r e b e i S o b l a r Jou r e b e i S n a l l &A
Copyright © Jouralbo Sieber e Allan Sieber. Todos os direitos desta edição reservados à MV Serviços e Editora Ltda. revisão: Rogério Amorim
cip-brasil. catalogação na publicação sindicato nacional dos editores de livros, rj S573n Sieber, Jouralbo, 1930 Ninguém me convidou/ Jouralbo Sieber, Allan Sieber – 2. ed. – Rio de Janeiro : Mórula, 2015. 116 p. ; 30 cm.
ISBN 978-85-65679-30-5
1. Humorismo brasileiro. I. Sieber, Allan. II. Título.
15-22147
CDD: 869.97 CDU: 821.134.3(81)-7
R. Teotônio Regadas, 26/904 – Lapa – Rio de Janeiro www.morula.com.br | contato@morula.com.br
Agradecimentos Gostaria de agradecer imensamente a Eva Iolanda Sieber, senhora minha mãe e esposa de Jouralbo. Obrigado por nos agüentar, mãe. Meus sinceros agradecimentos a Claudia Jouvin, Lucas Pexão, Jorge Furtado, Nora Goulart, Chiquinha, Bebê Baumgarten, Fabio Zimbres, Cynthia B, Rogério de Campos, Marcelo Y. Salles e Patricia Pombo, por terem me ajudado com um apoio logístico fundamental e acreditado no livro. Denise Garcia, Tiago Lacerda e Alzira Valéria: muito obrigado por doarem horas de trabalho transcrevendo as entrevistas que fiz com Jouralbo. Por fim, muitíssimo obrigado a Marianna Araujo, Patrícia Oliveira e Vitor Monteiro de Castro, meus amigos da Mórula Editorial.
PREFÁCIO
D
o b l a r u o J
Meu pai se chama
esde que me conheço por gente, Jouralbo Sieber sempre foi um estranho para mim. Meu pai era muito apegado a meu irmão mais velho, Halex, e quando esse saiu de casa ainda adolescente, ele simplesmente achou que não era uma boa idéia “investir” num relacionamento com o filho mais novo para não se decepcionar novamente. O mais legal dessa história é que o próprio Jouralbo me contou dessa preferência – por Halex – anos atrás. Ele sempre foi de uma sinceridade desconcertante, beirando o autismo. Sim, lá em casa tinha SIM um irmão mais querido que os outros... Lembro vagamente de alguns passeios em praças, mas não passava disso. A índole do meu irmão (éramos seis, nessa ordem: Silvia Helena, Suzana, Halex, Claudia e Claudete – gêmeas – e por fim eu, o caçula temporão) combinava com a do meu pai. Eles pescavam, caçavam e viajavam juntos, eram realmente ligados. Já eu sempre fui muito introspectivo, quase um autista, não socializava com outras crianças de minha idade. Lembro inclusive que um dia minha mãe, a sábia senhora Eva Iolanda, tomou a iniciativa de convidar um garoto do bairro a brincar comigo e depois que ele começou a maltratar um gato da nossa casa eu bati nele... Eu era uma criança “sensível”, digamos assim. Para mim, Jouralbo sempre foi um ser ameaçador, não violento, mas era aquela coisa, uma figura paterna muito rígida. Alguém que eu temia mais do que o próprio
Deus. Mas no final das contas não é esse o papel de um pai? Eu tinha orgulho de ter um pai desenhista e cresci lendo sua coleção de quadrinhos, que incluíam Nick Holmes, The Spirit e O Fantasma. Sempre gostei do desenho mais “cartum”, caricato, homenzinhos com narizes grandes, olhos esbugalhados. Recordo que meu pai tentou me ensinar as noções básicas do desenho, perspectiva, anatomia e sombra, mas isso durou poucos meses, eu realmente não tinha talento para esse tipo de desenho. A frustração dele era visível com meus garranchos. Aos 20 anos saí da casa de meus pais e por anos mantive um contato apenas esporádico com Jouralbo. Ele já estava aposentado e passava seus dias vendo filmes na TV e tendo eventuais acessos de fúria com os muitos netos. 5
lugares, ruas, nomes e sobrenomes. Incrivel, acho que nunca conheci alguém com uma memória tão prodigiosa para datas (por outro lado, a memória recente dele é parecida com a minha: saíamos para comprar meia dúzia de coisas na padaria e esquecemos da metade delas sempre). A medida que eu ía cruzando as informações das sessões de entrevistas e organizando isso em ordem cronológica, montava esboços de páginas em quadrinhos para ele desenhar. Ele desenvolveu um ritmo rápido depois do começo e confesso que se não fosse pelo meu atraso em mandar os roteiros - eventualmente passava 6 meses sem mandar nada – esse álbum já estaria pronto há uns dois anos. Sim, a culpa é minha.
Em 2006, tive a idéia de fazer uma longa entrevista com ele, já com uma ideia embrionária desse livro. Ele sempre foi bom para contar histórias, e eu lembrava de algumas coisas que não tinha certeza se eram fantasias da minha infância ou se realmente aconteceram. Propus nessa época fazermos esse livro juntos. Seria a história dele como desenhista dos anos 1940 a 1990 passada por um filtro, no caso, eu. Até o começo de 2010 gravei mais ou menos umas 15 horas de entrevistas com ele. Tinha coisas que eu esquecia de perguntar ou não estavam claras para mim e quando retomava o assunto ele lembrava das datas - dias, meses e anos – sempre com a mesma precisão. Coisas que aconteceram há mais de 70 anos... Pessoas,
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Esses atrasos se deviam a dois fatores: por um lado eu faço muitas coisas ao mesmo tempo, muitas mesmo (não bem feitas, mas isso não vem ao caso) e por outro eu sentia uma responsabilidade enorme em lidar com as coisas e as histórias do meu pai. Várias vezes pensei em desistir do projeto por achar que eu não estava à altura dessa tarefa levemente hercúlea: condensar em menos de 100 páginas mais de 5 décadas de trabalho de uma pessoa. Também aventei a hipótese de entrevistar amigos e ex-colegas dele para detalhar melhor certas histórias que ele me contava. Desisti disso por conta de ele quase não ter amigos hoje em dia e porque no final das contas a história de Jouralbo quem deveria contar era o próprio Jouralbo. Simples assim. Vendo o processo dele em fazer os quadrinhos consegui enxergar um paralelo com o tempo em que eu fazia fanzines: colagens de títulos, sobreposições, correções no original com tinta guache branca, etc. Ele usava o seu velho computador como eu utilizava a máquina de Xerox. Só que ele é mais caprichoso do que eu jamais fui, sempre me entregou os originais montados em cartão duro e com um papel manteiga para proteger a arte-final. Lá pelas tantas eu me dei conta de que eu era o “chefe” do meu pai nesse processo e ele era um profissional irrepreensível.
Pobre Jouralbo, a essas alturas com certeza merecia um chefe mais digno... Tivemos algumas poucas desavenças com relação ao roteiro, mas acho que é exagero chamar de “desavença”. Eu tentei sacanear algumas pessoas ao longo do livro - pessoas que realmente mereciam ser sacaneadas - mas meu pai tem uma ética muito rígida quanto a isso e cortou esses momen-
tos mais espinhosos, por assim dizer. Com freqüência ele alterou o roteiro original em prol de uma verossimilhança e adicionou um novo personagem ás histórias finais: uma gatinha que foi achada perto de sua casa na praia do Pinhal, no litoral gaúcho, a “Pretinha”. Há poucos minutos atrás, quando estava escrevendo esse posfácio, liguei para ele para saber se era uma gata ou um gato e qual era o nome ao certo do bicho. – Todos chamam de Pretinha, mas para mim é Esperança. Esse Jouralbo não cansa de me surpreender. Hoje, vejo claramente que além de querer contar a(s) história(s) dele, eu queria fazer esse livro para ficar ao lado do meu pai e ouvi-las. Ele é uma pessoa difícil e eu
também não sou muito fácil. Esse conflito de personalidades nos distanciou por muito tempo, mas vendo suas histórias aqui reunidas sou obrigado a concluir que ele me influenciou muito mais do que eu imaginava. Sua obsessão em sempre ser ele, custe o que isso custasse, é louvável. Não foi um aprendizado formal do tipo do pai que pega o filho no colo e fala “filhinho querido, a
vida é assim e assado”, não, foi meio na “patada” –somos gaúchos, afinal de contas, sem frescura, pô! - e no instinto, mas por causa dele eu sei o que é ser gente nesse mundo ingrato. Nossa vida não daria um filme hollywoodiano ridículo do tipo “meu pai me ensinou a andar de bicicleta, a dirigir e a me barbear”, não, meu querido pai me ensinou - não por palavras - uma coisa muita mais preciosa que isso: seja você mesmo, sem concessões. Não seja um puxa-saco, por mais que a vida lhe imponha isso. Nade contra a corrente com braçadas fortes. Obrigado, Jouralbo. De um jeito ou de outro acho que aprendi a lição. Allan Sieber Rio de Janeiro, 18 de outubro de 2010
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APRESENTAÇÃO
Também não fui convidado N
inguém me convidou para escrever sobre este livro, mas eu tenho uma séria demanda a fazer: devia haver mais livros como este. Por vários motivos. O primeiro e mais óbvio é que convencer os pais a desenhar é uma sacada genial que, sem dúvida, vai animar muitos desenhistas brasileiros que já consideram abandonar esse ofício desgastante. E são vários os desenhistas com pais que tenham pelo menos alguma familiaridade com canetas e réguas. Já prevejo uma série de experiências semelhantes, até o extremo de transformar os pais numa dupla de desenhista e roteirista para criarem nossa “autobiografia” (autores com muita autoridade para o trabalho, convenhamos). Além disso, é um livro de memórias. A autobiografia é um gênero muito praticado nos quadrinhos, mas memórias nem tanto. Os quadrinhos autobiográficos são quase crônicas que se escreve enquanto se vive. O que me refiro é olhar realmente para trás (aquilo que só dá pra fazer quando você está realmente distante, cronológica ou geograficamente). É possível que depois de anos fazendo quadrinhos a aposentadoria seja o sonho dos desenhistas e só a ideia de reviver essa vida de desenhista (e fazer isso desenhando) seja um fator desanimador. Temos exceções, e esse livro já ganhou a companhia de um livro do Santiago e outro da Laerte (são os que eu me lembro agora, além de uma que o Guazzelli está prometendo). Mas são poucos. Eu gosto de memórias, deveria haver mais livros como esses. Memórias, é claro, são parte da história e eu tenho fascínio pelas histórias desse século XX. As pessoas finalmente puderam viver das maneiras mais diversas possíveis, numa explosão de idiossincrasias nunca vista antes e ainda não sabemos aonde vamos chegar com isso. Este livro mostra um personagem vivendo numa Porto Alegre que eu
não conheci, mas cujas histórias aparecem de vez em quando num pedaço de conversa ou num trecho de rua que surge de repente. Este livro é mais um pedaço dessa cidade desaparecida onde eu acabei vindo morar. E, claro, entre as coisas que me interessam neste livro tem algo que talvez seja muito particular: eu gosto de histórias de redações, de editoras, do dia a dia de desenhistas e autores em geral. E este livro está cheio disso e de uma redação especial: a Editora Globo, de Porto Alegre, era uma das editoras mais importantes do Brasil e reunia autores que são importantes para a cultura brasileira. Além disso, reunia alguns dos melhores desenhistas (entre artistas e desenhistas comerciais, para fazer uma distinção mais comum antigamente) trabalhando na área. Vários nomes que vamos encontrar aqui foram personagens importantes desse ofício e grandes artistas cujo trabalho nos aparecem às vezes revirando as prateleiras dos sebos (de Porto Alegre e de outras cidades porque a Editora Globo era nacional e não um fenômeno regional). Pouco se fala ou se conhece sobre esses artistas (o trabalho da pesquisadora Paula Ramos é uma exceção ainda não publicada e que, portanto, quase ninguém teve acesso) e minha curiosidade sobre eles perdura. O Jouralbo fazia parte desse universo e conviveu com o Mottini, Fahrion, Zeuner e outros. E o mais incrível é que o autor e desenhista destas memórias desenha no estilo que ele desenvolveu nessa época, sentando nas mesas por onde essa gente passou. E, finalmente, tem que haver mais livros de um senhor chamado Jouralbo e que numa certa época da vida comprava camisas multicoloridas e espalhafatosas só para irritar as pessoas.
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m 1977, eu tinha um laboratório montado na Raul Moreau Propaganda. Um dia me convidaram na agência para fazer um comercial para TV: eu fazia o papel do faxineiro de uma escola, que se passava por um professor na ausência dele e que no fim é surpreendido “dando aula” pelo próprio professor. Foi meio complicado, tive que ensaiar bastante, era um texto grande. Gravei essa cena várias vezes porque o diretor implicava com a minha voz, achava que era muito nasalada, sei lá. Coisas da publicidade. Por fim, tive eu mesmo que me dublar, uma coisa que achei difícil e chata. Tinha que
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olhar dezenas de vezes a minha própria imagem para acertar o movimento labial e a voz. Foi dureza, mas acabei acertando. O cachê era muito bom e nessa época eu estava precisando de um dinheiro extra. Foi meu primeiro comercial... Logo depois um amigo que fazia freelance para outra agência viu esse comercial e me chamou para fazer outro. Nesse, o meu papel também era o principal: um garçom que servia café, se atrapalhava, caía por cima da mesa e virava ela. E, no fim, o garçom pegava a xícara de café e tomava aquele cafezinho, que era o Café David. A agência era bem pequena e não tinha mui-
ta verba para fazer esse trabalho. O negócio era gravar na madrugada num estúdio de TV. Porque era mais barato gravar nessa hora, por causa do mesmo problema da verba curta, tinha que ser tudo resolvido numa tomada só... Então fui lá, ensaiei o texto algumas vezes e gravei. Fiz tudo certo. Caí de verdade com o café em cima da mesa, aquela confusão toda... Mas deu certo, e por anos eu fui reconhecido na rua pelo papel do garçom trapalhão. Re! Re! Meu terceiro trabalho como “garoto-propaganda” veio desse comercial do Café David. Na madrugada que estávamos gravando, um produtor de uma agência
maior acompanhou a gravação e ficou muito impressionado com o meu “profissionalismo”, afinal, era uma cena difícil e consegui fazer numa tomada só, sem errar. Esse sujeito depois veio me cumprimentar falando que gostou muito do meu desempenho e tinha uma ponta para mim em outro comercial. De fato, meses depois fui chamado para outra gravação. O anúncio era de uma loja chamada “Tennis Show”. Perguntavam para várias pessoas: “O que é Tennis Show?” Eu era uma dessas pessoas e respondia algo ligeiramente absurdo. Esse foi meu último “papel” na TV... 1977 foi um ano movimentado.
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NESTA PÁGINA, EM SENTIDO HORÁRIO, JOURALBO, EVA IOLANDA E ALLAN SIEBER NA PRAIA DO PINHAL (RS); ALLAN COM O DEDO ESMAGADO AOS DOIS ANOS, EM 1973; JOURALBO, EVA IOLANDA E ALLAN. NA PÁGINA À DIREITA, JOURALBO, EVA IOLANDA E HALEX SIEBER, EM 1973.
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2a edi巽達o
maio 2015
impress達o rotaplan
papel miolo
papel capa
offset 90g/m2 cart達o supremo 300g/m2
SOBRE OS AUTORES Jouralbo Sieber
nasceu em 1930 em Porto Alegre, RS. Ilustrador, seu primeiro emprego foi na Editora Globo em Porto Alegre, nos anos áureos da editora. Depois, passou a trabalhar como desenhista e diretor de arte na publicidade gaúcha, carreira que seguiu até os anos 1990. Ninguém Me Convidou é sua primeira HQ e atualmente trabalha no seu segundo álbum, de novo em parceria com seu filho Allan e outros desenhistas.
Allan Sieber nasceu em 1972 em Porto Alegre, RS. Quadrinista, ilustrador e diretor de animações, colaborou com diversas revistas e jornais nacionais, como Piauí, Sexy e Trip, além de ter trabalhos publicados na Argentina, França, México, Finlâdia e Espanha. Desde 1999 mora no Rio de Janeiro, onde trabalha em sua produtora de animações, a Toscographics, e publica diariamente as tiras “Preto no Branco” e “Bifaland”, no jornal A Folha de S. Paulo.
Ninguém me convidou para escrever sobre este livro, mas eu tenho uma séria demanda a fazer: devia haver mais livros como este. Por vários motivos. O primeiro e mais óbvio é que convencer os pais a desenhar é uma sacada genial que sem dúvida vai animar muitos desenhistas brasileiros que já consideram abandonar esse ofício desgastante. Além disso, é um livro de memórias. A autobiografia é um gênero muito praticado nos quadrinhos, mas memórias nem tanto. Eu gosto de memórias, deveria haver mais livros deste gênero. E, claro, entre as coisas que me interessam nesse livro tem algo que talvez seja muito particular: eu gosto de histórias de redações, de editoras, do dia a dia de desenhistas e autores em geral. E este livro está cheio disso. E, finalmente, tem que haver mais livros de um senhor chamado Jouralbo, que numa certa época da vida comprava camisas multicoloridas e espalhafatosas só para irritar as pessoas.
Fabio Zimbres
ISBN 978856567930-5
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