JT Sempre Número 48

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Número 48 - 01 de agosto de 2019

Livros que nasceram no jt. A brilhante e inesquecível escola chamada Jornal da Tarde continua gerando frutos. Aqui estão os três mais recentes livros de profissionais esculpidos em suas saudosas olivettis: Marli Gonçalves, Nirlando Beirão eMoisés Rabinovice. Moisés Rabinovici

Marli Gonçalves

Fernando Portela Nirlando Beirão

Qual a serventia da Imprensa? Marco Antônio Rocha


Vem aí mais um Encontro. Aguarde. Será no mês de novembro.

O jt Sempre é uma publicação com um único objetivo: manter viva a memória do Jornal da Tarde. É, acredito, a melhor forma de nos manter em contato, trocar informações, promover encontros para o papo agradável de sempre. Você pode participar. Mande sugestão, artigo, matéria, foto, histórias para mariomarinho@uol.com.br No campo “Assunto”, coloque: “JT Sempre”.

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Homenagem a Boechat Em reconhecimento ao trabalho jornalístico do âncora da TV Bandeirantes e da rádio Band News FM Ricardo Boechat, falecido em fevereiro passado, a Câmara Municipal de Itapevi, na Região Metropolitana de São Paulo, lançou o Curso e Prêmio Ricardo Boechat de Jornalismo Político, destinado a estudantes de jornalismo e jornalistas formados a partir de 2015. Com o objetivo de contribuir para o aprimoramento da cobertura da pauta política, alinhado às novas formas de produção e veiculação de conteúdo em plataforma multimídia, o curso terá 60 vagas, além de outras cinco destinadas a jornalistas refugiados, para que eles conheçam o sistema político do País. Dividido em duas fases,na primeira os participantes terão aulas com professores, mestres e doutores na área política, de setembro a dezembro de 2019. Na segunda fase, de janeiro a abril de 2020, eles terão aulas práticas, em coletivos,

ministradas por profissionais de comunicação para elaborar as pautas que concorrerão ao prêmio em 1º de junho de 2020. As reportagens produzidas pelos coletivos serão premiadas nas seguintes categorias: Pauta, Artigo de Política, Crônica, Editorial de Política, Reportagem, Notícia, Fotojornalismo e Edição. Mais informações e inscrições no site da Câmara de Itapevi. Extraído do Jornalistas&Cia.

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Qual a real serventi A imprensa estará cumprindo bem seu papel se mantiver em relação ao governo o distanciamento necessário para ter sobre ele visão questionadora e independente

Houve notável entusiasmo de grande parte da sociedade brasileira com os resultados das eleições de 2018, porque esse desfecho parecia simbolizar uma ruptura com a era lulopetista, marcada pela corrupção e pela irresponsabilidade administrativa. O triunfo dos candidatos que se apresentaram como o “novo” e como a antítese de tudo o que se atribuía ao PT indicava a clara insatisfação do eleitorado com aquele estado de coisas e, por conseguinte, denotava a esperança de mudanças radicais que despertariam o enorme potencial adormecido em razão da captura do Estado por quadrilhas e corporações corruptas. Para os mais empolgados, a vaga reformista, capitaneada não só pela eleição do presidente Jair Bolsonaro, como pela surpreendente renovação dos quadros parlamentares na União e nos Estados, demanda da sociedade brasileira total engajamento para atingir os fins a que se destina – quais sejam, limpar o País da corrupção e das influências da esquerda e colocá-lo no rumo do crescimento exuberante, mercê das reformas estruturais modernizantes. Mas o que deveria ser um movimento de revivificação das forças nacionais vai-se tornando um impulso de radicalização e de desunião, incapaz

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de analisar criticamente as razões de sua própria paralisia. Prefere-se atribuí-la a quem não anuncia sua absoluta aderência aos, digamos, princípios do bolsonarismo e a quem quer que deles se desvie ou em relação a eles nutra qualquer crítica. Nesse contexto, não são poucos os que julgam que a própria imprensa deveria unir-se aos esforços do governo. O jornalismo, segundo essa visão, deveria refrear seu natural ímpeto de fazer reparos às iniciativas governamentais, pois estas visariam exclusivamente ao interesse público e ao bem comum; por outro lado, o jornalismo deveria dedicar-se a apontar as artimanhas daqueles que lucrariam com o retorno ao desvario lulopetista. Conforme essa visão, os erros do governo e de seus membros seriam fruto quase natural e esperado de um pedregoso processo de reconstrução nacional, ao passo que qualquer reparo aos projetos governistas só pode ser resultado do inconformismo da “velha política” com o saneamento moral empreendido pelo bolsonarismo. Logo, ao focar sua atenção mais no governo, procurando dissecar os problemas políticos e administrativos da Presidência de Jair Bolsonaro, a imprensa estaria fazendo o jogo dos inconformados e, no limite, prejudicando o País. É neste momento, portanto, que


ia da

Imprensa

se faz essencial relembrar qual é a serventia da imprensa em uma democracia. O escritor George Orwell, que entendia como poucos a essência do totalitarismo, dizia que, “se liberdade significa alguma coisa, significa o direito de dizer às pessoas o que elas não querem ouvir”. A imprensa estará cumprindo bem seu papel se mantiver em relação ao governo o distanciamento necessário para ter sobre ele uma visão questionadora e independente. É o que o Estado vem fazendo ao longo de sua história de 144 anos. Não se trata de fazer a crítica pela crítica, e sim observar se os princípios da boa administração e da boa política estão sendo respeitados, pois disso depende em grande parte a saúde da democracia. Por isso, nenhum governo pode ser tratado com condescendência pela imprensa. O escrutínio público dos atos de governantes em geral é o único antídoto eficaz para o autoritarismo. Sem essa fiscalização permanente, que é tarefa precípua do jornalismo sério, os cidadãos tendem a ficar no escuro a respeito de decisões que afetam o País e seu futuro. Sem informações críticas para aquilatar o trabalho das autoridades, os cidadãos podem se ver enredados quer pelo discurso oficial, quer

pela narrativa da oposição – em qualquer dos casos, alimentam-se o populismo e o extremismo, sem que o interesse nacional seja de fato atendido. Há quem diga que, a despeito de tudo isso, a imprensa deveria “colaborar” para que o governo seja bem-sucedido, pois disso dependeria a redenção do País. Essa colaboração se daria de duas formas: primeiro, por meio do reconhecimento das boas intenções do governo; segundo, por meio da crítica aos que estariam efetivamente prejudicando o País – nomeadamente os corruptos recalcitrantes. Ora, nesses termos não haveria mais a necessidade de uma imprensa livre; bastaria a propaganda oficial. Mas então não estaríamos mais numa democracia. Notas e Informações, O Estado de S.Paulo 30 de junho de 2019

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Para que serve a Marco Antonio Rocha A resposta pode ser curta ou longa. Ou grossa... Serve para as pessoas saberem do que se passa. Na sua cidade, no seu país ou no mundo. Até as pessoas que dizem que não interessa o que diz a imprensa, ou que não precisam saber do que a imprensa diz. Quando ficam sabendo de algo que lhes diz respeito, por outras pessoas que acompanham a imprensa (por exemplo, como vai ficar a minha aposentadoria?), imediatamente perguntam: como você tá sabendo disso? E ouvem: ué, você não viu nos jornais, não ouviu no rádio, não viu na televisão? Essa é a resposta curta à pergunta para o que serve a imprensa. A resposta longa é dada em muitos livros, por muitos professores e intelectuais, por bibliotecas inteiras, pois a imprensa é, além de tudo, uma fonte de distribuição de informação, de cultura, de confronto de ideias, de costumes e modos de vida entre todos os povos. E cada vez mais, graças à crescente amplitude, ao imediatismo e presteza dos canais de comunicação. Devido à imprensa, hoje em dia o inglês, por exemplo, passou a ser uma língua universal, que quase todos os humanos são capazes de usar, de entender e de se comunicar.

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Há apenas 50 anos atrás era muito menos compartilhada e nada impede prever que dentro de mais 50 anos toda a humanidade se entenderá e se comunicará num único idioma, um inglês universal, derrubando assim a bíblica torre de Babel que durante milênios dificultou a aproximação e o entendimento entre os povos. E não há dúvida que a imprensa, nas suas mais diversas plataformas, tem tido papel relevante da desbabelização da humanidade, no aumento da boa e correta informação sobre qualquer curiosidade humana, na disseminação da ciência como fonte principal de aquisição de conhecimento verdadeiro, sobrepujando as mitologias e as ideologias. A resposta grossa é aquela que todo mundo conhece e que muitos e muitos políticos, picaretas, aproveitadores, demagogos, todos os que fazem da ignorância (dos outros) e da inocência (de grande parte), seu trampolim para aventuras pessoais: “a imprensa só serve para a gente se limpar no banheiro”. O que seria dos cristãos em geral, católicos, protestantes, crentes, evangélicos, que ainda hoje disputam entre si a primazia do cristianismo e da fé em Jesus


a

Imprensa?

Christo, se não fossem os escritos transmitidos pelos 4 evangelistas – uma forma de “reportagem”, de imprensa da antiguidade, muito anterior à imprensa que conhecemos. Sim, e a eles podemos juntar os “contadores de histórias” das tribos primitivas que nos transmitiram informações e noções de como o mundo se formou e de como o homem surgiu, hoje em dia estudadas e analisadas por antropólogos. Sem esses mitos, reunidos e retransmitidos de geração em geração, desde que a escrita surgiu, como poderíamos ter noção da própria história da humanidade? No mundo moderno, é a imprensa que cumpre esse papel. É verdade que milhões de informações colhidas todos os dias por jornais, rádios, tevês etc, não chegam ao grande público, não são “aproveitadas”. Mas, as de maior interesse do público e para o público, ou para os públicos mais diversos, são sim “aproveitadas” e desse modo um rio ou curso de informação é diariamente distribuído por

toda parte. O efeito que isso tem tido no aperfeiçoamento, amadurecimento e engrandecimento moral de toda a humanidade ainda está para ser averiguado e estabelecido, se é que pode ser estabelecido. Mas, sem isso, ou seja, sem A IMPRENSA, no mais amplo sentido da palavra, no sentido de informação e de esclarecimento, o ser humano ainda estaria brandindo seu tacape e quebrando cocos, como na cena inicial de “2001-Uma Odisseia no Espaço”. E nem teria o fundo musical de Assim Falou Zaratustra, de Strauss, uma vez que as supostas palavras de Zaratustra só chegaram a Strauss através da Imprensa.

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LIVROS QUE NASCERAM NO JORNAL DA TARDE

O verbo feminismo Mario Marinho Sim, todos sabem que feminismo é um substantivo masculino, embora expresse um sentimento feminino. Mas a nossa Marli Gonçalves acha que o feminismo deveria ser um verbo. E ela tem razão. Afinal de contas, o verbo é uma palavra que exprime, por flexões, algumas categorias como o tempo (que identifica a ação, o processo ou estado em relação ao momento em que é enunciado), a pessoa (que indica aquele que fala, a quem se fala e de quem se fala), o número (que indica se há um ou vários sujeitos), a voz (que indica o papel agente, paciente ou ambos do sujeito na enunciação da ação), o modo (que indica a maneira de conceber e de enunciar o processo) e o aspecto (indica se a ação é habitual, momentânea, progressiva etc.). Sem contar que verbo é também o próprio Deus, segundo a acepção bíblica. “O verbo se fez carne e habitou entre nós”. É muita complexidade. Mas só tamanha complexidade para definir a complexidade que é a mulher – seus sentimentos, suas dores, suas alegrias, enfim, sua vida

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E toda essa complexidade está presente em “Feminismo no Cotidiano” que a Editora Contexto acaba de lançar. É só não é mais complexo porque o texto claro, luminoso, alumiante da Marli navega com facilidade e doçura nesse emaranhado de sentimentos. Vai mais além de conceitos e traz números da secular luta da mulher por seu espaço nesse mundo, pesado substantivo masculino. São números que ilustram essa luta desigual. São números, são informações seguras que Marli Gonçalves sempre trouxe em seus textos, em suas brilhantes reportagens dos tempos do saudoso Jornal da Tarde. “Feminismo no Cotidiano”, é bom que se avise, é livro para homens e mulheres, fêmeas e machos.


Fernando Portela, Mário Marinho, Luciano Ornelas, no lançamento

A Velha chama Os contos de Fernando Portela, por vezes, beiram o estranho, o fantástico, o bizarro. Em outras vezes, a maioria, na verdade, ultrapassa esses limites de gênero, brinca com as fronteiras entre a realidade prosaica, de personagens e pessoas cotidianas, e as lança por um universo, ao mesmo tempo, reconhecível e muito, muito estranho. No entanto, o mais bizarro é que reconhecemos estes personagens, sabemos que podem existir (ou que realmente existem e que estão ao nosso lado). Sabemos dele. Passear pelos contos de “A velha Chama e a Negra Solidão”, portanto, nos provoca uma primeira impressão de descoberta, de redescoberta, de reavaliação, de mundos (tanto no sentido literário quanto no pessoal). E, à cada página, esta sensação se renova, pois nunca sabemos o que acontecerá na próxima virada de parágrafo, muito menos aonde seremos levados. A escrita de Fernando Portela é tão poderosa que ficamos ansiosos para descobrir. No Jornal da Tarde, Fernando Portela recebeu o apelido de “Satã”.

Talvez pelo seu realismo satânico ou anterrealismo ou pós-realismo. Escolha. Nas primeiras páginas, Portela reconhece (ou avisa): “É dessemelhante, um pouco excêntrico”. Suas 216 páginas são divididas em quatro livro. Em cada um deles, um aviso, uma admoestação, um conselho. Livro 1: Engraçado quando Dizem “a realidade” Pensam Até que são reais. Livro 2: Acredite: o espetáculo Do invisível é deslumbrante. Para quem tem coragem. Livro 3: Não diga nada. Ou O mínimo. Um olhar vale mais Do que mil beijos. Livro 4: Dói me o Universo Inteiro: são amores, Maldições, lembranças Disparatadas.

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LIVROS QUE NASCERAM NO JORNAL DA TARDE N irlando em busca do tempo perdido Antônio Carlos Prado Um cachecol enrolado sobre outro cachecol, fisionomia construída intencionalmente triste, lá vai o moço mineiro de vinte anos de idade caminhando pelo centro de São Paulo, no rigoroso inverno de 1968 – rigoroso no clima, rigoroso na ditadura que esmagava o País, rigoroso em fazer cumprir um vendaval de mudanças nos costumes e na cultura em todo o mundo. Nas mãos, o moço leva, é claro, um livro do filósofo francês Jean-Paul Sarte – era moda; e no peito carrega paixões não correspondidas, nada grave, são paixões inventadas para não serem correspondidas mesmo – tanto que uma dessas amadas só poderia ser tocada se ele deslizasse as mãos sobre as telas dos cinemas Normandie ou Bretagne: tratava-se da atriz Anna Karina, no filme “Vivre sa vie”, de Jean-Luc Godard. O moço mineiro assistiu dezenove vezes a esse filme. No trapézio de sua alma uma história familiar balança ao fundo, e ele sabe disso, sabe que um dia irá ter de contá-la para alívio próprio. O que aos vinte anos o jornalista e escritor Nirlando Beirão não sabia, porque a ninguém é dado o dom de prever décadas à frente, é que ele seria o dono, trágica e tristemente, da definitiva definição de uma doença. Machado de Assis é insuperável ao retratar na literatura a psique feminina de sua personagem Capitu: “olhos de ressaca”. Nirlando Beirão, em seu décimo primeiro livro que está sendo lançado e se inti-

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tula “Meus começos e meu fim” (Companhia das Letras), cristalizou em palavras a doença degenerativa esclerose lateral amiotrófica, na qual os neurônios motores vão paulatinamente paralisando todo o corpo, à exceção dos olhos, mas a enfermo mantém-se lúcido. Sua sigla é ELA, não tem tratamento nem cura. É fatal. Nirlando arrasou: “(…) tenho o duvidoso privilégio de chorar a minha própria morte”. O avô padre Com licença de usar uma expressão que nomeia a mais célebre obra de Fernando Sabino, o nosso personagem tinha um “encontro marcado” com o contar, como o faz agora em “Meus começos e meu fim”, a história que marcou a sua infância, comentada pelos entes familiares adultos “entre sussurros e culpas”. Nirlando cria ótima imagem: “uma história eivada de tabus e silêncios”. E complementa: “o livro não é e nem pretende ser uma autobiografia nos moldes tradicionais”. Que história é essa? É o amor de seu avô por sua avó. Qual era o problema? Por que os sussurros? Porque o avô… era padre. Padre Beirão, colega de seminário, na cidade portuguesa de Viseu, daquele que se tornaria um dos maiores ditadores do país: António de Oliveira Salazar. Padre Beirão e sua esposa, avô e avó de Nirlando, emigraram para o Brasil e desembarcaram em Minas Gerais em 1915. O livro estava começado quando em 2016 veio o diagnóstico de ELA. Ao recebê-lo, escreve Nirlando, “a consciência piscou”. Mais:


“degenerativa é uma palavra que tira você para dançar – uma dança de medo”. Como não incluir a sua enfermidade no livro que já estava escrevendo? “Pensei em misturar a história antiga com minha condição atual. Tinha dúvidas se ia rolar”, explica ele. Pois é, rolou, e rolou com maestria, a mesma maestria que fez de Nirlando um dos mais consagrados textos do jornalismo brasileiro. No livro, no entanto, o texto de Nirlando é Nirlando elevado a Beirãonésima potência. É Marcel Proust sem choramingo. Nirlando é Proust apressado – e nem poderia ser diferente, desculpem a melancolia, mas é o autor mesmo quem diz que tem pressa. Há, porém, passagens engraçadas, tristemente engraçadas, e tal sentimento ambíguo é possível, já dizia Tom Jobim: “há textos que riem e choram aos mesmo tempo”. Vamos a uma passagem: Nirlando mora no bairro de Higienópolis, um dos mais nobres paulistanos, e nele o cadeirante Zé Cláudio é amigo de todos devido ao seu alto astral. Zé Cláudio tem uma cadeira com guarda-chuva acoplado, toda incrementada, e vende balas nos semáforos. Nirlando e ele conversavam sempre de forma camarada. Amigos! Irmãos! Zé Cláudio é santista, Nirlando, corintiano, e ambos se provocavam futebolisticamente. Quando Nirlando teve de começar a sair de casa em cadeira de rodas, Zé Cláudio brincava: “bem vindo ao clube”. Nirlando o amava e o ama ainda mais. O livro é fado O desfecho do amor proibido do avó padre, isso eu deixo, é claro, para o leitor – quem conta fim de livro tem caráter duvidoso. Dou a garantia de que vale a pena viajar ao passado com o autor, e sabe disso quem o conhece do jornalis-

mo: Nirlando trabalhou nas principais redações do País, entre elas as revistas “Senhor”, “ISTOÉ/Senhor” e “Status”, publicadas pela Editora Três. Chegou a São Paulo em 1968, da sucursal mineira do jornal “Última Hora” diretamente para o Jornal da Tarde que, aos dois anos de idade, ainda engatinhava. Livros, são muitos e diversos, e um dos principais é “Meus 405 dias ao lado de Ayrton Senna”, em parceria com Adriane Galisteu. Como jornalista, ele ainda não conseguiu dar a notícia que tanto deseja: “acabou A Voz do Brasil”. Como escritor, em seu livro que desembarca nas livrarias, o autor arrola alguns arrependimentos – também não os conto para não desmanchar o prazer do leitor. Mas assinalo duas coisas: a primeira é que espero, de coração, que o neto do padre Beirão tenha devorado muitos embutidos, como disse, certo dia, que gostaria de devorá-los. A segunda questão é que, vez por outra, ele colocava na cabeça intrincadas indagações, e numa delas remeteu-se até ao “O Alienista”, de Machado de Assis: Nirla, como é chamado pelos amigos, ficou matutando qual Brasil é real e qual Brasil é enganoso, qual Brasil é sério e qual Brasil não consegue sê-lo. Se chegou ou não à conclusão, juro que isso, machadianamente, ele não contou a ninguém. Voltando aos arrependimentos, quem nos mostra Portugal da forma que Nirlando descortina o país não tem de se arrepender de nada. Sua missão era escrever o atual livro e isso ele o fez. Livro que, aliás, não é livro. Não é texto. É fado. Antonio Carlos Prado Ribeiro, da IstoÉ, começou sua carreira no JT.

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LIVROS QUE NASCERAM NO JORNAL DA TARDE

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Como se fossem as Tábuas da Lei, Moisés (o Rabinovici) guardou cuidadosamente as origens do Jornal da Tarde. Nestas duas páginas estão a formação inicial do Jornal da Tarde, em dezembro de 1965.

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LIVROS QUE NASCERAM NO JORNAL DA TARDE

Cadê a tecla “de Moisés Rabinovici “JT Sempre” é um título perfeito para explicar o livro que estou lançando nesta quinta-feira, 1° de agosto – “Escritos com a Pele”. Ouso dizer que os 50 nomes (comigo, 51) nas duas laudas amarelecidas da “certidão de nascimento” do Jornal da Tarde, com data de dezembro de 1965, são meus co-autores. Os que vieram depois, até a “certidão de óbito”, a edição de 31 de outubro de 2012, seriam cúmplices. É que me considero um resultado da Escola JT. Quantas vezes aprendi reescrevendo meus textos a mando do chefe de reportagem Ulysses Alves de Souza? Quanto me ensinou o brilhante repórter Hamiltinho de Almeida? Quem ainda acha que só havia um único “lauda 1” na redação do JT está enganado. Passei madrugadas inteiras diante da máquina de escrever sem completar o primeiro parágrafo. Numa noite, travado, Mino Carta me perguntou: “Mas qual o problema?” Ouviu o que eram justificativas para uma reportagem empacada, e apenas aconselhou: “Ora, comece pelo que mais o impactou”. A lição ainda é atual, 54 anos depois. Um dia, em novembro de 1977, Murilo Felisberto me perguntou se eu toparia ir para Israel, “e esperar a paz”. O presidente egípcio Anuar Sadat faria uma histórica visita

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a Jerusalém, derrubando tabus, muros de ódio e enfrentando a fúria do mundo árabe. A percepção ou fantasia era a de que o Oriente Médio poderia viver feliz para sempre. O Grupo Estado não tinha mais correspondente em Tel Aviv depois da saída de Nahum Sirotsky, que também escrevia para o JB sob pseudônimo e era adido cultural da embaixada do Brasil. Lá fui eu com a minha Olivetti portátil. Poderia estar até hoje esperando a paz. Só houve acordo com o Egito e a Jordânia, e não com os palestinos, contra os quais Israel invadiu o Líbano duas vezes. Cheguei a Beirute em 1982, na retaguarda das forças israelenses. E fui para o lado muçulmano da cidade. Para atender os enviados dos jornais do mundo todo, foi montado um centro de imprensa em Ba’abda, perto do palácio do governo e embaixada do Brasil. As regras: meia hora para cada correspondente, pela ordem de fuso horário. Assim, os europeus tinham prioridade, porque corriam contra o tempo. Brasileiros, não, estávamos com seis horas a favor. Meia noite no Líbano era ainda 18 horas em São Paulo. (Fofoca: uma vez cedi meu lugar na fila do telex a um coleguinha que sentia urgência em responder à queixa de seu editor, contrário ao uso da expressão “evacuação


eletar”? de Beirute”, traduzida do inglês withdraw. “Os leitores da Baixada Fluminense”, dizia ele, “vão pensar que a guerra aí é por causa de esgoto”. Quando o amigo acabou, um atentado no gerador do centro de imprensa desligou a energia. Tive que viajar hora e meia até a fronteira para transmitir.) Não houve um único dia que deu para escrever na Olivetti e depois só copiar no telex. Não, sentava diante da máquina, ligava-a com a redação em São Paulo, e ia dedilhando. Telex não tem os recursos de um computador, como tecla para deletar, voltar atrás, copiar e colar, nem acentos nem cedilha. Escrevia-se “com a pele”. Os comandos partiam direto do cérebro para os dedos, sem nenhuma escala em algum departamento de maquiagem. A primeira noite foi horrível. Saí do telex com a sensação de que transmitira o pior texto da minha vida. Bons aqueles tempos em que poderia ficar na lauda 1 a madrugada inteira! Mas aconteceu que recebi um elogio pelo que enviei, o resumo do meu dia de combates aéreos entre Israel e Síria, e a caça diária a Yasser Arafat. Chegava ao fim algo em mim: a obsessão pelo

perfeccionismo. Esta é a origem de Escritos com a Pele, a reunião de textos do Líbano que marcaram a transição entre o que eu era e o que sou desde então, mas ainda atuais pelo valor histórico. Foi o meu batismo de fogo. Uma evolução, mas JT sempre.

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Brasil está entre os que mais confiam na imprensa, aponta pesquisa Ipsos A pesquisa Trust in the Media, confiança na mídia, realizada em 27 países pela Ipsos, mostra o Brasil empatado com a Alemanha como o terceiro país em que mais se confia na imprensa. Índia e China lideram. Dos 1.000 brasileiros adultos que participaram do levantamento, realizado em janeiro e fevereiro, 65% responderam confiar em jornais e revistas, o mesmo percentual para emissoras de televisão e rádio. Sites de notícias vieram a seguir, com 58%. Os indianos apresentam o maior percentual de confiança na imprensa (77%), seguidos dos chineses (67%). Depois de brasileiros e alemães, vêm sul-africanos (64%), malaios e canadenses (62% em cada um dos dois países). Na média dos 27 países, 47% confiam em jornais e revistas, 65% em televisão e rádio e 58% em sites. A margem de erro para a pesquisa no Brasil é de 3,1 pontos percentuais. 16


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