A SBAT, pioneira dos direitos autorais no Brasil e símbolo do teatro brasileiro, se renova a partir de sua vocação cultural.
Laboratório de Dramaturgia SBAT Primeiro ano de atividades: • oficinas e palestras • leituras dramatizadas • estudo de grandes obras no idioma original Estímulo, discussão e reflexão sobre a dramaturgia nas artes cênicas, cinema, televisão e outras mídias.
Desde 1917 em defesa do direito autoral. Reconhecida como de Utilidade Pública Federal pelo Decreto nº 4.092 de 4 de agosto de 1920.
Av. Almirante Barroso, 97 / 3º andar – Castelo Cep: 20031-005 – Rio de Janeiro/RJ – Brasil Tels: +(21) 2240.7231 / 2544.6966 Fax: +(21) 2240.7431 www.sbat.com.br
sumário 2
Aderbal Freire-Filho
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O Rio de Antunes Encenador busca inspiração em Carmen Miranda, Lamartine Babo e Lima Barreto para trilogia carioca
CONSELHO DIRETOR
Aderbal Freire-Filho Alcione Araújo Millôr Fernandes Ziraldo Alves Pinto
PRÓLOGO
Daniel Schenker
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Ilustres discípulos de Antunes Daniel Schenker
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Naum Alves de Souza assina versão musical de seu célebre texto, concretizando projeto formulado com o maestro Marcos Leite
revistadeteatro@sbat.com.br bambinacult@gmail.com Órgão Oficial da SBAT – Sociedade Brasileira de Autores, inscrito na Ulrich’s International Periodicals Directory sob o registro ISSN 0102-7336.
Aurora ao sabor da canção Daniel Schenker
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CONSELHO EDITORIAL
O palco da rua Alcindo Guanabara Teatro Dulcina, antigo Regina, reabre no Centro depois de uma trajetória marcada por encenações históricas e pelo amor da atriz à arte dramática
Aderbal Freire-Filho Ana Velloso Regina Zappa Vera Novello
Marina Gadelha
SUPER VISÃO
Três É Editoração e Design Ltda. DIREÇÃO EXECUTIVO FINANCEIRA
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Bia Gondomar
Empresta-me teus olhos Alcione Araújo
EDIÇÃO
Regina Zappa
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COLABORADORES
Alcione Araújo Daniel Schenker Lula Marina Gadelha Maria Luiza Franco Renato de Aguiar Rodrigo Dourado
Rodrigo Dourado
34 DEBATES NA SBAT Luzes sobre a nova dramaturgia Daniel Schenker
PESQUISA ICONOGRÁFICA
Maria Luiza Franco
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REVISÃO
Maria Helena Pereira PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO
Mais Programação Visual
Montagem com fotos de Emídio Luisi CTP E IMPRESSÃO
WalPrint Gráfica e Editora TIRAGEM
5.000 FOTOS DE ACER VO CEDIDAS PELA
Discutindo a relação Maria Luiza Franco
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www.maisprogramacao.com.br CAPA
O palco da subversão pernambucana: Grupo de Teatro Vivencial e a cena tropicalista
Conhecimento que ilumina o presente Daniel Schenker
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Texto, um assunto polêmico Daniel Schenker
42 ENSAIO Teatro Casa Grande, 45 anos do lugar da utopia Maria Luiza Franco Busse
50 OSSOS DO OFÍCIO “Trabalhar em teatro é ter liberdade” Recursos obtidos através do Convênio nº 732974/2010, celebrado entre o Ministério da Cultura e a Bambina Ação Cultural Associados Esta edição traz um encarte com a peça Cineteatro Limite, de Pedro Brício.
Camareira há 22 anos, a paixão de Arminda Farley por seu trabalho só se iguala ao amor pelo Fluminense Marina Gadelha
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P R Ó L O G O
Mestre Antunes Filho. Pronto, já disse tudo sobre este número da Revista da SBAT. Talvez seja o caso de dizer um pouco mais sobre a SBAT. Digo, a nova SBAT, porque dizer SBAT também já é dizer tudo sobre o teatro brasileiro. Disse, dizer, digo, dizer, dizer, estou abusando do verbo, digo, do verbo dizer, não do verbo, da palavra. Que, pelo contrário, estou economizando, uma vez que repito muitas vezes a mesma. Botando ordem nesse começo de prólogo (começo de prólogo? começo de começo? não soa estranho?). Um pouco mais sobre a nova SBAT: esta que sempre foi a casa do autor brasileiro e que foi pioneira em muitos sentidos, é avançada hoje também, quando amplia o sentido de autor e, abrindo suas portas, sabe que é a casa do artista brasileiro de teatro. Não que deixe de abrigar os dramaturgos, como sempre fez. Aqui eles podem viver, sonhar, conversar sobre os que saíram, apostar que vão voltar, daqui a um mês, semana que vem, daqui a um ano, mas vão voltar, todos vão voltar, a volta do dramaturgo pródigo. Mas aqui também são bem-vindos os novos dramaturgos, digo (olha o verbo aí de novo) não só os jovens autores que estão escrevendo a assim chamada “nova dramaturgia”, como os artistas que constroem uma dramaturgia da cena. Sejam eles autores de espetáculos que partem das mais diversas origens – exemplifico aqui com a dramaturgia de Eugenio Barba, do Odin Teatret – ou artistas que fazem “montagens” a partir de textos dramáticos ou narrativos – lembro o polonês Warlikowski, “montando” com inserções várias, poemas, textos etc., Um bonde chamado desejo, que nem por isso deixa de ser de Tennessee Williams, ou “montando” um espetáculo com uma peça de Bernard Marie-Koltés, um conto de Kafka e um romance de Coetze.
CORREÇÃO 1 No encarte da Revista de Teatro
Mania de falar de estrangeiros! Podia ficar aqui com os autores Christiane Jatahy, Kike Diaz e muitos outros. Não vou à Oropa e França antes de ir a Bahia por vontade própria, mas para acalmar alguns críticos colonizados que aceitam melhor o que sabem que é feito nessas terras distantes do Kaisalemão, entre a Turquia e o Ceará, citando de memória o mestre Suassuna, o grande Ariano caboclo. Se o teatro é reinventado a cada dia – desde Brecht? Desde que o cinema existe? Desde Shakespeare? Desde sempre? – uma sociedade de autores não pode ficar parada em conceitos rígidos. Nem mesmo, e principalmente, em conceitos rígidos de autores. Sociedade Brasileira dos Autores/Artistas Todos, SBAT.
da SBAT nº 525 publicamos a peça A Revolução na América do Sul de Augusto Boal. Informamos que esta peça só pode ser representada, no todo ou em parte, seja por que processo for, mediante a autorização expressa dos herdeiros e representantes legais da obra do autor.
2 Na Revista de Teatro da SBAT nº 526, o espetáculo registrado na foto da página 10 é o Theatro Musical Brazileiro II (1914 a 1945), de Luis Antônio Martinez Corrêa, com Lícia Manzo, Márciah Luna Cabral e Maria Sita.
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Então, mestre Antunes Filho. A matéria de capa da Revista da SBAT é dedicada à trilogia carioca desse artista maior do teatro brasileiro, encenador, autor, formador de várias gerações de atrizes e atores, reconhecido internacionalmente. Um mestre é muitos, é múltiplo, tem muitas formas, como um mito. Cada um de nós, seus admiradores, nos relacionamos com uma dessas formas do mestre-mito. Antunes Filho é muitas vezes representado por uma imagem que se forma a partir de Macunaíma. Eu o vejo iluminado já por sua presença anterior no teatro brasileiro, Bonitinha, mas ordinária (ouço meu amigo Nelson Caruso, ator com Mirian Mehler e Fregolente nessa montagem,
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falando dela com um entusiasmo que compreendi inteiramente quando vi o espetáculo), Ricardo III, tantos Antunes... Uma comprovação de que estamos falando de um mestre é a existência de epígonos que se inspiram na sua obra para criar obras novas. E aqui estão alguns ilustres discípulos do mestre, também vistos por Daniel Schenker. Este número da revista traz também uma reportagem sobre uma obra de outro mestre do teatro brasileiro, Naum Alves de Souza. Ouvi de um louco que o mundo é formado de coincidências e não de água, como queria Tales de Mileto. Este número da revista ajuda a comprovar a tese, juntando, por coincidência, Antunes e Naum. Naum foi responsável por grande parte do impacto de Macunaíma no teatro brasileiro como seu diretor de arte, criador das imagens fortes, que vestiram o espetáculo magistral. A reportagem que trazemos aqui é sobre Aurora da minha vida, outro marco do teatro brasileiro. Aurora tem agora uma versão musical, composta pelo próprio Naum e por Roberto Gnattali, a partir de uma proposta original e de um núcleo de composições do saudoso e querido maestro Marcos Leite. E assim é enriquecido o teatro musical brasileiro, autenticamente brasileiro, maravilhosa Aurora, maravilhoso teatro musical brasileiro, que não quer copiar ninguém, só quer mostrar que dá samba também. Minhas poucas palavras aqui sobre a nova SBAT são uma modesta introdução a um acontecimento maior que está reportado também neste número: o Fórum de Debates, realizado em junho, na histórica sede da Sociedade. Ali Alcione Araújo falou com muito mais propriedade sobre a criação no e do palco. E Moacyr Góes, Marcílio Nogueira, Naum Alves de Souza, Roberto Guimarães, Tânia Brandão, Moacir Chaves, Patrick Pessoa, Vera Novello, Henrique Tavares, Renata Mizrahi, Diego Molina ofereceram vários pontos de vista para ampliar o olhar sobre o teatro contemporâneo, seus autores, seus artistas. Um acontecimento marcante, que a revista, através dos seus atentos colaboradores, leva adiante. E tem muito mais este número. Os destaques que faço aqui são justos. Mas podia dedicar este prólogo, em primeiro lugar, com igual justiça, à matéria sobre a história de resistência do Teatro Casa Grande. Ao texto de Rodrigo Dourado sobre o Grupo Vivencial, de Pernambuco. À mestra das camareiras, querida Arminda. A esse acontecimento tão auspicioso que foi a reabertura do Teatro Dulcina. Ao encontro dos grandes atores Mauro Mendonça e Alexandre Borges. Alcione Araújo, na sua sábia crônica, partindo de Pirandello, nos fala das muitas pessoas que somos. Hoje, levantei, tomei café (digo, chá), reli as provas da revista, fiz meus exercícios matinais, digo (!), exercícios de admiração, e eles seguiram o rumo em que aparecem aqui. Outro dia, como quando alternamos a ordem de nossos exercícios físicos, ou a ordem da nossa caminhada na praia (para o Leblon ou para o Arpoador), ou a ordem do nosso olhar, mudaria talvez o rumo, sem mudar as admirações. Aderbal Freire-Filho
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O Rio de
Antunes Encenador busca inspiração em Carmen Miranda, Lamartine Babo e Lima Barreto para trilogia carioca
Antunes Filho retoma características marcantes de sua trajetória como encenador, ao mesmo tempo em que revela disposição para continuar surpreendendo. A trilogia que traz ao Rio de Janeiro – formada pelos espetáculos Policarpo Quaresma, Foi Carmen e Lamartine Babo – espelha sua inquietação. São trabalhos que evidenciam a conexão do diretor com o texto brasileiro, comprovada em diversas encenações realizadas ao longo das últimas décadas. E atestam a determinação em não apresentar leituras tradicionais, e sim obras que resultam de operações sobre o material original. Em relação às montagens que desembarcam no Rio, Antunes se debruçou sobre a obra de Lima Barreto em Policarpo Quaresma; evocou Carmen Miranda através da ligação com o butoh em Foi Carmen; e assinou o texto de Lamartine Babo. Paulistano, Antunes volta-se para o Rio de Janeiro nessa trilogia, em cartaz no Teatro Nelson Rodrigues, patrocinada pela Caixa Cultural e pelo governo federal,
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e viabilizada graças à iniciativa da Casa das Artes de Laranjeiras (CAL). “Fiquei amigo de paulistas, como Vianninha, no Rio”, relembra, acerca de um dos mais importantes dramaturgos do país. Antunes dirigiu, inclusive, montagens de textos de Oduvaldo Vianna Filho, como Corpo a corpo e Nossa vida em família. O Rio é a cidade onde Lima Barreto e Lamartine Babo nasceram. Já Carmen Miranda era portuguesa de Marco de Canaveses, mas tornou-se símbolo da brasilidade, tema caro ao diretor. “Eu gosto das coisas do Brasil, onde nasci. É minha vida, minha gente”, afirma Antunes. Por meio das figuras de Carmen Miranda e Lamartine Babo e do personagem-título de Lima Barreto, Antunes Filho reflete sobre a brasilidade. Celebrada como grande cantora, com passagens pela rádio Mayrink Veiga e pelo Cassino da Urca, Carmen enveredou pelo cinema e migrou para os Estados Unidos, o que lhe valeu duras críticas na volta. Lendário compositor, Lamartine alcançou consagração com marchinhas carnavalescas eternizadas no tempo. E Lima Barreto criou, em 1911, a figura ufanista de Policarpo Quaresma, incansável na sua determinação de louvar o Brasil a qualquer custo. Policarpo levou Antunes a “presentificar” sua infância e seu processo de formação artística. “Desde menino, vejo cinema e teatro. Assisti a Procópio, Bibi, Dulcina, Colé, Oscarito, até Vicente Celestino. Esse trabalho, concebido a partir de Lima Barreto (Triste fim de Policarpo Quaresma), foi inspirado na minha infância, quando acompanhei o teatro antigo, o circo”, disse. Não houve qualquer intenção de biografar Carmen ou Lamartine, este evocado a partir de uma situação-base lançada por Antunes: a visita de um senhor e sua sobrinha a uma banda que ensaia as músicas de Lamartine. Além de experimentar a função de autor teatral, Antunes entregou a direção do espetáculo a
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“O ator precisa de pouca energia, mas direcionada. É um desperdício trabalhar sem técnica” Lamartine Babo
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Emerson Danesi, ator do Centro de Pesquisa Teatral (CPT), numa proposta de descentralização praticada anteriormente através do projeto Prêt-à-porter, no qual se “limita” a coordenar o processo de escrita e preparação de cenas pelos próprios atores. Em Foi Carmen, Antunes se volta para o imaginário popular que surgiu em torno do mito de Carmen Miranda. Uma menina antecipa seu sonho de um dia ser artista. Três senhoras participam dessa premonição. Ela descobre um turbante numa caixa, veste-o e encarna seu futuro ídolo. De repente, a menina se dá conta de que tudo foi uma ilusão, tudo se dissipou. Parte do espetáculo é falada em fonemol, língua fictícia articulada em trabalhos anteriores, como Nova velha história e Drácula e outros vampiros. “Dá para entender o fonemol quando há sentimento. A fala deve surgir de uma necessidade”, afirmou. É notável a inspiração em Kazuo Ohno, mestre do butoh, a dança do renascimento do pós-Hiroshima e Nagasaki, norteando o projeto. “Mas nesse retorno a Foi Carmen, investi na brasilidade”, salientou. Apresentada no Rio de Janeiro, em 2005, juntamente com O canto de Gregório e Fragmentos
Lee Thalor em Policarpo Quaresma
Lee Thalor e Patricia Carvalho em Foi Carmen
FOTOS: EMÍDIO LUISI
troianos, Foi Carmen se inscreve na lista de trabalhos revisitados por Antunes. “É a chance de investir no amadurecimento”, observou Antunes, que vem aperfeiçoando o método de atuação junto aos atores do CPT, descrito no livro Hierofania: o teatro segundo Antunes Filho, de Sebastião Milaré. “O ator precisa de pouca energia, mas direcionada. É um desperdício trabalhar sem técnica”, acrescentou. No decorrer de sua carreira, Antunes realizou novos espetáculos a partir de textos que já tinha encenado. Montou, em sequência, duas versões de Medeia, tragédia de Eurípedes. Retomou Vereda da salvação, peça de Jorge Andrade centrada na escalada de fanatismo vivenciada por colonos esquecidos no interior do Brasil. Rendeu um espetáculo excepcional, potencializado pelas interpretações de Luís Melo e Laura Cardoso, pela cenografia de J.C. Serroni, formada por troncos de árvore sem copas e pela própria releitura do diretor. “Quis homenagear Jorge Andrade, que continua esquecido. Talvez por ser sério demais”, disse Antunes, que encenou o texto na fase final do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), em 1964. Mais recentemente, Antunes assinou uma nova versão de A falecida, intitulada Falecida vapt-vupt, peça que levou ao palco em 1965. Uma experiência que, assim como a de Vereda da salvação, comprova seu vínculo com a dramaturgia nacional. Em especial, com a obra de Nelson Rodrigues, abordada nas encenações de Bonitinha, mas ordinária, Nelson Rodrigues – O eterno retorno (depois condensada em Nelson 2 Rodrigues), Paraíso Zona Norte e Senhora dos afogados, além da adaptação de Vestido de noiva, na TV Cultura. O título da nova Falecida parece sintetizar uma determinação do encenador em ajustar ao ritmo dos dias que correm. “Não é difícil
Laura Cardoso e Luís Melo em Vereda da salvação
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“Fui abolindo a cenografia, ficando com o necessário. Quero valorizar o jogo entre os atores, o jogo de amarelinha, os desafios. Quanto menos cenografia houver, mais o espectador projetará sua imaginação em cena”
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entrar em sintonia com o tempo de hoje porque somos massacrados. Não há como resistir”, constata. Antunes procura ainda firmar elo com uma tendência contemporânea – a da desconstrução da obra –, presente, porém, em seu teatro há bastante tempo. Basta lembrar de Macunaíma, releitura do romance homônimo de Mário de Andrade, que gerou o texto de Jacques Thiériot, divisor de águas no teatro brasileiro. “Busco a desconstrução como diálogo positivo com a obra. Na verdade, é algo que sempre procurei. (Hans-Thies) Lehmann cita a encenação de Macunaíma ao abordar o teatro pós-dramático. Nem se pensava nisso na época, e sim na afirmação de uma estética”, observa Antunes sobre o espetáculo com atores do Grupo Pau-Brasil (rebatizado, logo após, de Macunaíma). Estética é um termo amplo, mas num sentido mais restrito pode-se dizer que a do teatro de Antunes mudou. A partir das cenas do Prêt-à-porter e do mergulho nas tragédias gregas, o diretor tratou de reduzir em parte considerável o aparato cênico. “Fui abolindo a cenografia, ficando com o necessário. Quero valorizar o jogo entre os atores, o jogo de amareli-
PAQUITO
Drácula e outros vampiros
EMÍDIO LUISI
Macunaíma
Antígona
EMÍDIO LUISI
nha, os desafios. Quanto menos cenografia houver, mais o espectador projetará sua imaginação em cena”, garante Antunes, que, nos anos 1990, deslumbrou retinas com os aquários de Gilgamesh. A desconstrução não deve, portanto, ser percebida como desvalorização do texto. Até porque Antunes Filho fermentou sua carreira no contato com obras de inestimável valor, tanto no repertório brasileiro quanto no internacional. Foi assistente com os diretores estrangeiros que desembarcaram no Brasil e trabalharam no TBC, em especial com Adolfo Celi. Ingressou no Teatro Íntimo Nicette Bruno e fundou o Pequeno Teatro de Comédia – montando Plantão 21, de Sidney Kingsley, e Sem entrada, sem mais nada, de Roberto Freire – e o Teatro da Esquina – onde encenou A megera domada, de William Shakespeare, Black-out, de Frederick Knott, e A cozinha, de Arnold Wesker. Conduziu Maria Della Costa em Bodas de sangue, de Federico García Lorca, e Tome conta de Amelie, de George Feydeau. Antes de aderir de maneira contundente ao trabalho em grupo – primeiro com o Pau-Brasil/Macunaíma, depois no CPT –, Antunes esteve à frente de uma importante versão de Esperando Godot, de Samuel Beckett, interpretada por atrizes (Lelia Abramo, Eva Wilma, Lilian Lemmertz e Maria Yuma). No início dos anos 1960, fez um estágio com Giorgio Strehler, no Piccolo Teatro de Milão. “Assistia aos ensaios dele de peças como A visita da velha senhora e Ópera dos três vinténs”, lembra, acerca dos textos de Friedrich Dürrematt e Bertolt Brecht, respectivamente. “Convivi com grandes atores e diretores, o que gera em mim uma certa melancolia. É uma alegria ter vivido tudo aquilo. E é triste que tenha passado”, concluiu.
DIVULGAÇÃO
GABRIEL CABRAL
Paraíso Zona Norte
Senhora dos afogados
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ILUSTRES
DISCÍPULOS DE ANTUNES Daniel Schenker
Vários atores não só trabalharam com Antunes Filho como foram formados por ele, antes e depois do surgimento do CPT, em 1982. Laura Cardoso estreou no teatro em montagem dirigida por Antunes – Plantão 21, em 1959. Marcos Oliveira e Cacá Carvalho se impuseram com força na época de Macunaíma, espetáculo que também projetou Giulia Gam. Luís Melo tornou-se o ator principal de determinada fase do CPT, marcadamente entre as encenações de Paraíso Zona Norte e Gilgamesh. Juliana Galdino sobressaiu no período em que o diretor mergulhou nas tragédias gregas e no projeto Prêt-a-porter. “Considero Antunes um gênio. Nós nos conhecemos na TV Tupi de São Paulo. Eu estreei com ele no teatro”, relembrou Laura Cardoso. Décadas depois, voltaram a trabalhar juntos na encenação de Vereda da salvação. “Foi um
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processo intenso. Tínhamos muitas horas de ensaios, exercícios. Ficávamos no teatro o dia inteiro. Lembro que, num dado momento do espetáculo, ele pediu para eu falar com uma voz aguda, distante do meu registro natural. Experimentei várias vezes até acertar o que ele buscava. Com o passar do tempo, percebi que continuava bastante sério, ainda que um pouco mais doce”, disse Laura. A parceria entre Antunes e Luís Melo começou na encenação de A hora e a vez de Augusto Matraga, de João Guimarães Rosa. “Eu já tinha tentado entrar para o CPT, mas Antunes não queria atores de fora de São Paulo”, relembrou Melo, que morava em Curitiba. “Viajei para o Rio de Janeiro e São Paulo com a encenação de Gritaria nos muros da cidade”, afirmou, citando a peça de Tankred Dorst. “Antunes precisava de um ator para Augusto
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Matraga e Ademar Guerra me indicou”, continuou Luis Melo, que interpretou Joãozinho Bem Bem e outros personagens. “Aprendi a ser coadjuvante para depois ganhar mais destaque”, acrescentou Luís Melo, que participou da remontagem de Macunaíma. “Fiz Xica da Silva e, logo após, Antunes desestruturou o grupo. Na sequência, me chamou para Paraíso Zona Norte. Foi quando comecei a protagonizar”. Ele manteve o posto em Nova velha história, espetáculo oriundo da fábula de Chapeuzinho Vermelho e falado em fonemol; Trono de sangue, versão de Macbeth, de William Shakespeare; Vereda da Salvação e Gilgamesh. Cada espetáculo trouxe desafios diferentes. “O fonemol não poderia parecer com inglês, francês, russo, árabe ou espanhol. Nós nos valemos dessa língua fictícia para libertar a palavra
estava começando a ensaiar Fragmentos troianos. Participou das encenações das tragédias gregas e das cenas contemporâneas do Prêt-à-porter (do 3 ao 7). “Apesar dos universos bastante distintos, as tragédias e as cenas do Prêt-à-porter se encontravam na defesa de um teatro essencial, que valoriza a presença do ator. Na experiência do Prêt-àporter, o objetivo é afastar o ator dos padrões viciados de comportamento contemporâneo, para deixar vir à tona o comportamento exemplar. É o lugar da não máscara. Eu posso querer dizer algo diferente do que digo, ao
CARLOS RENNÓ
de seu significado literal, explorar suas sonoridades, estabelecer uma estranheza. Queríamos abrir a palavra, esgarçá-la”, salientou Melo, que transitou do fonemol para a importância do verbo de Shakespeare. “Ensaiamos Trono de sangue em língua inventada”, afirmou. Luís Melo acompanhou de perto o desenvolvimento do método de Antunes em relação aos atores. “Ele deu partida a uma pesquisa sobre o desequilíbrio como expressão. Investia numa fase de aprimoramento intelectual para depois desestabilizar o ator, para que encontrasse outro tipo de sensibilidade, afastando-o da esfera racional”. O ator viu nascerem projetos que só seriam desenvolvidos muito tempo depois. Na época de A hora e a vez de Augusto Matraga, Antunes pensou em encenar A pedra do reino, de Ariano Suassuna, projeto que seria viabilizado bem mais adiante. Depois de Trono de sangue, tentou enveredar pelas tragédias, jornada que também não aconteceria naquele momento. “Quase interpretei Medeia”, disse Melo, que participou ainda da semente do projeto Prêt-à-porter. “Aos sábados de manhã fazíamos cenas naturalistas abertas ao público. Tínhamos uma semana para prepará-las e costumávamos buscar inspiração em contos de autores como Anton Tchekhov e Katherine Mansfield. Eram improvisos ensaiados. Virou um sucesso. Antunes queria o ator-criador e não o que executa bem”. Juliana Galdino entrou no CPT em 1999, quando Antunes
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contrário das personagens trágicas, que não têm esse tipo de expediente”, comparou Juliana, que ganhou o Prêmio Shell por seu trabalho em Medeia 2. Como Luís Melo, Juliana Galdino acompanhou o desenvolvimento do método de Antunes, em especial no que se refere à partitura vocal. “Antunes se utilizou da tragédia para re-significar o lugar comum através da voz. Os tons e a cadência que imprimo são camadas que dão sentido ao papel”, sublinhou Juliana, que participou ainda das montagens de Antígona, O canto de Gregório e Foi Carmen.
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CLAUDIA RIBEIRO
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Naum Alves de Souza assina versão musical de seu célebre texto, concretizando projeto formulado com o maestro Marcos Leite Texto doce-amargo, de natureza memorialista, A aurora da minha vida reviverá nos palcos. Mas Naum Alves de Souza não se “limitou” a investir em nova montagem tradicional. Ele concretiza um projeto de anos, concebido em parceria com o maestro Marcos Leite: o de partir para uma versão musical do texto, escrito há pouco mais de 30 anos, que rendeu os prêmios APCA e Molière de melhor autor, em 1981. “A ideia da Aurora... musical nasceu na fervilhante cabeça de Marcos Leite. Pretendíamos transformar a peça numa verdadeira ópera, inteiramente cantada. Mas não tivemos recursos financeiros para uma dedicação exclusiva ao projeto, que acabou engavetado durante anos. Leite morreu sem saber que um dia, com sua imagem na cabeça, retomaríamos a empreitada graças aos cuidados da maestrina Regina Lucatto, sua esposa e parceira musical”, conta Naum, que assina a direção do espetáculo, no teatro Sesc Ginástico, com elenco formado por Ana Velloso, Ester Elias, Helga Nemeczyk, Vera Novello, Andre Dias, José Mauro Brant, Thelmo Fernandes e Victor Maia. O maestro Roberto Gnattali, que havia participado do primeiro projeto com Marcos Leite, compôs a maior parte das músicas desta A aurora da minha vida. Além da tenacidade de Regina Lucatto,
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“Na verdade, quando escrevi, não imaginei tão longa vida para A aurora... Achava que um dia ficaria ultrapassada e apenas gerações próximas da minha sentiriam afinidade com o material” Naum Alves de Souza
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o projeto foi resgatado graças à iniciativa da atriz e produtora Ana Velloso. “Ela me ligou para propor uma Aurora... musical. Fiquei muito entusiasmado. E a já longa experiência que adquiri em espetáculos musicais – sobretudo na direção de óperas, balés e shows – foi bastante útil”, afirma Naum, que também criou letras para a versão atual. Entre as 30 canções que integram o espetáculo, o público se depara com uma variedade de ritmos e estilos, com direito a samba, marchinha, bossanova, música sertaneja e opereta. As características originais do texto foram mantidas. Estão lá os conhecidos personagens – estudantes de um colégio tradicional. Figuras arquetípicas, sem nome, designadas por adjetivos (adiantada, quieto, órfão, gorda, puxa-saco, gêmeas, bobo) e funções (diretor, padre, professora de inglês, professor de desenho, freira), que, aos poucos, ganham individualidade. Apesar de lançar um olhar até certo ponto doloroso em relação à infância e de ambientar os personagens numa escola, Naum Alves de Souza não vê A aurora da minha vida como uma análise crítica do ensino numa determinada fase da história brasileira. O próprio fato de a peça continuar na pauta do dia pode ser um sinal de que Naum não se prendeu ao retrato de uma época específica. “O texto fala mais sobre os pequenos seres humanos (crianças, adolescentes e adultos comuns) do que exatamente sobre o sistema educacional. Na verdade, quando escrevi, não imaginei tão longa vida para A aurora... Achava que um dia
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ficaria ultrapassada e apenas gerações próximas da minha sentiriam afinidade com o material. Entretanto, a peça sobreviveu às mudanças do ensino e tem sido montada com frequência ao longo dos anos, não só no Brasil. Parece-me, então, que, sem querer, escrevi algo que não é exatamente sobre a escola ou o ensino”, observa Naum, que assinou uma trilogia composta por A aurora..., No Natal a gente vem te buscar e Um beijo, um abraço, um aperto de mão. Naum, não por acaso, revisitou o texto no correr dos anos. A aurora da minha vida estreou em 1981, em São Paulo, com Cristina Pereira, Eliane Giardini, Isa Kopelman, Maria do Carmo Sodré, J. C. Violla, Paulo Betti, Roberto Arduin e Tacus. Migrou para o Rio de Janeiro, onde foi encenada com elenco carioca integrado por Marieta Severo, Pedro Paulo Rangel, Stela Freitas, Analu Prestes, Cidinha Milan, Roberto Arduin, Mário Borges e Carlos Gregório. Depois o texto foi evocado em 1984 e em 2004. “Creio que os autores/encenadores fazem o mesmo todas as vezes que retornam a suas peças, seja em virtude de novos espetáculos, seja de simples leituras. Descubro defeitos, repetições, palavras ou expressões mais adequadas. Desta vez, a revisão foi mais profunda por causa da proposta da montagem com incidência de um número maior de músicas. Fiz pequenos cortes para abrir espaço para as canções. E escrevi letras, o que é um dado novo em minha carreira”, explica Naum sobre a peça já apresentada no Canadá, no Paraguai, no Uruguai, em Portugal e na Argentina.
Elenco e capa do programa da primeira montagem carioca
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O PALCO DA RUA ALCINDO FOTOS: RENATO DE AGUIAR
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Bibi Ferreira, Nathália Timberg e Marília Pêra interpretando Dulcina no espetáculo Um brinde à Dulcina!
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Teatro Dulcina, antigo Regina, reabre no Centro depois de uma trajetória marcada por encenações históricas e pelo amor da atriz à arte dramática
GUANABARA O ano era 1935. A Cinelândia se destacava como um dos ícones da boemia e da cultura do Rio de Janeiro e o então Theatro Regina abria suas portas, compondo junto ao Municipal e ao Rival um efervescente corredor cultural carioca. O espetáculo de estreia foi La banque Nemo ou, na tradução, O grande banqueiro, com Jaime Costa, Olga Navarro, Palmerim Silva, Plácido Ferreira, Olavo de Barros, Mahilda Costa, Mário Salaberry, Tamar Moema e Clara Leone. Iniciava-se, no Centro do Rio, a história de um palco que iria se misturar com a do próprio teatro carioca e até brasileiro. Com frisas, camarotes e balcões, era considerado à época um dos mais modernos do país. O Regina passou a ser o teatro das grandes companhias. Após o grupo de Jaime Costa, comandaram também sua cena o de Procópio Ferreira, a
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trinca Cazarré-Elza-Dolores e a trupe encabeçada por Palmerim. Até chegar a vez do casal de atores Dulcina de Moraes e Odilon de Azevedo, com a peça Nunca me deixarás, em 1941, marcando definitivamente o palco da Rua Alcindo Guanabara. A companhia Dulcina-Odilon havia estreado com a peça Amor, de Oduvaldo Viana, no teatro Rival, em 1934. Calcada na escolha de textos de autores de forte densidade cultural e na afirmação de Dulcina como diretora artística dos espetáculos, a dupla que marcou época nos palcos por mais de 30 anos comandava o Regina quando um incêndio destruiu o teatro, em 1944, e o espaço passou por sua primeira grande reforma. No mesmo ano, a convite do então ministro da Educação, Gustavo Capanema, o casal apresentou, no Theatro Municipal, Cesar e Cleópatra e Santa Joana, de
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“Na minha vida, o único horário certo e respeitado é quando o Meu Senhor (o respeitável público) senta na plateia” Dulcina de Moraes, em entrevista ao jornal Correio da Manhã, em 1958
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Bernard Shaw, e Anfitrião 38, de Jean Giradoux. Em seguida, Bodas de sangue, de Lorca, no teatro Ginástico. O maior sucesso veio na sequência, com Chuva, montagem de John Colton e Clemence Randolph, que impressionou não apenas pela água que caía durante todo o espetáculo no Municipal, mas pelo virtuosismo técnico e a impecável atuação do elenco, principalmente de Dulcina, no texto de Somerset Maugham. Outra peça de destaque da atriz foi Vamos brincar de amor em Cabo Frio?, de Sérgio Viotti, que viajou por diversas capitais brasileiras, na década de 1960. Filha dos atores Conchita e Átila de Moraes, Dulcina nasceu durante uma temporada dos pais, na cidade de Valença (RJ). “Nasci no teatro. As mamadeiras tomei ouvindo estudar papéis e ao sabor das excursões dos meus pais, aqui e ali, onde fui educada. Na minha
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vida, o único horário certo e respeitado é quando o Meu Senhor (o respeitável público) senta na plateia”, contou a atriz, em entrevista ao jornal Correio da Manhã, em 1958. Mesmo subindo ao palco com um ano de idade, a estreia ‘oficial’ da futura grande dama foi aos 15 anos, em Lua cheia, à frente da aclamada companhia de Leopoldo Fróes. A partir de então, jamais deixaria de dedicar sua vida ao teatro. O Regina foi reaberto em 1946, com a peça Avatar, de Genolino Amado, com Dulcina e Odilon. Passaram por lá também companhias marcantes como TôniaCeli-Autran, com Otelo, de Shakespeare, e a de Cacilda Becker, com O santo e a porca, de Ariano Suassuna. Em 1952, o casal empreendedor decidiu comprar o teatro da Rua Alcindo Guanabara para criar a Fundação Brasileira de Teatro, um marco na história
Ana de Hollanda, ministra da Cultura
das artes cênicas, chegando a se consagrar como uma das melhores escolas do país. Rubens Corrêa, Ivan Albuquerque, Cláudio Corrêa e Castro, João das Neves e Irene Ravache são alguns nome que estudaram na FBT. E, enfim, os programas começaram a indicar a mudança de nome do teatro em homenagem a Dulcina. Em 1971, o casal mudou-se para a capital federal, a fim de se dedicar à formação de atores e, em 77, o jornal Folha de S. Paulo noticiava: “Dulcina vendeu seu teatro não por desamor à arte, mas por necessidade, já que precisava de dinheiro para terminar a sua Faculdade de Artes Cênicas, em Brasília. Ontem, durante a cerimônia, ela contou que o tinha comprado já com o objetivo de ensinar teatro aos jovens”. E o teatro carioca foi ocupado por companhias de diferentes estados. Recebeu espetáculos como
Escuta Zé, O amor do não, Trateme leão, entre outros, e novamente fechou as portas para uma grande reforma (desta vez, eliminando a caixa de ponto das coxias). Voltou a reabrir apenas em 1983, com a montagem de Galvez, o imperador do Acre, de Márcio Souza, direção de Luís Carlos Ripper.
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Emilio Kalil, secretário municipal de cultura do Rio de Janeiro
A noite de reabertura recebeu o então secretário de Cultura do MEC, Marcos Vinícius Villaça, que, contam os jornais da época, foi bastante aplaudido pelos artistas presentes. História que se repetiu em agosto deste ano, quando o Rio de Janeiro mais uma vez abriu as portas do Dulcina reformado. Com a casa lotada, a plateia comemorou a volta deste importante palco carioca junto à Fundação Nacional de Artes (Funarte) e ao Ministério da Cultura (MinC), responsáveis pela reforma de R$ 2,3 milhões, em uma bela homenagem à grande atriz, diretora e educadora. A celebração foi coroada por Bibi Ferreira, Nathália Timberg e Marília Pêra interpretando Dulcina no espetáculo Um brinde à Dulcina!, criado especialmente para a reabertura do teatro. As atrizes, que foram suas grandes amigas, leram trechos da última entrevista
Arlete Salles, Beth Goulart, Paulo Betti, Patrícia Travassos e Hamilton Vaz Pereira marcaram presença na noite de reabertura
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concedida ao jornalista Simão Khoury. Era Dulcina nas vozes das três, falando da infância ao lado dos irmãos, dos pais, de q u a n d o ro u b o u a c e n a a i n d a bebê, a primeira vez como atriz, do quanto detestava se ver na televisão, de como sua vida longe dos palcos era sem graça e, neles, grandiosa, da dedicação incondicional e paixão arrebatadora pelo teatro brasileiro. “O teatro vai existir enquanto houver uma única pessoa. É um documentário vivo do momento que a humanidade está vivendo”; “sempre achei que o artista era uma força e que estava cada um no seu lado. Quis unir a força ao entrosamento e dar frutos, daí a ideia da Fundação Brasileira de Teatro”, foram algumas frases ouvidas nas encenações da noite. Presente à cerimônia que marcou a reabertura do teatro, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda,
Sérgio Mamberti, Myriam Lewin, Antonio Grassi e Nicette Bruno
lembrou o período áureo da abertura do Dulcina: “Desde quando foi inaugurado, este espaço acolheu importantes companhias que marcaram a história teatral brasileira. Não tenho dúvida de que, agora renascido, será uma peça chave no processo de revitalização da Cinelândia que todos desejamos”, destacou. O ator Paulo Betti esteve presente à reabertura e lembrou quando estreou O amigo da onça, em 1987, ao lado de Cristina Pereira, Andréa Beltrão, Eliane Giardini, Sérgio Mamberti, Antonio Grassi, entre outros. “Este teatro tem um jeitão maravilhoso, uma importância fundamental, uma caixa de cena muito bonita. Aqui, pintamos parede e lavamos chão”. Por sua vez, Grassi, presidente da Funarte, subiu ao palco do teatro e saudou: “Sejam bem-vindos ao Dulcina restaurado e entregue à população brasileira, à classe
artística e à cidade do Rio de Janeiro. Dulcina dedicou sua vida ao teatro brasileiro. A ela, nesta noite, nossa maior homenagem”. De 1996 a 2001 foi a Cia. Fodidos Privilegiados, inicialmente sob a direção de Antonio Abujamra, que ocupou o teatro, já bastante deteriorado. Em 2004, Medeia, com Renata Sorrah e José Mayer, lotou as plateias do Dulcina. Depois, Dilúvio em tempos de seca, com Giulia Gam e Wagner Moura, com direção de Aderbal Freire-Filho, foi apresentado naquele palco. A última vez que Dulcina de Moraes retornou aos palcos cariocas foi em 1981, na peça que Sérgio Viotti escreveu especialmente para a atriz, O melhor dos pecados, com direção de Bibi Ferreira. Recebeu o Prêmio Molière Especial. O teatro segue homenageando sua grande dama a cada noite em que há espetáculo.
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“O teatro vai existir enquanto houver uma única pessoa. É um documentário vivo do momento que a humanidade está vivendo” Dulcina de Moraes
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Empresta-me
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Publicado no Estado de Minas, é uma das crônicas de Urgente é a vida (Editora Record, 2004), livro que ganhou o prêmio Jabuti, em 2005.
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Foi Pirandello – escritor e dramaturgo italiano – quem disse: “Eu sou tantos quantos são os que me veem.” Queria dizer que cada pessoa que me olha, me vê de uma maneira. E esta maneira como me vê, depende mais dela, que me olha, do que de mim, que sou olhado. Na verdade, eu me suponho o mesmo, sempre, em qualquer lugar, em qualquer circunstância, diante de quaisquer pessoas. Mas, segundo Pirandello, eu sou tantos quantos são os que me olham. Enquanto eu me suponho único, na verdade sou pulverizado em inúmeros “eus” , tantos quanto o número dos que me veem. Uma tal afirmação nos deixa constrangidos. Sempre acreditamos que, embora da mesma espécie, homo sapiens, somos, cada um de nós, uma unidade, que temos uma inteireza singular, que temos uma essência única. Engano, enganos. Cada um de nós é um caleidoscópio – multifacetado e capaz de infinitos arranjos. Os estruturalistas, Foucault à frente, afirmam que também não temos uma essência. Somos como a cebola, cascas sobre cascas, à volta de um núcleo, de cascas.
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Vejo o outro, assim como vejo o mundo, através dos meus olhos. E gostaria de grifar a palavra através. Através dos olhos, as pessoas e as coisas chegam ao nosso complexo aparelho oftalmológico. Mas o que vemos, a imagem que, afinal, nos ajuda a entender o mundo e nos emocionar com ele, é a síntese entre o que captamos e tudo o que toda a nossa experiência de vida acumulou. A visão do mar calmo, das nuvens que deslizam suavemente, do sorriso que ilumina o rosto de uma criança ou de uma tela de Picasso, chega a cada um de nós através dos nossos olhos. Porém, a percepção delas vem sendo lentamente construída ao longo de toda a nossa vida. Há pessoas que olham mas não veem, outras que veem e não percebem, assim como há pessoas que são capazes de ver o que não se mostra, veem sem o olhar – sem jamais ter visto um átomo, o físico Heisenberg, criador da Teoria da Incerteza, concluiu matematicamente, que era impossível saber onde estaria um elétron, nem se a cada momento era massa, era energia ou ambas, mas – é isso
olhos que nos interessa – malgrado tudo, o elétron existe, indiscutivelmente. Há mundos dentro do mundo. Só se mostram, porém, a quem paga um ingresso caro, que é dedicar-se a vê-los. Lacan dizia que cada um fala do seu lugar. Pode-se parafraseá-lo: Cada um só vê do seu lugar. O que vemos não é o que enxergamos, é o que percebemos. Posto de outra maneira, é como disse o poeta: “aquilo que o poema nos mostra, não vemos com os nossos olhos de ver, e sim com o nosso espírito.” E a poesia é um suceder de imagens que formam metáforas e, por sua vez, criam uma maneira de dizer o indizível. Por isso, a arte é necessariamente plural. Cada um percebe segundo a história de sua vida sensível. É necessário enxergar bem, mas não é suficiente. Esta capacidade, no entanto, só será virtude para os que, além de verem, souberem perceber – a concretude daquela imagem, a significação daquela imagem, a metafísica daquela imagem, assim como a poesia daquela imagem. Ao fim e ao cabo, o que vemos está em nós. O que percebemos do mundo é uma articulação
entre o que enxergamos, o que sabemos e o que sentimos. Já a imagem como somos vistos é uma construção do outro. E o outro não constrói só a minha imagem, constrói também o meu ego. Cada um de nós é um jogo infinito de espelhos. Sou tantos quantos são os que me olham. Quem sabe não vem daí a quantidade de cegos entre os poetas? Homero foi cego, Camões o foi de um olho e Borges chegou a ironizar sua própria condição:” A vida que me deu a palavra, me deu também a escuridão.” Sartre dizia que a imagem não é uma coisa. É algo que capturamos de alguma coisa, uma espécie de propriedade que emana da coisa. Indígenas brasileiros não permitiam serem filmados ou fotografados. Achavam que, junto com a imagem, sua alma era furtada pela foto. E Oliver Sachs, doublé de neurologista e escritor, narra o episódio de seu paciente, que ficara sessenta anos em completa cegueira, até que a evolução da oftalmologia permitiu que fosse afinal operado. Depois que recuperou a visão, o pobre homem vivia aturdido com o turbilhão de
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Alcione Araújo
luzes, cores, formas, tamanhos e volumes, que só suportava o incômodo desse mundo feérico fechando os olhos. Até que, atormentado pelo sofrimento, pediu para retornar à cegueira. Foi atendido. E morreu em paz, sem precisar voltar a ver o mundo. A arte – especialmente as narrativas dramáticas – é uma forma de adquirir vivências do que não se viveu. Permite que se experimente o sabor sutil de ser mil heróis, salvadores, conquistadores, santos, assaltantes, miseráveis e milionários, amar e ser amado, sem sair da moldura de uma vida pobre e medíocre. Daí o seu fascínio. Hoje me ocorreu que se poderia fazer uma experiência. Alguém me fizesse a gentileza de emp re s t a r-me os olhos. Gostaria apenas de, por alguns instantes, ver o mundo como a pessoa o tem visto. Eu seria ela por um curto tempo. O que aconteceria? Será que mudaria alguma coisa? Depois de tudo o que disse, veríamos dois mundos? Será que, além de sermos tantos quantos são os que nos olham, como disse Pirandello, vivemos isolados em mundos diferentes?
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O PALCO DA SUBVERSÃO PERNAMBUCANA:
GRUPO DE TEATRO VIVENCIAL E A CENA TROPICALISTA Rodrigo Dourado
Cinderela, a história que sua mãe não contou, 1991
Mais de 30 anos se passaram desde que Pernambuco viveu uma experiência teatral cuja força alterou radicalmente o panorama cênico do estado. Em 1974, na cidade de Olinda, surgiu a trupe mais subversiva do tablado pernambucano, o Grupo Teatro Vivencial, que ousou afrontar a hegemonia armorial e lançou um brado tropicalista e homoerótico do topo da acrópole olindense. O Vivencial foi o grande responsável pela importação do ideário tropicalista para a cena pernambucana, dialogando com a deglutição antropofágica, com a cena performativa e contracultural emergente no mundo. Sua estética tinha laços estreitos com a experimentação do Living Theatre (de quem parodiou o nome) e do Teatro Oficina, encontrou
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pontos de convergência com os grupos de criação coletiva da década de 1970 no Rio de Janeiro e em São Paulo (Asdrúbal trouxe o Trombone, Royal Bexiga’s Company etc.). Sua temática francamente homoerótica estava associada à produção do Teatro do Ridículo, nos EUA, e dos Dzi Croquettes, no Brasil, sendo também reflexo do transformismo em voga na Revista carioca e paulista desde o show Les girls, no final dos anos 1960. Com o objetivo dar voz aos jovens da periferia da cidade e utilizando como material dramatúrgico o noticiário jornalístico, crônicas, contos, poemas e textos de autores como Jean Genet e Bertold Brecht, o primeiro espetáculo do grupo, intitulado “Vivencial I”, chamou imediata atenção do
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movimento artístico local e tornouse um repentino sucesso. Ligada ao Movimento Pastoral da Arquidiocese de Olinda e Recife, a trupe foi imediatamente afastada dos auspícios religiosos. A partir de então, o Vivencial construiu uma meteórica trajetória (1974-1983), atraiu a cena de vanguarda da cidade e transformou-se num foco de resistência “desbundada” ao regime militar brasileiro. No café-teatro que o grupo mantinha desde 1978, foram apresentados shows musicais, performances de naturezas diversas e
Américo Barreto em Vivencial II
números de transformistas. Com o tempo, o local, frequentado pela classe média intelectualizada da cidade, foi cedendo cada vez mais espaço aos transformistas e essa presença tor nou-se a principal marca desse espaço cultural, chamado Vivencial Diversiones, e do próprio grupo. Bonecas falando para o mundo foi o espetáculo apresentado todas as noites, que aglutinou as performances transformistas e, no título, parodiava e zombava do popular slogan da Rádio Jornal do Comércio do Recife, criado em 1948: “Pernambuco falando para o mundo”, um símbolo da pretensão cosmopolita e “penetradora” da cultura local. Entre as colaborações mais prolíficas para o grupo estava a parceria com Jomard Muniz de Britto, grande porta-voz da movimentação tropicalista no Recife. Foi ele que, no mesmo ano de lançamento do CD Tropicália, 1968, assinou em
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ARQUIVO PESSOAL DE AURICÉIA FRAGA
ARQUIVO PESSOAL DE AMÉRICO BARRETO
Auriceia Fraga e Ivonete Melo em Sobrados e mocambos, 1977
ARQUIVO PESSOAL DE SUZANA COSTA
Pernambuco o manifesto “Por que somos e não somos tropicalistas” e criou a expressão “pernambucália”. De autoria de Britto, o grupo encenou “Nos abismos da pernambucália” (1975), “Sete fôlegos” e “Perna, pra que te quero?” (1980). Com o escritor e cineasta, o Vivencial produziu ainda 13 filmes em película super-8, um precioso registro histórico: “Vivencial I”, “Uma experiência didática: o corpo humano”, “Toques”, “Copo vazio”, “O palhaço degolado”, “’Cheiro do povo”, “Imitação da vida”, “Inventário de um feudalismo cultural”, “Jogos frutais frugais”, “Jogos labiais libidinais”, “Noturno em ré(cife) maior”, “Outras cenas da vida brasileira” e “Tieta do litoral”. Num desses trabalhos, dramatiza-se o conflito entre armoriais e tropicalistas, que se acirraria, crescentemente, com o passar dos anos, tendo o Vivencial como principal trincheira antiarianista no Nordeste, conforme conta o pesquisador Alexandre Figueirôa, no livro “O cinema super 8 em Pernambuco – do lazer doméstico à resistência cultural”. “Em ‘O palhaço degolado’, a partir de um poema de Wilson Araújo de Souza, Jomard Muniz aborda criticamente dois expoentes da cultura pernambucana: o sociólogo Gilberto Freyre e o teatrólogo Ariano Suassuna, personalidades que, de tão respeitadas e idolatradas, tornaram-se figuras inatingíveis e inquestionáveis. [...] O filme ironizava principalmente Ariano Suassuna, que lançara o Movimento Armorial, de retorno às raízes medievais da cultura nordestina, como contestação ao tropicalismo, do qual Jomard era um dos expoentes no Nordeste”. Em 1975, quando da montagem de Nos abismos da pernambucália, em entrevista ao Jornal do Comércio, o fundador e diretor do grupo, Guilherme Coelho, assumiu:
Suzana Costa em Repúblicas independentes, darling, 1978
Vivencial construiu uma meteórica trajetória, atraiu a cena de vanguarda da cidade e transformou-se num foco de resistência “desbundada” ao regime militar brasileiro
“O espetáculo [...] é deliberadamente uma retomada crítica do trabalho iniciado por José Celso n´O Rei da Vela”, revelando seu débito com o projeto tropicalista. Dois anos mais tarde, o grupo encenou Sobrados e mocambos, releitura de Hermilo Borba Filho baseada na obra de Gilberto Freyre. Borba Filho, falecido em 1976, foi o criador – com Suassuna e outras figuras – do Teatro do Estudante de Pernambuco (TEP) e do Teatro Popular do Nordeste (TPN), grupos cuja pesquisa articulava as matrizes populares da cultura nordestina com as grandes obras da dramaturgia mundial. Com o passar do tempo, no entanto, Suassuna e Borba Filho divergiram em suas investigações sobre o popular e afastaram-se devido à
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Auricéia Fraga em Repúblicas independentes, darling
FOTOS: ARQUIVO PESSOAL DE AURICÉIA FRAGA
Américo Barreto e Auricéia Fraga em Republicas independentes, darling
“o Vivencial [...] respira um ar de programa de auditório, de circo do interior. A forma escrachada, herança da revista, do Mambembe, serve a propósito de questionar o teatrão e incita o raciocínio por meio do riso” Fátima Saadi, Revista Ensaio edição n.01
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a p ro x i m a ç ã o d o s e g u n d o d o s princípios brechtianos. Assim, o Vivencial encontrou em Sobrados e mocambos uma excelente oportunidade de visitar de maneira irônica e debochada as narrativas de formação da cultura brasileira, desafiando também o patriarcado no qual se baseia o Nordeste armorialista. Em 1977, o grupo encenou Viúva, porém honesta, de Nelson Rodrigues, e lançou o jornal-programa A Marreta. Nele, os articulistas pretendiam fazer uma síntese do momento cultural pernambucano, alvejando muitos de seus ícones. Despertou particular interesse o artigo “Vivencial versus Armorial”: “Até bem pouco tempo, Recife só conhecia um movimento cultural, de tendências duvidosas, inclusive
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o armorial. [...] Por outro lado, aparecia em Olinda outro movimento, pouco popular e menos cultural, no sentido tradicional; era um grupo de teatro cuja base estava na expressão corporal do teatro e filmes super-8 [...]”. Identificando o público-alvo dos dois movimentos, seus agentes produtores e ressaltando as divergências entre ambos, a publicação conclui: “Dos dois, não é preciso dizer que o armorial teve maior público e maior divulgação, mesmo porque acobertado por uma propaganda oficial não desafiava nada, apenas tentava conciliar o inconciliável: dois tipos de cultura, emanados de classes diferentes. O melhor exemplo do fiasco foi o próprio ballet inventado por Ariano, onde se tentou utilizar um bumba-meu-boi dentro de um quadro onde se previa a fusão do ballet clássico com a manifestação popular.”
No ano seguinte, o grupo montou Repúblicas independentes, darling, colagem de textos de Luís Fernando Veríssimo, Carlos Eduardo Novaes e Carlos Drummond de Andrade, que viajou pelo Brasil através do Circuito Mambembão/ Mambembinho, programa criado pelo extinto Serviço Nacional de Teatro (SNT). O espetáculo chamou a atenção de alguns críticos por seu aspecto tropicalista, aparentemente deslocado e tardio. Armindo Blanco, escrevendo para A Notícia, do Rio de Janeiro, em 25 de janeiro de 1979, considera-o “no mínimo insólito”. Já Fátima Saadi, em artigo para a edição n.01 da Revista Ensaio, do mesmo ano, atesta: “O Vivencial [...] respira um
ar de programa de auditório, de circo do interior. A forma escrachada, herança da revista, do mambembe, serve a propósito de questionar o teatrão e incita o raciocínio por meio do riso”. Com Notícias tropicais, de 1980, baseado em textos de João Silvério Trevisan e Eduardo Novaes, o Vivencial reafirmou sua síntese tropicalista, assumindo um visual cada vez mais próximo de Carmem Miranda, carnavalizado, sensual, exótico. No programa, o diretor retomou o discurso oswaldiano, definindo a proposta da encenação: “A peça isola três dos mais evidentes e dialéticos discursos do momento circunstancial-cultural brasileiro; o discurso da direita, o da
esquerda e o discurso síntese da ‘coluna do meio’, que no momento antro-político-fágico é o único que consegue polarizar e sintetizar a ideologia e o prazer”. Ainda em 1980, o grupo encenou All star tapuias, com textos e direção de Antônio Cadengue, Carlos Bartolomeu e Guilherme Coelho. Assim como o tropicalismo havia feito com a Antropofagia oswaldiana, o Vivencial retomou, neste espetáculo, o integralismo de Plínio Salgado, criticando seus conceitos e princípios, na forma de paródia/pastiche. Na mesma época, lançou o “Manifesto Quá-QuáQuá”, espécie de ideário síntese, no qual o grupo se colocava mais uma vez sobre diversas questões
ARQUIVO PESSOAL DE IVONETE MELO
Antônio Cadengue e Ivonete Melo em All star tapuias, 1980
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“O Vivencial consagrou uma maneira de fazer arte recifense, com todo o lixo que tinha ao seu redor, literalmente” João Silvério Trevisan, trecho do livro Devassos no paraíso
da cultura brasileira, trazendo no título sua intenção fundamental: o deboche contra todas as instituições e contra si mesmo, numa tentativa de (in)definir um projeto artístico, uma postura política. Desde a abertura do café-teatro, o Vivencial apresentou uma produção numerosa e em permanente diálogo com o universo transformista/travesti. Até o seu fechamento, uma estética decisivamente queer tomou conta da casa em trabalhos como As criadas, de Jean Genet, Parabéns pra você, de Fauzi Arap e Glauco Matoso, Rolla Skate e Nós mulheres,
ANA FARACHE
Américo Barreto, Pernalonga e Henrique Celibi em Os filhos de Maria Sociedade
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criações coletivas. Com a transferência do líder, Guilherme Coelho, para o Rio de Janeiro, o grupo viveu um processo de desagregação. Alguns integrantes criaram em Natal (RN) e Belém (PA) o Vivace Café-Teatro, outros seguiram para Fortaleza (CE), onde inauguraram a Boate Transação. Sem muito sucesso nesses empreendimentos, alguns vivecas (como eram chamados carinhosamente os componentes do grupo) retornaram a Olinda e decidiram reabrir o Diversiones. São dessa fase os trabalhos Os filhos de Maria Sociedade, Ôba Nana... fruta do meio,
ANA FARACHE
O pastoral culturil das meninas do Brasil, Assim é peia, Mar e cais, The brazilian tropical super star e Guerra das estrelas, nos quais o desejo e o riso em torno da figura do homossexual tornam-se centrais. Mas a reabertura do Diversiones não durou muito e em 1983 a casa deixou de figurar na paisagem pernambucana. Menos de dez anos depois, em 1991, estreou o espetáculo Cinderela, a história que sua mãe não contou, de autoria de Henrique Celibi. Ele, que era um adolescente à época do Vivencial e foi praticamente criado nos camarins do grupo, retomou a verve anárquica, satírica e homossexual da trupe olindense e fez de Cinderela... – aliado a um competentíssimo elenco de comediantes – o maior sucesso de bilheteria da história do teatro pernambucano, em cartaz por mais de uma década, ultrapassando a marca de 400 mil espectadores. A peça parodia e satiriza o conto de fadas original, transferindo-o para a paupérrima periferia do Recife, onde um pobre gay suburbano – negro, sem educação, descalço, de cabelos desgrenhados, óculos grossos e avental – vai ao baile no castelo de um príncipe bastante afeminado, obrigado pelo pai a casar-se para provar sua masculinidade. Na versão pernambucana, todas as personagens são interpretadas por atores travestidos e o riso grotesco popular é acionado permanentemente, com recorrência a palavrões e ao baixo material. Para muitos críticos, o espetáculo é um subproduto da flama subversiva e política do Vivencial, um remanescente “desviado” da estética da trupe olindense, calcado unicamente no riso popular e esvaziado em seu conteúdo político. Mas a verdade é que Cinderela, a história que sua mãe não contou
Pernalonga e Henrique Celibi em Nós Mulheres
coloca em cena a cultura da periferia recifense, tensionando – através do riso – as identidades sexuais contemporâneas e a condição subalterna do brasileiro, metaforizada pela figura do transformista. Assim, analisar as tensões históricas entre armorial e pernambucália permite perceber como o Vivencial desempenhou papel decisivo para a cultura nordestina e brasileira, articulando um elemento libertário, plural e cosmopolita em oposição à força conservadora e re a c i o n á r i a d o s a r m o r i a l i s t a s . Para um observador atento, o Vivencial ecoa no Manguebeat e em outras manifestações contemporâneas – como Cinderela... – que se propõem a fazer uma nova síntese dessa cultura. Como garante o escritor João Silvério Trevisan no livro Devassos no paraíso: “A repercussão do Vivencial na cena brasileira foi mínima, como era de se esperar, por
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não se tratar de um grupo folclórico do Nordeste, portanto, desviante das expectativas nacionais. Mas acho que foi muito importante para o Recife. Não creio que seja possível pensar em movimentos como o Manguebeat sem remeter à existência transgressora do Vivencial. Ele consagrou uma maneira de fazer arte recifense, com todo o lixo que tinha ao seu redor, literalmente. É o que as novas gerações perseguem hoje no Nordeste”. Representando, assim, o “desviante sexual” com suas teatralidades mestiças e performativas; elaborando uma linguagem fronteiriça, fruto de inúmeras traduções, contaminações e deslocamentos, o Vivencial se negou a afirmar a existência de uma identidade originária e pura, deixando uma marca irrevogável no teatro pernambucano e assumindo um lugar político de suma importância para a cena brasileira.
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DEBATES NA SBAT Fórum de discussões leva à Sociedade Brasileira de Autores Teatrais profissionais e especialistas para debater as questões pertinentes à vida teatral contemporânea no Brasil. Os temas abrangeram da autoria teatral, texto e direção, à tradição do teatro shakespeariano e os novos dramaturgos.
Luzes sobre a nova
dramaturgia O Fórum da Sbat não poderia deixar de destinar um dos encontros à nova dramaturgia. Cabia não só destacar a relevância dos autores que despontaram nos últimos tempos, como falar sobre uma escrita teatral que ultrapassou a fronteira do gabinete. Muitos dramaturgos, alguns inseridos em representativas companhias de teatro, escrevem textos impregnados pelos rumos dos ensaios e em relação direta com o processo dos atores. No encontro da Sbat – intitulado Como e por que uma casa de 100 anos, reformada, pode ser o melhor lugar para morar – marcaram presença Renata Mizrahi, Henrique Tavares, ambos integrantes do site Drama Diário, e Diego Molina, sob a mediação de Vera Novello. Molina abordou a dificuldade que o dramaturgo ainda enfrenta para afirmar a profissão no contexto brasileiro. “Historicamente, nunca
Daniel Schenker
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houve no Brasil um projeto de formação de autores, só de atores e diretores. A única exceção foram os Seminários de Dramaturgia do Teatro de Arena”, observou, fazendo referência à iniciativa do Arena, grupo capitaneado por José Renato, que tinha entre seus integrantes Gianfrancesco Guar nieri, Oduvaldo Vianna Filho, Augusto Boal, Flávio Migliaccio e Milton Gonçalves. Henrique Tavares disse considerar desfavorável o contexto das últimas décadas para a proliferação de autores brasileiros. “Nossa geração vem da leva de grandes encenadores em que o ator estava em segundo plano e o autor, no subsolo”, afirmou, evocando a década de 1980, conhecida como a era dos encenadores. Henrique, Renata e Diego integram a nova dramaturgia brasileira, movimento conduzido, ao longo dos anos 1990, por Roberto
FOTOS: RENATO DE AGUIAR
Alvim, hoje radicado em São Paulo, onde fundou a sua companhia, Club Noir. Os três fizeram percursos um pouco diversos. Formado pela Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), Henrique Tavares se tornou diretor da companhia Quem são Esses Caras?; assinou alguns textos montados pelo grupo, como Bárbara não lhe adora, Cidade vampira (em parceria com Fausto Fawcett), Telecatch e Cine-teatro drive-in; e participou, como autor convidado, do curso de dramaturgia ministrado pela Royal Court Theatre no Brasil. Diego Molina e Renata Mizrahi são parceiros na companhia Teatro de Nós e na escrita de alguns textos, como Woody Allen não se encontra. Ele também acumula a função de ator (faz parte da Cia. Alfândega 88, conduzida por Moacir Chaves) e escreveu vários textos: Ninguém mais vai ser bonzinho, O espião que nós amamos (com Bosco Brasil), Pedroca e Belinha e Fabulamente. Ela cursou oficina de dramaturgia com José Sanchis Sinisterra, promovida por Aderbal Freire-Filho no Teatro Poeira, s o b re s s a i u com Joaquim e as estrelas (pelo qual
ganhou o Prêmio Zilka Salaberry de melhor texto), Os sapos, Nada que eu disser será suficiente até que o sol se ponha, Um dia Anita (com Júlia Spadaccini), Rua dos sonhadores e Lar.... O ofício de autor visto de uma perspectiva pouco romântica foi o tema abordado pelos três. “Estamos falando de uma profissão, não de genialidade. O autor tem que contar uma história. Ganha o seu sustento através do trabalho. Não se pode ter a ambição de formar gênios”, observou Henrique Tavares. Renata Mizrahi, por sua vez, contou que em suas aulas de dramaturgia costuma partir da estrutura clássica. Para ela, escrever sob encomenda requer a administração de um equilíbrio delicado. “Tem exigências específicas. Não se pode perder de vista que escrever é tempo. E o tempo é amigo da qualidade”, alertou Renata, voltada agora para um texto centrado nas polacas judias. Nenhum dos três perdeu de vista a importância com o vínculo pessoal na hora da escrita. “As pessoas estão querendo escrever, dar testemunho sobre seu tempo. Eu escrevo para mim. Será
ótimo se os outros gostarem, mas é para mim”, ressaltou Henrique, professor de dramaturgia da Sbat. Vera Novello destacou o trabalho artístico como uma resposta ao mundo. “A escrita é um diálogo com quem já escreveu. Eu leio e tenho vontade de responder ao autor”, disse Vera, que citou a escritora Adélia Prado: ‘Cada um de nós tem as suas 24 horas do dia para viver. Vivam bem e o resto virá’”. Na opinião de Vera, “o trabalho tem que ser prazeroso”. Uma das questões salientadas no debate foi a necessidade de domínio técnico sobre a escrita. “Na Argentina e no Chile, os autores dominam as ferramentas do texto”, comentou Diego Molina, ciente, porém, da necessidade de se ter o que dizer, o que talvez não seja muito conciliável com as impositivas regras de mercado. “Hoje em dia se costuma apregoar que uma peça não pode durar mais que uma hora e meia. Então, é preciso cortar todas as peças de Shakespeare? Não estamos aqui para falar do que é ou não comercial. Se eu domino uma técnica e falo de coração, pode durar 30 horas”, sublinhou. Diego Molina, Vera Novello, Renata Mizrahi e Henrique Tavares
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Discutindo
a relação No segundo dia do Fórum, o assunto foi Dramaturgia e encenação: discutindo a relação. Na mesa, Aderbal Freire-Filho, Alcione Araújo, Moacyr Góes e Naum Alves de Souza enfrentaram, entre pouco caso e preocupação, o tema que tinha por premissa considerar problemático o tête à tête entre texto e direção. Diretor, autor e ator, Aderbal Freire-Filho lembrou que na origem do teatro os gregos escreviam e montavam seus textos. Havia tantos édipos em cena quanto autores pensando e produzindo sobre a tragédia do incesto. Aderbal fez a defesa da autoria múltipla baseada no conceito de atelier, no qual a criação é coletiva sem privilégio de encenador ou autor, e apontou
Maria Luiza Franco
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a intertextualidade como meio que permite tornar a obra sempre contemporânea. Sua Ofélia recebeu de presente de Hamlet um disco dos Beatles, e Aderbal lamentou profundamente Shakespeare não estar na plateia. “Tem gente que só gosta de montar autor morto para não encher o saco. Eu só gosto de montar autor vivo, para que veja as possibilidades de sua peça”, ressaltou Aderbal, contando que chega a perguntar ao porteiro do teatro se Shakespeare, Tchecov, ou outro clássico que esteja encenando, “não veio hoje”. Por negação, Alcione Araújo deu ainda mais peso ao debate. Ele considerou falso problematizar a relação entre autor e diretor. Para o escritor, que se declarou
“um autor, por índole e vocação”, diretor e autor são diferenças complementares e necessárias, entre outras coisas porque o texto é linear e a encenação, espacial, feita de justaposições. “O diretor é um extraordinário criador, porque faz da letra morta o lugar da verdade”. Alcione salientou que exigir autoria exclusiva não indica mais nenhuma solenidade com o escritor, e saudou o fato de os diretores talentosos sempre traírem os seus textos para revelar o que ele próprio não tinha percebido. Numa analogia com o corpo humano, disse que o texto é o coração e a direção, o pulmão da obra. “Não sou tão calmo como o Alcione”, avisou Naum Alves de Souza, o terceiro mestre dramaturgo a expor seu ponto de vista. Ele, definitivamente, não quer “parcerias” nas suas peças. “Às vezes, o encenador passa da conta, trai meu pensamento e me deixa em situação difícil”, disse o autor e diretor, depois de contar como um dos seus personagens, um padre, foi transformado num gay sem ele nunca ter pensado nisso.
“O diretor é um extraordinário criador, porque faz da letra morta o lugar da verdade” Alcione Araújo
Com um discurso sustentado na paixão, Moacyr Góes fez o elogio do teatro como uma realidade autônoma que envolve muitos profissionais e, portanto, ninguém é dono nem autor. “Meu encantamento pelo teatro é o espetáculo, a instauração do teatro como espetáculo”, afirmou o também autor e diretor, para quem “Ibsen e João Falcão são a mesma coisa”. Na perspectiva de sentir o teatro como linguagem que se estrutura por si mesmo, Moacyr disse não
importar a qualidade da traição quando se é profundamente apaixonado, sugerindo que a criação teatral passa longe e não faz caso de embates sobre interpretação e superinterpretação. Essa preocupação seria de uma crítica pouco sensível à realidade que diz respeito exclusivamente à arte do teatro. “A paixão não esquarteja, justifica tudo o que se faz”, assegurou. Porque para Moacyr, desde sempre e somente “o patrão é o espetáculo”.
Vera Novello, Alcione Araújo, Aderbal Freire-Filho, Naum Alves de Souza e Moacyr Góes
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Conhecimento que ilumina o presente O título de uma das mesas do Fórum de Dramaturgia da Sbat – Ibsen, Tchecov, Pirandello, Brecht, Beckett: o caminho de volta a Shakespeare, ao Teatro Ilimitado – apontou para um oportuno retorno ao passado. Mas os integrantes da mesa, mediada por Aderbal FreireFilho, se preocuparam em estabelecer pontes com o presente. O diretor Moacir Chaves chamou atenção para a determinação de não lançar um olhar cristalizado em relação aos autores que vem encenando ao longo dos anos. “Montei Esperando Godot para entender Esperando Godot”, disse, referindo-se à peça mais conhecida de Samuel Beckett,
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que, para Moacir, traz questões emergenciais. “Nós somos seres ilusórios. É o terror e a beleza da vida. Em Beckett há fragmentos de ser, de história”, afirmou. Moacir Chaves destacou em seus espetáculos a construção dos textos – e da cena – em detrimento do enredo. “Não vamos ver um espetáculo de dança com a expectativa de encontrar enredo, trama. O mesmo se dá com as artes plásticas. Além disso, não se costuma estudar a estrutura, a poética dos autores. O autor propõe sonoridades que remetem a construções mentais. Os temas de Nelson Rodrigues são velhos, mas não seus textos. A obra não se esvai; continua pertinente”, observou. Moacir também distingue a peça de teatro da cena propriamente dita. “Teatro não é dramaturgia”. No decorrer do tempo, a noção de texto foi redimensionada. Não significa apenas texto verbal; pode ser estendida aos demais componentes da cena, todos transmissores de ‘significados’. O professor Patrick Pessoa centrou sua fala no estudo reali-
zado por Peter Szondi no livro Teoria do drama moderno, no qual destaca autores que colocaram o drama em crise. “Szondi diz que há um conceito ideal/puro de drama e os dramaturgos modernos são desviantes. Mostra o avanço dos elementos épicos na forma dramática, desencadeando a crise do drama”, sintetizou Patrick, que se debruçou sobre a problemática suscitada por Bertolt Brecht. “A impureza de Brecht, que mescla épico e dramático, é semelhante à de Shakespeare, que não compôs dramas perfeitos de acordo com as poéticas normativas”, comparou. “Brecht considera problemática a identificação afetiva, a empatia – condição na Grécia para que os espectadores sentissem medo e paixão para, assim, se purificarem”. O chamado distanciamento brechtiano não visava a uma eliminação da emoção do público diante da encenação. Para Brecht, cabia, isto sim, impedir que o espectador se emocionasse a ponto de assistir à montagem de forma alienada, desconectada do acontecimento teatral em si.
A pesquisadora e crítica de teatro Tania Brandão fez uma contextualização histórica. “Não compreendemos bem os autores do classicismo francês. Criam a partir de uma série de limitações impostas que resultam na peça bem feita”, afirmou, evocando os autores do classicismo, Racine e Corneille, que procuraram resgatar a tragédia clássica nos moldes originais. “Shakespeare, para eles, é um bárbaro, alguém que propõe uma dramaturgia sem sentido”, assinalou. De fato, os autores do classicismo marcaram oposição à tragédia shakespeariana, repleta de liberdades (mistura de tragédia e comédia, ausência das unidades de tempo, lugar e ação) originalmente impensáveis. “E Beckett quebrou as estruturas do classicismo francês. Em Esperando Godot, não acontece nada. É algo que caminha na contramão de certa tradição francesa, que determina que a ação deve progredir”, complementou. Especialista em teatro brasileiro, Tania Brandão lembrou as dificuldades enfrentadas pelo autor
“A obra não se esvai; continua pertinente” Moacir Chaves
nacional. “O autor jamais se livrou de estar a reboque do ator. É escravo de um teatro de ator pautado pelo teatro francês. Procópio (Ferreira) dizia respeitar o autor, mas como continuador inteligente do texto”, acrescentou. Ao abordar Procópio, Tania trouxe à tona as primeiras décadas do século XX, quando os atores impunham suas personalidades carismáticas sobre as personagens que faziam, reduzindo o texto quase a veículo para suas atuações. Atualmente, ela está envolvida com a redação de um livro sobre a atriz Itália Fausta. Daniel Schenker
Moacir Chaves, Tania Brandão, Aderbal Freire-Filho e Patrick Pessoa
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Texto,
um assunto
polêmico O debate que inaugurou o Fórum de Dramaturgia da Sbat, sob o título Profissão Autor, trouxe à tona uma questão polêmica: até que ponto o espetáculo teatral deve partir de um texto? Marcílio Moraes, presidente da Associação dos Roteiristas, e Roberto Guimarães, curador de artes cênicas do Oi Futuro, integrantes da mesa que contou com as presenças de Aderbal Freire-Filho e Vera Novello, têm opiniões divergentes. “Claro que é possível um trabalho não começar pelo texto. Mas, para mim, está na base de tudo”, disse Marcílio, que percebe um desprestígio do texto na cena contemporânea. “O dramaturgo,
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valorizado no século XIX, foi perdendo espaço e visibilidade para o espetáculo”, acrescentou. E chamou a atenção para um panorama histórico. No século XIX, havia a corrente do textocentrismo, calcada na fidelidade ao texto, ao autor teatral. Com o advento do encenador e a proliferação deles ao longo do século XX, o status do autor de gabinete foi repensado. A própria noção de texto mudou, não significando mais simplesmente texto verbal. Não por acaso, os conceitos de texto e de cena se tornaram quase equivalentes, na medida em que todos os componentes do acontecimento teatral são transmissores de “significados”. Além disso, muitos artistas passaram a investir numa dramaturgia dessacralizada, produzida e modificada no decorrer do processo de ensaios. “Assumo que não sou muito partidário dessa corrente. Em fases da história do teatro, pouco sabemos sobre os espetáculos. Os textos é que ficaram”, assinalou Marcílio Moraes, que detecta maior atenção ao autor no cinema e na televisão. “O roteirista
foi esquecido durante a fase do Cinema Novo, pautada pela urgência do improviso”, disse, referindose ao movimento capitaneado por diretores como Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Ruy Guerra. “Entretanto, nos últimos tempos, alguns roteiristas voltaram a ser valorizados. Na televisão há um reconhecimento maior em relação a quem escreve. Basta lembrar que os atores não sabem o que vai acontecer antes de receberem o texto”, comparou. Já Roberto Guimarães mostrase mais animado com as experiências contemporâneas que emprestam novo significado ao lugar do texto. “No Oi Futuro, nem sempre nos voltamos para trabalhos que começam da página em branco, ainda que saibamos da relevância do texto em si”, admitiu Roberto, aproveitando para citar exemplos de encenações. “Os Irmãos Guimarães mexem com o mito Beckett. Propõem releituras. Constroem seus trabalhos durante o processo de ensaios”, afirmou, evocando os irmãos Adriano e Fernando Guimarães, de Brasília. “Há, inclusive,
textos do Beckett em que não existe fala”, disse, citando Ato sem palavras I (encenado por Isabel Cavalcanti, A última gravação de K r a p p , m o n ó l o g o c o m S é rg i o Britto, no Oi Futuro) e Ato sem palavras II. “Em Glass, o público ouvia textos pré-gravados. A dramaturgia não estava na boca dos atores”, acrescentou, ao comentar o interessantíssimo trabalho de Haroldo Rego, no qual atrizes ficavam confinadas em caixas de acrílico e os espectadores ouviam falas gravadas em MP3. Roberto não perde de vista os riscos que a inclusão da tecnologia em cena eventualmente acarreta. “Hoje em dia, todo mundo pode filmar, fotografar, se sentir um pouco como artista. Há, claro, o risco da banalização”, salientou. O destaque ao texto contemporâneo é uma das diretrizes do Oi Futuro, que selecionou Fragmentos, experiência escorada em Fragmentos de um discurso amoroso, de Roland Barthes. O espetáculo resultou de um somatório de interferências criativas de dois diretores (João Paulo Cuenca e Fernanda
“O dramaturgo foi perdendo espaço e visibilidade para o espetáculo” Marcílio Moraes
Félix), dois atores (Fabrício Belsoff e Bianca Joy) e nove autores (Cuenca, Félix, Ramon Mello, Alessandra Colasanti, Bruna Beber, Felipe Bragança, Keli Freitas, Lucas Paraizo e Vitor Paiva). “Mas também trabalhamos com grandes textos. É bom ouvir um texto bem dito por um excelente ator”, disse Roberto sobre a programação do Oi Futuro, que contou com Fernanda Montenegro interpretando Simone de Beauvoir em Viver sem tempos mortos, encenação assinada por Felipe Hirsch. Daniel Schenker
Roberto Guimarães, Marcílio Moraes, Vera Novello, Aderbal Freire-Filho
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E N S A I O
Teatro Casa 45 anos do lugar Maria Luiza Franco Busse
Era uma vez uma utopia que encontrou lugar em um espaço da zona sul carioca. No bairro do Leblon, quatro amigos e um mesmo sentido de liberdade criaram o Café-Teatro Casa Grande. Era 1966. Arte e cultura seriam o meio de expressão de resistência poética ao melancólico cenário que envolveu o país com o golpe de estado de 1964. A cada ato arbitrário da ditadura, o Casa Grande respondia com espetáculos contra-hegemônicos. Desse modo, Chico Buarque leu sua peça Calabar, proibida pela censura, e Vianninha encenou suas peças De Lenin a Costa e Silva e De frente e de costas. Naquele lugar da utopia tudo que representasse opressão era transformado em abertura. A começar pelo nome. A casa-grande do sinhô agora era do “escravo”. Afinal, o Café-Teatro nasceu para inverter a lógica da naturalização da hostilidade e repressão políticas e combater o bom combate, no qual as armas são o gesto amoroso, potente e seguro de que a vida é um ato coletivo de igualdade e fraternidade entre todos os homens livres. Em 1974, o Casa Grande foi palco da primeira reunião política aberta a todo cidadão que se dispusesse a atravessar o longo corredor que levava ao foyer do teatro e, em seguida, ao auditório. Era o início dos debates em meio à ausência do diálogo amplo, geral e irrestrito até então constrangido pelo regime de
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exceção. A conversa intensa, os olhares vivos e a escuta afiada provocaram a utopia de realizar o I Ciclo de Debates da Cultura Contemporânea. E assim foi durante sete semanas de 1975. Ano seguinte foi a vez do II Ciclo de Debates sobre Economia, e o Rio de Janeiro viu, ouviu e conheceu de perto o metalúrgico do ABC paulista que falava de uma luta e de uma outra história de bem-estar possível para todos os brasileiros. Era o Lula. E assim se passaram os dias naquela Casa Grande dos cidadãos e sua incansável sucessão de atos em favor da anistia e do restabelecimento da ordem democrática. Em 1984, o candidato à presidência da República Tancredo Neves recebeu de artistas e intelectuais documento pelo fim da censura. Nesse encontro solene, o político mineiro proclamou o que viria a se tornar a epígrafe daquele espaço: “território livre da democracia no Brasil”. A máxima se mantém escrita no mural do hall do teatro, hoje Oi Casa Grande, fazendo lembrar a primeira reunião pelas Diretas Já, com as presenças de Ulisses Guimarães e Teotônio Vilella, e o dia 29 de julho de 1985 em que o então ministro da Justiça, Fernando Lira, escolheu o lugar para assinar o decreto que pôs fim à censura no país. Sem também deixar esquecer o encontro da presidenta Dilma Roussef com intelectuais, artistas e sociedade em geral, durante o segundo turno
Grande,
da utopia
FOTOS: RENATO DE AGUIAR E ACERVO FUNARTE
das eleições de 2010, no qual Chico Buarque ressaltou que aquele seria um governo que não falaria grosso com Cuba, nem fino com os Estados Unidos. Os fatos não estão desmentindo o poeta. Mas são demais os perigos da vida e, em 1997, eles não livraram o Casa Grande de um incêndio que destruiu todas as evidências físicas do território de tantas batalhas vitoriosas. Mesmo assim as atividades seguiram adiante em meio aos escombros, até a reinauguração do espaço em 2008, com o nome de Oi Casa Grande. Em 2005, para comemorar os trinta anos dos históricos debates políticos, foi criado o Instituto Casa Grande. O braço cultural, encarregado de promover cursos, eventos e ciclos de debate abertos a toda a sociedade é a mais recente utopia. Na verdade, uma briga que envolve a disposição de preservar um espaço para todos versus o interesse em fazer negócios em um ponto nobre da cidade. Ao longo de 45 anos, a experiência da Utopia com o Casa Grande, de quem não cessa de encontrar acolhida, permite a ela, Utopia, pensar que ali encontrará outra vez o lugar para a realização de mais um projeto que acompanha o sentido de liberdade, igualdade e fraternidade, inspiração da pedra fundamental do teatro que nasceu com a vocação de ser o território livre da democracia.
Inauguração do Café Concerto, 1966
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Solenidade do fim da censura com o Ministro da Justiça Fernando Lyra, 1985
Gota d'água, 1975
Incêndio de 1997
Apoio à candidatura de Tancredo Neves, 1984
O mistério de Irma Vap, 1986
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Claudia Gimenez em Como Encher um Biquíni Selvagem, 1995
Yes, nós temos Braguinha, 1968
Miguel Falabella em Louro, alto, solteiro procura, 1994 Show brasileiro, profissão esperança, 1970
Grande Otelo
Brincando em cima daquilo com Marília Pêra, 1985
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Show Travessia de Milton Nascimento, 1967
Marco Nanini em O burguês ridículo
Apenas 500 milhões de dólares, 1978
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1984, 18 anos de Casa Grande
Regina Casé em Nardja Zulpério, 1989
Um gordoidão no país da inflação com Jô Soares, 1983
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Bibi Ferreira em Brasileiro Profissão Esperança
Ítalo Rossi em Brasileiro Profissão Esperança, 1970
Roberto Battaglin, Alexandre Frota e Felipe Martins em Capitães de Areira, 1982
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Dedina Bernadelli em Capitães de Areia
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Jayme Costa, Joffre Soares e elenco em Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come, 1966
Maria Regina e Oswaldo Loureiroem Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come
Oswaldo Loureiro e Jayme Costa em Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come
Vianinha, Odete Lara, Napoleão Muniz Freire e Luiza Maranhão em Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come
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“Trabalhar em teatro é ter liberdade” Marina Gadelha
Camareira há 22 anos, a paixão de Arminda Farley por seu trabalho só se iguala ao amor pelo Fluminense A estreia no teatro não foi das mais aplaudidas. Arminda Farley tinha acabado de perder o emprego em uma loja que falira no Rio Sul e pediu à vizinha de uma amiga, a camareira Lourdinha, que a ajudasse a conseguir um trabalho. “Você quer mesmo? Tem de estar lá aos sábados, domingos e feriados”, ouviu como alerta. Mas Arminda queria mesmo. Então, uma tarde – sem avisar, porque não tinham telefone –, Lourdinha chegou à casa de Arminda, no Bairro de Fátima, para levá-la ao seu primeiro dia como camareira, no teatro Cacilda Becker. “Lembro que o espetáculo era com a Stella Freitas e o Bruno Garcia bem novinho. A Lourdinha me apresentou ao produtor, falou rapidamente e foi embora. Pensei: o que é que eu faço?” Na peça, Stella usava um vestido longo, vermelho, com um zíper grande nas costas e, na troca de roupa, quando Arminda foi ajudar, o fecho engatou e a atriz entrou com o vestido aberto em cena. “Eu fiquei muito nervosa, arrasada. Mas a Stella é uma pessoa fora de série e veio falar comigo: ‘não fica assim, meu bem. Amanhã, quando chegar, eu mostro como se faz e a gente não vai ter problema’.
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Então, fui me interessando. Quando você aprende, as pessoas começam a valorizar, você fica mais solta, se comunica melhor”, conta. Com 22 anos de profissão, Arminda coleciona boas histórias. Lembranças dramáticas e engraçadas que viveu nos bastidores do teatro. E até em cena quando, intimada pelo ator Pedro Cardoso, foi levada ao palco de Os ignorantes como figurante, ao lado do contrarregra Netinho. Os dois faziam papel de evangélicos. “Entrávamos eu e o Netinho, mas ele encenava e era muito engraçado. Com a plateia olhando, era complicado, as pernas tremiam. Eu ri muito, não aguentei. Como sabia que ia desconcentrar o ator, preferi sair. Lá atrás eu garanto que sou artista, mas aqui na frente, não”. Sua simpática gargalhada foi ouvida em muitos outros cenários, como o da Kombi da produção de uma peça encenada em diferentes praças da cidade. Uma vez, Arminda esqueceu de levar a espada do ator André Mattos, que teve que atuar segurando um facão de cozinha. Dentro do carro, a equipe técnica e o restante do elenco rolavam de rir. Mas também há passagens tristes, como aconteceu em O bem amado, com Marco Nanini, quando o material de cena pegou fogo, no teatro Cultura Artística, em São Paulo, e de uma hora para outra todos ficaram sem o emprego. Ou quando, certa vez, todo um elenco ficou arrasado com a péssima crítica ao espetáculo. Arminda não se conformou. “A crítica foi tão cruel com a atriz que até a sandália dela foi citada por ser feia. Eu disse: ‘gente, como uma pessoa, em tão pouco tempo, pode arrasar um trabalho? Isso aqui se fez em meses de ensaio. Quer dizer
que nada prestou? Nem a luz? Nem um figurino? Nem um sapato?’ Aquilo mexeu comigo. Comecei a ver o teatro com outros olhos”. Hoje, ao assistir a uma peça, Arminda observa principalmente a troca de figurino e a atuação dos atores. Mal consegue se concentrar no enredo. E fica orgulhosa quando faz parte da equipe de um bom espetáculo. “Eu ficava babando ao assistir Rosa Maria Murtinho, Camila Amado, Marli Bueno e Lafayette Galvão, em O pacto das três meninas. Que show! Esses atores são demais!”, derrete-se. Os anos de experiência renderam o convite a Arminda para dar palestras na Faetec (Fundação de Apoio à Escola Técnica do Rio de Janeiro) e ensinar sua profissão a futuras camareiras. “Eu disse que era uma satisfação passar o que aprendi praticamente sozinha a outras pessoas. Falei que o mais importante é a honestidade, porque você está em um camarim para cuidar de um ator. Ele tira a roupa, as joias, o dinheiro e põe tudo ali. Se você não for honesta, não vai dar certo. Outra coisa importante é olhar e não ver, escutar, mas não ouvir. Além de chegar cedo, três ou quatro horas antes. Gosto de deixar as roupas passadas e o café preparado para quando os atores chegarem”, ensina. Para Arminda, trabalhar em teatro é ter liberdade. Prefere à televisão, onde não se tem hora para sair. Querida pela classe, muitas vezes está em duas produções ao mesmo tempo e nunca ficou sem trabalho nos 22 anos de profissão. Amor tão grande como o que tem pelo teatro, somente pelo seu Fluminense, o time do coração. E, claro, pelos amigos. “Gostaria muito que você escrevesse nessa matéria o nome de dois Pedros, aos quais quero agradecer: Pedro Paulo Rangel e Pedro Cardoso. Não tenho palavras”. Combinado, Arminda.
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Laboratório de Dramaturgia SBAT Oficinas de Dramaturgia Criação e aperfeiçoamento de textos em oficinas e palestras com 3 meses de duração.
Dramaturgia em Debate Leituras dramatizadas de 08 textos nacionais que marcaram a História do Teatro Brasileiro.
Viagens Imaginárias Programa inédito de leitura de peças da dramaturgia universal no idioma original, desenvolvendo simultaneamente o conhecimento de um idioma e de uma peça teatral.
Inscrições abertas. Vagas limitadas. Maiores informações: +(21)
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