NON PARK | livro

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NON | PARK


Pontifícia Universidade CatóliCA - PUC Rio Projeto de conclusão do curso | Arquitetura e Urbanismo

Manuela da Silva Ramos Muller Orientador: Otávio Leonídio


Sumário 1| Tema 3 2| Justificativa 5

4.7| Pedro Fiori arantes - arquitetura Nova | Arquitetura de mutirão

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4.8| Pesquisa Ação - P.A.

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3| AnÁlise do contexto 3.1| Históricas| Sociais 3.1.1| História do lixão/aterro controlado 6 3.1.2| Dia-a-dia da catação 7

3.1.3| Enceramento do aterro: Consequências e medidas 10

5| Non Park 5.1| Não programa

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5.2| O projeto

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5.2.1| Hipótese Radial

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5.2.2| Hipótese Axial

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3.1.4| Sociedade Ativista 11 3.2| Técnicas| Ambientais 12 3.3| Espaciais 14

4| Referências projetuais| conceituais 4.1| Robert Smithson 18 4.2| Solla Morales- Terrain Vague 18 4.3| Koolhaas- Parc de la Villete 18 4.4| Post-it city 19 4.5| Tchumi- Parc de la Villette 19 4.6| Victor Papanek - Arquitetura Vernácula

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6| Nota Final

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1 | Tema

O Bicho-homem que come Se come e consome... É bicho!... O bicho-homem que não some Só come e não sente... Não é gente!... O bicho-homem que não é homem É bicho... É fome... O homem-bicho no luxo do homem! Sem nome... É lixo! O lixo do homem é lixo de bicho Bicho não faz lixo O lixo é do homem... Do homem-lixo! BANDEIRA, O homem, o lixo e o bicho: Poesia completa e prosa, p. 48.

Desenvolvimento paisagístico para a área do extinto aterro controlado de Jardim Gramacho ( anexo 1 ). A proposta visa a repensar criticamente o espaço e o panorama desse local, considerando a complexidade das questões sociais, ecológicas, urbanísticas, artísticas e históricas. A imagem — muito forte e marcante — dos grandes amontoados de lixo e dos mutirões de catadores permanece no imaginário de todos aqueles que, de alguma forma, conheceram ou vivenciaram aquele lugar. Com o encerramento das atividades do aterro controlado, em 2012, o cenário encontra-se completamente modificado: trata-se hoje de um descampado de terra batida ( anexo 2 ). A extração de gás, prevista para os próximos dez anos, não contempla um destino funcional/paisagístico para este espaço, dando margem para novos estudos e planejamentos. A partir do entendimento do complexo panorama em que esse recorte territorial está inserido, propõe-se o Non Park (não parque), um espaço que tenha as características essenciais para nominá-lo parque, mas que não atenda a atributos genéricos que podem ser aplicados a qualquer terreno, independentemente de sua situação espacial, histórica ou social. Daí o nome Non Park, tomando a negativa como forma de romper com os possíveis e usuais programas de parque até então estipulados. Pretende-se, assim, criar um espaço que não esconda seu passado, mas que também não se encerre em uma denúncia explícita de tudo que ocorreu, criando portanto um programa específico para esse território. anexo 1

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2 | Justificativa A escolha do tema justifica-se a partir de uma indagação que surgiu junto com a notícia do fechamento do aterro sanitário: Qual será o destino reservado para esse espaço, durante e depois do período previsto de extração de gás metano? Diante da realidade miserável em que se encontra a comunidade de Jardim Gramacho, consolidada a partir de atividades ligadas ao aterro, e diante da enorme poluição (dos rios e da Baía de Guanabara) proveniente do lixo, faz-se urgente a elaboração de uma solução que não resulte em uma mera maquiagem, mascarando as contradições existentes no local.

anexo 2 4

Apesar da precariedade, o aterro não só foi o ponto de partida para o surgimento e o desenvolvimento do bairro como também funcionou como principal gerador de renda da comunidade. Tal território é reconhecido pelos moradores como parte de sua história e seu ambiente, espaço onde se deram as relações de trabalho, afeto e vínculo comunitário. Tendo em vista a história e a realidade locais, não parece ser razoável inserir ali um modelo convencional de parque uma vez que tais fórmulas preexistentes tendem a oferecer soluções que, tanto visualmente quanto em termos de atividade, nada refletem a especificidade do local onde se estabelecem. A proposta do Non Park visa a quebrar com alguns paradigmas impositivos de parque, proporcionando uma constante interação entre os moradores de Jardim Gramacho e servindo como um condensador social. Sua apropriação tem vínculo imediato com as necessidades e demandas do bairro, convidando o público a criar suas próprias atividades. Tal interatividade é possível graças a infraestruturas flexíveis que preveem uma constante sobreposição e renovação das atividades exercidas. Essa constante mudança é o principal motor de vitalidade do projeto.

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3 | Análises do contexto

da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (FUNDREM). Esse órgão foi responsável por coordenar, supervisionar e implantar o sistema de disposição final dos resíduos sólidos urbanos provenientes das cidades do Rio de Janeiro, Duque de Caxias, São João do Meriti, Nova Iguaçu e Nilópolis.

3.1 | Históricas | Sociais 3.1.1 | História do lixão / aterro controlado Apesar da importância metropolitana de Jardim Gramacho, sua evolução urbana é pouco documentada. Desde a ocupação da região da Guanabara, os sucessivos vazadouros de lixo foram feitos sobre manguezais à beira da Baia. Em 1978 o lixão foi criado, em plena vigência da ditadura militar. O regime de exceção visava, entre outras questões políticas, a um planejamento para o desenvolvimento de regiões metropolitanas nos grandes centros do país, tendo como um de seus resultados, a fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro e o consequente surgimento da Fundação para o Desenvolvimento

O antigo lixão, que a partir de 1996 tornou-se um aterro controlado, situa-se na cidade de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense ( anexo 3 ). Além de ter uma conexão visual com a Refinaria Duque de Caxias (REDUC) e o Aeroporto Internacional, ele está cercado pelos rios Sarapuí e Iguaçu, pela Baia Guanabara e pela favela de Jardim Gramacho ( anexos 4 e 5 ). Considerado o maior da América Latina, operou por trinta e quatro anos — de 1978 a 2012 —, recebendo, em média, 8 mil kg de lixo por dia, o que gerou um acumulo de aproximadamente 80 milhões de toneladas. Esses resíduos ocupam uma área de 1,3 milhões de metros quadrados, e os taludes chegam a setenta metros de altura (sendo dez metros abaixo da cota zero).

Baixada Fluminense Estado do Rio de Janeiro

Duque de Caxias Cidade do Rio de Janeiro

anexo 3 6

anexo 4

anexo 5 7


A escolha do terreno para o suposto aterro controlado (lixão) foi feita a partir da avaliação de equidistância entre os municípios, da identificação de um território longe não só do aglomerado populacional como também do interesse especulativo da construção civil. Uma parte do mangue que compõe as margens da Baía de Guanabara, área de preservação inicialmente pertencente à União (e estava sob a responsabilidade do INCRA) e posteriormente doada à Comlurb ( anexo 6 ), foi o terreno escolhido.

A implementação do lixão gerou impacto imediato na vida do bairro. As principais vias de acesso foram tomadas por atividades comerciais e industriais ( anexo 7 ). Jardim Gramacho oferecia um amplo espaço para que os catadores e suas famílias se estabelecessem. A comunidade se desenvolveu a partir de atividades econômicas que giravam em torno do aterro. Cerca de 60% da população vivia de ofícios relacionados aos resíduos sólidos. Foram registrados apenas 1.400 catadores, fora os que não constavam legalmente e os que atuavam em lixões clandestinos. O bairro possui 13.700 moradores, com uma renda domiciliar per capita de 370 reais mensais

3.1.2- Dia-a-dia da catação Não é fácil perceber como era a vida nas “rampas”, nome usado para as montanhas de acumulo do lixo. Por mais que existam vídeos, documentários, textos, depoimentos e fotos, não dá para compreender, de fato, a atmosfera daquele lugar. Os catadores levavam uma vida dura, as condições de trabalho eram massacrantes. Todos os dias corriam atrás dos caminhões carregados de resíduos sólidos, em busca de materiais recicláveis. Durante muitos anos estiveram expostos a radiação, em contato direto com urubus, ratos e principalmente com o lixo (que não era segregado em orgânico, eletrônico, hospitalar, radioativo, urbano ou industrial). Para muitas pessoas, a solução era levar seus filhos para trabalhar na rampa; para outros, era morar em Jardim Gramacho durante a semana e retornar às suas casa nos finais de semana. Como o desenvolvimento do bairro se deu juntamente com o do lixão, sua história carrega muito dessa identidade. Os moradores têm uma afetividade muito grande para com o antigo aterro e hoje, com ele já encerrado, mostram suas saudades. Para quem vê de fora é impossível entender esse sentimento, fica-se questionando o que havia ali de tão interessante. A resposta para essa pergunta está na realidade: a vida, ali, era carregada de amizade, paixões, rotinas, sofrimento, suor e luta. Quer em termos afetivos ou materiais, tudo conquistado pelos catadores foi fruto daquele território. É interessante observar como o ser humano se adapta e resiste às condições a ele impostas. Todo esse cenário acima descrito é consequência da segregação social. A história de Jardim Gramacho revela o tamanho do descaso com as classes exploradas.

anexo 6 8

anexo 7 9


3.1.3 | Enceramento do aterro: Consequências e medidas Com o encerramento das atividades do aterro, a tragédia social ficou ainda mais severa. As cenas chocantes dos filmes que relatam a vida dos catadores de lixo tendem, na realidade, a piorar ainda mais: estima-se que a população que vivia abaixo da linha da pobreza crescerá de 43% para 87%, demonstrando o fracasso das medidas assistenciais tomadas para amenizar o impacto do fim da operação do aterro. Sublinha-se o adiantamento da compensação financeira prevista para os catadores no contrato de concessão para a exploração de gás, no valor de R$ 14.000 para cada ex-catador. Esta quantia mostrouse insuficiente, uma vez que a maioria dos que a receberam não foi instruída para utilizá-la de maneira adequada. Os programas sociais de capacitação para esses trabalhadores não tiveram eficácia nem a continuidade prometida e necessária. É dramático verificar que o bairro continua vivendo intensamente de ações ligadas ao lixo, com novos lixões clandestinos e toda uma rede de atividades ilegais.

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3.1.4- Sociedade Ativista Diante de um cenário precário — ao qual a infraestrutura urbana ainda não chegou e no qual a miséria é protagonista —, surpreendentemente depara-se com uma sociedade organizada. Os líderes das quarenta e oito organizações que representam Jardim Gramacho se reúnem no Fórum Comunitário para discutir questões que envolvem o bairro e para buscar políticas de melhoramento para o mesmo. Tais debates acontecem no final de todos os meses e são abertos ao público, possibilitando a presença e a opinião de todos. O viés ativista foi muito estimulado quando o aterro controlado ainda se encontrava ativo. Muitos dos catadores se organizavam como cooperativas para que a coleta fosse mais eficaz. Esse método obteve ótimos resultados, pois trabalhavam em equipe. O mais importante foi que, a partir daí, eles começaram a exigir seus direitos e a cobrar mudanças, obtendo assim muitas conquistas. A catação passou a ser uma profissão legalmente regulamentada. Valendo-se dessa articulação, o projeto do Non Park solicita à população que participe da sua construção e permanente renovação. O programa de atividades para o parque seria estipulado a partir das demandas da própria população de Jardim Gramacho. Para que a ideia se concretize, propõe-se que seja eleito um Conselho Gestor a partir do fórum comunitário (que já existe desde 2005), com o objetivo de discutir as propostas de ocupação e construção das infraestruturas passíveis de serem oferecidas no Non Park.

Deste modo, as entidades que representam o bairro seriam ouvidas e todos debateriam de forma democrática as questões relacionadas ao assunto, havendo assim um controle de ocupação/apropriação do território. Para que seja possível projetar um espaço que agregue diferentes funções e comporte essas mudanças programáticas ao longo dos anos, fez-se necessária a elaboração de um questionário que ajudará a indicar as possíveis atividades para que a infraestrutura proposta seja adequada e flexível. Queremos ser vistos, queremos que olhem a nossa feiura, nossa sujeira, que sintam o nosso bodum em toda parte; que nos observem fazendo nossa comida, dormindo, fodendo, cagando nos lugares bonitos onde os bacanas passeiam ou moram. Dei ordem para os homens não fazerem a barba, para os homens e mulheres e crianças não tomarem banho nos chafarizes, nos chafarizes a gente mija e caga, temos que feder e enojar como um monte de lixo no meio da rua. E ninguém pede esmola. É preferível a gente roubar do que pedir esmola. FONSECA, A Coleira do cão, pg 221

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3.2| Técnicas| Ambientais

colocação de camadas compactadas de argila e manta, a fim que não haja riscos de contaminação do solo. O lixo depositado é coberto no mesmo dia, evitando a queima de gases para a atmosfera.

Quando o lixão foi implantado na região de manguezal, ainda não havia sido difundida a importância da preservação ambiental e sua consciência. Com o passar do tempo, fez-se uma ferida nessa zona úmida, tão sensível e rica como ecossistema.

Após o fechamento do aterro, em 2012, foram implementadas as medidas do plano de encerramento. O gás provido do lixo é composto, basicamente, por CO2 e metano. O CO2 é tratado para não poluir a atmosfera, e o metano revertido em energia. A usina (gerenciada pela Novo Gramacho Energia Ambiental) retirará 700 m3/h de metano e parte de sua venda, pela REDUC, será destinada ao crédito carbono.

O lixão é caracterizado por poluir tanto o solo quanto a atmosfera, pois é despejado sem nenhum tratamento ou medida de precaução. Dessa forma, o chorume, além de poluir o solo, alcança o lençol freático e a dissipação dos gases colabora com o Efeito Estufa. O que ocorre é que os resíduos sólidos, após quarenta e oito horas, passam a se decompor (as bactérias se apropriam da matéria orgânica). Esses resíduos em contato com as águas pluviais resultam em um liquido que, por sua composição química, torna-se devastador para o meio ambiente: o chorume.

Outras medidas em curso são a terraplanagem, a compactação dos resíduos, a captação de águas pluviais, o replantio de espécies nativas, o tratamento do chorume, a reconstituição do “cinturão verde” de mangue, e o seu monitoramento. O resultado que se busca é um terreno sedimentado, coberto por vegetação e com visitação controlada por conta da extração de gases e seus riscos. Após o termino da extração, a Comlurb entregará o terreno para a Prefeitura de Duque de Caxias. A história ambiental dessa área compromete construções civis, de médio e grande porte, restando como solução, até agora sugerida, o desenvolvimento de uma espécie de parque urbano, aberto à população.

Em 1996, quando a situação ficou definitivamente caótica, as autoridades resolveram criar medidas urgentes para transformar o lixão em aterro controlado ( anexo 8 ). O aterro controlado é caracterizado por medidas curativas, tais como as que foram implantadas em Jardim Gramacho. A área contaminada foi isolada para que o chorume não permanecesse vazando para os rios, comprometendo ainda mais a saúde da Baía. Diques de impermeabilização foram construídos, assim como drenos que levam o chorume para a estação de tratamento (implantada em 2000). A compactação e o recobrimento do lixo também foram feitos, como o replantio de parte do manguezal. Não se pode considerá-lo um aterro sanitário, em razão de que este segue regras específicas, como: escolha adequada do terreno, limpeza e tratamento do solo, 12

O processo de degradação dos resíduos sólidos do extinto aterro controlado já acontece há anos. Os materiais que ainda não foram decompostos são os mais complicados, todavia já houve uma grande diminuição de seu volume. Estima-se que nos próximos cinquenta anos, haja um recalque de, no máximo, cinco metros, gerando uma configuração ondulada do terreno. anexo 8 13


3.3 | Espaciais Há sete acessos para Jardim Gramacho e todos são feitos a partir da Avenida Washington Luiz. A hierarquização das entradas é totalmente vinculada à das vias. Sendo assim, a principal é feita pela Avenida Monte Castelo, que faz a ligação com o antigo aterro sanitário (anexo 9) .

A possibilidade de muitas entradas afeta a falta de controle sobre o espaço e, consequentemente, a concentração de lixões clandestinos em terrenos vazios (anexo 10) .

Por mais que o bairro não tenha tido nenhum planejamento articulado à prefeitura, no que tudo indica, há uma rede viária organizada e previamente projetada. Identifica-se um certo zoneamento que distingue áreas como: 1-Potencial para construções industriais, 2-Residencial precária, 3- Desenvolvida, e 4-central (anexo 11) .

Os espaços utilizado s para lazer não têm qualquer qualificação para uso. Apesar de algumas áreas estarem muito próximas ao lençol freático, há apenas um canal para a drenagem do solo (anexo 12).

anexo 10

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O recorte territorial do Non Park se encontra afastado da população e fica “imerso” no manguezal como uma ilha, tendo como único acesso a rua principal. Não há qualquer vinculo visual/paisagístico ou de continuidade urbana com o bairro. A usina de gás metano se encontra bem na entrada do terreno e logo a seguir situa-se a zona de tratamento do chorume.

anexo 13 16

No vasto e árido espaço restante, em que a cota mais alta é no centro do território (anexo 13), há uma boa acessibilidade viária, feita a partir de veredas “circulares” que vão até o ponto mais alto do local (anexo 14).

anexo 14

O sistema de drenagem do chorume (anexo 15). ocorre de maneira coerente com o declive da topografia e encontra uma barreira radial que os direciona para a zona de tratamento. Já os poços de captação do gás metano (anexo 16) são distribuídos por um sistema de rede (os pontos são os poços, as linhas são as tubulações que os conectam e a rede é

anexo 15

a multiplicação desses dois elementos e a distribuição dos mesmos por toda a área). Ao se observar o recorte territorial, identifica-se uma apropriação radial. A água, o mangue, a nova vegetação, a distribuição dos poços, o sistema de drenagem, as vias e a topografia têm um caráter radial com relação ao centro do território.

anexo 16 17


4| Referências projetuais| conceituais Como se encontra nos tópicos abaixo, as referências mencionadas ajudam a conceber o pensamento conceitual do projeto como um todo. A elaboração do Non Park tem como embasamento a teoria desses pensadores, projetos e pesquisa, assim como o estudo da exposição.

4.1| Robert Smithson Segundo Robert Smithson, o Non-Site contém uma metáfora dimensional. Entre a paisagem e o Non-Site existe um espaço metafórico, abstrato. O artista, como operador estético, tem o papel de mediador entre a paisagem real e o Non-Site. A soma da linguagem (programa) e da ideia (metáfora) cria o não lugar, mas para isso é preciso um programa de ação, remetendo a algo que ainda não existe . Esse novo elemento é um operador estético, é a construção de uma nova dimensão.

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4.4| Post-it city 4.3| Koolhaas- Parc de la Villete Para ele, os parques não foram adaptados ao seu tempo. Acredita que deve incluir símbolos de modernização e inovação com o objetivo de torná-lo ativo e manifestar o modo de vida da cidade por meio de constante renovação das atividades. Revela o vazio como oportunidade para produzir congestionamento. Pretende quebrar com a doutrina arquitetônica de nunca permitir a indeterminação, projetando as intenções programáticas, mas não o espaço em si.

Exposição sobre apropriações ocasionais do espaço público. Nenhum dos usos foi projetado ou previsto pelo urbanista. São intervenções provisórias, muitas das vezes informais e versáteis em um local público. Geradas a partir das necessidades e demandas do local, expressam vitalidade e presença do cidadão na construção da vida urbana.

4.5| Tschumi- Parc de la Villette 4.2| Sola-Morales - Terrain Vague Através da imagem fotográfica é possível receber indícios, impulsos que ajudam na construção de um imaginário que se estabelece como o de um lugar e o de uma cidade determinada. Terrain Vague são vazios, de limites imprecisos e de vaga definição. São lugares que não foram incorporados à dinâmica urbana, e, como tudo que não se encaixa no sistema “comum”, causa estranheza e sentimentos pejorativos. São espaços nas cidades, mas que não pertencem ao pensamento e ao planejamento das mesmas. São a crítica à própria cidade e a solução para muitas delas. Diante da estabilidade, procurase a aventura; diante da densidade, procuram-se os vazios. Sendo assim, a ordem urbana precisa dessa indefinição, criando uma dialética entre estes espaços e o próprio ser humano de nossos tempos.

Interpreta o parque como uma nova maneira de cidade, rompendo com a ideia que existia previamente. É anticontextual no sentido de que, plasticamente, visualmente e arquitetonicamente, o parque não tem qualquer integração com o entorno, mas com relação à realidade da cidade de Paris, ele instiga diversos questionamentos, se inserindo diretamente no panorama real em que se situa. As provocações geradas a partir do projeto não são tão óbvias e fazem com que a maioria dos frequentadores não as entenda. Para ele, o importante é reagirem diante do feito.

4.6| Victor PapanekArquitetura vernácula Arquitetura que traduz a linguagem do lugar, feita de forma coerente com a cultura e a natureza do local. Utiliza materiais, sistemas construtivos e mão de obra que façam sentido naquela realidade, integrando-a ao meio em que é feita. É normalmente autoconstruída, pois respeita a escala humana, e é de fácil compreensão. O processo de construção é tão ou mais importante do que o produto acabado, pois revela um ato cooperativo. A arquitetura vernácula passa a adotar os resíduos sólidos em suas soluções, quando eles fazem parte do contexto daquele espaço. Com os detritos não degradáveis da alta tecnologia a acumularem-se em todo o mundo, verificou-se uma incorporação imediata no vernáculo dos novos materiais encontrados.(PAPANEK, 2007,cap6)

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4.7| Pedro Fiori Arantes-

5| Non Park

Arquitetura Nova| Arquitetura de mutirão

5.1| Não programa

Arquitetura nova de Sergio Ferro apontou transformações possíveis para as próximas gerações. A continuidade de sua problemática resultou nos mutirões auto geridos a partir dos anos 80. O mutirão para a construção popular surgiu em contraposição aos conjuntos habitacionais “modernistas”. O controle das decisões e a administração dos recursos eram feitos pelos próprios construtores e futuros frequentadores.

O conceito de Non Park surge a partir de um questionamento que trata da imposição programática e visual do parque sobre determinado espaço. Tendo em vista toda a complexidade já citada, a relevância da questão histórica e suas consequências, entende-se não ser adequado adaptar os programas habituais de parque a este território impregnado de história tão singular. Tanto nas artes como na arquitetura, a negação de algo é uma maneira de criar novos parâmetros para aquilo que se contesta, sempre carregando um pouco do que foi previamente estipulado. No caso do não parque,

Com o passar do tempo, a participação de novos arquitetos foi fundamental para constituir uma melhor base técnica, organizacional e intelectual nos mutirões. Desta forma, o arquiteto, que antes trabalhava lado a lado com os mutirantes, passa a ter autonomia para elaborar projetos. O mutirão não nasce com a intenção de profissionalizar as pessoas e sim como uma atividade amadora (trabalho não pago). Houve um período em que esse método construtivo foi recomendado pelo bancos, como política alternativa e especifica do terceiro mundo. Mas o mutirão só se justifica se for um movimento social e de “autogestão”, caso contrário é um método retrógrado de construção. Esse dilema crucial estabelece limites da constituição de um processo coletivo de criação, que não pode ser regressivo, com a negação do ofício do arquiteto, nem autoritário, com sua sobrevalorização.- (ARANTES, 2002, pag 209) Arquitetura do espetáculo Autoconstrução - Uma antipoética da economia: extraindo do mínimo apenas o mínimo para a sobrevivência. (ARANTES, 2002, pag 189) 20

4.8| Pesquisa Ação- P.A. Pesquisa social concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou problema coletivo. Os pesquisadores e os participantes, representativos do problema, são envolvidos de modo cooperativo e participativo. É vista como um ato de engajamento sócio-político a serviço das classes populares. É organizada em meio aberto: bairro popular, comunidade rural, instituições etc. A postura do pesquisador é escutar os vários aspectos da situação, sem impor seu juízo de valor. A P.A. visa a produzir conhecimento, adquirir experiências, construir discussões e capacitar as pessoas a desenvolverem certas atividades de forma “autônoma”. Além disso, procura soluções para os problemas levantados.

nega-se a imposição paisagística e de atividades realizadas, mas as características que categorizam o parque são mantidas. Esta dialética, no caso, impõe a necessidade de realizar uma pesquisa sobre as possíveis tipologias de parque: militar, natural, industrial, de estacionamento, habitacional, de diversão, temático, de skate, infantil, para cães, tecnológico/científico, jardim botânico, esportivo, de artes. Também foi de extrema importância caracterizar o que se nomeia

anexo 18 21


praça e jardim, com o objetivo de discerni-las da definição de parque. Compreendese parque como um espaço de larga escala, urbano ou rural, privado ou estatal, mas sempre de caráter público, controlado ou de livre acesso. Pode comportar diversas funções (inclusive a de jardim e praça); é um espaço de encontro e tem como objetivo reunir algo, proporcionar infraestrutura para a realização dessas atividades. Para criar o Non Park foi preciso elaborar o não programa que é a própria indefinição programática. A combinação entre infraestrutura e ocupação casual de atividades tem como objetivo projetar vazios oportunos para produzir encontro e reunião. A qualidade dos espaços e o potencial de cada um deles, juntamente com a demanda da população, vão gerar novas apropriações. Estas, conforme o tempo, vão se sobrepondo e substituindo, resultando em um espaço em constante mutação. A frequente renovação reflete a vida das cidades e, mais especificamente, a vida do bairro, onde a substituição e a justaposição de atividades são itens importantes para sua vitalidade. Desta forma pretende-se trazer para o projeto a participação constante dos habitantes. Com o fechamento do aterro sanitário, muitos ex-catadores ficaram sem fonte de renda e essa seria uma oportunidade de recomeço. O objetivo não é criar algo definitivo e controlado, e sim um sistema de regras e estruturas que respeite a liberdade e suporte as variações. O projeto atua em um território que, como poucos, expõe as feridas contradições inerentes

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ao mundo capitalista. Durante décadas, aquele lugar foi compelido a sofrer, na sua atividade econômica, nas relações sociais, na destruição ambiental, bem como na atmosfera espiritual, uma asfixia degradante e progressiva. Trata-se de projetar uma metamorfose capaz de transformar esse lugar em um espaço de convivência produtiva entre dualidades. O Non Park se apresenta como uma paisagem em que as dualidades, presentes no projeto, ao invés de serem anulativas são dialeticamente complementares. O espaço caótico (o caos) é gerado a partir de um sistema (a ordem), e as memórias (o permanente) mantidas são referentes ao mundo do desperdício (o descartável), se apresentando como um projeto que converte a histórica imposição em um procedimento de cooperação e liberdade. A proposta repudia as afirmações absolutas e é avessa ao “culto da genialidade”. Alerta para a importância de tirar os projetos urbanos/arquitetônicos das mãos da elite, tendo a comunidade como sujeito ativo. Existe de maneira democrática e para se desenvolver não precisa eclipsar nada ao seu redor. Todo projeto urbano é político, mas existem diversas vertentes. O Non Park é fruto da análise histórica e da tentativa de aproximação do lugar. São iniciativas que questionam os problemas derivados de uma sociedade de classes. A maioria das soluções lançadas para lugares como esse, vistos como “restos” da cidade, mesmo quando “atende ao que o povo quer”, tem um caráter de segregação! O Non Park opõe-se a essa posição.

O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais. (BRECHT, Bertold, O Analfabeto Político)

Todos os conceitos foram estabelecidos em relação a um local específico (Jardim Gramacho), no qual a história, a geografia, a cultura etc são determinantes para fundamentar todos os argumentos e pensamentos constitutivos do Non Park. O estudo foi limitado a apenas esse recorte territorial, sem o objetivo de encontrar uma solução especulativa a partir da análise das características comuns aos demais cenários. A intensão foi encontrar diretrizes projetuais que carreguem muito do Jardim Gramacho, sem que possam ser aplicadas a outros locais. O fator “casualidade” determinou a criação de um projeto de infinitas variáveis e cenários hipotéticos de ocupação. A proposta de construção participativa do parque leva em conta o entendimento da P.A. e a arquitetura de mutirão. Apesar de a P.A. ser elaborada por sociólogos, trata-se de uma pesquisa que visa a encontrar soluções para problemas coletivos (de lugares com baixa renda) e só se justifica quando capacita os envolvidos a exercer atividades autônomas. A construção do Non Park tem como objetivo gerar novos empregos e instruir os interessados para que invistam na própria formação profissional. Já o conceito de mutirão, que nasceu sem esse interesse, apostando no amadorismo e no trabalho conjunto (sem hierarquia), ganha aqui novos contornos. Quando o arquiteto passa a ter mais voz e poder de decisão, começa a surgir uma vertente mais profissional da arquitetura de mutirão, a qual o Non Park incorpora. Aqui a proposta tem como referência a arquitetura vernácula, pois busca não só desenvolver soluções que atendam às questões locais como também utilizar materiais que façam parte do ciclo preexistente no bairro. O Non Park carrega o germe da emancipação: deseja entranhar-se de tal forma no contexto, que, de fato, seja parte do mesmo. A grande questão da autoria faz com que não seja possível categorizá-lo como vernáculo, pois a definição dessa arquitetura consiste na ausência autoral. 23


É preciso que falemos dos mundos e não do mundo, mas sabendo que cada um deles está em comunicação com os outros, que cada um possui pelo menos imagens dos outros – imagens eventualmente truncadas, deformadas, falsificadas, às vezes reelaboradas por aqueles que, ao recebê-las, procuraram nelas os traços e os temas que lhes falavam primeiramente deles mesmos, imagens cujo caráter referencial é, no entanto, indubitável, de forma que ninguém mais pode duvidar da existência dos mesmos. (AUGÉ, Por Uma Antropologia dos Mundos Contemporâneos, pg 141)

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Módulo de Ativação| Tipologias Possíveis tipologias dos módulos

5.2 | O projeto

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Níve

Possíveis Tipologias dos núcleos

anexo 20a e de 20bAtivação Núcleo

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Total de 33 núcleos

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anexo 19

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Diametro máximo| 30m

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Diametro| 20m

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Diametro mínimo| 10m

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| Livre apropri gem açã ena o r D

Nível Alto

26

Poço de extração de gás

A própria configuração da morfologia (medidas: altura, diâmetro, inclinação; localização e configuração) pretende criar espaços arquitetonicos. Os resíduos sólidos aglomerados no terreno, tomam novas formas e possibilitam a construção de espaços cobertos e apropriáveis. A possibilidade de variações dos módulos gera uma paisagem onde a configuração morfológica se confunde com arquitetura. Por utilizar elementos construtivos e mão de obra local, os módulos e suas atividades podem ser modificados e até mesmo substituídos ao longo do tempo.

de

Possíveis tipologias dos módulos

Nível Alto

O Non Park propõe-se como espaço intermediário entre o meio antropizado e a natureza. Se por um lado será induzida a apropriação da população sobre as infraestruturas, por outro será feito o mesmo com a ocupação das espécies nativas sobre o território. É possível observar que, apesar de não ter havido qualquer tratamento de limpeza do solo, houve uma apropriação muito rápida da natureza sobre o espaço, criando um cinturão dessa nova vegetação (anexo 18). A proposta visa a respeitar essa borda já estabelecida.

Módulo de Ativação

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anexo 17

A paisagem se comporta como uma esponja, pois absorve e processa todos os elementos, características, questões e fatores importantes do território e de seu entorno. Ao se aproximar da realidade, revela os atributos ao invés de camufla-los. As novas camadas intercalam com as antigas, de forma que todas são reveladas. Os demais parques aplicam camadas “higienizadoras”, cuja sobreposição faz com que uma anule a outra, camuflando a realidade.

O programa projetual tem como protagonista a comunidade. Desta forma, acredita-se que o planejamento e as regras são fundamentais para que eles próprios se organizem, construam e modifiquem o parque. Os poços de extração de gás, elementos marcantes na paisagem árida que lá existe, irão delimitar a posição dos módulos de ativação, em cujos centros estarão situados. Tais módulos são, no projeto, concebidos como “ilhas” de ocupação humana — definindo o raio permitido para o acontecimento de atividades (anexo 19). Como o recalque gera formas aproximadamente circulares, essa conformação é aderida ao projeto.

Esp or tiv a

+

Com o objetivo de romper com o processo projetual linear — em que o resultado da problematização identificada na analise é uma solução fechada e definitiva—, foram determinados cenários distintos e mutáveis, tornando-o ramificado e cíclico. A fim de proporcionar um projeto flexível, regras dinâmicas foram criadas, dando espaço para a casualidade definir certas mudanças. Ao contrário do masterplan — que tem como objetivo impor o projeto como verdade absoluta e não permite variações—, as hipóteses surgem como um sistema aberto. Ao definir lógicas de ocupação do solo, estipula-se que a mesma será “supervisionada” ao longo do tempo.

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Topografía mutante

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Por se tratar de uma topografia constituída de resíduos sólidos, as condições geológicas e geotécnicas do solo são muito peculiares: com o passar do tempo ocorrerão recalques nesse território, gerando assim uma paisagem mutável. A poética do Non Park se dá a partir da tentativa de aproximação desse “organismo vivo” (território). O projeto visa não só a incorporar as alterações decorrentes de mudanças imprevisíveis, mas também intensificar essa morfologia, dialogando diretamente com a mesma (anexo 17).

Po s

ibi ivre apropr lid Móduloagde em | LAtivação| iaç Tipologias a

Núcleo de Ativação Total de 58 núcleos

anexo 21 27


Para que seja possível projetar um espaço que agregue diferentes funções e comporte essas mudanças programáticas ao longo dos anos, elegeram-se tipologias referentes aos módulos de ativação. Tais tipologias a um só tempo sugerem e restringem as ocupações, de tal modo que deixem em aberto as possíveis atividades relacionadas a cada uma delas (anexo 20a). A água, a vegetação e a infraestrutura são os três elementos fundamentais para a criação do projeto nas diferentes escalas. As diferentes tipologias serão definidas a partir da combinação de intensidade de cada uma delas. Apenas 1/3 do total de poços de extração (295 unidades) servem como base para a criação dos módulos. Os outros 2/3 são mantidos apenas como memória e marcos no território. Dos 99 possíveis módulos, 27 são referentes às tipologias: logística/produtiva, esportiva/recreativa e multifuncional. Já o restante dos módulos de ativação, 59 são restrito a atividades de drenagem e 13 a espaços de livre uso. Cada núcleo é constituído por três módulos (anexo 21), dois dos quais são de livre uso ou drenagem e variam entre 10, 20 e 30 m de diâmetro. O terceiro pertence às outras tipologias estipuladas e varia entre 20 e 30 m de diâmetro (anexo 20b). As variações de diâmetro fundamentam-se pela seguinte equação: a menor medida para que comporte um ciclo interno e a maior medida para que seja facilmente executada. A determinação dos 33 núcleos, justifica-se por garantir o equilíbrio do desenvolvimento do Non Park.

O sistema gerado pelas regras de ocupação, induz a construção de um núcleo a ser pensada de modo conjunto com os demais. Como o processo construtivo de um dos módulos do núcleo depende dos demais, cria-se uma harmonia de atividades no espaço, conforme os núcleos vão surgindo. Há diversas maneiras de os três módulos se relacionarem construtivamente. O que se exige é a coerência entre o material que se retira e o que é aglomerado no terreno. A retirada de resíduos sólidos de uma determinada circunferência e altura (para gerar um modulo côncavo em relação ao terreno) deve ser equivalente ao volume necessário de matéria para formar dois outros módulos de ativação (convexos em relação ao terreno) ou vice e versa (anexo 22). Como se tratam de cenários que vão ser construídos cooperativamente, os módulos respeitam a escala humana e a altura é de no máximo quatro metros, permitindo uma troca visual em todo o espaço. As hipóteses são uma antecipação da máxima ocupação possível para o progressivo processo construtivo do Non Park. A partir da análise do local, identificam-se duas vertentes de ocupação no território: radial e axial. Estas servem de partido para o desenvolvimento dos cenários. As hipóteses obedecem a regras comuns, mas também a regras específicas e independentes.

5.2.1| Hipótese Radial A hipótese radial enfatiza o caráter periférico presente no território. Desde a situação em que ele se encontra (cercado por mangue e água) até a topografia; desde os sistemas (viários, de drenagem e de extração de gás) até a vegetação rasteira presente no espaço — tudo converge para o centro do terreno e obedece a essa configuração radial.

mantidos e conectados aos novos sistemas. As vias, os eixos da drenagem pluvial e da drenagem de chorume, convergem para o centro do território e se apresentam de maneira intercalada para que haja uma melhor distribuição destes líquidos pela superfície.

Dois cinturões foram criados. O primeiro situa-se bem no centro/cume e está acima da cota 45 do terreno. Caracteriza-se por ser um núcleo com vegetação densa (induzida). Nesse núcleo os módulos são destinados ao tratamento de águas pluviais e a espaços vazios, que possibilitam a livre apropriação da paisagem e a constante renovação de usos. Esses módulos precisam de manutenção e utilização, mas não demandam constante presença humana, construções e espaços abrigados.

Os cinturões causam bruscas mudanças de paisagem e dos elementos que as constituem. Esse contraste, gerado a partir das diferentes composições dos elementos presentes e influentes naquele espaço, resulta em um caos de informações. Conforme se afasta do centro/cume da topografia, se vivenciam cenários e paisagens completamente distintos, fazendo do Non Park um espaço dinâmico e multifacetado.

Já o segundo cinturão diz espeito a um espaço árido, sem vegetação e com terra aparente. Nesse cenários os módulos são ligados a atividades de constante presença humana (educacional; esportiva/recreativa; multifuncional; logística/produtiva). O cinturão periférico existente vai ser mantido isento de usos ou de induções, sendo entregue à ação da natureza. As vias principais e os sistemas de drenagem são distribuídos de maneira equilibrada. As vias radiais foram mantidas, e outras duas foram criadas (seguindo os eixos X e Y) com o objetivo de fazer a ligação entre a radial maior e a radial menor. As demais vias seguem a configuração de rede e conectam os módulos entre si, ou os levam para mirantes. Os diques e drenos radiais de drenagem do chorume e das águas pluviais também foram

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diagramas

Diretriz radial

Cinturões com paisagens e apropriações distintas

Ocupação que Divisão de converge para o atividades dos centro | Divisão módulos | segundo equilibrada dos a intensidade de sisitemas sobre o uso/ frequencia espaço humana

Conformação radial

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30

31


32

33


Espaço árido Vegetação natural rasteira

corte longitudinal hipotese radial

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Vegetação induzida no cume

Vegetação natural rasteira

Vegetação natural rasteira

Vegetação induzida no cume

Espaço árido Espaço árido

Espaço árido

Vegetação natural rasteira

corte transversal hipotese radial

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5.2.2| Hipótese Axial Já a hipótese axial estende o eixo da Rua Monte Castelo — que tem grande importância histórica na consolidação do bairro de Jardim Gramacho — para dentro do território do Non Park, fazendo a ligação direta (através de uma via) da Av. Washington Luiz com a Baía de Guanabara. A partir desse eixo é que se dá a apropriação do espaço por módulos de ativação e é ao longo dele que se cria uma clareira na paisagem. Esse vão na densa vegetação arbórea induzida é criado entre duas ruas paralelas à axial e tem como objetivo gerar um corredor visual no Non Park, que liga suas extremidades à favela e à Baía de Guanabara. Além disso, tem como objetivo ressaltar a importante presença da água no espaço. É por meio desse axis que se dá o amplo sistema de drenagem do chorume e o de águas pluviais, interligando as lagoas da entrada no Non Park com as situadas no fim da via axial (próximas a Baía). Como o topo do terreno se encontra na metade do percurso da via principal, a drenagem é feita de forma a respeitar o declive, encaminhando parte dos líquidos para um conjunto de lagoas e o restante, para o outro. As águas pluviais, recolhidas para não cooperar com a geração de chorume, são tratadas nos módulos de ativação assim destinados. Após esse processo, são despejadas na Baía de Guanabara ou vão para os reservatórios/ lagoas (utilizados para suprir o consumo do próprio Non Park). Já os diques de drenagem do chorume, destinam-no para zonas de tratamento/ lagoas (uma preexistente e a outra construída para tratamento macrobiótico).

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Nesse eixo será permitida apenas a vegetação rasteira e módulos relacionados à água ou a vazios sugestivos de utilizações livres e temporárias. No restante do terreno, vai ser realizada a indução da natureza e os módulos vão ser destinados às demais tipologias, que são atividades mais urbanas e que demandam um uso frequente dos seres humanos.

diagramas

Diretriz Axial

Conexão de águas | Corredor visual entre extremidades: Favela e Baía

Divisão de atividades dos Ocupação a módulos | segundo partir do eixo | a intensidade de malha distorcida uso/ frequencia humana

Eixo | Conecta; corta

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Clareira no território Lagoas | Tratamento de chorume e águas pluviais

corte longitudinal hipotese axial

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Sistema de drenagem de águas pluviais e chorume| Corredor de água que as conecta

Clareira no território | Conexão visual: Favela e Baía de guanabara

Clareira no território Lagoas | Tratamento de chorume e águas pluviais

Vegetação densa induzida

Vegetação densa induzida

corte transversal hipotese axial

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6| Nota Final É importante ressaltar que as atividades do Non Park são prioritariamente exercidas por cooperativas locais, mas podem vir a ser geridas pelo bairro e abertas às comunidades vizinhas. Ao observar o ciclo de atividades permanentes na comunidade de Jardim Gramacho, percebe-se que ele ainda se encontra muito ligado à catação e à reciclagem. Acreditando que esse ciclo tem uma enorme força, é importante interligá-lo ao ciclo do parque, fortificando ambos (anexo 24). Como fazer isso? Os módulos de ativação foram pensados para serem executados pelos próprios moradores (mão de obra não qualificada). Sua estrutura, fechamentos e mobiliários, devem ser fruto da transformação dos resíduos

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sólidos catados em Jardim Gramacho. A catação pode ser relacionada a oficinas que geram produtos a partir dos resíduos sólidos. O Non Park revela-se, assim, um espaço que instiga e provoca seus usuários não a denunciar explicita e planfetariamente o passado daquele lugar, mas a experimentar a realidade da reciclagem na própria existência e na relação da comunidade com seu território. Sem abrir mão da história ali vivida, mas sem deixar-se escravizar pelo passado, os ex-catadores de lixo do Jardim Gramacho podem reconstruir seu futuro através da prática da atividade que os identifica: extrair dos resíduos a matéria-prima para seu sustento. Só que, dessa vez, com dignidade de cidadão que toma as rédeas de sua história.

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