Saudade de Minha Amada

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Moacir Morran

“SAUDADE DE MINHA AMADA”


Capa: Carlos Meiga Ilustrações internas: Moacir Morran Revisão e Correção Textual Luiza Gorete Cavalcante Ferreira Diagramação e páginação: Carlos Meiga Gráfica e Editora: IRIS

Morran, Moacir Saudade de minha amada: cordel / Moacir Morran; ilustração de capa Carlos Meiga, ilustrações internas Moacir Morran - Fortaleza: Iris, 2011. 40p. : il. ISBN Prêmio Alberto Porfírio: Literatura de Cordel.

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Apresentação Falar de saudade, o que poderia ser mais arriscado? Quando Moacir Morran, no cordel que ora vos apresento, resolveu versar sobre o tema, mais do que certeza, tive um pressentimento... o poeta escreveria uma epopeia. E foi o que ele fez. O poema fala de uma “moça branca como a lua” que transforma o mundo de um jovem rapaz, levado, pelas peripécias da vida e do coração, a sentir muito mais que amor. O bem-querer do nosso narrador diversifica o ato de sentir; passeia da angústia à vitoria, da tristeza à mais simples alegria, aquela que é a melhor de se sentir. A saudade, que aparece do começo ao fim no mote, vai mudando e o arriscado natural que vem junto dela também se transforma, vira poesia. Nos versos rimados do cordel de 32 estrofes, o leitor será capaz de fazer uma viagem sincera entre as cercas dos sertões, os efeitos que causa uma longa distância no coração dos apaixonados e o que se pode sentir quando se ama, de verdade, um amor que – dizem – poderia ser impossível. Pois é, o Moacir consegue. Depois de ler tanto as composições dele, como já disse, tinha mais que certeza de o amigo conseguiria. O cordel vira saga, os sentimentos alimentam a história e nossas experiências com o tema, começam a aparecer pelo caminho. Identidade. Quando o que se lê toca o interior do ser humano, coisas inexplicáveis acontecem, tais como as que me ocorreram quando li os versos do amigo Morran. Tenho certeza que o mesmo irá acontecer, quando você leitor, iniciar seu mergulho nos versos desta ode.


Afinal, como nos demonstra esta obra que se inicia ao virar desta página, conhecemos pouca coisa do dito mundo real, quando estamos longe da literatura. Professor Kamillo Silva Mestre em História Social pela UFC e professor da rede pública de ensino. Produção: Autor da dissertação de mestrado Pelos caminhos das memórias, nas águas do Jaguaribe. A enchente em Jaguaruana nos anos de 1960, 1974, 1985.produção de u


A minha mĂŁe, Dona Creuza Que me ensinou a enfrentar a escola da vida. Ao amigo, Marcelo Avelino Que me orientou na vida acadĂŞmica. 5


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“SAUDADE DE MINHA AMADA” MOACIR MORRAN

Todo tempo neste instante É uma grande eternidade Pra matar essa vontade No meu coração pulsante De um amor que tá distante Bem longe dessa morada E nesta noite enluarada Ladeando a minha égua Eu quero gritar sem trégua: Saudade de minha amada. Essa falta é como um corte Que dói até no meu lembrar Não posso mais suportar Uma dor que bate forte Já não ligo nem pra morte Nessa vida agoniada Tão longe da desejada A mulher que sempre amei E o que sinto agora eu sei Saudade de minha amada.

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A saudade é ferro quente É pancada de chinela Não é bonança e nem procela Vira a cabeça da gente Não tem essa de valente Robustez incontestada Quando por ela é atacada O vivente se desmonta A cabeça fica tonta Saudade de minha amada. E quando se pega o mal Que já nasce dentro da alma É preciso muita calma Virtude descomunal Pois fere como punhal Essa ausência desgraçada Que é uma carga tão pesada Prum caboclo sonhador E assim toco o meu clamor Saudade de minha amada.

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Amar é algo complicado Floresta vira deserto O errado pode está certo O certo talvez errado O faminto é saciado O tudo se torna nada Liberdade aprisionada A prisão que não tem grade Eu rezo que nem um frade Saudade de minha amada. Sei que o homem também chora Quando perde um grande amor E eu conheço bem a dor Sinto de dentro pra fora Me rasgando como espora Toda a carne castigada E não tem dor comparada Ao que sinto aqui no peito E chorar é o meu direito Saudade de minha amada.

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Uma inevitável sina Não se tem como escapar O efeito do verbo amar É virose que amotina Nossa alma fica traquina A vida melhor e ousada Tem a sua carga pesada Como um peso de uma pena Onde está a minha pequena? Saudade de minha amada. Pode parecer loucura Esse meu desejo tolo Mas a mulher é um consolo Pra quem vive na amargura Solidão é uma sepultura Escura, funda e fechada Que deixa alma atormentada Suplicando uma atenção Digo com toda paixão Saudade de minha amada.

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Me lembro daquele dia Em que a vi a primeira vez Tava domando uma rês De seu pai, Seu Zé Maria E quando eu vi aquela “cria” Naquela cerca escorada Perdi o rumo da jornada Não morri por uma sorte E hoje canto até a morte: Saudade de minha amada. Moça branca como a lua Cabelo cor de carvão O corpo que nem violão Um encanto que insinua A qualquer homem da rua Do sertão e de outra parada Esta mulher tão encantada Moça linda de se ver Diga se não dar pra ter Saudade de minha amada.

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Sua voz doce a ressoar É brisa de litoral Assanhando o coqueiral E crespando todo o mar Na sua boca um paladar Da fruta mais desejada A minha alma enfeitiçada Que parecia até com fome E o alimento era o seu nome Saudade de minha amada. Mas antes dessa menina Meu coração era calado Batia meio retardado Não tinha essa adrenalina Agora tá como usina Pulsa que nem batucada O seu amor me fez morada Daqui nunca mais saiu Eita que paixão febril! Saudade de minha amada.

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Tudo foi como um trovão Fazendo muito barulho Minha vida era um bagulho Houve uma transformação Algo sem explicação A minha vida alterada Duma forma acelerada Que ninguém podia explicar Como é grande o meu penar Saudade de minha amada. Mas já era tarde demais Pra mudar o sentimento Arrancar do pensamento Minhas vontades carnais E eu gostava ainda mais Desta moça tão arretada E que passava enfeitada Nem olhava pro vaqueiro Canta meu lembrar brejeiro: Saudade de minha amada.

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Me recordo bem de um dia Em que nós nasceu a paixão Olhares em colisão No meio da vacaria Nós em pura sintonia Parecia um conto de fada Que em poesia ora é cantada Por um poeta vulgar Que não pára de gritar: Saudade de minha amada. Vivemos o nosso amor Por dentro de matagais Sem saber os nossos pais Não quisemos nada expor Eu um simples agricultor Ela um tanto afortunada Nossa paixão era vetada E pras famílias proibido Recito mesmo ferido Saudade de minha amada.

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Mas o capeta um dia apronta Não tardava a nossa vez E mal completara um mês Não chegou a fechar a conta Nosso destino então afronta Nos leva pruma emboscada Seu Zé Maria e a tropa armada Preparam uma tocaia Eu falo e ninguém empaia Saudade de minha amada. O amor não sabe contar Tanto faz um mês ou cem A razão não explica bem Como é que isso então se dar E quem sou eu pra discordar Do que não se sabe nada Mesmo achando adiantada Nossa relação escondida Que marcara a nossa vida Saudade de minha amada.

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Nós escapemos daquilo Tivemos foi muita sorte E quase vimos a morte Ressoando o seu sibilo Ninguém mais tava tranquilo A coisa ficou pesada Nossa paixão ameaçada Nos deixava em aflição E versou o meu coração: Saudade de minha amada. Cada dia ficou pior Até que um dia aconteceu Meu coração ali morreu Pois não houve dor maior Do que o fardo de estar só Na solidão dessa estrada É melhor uma facada No ventre e no coração Que viver essa emoção Saudade de minha amada.

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E naquele dia mesquinho O seu pai; velho selvagem Mandando-a fazer viagem Desfazendo o nosso ninho Hoje vivo aqui sozinho Numa casa tão surrada Canto a tristeza velada Nos versos dessa canção Que tem o triste refrão Saudade de minha amada. Hoje não tenho notícia Desse amor de juventude Nunca mais tive quietude Nem amor, paixão, carícia Fiquei como uma milícia Sonhando com a chegada Da mulher distanciada Há tempos de minha vida Ainda choro a partida Saudade de minha amada.

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Logo hoje no alegrete Em que me pus a lembrar Um amigo a me chamar Me trazia um certo bilhete Quase cai do tamborete Vendo a escrita desenhada Era o nome da danada De quem amei de verdade Pense na felicidade! Saudade de minha amada. Eu desfiz minha tristeza Enxugando aquele pranto Coração pulsava tanto Que até tive uma moleza E agora tinha certeza Minha dor ia ser curada Tendo a vida agraciada Com a volta do meu amor Eu já não dizia com dor: Saudade de minha amada.

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Abri aquilo lentamente Meu coração tão apertado Fui lendo aquele recado Muito vagarosamente Me mantinha reticente Numa leitura calada Da cartinha perfumada Que estava na minha mão Eu controlei a fixação Saudade de minha amada. Dizia assim o tal bilhete: “Ó meu amor, quero você É difícil te esquecer Pois teu amor é o meu banquete E tua ausência é um estilete Que me deixa mui cortada Quero por ti ser beijada” E aquilo tudo num triz Me fez gritar tão feliz: Saudade de minha amada.

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Agora eu ia rever meu amor E curar minha ferida Aquela emoção perdida Voltou até com mais sabor Eu agradeço ao meu Senhor Minha dor fora extirpada Uma dádiva alcançada Apagando o meu passado Digo mais aliviado: Saudade de minha amada. Não há mal que não tem cura E não há ida sem a volta Todo homem não se solta Das garras de sua cultura Não há coração que atura Uma lembrança gravada Que até hoje é recordada Me ferindo com maldade Vou matar essa ansiedade Saudade de minha amada.

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Eu sai deste calvário Revigorei minha vida Já não sinto essa ferida No meu coração ordinário Vivo um novo itinerário Que mudará essa jornada A vontade tão sonhada De rever o meu passado Me fez cantar invocado: Saudade de minha amada. O lírio abriu bonito Cortejado por pardais Vi belezas divinais Naquele dia tão bendito Tudo isso já tava escrito Antes dela ser contada Dessa maneira rimada Por um poeta sem tino E será obra do destino? Saudade de minha amada.

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É imensa a minha alegria Que alívio pro meu penar Deus veio me abençoar Matando a melancolia E o que minha alma sofria Há muito tempo enjaulada Mas hoje então libertada Quer de novo reviver Para nunca mais dizer: Saudade de minha amada. Chega ao fim o meu sofrimento Versejado neste ensejo Realizando o meu desejo Que risquei dentro do vento A alegria nesse momento Explodindo iluminada Tornou toda a caminhada Muito mais leve e feliz Dentro de mim já não diz: Saudade de minha amada. Aracati, 13 de março de 2006, às 10:12 de uma manhã chuvosa. 37


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