Revista PopUp! - A Cidade Onde Apenas Eu Não Existia

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A cidade onde apenas eu não existia

Foto: Reprodução

Sucesso de 2016 trouxe a tona temas relevantes pouco discutidos TEXTO: LUCAS OCTAVIANO CINCHETTO/ DIAGRAMAÇÃO: MARIA BEATRIZ DOS REIS

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ois mil e dezessete começou e com o novo ano, também se iniciou a nova leva de animes para a televisão japonesa. A temporada de inverno, como é conhecida, é considerada por muitos como a mais fraca do ano em qualidade de enredo. Nesse ano porém, o retorno de animes que fizeram sucesso como A o n o E x o rc i s t e K o n o S u b a r a s h i i Sekai ni Shukufuku wo! , prometem esquentar a temporada. Uma grande questão que surge é se as segundas temporadas desses animes ou se outros lançamentos, irão conseguir o sucesso que Boku Dake Ga Inai Machi (Erased, para o ocidente), alcançou na temporada de inverno 2016 e que

se estendeu para as outras levas de animes, ficando entre os melhores do ano passado. Aplaudido e criticado por muitos Erased abordou, em meio a temas já conhecidos pelos japoneses, enredos que são pouco convencionais ou pouco explorados, nas produções televisivas, tanto japonesas quanto ocidentais. A história de Boku Dake Ga Inai Machi, a tradução é algo em torno de “A cidade onde apenas eu não existia”, se ambienta em dois tempos, a vida adulta e a infância do personagem principal, Satoru Fujinuma. De autoria do mangaka Kei Sanbe, e história adaptada para animação através do

estúdio A-1 Pictures (Ao no Exorcist, Sword Art Online, Magi, Nanatsu no Taizai), a animação se mostra impecável em quesitos técnicos do começo ao fim. Em um primeiro momento os telespectadores são apresentados para um “fenômeno” que está presente na vida de Satoru, o Revival. É através desse “fenômeno” que história terá seu inicio. O Revival é responsável por fazer com que o protagonista consiga voltar no tempo, geralmente por alguns momentos, para evitar alguma tragédia. O “poder” age inconscientemente e se desenvolveu ao longo da vida de Satoru. Pois bem, depois que entendemos


e encontra Satoru na cena e logo o incrimina. Ele foge e nesse momento o Revival é ativado, só que dessa vez leva Satoru de volta á sua infância, algum tempo antes do desaparecimento das crianças em sua cidade. Ele agora é um adulto preso em um corpo de criança. O anime continua seu desenrolar com Satoru tentando evitar que sua colega de classe Kayo seja pega pelo assassino, e começa a tentar entender o mundo da garota e pensar em soluções para o problema. Kayo é uma dos personagens mais cativantes do anime, e é justamente sua história a mais triste. Com a proximidade com Kayo, Sobaru passa a descobrir coisas que não havia prestado atenção em sua infância. A menina sofre violência domestica em sua casa. Sua mãe é negligente e pratica violência física e psicológica contra a garota. Para fugir de sua realidade, Kayo fica longe de sua casa o maior tempo possível. É ela a responsável por dar o título a historia.

Erased vale a pena? No decorrer da animação somos apresentados a diversos desfechos. Grande parte das críticas negativas, se baseiam no maior mistério do anime. Que na verdade não é tão mistério assim: quem é o seqüestrador/assassino de crianças? É verdade que nesse ponto, qualquer um que preste atenção aos detalhes irá conseguir descobrir. E nesse caso, alguns telespectadores vão se decepcionar ao saberem que estavam certos o tempo todo. Porém o anime é muito mais do que um seinen de investigação. Ele trata das relações de confiança entre os personagens. E embora isso seja comum em animes, Erased traz isso de uma maneira sensível que cativa o público. A relação de Satoru com sua mãe é bem desenvolvida

e cria uma dualidade com a relação que Kayo tem com sua família. Enquanto do lado do protagonista a mãe é carinhosa, ente e apóia o filho, do lado de Kayo a mãe a detesta e abusa da garota. Um dos desfechos do anime é inclusive o confronto entre Sachinko e a mãe de Kayo. O laço entre mãe e filho poré tem seu ponto forte nos capítulos finais do anime, quando Satoru sofre um acidente e fica em coma e é mostrado que sua mãe desiste de tudo para cuidar do filho, sem perder a esperança. As outras p e s s o a s que estão ao redor de Satoru também são necessárias para ajudar a evitar as tragédias. Desde os amigos de escola enquanto criança, que ajudam Satoru a evitar os seqüestros. Kanya Kobayashi, um deles, com uma inteligência acima da média, também é bom observador. É ele quem ajuda Sobaru a ver a verdadeira tragédia que é a vida de Kayo. Airi Katagari, sua amiga de

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o funcionamento do Revival, somos apresentados a vida de Satoru, um escritor de mangás fracassado que trabalha fazendo entregas para uma pizzaria. No meio de suas entregas ele salva pessoas de um acidente depois que seu “poder” é ativado e acaba sofrendo um acidente no lugar. Nesse momento outra personagem é apresentada Sachinko Fujinuma, a mãe de Satoru. Ela volta a cidade para cuidar do filho e com ela, trás lembranças de um acontecimento do passado, que teve influência na vida de Satoru quando criança. Essa lembrança diz respeito ao desaparecimento de algumas crianças na cidade, entre elas, colegas de classe de Satoru, em especial Kayo Hinazuki. O suposto assassino dessas crianças está para pegar pena de morte, ele era um conhecido de Satoru e sempre negou as acusações. Satoru se tente culpado pela morte de Kayo, pois ele foi a última pessoa a vê-la com vida, em um parque da cidade. Na ocasião ele pensou e chamar a garota para irem juntos para casa mas acabou não seguindo seu pensamento. Em uma ida ao mercado, Satoru tem um Revival e pede a ajuda da mãe para tentar descobrir o que há de errado. Ele não consegue perceber nada, mas sua mãe vê um homem que tinha saído do mercado com uma criança, partir sozinho com o carro após perceber que Sachinko estava olhando. É esse momento que da sequencia ao desenrolar da história. Satoru e a mãe vão para casa, Satoru sai da casa para o trabalho. A mãe percebe que conhece o homem que partiu com o carro e que ele pode estar ligado ao desaparecimento das crianças que aconteceu no passado. Antes que consiga avisar o filho, ela é assassinada dentro da casa. Satoru chega e encontra a mãe morta, a polícia foi acionada por alguém


Sequestro, assassinato de crianças e violência domestica em um anime?! O tema é complexo, principalmente quando retratado em um anime. Erased é classificado como Seinen, um gênero para jovens e adultos no Japão, mas não é por ter uma classificação que ele não será visto por outras crianças, seja no oriente ou ocidente. O desaparecimento de crianças e adolescentes chega a números espantosos. No Brasil, cerca de 40mil crianças e adolescentes desaparecem a cada ano. A grande maioria não é

encontrada. Ou tem um fim trágico. Em 2014 números do Disque Direitos Humanos apontaram que cerca de 91mil crianças sofrem algum tipo de violação de direitos em seus lares. 74% negligência, 49% violência psicológica, 43% violência física e 25% violência sexual. As crianças que chegam a passar por violência sexual, passam por outros tipos de violência e negligência. Com números alarmantes em nosso país, Erased passa de apenas uma história cativante. Ele passa a dar visibilidade a assuntos sérios. E que muitas vezes não são abordados de maneira tradicional. Muitas vezes as pessoas não percebem os sinais da violência, ou preferem não perceber, e acabam encarando a realidade quando já é tarde demais para a criança. Essa é uma das lições

que o anime busca ensinar, através da jornada do protagonista. Sobaru não busca deter o assassino par que o Revival desativado e ele volte ao normal. Ele busca salvar as pessoas ao seu redor que ele não conseguiu salvar em sua primeira chance. Não apenas dos assassinatos, mas da violência e tristeza que elas enfrentam. O anime busca mostrar que o arrependimento “E se...” (E se eu tivesse feito isso, E se eu tivesse conversado com aquela garota, etc.) pode ser evitado tomando atitudes no presente. A história tenta desesperadamente avisar as pessoas que elas não devem se omitir e sim prestar atenção aos outros que estão ao redor e ajuda-lós. Pois diferente de Sobaru, as pessoas não irão ter outras chances para refazer o passado e evitar tragédias.

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trabalho no tempo presente, é quem ajuda o homem no tempo presente em sua fuga e na tentativa de descobrir quem é o assassino.


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