... são lavas que reproduzes essas luzes, lavas que estão prestes a serem lançadas ao alto... --- O que poderemos esperar disso --- pensou em voz alta o Rei Vir Dessa vez, Noor seguia na frente sempre batendo seu cajado no solo. A sombra da pouca luz nas paredes da entrada pareciam rostos presos na pedra que gritavam por socorro.
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Parte 20 Din e Jessica saíram de suas casas assim que ouviram uma falação nas ruas. Era um dos homens que Din pediu para ficar em Nor disfarçado de morador da cidade ou de comerciante, nas imediações do Mercado só para observar o que aconteceria quando o Sub Comando da Guarda descobrisse que os prisioneiros de Melina não estavam mais ali. Os homens já estavam contando aos presentes aquilo que presenciaram. --- ... então, nós estávamos experimentando maças numa das barracas e vimos quando uma carroça com alimentos parou na frente do Grande Galpão... os guardas que lá estavam pela manhã não eram mais os dois em que Din fez com que ficassem desatentos... --- Olá... bom dia --- disse Din. --- Olá Din, estava contando para eles o que aconteceu... --- Ótimo, continue... --- Bem, nós juntamente com outras pessoas curiosas da cidade chegamos perto dos portões. Assim que eles se abriram os Soldados Rãmm que estavam de guarda entraram fazendo ruídos na língua deles, acho que para acordar os prisioneiros e logo saíram às pressas. O corre corre foi tanto que alguns outros Soldados que chegaram esbarraram na carroça de frutas e ela se virou fazendo com que maçãs, laranjas e muito candiu rolasse ladeira abaixo para alegria do povo que começou a pegar e colocar nas suas sacolas... eles nem ligaram para aquilo. --- Houve algum tipo de ‘alarme geral’? --- Acho que não... ao menos como esperávamos... houve muita correria, um entra e sai do Galpão com restos de vestimentas que deixaram ali, restos de comida, mas nada de muito alarmante. O sub Comandante então fez uma formação dos Soldados e à distância, pudemos ver que ele dava broncas e chamava a atenção aos gritos dos Guardas os quais ouviam e baixavam as cabeças. 83
--- Foi só isso? --- Acho que sim... mais tarde, após a bronca na formação eles trancaram a porta do Grande Galpão e todos entraram no Castelo pela porta da Guarda. Ficamos aguardando mais um tempo enquanto visitamos e vimos mais algumas mercadorias na parte de trás do Mercado e nada de novo ocorreu. --- Eles não têm comando --- disse Jessica --- sem a presença de Noor e seu fiel Comandante o Gigante Grey eles não sabem que atitude tomar. --- Acho que Jessica está certa... eles nunca que vão sair de lá sem uma ordem, deixar a cidade desprotegida sem terem alguém que confiem a sua frente... --- Verdade Din --- disse o homem que trouxe o recado --acho que ao menos por hora poderemos ficar tranquilos. --- O que faremos agora Din? --- Vocês fiquem por aqui ajudando na reconstrução de tudo. Muita coisa já foi reparada e agora temos muita gente trabalhando no Castelo principalmente nas instalações da Guarda... temos de recuperar rapidamente nosso poder de defesa pois não sabemos o que pode acontecer. Eu e Jessica vamos à Fenda em socorro ao Rei Vir. Vocês que são soldados e estão acostumados devem se unir, encontrar algum de vocês para comandar os trabalhos e manter sempre uma guarda nas entradas da cidade de olhos abertos, dia e noite para que não ocorram mais ataques e nos peguem desprevenidos. --- Você está mais do que certo Din --- disse um dos guardas --- acho que já temos um consenso de quem assumirá o Comando. Será Kern, o mais antigo Guarda do Rei. Todos olharam para Kern e aplaudiram o novo Comandante. --- Kern... preste atenção --- disse Din --- a tarefa que agora você assume não será nada fácil. Convoque novos homens e mantenha a guarda alerta. Nós, eu e Jessica iremos trazer o Rei Vir de Volta e seria muito bom se ele visse que tudo está bem assim que chegar. A segurança de toda população está nas suas mãos. 84
--- Pode deixar Din --- disse o novo Comandante --- vou dividir o pessoal e parte continuará a reconstruir o Palácio recuperar armas e o restante fará uma guarda intensiva. Não vamos deixar que nada aconteça novamente. Din e Jessica se despediram de todos, pegaram seus embornais contendo frutas secas, vasilhas com água fresca e facas com punhos de madeira forte e lâminas de vidro forte e afiado. Din também se armou de uma espada colocando-a numa bainha presa na altura da cintura enquanto Jessica eximia em arco e flecha, carregou nas costas um cesto com muitas flechas e vestiu a tiracolo seu arco predileto feito com galho de Assa peixe. Eles partiram até o a Foz do Rio Car, aonde de barco, chegariam mais rápido até o sudeste da Fenda. Da Praia de Melina até a Foz do Rio Car era um caminho bastante rápido, bastava passar por trás do Monte James e logo dava para ver o Rio e as embarcações ancoradas num pequeno porto feito pelo povo de Melina e pelos Mercadores de vidro que carregavam as embarcações com o produto final e o transportavam para os outros continentes. Din e Jessica logo subiram num pequeno barco equipado com vela e remos o qual eles mesmos fabricaram junto com seu pai. Era um barco para passeio e pesca, não servia para carregar mercadorias uma vez que sua largura era estreita e não sobrava muito lugar para guardar caixas além dos três assentos transversais do barco, um na popa, um no centro e um menor na proa do barco. --- Vamos pela margem leste --- dizia Jessica enquanto remava. --- Sim, a correnteza é menor naquele lado --- disse Din enquanto içava a vela que ajudava muito na navegação rápida. Normalmente os ventos naquela região vinham do Sul e como encontravam o Monte James, esses ventos o contornavam e seguiam para o interior do Continente pela lateral oeste de Melina, que ficava um pouco escondida atrás do Monte e também pela abertura do Rio Car. 85
Esses ventos eram fortes e muitas vezes nem era necessário o uso de remos para se chegar rapidamente no interior onde se abre o Grande Lago Leste que termina dentro da Floresta Negra, no entorno da cratera onde está a Fenda. Din pescava muito ali com seu pai quando ele ainda estava vivo. A quantidade de peixes é enorme uma vez que a maioria das Aldeias e cidades fica no lado Oeste da Sirvia e por causa da proximidade da Fenda eram poucos que se arriscavam a chegar ali perto. A viagem foi rápida e logo que entraram no Grande Lago eles resolveram parar um pouco numa das margens, pescar alguns peixes e fazerem uma refeição em um lugar onde pudessem ao menos comer tranquilos. Din, de dentro do barco jogou uma rede redonda e na primeira puxada ela trouxe dois peixes de tamanho médio. --- Nossa... que sorte... foi de primeira. --- Vou limpá-los aqui mesmo enquanto você ascende o fogo para que possamos assá-los. ---Tá certo. Todas as pessoas naquela época carregavam com em seus pertences duas pedrinhas que chamavam de Pedra de Fogo. Uma delas era uma pedra cinza clara e a outra meio amarronzada, cheia de metal e ferro. Eles juntavam um pouco de palha seca e sobre ela raspavam as pedras uma na outra, o que produzia várias faíscas que por sua vez incendiavam a palha. O processo era muito rápido. Din e Jessica comeram os peixes e comeram frutas frescas colhidas ali mesmo. Aproveitaram para traçar um plano de entrada na Fenda e depois de descansarem um pouco, seguiram viagem, agora só com os remos e com uma cautela redobrada. Eles sabiam que estavam entrando num território perigoso e não queriam fazer muito alarde. No Norte do Grande Lago havia uma espécie de ‘Portal’ para entrada na Floresta. Assim que eles entraram, o vento ficou gelado, o dia virou quase noite e o ar fresco que até então respiravam se tornou pesado. 86
Ambos remavam observando as folhagens das duas margens que uma vez ou outra se mexiam. Eles sabiam que estavam sendo observados, mas n達o imaginavam por quem.
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Parte 21 Longe dali, no Norte do Rio Car, Vlater, Aiua e Lilly chegavam a tal passagem em que o Mago havia dito. O percurso pelas bordas do Pântano não foram fáceis e eles enfrentaram outros perigos. Aiua mancava um pouco e as vezes sentia fortes dores no estomago. Ao ficar preso na areia movediça ele talvez tenha sido picado por algum inseto que habita essas piscinas de areia. Alem do mais, ele ingeriu uma boa dose daquela lama de areia quando ficou com a cabeça submersa e esse deve ser o motivo das dores de barriga. Tudo que ele comia vomitava minutos depois. Vlater, no meio do percurso, colheu algumas folhas de um arbusto, amassou e colocou dentro de uma garrafinha de água. Essa água se tornou esverdeada e ele pedia para que Aiua a bebesse a todo o momento. Ele disse que era uma espécie de antídoto para vários tipos de bactérias. Aos poucos as dores foram parando e o que restava era o inchaço e as dores nas pernas. --- Chegamos a passagem --- disse Vlater --- Você conhecia esse lugar? --- Eu conheço muita coisa nesse nosso mundo... acho que conheço lugares e fatos até de outros mundos... --- Como pode isso Vlater? --- Perguntava Aiua enquanto iniciava as amarras no barco que iriam construir. --- Logo vocês irão me conhecer melhor... muita gente diz que eu não sou desse mundo, mas isso não é verdade. O fato é que não me recordo de absolutamente nada da minha infância e da minha adolescência. Para mim, já nasci desse tamanho, com esse pensamento e os sonhos que tenho nas noites em que durmo. --- Você não se lembra de seus pais? --- Não me lembro e acho que nunca os conheci... --- Mas... quem te criou? 88
--- Não tenho a mínima ideia Lilly... a única coisa que me veio a mente quando pensei em minha infância é que nessa Fenda eu encontraria respostas. --- É por isso que estamos indo lá? --- Vocês bem sabe que outros Magos habitam esse nosso mundo. Muitos deles querem o poder máximo. Ninguém sabe bem o que é e o que farão quando e se conseguirem esse tal poder... minha consciência mandou que eu procurasse vocês e é isso que eu fiz... acho eu que vocês terão mais surpresas do que imaginam, mais surpresas do que eu mesmo. --- Pronto Vlater --- disse Aiua que amarrava com cipós uma balsa feita com madeiras leves que eles foram recolhendo pelo caminho no Pântano. --- Vamos descer por aqui... Quanto mais eles desciam por um túnel de terra, mais eles ouviam o barulho de água corrente. A tal passagem era um buraco que levava até as fortes correntezas do Rio Car assim que esse atravessava a faixa de Pântano. Ali, as águas que desciam com força das Geleiras do Norte recebiam força do relevo que fazia a água correr mais forte. Era um local bastante desconhecido e mesmo Aiua ou Lilly que nasceram ali na região não conheciam aquelas redondezas. Aiua e o povo de Margo utilizava embarcações para levar suas mercadorias para o Centro e o Sul do Continente, mas para isso sempre se utilizavam das rotas do Mar, eram mais seguras que o desconhecido do Pântano e da Cratera onde estava a Fenda. Ali dentro, o som da água era ensurdecedor e eles tinham que gritar uns com os outros para se comunicar e se fazerem entender. --- Venham... --- gritou Vlater --- amarrem bem os embornais e as armas em suas costas e sua cintura... --- Pode deixar... você está preparado Aiua? --- Sim... a hora que vocês quiserem... Vlater segurou pelo lado esquerdo a embarcação em pé a sua frente. Aiua a segurava do lado direito e Lilly ao centro se 89
agarrava a amarras que estavam atadas a proa do barco. Eles estavam posicionados no alto da caverna e o Rio passava por baixo deles, mais ou menos cinco metros de altura. Vlater gritou com toda potência de sua voz. --- Atencão... ééé... jááááá... Ao mesmo tempo os três se arremessaram sobre o barco e esse sobre as corredeiras cinco metros abaixo. Num primeiro momento parecia que todos iriam afundar, mas logo a madeira seca fez a embarcação flutuar e eles foram se acomodando enquanto a velocidade em que desciam rio abaixo ia aumentando gradativamente. Não demorou muito e eles puderam ver a luz do sol que estava ativo do lado de fora da pequena caverna e assim que chegaram nessa saída notaram que havia uma queda d’água de aproximadamente uns trinta metros. Foi o tempo de Vlater dar mais um grito alto. --- Segurem-se bem agoooora ... O barco chegou até a beirada da cachoeira, deu uma pequena virada para a esquerda e despencou com os três grudados nele. Quando caiu na parte de baixo do Rio Car, Aiua reparou que Lilly não tinha conseguido segurar e se desprendeu da embarcação que continuava a descer o Rio rapidamente. --- Vlaaater... Vlaaater... O Mago olhou para o lado e para trás procurando Lilly desesperadamente. O barulho das águas e toda aquela confusão, além da água muito fria, não deixavam sua voz sair num volume alto, mas mesmo assim ele gritava... --- Lilly... Liiiily... --- gritavam os dois. Era um momento bastante tenso. Ambos não acreditavam que iriam encontrar a amiga. Na cabeça de Aiua passava a ideia de que Lilly batera a cabeça no fundo do Rio quando da queda. Eles ficaram os dois de joelho no pequeno barco e quando ele já desenvolvia uma velocidade razoável e eles praticamente já perdiam as esperanças de rever Lilly eles ouviram uma voz 90
gritando. --- Eeeeiii... Vlaaater... Aaaaiua... me ajudem aqui... Os dois ficaram procurando a voz até que olharam para a parte de trás do barco e viram que Lilly estava se segurando nos galhos e nas amarras feitas por Aiua na popa da embarcação. Venha Lilly... --- gritou Aiua que estava mais perto dela. Logo depois Vlater chegou para ajudar e puxaram Lilly que tremia de frio para dentro do barco. --- Segure-se bem... --- gritava Vlater --- ainda vamos descer muitos quilômetros de rio. Aos poucos e mais acomodados àquela descida passou a ser uma diversão. A medida que se afastavam das proximidades das Geleiras o Sol ficava mais quente e a água que molhava as vestes não incomodavam mais. Os três, sempre se segurando nas amarras o máximo que podiam apreciavam a viagem, as revoadas de pássaros nos campos regados pelo Rio Car e o movimento de manadas de Lhamas que corriam pelas margens. Passado algum tempo, o barco foi diminuindo sua velocidade apesar de ainda seguir impulsionado pelas correntezas. De onde estavam observaram que a Cratera já dava para ser vista no horizonte e antes dela, a vegetação mudava. Era a Floresta Negra que se formava naquele entorno. Apesar disso, eles se sentiam seguros dentro do barco e dentro do Rio que agora era de águas tranquilas. Eles entraram na Floresta pelo Norte e apesar de estarem quilômetros de distância, bem longe da embarcação de Din e Jessica, se depararam com o mesmo ambiente. A sombra das árvores, o vento frio, o ar pesado e os arbustos nas margens que se mexiam e paravam. Aiua olhou para trás e os dois outros olharam para ele. Pelos olhares via-se que eles, principalmente Aiua e Lilly não se sentiam muito confortáveis ali. Com as mãos, Vlater começou a remar para que a embarcação alcançasse à margem direita que dava acesso a elevação 91
da cratera negra.
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Parte 22 Nasser abiu os olhos e aos poucos as imagens foram se formando. Ele olhava para o teto de onde estava deitado e aos poucos percebia que aquele local fora construído por alguém. Não era possível que a natureza tivesse esculpido com tanto esmero e com tanta presteza aquelas paredes uniformemente formadas de sulcos negros brilhantes os quais piscavam de vermelho e branco. Ele se sentou apoiando o corpo com uma das mãos e levou a outra a sua nuca. Ele sentia uma enorme dor na nuca e na cabeça. --- Que estou fazendo nesse lugar? --- pensava ele --- onde estará Sirio? Aos poucos ele ia observando o local enquanto se levantava do chão macio, das mesmas pedrinhas pretas roliças que fizeram escorregar até a base da cratera. Ao seu lado, uns 10 metros de distância havia um lago de lavas ainda em brasa. Àquela distância não eram tão quentes e já estavam em estado de resfriamento. Algumas já se tornaram solidas enquanto entre uma placa e outra borbulhava a rocha líquida vinda da profundeza do Planeta, essa sim, incandescente, com um vermelho forte. Era a luz que iluminava o teto. Era um local circular e no entorno desse local estavam dezenas de buracos profundos, cavernas secundárias que saiam ou chegavam até a caverna principal onde ele se encontrava naquele momento. Nasser encostou-se a uma rocha menos e procurou água em seu embornal. Pegou uma das garrafas que trouxe consigo e tomou metade da água num gole só. --- Água morna! Tudo aqui é morno, é quente... que lugar impressionante --- dizia ele consigo mesmo. Guardou a garrafa junto com os outros pertences enquanto se levantava da pedra e caminhava até o local com lava. --- Siiiirio... --- gritou --- Siiiirio onde você estááá? 93
Apenas o eco de seu grito respondeu ao seu chamado. --- Que devo fazer agora? Alguém me trouxe para cá e esse alguém só pode ter sido Sirio. Nós estávamos sozinhos até que ele entrou em transe e eu escorreguei. Será que devo procurá-lo dentro de uma dessas pequenas cavernas? Ele não pensou duas vezes. Alguma coisa tinha de ser feita e ele caminhou lentamente até a entrada maior de uma dessas cavernas e foi avançando. Ela era curta e aos poucos ele chegou a outro salão bastante parecido com o que ele estava e essa também tinha dezenas de outras cavernas. Nasser então entrou nesse outro ambiente e caminhou até outra caverna. --- Logo não saberei voltar onde estava... que importa... eu queria mesmo era encontrar a saída desse local e ir para minha terra de onde eu nunca deveria ter saído... Ele avançou por muitas cavernas e a cada uma que atravessava o ambiente era muito parecido com a anterior. Uma vastidão de paredes negras como se a lava tivesse escorrido por elas e depois de um tempo endurecido. Numa dessas entradas Nasser se deparou que havia um objeto diferente jogado no centro dela. Ele foi se aproximando sem tirar os olhos do objeto e quando ia se abaixando para pegá-lo ouviu uma voz atrás dele. --- Não toque nisso Nasser... Assustado ele olhou para trás e viu um homem que saia de uma das cavernas. --- Que...quem é você? --- Sou Sirio... Nasser foi se aproximando do homem e de boca aberta notou que era realmente seu antigo amigo só que muitos anos mais novo, já não apresentava mais as rugas da face e estava com o corpo ereto, como se tivesse voltado no tempo. --- Sirio... --- dizia ele em voz baixa --- como você fez isso? Você não... não pode ser Sirio... --- Sou eu Nasser...eu recebi energias suficientes para rejuvenescer assim que entramos nesse lugar. Acho que logo isso 94
vai acontecer com você... --- Mas... Sirio --- dizia ele enquanto passava sua mão no rosto do amigo --- é inacreditável... eu não posso te reconhecer... --- Veja isso que eu achei --- dizia Sirio enquanto mostrava uma pedra para Nasser --- isso é uma inscrição muito antiga. Esse local já foi visitado a muito tempo atrás. Essas pessoas falavam e escreviam em outra língua, diferente da nossa. Abismado ainda com a aparência jovem do Mago, Nasser segurou a pedra com as inscrições e ficou observando sem entender nada até que novamente de outra caverna ele se virou com outro chamado. --- Afaste-se dele Nasser... Nasser olhou para trás rapidamente e viu o Mago em sua aparência normal saindo de um desses buracos. Quando olhou para frente aquele homem novo que se dizia ser Sirio havia desaparecido deixando-o com a pedra e as inscrições nas mãos. --- Que está acontecendo Sirio? --- Eu voltei onde te deixei assim que entramos na Fenda, você estava desmaiado e eu te carreguei até aquele local e agora pouco cheguei lá e você não estava mais ali... o que você estava vendo? --- disse o Mago enquanto se aproximava do amigo. --- Apareceu um homem novo e disse que era você, mas estava bastante jovem, eu estava acreditando na conversa dele e ele me deu isso para segurar... ai você chegou e ele sumiu como a fumaça... --- Nasser, esse lugar é cheio da presença de enxofre e de partículas de gases dos quais não conhecemos até hoje... isso tudo pode ser uma reação desses gases que fazem a gente ter visões estranhas... deixe-me ver essa pedra. Nasser, ainda meio estonteado por aquilo que tinha acontecido passou a pedra para Sirio e observou que aquele objeto que estava no chão e ele iria pegar não estava mais ali. --- Acho que esse objeto estava no chão e eu que o peguei... --- Pode ser mesmo... o homem foi coisa da sua imagina95
ção... --- Não sei Sirio... passei minhas mãos no rosto dele, senti o seu calor... muito estranho. Na verdade eu queria ir embora daqui... --- Embora para onde Nasser? --- Ora para onde, para Candiu, para meu Castelo... --- A gente faz coisas nessa vida que nem mesmo sabemos o porquê fizemos... nós vamos embora daqui, não se preocupe, basta olharmos um pouco mais e depois vamos procurar a saída. --- Como assim procurar a saída? --- Você sabe onde fica a saída Nasser? --- Eu não sei nem como entrei aqui... --- Nem eu meu amigo... lembre-se que estávamos juntos lá fora e ai o que aconteceu com você aconteceu também comigo... --- Pelos deuses... --- Veja isso --- disse Sirio mostrando a pedra para Nasser --- aqui está escrito alguma coisa relacionada a armazenamento de alimentos, veja... --- Como você sabe disso? --- Veja... são frases escritas á partir de desenhos... uma estante vazia, sacos de cereais, sacos de frutas, aves mortas e finalmente a estante com todos esses produtos guardados na estante. --- Que coisa estranha, nunca se ouviu falar de outras civilizações nesse nosso mundo. --- Nunca... ao menos até hoje. Agora já sabemos que esse lugar foi visitado por outras pessoas que talvez não sejam da nossa época, nem da época de nossos pais, nem de nossos avós ou bisavós, eles estiveram aqui muito tempo antes deles. --- O que faremos agora? --- Venha, vamos seguir por mais umas dessas cavernas para ver onde iremos chegar. --- Acho que assim iremos nos perder... --- Já estamos perdidos Nasser, já estamos perdidos! 96
Parte 23 Noor e Vir preferiram dar a volta pelo lado sul da Cratera, eles queriam antes de entrar investigar um pouco mais a região para verem se havia uma entrada mais ampla do que aquela por cima das encostas negras e escorregadias. Isso foi confirmado em pouco tempo assim que eles passaram por uma clareira se aproximava ao máximo do Rio Car. --- Vamos por aqui. --- Me diga a verdade Noor... você consegue caminhar sem que eu te ajude. Vamos subir um pouco de encosta e depois entramos numa grande e escura caverna. --- Vir, acho que eu posso ver melhor do que você, além do mais, lá dentro não há luz e com certeza eu serei mesmo obrigado a guia-lo pois já estou acostumado com as trevas. --- Então vamos por aqui. A subida da encosta foi rápida uma vez que ela ficava praticamente na altura do solo da Floresta. Isso ocorreu porque com as enchentes constantes do Rio, a água passava pelas encostas e levava com ela as terras da beirada dessa encosta e ocorriam desmoronamentos. Mais tarde outras enchentes e outra vez o Rio levava as terras que desmoronaram e assim por diante até que ficasse baixa. Eles entraram pela grande caverna e principalmente Vir suspirava com o que via. --- Vir... --- Diga Noor. --- Descreva o que você está vendo. --- A entrada por que passamos tem uma altura monumental, acho que uns 40 metros de altura. As paredes são grossas, formadas por várias e várias erupções que escorreram a lava por cima da própria lava que já tinha endurecido. Esse forro todo é negro e brilhante, parece vidro negro e se formam sulcos entre uma escorrida de lava e outra. Túneis dessa mesma lava derretida se solidificaram e com o passar do tempo e de 97
muitas e muitas erupções formaram dezenas, talvez centenas de passagens que são como um labirinto. --- Posso sentir o calor no chão... --- dizia Noor enquanto caminhava ao lado de Vir num frenético entra e sai de tuneis e passagens em arco. --- Entramos agora num salão esplêndido... diferentemente dos outros em que estávamos, esse é limpo, não se vê pedras médias jogadas e espalhadas, estamos pisando praticamente num tapete negro de bolinhas de pedras negras brilhantes que parecem terem sido polidas uma a uma e... --- parou um pouco --- E... o que está vendo Vir? --- E ao centro desse enorme salão existe um buraco com o mesmo material... --- Um buraco? --- Sim Noor... um buraco a três metros de nossos pés que... --- Vamos nos afastar dele Vir --- gritou Noor Não deu tempo de voltarem. Como um funil que recebe a água, as pedrinhas começaram a rolar sobre seus pés e ambos caíram de costas no chão. --- Estamos escorregando para o buraco Noor --- gritava Vir --- Resista Vir --- gritava Noor --- tente voltar e me puxe para cima... use seu cajado... Era impossível tentar alguma coisa diferente daquilo que estava acontecendo. A força das pedras roliças carregavam seus corpos lentamente e mesmo cravando no chão as mãos e os cajados, ambos não encontravam um solo mais firme no fundo, eles tinham a impressão de que abaixo deles já era parte do buraco. Uns dois metros, Noor sumiu dentro do buraco, Vir ainda tentava resistir mais já estava sem forças, ele também foi sugado pelo buraco. A queda livre de ambos foi rápida, quem sabe uns 5 ou 10 segundos e já sentiram seus corpos caindo sobre uma montanha 98
dessas mesmas pedras. Não pararam ai. O monte de pedras não era sólido, ainda bem senão poderiam ter se quebrado, mas por ser macio, continuaram a rolar e escorregar pelas encostas até chegarem ao solo plano desse ambiente. --- Noor... Noor... --- gritava o Rei Vir que se levantava e caia novamente não conseguindo firmar seu corpo devido o efeito da queda e das pedras roliças que não sustentavam o peso do corpo --- Noor... --- Estou aqui --- disse Noor --- acho que estou na base da pilha do lado oposto do seu... ouço sua voz mas não posso te ver... Vir deu a volta ainda escorregando um pouco e conseguiu alcançar seu companheiro que estava ainda tentando se levantar. --- Venha... eu te ajudo... Aos poucos e um se segurando ao outro conseguiram chegar até um local um pouco mais distante da montanha de pedras. Ali o solo estava firme e então puderam se levantar. --- Pelos Deuses... onde viemos parar? --- A Fenda... entramos na Fenda Vir --- dizia Noor segurando nos braços de seu amigo e procurando ver onde estava ou ao menos sentir alguma vibração. --- Acho que nunca mais sairemos daqui Noor... --- Também começo a pensar nisso... mas veja esse lugar... eu sinto que ele é esplendido... melhor morrermos aqui do que em guerras e em acidentes e sermos enterrados em valas comuns ou sermos cremados em embarcações que seguem a correnteza do Grande Candi... --- Que você está falando Noor... --- Não sei... sinto que as palavras estão sendo colocadas na minha boca... --- Como assim... --- Há alguma entidade aqui... --- Você pode senti-la? --- Posso... algo muito forte Vir... meus pensamentos estão se misturando... 99
--- Que estará aconte... --- dizia Vir quando foi interrompido por uma voz que se aproximava deles pelo lado oposto da pilha de pedras negras. --- Está com medo Noor? --- disse a voz --- Quem está ai? --- Seu mestre --- afirmou a voz e qual não foi o espanto deles quando olharam para a esquerda e se depararam com Sirio que se aproximava em pé, segurando firme seu cajado. --- Sirio --- exclamou Noor --- só pode ser um pesadelo... --- Sou eu mesmo meu caro... em pele, osso e espírito. --- Pelos Deuses... o Mago Sirio em pessoa --- dizia Vir que por pouquíssimas vezes viu Sirio pessoalmente. Uma das vezes foi quando foi com seu pai vender vidros em Candiu e de lá foram fazer uma entrega especial nas Montanhas e essa entrega era exatamente ao Mago Sirio. A outra vez, foi perto da Floresta nas proximidades de Vigilia quando ele e Noor travaram sua última batalha e ambos saíram feridos porem, Vir chegou a acudir seu então amigo Noor que tivera o rosto rasgado quando o Mago lançou sobre ele uma magia em forma de raio que lhe rasgou o rosto de orelha a orelha. --- Você se lembra de mim Vir? --- Lembro sim Mago...mas... --- Pensou que eu já estava morto? --- Eu nunca mais o vi... e pouco ouvi falar do Senhor... Como todos na Sirvia, Vir sempre teve respeito pelo Mago Sirio e foi igualmente ensinado a rezar e orar aos Deuse na direção das Montanhas do Oeste porque era ali que morava o representante dos Deuses naquele Mundo. --- Como você veio parar aqui? --- perguntou Noor --- Eu que pergunto Noor... talvez estivesse querendo espreitar o que você viria fazer aqui e os ventos me contaram que você estava vindo para esse fim de mundo. --- Vejam --- gritou Vir apontando para trás de Sirio --tem alguém ali. --- Sou eu... --- Eu quem? 100
--- Nasser... Rei de Candiu --- Ora ora, será um encontro de Chefes de Tribos da Siria --- disse Noor com um tom sarcástico. Nasser é um verdadeiro político. Ele conhecia todo mundo e todo mundo o conhecia. Ele era até então o maior comprador da Siria e todos o respeitavam por isso. Noor sempre manteve uma amizade com ele mesmo sabendo de sua proximidade com Sirio. As forças do exército de Candiu não eram para se brincar e Noor nunca tentou nada que deixasse o Rei Nasser pensar que ele era um inimigo. Vir o conhecia do comércio de vidros e de alimentos. Por várias vezes fizeram negócios juntos e de certa forma se davam bem, mesmo por muitas vezes ter recebido bem menos que o combinado em vendas de seus produtos a Nasser. --- Vocês estão perdidos como nós estamos... --- disse Noor --- eu sinto isso. --- A Fenda trás novidades... acho que perdidos não é bem a palavra certa, eu e Nasser estamos a procura... do que ainda não sabemos. --- Mago Sirio, o Senhor tem alguma noção de como sair daqui? --- Chegamos aqui da mesma forma de vocês, engolidos pelo buraco... resta-nos procurar o que viemos ver... juntos ou... separados novamente... A proposta de Sirio era razoável. Ele conversava, ao menos até agora, sem remorsos das discórdias que teve com Noor no passado. --- Bem... --- disse Vir --- vamos seguir em frente nós quatro... juntos até onde pudermos ir e tomara achemos uma saída razoável dessa enrascada em que entramos. Noor estava até então quieto e com a cabeça baixa. Ele se desencostou da parede onde se apoiava e disse. --- Vamos... Os quatro agora seguiam juntos por mais uma das cavernas sem saber ao menos onde ela levava... todos eles em silêncio. 101
Parte 24 --- Vocês sentiram o chão tremer? --- Perguntou Lilly --- Eu não... --- O terreno aqui perto dessa cratera é bastante instável. Vulcões, mesmo extintos, estão sempre em estado de acomodação. Pensem na gordura de um Alce que fica sobre a água quando estamos cozendo sua carne numa panela grande. Mesmo que seja retirada do fogo a gente nota que a algo mais frágil por baixo, é a água quente que se move fazendo essa camada de gordura se mover... --- Nós estamos sobre essa camada de gordura... --- Exatamente Aiua... estamos caminhando sobre um terreno móvel e se a panela for novamente colocada no fogo, a água voltará a ferver e a terra vai se mover até aparecerem fendas por onde essa água quente vai escorrer... esse é um exemplo do solo do Vulcão e de seu entorno. --- Isso é verdade... notei isso desde que descemos do barco e senti o solo aquecido, quanto mais nos aproximamos ele fica mais aquecido. --- Venham por aqui acho que é mais seguro. Aiua, Lilly e Vlater estavam dentro do Vulcão. A entrada pela lateral Nordeste, de onde vieram, era ampla e parecia um buraco que levava até o centro da montanha. --- Impressionante como isso é bonito! --- dizia Lilly --- É uma beleza fantasmagórica... eu ando aqui e imagino essa lava em estado líquido escorrendo por essas paredes... o calor que isso deve ter... --- Ei... venham por aqui...vejam o que eu achei... --- gritou Vlater Aiua e Lilly se aproximaram da sala onde Vlater estava e viram centenas de ossos espalhados pelo chão. Não pareciam ossos humanos, eram ou muito grandes ou muito pequenos. --- Não vejo nenhum crânio... pelos Deuses --- disse Lilly apavorada quando se deparou com uma enorme sombra que vi102
nha de trás de Aiua --- CUIDAADO AAIUA... --- gritou ela. Aiua olhou para trás e não teve nem o reflexo de gritar. O animal meio cão meio homem mergulhou sobre ele mordendo-o no pescoço que imediatamente jorrou sangue. --- Venha para cá Lilly --- gritou Vlater que até então estava despercebido do que acontecia observando os ossos no chão --- rápido, vamos para trás daquela pedra. Era um Cinocéfalo ou somente Cino como era costumeiramente chamado. É outra raça que foi bastante perseguida por todos os povos da Sirvia. Eles atacam geralmente em bandos de 5 ou 6 e devoram suas vítimas. Há muitos anos não havia notícias de um ataque dessa criatura e Lilly nunca nem tinha ouvido falar deles. --- Vamos ficar juntos Lilly... ele já nos viu... Em poucos segundos outro Cino apareceu, esse era um pouco menor, mas assim que viu o sangue no chão e os pedaços de Aiua ele começou a devorá-los enquanto o outro, o maior, veio caminhando para o lado em que estavam Lilly e Vlater. --- Por aqui Lilly... temos uma chance no salão anterior a esse. Andando rapidamente e de costas para não serem pegos de surpresa eles entraram no salão maior onde ambos estavam segundos atrás. --- Venha --- gritou Vlater --- vamos ficar atrás dessa piscina de lava endurecida. Assim que eles se posicionaram as duas criaturas entraram no salão e começaram a querer cercar suas presas. Eles vinham rosnando e babando um de cada lado da piscina. Num movimento rápido, Vlater bateu com força seu cajado na lava que abriu um buraco vertendo a pedra derretida sobre a sólida. --- Você tem seu cajado com você Lilly? --- Sim...está comigo... --- Pois bem... um vem do seu lado e o outro do meu... ataque ele da mesma forma que eu vou fazer agora... Assim que o Mago acabou de dizer isso e o cão maior 103
estava há uns 3 metros dele na sua direita ele bateu o cajado de lado na lada fumegante e essa espirrou na criatura. Foi um golpe de muita sorte. A lava quente acertou o rosto e o peito do meio animal meio homem que urrou e levou suas mãos a cabeça. Muito rapidamente Vlater deu a volta por trás e com muita habilidade o empurrou com os pés e o mesmo caiu na piscina que agora estava vermelha, borbulhando de calor. A criatura caiu de cabeça e rapidamente se desintegrou. O outro observou aquilo e deu um grito misturado de horror e de raiva e veio para cima de Lilly que recuou de costas e quando ele estava a menos de 2 metros para alcança-la a criatura parou e olhou para trás de Lilly. Ele parou e recuou. Vlater havia vestido seu gorro e ficou com os braços abertos como se fosse um Urso. Ele fazia ruídos como se fosse um Gorila e cresceu, dentro da sua capa e gorro negros ele estava com mais de 4 metros, depois 5, depois 6 ou 7 metros e então rosnou como um animal furioso a ponto de Lilly olhar para trás e ver aquilo assustada. --- AAaaaaahhh --- gritou Lilly com as mãos nos olhos. Naquele momento passou por sua cabeça que outra criatura havia devorado seu amigo Mago e agora seria a vez dela até que reparou bem e notou que Vlater estava no seu tamanho normal, abaixo dessa criatura... que era somente sua sombra que havia crescido. O Cinocéfalo estava atordoado olhando para aquela enorme criatura negra e Vlater então gritou. --- Mate ele Lilly... Ela estava 2 metros da fera e sem titubear virou-se e cravou seu cajado bem no seu coração. Ele uivou segurando o cajado preso a seu peito e caiu para trás, de costas, morto. Lilly ficou olhando para ele caído e só tirou os olhos quando Vlater chegou ao seu lado e tocou em seu ombro dizendo. --- Aiua era um bom homem. Ela o abraçou forte, ainda tremendo. Lilly nunca havia matado um homem, e aquele parecia um deles, ao menos seu 104
corpo era de um homem forte. --- Co... como... você fez isso? --- Ilusão de ótica... é mágica mais antiga de todas. Eu estava na frente da luz do fogo e vi que atrás de mim havia uma parede alta. Nem pensei duas vezes. --- Pobre Aiua --- dizia Lilly se afastando dos braços de Vlater --- éramos bons amigos... tínhamos nossas diferenças mas sempre trabalhamos pelo bem da nossa gente... ele sempre foi um Chefe exemplar... --- Tenho certeza disso Lilly... tenho certeza disso... --- Precisamos descansar um pouco... comer e beber... --- Venha... o perigo já passou ... vamos nos sentar aqui, eu trouxe o embornal de Aiua, vamos ver o que ele trouxe. Ambos se sentaram e começaram a comer frutas secas, e beber suco de mangas que Aiua trazia em seus pertences. --- Vlater ... --- Sim. --- Quando nos conhecemos você disse que conhecia meu pai, meu avô... como pode ser isso? Você tem 300 anos? --- É uma longa história... nas terras que andei todos me falavam deles Lilly. Seu pai e o pai dele foram grandes caçadores e guerreiros pela causa de seu povo... eu ouvi tantas histórias deles que os fiquei conhecendo... Lilly olhava para a fruta seca que comia e num momento ela virou seu rosto e olhando Vlater de frente ela disse. --- Você pensa que sou uma criança boba não é mesmo? Vlater olhou para ela, retirou o gorro de seu casaco que cobria sua cabeça e fez que não com a cabeça sem dizer uma palavra. --- Eu não sou uma criança... Ficaram em silêncio por algum tempo observando o que comiam, ambos com a cabeça baixa. --- ... muito menos boba! Lilly se levantou e foi olhar o pouco que restou de seu amigo Aiua, ao lado do monte de ossos. 105
Parte 25 Sirio, Noor, Nasser e Vir atravessaram incansavelmente dezenas e dezenas de tuneis, passagens, arcos e portais. Parecia um mundo sem fim ali naquele subterrâneo. O que mais os intrigava era o fato da iluminação, pois por onde passavam as paredes pareciam terem uma luz própria, como se fossem embutidas por trás daqueles sulcos negros e profundos que um dia escorreram vivos formando aquelas grossas paredes. Outro fato que em muitas das paradas eles comentaram era o ar. No início, assim que chegaram à montanha saindo da Floresta Negra o ar era pesado, seco, empoeirado, agora não, quanto mais eles penetravam nos túneis e percebiam que estavam descendo o ar ficava mais puro, mais suave. --- Vamos parar um pouco... meus pés estão ardendo... parece que andamos há dias sem parar nesses túneis... --- É a idade que vai chegando --- provocou Sirio --- Pode até ser... já não tenho mais a vitalidade que tinha quando te desafiei... --- Mesmo assim saiu perdendo... Vir percebia que os dois estavam se provocando e não era só naquele momento. Em outras oportunidades sempre um alfinetava o outro. --- Escutem... ao menos aqui rogo que sejam um pouco mais cordiais um com o outro. Tanto eu como o Rei Nasser não temos nada a ver com as discórdias de vocês e acho que não somos obrigados a presenciar isso... Ele disse aquilo e parou um tempo, olhou para Nesser e começaram a rir. --- Como se pudéssemos evitar essa conversa --- disse Nasser --- pior que somos obrigados sim. A conversa cessou durante um tempo e então eles todos, ao mesmo tempo, levantaram as cabeças e olharam um para o outro com um ar de indignação, como que tentando escutar alguma coisa. 106
--- Vo... vocês estão ouvindo isso --- Perguntou Nasser. Eles saíram de onde estavam e foram caminhando juntos, em silêncio, atrás de um som bastante conhecido por todos... o som do canto de passarinhos. Passando por um curto corredor e no final dele um grande arco eles ficaram abismados quando chegaram num lugar magnífico. Era uma floresta de plantas de toda ordem, pássaros revoando, um pequeno riacho onde aparentemente corria uma água pura e cristalina e dezenas de macacos aranha, pregos e micos que pulavam de galho em galho atrás de frutas frescas das enormes Figueiras, Amoreiras e Mangueiras repletas de frutas maduras. --- Que coisa linda ver esse lugar... --- disse Nasser --agora voltarei para Candiu e vou organizar uma grande festa para toda população. --- Estamos no centro do Vulcão --- dizia Sirio enquanto andava sobre a grama macia --- a chuva alcança essa espécie de buraco formado pela lava quente que um dia, há muitos anos foi expelida por toda região... --- Isso deve ter sido a milhões de anos --- disse Noor ---Exatamente, milhões de anos atrás... --- Mas como pode o chão e as paredes daquelas cavernas ainda estarem quentes e vertendo lava aquecida... --- Lá dentro a água da chuva não alcança... abaixo do solo dessa espécie de jardim ainda existe lava quente, mas o vento, a chuva que cai, deixam o solo resfriado. --- Será que podemos tomar essa água? --- Acho que sim... é água da chuva... --- Vejam a altura dessas paredes... Todos ficaram olhando para cima e notavam que as paredes lisas e negras formavam um paredão circular de quase 500 metros de altura. --- Taí a saída Nasser --- disse Vir em tom de deboche --basta escalar essa muralha e então estará na Floresta Negra, rumo a Candiu. --- Acho que estamos bem perto de nosso objetivo... já co107
nhecemos a fenda, basta achar o que todos nós viemos procurar aqui e todos vocês sabem bem do que estou falando. --- Eu vim obrigado, não acredito nas lendas que as pessoas contam --- disse Vir. --- E você Noor --- disse Sirio --- veio atrás do que? --- Vocês todos bem sabem... --- As Cartas --- disse Sirio em voz baixa --- onde estarão as cartas? Não sei por que motivo, mas acho que estamos perto delas... A Lenda das 4 Cartas era muito antiga e muito falada em todo aquele mundo. A maioria das pessoas dizia que aquilo era uma invenção para que as pessoas se aventurassem em entrar na Fenda e sumirem para sempre. Outros por sua vez falavam que essas pessoas não sumiam e sim se transportavam para outra dimensão, para outros mundos, o fato é que muita gente se arriscou a tê-las consigo e nunca mais foram vistas. --- Somos em 4 e existem 4 cartas --- disse Noor --- uma para cada um de nós. --- E como será a escolha? --- Na sorte... cada um colocará a mão dentro do embornal e retirará a sua. Então, uma voz grossa ecoou no jardim onde eles estavam. --- Somos seis e não quatro... Era Vlater e Lilly que se aproximavam do grupo. --- Vlater... --- exclamou Nasser que já o conhecia --- então foi isso que trouxe de tão longe? --- Quem é esse sujeito? --- perguntou o Rei Vir --- Esse é o famoso Vlater --- dizia Sirio enquanto caminhava até perto dele --- o homem das mil faces, ou o espírito das florestas, ou o Rei da Gardia... como queiram... --- Sirio, pelo jeito você já ouviu falar muito de mim. --- E nunca ouvi falarem bem de você... --- Você os conhece Vlater? --- Perguntou Lilly --- Alguns deles eu conheço bem, outros não... que falta de educação a minha... deixe-me apresentar Lilly, a Chefe da 108
Aldeia Crende... --- Lilly... --- dizia Sirio --- conheci muito Taor, seu pai... --- Ouvi falar de você Mago Sirio... e nunca quis encontrá-lo... --- E os homens de sua Aldeia? --- perguntou Sirio mostrando um leve sorriso --- vocês já formaram seu exército de homens fortes? Lilly ficou irritada e ameaçou levantar seu cajado contra Sirio mas foi interrompida por Vlater. --- Tudo a seu tempo Lilly... tudo a seu tempo... --- disse ele para a Chefa que se mostrava furiosa. Em toda Siria se ouviam rumores de que Sirio, juntamente com o então Rei Messia, pai de Nasser, quiseram tomar a Aldeia Crende para terem assim o domínio das águas do Grande Rio. Para isso, numa noite escura em que os homens da Aldeia haviam saído para conter uma matilha de Pelores que estavam arruinando sua criação de animais, inclusive muitos Rãmm, sequestraram quase todas as mulheres da Aldeia. O Mago que as detia para seus experimentos, injetou em seu sangue o que ele chamava de ‘alma feminina’, um produto que segundo eles não as deixava mais gerarem homens. Na volta da caça, os guerreiros da Tribo se entregaram desde que Sirio e Messia soltassem as mulheres. A troca foi feita e os homens foram escravizados e muitos deles morreram no trabalho ou pelos castigos a que eram submetidos por desobedecerem ao Rei. Daqueles dias até os dias de hoje, a Aldeia não gerou mais homens e todas elas sabem que o destino final está perto, o dia em que padecer a última Crende. --- Será engraçada essa disputa --- disse Vir --- eu não desejo carta alguma, só quero voltar para meu povo e que os prisioneiros feitos por Noor sejam devolvidos. --- Em breve Vir... isso acontecerá em breve... --- disse Noor. Já estava escurecendo e sem dizer nada, cada dupla procurou se abrigar em algum lugar seguro. Nasser e Sirio subiram 109
numa Figueira e ali se acomodaram como podiam. Vir e Noor encontraram uma árvore que tinha seu tronco oco, limparam aquela toca, retiraram as formigas e outros insetos e ficaram ali. Vlater e Lilly por sua vez voltaram para dentro da caverna e se deitaram num monte de pedras roliças... antes disso Vlater tirou sua capa com toca e a estendeu no chão para que ficasse mais macia. --- Então é verdade o que dizem --- exclamou Lilly --- eu vou matar esse homem... no primeiro momento que puder eu mato ele, nem que isso me custe a minha própria vida... --- Tudo a seu tempo Lilly... vamos ficar de olho nele, mas com cuidado, ele é mais esperto do que nós dois juntos e não sei ao certo, mas se ele quiser, de lá onde está no galho daquela árvore ele sabe o que estamos falando aqui. Lilly olhou para Vlater e olhou pela janela a frente deles, dentro da caverna e que dava para ver a árvore em que Sirio estava. Ela só fez que sim com a cabeça, sem falar mais nenhuma palavra. --- Noor --- chamava Vir em voz muito baixa. --- Diga... --- Quer retirar sua máscara? --- Já a retirei Vir... Vir percebeu que Noor a passava no escuro. --- Sinta ela... é de vidro... da mais alta qualidade... Vir, no escuro daquela pequena gruta, segurou a máscara com uma das mãos e passou sua outra mão em sua superfície gelada. Ele percebia cada detalhe que a forma determinou, os olhos feitos como se estivessem cerrados, as arestas das maças do rosto, o desenho das sobrancelhas e das rugas, os orifícios das narinas e da boca, tudo era perfeito, parecia que ele acariciava o rosto do seu sequestrador. Ele chegou a pensar ‘Noor odeia seu rosto como está, se eu quebrar essa máscara eu me vingarei daquilo que ele fez com meu povo, com a 3 mulheres que ele mandou matar na minha frente’... mas Vir era uma pessoa muito boa, um homem simples que preferia a disputa nas palavras que nas guerras, 110
ele nunca iria se perdoar se fizesse uma coisa dessas. Vez ou outra o chão tremia um pouco. Os barulhos e ruídos eram de toda ordem, desde tremores de terra, rochas caindo, o vento soprando nas árvores mais altas e barulhos de animais, havia muitos animais ali e nenhum deles adormeceu totalmente. Eles acordaram várias vezes durante a madrugada com os ruídos ou com os pesadelos em seus sonhos. O cheiro de enxofre e de pedra queimada estava por toda parte. Muitas vezes eles cobriam as narinas com panos para não se intoxicar com aquele cheiro horrível. Foi uma noite bastante difícil para todos eles.
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Parte 26 Din e Jessica acordaram assustados com os trovões e os raios. O riacho onde eles estavam dentro do Vulcão os protegia da chuva forte, mas o som dos estrondos ecoava pelas paredes negras e dobravam sua intensidade. Assim que eles entraram pelo Rio Car na meia escuridão da Floresta Negra eles notaram que um braço do Rio seguia até a base da Montanha. Por segurança eles resolveram remar bem devagar por aquele riacho e muitas vezes tiveram de afastar os arbustos que invadiam a água interrompendo a passagem do pequeno barco. Foi o melhor de todos os caminhos. Além das enchentes do Rio Car causados pelo degelo das Montanhas do Norte terem desgastado as bordas altas do Vulcão, formaram-se alguns braços de água que encontraram fendas no chão e entraram dentro da montanha cobrindo de água várias daquelas cavernas. O braço que eles seguiram, sem saber daquilo, fez com que ambos nem sujassem seus pés nas pedrinhas negras roliças que deram tanta dor de cabeça aos outros. --- Lá fora está chovendo muito --- disse Jessica --- Você está com medo? --- Sim... --- Eu também Jé... estou morrendo de medo e acho que dormi porque não aguentava mais de sono. --- Você tem alguma coisa para a gente comer? --- Vamos ver --- disse ele abrindo seu embornal --- tenho algumas frutas secas e alguns pedaços do peixe que assamos na beira do Rio... tome, coma isso! --- Para onde iremos agora? --- Ontem à noite quando a própria correnteza nos trouxe até aqui eu não enxergava um palmo a frente do meu nariz, hoje vejo que paramos porque essas plantas fecharam a passagem. --- Empurre-as com seu remo. 112
Din empurrou as plantas e ambos viram que o riacho seguia a frente. --- Vamos comer e depois seguimos com atenção. Feito isso eles dispensaram os restos de peixe para não restas odores que pudessem atrair animais selvagens e seguiram pelo mesmo braço do Rio que os levou até ali. --- Veja Din --- dizia Jessica apontando para uma clareira a frente do barco --- ali existem luzes... --- São vermelhas... deve ser lava em chamas... --- Pare o barco... --- sussurrou alto Jessica --- estou vendo sombras passando pelas paredes... --- Eu também vi... o que será? --- Nossa --- disse Jéssica sorrindo – são Pézões... Dentro de uma caverna havia um bando de Skiapodes os quais muita gente os chamava de Pézão. São criaturas inofensivas que têm uma perna e um pé sendo que esse pé é enorme, largo e grande. Eles são quase humanos. A única diferença é que entre eles não existe macho e fêmea, eles têm os dois órgãos reprodutores. Gostam do calor intenso e temem o frio. Sempre são vistos nas imediações tanto do Vulcão da Fenda como no Monte James o qual também é um Vulcão. Não são domesticáveis pois gostam de andar pelas matas nos dias de sol quente a procura de frutas e de insetos que são seu alimento predileto. Quando se prende um Pézão você o condena a morte bem rapidamente. Em cativeiro eles sobrevivem por 1 ou 2 dias no máximo. Dizem na Sirvia que eles morrem de tristeza. --- Vamos nos aproximar um pouco mais... O barquinho percorreu mais uns 200 metros até chegar a boca da caverna que dava para a clareira de lavas fumegantes. Ainda da porta, sem que os Pézões vissem os dois, de dentro do barco Din atirou alguns pedaços de frutas secas que tinha em seu embornal. Logo eles vieram e começaram a comê-las. --- Hei... --- gritou Jessica com um sorriso acenando para eles. 113
--- Veja... eles estão vindo... nossa, são muitos... Era uma comunidade de Pézões desde os mais velhos com barbas e pelos no corpo até alguns bem pequeninos, crianças com uma perna só e pés enormes. Jessica desceu do barquinho e já pegou um pequenino no seu colo abraçando-o com todo carinho. Os outros se aproximaram e começaram a passar as mãos nos cabelos dela e ajudar Din a descer do barco. Din e Jessica sempre estavam no Monte James e assim se acostumaram com essas criaturas. Muitas vezes quando Din trabalha com a areia fazendo seus vidros ele é rodeado por Pézões que ficam observando ele assoprar as bolas de vidro incandescentes para torná-las garrafas ou vasos. Eles ficam abismados com aquele processo e se olham entre eles, soltam ruídos que deve ser sua língua de comunicação e dão risada quando Din ou Jessica se queimam com o material quente. --- Vocês são muito lindos --- dizia Jessica já com dois nenês Pézões nos seus braços. Um deles, talvez o mais velho se aproximou de Din e começou a grunhir e fazer sons estranhos como se quisesse falar alguma coisa. --- O que você está querendo me dizer? A criatura encantadora mantinha uma expressão amena, mas vez ou outra apontava para as cavernas e fazia uma cara de bravo e levantava seus ombros como que imitando um monstro. --- Din, acho que eles querem nos dizer que viram pessoas por aquele lado... --- Nossa, será que eles viram o Rei Vir? --- disse Din chamando eles. Din correu até o início do túnel perto do Rio e colheu uma folha grande de um arbusto. Voltou e pegou um pedaço de um galho antigo que encostava no chão perto da lava e se queimos virando um carvão. --- Vejam isso... --- disse ele enquanto se ajoelhava no chão e sobre a folha iniciava um desenho de um homem com 114
olhos grandes e barba comprida tentando fazer com que o desenho se parecesse com Vir. --- Vocês viram ele? --- mostrando o desenho Logo todos olhavam e pulavam em sua única perna fazendo ruídos e apontando para o interior das cavernas. Era uma certeza, eles reconheceram o desenho. Din conhecia aquelas criaturas como ninguém, eles nunca mentiam. --- Vocês podem nos levar a eles? --- disse Jessica colocando as crianças no chão e gesticulando apontando ela e Din, eles e depois o fundo da caverna. Eles se entreolharam, um deles pegou a folha do desenho, ajoelhou-se no chão e desenhou ao lado da imagem de Vir mais 5 quadrados... --- Din, o Rei Vir não veio só com Noor... tem mais gente com eles. Din olhou para o Pézão que havia retocado o desenho e disse. --- Leve a gente até eles --- batendo no próprio peito, mostrando Jessica e depois apontando o desenho. A criatura olhou para seus amigos, grunhiu alguma coisa e mais 5 deles se juntaram ali perto. Estava formada uma guarda e ao mesmo tempo um passeio turístico por aqueles túneis. --- Eles devem conhecer todo esse lugar na palma de suas mãos, eles vivem aqui... --- Vamos --- disse Din chamando-os com as mãos. E os 6 Pézões foram pulando com uma agilidade sem igual para dentro da caverna seguidos por Din e Jessica que andavam a passos largos para não perderem eles de vista.
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Parte 27 A chuva forte daquela manhã encharcou toda aquela Floresta interna. Agora caia uma fina garoa, mas estava frio devido a umidade e a corrente de vento que vinha do alto da boca da Cratera. Sirio e Nasser acabaram descendo da árvore no meio da madrugada e foram para o mesmo abrigo onde estavam Vlater e Lilly. Lilly chegou a ficar observando na penumbra da noite, iluminados pelas luzes das poças de lava, se Sirio adormecia. Ela tinha um objetivo de acabar com aquele homem e queria que ele dormisse profundamente para que ela cravasse o cajado em seu coração assim como fez com o Cinocéfalo que matou Aiua e depois a atacou. Vir e Noor permaneceram dentro do tronco oco. Lá dentro não molhou e eles puderam descansar um pouco melhor, mas a essa hora já estavam andando pela pequena Floresta colhendo e comendo frutos de Candiu e Mangas as quais as árvores estavam abarrotadas de frutos. --- Eu já havia ouvido falar do Senhor --- disse Lilly enquanto se aproximava de Vir e colhia também algumas frutas. --- Não precisa me chamar de Senhor... sou uma pessoa simples... --- Sim...Vir --- Assim é melhor... você é do extremo Norte e eu do extremo Sul. Mesmo assim o Continente não é grande e as notícias correm... eu também já ouvi falar de você e de sua tribo Lilly. Hoje sou um mero fabricante de objetos de vidro, mas no passado eu fabricava e entregava para venda em todos os pontos da Sirvia. --- Você já esteve em Crende? --- Muitas vezes... conheci seus pais e sempre tive uma boa relação tantocom os Crendes como com os Margos lá do Norte. 116
--- Você conheceu Aiua? --- Sim... conheci... trocávamos mercadorias... eu lhe fornecia vidros e ele as belíssimas e fortes cerâmicas fabricadas por eles... --- Ele está morto... --- Morto? Como assim? Um homem tão forte... --- Foi ontem --- dizia Lilly com a cabeça baixa --- nós chegamos aqui trazidas por esse homem chamado Vlater. Fomos atacados por Cinocéfalos e um deles matou e devorou Aiua na nossa frente... --- Pelos Deuses... vai ser difícil escolherem um substituto a altura e com a coragem de Aiua na sua Aldeia. Com certeza o povo Margo vai ficar muito triste, ele é muito querido ali. --- Verdade... eu sei o quanto ele era bom... nos vemos praticamente todos os dias... bem --- disse ela com ar de tristeza --- nos víamos! --- Você sabe o que procuram? --- Vlater nos disse que é algo que poderá nos salvar pois se cair em mãos erradas poderá ser o fim da paz no nosso Continente. --- Tenha certeza que ele está certo disso... --- Mas me diga Rei Vir, o que eles tanto procuram? Vir percebeu que Vlater estava se aproximando e ficou um pouco receoso para contar a história para Lilly. --- Olá Rei Vir... sou Vlater de Gardia. --- Já ouvi falar de você Vlater... fazemos muitos negócios com navegantes e mercadores do seu Continente. --- Espero que não tenham mentido sobre a minha conduta e a minha honra. --- Apenas me disseram que você é um Mago... e... --- E? --- Bem, falam que você não é desse nosso Mundo. --- Que bom... quem sabe algum dia alguém me apresente o meu verdadeiro Mundo pois nem eu sei de onde sou. Mas, diga-nos, o que sabe desse lugar e do que vieram atrás, afinal Lilly também gostaria de saber. 117
--- Dizem que aqui estão o que chamam de ‘as vontades dos Deuses’. --- Como assim? --- perguntou Lilly. --- Aqui a gente pode encontrar ‘o passado, o futuro, o mundo dentro de nosso mundo e finalmente a morte’. Lilly ficou toda arrepiada com aquilo que Vir havia dito. Muita gente não gostava nem de falar dessas coisas, sempre se achou que era um desafio aos Deuses e a Sua vontade. --- Você nunca ouviu falarem disso Lilly? --- Nunca... ouvi falar que essa Fenda guardava poderes, mas nunca estes que podem alterar as vidas das pessoas... --- Não tenho certeza se existem de verdade --- disse Vir --- sempre achei que isso era uma lenda, mas é o tal negócio, quando muita gente diz essa mesma coisa pode ser que haja um fundo de verdade. --- E é verdade Vir --- disse Sirio que se aproximava olhando para a cara de Lilly que já se fechava de raiva --- se você tiver esses poderes menina você poderá salvar sua Aldeia do triste final --- e quando ia esticando sua mão para passar nos cabelos de Lilly ele foi interceptado por Vlater. --- Não toque nela... Os dois se olharam e dava para ver faíscas saindo de seus olhos. --- Tire suas mãos de mim... e pense duas vezes antes de encostar novamente... --- E você, não ouse mais dirigir suas palavras medíocres para essa moça... ela está comigo... --- Eu só espero que você não queira me enfrentar Mago Vlater, o homem que nem sabe quem é... --- Você é um velho que não tem mais forças para nada Sirio... eu não faria nada de mal para um ancião. --- Pelo jeito você não tem muitos amigos não é mesmo Sirio? --- disse Noor --- Eu não preciso de amigos... só quero minha liberdade interna... o resto para mim Noor, é um simples resto! A conversa esta em início de pé de guerra quando eles 118
ouviram os gritos apavorados de Nasser. --- Me ajudem... por favor me ajudem... Todos correram e procuraram Nasser do local de onde vinham os gritos... --- Pelos Deuses... estou aqui...em...cima... Assim que eles olharam para cima viram que Nasser estava preso pelos galhos de uma Byblis Gigante. Essa é uma planta carnívora comum daquela época e que é nativa da Sirvia desde os primórdios. Sua altura comum é de no máximo 30 ou 40 centímetros, mas naquele local devem ter sofrido alguma mutação e essa e deveria ter mais ou menos uns 20 metros de altura. --- Não se mexa muito Nasser... essa planta detecta o movimento da sua presa e então a estrangula... --- Pelos Deuses Sirio, use sua Magia...me tire daqui... Sirio levantou seu cajado e dele começou a sair uma espécie de névoa fina que foi envolvendo a planta desde a sua raiz. --- Ela está apertando mais Sirio --- gritava Nasser --não me deixe morrer... minhas pernas estão adormecidas... --- Mantenha-se calmo amigo... --- dizia Sirio. O Mago continuava a sua magia com o cajado quando Vlater e Vir se aproximou da raiz da planta, cada um deles segurando uma pedra pontuda em cada uma das mãos e começaram a desferir golpes nos troncos finos. A cada golpe a planta estremecia. --- Venham... ajudem-nos --- gritou Vlater Lilly também se apoderou de pedras e começou a bater junto com eles na base da planta. Ela começava a sentir os golpes e muitos galhos iam caindo como se fossem de borracha mole. --- Eu tenho uma faca --- gritou Lilly que correu até o seu embornal para pegá-la. Voltou correndo e começou a dar golpes na base até que a planta começou a se esfacelar como se fosse um Bambu verde cortado ficando em farpas. --- Morra desgraçada... solte esse homem... --- dizia Lilly 119
em voz alta. A planta foi caindo aos poucos e com ela Nasser que gemia de dor. --- Pelos Deuses... já não consigo nem respirar direito... Finalmente a planta sucumbiu e caiu por inteira de lado e com ela o Rei Nasser. Todos foram ajudá-lo a se levantar. --- Esperem... toda calma... isso está doendo muito... --reclamava ele. --- Você está inutilizado Nasser, sinto informá-lo --- disse Sirio. --- Como assim Mago... --- Essa carnívora é de uma espécie paralisante... Todos olharam para Sirio com ar de espanto da forma que ele dava a notícia ao seu companheiro de viagem. --- Estou te preparando para o pior meu caro... é bom que você saiba para poder enfrentar o que você vai passar... Vir chegou perto de Sirio e disse em voz baixa. --- Por favor, Mago Sirio, tenha ao menos um pingo de piedade. --- Eu não quero morrer... me salvem por piedade... Lilly desesperada fazia massagens na perna de Nasser e só parou quando Sirio disse. --- A carnívora injetou seu veneno em você Nasser... como eu disse, esse é um veneno paralisante e quanto mais for massageado mais rápido será seu efeito. Acho que você não vai morrer, mas não poderá mais andar sem ajuda. --- O que você está dizendo Sirio --- perguntou Nasser com o semblante bastante sério. --- É isso meu caro... não existe antídoto para tal veneno... você pendeu suas pernas e dependendo da quantidade de veneno --- parou e pensou --- ele vai subir para seus órgãos e você poderá perder o funcionamento de todos eles até... --- Até o que? --- Até a morte... --- disse Sirio enquanto se agachava e colocava as mãos sobre os ombros do amigo que sofria com a dor. 120
Os outros saíram de perto andando devagar. Lilly trouxe água para ele e deu-a em suas mãos. Ele pegou a garrafa de barro e deixou-a cair sobre suas pernas dormentes. --- Já não sinto direito as minhas mãos... Sirio ficou olhando para ele como que reparando sua morte se aproximando. Ele parecia estudar a forma que o veneno da planta agia naquele corpo. --- Você não tem um remédio para isso Sirio? --- disse Nasser olhando o Mago com lágrimas nos olhos. --- Para que? Para a morte não há remédio... a morte é o remédio e desse, todos nós experimentaremos algum dia... pode ser hoje... pode ser amanhã... ninguém sabe. Voltou a chover forte. Nasser disse que não queria sair de lá, do lado de sua assassina já morta, mas que parecia olha-lo com ar de vitória. Vez ou outra seus galhos ainda se movimentavam um pouco, como se ela procurasse a seiva que lhe da vida. --- Pode me deixar a só Sirio... Sirio então se afastou e da boca da caverna onde todos estavam se abrigando ele olhou para trás e viu seu amigo Nasser tentando gesticular e falando em voz baixa com alguém que só ele via, só ele enxergava. --- Com quem ele fala Sirio? --- perguntou Vir Sirio que não tirava os olhos do amigo se apoiou com as duas mãos sobre a ponta de seu cajado e sobre elas deitou seu queijo sempre olhando e disse. --- Ele está tentando convencer a morte para que ela não o leve... mas de nada adianta, ninguém convence a morte de que hoje não é seu dia... ela é certeira e tem o tempo marcado para cumprir sua tarefa... sua foice é rápida e no momento certo ela cortará a alma de Nasser e então ele vai parar de sofrer. --- Você conhece a face da morte Sirio? --- perguntou curiosamente Vir. O Mago velho virou seu rosto bem devagar como se fosse olhar para Vir, porém seus olhos passaram por ele e chegaram num outro ponto mais atrás. 121
Vir acompanhando seu movimento também olhou na direção em que o Mago olhava e viu, na sombra da caverna, iluminado apenas pelas pequenas labaredas da piscina de lavas, o Mago Vlater, em pé com seu gorro cobrindo totalmente sua face, segurando seu cajado como se fora uma foice. --- Essa é a face da morte... pode ter certeza disso... mais cedo ou mais tarde você verá que eu tenho razão meu amigo Vir Rei de Melina. Aquela tarde e inicio de noite foi tristeza e desespero para todos eles. Ao longe durante toda aquela chuva e os trovões que nunca cessavam eles assistiram Nasser chorar e se lamentar, pedindo perdão e mais uma chance para que ele revisse sua cidade e sua gente. De nada adiantou. Antes da primeira noite ele parou de falar e deitou de costas no chão de grama encharcado da mesma forma que sua assassina estava. O cheiro de enxofre era muito forte e ambos, Nasser e a planta estavam mortos!
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Parte 28 Juntos eles decidiram cremar o corpo de Nasser. Ele foi colocado num envelope de folhas de uma grande Palmeira e amarrado com cipós fortes. Seu corpo foi então colocado sobre uma prancha deitada numa pedra ao lado de uma piscina grande de lava. Cada um daqueles que estavam ali fizeram suas orações aos Deuses e depois disso, Sirio virou a prancha e o corpo do Rei deslizou devagar até mergulhar e desaparecer imediatamente na pedra derretida. --- Já estou perdendo as esperanças de vida aqui por muito mais tempo --- disse Vir --- acho que vou tentar encontrar uma saída... não é possível que não exista uma dessas centenas de cavernas que leve até a Floresta. --- Deve existir mesmo... --- disse Vir --- Alguém gostaria de me seguir? Todos ficaram em silêncio. A vontade de encontrar aquilo que vieram buscar era maior que o perigo eminente da morte. Nenhum deles queria abnegar a vontade do poder das cartas mesmo sabendo que quem sabe, até com elas em mãos, seria impossível sair dali. --- Fique com a gente Vir... --- disse Noor --- eu te trouxe para cá contra a sua vontade e me sinto responsável por sua vida. Se você for procurar a saída eu irei com você, mas essa não é a minha vontade. Eles pararam de conversar e se entreolharam. A Montanha tinha sacudido forte. --- Vocês sentiram isso? --- perguntou Vir --- temo que essa montanha vai pelos ares em pouco tempo. --- Dessa vez o abalo foi forte mesmo --- disse Lilly Mais uma vez ao chão tremeu forte. E logo depois mais uma vez fazendo com que algumas rochas grandes que estavam presas no alto do paredão que levava ao céu despencaram do alto caindo sobre a pequena floresta. --- Vamos ficar abrigados --- gritou Vlater 123
O chão tremia e parava. Isso aconteceu diversas vezes até que veio o tremor maior. Eles não conseguiam parar em pé e todos se sentaram no chão da caverna grande que dava para o ‘jardim’. A piscina onde haviam acabado de derramar o corpo de Nasser se abriu espantosamente dobrando de tamanho e muita lava incandescente veio à tona. Aos poucos ela foi se abrindo e a rachadura que se formava no chão, dentro da caverna seguiu até a janela que dava para a pequena floresta. De dentro da caverna, acuados e se segurando e se protegendo das pedras que caiam das paredes altas todos eles podiam observar pela janela que as árvores do lado de fora tremiam e se dobravam. Lá fora surgiram focos de fumaça e em seguida algumas explosões pequenas. --- O Vulcão está ativo --- gritou Vir --- teremos de encontrar um lugar mais alto para nos proteger caso o lago transborde... --- Todos os lugares são perigosos agora... acho melhor ficarmos aqui no grande salão onde existem menos pedras... tenham certeza que aqui é mais seguro --- gritava Sirio olhando para as paredes negras que os cercava e colocando seus braços sobre a cabeça. Os tremores continuavam em menor intensidade, mas a rachadura que saia do poço de lava, agora cheia de material em chamas seguia até o túnel que dava para o lado de fora. Aos poucos ela alcançou e tomou toda a entrada chegando ao gramado que se incendiava assim que aquele material tocava nela. --- A lava está tomando o salão... --- Temos duas opções... ou seguimos para dentro dos tuneis ou saímos para o jardim descoberto... --- Teremos de sair para o jardim --- dizia Vir que vinha correndo do túnel que levava ao interior --- a lava vem correndo de dentro para fora... Caminhando com cuidado no buraco de saída já quase que tomado de lava eles alcançaram o jardim que em muitos pontos ardia em chamas. 124
Todos eles correram para o outro extremo do jardim onde existia um pequeno laguinho da água que foi formado pelas chuvas e a terra não absorveu. --- Vlater será o início de uma erupção? --- Acho que não Lilih, foi um abalo de grande intensidade, mas pelo que vejo já parou... é a terra que aos poucos vai se assentando e... Vlater nem bem acabou de falar e um pedaço grande da parede daquela torre desmoronou bem acima deles caindo de uma altura de mais de 100 metros. Esse pedaço da encosta era pura lava endurecida e pelo tamanho deveria pesar umas 2 ou 3 toneladas. Assim que caiu, a pedra enorme abriu um buraco monstruoso. O solo do jardim era fino, apenas formado pelo acumulo de terra e poeira trazidas de longe pelo vento. --- Pelos Deuses --- gritou Noor que dentro de sua máscara não conseguia enxergar direito o que se passava --- chegou a nossa hora... vamos morrer... O buraco aberto começou a aumentar e devorar tudo que encontrava. As árvores, o pequeno lago de água, a grama e o próprio solo no entorno daquele local. --- Não temos para onde correr --- gritou Sirio --- temos que sair daqui de algum jeito --- e levantou seus braços para o céu quando foi pego de surpresa e afundou no solo. O chão sobre ele e Noor desabou e ambos, pegos de surpresa foram levados para o fundo. --- Já vai tarde --- pensou Lilly em voz alta --- Venham --- gritou Vlater --- por aqui... Também não deu tempo nem deles se moverem dali. O buraco acabou engolindo todos eles que caíram aos gritos de horror. Aos poucos eles foram se desenterrando de toda terra e poeira que havia caído sobre eles. Lilly foi a primeira. Ela se levantou tossindo e cuspindo saliva com terra negra. --- Me ajude... por favor me ajude aqui --- disse Vir --- estou com minhas pernas presas na terra. 125
--- Espere Vir... estou indo. Lilih começou a puxar Vir pelos braços e sem perceber Vlater se aproximou por trás dela e a ajudou. Vir foi retirado da terra e todos ficaram se limpando da poeira nas roupas. --- Onde estarão Sirio e Noor? --- Eu... eu... estou aqui... --- era Noor que procurava se levantar. --- Pelos Deuses --- disse Lilly --- o que aconteceu com seu rosto? Na queda Noor perdeu sua máscara de vidro e todos eles ficaram impressionados com a deformidade do rosto daquele homem. --- Venha Noor --- disse Vlater --- nós te ajudamos. --- Estou bem... só um pouco tonto depois dessa queda... não há necessidade de tantos cuidados... Noor estava um pouco irritado com a situação de ter perdido sua máscara. Desde o dia do ferimento esse era o seu maior recalque... ele detestava se olhar num espelho e pediu para que todos eles fossem retirados do seu Palácio e nunca até hoje ele tinha aparecido em público sem a sua máscara. --- Despencamos uns 50 metros abaixo do jardim... ainda bem que a lâmina de terra nos protegeu e a quantidade de pedras que ruiu foi pouca, exceto aquele bloco gigantesco que fez com que tudo isso ocorresse. --- E Sirio --- perguntou Vir, o único ali que não tinha nada contra ele. --- Deve ter morrido enterrado. --- Tomara os Deuses que isso tenha acontecido --- disse Lilly em tom de vingança. A poeira foi diminuindo e aos poucos eles viam o estrago que a imensa pedra fez. Com a força da pancada quase todo jardim veio abaixo, mas as plantas estavam todas elas reviradas, raízes para cima e muitas copas de árvores enterradas. --- Vejam --- disse Vir --- ali na frente... Sirio estava em pé, segurando seu cajado olhando para as paredes que ficavam abaixo do Jardim. Os outros, exceto Noor 126
que permaneceu sentado, se aproximaram de Sirio e ficaram observando juntamente com ele aquelas paredes. Desde onde eles estavam em pé quase até a altura em que o jardim se iniciava, antes da queda, as paredes continham uma série de desenhos perfeitamente esculpidos na parede negra de lava endurecida. Eram letras em alto relevo escritas na direção vertical e separadas por retângulos que tinham 4 ou 5 linhas dessa escrita como se cada um daqueles retângulos tivesse uma frase, ou transmitiam alguma ideia. --- Você entende isso Sirio? --- perguntou Vir. Sem se mover um milímetro de onde estava e sem tirar os olhos das escritas Sirio respondeu. --- Quando eu cheguei nesse lugar, ainda nas encostas de fora do Vulcão quando eu e Noor chegávamos e tentávamos alcançar a grande caverna, senti uma força impressionante dentro de mim. Era como se eu estivesse sendo ensinado a entender algo que eu nunca vi em minha vida nem em meus sonhos. --- E eram essas as palavras? Essas que estão a nossa frente? --- Não tenho certeza disso, mas acho que sim... vejo alguma coisa que reconheço desde aquela chegada. --- Essa escrita não é do nosso mundo... nem do nosso tempo... --- Como assim Vlater? --- Conheço todas as civilizações do nosso mundo... todas indiscutivelmente... nunca vi algo parecido em nosso planeta... Eles ficaram ali observando aqueles hieróglifos. Alguns deles mostravam desenhos bem nítidos de aves, de pessoas carregando cajados, de corujas, livros abertos, pessoas com os olhos enormes, mas nenhum deles arriscou ao menos até então dizer o que estava escrito ou o que poderia ser aquilo.
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Parte 29 Din e Jessica, juntamente com o pelotão de Pézões fizeram um zig zag por dentro daqueles túneis que deixaria qualquer outra pessoa totalmente perdida e desnorteada para voltar onde estavam horas atrás. No momento em que eles chegavam perto de um grande salão deu-se o abalo que demoliu paredes e túneis por todo aquele subterrâneo. Acostumados com aquilo, os Pézões não paravam nem um instante e fazendo seus grunhidos e sons estranhos eles se desviavam das pedras e das poças de lava com tanta agilidade que davam inveja aos dois jovens de Melina. Eles entraram então em um dos túneis e era exatamente o túnel que levava ao salão grande que dava para o Jardim externo, chegaram até a metade e pararam para observar de longe o que havia ocorrido. Sem saber de nada, Din e Jessica os acompanhavam e pararam para descansar enquanto eles observavam o jardim afundado. Logo eles voltaram devagar e discutindo alguma coisa entre eles. Um deles tocou no ombro de Jessica e fez que deveriam seguir caminho voltando pelo mesmo lugar por onde entraram. --- Será que eles se perderam Din? --- Eles nunca se perdem... essa é a casa deles a muitos e muitos anos e devem conhecer esse lugar melhor do que nós conhecemos as praias de Melina. --- Verdade... vamos segui-los rápido... mesmo com uma perna eles correm mais que a gente... O zig zag continuou com muita euforia e só parou um pouco quando então eles, cuidadosamente entraram num túnel recentemente aberto que na verdade era uma descida bastante íngreme. Houve um momento engraçado quando o primeiro Pézão da fila escorregou no caminho de lava endurecida e caiu de buda 128
no chão. Ele se levantou passando a mão na bunda e grunhindo como se estivesse sentindo dor e todos os outros começaram a dar risadas. --- Eles são divertidos né Din --- disse Jessica que também sorria. --- Sim... eles são bastante engraçados. Eles caminharam então com mais cuidado naquela descida e chegaram num portal cheio de plantas e árvores caídas. Um deles olhou para trás e colocou o dedo na frente da boca em sinal de silêncio. Vagarosamente eles colocaram a cabeça no meio das plantas e foram seguidos por Din e Jessica. --- Olhe Din --- é o Rei Vir --- sussurrou Jessica --- Nossa... ele não está preso e tem mais gente com ele. Não vejo o Rei Noor e não conheço essas pessoas que estão com ele. --- Veja... tem uma mulher. --- Verdade... parece uma guerreira... que será que eles estão vendo naquela parede escura. Um dos Pézões tocou no ombro de Din e mostrou que havia mais uma pessoa sentada distante deles. --- Quem é aquele monstro sentado ali Jessica... nossa... ele tem um rosto horrível... é totalmente desconfigurado. --- Engraçado que ele veste roupas como se fossem as nossas... vamos tentar nos aproximar deles pelo meio dessas plantas e poderemos escutar o que eles falam. Din olhou para o grupo de Pézões e com gestos disse que ele e Jessica iriam ver o que aquelas pessoas conversavam e que eles deveriam esperar ali. Eles entenderam e concordaram. --- Venha Jessica... vamos bem devagar... Ainda existiam alguns pequenos tremores e a chuva continuava. Era uma mistura de trovões com tremores e eles não perceberam a aproximação dos dois. Quando eles chegaram perto puderam ouvir o que conversavam. Sirio ainda com a cabeça em pé olhava para a parede e 129
num momento ele levantou seus braços e começos a dizer. --- Encontramos también ante una lengua aglutinante, que tampoco tiénes relaciones evidentes con el sumério o el elamita... --- Que ele está dizendo Vlater? --- perguntou Lilly um pouco assustada. --- Espere... vamos acompanhar...ele está parando de falar e voltou ao chão... Naquele momento todos eles presenciaram algo estranho acontecer. Noor, que estava recuado e sentado sem a sua máscara havia se levantado sem que ninguém tivesse percebido e da mesma forma que aconteceu com Sirio, na entrada do Vulcão, ele levitava diante as escritas, um pouco ao lado deles. Din e Jessica viam todos eles de costas e agora, apoiados numa pedra em forma de baú, assistiam assustados a levitação de Noor e ouviam-no dizer. --- Estamos em todos os cantos dessa Galáxia... nossos ancestrais estiveram aqui no ano 6 desse Universo... conhecemos todos os poderes existentes de todas as criaturas animadas e inanimadas... a vida dos átomos e das moléculas e como se pode interferir nas vidas que passaram, naquelas que ainda virão, nos mundos paralelos e finalmente no desaparecimento da vida... são essas as Cartas... O corpo de Noor estremeceu como se estivesse sendo sacudido por alguma entidade que nenhum deles poderia visualizar. Ele que estava com os braços levantados ao céu, levitando a 1 metro de altura estremeceu e depois seus braços ficaram em forma de cruz, abertos um para direita e o outro para a esquerda, e continuou falando. --- Da vida local onde for transportado, o ‘viajante’ desfrutará do idioma como se de lá fora. A relação que existe entre as 4 vontades é bem próxima e elas só poderão ter efeito quando as cartas estiverem juntas, sempre em voz baixa... só para si próprio... uma qualquer pode ser lida sempre no mesmo ambiente e só na presença das outras... separadas e em voz alta não existirá efeito nenhum... leia a desejada e visualize o 130
tempo... sua alma fará a viagem e só existirá uma forma delas permanecerem no ambiente... quando da leitura da carta do desaparecimento da vida, então o corpo some e as Cartas ficam... de outra forma todas elas seguem o mesmo destino de quem as leu... só retornará quando for lida novamente... porém, dessa vez de trás para frente... o poder de ver o futuro é indigno e mudanças na vida poderão ocorrer... cuidado com essa viagem pois poderá não ter o retorno desejado... são os desígnios... para quem puder encontrar a caixa do Universo que ora se agitará até que sejam retiradas as Cartas... Noor disse aquilo e lentamente foi girando seu corpo em seu próprio eixo. Começou a girar lentamente, mas a velocidade foi aumentando e a cada momento aumentava mais até que só se via um vulto girando no ar a 1 metro de altura, sem que nenhum som fosse emitido exceto o do corpo girando no ar e de repente... desapareceu. Todos ficaram olhando uns para os outros e ninguém podia acreditar no que tinham assistido. Din e Jessica assustadíssimos começaram a sentir algo estranho onde estavam. --- Jessica... --- sussurrou bem baixo Din --- Que está acontecendo? --- Você está sentindo? --- Sim... O baú de pedra onde eles estavam apoiados começou a vibrar. Eles tiraram as mãos de cima dele e vagarosamente viram uma tampa se abrir. Ninguém mais viu aquilo, somente os dois irmãos. Dentro do Baú de pedra existia um pequeno rolo de uma espécie de papel amarrado com uma cinta metálica. Din olhou para Jessica e mesmo com medo levou sua mão até aquele conteúdo e os pegou. Imediatamente a tampa se fechou e se fundiu com a pedra toda, voltando a ser um simples bloco de granito negro. Vagarosamente eles saíram dali de costas e foram ao encontro dos Pézões que da porta da caverna assistiam tudo e da 131
mesma forma n達o entenderam nada do que tinha acontecido.
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Parte 30 Mais uma vez choveu e trovejou naquela noite grande. Lilly, Vlater, Vir e Sirio resolveram manter um pacto de cordialidade ao menos enquanto estivessem ali juntos. Eles discutiram a morte e seus efeitos, falaram sobre as estrelas e sobre fatos que todos eles presenciaram e que achavam não pertencer ao mundo em que vivem. Vir e Lilly, apesar de não terem a ‘fama’ de Magos como a dos outros dois, aparentemente nos comentários foram os que tiveram mais contatos e provas da existência de ‘outras’ vidas que não faziam parte de seu mundo. Lilly nasceu e nunca havia saído da região das Geleiras do Norte e ali presenciou por muitas e muitas vezes a passagem de luzes e de veículos nunca imagináveis naquela época pelo céu da sua região. Quem sabe pelas auroras boreais ou quem sabe pela passagem das fortes frentes frias que mantinha costumeiramente um vento e um ar úmido em suspensão e isso refletia qualquer efeito de luz seja do mar, das estrelas, das 12 luas ou mesmo de pequenas nuvens de vagalumes, por exemplo, que redobram sua luminosidade quando refletidas. Vir por sua vez fabricava vidros e entre eles enormes lentes para observação de estrelas e de astros. Ele já confeccionara mapas celestes com uma leitura de todas as faces das 12 luas, dos 2 sóis e de uma enormidade de astros que muitas vezes não poderiam ser vistas a olho nu. Ele recebia encomendas dessas lentes e de tanto testa-las aprendeu e se acostumou a olhar para o céu no qual presenciou várias e várias vezes passagem de objetos iluminado por si próprio e que ele nunca imaginou nem contar a ninguém para que não o tomassem como louco. --- Eu não me conformo até agora com aquilo que vi... --disse Lilly --- Vlater, você já tinha visto ou presenciado um fato desses? --- Já havia presenciado levitação, corpos que tem o des133
prendimento de raios de energia, luzes estranhas nos céus, mas esse desaparecimento de corpo e alma foi a primeira vez. --- O céu tem muitas outras espécies de vida --- dizia Sirio --- elas vagam a procura de almas para serem abduzidas... --- Abduzidas? --- perguntou Vir. --- É uma palavra utilizada no meio dos Mágicos, significa ser carregado de um ponto a outro sem perceber. Ser raptado. --- Estou com fome... --- disse Vir se levantando. --- Meu embornal ainda tem muitas frutas secas e frescas. --- Posso pegá-la Vlater? --- Sim... ela está dentro daquele salão, bem perto da caverna de entrada. Eles continuaram conversando sobre os fenômenos da natureza até que Vir chamou a atenção deles. --- Ei... pe... pessoal --- gritou Vir --- alguém além de nós esteve aqui! Eles vieram ver do que Vir estava falando e quando chegaram ao corredor do túnel puderam ver o motivo que ele os chamou. --- São pegadas enormes... de um pé só... --- São Pezões --- disse Vir --- existem vários no Monte James. Eles fazem dos vulcões seu habitat e vagam por esses corredores e buracos como ratos. --- Nossa... e eles só tem um pé? --- Sim Lilly, só um pé e ele é enorme. São parecidos com homens como nós apesar de serem mais peludos, mas todos eles têm uma perna e logicamente 1 pé. --- Mas aqui tem pegadas de seres humanos calçados... vejam essas pegadas --- disse Vlater enquanto as seguia para ver até onde iam. Todos eles seguiram as pegadas e chegaram até a pedra em forma de baú. --- Esse é local do ‘conteúdo’ que procuramos --- disse Sirio 134
--- Será mesmo? --- disse Vlater levantando a ponta de seu cajado e batendo ele de ponta bem no centro daquela pedra em forma de cubo. A pedra se quebrou e dava para notar que era uma caixa especial pois a hora que ela se espedaçou seus cacos se iluminaram como a luz do Sol fazendo com que eles virassem ou cobrissem seus olhos e quando olharam novamente a pedra estava novamente inteira... intacta. --- Alguém esteve aqui um pouco antes de nós e retirou as cartas de dentro do baú. Alguém que nos seguiu, ou alguém que já estava aqui desde a nossa chegada. A hora que Noor leu os caracteres a pedra deve ter se aberto e essas pessoas retiraram daqui aquilo que queríamos. --- Em comparação as marcas dos tais Pézões essas pessoas eram pequenas. --- Exatamente Lilly... você está certa... eram pessoas pequenas ou quem sabe... crianças. --- A chuva molhou o terreno desmoronado e acho que eles nem imaginam que descobrimos que estiveram aqui. Precisamos achá-los antes que cometam a besteira de destruir as cartas. --- Sim Sirio. Concordo com você. Em mãos erradas essas cartas se tornam um perigo para todos os seres de nosso Mundo. --- Agora a noite não conseguiremos encontrar nem uma saída daqui. Vamos nos alimentar e descansar. Amanhã assim que o dia clarear será mais fácil encontrar alguma coisa. Dito aquilo eles trataram de comer alguma coisa. Vir, que era um conhecedor das plantas que nascem e crescem dentro do Vulcão Monte James recolheu algumas espécies de Tubérculo que quando assados ficavam excelentes e são um ótimo alimento. --- Vejam --- disse ele trazendo várias dessas e outro tanto de varas verdes de árvore --- são batatas... espetem nas varas e cozinhem elas no calor dessa ‘lagoa’ de lava. Lilly comeu algumas daquelas batatas e foi se deitar num canto protegido da chuva e das lavas que porventura pudessem 135
espirrar da ‘lagoa’. --- Você está cansada Lilly? --- disse Vir enquanto se aproximava --- Estou preocupada como isso tudo vai terminar Vir... já perdemos vários daqueles que tinham a esperança de ter esse poder das cartas nas mãos e acho que isso não vai acabar bem para nenhum de nós. --- Também acho isso... minha vinda aqui tinha a finalidade única de levar Noor de volta para as Terras de Nor para que assim meu povo sequestrado fosse libertado. Morreram tanto Noor como seu fiel escudeiro o Comandante Gigante Grey e agora, tudo que eu quero é sair daqui... e procurar uma forma de libertar minha gente. --- Eu vou ficar sempre de olho em você Vir... assim que conseguir achar uma saída eu sigo com você. Estou arrependida de ter saído de minha Aldeia e deixar meu povo. Pior que eu nem sei o que significa realmente essas tal ‘cartas’. --- São cartas de Magia. São 4 ao todo Lilly. Pelo que entendi o que Sirio e Vlater disseram sobre aquilo, traduzindo em poucas palavras o que Noor falou no transe, as cartas têm de ser lidas para que aconteçam as magias. --- Sim...isso eu entendi, as cartas devem sempre estar juntas e lidas para acontecer a magia e quando quiser voltar dessa magia é preciso lê-la ao contrario, sempre em voz baixa e mesmo que você decore o que está escrito nelas não fará efeito nenhum a não ser que fale as palavras olhando para a carta. --- Exatamente. --- Mas me diga exatamente o que elas fazem. --- Uma delas é a carta das vidas que passaram você pode voltar ao tempo lendo ela. Outra delas é a carta da vida que ainda vai acontecer, ou seja você pode ver o que vai acontecer amanhã cedo por exemplo. --- Pelos Deuses Vir... você acredita nisso? --- Acredite Lilly --- disse Vlater que se aproximava e se sentava perto deles --- essas cartas são poderosas e não foram confeccionadas por gente como nós. 136
--- Quem as confeccionou então? --- Seres que vivem em outros planetas... acredite... ao redor de cada uma das estrelas que você pode ver no céu existem uma infinidade de mundos iguais ao nosso e em muitos deles existe vida. Lilly ficou em silêncio pensando no que havia ouvido. Ate que disse. --- Uma das cartas é para vidas passadas, outra é para vidas futuras e as outras? --- A terceira é para você entrar em mundos paralelos? --- O que vem a ser isso? --- Dizem que aqui, bem ao nosso lado, vivem outras pessoas nesse mesmo local, mas nem eles nos veem e nem nós podemos vê-los... são os mundos paralelos. --- Que loucura... e a última? --- A última é o fim. --- Como assim o fim? --- A morte... o desaparecimento de todos esses mundos e dessa, não existe volta, de forma alguma... foi o que aconteceu com Noor... ali --- disse Vir apontando para o muro de caracteres --- uma daquelas coisas que ele leu desvendando o que queriam dizer levava quem foi o escolhido para o fim... e ele foi o escolhido! --- Por quem? --- Pelo destino de todos nós que estávamos aqui vendo aquilo. Alguém ou alguma coisa nos fez a vir até aqui. Acho que já era tempo disso ser desenterrado e nós, inclusive você, fomos todos escolhidos. --- Eu nem sabia disso... nunca ouvi falar das ‘cartas’... --- Mas de alguma forma veio... e 1 de nós poderá salvar esse mundo, ou então poderá acabar com ele... isso não sabemos ainda. Só sabemos que as cartas estão em perigo e podem ser destruídas ou vendidas ou dadas para pessoas que com esses poderes poderão acabar com todo tipo de vida que podemos imaginar. --- Estou tão confusa... e você Vir --- perguntou Lilly 137
olhando para Vir que estava encostado numa das paredes no escuro --- Vir... --- chamou. --- Adormeceu... acho que é o que devemos tentar fazer. --- Amanhã vou embora desse lugar... --- Sim...você é livre Lilly... O silêncio tomou conta da noite. A chuva se tornou uma garoa, os tremores pararam e nem as criaturas que faziam balburdia e barulho na noite anterior, não saíram de suas tocas. Todos estavam esgotados!
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Parte 31 Din e Jessica despertaram numa das tocas dos Pézões. Eles seguiram as criaturas que os levaram para esse lugar, no meio daquela espécie de formigueiro cheio de caminhos e labirintos, todos exatamente iguais. --- Você já acordou Din? --- Sim Jé... estou aqui observando essas cartas... vamos abrir? --- Vamos... Din se sentou ao lado de Jessica e antes de abrir um olhou para o outro e ensaiaram um tímido sorriso. Din retirou a pulseira metálica que mantinham enroladas impecavelmente as 4 cartas. Assim que ele as retirou, que eram feitas de um material que eles nunca tinham visto pularam como se estivessem vivas e caíram no chão. Mais uma vez eles se entreolharam rapidamente e voltaram a olhar para as cartas no chão, todas 3 delas com a escrita para cima e uma delas com as costas para cima. --- Tome Jessica --- disse Din passando a pulseira metálica para Jessica --- veja se serve em seu braço. O anel era mais largo que o pulso de Jessica e ela foi colocando no braço até que fixou na altura de seu bíceps. --- Ficou bonito em você! --- Obrigada Din... eu nunca tinha visto uma coisa igual essa. Veja esses desenhos... tão minuciosos, tão delicados... --- Parecem letras... as mesmas letras da escrita no paredão negro que Noor leu e evaporou... é muito lindo... Os 2 voltaram então os olhos para as cartas. Din pegou a que estava virada de costas e ficou olhando bem de perto. Era muito colorida, cheia de desenhos minúsculos colocados em um círculo, como se fosse um código. Jessica pegou as outras do chão e virou para ver se tinham o desenho e eles notaram que o desenho no verso das 4 eram exatamente iguais. 139
--- Não é possível que alguém conseguisse desenhar algo tão detalhado e de tamanhos tão pequenos com tanta perfeição Din... isso não é desse mundo em que estamos. Já vi desenhos e escrita de nossos professores, mas não chegam aos pés desses aqui... veja... os detalhes... as cores... Din pegou as cartas que Jessica entregava para ele e reparou no desenho de todas olhando bem de pertinho... ele virava elas procurando ver todos os desenhos... --- Veja esse aqui... parece uma estrela caindo... --- Esse aqui é uma pessoa ao lado de um livro... --- Olha...o Sol... uma Lua... uma bengala... que estranho Jessica... --- Vire elas Din... Din virou as cartas e ali estavam escritas coisas com o alfabeto bem parecido com o deles. Din e Jessica estudavam muito e gostavam de ler os manuscritos antigos que os professores guardavam em salas, como se fosse uma biblioteca. --- Cuidado Din... você viu Noor falando antes de sumir que essas cartas tem poderes muito fortes quando lidos. --- Vamos ler uma delas juntos para ver o que acontece? --- Vamos... --- Você pode entender alguma dessas palavras? --- Nenhuma Jessica... não... não tenho a mínima ideia do que está escrito ai... --- Vamos ler juntos e o que acontecer com um acontecerá com o outro... --- Tá bom... escolha uma delas... --- Essa aqui... Gaguejando e dando algumas risadas com o que liam Din e Jessica passaram a ler as palavras que conseguiam juntar as letras. --- Lo… que en el mundo en que vivimos… vemos el final de la misma y ya… --- que engraçado Jé --- no podemos tener los gustos… y disgustos… de que la vida… Os dois ficaram olhando para a carta que tinham acabado de ler e depois, no mesmo momento um olhou para o outro e começa140
ram a rir sem parar. --- Nossa... tanta luta por essas cartas e não aconteceu nada... que engraçado... Naquele instante um dos Pézões entrou onde eles estavam e com ar desesperado começou a gesticular para eles. --- O que você quer dizer --- perguntou Jessica... O Pézão, saiu da sala e logo voltou com a folha em que Din havia desenhado o Rei Vir. Ele se agachou e apontou o desenho para eles, depois apontou a porta da caverna e fez com as mãos como se eles estivessem ali. --- Eles estão atrás de nós Din... precisamos sair daqui... Din se levantou e colocou as cartas em seu bolso e logo olhou para o Pézão e disse com sinais. --- Nós dois --- mostrando ele e Jessica --- precisamos sair daqui --- fazendo sinal com a mão mostrando a porta de saída daquele ambiente. O Pézão entendeu o que Din disse em gestos, pegou ele pelo braço e começou a puxá-lo para fora. Jéssica recolheu rapidamente seus poucos pertences e correu atrás deles. Correram por túneis e portais, entrando e saindo freneticamente. Outros Pézões os acompanhavam e então chegaram num pequeno buraco que parecia ter uma escada para subir. Eles entraram ali e um dos Pézões do lado de fora colocou 3 pedras na porta de entrada para que ninguém visse esse compartimento. --- Acho que aqui estaremos seguros Jessica... --- Mas Din... viemos buscar o Rei Vir... ele está com aquelas pessoas... --- Vamos aguardar o momento certo para resgatá-lo... esse momento vai chegar... acho que em breve... Na correria de achar de quem eram aquelas pegadas, Sirio fez um caminho diferente dos demais. Ele resolveu subir pelas encostas caídas do Jardim e tomar o rumo da busca por cima. Ele dizia que os espiões estavam no Jardim quando o tremor aconteceu e eles deveriam ter caído junto com as árvores e a floresta, ficaram escondidos e na hora que Noor disse as palavras eles, de alguma forma acharam as cartas e voltaram de onde tinham 141
saído. Vir, Lilly e Vlater optaram em seguir o caminho onde estavam as pegadas. Vlater disse que não seria possível subir nas encostas sem que eles vissem, apresar de estarem bastante atentos a tudo aquilo que aconteceu. --- Tenho certeza que eles vieram por aqui... --- Vlater... não vamos fazer um caminho muito longo... depois não conseguiremos encontrar mais as passagens e nos perderemos de Sirio. --- Para que queremos Sirio, Vir? Ele já nem sabe mais o que fala. --- Lilly olhou para Vir e ambos deram com os ombros, sem saber se Vlater falava o correto. Eles correram muito, entraram e saíram por diversos túneis mas não acharam mais pegadas dos Pézões nem das pessoas que estavam calçadas. Num certo momento, Lilly pediu para parar um pouco e Vir a apoiou. --- Eu vou andar mais um pouco por esses túneis, mas eu retornarei aqui com ou sem eles... me aguardem... --- disse Vlater e saiu em disparada. --- Que loucura isso Vir... eu juro que já não aguento mais... estamos sem comer e beber a não sei quanto tempo e minhas energias estão no limite... --- Lilly --- disse Vir --- enquanto corríamos para cá eu acho que ouvi barulho de água correndo... --- Não é possível... estamos no meio de um Vulcão... --- Eu sei disso, mas quem sabe os tremores abriram algum poço, poderemos beber água e nos lavar... me sinto imundo com essa poeira negra no corpo. --- Onde você ouviu a água? --- Por ali --- apontando para uma caverna de onde tinham vindo --- acho que não foi muito tempo atrás... vamos tentar fazer o mesmo caminho que viemos só que invertido. --- Vamos... é uma chance que não podemos desperdiçar... estou morrendo de sede e de fome... 142
Parte 32 A noite grande chegou rapidamente. Enquanto Sirio vagava sozinho dentro do Vulcão da Fenda, Vlater se cansou de procurar os humanos que estavam com as cartas e Lilly junto com Vir encontraram o riacho de água cristalina o qual por sorte, estava recheado de pés de morangos silvestres e eles se sentaram com os pés na água, se lavaram e ficaram comendo até a noite chegar. Jessica estava cansada e adormeceu logo que escureceu. Antes disso, os Pézões trouxeram frutas para onde ela e Din estavam e eles comeram juntos tentando se comunicar por meio de sinais. Em troca, Din deu a eles algumas figuras de vidro que ele mesmo tinha feito há alguns meses e estavam perdidas em seu embornal. Não era grande coisa, mas se pareciam com bichinhos da floresta ou insetos surreais. Os Pézões ficaram observando as peças e sorriam mostrando o presente uns aos outros. Din foi se deitar ao lado de sua irmã e quando se deitou ele reparou que existia uma fenda na parede ao seu lado e por ela passava uma iluminação que vinha das Luas. --- Se quebrarmos essa parede estaremos na Floresta e de lá poderemos ir para casa --- pensou ele --- mas primeiro eu gostaria de falar com Vir e chamá-lo para ir embora conosco já que seu raptor está morto...ou desaparecido. Sem sono ele retirou as Cartas de seu bolso e começou a olhá-las com muita atenção prestando atenção principalmente na ilustração maravilhosa que havia atrás de cada uma delas. --- Por que será que não aconteceu nada quando nós lemos a Carta --- pensou --- vamos ver se lendo outra algo vai acontecer. Din pegou uma delas e começou a ler enquanto se lembrava de Noor flutuando no ar e dizendo aquelas palavras... --- Lo que en el mundo en que vivimos, vemos que han pasado los tiempos y en ellos podemos vivir y disfrutar de lo que está 143
en él Algo assustador para ele aconteceu. No momento em que acabou de ler aquele texto ele estava novamente encostado no baú de pedra ao lado de Jessica olhando Noor flutuando e falando aquelas palavras. Ele pensou “voltei no tempo ou estarei sonhando”. --- Jessica --- sussurrou ele no ouvido da irmã. --- Diga... --- Eu já vi isso... --- Isso o que Din? --- Essa cena... --- Fique quieto... você está louco... se continuar falando eles vão ver a gente... Din sabia até as palavras que Noor iria falar e pei sair de pensou. --- De alguma forma, depois que saímos daqui, eles descobriram a gente e vieram atrás da gente. Vou me esconder no corredor escuro e esperar para ver como foi isso. De trás de um monte de pedras ele pode observar que Noor tinha acabado de falar e começou a girar até sumir. Todos eles ficaram se entreolhando e Din viu Jessica e os Pézões passando pelo corredor e saindo do túnel que levava até a Floresta caída. De repente ele reparou que enquanto os outros estavam vendo o local onde Noor desapareceu o Rei Vir vinha se aproximando da entrada, sozinho, e começou a reparar nas pegadas no chão. Foi o momento que ele aproveitou o para chamar o Rei Vir e falar com ele. --- Rei Vir --- disse ele em voz baixa --- Rei Vir... estou aqui... --- Quem está falando? --- perguntou Vir olhando para dentro da caverna. --- Sou eu Rei --- Disse Din acenando para ele --- estou aqui... --- Você é Din --- disse o Rei --- que está fazendo aqui? --- Rei Vir... não temos muito tempo... eu estou com as 144
Cartas e esse tempo que estamos aqui conversando já passou... vocês vão procurar a gente já já... --- Não estou entendendo --- disse Vir um pouco assustado. --- Quando vocês saírem correndo procurando a gente tente se separar deles e procure a beira de um riacho... eu passei lá enquanto corri e vocês vão estar atrás de nós... me aguarde nesse lugar... acharemos uma saída... --- Como assim... não estou entendendo... --- Vá para a porta da caverna... rápido --- disse Din empurrando o Rei Assim que o Rei Vir saiu de perto dele, ainda olhando para trás ele pegou a carta que tinha lido e ainda estava sobre as outras e leu ao contrário. Imediatamente ele voltou para o lado de Jessica que dormia tranquilamente. --- Jessica... Jé --- dizia Din sacudindo devagar sua irmã. --- Nossa... que foi... teve pesadelos? --- Quase isso Jé... eu voltei no tempo... --- Que você está falando Din... --- Eu li a carta... voltei no tempo... --- Espere um pouco... --- disse ela enquanto se sentava mais acomodada. Din contou a ela o que havia ocorrido e ela ficou olhando, meio que não acreditando no que estava ouvindo. --- Que faremos agora? --- Lembra que quando corríamos para cá com os Pézões a gente passou por um lugar que tinha água corrente? Pois é... eu pedi para o Rei Vir ficar lá esperando a gente... fico pensando se ele conseguiu de separar daquelas outras pessoas.. --- Como chegaremos lá? --- Venha aqui... vamos acordar os Pézões... Ambos se levantaram e na penumbra acordaram seus ‘amigos’ Pézões... --- Ei...acordem...acordem... eu e ela --- disse ele apontando para Jessica e depois apontando para a porta fechada --- vamos embora... 145
Eles olharam para a porta e fizeram que não com a cabeça. Din disse que tinham de sair e ir para casa deles. Finalmente, depois de várias mímicas um deles deu um assovio fino e logo depois a porta se abriu. Din e Jessica saíram correndo na direção em que tinham vindo desde a correria do baú das cartas. --- Acho que é por aqui Din... --- Pare um pouco... vamos escutar a água... --- É por ali...pela nossa direita... vamos... Ainda na penumbra, viam alguma coisa graças a luz das poças de lava incandescente, começaram a ouvir mais perto o barulho da água. --- Chegamos... é por aqui... --- Ali está ele --- disse Jessica --- Rei Vir... estamos aqui... mas, quem é você? --- Olá... amiguinhos...que bom rever alguém conhecido... essa é Lilly a Chefe da Aldeia dos Crendes, do Norte. --- Como... como vocês nos encontraram? --- É uma longa história Chefe Lilly... esperem um pouco --- disse Din e deu um assovio fino imitando os Pézões que logo apareceram aos montes --- vejam isso --- disse Din pegando novamente uma folha grande de uma árvore e com o carvão que estava em seu bolso desenhou um barco e disse. --- Nosso barco... onde está? Surpreendentemente os Pézões começaram a rir e apontaram para uma moita de morangos silvestres que estava a 5 metros deles. --- Nossa Jé...a gente nem sabia... foi aqui que nós desembarcamos... --- Venham... entrem no barco... ele é pequeno, mas é melhor sairmos daqui enquanto não amanhece o dia. Vagarosamente e sem fazer alarde o barquinho deslizou pelo ‘braço dágua’ que desaguava no Rio Car. Eles não falaram uma só palavra enquanto estavam ali por perto, parece que alguma coisa dizia que o resgate ainda não estava terminado. 146
Parte 33 O dia amanheceu nublado e garoava um pouco quando eles alcançaram o Rio Car. Costumeiramente a Sirvia era acometida por chuvas e muitas dessas se transformavam rapidamente em tempestades, mas nos últimos tempos essas garoas eram quase inexistentes e o volume de chuva tem sido intenso. --- É dia e ainda parece noite... --- Vimos isso quando chegamos Rei Vir. A Floresta encobre o céu e mesmo que os Sóis estejam a pino essa escuridão é constante. --- Precisamos libertar nossa gente que está presa em Nor... --- Quanto a isso fique despreocupado meu Rei... todos já estão seguros em suas casas lá em Melina... Enquanto o barco deslizava Rio abaixo, Din e Jessica iam contando tudo que ocorreu desde quando o povo prisioneiro foi levado refém. Din contou também sobre os guardas do Palácio que estavam presos e sobre e reconstituição da guarda na cidade. Enquanto ele falava, Vir sorria de alegria como se fosse uma criança. Rapidamente Din contou sobre as Cartas e como ele voltou no tempo para chamar o Rei Vir. --- Vocês merecem uma medalha de heróis... Assim que o Rei disse aquilo eles sentiram um vento frio que vinha do Sul fato que não era costumeiro. O Sul sempre era quente e os ventos na Sirvia só eram frios quando vinham do Norte, da terra de Lilly ao lado das Geleiras. --- Que vento estranho esse... --- Que será isso Rei Vir... --- Prefiro nem pensar no pior... O vento aumentou e com ele vieram raios que caiam por cima das árvores fazendo fachos de clarão nas águas escuras do Rio Car. As árvores aos lados e acima deles começaram a balan147
çar. Não era um balanço comum de vai e vem com o vento, elas se esticavam para cima e para os lados, todas elas juntas. A imagem se tornou em preto e branco e agora o Rio também entrava na dança elástica, tudo movido pelos trovões que agora faziam sons em ritmo, tudo se mesclando, som, imagens e o vento. --- Isso é magia... preparem-se para o que virá... --- gritou Vir. Jessica estava apavorada e Lilly saltou ao seu lado e a abraçou pelos ombros. Vir ficou em pé na frente do barco enquanto Din estava na popa procurando dirigir a embarcação naquela nuvem movediça irreal. Aos poucos aquela massa de preto e branco foram se fechando e no fundo, bem onde seria a saída da Floresta dentro do Rio que dava para o Sul formou-se um rosto enorme, escuro, coberto por um gorro também escuro. --- É Vlater --- gritou Lilly Num movimento rápido ela pegou seu arco e o armou com uma das flechas de ponta de vidro e atirou bem no meio daquela massa que formava o rosto do Mago. --- Vejam... ele está ali --- disse Vir apontando para a borda esquerda. Vlater estava parado na margem do Rio e assim que a embarcação passou na sua frente ele levantou os braços e os galhos das árvores começaram a baixar estalando na água. Era como uma centena de chicotes que batiam na água criando marolas imensas. --- Protejam-se --- gritou Vir --- os galhos vão derrubar a gente. Quando os galhos se aproximavam do barco ocorreu uma explosão e eles olharam para o Mago que tinha caído de lado quase dentro das águas. Era como uma granada que havia explodido ao seu lado. Depois outra e depois mais uma. Na terceira eles puderam ver que do outro lado da margem estava Sirio fazendo a magia com as mãos como se esti148
vesse jogando as bombas em Vlater mesmo tendo quase 200 metros entre uma margem e outra. --- Uauuu, é uma briga de Magos --- pensou Din que nunca havia presenciado algo parecido que fosse com aquilo. --- Din --- gritou o Mago Sirio --- traga o barco para essa margem... só eu poderei tirá-los daqui... --- Queremos ir embora... só isso Sirio... --- gritou Vir --deixem os meninos em paz... nós não temos nada que vocês possam querer... Repentinamente um galho pegou a embarcação pela popa e puxou para cima fazendo com que seus tripulantes caíssem na água. --- Vamos nadar até a margem... --- Para qual? Jessica que não sabia nadar foi ajudada por Lilly a qual graças às plantações de algas em suas aldeia era uma eximia nadadora. Ela segurou a menina por trás, pelo pescoço, e a puxou para a margem mais próxima que ficava bem ao lado de Sirio. Vir acompanhou um tempo a correnteza e se segurou do mesmo lado delas só que um pouco mais a frente. Din havia desaparecido naquela confusão. --- Din... Din... --- gritava Jessica --- Ele também não sabe nadar? --- Sabe sim Lilly... ele nada muito nas praias de Melina... onde ele estará... Vir que vinha subindo o Rio para se encontrar com os outros gritou. --- Vejam... Vlater pegou ele do outro lado... --- Onde está o Mago Sirio? --- Não sei... ele estava aqui a pouco... --- disse Lilly. --- Temos que fazer alguma coisa --- dizia Vir enquanto mergulhava nas águas do Rio Car. Nadando ele seguiu até onde estava o barco subiu nele e remando com as mãos o trouxe até a beira onde estavam Vlater e Din. 149
--- Fiquem ai... eu já volto... Lilly e Jessica estavam apavoradas com tudo aquilo e se sentaram numa pedra. De repente uma mão tocou no ombro de Jessica que assustada deu um pulo para frente seguido de um grito. Eram os Pézões que tinham visto tudo e nada podiam fazer. Ela abraçou o mais velho chorando e disse. --- Levaram Din... eles levaram Din ... --- apontando para a outra margem do Rio. Os Pézões conversaram entre eles e na língua deles até que todos se viraram para a outra margem e começaram a assobiar, todos juntos. Jessica chegou a colocar as mãos tampando seus ouvidos, mas não adiantava, o som parecia passar pelas suas mãos e entrava em seus ouvidos. --- Veja Jessica --- gritou Lilly para Jessica que se levantava de onde estava tampando seus ouvidos e olhando para onde Lilly apontava. Na margem do outro lado apareceram dezenas de outros Pézões. Com muita agilidade e se segurando nos troncos com seus braços fortes, eles subiam nas árvores mais altas e de lá soltavam cipós que balançavam e chegavam até o lado do rio onde elas estavam. Os Pézões que ali estavam pegavam esses cipós e atravessavam o Rio e juntos, formaram um exército de mais de 100 Pézões. --- Eles gostam de Din... vão salvá-lo... Lilly e Jessica ficaram ali paradas, embaixo de um arbusto com seus ‘amigos’ mais velhos, que as protegiam da chuva, cuidando de 3 nenês Pézões e aguardando o que iria acontecer.
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Parte 34 Assim que Vir atravessou o Rio Car ele saiu em disparada para o interior da Floresta. Em tempos passados ele caçava para sustentar sua família e conseguia seguir rastros como ninguém. Logo ele viu um arbusto que estava com as pontas dos galhos quebrados recentemente e quando olhou para o chão empoçado reparou que existiam marcas de pés e duas linhas que se arrastavam ao lado dessas marcas. --- Miserável está arrastando o menino --- pensou ele. Ele correu até uma clareira seguindo um Riacho que levava água do Rio até o Mar. De longe ele olhou em campo aberto e a 1 ou 1,5 quilometro ele avistou o homem de capa puxando Din pelo colarinho. --- Te peguei Mago... tenho de ter uma estratégia. Ele saiu correndo pela lâmina de água do riacho porque por ali ele seria mais rápido que na Floresta fechada. Vlater entrou numa caverna feita por duas pedras enormes que se encontravam como mãos que rezam. Ele nunca havia estado ali e soltou o menino o qual estava tonto de tanto ser puxado pulo colarinho e a gola de seu casaco quase o matou asfixiado. --- Vamos ver se há alguma coisa nessa caverna --- disse Vlater caminhando até seu interior. Logo ele voltou e disse aos gritos. --- Eu quero as Cartas pirralho... me entregue por bem... --- Eu... eu não tenho nada... --- Não minta para mim rapaz --- disse Vlater se agachando e apertando as bochechas do jovem... --- eu quero as Cartas... --- Elas estão no Vulcão... eu dei para os Pézões... Vlater começou a revirar o embornal de Din, jogou todos seus pertences no chão e ficou desesperado quando viu que as Cartas não estavam ali. 151
--- Me diga, pela última vez --- disse ele olhando o menino bem de perto --- onde estão as minhas Cartas... diga... Din olhava para as mãos sujas dele a sua frente e notou que as unhas do Mago começaram a se alongar até formarem 5 pontas finíssimas de 20 centímetros cada uma. Quando Din ia dizer que as cartas estavam em seu bolso, uma pedra acertou a cabeça do Mago que fez um ruído seco pela boca e caiu de lado. --- Saia daqui menino --- disse Sirio que estava na porta da caverna segurando seu cajado --- saia daqui --- gritou ele. Mais que rápido o menino saiu correndo até o lado de fora da caverna e sem saber para onde ir, se escondeu atrás de uma pedra. --- O que você quer comigo Mago Sirio --- dizia Vlater enquanto se levantava lentamente colocando uma das mãos na cabeça dolorida pela pedrada. Sirio não respondeu e apenas moveu seu cajado para outra pedra. A mesma se suspendeu no ar e voou em direção a Vlater acertando ele no joelho, depois outra pedra, depois outra. Todas acertavam Vlater que agora parecia não sentir mais as pedradas. Ele se levantou enquanto pedras e mais pedras chocavam em seu corpo e ele nem se movia. Colocou então seu gorro e estendeu as duas mãos em direção a Sirio e ele foi jogado para fora da caverna como se tivesse sido atingido por uma bala de canhão. Vlater saiu da caverna, mas agora não era mais um homem que vestia aquela capa com gorro, era uma criatura que não existia naquele mundo. Ele era como um crocodilo que andava de pé e quando abria a boca enorme, outra pequena cabeça saía de sua boca e soltava gritos horripilantes. A criatura foi até onde Sirio estava prestes a se levantar e com suas garras pegou o velho Mago pelo pescoço e o atirou mais longe ainda. Apavorado Din pegou as cartas de seu bolso pensando em voltar para a saída do riacho que dava no Rio Car e começou a ler. O que ele não sabia era que carta escolher, aquele texto 152
não era para ser decorado, mesmo assim ele leu o primeiro texto que viu. --- Lo que en el mundo en que vivimos, vemos otros mundos que nos rodean y que demuestra el paralelo que nos rodea… Aos poucos tudo foi se tornando sem cor, meio esverdeado meio escuro e agora, ao invés de ver aquela criatura horrenda indo em direção a Sirio ele via uma espécie de névoa branca a qual conforme andava deixava rastros esfumaçados as suas costas. --- Estou no mundo paralelo... --- pensou ele --- me lembro de que ele disse que uma das cartas era um mundo que tem vida ao lado do nosso... Din olhou para os lados e agora via outros vultos brancos alguns chegavam até perto dele e depois saiam como que voando para longe. Ele correu o quanto pode para chegar até o vulto de Vlater e quando se aproximava dele notou que ele parou e olhou para trás. Um outro vulto vinha ao seu encalço e rapidamente ele pegou aquela criatura bem menor que ele e a arremessou para longe que bateu em alguma coisa e caiu imóvel. Vlater, ou seja, o que fosse aquilo se voltou novamente para Sirio e quando ia pegá-lo novamente para arremessar Din pulou sobre suas costas e se segurou em seu pescoço. A criatura começou a se sacudir e balançar a cabeça então Din percebeu que a névoa branca fazia os movimentos antes da criatura e pensou. --- Isso é o que chamam de alma da gente --- e com toda sua força se agarrou àquela nuvem branca como se fosse uma pessoa e começou a puxá-la para trás. Quanto mais ele puxava mais o Mago se sacudia e ele puxou, puxou, tão forte que num momento criatura e alma sumiram, como se fossem fumaça desapareceram. Din pegou a Carta que tinha lido e começou a lê-la ao contrário. Quando acabou ele viu que estava no mesmo lugar, atrás da pedra escondido. De longe ele olhou para o lugar do vulto que a criatura 153
havia jogado longe e percebeu quem era. --- Rei Vir... Ele saiu correndo até onde seu Rei estava e percebeu que da cabeça do Rei escorria muito sangue. Ele estava morto --- Não é possível... pelos Deuses... não é possível --- gritava ele. --- Volte no tempo filho... Din parou de gritar e olhou para trás, não havia ninguém, mas a voz era idêntica a de Sirio que repetiu. --- Volte no tempo filho... segure-o antes que Vlater o veja... Din pegou as 4 cartas e ficou olhando para elas pensando... --- E agora... qual será a carta? Será essa? No momento em que ele pensava isso as cartas caíram de suas mãos e sobre uma delas caiu uma folha de uma árvore. --- É essa...pensou ele... vou ler pensando em minutos atrás quando estava correndo para trás da pedra “Lo que en el mundo en que vivimos, vemos que han pasado los tiempos y en ellos podemos vivir y disfrutar de lo que está en él” Agora Din estava chegando atrás da pedra. Ele viu Sirio ser arremessado da caverna, depois a criatura chegando a ele e o pegando e arremessando mais longe ainda. Ele viu a criatura indo atrás de Sirio novamente, mas dessa vez reparou que Vir se aproximava gritando. --- Tire as mãos desse menino... tire as mão dele... Foi então que Din gritou. --- Estou aqui meu Rei... estou aqui... --- Din meu jovem --- dizia o Rei --- ainda bem que você está salvo. --- Veja o que vai acontecer com ele... Os dois ficaram olhando a criatura ir atrás de Sirio e quando se aproximava ele se contorceu como se algo o segurasse. Logo depois ele virou para trás e tentava tirar algo da sua cabeça até que ele se contorceu todo, deu um grito horripilante e saiu voando para o céu como se fosse uma flexa de fogo. Sumiu. 154
--- Era eu que estava segurando a sua alma... --- VocĂŞ? --- Sim meu Rei... eu voltei para te salvar... --- Vamos embora daqui... --- Vamos, meu Rei!
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Parte 35 Vir e o jovem Din saiam rapidamente daquele local perto da caverna onde estavam. A chuva continuava forte, mas os raios e trovões haviam parado desde que Vlater subiu como uma flecha ao céu e atravessou as nuvens. Eles faziam o caminho de volta seguindo a mesma lâmina de água do riacho que Vir fez quando estava a procura de Vlater e Din. Assim que estavam chegando perto do Rio Car a chuva se tornou mais intensa e o céu escureceu rapidamente. --- Veja aquilo Din --- disse o Rei apontando para perto do Rio --- as árvores estão andando ou é impressão minha? --- Elas estão andando... vamos voltar meu Rei... Logo eles viram que estavam cercados Candius gigantes que os ameaçavam com seus galhos. Eles ficaram parados, sem saber o que fazer no meio daquele Riacho até que atrás deles ouviram uma voz. --- As Cartas têm de ter mãos corretas --- era Sirio que aparecia do meio da vegetação --- elas não podem estar em mãos erradas porque assim a grande guerra dos mundos será evidente... Sirio falava aquilo mostrando uma expressão digna de uma estátua. Seus olhos estavam fechados e seu corpo parecia uma estátua, imóvel. --- Dê as Cartas a ele Din... e vamos para casa... Din chegou a colocar sua mão no bolso onde tinha as guardado, mas repentinamente saiu correndo novamente em a caverna, foi quando Sirio apareceu a sua frente, na mesma forma em que estava instantes atrás às suas costas. Ele se virou novamente para o lado de Vir e percebeu que Sirio também estava ali no local antigo. Olhou novamente para trás e Sirio estava também no caminho da caverna. Outra voz apareceu a sua direita e esquerda. Sirio havia se multiplicado em 8 ou nove corpos presentes. --- Eu estou em todas as partes menino, as Cartas são minhas 156
e você não poderá me derrubar, pois eu sou muitos e você é um só... Din estava se sentindo derrotado. Ele queria as Cartas uma vez que ele as encontrou. Ele já sabia como utilizá-las com coerência e seu pensamento era bom, ele nunca iria utilizá-las para o mal. Quando ele as retirava do bolso para entregar ouviu ruídos que chegavam pelas árvores, por cima delas e pelos lados. Era o batalhão de Pézões, centenas deles que cercavam as imagens de Sírio por todos os lados e cortavam os galhos das árvores animadas as sufocando. Eles se atiraram aos montes sobre as imagens dos Magos, dezenas sobre cada um daqueles clones e todos eles caíram no chão fazendo com que as árvores perdessem a sua magia. Seguravam e sufocavam os Magos que da mesma forma que as árvores iam perdendo o efeito de multiplicação até que restou o Sirio original, o ícone, caído no chão pedindo que eles o largassem, mas todos os quase 200 Pézões unidos o seguravam e assoviavam alto abafando os gritos do Mago que aos poucos foi perdendo a força. --- Vamos Din --- gritou o Rei Vir puxando o menino Riacho abaixo. De longe eles ainda escutavam os assovios dos Pézões que se amontoavam sobre o Mago Sirio o qual ficou indefeso. A pequena embarcação estava ali na margem esquerda do Rio e antes de entrarem a bordo, Vir pegou duas folhas grandes de palmeira que estavam no chão e disse. --- Tome... serão nossos remos... Assim que atravessaram o Rio, Lilly e Jessica já estavam em pé juntamente com as crianças e alguns adultos Pézões que os esperavam. Vir ficou no barco o segurando na margem enquanto Lilly e Jessica beijavam as crianças e se despediam de todos com fortes abraços. Din desceu do barco e chegou perto do Pézão mais velho. Ele colocou uma das mãos no peito do seu amigo e escutou o seu batimento cardíaco. Da mesma forma o Pézão colocou sua 157
mão no peito de Din e ambos ficaram se olhando por um tempo. Era uma forma de mostrar a amizade de dois povos que surgira ali. Din o abraçou e entrou no barco. Os Pézões ficaram na margem olhando a partida de seus amigos e dali, ainda ouviam baixinho o assovio do batalhão que nocauteava o Mago e suas pretensões em ter para si as Cartas. --- Vamos para casa --- gritou Vir --- para o Sul. A descida do Rio foi tranquila. A chuva se tornou uma fina garoa e assim que a embarcação saiu da Floresta no entorno do Vulcão da Fenda, a chuva parou e um único Sol apareceu no céu acompanhado de centenas de pássaros. Quando já estavam longe da Floresta todos eles olharam para trás e observaram o Monte da Fenda, negro, soltando sempre uma fumaça pelo seu cume, assustador e cheio de mistérios quando dentro dele, porém, maravilhoso quando visto de longe. --- Din chegando a nossa Vila, teremos de conversar sobre essas Cartas. --- Sim meu Rei... elas poderão trazer perigo para nosso povo e sei bem disso. --- E eu... preciso voltar para o lado do meu povo --- dizia Lilly. --- Eu vou te levar embora para sua casa Lilly... vamos chegar a nossa Aldeia e descansar por 1 ou 2 dias, depois pegaremos uma embarcação maior e viajaremos para o norte pela costa Leste da Sirvia, pelo Mar. Lilly ficou mais tranquila. Ela não tinha a mínima ideia de onde estava e de como fazer para chegar até Crende. Jessica que estava sentada a seu lado a abraçou e disse. --- Não se preocupe logo você estará em casa com sua gente... eu e meu irmão vamos te acompanhar até lá. Parte 36 Melina estava em festa com a volta de seu Rei. As ruas, vilas e casas, bem como uma boa parte do Palácio, tudo recons158
truído, estavam enfeitados com panos, vidros coloridos de todas as formas pendurados pelas janelas e sacadas das casas e na Praça principal havia muita comida. O povo escutava atento a todas as histórias que eles contavam tanto do resgate do povo sequestrado por Noor como das andanças por dentro da Fenda, os perigos e suas passagens. Din havia conversado com Vir e entre eles combinaram de não comentar sobre as Cartas. Isso poderia trazer perigo, pois sempre existem invejosos que querem saber coisas do passado e do futuro e quem sabe esse uso não seria desejável. Jessica e Lilly concordaram com isso. Havia barracas de comidas das mais diversas e Jessica, sempre de mãos dadas a Lilly, mostrava a cidade, seus costumes, suas crenças e apresentava pessoas comuns do povo da cidade. A cada barraca que passavam Lilly se impressionava mais com a qualidade e a beleza dos vidros que aquelas pessoas produziam ali. --- Rei Vir combinei com Lilly e com Jessica. Depois de amanhã bem cedo partiremos no Netúnio rumo ao Norte. O barco será carregado com alimentos e água. As velas estão sendo revisadas e nessa época sabemos que os ventos marinhos são fortes do Sul para o Norte assim, acho que em 3 ou 4 dias completos estaremos desembarcando no Porto de Margo. --- Se você quer assim e se acha que já estará descansado o suficiente para essa viagem, que assim seja Din... você não vai levar guardas para caso aconteça algo? --- Acho que não será necessário meu Rei. Minha intenção é chegar rápido e depois, eu e Jessica daremos a volta no Continente partindo de Margo pelo Norte, passando por trás das Geleiras e seguiremos até o Porto de Candiu. --- Acho arriscado filho... Sirio não morreu e você bem sabe disso. --- Eu sei Senhor, mas a minha intenção é exatamente essa, assim que chegar a Candiu ir até as Montanhas, logicamente sem as Cartas que deixarei em um local seguro e conversar com o Mago sobre o ocorrido naquele dia perto da caverna. 159
--- Ainda acho arriscado... Sirio é um velho, mas seu poder de magia é incontrolável e pode ser perigoso... leve isso meu jovem, acho que é um talismã que eu encontrei quando estávamos na Fenda --- e deu a Din uma pequena argola de um material muito duro que eles não conheciam. --- Obrigado Senhor, guardarei isso com muito carinho. Estou preparado meu Rei, algo me diz que ele nos quer bem. Aquele dia em que voltei no tempo para salvá-lo daquela criatura em que Vlater se transformou, foi ele quem me chamou a atenção para fazê-lo. Por sorte não li a Carta da Morte... --- Por sinal você nunca leu a Carta do Futuro também... --- Acho-a a mais perigosa de todas... se ler a carta da morte tudo estará acabado seja lá quem for que a lê, mas a que nos mostra o futuro, essa tem um ar de mudança para si que poderia alterar todo o destino do nosso mundo e eu acho, sinceramente, que isso só pertence aos Deuses e a mais ninguém. --- Você é uma pessoa boa e coerente Din... fui amigo íntimo de seus pais e sei o quanto ele deve estar orgulhoso de você e de Jessica no outro mundo. --- Obrigado meu Rei... suas palavras me confortam e com isso sei que estou fazendo o melhor. --- Às vezes penso que seria melhor mesmo é destruir essas cartas... isso acabaria com a ansiedade de todos que querem tê-las para si. --- Pensamos da mesma forma Senhor, mas acho que alguém ou algo, não se sabe quem ou o que, as colocou em nossas mãos para serem utilizadas para o conhecimento de nossas vidas e de nossa gente... para falar a verdade, acho que elas são indestrutíveis... permaneceram muito tempo dentro do vulcão no calor das lavas, na água das chuvas e me parecem impecáveis, nem depois de eu ser arrastado por Vlater e ter meu bolso cheio de pedras e de terra negra elas ao menos se sujaram, sempre estão secas e limpas como novas. --- É um mistério... --- Ei vocês --- gritou algumas mulheres que comiam e dançavam na Praça de Melina --- vocês não vão se divertir com 160
todos? --- Quer dançar Din? --- Ora vamos, afinal estamos em festa! Aqueles festejos duraram o dia e a noite. As fogueiras iluminavam e aqueciam as pessoas que sorriam e dançavam. Foram dias felizes aqueles. O céu estava claro quando quase todos adormeceram. Lilly estava do lado de fora da casa de Jessica que já havia se recolhido. Ela observa o nascer do Grande Sol já no horizonte e no momento em que se levantava para ir dormir ela deu uma última olhada para as nuvens, de relance ela achou que uma delas formava o rosto de Vlater, mas logo viu que era só uma lembrança. Antes de dormir, já deitada em sua cama, ela colocou suas mãos sobre suas pernas tocadas delicadamente pelo Mago. Deu um suspiro e logo adormeceu.
FIM DO EPISÓDIO
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