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UM MANIFESTO DRAG
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“A drag veste uma máscara, mas não é tão diferente de você. Na verdade, ela é você mostrada de uma forma muito sincera” - Clarissa Lassertits
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SUMÁRIO 6
EU NA HISTÓRIA_______________11 MELANIE ANDROX____________17 EU PELAS RUAS_____________27 O OUTRO EU________________35 EU__________________________41 EU E O MUNDO______________55 EU EM CASA_________________61 AGRADECIMENTOS___________73
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Querido diário, Já me perguntei muitas vezes qual seria meu papel na vida das pessoas que vivem num mundo onde a intolerância e o ódio são espalhados o tempo todo - atingindo pessoas que só buscam uma coisa: ser elas mesmas. Com este manifesto, busco aproximar a sua realidade, leitor, das realidades das Drags e de seus pensamentos mais íntimos a fim de estreitar laços e celebrar a liberdade de expressão em sua forma mais rica. Com uma coleção de 7 livros inspirados por 7 Drags Queens diferentes, pretendo me expressar de uma forma tão livre e genuína quanto elas. Com amor, Liberdade. 9
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EU NA HISTÓRIA 11
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Drag Queen. Dressed as a Girl, onde criamos nossas personas e montamos em nossos corpos. Ou melhor, onde botamos para fora o nosso eu verdadeiro. Alguém que sempre morou dentro de nós, alguém que sempre esteve em tudo o que eu fazia e a forma com que eu agia. Alguns fazem arte com tinta e papel. Outros, escultura ou cinema. Eu faço arte com a minha essência. Eu me invento a partir do que está dentro de mim. Eu me monto, eu me crio, eu sou quem eu quero ser.
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Nos inspiramos em muitas pessoas que escreveram as nossas histórias. Desde sempre existiram homens e mulheres com vontade de expressar uma pessoa diferente do que todo mundo vê. De Divine a Rupaul. De Silvetty Montilla a Pabllo Vittar. Das minhas irmãs Drag Queens locais às mais famosas do mundo. Somos todas unidas por um ideal. A liberdade de expressão. De sermos quem somos. De criarmos quem queremos. De usarmos da maquiagem, da moda, da performance, do visual, tudo isso para mostrar ao mundo os nossos lados frágeis, delicados, que moram dentro de nós.
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MELANIE ANDROX 17
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Posso me apresentar com essa frase:
“Os polos opostos que se colidem viram arte.” Conheci o mundo Drag através de um amigo que me enviou um clipe da Adore Delano, uma drag famosa da atualidade, que ficou bem conhecida pelo programa de TV Rupaul’s Drag Race. Até hoje, Adore é uma das minhas drags favoritas e me inspira muito no que eu faço e na minha vida pessoal.
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O que me fez começar a me montar? O que me cativou? Bom, desde pequeno eu me montei, de uma maneira ou de outra. Sempre vestindo as roupas e fantasias da minha irmã e eu me sentia muito confortável assim. Isso sempre me fez muito bem e faz até hoje. Além do boom drag que a RuPaul trouxe com o programa, isso me motivou muito, porque
drag deixa ser tudo que não sou quando estou de Guilherme... E muita coisa mudou desde então. Eu melhorei muito a maneira como dinamizo meus sentimentos e lido com eles por causa da Melanie.
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Ela me ajuda mais que qualquer um e por isso gosto de dizer que
não somos dois e sim um só. Ganhei mais reconhecimento e respeito pela minha arte, até pelo desenhos, mas também perdi algumas pessoas.
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Ter que fingir que a Mel não existe dói pra caramba. A melhor parte de ser drag pra mim é a transformação e o poder que ela te dá de poder ser quem você quiser por um tempo. A minha drag, por exemplo, tem várias faces e várias fases. Como um pintor... Fase azul, rosa etc. A pior parte de ser drag queen é tirar a fita isolante da cabeça, desaquendar e toda a dor física que drag traz, porque não é mole. Mas pra mim toda essa dor vale a pena.
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Preconceito a gente internaliza, infelizmente. E com a drag eu nem sofro tanto preconceito quanto quando estou desmontada.
Parece que as pessoas têm medo da drag porque não entendem ou não sabem o que é, daí acabam nem mexendo comigo.
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EU PELAS RUAS 27
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Algum momento de constrangimento? De verdade, assim, nenhum.
Mas de extrema felicidade é toda vez que eu faço alguém feliz com a minha arte ou agrado o olhar de alguém com a minha estética porque grande parte da Melanie é a estética e a maquiagem, que são meus maiores talentos, que necessitam de criatividade. Minha primeira performance foi muito libertadora pra mim.
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Minha primeira performance foi num bar aqui de Teresópolis. Fui convidado por uma moça que faria aniversário no dia e fechou a casa pra comemorar. Ela me deu total liberdade artística e eu resolvi fazer Buttons das Pussycat Dolls.
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Acabei a performance nua só com um “x” de fita isolante em cada mamilo. E a performance foi para um público hétero. A maioria pareceu gostar e a outra metade - os idosos e os homens - ficaram meio chocados.
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Nunca cheguei a fazer coisas cotidianas montada, de fato. O mรกximo foi ir ao bar com um amigo depois do show (risos) e foi bem diferente ver como as pessoas lidam com a drag. Como jรก disse, a maioria nem interage com a gente.
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O OUTRO EU 35
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Como eu sou desmontado? Fora da pele da Melanie… A única parte, na verdade, da minha vida desmontado que influencia na Melanie são meus gostos pessoais. Porque na verdade ela é a minha exteriorização, o meu inverso.
Então é basicamente tudo que o Guilherme não pode/ consegue ser/fazer.
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Coisas que o Luiz Guilherme faz e eu gostaria que a Melanie fizesse? Bem, gostaria de poder conviver normalmente com a minha famĂlia. As pessoas tĂŞm medo ou ficam abismadas pela Melanie. O Guilherme ĂŠ muito mais agredido e sofre maiores olhares maldosos e preconceituosos.
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Acho que de um jeito a Melanie obriga as pessoas a aceitarem-na e o Guilherme nĂŁo tem esse poder.
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EU 41
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EU EO MUNDO 55
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O que eu diria a alguém que desconhece a cultura Drag? O que essa pessoa precisa saber para estar por dentro e entender?
Eu acho que a figura da drag em geral já desperta curiosidade em quem vê. Ou desperta preconceito, mas nesses casos, em sua maioria, não vale a pena tentar.
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Pessoas que simpatizam com a nossa figura merecem ouvir algo legal e serem introduzidas na nossa cultura. Acho que eu não falaria nada porque sou meio tímido pra conversar, mas uma boa conversa é uma ótima introdução.
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Esse é outro ponto negativo de fazer drag: ter que dar uma aula de gênero, arte e sexualidade toda vez que conheço alguém.
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EU EM CASA 61
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Família...
Meu conceito de família e lar mudaram drasticamente desde que me assumi e lidei com as reações dentro de casa. Eu sinto que todos os laços se afrouxaram ou foram cortados e destruídos com exceção de uns dois ou três, dentro da família.
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Não posso dizer que me vejo sem eles porque sou dependente dos meus pais financeiramente e ainda emocionalmente - o que parece se desfazer cada dia, ainda mais por causa da drag.
É muito difícil pra mim saber que mesmo com o apoio do resto do mundo, que sempre me ovaciona com elogios e bons atributos, eu me deito e não tenho o apoio da minha mãe, por exemplo.
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Família pra mim é quem me ama com todo o seu coração e ama quem eu sou de verdade, ao invés de amar um projétil fantasiado. Não tem nada a ver com o sangue.
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Como RuPaul diz, nós LGBTs acabamos tendo que escolher nossas famílias, porque a nossa de sangue nem sempre nos aceita como somos. E eu acredito nisso, apesar de amar e considerar muitos familiares com laços sanguíneos.
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Algum recado que eu daria para a minha família sobre Melanie? Sobre meu mundo? Primeiro que parem de se basear em “é só uma brincadeira” pra tentar aceitar. Se convencer disso não muda nada e só piora porque a Melanie é parte de mim. A Melanie
é eu e eu sou ela - que confuso!
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Eu gostaria que eles entendessem o quanto isso me traz felicidade e satisfação, porque me permite ser o que me reprimo mais ainda perto deles - durante o dia-a-dia.
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Como seria a minha famĂlia Drag Queen? Minha famĂlia ideal, como se eu fosse a Melanie 24h por dia? Assim como a Melanie, os pais dela e os irmĂŁos, teriam as pintinhas que se movem no seu rosto dependendo do humor. Pouca gente sabe mas esse ĂŠ um dos conceitos da Mel. E todos teriam a sobrancelha igual a minha e se vestiriam de forma simples e bonita em seu cotidiano.
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Sem padrões ou regras vindas do senso comum excludente e preconceituoso. Os pais da Melanie teriam plena noção que sua saúde mental é mais importante que sua carreira escolar e profissional e deixariam ela ser o que quer que a fizesse feliz.
Inclusive ser o Guilherme quando quisesse. Eu imagino a família da Melanie numa dinâmica parecida com a de Coraline.
A família da Mel é tudo que a minha não é.
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AGRADECIMENTOS 73
AGRADECIMENTOS Close é um projeto que só pode ser concretizado graças a colaboração de algumas pessoas muito especiais que nos ajudaram no decorrer do semestre. Gostaríamos, portanto, de agradecer aos orientadores Daniel Malaguti e Tatiana Messer, aos monitores e responsáveis pelo Laboratório de Produções Gráficas da PUC-Rio e à banca de Projeto 6. Além disso, gostaríamos, também, de agradecer o apoio dos nossos amigos e familiares no decorrer do período e, principalmente, àquelas que foram a inspiração para o projeto: Melanie Androx, Shandra Kala, Raddel e toda a cena Drag brasileira.
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