Revista de Teatro SBAT n.530

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Desde 1917 em defesa do direito autoral. Reconhecida como de Utilidade Pública Federal pelo Decreto nº 4.092 de 4 de agosto de 1920.

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sumário 2

PRÓLOGO Aderbal Freire-Filho

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CONSELHO DIRETOR

Belo horizonte para o teatro de grupo

Aderbal Freire-Filho Alcione Araújo Millôr Fernandes Ziraldo Alves Pinto

A cena da capital mineira se destaca no contexto atual pela disposição para o risco e intensa troca artística entre companhias portadoras de diferentes propostas de linguagem Daniel Schenker

revistadeteatro@sbat.com.br bambinacult@gmail.com

20 ENTREVISTA “O autor é um trabalhador e tem direito ao pagamento por seu trabalho”

Órgão Oficial da SBAT – Sociedade Brasileira de Autores, inscrito na Ulrich’s International Periodicals Directory sob o registro ISSN 0102-7336.

A escritora Ana Maria Machado, presidente da ABL, fala de literatura, adaptações para o teatro, bibliotecas populares e, claro, direito autoral

CONSELHO EDITORIAL

Cleusa Maria

Aderbal Freire-Filho Ana Velloso Regina Zappa Vera Novello

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SUPER VISÃO

Três É Editoração e Design Ltda.

A crítica desautorizada? A opinião sobre teatro na internet Rodrigo Monteiro

DIREÇÃO EXECUTIVO FINANCEIRA

Bia Gondomar EDIÇÃO

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Regina Zappa Cleusa Maria Daniel Schenker Lula Maria Luiza Franco Busse Renato de Aguiar Rodrigo Monteiro

Daniel Schenker

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PESQUISA ICONOGRÁFICA

Maria Helena Pereira PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO

Interpretação ou superinterpretação? Eis a questão Maria Luiza Franco Busse

Maria Luiza Franco REVISÃO

Um exemplo de versatilidade Pedro Brício se multiplica com habilidade entre as funções de autor, ator e diretor

COLABORADORES

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Discutindo a relação

www.maisprogramacao.com.br

(à maneira das resenhas – “para entender o caso” – das reportagens policiais)

CAPA

Aderbal Freire-Filho

Mais Programação Visual

Montagem com fotos de espetáculos citados na matéria Belo horizonte para o teatro de grupo. CTP E IMPRESSÃO

WalPrint Gráfica e Editora TIRAGEM

42 ENSAIO Tablado, 60 anos agora Maria Luiza Franco Busse

5.000 FOTOS DE ACER VO CEDIDAS PELA

50 OSSOS DO OFÍCIO Jogo de som Maria Luiza Franco Busse

Recursos obtidos através do Convênio nº 732974/2010, celebrado entre o Ministério da Cultura e a Bambina Ação Cultural Associados

52 EPÍLOGO

Esta edição traz um encarte com a peça Minha sogra é da polícia ou A rival de Sherlock Holmes, de Gastão Manhãs Tojeiro.

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P R Ó L O G O

Uma mensagem urgente para você que abriu esta revista e começou aqui ou, lendo desordenadamente, chegou até aqui: a SBAT sangra. Como nos casos de doentes graves, em que é comum fornecer boletins médicos periódicos, eu devia ter incluído sempre nesses prólogos uma notícia dos avanços na recuperação da SBAT. Até hoje teriam sido boletins otimistas, dando conta de que o doente grave estava assistido por uma junta dedicada e contava com apoios decisivos, que aos poucos fortaleciam sua saúde. Seria melhor do que começar com um boletim assustador como este: o doente sangra. Todos conhecemos a importância do afeto, do ambiente agradável para a recuperação de doentes e a medicina admite e incorpora esses valores nas suas prescrições: o doente cercado por quem gosta dele, a sensibilidade como fator de cura. O doente sangra, mas nossa luta continua e mais do que nunca precisamos de voluntários. Você que lê esta mensagem: precisamos de todos para doar sangue. Aceitamos sangue de todos os tipos, o doente é sangue bom, que se mistura bem com todos os doadores. Diga o que você pode fazer, faça qualquer coisa, eu, autor e diretor de teatro, 71 anos, dois filhos, que estou aqui ao lado de outros companheiros e companheiras, sem qualquer remuneração, sem ter talento de administrador, sem ter nunca desejado me candidatar a qualquer cargo nesta sociedade querida, estou na sala de espera do doente, esperando por você. Venha. Agora, em um tempo de adjetivos novos, como presencial, por exemplo, os verbos, mesmo imperativos, podem ser respondidos com meios novos. Você tem muitas possibilidades de vir: por email, celular, sms, redes, etc. Que este não seja o último número da Revista, que a sociedade dos poetas dramáticos não seja morta. Enquanto escrevo, recebo a notícia de que a presidenta Dilma Roussef acaba de promulgar a Lei que cria o Dia da Música Popular Brasileira e escolhe o dia 17 de outubro, por ser a data de nascimento de Chiquinha Gonzaga. Leio a notícia na página da Chiguinha na web, onde está dito que ela também foi a pioneira na luta pelos direitos autorais. E leio no Estadão digital. Ali está, com todas as letras, “também fundou a Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (SBAT)”. Enquanto isso, essa bela composição de Chiquinha Gonzaga sangra. E no entanto é preciso cantar, escrever, entrevistar, fotografar, editar a revista, brindar. Vamos cantar com este belo número da revista. Ouçam a voz da nova presidente da Academia Brasileira de Letras. O único defeito de Ana Maria Machado, para mim, é não ter escrito seus livros para crianças quando eu era criança. Nem isso, o defeito é meu que nasci antes da hora. Não tive a autora de livros para crianças, mas tive a crítica de teatro. Os críticos de um lado, os artistas de outro, talvez seja a fórmula ideal para que essa arte que queima rápido como uma fogueira tenha melhores condições de desenvolvimento. Uma Machado de cada lado, Ana Maria e Maria Clara. E um Machado (de Assis) abençoando. A SBAT esteve desde sempre muito próxima da ABL: a ata de fundação da Sociedade foi escrita por Viriato Correa, o primeiro presidente foi João do Rio, Raimundo Magalhães Junior, que hoje dá nome ao teatro

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da Academia, foi presidente da SBAT, e muito mais. A tradição segue com Ana Maria Machado, uma sócia muito querida da SBAT. Quero saudar também a estreia da Cleusa Maria, autora da bela matéria com Ana Maria Machado. É a Revista de Teatro afirmando seu propósito editorial de juntar uma seleção de craques do jornalismo cultural brasileiro, as feras da Regina. Cantando em coro: a revista invade o jovem teatro mineiro. É outra das grandes reportagens do Daniel Schenker, agora dando um panorama amplo, aprofundado de um dos movimentos teatrais mais ricos do Brasil. Por ele, são confirmadas algumas tendências que têm marcado o teatro brasileiro nos últimos anos. A mais notável é a que revela a força crescente dos grupos, companhias, coletivos e suas práticas de criação. Uma das práticas mais caras aos grupos é a da criação coletiva, dividindo texto, encenação (direção, cenografia, figurinos, etc) entre todos os atores e atrizes. No jovem teatro mineiro essa prática é alternada com o trabalho com diretores convidados, com dramaturgias nascidas de adaptações e muito mais. Como sou um velho diretor uruguaio (por adoção), também me chamou a atenção a ponte que mais de um grupo mineiro constrói com o teatro hispano-americano. Andei muitos anos nessa estrada, sentindo a mesma necessidade de aproximação com esse teatro todavia por traducirse. A reportagem destaca ainda a importância de um centro teatral irradiador. Esse papel é brilhantemente cumprido em Minas Gerais pelo Grupo Galpão e o centro de cultura teatral que é extensão do grupo, o Galpão Cine-Horto. Vamos cantar o Galpão. Uma sinfonia para o Tablado, centro irradiador de cultura teatral no Rio, há 60 anos. Aqui está ela, Maria Clara Machado, viva na sua casa, sua e de todos nós artistas de teatro brasileiros. O Tablado é o tema do Ensaio deste número. E no entanto é preciso cantar, cantar, cantar. Ney Latorraca e Bruno Garcia, os dois fotografados ao pé de uma árvore, na seção que junta mestres e discípulos, uma relação de ida e volta. O incrível Pedro Brício, escrevendo, dirigindo, atuando sem parar. Já existe uma página Eu quero ser Pedro Brício num facebook desses? Sou candidato. Um olhar sobre a crítica teatral na internet, onde, espera-se, o espaço não seja desculpa para a superficialidade. Os ossos do ofício de dois ferreiros, digo, de dois Ferrei(y)ras do som. Se você ainda não descobriu uma forma de doar sangue, sugiro uma. Monte um autor da SBAT. É você, de fato, quem vai ganhar. Para mostrar a imensidão do nosso repertório, publicamos um clássico da comédia brasileira, Gastão Tojeiro, o autor de maior sucesso da famosa Geração do Trianon, que lotou os teatros na primeira metade do século passado. Assim como Onde canta o sabiá, sua peça mais conhecida, ainda é viva e luminosa nos dias de hoje, suas comédias merecem o palco novo dos grupos, encenadores e companhias e produtores que reinventam o teatro. Cantar.

Aderbal Freire-Filho

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Belo horizonte para o teatro de

grupo A cena da capital mineira se destaca no contexto atual pela disposição para o risco e intensa troca artística entre companhias portadoras de diferentes propostas de linguagem

TALITA OLIVEIRA

Daniel Schenker

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Analisar o teatro brasileiro a partir da produção de São Paulo e do Rio de Janeiro leva, inevitavelmente, a um reducionismo. Esta constatação fica evidente no momento atual, marcado pela efervescência da cena em Belo Horizonte, principalmente no que se refere às atividades de grupos com até dez anos de estrada, a maioria bastante influenciada pelas ações do Galpão Cine Horto. Não cabe buscar uma equivalência entre as propostas de diversas companhias, mas, ainda assim, é possível perceber determinadas características em comum: a necessidade de falar sobre a realidade, seja a partir de uma perspectiva mais subjetiva/intimista, seja através de um vínculo direto com o contexto socioeconômico da localidade na qual se está inserido; o investimento numa dramaturgia dessacralizada produzida durante o processo de ensaios; o intercâmbio


Em Curitiba, foram lançados ainda a revista Subtexto nº 8, uma publicação do Galpão Cine Horto, e o livro Teatro sem diretor, de Jurij Alschitz, diretor de Eclipse, mais recente montagem do Grupo Galpão, realizada a partir de um mergulho em contos de Anton Tchekhov. “O teatro de Minas Gerais ganhou visibilidade com grupos como Galpão, Ponto de Partida e Armatrux. Atualmente, há uma profusão de companhias estáveis. Talvez Gabriel Villela não precisasse mais sair de Minas em direção a São Paulo para ter seu trabalho reconhecido. Existe uma cena bastante relevante decorrente de políticas públicas e de incentivos a trabalhos coletivos”, observou Leandro Knopfholz, diretor do Festival de Curitiba. Espetáculo 1961-2009, da ZAP 18

constante entre os grupos na realização de projetos conjuntos; e a soma desses elementos na afirmação de vozes autorais. Não por acaso, a última edição do Festival de Curitiba sediou uma mostra dedicada a grupos jovens de Belo Horizonte, intitulada Teatro para ver de Perto, com curadoria do Galpão Cine Horto. A mostra apresentou ao público espetáculos das companhias Casca (Quintal), do Chá (A mudança e Da ordem das coisas), Cinco Cabeças (Cachorros não sabem blefar), Pequeno Mamute Capitão Amável (Robinson), Quatroloscinco (Outro lado) e Mayombe

(A pequena América e sua avó $ifrada de escrúpulos). “As propostas dos novos grupos são muito diferentes das do Galpão. Hoje existe um espaço maior para risco. Há mais apoios, financiamentos, editais. Ainda é pouco, mas possibilita aos grupos correrem riscos”, explicou Chico Pelúcio, integrante do Grupo Galpão. “Optamos por trabalhar com companhias jovens, portadoras de pesquisas continuadas e que investem em dramaturgia original”, revelou Leonardo Lessa, que dividiu com Chico a curadoria e coordenação artística da mostra.

Criações coletivas e saudáveis intercâmbios A Cia. Luna Lunera, que completou dez anos de atividades no ano passado, começou da reunião de artistas formados no Palácio das Artes. O espetáculo de formatura – uma elogiada encenação de Perdoa-me por me traíres, de Nelson Rodrigues – fez o grupo despontar. O projeto Cena 3 X 4 – no qual g r u p o s re a l i z a v a m m o n t a g e n s oriundas do encontro com um diretor e um dramaturgo –, executado no Galpão Cine Horto a partir de uma proposta da Maldita Cia., gerou outro trabalho do Luna Lunera: Nesta data querida.

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GUTO MUNIZ

Luna Lunera

DIVULGAÇÃO

Perdoa-me por me traíres

Aqueles dois

“Falamos de nós mesmos nos trabalhos que criamos” Marcelo Souza e Silva

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Ao longo dos anos, o grupo criou características que podem ser encontradas em seus espetáculos. Em especial, o investimento no processo colaborativo e no vigoroso trabalho corporal. “Nesta data querida foi construído por meio de processo colaborativo, que se tornou uma tônica nas criações da Luna Lunera; Aqueles dois radicalizou essa proposta. Afinal, os próprios atores exerceram funções de diretores, dramaturgos e cenógrafos, envolvendo-se diretamente em todas as instâncias de criação; em Cortiços, o trabalho corporal se tornou protagonista. Foi o ponto de partida para a

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construção de personagens, o mediador dos conflitos estabelecidos no espaço e entre os personagens”, afirmou o ator Marcelo Souza e Silva, integrante da companhia. Não por acaso, esses foram os espetáculos escolhidos para comemorar os dez anos do grupo. “Cortiços representa um retorno à pesquisa das fronteiras e interseções do teatro com a dança. Há na atuação uma espécie de insanidade, uma extravagância na energia, que cabia em Perdoa-me por me traíres e voltou em Cortiços”, complementou o ator Odilon Esteves, que não está em cena em Cortiços, espetáculo dirigido pelo coreógrafo Tuca Pinheiro. Os atores do Luna Lunera não costumam ser conduzidos pelo mesmo diretor em suas montagens. “Nós nos conhecemos na escola. A cada semestre, novos professores, propostas, perspectivas e horizontes. Não tínhamos uma única técnica a que todos quisessem se dedicar. E nem a pesquisa de uma única estética. Desejávamos continuar estudando juntos, passando por novos caminhos. E como somos um grupo de atores, qualquer um pode sugerir em que sentido caminhar”, explicou Odilon.


RODRIGO ZEFERINO

Cortiços

As experiências pessoais como matéria-prima marcam o grupo, a exemplo dos relatos autobiográficos contidos em Não desperdice sua única vida. “Nesse trabalho, o biográfico era mais explícito. Mas desde Nesta data querida, os atores já estavam trazendo suas questões pessoais, visões de mundo, inquietações, posições políticas, para a sala de ensaio. Mesmo em Perdoa-me por me traíres havia um desvelar-se de cada ator por trás das personagens de Nelson Rodrigues”, disse Odilon. “Falamos de nós mesmos nos trabalhos que criamos”, resumiu Marcelo.

A Cia. Clara também está completando dez anos e surgiu da junção de amigos, alguns da escola de teatro da Fundação Clóvis Salgado. Sob a condução de Anderson Aníbal, o grupo surpreendeu, numa das edições do Festival de Curitiba, pela exposição sensível do universo afetivo dos personagens em Coisas invisíveis. “Nós desenvolvemos uma dramaturgia própria a partir da necessidade de falar sobre o que vivíamos no dia a dia”, disse Anderson, que firmou parceria com Gustavo Naves Franco na dramaturgia. Aos poucos, Anderson se aproximou do universo de Anton Tchekhov. “Buscamos referências para a estrutura das nossas cenas nos textos de Tchekhov. A ideia de trabalhar com um conto na montagem de Nada aconteceu serviu como mais um exercício de aproximação para depois partirmos para os textos produzidos para teatro”, assinalou Anderson, que montou A gaivota com os alunos formandos da Fundação Clóvis Salgado e planeja encenar a mesma peça com os atores da Cia. Clara. O projeto de Nada

aconteceu surgiu ainda de uma parceria estabelecida com outro grupo mineiro, o Quatroloscinco. A Clara travou parcerias bemsucedidas com o Quatroloscinco e o Piollin, de João Pessoa. Nesse momento, a companhia começa a apresentar Cinema, nova montagem para o espetáculo que estreou em 2005. O elenco agora é formado por atores pernambucanos num projeto que resulta do vínculo com o Espaço Muda, do Recife. Os dez anos de percurso também serão comemorados através de uma nova temporada da montagem de Alguns leões falam. Ex-integrante da Clara, Grace Passô saiu para fundar, em 2004, o Espanca!, juntamente com Gustavo Bones e Marcelo Castro. A companhia foi impulsionada pela receptividade de Por Elise. Concebida para o Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto, a cena ganhou desenvolvimento para o formato de espetáculo. A habilidade no registro do medo – ou até do pânico – dos personagens de Por Elise, imersos em cotidiano marcado pela carência afetiva, potencializou o Espanca!, que

Clara Cinema

NILTON LEAL

MÁRIO ÂNGELO

Alguns leões falam

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Amores surdos

FOTOS: GUTO MUNIZ

Espanca!

voltou a acertar em Amores surdos, radiografia de uma família disfuncional. A escolha de elementos não literais em relação ao que se fala (o abacate em Por Elise, a lama em Amores surdos) e a expressiva utilização de metáforas tornaram-se elementos fortes do grupo. “Todas as peças hoje em repertório propõem ficções sob perspectivas metafóricas. Acredito que foram estratégias que encontrei para que o leitor pudesse ler uma coisa, decifrando outra”, disse Grace, referindo-se também a Congresso internacional do medo e Marcha para Zenturo – este último concebido a partir do elo entre o Espanca! e o Grupo XIX, de São Paulo. A dramaturgia de Marcha para Zenturo foi influenciada pelo mergulho em Tchekhov. “Nós falamos sobre o aceleramento do ritmo da vida, com o próprio homem no meio desse redemoinho. A história de Marcha... se passava em 2441 e era entrelaçada por uma evocação tchekhoviana do século XIX”, acrescentou. Com a Cia. Brasileira, de Curitiba, o Espanca! integrou o projeto Rumos Teatro, promovido pelo Itaú Cultural, que visava à integração entre grupos de diferentes partes do Brasil. Com a Cia. Brasileira e o

Marcha para Zenturo

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Grupo XIX, realizou o Acto 1 e Acto 2, intercâmbios artísticos pautados pelo encontro entre os três coletivos. “Para mim, e de maneira geral, acredito que a integração com o Grupo XIX confirmou a vontade de nos configurarmos como um grupo que se operacionaliza horizontalmente, como artistas que criam de forma colaborativa. Já o contato com a Cia. Brasileira nos reafirmou o desejo de buscar uma voz e dramaturgia do nosso tempo, disposta a implodir procedimentos já estabelecidos”, continuou Grace. Outra experiência bem-sucedida foi a direção coletiva de Delírio em terra quente, peça de formandos do Centro de Formação Artística da Fundação Clóvis Salgado – Palácio das Artes, que propiciou a Grace dar continuidade à pesquisa dramatúrgica sobre o realismo fantástico, a partir de uma investigação em torno de contos da literatura latino-americana. E o Espanca! partirá para outra empreitada de peso: a montagem de Líquido tátil, projeto gestado em parceria com o diretor e dramaturgo argentino Daniel Veronese. “Ele propôs esse texto, que escreveu em 1997. Acho o trabalho de Veronese cru, por vezes sinistro. Tenho curiosidade e


admiração em relação às suas opções. No fundo, identifico nele algo que compartilho: a ideia de teatro como um lugar que tenta a todo custo fugir das falsas ilusões.” O grupo Quatroloscinco, que completa cinco anos de trajetória, foi fundado por alunos do curso de graduação em teatro da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O trabalho vem se desenvolvendo através do contato com outros grupos e iniciativas. O Galpão Cine Horto foi bastante importante para a companhia. Afinal, É só uma formalidade despontou após vencer o Festival de Cenas Curtas. Além disso, Marcos Coletta trabalha atualmente no Centro de Pesquisa e Memória do Teatro do Galpão Cine Horto. E Assis Benevenuto esteve vinculado à dramaturgia do projeto Oficinão, em 2011. O Quatroloscinco também travou intercâmbio com a Cia. Clara e o grupo Piollin. “É só uma formalidade estreou dentro do projeto Ilhas Livres, que existia na Caixa Clara. Este projeto dava aos seus participantes espaço para ensaio, apresentações e material gráfico. Residimos na sede da Clara durante cinco meses e logo Anderson Aníbal nos convidou para participar

do projeto de intercâmbio com o Piollin. Levamos É só uma formalidade para João Pessoa e estabelecemos laços com o Piollin que duram até hoje. A parceria com a Cia. Clara rendeu nossa participação no espetáculo Nada aconteceu. Foi curioso, pois trabalhamos pela primeira vez com um diretor, inseridos num projeto que não era nosso. Os três coletivos são muito diferentes. O Piollin e a Clara contam com a presença de um diretor. Nós escolhemos, até então, outra forma de pesquisa, que prioriza o grupo e a criação coletiva. Não quer dizer que seja melhor ou pior. São formas diversas de se buscar a mesma coisa. Mas todos valorizam a pesquisa continuada e a busca por linguagem própria. O que mais marcou nessa parceria foi o encontro de grupos em fases distintas de trajetória: o Piollin, consagrado, com 30

“Todas as peças hoje em repertório propõem ficções sob perspectivas metafóricas” Grace Passô

Por Elise

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GLÊNIO CAMPREGHER

MARCO AURÉLIO PRATES

É só uma formalidade

“Como valorizamos a pessoalidade, procuramos deixar que cada um atue sentindo-se à vontade em cena” Assis Benevenuto

anos de história; uma companhia jovem, a Clara, porém já com uma pesquisa reconhecida do diretor; e um grupo recém-nascido, o nosso, ávido pelo crescimento e aprendizado”, comparou Assis. Em É só uma formalidade e Outro lado, o grupo buscou um registro interpretativo distante da declamação, procurando sintonizar os atores com o instante da cena. “Os atores são mentalmente e fisicamente muito diferentes entre si. Gostamos disso.

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Nossa unidade se exprime mais pelos matizes do que pela homogeneidade. Achamos prematuro dizer que há um lugar específico da interpretação que queremos. Mas é fato que até agora temos uma característica: a de conduzir a interpretação mais como uma apresentação do ator do que com artifícios e técnicas. Este foi um lugar que encontramos para estarmos próximos do espectador. Como valorizamos a pessoalidade, procuramos deixar que cada um atue sentindo-se à vontade em cena. E, aos poucos, quase que silenciosamente, uma equalização de registros vai acontecendo, ainda que preservemos os timbres de cada um. O fundamental é abrir a escuta e o olhar para entender o que o outro faz e reagir de forma adequada. Mais do que registros vocais ou corporais, tentamos trabalhar o ‘estar presente’”, esclareceu Assis Benevenuto. Uma das diretrizes dos Quatroloscinco é o investimento em criações coletivas. Como o Luna Lunera, a companhia não aposta na condução de um único diretor e os próprios atores se dedicam às mais variadas funções. “Começou como uma necessidade de falar do que era nosso sem que nos submetêssemos ao discurso de um único autor ou

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diretor. E é reflexo da falta de recursos, que nos obriga a ter uma equipe pequena, onde todos precisam se dividir nas funções artísticas e de produção. Em todo caso, a criação coletiva nos permite conhecer o trabalho do outro e existe liberdade para defender nossas ideias. Eu e o Assis já temos uma atividade dramatúrgica que vai além do Quatroloscinco, e no grupo podemos exercitá-la plenamente. Nestes cinco anos, desenvolvemos habilidades como atores que dirigem, escrevem, pensam na luz, no cenário, no espaço, na relação com o público. Gostamos desta assinatura. Claro que, frequentemente, sentimos falta de um olhar de fora ou de alguém mais experiente que possa nos orientar, mas a riqueza do processo acaba compensando certas carências. No entanto, não haveria problema em trabalhar com um diretor e até temos este interesse para próximos projetos, contanto que não percamos nossa autonomia autoral. Pensamos mais na figura de um orientador de processo do que de um diretor, no sentido mais tradicional da palavra”, explicou Marcos Coletta. De qualquer modo, a criação do Quatroloscinco costuma ser norteada por obras de autores – como


EMI PHOTOART

Quatroloscinco

César Brie, Guillermo Calderon, Eduardo Pavlovski e Istvan Banyai. “Lidar com referências é uma forma de termos um tipo de orientação porque, apesar de investirmos na criação coletiva, alguma orientação é necessária para não nos perdermos no caos das propostas. Por isso, a primeira coisa que fazemos num processo é definir um tema principal e depois povoamos nosso imaginário com todo tipo de referência para, assim, criar o que é nosso. Poderíamos ter montado um texto do César Brie ou do Rafael Spregelburd. Lemos muitas coisas que tivemos vontade de encenar. Mas o exercício da criação autoral é um pilar da nossa pesquisa, mesmo que esta seja atravessada por inúmeras referências. Aliás, gostamos de explicitálas”, acrescentou Marcos. A proximidade com esses autores evidencia uma ligação com a dramaturgia latino-americana. “Lamentamos a distância cultural que o Brasil tem em relação aos outros países da América Latina. Vemos grupos do Peru, Chile, Colômbia e Argentina interagirem muito entre si, mas bem pouco com o Brasil. Falta na nossa cultura uma identidade latino-americana, que é tão forte nos nossos vizinhos. O Quatroloscinco sempre

MARCOS COLETTA

Outro lado

esteve em contato com esta dramaturgia, muito por influência da professora e diretora teatral Sara Rojo, chilena radicada no Brasil, que estimulou a criação do grupo e até hoje dialoga conosco. Sara está ligada às questões políticas e sociais da América Latina e trouxe isso para nós. Os dois textos que mais influenciaram os espetáculos É só uma formalidade e Outro lado foram, respectivamente, Solo los giles mueren de amor, de César Brie, e Neva, de

Guillermo Calderon. Assis e eu também desenvolvemos uma pesquisa com a improvisação e este caminho nos aproxima dos países latino-americanos e suas produções artísticas. Assis esteve no Festival Ibero-americano, em Bogotá, e buscou referências de estudo para o grupo. Todos os integrantes, quando viajam para os países da América Latina, procuram assistir a espetáculos, trazer livros. Estamos ligados nessa pesquisa”, disse Marcos Coletta.

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FOTOS: DIVULGAÇÃO

Mayombe A pequena América e sua avó $ifrada de escrúpulos

América Latina, periferia e teatro de rua

“Falamos sobre territórios culturais, poéticos e sociais. A América Latina é nosso lugar de enunciação” Sara Rojo

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A dramaturgia latino-americana também marca o Mayombe Grupo de Teatro. “Falamos sobre territórios culturais, poéticos e sociais. A América Latina é nosso lugar de enunciação. O que acontece é fundamental para todos nós”, salientou Sara Rojo, à frente do grupo, profissional citada pelos integrantes do Quatroloscinco. Pode-se dizer que a abordagem da condição feminina é um dos universos temáticos valorizados pelo Mayombe. “A problemática da mulher é uma constante, porque nossas sociedades ainda não conseguiram um patamar de igualdade genérica. Mas não é o nosso único tema: América (menina/mulher) é também América, território com todas as exclusões que nela existem”, observou Sara, citando o espetáculo A pequena América e sua avó $ifrada de escrúpulos, que conta, no elenco, com a

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participação de Marcos Coletta, do Quatroloscinco. “Nessa montagem, nós nos debruçamos sobre o conceito de montagem de Eisenstein e com a contradição como regra estruturante do fazer cênico”, complementou Sara. Há uma articulação entre teoria e prática movendo o trabalho do grupo, conforme pode ser conferido no livro Mayombe – Arquivos da memória, dramaturgia, pesquisas e práxis cênica, organizado por Marcos Alexandre. Como em relação às demais companhias, o Galpão Cine Horto imprimiu uma influência essencial. Basta dizer que o grupo apresentou lá dois espetáculos – O julgamento de Don Juan e Por esta porta estar fechada, as outras se tiveram que abrir –, além de A pequena América e sua avó $ifrada de escrúpulos na mostra organizada pelo Cine Horto no último Festival de Curitiba. Integrante do Mayombe, Marina Arthuzzi faz parte de outra companhia,


a Primeira Campainha. Marina Viana e Mariana Blanco também transitam entre os dois grupos realizando funções não circunscritas à esfera da atuação. O acúmulo de funções é, inclusive, uma das principais características da Primeira Campainha. No espetáculo Sobre Dinossauros, galinhas e dragões, elas atuam, assinam dramaturgia, iluminação, cenografia e figurino, além de operarem em cena o som, a luz e o vídeo. Esse acúmulo evidencia, muito possivelmente, uma necessidade de expressão dos anseios comuns. “As montagens não surgem de colagens de textos, e sim de nossos desejos, e fazemos alguns recortes de discursos alheios (não necessariamente textos, mas imagens, ideias, conceitos). Buscamos alternativas para que o teatro se desdobre em potências (se re-potencialize) para continuar produzindo brechas, rasgos, fendas, e possibilidades”, resumiu Marina. No primeiro espetáculo, Elisabeth está atrasada..., a Primeira Campainha enveredou pelo universo feminino, que não permaneceu, porém, como foco central dos demais trabalhos. “A principal proposta é

a busca por uma linguagem que corrobore com a nossa realidade política, financeira, estética, poética, ética e dramatúrgica. É uma linguagem multirreferencial e autorreferencial que, de uma forma autoral e autobiográfica, contempla principalmente dramaturgia e performance. As referências que trazemos para a cena são consequências desta busca. O que fazemos é quase Teatro de Revista, só que de forma aficionada, mais parecida com os fanzines. Não por acaso, apelidamos carinhosamente nosso trabalho de Teatro de Fanzine. Para enriquecer essa multimistura unem-se às três atrizes profissionais de outras áreas (jornalismo, comunicação, cinema, artes visuais)”, acrescentou. O Galpão Cine Horto exerceu influência na jornada da Primeira Campainha. Sobre Dinossauros, galinhas e dragões começou em formato reduzido no Festival de Cenas Curtas. A companhia propôs ao Cine Horto a criação do prêmio Banana Rosa para contemplar os participantes do Cenas Curtas. E foi beneficiada pelo primeiro edital de intercâmbio do Cine Horto, que resultou no

“As montagens não surgem de colagens de textos, e sim de nossos desejos” Marina Arthuzzi

elo com outro grupo, o Heliogábalus, do Paraná. “Não existiam regras para o encontro. A liberdade de criação nos permitiu uma intensa troca artística e criativa. Os grupos se propuseram a iniciar um novo processo único, concebido coletivamente. O intercâmbio ocorreu durante oito dias e, ao final do sexto, fizemos uma performance com duração de 24 horas no Cine Horto e arredores”, lembrou Marina. Outros dois grupos atuantes nesse momento descenderam da

TOMÁS ARTHUZZI

Primeira Campainha

Elisabeth está atrasada...

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“As montagens se aproximam das características de um fórum. O público pode participar” Cida Falabella

Cia. Sonho & Drama, fundada há quase 30 anos: o Zap 18 – que, na verdade, representa a perpetuação da Sonho & Drama, agora rebatizada – e o Trama. Ambos se conectam na busca de inserção com as comunidades da periferia, nas quais suas sedes estão inseridas. A Sonho & Drama virou Zap (Associação Zona de Arte da Periferia) a partir do momento em que o grupo fixou sede no bairro Serrano, em 2002. “Antes, ficávamos peregrinando por vários espaços. O último foi Santa Luzia, na grande BH. Permanecemos lá

TALITA OLIVEIRA

Zap 18

GUTO MUNIZ

1961-2009

Esta noite, Mãe Coragem

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dois anos. Fomos desalojados quando mudou a prefeitura”, contou Cida Falabella, que conduz o Zap com Elisa Santana. O investimento na arte-educação está na base das propostas do Zap. “Trabalhamos com a questão da formação continuada com crianças e adolescentes. Damos oficina de capacitação tanto para quem tem experiência com teatro quanto para alunos de escolas públicas e jovens assediados pelo mercado de consumo e pelas drogas. Procuramos dialogar com associações de moradores e nos aproximar das famílias dos jovens com o intuito de sensibilizá-las. Há um viés social, mas focamos, acima de tudo, no artístico”, esclareceu Cida. O teatro épico de Bertolt Brecht, centrado na busca por uma dramaturgia e uma cena capazes de conscientizar o espectador, vem norteando o Zap. “Os nossos espetáculos são marcados por depoimentos dos atores sobre as questões abordadas. As montagens se aproximam das características de um fórum. O público pode participar”, informou. Esta noite, Mãe Coragem promove uma associação entre a guerra do tráfico e aquela na qual Mãe Coragem, personagem-título da


5 Cabeças

RONALDO JANNOTTI E BYRON O'NEILL

Cachorros não sabem blefar

ALEXANDRE LOPES

peça de Brecht, está imersa. Já 19612009 conta a história do Brasil nas últimas décadas através do olhar da juventude e sob a perspectiva das utopias. Os dois espetáculos têm dramaturgia de Antonio Hildebrando, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), parceira do grupo. Nesse momento, o Zap começa a desenvolver o próximo trabalho, que

deverá se chamar Por que a gente é assim?, no qual o mito da brasilidade será questionado. Epaminondas Ruas, Carlos Henrique e Glicério Rosário trabalharam durante oito anos na Sonho & Drama até se distanciarem da companhia para fundar o Trama, grupo conduzido por Eid Ribeiro, que costuma priorizar a improvisação (com exceção de John & Joe, texto da autora húngara Ágota Kristof). Há um ano, estabeleceram sede em Contagem, a cerca de 30 quilômetros de Belo Horizonte. “Tivemos uma sede em Floresta, que é um bairro de passagem de Belo Horizonte, onde ficamos seis anos. Mas não conseguimos estabelecer o vínculo que temos agora em Contagem. Fortalecemos a relação com os Arturos, comunidade quilombola da região. Lá ainda existe um pensamento de que Belo Horizonte é melhor. Ao mesmo tempo é possível constatar o desejo de que as coisas aconteçam em Contagem. E para nós a questão do pertencimento é muito importante”, sublinha Epaminondas. A companhia vem realizando, há cinco anos, o projeto Grupos em Trama, que contempla coletivos situados na periferia de Belo Horizonte.

Alguns, inclusive, foram formados a partir dessa iniciativa, como o Coccix e o Crônica. A Cia. 5 Cabeças surgiu graças ao já mencionado Festival de Cenas Curtas, promovido pelo Galpão Cine Horto. O grupo apresentou 5 cabeças à espera de um trem no Cenas Curtas, em 2009. Com a boa receptividade passou a viajar para se apresentar em festivais brasileiros. Nesses primeiros anos, firmou propostas, como a dramaturgia colaborativa e a proximidade com o Teatro do Absurdo. “A dramaturgia de Cachorros não sabem blefar, por exemplo, surgiu de encontros nos quais decidimos criar um espetáculo com duração aproximada de uma hora, que continuasse nossa pesquisa em Teatro do Absurdo iniciada com 5 cabeças à espera de um trem. Nesses encontros abordamos os temas de interesse dos atores, questões estéticas, filmes e livros que poderiam servir de referência”, contou Byron O’Neill, diretor do grupo. O ponto de partida não costuma ser o texto propriamente dito. “Partimos, normalmente, de uma imagem. No caso de Cachorros não sabem blefar, da imagem de uma banheira trazida pelo ator Saulo Salomão.

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DANIEL PROTZNER

Pequeno Mamute Capitão Amável

Robinson

Depois, crio um texto inicial, na verdade uma espécie de sinopse, que norteia nosso trabalho. Posteriormente, vamos para a sala de ensaio, onde desenvolvemos jogos teatrais e improvisações relacionados à temática abordada. Durante o processo, os atores me enviam textos teatrais, notícias de jornal e demais estímulos, para que eu desenvolva a dramaturgia.” O tempo é o protagonista de 5 cabeças à espera de um trem e Cachorros não sabem blefar. “Em ambas há um relógio que marca sempre o mesmo horário: 9h15. Os personagens estão esperando alguma coisa acontecer. Entretanto, Cachorros não

“Entendo dramaturgia, direção e atuação quase que numa mesma esfera” Francis Severino

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sabem blefar é mais denso, sério. A dramaturgia está mais amadurecida, assim como o grupo de atores. A troca de ideias proporcionada pelos debates e análises nos festivais de que participamos foi fundamental para que entendêssemos que faltava um pouco de nó na garganta no nosso primeiro trabalho. 5 cabeças à espera de um trem é mais descompromissado, cômico. E mais musical. Afinal, as cinco cabeças em cena cantam e dançam. Outra diferença: em 5 cabeças à espera de um trem os atores são visíveis apenas do pescoço para cima. Literalmente são cabeças esperando um trem que nunca chega. A interpretação e a maquiagem se revelam caricaturais, carregadas. Já em Cachorros não sabem blefar, a interpretação é mais ‘naturalista’ e os atores contam com o corpo inteiro. Além disso, a maquiagem é minimalista. Os dois trabalhos valorizam o silêncio, porém o ritmo de 5 cabeças à espera de um trem é mais frenético”, comparou . Francis Severino transita entre três grupos: Cia. do Chá, Casca e Pequeno Mamute Capitão Amável. Neles, desponta como dramaturgo, ator ou diretor, funções que considera interligadas entre si. “Entendo

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dramaturgia, direção e atuação quase que numa mesma esfera. Quando dirijo, tenho dificuldade de não interferir nas palavras que serão ditas pelo ator e acho improvável que uma ação que ele apresente não interfira na dramaturgia e na condução da direção. Enquanto ator, tento fazer isso, mesmo que seja em segredo”, afirmou. Francis salienta as diferenças entre Chá, Casca e Pequeno Mamute Capitão Amável. “A Cia. do Chá resulta de uma miscelânea de propostas, de uma soma de estéticas. Falamos através de metáforas, buscando incessantemente a poesia das coisas. A Casca vive um momento de transição, procurando manter o impulso e a paixão característicos num momento de abertura de horizontes. E a Pequeno Mamute Capitão Amável representa um desejo de trabalhar distanciado do formato tradicional de grupo ou coletivo. Na verdade, é uma dupla formada por mim (Pequeno Mamute) e Dimitrius Possidônio (Capitão Amável).” Na mostra Teatro para Ver de Perto, do Festival de Curitiba, Francis atuou em Quintal, da Casca, e Da ordem das coisas, da Chá; dirigiu A mudança, da Chá, e assinou a


em nossa primeira montagem, Na roda. Aprofundamos a palhaçaria em Concerto em ré. O primeiro tem sua base dramatúrgica nas canções e brincadeiras regionais existentes e colhidas por nós, principalmente em Minas Gerais. O segundo é uma paródia de uma grande banda de rock contada de trás pra frente”, esclareceu Leonardo Rocha, integrante do grupo. A companhia também montou Como a gente gosta, a partir de As you like it, texto de William Shakespeare. “Eduardo Moreira, nosso diretor, fez diversas leituras e observações de todas as traduções,

“... fazíamos cortes de texto, de personagem e escolhíamos qual a melhor forma de contar aquela história” Leonardo Rocha

RONALDO JANNOTTI

dramaturgia (em parceria com Dimitrius) e atuou em Robinson, da Pequeno Mamute. Com a Cia. do Chá, portanto, Francis aparece como diretor e ator. “Em A mudança e Da ordem das coisas, a dramaturgia e o texto são assinados por integrantes do grupo. A construção dramatúrgica de ambos partiu de literatura não dramática, imagens pictóricas e músicas. Além disso, as duas peças tocam na temática dos pequenos absurdos domésticos. A diferença está no desdobramento dessas dramaturgias. Em A mudança, buscamos construções de sentido sem o apoio de um grande número de palavras. A construção das imagens e da cadência delas apoiou-se em poucas palavras somadas à trilha sonora. Em Da ordem das coisas, o discurso tem como pilastra principal o texto dito, embora não exclua a força da imagem”, analisou. O grupo Maria Cotia, fundado em 2006, assumiu, desde o início, a sua vocação para o teatro de rua. O vínculo com a máscara, a palhaçaria e o brincante se impôs a cada espetáculo. “A máscara expressiva e o ator/brincante estiveram presentes

LUDIANA MARQUES

Chá

Da ordem das coisas

A mudança

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FOTOS: GUTO MUNIZ

Casca

Quintal

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filmes, artigos e afins encontrados de As you like it. Durante essas leituras, fazíamos cortes de texto, de personagem e escolhíamos qual a melhor forma de contar aquela história. Eduardo sugeria trechos de outros personagens da obra de Shakespeare. Assim, falas de Romeu e Julieta e Muito barulho por nada podem ser encontradas em nossa montagem”, explicou Leonardo. Em seus espetáculos, o Maria Cotia desenvolveu um conceito denominado de música-em-cena. “A canção não se torna tão somente ferramenta para ambientação de cena, sonoplastia ou narração; deve cumprir um papel dramatúrgico e não apenas superficial de preencher uma fala. Precisa ser primordial para a cena.” O Maria Cotia mostrou Na roda e Concerto em ré nos países de língua portuguesa da África. “Lá tudo é distinto para nós. O clima, as cores, a geografia, a política, a comida. Descobrimos que cada país é diferente do outro. No Brasil temos a noção de que a África é uma só. Na verdade, é um continente, inclusive maior que o nosso. Apresentamos durante toda a turnê para cerca de 12 mil pessoas e fizemos o espetáculo Concerto em ré em

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Moçambique para uma rede de televisão nacional, que era assistida por 15 milhões de espectadores no país. Mas um fato que nos marcou bastante foi uma apresentação em Quelelé, um distrito de Bissau, capital de Guiné-Bissau. Fizemos Na roda numa quadra para cerca de 1200 pessoas. Grande parte daqueles espectadores era de comunidades de tabancas, aldeias muçulmanas do interior do país que saíram de suas casas só para ver o espetáculo. Eram pessoas que nunca tiveram contato com o teatro ocidental, o que dirá de outro país. Crianças com burca, cabeças baixas (olhar nos olhos era uma ofensa na cultura deles) assistiram à nossa montagem”, relatou. No segundo semestre de 2012, o grupo fará turnê nos estados do Pará, Amapá, Roraima, Rondônia e Amazonas, viabilizada por prêmios da Funarte. Apresentará espetáculos e oferecerá oficinas gratuitas. É difícil abordar todos os grupos que têm agitado a cena de Belo Horizonte. Existem ainda o Andante e o Multimédia. Mais do que enumerar todas as companhias, o mais importante é comprovar a potência desse movimento teatral.


FOTOS: GUTO MUNIZ

O poder irradiador do Galpão Cine Horto O Galpão Cine Horto, iniciativa do Grupo Galpão que vem fomentando o surgimento e desenvolvimento de muitas companhias em Belo Horizonte, começou em 1998. “Do lado da nossa sede havia um cinema abandonado da década de 1950, o Cine Horto, e decidimos alugar. Inauguramos com o intuito de ser um espaço cultural voltado para teatro, pesquisa e reciclagem de atores. Hoje temos mais de 17 projetos por ano, que fomentam a criação de companhias através de linguagem, pesquisa teatral, formação de público, apoio a grupos de teatro, trabalho com crianças de escolas públicas. E criamos o centro de pesquisa e memória catalogando os grupos do Brasil”, disse Chico Pelúcio, ator do Galpão. Cabe mencionar alguns dos mais importantes projetos desenvolvidos no Cine Horto. No Oficinão, atores do Brasil e de outros países da América do Sul se inscrevem para participar de pesquisas que resultarão em espetáculos. “Recebemos cerca de 120 inscrições de atores. Selecionamos 15, que passam um ano trabalhando com um diretor. De início, os próprios atores do Galpão dirigiam. Depois decidimos convidar diretores. Num terceiro momento, os diretores começaram a ser escolhidos via edital. O projeto se complementa com a realização de espetáculo de rua, atendendo às nossas demandas de circulação pelo interior do estado”. Algumas companhias surgiram do Oficinão, entre elas a 171 e a Cia. do Chá. A Cia. Maldita também nasceu no Oficinão. E propôs o projeto 3 X 4, que consistia no convite a quatro grupos de Belo Horizonte para trabalhar, cada um, com um diretor e um dramaturgo. “Formavam-se quatro núcleos que partiam do zero. Esse trabalho era supervisionado por Luís Alberto de Abreu, Tiche Vianna, Antonio Araújo e Francisco Medeiros. Daí surgiam quatro novos espetáculos. Nessa data querida, da Cia. Luna Lunera, foi produzido dentro

desse projeto”, afirmou. O 3 X 4 durou quatro anos e se desdobrou no projeto Núcleos de Pesquisa, no qual participantes escolhidos por currículo ganham acesso a núcleos de cenografia, figurino, dramaturgia, gestão cultural, jornalismo cultural e teatro para educadores, além de um estágio prático, normalmente em espetáculos do Galpão. Há ainda outras iniciativas, como o Festival de Cenas Curtas e o Rascunho em Cena, que abarca cenas de até oito minutos de duração. “São selecionadas 12 cenas por uma comissão. Outra comissão escolhe quatro delas, que têm até três meses para desenvolver uma cena curta a ser apresentada no Festival de Cenas Curtas. Depois uma é escolhida como a melhor, a que tem condições para se desenvolver num espetáculo. Entramos com apoio financeiro. É um espaço para risco, para errar”, explicou Chico Pelúcio, sobre o projeto inspirado no formato do Battersea Arts Centre, de Londres, com o qual o Galpão tem intercâmbio.

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O autor é um trabalhador e tem direito ao pagamento por seu trabalho

A escritora Ana Maria Machado, presidente da ABL, fala de literatura, adaptações para o teatro, bibliotecas populares e, claro, direito autoral Cleusa Maria

A decoração da sala destinada à presidência da Academia Brasileira de Letras diz algo do perfil daquela que ocupa desde dezembro de 2011, pelo período de um ano, o posto de destaque no mundo dos imortais. Eleita por unanimidade, tão logo tomou posse a escritora Ana Maria Machado, que em 2003 foi escolhida para a cadeira número 1 da instituição, imprimiu gosto próprio e personalidade ao espaço, onde recebe algumas das mais ilustres figuras das letras no país. Na parede localizada à direita da porta de entrada, pediu que dependurassem a cópia ampliada, em grandes dimensões, da Avenida Central num flagrante comum na virada do século XIX no Rio de Janeiro. A fotografia de Augusto Malta [1864-1957] mostra detalhes sutis da movimentação típica da cidade em desenvolvimento, onde homens em ternos de casimira inglesa e mulheres em toalete completa flanavam no mesmo espaço histórico em que trabalhadores arrastavam pesados móveis aos ombros e amas acalentavam bebês ao colo. Todos são figurantes de uma cena tão evocativa e distante quanto o Palácio Monroe, que ainda se avista perfilado em perspectiva, com o Pão de Açúcar ao fundo. “Foi o Geisel que mandou derrubar. Quem ia se manifestar contra a decisão naquela ditadura?”, comentou Ana Maria, referindo-se à criminosa demolição de um bem do patrimônio, que marcou uma época de transição na arquitetura brasileira, autorizada pelo então presidente Ernesto Geisel, em 1975.

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Passada uma hora de conversa em torno de temas que iam da literatura ao teatro brasileiros, do direito autoral à linha de ação da presidente à frente da ABL, ela disse: “Quero mostrar uma coisa; aliás, duas, porque me lembrei de outra quando pensava na primeira”. Imediatamente, supus que viria a seguir alguma revelação bombástica ou informação sigilosa – que só nos é dado conhecer quando fechamos o bloco de anotações e guardamos a caneta na bolsa. Engano. Ana Maria apontou o alto da prateleira, ao fundo de sua mesa de trabalho, onde está exposto um curioso objeto, um pequeno gabinete em madeira composto por gavetas e tinteiro de vidro, e fechado por portinholas com trinco, quando precisava ser transportado. “Era o tablet de Euclides da Cunha”, comparou ela. Em seguida, a presidente da ABL se inclinou para indicar, na prateleira abaixo, a foto de seus pais, clicados na Passeata dos Cem Mil, em 1968, por Evandro Teixeira. Seu pai, o jornalista Mário de Sousa Martins, naquele


FOTOS: RENATO DE AGUIAR

vezes abandonadas em gavetas, em outras, descartadas na lixeira digital. Sim, porque folha de papel nos dias presentes é uma forma de expressão. Há muito o gabinete de trabalho do autor de Os sertões caiu em desuso, mas continua testemunhando o embate infindável de quem se propõe a viver da escrita.

“A SBAT sempre foi eficiente comigo”

momento erguia o olhar a ponto de retardar o passo dos manifestantes que caminhavam de braços dados, provavelmente atendendo ao chamado do fotógrafo, que deveria estar dependurado em algum poste ou se equilibrando sobre o capô de um carro no Centro da cidade. Como não se comover diante do flagrante, sabendo que naquele dia uma multidão de brasileiros foi à rua protestar contra o regime imposto pelos militares e que pouco depois levou Ana Maria Machado e tantos outros ao exílio! Os três objetos escolhidos pela escritora para acompanhá-la na sala da presidência da ABL, para os quais nos chamou a atenção, parecem falar a mesma língua. São fragmentos singulares de uma trajetória de vida que segue sempre atuante, produtiva e conectada ao seu tempo. Essa história poderia estar contida nos papéis picotados e jogados sobre a avenida através de janelas dos prédios para saudar a passeata (como mostra a foto de Evandro Teixeira), ou nas folhas e folhas produzidas durante o corpo a corpo diário com a escrita, algumas

Ana Maria Machado nasceu no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, em 1941. Tem mais de 100 livros publicados no Brasil e em 18 países, grande parte voltada para o público infantojuvenil, incluindo algumas peças teatrais. Já vendeu cerca de 18 milhões de exemplares e recebeu dezenas de prêmios, entre eles o mundialmente prestigioso Hans Christian Andersen [2000] e o Machado de Assis, a maior láurea literária nacional concedida pela ABL [2001] pelo conjunto de sua obra. A esse currículo extraordinário, somam-se as atividades de pintora, professora e jornalista, carreira na qual se iniciou e que abandonou profissionalmente há algumas décadas. No fim de 1969, depois de presa pela ditadura, ela se exilou na Europa, onde permaneceu até o começo de 1972. Durante esse período, trabalhou como jornalista na revista Elle, em Paris, na BBC de Londres, e deu aulas na Sorbonne. De volta ao país, foi admitida no Jornal do Brasil e depois na Rádio JB, onde chefiou o radiojornalismo por sete anos, época em que começou a publicar seus primeiros livros infantis, juvenis e adultos aos quais iria se dedicar integralmente, a partir de 1980. A mulher de porte distinto e presença marcante que recebe calorosamente a equipe da SBAT na sala do quarto andar do Palácio Austregésilo de Athayde, no Centro do Rio de Janeiro, tem o dom da palavra clara e das respostas diretas. Suas opiniões são firmes, porém expressas com naturalidade e, quase sempre, amaciadas por um sorriso largo ao final. Mãe de três filhos e avó de dois netos, Ana Maria Machado é uma das mais fiéis associadas da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais. Participa da SBAT há tanto tempo que já não se lembra da data de seu ingresso. Mas correm pelos corredores da instituição comentários sobre um acontecimento que denota o apreço da autora pela causa e que ela própria não sabia ser de conhecimento geral. “Como souberam disso?”, indagou espantada e divertida, para, em seguida, confirmar que, de fato, nos anos 1990 recebeu a oferta de uma agência concorrente, no momento em que uma peça de sua autoria estava em montagem na França. Para ter seus direitos representados, no entanto, exigiam que a autora deixasse a SBAT. A conversa terminou ali: “A SBAT sempre foi muito eficiente comigo, não havia por que sair. Eu a considero uma conquista da classe e gostei muito quando o novo grupo assumiu sua direção”. Em diferentes momentos da conversa, a escritora evitou generalizações. Por exemplo, quando falou da relação entre narrativas literárias e suas versões para o texto dramático. “É muito difícil generalizar, mas normalmente quando acontece uma proposta de adaptação de um

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teatro, do teatro para o cinema. Mas a minha relação com a escrita passa pela linguagem. Não quero deixar essa tarefa para o diretor dirigir ou o artista encenar. Tenho uma atenção muito grande com o diálogo, tenho ouvido para o diálogo, e isso já me basta. Agora, quando fiz alguma adaptação para o teatro, como em os Três mosqueteiros, foi uma experiência muito prazerosa”.

Encostada no inconsciente

texto meu não vejo problema, até porque sempre peço para ler antes e já pedi modificações quando achei que havia traição ao espírito do original”. Se o autor que explora a linguagem dramática, a partir de um texto narrativo, está atento à essência do livro é possível chegar a uma adaptação sensível. A escritora citou o caso da obra História meio ao contrário, seu primeiro livro premiado (João de Barro, em 1977, e Jabuti, no ano seguinte), transposto para o palco por Linei Hirsch: “Este é um exemplo de um resultado ótimo; as adaptações muito ruins, eu não deixei ou esqueci”. Em breve, provavelmente no segundo semestre deste ano, seu romance de estreia na ficção adulta, Alice e Ulisses, publicado em 1983, entra em cena em um projeto da produtora Diana Hime. “Tenho problemas é com a falta de talento, quando não se entende o que é essencial na obra escrita, pois aí é apenas surfar na onda do livro famoso”, acrescentou Ana Maria, ela própria autora de uma adaptação de Os Três mosqueteiros, de Alexandre Dumas, a pedido do diretor Carlos Wilson, em 1988. Mas as incursões da autora pela linguagem dramática, até aqui, estão circunscritas ao público infantil. “Nunca me ocorreu escrever peças adultas, como nunca quis, por exemplo, escrever roteiro para o cinema. Eu já usei, no romance Tropical sol da liberdade, inserção de trechos dramáticos em diálogos. Acho que é muito comum os autores passarem de lá pra cá, do livro para o

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Diferentemente do teatro, quando leituras de textos e ensaios podem se estender noite adentro, a escritora Ana Maria Machado prefere criar seus textos, sejam eles ficção, ensaios ou artigos, na parte da manhã, no frescor das ideias e da jornada. “Sou absolutamente matutina”. O horário não é rígido, mas em geral lá pelas 5h30, 6h, ela começa a escrever. “O Lourenço (o músico Lourenço Baeta, seu marido), quando me via logo cedo me encaminhando para o escritório, dizia: ‘corre porque o João Ubaldo está uma hora na sua frente’! Geralmente, começo meu dia escrevendo.” Além dela e, claro, de João Ubaldo, muitos escritores profissionais no mundo inteiro e em diferentes épocas parecem iniciar sua rotina criativa no período da manhã, e não nas madrugadas, como creem os leitores. Ela citou uma coletânea publicada pela Companhia das Letras, reunindo históricas entrevistas publicadas na Paris Review sobre o processo de criação de alguns dos mais renomados e premiados autores internacionais. “Só dois deles escreviam à noite, são autores de livros policiais, acho... Até o Faulkner escrevia pela manhã, Hemingway era outro matutino. De manhã, você está encostada no inconsciente, é só deixar fluir. Não quero generalizar, mas eu noto isso: o embate com a linguagem se faz melhor logo cedo”. Entrevistar a presidente da Academia Brasileira de Letras sem perguntar sua opinião sobre a produção contemporânea na literatura nacional seria o mesmo que sair da festa sem provar o brigadeiro. “Vivemos um momento extraordinário. E o mais interessante desse cenário é justamente a diversidade. Estamos ainda muito dentro deste tempo para saber quem vai permanecer, mas há tantos escrevendo, publicando, além dos blogs, que costumo acompanhar e de que gosto. Ela citou como exemplos de novos autores com talento incontestável um punhado de nomes, entre eles Tatiana Salem Levy e Bernardo Carvalho. “Há outros casos em que é preciso deixar a poeira baixar. No entanto, ainda continuo achando que temos mais escritores que leitores”. O que precisa ser feito, então, para mudar este panorama? “Já disse isso tantas vezes que fico cansada: em resumo, precisamos formar professores que leiam; sem eles, afasta-se o jovem da leitura”.

Teatro e cinema E como avalia a produção atual do teatro brasileiro? Sem querer que pareça desprestígio aos profissionais do palco, Ana Maria Machado contou que não tem acompanhado muito as peças mais recente. Motivo: a incompatibilidade


“Geralmente, começo meu dia escrevendo” entre os horários das sessões e seu ritmo de vida atual. “Não tenho paciência para os atrasos, que são comuns no teatro. Além disso, as peças começam e acabam muito tarde. Estreia, então, nem se fala! Cheguei a pensar que talvez por eu já ter escrito muita crítica teatral, por ter visto tantos espetáculos, eu não quisesse mais ver. Não é bem assim, pois quando vou à Europa, onde as peças começam bem mais cedo, costumo ir muito ao teatro e gosto. Mas no Brasil, onde eu via tudo que se encenava, atualmente, tenho ido pouco”. Ela está mais em dia com os filmes que prefere assistir em casa e não em salas de exibição. “Eu gostava mais de ir ao cinema quando as sessões eram sempre em horas cheias, duas, quatro, seis, oito, dez”. Agora, o novo sistema de horários quebrados e a programação de vários filmes em rodízio numa mesma sala não a atraem tanto. “Às vezes, a gente chega ao cinema e o filme que queríamos ver foi exibido na sessão anterior e o seguinte já não interessa. Assim, acabo assistindo a muita coisa em casa”.

Direito autoral Em 2011, após a retirada do selo Creative Common do site do Ministério da Cultura, nos primeiros momentos da gestão da ministra Ana de Holanda, seguiu-se intenso tiroteio, envolvendo o projeto de reforma da Lei 9.610, de 1998, uma das principais bandeiras defendidas pelo ex-ministro Gilberto Gil e seu sucessor, Juca Ferreira. Considerado retrocesso por uns, avanço, por outros, o debate em torno do direito autoral pós-revolução tecnológica da internet mobilizou a classe artística, incendiou ânimos, dividiu opiniões. A presidente da ABL lembrou que a academia chegou a se manifestar naquela ocasião. Ela própria tem uma posição bem clara sobre o assunto. “O autor é um trabalhador como outro qualquer e tem direito ao pagamento por seu trabalho. Do contrário, vai ficar parecendo que só rico pode ser escritor”. Para a escritora, só existe um caminho para atender aos interesses das duas partes, e ele passa pela busca de uma forma conciliatória que permita ao autor sobreviver de seu trabalho e garanta também o acesso aos conteúdos digitais, à informação, à leitura. “Toda discussão sobre direito autoral tem de levar esses dois lados em consideração; é preciso flexibilizar as posições”. Ana Maria Machado mencionou o fato de, não por acaso, o então ministro Gilberto Gil ter escolhido a China,

um dos países que mais desrespeitam o direito autoral no mundo, para falar da necessidade de mudanças na lei brasileira. “O projeto todo do Juca (Juca Ferreira que sucedeu a Gil no MinC) foi desastroso em relação a isso. Aí se entra num processo de demonização das agências arrecadadoras, que não leva a nada. É preciso encontrar uma forma de convivência entre os dois lados, pois alguém está lucrando muito com isso. O Google é uma ferramenta extraordinária, mas quando hospeda um site pirata está lucrando com isso. É preciso buscar uma solução atual, sem discussões tão acirradas, como se o autor fosse um usurpador ou todo site fosse pirata. Não é bem assim”.

Parceria com as bibliotecas populares Segunda mulher a presidir a centenária ABL – a primeira foi a acadêmica Nélida Piñon – Ana Maria Machado tomou posse em 15 de dezembro de 2011, sucedendo a Marcos Vinicios Vilaça. A menos de quatro meses no proscênio dos literatos, ela definiu sua atuação: “Estou numa linha de continuidade. Cada mandato da Academia tem a duração de um ano, que pode ser prorrogado até dois. Entendemos que a ABL está, há algum tempo, num processo de abertura para a sociedade”. Por questão de temperamento, a abertura promovida em sua gestão, talvez, possa ser considerada menos midiática que a anterior. “Estou procurando aprofundar a presença da Academia junto a bibliotecas populares, reforçando a inserção junto às comunidades, e já firmamos três parcerias para atuar nessa área”, disse ela, defendendo a ideia de um processo continuado para a formação de leitores e autores que abrange, inicialmente, a capacitação técnica de auxiliares de bibliotecários. Assim, a movimentada agenda da presidente da ABL incluiu no mês de abril uma visita ao Casarão do Morro dos Prazeres, em Santa Teresa, para inaugurar a Feira Literária Flupp Pensa. Simultaneamente às parcerias para a inserção cultural de comunidades no Rio de Janeiro, a proposta de abertura se estende além do oceano, a instituições e universidades na Europa. “Estamos trabalhando junto às universidades de Oxford (Inglaterra), Salamanca (Espanha), Sorbonne e Clermont-Ferrand (ambas na França), para promover a presença do escritor brasileiro em projetos que resultem em publicações de referência. Com isso, já tivemos publicados os livros sobre Machado de Assis, reunindo textos de diferentes autores, e sobre João Cabral”. A escritora salientou que em 2012, porém, as atividades estão concentradas nas comemorações do centenário de nascimento de Jorge Amado. A programação, iniciada em março na França, é extensa, vai de conferências e mesas-redondas, a exposições, leituras públicas, exibição de filmes e shows musicais. Celebrados por uns, abominados por outros, os livros do autor baiano estão na ordem do dia. “É hora de reler Jorge Amado”, convoca a presidente da ABL, no site da instituição.

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A crítica

desautorizada? A opinião sobre teatro na internet Rodrigo Monteiro

No jornal, o Bonequinho que vai ao cinema aplaude sentado ou em pé. Pode também ficar sentado, sem expressar qualquer manifestação, dormir ou sair da sala de exibição. O leitor vê e sabe, assim, se o filme foi considerado bom ou ruim e se, na opinião do crítico, vale a pena assisti-lo ou não. Mas, quando quer explicações sobre o motivo do aplauso, da cochilada ou da decisão de retirar-se, ou mesmo das quatro, cinco, três ou nenhuma estrelinhas, a análise crítica se faz necessária. A crítica torna-se o grande passo além da simples nota. Analisar uma obra, descrevê-la a partir do seu ponto de vista, identificar marcas, apontar problemas, méritos, dificuldades vencidas e tentativas fracassadas só não são desafios maiores do que reunir todas essas informações em um só texto e publicá-lo.

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Se quem escreve é alguém ligado unicamente à teoria, ele corre o risco de ser acusado de desconhecer a maquinaria teatral em profundidade. Se for alguém da área, o problema fica ainda maior, pois “como é possível falar mal da peça X se nela está o ator que é meu amigo, o meu futuro diretor, o meu ex-figurinista?” ou “se a esposa dele está na peça Y, como ele vai falar mal do diretor?”. A autoridade para escrever a crítica ganha, a cada dia, mais força na própria crítica nesse tempo em que todos escrevem e publicam suas opiniões, ou podem simplesmente desenhar bonequinhos, oferecer botões de “curtir” ou usar de qualquer outra forma para divulgar sua avaliação sobre determinada obra de arte. Houve um tempo em que um determinado grupo de pessoas ditava o cânone a ser visto: os livros a serem lidos, um jeito certo de pintar, os programas de televisão censurados, os textos teatrais que poderiam ser produzidos. A igreja, o governo civil, a ditadura militar: o povo preguiçoso tinha guias “qualificados” para andar na selva sem pecar. Nos jornais, os editores escolhiam os críticos de teatro entre os jornalistas que se interessavam pelo tema e, ainda hoje, quem escreve sobre arte no Caderno de Cultura também corre o risco de escrever sobre futebol durante a Copa, sobre política nas eleições, sobre a Rihanna no Rock In Rio. No maior país da América


MONTAGEM COM FOTO DO BANCO DE IMAGENS © PHOTL.COM

Latina, apenas duas pessoas se dedicam exclusivamente a escrever críticas de teatro em jornal. Uma vive no Rio de Janeiro e a outra em São Paulo. Na exata linha oposta, Porto Alegre, Brasília, Fortaleza, Curitiba e Belo Horizonte têm importantes festivais com produções locais de altíssima qualidade. De Manaus a Florianópolis, hoje há mais salas de espetáculos e mais grupos de teatro e de dança do que nos últimos 30 anos. Cursos livres, de formação técnica, graduação, mestrado e doutorado são abertos e se espalham, e a Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-graduação em Artes Cênicas (Abrace), promove encontros nacionais que reúnem pesquisadores e artistas das cinco regiões do Brasil. Ou seja, na mesma medida em que o teatro perde espaço na mídia impressa, ganha-o nas ruas, na academia, nos shoppings, nos prédios restaurados pelo governo e pela iniciativa privada e, sobretudo, na internet. Depois de 40 anos escrevendo sobre teatro no jornal, o crítico Macksen Luiz saiu do Jornal do Commercio, seu último local de trabalho, e abriu um blog, dando assim continuidade ao seu trabalho. Com Lionel Fischer (Tribuna da Imprensa), Edgar Olímpio de Souza (Diário Popular) e Ida Vicenzia (Jornal do Commercio) aconteceu o mesmo. Já Edgar Olímpio de Souza, Marcelo Aouila e Dinah Cesare nunca escreveram em jornais, mas criaram sites ligados ao tema.

Para todos eles, é preciso ir além do Bonequinho e compartilhar suas reflexões de forma mais profunda. Se o gosto/não gosto válido é apenas o primeiro degrau, o último é o debate acerca da peça em cartaz. Nesses espaços, cada um é o seu próprio patrão, o seu próprio editor. No Facebook, no Twitter ou por email, os links dos textos são compartilhados. Quando positivas, as críticas ganham printscreens e se tornam cartazes em portas de teatro. Quando negativas, viram inboxes privados, distribuídos em segredo. Em ambos os casos, os contadores de acesso marcam o crescente aumento do número de leitores, de leituras, de textos e continua valendo o batido “se gostaram, avisem aos amigos e, se não gostaram, avisem aos inimigos”. O crítico que só fala bem pode até ser desacreditado por quem o lê com frequência, mas a produção da peça ruim sente no seu texto um carinhoso alento quando dela todos falam mal. O crítico que só fala mal não existe, embora existam aqueles que, já de antemão, não gostam de determinado diretor, gênero, ator ou de tipo de teatro, tornando parcial a sua avaliação. Longe de terminar a tipologia, existem ainda aqueles que não falam nem bem, nem mal das peças a que assistem, procurando mais descrever as obras do que valorá-las, propondo reflexões que ganham corpo, principalmente na investigação da linguagem

artística e da sua recepção. Com isso, chama-se a atenção para o fato de, felizmente, existir críticos para todos os gostos e críticas capazes de acompanhar a crescente malha cênica brasileira. Desde 2008, a jornalista Helena Mello pesquisa a crítica teatral em espaços virtuais na internet, apresentando, no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFRGS, a dissertação “Aspectos da Crítica Teatral Brasileira na Era Digital”. Após entrevistar cerca de 80 pessoas ligadas ao teatro, incluindo críticos teatrais, o trabalho é referência por apontar questões relevantes com embasamento teórico, tais como, entre outras: a autoridade do crítico teatral da internet e a linguagem utilizada nesse tipo de texto. Sobre o primeiro ponto, entram na pauta dois temas – a necessidade humana de compartilhar experiências e a manutenção da verdade como uma estrutura sólida. A internet possibilita ao homem comunicar-se com desconhecidos do mundo todo em uma relação que cruza fronteiras geográficas e temporais. Afinal, uma foto sua publicada no Fotolog em 2005 pode ser acessada ainda hoje por alguém que nasceu em 2006 e isso pode acontecer na sua cidade ou do outro lado do mundo igualmente. Nesse sentido, pairam na rede, pontos de vista bastante diferentes e também bastante iguais sobre diversos acontecimentos.

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As verdades, cada vez menos sólidas e mais fluidas, são questões que estimulam a maneira de pensar a arte, modificando, com certeza, a velha crítica, mas apresentando uma nova à qual, segundo a pesquisadora, é “pura perda de tempo resistir”. Orientada por Edélcio Mostaço, Helena Mello cita o caso recente da publicação de críticas teatrais anônimas em Santa Catarina, que causaram um alvoroço entre a classe artística local naquela ocasião. “É natural que uma pessoa que escreve de modo desrespeitoso, aparentemente sem critério, questionando aspectos pessoais daqueles que fazem arte, não seja bem aceita no meio artístico. Acho que fizeram bem aqueles que procuraram buscar sua identidade, reclamaram do espaço que ela ocupou etc. Mas também achei extremamente pertinente a colocação do ator Daniel Olivetto ao perguntar se é preciso realmente saber QUEM fala. Afinal, diz ele, os textos bíblicos provocam profundas discussões sem que a autoria seja posta à prova. Além disso, é bem verdade que os artistas costumam dizer que o que importa é o diálogo aberto com o público, a troca. Então, por que preciso saber quem fala para dar importância ao que está sendo dito?” É natural, sem dúvida, que seja dado mais valor às opiniões de pessoas que conciliam a formação acadêmica com o envolvimento artístico, mas desconsiderar os demais pontos de vista é fechar-se para o desconhecido. Participando de encontros nacionais e internacionais de

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artes cênicas, (em maio, por exemplo, houve a IV Jornadas Nacionales de Investigación y Crítica Teatral, na Argentina) Helena Mello afirma que “o público, os leitores, o mercado se encarregam de dar ou tirar espaço daqueles que se intitulam críticos. E, considerando que, hoje, na virtualidade, não há mais a chancela de um jornal, isso acontece ainda mais facilmente. O resto são perguntas e não respostas, embora eu não veja nisso um problema. É a partir das primeiras que aguçamos a nossa sensibilidade e fortalecemos a nossa capacidade de refletir.” Sobre a questão da linguagem, a internet possibilita mais liberdade a quem nela escreve, não só em relação ao tamanho do texto. Fotos e vídeos podem ser anexados facilmente, assim como o recurso do hiperlink pode ser um importante aliado tanto do autor como do leitor. Enquanto lê o texto, é possível conhecer o site do grupo, ver cenas da peça, ouvir sua trilha sonora. Ao fazer relação com quadros, livros, filmes, lugares, ou qualquer outra fonte, a análise crítica publicada na internet pode proporcionar o acesso a essas informações de modo rápido e fácil. Lionel Fischer diz só ver vantagens ao escrever para o próprio site. “No blog, escrevo o que quero e sem nenhuma preocupação, por exemplo, com o tamanho dos artigos ou das

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críticas. Como sou o patrão de mim mesmo (pela primeira vez na vida, diga-se de passagem), desfruto de uma deliciosa e imensa liberdade. Tenho, no momento, 385 seguidores, mas sei que há um número muito maior de pessoas que lê o que escrevo, pois, muitas vezes, pessoas que não são seguidoras comentam comigo – pessoalmente ou por e-mail – os artigos e as críticas que posto.” Ida Vincenzia concorda com ele e, sobre a repercussão que a internet proporciona, acrescenta: “Recebo muitos e-mails comentando as críticas, além de convites para escrever sobre teatro. São pessoas aconselhando o público de teatro a assistir às peças por mim criticadas, ou indicando a leitura das críticas. A repercussão me surpreende. Outras afirmam a importância que tiveram, em suas carreiras, as observações feitas por mim. Isso tudo me faz perceber como os blogs são um veículo efetivo de comunicação, e como são recebidos pela classe teatral.” Marcelo Aouila, que diz não escrever críticas, mas opiniões pessoais, conta que “existe um link entre o blog e o Facebook. As pessoas curtem, criticam minha opinião e comentam sobre os espetáculos. Surpreendentemente, algumas vezes, já me pararam em locais públicos para dizer que leem o que eu escrevo. Como também sou produtor cultural, sei das dificuldades de se produzir um espetáculo e do sofrimento que é quando alguém fala mal do seu trabalho, sem saber as condições de produção. Procuro apontar coisas que possam melhorar, e evito falar mal. Mas nem sempre dá para não falar mal. Quando não gosto de nada da peça, eu não


escrevo. Sempre tem algo de bom para comentar. Às vezes, eu nem gosto, mas tenho a consciência de que funciona para um tipo de plateia. Então, se funciona, tem que ser valorizado. É melhor ser sincero para quem lê do que agradar a quem está trabalhando e ser incoerente com o que penso.” Para Edgar Olímpio de Souza, da revista virtual Stravaganza, “abrir um site de cultura, com espaço também para outras áreas culturais, é uma maneira de não ficar sujeito aos critérios nem sempre artísticos que orientam a cobertura teatral feita pelas revistas e jornais tradicionais. Ou seja, tenho plena autonomia para abordar uma peça no meu blog, não importando se o espetáculo é estrelado ou não por um(a) ‘artista da Globo’, alguma figura midiática ou amparado por ampla publicidade.” Uma iniciativa bastante interessante é a Revista Questão de Crítica, um site dedicado à publicação de críticas e de estudos sobre o teatro. Dinah Cesare, uma das coordenadoras do projeto juntamente com Daniele Ávila, conta que a ideia surgiu no final de seu curso de graduação em Artes Cênicas com habilitação em Teoria do Teatro na UniRio. “Nós finalizávamos o curso de teoria e a Daniele lançou um projeto para novos críticos na antiga edição do riocenacomtemporânea, que foi um laboratório para nossa revista. Assistíamos aos espetáculos do festival e escrevíamos as críticas em tempo de publicação. A experiência nos possibilitou vislumbrar a criação de um espaço para a prática reflexiva sobre o teatro. Nós havíamos estudado a criação de perspectivas e de categorias novas para pensar a cena teatral e queríamos exercitar o olhar e a escrita em atrito com as produções artísticas. Sempre acreditamos que existe um público que está interessado na crítica, assim como na arte, ou seja, interessado

em novos modos de ver e de construir o mundo.” Sobre aos acessos ao site, ela garante: “A repercussão da revista é pensada como um todo. Temos um índice significativo de visitas, considerando que se trata de conteúdo sobre teatro. Recebemos sistematicamente e-mails das assessorias dos espetáculos em cartaz nos convidando a assisti-los. Em alguma medida, recebemos também retorno de artistas interessados em dialogar e comentários pela web. Isso tudo está crescendo. Cada vez mais pessoas que se dedicam ao teatro, tanto para pensá-lo quanto para fazê-lo mais propriamente, nos escrevem. Estamos planejando o Segundo Encontro Questão de Crítica. Realizamos uma premiação em 2012 e já estamos no processo para 2013.” Talvez, para o futuro, o melhor benefício da crítica teatral nos espaços virtuais seja o potencial de ser um arquivo aberto e constantemente alimentado de textos e de imagens dos espetáculos teatrais. Para conhecer as produções teatrais do Rio de Janeiro nos anos 1980 e 1990, para não irmos muito longe, o pesquisador deverá recorrer aos jornais e revistas. Haverá algumas críticas, algumas matérias e o serviço, contendo o título e alguns nomes da ficha técnica. Felizmente, depois do boom da internet, as ferramentas de busca oferecem um arsenal muito maior. Testemunhas de uma encenação, os críticos partilham o seu olhar sobre as obras, expondo suas análises em lugar próximo às peças. Graças ao aumento do número de textos, é comum encontrar mais de dois pontos de vista sobre o mesmo espetáculo. Cabe ao leitor separar o joio do trigo e confiar nesta ou naquela opinião. Ao comentar o valor da crítica na internet, a pesquisadora Helena Mello lembra uma frase de Antonio Costella: “A roda faz andar a ambulância e o canhão, o avião serve para avizinhar cidades e para atirar bombas sobre elas, a energia nuclear contém o poder quase mágico de alavancar a humanidade e, ao mesmo tempo, o de destruí-la. Os meios de comunicação serão aquilo que o ser humano fizer deles”. Abordado na saída, o Bonequinho pode agora se explicar (se quiser).

O mapa da mina Blogs e revistas de teatro online Sobre Crítica Teatral Helena Mello sobrecriticateatral.blogspot.com TeatroPOA Rodrigo Monteiro teatropoa.blogspot.com TeatroRJ Rodrigo Monteiro teatrorj.blogspot.com Teatro Baiano teatrobahia.blogspot.com Anta Profana antaprofana.com.br Lionel Fischer lionel-fischer.blogspot.com.br Revista Stravanza revistastravaganza.com.br Ida Vicenzia Crítica de Teatro idavicenzia.blogspot.com.br Macksen Luiz macksenluiz.blogspot.com.br Aouila no Teatro Marcelo Aouila aouilanoteatro.blogspot.com.br Caderno Teatral Lucianno Maza www.cadernoteatral.com.br Rio no Teatro www.rionoteatro.com.br Revista Bacante www.bacante.com.br Revista Questão de Crítica www.questaodecritica.com.br

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UM EXEMPLO DE

VERSATILIDADE Pedro Brício se multiplica com habilidade entre as funções de autor, ator e diretor Pedro Brício resiste a classificações. Autor, ator e diretor, vem transitando entre todas essas funções nos diversos trabalhos que realiza. Às vezes, acumula ao dirigir montagens de seus próprios textos. Mas não elege um desses lugares artísticos. Se há alguma preferência é pelo processo colaborativo. “Gosto de me misturar, do cotidiano da sala de ensaio, de sair do meu universo para me alimentar do mundo dos outros. É desse modo que eu me renovo”, afirma. Como dramaturgo, Pedro Brício trabalhou dessa forma na adaptação de O menino que vendia palavras, espetáculo infanto-juvenil assinado por Cristina Moura, a partir

Daniel Schenker

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de um livro de Ignácio de Loyola. “Concebi o texto em colaboração com a diretora e os atores. Cristina não busca construir um sentido óbvio. Fui organizando a escrita aos poucos. Houve cenas que surgiram das oficinas com atores (um coletivo mais abrangente do que o elenco escalado para a montagem); outras que escrevi sozinho; e ainda aquelas que nasceram de propostas dos atores”, enumera Brício, referindo-se ao texto centrado na relação entre pai e filho, quando o primeiro figura como referência quase absoluta, como detentor de todo o conhecimento. Mas Brício despontou como dramaturgo anos antes, com O homem que era sábado. Depois vieram A incrível confeitaria do Senhor Pellica, que lhe valeu o Prêmio Shell de melhor autor, Cine-Teatro Limite (que será lançado pela Funarte), Me salve, musical, Comédia russa, Trabalhos de amores quase perdidos e, mais recentemente, Breu. De início, certas características


RENATO DE AGUIAR

parecem unir as peças. Uma delas é a tendência a se reportar ao passado. Senhor Pellica é ambientado no século XVIII, Cine-Teatro, na década de 40 do século XX, e Breu, nos anos 70 do mesmo século. “Tenho prazer em estudar. E escrever uma peça é uma boa maneira de estudar”, justifica Brício, que organizou ainda o material dramatúrgico de Fitz jam, evocação da

década de 20 a partir da vida do escritor americano F. Scott Fitzgerald. Outra característica evidenciada em boa parte de seus textos é a alternância de gêneros ao longo da peça ou até de uma mesma cena. As referências também despontam em seus textos. Comédia russa evocava uma obra célebre, O inspetor geral, de Nikolai Gogol. Cine-Teatro Limite trazia à tona a

atmosfera da Atlântida num texto salpicado de citações – o protagonista, Sábato, é uma possível menção ao renomado crítico de teatro Sábato Magaldi. Me salve, musical provocava uma reversão de expectativas ao que tradicionalmente se espera de um musical nos dias de hoje. “Mas Trabalhos de amores quase perdidos não tem ambição histórica e nem discrepância entre gêneros”, relativiza. Apesar de trazer à tona um período pré-determinado da história – a ditadura militar brasileira –, Breu talvez possa ser considerado como um texto à parte na obra de Pedro Brício. Está distante da mistura de gêneros e representa uma aposta no desenvolvimento suave, na contramão do proposital jogo de contrastes normalmente encontrado. Na peça, Brício promove o encontro entre Carmem e Aurora, mulheres de classes sociais e experiências de vidas diversas e envolvidas em imbróglios familiares, que se e n c o n t r a m na casa de

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“Tenho prazer em estudar. E escrever uma peça é uma boa maneira de estudar”

uma delas para preparar cachorroquente. “Quando comecei a escrever Breu, a discussão sobre a investigação de crimes da ditadura pela Comissão da Verdade não estava tão em voga. Pensei: ‘ninguém escreve uma peça sobre a ditadura’”, assinala Brício, que investiu mais no insinuado do que no explícito. “Há o Breu da dramaturgia. O texto tem muitas sombras, que eu trabalhei conscientemente”, observa. Pedro Brício dirigiu as encenações de boa parte de suas peças – Comédia russa, conduzida por João Fonseca, e Breu, a cargo de Maria Silvia Siqueira Campos e Miwa Yanagizawa, são exceções. Também dirige com frequência

montagens de textos de autores diversos. A mais recente foi A peça do casamento, de Edward Albee, que radiografa o final de um casamento de 30 anos. “Tenho fascínio por Albee. É um crítico da sociedade americana. Possui uma visão seca e cruel da vida. Os personagens são furiosos. É uma peça de um ato que começa como comédia e vai se adensando sem chegar ao desagradável de Quem tem medo de Virginia Woolf? Mas é dura. Confronta o público com uma visão bastante real do casamento”, declara Pedro Brício, que foi convidado pela atriz Guida Vianna para assumir a direção. A montagem, que conta com a presença de Dudu

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O menino que vendia palavras

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Sandroni, estreou na última edição do Festival de Curitiba. Outro trabalho recente, Modéstia, texto do dramaturgo argentino Rafael Spregelburd, surgiu como um projeto do próprio Pedro Brício. “A questão da estrutura dramatúrgica tem me interessado. Acho o texto ousado, inventivo e arrojado. O que Spregelburd quer discutir não está evidenciado. Existe uma superfície sendo exposta, mas por baixo há algo querendo se manifestar. Não conseguimos, porém, identificar exatamente o que é. O texto sugere relações conceituais e discute a globalização, o duplo, as interfaces, o mistério do teatro. Ele constrói universo detalhista que não é aleatório. Tem uma cabeça matemática e poética”, elogia Pedro, acerca do texto dividido em diferentes planos temporais – um voltado para passado, de notada atmosfera tchekhoviana, e o outro, para a Argentina contemporânea –, proposta materializada numa cenografia que coteja o vaudeville.

FOTOS: PAULA KOSSATZ

Comédia russa

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GUGA MELGAR FOTOS: DALTON VALÉRIO

Laranja azul

Trabalhos de amores quase perdidos

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Como se vê, Pedro Brício transita por uma dramaturgia heterogênea. “Eu não tenho um programa estético a cumprir, nenhuma determinação em afirmar uma coerência”, assume. A convite de Isabel Cavalcanti, dirigiu as montagens de Fim de jogo, de Samuel Beckett, e O caderno rosa de Lori Lambi, adaptação da obra de Hilda Hilst. A convite de Dani Barros, assinou Acqua toffana, a partir de texto de Patricia Melo. Em relação a Fitz jam, o plano inicial era trabalhar como ator. Convidado, porém, a integrar o elenco de uma novela, se afastou e retornou para dirigir e orquestrar a dramaturgia. Como ator, Pedro Brício trabalhou com Ana Kfouri (em Volúpia), Felipe Hirsch (A morte do caixeiro viajante), Guilherme Leme (Laranja azul), Nehle Franke (Lulu) e firmou parceria com Christiane Jatahy, diretora do bem-sucedido A falta que nos move... ou todas as histórias são ficção – espetáculo que ganhou uma versão cinematográfica (A falta que


nos move). “Nós usávamos nossos nomes e histórias pessoais como matéria-prima. Mas falávamos coisas que não nos diziam diretamente respeito. O personagem, em especial no filme, é mais cáustico e cínico do que eu”, diferencia. Christiane Jatahy reuniu personagens em torno de um jantar. Ao longo da noite, enquanto se espera um convidado misterioso, os ânimos vão ficando cada vez mais acirrados. No que se refere ao registro interpretativo dos atores, a diretora buscou romper com um padrão de representação, comprometendo-os com o instante imediato da cena/filmagem. Brício, que fora A falta que nos move só tinha feito em cinema o

curta Vox populi, de Marcelo Laffitte, ressurgirá, em breve, na tela, em O fim e os meios, novo filme de Murilo Salles. “Interpreto um publicitário que vai fazer campanha política de um senador em Brasília e se envolve numa compra de dossiê. Ele não tem ferramentas para enfrentar a selva de Brasília. Não conta com solidez na formação política e ética”, anuncia. De acordo com Pedro Brício, Salles estava interessado na não-atuação. “Eu interpretei basicamente mim mesmo. Procurei pensar em como lidaria com as situações pelas quais o personagem passa”, resume. O fim e os meios não é o único projeto de Pedro Brício a despontar

FOTOS: PAULA HUVEN

Breu

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FOTOS: ANA ALEXANDRINO

Modéstia

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nos próximos meses. Com a Zeppelin Cia. de Teatro – que fundou, em 2003, ao lado de Isabel Cavalcanti, Rui Cortez e Tomás Ribas –, Brício planeja encenar A outra cidade, texto que escreverá graças a uma bolsa da Secretaria de Cultura do Estado. “Será sobre uma cidade (entre Brasil, Uruguai e Argentina) que está sendo inundada. Contarei a história sob a perspectiva de uma família. Haverá ligação com o realismo fantástico. Newton Moreno irá me orientar. Quero suscitar questões: como enfrentar a ideia do fim – enquanto morte, fim do mundo, de uma peça? O que fica se a cidade onde você está acaba?”, enumera.


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A falta que nos move

Brício também escreveu um texto sobre Arthur Rimbaud, intitulado Eu é um outro (extraído de frase famosa do poeta). O projeto partiu do ator André Marinho, que convidou Isabel Cavalcanti para dirigir o espetáculo. Ela, por sua vez, chamou Pedro Brício para escrever a peça. “Havia um problema inicial: ‘como escrever tão bem quanto Rimbaud?’ Não poderia ser um recital poético. Concebi três histórias paralelas em momentos históricos diferentes. Haverá uma parte biográfica sobre Rimbaud; outra, ambientada em 2005, na França, centrada em professor gay de literatura que tem o apartamento invadido por rapaz árabe; e mais um sobre uma tradutora que está envolvida com textos de Rimbaud nos anos 70. Será um texto mais visceral. Tentei traduzir a emoção que se sente ao ler Rimbaud. Ele era um gênio precoce, conhecido pela desmedida, um bárbaro e, ao mesmo tempo, alguém muito culto. Existem d a d o s surpreendentes

sobre ele. Afinal, como um poeta genial abandona, aos 24 anos, a literatura e vira comerciante de armas?”, questiona. A estreia está programada para julho. Para completar, Pedro Brício fará uma obra de Tim Crouch, Peças para museu, ao lado de Bel Garcia, que será apresentada juntamente com Matamouros, de Hilda Hilst. “Crouch influenciou a geração carioca que trabalha com metalinguagem”, informa Brício, acerca do projeto que ganhou verba do Fundo de Apoio ao Teatro (Fate) e deverá desembarcar na cena em agosto.

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Interpretação ou superinterpretação?

Eis a ques Maria Luiza Franco Busse

O estranhamento e identificação entre autor e diretor, assunto recorrente e que já foi tema de fórum promovido pela SBAT, volta à cena com o episódio que envolveu a peça Paraíso. Na montagem dirigida por Antônio Abujamra, Dib Carneiro Neto não se reconheceu como autor e pediu que seu nome fosse retirado dos créditos. Impressos prontos, a solução foi uma tarja preta que anulou sua assinatura na autoria do texto.

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Se o original de Dib Carneiro Neto explorava um diálogo de contas entre um casal idoso, o release divulgado pela Cia. Anjos Pornográficos, que encena a peça, deixa vislumbrar que existem mais coisas no mundo da representação do que não imagina a verossimilhança. Afirma o release: “Na encenação do diretor Antonio Abujamra, o teatro exige o coletivo e a carne. O coletivo se revela na atuação de dezenas de atores que interpretam o filho ausente. ‘O que é bom em segredo, é melhor em público’, já dizia Pirandello, enfatizado por Abujamra. E completa o veterano encenador: ‘Quanto à carne, está representada na concretude da cena, na essencialidade do gesto e na valorização da palavra, tudo isso convergindo para traduzir com maior fidelidade possível a complexidade do ser humano. ‘Se o inferno são os outros’,

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como pontificava o existencialista Jean-Paul Sartre, o paraíso deveria ser um monólogo. Não é.” Em síntese, o que era um texto para uma dupla de caracterização sênior se multiplicou em muitos atores jovens, atuando em um palco ambientado, numa direção que não dizia respeito aos jogos cênicos sugeridos pelo autor e com falas acrescidas de passagens de Manuel Bandeira, Fernando Pessoa, Tchecov, Becket e Brechet. Dib não se considera um autor “imexível”, mas entendeu que Paraíso passou a ser exclusivamente de Abujamra, na medida em que não foi chamado a participar do processo. Considerando o que pode haver de instabilidade na escrita, acordo prévio entre as partes parece ser a chave para a harmonia de todo processo. A diretora Christiane Jatahy assinou O livro, do autor vivo e amigo Newton Moreno, e com ele


tão e mais o ator Du Moscovis construiu o espetáculo a partir das discussões na sala de ensaio. Essa dramaturgia, conhecida como processo colaborativo, não tem nada do pragmatismo que faz uso do texto em função de diversos propósitos. Christiane ressalta: “Cada caso é um caso; é difícil generalizar, mas não acho que tudo é possível. Cada situação tem os seus limites apresentados pela própria situação e não existe limite preestabelecido. No caso de O livro, desde o início foi conversado que era um texto em processo. O texto se transformou em comum acordo no desejo de todos nós reconstruindo para a cena”. Citou como exemplo de trabalho oposto o que foi realizado em Leitor por horas, peça do também autor vivo e amigo Jose Sanchis Sinisterra, que ela montou conforme a intenção da obra. “É claro que a minha monta-

gem é um olhar, mas era um texto fechado e não fiz nenhuma intervenção”, disse a diretora. Quais os limites e possibilidades da relação entre autor e diretor na interpretação de uma obra teatral? A delicada questão foi debatida na mesa Dramaturgia e encenação: discutindo a relação, durante o fórum realizado em setembro de 2011 na sede da SBAT, no Rio de Janeiro. O autor Alcione Araújo considerou falso problematizar a relação por se tratar de diferenças complementares e necessárias visto que o texto é linear e a encenação espacial, e saudou o fato de diretores talentosos sempre traírem seus textos para revelar o que ele próprio não tinha percebido. Naum Alves de Souza, por sua vez, disse dispensar “parcerias” nas suas peças, porque não quer ter seu pensamento traído pelos diretores a ponto de ser

colocado em situação embaraçosa, como já teria acontecido. Moacyr Góes sustentou que não importa a qualidade da traição, porque a criação teatral é movida pela paixão que justifica tudo o que é feito, e Aderbal Freire-Filho fez a defesa da autoria múltipla, sem privilégio de encenador ou autor, sempre atenta ao recurso da intertextualidade que mantém a obra contemporânea. Ainda de acordo com Aderbal, ver a relação entre autor do texto e autor do espetáculo à margem da história do teatro pode ser uma forte razão para o que chama de “ confusões frequentes”, daí a necessidade de recuperar a trajetória da dramaturgia desde sua origem, percurso que remonta ao século VI antes da era cristã. É mais uma encenação do debate que não deixa morrer a paixão criativa que alimenta o fazer teatral.

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Discutindo a relação (à maneira das resenhas – “para entender o caso” – das reportagens policiais) Ver a relação autor do texto versus autor do espetáculo à margem da história, só acentua as confusões frequentes.

cenografias, era o cenógrafo quem tinha que orientar os atores sobre o uso dos cenários). É curioso

Vamos tentar acompanhar esse capítulo da história do teatro a grandes passos?

ver que o ator Molière montou uma peça de Racine.

1.

4.

No começo, na Grécia, era um único cidadão: escrevia e dirigia suas tragédias e suas comédias. Isso era

Saxe-Meinigen, de André Antoine etc. Começa também um novo período histórico, que se define pela

natural: os primeiros autores que escreviam os discursos dos seus personagens, ao contrário daque-

recuperação da dramaturgia de todos os tempos. Gerd Bornheim ressalta que nenhuma era anterior

les que os antecederam, os épicos, que narravam o que seus personagens diziam e faziam, não podiam ler sozinhos o que tinham escrito. Precisavam de um leitor para cada personagem, de atores, com quem

dispôs da dramaturgia de todos os tempos, que isso foi um privilégio do século XX. 5.

certamente combinavam o que tinham que fazer. 2.

Por muito tempo, o autor continuou sendo o ori-

etc., dirigidas a uma plateia homogênea que conhecia essas regras; os autores que dirigiam suas pe-

Coincidindo com os primórdios do Iluminismo, surgem autores que cuidam somente da criação do

ças, sendo Bertolt Brecht o exemplo mais notável; as criações coletivas, quando o conjunto dos atores

texto (Corneille, Racine…) e não se envolvem com a encenação de suas obras. A partir daí vão se encarregar da encenação das peças outros contemporâneos: um ator líder de companhia, o autor da cenografia etc. (numa época de grandes e sofisticadas

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Do mesmo modo, todas as práticas “autorais” (texto e cena) existiram no século XX. Os ensaiadores, primeira “geração” de diretores de teatro, artesãos que conheciam as regras para encenar comédias, dramas

entador dos atores das suas peças. Shakespeare, Molière… 3.

Só a partir do final do século XIX, começam a surgir artistas que se dedicam exclusivamente à realização do espetáculo. A história fala dos duques de

constrói o espetáculo; finalmente, os encenadores, coautores, em todos os sentidos, do espetáculo. 6.

Para um público progressivamente heterogêneo, as velhas regras do espetáculo foram perdendo validade


7.

e o artesão ensaiador foi sendo substituído pelo artista encenador (para quem recusa essa tese, é bom

textuais, “intercenatextuais”, combinadas, formada de citações, reviradas, cozinhadas, trituradas etc.,

ver o que acontece hoje na ópera, onde essa história está se repetindo diante de nossos olhos).

etc. Há algum tempo se processam essas formas híbridas, a partir de textos clássicos e textos de

O encenador foi o artista que abriu o palco para as peças de todas as épocas, de todos os gêneros, de

domínio público. Mas certos autores vivos, ou agentes e herdeiros de autores cujos direitos ainda são

todos os estilos, de todas as escolas, ampliando as possibilidades expressivas da cena, desenvolvendo

vigentes, já relaxam e gozam e admitem a criação de espetáculos “a partir de” suas obras. *

sua gramática, formulando uma nova poética. 8.

O palco re-inventado, o palco aberto, como se queira

11. É também natural que autores pactuem com seus diretores os limites dessas… parcerias, para chamar de algum modo a obra resultante no palco.

chamá-lo, desafiou os autores para novas formas dramatúrgicas. Desde Beckett, gerações de novos autores percebem o campo ilimitado do poético na cena e ousam (Bernhard, Sarah Kane, Lagarce, Vina-

Aderbal Freire-Filho

ver, para citar poucos). E muitas vezes vão além do palco que os encenadores abriram, propondo, por sua vez, novos desafios a esses mesmos encenadores. 9.

Modifica-se e modifica-se e vai continuar a se modificar a relação autor x encenador. No primeiro momento, o conceito de fidelidade era determinado pelo interesse do autor em dizer supostamente a mesma coisa escrita pelo autor. Dizer na língua visual e sonora do palco, com todas as liberdades que a criatividade inspirada pela cena oferecesse, o que talvez pudesse ser definido como ampliação pela encenação ou, mais simplesmente, como consumação da obra pela encenação. Antes, o texto só tratava-se de uma obra inacabada.

10. É natural que essa história, em outro passo mais, leve a criações de toda espécie, subordinadas, inter-

*

No Brasil, já são incontáveis os casos de espetáculos “a partir de” textos clássicos, como, por exemplo, Ensaio.hamlet e A gaivota, de Kike Diaz. Uma montagem revolucionária de A dama das camélias, de Alexandre Dumas filho, mantendo esse título, foi apresentada recentemente no Odeon, em Paris; na verdade, uma versão livre a partir do romance original, da peça A missão, de Heiner Müller e da História do olho, de George Bataille. Nessa miscelânea concebida pelo encenador alemão Frank Castorf, que resulta num único espetáculo, está, como se vê, um texto de autor cujos direitos ainda são vigentes (Heiner Müller). Warlikowski, um jovem encenador polonês, dos nomes mais destacados da cena europeia hoje, montou um espetáculo a partir de Um bonde chamado desejo, de Tennessee Williams; um autor americano, defendido pelas leis rigorosas de direitos dos Estados Unidos. Outro espetáculo recente desse polonês mistura um pequeno conto do Kafka, com um texto de Bernard-Maire Koltès e excertos do romance Elizabeth Costello, de J. M. Coetzee, Premio Nobel de Literatura de 2003.

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E N S A I O

Tablado , 60 anos agora Maria Luiza Franco Busse

Era uma vez... . História que começa com “era uma vez” tem por princípio acabar bem. Isso porque tudo cabe na ficção. Assim, o bem acaba bem e o mal acaba mal, para o bem de todos, do vilão inclusive, na perspectiva de uma pedagogia que tem a ética como valor primeiro. Ocasionalmente, há casos em que a realidade imita a ficção e foi o que se deu com o teatro Tablado, que vai passar todo o 2012 comemorando os 60 anos de fundação. “A vida vem, sem querer”, era a explicação de Maria Clara Machado quando alguém perguntava como as coisas aconteciam para ela. A inauguração do Tablado não foi diferente. O patronato da Gávea, dono do terreno, cedeu o local para a moça que apresentava teatro de bonecos para as crianças de seu educandário e montou num galpão o que hoje é referência de gosto pela arte de representar. A data era 28 de outubro de 1951. Portanto, o ano dos parabéns foi 2011, mas a celebração foi agendada para ocupar os dois semestres de agora. E a festa já começou bem. O teatro Tablado recebeu o troféu Categoria Especial da 24ª edição do prêmio Shell de Teatro, realizada no último 13 de março, no Rio de Janeiro. A próxima atração é a remontagem de A menina e o vento que, junto com Pluft e Cavalinho azul, compõe a trilogia dos clássicos dedicados ao público infantil escritos por Maria Clara Machado. Tem ainda os atores Pedro Cardoso e Graziella Moretto de volta com a peça-improviso Uãnuêi , sucesso de criação coletiva com a plateia que sugere o tema a ser encenado na hora. Novidade é Viagem de Clarinha, inédito de Maria Clara Machado escrito em prosa e que está sendo adaptado para a dramaturgia. Quem assina a delicada transposição é Cacá Mourthé, a sobrinha a quem a autora não deixou escolha quando a menina tinha 14 anos: “Cacá, a minha obra é sua”, disse a dona das histórias. E Maria Clara entendeu que além do

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mesmo nome da tia também tinha herdado dela, “sem querer”, a compreensão, o entendimento e a sensibilidade para o ofício que aquele tablado requisitava. Desde a morte de Maria Clara Machado, há 11 anos, Cacá toca as atividades do espaço, dentre elas os cursos que formaram atores como André Mattos, Andréa Beltrão, Cláudia Abreu, Dalton Mello, Fernanda Torres, Fernando Caruso, Georgiana Góes, Leonardo Brício, Louise Cardoso, Malu Mader, Marcelo Adnet, Marcelo Serrado, Mateus Solano, Micaela Góes, Selton Mello, Telmo Fernandes e tantos outros ‘tabladianos’. Aniversário supõe presente, e Cacá está torcendo para o Tablado ganhar dois: a liberação da verba de Ponto-de-Cultura, condição a que o teatro é habilitado há 4 anos e o Ministério da Cultura ainda não repassou. Por isso, não está sendo possível realizar o projeto de formar tabladianos de comunidades carentes do todas as partes da cidade, oferecendo oficinas de mão de obra de cenografia, além dos cursos de ator, além de voltar a editar o Cadernos de teatro que nasceu sob o lema “remember Amapá”. O objetivo de Maria Clara Machado era ensinar a produzir com recursos locais porque o espetáculo tem que continuar. A outra lembrancinha diz respeito ao prefeito Eduardo Paes. Depende dele a autorização para ser criada a Calçada da fama, no trecho da rua Batista da Costa, em frente ao teatro, na Lagoa, Zona Sul do Rio. O projeto de ocupação artística do asfalto, sem nenhuma expressão viária, e da pracinha, hoje suja e abandonada, já está na Secretaria de Cultura do município desde o início de 2011. Contempla anfiteatro e café, com atividades gratuitas aos cuidados do pessoal do Tablado. Cacá vai pedir uma audiência para expor a ideia junto com seus tabladianos. Quem sabe, “sem querer”, o prefeito aprova. O certo é que, a julgar pelo o que está no papel, a população vai aplaudir.


FOTOS: ACERVO TABLADO

Maria Clara Machado recebendo o Prêmio Moliere em 1969

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1956-1968

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1956-1968

2003

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Pluft, o fantasminha


Maria Minhoca, 1968

A bruxinha que era boa, 1958

Maroquinhas fru-fru, 1970

Tribob贸 city, 1971

Ensina-me a Viver

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A menina e o vento

1963

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1989-90

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Jonas e a baleia, 2001

A história de Tobias e Sara, 1955

O tempo e os Conways, 1957

O diamante do Grão-Mogol, 1967 O alfaiate do rei, 2005

O boi e o burro no caminho de Belém, 1953

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2001

O Cavalinho Azul 48

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1960


Camaleão na Lua, 1969

Camaleão na Lua, 2002

O embarque de Noé, 1957

Tio Vania, 1955 O Dragão Verde, 2008

Chapeuzinho Vermelho, 1956

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O S S O S

D O

O F Í C I O

Jogo de RENATO DE AGUIAR

Maria Luiza Franco Busse

Carlinhos Ferreyra 50

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O que têm em comum o bailão do musical Tim Maia, em que o ator Thiago Abravanel incorpora o síndico, e o espetáculo Versão brasileira, sobre a trajetória versionista de Cláudio Botelho, que estreia em abril no Rio? A sensibilidade de construir e propagar um áudio harmonioso e confortável para a plateia, sem perder a pressão. E os responsáveis por isso são profissionais que exercem a função de operador e designer de som. No caso, Branco Ferreira e Carlinhos Ferreyra, respectivamente. Aliás, Branco não gosta nem um pouco da nomeação ‘designer de som’. “Sou projetista, faço projeto de sonorização”, disse. E assim fica combinado que o termo importado será eliminado da conversa com o projetista Branco, responsável por dar o volume de som adequado ao ambiente do teatro, selecionar o equipamento e posicionar as caixas. O trabalho exige mixagem perfeita de tecnologia e audição emocional. “A técnica facilita, mas não te capacita, não dá ideia”, acrescentou. Pensar a história que tem na mão faz parte do projeto de som, que requer conhecimento e

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memória afetiva. “Em Tim Maia”, explicou Branco,” timbrei conforme as épocas. Na década de 1960, por exemplo, não existiam os graves tão profundos, fortes, que apareceram na década seguinte por causa da gravação digital.” Branco lembrou que no Brasil não existe faculdade de engenharia de som. Ele se formou técnico em eletrônica pelo CEFET – Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, referência de ensino técnico no país, e há 20 dos seus 44 anos está na “estrada”. É o caminho mais comum percorrido pelos profissionais da área de áudio, que costumam migrar da engenharia de telecomunicações ou elétrica. Além de projetar, Branco, ocasionalmente, também opera a mesa e os aplicativos que botam o som no ar. “Rouba” o trabalho de Carlinhos, que nem por isso se aborrece. A relação entre projetista e operador é tranquila, garantem os bons companheiros, que se entendem em sintonia fina. Trabalharam juntos, recentemente, na edição musicada do premiado Aurora da minha vida, de Naum Alves de Souza, e poderão ser “ouvidos” na reestreia de Marlene Dietrich, as pernas do século, em São


operar o aparato tecnológico pode parecer mecânico, mas está longe disso. “Tem a base gravada, mas é preciso sentir o sopro do músico, a voz, o que está sendo apresentado no dia, que nunca é igual aos outros, e é essa sensibilidade que garante o fluxo harmônico”, ressaltou o operador da batuta eletrônica, lembrando que esse é o ritmo durante toda a temporada e a cada sessão espetáculo. Branco e Carlinhos são amigos e parceiros profissionais desde 2005, quando se conheceram na coxia da peça Lado a lado com Sondheim, mais um musical de Charles Möeller e Cláudio Botelho. Branco era o projetista e Carlinhos, o operador. Mas só notaram que tinham o mesmo sobrenome no dia dessa entrevista. A separar, apenas o i do Ferreira do Branco e o Y do Carlinhos. Acharam graça. Normal. Coisa de gente que vive no silêncio das palavras do mundo particular da música.

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RENATO DE AGUIAR

Paulo. Em ambas, cada um no seu cada qual, se é que isso se aplica. Há 10 anos o trabalho aumentou e a tendência é estabilizar, tem para todo mundo. Esta é a opinião dos dois, satisfeitos por viverem dos seus ofícios. Carlinhos tem 33 anos e o gosto pelo ofício aconteceu aos 17, quando começou a carregar caixa acústica e a levar choques para “testar a bateria” na montagem do projeto de som do teatro de Arena, palco de importantes musicais, administrado por seu pai, o veterano Carlito Ferreyra. O primeiro trabalho de pilotar “as carrapetas” da mesa de som foi no infantil Dona Baratinha, dirigido por Bibi Ferreira, e a afirmação profissional veio em 2000 com o musical Cole Porter – Ele nunca disse que me amava, da dupla Charles Möeller & Cláudio Botelho. Desde então, é só alegria e muito cansaço mental porque “a mixagem não termina nunca, só o prazo”. A frase, que repetem, é de Fábio Henriques, referência da turma do som e que já virou epígrafe para a categoria. Isso porque o trabalho de

MONTAGEM COM FOTO DO BANCO DE IMAGENS © PHOTL.COM

som Branco Ferreira |

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Desenho de Lula

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