EXCELENTÍSSIMO SENHOR DR. JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, presentado pelo Promotor de Justiça que a esta subscreve, titular da 7ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania do Núcleo da Capital, com sede na Av. Nilo Peçanha n.º 26 – 4º. andar, onde receberá intimações, vem, com amparo nos arts. 127 e 129, III da CRFB/88; nos arts. 1º e segs. da Lei n.º 7347/85; no art. 25, IV, “b”, da Lei nº 8.625/93; e no art. 17 da Lei nº 8.429/92, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA,
com requerimento liminar,
em face de: 1. EDUARDO DA COSTA PAES, brasileiro, casado, bacharel em Direito e Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro, domiciliado na Sede do Poder Executivo, situada na Rua Afonso Cavalcanti, 455/13º andar; 1
2. ANTONIO PEDRO VIEGAS FIGUEIRA DE MELLO, inscrito no CPF sob o nº 088.641.467-92, Secretário de Turismo e Diretor-Presidente da RIOTUR, com endereço na Rua Marques de São Vicente, nº 287, Ap. 602, Gávea, nesta; 3. PAULO
ROCHA
VILLELA,
inscrito
no
CPF
sob
o
nº
CPF
370.813.817-15, ex-Diretor de Operações da RIOTUR, com endereço na Rua Rainha Guilhermina, nº 150, Ap. 101, Leblon, nesta; 4. AMÉRICO DA COSTA BORGES, inscrito no CPF sob o nº 241.071.747-00, Diretor Administrativo e Financeiro da RIOTUR, com endereço na Estrada da Gávea, nº 646, Ap. 402, São Conrado, nesta; 5. INSTITUTO SUPERAR, associação civil inscrita no CNPJ sob o nº 08.986.683/0001-00, com sede na Rua Victor Civita, 66, Bloco 2, Edifício 4, Salas 205 e 333, Jacarepaguá, nesta, e no Complexo “O2”, Bloco 7, Sala 208, Barra da Tijuca, nesta; 6. MARCOS MALAFAIA DA PREZA, inscrito no CPF sob o nº 942.351.987-34, Jornalista, com endereço na Rua Victor Civita, 66, Bloco 2, Edifício 4, Salas 205 e 333, Jacarepaguá, nesta; na Av. Lúcio Costa, 5100, Bloco II, AP. 1103, nesta; e no Complexo “O2”, Bloco 7, Sala 208, Barra da Tijuca, nesta; 7. Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro - RIOTUR, situada na Praça Pio X, nº 119, 10º andar, Centro, Rio de Janeiro,
2
pelos fatos e fundamentos jurídicos adiante expostos.
-I– DOS FATOS E DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
I.1 – Breve Resumo dos Fatos
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, a partir de representação da ilustre Vereadora Andrea Gouvêa Vieira, instaurou o Inquérito Civil nº 2011.01072113, cujos autos instruem a presente inicial, com vistas a apurar possível ilegalidade na contratação do Instituto Superar, pela Prefeitura, para a realização do evento hípico “Oi Athina Onassis Horse Show”, 1na Cidade do Rio de Janeiro, nos anos de 20092 e 20103 (fls. 02 e ss.).
“Nascida na França, Athina foi a única filha de Christina Onassis (1950-1988) e de seu quarto marido, Thierry Roussel, herdeiro francês de uma fortuna farmacêutica. Seu prenome é uma homenagem à avó materna, Athina Livanos. 1
Depois da morte de sua mãe, que cometeu suicídio num hotel em Buenos Aires, na Argentina, Athina passou a morar com seu pai e com sua madrasta, Marianne "Gaby" Landhage, uma modelo sueca que tinha sido amante de longa-data de seu pai, de quem já tinha dois filhos. Atualmente, eles têm três: Erik Christophe (1985), Sandrine (1987) e Johanna (1991). Athina foi educada em escolas estaduais em Lausana, na Suíça, que seguem o modelo francês de educação secundária[. Ela terminou seu curso de Baccalauréat no verão de 2003. 3
Conforme se depreende da análise dos autos do Processo Administrativo nº 12/400.568/2009 (fls. 44 e ss. do Inquérito Civil), por intermédio do Contrato nº 065/2009, datado de 30 de julho de 2009 (fls. 103/106), a RIOTUR assumiu o compromisso de participar financeiramente do evento mediante o pagamento do valor de R$ 2.000.000, (dois milhões de reais), o que efetivamente se deu. No ano seguinte, já agora por intermédio do Processo Administrativo nº 12/400.618/2010 (fls. 277 e ss. do Inquérito Civil), as mesmas partes firmaram o Contrato nº 103/2010, datado de 24 de agosto de 2010 (fls. 335/338), assumindo a RIOTUR o compromisso de participar
Quando Athina começou a namorar, em março de 2003, o brasileiro Álvaro de Miranda Neto, conhecido como "Doda Miranda" e que é doze anos mais velho do que ela, mudou-se para São Paulo, onde o casal passa temporadas nos dias de hoje, residindo na Bélgica. Eles pagaram 8,6 milhões de dólares por um luxuoso e enorme duplex, na Vila Nova Conceição, com espaço para quinze carros e com vista para o Parque do Ibirapuera. Athina Roussel e "Doda Miranda", se casaram em 3 de dezembro de 2005. O pai e a madrasta da noiva não compareceram, mas sua meia-irmã Sandrine Roussel foi convidada. Com o casamento, Athina oficialmente tem agora uma enteada, a filha de Doda, Viviane. Mais de mil garrafas de champagne da marca Veuve Clicquot foram compradas, e ritmos de samba eletrônico foram escolhidos pelos noivos, que dançaram até o amanhecer. O casal teve aproximadamente dez testemunhas, dos quais muitos eram equitadores brasileiros. Athina e Doda decidiram não publicar as fotos do casamento (conforme eles estavam planejando fazer), porque um programa de televisão comentou sobre a trágica morte de sua mãe antes do casamento. O casal alegadamente não pediu presentes, mas pediu para que o dinheiro deles fosse doado para instituições de caridade” (Fonte: Wikipédia). 2 3
Entre os dias 31/07 e 02/08. Entre os dias 26 e 28 de agosto. 4
financeiramente do evento mediante o pagamento do valor de R$ 2.000.000, (dois milhões de reais), o que efetivamente se deu. Em ambos os contratos os valores, no total de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões), foram repassados pela RIOTUR ao Instituto Superar, contrato mediante inexigibilidade de licitação (art. 25, caput, da Lei nº 8.666/93). Conforme se vê de fls. 46/47 e 279/280 do Inquérito Civil, os contratos foram justificados pelo suposto fomento da atividade turística que referido evento proporcionaria à Cidade, além dos benefícios à imagem do Rio de Janeiro no cenário mundial e à sua candidatura aos Jogos Olímpicos de 2016. Não obstante parte do custeio dos eventos tenha ocorrido com verbas públicas, a entrada aos mesmos foi explorada comercialmente
por
meio
da
venda
de
ingressos,
com
preços
consideravelmente altos, revertidos em favor de particulares. Nessa
linha,
registre-se
que,
de
acordo
com
informações prestadas ao Ministério Público pelo próprio Instituto Superar (fls. 704/705), as mesas mais “baratas” foram vendidas por nada menos que R$ 16.000,00. Já os camarotes mais “baratos” foram adquiridos por R$ 300,00, sendo o ingresso “mais em conta” comercializado a R$ 100,00. É relevante também considerar que somente com a venda de ingressos o “Oi Athina Onassis Horse Show” arrecadou, em 2009,
5
o valor de R$ 1.153.146,00 e, em 2010, o total de R$ 1.078.606,06 (fl. 713 do inquérito civil).4 Em suma, por meio de verbas públicas custeou-se evento fechado, realizado num dos clubes mais privativos da alta sociedade carioca, a Sociedade Hípica Brasileira5 I. 2 - Da Manifesta Ausência de Interesse Público O luxuoso evento bancado com verbas do erário municipal, como já referido, voltou-se a um seletíssimo grupo de cavalheiros e damas, brindados pela presença da conhecida Boate “Disco de São Paulo” (fl. 52), por uma área de mesas “VIP” para 1080 pessoas e por uma área de boulevard com 12 lojas, 3 restaurantes e 1 bar (fl. 53). Tal circunstância indica que, além dos valores arrecadados com a venda de ingressos, houve também vultosos lucros com a comercialização de bebidas, alimentos e outros produtos, o que, certamente, incrementou ainda mais o lucro dos particulares,
já
beneficiários
pela
contribuição
milionária
da
municipalidade. Só o “retorno de mídia” foi de R$ 22 milhões em 2009, R$ 41 milhões em 2010 e R$ 48 milhões em 2011. Já os cavaleiros e amazonas, além de desfrutarem dos mesmos
requintes,
foram
agraciados
com
Hospedagem
no
Hotel
Copacabana Palace (fl. 51) e recebidos pelo Governador do Estado no
No ano de 2011, em que não houve patrocínio da Prefeitura, a venda de ingressos rendeu o valor de R$ 1.268.391,88 (fl. 713). 5 Sobre a Sociedade Hípica Brasileira e seu glamour, consulte-se http://www.shb.com.br/novo/index.php. 4
6
Barco Plink Fleet, de propriedade do conhecido empresário carioca Eike Batista. Très chic.6 É essencial também destacar que a contratação do até então desconhecido Instituto Superar, fundado em 2007 e presidido pelo demandado Marcos Malafaia da Preza (fls. 58/74), deu-se sob a alegação de que o evento beneficiaria atletas paraolímpicos, dada a possibilidade de estabelecerem contatos com patrocinadores (fls. 54 e 651). Ocorre que, como se sabe, o hipismo não figura dentre os esportes paraolímpicos, o que, por si só, afasta a justificativa alegada. Também não há qualquer notícia concreta de incentivo aos esportes paraolímpicos. A rigor, todos os elementos estão a indicar que a participação do Município deu-se em franca violação ao interesse público e voltou-se, por isso, ao incremento de negócios de caráter exclusivamente privados (venda de ingressos, comercialização de bebidas, alimentos e outros produtos), inclusive a transmissão por grandes redes de televisão, nacionais e estrangeiras (TV Globo e Sportv e Eurosport etc – fls. 281/282). Registre-se, por relevante, que a parceria com as emissoras nacionais deve-se à longa carreira do demandado MARCOS MALAFAIA na Rrede Globo de Televisão, como repórter esportivo e executivo (fls. 568/570). Ademais, como já exposto, população não teve acesso aos referidos espetáculos hípicos, cujos preços foram fixados em valores
6
Cf., no Inquérito Civil, as diversas notícias publicadas nas colunas sociais da grande imprensa. 7
significativos de modo a selecionar os participantes em virtude das possibilidades econômicas que ostentam. Portanto, conclui-se que os contratos firmados pela RIOTUR violam o art. 6º, II, da Lei nº 8.666/93, na medida em que os “serviços” contratados, produção de evento particular, não se destinavam a “obter determinada utilidade de interesse para a Administração”, que se encontra vinculada ao interesse público, assim conceituado pela mais vetusta doutrina de Direito Administrativo: “O princípio do interesse público está intimamente ligado ao da finalidade. A primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral. Em razão dessa inerência, deve ser observado mesmo quando as atividades ou serviços públicos forem delegados aos particulares. (...) Como bem ensina Celso Antonio Bandeira de Mello, o “princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele... Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social”” (Meirelles, Hely Lopes.
Direito
Administrativo
Brasileiro.
32a
Edição.
Malheiros. São Paulo. 2006.)
8
A corroborar a manifesta ausência de interesse público, relevar
notar
que
sequer
foram
contratualmente
previstas
as
contrapartidas previstas na Lei Municipal nº 3.006/2000 (fl. 780), que assim dispõe:
“LEI Nº 3006 DE 18 DE JANEIRO DE 2000 Institui a obrigatoriedade da Contrapartida nos contratos de patrocínio firmados pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e dá outras providências. Art. 1º Fica instituída no âmbito da Secretaria Municipal de Esportes
e
Lazer,
a
obrigatoriedade
da
prestação
de
contrapartida pelos beneficiários de contratos de patrocínio firmados com a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Art. 2º A prestação da contrapartida a que se refere o art. 1º deverá se efetivar através da obrigação de : I - realizar palestras, conferências e atividades orientadas na Rede Municipal de Ensino; II - realizar palestras, conferências e atividades orientadas e práticas nos Centros Esportivos Municipais; III - participar de Seminários, Cursos e Encontros Orientados para professores de Educação Física da Rede Municipal de Ensino; IV - participar de competições, torneios e certames realizados ou apoiados pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
9
Art. 3º Para efetivação da contrapartida de que trata esta Lei os órgãos envolvidos deverão celebrar convênio de colaboração mútua. Art. 4º O cronograma de contrapartida deverá fazer parte obrigatória dos contratos de patrocínio, contendo as datas e locais em que ela será efetivada. Art.
5º
O
descumprimento
do
cronograma
de
contrapartida gerará: I - multa de trinta por cento do valor do contrato; II - rescisão do contrato de patrocínio no caso de reincidência. Parágrafo único. O beneficiário do Contrato de Patrocínio que tenha sido
rescindido pelo descumprimento do
cronograma
contrapartida
de
ficará
impedido
de
contratar novo patrocínio com a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Art. 6º O Poder Executivo adotará as medidas cabíveis à plena execução da presente Lei. Art. 7º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário”.7
Mas não é só.
A necessidade de previsão das contrapartidas previstas na Lei nº 3.006/2000 foi apontada pela Procurador do Município Rodrigo Ramos Lourega de Menezes nos autos do Processo 15/000.469/2011 (fl. 615), relativo ao patrocínio para o ano de 2011, que acabou sendo cancelado. 7
10
I. 3 – Do Desvirtuamento da Inexigibilidade de Licitação Mesmo
que,
ad
argumentandum
tantum,
se
vislumbrasse interesse público a justificar dispêndio do erário com a realização de evento privado, é flagrante a desobediência aos preceitos dos arts. 13 e 25 da Lei 8.666/93, diante das irregularidades nas justificativas prestadas para inexigibilidade de licitação. Desde logo é o caso de apontar a inexistência de análise jurídica a embasar a contratação direta, o que viola o art. 38, VI, da Lei nº 8.666/93.8 Da só análise dos processos administrativos, constatase também terem sido olimpicamente ignorados os preceitos contidos no art. 26 da Lei nº 8.666/93, segundo o qual:
“Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas
no
art.
25,
necessariamente
justificadas,
e
o
retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos.
A irregularidade foi apontada pelo TCM nos autos do Processo 40/28117/2009 (fl. 682). 8
11
Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos: I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso; II - razão da escolha do fornecedor ou executante; III - justificativa do preço. IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados”.
Relativamente aos requisitos para a inexigibilidade da licitação (art. 25), é também fácil constatar que nenhum dos objetos sociais do Instituto Superar implica em serviços de notória especialização, conforme é possível observar da só leitura de seu estatuto social (fls. 58 e ss). Evidentemente, não há que se conceber a produção de um evento esportivo em ambiente fechado como sendo um serviço de notória especialização, nos termos e para os fins do art. 13 da Lei de Licitações: “Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos
profissionais
especializados
os
trabalhos
relativos a:
12
I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; II - pareceres, perícias e avaliações em geral; III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; V - patrocínio
ou
defesa
de
causas
judiciais
ou
administrativas; VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; VII - restauração de obras de arte e bens de valor histórico. § 1º. Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração. (...) § 3o A empresa de prestação de serviços técnicos especializados que apresente relação de integrantes de seu corpo técnico em procedimento licitatório ou como elemento de justificação de dispensa ou inexigibilidade de licitação, ficará obrigada a garantir que os referidos integrantes realizem pessoal e diretamente os serviços objeto do contrato.” “Art. 25. É
inexigível
a
licitação
quando
houver
inviabilidade de competição, em especial: (...)
13
II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; (...) § 1o Considera-se
de
notória
especialização
o
profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, estudos,
decorrente
experiências,
de
desempenho
publicações,
anterior,
organização,
aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.”
Vale relembrar, a essa altura, a lição de Marçal Justen Filho: “...as hipóteses do art. 13 conduzirão à contratação direta quando for impossível a competição para selecionar a proposta mais vantajosa (...) Um serviço será técnico quando importar a aplicação do conhecimento teórico e da habilidade pessoal para promover uma alteração no universo físico ou social. A
14
noção de “técnica” vincula-se, então, a dois aspectos inter relacionados. O primeiro é a transposição para a vida pratica de um conhecimento teórico, de modo a gerar uma utilidade efetiva
e
concreta.
Os
serviços
ditos
“técnicos”
caracterizam-se por envolverem a aplicação de rigorosa metodologia ou formal procedimento para atingir determinado fim. A técnica pressupõe operacionalização de conhecimento cientifico, permitindo aplicações práticas para uma teoria (...) A segunda característica do serviço técnico reside na exigência
de
capacitação
uma
peculiar,
habilidade
individual
relacionada
com
numa
potenciais
personalíssimos. Promove-se uma espécie de transformação do conhecimento teórico em pratico, porque envolve um processo intermediado pela capacidade humana. Daí se segue que toda atividade técnica reflete a personalidade e a habilidade humanas... (...) O conceito de serviço técnico profissional especializado consta do art. 13. O inc. II acrescenta duas exigências à contratação com
inexigibilidade,
contratação
e
a a
saber,
o
notória
objeto
singular
da
especialização.
A
inexigibilidade apenas se configura diante da presença cumulativa dos três requisitos. Ou seja, não basta configurar-se um serviço técnico profissional especializado, 15
mas a contratação direta dependera de constatar-se a existência de objeto singular. Ademais disso, apenas poderá ser contratado um sujeito titular de notória especialização. (...) O que a Administração busca, então, é o desempenho pessoal de ser humano dotado de capacidade especial de aplicar o conhecimento teórico para a solução de problemas do mundo real. (...) A
fórmula
“natureza
singular”
destina-se
a
evitar
a
generalização da contratação direta para todos os casos enquadráveis no art. 13. É imperioso verificar se a atividade necessária à satisfação do interesse sob tutela estatal é complexa ou simples, se pode ser reputada como atuação padrão e comum ou não. A natureza singular caracteriza-se como uma situação anômala,
incomum,
satisfatoriamente
impossível por
de
qualquer
ser
enfrentada profissional
“especializado”.” (Justen Filho, Marçal; Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 15ª Edição, 2012, Dialética, São Paulo, págs.200 e 418-420).
A jurisprudência pátria segue pelo mesmo caminho:
16
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
CONTRADIÇÃO
NÃO-CONFIGURADA.
CONTRATAÇÃO DE EMPRESA SEM LICITAÇÃO. SERVIÇOS TÉCNICOS DE AUDITORIA. REVISÃO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS, PARA FINS DE APURAÇÃO DA QUOTA-PARTE DA REPARTIÇÃO TRIBUTÁRIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 25, II, DA LEI 8.666/1993. 1. O vício da contradição pressupõe que os fundamentos e a conclusão do julgamento caminhem em sentidos opostos, o que não ocorreu nos autos. 2. O Tribunal de origem considerou justificada a contratação direta porque a empresa é bem conceituada, e o serviço de revisão da arrecadação do ICMS, para controle da quotaparte na repartição de receitas, demanda conhecimentos técnicos especializados. 3. Contudo, a inexigibilidade da licitação, nos termos do art. 25,
II,
da
Lei
8.666/1993,
pressupõe
a
presença
concomitante dos seguintes requisitos: a) serviço técnico listado no art. 13; b) profissional (pessoa física) ou empresa de notória especialização; c) natureza singular do serviço a ser prestado. 4. Sem a demonstração da natureza singular do serviço prestado, o procedimento licitatório é obrigatório e deve ser instaurado,
com
o
objetivo
maior
de
a)
permitir
a
concorrência entre as empresas e pessoas especializadas no mesmo ramo profissional e, b) garantir ampla transparência à contratação pública e, com isso, assegurar a possibilidade
17
de controle pela sociedade e os sujeitos intermediários (Ministério Público, ONGs, etc.). 5. Recurso Especial parcialmente provido. (REsp 942.412/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA,
julgado
em
28/10/2008,
DJe
09/03/2009)”.
No caso sob análise, do que se vê do instrumento particular de fls. 120/123, a produção do evento coube, a rigor, à empresa “Global Champions Tour BV”,9 e não ao Instituto Superar, que em referida avença assume, como principal obrigação, a de remeter à “Global” o valores líquidos dos prêmios arcados pela Prefeitura (Cláusula Segunda 2.1, “e” e doc. de fl. 146), o que realmente ocorreu. - II – DA LEGITIMIDADE PASSIVA
A pertinência subjetiva da lide relativamente ao demandado EDUARDO DA COSTA PAES prende-se ao fato de ter autorizado a contratação ocorrida em 2009 e o consequente repasse de verbas para a realização do evento “Oi Athina Onassis Horse Show (fl. 49). Seu pleno conhecimento a respeito do indevido repasse de verbas à promoção de evento privado também resulta das correspondências de fls. 281 e 287, subscritas pelo Instituto Superar, e de suas declarações dadas
9
Representada pela J.A.P. Tops. 18
à grande imprensa, em 2011, já após tornados públicos os repasses ocorridos nos anos anteriores (fl. 11). ANTONIO
PEDRO
VIEGAS
DE
MELLO,
Diretor-
Presidente da RIOTUR, e PAULO ROCHA VILLELA, Diretor de Operações da RIOTUR, devem figurar no polo passivo por terem firmado os Contratos 65/2009 e 103/2010 (fls. 103/106 e 335/338) e autorizado a realização das despesas e os consequentes pagamentos (fls. 45/49, 94/95, 278 e 319). Por seu turno, AMÉRICO DA COSTA BORGES, na qualidade de Diretor Administrativo e Financeiro da RIOTUR, aprovou e autorizou a realização das despesas aqui narradas (fls. 94/95, 99, 278, 319), não obstante claramente contrárias ao interesse público. Em razão de ter concorrido e se beneficiado das condutas ímprobas, também deve figurar como demandado o INSTITUTO SUPERAR, nos termos do art. 3º da Lei nº 8.429/92 (“Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”).
MARCOS MALAFAIA DA PREZA também deve compor o polo passivo uma vez que era, ao tempo das contratações, o único gestor do referido Instituto, o que indica ter sido beneficiário direto das ilegais avenças, a que subscreveu, tanto pelo uso de verbas públicas como pela visibilidade de mercado obtida com a realização do evento. 19
A comprovar a exclusividade da gestão do Instituto pelo demandado MARCOS MALAFAIA DA PREZA e a relevância de sua qualificação pessoal para a realização dos contratos, merece registro o depoimento prestado ao Ministério Público pela “sócia” Ana Cláudia Arnaud da Costa, amiga “de infância” de Marcos Malafaia e claríssima em afirmar nunca ter trabalhado em referido Instituto (fls. 716/717).
Assim,
para
todos
os
efeitos
processuais,
faz-se
necessária a desconsideração da personalidade jurídica do Instituto Superar com vistas à responsabilização direta e ilimitada de seu sóciogestor, com o consequente alcance de seu patrimônio para fins de ressarcimento ao erário. Por fim, a presença da RIOTUR no polo passivo prendese ao pedido invalidação dos Contratos 65/2009 e 103/2010, ao final formulado.
- III – DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
A celebração dos contratos acima referidos significou inegável violação, como já ressaltado, aos princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade administrativas, do que resulta a caracterização de improbidade administrativa, nos termos e para os fins do art. 37, § 4º, da Constituição Federal ("Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da 20
função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”). Em nível infraconstitucional, como não se ignora, cuidou a Lei nº 8.429/92 de disciplinar não só as sanções aplicáveis aos ímprobos como também, e principalmente, as hipóteses, numerus apertus, que caracterizam a denominada improbidade administrativa. Assim, no art. 9º cuida o legislador daqueles atos que importam enriquecimento ilícito do agente; no art. 10, dos que causam dano ao patrimônio público; e, finalmente, através do art. 11 descreve a lei as condutas que importam violação aos princípios da Administração Pública. O dispositivo legal por último indicado encontra-se redigido da seguinte maneira: ´Art.
11.
Constitui
ato
de
improbidade
administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole
os
imparcialidade,
deveres legalidade
de e
honestidade, lealdade
às
instituições, e notadamente: I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; (...)”.
21
A propósito dos princípios da Administração Pública, ressalta o art. 4º da mencionada lei que "Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos", o que significa que incorre em ato de improbidade administrativa, sujeitando-o às sanções previstas no art. 12, o agente público que transgride os princípios explicitados no art. 37 da Constituição Federal. Justifica-se a posição do legislador ao tipificar a violação aos princípios que regem a Administração Pública, erigindo-a à categoria de ato de improbidade administrativa (art. 11), na medida em que referidos princípios apresentam-se na condição de mandamentos normativos nucleares e superiores do sistema jurídico que orientam e direcionam a elaboração das regras jurídicas. Celso Antônio Bandeira de Mello ressalta a sua importância basilar ao asseverar que: “Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica
ofensa
não
apenas
a
um
específico
mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade,
conforme
o
escalão
do
princípio atingido, de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustém e aluise toda a estrutura neles esforçada´ ("Elementos de
22
Direito
Administrativo";
editora
Revista
dos
Tribunais), alinhando-se no mesmo sentido a doutrina de Wallace Paiva Martins Júnior, para quem: “A violação de princípio é o mais grave atentado cometido contra a Administração Pública, porque é a completa e subversiva maneira frontal de ofender as bases orgânicas do complexo administrativo. Grande
utilidade
fornece
a
conceituação
do
atentado contra os princípios da Administração Pública
como
espécie
de
improbidade
administrativa, na medida em que inaugura a perspectiva de punição do agente público pela simples violação de um princípio, para assegurar a primazia dos valores ontológicos da Administração Pública, que a experiência mostra tantas e tantas vezes ofendidos à míngua de qualquer sanção” (Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 224).
Em
resumo,
conclui-se
que
os
agentes
públicos
demandados, ao violarem os comandos contidos no art. 37 da Constituição Federal, infringiram a principiologia regente dos atos da Administração Pública (art. 11 da Lei n.º 8.429/92), do que deve decorrer a incidência das sanções previstas no art. 12 da Lei nº 8.429/92.
23
Além da flagrante violação aos Princípios norteadores da Administração Pública, os atos praticados pelos demandados configuram a hipótese prevista no art. 10, caput e Incisos II e XI da Lei nº 8429/92, verbis:
“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou
culposa,
que
enseje
perda
patrimonial,
desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades definidas no art. 1º do mesmo diploma legal, e notadamente: (...) II – permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes
do
acervo
patrimonial
das
entidades
mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; (...) XI – liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular”.
24
- IV – DA INDISPONIBILIDADE DE BENS DOS DEMANDADOS COMO GARANTIA IMPRESCINDÍVEL AO INTEGRAL RESSARCIMENTO DO DANO
Conforme se demonstrou à exaustão, a conduta dos requeridos reflete não só violação aos princípios constitucionais como também dano ao erário, do que deve resultar o seu integral ressarcimento em favor do ente público. A obrigação de reparar o dano é regra que se extrai, já de muito, do art. 159 do velho Código Civil, tendo merecido expressa referência por parte do texto constitucional (art. 37, § 4º) e pela própria Lei de Improbidade Administrativa (art. 5º). Trata-se de um princípio geral do direito e que pressupõe: a) a ação ou a omissão, dolosa ou culposa, do agente; b) a constatação do dano, que pode ser material ou moral; c) a relação de causalidade entre a conduta do agente e o dano verificado; d) que da conduta do agente surja o dever jurídico de reparação. O desiderato de “integral reparação do dano” será alcançado, assim, por intermédio da declaração de indisponibilidade de tantos
bens
de
expressão
econômica
quantos
bastem
ao
restabelecimento do status quo ante. É o que estabelece o art. 37, § 4º, da Constituição Federal, regra que vai encontrar correlata previsão na Lei nº 8.429/92, art. 7º( "Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá á autoridade administrativa responsável
pelo
inquérito
representar
ao
Ministério
Público,
para
a
indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que 25
se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento
do
dano, ou sobre o acréscimo
patrimonial resultante
do
enriquecimento ilícito") .
Por
tratar-se
de
medida
cautelar,
torna-se
necessária a demonstração do fumus boni iuris, da plausibilidade do direito pleiteado pelo autor, de sua probabilidade de vitória, o que, no caso em tela, resulta da própria narrativa dos fatos e dos sólidos elementos probatórios colhidos no Inquérito civil que instrui esta inicial. Dentre tais elementos, merece destaque o despacho do atual Secretário Municipal de Esportes e Lazer, que, por ocasião da renovação do patrocínio para o ano de 2012, anulou a nota de empenho, e, em consequência, o repasse dos valores, por não estar devidamente caracterizada a “convergência” de interesses para a celebração do convênio nem tampouco a exclusividade (“centralização”) de realização do evento pelo Instituto Superar (fl. 642). Tal pronunciamento deu-se na linha dos questionamentos feitos pela Procuradoria Geral do Município, na pessoa do Procurador do Município Rodrigo Ramos Lourega de Menezes (fl. 615). No que se refere ao periculum in mora, inclina-se a melhor doutrina pela sua implicitude relativamente às condutas de improbidade administrativa, de sua presunção pelo art. 7º da Lei nº 8.429/92, o que dispensa o autor da demonstração da intenção de dilapidação ou desvio patrimonial por parte do réu.10 Fábio Medina Osório. Improbidade administrativa – Observações sobre a Lei 8.429/92. 2ª ed. Porto Alegre: Síntese, 1998, pp. 240/241; José Roberto dos Santos Bedaque. “Tutela Jurisdicional Cautelar e Atos de Improbidade Administrativa”. In Improbidade Administrativa – Questões Polêmicas e Atuais. São Paulo: Malheiros, 2001. 10
26
É nesse sentido a
jurisprudência, já pacificada, do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: “RECURSO
ESPECIAL
Nº
1.319.515
-
ES
(2012/0071028-0) RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA.
MEDIDA
CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI Nº 8.429/92. TUTELA DE EVIDÊNCIA. COGNIÇÃO SUMÁRIA. PERICULUM IN
MORA.
EXCEPCIONAL
PRESUNÇÃO.
FUNDAMENTAÇÃO NECESSÁRIA. FUMUS BONI IURIS.
NECESSIDADE
DE
COMPROVAÇÃO.
CONSTRIÇÃO PATRIMONIAL PROPORCIONAL À LESÃO
E
AO
RESPECTIVO.
ENRIQUECIMENTO BENS
ILÍCITO
IMPENHORÁVEIS.
EXCLUSÃO. 1. Trata-se de recurso especial em que se discute a possibilidade de se decretar a indisponibilidade de bens na Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 7º da Lei 8.429/92, sem a demonstração do risco de dano (periculum
in
mora),
ou
seja,
do
perigo
de
dilapidação do patrimônio de bens do acionado.
27
2. Na busca da garantia da reparação total do dano, a Lei nº 8.429/92 traz em seu bojo medidas cautelares para a garantia da efetividade da execução, que, como sabemos, não são exaustivas. Dentre elas, a indisponibilidade de bens, prevista no art. 7º do referido diploma legal. 3. As medidas cautelares, em regra, como tutelas emergenciais, exigem, para a sua concessão, o cumprimento de dois requisitos: o fumus boni juris (plausibilidade do direito alegado) e o periculum in mora (fundado receio de que a outra parte, antes do julgamento da lide, cause ao seu direito lesão grave ou de difícil reparação). 4.
No
caso
da
medida
cautelar
de
indisponibilidade, prevista no art. 7º da LIA, não
se
vislumbra
uma
típica
tutela
de
urgência, como descrito acima, mas sim uma tutela de evidência, uma vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o que atinge toda a coletividade. O próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano, em vista da redação imperativa da Constituição Federal (art. 37, §4º) e da própria Lei de Improbidade (art. 7º). 5. A referida medida cautelar constritiva de bens, por ser uma tutela sumária fundada em evidência, não possui caráter sancionador nem antecipa a 28
culpabilidade do agente, até mesmo em razão da perene reversibilidade do provimento judicial que a deferir. 6. Verifica-se no comando do art. 7º da Lei 8.429/1992 que a indisponibilidade dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário, estando o periculum in mora implícito no
referido
dispositivo,
atendendo
determinação contida no art. 37, § 4º, da Constituição,
segundo
a
qual
improbidade
administrativa
"os
atos
importarão
de a
suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública,
a
indisponibilidade
dos
bens
e
o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível". 7. O periculum in mora, em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de bloqueio de bens, porquanto esta Corte
Superior
já
apontou
pelo
entendimento
segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92. Precedentes: (REsp
1315092/RJ, Rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro
TEORI ALBINO
ZAVASCKI,
PRIMEIRA 29
TURMA,
julgado
em
05/06/2012,
DJe
14/06/2012; AgRg no AREsp 133.243/MT, Rel. Ministro
CASTRO
MEIRA,
SEGUNDA
TURMA,
julgado em 15/05/2012, DJe 24/05/2012; MC 9.675/RS,
Rel.
MARQUES,
Ministro
SEGUNDA
MAURO
TURMA,
CAMPBELL julgado
em
28/06/2011, DJe 03/08/2011; EDcl no REsp 1211986/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/05/2011, DJe 09/06/2011). 8. A Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes
tráfegos,
patrimoniais,
ocultamento
possibilitados
ou
por
dilapidação instrumentos
tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo, buscou dar efetividade à norma afastando
o
requisito
da
demonstração
do
periculum in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art.789 do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de recuperação do patrimônio do
público,
da
coletividade,
bem
assim
do
acréscimo patrimonial ilegalmente auferido. 9. A decretação da indisponibilidade de bens, apesar da excepcionalidade legal expressa da desnecessidade da demonstração do risco de dilapidação do patrimônio, não é uma medida de adoção automática, devendo ser adequadamente 30
fundamentada pelo
magistrado, sob
pena de
nulidade (art. 93, IX, da Constituição Federal), sobretudo por se tratar de constrição patrimonial. 10. Oportuno notar que é pacífico nesta Corte Superior
entendimento
segundo
o
qual
a
indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidade administrativa de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma. 11.
Deixe-se
responsável
claro,
pela
entretanto,
condução
do
que
ao
processo
juiz cabe
guardar atenção, entre outros, aos preceitos legais que resguardam certas espécies patrimoniais contra a indisponibilidade, mediante atuação processual dos interessados - a quem caberá, p. ex., fazer prova que determinadas quantias estão destinadas a seu mínimo existencial. 12. A constrição patrimonial deve alcançar o valor da totalidade da lesão ao erário, bem como sua repercussão no enriquecimento ilícito do agente, decorrente do ato de improbidade que se imputa, excluídos os bens impenhoráveis assim definidos por
lei,
salvo
quando
estes
tenham
sido,
comprovadamente, adquiridos também com produto da empreitada ímproba, resguardado, como já dito , o essencial para sua subsistência. (...) 31
14.
Assim,
como
a
medida
cautelar
de
indisponibilidade de bens, prevista na LIA, trata de uma tutela de evidência , basta a comprovação
da
verossimilhança
das
alegações, pois, como visto, pela própria natureza do bem protegido, o legislador dispensou o requisito do perigo da demora. No presente caso, o Tribunal a quo concluiu pela existência do fumus boni iuris, uma vez que o acervo probatório que instruiu a petição
inicial
demonstrou
fortes
indícios
da
ilicitude das licitações, que foram suspostamente realizadas de forma fraudulenta. Ora, estando presente o fumus boni juris, como constatado pela Corte
de
origem,
e
sendo
dispensada
a
demonstração do risco de dano (periculum in mora), que é presumido pela norma,
em razão da
gravidade do ato e a necessidade de garantir o ressarcimento do patrimônio público, conclui-se pela legalidade da decretação da indisponibilidade dos bens. 15.
Recurso
1.319.515/ES,
especial Primeira
não
provido”
Seção,
(RESP
maioria,
j.
22.08.12, DJe 21.09.12).
Em caso idêntico e recente, o Tribunal de Justiça de nosso Estado, por ocasião do julgamento do Agravo de Instrumento nº 0042592-40.2012.8.19.0000, Relator Des. Custódio Tostes, decidiu pela decretação da medida, nos seguintes termos: 32
“AÇÃO
CIVIL
ARRESTO.
PÚBLICA.
EVENTOS
INDEFERIMENTO REALIZADOS
DE COM
RECURSOS PÚBLICOS, MEDIANTE COBRANÇA DE
INGRESSOS
POR
PARTICULARES, PARA
DIVULGAÇÃO DE MARCA DE CERVEJA. “BAILES DEVASSA”. AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO E DE PROVA DAS
HIPÓTESES
INEXIGIBILIDADE.
DE
SUA
INDÍCIOS
DISPENSA DE
LESÃO
E AO
ERÁRIO. CABIMENTO DA LIMINAR, NOS TERMOS DO ART. 12 DA LEI 7.247/1985, DIANTE DA PRESENÇA
DO
PERIGO
PLAUSIBILIDADE
DO
NA
DEMORA
DIREITO.
E
DA
DECISÃO
CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. SÚMULA 58 DO TJERJ. PROVIMENTO DO RECURSO”.
-V– DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer o Ministério Público, seja decretada, liminarmente e inaudita altera pars, a (I) INDISPONIBILIDADE DOS BENS dos demandados EDUARDO DA COSTA PAES, ANTONIO PEDRO VIEGAS FIGUEIRA DE MELLO, PAULO ROCHA VILLELA, AMÉRICO DA COSTA BORGES, INSTITUTO SUPERAR e MARCOS MALAFAIA DA PREZA, no montante de R$ 4.000.000.000,00 (quatro milhões de reais), possibilitando a efetivação do pedido de ressarcimento ao erário. 33
Requer também o Ministério Público:
- (II) a notificação dos demandados para, querendo, no prazo de 15 (quinze) dias, oferecerem manifestação em defesa prévia por escrito, nos termos do artigo 17, § 7°, da Lei 8.429/92; - (III) O recebimento da petição inicial e, após, a citação dos réus, nos termos art. 17, § 9º, da Lei nº 8.429/92; - (IV) AO FINAL, sejam julgados procedentes os pedidos, acolhendo-se a pretensão ora deduzida, para: IV.1) INVALIDAR os Contratos nº 65/2009 (Processo Administrativo nº 12/400.568/2009)
e
103/2010
(Processo
Administrativo
nº
12/400.618/2010), firmados entre a RIOTUR e o Instituto Superar; IV.2) com fundamento no art. 5º c.c. art. 12 da Lei 8.429/92 condenar os demandados EDUARDO DA COSTA PAES, ANTONIO PEDRO VIEGAS FIGUEIRA DE MELLO, PAULO ROCHA VILLELA, AMÉRICO DA COSTA BORGES, INSTITUTO SUPERAR e MARCOS MALAFAIA DA PREZA a, solidariamente, ressarcirem aos cofres públicos municipais o valor de R$ R$ 4.000.000.000,00 (quatro milhões de reais), devidamente acrescido de juros legais e correção monetária; IV.3) aplicar-se aos requeridos EDUARDO DA COSTA PAES, ANTONIO PEDRO VIEGAS FIGUEIRA DE MELLO, PAULO ROCHA VILLELA, AMÉRICO DA COSTA BORGES as sanções de perda da função pública, 34
suspensão dos direitos políticos por até 08 (oito) anos, pagamento de multa civil em valor a ser fixado por esse Juízo e proibição de contratar com o poder público e ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de até 5 (cinco) anos (art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92); IV.4) aplicar-se ao demandado MARCOS MALAFAIA DA PREZA as sanções de suspensão dos direitos políticos por até 08 (oito) anos, pagamento de multa civil em valor a ser fixado por esse Juízo e proibição de contratar com o poder público e ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de até 5 (cinco) anos (art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92); IV.5) aplicar-se ao requerido INSTITUTO SUPERAR as sanções de pagamento de multa civil em valor a ser fixado por esse Juízo e proibição de contratar com o poder público e ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de até 5 (cinco) anos (art. 12, II e III, da Lei nº 8.429/92). Requer o Ministério Público produção de todas as provas em direito admitidas, a serem oportunamente especificadas. Por fim, esclarece que receberá intimações pessoais na Avenida Nilo Peçanha, 26 – 4º andar, Centro, Rio de Janeiro – RJ, CEP 20.020-100.
35
Dá-se à causa o valor de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais). Termos em que, Pede Deferimento.
Rio de Janeiro, 17 de julho de 2013
GLÁUCIA DA COSTA SANTANA
ROGÉRIO PACHECO ALVES
Promotora de Justiça
Promotor de Justiça
36