A BRASILIDADE DO AMANHÃ. LUCIO, OSCAR, NY, 1939 COMAS, Carlos Eduardo Dias Doutor; Université de Paris ccomas@uol.com.br ALMEIDA, Marcos Leite Mestre; UFRGS almeida.marcos.arq@gmail.com O Mundo de Amanhã foi o tema escolhido em 1935- em plena depressão- para a Feira Mundial de Nova York de 1939-40. O concurso de anteprojetos para o Pavilhão do Brasil se realizou em 1938. O terreno era lote com duas testadas e divisa lateral retas e o lado maior sinuoso. cabeça e terço de quarteirão compartido com o Pavilhão da França. A taxa de ocupação era de 50%. A fachada principal na testada menor deveria ter dois andares. O Pavilhão e seus jardins deveriam destacar as riquezas agrícolas e minerais nas quais se baseava a qualificação exportadora do país. A afirmação idiossincrática de cultura e paisagem devia evidenciar oportunidades de turismo. A afirmação de modernização em curso devia evidenciar oportunidades de negócio. O tema da feira era incompatível com propostas historicistas, mas o edital assinado pelo Departamento Nacional de Indústria e Comércio do Ministério do Trabalho recomendava que o pavilhão fosse construído e decorado em estilo tipicamente brasileiro. A cerimônia de premiação foi prestigiada pelo presidente Getúlio Vargas. O júri considerou que o anteprojeto de Lucio Costa se destacava pela brasilidade. Elogiou o uso adequado e discreto dos elementos da técnica moderna de construir e a fácil comunicação da rua com o pátio, elemento que propicia distração do percurso longo e constitui espaço de socialização simpático. O anteprojeto de Oscar Niemeyer se recomendava pela entrada franca e menor percurso, funcionalidade e economia. Apesar de lhe faltar brasilidade, evitava lugares-comuns da arquitetura moderna. Bilateralmente simétrico, o anteprojeto de Lucio articula três elementos axialmente alinhados. O pórtico triangular avança em largo junto à avenida. Paralelo à única divisa, o bloco retangular apresenta pátio central, vestíbulo de pé-direito duplo, e galeria em U sobre pilotis com balanços nas alas maiores para a rua curva e o vizinho. O auditório trapezoidal é flanqueado por corredores e rampas assimétricas; o restaurante fica abaixo do vão central da travessa do U e do auditório, em contato com o pátio e o pilotis da galeria. O anteprojeto de Oscar tem vestíbulo de pé-direito duplo frente a largo junto à avenida. A galeria se desenvolve em barra curva de dois andares acompanhando a rua sinuosa. Ala com restaurante e o auditório ocupa barra de projeção retangular paralela à divisa e perpendicular ao vestíbulo. Galeria e vestíbulo formam um L de perna curvilínea; mais o restaurante conformam figura em U, com a perna menor ampliada pelo auditório avançando sobre o largo. Os dois anteprojetos compartem a idéia de largo parcialmente ocupado e pátio posterior entrevisto do vestíbulo, a composição ternária que mostra vazio entre dois sólidos para a avenida, o fechamento lateral mais ou menos acentuado, uma colunata limitando o pátio, maior permeabilidade ao fundo. A oposição entre ambos não é visceral, como mostra a análise topológica. O edital falava na possibilidade de aproveitamento de idéias de todos os projetos premiados. Com o beneplácito implícito do Ministério do Trabalho, Lucio e Oscar farão projeto
novo em Nova York, informado desta vez pelo conhecimento do Pavilhão Francês em construção. A parceria confirma a admiração de Lucio pelo anteprojeto de Oscar. Contudo, Lucio nunca afirmou tê-lo julgado superior. Pensava que "o mero fato de o ter convidado para trabalhar comigo em um novo projeto já ser suficiente prova de distinção," mencionando sem maior esclarecimento as "suscetibilidades" de Oscar. Seja como for, o trabalho em equipe entre arquitetos não é incomum e a companhia de compatriota pode ser respaldo em terra estranha. Oscar trabalhava com Lucio há alguns anos. Seus talentos podiam ver-se como complementares. A combinação da segurança de seleção formal de um com a capacidade de geração de hipóteses de outro era vantagem se "o que estava em jogo era a causa da boa arquitetura". A visão dos dois anteprojetos de concurso mostra que são infundados os rumores de subordinação de Lucio a Oscar. Lucio não abdicou da co-autoria. Embora tenha observado que "a orientação de Oscar viria a se tornar predominante," isto é só parcialmente verdadeiro. O projeto conjunto é uma síntese aperfeiçoada dos esforços dos dois e algumas de suas características mais ousadas vem de Lucio. A presente comunicação amplia estudos anteriores do Pavilhão pelos autores ao salientar a importância do uso de obras de arte como marca de brasilidade no anteprojeto de Lucio, e da explicitação da transformação topológica no anteprojeto de Oscar.
REFERÊNCIAS CANEZ, Anna Paula; ALMEIDA, Marcos; BRINO, Alex. Originais e redesenhos em análise: as versões não construídas de Lucio Costa e Oscar Niemeyer do Pavilhão de Nova Iorque. In: TRIGUEIROS, Conceição. (Org.); Palcos da arquitetura. Lisboa: Academia de Escolas de Arquitetura e Urbanismo de Língua Portuguesa, 2012. COMAS, Carlos Eduardo Dias. A Feira Mundial de Nova York de 1939. O Pavilhão Brasileiro / New York world’s fair of 1939 and the brazilian pavilion. Arqtexto. Porto Alegre, RS n.16 (2010), p. 56-97. COMAS, Carlos Eduardo Dias. Arquitetura Moderna, Estilo Corbu, Pavilhão Brasileiro. In: AU - Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, nº 26, 1989. COMAS, Carlos Eduardo Dias. Precisões Brasileiras Sobre um Passado da Arquitetura e Urbanismo Modernos a partir dos projetos e obras de Lucio Costa, Oscar Niemeyer, MMM Roberto, Affonso Reidy, Jorge Moreira & cia., 1936-45. Tese de doutorado. Paris: Université de Paris VIII, 2002BRUAND, Yves. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1981. p. 198. COSTA, Lucio. Registro de uma vivência. 2º.ed. São Paulo: Empresa das Artes, 1997. COSTA, Lucio. Sôbre arquitetura. Porto Alegre: CEUA, 1962. DEPARTAMENTO NACIONAL DE INDÚSTRIA E COMERCIO. Exposição Internacional de Nova York 1939. Edital do concurso de projectos Pavilhão do Brasil. A Noite. Rio de Janeiro, domingo 23-1-1938, p. 5. DIREÇÃO DA REPRESENTAÇÃO DO BRASIL NA FEIRA MUNDIAL DE NEW YORK DE 1939. Pavilhão do Brasil. Feira Mundial de Nova York de 1939. New York: H.K. Publishing, 1939. Álbum. El-DAHDAH, Farès. Oscar 102/ Brasilia 50: eight cases in Brazil's architectural modernity. Houston: RSA, 2010. Exposição Mundial de Nova York: concurso de ante-projetos para o Pavilhão Brasileiro. Arquitetura e Urbanismo. Janeiro e fevereiro de 1938. pp. 50-2. Exposição Mundial de Nova York: termo de julgamento do concurso de ante-projetos para o Pavilhão Brasileiro. Arquitetura e Urbanismo. Março e abril de 1938. pp. 98-9. Pavilhão do Brasil em New York. Lucio Costa e Oscar Niemeyer Filho. Arquitetura e Urbanismo. Maio e junho de 1939. pp. 471-80. NIEMEYER, Oscar. Niemeyer. Belmont-sur-Lausanne: Alphabet, 1977 VIDAL, Armando. O Brasil na Feira Mundial de Nova York de 1939; relatório geral. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1941.
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