Revista Popup! - Bates Motel

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Hello, mother!

Uma análise psicológica da série que trouxe Norman Bates de volta para os holofotes

TEXTO E DIAGRAMAÇÃO: MARIA BEATRIZ DOS REIS

E

m 1960, o diretor Alfred Hitchcock trouxe para as telas do cinema o suspense/horror conhecido como Psicose, que apresentou Norman Bates, personagem de Anthony Perkins que era obcecado por sua mãe, Norma. Bates Motel chegou em 2013, como uma espécie de prólogo do filme, pelas mãos de Carlton Cuse (Lost, The Returned, The Strain), Anthony Cipriano e Kerry Ehrin (Friday Night Lights) e exibida pelo canal A&E. Na série, Norma (Vera Farmiga) acabara de adquirir um motel em uma cidade de costeira chamada White Pine Bay, localizada no estado de Oregon, nos Estados Unidos, para que ela e Norman (Freddie Highmore) possam começar uma nova vida. Ambos os personagens são envolvidos em uma atmosfera muito diferente da que se vê usualmente entre mães e filhos. A entrevista a seguir traz uma visão psicológica da série e seus personagens pelos olhos do psicólogo Raphael Bernardes, 25 anos, especializado em Psicologia da Saúde. PopUP! - Como você enxerga a relação entre Norman e sua mãe? Tanto em Bates Motel, quanto em Psicose, é mostrado a relação dos dois como algo simbiótico. Em vários momentos da série, a mãe se mostra invasiva em relação a privacidade e o desenvolvimento dele, tanto a respeito de ele se relacionar afetivamente com outras pessoas, quanto à adolescência pela qual ele está passando. Isso mostra que não há uma diferença muito grande entre o “eu” e o “ela”, assim como acontece em

alguns surtos quando ele passa a falar e até se vestir como se fosse a mãe. Não existe muita separação entre o que é o desejo dele e o desejo dela. PopUP! - Você acredita que exista alguma forma de incesto na relação dos dois? O incesto, da forma como é trabalhado em algumas áreas da Psicologia, não necessariamente tem uma passagem ao ato. Então, a própria relação simbiótica já diz respeito a algo muito mais complicado, que poderia ser analisado através do Complexo de Édipo. Se pensarmos por esse ponto, existiria uma relação incestuosa no nível simbólico, pois há uma invasão constante do outro, que pode ser até, como mostrado em algumas cenas, em um contexto sexualizado. PopUP! - Como você analisaria ambos os personagens separadamente? Dentro da Psicanálise, o Norman não é classificado nem como sociopata, nem psicopata. É muito comum associar a capacidade de cometer crimes com alguma dessas estruturas, mas isso não está relacionado. Ele é um psicótico, o que significa que ele tem um rompimento com a realidade em algum nível. Na psicose, a realidade é cindida, ou seja, o indivíduo cria um delírio, uma espécie de fantasia na qual os desejos dele vão sendo realizados. O próprio filme Psicose traz essa questão do sujeito que é invadido pelo outro. Sig-

mund Freud, criador da Psicanálise, coloca que o psicótico tem um “inconsciente a céu aberto”. Em outras estruturas, todos os desejos que vão surgindo ao longo do desenvolvimento, inclusive o desejo do incesto já mencionado, são reprimidos e guiados a outros destinos. No psicótico, por conta do “inconsciente a céu aberto”, não existe essa repressão. Ainda não se passa ao ato em si porque o indivíduo tem um vínculo com a realidade, então ele cria delírios para realizar seus desejos. Uma interpretação, dentre muitas, é o fato de que ele se veste da mesma maneira que a mãe como forma de realizar um desejo dentro da relação que ele construiu com ela. PopUP! - Qual efeito esse tipo de série causa no espectador (já que, muitas vezes, esse tema está associado a serial killers)?


Se Dexter: Morgan (Michael C. Hall) é adotado ao-

você Gostou de bates s:

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The Following: Joe Carroll é um assassino diabólico que admira a obra de Edgar Allan Poe. Ele usa a tecnologia e sua inteligência para criar um culto de serial killers, todos ligados uns aos outros e espalhados por todo os Estados Unidos. O ex-agente do FBI Ryan Hardy, que o caçou e o capturou no passado, é forçado a voltar ao trabalho após sua fuga de prisão.

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três anos de idade por Harry (James Remar) e Doris (Kathrin Middleton), depois de ter se tornado órfão. Após detectar sua tendência homicida, o pai de Dexter decide ensinar a ele um código no intuito de canalizar a raiva do filho para situações mais propícias à violência. Nesta nova lógica, Dexter deve matar apenas assassinos de pessoas inocentes com a condição de provar sua culpa.

pode gostar DE: A questão da influência desse tipo de série sob o espectador é a mesma discussão que se tem sobre jogos ou filmes de violência. Existem algumas formas de se pensar esses efeitos: alguns dizem que isso pode instigar mais violência, e outros dizem que isso pode servir como válvula de escape. Não existe uma resposta concreta sobre o impacto de uma séria, o que se pode pensar é como um indivíduo vai se desenvolvendo na medida em que as histórias são incorporadas por ele, lembrando que cada indivíduo tem uma resposta diferente para uma situação. Em relação à Bates Motel, eu acredito que não seja promovido nenhum tipo de violência, por mais que hajam assassinatos. Ela traz uma questão importante que diz respeito

à violência que a própria mãe sofreu e qual resposta ela vai dar para as violências que volta a sofrer. Não é mostrado simplesmente alguém que cometeu um crime, existe uma pessoa e uma história por trás daquilo. PopUP! - Psicologicamente, por que esse é um tema que atrai tanto o público? Eu acredito que essas séries chamam a atenção por trazerem questões que não são comumente vistas e pela forma como elas são colocadas. O mistério, a curiosidade do público para entender porque aquele personagem age daquela forma, torna-se instigante para o espectador. Quando se vê na mídia conteúdos que dizem respeito à algum distúrbio, é sempre de uma forma muito esteriotipada; é difícil existir uma conversa so-

Hannibal: Will Graham é um investigador do FBI que tem o talento de se inserir nas cenas de crimes e visualizar exatamente o que aconteceu. Tal capacidade ajuda a solucionar muitos casos, mas também exige muito dele, obrigando-o a se consultar com o psiquiatra Hannibal Lecter. Mal sabe Graham que o Dr. Lecter não é um psiquiatra comum.

bre esse tema que traga essas questões para o cotidiano e as séries têm trazido um pouco sobre isso. Historicamente, as pessoas com transtornos mentais sempre foram excluídas da sociedade, pouco se falava sobre isso e as explicações que eram dadas estavam relacionadas com um contexto cultural muito específico. Hoje em dia, ainda existe muito desse conteúdo sendo colocado, mas já é possível ver essa questão de forma mais científica, médica, filosófica e ética. A quinta e última temporada da série estreou em fevereiro e traz a cantora Rihanna no papel da personagem Marion Crane, da célebre cena do chuveiro imortalizada em Psicose.


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