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Sexta-feira 26 de Março de 2010
TÉNIS
A BOLA
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«Revejo-me em Federer» CARLOS VIDIGAL JR/ASF
STEFAN EDBERG
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O antigo tenista a falar como foi no ‘court’: sereno, fluente, racional, sóbrio e assertivo. Deixou de jogar há 14 anos mas mantém-se atento ao ténis, divertindo-se nalguns torneios para veteranos. Mas pouco mais. Dedica mais tempo aos negócios e até prefere que os filhos não sigam as suas pisadas. Saiba porquê... Entrevista de
NUNO PARALVAS
j STEFAN EDBERG Data de nascimento — 19 de Janeiro de 1966 (44 anos) Naturalidade — Vastervik (Suécia) Altura — 1,88 m Peso — 77 kg Carreira — 1983 a 1996 Vitórias — 806 Derrotas — 270 Títulos — 42 ‘Grand slams’ — Austrália (1985 e 1987), Wimbledon (1988 e 1990) e Estados Unidos (1991 e 1992) ‘Ranking’ — 72 semanas número 1 ‘Prize money’ — 20,63 milhões de dólares (15,24 milhões de euros, ao câmbio actual), oitavo na lista dos tenistas que mais receberam
Foi muito bom ter sido tenista profissional mas senti necessidade de me afastar um pouco. Há outras coisas para fazer na vida
com os melhores e para se avaliar o nível do jogo. Seguramente que em Portugal é bom, mas os jogadores têm de ser postos à prova. É necessário que logo aos 12 anos se perceba qual o nível do jogo.
STEFAN EDBERG
antigo n.º 1 do ‘ranking’ ATP
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EIXOU o ténis em 1996, depois de uma carreira de grande sucesso. Como passouapreencherotempo livre? — Passo a maior parte do tempo na Suécia, onde vivo. Os meus filhos estão na escola, vou levá-los e buscá-los muitas vezes. Não viajo muito e dedico-me ao meu principal trabalho, que tem a ver com produtos financeiros e com imobiliário. O ténis ainda faz parte da minha vida, mas, agora, de forma menos significativa do que antes. — Sente saudades? — Para ser franco... nem por isso! Talvez as pessoas pensem que eu devia sentir falta de jogar ao mais alto nível. Foi muito bom ter tido a oportunidade de jogar ténis profissional, mas uma carreira dura 10 ou 15 anos e há outras coisas para fazer na vida. Senti a necessidade de afastar-me, embora tenha sempre mantido algum contacto. Não deixei o ténis em absoluto, continuo a ter prazer a treinar-me e a jogar. É bom jogar apenas uma hora, suar um bocado. Sinto-me bem e é isso que faço todas as semanas. — Que idade têm os seus filhos? — O meu filho Christopher tem 13 anos e minha filha Emily 17.
— É escusado perguntar se jogam ténis. — [Risos] O Christopher joga, mas a Emily não. — Acha que ele gostava de seguir o exemplo do pai? — Não. Acho que eles gostam de praticar desporto mas não pensam em ser profissionais, o que, de cer-
Stefan Edberg esteve 72 semanas no primeiro lugar do ‘ranking’ ATP e é ainda o oitavo na lista dos tenistas com mais prémios arrecadados ta forma, é muito bom para mim. Ser profissional é bom, mas exige muito trabalho, muitas horas de dedicação. Nem toda a gente precisa de chegar ao mais alto nível para tirar prazer do desporto. —Venceu,recentemente,umtorneio do ATP Champions Tour no qual ganhou a John McEnroe e Goran Ivanisevic [interrompe]... — ... Ainda consigo vencer alguns dos mais velhos [risos]. — Não conseguiria vencer alguns dos mais novos? — Não! O ténis mudou, tornouse muito físico. Os jogadores de hoje são muito fortes, batem a bola com mais força e a tecnologia também ajudou, especialmente as cordas das raquetas que permitem fazer melhor os spins. Nadal e Federer elevaram o nível do jogo. Os melhores são realmente bons e o jogo está in-
teressante. Há novos valores que podem discutir os jogos com eles. Por exemplo Del Potro, Murray, Cilic, Djokovic, Roddick. — Acha que tinha alguma hipótese de ganhar um set a Federer? — Não, não, não [risos]. Talvez um jogo, mas não há comparação possível. Eles são os melhores, treinam todos os dias e são muito mais novos. A diferença é muito grande e eu era muito melhor há 20 anos. Mas acho que ainda podia passar um bom bocado treinando-me com eles. Agora um jogo... seria muito duro! — Muitas pessoas dizem que Federer é o melhor jogador de sempre. Qual a sua opinião? — Concordo em absoluto. Não consigo ver outro jogador tão completo. Tem um recorde de vitórias em Grand Slams. Além do registo fantástico,temhipótesedecontinuar
a ganhar mais alguns torneios, o que é extraordinário. É o que mais gosto de ver jogar. — Que outros tenistas admira? — Cilic tem um grande talento e pode tornar-se um dos melhores do mundo, Djokovic já provou que pode bater-se com Federer e Nadal. Há muitos bons, mas, para mim, Federer está acima deles, é tremendo. De certa forma, revejo-me um pouco na sua maneira de jogar, muito fluente. Ele consegue fazer imensas coisas com a bola, mudar tácticas e faz parecer tudo fácil no court. Também é impressionante ver Nadal, a sua entrega física invulgar e a sua força mental em momentos cruciais. — Conhece alguns jogadores portugueses? — Não. Houve alguns no meu tempo, mas... não me lembro. — Frederico Gil ou Rui Machado? — Não.
Surpreendido com Portugal Stefan Edberg esteve em Portugal pela segunda vez, para a apresentação da Cascade Sports Academies, em Lagos, da qual é parceiro e conselheiro. No ano passado, no Verão, participou no torneio Vale do Lobo Grand Champions, e ficou com boa imagem do país, que agora reforçou. «Da perspectiva de um sueco, que conhece pouco de Portugal, fiquei muito bem surpreendido. Vindo do Norte da Europa, é natural gostar do clima temperado. O Algarve tem uma costa muito bonita e dramática. As pessoas têm sido muito simpáticas comigo, os espaços estão muito limpos e, pelo que sei, há pouca criminalidade, quando comparado com outros locais, mesmo na Europa. Parece uma zona muito boa para passar uns belos dias», disse o antigo tenista, que não sabe se voltará para jogar em Vale do Lobo, este ano. «Vou tentar, mas vai ser difícil — os meus filhos vão estar a fazer muitas coisas nessa altura...»
— Portugal tem grandes talentos no futebol e poucos no ténis. A Suécia continua a ter grandes tenistas. Há alguma explicação para que isso aconteça? — Obviamente, há talentos em Portugal, mas talvez sejam encaminhados para o futebol. Em primeiro lugar, no ténis são necessárias infra-estruturas. Acredito que Portugal as terá, mas também bons treinadores, boa liderança. Para se ser um bom jogador de ténis é necessário, além de elevado conhecimento do jogo, viajar muito para competir
— Essa será uma das razões para que a Suécia tenha tão bons talentos no ténis? — Tivemos uma geração de ouro, tivemos Bjorn Borg. O ténis tornou-se muito popular e construíram-se courts por todo o lado, os treinadores eram muito bons e trabalhámos muito. Os resultados não aparecem de um dia para outro. Tudo leva o seu tempo. Depois da geração de ouro, continuámos a ter jogadores muito bons. — O ATP tem um prémio de desportivismo com o seu nome. Qual a sua opinião sobre a decisão de André Agassi ter revelado, num livro, o consumo de drogas? — Não é uma história bonita. É uma história que não queremos ouvir. Não sei quais foram as razões que o levaram a fazê-lo, nem li o livro, mas tomei conhecimento do assunto e ouvi comentários negativos — tenho a opinião de que todas as pessoas têm liberdade de expressão e podem fazer o que entendem, mas acho que seria preferível recordá-lo pelo que fez nos courts, sem ter de olhar para este tipo de coisas. Não ébomouvirqueelelamentapelostenistas com quem jogou. — Mas essa confissão também não pode servir de alerta? — Sim, é verdade. É uma opinião que muitas pessoas têm e, na verdade, todos os indivíduos, de uma ou outra forma, cometem erros. Mas ele era um exemplo e agora muitos levantam questões e olham de maneira diferente para ele. Isso mudou. Pelo menos é o que oiço.