3 R$ 1l,90
NOEL
~ROSA
NÃO TEM TRADUÇÃO MPB - 4
PRA QUE MENTIR? PAULl NH O DA VIOLA
FEITIO DE ORAÇÃO AGOSTINHO DOS SANTOS
PROVEI JORGE GOU LART/N ORA NEY
PIERRÔ APAIXONADO MARIA BETHÃNIA
TR[S APITOS ELIZETH CARDOSO
CONVERSA DE BOTEQUIM ARACI DE ALMEIDA
ÚLTIMO DESEJO BETH CARVALHO
PALPITE INFELIZ ROBERTO SILVA
SÓ PODE SER VOCÊ (ILUSTRE VISITA ) MARCIA
CACO APAIXONADO NOEL ROSA
PASTORINHAS <.?~~.___._ _ _-,,-,~ A
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ED I TORA
GlOBO
EDITOR A
GlOBO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO Roberto Irineu Marinho (presidente) João Roberto Marinho (vice-presidente) Roberto Irineu Marinho, José Roberto Mari nho, Luiz Eduardo Velho da Silva Vasconce los, Mauro Molchansly, Pedro Ramos de Carvalho (conselheiros )
Diretoria executiva Ricardo A Fischer (diretor geral), Fernando A Costa, Flávio Barros Pinto, Carlos Alberto R. Loureiro, José Francisco Queiróz (diretores) Divisão de fasclculos e livros Diretor: Flávio Barros Pinto Editorial: Sandra R. F. Espilotro (editora executiva)
Mais que uma simples categoria de manifestação artística, a música popular brasileira é um tipo de catalisador do pensamento e da cultura nacionais. Há muito a música foi eleita como veículo em que nós, brasil eiros , nos sentimos mais confortáveis para comunicar nossas paixões , nossas angústias , medos, ressentimentos, procuras , nossas posições políticas . Justamente por isso, resgatar a história da MPB é resgatar momentos, imagens e eventos da nossa história. Nesse século, nossa música desabrochou. Quem tenta entender sua traj etória percebe que até os anos cinqüenta tivemos ensaios , talentos qu e foram espalhando sementes no imaginário do povo e dos compositores. Algumas dessas sementes frutificaram ali mesmo, no momento da semeadura, e viraram canções que até hoje habitam nossas memórias. São as canções de Noel Rosa, de Lupicínio Rodrigues, de Ismael Silva, de Ataulfo Alves e de muitos outros. Mas foi apenas no final da década de cinqüenta que todas essas sementes se fundiram , se misturaram e deram origem à nova música popular do Brasil. Navegando nas águas de Tom Jobim, João Gilberto e Vinicius de Moraes, a bossa nova atracou no porto brasileiro e mudou para sempre os rumos dessa história. O que veio depois foi o desenvolvimento da planta, foram as cores das pétalas, foram as curvas dos galhos . Foi uma geração inteira de t a lentos in éditos que agora, no final do sé culo, continua produzindo e gerando frutos, confirmando a nossa música, brasileira antes de tudo, como uma das expressões artísticas mais criativas do século vinte. A coleção MPB Compositores vai lev ar a você a história desses homens e dessas mulheres. E, mais que tudo, dessa música.
Vitório Cestaroli (editor de arte) Edison Gasparim (diagramador) Edenir da Silva (assistenle de redação) Colaboradores: Elifas Andreato (Projeto e criação) Wharrysson Lacerda (Redação e edição de texto) lolanda Huzak (Edição de fotografia) Alexandre Huzak (Direção de arte) Sandro Schulze (Chefe de arte) Dennis Vecchione e Bento And reato (Editoração Eletrônica) Janaina Abreu (Secretária de redação) Mônica Hog (Pesquisa) Cri stiane Teixeira (Revisão) Sulla Andreato (Administração) Marketing: Heitor de Souza Paixão (diretor) Atílio Roberto Bonon (gerenle de produção). Elisabete Blanco (supervisora de produto) , Sérgio Ishikawa (supervisor de marketing), Eliane Soares (assislente de marketing), Marilda Faria de Oliveira, Zita Stellzer R. Arias (coordenadoras de produção) Circulação: Wanderlei Américo Medeiros (diretor) Marketing Direto e Serviços ao Cliente: Wilson Paschoal Jr. (diretor) Assinaturas: Ubirajara Romero (diretor) Comunicação: Mauro Costa Santos (diretor)
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Editora Globo S.A. Rua Domingos S. dos Anjos, 277, 1" andar, CEP 05136-170, São Paulo, SP, Brasil MPB COMPOSITORES é uma publicação da Editora Globo SA Para conhecimento público, o preço do Compact Disc - CO -, parte integrante e inseparável desta obra, é de R$ 2, 50. Embora não possa ser comercializado separadamente. Distribuidor exclusivo para o Brasil : Fernando Chinaglia Distri buidora S.A Rua Teodoro da Silva, 907, CEP 20563-032, Rio de Janeiro , RJ ISBN DA COLEÇÃO: 85.250.1917-8 ISBN DO VOLUME: 85.250. 1920-8
LORED ANO
Noel Rosa é uma escola especial dentro das diversas escolas que compõem o universo do samba brasileiro.
É o pioneiro de uma forma , na qual a poesia popular, altamente sofisticada, embora saindo de maneira simples, junta-se a uma melodia dimensão poucas vezes atingida na história da nossa música popular. PauZinho da Viola
o FEITIÇO DA VILA NOEL ROSA FOI UMA REUNIÃO. EM SUA CURTA EXISTÊNCIA, ELE MISTUROU O ARDOR DOS ROMÂNTICOS COM A VONTADE DE GOZAR A VIDA DAQUELES QUE SÃO SEMPRE JOVENS. VIVEU INTENSAMENTE SUA BREVE PASSAGEM PELO MUNDO.
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Oel Rosa era um pândego, quase um humorista, com suas letras irônicas, sarcásticas, quase satíricas. Os livros contam essa essa tória de Noel Rosa. Nas décadas de 20 e 30, ele alegrará o bairro de Vila Isabel, a cidade do Rio de Janeiro e o Brasil. Sua música inovará e, ainda ass im, será aceita até pelos conservadores, que não resistirão e deixarão um sorriso, ainda que leve, ir se formando nos lábios, quando o rádio tocar Gago Apaixonado, Que horas são? ou Com que roupa? Noel Rosa será um compositor popular, mas, talvez, a figura que melhor se encaixe a ele seja a de um palhaço. Palhaço daqueles que fazem questão de se maquiar colocando uma lágrima no rosto e, a partir dela, ir quebrando lentamente as resistências, ir conduzindo a imaginação de quem ouve, até que surja o sorriso. A lágrima de Noel Rosa sempre esteve estampada em sua face. Surgiu em seu parto: uma operação difícil, re-
solvida a fórceps, que mobilizou dois médicos e teve como principal conseqüência uma fratura no maxilar inferior do bebê. Mas uma fratura que não foi e que seria notada meses depois, passado tempo demais para uma correção definitiva. A criança ficará marcada para o resto da vida. Porém, mais profunda que a deformação física, será a deformação no espírito. Noel carregará um grande complexo. A linha reta que une seu pescoço ao lábio inferior, quase sem a presença do queixo, será responsável por várias amarguras que o acompanharão por todos os caminhos da vida. Nesse caminhos, Noel Rosa passará inúmeras vezes pelo bulevar 28 de setembro. Em 1932, esta já é a principal rua do bairro de Vila Isabel, zona norte do Rio de Janeiro. Noel não passa despercebido. Ele tem as costas ligeiramente encurvadas, está sempre acompanhado de um violão e é assim que as pessoas que estão nos bares, nos botequins e nas portas de casas o reconhecem e o
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quintal, o mesmo Noel que, anos mais tarde, enfrentaria um segundo suicídio: o de seu pai. O artista abraçaria o mundo de Vila Isabel e, a partir dele, construiria um novo, no qual as formas se aproximariam do real mas seriam, de algum modo, mais fl uidas. O malandro das ruas seria transformado por Noel em símbolo. Os olhos do artista se lançariam sobre o dia-a-dia e encontrariam as ironias, as anedotas, as brincadeiras, os amores e as desilusões de todo dia. Mas Noel Rosa era mesmo um pândego, incapaz de levar a vida dentro de padrões normais de bom comportamento da época. Q uando fez dezessete anos, foi convocado pelo exército e serviu no Tiro de Guerra. Sua' passagem pelos quartéis fico u marcada por várias repreensões, em função das paródias que ele costumava inventar para as quadrinhas cantadas durante as marchas. Ainda no Colégio São Bento, onde ele completou seus estudos de segundo grau, fico u famoso o episódio em que ele, Noel, seguia à frente de um desfile, comandando um pelotão de alunos. Ele marchava firme, com a espada desembainhada, apontada para o alto, e os colegas o acompanhavam. Mas, de repente, ele começou a dançar e a rebolar e os outros caíram na gargalhada e dispersaram a parada. Valeu uma suspensão.
cumprimentam. E ele pára para conversar e alonga o tempo do trajeto, q ue o leva até o ponto do bonde e, de lá, para o Café Nice, no centro, ou para os bares e prostíbulos da Lapa ou do Mangue, na zona norte. Em 1932, Noel Rosa já é um compositor pop ular. No carnaval passado, o de 1931, sua música Com que roupa? foi a mais executada. A partir daí, Noel incorporaria o bairro de Vila Isabel ao cenário artístico brasileiro. Ele mudou a vida daquela comunidade. Transformou aquelas ruas, casas, pessoas e botequins, tipicamente cariocas e de classe média, em imagens que passaram a povoar a imaginação coletiva brasileira a partir de 1929, quando, aos 19 anos, ele começou, efetivamente, a produzir música. Noel nasceu em 11 de dezembro de 1910 e, aos 21 anos, já põe em prática um estilo de vida boêmio que o levaria ao sucesso e à fama, mas, aos poucos, também lhe tiraria a vida.
A MALANDRAGEM ROMÂNTICA Noel já havia começado a fazer diferença no bairro onde nasceu e morou ainda na infância. Era uma criança inquieta, que sempre chegava em casa com as roupas rasgadas, o corpo suado das brincadeiras da rua. Sempre a rua, que seria mais seu lar que sua própria casa. Seria na rua que Noel construiria boa parte de sua personalidade. Ali, ele trataria com os personagens da vida cotidiana, humilde, miserável, fanfarrona e malandra do Rio de Janeiro de então. A criança, que desde cedo aprendera a conviver com o infortúnio do queixo, com o infortúnio do suicídio da avó, enforcada numa árvore do
SAMBA E ANATOMIA ~
Depois do exército, Noel estava decidido a realizar o sonho de sua família e se tornar médico. Prestou o vestibular e não passou. No ano seguinte, tentou novamente e foi aprovado. Começou a cursar, mas nessa época, o samba já o absorvia por inteiro.
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Em 1.932, Noel Rosa concedeu entrevista ao jornal " O Globo". Um relato que mostra a clareza e uma certa amargura do artista que se vê, multas vezes, obrigado a se deixar explorar para sobreviver. Noel fala também dos rumos da MPB naqueles dias. "Antes, eu me comovia quando ouvia cantado no rádio ou no disco qualquer samba meu. Santa vaidade ... Aprendi o que devo fazer para me domiMr. Pergunta se na..cL dade constantemente: há compositores que compram samba? Eu posso afirmar que há. Já vendi muitos sambas. Eu os vendia por uma verdadeira bagatela e eles davam bons lucros. Agora sim é que eu esto u começan-
do a compreender a vida. Não vendo mais sambas. Também não os compro porque, graças a Deus. não preciso disso. Antes, a
não havia aqui embaixo samba. Quando a bossa nasceu, a cidade derrotou o morro. O samba lá de cima perdeu o espírito, o pa~mba1inha llllLÚOico liSIIIJ'olllÔruoinmu;Ot:-'~s5Ee!UlI~s;aalObOlorJnéd ito. Em primeirO-lugar, O-mamulher. Agora já não é assim. Há também o landro sofreu uma tra nsformação espantodinheiro, a crise. A mulher e o dinheiro, afi- sa. Antes era diferente; agora está mais ou nal, são as únicas coisas sérias desse mun- menos banalizado. A civilização começa a do. O samba está na cidade. Já esteve, é subir o morro, levando as suas coisas boas verdade, no morro, isso no tem po em que e suas co isas péssim as."
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Foi um período em que ele ficou em dúvida sobre que caminhos deveria adotar para continuar a vida. Pensava em se dividir, fazer medicina e continuar sambista. Mas, logo percebeu que a mistura era impossível. A Medicina foi abandonada, mas deixou lembranças, como a letra do samba Coração, uma música anatômica, como afirma o próprio Noel.
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corrida pelo garçom que conhecia Noel e lhe emprestou o dinheiro. E ela voltou para casa, dez da noite - o que para os padrões da época era de madrugada - , decidida a nunca mais sair de casa com o marido. Mas havia o outro lado de Noel. Que deixava versos e bilhetes de amor presos às cordas do violão, para que ela os encontrasse pela manhã, quando ele ainda não havia chegado em casa vinA BOEMIA E A do da noite de boemia. A mesVIDA DE CASADO ma noite e a mesma boemia ...... ... ........ . ........ ........... g o que, misturadas ao álcool, foEssa mistura de deboche e in- ~ ram alguns dos responsáveis por conseqüência foi a marca, tam- ~ seus pulmões perfurados pela bém, de seu casamento. Por vol- <~ tuberculose, que acabaria levanta de 1930 , sua mãe, Dona <~ do-o à morte, quando tinha Martha, já havia transformado ~ apenas 26 anos, quatro meses e a casa da família em uma escola ~ vinte e três dias. Essa foi seme uma de suas alunas era uma pre a marca de Noel. Sua criaNoel Rosa e Lindaura, recém-casados, em 1934. Ele garota chamada Lindaura. E tinha 24. ela contava com apenas 13 anos de idade. ção não requeria uma condição tudo começou com Noel espeespecial. À noite, a bebida e a rando por ela no final das aulas, a pretexto de acompanhápoesia iam se misturando e se transformando em canções. la até em casa. Como todo namoro, evoluiu para as mãos Não havia rituais. Sua música não pedia estados de torpor, dadas, os beijinhos e logo, mesmo contra a vontade da adormecimento ou euforia. Seus elementos eram outros. mãe de Lindaura, ela já estava casada aos 13 anos de idade. E, talvez, tivessem como únicos requisitos o lugar: era na Casada com um Noel 11 anos mais velho que ela, já samrua que eles surgiam e era nos botequins que eles cresciam bista, já boêmio. Lindaura conta que o casamento foi um e ganhavam a cidade. misto de alguns momentos hilários e de muitos momentos tristes. Ela se lembra da vez em que os dois combinaram ir HARMONIAS E VERSOS ESPONTÂNEOS ao cinema no centro. Antes, decidiram parar numa leiteria para comer arroz doce. Sentado de frente para a rua, Noel No caso de Noel, a música brotava espontaneamente. Aslogo avistou algum conhecido e saiu para conversar. Não sim, quase a esmo. Era uma atividade tão corriqueira quanvoltou. Lindaura ficou lá, esperando, em vão, sem dinheito conversar com os amigos. Começava cantarolando, as ro nenhum para pagar a conta ou tomar o bonde. Foi sopalavras iam se misturando aos sons e pronto! Mais um samba estava terminado. Para Noel, a música sempre foi uma solução. Era a música que lhe aliviava a carga da deformação na face, lhe garantia acesso fácil às mulheres, que, de outra maneira, poderiam desprezá-lo. Era a música que garantia uma certa complacência da família para com seu comportamento até certo ponto irresponsável e lhe abria espaços no meio da sociedade de então. Era por meio da música que ele dava vazão à sua personalidade irreverente e ambígua. Noel Rosa era aquele tipo especial de pessoa que carrega uma tristeza nos olhos mas consegue melhorar um pouco a vida dos que estão em volta. A trajetória de Noel foi um caminho de duas vias. De um lado, o trágico de sua vida pessoal. De outro, a alegria dos versos e das músicas. Quando ele morreu, já havia virado mito, estava cravado no imaginário popular e suas músicas faziam coro na memória das pessoas. E na memória da MPB. Araken, antigo companheiro de boêmia de Noel Rosa.
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SE ENCARREGARIA DE FORNECER A NOEL A
AMBIGÜiDADE ENTRE DRAMA E ALEGRIA QUE ELE LEVARIA PARA SUAS MÚSICAS E PARA SUA VIDA
anoel de Medeiros Rosa e Marta de Azevedo Rosa moravam g na rua Teodoro da 5il- 1 va, 130, em Vila Isa- ~ bel, no Rio de Janeiro. Ela era pro- .~ fessora. Ele trabalhava numa loja ~ de camisas . Era o responsável pela '~ administração e havia tirado o negócio do buraco. Em troca, o dono ~ havia lhe prometido sociedade. Mas, até aquele momento, nada tinha acontecido. Manoel andava desgostoso e, daí a pouco, abriria sociedade com mais dois amigos e montaria uma loja de roupas finas, para trabalhar com produtos importados. Tudo deu certo. negócio ia bem, mas veio a Primeira Guerra Mundial , que durou de 1914 a 1918, e muitas fábricas nos países de primeiro mundo se viram transformadas em linhas de produção de material bélico. Além disso, o comércio internacional era dificultado pelo patrulhamento costeiro. Assim, o negócio do pai de Noel Rosa acabou. Desiludido, ele partiu para o interior de São Paulo para ganhar a vida como agrimensor. Dona Marta também não ficou parada. Transformou a casa em escola e começou a lecionar. Nesse período, o trabalho prendia o pai em fazendas no interior de São Paulo e ele visitava a família apenas uma vez por ano, na época do Natal . Aliás, essa época do ano, o
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Noel Rosa. em 1916. aos seis anos: um dos melhores períodos da família.
Natal, foi a responsável pelo nome de seu primeiro filho - Noel. Manoel era um homem que gostava das letras e admirava, especialmente, os escritores franceses. Assim, seu primogênito recebeu o nome de Noel, que é como se escreve Natal em francês . Com quatro anos, Noel Rosa ganharia seu irmão , Hélio. Ao contrário de se tornarem companheiros, Hélio e Noel cresceram separados por personalidades absolutamente diversas . Enquanto Noel era um garoto alegre que vivia em travessuras, mas acabava sendo perdoado justamente por seu jeito carinhoso, Hélio era circunspecto, rebelde e áspero. Muito, até, em função do irmão, que acabava angariando a atenção sempre que estava por perto. amor do pai pelas letras e a mãe professora passaram para o garoto Noel uma
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intimidade com as palavras que o acompanharia sempre.Junto com isso, estava a rua. Ela seria, sempre , sua influência maior. Seria , também, a dor de cabeça de Lindaura Rosa, sua jovem esposa , que ficava noites a fio esperando a volta do marido que sumia por três, quatro noites consecutivas. Aconteceu assim mesmo durante a temporada que os dois passaram em Belo Horizonte, logo depois do casamento. Eles foram para lá porque Noel precisava de tratamento contra a tuberculose que já o afligia, e o clima seco e ligeiramente frio da capital mineira era recomendado pelos médicos. Mas, mesmo nessa condição, não foram 'raras as noitadas nos botequins da cidade e, portanto, não foram raras as vezes em que Lindaura ficou sozinha. Em 1935, pouco depois de chegar a Belo Horizonte, Noel recebeu a notícia de que seu pai se suicidara, por enforcamento, debaixo de uma cama numa clínica para doenças dos nervos, assim já fizera sua avó, quando Noel ainda era criança. Era mais um capítulo do enredo trágico em que ele vivia envolvido. Mais uma prova de que a personalidade dele era ambígua, na medida em que seu universo também se dividia entre a alegria dos botequins, as dificu ldades da vida e a instabilidade da família.
Acima, na foto maior, a família Medeiros Rosa reunida no chalé da rua Teodoro da Silva, em Vila Isabel. Nesta casa nasceriam os dois filhos do casal Manoel Medeiros Rosa e de sua esposa, Marta Rosa: Noel, de pé, e Hélio, no colo do pai e acima, à direita, já formado em Veterinária. Logo abaixo, a esposa de Noel, Lindaura, em dois momentos: na década de 30, ainda jovem, e depois já idosa. Ao lado, Noel Rosa aos quinze anos, quando ainda estudava no Externato São Bento e começava a descobrir a vida das ruas do Rio de Janeiro. Nessa época, Noeramâa pensava em seguir o exemplo do avô paterno, Eduardo Corrêa de Azevedo, e se formar em Medicina.
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SAMBA, PRONTIDÃO E OUTRAS BOSSAS. COISAS DE NOEL NOEL ROSA CONSTRUIU UMA OBRA A PARTIR DO QUE PARECIA ABSOLUTAMENTE DESINTERESSANTE NA ÉPOCA: EM SUAS LETRAS, OS DONOS DA CENA ERAM OS TIPOS COMUNS DA RUA, OS ANÔNIMOS DAS ESQUINAS E DOS BOTEQUINS DO RIO DE JANEIRO .
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..... THEATRO CENTRAL lia n:. l~UtUI~S ~( UU ft~IIOIR , ~!''-~!}... Obra de Noel Rosa Mas as cidades comecomeçou a apare çavam a ser descobertas. cer no ano de Na década que se aproxi1929. Ele estava com 19 mava - a de 30 -, a músianos e tudo que desejava ca e a literatura exploraera aproveitar a noite do riam mais fortemente as Rio de Janeiro, que fervipaisagens urbanas. As ci-· lhava com os bares e os dades iniciavam o seu cresprostíbulos. Era um mo- Cartaz de uma das apresentações de Noel Rosa. Ele dividiria cimento e os valores comento em que a vida mar- o palco com Francisco Alves, o Chico Viola. No começo da meçavam a mudar. ginal e boêmia da cidade década de 30, os dois assinariam vários sambas juntos. Os anos 30 seriam um crescia e se fazia acompanhar por uma geração inteira período de grandes transformações. A história oficial de compositores e músicos que se encarregariam de falaria dessas mudanças, décadas depois. Vários eventransformar essas imagens e esses personagens em eletos ficariam para sempre na história do Brasil. Depois mentos da música popular brasileira. É a partir dessa da revolução de 30, houve mais uma, logo em seguiépoca, por exemplo, que a imagem do malandro carida, em 1932, quando São Paulo e Minas Gerais prooca fica imortalizada e se transforma em figura folclótestavam contra o governo militar que regia o país rica nas décadas seguintes. Ao mesmo tempo, o Brasil sem constituição. Foi a revolução constitucionalista, de 1929 é um país tenso, às vésperas da revolução de que levou paulistas e mineiros ao campo de batalha, 30, que levaria Getúlio Vargas ao poder. Era uma nacontra as forças do governo federal. A revolução foi ção que dependia essencialmente de suas fazendas de sufocada e a Constituição acabou saindo apenas cincafé, em São Paulo. Por isso, a vida ainda tinha muico anos depois, em 1937. O Brasil passava por um tas referências do campo. A produção musical ainda momento de completa transformação. Por um lado, a se sustentava em poesias sentimentais e saudosistas, transição econômica de um país que precisava se incomo nos versos de Catulo da Paixão Cearense. dustrializar; por outro, a transição política. O poder
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com a mistura observada na música a partir daquela saía das mãos dos fazendeiros de Minas e de São Paudécada. O samba que surgia trazia influências do morlo, que comandavam o país dentro da chamada polítiro da Mangueira e do bairro do Estácio. Era a época ca do café-com-leite, e se transferia para um governo das marchinhas. Era, também, o início do reinado de controlado por militares, representantes de uma clasLamartine Babo, cujas criações foram as mais tocadas se média que se formava nos centros urbanos. em repetidos carnavais. Noel Rosa é elemento ativo Nesse princípio da década de 30, Noel Rosa havia nessa mudança. Em 1931, sua criação Com que roupa? começado definitivamente sua carreira musical, abandohavia sido a mais tocada e foi um recorde, com quinze nando o curso de medicina, para frustração de sua mãe, mil discos vendidos. A idade foi conseguida graDona Martha, e do pai, Manoel Rosa. É dessa época, ças a um veículo que cometambém, a formação do Bançava a crescer no país: o rádo de Tangarás. O primeiro dio. Ele seria o difusor do grupo de música de que Noel novo samba que brotava, participava. Eles se apresenpoético, do violão de Noel; tavam em festas beneficentes que saía de dentro do barrae em bailes de clubes, mas co de Cartola, no morro da sempre se recusavam a cobrar Mangueira; e que extrapocachês. Não queriam ser vislava os limites do bairro do tos como músicos profissioEstácio, nas composições de nais, já que, na época, as pesIsmael Silva. O Brasil que soas que viviam de música surgia a partir de 1930 era eram mal vistas pela sociedaum país que queria se alede. O preconceito era tão grar, passadas as incertezas grande que os integrantes do da revolução. Era um país grupo decidiram ad otar que pensava em crescer, mas pse udônimos. Mas apenas que, na verdade, ainda não um deles levou a história a havia se livrado totalmente sério: Carlos Braga, o Braguide velhas estruturas e de venha, que passo u a usar o lhos problemas. nome artístico de João de Problemas como, por Barro e, sob este pseudônimo, comporia com Noel exemplo, a corrupção nos Rosa um clássico : Pastoserviços púb licos. Nessa época, o pai de Noel trabarinhas. João de Barro ficaria imortalizado, também, pela Fachada do Hotel Avenida, no centro do Rio de Janeiro, lhava numa repartição púe cartaz de mais um show em que Noel aparece ao lado autoria de Carinhoso, em de Francisco Alves. A década de 30 marcou o começo de blica e acabou demitido do cargo por motivos políticos. parceria com Pixinguina. um processo mais firme de urbanização do país. O pai, Manoel Rosa, foi para NovoS TEMPOS, NOVOS RITMOS 1i~~i~~L~~J:!j~~r- casa e entrou num processo de depressão que, algum tempo depois, acabaO país muda, as cidades crescem ria levando-o para o hospício e para o suicídio. Indignado com a situação, e, no Rio de Janeiro, ganha força uma Noel responde da única - e da mecomemoração popular que acabaria se lhor - maneira que ele conhecia: pela tornando um dos símbolos do Brasil e da brasilidade: o carnaval de rua. No música. Ele compõe Onde está a hocomeço eram os corsos, que cruzavam nestidade?, uma crítica ácida dos costumes das novas elites e do governo. as ruas da Tijuca, de Vila Isabel, da e a Avenida Rio Branco, no cenO teor de Onde está a homstidade? é vátro. Não passavam, na quase uma exceção no trabalho de Noel Rosa. Suas músicas normalmenrios carros enfileirados e enfeitados de confete e serpentina, que levavam fote falavam do dia-a-dia, dos personaliões cantando e brincando no calor do gens de seu bairro, mas era raro apremês de fevereiro. Os corsos evoluíram ~~.2a:=~~.-í~ • sentarem críticas de cunho político.
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\ Ele adotava outra linha. Noel fazia parte de um novo tipo de samba, que era a transição entre o morro e o asfalto. Mais tarde, esse samba que surgia seria chamado de bossa. E um dos pais dessa bossa era Noel.
o MAESTRO E O SAMBISTA DO MORRO A época era ainda complicada no plano da política, mas a sociedade se organizava e havia um certo otimismo no ar. No Rio e em São Paulo surgem os primeiros arranha-céus. As cidades começam a estabelecer limites mais claros entre os pobres e os ricos. No Rio, inicia-se o favelamento dos morros, enquanto a classe média se aloja na zona sul. Mas Noel não se envolve nessa nova divisão. Ele está em Vila Isabel, que é um tradicional bairro de classe média, no meio do caminho entre os novos ricos da zona sul e os pobres do morro. Em vez de seguir um caminho mais fácil rumo ao sucesso, ele escolhe uma viela, que o leva até o alto dos morros do Rio de Janeiro e, de lá, para a posteridade. Ele não faz o mesmo tipo de música de Carmem Miranda ou de Ary Barroso, um produto de consumo mais fácil e instantâneo. Ele opta por subir o morro, para lá descobrir compositores e músicos que seriam decisivos para seu crescimento como artista. No morro da Mangueira, ele compõe com Cartola e se depara com uma enor-
1~...p..p,A • Charge do Bando de Tangarás. primeiro grupo musical de que Noel Rosa participava .
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Foto histórica: um painel da geração que fez o samba na década de 30.
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me criatividade musical, que brotava da pobreza e da miséria, mas que assumia tons de grande arte. Uma arte que não passava despercebida à sensibilidade do compositor. E também não escapava à sensibilidade do maestro. No começo dos anos 30, Heitor Villa-Lobos dirigia um programa governamental que tentava popularizar a música clássica. Ele havia implantado aulas de canto orfeônico nas escolas públicas do Rio de Janeiro e, juntamente com Cartola, preparava um coral com as crianças pobres do morro. Quando ficou sabendo do projeto do coral, Noel Rosa logo se interessou e, nos horários dos ensaios, passava no barraco de Cartola. De lá, eles seguiam para um barracão, onde Villa-Lobos já os esperava com a criançada reunida. Essa troca de experiências foi, aos poucos, enriquecendo o universo musical de Noel. Ele descendia de uma tradição de grandes seresteiros de seu bairro, a Vila Isabel, e já havia aprimorado a poesia daqueles antigos cantores. Nesses primeiros anos da década de 30, ele começaria a ganhar novos elementos, a fazer uma mistura ainda inédita na música popular. Uma mistura que seria consumada com a parceria de Osvaldo Gogliano, o Vadico, pianista que traria novos elementos para o trabalho de Noel.
Baptista, um jovem sambista da época. Tudo co meço u porque Noel não gosto u da imagem de malandro que Wilson havia dado aos sambistas em sua música Lenço no pescoço, gravada por Sílvio 'Caldas. Os versos que irritaram Noel falavam do sambista malandro, de "lenço no pescoço e canivete no bolso". Noel respondeu com outra canção: Rapaz folgado. A polêmica se estenderia por anos, com os dois compositores trocando alfinetadas em forma de samba. No final, Noel e Wilson acabaram se tornando grandes amigos. Apesar dessa postura, era difícil dissociar sua imagem da imagem do malandro . Em casa, sua mãe, dona Martha, se desesperava com as noitadas do filho. A partir de 1934, Lindaura, sua esposa, se juntaria a dona Martha na espera por Noel. Uma espera que duraria até o fim: afinal, lhe era impossível abandonar esse estilo de vida. Mesmo depois de descobrir que estava com tuberculose, nesse mesmo ano de 34, Noel não conseguia fugir ao cotidiano boêmio. Na verdade, sua vida foi encurtada, em muito, pelos excessos do álcool e pelas noites passadas em claro. Houve poucos momentos em q ue ele tentou se cuidar. E nessas horas, a única alternativa foi deixar a cidade do Rio de Janeiro para se afastar da boemia. D a primeira vez, ele foi para Belo Horizonte. Não adiantou. No segundo dia na cidade, ele já passa a noite fora. No final de uma semana, está plenamente incorporado ao grupo de boêmios da capital mineira. As outras vezes são em conseqüência de ataques agudos da doença. Nesses dois momentos, ele procura retiro em Friburgo, na região errana do Rio de Janeiro. A segunda ida a ciCIade é mais melancólica. Seu quadro já não tem volta. E essa constatação passa a influenciar seus sambas derradeiros. É o caso de Último Desejo, que ele cria antes de retornar para a cidade do Rio de Janeiro, onde morreria pouco tempo depois.
DIGNIDADE DE SAMBISTA Mas a importância de Noel não se restringiu à poesia e ao surgimento da bossa. Ele foi importante, também, para a imagem do músico da época. E este é um dado inusitado na biografia de Noel Rosa. A história tratou d associar sua imagem aos cabarés, à boemia e à malandragem de então. P=~41~,cf a o, e e percorna esses ugares,oe la nesses ares e era freguês dos prostíbulos do Mangue e da Lapa. Mas Noel tentou desvincular essas atividades da profissão de sambista e compositor popular. Um exemplo disso é a famosa polêmica entre ele e Wilson 11
INSTANTANEAMENTE, ETERNAMENTE
canções. A letra de Disse me disse é outro exemplo. Noel a compôs a partir da conversa com uma amiga de sua mãe que chamava a vizinha de faladeira. Era assim que surgia a música de Noel.
Quando se olha a vida de Noel Rosa, vem logo a associação com os poetas românticos que, no final do século 18 e começo do 19, morrem aos montes, vítimas SAMBA FREOÜENTA O TEATRO, de tuberculose. Somando a isso a força das paixões VAI AO CINEMA, ESTÁ NA RUA que o levam a compor músicas como Três Apitos e Dama do Cabaré, ambas dedicadas a mulheres, está fechado o quadro: Noel é um romântico. Mas não. Em 1934, a música de Noel Rosa atinge outras mídias. Suas canções não se restringiriam apenas ao mundo Suas letras mostram que ele encara as relações sob um outro ponto de vista. Ele não diz "adeus, meu do rádio. A música feita para a dançarina Ceci, Dama amo r"; prefere sussurar do Cabaré, seria usada um simples "até ama- · !P..- ..- -...----~-----------..- no cinema, parte da trinhã". São raras as múlha sonora do filme Musicas mais melosas. 't I' lheres da Cidade. Nos Quando Noel Rosa Mas, MA T HI AS, eu pergunto: anos seguintes, Noel reamorreu, ele era consideCOM QUE ROUPA EU VOU AO SAMBA QUE VCE ME COtMDOU? lizaria outras incursões rado um dos maiores nas grandes telas. Faria, sambistas em atividade. também, musicais para Mas, o passar dos anos o teatro. O que ficou e das décadas se encarmais famoso é o Barbeiregou de mostrar o que ro de Niterói, uma paróNoel realmente foi: um dia da obra clássica o Barbeiro de Sevilha. gênio. Ele começou a compor quando tinha Nessa aventuras pelos 19 anos. Sete anos depalcos, o que mais marpois, aos 26, quando cava era o humor de morreu, ele já possuia Noel, que acabava sus230 músicas registradas tentando as tramas ao em seu nome, sem concusto de muito humor tar as inúmeras vendidas e sátira. Um humor que ou simplesmente perdifoi esquecido por suas das no turbilhão de biografias e que acabou que, vezes, o levava a criar cinse associa a ele. Normalco canções no mesmo mente, Noel é lembradia. Mas, se as músicas do por seus silêncios saíam aos borbotões, inexplicáveis, em monão significava que fosmen tos que ele parecia Propaganda da época. feita a partir do primeiro grande sucesso sem criações apressadas, sair do ambiente em que de Noel Rosa. no carnaval de 1931. A música Com que roupa? ligeiras. Ao contrário, estava e deixava os amihavia se tornado mania no Rio de Janeiro. uma grande parte delas gos falando sozinhos. é feita de obras-primas que mudaram a música da Ou, então, pelo queixo defeituoso, que lhe valera, desépoca e as cabeças dos jovens que produziriam as mede os tempos de colégio, o apelido de "queixinho". lodias e os versos em gerações seguintes. Seu repertóPorém, como os gênios, Noel era 111.uito diferente das rio será quase todo um tipo de crônica da vida e dos impressões iniciais que despertava. Ele não se perdia nos labirintos da autopiedade. Apesar de evitar cocostumes do Rio de Janeiro da época. Por exemplo, quando o cinema ganhou força no Brasil, ele trouxe mer em público, para que as pessoas não notassem a junto uma mania: as expressões em inglês. Noel logo movimentação estranha de seus maxilares durante a registra e ridiculariza a nova onda, escrevendo o sammastigação, Noel preenchia seu dia e sua criação com um humor que desconcertava até os amigos mais próba Não tem tradução. Assim aconteceria com outros fatos corriqueiros que ficariam registrados em suas ximos. Almirante, um dos integrantes do Bando de
o
um "ue rouna, Sim, com que roupa
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Tangarás, nunca se esqueceria de um episódio no qual vida das pessoas e que revelam o ridículo escondido Noel mostrava todo o seu humor e sua irreverência. por trás de cada situação. Seja qual for a origem de Era um show do grupo em Taubaté, interior do estasua inspiração, o fato é que as melodias iam lhe surdo de São Paulo. Noel engano u a platéia, colocando gindo assim: naturalmente. um aparelho no meio do palco, antes da apresentaNão adianta tentar perceber os acontecimentos ção. Muitos dos que assistiam imaginaram que se trahistóricos, que ficaram registrados nos livros, na obra tasse de um gramofone e que o pretenso disco era a de Noel. Eles dificilmente poderão ser encontrados primeira gravação em disco realizada no país. De uma lá. O que se achará será um retrato fiel e agudo de outra vez, num show no Rio de Janeiro, Noel estava como o povo vive, de como o povo ama, de como o atrasado e Almirante olhava para todos os lados, propovo lida com a falta de dinheiro, com o ladrão, com curando o colega. De repente, Almirante reconhece o o aumento dos impostos, com a alegria e com as tristerno de Noel no meio tezas . E, talvez, j ustada pl atéia e passa a mente por isso aquelas cham á-lo. Só que não criações quase instantâera Noel. Ele havia troneas tenham se tornado cado de roupa com um eternas. E tenham ido fã que queria entrar para muito além dos limites o show mas não tinha o de Vila Isabel e do Rio dinheiro para o ingresde Janeiro, tornando-se so. Minutos depois, ele UlllversalS. apareceu com um terno A conjuntura mucompletamente diferenda, os fatos da política te. Depois dessa noite, mudam, os lugares poa prática de trocar de dem ser diferentes, mas ro up a com os fãs sem os sentimentos não vaingresso viraria rotina. riam . E quando Noel Fico u famosa, também, enxergava as morenas a história do sapato de que desciam dos morNoel Rosa. Novamente ros para trabalhar nas colocando Almirante em casas das famílias de situação delicada, ele suclasse média; quando bia ao palco e se sentava ele cruzava com os bêno banquinho para tocar bados que voltavam, já violão . Mas o público d e manhã, do cabaré; das primeiras cadeiras quando observava o apenas conseguia prestar corso que passava na atenção no sapato imunrua, na verdade, ele do que ele usava. No fipercebia como cada um nal do espetáculo, Almid aq ueles personagens rante o alertou. No dia se colocava diante da seguinte, Noel apareceu vida e lidava com suas com apenas um sapato misérias e delícias, com engraxado e explicou: ll@ljillíiiiilll_ __ seus dramas e contra"esse é o pé em que bate Na imagem de Noel, uma dedicatória à amiga Araci de Almeida, tempos, com suas tristeque o amou por toda a vida e que foi uma de suas principais
zas e felicidades de todos a luz do refletor, o outro intérpretes, acompanhando-o pelos bares e pelas rádios. não precisa". os dias. No momento Não tivesse Noel sido um boêmio, sua obra proseguinte, essa percepção já ganhava nova forma, forI -===~v:;;:av ;:;:e;;] mente urgma no.funâo de ã1gum qUIntal, del- -made samba, quase semp re cheio de humor e de ira=- - - tado na rede, ou trancado num escritório depois do nia. N ão a ironia de quem olha a vida de cima, mas a expediente. Talvez o detalhe do queixo deformado teque faz parte da própria condição humana, que oscila nha avivado seu olhar agudo para outros detalhes, que entre a beleza e o horror, entre a mediocridade e a acabam se juntando e formando o quadro maior da grandeza de espírito. 13
PARCEIR IC c;J JTénftl ETES
CONVERSA DE BOTEQUIM NOEL SEMPRE COMPÔS NATURALMENTE, O VERSO SURGINDO DE FORMA ESPONTÂNEA, COMO NUM BATE-PAPO ENTRE AMIGOS.
oel Rosa teve vários parceiros. Tantos, que é quase impossível numerá-los. Isso porque os parceiros de Noel fo ram, desde sempre, todos que passavam por seu caminho. Seja nos bondes, seja nas esquinas, seja nos zes, um assobio, às vezes uma frase, às vezes uma palavra. Noel recolhia esses fragmentos e, ato contÍnuo, os transformava em verso e em música. Assim, Noel compunha ao vento , compunha com o desconhecido que lhe cumprimentava, compunha com o atendente do boteco, com o motorneiro do bonde. Os personagens que fazem parte de suas músi cas não chegaram ali à toa, estiveram sempre participando da criação. Não como meros objetos que servem de inspiração, mas como parceiros, de fato. Só assim ele conseguiu reconstruir o cotidiano tão diverso e tão movimentado do Rio de Janeiro da época: recolhendo palavras, frases, expressões e sentimen-
plesmente Nássara, como era chamado pe los am igos de Vi la Isabe l. Nássara foi um dos melhores amigos e um dos mais freqüentes companheiros de Noel Rosa em suas noitadas nos cabarés do Rio de Jane iro , da década de 30. Os dois batiam cartão nos bares do Ponto dos Cem Réis, especialmente no bar do Carvalho, um dos preferidos de Noel. De lá, às vezes saí am em bando par a f aze r serestas sob as j ane las da Vil a ou da Tiju ca . Nássara era cartunista . Entre seus trabalhos figuram várias charges do amigo Noel Rosa, quando ele estava no auge, compondo sucessos de carnava l e mantendo suas músicas entre as preferidas dos ouvintes . Nássara sobreviveu ao amigo. Coincidéncia do destino, o cartunista faleceu no dia 11 de dezembro de 1996, exata mente no mesmo dia em que Noel Ro sa comp letaria 76 anos .
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tos das pessoas que dividiam com ele as ruas e as praças. Mas havia também os parceiros formais. Aqueles que, oficialmente, dividiam a autoria com Noel. Havia, também , os que assinavam a música mas, na verdade, não tinham nenhuma participação na criação. Era o caso de Francisco Alves, o Chico Viola, o cantor mais popular do país no começo da década de 30. Ele se notabilizou por sua voz, mas também ficou conhecido por comprar alguns sambas de compositores desconheidos. Uma atividade a princípio reprovável, mas que acabou revelando novos talentos. No caso de Noel, o acordo ~e deu em torno de um carro. Francisco Alves tinha um negócio de carros usados. Ele comprava os automóveis em São Paulo e os revendia no Rio de Janeiro. O carro que Noel dirigia, um Chandler, andava ruim e ele aceitou o acordo proposto por Francisco Alves: tro-
ca)"ia a parceria e os direitos autorais em sambas por um Chevrolet. Esquemas parecidos, o cantor faria com outros grandes sambistas, que tentavam começar carreua, como Cartola e Ismael Silva. Se a compra de sambas tinha um caráter duvidoso, pelo menos, teve como mérito a aproximação ainda maior entre Noel Rosa e Ismael Silva, numa das parcerias mais criativas da história do samba, que seria responsável por clássicos como Ando Cismado e Isso não se faz. A parceria com Ismael era mais um exemplo do modo de trabalho de Noel Rosa. Ele foi o primeiro branco a compor samba, justamente porque foi um dos únicos a subir os morros e travar conhecimento com as comunidades negras que faziam, nas palavras do próprio Noel, "um samba criativo, com harmonias inéditas. Essa gente daqui transforma tudo em canção, desde as tristezas, até as misérias e as alegrias". O Rio de Janeiro de então tinha uma divisão até certo ponto rígida entre os diferentes tipos de música que seus bairros produziam. O samba do Estácio era diferente do samba do morro da Mangueira, que era diferente do praticado em Vila Isabel. Mas esse panorama começaria a mudar naquela década de 30, especialmente a partir do trabalho de Noel Rosa. Com Ismael Silva, por exemplo, ele promovia uma integração. Era o samba de Vila Isabel que se misturava ao do Estácio. A mesma coisa acontecia com Cartola. Os moradores da Mangueira se acostumaram a ver Noel Rosa subir o morro e se sentar na porta do barraco de Cartola. Ali, os dois trocavam idéias e versos, e acabavam, invariavelmente, criando novas canções. slIILsur iu.. -.exe > JY.ão faz, amor. E surgiu, principalmente, um novo tipo de samba, que mesclava elementos da classe média e dos morros. Outros parceiros importantes
Acima. Lamartine Babo. companheiro de farras e de marchinhas de carnaval. Abaixo. Braguinha. um dos integrantes do quinteto Bando de Tangarás e que compôs com Noel Rosa um clássico: As Pastorinhas.
se reunir no Ponto de Cem Réis, uma das esquinas de Vila Isabel, onde se concentravam vários bares e botecos e que servia de ponto de encontro para os boêmios. Por essa época, Noel se aventurou, também, pelas marchinhas de carnaval. Dividiu com Lamartine Babo as autorias de AB Surdo, para o carnaval de 1930. No carnaval do ano seguinte, a dupla repetiria a dose e lançaria, outra marcha: A.E.I.O.U . . Mas, Lamartine e Noel formaram, naquele começo dos anos 30, mais que uma dupla de co mpo sitores com elementos em comum . Eles foram amigos mesmo. Dividiram arruaças pelas ruas de Vila Isabel, roubaram vidros de leite postos nas soleiras das casas do bairro da Tijuca, onde Lamartine morava. Enfim, tinham personalidades parecidas. Eram dois jovens cariocas, feios e desengonçados, mas donos do bom humor típico do Rio de
de Noel foram João de Barro, também conhecido como Braguinha, e Almirante. No início de carreira, ~ em 1929.. Noel era UIa clos integrantes do Bando de Tangarás, que reunia os três, mais Hentique Brito e Álvaro de Miranda Brito, o Alvinho. O Bando de Tangarás foi um grupo de amigos, que costuma
Janeiro, uma mistura de sarcasmo e de malícia. Seus nomes ficariam registrados na história musical do Brasil entr-e os ma im::cs-sambistas de todos os tempos. Lamartine, como criador de marchas de carnaval invencíveis por anos a fio. E Noel Rosa, como o primeiro poeta do samba.
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INTÉRPRETES
quando Araci passou a freqüentar os bares de Vila Isabel, estava enfrentando dois obstáculos. Mas ela não esmoreceu. Em primeiro lugar, por conta de sua personalidade firme e decidida. D epois, porque nessas alturas, sua admiração por Noel Rosa já era enorme. E ela insistia em tentar estar por perto dele constantemente. Com o tempo, a admiração cresceu e virou paixão e dominou os sentimento de Araci até sua morte, já nos anos 90, sem que Noel Rosa lhe correspondesse. Ele sempre a tratou como uma colega, como uma igual, nunca pensou nela como uma possível amante. Noel Rosa foi um dos artistas mais conhecidos do Brasil na década de 30. Ao seu lado, aparecia Francisco Alves, que dividia com ele as composições, mas era mais conhecido pelo trabalho como intérprete. Intérprete das próprias criações de Noel Rosa. Suas gravações alcançaram recantos do país como nunca havia sido feito,
Se os parceiros foram muitos, em maior número ainda foram os intérpretes de Noel Rosa. Mas, até hoje, sua principal intérprete é mesmo Araci de Almeida. Naqueles idos de 30, Araci saiu de seu bairro, o Encantado, também na zona norte do Rio de Janeito, e começou a freqüentar os bares e a vida noturna de Vila Isabel. Dois fatos raros: uma mulher andar na boemia, misturada a um bando de homens meio bêbados, meio artistas, o próprio fato de vir de um bairro como o Encantado. Se Vila Isabel era um bairro de classe média baixa, o Encantado era uma comunidade muito mais pobre, comumente colocada no mesmo nível das favelas que já começavam a se espalhar pelos morros do Rio de Janeiro. O estigma acompanhava os moradores, que não eram bem vistos pelos moradores de outros bairros. Assim,
MARIA BETHÃN IA
JOÃO BOSCO
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Francisco Alves, o rei da voz e o artista mais popular do Brasil na década de 30. Foi o primeiro fenômeno de massa da história da música brasileira. Abaixo, Marília Baptista na rádio Mayrink Veiga. O olhar orgulhoso de Noel Rosa (à esquerda na foto) denuncia: Marília era mesmo sua intérprete favorita. Depois, alguns dos intérpretes de Noel em anos recentes. Paulinho da Viola fez o caminho contrário de Noel: desceu do morro para o asfalto e resgatou Pra que mentir?, em seu álbum de 1976, Cantando. Beth Carvalho que fez sucesso com Onde está a honestidade? João Nogueira, que gravou várias músicas de Noel no álbum Wilson, Geralddo e Noel. Maria Bethânia, que, além de ter gravado Pela décima vez, sempre inclui músicas de Noel em seus shows. E Chico Buarque, que foi fortemente influenciado pelo poeta de Vila Isabel, e gravou Filosofia, um dos clássicos da música popular brasileira.
graças às ondas do rádio. E ficaram registradas para as futuras gerações de músicos e compositores da MPB. Era a época de ouro do rádio no país. E uma das estrelas era Marília Baptista. Ela era uma das cantoras mais populares da década de 30 e a intéprete favorita de Noel. Mas Noel era um grande sucesso naquela época e vários outros cantores se interessaram em gravar suas composições. Orlando Silva foi um deles. Sílvio Caldas já seguira o mesmo caminho. Passaram-se as décadas e Noel Rosa continuou recebendo novas interpretações. Elizeth Cardoso daria nova cara ao sucesso de Três Apitos. E, logo em seguida, os rapazes que criaram a bossa nova redescobririam o trabalho de Noel. Anos mais tarde, Tom Jobim admitiria que as músicas de Noel Rosa tinham sido decisivas na sua formação. O mesmo acontece com Chico Buarque, que cresceu misturando os sons da bossa nova e antigas gravações de Ismael Silva e Noel Rosa. Nos anos 70, várias gravações foram feitas com músicas de Noel. Entre elas aparecem, em 1976, Chico e sua versão de Filosofia, gravada no álbum Sinal Fechado. Paulinho da Viola, também em 76, grava Pra que mentir? No final do século, já nos anos 90, Noel continua atual e suas releituras são sucessos. É o caso da gravação de Gago Apaixonado, que João Bosco inclui em seu álbum acústico de 1995.
PAULlNHO DA VIOLA
BETH CARVALHO
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CHICO BUARQUE
NOEL ROSA E VADICO CRIARAM VÁRIOS SUCESSOS JUNTOS. PORÉM, MAIS QUE ISSO, ELES AJUDARAM A MUDAR A CARA DO SAMBA E DA MÚSICA POPULAR DA ÉPOCA.
COIVERS DE IlTEQUlM
svaldo Gogliano, o Vadico, havia chegado ao Rio de Janeiro há pouco tempo e acabou sendo apresentado a Noel nos estúdios da gravadora Odeon, em 1932. Juntos, seriam responsáveis por verdadeiras obras-primas da música brasileira, como Feitiço da
O
Vila e Conversa de Botequim. Noel Rosa teve vários parceiros, sua obra se espalha, dividindo as assinaturas das músicas com inúmeros 'sica de Noel, a letra era quem dava o tom. Quase sempre, a música se submetia aos versos dele. No meio da efervescência musical daquela década de 30, Noel Rosa já havia transformado a feição do samba. Os temas eram novos, diferentes dos tradicionalmente cantados nos morros, em especial no da Mangueira. Quando Noel se uniu a Vadico, a combinação se fechou. A música de Vadico se encaixou perfeitamente na cadência determinada pelas letras de Noel Rosa. Vadico foi o parceiro mais constante que ele teve. E foi essa parceria que garantiu um refinamento nos arranjos e nas harmonias das criações de Noel Rosa. Aparentemente, Vadico tinha
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-~ ).
•Acima, reproduções de dois momentos do relacionamento de Noel Rosa e Vadico. No alto, um artigo de jornal que critica Noel pelo rompimento temporário com o parceiro. logo abaixo, a letra de uma das obras-primas da dupla, Feitio de Oração, escrita em abril de 1935.
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todos os elementos para não virar sambista. Ele vinha de São Paulo e era pianista, com alguma formação clássica. Mas era justamente essa mistura de elementos tão diferentes, de formações tão díspares, que ainda faltava à carreira de Noel Rosa. Vadico trouxe para as músicas de Noel novos elementos que foram sendo incorporados aos poucos e dando um novo tom ao samba. Mais tarde, essa mistura seria batizada de bossa. Essa foi a rimeira ru tura na história da MPB. A aproximação entre os ritmos populares do samba e os arranjos até certo ponto sofisticados - de Vadico se misturavam às letras de Noel Rosa e começavam a dar as bases para uma nova música popular. Que invadiria as casas a partir das ondas do rádio. A segunda ruptura aconteceria mais tarde, em 1959, quando o morro conversaria com o asfalto novamente e, dos versos de Vinicius de Morais, da música de Tom Jobim e da voz e do violão de João Gilberto, brotaria a nova bossa, a
bossa nova.
Depois da morte de Noel Rosa, Vadico diminuiu sua produção. Também morreu jovem, em 1962, aos 55 anos de idade.
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PRA QUE MENTIR? Pra que mentir Se tu ainda não tens Esse dom de saber iludir? Pra que, pra que mentir Se não há necessidade de me trair? Pra que mentir Se tu ainda não tens A malícia de toda mulher? Pra que mentir Se eu sei que gostas de outro Q ue te diz que não te quer? Pra que mentir tanto assim Se tu sabes que eu já sei Q ue tu não gostas de mim?! Se tu sabes que eu te quero Apesar de ser traído Pelo teu ódio sincero Ou por teu amor fingido?! Pra que mentir Se tu ainda não tens Esse dom de saber iludir? Pra que, pra que mentir Se não há necessidade de me trair? Pra que mentir Se tu ainda não tens A malícia de toda mulher? Pra que mentir Se eu sei que gostas de outro Que te diz que não te quer?
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e compositor e cantor. Pau linho surgiu no cenário do samba no final da década de 60 com um grande sucesso: Foi um rio que passou em minha vida. No mesmo ano, em 1969, um novo sucesso, Sinal Fechado, abriria as portas da MPB para o sambista que saía das fileiras da escola de samba da Portela. Pau linho foi o primeiro a fazer a aproximação entre o samba das escolas e a nova MPB que surgia no período pós-bossa nova. Sambista consagrado, Paulinho gravou Pra que mentir?, de Noel Rosa, em seu álbum Cantando, de 1976.
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VOCÊ Ary Barroso - É o autor de Aquarela do Brasil, música que se transformou em símbolo de Bra si l e que, até hoje, é lembrada quando se quer fa lar das coisas da terra . Mas Ary Barroso tem uma produção extensa, que vai muito além de Aquarela. Entre outros sucessos, ele compõe, por exemplo, Tabuleiro da Baiana. Bossa - Foi o nome dado ao samba que surgiu na décad a de 30 misturando ritmos do morro e elementos melódicos dos bairros de classe média do Rio de Janeiro. Café Nice - Um dos pontos de encontro da boemia na déc ada de 30 no Rio de Janeiro. Era comum encontrar por lá, por exemplo, Almi rante, parceiro de Noel Rosa, Francisco Alves e, eventualmente, Ismae l Silva . Catulo da Paixão Cearense Compositor que ficou famoso na década de 20. Seus versos ro mânticos e saudosistas caíram no gosto popular e, durante algum tempo, ele foi considerado o maior letrista do país. Catulo goza va de muito prestígio junto à im prensa de então, muito em função de sua am izade com Ass is Chateaubriand , que, na época, começava a ensa iar os primeiros pa ssos do que viria a ser o maior imp ério do seto r de comunicações deste séc ulo no Brasil: Os Diários Associados. Carmem Miranda - Carmem nasceu em Portugal e chegou ao Brasil quando tinha três anos de ida de. Aqui, ela se transformou numa artista popular, mistu ra de cantora e vedete. Carmem Mirand a foi uma das primeiras artistas nacionais a ter repercussão no exterior. No final da década de 30 e na década de 40, ela participaria de vários filmes em Hollyvvood.
PRECISA
Cartola - Poeta do morro da Mangueira, Cartola foi um dos mais criativos compositores de toda a história da MPB . Com sua arte instintiva, Carto la é responsável por vários clássicos de nossa música, como As rosas não fa lam e O mundo é um moinho.
SABER
tante do sam ba do ba irro do Estácio, o mais tradicional do Rio de Janeiro.
20 e 30. Significa estar sem dinheiro.
Revolução de 30 - A revolução lamartine Babo - O rei das foi uma conseqüência indireta marchinhas de carnaval. La- do movimento tenentista que martine entrou para a história havia agitado o país a partir de com as músicas simples que ani - 1924. A classe média que surgia maram os carnavais por vários nas cidades começava a não Constituição de 1937 - Ela entrou anos a partir da década de 30 mais aceita r a política do cafépara a históri a como a "Constitui - como, por exemp lo, Teu cabelo com -leite imposta pelos fazen ção Polaca ", uma alusão à cons- não nega. Com No el Ro sa , ele deiros de Minas e de São Paulo tituição polonesa da época, que compôs as marchas AB Surdo e e começava a se articular. Nesse contexto, o exército, que era extremamente autoritária. Na A. E.I. O. U. sempre teve suas fileiras formaverdade, a Constituição de 37 Orlando Silva - Um dos principais das pela classe média, é um dos ab riu caminho para a implantaintérpretes das déc adas de 30 e focos de ativismo político por ção do Estado Novo de Getú lio, 40. De origem bastante humilde mudanças. O movimento tenen período que va i até 1946 e duran (ele era trocador de ônibus), tista foi uma expressão da insate o qual Vargas imprime sua marOrlando Silva estréia com a gra- tisfação dessa classe média que ca de ditador, centra lizando todas vação de Última estrofe. Para compunha o exército e teve pelo as decisões. muitos ele se tornaria o maior in - menos duas conseqüências Elizeth Cardoso - Durante várias térprete do Brasil. para a política da época : de um décadas, Elizeth Cardoso é con Pixinguinha - Um dos maiores lado, a Coluna Prestes, um gru side rada a dama da mú sica pomúsicos brasileiros de todos os po de mil e seiscentos ex-inte pular bra sileira, é sua mais com tempos. Pixinguinha marcou épo- grantes do exército, rebelados, pleta intérprete. A consagração ca com seus arra njo s sofistica- que perco rre ria dezenas de michega em 1951, quando ela gra dos e singelo s e também com lhares de quilômetros do Brasil, va Barracão. suas composições românticas. enfrentando for ças federais, esHeitor Villa-lobos - Villa -Lobos é Entre inúmeros outros sucessos, taduais e até bandos de cangaconsiderado o maior compositor vale a pena lembrar dois clássi- ceiros. A Coluna leva em frente sua marcha por mais de três de música cláss ica do Brasil. Sua cos: Borboleta e Carinhoso. anos. Por outro lado, mais tarde , carrei ra começa quando ele de Política do café-com-Ieite - Foi o espírito do movimento se une cide cruzar o país tocando em ca o nome dado à política que domi- à decadência das lavouras de barés e em cinemas. Nessas via nou o Brasil nas primeiras déca- café e conseaue fazer a revoluge I :>, Ud ill l Liu d Ullli:l IU ;)~U " " " " das da República. Trata-se de ção, levando Getúlio Vargas ao a música clássica e ritmos popuuma alu são à alternância entre poder. lares, sons da natureza e cantiPresidentes da República pau gas folclórica s brasileiras . Na Seresteiros - Nome dado aos listas (que representavam os do época, ele era apenas um músinos de faze ndas de café), e mi- grupos que cantavam sob as jaco autodidata que ganhava a vida nelas de moças e mulheres, já na neiros (que representavam a pecom seu ofício. Ma s, alguns anos década de vinte. Muito da histócuária leite ira) . depois, ele ga nh a uma bolsa e vai ria dos primórdios da MPB se liga finalmente estudar música num Primeira Guerra Mundial - Con - a esses músicos. conservatório em Pari s. Entre flito que durou de 1914 a 1918. A Sílvio Caldas - Um dos maiores suas obras mai s conhecidas es- Primeira Guerra teve um de seus intérpretes da história da MPB. tão o Tren zin ho Caipira e As estopins detonados pelas bata Na década de 30, Sílvio Caldas já lhas entre França e Alemanha Bachianas. era sucesso. Chão de Estrelas é pelos territórios da Alsácia e da uma de suas interpretações que Ismael Silva - Um dos maiore s Lorena . sambistas de todos os tempos. ficou famosa e que acabou se Ismael era um típico represen- Prontidão - Gíria das décadas de transformando em clássico.
SAIBA MAIS sobre Noel Rosa lendo: Noel Rosa, uma biografia de João Máximo e Carlos Didier. Esta é a obra definitiva sobre a vida de Noel. Estão presentes aí todos os deta lh es pessoais e da época, que acabaram construindo o mito Noel Rosa.
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Episódios do folclore musical brasileiro: a polêmica entre Noel Rosa e Wilson Baptista. Na época, Wilson Baptista era um jovem e talentoso sambista, porém, um sambista desconhecido, que sonhava com a fama e apostava que a conseguiria. Ele acabou entrando para a história como um dos grandes sambistas da década de 40. Mas, naquele ano de 1934, ele ainda se apresentava em lugares obscuros do interior do Rio de Janeiro. A polêmica com Noel Rosa foi, portanto, um jeito de aparecer para o grande público. Noel já era sambista conhecido e, na medida que respondia aos ataques de Wilson, mais este último ficava na boca do povo. Mas, ataque de sambista é feito em verso e batuque. A polêmica entre os dois foi mais um desafio. Noel havia composto Rapaz Folgado, uma crítica velada à música Lenço no Pescoço, de Wilson. Ele deu o troco efez o sambaMocinho k===~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~m~a ·
ignorou. A segunda provocação veio melhor. Um bom samba, Conversa Fiada, que satiriza Feitiço
da Vila, grande sucesso de Noel. Já não dava para ignorar. Noel respondeu. E a resposta foi definitiva. Ele compôs Palpite Infeliz, que já nasceu obra-prima e encerrou a disputa.
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REPENTE, A CLASSE Mt,DIA CARIOCA SUBIA O MORRO E BAIRROS COMO
VILA I SABEL E A LAPA FERVILHAVAM COM SEUS BOTEQUINS CHEIOS DE HOMENS E MULHERES QUE ACABARAM VIRANDO SÍMBOLOS: ERA A t,POCA DOS MALANDROS E DOS BO~MIOS, QUE NOEL ROSA AJUDOU A TRANSFORMAR EM íCONES, REPRESENTANTES DE UM TEMPO E DE. UM MODO DE VIDA. NOEL ROSA MUDOU OS RUMOS DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. COLOCOU,
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NA MEDIDA EXATA, O PESO DA POESIA NAS COMPOS IÇÕ ES . TUDO QUE ACONTE-
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