TGI II | Mariana Cristina Adão

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ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS A COMPOSIÇÃO DO LUGAR

Mariana Cristina Adão



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ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS A COMPOSIÇÃO DO LUGAR


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Mariana Cristina Adão Trabalho de Graduação Integrado II Instituto de Arquitetura e Urbanismo CAP Márcio Minto Fabrício GT Simone Helena T. Vizioli USP São Carlos Dez/2014


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AGRADECIMENTOS

À professora Simone, pelo acompanhamento do trabalho e por toda a atenção. Aos professores Joubert e Márcio, pelos atendimentos e ajudas no trabalho. Aos professores do IAU, pelos ensinamentos. A Bia, Camila, Cristiana, Debora, Fernanda, Jéssica R., Jéssica S. e Talita, pelos momentos que passamos. Ao Renan, pelo companheirismo, carinho e compreensão. Ao meu irmão, pelos momentos de descontração. Aos meus pais, pela dedicação, amor e por serem meu maior incentivo para seguir em frente.


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ÍNDICE

UNIVERSO PROJETUAL

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AÇÕES PROJETUAIS

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LUGAR

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PROGRAMA

49

PROJETO

55

Ruínas

62

Passarela

66

Conservatório

72

Torre

80

Biblioteca

88

Áreas livres

92

CONSIDERAÇÕES FINAIS

107

BIBLIOGRAFIA

113


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UNIVERSO PROJETUAL

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UNIVERSO PROJETUAL


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UNIVERSO PROJETUAL

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O trabalho de um arquiteto engloba diversas etapas que vão desde a criação artística até a construção. No entanto, deve-se saber em qual medida utilizar tais fatores, pois “enquanto satisfaz apenas às exigências técnicas e funcionais, não é ainda arquitetura; quanto se perde em intenções meramente decorativas, tudo não Soma-se a isso, a dependência da arquitetura de seu meio social e físico, da época na qual ocorre, das técnicas empregadas, dos materiais utilizados e dos recursos “A história da arte mostra que a arquitetura sempre foi parte integrante fundamental no processo da criação artística como manifestação normal de vida. Ela engloba, portanto, a própria história da arquitetura, constituindo-se, então, por assim dizer, no ‘álbum de família’ da humanidade. É através dela, através das coisas belas testemunho em testemunho, os itinerários percorridos nessa apaixonante caminhada, não na busca do tempo sempre porque entranhado A arquitetura, e outras formas de expressão artística, representam memórias de um tempo, lugar e usuário determinados, podendo este último ser apenas um indivíduo ou toda uma sociedade. O que observamos em arquitetura nos dias de hoje é um grande descaso por essas memórias, sendo que, muitas delas ou são destruídas para dar lugar ao novo ou


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riscos para quem se atreve a desvendá-los. Dessa forma, o que procuro trabalhar no meu TGI é como interferir nesse lugares, repletos de camadas – sendo essas aqui trabalhadas como camadas do tempo – compondo com o contexto onde está inserido. O que pretendo é fazer das memórias um passado vivo no presente. Para isso, foi necessário pesquisar diferentes formas de se trabalhar e interpretar a memória, por meio de teoria e projetos arquitetônicos. Pierre Nora é um dos autores que trabalha com esta questão e cujo texto “Entre memória e história: a proanalisar a Memória. Nele, Nora descreve memória como oposição a história, sendo a aceleração da história a causa da morte da memória. Entretanto, apesar de colocar a memória como oposta à história, o autor mostra que esta é essencial para a existência daquela, uma vez que é a história que transporta a memória através do tempo e que, com a distância e a mediação, a memória passa a ser história. Essa passagem de memória para história é caracterizada pela mudança dos produtores de memória. Nos tempos clássicos, os produtores de arquivos eram as grandes famílias, Igreja e Estado, hoje, todos escrevem suas Memórias. Existe, assim, o dever de memória, -Memória multiplicou as memórias particulares, gerando


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Nora diz que a memória passou do histórico ao psicológico, do social ao individual, da repetição para a rememoração, do público ao privado e do coletivo aos homens-memória. de-memória, das sociedades-memória – igrejas, escolas, famílias e Estado – que faziam a transmissão de valores, passagem regular do passado para o futuro. Isso teve como causa o fenômeno da mundialização e midiatizaSem esses meios, a memória cada vez menos é vivida no interior e sente necessidade de suportes exteriores, como lugares de história com vontade de memória. Isso O que se esquece, na arquitetura, é que esses lugares não necessariamente precisam fazer parte da história de uma sociedade inteira, sendo um marco de um tempo. Também são considerados lugares de memórias dades, ou, até mesmo, uma família. O importante são as de Porto Alegre, é um exemplo disso. Uma memória íntima e particular, mas não menos importante que outras memórias. Outra autora que também escreve sobre memória memória, patrimônio e passado possuem sentidos Assim, patrimônio histórico deve evocar dimensões da


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Porto Alegre / RS Projetada pelo arquiteto e artista plático Joseph Lutzenberger, em


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cultura como um passado vivo, acontecimentos e coisas que merecem ser preservadas porque são coletivamente histórico é um lugar de memória com uma diversidade todo lugar de memória é patrimônio histórico. No entanto, como lembra a autora, observa-se que quando se fala em patrimônio histórico pensa-se quase sempre em uma imagem congelada, como museus, monumentos, obras de arte e documentos, sendo a ção coletiva e longe de expressar as experiências sociais. Deve-se mudar essa visão de patrimônio e a arquitetura é uma forte arma para essa transformação. Porém, isso não deve ser como vem ocorrendo, onde há apenas duas ações possíveis para a história: destruição ou conservação, sendo esta, a partir da preservação ou da construção do passado. tante produção do novo: o passado é visto como tendo ser como testemunho de algo superado. A construção do passado é vista como um sentimento de nostalgia. Ambos possuem as mesmas premissas: não se importam -se um processo acabado e fechado. Esse é um modo abstrato de se absorver a história, sendo assim, ela não é uma forma de conhecimento,

riência social, o que gera uma sociedade sem cidadania.


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São Paulo / SP Lina Bo Bardi Fonte: <http://www.archdaily. dia-do-arquiteto-a-invencaode-uma-arquitetura-moderna-

São Paulo / SP Lina Bo Bardi Fonte: <http://www.archdaily. da-arquitetura-sesc-pompeialina-bo-bardi/


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o passado é continuamente vivido e descoberto no presente e ambos os tempos convivem harmoniosamente. Segundo Nora, no passado, nação, história e memória viviam em simbiose. Então, Estado-Nação foi substituído por Estado-Sociedade, história como tradição de memória foi substituída por história como laboratório das mentalidades do passado e a legitimação pelo retomada de suas autonomias, nação passa a ser um dado, história, uma ciência social e memória, um fenômeno privado. É necessário fazer com que a produção incida sobre a questão da cidadania. Isso implica passar a história e política de preservação e construção do passado para feito com dupla tarefa: crítica à história “dos vencedode horizontes de validade histórica. vas dos acontecimentos passados e presentes e torna-

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derivada preserva apenas estes testemunhos, sem se não há memória popular ou alternativa à do poder que Essa talvez se articula como a maior parte das políticas de preservação no Brasil. O que tem sido feito é recriar a memória dos que perderam a visibilidade de suas ações e resgatar essas ações e suas utopias não realizadas. Aposta na existência de memórias coletivas e heterogêneas, mas que são


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fortes referências de grupo, mesmo que com fraco nexo que essas experiências silenciadas se reencontrem com a dimensão histórica. É necessário produzir um direito ao passado com crítica e subversão constante das versões instituídas. O reconhecimento ao direito ao passado está ligado Esse reconhecimento aceita os riscos da diversidade e de encontrar as solicitações por uma memória social que venham baseadas em seu valor simbólico, mesmo que sejam locais, pequenas, quase familiares. Não teme

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layer temporal, que não tem de necessariamente moralizar ou denunciar o tempo preexistente ou demonstrar um virtumento orienta-se pela produção de uma cultura que não repudie sua própria historicidade, mas que possa dar-se conta dela pela participação nos valores simbólicos da cidade. Esses valores simbólicos também são incluídos na

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do ele, são momentos da história arrancados do movimento da história, lugares de história com vontade de memória, tudo o que administra a presença do passado no presente. Os lugares de memória possuem dois


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Praça das Artes São Paulos / SP Brasil Arquitetura Fonte: <http://www.archdaily.

Praça das Artes São Paulos / SP Brasil Arquitetura scrapercity.com/showthread.


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três sentidos: material, simbólico e funcional, presentes simultaneamente, porém, em graus diversos. O estudo dos lugares, segundo Nora, é uma encruzilhada entre dois movimentos: o movimento historiográmemória. Entretanto, viver integralmente sob o signo da memória esvazia os lugares daquilo que os fazem lugares de memória, havendo a necessidade de manifestações da vida social. lugar de memória, onde o passado ainda é vivo e possui uma intensa manifestação da vida social, ou seja,

Para aprofundar essa discussão, o texto “Estrutura ções, assim como as obras de arte. O que os diferencia é que os fatos urbanos são produzidos pelo público e as obras de arte, para o público. Por isso, fatos urbanos não se explicam por suas funções, que se alteram com o tempo. Também são considerados coletivos, por serem progresso da razão humana, e individuais, por serem uma forma organizada no tempo e espaço. Devem ser vistos em suas totalidades, ou seja, em conjunto com entorno, e, como destaca o autor, deve-se entender que conceituar um fato urbano é diferente de vivê-lo.


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Rossi diz que fatos urbanos persistentes podem ser vistos como monumentos, pois são fatos propulsores do desenvolvimento e se conservam durante a evolução da cidade. Ainda segundo Rossi, a arquitetura da cidade pode ser representada de duas formas divergentes: a cidade como um grande artefato, ou seja, uma grande obra de engenharia e arquitetura que cresce no tempo, ou por entornos limitados, com arquitetura própria, e, portanto, forma própria. Isso interfere diretamente na forma como se constituem as permanências, podendo se tornar aberrações, quando estão isoladas, não acrescentando nada nem podendo ser acrescentadas, ou elementos propulsores, quando a forma do passado assume uma função diferente, mas continua ligada à cidade. Esses elementos propulsores tem grande carga de memória. Para Nora, o que chamamos hoje de memória já não é mais memória, e sim, história. A memória verdadeira é espontânea, social, coletiva, globalizante e imediata, como gestos, hábitos e ofícios, enquanto a memória transformada por sua passagem em história é voluntária, deliberada, psicológica, individual, subjetiva e indireta. Isso compõe a metamorfose contemporânea. O que pretendo trabalhar no meu TGI é a coexistência de memórias e tempos, pois acredito que há diversos meios de se projetar em lugares repletos de memória sem recorrer a uma ação totalmente destruidora ou conservadora.


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AÇÕES PROJETUAIS 21

AÇÕES PROJETUAIS


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AÇÕES PROJETUAIS 23

É possível compor com o lugar, sem que este perca suas memórias, mas some novas memórias? É com essa indagação que começo a pensar em quais ações projetuais adotar. Falar em camadas do tempo vai além da passagem cronológica, abrange também as memória, relações sociais, econômicas... E na arquitetura podemos perceber como o passado foi, e o presente é contado. Assim, são projetuais. O processo do TGI iniciou-se em 2013, quando foram em analisar materialidade, enquadramentos e luz e sombra. um objeto síntese de pré-TGI, no qual procurei explorá-las.


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Objeto de pré-TGI


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esses temas, foram feitas transcrições do objeto, que o madas, materialidade, enquadramentos e luz e sombra) nas transcrições e, a partir delas, vieram dois conceitos, que, mais tarde, foram utilizados como propostas arquitetônicas: interdependência da obra e lugar e seleção. Dizer que obra e lugar são interdependentes, signio lugar depende do objeto para existirem como tais, ou do.

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Já a seleção visual esconde ou revela situações do lugar, o que é importante destacar para que a obra e o passado estejam vivas nas memórias do presente. projetual como sendo a COMPOSIÇÃO. Compor a obra com o lugar, de modo que ambos se contaminem formando um só lugar com rica diversidade.


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Montagem

Colagem

Xerox

Transcrições


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Lugar de memória

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Camadas de memória

Estação Ferroviária de São Carlos

COMPOSIÇÃO

Painel síntese do processo, no qual pego como objeto de estudo a estação ferroviária de São Carlos, analisando formas de composição do lugar. Fonte das Imagens: Google

Com novos enquadramentos do lugar, formam-se novas visuais do pré-existente, que antes poderiam nem ser notadas.

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[É possível compor com o lugar, sem que este perca suas memórias, - - Ações projetuais mas some novas memórias?] Fase 2. Transcrições


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LUGAR 29

LUGAR


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LUGAR 31

Com base nos questionamentos que me levaram à

tisse minha postura não seria difícil, visto que a arquitetura sempre traz consigo memórias de um tempo, que são perceptíveis até mesmo em ruínas. As necessidades, a história, o comum, a beleza de um passado podem ser observados andando pelas ruas das cidades. O município de Lençóis Paulista / SP, com pouco mais de 61 mil habitantes, é uma típica cidade do interior paulista. Localizada a 300 km de São Paulo e 50 km de Bauru, tem, em seus percursos, lugares repletos de memórias a serem reveladas.

N

milhas km

200 400


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Um desses lugares é lençoense, uma antiga destilaria de álcool e açúcar, que hoje encontra-se grande parte em ruínas.

N

Construída às pressas em 1943, para suprir as necessidades energéticas durante a Segunda Guerra Mundial, foi abandonada quando sua não houve mais necessidades de sua função.


LUGAR 33


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N

Houve algumas tentativas de novos usos para este lugar, como em julho do contrato para abrigar a Casa da Cultura e o Museu Histórico da Cidade, entretanto, funcionou por apenas 10 anos. Com sua saída, o lugar foi mais uma vez esquecido, e sua degradação, cada vez maior.


LUGAR 35


36 ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS Usos Residencial Serviço Comercial Institucional Misto com habitação Área verde

Quando ainda funcionava a destilaria, a região era quase vazia. Aos poucos, foi ocupada por sidade, tornando-se uma N


LUGAR 37


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Via arterial Via coletora Via local

N

Essa ocupação também ocorreu nas residências pertencentes à destilaria e nas próprias construções da área de indústria.


LUGAR 39


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Tanques Pomar

Residências

Indústria

Implantação


LUGAR 41

A destilaria era dividida em três áreas: indústria, residências e pomar. As residências encontram-se ao norte da indústria, mas não foram consideradas neste projeto. Os cerca de 15 mil metros quadrados de terreno possuem um desnível total de 17 metros. Ao norte, encontram-se dois tanques usados para armazenar álcool e a base do que seria um terceiro tanque. Ao sul, encontra-se a indústria, composta por uma torre de 25 metros de altura, uma chaminé igualmente alta e galpões, que são os mais degradados, sendo que cesso de degradação, com fotos tiradas em 1983 (imagens superiores) e em 2014 (imagens inferiores).

Corte


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Fonte: SÃO PAULO, 1985

Fonte: Arquivo pessoal


LUGAR 43

Fonte: Sテグ PAULO, 1985

Fonte: Arquivo pessoal


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Fonte: SÃO PAULO, 1985

Fonte: Arquivo pessoal


LUGAR 45

Fonte: Sテグ PAULO, 1985

Fonte: Arquivo pessoal


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Fonte: SÃO PAULO, 1985

Fonte: Arquivo pessoal


LUGAR 47

processo de tombamento pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico - CONDEPHAAT, em dezembro de 1989. tes, que hoje encontram-se espalhados pela cidade. O projeto vencedor foi do Metrópole Arquitetos.

Perspectivas do projeto de Metrópole Arquitetos. Fonte: <http://www.arqbacana.com.br/internal/arq!aqui/ read/13684/metr%C3%B3polearquitetos-destilaria-central-delen%C3%A7%C3%B3is-paulista>

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A atual situação do lugar, somada a sua história e memórias, gera algumas indagações para implantar um novo uso: O que pode ser mantido como ruína? O que deve ser reconstruído? Como valorizar as memórias deste lugar e, ao mesmo tempo, abrir espaço para novas memórias? Essas indagações foram essenciais para a constituição do projeto.


PROGRAMA 49

PROGRAMA


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PROGRAMA 51

Lençóis Paulista é uma cidade com opções restritas de cultura e lazer, levando seus habitantes a procurarem essas atividades em cidades próximas. A cidade foi recentemente incluída no Circuito Turístico “Caminhos do Com base nisso, a proposta é criar uma novo espaço que promova atividades culturais, ampliando, assim, o polígono cultural existente, que atualmente é composto por quatro áreas: Biblioteca Municipal Orígenes Lessa, Espaço Cultural Cidade do Livro, Casa da Cultura Profª Maria Bove Coneglian e Museu Alexandre Chitto. A Casa da Cultura, onde se localiza a Secretaria da Cultura, é um espaço com diversos programas, entre eles, cursos de dança, teatro, música, artes plásticas, sala para apresentações de todos os tipos, e a orquestra de sopros da cidade. Essa diversidade é um bom intercâmbio cultural, entretanto, atividades como o da Orquestra Municipal de grande capacidade de crescimento, gerando necessidade de maior e melhor estrutura. A orquestra conta, atualmente, com cerca de 40 músicos. Seu repertório vai do erudito ao popular e é referência para toda a região. Também incentiva a formação de novos músicos através de um trabalho base denominado Banda Experimental Jovem, com mais de 60 alunos. Assim, o projeto visa atender a uma futura necessidade da orquestra e de projetos de instrumentalização, implantando um conservatório, com espaços para ensino, ensaios e apresentações, além de uma ampla área para


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lazer. A criação de uma nova área cultural, resultará em um novo eixo, ampliando o polígono cultural que encontra-se concentrado no centro da cidade.

Áreas culturais existentes Área de intervenção Eixos culturais existentes Novos eixos culturais N


PROGRAMA 53

Biblioteca Espaรงo Cultural

Museu

Casa da Cultura


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PROJETO 55

PROJETO


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PROJETO 57

O primeiro passo para a concepção do projeto foi decidir o que, da construção existente, permaneceria como ruína, o que seria retirado e o que seria restaurado. Para tanto, foi realizada uma cuidadosa análise do lugar e uma possível relação com novas construções. A principal proposta do projeto é convidar os visitantes a percorrerem todo o lugar, despertando a curiosidade através dos percursos, gerando visuais que horas escondam, horas revelem suas memórias. A implantação de uma nova construção se faz necessária, tanto para atender ao programa, quanto para relacionar o passado com o presente, as ruínas com o novo e o respeito às características ímpares de ambos. Com essa relação é possível diferenciar as formas construtivas, as relações com o espaço, as necessidades de cada época e sociedade.

Primeiros estudos


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Chaminé

Tanque

Galpão

Torre Galpão

Cobertura

N


PROJETO 59

eixos que norteassem o projeto. O primeiro eixo, paralelo à Avenida José Antônio Lorenzetti, principal via que contorna o lugar, é onde foi projetada a nova construção. Além dessa construção, onde é localizado o conservatório, outro elemento que marca o eixo é um dos decks de madeira que conforma o projeto. Ele atravessa toda a extensão norte do eixo, até seu encontro com o conservatório. O segundo e último eixo é marcado por uma passarela, a qual corta toda a região sul do lugar, ligando a torre existente ao novo prédio do conservatório. Atravessa a região das ruínas, oferecendo, a quem passa por ali, uma maior compreensão do que já foi este lugar e de como ele é. Em seu percurso é possível observar toda área livre do lugar, além de uma grande extensão da cidade.

Planta da destilaria Restauro Ruínas Retirado


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Corte AA - Eixo 1

Corte BB - Eixo 2

Implantação Eixo 1 - Nova construção Eixo 2 - Passarela



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Ruínas As ruínas desempenham o papel principal do projeto. São as ruínas que fazem o projeto existir como é. É a partir das ruínas que todo o projeto se desenvolve. Dessa forma, as ruínas são abertas a visitação a todos que estiverem dispostos a desvendar o passado. São divididas em duas partes: ao norte, onde se encontram os tanques, e ao sul, com os galpões e a chaminé. Nos galpões ainda é possível encontrar antigas caldeiras e imaginar como era a dinâmica da destilaria através das divisões dos ambientes.

Imagens das ruínas Fonte: SÃO PAULO, 1985





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Passarela A passarela é a principal conexão entre o antigo e o novo. Com 80 metros de extensão, 4,5 de largura e entre 3,70 e 9 metros de altura, é sustentada por quatro pórticos de concreto protendido e vigas de aço corten, e faz ligação entre a torre e o conservatório Da passarela pode-se ver todo o lugar, seu entorno e a cidade. Também tem uma visão única das ruínas, tornando mais fácil a compreensão da interação entre os ambientes. Caminhando sob a passarela, seus pórticos criam um enquadramento de parte das ruínas, chamando a atenção para a história do lugar.



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Corte BB - Eixo 2


PROJETO 69




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Conservatório O prédio do conservatório é dividido em três pavimentos de 18 x 54 metros. Possui duas entradas: uma no eixo em que se encontra, a partir do deck que o invade, e a outra, no cruzamento dos eixos, ambas no térreo. Foi implantado mantendo distância do existente, como sinal de respeito por suas memórias e história. No térreo encontram-se a recepção, administração e salas de aulas teóricas, que também podem ser usadas para aulas práticas e ensaios, além de banheiros, espaços de convivência e circulação. Uma de suas entradas dá acesso à passarela que leva ao segundo andar da torre. No primeiro andar há a coordenação, salas de professores e salas de aulas prática e ensaios. Também conta com banheiros, áreas de convivência e circulação. Já no subsolo é onde se localiza um auditório para 308 pessoas, com foyer, depósito e camarins, podendo ter apresentações de outros gêneros, além da orquestra. Por conta do desnível do terreno, através do subsolo é possível acessar outras áreas do projeto, dessa forma, em toda sua área não ocupada pelo teatro há uma grande área livre de piso de concreto liso, que pode ser usada para encontros e lazer.



74 ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS

Primeiro andar

Térreo


PROJETO 75

Plantas do conservatório Admnistração Banheiro Coordenação Depósito e camarins Foyer Recepção Sala de porfessores Sala de aula práticas / ensaios Sala de aulas teóricas

Subsolo


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Corte AA - Eixo 1


PROJETO 77


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Suas laterais são revestidas por uma “segunda pele” de brise de aço corten e suas entradas, por parede cortina de vidro. Isso, somado à localização dos ambientes no núcleo da planta, o torna uma construção leve, permeável para os olhos do transeunte. A estrutura é formada por pilares de concreto armado de 30 centímetros por 4,5 metros, também localizados no centro, numa malha de 6 metros. O interior tubulações. Lajes nervuradas de 25 centímetros completam a estrutura. As paredes divisórias das salas são revestidas de materiais acústicos, para neutralizar os ruídos tanto externos, quanto de outras salas.



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Torre Como já visto, algumas das construções existentes serão restauradas, de modo a atender às necessidades atuais da cidade. Uma dessas construções é a torre. Com cerca de 25 metros de altura, o projeto para a torre toma como princípio suas características, assim, sua fachada é restaurada e, em seu interior, é colocado uma nova estrutura em aço que sustentará os novos usos. Por ser a construção mais alta do lugar e oferecer uma vista ímpar da cidade, assim, possui usos comerciais e de serviços, podendo ser visitada por todos. É dividida em seis andares onde funcionarão uma loja de música, um café e um restaurante, tendo este último três andares, sendo um reservado para a cozinha. Para ventilação dos banheiros há um shaft, para não descaracterizar a fachada. Para dar acesso à partir do primeiro andar, foi projetado um anexo à torre, onde há um elevador e escadas. Esse anexo é permeável, contornado por um cobogó de aço corten.



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Térreo - Recepção

Primeiro andar - loja


PROJETO 83

Segundo andar - cafĂŠ

Terceiro andar - cozinha do restaurante

Plantas da torre Banheiro


84 ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS

Quarto e quinto andares - restaurante

Plantas da torre Banheiro


PROJETO 85

Corte BB - Eixo 2


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A permeabilidade da caixa de escadas se contrapõe com a estrutura mais “pesada”, de concreto e alvenaria, da torre. Isso, somado à diferença de materiais, faz mais uma comparação entre presente e passado, podendo este ser visualizado através daquele.



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Biblioteca Outra construção que terá suas características iniciais recuperadas é o galpão que abrigará a biblioteca. Assim como a torre, possui estrutura de concreto, vedação de alvenaria e grandes janelas de ferro. Seu interior receberá estrutura necessária para o novo uso.

Planta da biblioteca Banheiro



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Corte BB - Eixo 2


PROJETO 91

Como já existe biblioteca municipal, cujo acervo é bastante amplo e valorizado, esta biblioteca é dedicada à literatura musical, como livros de história da música e partituras, para serem usados em aulas e retirados.


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Áreas livres As áreas livres oferecem diferentes estares, pensados para atrair toda a população da cidade, oferecendo novas opções de lazer e atividades culturais. A vegetação foi planejada com uma maior densibosque, e com menor densidade e caducifólias perto das construções, agindo como complemento dessas e oferecendo algumas áreas sombreadas. Algumas vegetações existentes permaneceram, outras, menores, foram remanejadas. Além da pavimentação em concreto liso, na projeção do prédio do conservatório e da passarela, as áreas livres também são revestidas por pedra portuguesa - em sua maioria - e tijolo - onde já havia e em parte do playground. Também algumas áreas gramadas, cobertas ou não por decks, estão espalhadas pelo parque.

Pisos Areia Gramado Deck de madeira Pedra portuguesa Tijolo

Vegetação Existente (árvores) Existente (palmeiras) Existente remanejada Nova caducifólia Nova densa



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BOSQUE O espaço onde se encontram os tanques é destinado ao estar e contemplação. Uma área gramada, com vegetações densas, que oferecem sombras e fecham esta área para a avenida, abrindo-a para a escola, que se encontra a nordeste. Os tanques permanecerão também como ruínas, trazendo uma amostra, a quem penetra o parque por esta área, do que há adiante. É cortado por um deck com bancos, dando mais um motivo para a permanência neste local. Este deck corta toda esta área e penetra o prédio do conservatório. Também seu amplo gramado sombreado oferece condições para descanso e atividades físicas.



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Corte AA - Eixo 1


PROJETO 97


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PLAYGROUND O playground é dividido em três camadas: a primeira, mais externa, é gramada com vegetação. A segunda, intermediária, pavimentada de tijolo, conta com aspercamada interna, de areia, é onde se encontram brinquedos lúdicos. Foi projetado de maneira não usual com o que encontramos na cidade, assim, será uma forma de atrair crianças e adultos, aproximando a população da história do lugar e da arte musical. É cortado por dois caminhos na direção de cada um dos eixos, de modo a não interromper a passagem e gerando perspectivas do lugar.



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DECKS Os decks estão localizados em três pontos do projeto: nas pontas dos eixos e no cruzamento estre eles, formando uma continuidade visual. O deck de união dos eixos é dividido em três níveis, todos com acesso da rua. É uma área de recepção, visto diversas áreas do parque, assim, é pensado como tal. É uma área sombreada e com desenhos que sugestiona a permanência, como suas escadas e as aberturas para as árvores que podem ser usados como bancos. A leste deste deck há uma escadaria que dá acesso ao pátio ao lado da biblioteca. Esta área, onde antes havia outro galpão, permaneceu sem construção no projeto. Entretanto, seu piso de tijolo, contínuo em toda a área de ruínas e construções existentes, sugere a existência passada de alguma construção. O pátio foi projetado para ser usado para apresentações ao ar livre, e sua escadaria, como arquibancada. O deck ao lado da torre também recepciona quem adentra o parque pelo seu lado mais reservado e dá acesso às ruínas e à torre. Entre esses dois decks há uma passagem delimitada, de um lado, pelas ruínas e as construções existentes, de outro, pelos muros das residências. Essa passagem também foi pensada como um estar, assim, dispõe de bancos e áreas sombreadas e possui vistas diversas do existente.



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Corte AA - Eixo 1

Deck de encontro dos eixos.



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Corte BB - Eixo 2

Pátio da biblioteca


PROJETO 105

Deck da torre



CONSIDERAÇÕES FINAIS 107

CONSIDERAÇÕES FINAIS


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CONSIDERAÇÕES FINAIS 109


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Cada traço de desenho, cada ideia para o projeto, foram pensados sempre considerando as premissas do universo projetual e as questões que levaram à ação projetual. Foi adicionada uma nova camada ao lugar. Camada que pretende somar novas memórias e histórias e que respeita e preserva as existentes. Essas camadas, de presente e passado, podem se evidenciar na materialidade, como na contraposição entre o aço corten e a alvenaria, e nas formas construtivas. A nova camada também é responsável por enquadramentos do lugar. Dessa forma, seleciona visuais que revelem características que, talvez, passassem despercebidas sem ela. Assim, a nova camada tem total dependência do lugar para existir, assim como o lugar, sem essa nova camada, não tem os mesmos aspectos. Com isso, as ruínas estão neste lugar para serem reveladas, descobertas e apreciadas. São os elementos principais do projeto, sem as quais todo o projeto mudaTão importante foi este lugar, para em nada se acabar. Entre ruínas e memórias existe uma história que devemos preservar.


CONSIDERAÇÕES FINAIS 111


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BIBLIOGRAFIA 113

BIBLIOGRAFIA


114 ENTRE RUÍNAS E MEMÓRIAS


BIBLIOGRAFIA 115

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Artigos de revistas FIGUEIRA, Jorge. Nem passivo, nem ostensivo. Revista aU, São Paulo, ano 27, n 225, p. 43-47, Dez./2012. FRAJNDLICH, Rafael Urbano. Sonoro monólito. Revisa aU, São Paulo, ano 28, n 227, p. 24-33, Fev./2013. LANDSCAPE ARCHITECTURE MAGAZINE. 1910- . Mensal.


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Documentos ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9050: espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro, 2004. 97p. Conselho de Devesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado. Processo n° 24037, de 07 de agosto de 1985. Estudo de tombamento da Destlaria Central de Lençois Paulista. Conselho de Devesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado. Processo n° 69034, de 11 de abril de 2013.Pedido de aprovação de intervenção na Destilaria Central de Lençóis Paulista pode parte da Prefeitura Municipal de Lençóis Paulista.



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