CONTRIBUTOS PARA A
HISTÓRIA ECONÓMICA E SOCIAL
DO CONCELHO DE VALONGO ENTRE 1258-1835. P
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Joel Silva Ferreira Mata
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
2017
Ficha técnica Titulo: Contributos para a História Económica e Social do Concelho de Valongo entre 1258-1835. Subtítulo: Perspectivas
Autor: Joel Silva Ferreira Mata
Edição: Câmara Municipal de Valongo Primeira Edição: Março 2017 Tiragem: 500 ex.
Design e Impressão: Tipografia Lessa – www.tipografialessa.pt ISBN: 978-989-99837-0-0
Depósito Legal: 423644/17 Créditos
A.N.T.T., A.D.P., A.D.B., M.M.V. (Miguel Godinho), Fundo C.M.V. Na capa: pintura de Souza Pinto, “Vallongo” (1906). O autor não segue o Acordo Ortográfico de 1990.
CONTRIBUTOS PARA A
HISTÓRIA ECONÓMICA E SOCIAL
DO CONCELHO DE VALONGO ENTRE 1258-1835. P
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ÍNDICE Prefácio.................................................................................................................... 9 Introdução............................................................................................................. 11 Agradecimentos ................................................................................................... 15 I Parte: A formação da identidade territorial e humana do actual concelho de Valongo 1.1 – O percurso “histórico-administrativo”: de 1258 a 1836.................. 17 1.2 – A evolução demográfica...................................................................... 24 1.3 – Os Ritmos de natalidade/ nupcialidade nas freguesias ................ 44 1.3.1 – Os filhos naturais ....................................................................... 44 1.3.2 – Os filhos legítimos ..................................................................... 50 1.3.3 – Os desqualificados por nascimento ........................................ 54 1.3.4 – Os filhos de mães solteiras ....................................................... 56 1.3.5 – O destino dos Abandonados e expostos ................................ 62 1.3.6 – As mães solteiras do território do actual concelho de Valongo e pais do exterior .................................................. 67 1.3.7 – Os filhos de relações conjugais adulterinas ........................... 70 1.3.8 – Os filhos sacrílegos .................................................................... 73 1.3.9 – Outros espúrios .......................................................................... 74 1.3.10 – Os filhos de escravas negras .................................................. 74 1.3.11 – Os abandonados ....................................................................... 76 1.4 – Os ritmos de mortalidade .................................................................. 83 1.4.1 – A sazonalidade e ocorrência dos óbitos.................................. 83 1.4.2 – A mortalidade infantil e juvenil ............................................... 89 1.4.3– Os que morreram celibatários ................................................... 97 1.4.4 – Os que morreram de demência ............................................. 100 1.4.5 – Os que morreram fora do território valonguense ............... 104 1.5 – A morte por acidente ......................................................................... 111 1.5.1 – Por afogamento ........................................................................ 111 1.5.2 – Por acidente de trabalho ......................................................... 112 1.5.3 – Por acidente não identificado ................................................ 113 1.5.4 – Por ouvir missa ........................................................................ 114 1.5.5 – Por engasgamento ................................................................... 114 1.5.6 – Por acidentes na estrada ......................................................... 115 1.5.7 – Por incêndio na habitação ...................................................... 116 1.5.8 – Por homicídio e suicídio ......................................................... 116 5
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1.6 – As elites, minorias étnicas, mendigos e vadios.............................. 119 1.6.1 – As patentes militares e os soldados....................................... 119 1.6.2 – Os soldados que tombaram na guerra.................................. 129 1.6.3 – Os proprietários de escravos .................................................. 132 1.6.3.1 – Os militares..................................................................... 133 1.6.3.2 – Os senhores laicos ......................................................... 134 1.6.3.3 – O clero secular................................................................ 136 1.6.4 – A “aristocracia” letrada do território .................................... 138 1.6.4.1 – Os eclesiásticos............................................................... 138 1.6.4.2 – Os tabeliães ..................................................................... 153 1.6.4.3 – Os cirurgiões e os boticários ........................................ 158 1.6.4.4 – Os licenciados e os estudantes..................................... 162 1.6.5 – Os mendigos e vadios ............................................................. 163 1.6.6 – Alguns ciganos cristãos de Alfena ........................................ 171 1.7 – O hospital dos leprosos de Alfena ................................................... 172 1.8 – A morte como expressão da última diferenciação social ............. 180 1.8.1 – Dos abades, reitores, padres e clérigos: os a testato e os ab intestato ......................................................................... 180 1.8.2 – Das elites locais ........................................................................ 194 1.8.3 – Os que morreram e deixaram dívidas .................................. 221 1.8.4 – A fome dos pobres e as “missas da carne, pão, vinho, azeite e dinheiro” deixadas pelos ricos ................................ 223 II Parte: A economia e a estruturação do território agrícola valonguense 1. – A senhorialização do território .................................................................. 233 1.1 – A implantação senhorial: a coroa, o clero regular, secular e outros ................................................................................................ 233 1.2 – O casal como base da estrutura económica da família ................. 237 1.3 – A pressão demográfica e a partição do casal.................................. 245 1.4 – A transmissão do domínio útil da propriedade agrícola. ............ 260 1.4.1 – Por encampação ou interrupção ............................................ 260 1.4.2 – A sucessão por morte do cabeça de casal: a lutuosa ........... 262 1.5 – Conflitualidade entre senhorios e os camponeses ........................ 264 2 – O património arquitectónico edificado ..................................................... 271 2.1 – A casa de morada do camponês valonguense e suas dependências ...................................................................................... 271 2.2 – Os pardieiros ...................................................................................... 295 2.3 – As cabanas........................................................................................... 298 6
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3 – A carga tributária e fiscal............................................................................. 299 3.1 – As rendas pagas pelos agricultores aos senhorios ........................ 299 4 – Os sistemas de regadio: o sorteio e os consortes litigantes .................... 318 III Parte: Os grupos profissionais e a distinção onomástica dos moradores valonguenses 1 – Os mesteirais: produção, comercialização e prestação de serviços ...... 331 1.1 – Os almocreves..................................................................................... 331 1.2 – Os moleiros ......................................................................................... 342 1.3 – Os padeiros e as padeiras ................................................................. 357 1.4 – Os ferreiros .......................................................................................... 361 1.5 – Os ferradores ...................................................................................... 366 1.6 – Os alfaiates .......................................................................................... 370 1.7 – Os sapateiros....................................................................................... 380 1.8 – Os vendeiros e as vendeiras ............................................................. 385 1.9 – Os barbeiros ........................................................................................ 392 1.10 – Aspectos onomatológicos dos profissionais e moradores valonguense: as alcunhas .......................................... 394 Conclusão ........................................................................................................... 423 Fontes e bibliografia ......................................................................................... 427
Siglas e abreviaturas: ADB – Arquivo Distrital de Braga ADP – Arquivo Distrital do Porto A.H.M.V. – Arquivo Histórico Municipal de Valongo A.H.S.C.M.P. – Arquivo Histórico da Santa Casa da Misericórdia do Porto B.co – Banco Fl. (s) – Folio (s) Liv. – Livro Mç. – Maço N.º – Número P.M.H. – Portugaliae Monumenta Historica s/d – Sem data TT – Arquivo Nacional da Torre do Tombo = – Casado (a) com 7
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Joel Silva Ferreira Mata
Prefácio
Valongo, um território, um património, uma história.
Tenho o privilégio de presidir aos destinos do Município, precisamente no tempo em que cruzamos uma importante data da nossa memória coletiva, as comemorações dos 180 anos de elevação de Valongo a Concelho no âmbito da corajosa Reforma Administrativa de Passos Manuel que o Portugal viveu exatamente há 180 anos e que extinguiu quase 500 concelhos alguns deles centenários. As comemorações são um ponto de encontro da identidade, da cultura, da solidariedade e das pessoas, mas também são pretexto para conhecermos melhor a nossa história e por isso em boa hora desafiei o Professor Joel Mata, autor de inúmeras monografias de diversos territórios, a ajudar-nos a construir as pistas para compreendermos melhor de onde vimos, por onde passamos, com quem convivemos, pois desta forma compreenderemos melhor para onde vamos. Esta obra, enquanto contributo de perspetivas novas e rigorosas para a compreensão da nossa história, chega às nossas mãos, numa edição comemorativa, reunindo preciosa informação dos principais momentos de evolução 9
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do território, a partir das Inquirições Gerais de 1258, na sua mais completa e global fonte de conhecimento. Num tempo que não se mede por datas, mas sim por acontecimentos, Valongo tem sabido respeitar os seus legados, material e imaterial, ao longo das gerações. Encravado pelas serras, neste concelho sem muros, nem fronteiras, implantaram-se modelos económicos, sociais e culturais mais de acordo com o seu posicionamento periférico. As suas gentes souberam aproveitar a existência das condições naturais e atrair as transações comerciais que permitiram abrir a região ao exterior. Em tempos tão exigentes como aqueles que vivemos, as comemorações dos 180 anos oferecem-nos uma oportunidade de fazer o incomum. A responsabilidade é grande e acredito que, do ponto de vista editorial, ficará registado nas páginas de ouro do nosso concelho, um reforço de cidadania. Todos temos obrigações para com o passado e com as nossas gentes para que a nossa história seja vivida nas nossas escolas, nas nossas empresas, nos nossos museus, nas nossas ruas, em cada uma das nossas freguesias. Pelo diálogo permanente entre o povo e o território, é minha convicção que valorizar o que nos une, nos torna mais fortes, ficando aberto o caminho à afirmação de mais projetos que devemos legar aos valonguenses.
José Manuel Ribeiro Presidente da Câmara Municipal de Valongo
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Introdução Neste livro procura fazer-se uma abordagem social e económica, sob determinadas perspectivas que pretendem valorizar sobretudo o homem e a mulher comum que durante séculos teimou em viver, morar, trabalhar e morrer no território do actual concelho de Valongo. Valorizamos, por isso, toda a acção humana desenvolvida tanto nos campos como nos mesteres, as profissões ligadas à indústria do vestuário (alfaiates), da metalurgia (ferreiros e ferradores), da indústria de transformação dos cereais (moleiros), do fabrico do pão (padeiros e padeiras), do comércio local (vendeiros e vendeiras), e do comércio de médio curso (com a cidade do Porto), e mais esporadicamente com a actividade comercial e profissional em zonas mais longínquas do aro normal de actuação de centenas de milhares de indivíduos, maioritariamente masculinos. As elites religiosas, civis e militares, sendo minoritárias, não deixariam de exercer toda a sua influência e poder sobre os outros que eram sempre seus dependentes, quer fossem fregueses (quase todos), escravos ou filhos de escravos, camponeses ou mesteirais, e, por isso, interpretamos, sempre que possível, a sua acção enquanto membros de uma sociedade organizada, estratificada e disciplinada neste território que evidencia semelhanças e assinala assimetrias. Neste estudo faz-se uma reflexão sobre a componente jurisdicional que conduziu à reunião das cinco freguesias anteriormente distribuídas pela Terra e concelho da Maia, e pelo extinto concelho de Aguiar de Sousa, em 1836, altura em que o deputado e Presidente do Conselho de Ministros, por 11
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pouco tempo, é certo, António Dias de Oliveira terá exercido alguma influência pessoal, não obstante apresentarmos outras motivações mais objectivas e consistentes que terão pesado na proposta apresentada pela Comissão criada por Portaria de 26 de Setembro de 1836, pela qual a freguesia de São Mamede de Valongo foi elevada a concelho e a cabeça de concelho. O concelho de Valongo é uma unidade administrativa recente. O nosso estudo visa reflectir sobre esta terra de meados do século XIII, tendo como ponto de partida as Inquirições Gerais do Reino de 1258, e terminar em meados do século XVIII, com as Memórias Paroquiais. Todavia, mais tarde, avançamos até 1836, data marcante geradora de uma nova dinâmica que enraíza uma certa consciência, socialmente adquirida, de traços comuns e que vai forjando e sulcando uma matriz de pendor autonómico cada vez maior. Uma vez que o território estava então disperso, a nossa abordagem foi formulada com base no conceito de “território do concelho de Valongo globalmente considerado”, sempre que se fez menção à geografia que viria a formar o concelho. Como metodologia, fizemos em primeiro lugar uma referência sobre a formação da identidade do território e a sua evolução demográfica, a partir dos registos paroquiais sobre os nascimentos, baptizados e óbitos e interpretando-os à luz dos conceitos de natalidade, nupcialidade (como regime civil determinante mas não único) e a mortalidade, nos seus múltiplos contornos. Além deste acervo documental, recorremos às inquirições, arrolamentos de moradores, visitações senhoriais, informações populacionais constantes nos forais das freguesias constitutivas do futuro concelho de Valongo, às Memórias Paroquiais, a levantamentos com fins económicos dos finais do século XVIII e administrativos constantes no mapa n.º 2, anexo ao Decreto de 6 de Novembro de 1836, que justifica a elevação da freguesia de São Mamede de Valongo a concelho e cabeça de concelho, atendendo, entre outros aspectos, à sua demografia. Por outro lado, mantivemos a divisão administrativa anterior àquela que promoveu a união das freguesias de Sobrado e de São Martinho do Campo (Reorganização Administrativa do Território das Freguesias- Lei n.º 22/2012, 12
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de 30 de Maio). O território analisado, tendo por base as cinco freguesias é mais real, mais facilmente interpretado por corresponder a realidade diferentes e por vezes antagónicas (o regadio, por exemplo). A economia e a estrutura do território será globalmente um aspecto muito interessante. Apresentamos como peça fundamental da economia agrícola do território, a família nuclear de camponeses, constituída em casal, conceito que traduz o sistema tributário e a unidade agrária, através dos quais se geram as relações de produção e de dependência entre o senhorio do domínio directo e o utilizador do domínio útil da terra conhecido por foreiro, ocupante, precarista, arrendatário, cabeça de casal e outras designações que são apresentadas pela historiografia. O património arquitectónico edificado, nas suas diversas e múltiplas dimensões como a casa de morada, celeiros, aidos e eiras foi estudado minuciosamente tanto quanto o espólio documental o permitiu e foi interpretado como elemento valorizador e transformador da paisagem campesina. Alguns camponeses viviam na zona urbana de São Mamede de Valongo, juntamente com a grande maioria dos mesteirais, em arruamentos que surgem inicialmente em torno do adro da igreja paroquial. Nas restantes freguesias, o levantamento é menor, mas não deixaremos de dar relevo aos lugares ou aldeias onde surgem os primeiros aglomerados populacionais que mais tarde formarão a respectiva freguesia. Por fim, faremos uma pequena reflexão sobre os auxiliares identificativos onomásticos, para distinguir os indivíduos que dão pelo mesmo nome. As alcunhas agrupadas por categorias (discutíveis) comuns às diferentes freguesias são em maior número na cabeça de concelho, freguesia que evidencia um maior devenvolvimento demográfico.
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Agradecimentos Este livro partiu de uma iniciativa levada a cabo pelo Sr. Presidente e Câmara Municipal. O convite foi aceite depois de uma profunda reflexão que conduziu à leitura preliminar e aturada da literatura produzida a nível monográfico e outros. Pretendeu-se, pois, apresentar, um trabalho que trouxesse alguma novidade. Esse foi o desiderato que esperamos ter conseguido alcançar, pelo menos em parte. Aqui me curvo penhoradamente a todos os que denodadamente abriram portas e se dispuseram a colaborar activamente, trocar impressões, discutir sobre aspectos particulares, e os que se disponibilizaram para calcorrear as freguesias e identificar parte do espólio construtivo de antanho e paisagístico que a acção humana ainda não destruiu. Em particular às Dr.as Manuela
Ribeiro, do Arquivo Histórico Municipal de Valongo, e Paula Machado do Museu Municipal de Valongo, ao Drs. Agostinho Rocha, da Divisão de Cultura, Jacinto Soares e Fernando Castro; e ao Doutor Rodrigo Dominguez, e ao srs. Santos, da Sala de Topografia e Miguel Godinho, fotógrafo. Por fim, ao Senhor Presidente e à Câmara que tornaram possível a realização deste projecto de investigação sobre algumas perspectivas da História do concelho, integrado nas Comemorações dos 180 Anos do Município.
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I Parte: A formação da identidade territorial e humana do actual concelho de Valongo
1.1 – O percurso “histórico-administrativo”: de 1258 a 1836 A formação territorial, jurídica, política e administrativa do actual concelho valonguense, ou como se entende, do município de Valongo, resultou de acto político que visou melhorar a divisão territorial do reino e, assim, extrair todas as vantagens que deviam “resultar da organização de um Systema Administrativo”, conforme se lê no preâmbulo do Decreto de 6 de Novembro de 1836. Na verdade, a divisão administrativa sofreu, já no século XVI, uma profunda reforma, dando origem aos forais novos, outorgados por D. Manuel, e tinham por objectivo disciplinar e uniformizar um conjunto de aspectos jurídicos, senhoriais, económicos e toda uma panóplia de direitos que andavam dispersos pelas cartas de foral atribuídas indiscriminadamente pelo rei, rainha, ordens militares, bispos e outras entidades resultando, como consequência, uma amálgama de elementos diferenciadores para governar os súbditos de um mesmo poder centralizado. A partir de 1527, D. João III procede ao levantamento das estruturas sociais e económicas das cidades, vilas, aldeias e lugares, para dar resposta administrativa ao crescente aumento demográfico, visível em grande parte 17
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do País. Terminado este trabalho, o território nacional foi redesenhado, dando origem a novas cidades, como Bragança, Beja, Elvas, Faro, Leiria, Portalegre e Tavira, assim como foram elevadas à categoria de vilas notáveis outros territórios como Olivença, Estremoz, Lagos, Setúbal e Castelo Branco1, cujo estatuto resultou do número dos homens honrados que aí viviam mas também do aumento da sua população que justificou a distinção. A reforma administrativa civil então promulgada vem no sentido de promover uma melhor governação (governança) e sobretudo a nível da justiça. Porém, os desígnios do Rei nem sempre coincidiam como o quotidiano das populações concelhias, nem com os oficiais que tinham o encargo de “correger”, comarcas demasiado extensas. Por outro lado, a autonomia concelhia e a sua vida jurídica local apesar de não sofrer metamorfoses profundas do ponto de vista jurídico, o certo é que a dinâmica económica e social dotava as populações de uma idiossincrasia que as tornava mais autónomas e vocacionadas para o trabalho nos diferentes graus profissionais especializados, ainda que o sector primário da produção continuasse a ser, na sua grande mancha geográfica, o denominador comum às centenas de concelhos, mas paulatinamente, os mesteres, os agentes económicos ligados ao comércio e à prestação de serviços forjam as elites locais e pouco a pouco assistimos à formação de uma identidade profundamente enraizada nas práticas comuns de algumas centenas de fogos, isto é, de famílias que repartem o tempo ora na agricultura, ora nas profissões adjacentes, ora em outras ocupações que lhes dão um estatuto mais qualificado daqueles que continuarão a alimentar a base social em cada lugar. Com efeito, o concelho ou município de Valongo (duas realidades jurídicas distintas mas que concorrem historicamente para o mesmo objectivo) não existe enquanto unidade administrativa civil. O seu território actual fazia parte da Terra e concelho da Maia e do extinto concelho de Aguiar de Sousa. O elevado número de concelhos sem qualquer expressão demográfica, económica ou social, há muito que reclamavam por uma reforma administrativa que adequasse convenientemente o território às novas dinâmicas e 1
DIAS, João José Alves (1996) – Gentes e espaços (em torno da população portuguesa na primeira metade do século XVI). Vol. I. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, pp.184-188. 18
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realidades do Reino, cujas manifestações encontramos no início do século XIX2. Este desiderato, ainda que, com contornos pouco coincidentes com os que reclamava Alberto Meneses, iria estar na primeira linha reformista dos liberais assim que foi estabelecida a paz, apesar do clima de profunda instabilidade política que se manteve durante muito tempo. Terminada a guerra civil, que opôs os liberais aos absolutistas (D. Pedro IV a D. Miguel) foi, de novo, colocada a questão administrativa, tanto mais que havia ainda algumas dívidas miguelistas por saldar e, nesse sentido, alguns concelhos perderam a sua autonomia, incorporando outros, por terem estado ao lado dos absolutistas contra os liberais. A povoação erigida em cabeça de concelho foi a de São Mamede de Valongo, uma localidade marcadamente rural, mas de tendência urbanizante, cujas elites viviam sobretudo da comercialização do pão que abastecia directamente a cidade do Porto; almocreves e mercadores; agentes que animavam o comércio local e de rua – os vendeiros e vendeiras –, os ferradores, alfaiates e muitos outros. Não obstante, as unidades moageiras, de maior impacto económico, que estavam instaladas no Rio Ferreira faziam parte do território do antigo concelho de Aguiar de Sousa. Porém, o posicionamento estratégico de São Mamede de Valongo rapidamente atraiu os proprietários e os interessados no negócio que aglutinava diversas actividades industriais e artesanais que envolvia praticamente toda a população trabalhadora: os camponeses que deviam semear, recolher e vender os cereais, os proprietários dos moinhos que determinavam as quantidades e estipulavam os preços; os moleiros que trabalhavam directamente para os senhorios a quem entregavam a maquia; os almocreves que decalcavam, vezes sem fim, os sulcos dos trilhos vicinais, de pavimento irregular; os mercadores portuenses e outros investidores que se deslocavam a São Mamede de Valongo para fazer negócios. Por outro lado, o julgado de São Mamede de Valongo goza de alguma autonomia por estar no limite do concelho da Maia, e ter uma vida e uma actividade própria, uma população com certos laivos cosmopolitas que vive 2
MENESEZ, Carlos Alberto de (1825) – Plano de Reforma dos Foraes e direitos banaes fundado em hum novo systema emphiteutico nos bens da coroa, de corporações, e de outros senhorios, dividido em nove pares com hum novo arredondamento de comarcas para os foraes do património da coroa. Lisboa. 19
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organizadamente em arruamentos que distingue as elites dos mesteres dos que vivem no isolamento dos casais, no meio das propriedades agrícolas, em torno da lareira, num só espaço – a cozinha –, onde dormem, comem e socializam, isolados das notícias que chegam pelos viajantes, e do ambiente e azáfama das profissões. É uma vantagem que lhe advém por ser um ponto fundamental no apoio ao trânsito entre a cidade do Porto e a vila de Amarante3, já no interior transmontano, adquirindo significado no encurtamento das etapas para descanso dos almocreves, caminheiros e animais de carga. Mapa n.º 1 – A rede viária que atravessava o território valonguense
Fonte: CRUZ, António (1970) – Geografia e economia da província do Minho nos fins do século XVIII, (adaptado).
Este é um dos aspectos que terá pesado na avaliação feita pelas Juntas Geraes de Districto (leia-se do Distrito do Porto), que reuniram em 17 de Maio de 1836, para formarem um Projecto de Divisão dos Concelhos e Julgados4, sendo o prazo para se ultimarem os trabalhos da Divisão do Território fixado pelo 3 4
ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de, P. (1968) – Vias Medievais Entre-Douro-e-Minho, Vol.I. Porto: Faculdade de Letras (polic.), pp.173-174. Colecção de Leis e outros Documentos Officiaes publicados desde o 1.º de Janeiro até 9 de Setembro de 1836. Quinta Série. Lisboa: Imprensa Nacional, 1836, 105. 20
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Decreto de 15 de Junho do mesmo ano5 quando apresentou a proposta de nova divisão administrativa e a elevação da freguesia de São Mamede de Valongo a concelho e a cabeça de concelho. É insuspeitável que António Dias de Oliveira, nascido a 20 de Julho de 1804, nesta freguesia e que viria a desempenhar diversos cargos de manifesta envergadura, quer na magistratura, quer na política nacional, vindo a chefiar o VIII Governo Constitucional (ou o III Governo Setembrista, entre 2 de Junho a 10 de Agosto de 1837)6 não tenha influenciado a decisão da Junta. O certo é que os trabalhos da Junta e do Parecer proposto pela Comissão criada por Portaria de 26 de Setembro de 1836, para apresentar um Projecto para a Divisão Administrativa do Reino7 levou
a rainha D. Maria II a “decretar provisoriamente” a extinção de inúmeros concelhos e a criação de outros, como o de Valongo.
A elevação da freguesia de São Mamede de Valongo a concelho pelo Decreto de 6 de Novembro de 1836 incorporava, inicialmente, seis freguesias: São Mamede de Valongo, São Lourenço d’Asmes e São Vicente de Alfena, desanexadas do concelho da Maia, e as de Santo André de Sobrado, de São Martinho do Campo e de São Miguel da Gandra, que pertenciam ao extinto concelho de Aguiar de Sousa, como consta do Mapa n.º 2, anexo ao referido decreto. Olhando para a composição demográfica através do número de moradores arrolados para as seis freguesias, a de São Mamede de Valongo representa cerca de 40.3%, que além de ser dominadora é diversificada e qualificada profissionalmente. Não obstante, e como previa o referido decreto, esta composição podia não ser definitiva. De facto, por razões pouco claras, o descontentamento popular, e a sua reacção, por exemplo, ao lançamento de impostos concelhios, a 20 de Junho de 1837, abrangendo o universo das freguesias conce5 6
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Colecção de Leis e outros Documentos Officiaes publicados desde o 1.º de Janeiro até 9 de Setembro de 1836. Quinta Série. Lisboa: Imprensa Nacional, 1836,p.154.
Noticia dos ministros e secretários d’estado do regímen constitucional nos 41 annos decorridos desde a regência instalada na ilha Terceira em 15 de março de 1830 até 15 de março de 1871. (1871). Lisboa: Imprensa Nacional, p.6; Respublica. Reportório Português de Ciência Política, Ano: 1837. [Disponível em: http://maltez.info/respublica/Cepp/anuário/ secxix/ano1837.htm., p.2. [Consultado em:01./02/2017]. Colecção de Leis e outros Documentos Officiaes publicados desde o 1.º de Janeiro até 9 de Setembro de 1836. Sexta Série. Lisboa: Imprensa Nacional, 1836, p.31. 21
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lhias, sobre os géneros alimentares8, terá desencadeado a oposição suficiente para que a freguesia de São Miguel da Gandra fosse retirada do mapa do concelho de Valongo e passasse a integrar o concelho de Paredes, por carta de Lei de 27 de Setembro de 1837, (parágrafo 12.º), perdendo 224 fogos, reduzindo o concelho a apenas 1701 fogos correspondendo, assim, a população da freguesia de São Mamede de Valongo a 45.5% da totalidade dos habitantes do concelho então criado. No fim do século XVIII, à distância de trinta e sete anos apenas, Custódio José Gomes de Vilas-Boas apontava a seguinte composição demográfica das cinco freguesias, com base na unidade familiar (o número de fogos)9: Alfena:
200; Annes (sic) [Asmes]: 217; Valongo: 775; São Martinho do Campo: 279; e Sobrado: 230, num total de 1703 fogos, levantamento que praticamente coincide com aquele que seria realizado pela Junta: 1701 fogos, que apontam para uma ligeira diminuição ou estagnação populacional. Esta realidade demográfica, porém, não impediu que Valongo fosse elevado à categoria de vila por Decreto de 17 de Abril de 1836, pelo qual D. Maria II, a rogo da Câmara Municipal, entre outros aspectos de natureza psicológica-militar, como a “gloriosa recordação que seu nome offerece, por ser daquelle ponto que Sua Magestade Imperial, Meu Augusto Pai, de Saudosa Memória, dirigiu a Batalha de Ponte Ferreira, uma das muitas que vencera para Restituir-Me o Throno, e Libertar a Nação”10 refere que “attendendo à sua População, e estar já constituída Cabeça de Concelho”11, isto é organizada administrativamente, com “casa de Câmara”, por imperativo do artigo 4.º do Decreto de 6 de Novembro de 1836. De facto, a população deste novo concelho é significativamente mais reduzida daquela que constitui os concelhos limítrofes. Em número de fogos, a composição de então era a seguinte12: Valongo: 1925; 8
A.H.M.V., Livro de Arrematações, 1837-1838, p.4.
10
«Decreto de 17 de Abril de 1837», in Diário do Governo, n.º 92, de 20 de Abril, de 1837, publ. MOREIRA, Paulo Fernando Pereira Caetano (2012) – A Batalha de Ponte Ferreira (Campo, Valongo, 1832): um processo memorialista e de valorização patrimonial. Porto: U. Porto. Faculdade de Letras, pdf, p.132.
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12
CRUZ, António (1970) – Geografia e economia da província do Minho nos fins do século XVIII. Plano de descrição e subsídios de Custódio José Gomes de Vilas-Boas. Porto: Centro de Estudos Humanísticos. Faculdade de Letras da Universidade do Porto, pp. [356-357; 364-365].
«Decreto de 17 de Abril de 1837», in Diário do Governo, n.º 92, de 20 de Abril, de 1837.
«Decreto de 17 de Abril de 1837», in Diário do Governo, n.º 92, de 20 de Abril, de 1837, Mapa anexo, n.º2. 22
Joel Silva Ferreira Mata
Santo Tirso: 2600; Paredes: 3989; Gondomar: 3953; Maia: 3215, o que parece dar força à ideia de que a elevação de São Mamede de Valongo a concelho é uma questão sobretudo geoestratégica do ponto de vista viário. Os territórios que passaram a integrar o concelho de Valongo13 são
unidades (freguesias) distintas, no seu ambiente rural. A freguesia de Santo André de Sobrado14 e a de São Martinho do Campo15 têm grandes afinidades, unidas e desunidas pelo domínio e uso da água do Rio Ferreira, o pulmão dos campos e dos moinhos aí instalados. O consenso a propósito da distribuição da água, por sortes era, por vezes, difícil de alcançar, movimentando autores e réus em disputas jurídicas complexas que acabaram por cimentar uma identidade reivindicativa comum. A freguesia de São Lourenço d’Asmes, actualmente designada por Ermesinde, alteração toponímica autorizada pelo Decreto republicano16 de 6
de Fevereiro de 1911 – topónimo que já correspondia a uma das suas aldeias mais relevantes –, embora não sendo a freguesia mais importante em termos demográficos e implantação dos agentes económicos, estava mais próxima da cidade do Porto, da sede do concelho da Maia, era, em todo o caso, um pólo de desenvolvimento de vários aglomerados populacionais em torno das margens do Rio Leça e de outros mais longínquos como o lugar de Sá ou de Ermesinde17.
A freguesia de São Vicente de Alfena, em determinado período medieval exibiu um certo crescimento económico associado à produção e comercialização de artefactos militares e apetrechos para a agricultura decaiu quando a feira é extinta no reinado de D. Afonso III, mas lentamente se expande 13 14 15
16 17
SEARA, Francisco José Ribeiro (1896) – Bosquejo histórico da villa de Valongo. Santo Tirso: tipografia do Jornal de Santo Tirso; REIS, Joaquim Lopes dos, P.e (1904) – A Villa de Vallongo. Porto: Typographia Coelho (a vapor).
PINTO, Manuel (1983) – Bugios e Mourisqueiros. Valongo: Associação para a defesa do Património Natural e Cultural do Concelho de Valongo (ADEPAVAL).
MARTINS, Fernando; PEREIRA, Manuel (s.d.) – Campo: Valongo: (s.l): Lusitânia Editores.
«Decreto de 6 de Fevereiro de 1991», in Colecção Oficial de Legislação Portuguesa. Ano de 1911. Lisboa: Imprensa Nacional (1912).
Veja-se, entre outros BEÇA, Humberto (1921) – Ermezinde: Monografia: Histórico-Rural. Porto: Companhia Portuense Editora; SOARES, Jacinto (2014) – Ermesinde: memórias da nossa gente. Subsídio para a sua monografia. 2.º Edição. Ermesinde: Junta de Freguesia de Ermesinde; idem (2016) – Ermesinde. O Património e a nossa gente. Mosaicos e Historiais. Subsídios para a sua monografia II. Ermesinde: Junta de Freguesia de Ermesinde. 23
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
distribuindo-se a sua população por diversos lugares ou aldeias nas fraldas do rio Leça18. A comunicação e interacção entre os diferentes territórios era muito reduzida, não sendo, por isso, fácil falar de uma identidade comum que tenha conduzido à reunião destas freguesias para formar o concelho, a não ser um pressuposto apoiado na justificação de uma melhor organização administrativa geral do Reino, que é uma posição objectiva e pragmática, no alinhamento de um novo mapa administrativo que se consagra com a publicação a 1 de Janeiro de 183719, depois de referendado20 por Passos Manuel, o novo Código Administrativo.
1.2 – A evolução demográfica A metodologia geralmente adoptada, entre nós, para estabelecer, por estima, a população portuguesa desde o período medieval ao tempo pré-estatístico, assenta, basicamente, no critério do coeficiente multiplicador que incide sobre realidades heterogéneas que dão pelos nomes de “fogos”, “vizinhos”, “moradores”, “pessoas”, “homens”21, “casais”, “meios casais”,
“terço de casais”, “fogueira”, e outras designações indiferentemente utilizadas nas apegações e vedorias monacais ou do cabido, nas visitações das ordens militares e fundamentalmente nas actas das inquirições gerais, duo e trecentistas, de iniciativa régia. Em geral o coeficiente adoptado varia entre 4 e 5 e foi amplamente utilizado, em diversas regiões do Reino22, critério que seguimos (coeficiente) para
18 19 20 21 22
MOREIRA, A. Domingos; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – Alfena. A Terra e o seu povo. Ermesinde: Esc. Tip. Das Missões- Cucujães.
Código Administrativo de 31 de Dezembro de 1836. [Disponível em: http://www.fd.unl.pt/ Anexos/investigaao/1814.pdf. [Consultado em: 12.12.2016]. COSTA, Mário Júlio de Almeida (2007) – História do Direito Português, 3.ª edição. Coimbra: Edições Almedina, p.426. DIAS, João José Alves (1996) – ob. cit., p.28.
COSTA, Avelino de Jesus (1954) – O Bispo D. Pedro e a organização da diocese de Braga. Vol. I. Coimbra: Universidade de Coimbra, p.207; MARQUES, A. H. de Oliveira (1980) – «A População portuguesa nos finais do século XIII», in Ensaios de História Medieval Portuguesa, 2ª ed. Lisboa: Editorial Vega pp.51-54 (51-92); MARQUES, A. H. de Oliveira (1984) – «Demografia», in Dicionário da História de Portugal, vol.II, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, pp. 281-282; MATTOSO, José (1988) – Identificação de um 24
Joel Silva Ferreira Mata
os anos de 1527, 1533 e 1565, para calcular a população do extinto concelho de Coina (que integra hoje a união das freguesias de Coina e Palhais, do concelho do Barreiro)23, seguindo o critério de Joaquim Veríssimo Serrão24, assim como no concelho de Baião, também na centúria de Quinhentos25, por parecer o mais ajustado. Por outro lado, se tivermos em conta a definição de vizinho incerta no Título XXI, do Segundo Livro das Ordenações Manuelinas26, esquematizada por João José Alves Dias27, a tarefa só aparentemente está facilitada. Os factores imponderáveis são múltiplos o que impede o apuramento real da população, nomeadamente em território de matriz rural. As Inquirições Gerais efectuadas entre 1220-1343, num total de oito inquéritos realizados durante longo período28, com abordagens e critérios
não coincidentes, permitiram à monarquia consolidar o poder régio em territórios como o Entre-Douro-e Minho, Trás-os-Montes e Alto-Douro, a Beira Litoral e a Beira Interior, até ao Rio Tejo29. A instabilidade política, do início do século XIII – que levou à deposição de D. Sancho II, e à consequente ascensão de seu irmão D. Afonso III, a crise de 1248 – foram situações que permitiram sobretudo, à nobreza senhorial local e regional apropriar-se de património fundiário e de direitos que pertenciam à coroa, motivo pelo qual foram efectuadas as inquirições gerais para repor a autoridade e a afirmação
23 24 25 26
27 28
29
País. Ensaio sobre as origens de Portugal, 1096-1325. Vol II. Composição. Lisboa: Editorial Estampa. p.17; COELHO, Maria Helena da Cruz (1990) – «A População e a propriedade na região de Guimarães durante o século XIII», in Os Homens, espaços e poderes, sécs. XI-XVI, vol. I Notas do viver social. Lisboa: Livros Horizonte, p.143; DAVID, Henrique (1995) – «A população Portuguesa na Idade Média: uma revisão biográfica», in Revista População e Sociedade, nº1. Porto: Edição CEPFAM- Centro de Estudos da População e Família, pp.87-91.
MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – A Comunidade Feminina da Ordem de Santiago: a Comenda de Santos em finais do século XV e no século XVI. Um estudo religioso, económico e social. Militarium Ordinum Analecta.9. Porto: Fundação Eng. António de Almeida, p.243.
SERRÃO, Joaquim Veríssimo (1980) – História de Portugal (1495-1580) vol.III. Lisboa: Ed. Verbo, p. 218. MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – Baião em torno do ano 1500. Coleção em Torno de Baião: contributos para a história económica e social de Baião, coord. Lino Tavares Dias. Baião: Edição Município de Baião/ Caleidoscópio, pp. 31-36.
Ordenações Manuelinas, Liv.II (1984) – Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, pp.99-100. DIAS, João José Alves (1996) – ob. cit. p.33.
PIZARRO, José Augusto Sotto Mayor de (2013) – «As Inquirições portuguesas (séculos XIII-XIV). Fonte para o estudo da nobreza e memória arqueológica. Breves apontamentos», in Revista da Faculdade de Letras, Ciências e Técnicas do Património, Vol. XII, p.283 (275-292). PIZARRO, José Augusto Sotto Mayor de (2013) – ob. cit., p.283. 25
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
régias. Esta atitude, então iniciada, foi inspirada nas deliberações tomadas nas cortes de Coimbra de 121130. Os diferentes inquiridores e escrivães, que redigiram as actas das inquirições não seguiram uma estrutura análoga; em 1220 a preocupação assentava no apuramento dos reguengos, dos direitos de padroados, dos foros e direitos, dos bens das ordens religiosas e militares31. As de 1258 apresentam
a mesma preocupação, baseada no levantamento de todos os tipos de património, os seus detentores sejam de natureza régia, do clero secular, igrejas paroquiais, cabidos, gafarias, clero regrante masculino e feminino e de outras senhorializações de natureza obscura; nas de 1284 e de 1343 os inquiridores apresentam como objectivo primordial de sua missão, o apuramento e natureza dos proprietários, identificando-os por freguesias, aldeias e lugares, escutam as denúncias sobre a usurpação de bens e direitos; os de 1288 e os restantes que tiveram lugar até 1343, os oficiais régios têm especial atenção ao património fundiário da nobreza e aos ilícitos praticados contra os funcionários e bens da coroa32.
Para este estudo interessa-nos analisar as inquirições gerais para compreendermos como se povoou o actual território do concelho de Valongo, disperso pelas cinco freguesias que foram integradas numa mesma unidade administrativa em 1836, correspondendo espaços geográficos com características próprias, a partir das quais se forja um tipo de agregado familiar de exploração agrária, de movimentação dos mesteirais hierarquicamente distintos, o desalento e o consequente abandono da terra, ermando os casais e o seu declínio, o desenvolvimento artesanal e comercial, a concentração e dispersão demográfica e o seu significado.
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31 32
Portugaliae Monumenta Historica a saeculo octavo post Christum usque ad quintum decimum iursu (1856). Academiae Scientiarum Olisiponensis edita I, Leges, p.169; (nas referêncais seguintes: P.M.H. Inquisitiones) BARROS, Henrique da Gama (1945) – História da Administração Pública em Portugal nos séculos XII a XV, 2ª edição, Tomo II. Lisboa: Sá da Costa Editora, pp.34-38; MATTOSO, José (1993) – «Dois Séculos de vicissitudes políticas», in História de Portugal, Vol. II. A monarquia feudal (1096-1480), dir. José Mattoso. Lisboa: Edição Círculo de Leitores, pp.111-113. VILAR, Hermínia de Vasconcelos (2005) – D. Afonso II. Um rei sem tempo. Lisboa. Círculo de Leitores, pp.186-192. PIZARRO, José Augusto Sotto Mayor de (2005) – D. Dinis (1261-1325). Lisboa: Círculo de Leitores, p.94; 154-156; 178-179. 26
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 1 – População estimada no actual concelho de Valongo (1258)33 Freguesias
n.º de casais
População campesina (coef. 4)
Percentagem (%)
Alfena (São Vicente de)
70
280
27.6
Campo (São Martinho do)
39
156
15.3
Ermesinde (São Lourenço d’Asmes)
24
96
9.5
Sobrado (Santo André de)
55.3
222
21.8
Valongo (São Mamede de)
65.5
262
25.8
Fonte: P.M.H. Inquisitiones, pp.505-513 e 577.
As iniciativas régias, com outro significado, continuariam a partir do último quartel do século XV, passando por D. Afonso V, D. João II e D. Manuel34, e tinham como objectivo proceder ao levantamento cadastral da população do Reino. Este desiderato, porém, não foi plenamente alcançado nem concluído, matéria que iria ser um dos esteios da política administrativa interna implementada por D. João III. Neste sentido, em 17 de Julho de 1527, o monarca enviou uma carta, expedida da cidade de Coimbra35, dirigida a todos os corregedores, pela qual mandava fazer, em todas as cidades, vilas, concelhos, coutos, honras, julgados, comendas e lugares, o reconhecimento das unidades familiares; os residentes, os que viviam fora, o número de viúvas, das mulheres solteiras, dos clérigos, as estruturas agrícolas que suportavam os agregados e núcleos familiares, como as quintãs, os casais, partes de casais, as herdades e quebradas, dando, assim, origem ao primeiro cadastro nacional. Nesta altura, o Reino estava dividido administrativamente nas comarcas de Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Entre-Tejo-e-Odiana e Algarve36. Todos os corregedores responderam positivamente excepto o doutor João Carneiro, cavaleiro da Ordem 33 34 35 36
A população é calculada por defeito, uma vez que as Inquirições são, em alguns casos, imprecisas, como por exemplo, em relação ao cômputo dos casais da Gafaria de Alfena. RODRIGUES, Teresa Ferreira (1993) – «As Estruturas populacionais», in História de Portugal, Vol.3. dir. José Mattoso. No Alvorecer da Modernidade, coord. de Joaquim Romero de Magalhães. Lisboa: Editorial Presença, p.198.
TT, Gaveta15, m.24, n.º12; FREIRE, Anselmo Braamcamp (1909) – «Povoação de Trás-os-Montes no XVI século», in Archivo Historico Portuguez, Vol. VII, n.º 1 e 2, pp.241-249).
DIAS, João José Alves (1996) – ob. cit., p.211. 27
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
de Cristo37, da comarca transmontana. O rei, através de uma carta, lavrada por Henrique da Mota, “goarda roupa omde os lyvros das outras comarcas estam”38 questionou o corregedor sobre a razão pela qual ainda não tinha feito a inquirição. A justificação dada pelo corregedor refere que o atraso se devia à inércia do escrivão Martins Ribeiro que “tinha a dita carta nam fazya ainda por ella obra nenhũa”39. A utilização de diferentes termos, querendo espelhar a mesma realidade, dificultam a análise e o tratamento dos dados, mas acrescem outras problemáticas que advêm dos casais desocupados aos quais se fez menção de um titular, as unidades agrícolas ocupadas por homens pobres e cabaneiros e pela cifra global que quantifica todos os moradores. Por outro lado, o número de moradores e de vizinhos para um mesmo período podia espelhar realidades sociais diferentes, assim como o número de fogos e de vizinhos podia não coincidir40. Em todo o caso, estas diferentes expressões, apesar da sua heterogeneidade e diversidade têm servido para o cálculo demográfico.
O território do actual concelho de Valongo despertou a atenção régia logo nas inquirições efectuadas em data anterior a 122041, nas freguesias de
Santo André de Sobrado e de São Martinho do Campo, através das quais é feito o levantamento dos casais reguengos e que pagam renda ao rei.
37
TT, Gaveta 14, mç.5, n.º6.
39
FREIRE, Anselmo Braamcamp (1909) – ob. cit., p.242.
38 40 41
FREIRE, Anselmo Braamcamp (1909) – ob. cit., p.241. DIAS, João José Alvo (1996) – ob.cit.p.37. TT, Gaveta 15, mç.24, n.12.
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Joel Silva Ferreira Mata
Inquirições efectuadas em São Martinho do Campo e em Santo André de Sobrado em data anterior a 1220. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Gaveta I, mç.7, n.º20.
Resolvida a crise política – guerra civil e morte de D. Sancho II, em Toledo –, D. Afonso III focaliza a sua acção na consolidação e centralização do poder régio, apesar das profundas dificuldades diplomáticas que enfrentou com a cúria romana, a propósito da formação dos senhorios jurisdicionais das infantas suas irmãs Teresa, Sancha e Mafalda42 e do processo de denúncia de bigamia, por ter casado com D. Beatriz, filha ilegítima de Afonso X, o Sábio, sendo ainda marido de D. Matilde, condessa de Bolonha43, mandando proceder às Inquirições Gerais de 1258. Respondiam ao inquérito “o joiz de cada joigadigo et o abade da egreja et todolos freegueses de cada uma freguesia et conjuraram nos sobre Sanctos Evangelios cada uno per si44. No território do actual concelho de Valongo foram ouvidos diversas testemunhas, conforme as freguesias.
42 43 44
MATTOSO, José (1993) – História de Portugal, Vol. II, dir. José Mattoso. A Monarquia feudal (1096-1480). Lisboa: Editorial Estampa, p114.
TORRES, Ruy de Abreu (1981) – «Afonso III, D.», in Dicionário de História de Portugal, Vol. I, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, p.40-41. P.M.H, Inquisitiones, p.74.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Excerto da acta das inquirições efectuadas no reinado de D. Afonso III, em S. Lourenço d’Asmes (Ermesinde) “Documento cedido pela ANTT” Cota: Feitos da Coroa. Inquirições de D. Afonso III, liv.5, fl.28v.
Em cada uma delas respondeu, em primeiro lugar, o abade da igreja paroquial. A acta das inquirições gerais, respeitante aos territórios das cinco freguesias não é clara e precisa, e resulta, por certo, em consequência daquilo que o escrivão conseguiu apurar. A ambiguidade textual não permite fazer, com segurança, o cálculo populacional, por diversas razões. Em primeiro lugar, porque alguns possessores ocupavam dois casais ou partes de casal, como acontecia em São Mamede de Valongo, e em Santo André de Sobrado45; em segundo lugar, pela menção de dezenas de leiras exploradas por lavradores autónomos que não aparecem referenciados no encabeçamento dos casais. Os campos de Ermesinde, as suas “bonas vinas”46, as herdades de “Vallis Longus”47, os “agri magni”48 e os seus linhares, as cerca de duas dezenas de leiras cultivadas por um só arrendatário, como por exemplo João Pelágio49, no lugar de Cavalo Morto, os cabaneiros, de Valongo da Estrada, de Ferraria e de outras aldeias50, teriam um peso diferente mas que também deviam entrar para o apuramento populacional se esse tivesse sido objec45
P.M.H. Inquisitiones, p.513 e 577.
47
P.M.H. Inquisitiones, p. 506.
46 48 49 50
P.M.H. Inquisitiones, p. 505
P.M.H. Inquisitiones, p. 507. P.M.H. Inquisitiones, p. 513.
P.M.H. Inquisitiones, pp. 506, 513. 30
Joel Silva Ferreira Mata
tivo. Não há dúvida de que, também, podiam ser equiparadas às unidades de exploração em tudo idênticas ao casal. Considerar a tipologia das leiras isoladamente parece ser excessivo, não sendo contabilizadas para efeitos de cálculo populacional51.
Excerto da acta das Inquirições efectuadas em São Vicente de Alfena, em 1258. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Feitos da Coroa. Inquirições de D. Afonso III, liv.5, fl.30.
Estas parcelas exploradas por um só titular irão dar origem a novos casais que as apegações dos finais do século XVI até ao século XVIII, levadas a cabo por diversos senhorios se identificam pelas suas confrontações.
51
COELHO, Maria Helena da Cruz (1990) – «A População e a propriedade na região de Guimarães durante o século XIII», in Homens, Espaços e Poderes Séculos XI-XVI. I. Notas do viver social. Lisboa: Livros Horizonte, p. 143. 31
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Excerto do foral da Terra e concelho da Maia, referente a São Lourenço d’Asmes. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Leitura Nova, liv.43, fl.30.
Mais difícil, porém, será determinar a população da freguesia de São Vicente de Alfena, uma vez que esta povoação (topónimo) não se confunde com os lugares de Baguim, Cabeda, Ferraria e Transleça, e pertencia globalmente considerado à gafaria de S. Lázaro: “tota villa Alfene est leprosorum”52, por não se indicar o número de leprosos, indivíduos solitários, mas que benignamente detinham várias unidades exploradas individualmente por herdadores e lavradores que entregavam as suas rendas ao administrador da gafaria na época das pagas. Por outro lado, regista-se o abandono de muitos lavradores nomeadamente da Ferraria, em virtude de ter sido autorizada a realização de uma feira na cidade do Porto, transcrevendo-se para a acta das Inquirições que este lugar “est totus depopulatus”53, pois os moradores procuraram outros
lugares nas proximidades como Alfena ou mais longínquos em Aguiar de Sousa para sobreviverem54.
52
P.M.H. Inquisitiones, p. 507.
54
P.M.H. Inquisitiones, p. 507.
53
P.M.H. Inquisitiones, p. 506.
32
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Excerto do foral da Terra e concelho da Maia, referente a São Vicente de Alfena (Cabeda). “Documento cedido pela ANTT” Cota: Leitura Nova, liv.43, fl.29v.
A problemática exposta mostra que é bastante difícil calcular o número de habitantes que morava no território do actual concelho de Valongo. Conforme o critério apoiado no apuramento de casais ou da aplicação do coeficiente55 teremos perspectivas diferenciadoras. O número de casais quantificados, por defeito, soma cerca de 253; se aplicarmos o coeficiente 4, teremos, em termos gerais, cerca de 1012 habitantes em 1258 ligados ao sector primário de produção, ficando de fora todos os indivíduos, e suas famílias, que porventura exercessem apenas funções artesanais ou outras ligadas ao trato comercial, como os mercadores. A sua distribuição, por freguesia, mostra que São Vicente de Alfena seria um pólo aglutinador associando à agricultura a actividade mineira, pelo menos até certo altura56 de onde extraíam e purificavam o minério de ferro, utilizado no fabrico de armas57, e outros artefactos ou barras transformadas como parece indicar a renda que os oito casais de Ferraria pagavam à coroa em “singulos palmos ferri”58, assim como aquelas peças tão necessárias à agricultura destacando-se, pela sua importância os 55 56
57 58
MARTINS, Alcina Manuela (1999) – «O Concelho de Valongo em meados do século XIIIuma época de expansão», in Estudos em Homenagem a Joaquim M. da Silva Cunha. Porto: Universidade Portucalense Infante D. Henrique, p. 793. CARDOSO, Luís, P.e (1747) – Dicionário Geográfico. Lisboa, p.276. MARTINS, Alcina Manuela de Oliveira (1999) – ob. cit. p. 790.
P.M.H. Inquisitiones, p.506.
33
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
“singulus ferros arati”59. Na verdade, a maior parte da população, estimada desta forma, vivia sob o domínio dos senhores da Maia (52.4%) e a restante no concelho de Aguiar de Sousa. A freguesia de São Vicente de Alfena estando num dos extremos interiores das Terras da Maia, não estava isolada, porque a estrada que ligava a urbe do Porto à de Guimarães e “um lanço desta estrada deveria seguir de Alfena por Nogueira da Maia e Milheirós em busca ou, da estrada Cale-Bracara, ou, talvez antes, em direcção à zona marítima”60, era uma artéria viária que devia ter tido um trânsito assinalável de almocreves e de outros agentes económicos que se deslocavam à feira e escoavam os produtos metalúrgicos, entre outros. As populações deste imenso território viviam preferencialmente e de forma concentrada para melhor se defenderem e estabelecerem laços de solidariedade familiar e de boa vizinhança. Em São Vicente de Alfena identificam-se as aldeias de Alfena, Baguim, Cabeda, Ferraria e a de Transleça; em São Martinho do Campo, as de Balselhas, Luriz e São Gemil; em São Lourenço d’Asmes são três lugares que formam os conjuntos populacionais: Ermesinde, S. Lourenço e “Azomes”; em Santo André de Sobrado, o tecido social desenvolve-se em torno das aldeias de Sobrado e de Vilar; em São Mamede de Valongo a população distribuía-se maioritariamente por Susão (65%) e por Valongo (35%), apesar do eixo viário que atravessava Valongo da Estrada. Toda esta gente estava, do ponto de vista do direito enfiteutico, protegida por diversas entidades jurisdicionais que, para isso, prendiam os camponeses à terra, contra a entrega de avultadas rendas em espécie mas também em moeda, o que obrigava os concessionários a trabalhar arduamente para obter a máxima produtividade das suas terras e conseguir vender os parcos excedentes das suas colheitas tendo em vista a obtenção de moeda tão necessária à satisfação das suas obrigações contratuais.
59 60
P.M.H. Inquisitiones, p.506.
ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de, P. (1968) – Vias Medievais.I. Entre Douro e Minho. Porto: Faculdade de Letras do Porto, (polic.), p. 42. 34
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Excerto do foral da Terra e concelho da Maia, referente a Valongo da Estrada e Valongo Susão “Documento cedido pela ANTT” Cota: Leitura Nova, liv.43, fl.29.
Ao longo do século XV, por iniciativa dos procuradores concelhios presentes em cortes, foi várias vezes denunciada a forma como os senhores, incluindo o funcionalismo público nomeadamente os rendeiros, mordomos, portageiros, siseiros e outros oficiais régios que exigiam a cobrança de direitos e de foros que as antigas cartas de foral não consagravam. Os agricultores e os almocreves sentiam-se prejudicados e, por isso, logo nas cortes de Leiria – Santarém (1433)61, os delegados reagem contra o luxo e corrupção dos oficiais de justiça, as sisas sobre o vinho, a requisição de palha e galináceos aos agricultores, o salário dos serviçais, a legitimação do imposto sobre a jugada, as portagens e relegos, certos direitos senhoriais, o imposto sobre o sal, o estatuto dos lavradores, sobre as jeiras. Curiosamente, D. Duarte, atendeu umas, rejeitou e adiou outras. Esta temática, no todo ou em parte, iria continuar a estar presente nas cortes de Lisboa (1439 e 1455), Coimbra (1472), Évora (1473 e 1481), Montemor-o-Novo (1477 e 1495), em Viana a par d’Alvito (1482)62. Os representantes, em cortes, do Terceiro Estado, pela sua tenacidade reivindicativa, conseguiram alguns benefícios e estaria na origem 61 62
SOUSA, Armindo (1990) – As Cortes Medievais (1385-1490), Vol. 2º. Porto: Instituto Nacional de Investigação Científica/Centro de História da Universidade do Porto, pp.289-319.
MARQUES, Maria Alegria (2013) – Foral de Aguiar de Sousa. 1513, s/l: O Planeta da Escrita, p.15. 35
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
de um movimento de protesto que conduziu a uma profunda reforma em torno desta matéria. De facto, o latim, que desde D. Dinis havia cedido o lugar ao português vernáculo; a moeda de conta, não sendo uma só espécie, deixava cada vez mais de estar presente nas transacções com espécimes de antanho como o maravedi, o morabitino, o soldo, o dinheiro, que em zonas mais recônditas e interiores persistiriam, mas em pequena escala; o comércio inter-regional estava em expansão através de uma rede viária, mais segura, mais frequentada e por isso, mais transaccionável em bens, mercadorias e de pessoas do trato comercial, de romeiros e de peregrinos; as vias fluviais navegáveis, pelo montante das cargas, dos meios de transporte requeriam mais liberdade de circulação, regulamentando-se a portagem, e o direito senhorial a zonas exclusivas destinadas à adopção de armadilhas para pesca. A modernidade, que a Expansão introduzia na sociedade portuguesa, levou a coroa a reflectir sobre um certo panorama mental que resultava da oposição entre os que evitavam a actualização dos diferentes diplomas, que beneficiavam certo grupo de privilegiados, e aqueles mais abertos, mais dinâmicos, mais activos que pugnavam por um País que se libertasse de uma prática que impedia o desenvolvimento. Esta reflexão iniciou-se no tempo de D. Afonso V, sem grande resultado, e o mesmo aconteceu no reinado do impetuoso D. João II.63. A subida ao trono, de seu primo, D. Manuel I, trouxe, uma nova visão do problema que tomou uma dimensão muito mais ampla, pela obsessão da centralização do poder. O Venturoso deu a Portugal uma nova compilação legislativa pela publicação das Ordenações Manuelinas, regulamentou o regime sobre a atribuição dos hospitais, gafarias, etc., promulgou a lei das sisas, enfim, empreendeu a primeira reforma administrativa que consistiu na anulação de todas as cartas de foral anteriormente atribuídas, substituindo-as por outras padronizadas e expurgadas de tudo aquilo que cumulativamente prejudicava os queixosos, mas também retirou, aos concelhos, uma série de prerrogativas que foram remetidas para a lei geral. É, assim, comum, dizer-se que os forais manuelinos ficaram, para memória, como uma espécie de pauta tributária deixando de continuar a ser “estatutos polí63
RODRIGUES, Teresa Ferreira (1993) – «As estruturas populacionais», in História de Portugal, Vol.3, dir. José Mattoso. No Alvorecer da Modernidade, coord. Joaquim Ramos de Magalhães. Lisboa: Editorial Presença, p.198. 36
Joel Silva Ferreira Mata
ticos-concelhios”64. Foram redigidos quase seis centenas de cartas de foral65, depois de terem sido feitas novas inquirições pelo cavaleiro Fernão de Pina, em três grandes grupos cronológicos66. O foral da Terra e Concelho da Maia dado pelas inquirições que deviam ter sido realizadas no Verão de 1518, sendo nessa época, senhor da Terra e Concelho da Maia, Pedro da Cunha Coutinho67, foi passado em 15 de
Dezembro de 1519, e o de Aguiar de Sousa, pelo mesmo processo, em 25 de Novembro de 151368. Os forais mencionados tinham um suporte técnico-metodológico que havia sido aprovado por D. Manuel, inserto nos Pareceres de Saragoça69, de 1497. Todavia, os obstáculos presentes nas inquirições dos séculos XIII e XIV mantêm-se nas suas posturas tradicionais; o levantamento impreciso dos casais e da restante propriedade sujeita a tributação enfiteutica, mantém o conceito de “moradores” e a exclusão daquela parte da população que cada vez mais de dedica ao comércio e que de desprende da terra. Sobre a freguesia de São Vicente de Alfena, o cavaleiro Fernão de Pina anota os casais da aldeia de Cabeda, cujo espaço agrícola estava nas mãos do rei e do cenóbio de Santo Tirso de Riba de Ave, ficando de fora as aldeias de Baguim, de Alfena, da Ferraria e de Transleça70; na freguesia de São Martinho
do Campo mencionam-se quantitativamente os casais das aldeias de Balselhas e de São Gemil, ficando por identificar os de “Toronhas”. A expressão usada é a de “moradores”71 que pagavam os foros confirmados pelas inquirições e pelos foreiros que estiveram presentes como testemunhas. Fernão de Pina anotou a falta de comparência de inúmeros usufrutuários, realidade 64
MARQUES, Maria Alegria (2013) – ob. cit., p.18.
66
SERRÃO, Joaquim Veríssimo (2001) – História de Portugal. O século de ouro (1495-1580), 3ª ed., revista e aumentada. Lisboa: Editorial Verbo, pp.212-215.
65
67 68 69 70 71
MENESEZ, Alberto Carlos de (1825) – ob. cit., p.38.
FRANKLIN, Francisco Nunes (1825) – Memória para servir de índice dos forais das terras do reino de Portugal e seus domínios. Lisboa: Academia Real das Ciências, apud DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.194.
TT, Livro dos Forais Novos de Entre Douro e Minho, fls.25-34v; fls.112-117; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., pp.33-46; pp.147-153; MARQUES, Maria Alegria (2013) – ob. cit., p.111.
DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1962) – Forais Manuelinos do reino de Portugal e do Algarve, conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo de Lisboa. Estremadura. Beja: Ed. autor, pp.323-327. DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., pp.39-40.
DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., pp.150-151. 37
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
pouco frequente no Reino. Nestes casos, o inquiridor fixou o nome do titular enfiteutico e a renda anterior, ficando aberta a possibilidade do morador faltoso reclamar da decisão tomada à revelia.
Excerto do foral de Aguiar de Sousa relativo a São Martinho do Campo. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Leitura Nova, liv.43, fl.114v.
Na freguesia de Lourenço d’Asmes, os povoados anteriormente identificados nas Inquirições Gerais de 1258 cedem lugar à freguesia de São Lourenço d’Azenes, contabilizando-se, assim, a totalidade dos casais, com a indicação daqueles concessionários que têm a seu cargo mais do que uma unidade agrária e tributária e a quem deve ser paga a respectiva renda72.
Em Santo André de Sobrado, as aldeias anteriores foram também aglutinadas no “Titollo de Sobrado”, seguindo-se o levantamento dos encabeçados, os senhorios, as rendas e as unidades (casais) que cada agricultor possuía73.
72 73
DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.40.
DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.151. 38
Joel Silva Ferreira Mata
Excerto do foral de Aguiar de Sousa relativo a Santo André de Sobrado. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Leitura Nova, liv.43, fl.115.
Para a freguesia de São Mamede de Valongo, o comissário de D. Manuel optou por inscrever “os moradores de Valongo da Estrada”, prosseguindo-se o método do titular-casal-senhorio-renda74. No reinado de D. João III, marcado por outra iniciativa sobre a reforma administrativa, originada pelo aumento demográfico, obrigou a uma nova redistribuição dos concelhos por comarcas75, levada a efeito em todo o terri-
tório continental. As inquirições que ocorreram então em 1527, no actual concelho de Valongo, são parcas e limitadas. As cinco freguesias de São Lourenço d’Azenes, de São Martinho do Campo, de Santo André de Sobrado e as povoações de Alfena e de Valongo inserem-se dentro do título “A Cidade do Porto d’El Rey nosso Senhor”76. Este território fazia, então, parte do termo do concelho do Porto, por imposição de D. Fernando, aquando da construção da muralha da cidade77.
74
DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.39.
76
TT, Gaveta15, m.24, nº12; FREIRE, Anselmo Braamcamp (1905) – «Povoação de entre Doiro e Minho», in Archivo Historico Portuguez, Vol. III. Lisboa, pp.259.
75
77
DIAS, João José Alvo (1996) – ob.cit., pp. 127-169.
MARQUES, Maria Alegria (2013) – ob. cit., p.123. 39
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Gráfico n.º1 - Os moradores das freguesias do actual concelho de Valongo (1527)
Fonte: TT, Gaveta 15, m.24, n.º12; FREIRE, Anselmo Braamcamp (1905) – ob. cit., pp.259-260
Se tomarmos como sinónimos os termos “casais” e “moradores” para efeitos de cálculo populacional, isto significa que a gente da freguesia de São Vicente de Alfena que em 1258 já era maioritária (27.2%), apesar das vicissitudes provocadas pela extinção da sua feira medieval, o certo é que, na primeira metade da centúria de Quinhentos esta tendência mantém-se. Em São Martinho do Campo, em 1258, o número de casais descritos distribui-se pelas aldeias de Balselhas, Luriz e de São Gemil, e outros que não foram contabilizados em Toronhas. A freguesia de São Lourenço d’Asmes foi aquela que mais cresceu em termos populacionais pois quase duplicou o número dos seus moradores estimados em 1258, que povoavam as várias aldeias e que os registos paroquiais, a partir dos finais do século XVI iriam, anotar com maior precisão. Em meados do século XVIII, em consequência do Terramoto de 1755, de Lisboa, foi feito um novo questionário dirigido aos párocos de cada freguesia muito bem estruturado, abrangendo um conjunto de segmentos interessantes que nos dão, pela primeira vez, uma imagem objectiva e clara e que permite entender melhor, a evolução do território do ponto de vista económico, profissional, os meios de produção, a paisagem, a segurança, a falta de meios policiais para prender malfeitores, os litígios pela repartição da água entre agricultores e moleiros designadamente em Santo André de Sobrado e em São Martinho do Campo. A evolução do território e ocupação humana reflecte-se no maior número de aldeias e de lugares povoados. 40
Joel Silva Ferreira Mata
O critério seguido foi o de “número de fogos”, “vizinhos” e “moradores” tomados como sinónimos. Nesta altura, a freguesia de São Vicente de Alfena havia expandido a sua área de ocupação aos campos, leiras e outros tipos de parcelas à Codiceira, Igreja, Punhete e Rua, mantendo os lugares de Baguim, Cabeda, Ferraria e Transleça, registando o reitor Joaquim da Cunha Sá de Sottomaior um total de 235 fogos, 685 pessoas de maior idade 150 ausentes78. Por informação do padre Teodósio Vasconcelos de Portugal, a freguesia de São Martinho do Campo estava distribuída pelos lugares da Póvoa, Outeiro, Corredoura, Pena do Corvo, Azenha, Luriz, Ponte Ferreira, Balselhas, Portela e Coletinha, apurando-se 165 moradores (em quarenta e cinco casais), 489 indivíduos com idade adulta, 79 de menor idade, e 111 ausentes79. Para Teodósio Vasconcelos Portugal “vizinhos” ou “fogos”80 são termos que reflectem a mesma realidade sociológica.
Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, o abade Constante de Sousa de Meneses utilizou, por sua vez, o termo “vizinhos”81, para enumerar os
que viviam nos lugares de Vilar de Matos, São Paio, Cancela, Igreja, Ermesinde, Sá e Ermida, perfazendo 548 pessoas entre adultos e menores, estando a propriedade rural distribuída por 168 “fogos”, expressão que equivale à noção de “vizinhos”. A freguesia de Santo André de Sobrado também sofreu uma expansão assinalável desde as inquirições quinhentistas. Os lugares da Devesa, Sobrado, Vilar, Paço, Ferreira, Costa e Campelo acomodavam 158 vizinhos, correspondendo a 637 pessoas entre adultos e crianças82. Na freguesia de São Mamede de Valongo, o reitor Joaquim de Sousa Dias, responsável pelas respostas dadas ao inquérito informa que havia, nesta altura, 583 fogos e uma população de 3 634 de comunhão e 237 de menor idade83. O crescimento populacional de Valongo é notável dominando o território do actual concelho. O seu desenvolvimento económico deve-se, 78
TT, MPRQ/2/254.
80
TT, MRPR/13/8.
79 81 82 83
TT, MRPR/8/76. TT, MRPR/8/76.
TT, MRPR/35/186. TT, MRPR/38/34.
41
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
em grande parte, a vectores de ordem interna, apesar de encontrarmos na freguesia gente oriunda de outros lugares, como alguns comerciantes da cidade do Porto e outros. Nos finais do século XVIII, foi feito, de novo, um arrolamento da população da Província do Minho, e sua distribuição entre géneros por Custódio José Gomes Vilas-Boas que mostra como evoluíram demograficamente as cinco freguesias, não se anotando, desta vez, os que estavam ausentes, nomeadamente nas partes do Brasil. Quadro n.º 2 – População da Comarca do Porto (concelho de Valongo, 1799) Mulheres maiores de 14 anos
Rapazes menores de 14 anos
Raparigas menores de 14 anos
Total de indivíduos
Freguesia
Fogos
Homens maiores de 14 anos
Alfena (São Vicente de)
242
291
324
149
121
885
Campo (São Martinho de)
200
282
304
161
137
884
Ermesinde (São Lourenço d’Asmes)
200
234
265
125
105
729
166
244
315
127
126
812
740
963
987
529
479
2958
Sobrado
(Santo André de) Valongo (São Mamede de)
Fonte: CRUZ, António (1970) – ob. cit., pp.[356-357; 364-365; 376-377].
42
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 2 – Distribuição da população pelas freguesias (1799)
Fonte: CRUZ, António (1970) – ob. cit., pp.[356-357; 364-365; 376-377].
Em 1836, no Mapa n.º 2 anexo ao Decreto de 6 de Novembro de 1836, a Junta Geral Administrativa do Distrito do Porto ao propor a elevação da freguesia de São Mamede de Valongo a concelho e a cabeça de concelho, apresenta como fundamentação principal a sua população distribuída pelas respectivas freguesias que irão fazer parte do novo município. Gráfico n.º 3 – Distribuição da população por fogos, nas diferentes freguesias (1836)
Fonte: Decreto de 6 de Novembro de 1836.
A evolução entre os períodos assinalados não pode corresponder à verdade, e dependerá certamente dos critérios e metodologia adoptados uma vez que as oscilações são demasiadamente evidentes. Na freguesia de São Vicente de Alfena, a população terá regredido cerca de 17.4%; em São 43
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Martinho do Campo cresceu aproximadamente 39.5%; a freguesia de São Lourenço d’Asmes apresenta uma tímida evolução em torno de 8.5%; mais baixa mas próxima de S. Martinho do Campo fica a variação populacional de Santo André de Sobrado calculada em cerca de 38.5%, e em São Mamede de Valongo o crescimento seria de 4.7%. Como se vê, estes dados, mostram como são ainda falíveis os critérios para o apuramento da população valonguense. Gráfico n.º 4 – Evolução populacional entre 1799-1836
Fonte: CRUZ, António (1970) – ob. cit., pp.[356-357; 364-365; 376-377]; Decreto de 6 de Novembro de 1836.
1.3 – Os Ritmos de natalidade/ nupcialidade nas freguesias 1.3.1 – Os filhos naturais Os nascimentos, evidentemente, acontecem na sua grande maioria num quadro familiar estável que lhe é anterior. No entanto, a análise dos assentos dos baptizados apresenta realidades disfuncionais, que aliás são comuns para qualquer outra parte do território nacional, variando apenas o número de casos, e, portanto, a percentagem em relação ao total dos indivíduos nascidos. O casamento moderno é uma estrutura que assenta as suas bases no século XV e que constitui “uma forma de organização da actividade 44
Joel Silva Ferreira Mata
reprodutiva”84, cabendo à Igreja a tarefa de padronizar as relações entre sexos, através da valorização do casamento conforme a ética e a moral cristã. A constituição de uma família exigia um conjunto de meios económicos que viabilizassem a sua independência e curso natural. No mundo rural, porém, onde estava inserido o território do actual concelho de Valongo, as expectativas podiam nem sempre corresponder à realidade. Com efeito, o sistema senhorial de exploração da terra dependia de um contrato realizado entre o possessor do domínio directo e o concessionário. Em geral, neste território, o procedimento contratual assentou numa visão de gestão de média duração, pelos contratos geracionais, em três vidas. Quer dizer que o filho primogénito, por regra, teria em princípio, assegurado a sua ancoragem económica por sucessão. Todavia, os outros filhos podiam não ter a mesma sorte. A propriedade arável facilmente era invadida pelo matagal, exigindo um trabalho árduo, caso contrário penalizaria a família camponesa, pela entrega de quotas fixas das rendas estabelecidas previamente. Os filhos secundogénitos, particularmente as raparigas, que não tendo património, teriam alguma dificuldade para constituírem um novo núcleo familiar. Gráfico n.º 5 – Nupcialidade global na freguesia de São Vicente de Alfena (1593-1802)
Fonte: ADP, E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1; E/27/4/2-6.2; E/27/4/28.3.
84
CARVALHO, Joaquim Ramos (2010) – «As Sexualidades», in História da vida privada em Portugal, dir. José Mattoso. A Idade Moderna, coord. Nuno Gonçalo Monteiro. Lisboa: Círculo de Leitores, p.101. 45
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Gráfico n.º 6 – Nupcialidade global na freguesia de Ermesinde (1586-1835)
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-15.1; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/5-17.9.
Gráfico n.º 7 – Nupcialidade global na freguesia de S. Martinho do Campo (1589-1835)
Fonte: ADP, E/27/4/2-8.6; E/27/4/3-11.1; E/27/4/3-12.1.
Gráfico n.º 8 – Nupcialidade global na freguesia de Sobrado (1588-1686)
Fonte: ADP, E/27/4/5-19.12.
46
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 9 – Nupcialidade global na freguesia de Valongo (1635-1835)
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2; E/27/6/1-4.1; E/27/6/25.1; E/27/6/2-5.2; E/27/6/2-6.1; E/27/6/3-11.1.
A exploração da terra, no actual concelho de Valongo, assentava basicamente no casal, a unidade agrária de incidência tributária. Pertencendo, a um filho, a sucessão tranquila, a questão estava, assim colocada sobre os outros. As apegações levadas a cabo pelo juiz e procurador do Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto mostram esta realidade, e o atropelamento à lei que impedia a partilha das unidades rurais estabelecidas. A pressão demográfica, e a chegada à idade adulta de vários filhos, obrigava, o progenitor a doar parte do seu casal, no montante de 50%, de um terço ou de um quarto das parcelas, que eram já exploradas em parceria com o titular contratual. Esta prática, apesar de ilícita, era tacitamente aceite pelos senhores laicos, ou eclesiásticos, pois desta forma, conseguiam manter as terras em bom estado agrário assim como o fomento de outras com aptidões agrícolas, através do arroteamento. À nova divisão correspondiam novas rendas, que estariam a cargo da “cabeça de casal”. Esta metodologia, no território do actual concelho de Valongo, produziu a sua eficácia, pela fixação de indivíduos que de outra forma teriam abandonado a freguesia de naturalidade em busca de um lugar onde pudessem constituir família. O movimento demográfico geral, e em particular em Portugal, esteve sujeito a diversos factores que condicionaram um desenvolvimento natural e linear da sua população. As epidemias que se abateram sobre o território tinham consequências profundas, sobretudo nas crianças, como está bem patente no espaço valonguense. Mesmo a geografia rural, do interior, só aparentemente estava mais isolada, especialmente nos finais do 47
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
século XVI. Na freguesia de São Vicente de Alfena, os caminheiros, os almocreves, os mercadores, e os romeiros eram agentes portadores de epidemias que ceifavam os homens, mulheres e crianças, desorganizavam o espaço de convivência; as guerras que exterminavam os homens destruturavam as populações pela pilhagem desenfreada, como aquela que ocorreu na freguesia de São Mamede de Valongo, durante a ocupação das tropas francesas, no início do século XIX, ou no período da refrega da guerra civil que opôs os liberais aos absolutistas, embora os registos sejam obscuros relativamente à causa de morte neste período conjuntural; os surtos e sequelas da fome, e outros factores de ordem climática como as secas, as intempéries e aqueles que que eram provocados pela acção do homem, são fenómenos que interferiam negativamente no desenvolvimento demográfico das populações campesinas. A reprodução da gente do território valonguense aconteceu em ambiente familiar, com a bênção cristã, sendo assim, a sua maioria, filhos naturais, aqueles que à face do ordenamento jurídico podiam ser legitimados. Havia, contudo, uma percentagem de indivíduos que nasciam de relações ilícitas, de mães solteiras, de pessoas que aguardavam o casamento ou a autorização canónica, de prostitutas, de escravas que não sendo significativa, em termos percentuais, seria altamente penalizadora e estigmatizante para todos os que não nasceram abençoados, reproduzindo gerações de incógnitos, de enjeitados, de “pretos” ou negros, pelo menos até à terceira geração, como consta nos assentos dos baptizados. Algumas crianças, nascidas neste território, eram filhas de mães que não eram freguesas. Vieram da cidade do Porto e de outros lugares limítrofes, sem confessar as suas razões que levaram à escolha do território de Valongo para terem os filhos; outras mães estavam de passagem.
48
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 10 – Nupcialidade global no território do actual concelho de Valongo, por freguesias (1586-1835)
Fonte: ADP, E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1; E/27/4/2-6.2; E/27/4/28.3; /27/4/4-14.5; E/27/4/4-15.1; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-14.6; E/27/4/415.2; E/27/4/5-17.9; E/27/4/2-8.6; E/27/4/3-11.1; E/27/4/3-12.1; E/27/4/5-19.12; E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2; E/27/6/1-4.1; E/27/6/2-5.1; E/27/6/2-5.2; E/27/6/2-6.1; E/27/6/3-11.1.
Alguns dos que foram criados aqui vieram da Roda dos Expostos da Confraria da Santa Casa da Misericórdia do Porto, e outros ainda foram abandonados à porta da igreja paroquial, das casas senhoriais ou entregues por indivíduos desconhecidos. É nesta realidade complexa que paulatinamente se vai forjando o tecido humano no território. No Antigo Regime, a idade do casamento era elevada, rondando, no Minho e Douro Litoral entre os vinte e seis e os vinte e sete anos, quer nos homens, quer nas mulheres85, em termos aproximados, cabendo à Igreja o
papel regulador da castidade, instrumentalizada pelas visitas pastorais cujos mentores censuravam fortemente a prática de actos que não cabiam nos quadros de uma moralidade sadia e cristã. No actual território do concelho de Valongo regista-se a presença periódica dos visitadores pastorais que não deixariam de chamar a atenção dos párocos responsáveis pelo registo dos assentos, como por exemplo, o padre Vicente de Araújo, da freguesia de São Vicente de Alfena, no início do século XVIII, no sentido de cumprirem as deliberações sinodais, e daí ser possível compreender a origem de todos os que aqui nasceram. 85
AMORIM, Norberta (2004) – «Comportamentos demográficos do Antigo Regime na Península Ibérica», in Ler História, 47. Lisboa, pp.147-170. 49
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Gráfico n.º 11 – Nupcialidade global no actual território do concelho de Valongo (1586-1835)
Fonte: ADP, E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1; E/27/4/2-6.2; E/27/4/28.3; E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-15.1; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/5-17.9; E/27/4/2-8.6; E/27/4/3-11.1; E/27/4/312.1; E/27/4/5-19.12; E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2; E/27/6/1-4.1; E/27/6/2-5.1; E/27/6/2-5.2; E/27/6/2-6.1; E/27/6/3-11.1.
Esta circunstância – o casamento que pode considerar-se tardio, tendo em vista a expectativa da esperança de vida – e apesar da pressão ética e moral verbalizada do altar, e do confessionário, o certo é que, as relações ilícitas não podiam esconder-se da comunidade, quando davam origem a nascimentos indesejáveis, já que a gravidez, mesmo quando ocultada tinha sempre consequências profundas, dando, pois, origem, a um segmento populacional ferido de ilegitimidade.
1.3.2 – Os filhos legítimos A maioria da população do território valonguense, de acordo com os assentos paroquiais, nasce dentro da família, num quadro conjugal abençoado pela Igreja. As famílias de grandes cabedais têm boas casas, criados e escravos e escravas para efectuarem todo um conjunto de trabalhos quotidianos. Os outros, a maioria, são camponeses que vivem nos seus casais, e habitam prédios chãos modestos, compostos em geral por uma cozinha que serve para a comensalidade, a socialização e a intimidade, favorecida de Inverno no aconchegar da lareira e do borralho. O espaço amplo devia ser internamente repartido, encontrando-se encostada a uma das paredes uma enxerga onde, depois de imensas horas de trabalho braçal, e de arado, marido 50
Joel Silva Ferreira Mata
e mulher, filhos e filhas descansavam. Os mais abastados do segmento rural, além da cozinha, tinham um celeiro que fazendo parte do mesmo imóvel, serviria também de câmara de recolhimento da família, podendo afastar o casal dos filhos. Outros, porém, tinham casas de dois pisos, destinando-se o primeiro às actividades culinárias, fumeiro e tratamento e conservação das carnes, de reunião familiar, e o segundo à câmara conjugal. No cômputo das cinco freguesias do actual território concelho de Valongo foram arrolados cerca de 20 520 nascimentos repartidos de forma muito diferenciada (quadro n.º 3): Quadro n.º 3 – Natalidade no território do actual concelho de Valongo Cronologia
Freguesia
Nascimentos
Fonte
1596-1766
Alfena (S. Vicente de)
2 737
ADP, E/27/4/2-5.1 ADP, E/27/4/2-5.2 ADP, E/27/4/2-6.1
1594-1711
Campo (S. Martinho do)
2 716
ADP, E/27/4/3-9.1 ADP, Dep. G ADP, E/27/4/3-10.1
1586-1835
Ermesinde
2 783
ADP, E/27/4/4-14.5 ADP, E/27/4/4-15.1 ADP, E/27/4/4-15.2 ADP, E/27/4/4-16.2
1598-1743
Sobrado (S.to André de)
1 243
ADP, E/27/4/5-19.12 ADP, E/27/4/5-20.2
11 041
ADP, E/27/6/1-2.3 ADP, E /27/6/1-3.1 ADP, E/27/6/1-3.2 ADP, E/27/6/2-6.1 ADP, E/27/6/1-4.1 ADP, E/27/6/2-5.1 ADP, E/27/6/1-4.2
1590-1796
Valongo (S. Mamede de)
O início do arrolamento é comum em todas as freguesias e ocorre em finais do século XVI. Na década de 1580 surgem os primeiros assentos de baptismo na paróquia de São Lourenço d’Asmes, e na de 1590 nas restantes paróquias pela ordem seguinte: São Mamede de Valongo, São Martinho do Campo, São Vicente de Alfena e Santo André de Sobrado. Ainda que cronologicamente desigual, o certo é que a freguesia de São Mamede de Valongo é aquela que regista um maior desenvolvimento demográfico que tira partido do seu posicionamento viário, assim como a permanência e fixação de diversos 51
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
senhorios eclesiásticos que neste território detinham imensas herdades como a Mitra do Porto, o mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto que em 1536, herdou todo o património do extinto mosteiro beneditino, feminino, de São Cristóvão de Rio Tinto86, o mosteiro de São Pedro de Cete, o mosteiro de Santa Clara do Porto, e de Santo Estêvão de Vilela, cujos procuradores e comendatários, abadessas e cónegos, no exercício da gestão das rendas provenientes da agricultura, apicultura e da criação de gado, participavam na organização e estrutura dos terrenos agrícolas, criando condições para a constituição de novas e renovadas famílias, com o apoio económico que derivava da possibilidade da exploração autónoma de um pequeno conjunto de terras, leiras, herdades e quebradas. A actividade comercial atinge a sua maior expressão com o intercâmbio com a urbe portuense, local para o qual se deslocavam dezenas de almocreves continuamente para levarem a farinha, o pão e a carne de animais criados nos aidos, e trazendo, no torna-viagem cereais que eram triturados nos moinhos do rio Ferreira, e toda uma vasta gama de bens necessários ao quotidiano dos valonguenses. Gráfico n.º 12 – Ritmo da natalidade no concelho de Valongo, por freguesias (1586-1650)
Fonte:ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-4.1; E/27/6/1-4.2; E/27/6/2-5.2; E/27/6/2-6.1; E/27/4/5-20.2; E/27/4/5-19.12; E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-15.1; E/27/4/3-10.1; E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-9.2; E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1.
86
SOUSA, Bernardo Vasconcelos e (dir.) (2006) – Ordens Religiosas em Portugal. Das Origens a Trento – Guia de Estudo. Lisboa: Livros Horizonte, pp.79-80. 52
Joel Silva Ferreira Mata
Os inúmeros vendeiros que expunham nas suas lojas e tendas, os produtos locais, as alfaias agrícolas, as ferraduras e os diversos apetrechos para os muares e cavalgaduras, davam, à freguesia, nomeadamente ao lugar de Valongo da Estrada, de passagem, de ligação de trânsito entre o Douro Litoral e Trás-os-Montes, do encontro de pessoas de diferentes localidades, de almocreves que vinham do interior nortenho, de mercadores da cidade do Porto, de oficiais do exército e membros do clero superior que vulgarmente se deslocavam a este lugar para estarem presentes nos baptizados, assim como os senhores laicos, com as suas comitivas e criadagem, participavam e comungavam de um ambiente social rural com fortes laivos urbanos que distingue esta freguesia da de São Vicente de Alfena, mais vocacionada para a actividade artesanal e agrícola directamente com a cidade do Porto e com a Maia, pelo caminho de Milheirós, pois a feira criada e extinta em meados do século XIII, que retirou da freguesia o frenesim dos que por aí chegavam para comprar objectos e artefactos em ferro, saídos das forjas dos mesteirais do lugar da Ferraria, deixou os seus habitantes mais isolados e algumas unidades agrícolas abandonadas. As famílias de São Martinho do Campo viviam essencialmente da agricultura e da actividade moageira, constituindo o rio Ferreira a sua maior riqueza natural. O regadio será uma das maiores preocupações dos agricultores que estavam subordinados aos proprietários dos moinhos, de quem dependia a água a desviar, por horas, repartida por todos os que possuíam terras férteis nos vales e margens deste curso de água de média dimensão. Mais interiorizado e mais verde, na freguesia de Santo André de Sobrado o ritmo dos nascimentos é superior àquele que verificamos para São Vicente de Alfena. Nesta freguesia nasceram, até 1766, cerca de 2737 crianças e em menos de cinquenta anos, na de São Martinho do Campo foram baptizadas um número de crianças muito próximo daquele que arrolamos para a freguesia anterior. A freguesia de São Lourenço d’Asmes, cuja natalidade foi levantada até 1835 evidencia também um índice de natalidade inferior ao das freguesias anteriores, pois até 1835, os valores são muito semelhantes aos de São Vicente de Alfena e de São Martinho do Campo, apesar dos registos abar53
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
carem a segunda parte da centúria de Setecentos ultrapassar facilmente o primeiro quartel do século XIX. As famílias de São Lourenço d’Asmes espalharam-se por diversos locais, dando a sensação de que o seu território estava muito preenchido e humanizado. Muitos dos que aqui nasceram e viviam eram filhos de famílias pobres, de mulheres mendigas e de cabaneiros, num ambiente rural, apesar da sua melhor localização e proximidade à cidade do Porto e à Maia, gozando de uma rede viária que facilitaria as relações comerciais se o desenvolvimento do sector primário de produção o permitisse. O seu território estava dominado pelo mosteiro de Santa Maria de Águas Santas, da Ordem dos Cónegos Regulares do Santo Sepulcro87, e dos beneditinos do cenóbio masculino de Santo Tirso de Riba de Ave, que arrecadavam grande parte da produção dos camponeses que aqui viviam. As casas de lavradores abastados não teriam grande vocação para a comercialização e daí a fraca malha de almocreves detectada em São Lourenço d’Asmes.
A freguesia de Santo André de Sobrado, ligada à agricultura subsidiária da água de regadio proveniente do rio Ferreira, é aquela onde, comparativamente com as outras do território valonguense há menos famílias e, portanto, menos nascimentos. Os seus pólos são fundamentalmente o lugar da Devesa, a aldeia de Ferreira, a de Sobrado, a de Vilar e a de Paço.
1.3.3 – Os desqualificados por nascimento À margem dos bem-nascidos no interior das famílias estruturadas, das elites militares, senhoriais, das casas de lavoura, daqueles que têm formação académica superior e a ocupação das profissões ligadas ao sector da saúde – cirurgiões e boticários – das habitações, casebres e cabanas dos pobres, dos agricultores, ferreiros, ferradores, alfaiates, moleiros e almocreves, havia outros que nasciam à margem do contexto familiar, filhos rotulados socialmente como incógnitos, enjeitados, expostos, filhos de mães solteiras, de clérigos para citar apenas as situações que mais correntemente desonravam as filhas e mulheres de família ou parentes masculinos profissionalmente 87
SOUSA, Bernardo Vasconcelos e (dir.) (2006) – ob. cit., p.216. 54
Joel Silva Ferreira Mata
bem colocados e que o registo no livro dos assentos de baptizados deixou laconicamente inscrito intercalados com os outros. O nascimento de crianças monoparentais ou de ascendência desconhecida e anónima era uma chaga muito profunda desde a medievalidade europeia, se bem que a sua prática remonte a épocas anteriores, mas, de facto, é a partir do século XII, que aparecem alguns membros notáveis da Igreja que começam a preocupar-se seriamente com o flagelo das crianças recém-nascidas e logo abandonadas. As mães aflitas, perdidas na sua angústia, dor e infortúnio, na Idade Média, tinham, por hábito, deixar as crianças nos adros e portas das igrejas paroquiais e nas portarias dos conventos femininos. Para dar resposta ao problema suscitado pelo abandono de crianças e ao infanticídio involuntário, em 1188, o papa Inocêncio III criou, em França, a Roda dos Expostos, uma estrutura que só tardiamente chegaria a Portugal onde os nascimentos indesejados, tanto nos centros boémios como Lisboa e do Porto, como no mundo rural, constituíam um importante problema social, familiar e religioso para o qual não foi possível encontrar um antídoto que pudesse estancar, de forma eficaz, o aumento das relações extraconjugais ou prénupciais, que, no caso do território do actual concelho de Valongo, tem particularidades específicas que caracterizam sobretudo a freguesia de São Mamede de Valongo, onde o fenómeno do filho monoparental, incógnito e exposto é mais evidente e que está ligado, em grande parte, aos visitantes profissionais que permaneciam, na freguesia, por curtos lapsos de tempo e que partem, quase sempre, sem deixarem rasto. A questão de protecção as crianças expostas mereceu, depois de Inocêncio III, também a atenção de Xisto IV, no século XV88. Na Península
Ibérica, a sua aceitação é mais tardia, e na Espanha remonta ao início do século XVI nas seguintes instituições de assistência social: Hospital de Santa Cruz de Toledo (1504); Casa de Expostos de Sevilha (1518); de Santiago de Compostela (1524); de Segóvia (1536), sendo incrementadas de novo, a partir da segunda metade do século XVIII, com a criação da Casa dos Expostos do Hospício de Oviedo (1752), de Orihuela (1761) de Badajoz (1773), da Casa da 88
TAVARES, Virgílio; PEDRO, Lúcia (2007) – Os Meninos Expostos da Roda em Torre de Moncorvo, s/l: Ed. do Autor, p.27. 55
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Misericórdia e a Casa dos Expostos de Burgos, que foram reunidas numa só instituição em 177789. Em Portugal, porém, esta calamidade, que atinge todo o território, mas, como no país vizinho, durante a Idade Média, captou pouco a atenção das autoridades administrativas e religiosas que ignoraram um problema com a visibilidade que a gravidade dos nascimentos indesejados representava. No entanto, na segunda metade do século XIII, já Dona Beatriz, mulher de D. Afonso III, e mãe de D. Dinis, senhora de um vasto património fundiário, diplomata perspicaz, fundou, em Lisboa, um hospício para crianças enjeitadas, e em 1321, a rainha Santa Isabel também inspirou um hospital destinado a receber os filhos das mães que abandonavam os filhos. No início do século XVI, D. Manuel instituiu a Casa dos Meninos ou Criandários, na dependência do Hospital Real de Todos-os-Santos, em Lisboa90. O número
cada vez mais elevado de meninos e meninas abandonados obrigou o poder central a interessar-se definitivamente pelo problema, declinando O Venturoso, nas câmaras municipais a responsabilidade de financiar o acolhimento os enjeitados91.
1.3.4 – Os filhos de mães solteiras As mães solteiras que declararam os seus filhos e que os baptizaram, dando-lhes um nome são em número bastante significativo, embora em valor absoluto, incomparavelmente mais baixo do que aquele que acontece em outros lugares do Minho e de Trás-os-Montes, como em Cardanha (Moncorvo), Poiares (Freixo de Espada à Cinta), Rebordãos (Bragança) e Cambeses (Braga)92. 89 90 91
92
PÉREZ MOREDA, Vicente (1980) – Las Crisis de mortalidad en la España Interior, siglos XVI-XIX. Madrid: Siglo Veinteuno de España Editores, pp.169-173. TAVARES, Virgílio; PEDRO, Lúcia (2007) – ob.cit., p.28.
SÁ, Isabel Guimarães (1996) – «Abandono de crianças, ilegitimidade e concepções pré-nupciais em Portugal. Estudos recentes e perspectivas», in Actas do III Congresso da ADEH (Associação Ibérica de Demografia Histórica), vol.3. Porto: Edições Afrontamento, p.38.
SILVA, Maria Manuel Teixeira Ferreira (1996) - «A Ilegitimidade em Cambeses, S. Tiago», in Actas do III Congresso de ADEH (Associação Ibérica de Demografia Histórica), vol.3. Porto: Edição Afrontamento, p.172. 56
Joel Silva Ferreira Mata
Os filhos de mulheres solteiras podiam resultar de relações extraconjugais que aconteciam por diversas razões, mas eram sempre filhos indesejados, conotados como ilegítimos jurídica e socialmente; não tinham lugar na sociedade, resvalando para os seus escalões inferiores trabalhando como criados ao serviço de famílias abastadas, ou na casa dos párocos na realização de serviços domésticos e outros. Muitas destas mães eram mulheres pobres e miseráveis que engravidavam de homens de quem nada sabiam, inclusivamente o nome, a naturalidade ou a família de origem; outras engravidando, e tendo os filhos, eram obrigadas a manter o anonimato do homem com quem se envolveram, mantendo-o secreto, situações que o acervo documental compulsado no território valonguense regista para memória e reflexão sobre uma sociedade eminentemente católica e instantemente moralizadora, onde a desonra da mulher constituía um anátema que a acompanhava até à morte, pela censura social e perda da respeitabilidade. Deviam passar por situações desagradáveis e comprometedoras, mesmo no interior da sua família, evitando, quando o seu estado de gravidez era notório, sair à rua, participar nas festas do padroeiro, dos santos maiores, assistir à missa, o que não deixaria, por certo, de ser reparado; o constrangimento de confissão para remissão do seu pecado, e ainda o acto de baptizar o filho, de forma discreta, semiclandestina, em dia de semana, sem o toque do sino93, sem grandes festividades, algumas vezes sem padrinhos ou tendo-os, seriam os padres que se encontravam disponíveis na freguesia, como na de São Mamede de Valongo, sem familiares. O baptismo é um sacramento, para o bem da alma do infeliz, e por isso, a sua realização “e o conjunto das cerimónias que o acompanham [constituem] um verdadeiro rito de passagem que permite à criança ligar-se à comunidade dos cristãos e ao mundo dos vivos e desembaraçar-se do pecado original e da sagrada impureza ligada ao parto”94, acontecia no mesmo dia ou nos dias próximos, para diminuir o peso do pecado que carregará para a vida inteira. A vergonha e a impossibilidade de poder, em muitas casos, criarem, sozinhas, o filho, levava as mulheres, desesperadas, a abandonarem os meninos e as meninas, em locais por onde passariam os transeuntes que eventualmente as recolheriam e lhes garantiram as condições de sobrevivência.
93 94
SILVA, Maria Manuel Teixeira Ferreira de (1996) – ob. cit., p.173.
LEBRUN, François (s/d) – A Vida conjugal no Antigo Regime. Lisboa: Edições Rolim, p.116. 57
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Na freguesia de São Vicente de Alfena, o flagelo das mães solteiras que assumem a sua culpa e desonra, representa, para o período considerado, cerca de 5%, embora nem sempre seja fácil identificá-las, uma vez que são anotadas pelo seu nome de baptismo, distinguindo-se, quando chamadas à colação, pela sua filiação paternal ou maternal, ou ainda pelo seu distinto domicílio. Algumas destas mulheres foram desonradas várias vezes por um só homem de quem tiveram mais do que um filho, e outras tiveram tantos filhos quantos os homens com quem mantiveram relações sexuais fora do quadro institucional e familiar, uns conhecidos, outros, porém, desconhecidos ou conscientemente ocultados dado o lugar que ocupavam e que era socialmente reconhecido. Num conjunto de 2 337 nascituros, registaram-se 134 baptizados de bebés originários de relacionamentos diferentes, todos condenados pela moral e ética cristã. Foram, mesmo assim, identificadas 126 mães solteiras, não incluindo as escravas negras e seus filhos. Entre 1596 e 165695, a popu-
lação ilegítima na freguesia de São Vicente de Alfena representa cerca de 7,5%, percentagem que regride para 2%, entre 1658 e 171296, mas que volta a crescer nos cinquenta e quatro anos seguintes entre 1712 e 176697. Entre 1596 e 1656, as mães solteiras residiam maioritariamente na aldeia de Baguim, depois em Cabeda e ocasionalmente, sem grande expressão percentual, no lugar de Transleça e no das Liceiras98; entre 1658 e 1712, o espectro territorial alarga-se e modifica-se atribuindo-se ao lugar da Ferraria o maior número de indivíduos nascidos de relações conjugais proibidas, seguido da Codiceira, da Rua, de Baguim, de Cabeda e da aldeia da Várzea99.
No período subsequente, de 1712 a 1766, o número de mães solteiras e de seus filhos diminui e circunscreve-se a outros lugares como o da aldeia do Reguengo, do Outeiro, de Transleça, da Igreja e do Outeirinho100. Na freguesia 95
ADP, E/27/4/2 – 5.1.
97
ADP, E/27/4/12-6.1.
96 98 99
ADP, E/27/4/2 – 5.1. ADP, E/27/4/2-5.1.
ADP, E /27/4/12- 6.1.
100 ADP, E/27/4/12-6.1.
58
Joel Silva Ferreira Mata
de São Martinho do Campo, partindo do mesmo pressuposto metodológico quanto à identificação de cada uma das mulheres solteiras, o número de crianças nascidas de ventres desprotegidos e que estigmatizam tanto mães como os filhos eleva-se a 122. Entre 1594 e 1695 a percentagem ronda os 4,2%; isto é, durante um longo século. Não obstante, entre 1612 e 1630, um tempo intermédio, e muito curto, o número de filhos ilegítimos, de mães solteiras atinge 12,75%101, uma taxa elevadíssima, descendo para valores que rondam os 3%, por defeito, no espaço cronológico que se situa entre o último quartel do século XVII e a primeira metade da centúria de Setecentos102. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, as oscilações são elevadas independentemente do arco cronológico abrangente. Entre 1586-1613, nasceram setenta e seis crianças, de mães solteiras, num total de seiscentos e quarenta e três, atingindo os nascimentos ilegítimos, neste período de cento e sete anos, cerca de 11,8%103, não entrando nesta cifra os filhos das mães solteiras do
exterior e aqueles que nasceram de mães viúvas. Dos finais do século XVII a meados do século XVIII, a percentagem desce para 5,8%104, elevando-se, entretanto, entre 1792 e 1819 para 9,8%, e desde 1817 a 1835, descem para cerca de 4,4%105. Curiosamente, o comportamento sexual de mulheres solteiras que dava origem a nascimentos de filhos naturais ou de espúrios andava, nesta freguesia, no Antigo Regime, muito próximo dos valores do sul do território, e eram muito inferiores àqueles que se verificavam no Minho106. Assim, entre 1588 e 1686, a percentagem de nascimentos de filhos fora do casamento e de ventres da freguesia, rondavam os cerca de 1,8%107, percentagem que desce uma décima entre 1713 e 1743108. Nesta freguesia, entre 1793 e 1819, as mães solteiras distribuíram-se pelo lugar de Cancela (21%), de Ermesinde (16,9%), da Ermida (12,6%) da Igreja (3,2%), de São Paio (6,4%), de Sá (27,4%), de Vilar (10,5%), de Vilar de Matos (1%) e das Rapadas (1%)109. Os lugares de 101 ADP, Depósito G.
102 ADP, E/27/4/3-10.1. 103 ADP, E/27/4/4-14.5. 104 ADP, E/27/4/4-15.1
105 ADP, E/27/4/4-16.2.
106 CARVALHO, Joaquim Ramos (2010) – ob. cit. p.113. 107 ADP, E/27/4/5.19.2. 108 ADP, E/4/5-20.2.
109 ADP, E/27/4/4-15.2. 59
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
maior relevo e densidade populacional são aqueles onde acontecia o maior número de nascimentos, não entrando, nestes valores, o número de filhos de mães solteiras que sendo de fora, por razões cinzentas e pouco esclarecedoras vieram ter seus filhos à freguesia. Na freguesia de São Mamede de Valongo, muito mais densamente povoada, animada comercialmente, ponto de encontro de muitas gentes com interesses diversos, era um território onde a “voz e fama” sobre as mulheres solteiras era pouco frequente. As visitas pastorais e a verbalização do pecado e o estigma que ostracizava mulheres e seus filhos terá tido um impacto grande entre a juventude que parece ter interiorizado a mensagem, reduzindo os seus comportamentos desviantes, embora, não sem mácula. As mães solteiras, naturais e residentes em Valongo foram responsáveis pelo nascimento de cerca de cento e vinte e nove indivíduos de ambos os sexos entre 1589 e 1796. Com excepção do período entre 1629 a 1651110 e 1651 a
1686111, que representam 4,3% e 3,3% respectivamente, de filhos nascidos fora do casamento e só de mães solteiras, em todos os outros arcos cronológicos, as percentagens são pouco expressivas. Note-se que desde os finais do século XVI ao fim do século XVIII nasceram, nesta freguesia, cerca de 11 041 indivíduos, representando os filhos de mães solteiras apenas cerca de 1.16%, valores que não encontramos nas restantes freguesias. A paternidade incestuosa, entre solteiras, parentes, sacrílegos, de origem adulterina, ou de mulheres prostitutas era sempre atribuída pela mãe da criança. Em tantos casos, apenas há conhecimento de dois indivíduos que protestaram a sua inocência. O primeiro foi Manuel Pinto, ferrador de profissão, que apresentou, em 1735, duas sentenças, uma da correição do crime e outra do cível, pelas quais parece provar que não era o pai de uma filha, de Ana, solteira, que morava no lugar do Xisto, na freguesia de São Vicente de Alfena e que era filha de Manuel Ferreira, do lugar de Ferraria112. No início do ano de 1740, Manuel Marques, velho, do lugar de Baguim, solteiro, encontrava-se preso no Aljube, instância onde corria o litígio que o opunha a Maria Henriques, solteira, do mesmo lugar, que lhe havia atri-
110 ADP, E/27/6/1-2.3. 111
ADP, E/27/6/1-3.1.
112 ADP, E/27/4/2-6.1, fl73v. 60
Joel Silva Ferreira Mata
buído a paternidade de seu filho José. O réu nega o seu envolvimento esporádico ou passional com Maria Henriques113. Numa outra perspectiva encontravam-se os que nasciam, por antecipação, de pais que estavam comprometidos por palavras, isto é, que aguardavam o casamento. A prática de relações sexuais antes do casamento entre indivíduos dispostos a constituírem família também era um alvo preferencial dos moralistas que censuravam vivamente esta conduta que atentava contra a honra e os ideais de família cristã. As relações antecipadas podiam ocorrer por duas ordens de razões. A dilação do dia da boda, ou por dúvida canónica, quando à licitude das uniões. As sentenças ou resoluções canónicas eram demoradas, e incertas. Como exemplo, veja-se os casos dos nubentes Silvestre Pereira e Isabel André “comprometidos para casar”114, que tiveram uma filha baptizada no
mesmo dia em que nasceu, a 26 de Fevereiro de 1721, no lugar de Cabeda115. Em Maio de 1746, Estêvão Fernandes, natural da freguesia de Salvador de Fornos, da comarca da Feira, “estava contratado a casar com Maria Pereira116, do lugar do Reguengo, baptizou um filho, de ambos, em Maio desse mesmo ano. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, os viúvos António Pereira e Maria Ferreira “segundo a fama”117, tiveram um filho, mas de acordo com o
abade João de Figueiredo Fragoso Abreu, já tinham casado, na freguesia de São Mamede de Valongo, em 1761. António Marques estava comprometido casar-se com Catarina Marques118 mas isso não os impediu de terem relações conjugais antes do casamento.
Foram dispensados para casar, Maria Moutinha e José Lopes, da freguesia de São Lourenço d’Asmes, moradores no lugar de Sá119, e não casaram, por consanguinidade, em 1766, Manuel da Fonseca, solteiro, “que
113 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.93.
114 ADP, E/27/4/2-6.4. fl 32v. 115 ADP, E/27/4/2-6.4. fl 32v. 116 ADP, E/27/4/2-6.4. fl 116.
117 ADP, E/27/4/4-15.2,fl.236v.
118 ADP, E/27/6/2-6.1 fl.85-85v. 119 ADP, E/27/4/4-15.2. fl.244.
61
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
esteve para casar mas não o fez por ter parentes consanguíneos em grau proibido e estar proibido pelo monarca o recurso à Sé Apostólica”120, e João Marques e Maria Dias, que pelos mesmos motivos, também não casaram121, mas isso não os impediu de terem filhos.
1.3.5 – O destino dos Abandonados e expostos A ocultação da maternidade e da paternidade, não sendo corrente, também se encontra registada no livro dos Assentos dos Baptizados. Algumas crianças recém-nascidas eram abandonadas à porta das casas de algumas famílias ricas e casas de lavoura, pela calada da noite, deixando os meninos e as meninas expostos à geada e à escuridão, ao temporal do Inverno, desprotegidos e à mercê de animais carnívoros, à espera que aparecesse uma mão de caridade, que a recolhesse, agasalhasse e lhe desse um destino122. Um exposto significa ser posto em evidência, posto à vista123, e enjei-
tado é sinónimo de abandonado, recusado, repelido124, conceitos que, em termos práticos, significam a mesma realidade, em todas as freguesias do actual território do concelho de Valongo. Os exemplos são imensos como se pode verificar a propósito das alcunhas: o termo “enjeitado” é aquele que prevalece como sinal identitário que estigmatiza os infelizes cujo pai não tem rosto. Em 1737, foi abandonado, o enjeitado José, de noite, na estrada, em frente da porta da casa de Silvestre Moreira Belo, do lugar do Outeiro, da freguesia de São Vicente de Alfena, que, por caridade cristã, o levou à cidade do Porto e o colocou na Roda dos Enjeitados, não antes de ter sido baptizado
120 ADP, E /27/6/1-4.2, fl.37v. 121 ADP, E/27/671-4.2, fl. 43.
122 FERREIRA, Thomaz António Ribeiro (1873) – Relatório apresentado à Junta Geral do Distrito de Bragança na sessão ordinária de 1872. Coimbra: Imprensa da Universidade.
123 NAZARÉ, Luís de Menezes (coord.) (1993) – Nova Enciclopédia Portuguesa. Vol.10. Lisboa: Ediclube, p.879.
124 SILVA, Lizette (1985) – «Expostos ou Enjeitados», in Dicionário de História de Portugal, vol II, dir. Joel Serrão. Porto: Liv. Figueirinhas, pp.511-512. 62
Joel Silva Ferreira Mata
pelo padre Inácio Dias Alão, com licença do reitor Simão da Cunha Porto125, que serve de exemplo a tantos outros casos de abandono infantil126. A Casa da Roda do Porto, em 1865, foi denominada Hospício dos Expostos do Porto sob a administração da Santa Casa da Misericórdia do Porto, sendo as suas despesas custeadas pela Câmara127, uma estrutura de
assistência aos inocentes abandonados que paulatinamente se irá estenderá a todo o território com o objectivo explícito de ser uma alternativa ao infanticídio e ao aborto128. Efectivamente, o número de enjeitados em Portugal irá, desde o tempo do Marquês de Pombal, ser um problema de Estado, pois a falta de indivíduos provocada por abandono e exposição tinha reflexos profundos na reprodução demográfica do Reino, já de si, cronicamente deficitária. O Sistema de Protecção das Rodas não trouxe os resultados que eram expectantes, pois a grande parte dos meninos e das meninas aí colocados morriam pouco tempo depois. Na Casa da Roda do Porto, no dia dos Santos Inocentes (28 de Dezembro), de grande significado emocional e não apenas simbólico e litúrgico, rendia-se homenagem às crianças que morriam na “idade da inocência, e nos finais do século XVIII rezava-se uma missa na igreja do Hospital da Misericórdia do Porto”129. O modelo das Casas das Rodas não se mostrou, pois, exequível, face ao número crescente de expostos e à complexidade da sua criação, e por isso, o decreto de 24 de Maio de 1783, da lavra de Pina Manique, chefe da Intendência Geral da Polícia130, num dos contratos celebrados com as câmaras municipais chamava os senados locais à resolução do problema, que deviam contribuir com dinheiros próprios. Para colmatar a falta de verbas recorriam
125 ADP, E/27/4/2-6.1, fl. 82v. 126 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.125.
127 [Disponível em: http/www.porto24.pt/memoria/memorias-da-casa-da-roda-noarquivo-distrital/]. [Consultado em 21.09.2016].
128 CUBERTO, Tiago Manuel Rodrigues (2011) – A Assistência à Infância em Torres Novas: estudo dos subsídios de lactação concedidos pela Câmara Municipal (1873-1910). Coimbra: FL- UC, pp.10-11; REIS; Maria de Fátima Porém (2012) – “Margens sociais. Cidade Solidária”, in Revista da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, nº 27 e 28, p.163 (152-163). 129 SÁ, Isabel dos Guimarães – Casa da Roda do Porto e o seu funcionamento (1710-1780) – [Disponível em: ler letras. up/ uploads/ficheiros/ 1949. pdf]. [Consultado em 21.09.2016].
130 PAULINO, Joana Catarina Vieira (2014) – «Os Expostos em números. Uma análise quantitativa do abandono infantil na Santa Casa da Misericórdia do Porto», in Atas do IX Encontro Nacional de Estudantes de História. Porto: Universidade do Porto, Faculdade de Letras, Biblioteca Digital p.187. eBook. 63
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muitas vezes a estratégias colectivas ao combate de crianças abandonadas131. Paralelamente e para assegurar alguma dignidade à parturiente anónima e diminuir o número de mortes de crianças abandonadas, as Casas da Roda dos Expostos tinham dependências que permitiam realizar o parto discretamente, com a assistência de parteiras, destinadas a “alguma mulher, que para evitar a sua desonra queira ir ter o seu parto à Casa da Roda, que para este fim, podendo ser, deverá ter um quarto separado com cama decente, a ama rodeira a receberá debaixo de todo o segredo e lhe procurará uma mulher bem morigerada ou parteira, que assistia ao parto132. Por isso, o sistema das Rodas foi, na segunda metade do século XIX, combatido e desmoralizado, e pelo decreto de 21 de Novembro de 1867, abolido em Portugal. Na década de 1860 foram suprimidas as casas das Rodas em Aveiro, Leiria, nos concelhos rurais dos alfozes de Lisboa e do Porto, em Penafiel, Ponte de Lima, e Torres Novas; na década seguinte foram extintas as de Lisboa, Porto, Viseu, Bragança, Évora e Beja133. Até lá, no então
concelho e Terra da Maia e no concelho de Aguiar de Sousa à qual pertenciam as freguesias de São Martinho do Campo e de Santo André de Sobrado, muitos meninos enjeitados foram levados e trazidos para serem criados em casa abastadas, embora muitos deles tivessem sido uma presa fácil da morte que espreitava desde o primeiro dia de vida. No lugar do Outeiro, da freguesia sobradense foi deixada abandonada, uma menina, à porta de casa do alfaiate Domingos João da Silva, que por caridade lhe deu o nome de Quitéria, baptizada a 12 de Outubro de 1748, sendo padrinho o cabo-mor António de Paiva Pinto e madrinha Catarina da Silva, mulher do alfaiate134; teve, nesse acto público, como testemunhas os
padres José Martins de Arruda e Manuel Moreira Belo.
131 BRETELL, Caroline; FEIJÓ, Rui (1991) – «A Roda de Viana do Castelo no século XIX: apoio social e estratégias familiares», in Cadernos Vianenses,nº12. Viana do Castelo, p. 218.
132 PINTO, António Joaquim Gouveia (1820) – Compilação das Providências, que a bem da criação e educação dos expostos ou enjeitados se têm publicado e acham espalhados em diferentes artigos de legislação pátria, a que acrescem outras, que respeitando ao bem regímen, e economia da sua administração, e sendo contudo filhas das mesmas leis, tem a experiência provado a sua utilidade. Lisboa: Impressão Régia, p.97.
133 CUBERTO, Tiago Manuel Rodrigues (2011) – ob.cit., p.12. 134 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.125.
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De ventre familiar, socialmente bem colocado, mas igualmente enjeitada, cite-se a menina que em 1756 foi exposta, levando consigo uma carta lavrada pelo punho da dama, sua mãe incógnita, na qual constava chamar-se Francisca Maria, situação típica de mulher honrada, que caiu na armadilha de relações ilícitas e que pertencia a uma família da elite da freguesia ou de outro lugar. Estas crianças etiquetadas eram muitas vezes resgatadas pelas mães verdadeiras135. O padre assistente na paroquial, João Belo referiu no assento que “para evitar escrúpulos [a menina] foi baptizada debaixo de condição com o mesmo nome”136, permitindo, futuramente a sua identificação se a mãe desesperada e caída na alçada do pecado, pretendesse remediar a situação, criando a Francisca Maria como filha natural. Assistiram à cerimónia sacramental os padres Luís dos Santos, Manuel Moreira Pontes e Constantino da Cunha Sottomayor. Em casos de desespero extremo pode enquadrar-se aquele que envolve a menina Teresa, enjeitada, que foi entregue na casa do reitor Simão da Cunha Porto, por uma mulher desconhecida, que aparentava setenta anos de idade, de nome Maria Pinta, da freguesia do Real, do arcebispado de Braga, algures entre Amarante e Arrifana de Sousa, que confessou ter sido abordada por um indivíduo, a cavalo, na freguesia de Torrão e que lhe havia entregado, sob ameaça, uma criança. A menina exposta recebeu o primeiro sacramento a 15 de Outubro de 1727, e foi apadrinhada por Francisco Ferreira, do lugar de Baguim, e por sua filha, criada do reitor Simão da Cunha Porto. Esta menina ficou aos cuidados da mulher de António da Silva, almocreve, do lugar da Rua137. Muitas crianças ficaram, para sempre, rotuladas como filhos de pais incógnitos porque a mãe não revelou a paternidade por receio, ameaça ou simplesmente por não saber o nome do homem com quem se envolveu. Entre outros casos, aponte-se o de Maria, solteira, da aldeia da Ferraria, e filha da viúva Domingas Fernandes que escondeu, ou ignorou o nome do pai de sua filha Catarina, revelando somente que este era natural da cidade do Porto138. Outras, como Maria Moreira, do lugar da Codiceira, ocultaram a paterni-
135 TAVARES, Virgílio; PEDRO, Lúcia (2007) – ob. cit,p.22. 136 ADP. E/27/4/2-6.1, fl.160v. 137 ADP, E/27/4/2 - 6.1, fl.50. 138 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.36v.
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dade de sua filha Teresa, sem deixar indicação sobre a pessoa com quem se relacionava, em 1724139; Maria, natural do lugar de Monforte, da freguesia de S. Salvador de Folgosa, manteve também incógnito o pai de Maria, sua filha que nascera na freguesia de São Vicente de Alfena (1725)140; Luzia, do lugar da Várzea, da mesma freguesia, mãe solteira da menina Vitória, mandou baptizá-la, à pressa, no mesmo dia em que nasceu141, por correr perigo de vida. Na freguesia de São Mamede de Valongo, a viúva Antónia Gonçalves teve um filho, em 1615, mas “não lhe deu pai por ser secreto”142, e no mesmo
ano, Maria da Silva, solteira, natural do Alentejo, ocultou a paternidade de seu filho que nasceu em Valongo, invocando igualmente o secretismo que envolvia o progenitor143.
Apesar da pressão que os envolvimentos extraconjugais despertaram, algumas mães solteiras não se coibiram em revelar a paternidade de seus filhos envolvendo indivíduos profissionalmente bem colocados e, portanto, membros das elites locais e de fora da freguesia, e de outros cujos filhos faziam parte do quotidiano do mundo das actividades artesanais, como, ferreiros, ferradores, soldados (Guarnição do Porto), e sapateiros. Das elites, exmplifique-se o estudante André da Silva, filho de Manuel da Silva, cirurgião do lugar de Baguim, que em Novembro de 1721 foi revelado por Luzia, solteira, por alcunha, a castelhana, do lugar da Rua, ser pai de Maria144; e Manuel Rodrigues, boticário, do lugar da Gandra que teve um filho com Ana, solteira, filha de António de Paiva, o serra, do lugar da Gandra (1724)145, a viver algures em Valongo.
139 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.40v. 140 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.43v. 141 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.53v. 142 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v. 143 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.83v.
144 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.33-34v. 145 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.40.
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1.3.6 – As mães solteiras do território do actual concelho de Valongo e pais do exterior Muitas jovens, ou não, envolviam-se com homens que não pertenciam ao território, não viviam nas freguesias, eram volantes, passageiros, ou profissionais ocasionais, oriundos ou naturais da cidade do Porto, de freguesias que pertenciam ao território da Terra e concelho da Maia, como Águas Santas, Silva Escura; São Pedro da Cova; da cidade de Braga; de Santa Maria de Landim; de algumas freguesias da Comarca da Feira; de Santa Maria do Reguengo e que andaram por aqui e que engravidaram mulheres solteiras. Alguns reconheceram a paternidade que as mães dos recém-nascidos atribuíam, mas a maioria não, e outros provavelmente nunca souberam que haviam sido pais. A pressão estava sempre sobre a mãe, e era ela que denunciava ou confessava a paternidade do filho. Algumas, porém, não sabiam identificar o homem ou homens com quem se envolveram. À freguesia de São Vicente de Alfena vieram ter seus filhos, Maria “mentecapta” que “se achou nesta freguesia em tempo do seu parto”146;
Maria Fernandes, galega147; Maria, natural “que disse ser São Joam de Ver da Comarca da Feira ora estante nesta freguesia”148; Maria Jorge, da cidade do Porto, que ocultou o nome do pai de sua filha Maria “a qoal se baptisou nesta igreja por nacer nela”149; Ana Silva, natural de São Martinho de Bougado que entretanto se domiciliou no lugar da Rua, e que não revelou o nome do homem que lhe dera o filho José, baptizado em 23 de Março de 1689, pelo vigário Pantaleão Pinto de Araújo150; de gente estrangeira, sem rasto nem antecedentes, baptizou o padre Vicente de Araújo, a filha de Paula, solteira, em 15 de Março de 1714151; Maria, solteira “que veio da sua terra para parir na casa do capitão Pinheiro dos Santos”152, não revelando a paternidade da filha Josefa que recebeu o primeiro sacramento em 23 de Dezembro de 1726, pelo reitor Simão da Cunha Porto; Senhorinha, que veio para a freguesia de 146 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.39. 147 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.49.
148 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.76v. 149 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.112. 150 ADP, E/27/4/2-5.2, fl. 66. 151 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.5.
152 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.47. 67
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São Vicente de Alfena e aqui teve seu filho José, mas que não sabia quem tinha sido o pai da criança, mas confessou que o mesmo havia estado antes, algum tempo, no lugar da Gandra153. Na freguesia de São Martinho de Campo, o número de mulheres solteiras que vieram de outros locais para terem os seus filhos é muito inferior. Em todo o caso, cite-se Isabel, filha de Bartolomeu Gonçalves, e de sua mulher Margarida Gonçalves, da freguesia de Sandim154; Domingas,
da freguesia de Redemoinhos que confessou ser o pai de seu filho José, o mancebo Manuel Rodrigues, do mesmo lugar155; Mariana de Melo, da cidade do Porto, que estava em casa de Manuel Bento, de São Martinho de Campo, teve um filho de Manuel Barbosa, solteiro, que foi levado à pia baptismal em 6 de Maio de 1669, pelo padre coadjutor Rodrigo Peres156; de Agrela vieram várias mulheres solteiras que em São Martinho de Campo tiveram filhos: Ana, Maria, Francisca, Catarina, outras homónimas157.
Na freguesia de São Lourenço d’Asmes assinalam-se diversos casos de mulheres solteiras que não pertenciam às famílias locais. Logo em 1586, Jerónimo Freire, cura desta igreja, sacramentou Pedro, filho de uma certa Catarina, solteira, estante na aldeia de São Paio, que não foi capaz de identificar o pai do menino, mas afirmava não pertencer ao bispado do Porto158. Em 1587, a solteira Guiomar “disse que vindo hum dia do Porto hum homem que não conhecia a emprenhara que não sabia donde era”159. Pode admitir-se que terá sido violada por um desconhecido; Maria, moça solteira “veio parir a esta freguesia disse ser moradora na cidade do Porto”160. O padre Gaspar Coelho de Carvalho baptizou a filha Ana, mantendo-se incógnita a respectiva paternidade; em 1633 menciona-se uma Inês “que veio parir a esta freguesia”161, dando por pai Baltasar Godim de Malafaia; sem
153 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.76.
154 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.79v. 155 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.83. 156 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.89.
157 ADP, Dep. G, fls.23v, 24v, 25v, 27v, 30v-31, 32, 35v, 40v e 41v. 158 ADP, E/27/4/4-14.5,fl.2.
159 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.4. 160 ADP, E/27/4/-14.5, fl.49.
161 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.51v. 68
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outra designação, registou o padre Gaspar Coelho de Carvalho, a presença de Antónia, solteira, “que veo de fora a esta freguesia a qual disse vir prenha pera a dita freguesia”162; de Águas Santas chegou Sebastiana, em 1643, para ter a Francisca, sacramentada pelo abade António da Rocha163; de Folgosa, vieram Maria e Antónia164, mas também de Agrela é natural a jovem Antónia que confessou que o pai do seu filho Tomás “hera (…) Francisco que morava junto a Carvalhos”165; Ana Antónia, viúva, do lugar da Ermida, denunciou, em 1699, Diogo da Silva, da cidade do Porto166, como sendo pai de seu filho Diogo; Maria Gonçalves, da freguesia de S. Silvestre, do bispado de Coimbra, deu à luz sua filha Maria, em casa de Manuel António, da Igreja167. De outras mulheres, como Catarina Pelha (?) e de seu acompanhante Manuel António “mendigos que disseram ser da freguesia de Silva Escura”168, nasceu, na freguesia ermesindense a criança de nome Jacinto e que foi sacramentado pelo abade José Lopes Roque da Maia, em 28 de Março de 1732.
Na freguesia de Santo André de Sobrado apareceu, em 1650, Maria, solteira, “mulher pobre que disse que era moradora na cidade do Porto na rua Cham”169, e deu por pai de Ana, sua filha, Francisco João, da mesma cidade.
Na freguesia de São Mamede de Valongo instalaram-se várias moças solteiras para terem seus filhos, e que eram provenientes de lugares muito distantes e fora do aro habitual circunscrito a freguesias do concelho e Terra da Maia, que reflectem a pujança económica desta freguesia e das oportunidades de trabalho que os campos e as actividades dos mesteres podiam oferecer a quem não tinha nada a perder. Pela confissão das parturientes solteiras foram pais de seus filhos homens naturais de Barcelos (freguesia de Santa Maria), Matosinhos, Guimarães, Alentejo, Braga (freguesia da Basto), da Galiza, Águeda, Terra da Feira, Árvore, Milheirós de Poiares e natural162 ADP, E/27/4/4_14.5, fl.52.
163 ADP, E/27/4/4- 14.5, fl.68v.
164 ADP, E/27/4/4- 14.5, fls.72v e 80v. 165 ADP E/27/4/4-14.5, fl.77v.
166 ADP, E/27/4/4 -15.1, fl.10v. 167 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.55.
168 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.106. 169 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.55. 69
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mente de lugares mais próximos como Águas Santas, Fonte Boa, Canelas, Penafiel, Lordelo, Baguim do Monte, das proximidades de Amarante, e cidade do Porto. O número de mães solteiras originárias de todos estes lugares, vilas e cidades, desde 1589 a 1796 foram responsáveis por uma percentagem muito reduzida das crianças nascidas na freguesia. Sem enumerar a casuística refira-se, por exemplo, Maria, solteira “que disse ser da Galiza”170, e que
nesta freguesia identificou o jovem João, de São Martinho do Campo, por pai de Manuel, seu filho, baptizado pelo vigário Manuel Marques Fortuna, em 10 de Junho de 1643171. Sem rosto identificativo, chegou a São Mamede de Valongo para ter o seu filho Manuel “hũa mulher muda a qual veo ter a este lugar prenhe e se não soube donde era e pario hum menino”172. Recebeu o rito de passagem à comunidade cristã a 10 de Outubro de 1661, pelo vigário João Marques, apadrinhado pelo ferreiro João Pêro; da cidade do Porto apareceu Felícia Nunes que deu por pai de sua filha Isabel, o solteiro Domingos, o melo, por alcunha173; da Galiza surgiu Maria, solteira, em 1710, para ter a filha Maria, cuja paternidade foi, pela mãe, atribuída ao clérigo da freguesia de Terras de Basto, do arcebispado de Braga174; Maria da Rocha, da freguesia de Felgueiras, teve a filha Maria, em Valongo da Estrada, 1765, sacramentada pelo padre António Dias. A mãe disse ser pai da criança, António de Sousa, o novo, sapateiro, mas que o vigário não o confirmou por andar refugiado175. Entretanto, foram identificados os avós tanto maternos como paternos.
1.3.7 – Os filhos de relações conjugais adulterinas As mulheres solteiras constituíam o anátema das relações sexuais reprimidas e censuradas que levava à contaminação dos costumes e à ruptura das boas práticas virtuosas e morais. Mas havia outras formas de contaminação, combatidas pelos moralistas presentes nas sociedades tanto urbanas 170 ADP, E/ 27/6/1-2.3, fl.55. 171 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.55. 172 ADP, E/27/6/1-3.1. fl.56. 173 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.41. 174 ADP,E/27/6/1-4.1, fl.4v.
175 ADP,E/27/6/1-4.2, fl.12v. 70
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como rurais –, as que resultavam da prevaricação do mandamento cristão “não adulterarás”. Com efeito, no território valonguense globalmente considerado, o estado de virtude de algumas viúvas e viúvos perdera-se, dando origem a nascimentos não legitimados, porque nestes casos, a remediação pelo casamento era impossível. Na freguesia de São Vicente de Alfena, a viúva Maria Gonçalves baptizou uma filha, em 1601, e atribuiu a paternidade a um certo Gaspar Moreira, mas não revelou o seu estado civil176; Maria Martins, casada com João Nogueira, confessou que Maria, sacramentada em 6 de Junho de 1610, era filha de Francisco Pires, de Baguim; o curioso é que o marido acabou por ter sido padrinho da criança177; Gonçalo Domingues, casado e morador na freguesia de Figueiras teve relações extraconjugais com a viúva Maria Francisca, das quais resultou o nascimento de um filho em 1628178.
Na freguesia de São Martinho de Campo, encontramos alguns sinais adulterinos de ambos os sexos. Em 1633, Gaspar Gil, homem casado, da freguesia de Barrosas, engravidou Madalena, moça solteira179. Em 1658,
André Lopes, homem casado e residente em Valongo, envolveu-se com a rapariga Benta, filha de Bernardo Nogueira. Não assumiu a paternidade que foi descoberta pela jovem180. Entre 1689 e 1751, foram vários casos que mereceram a censura social, familiar e religiosa. Em 1689, João Coelho, casado, do lugar da Aldeia, freguesia de Santo André de Sobrado mantinha relações com Isabel da Rocha, solteira, moradora na Quintã181; na mesma freguesia morava Matias da Cunha, casado, que se relacionou com Domingas, órfã, de Miguel Francisco do Outeiro182; da freguesia de São Mamede de Valongo, era
natural António Pinto, casado, que mantinha relações com Serafina, solteira, do referido lugar do Outeiro, dando origem ao nascimento de Maria183; da cidade do Porto, o galinheiro Jacinto, casado, teve, em 1717, uma filha com
176 ADP,E/27/4/2-5.1, fl.14.
177 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.32. 178 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.51. 179
ADP, Dep. G, fl.45v.
180 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.74.
181 ADP,E/27/4/3-10.1, fl.8v.
182 ADP, E/27/4/3-10.1,fl.14v. 183 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.93.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
a viúva Catarina de Sousa, que vivia na aldeia de Balselhas184; de fora da freguesia de São Martinho de Campo, aponta-se, também, um certo Manuel Pereira, que era pai do espúrio Manuel, filho da viúva Ana Benta185; a órfã de pai, Rosa, solteira, de Luriz caiu na “voz e fama” por estar relacionada com Manuel Gonçalves, o branco, casado, e morador em São Mamede de Valongo186; na mesma freguesia foi baptizado o ilegítimo Manuel, filho da viúva Helena Francisca, de Luriz e de João Gonçalves, casado187; da aldeia da Quintã era natural António Guedes, homem casado que com Mariana, solteira, filha de Teresa, também solteira, teve um filho chamado José, baptizado em 1745188. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, os assentos dos baptizados não registam nenhum acto sacramental de indivíduos nascidos de relações extramatrimoniais, e o mesmo acontecendo na freguesia de Santo André de Sobrado, no período considerado.
Quanto à freguesia de São Mamede de Valongo, já não se pode dizer o mesmo. A sua imensa população e diversidade social deram origem a alguns filhos feridos de ilegitimidade, nomeadamente entre 1651 e 1686. Não se sabe se o capitão Manuel da Fonte era casado quando se envolveu com Ana, solteira, sendo dado como pai de Manuel189; mas João Baltasar que
era casado com Catarina Francisca, teve, em 1661, uma filha adulterina com Domingas, solteira, que morava na Rua do Sapal190. Como se vê, os casos adulterinos arrolados resultam de relações extraconjugais, em que o homem é quase sempre do exterior ao território, indivíduo ligado a artes comerciais que anda por aqui, pois as mães das crianças, solteiras, ou viúvas, confessam as paternidades, mas não pode dizer-se que os pais assumem tal função, nem que estiveram presentes em qualquer dos casos evidenciados.
184 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.105v. 185 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.120v. 186 ADP, E/27/4/3-10.1,fl.180v. 187 ADP, E/ 27/4/3-10.1,fl.197. 188 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.20v. 189 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.44. 190 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.56. 72
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1.3.8 – Os filhos sacrílegos No quadro dos filhos ilegítimos enumera-se outra categoria que resulta, porventura, de relações sexuais mais censuráveis socialmente, que envolviam os eclesiásticos, que haviam feito voto de castidade e celibato191 e que,
portanto, quebraram esta promessa sagrada, cometendo, por isso, sacrilégio. Desta conduta desviante, nasceram várias crianças em Alfena, São Martinho do Campo e em São Mamede de Valongo. Em São Vicente de Alfena, foi pai, o padre Manuel Farinha, em 1600192; e
Frei Manuel Barbosa, de Águas Santas, que teve um filho com Isabel, solteira, de Alfena193, em 1610. Na freguesia de São Martinho do Campo, em 1636, Ana, moça solteira, deu por pai de seu filho Domingos, o abade, desta igreja, André Correia de Mesquita194; em 1659, a moça Domingas indicou, por pai de sua filha Maria, o padre João Moreira, que morava em São Gemil195. No início do século XVIII foi denunciado o padre Manuel Rodrigues, que havia residido na freguesia, e outro sacerdote, com o mesmo nome, que também morava nesta paróquia, o qual teve um filho com Maria Neves, solteira, chamado Martinho, e que foi baptizado pelo abade Domingos de Azevedo e Carvalho, em 1721196.
Na freguesia de São Mamede de Valongo revelam-se os casos do reverendo Pêro João de Vasconcelos (1699)197, e o do padre Manuel da Fonseca
que teve entre 1657 e 1658 dois filhos, de Domingas, solteira198, ficando por resolver a paternidade de Catarina, também filha de Domingas, que nasceu em 1661, mas que o vigário João Marques se recusou a mencionar: “não o declarei pai por ser prohibido aqui assentar-se”199, podendo, ou não, tratar-se, de um terceiro filho de ambos.
191 CARVALHO, Joaquim Ramos (2010) – ob. cit., p.109. 192 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.13v. 193 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.32.
194 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.47v. 195 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.75.
196 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.98v e 120. 197 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.97v.
198 ADP, E/27/6/1-3.1, fls.35 e 39v. 199 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.8v.
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1.3.9 – Outros espúrios A prostituição, não declaradamente explícita, também devia ter sido responsável pelo nascimento de alguns indivíduos fora do quadro familiar estruturado. Na freguesia São Vicente de Alfena, no lugar de Baguim, foi baptizada em 30 de Maio de 1637, a menina Isabel, que era filha de Maria, solteira, “a pega”200; em 11 de Junho de 1727 recebe o mesmo sacramento a bebé
Ana, que nascera nesse mesmo dia, e era filha de Ana Pacheca, solteira, que morava no lugar da Ferraria, e que deu por pai da criança António da Silva, viúvo, o cornija, por alcunha, “embora tenha estado com mais homens”201. A menina foi baptizada, à pressa, “por vir mortal”202. Foi padrinho deste nado-morto, Nicolau, criado do reitor Simão da Cunha Porto, e madrinha Inácia Ferreira, mulher de Domingos Carneiro, soldado pago, que vivia no lugar da Rua. O acontecimento foi presenciado, e por ele deu fé Custódia Duarte, mulher de António da Silva, almocreve do lugar da Rua. Na freguesia de São Martinho do Campo, a paroquiana Domingas Ferreira, que morava em Ponte Ferreira, teve vários filhos de outros tantos homens, documentada entre 1619 e 1627203.
1.3.10 – Os filhos de escravas negras A posse de escravos originários da Costa da Mina, de Angola e do Brasil era uma realidade visível em várias freguesias do território valonguense, a partir do século XVII. Estes escravos reproduziam as suas “crias” entre escravos que viviam na mesma casa, pelo cruzamento de escravos de proprietários diferentes e entre escravos e brancos, de profissões ou de ocupações heterogéneas. Na freguesia de São Vicente de Alfena, em 1608, nasceu Maria, filha da escrava Catarina André “a preta d’Alfena”204, que deu por pai de
sua filha, João, homem solteiro; em 1610, registou-se uma Maria “preta” que teve um filho de António, também solteiro, criado, que morava na cidade 200 ADP, E/27/4/2-5.2, fl.20. 201 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.48. 202 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.48.
203 ADP, E/27/4/3-9.1, fls.35v, 37, 39v e 43. 204 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.29.
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do Porto205; em 1631, Luzia, “escrava do senhor Balthazar Barbosa morador em a cidade do Porto ora estante nesta freguesia de Alfena”206 deu à luz uma menina, de pai incógnito; da escrava pertencente a Vicente Araújo, vigário desta freguesia207; de meados do século XVIII, regista-se uma Maria, filha da escrava de nome Graça propriedade de Manuel Bento e de sua mulher Catarina da Silva, do lugar de Cabeda208; em 1765 nasceu Estêvão, filho da escrava Mariana, que estava na casa de Luzia de Sousa, viúva, do lugar de Transleça; foram padrinho e madrinha João, escravo de Dona Rosa Maria Angélica, viúva, do lugar da Rua, e a escrava Teresa que pertencia a Manuel da Silva Martins, igualmente moradora no lugar da Rua209. Na freguesia de São Martinho do Campo, nasceu Feliciana, filha de Mariana, escrava do reverendo abade João da Fonseca, em 1708210; em 1745
o João, filho natural de Maria, escrava, de Amaro Ferreira, da Corredoura, cuja paternidade foi atribuída, sem contestação, a José, escravo do reverendo João Ferreira da Costa, desta freguesia211; e Maria, escrava do alferes Amaro Ferreira da Costa, teve o filho Francisco, não sendo revelada a sua paternidade212. Nos finais do século XVIII foi baptizada uma filha de Marcelina, escrava, natural da freguesia de Canas de Senhorim, do bispado de Viseu, que, por informações recolhidas pelo padre Manuel Rodrigues, estaria em casa do capitão Luís Ribeiro de Figueiredo213.
Na freguesia de São Mamede de Valongo menciona-se o menino Francisco dado à luz em 1675, e era filho de Maria, escrava de Pantaleão Álvares, rendeiro desta freguesia, mas não foi revelado qualquer indício sobre o pai214; de finais do século XVII, regista-se o nascimento de “hũa escrava que disse ser do senhor Bernardo Ferras da cidade do Porto”215; da mesma altura é o
205 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.32v. 206 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.55v. 207 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.74.
208 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.141.
209 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.196v. 210 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.72v.
211 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.200v. 212 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.214. 213 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.137. 214 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.71. 215 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.36. 75
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filho de Maria, escrava do sargento-mor Manuel de Sousa, e foi pai da criança Manuel Marques de Oliveira, de acordo com a confissão da mãe, anotada no assento a cargo do reitor André Alão Duarte216; foi mãe, no declinar da centúria de Setecentos, a escrava, Catarina, propriedade de Manuel Ramos das Neves e pai de outro escravo, de nome Francisco que pertencia à viúva Maria Dias217; em 1699 foi sacramentado Filipe, filho de Filipa, escrava de João Marques das Neves e pai de um certo Domingos da Silva, que vivia na freguesia de São Salvador de Arouca. Foi madrinha a escrava Maria, da casa do sargento-mor Manuel de Sousa218. No início do século XVIII, uma outra escrava chamada Filipa, da casa da viúva Catarina da Rocha, teve uma filha, e atribuiu a paternidade a João Pinto, solteiro, filho de Manuel Pinto, da Rua219; o capitão Vicente de Sousa era proprietário, em 1705, de uma escrava que teve uma filha com o escravo da viúva Maria Dias. Foi padrinho, Manuel, negro, escravo de Manuel Álvares Ribeiro e madrinha Filipa, por sua vez, escrava da viúva Catarina da Rocha220. Em 1750 há notícia do baptizado de Maria, filha de Rita, escrava do capitão José Pereira, não sendo prestada qualquer informação adicional sobre a paternidade221.
1.3.11 – Os abandonados Em pior condição teriam ficado aqueles que eram simplesmente abandonados, com o rótulo social de enjeitados. Na freguesia de São Vicente de Alfena, em finais do século XVII, aparece uma Catarina, provavelmente a viver no lugar do Xisto222; abandonado apareceu, à porta de Vicente Moreira, do lugar do Outeiro, um menino baptizado em 1748, como nome de Vicente, desconhecendo-se os pais223. Havia outros enjeitados nesta freguesia, como
216 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.75.
217 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.86v. 218 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.96v.
219 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.145.
220 ADP, E/27/6/1-3.2, fl. 181v. 221 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.162. 222 ADP, E/27/4/2-5.2, fl.78.
223 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.125. 76
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por exemplo, o António, familiar do reitor Simão da Cunha Porto224, e o José, encontrado de noite, na berma da estrada, em frente da porta de entrada para a casa de Silvestre Moreira Belo, do lugar do Outeiro, que, por caridade, o colocou na Roda dos Enjeitados da cidade do Porto225. Na freguesia de São Martinho do Campo foi baptizada uma menina a quem foi dado o nome de Domingas, enjeitada, encontrada em Ponte Ferreira, em 1644226. Em 1734, foi resgatada uma menina que se pressupõe
não ser originária da freguesia. O padre Manuel Rodrigues recebeu-a “sob condição”, por não ter a certeza se já havia recebido o sacramento227. Outros enjeitados aparecem na qualidade de padrinhos, como José (1735)228; um outro José que vivia em casa de Manuel Dias, uma Josefa que morava em casa de Manuel de Almeida229; em 1741, é referida a Martinha dos Anjos que foi “posta à porta de Ana João de Ponte Ferreira”230; junto da casa de Manuel André foi deixada, em 1742, a menina Eufémia231, e à porta de António da Silva, moleiro de Balselhas, colocaram, em 1751, o enjeitado Joaquim232. Já casado, João António, ao baptizar o seu filho, em 1748, foi anotado como sendo “enjeitado”233. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes foram encontrados também vários meninos abandonados como o Urbano234, em 1620; António à porta
do mendigo Bernardo Ferreira que vivia no lugar de Sá em 1722, e uma Ana abandonada em 1725235. No ano seguinte, o abade José Lopes Roque da Maia baptizou uma bebé com o nome de Ana, exposta “que trouxe a igreja Josepha Martinha, mulher de António de Sousa do lugar de São Paio e me entregou [ao abade] hum escrito do theor seguinte: dando lhe por nome Anna de
224 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.73.
225 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.82v. 226 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.58.
227 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.157.
228 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.160v.
229 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.187 e 187v. 230 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.187 e 187v. 231 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.190.
232 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.216-216v. 233 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.212. 234 ADP, E/27/4/4-14.5,fl.36.
235 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.80v e 88. 77
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Sousa dedicado (sic) à filha de Annacleto de Sousa delicado e de Anna Maria moradores na cidade do Porto e não se continha mais no dito escrito”236. No assento dos óbitos dos que morreram nesta freguesia, constam o nome e a idade de várias crianças rejeitadas e que acabavam por falecer, pouco tempo após o seu nascimento. Em 1743, a menina Paula, com a idade de seis para sete anos, faleceu, em casa de Maria Moutinha do lugar de Vilar237; em Sá, na casa de Mariana de Trezenhe (?), morreu, com dezanove
meses de idade, a inocente Maria238; com dois anos e nove meses sucumbiu o enjeitado José Maria, em 1750, que fora criado em casa de António Manuel “Tarollo”, e de sua mulher Maria Pereira239; no lugar de Ermesinde foi, criado, até à idade de quinze meses, por Rosa Antónia, mulher de João Fernandes dos Santos, o menino Manuel, sepultado no mesmo dia em que morreu, pelo padre coadjutor Alexandre Gomes da Silva240. Os que não tinham a sorte de serem recolhidos, amamentados por amas-de-leite, e criados na sua infância, caíam na mendicidade degradante, morrendo sem qualquer tipo de amparo ou companhia, como aconteceu por exemplo, com Silvestre, enjeitado, mendicante do lugar de Vilar, a quem “se lhe fes o que se costuma fazer aos pobres”241. No último quartel do século XVIII continuaram a morrer crianças enjeitadas de tenra idade, como Manuel, de dois meses e meio que estava a ser criado, no lugar de Ermesinde, em casa de Maria Ferreira, mulher de António Ferreira. Faleceu a 30 de Agosto de 1790 e foi depois enterrado nas sepulturas “dos párvulos”242, no dia seguinte pelo padre coadjutor Custódio
de São José da Costa Ferreira; no lugar de Sá esteve sobre os cuidados de Quitéria de Sousa, o enjeitado António, mas não teve mais do que oito dias de vida, e outro António, recolhido por Maria, mulher de António Silva; teria três ou quatro dias de vida243; em Vilar de Matos foi acolhida durante as três 236 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.92v.
237 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.180v
238 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.196v. 239 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.197v. 240 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.221.
241 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.236v. 242 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.164.
243 ADP, E/27/4/4-15.2, fls.170 e 172. 78
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semanas de vida, a menina Rosa, amparada por Ana Lourença, mulher de Manuel Luís dos Santos244, e uma Quitéria que viveu até aos nove anos, e que foi criada em casa de Manuel, foi sepultada no dia seguinte, no adro paroquial, pelo abade João de Figueiredo Fragoso Abreu245; próximo, em São Paio, havia sido tratada outra menina, “enjeitada da ama Quitéria de Sousa”246, que sucumbiu com sete anos de idade. Do lugar de Ermesinde, na década de 1790, faleceram três crianças expostas: Agostinho, que gozava da caridade de Rosa de Jesus; Bento, recolhido por Maria das Neves, mulher de José Ferreira e a abandonada Violante, que havia nascido na freguesia de São Pedro Fins e que foi criada por Maria da Silva e seu marido Manuel Martins247. No século XIX, porém, há, com efeito, nesta freguesia, alguns casos de crianças abandonadas e piedosamente recolhidas, alimentadas e baptizadas. Em 1807, foi padrinho de um menino exposto, o jovem António248; no ano
seguinte há notícia da bondade de Manuel Ferreira das Neves e de sua mulher Maria Ferreira que acolheram em sua casa a exposta Rosa Joaquina249; em 1809 aparece um certo António Ferreira abandonado no lugar de Sá250; neste mesmo lugar, em casa de João da Silva e de sua mulher Custodia Antónia, foi deixado, à sua porta, um menino que de imediato foi baptizado com o nome de José, pelo abade João de Figueiredo251; em 1813, pela calada da noite foi deixada uma menina exposta à porta de Manuel Ferreira Pardejo e que foi sacramentada com o nome de Rosa252; na casa de José Moreira Pacheco foi prostrada a menina Ana de Sousa, em 1821253; alguns anos mais tarde, filho de pais incógnitos e anónimos foi recolhido o menino Felisberto, à porta da família de José Manuel de Almeida254. 244 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.173. 245 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.211.
246 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.217.
247 ADP, E/27/4/4-15.2, fls.178v, 179 e 195. 248 ADP, E/27/4/4-15.2 fl.95v.
249 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.99v.
250 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.150. 251 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.166.
252 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.168v.
253 ADP, E/27/4/4-16.2, fls.16 e 17v. 254 ADP, E/27/4/4-16.2, fl.68.
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Noutras freguesias, como na de São Mamede de Valongo regista-se, ainda, em 1795, a enjeitada de nome Cândida, criada em casa de João Marques255; na de Santo André de Sobrado a enjeitada Maria que aparece como madrinha da filha de Antónia Gonçalves, viúva que guardou segredo sobre a paternidade da filha Maria, baptizada em Janeiro de 1615256. A maioria das crianças enjeitadas que encontramos nesta freguesia, vieram da Roda da cidade do Porto, e foram criadas em famílias de Sobrado. Os primeiros exemplos que arrolamos datam de 1736257 e dizem respeito a uma menina que foi trazida, da Roda, por João Fernandes Pinguela, do lugar do Paço, e outra que tendo a mesma origem, sucumbiu com dois anos de idade, em casa de João Mateus, de Vilar; sem paradeiro certo, deambulava no lugar da Costa, e que faleceu em 1737 “hum engeitado que andava pelas cazas e faleceu na de Manuel Fernandes”258. Com dois anos de idade deixou este mundo Andrade Gregório, enjeitado que veio da Roda, em casa de João Ferreira, do lugar de Sobrado, em 1764259. Quanto ao António, que falecera em 1776, sabe-se que vivia na mesma aldeia. Não fez testamento “nem tinha de quê”260, sendo o seu corpo envolto num lençol de linho e o ofício religioso realizado pelo padre José António Ferreira da Silva. No século XIX, ainda se refere o falecimento de uma criança exposta, do sexo masculino, que fora enterrada na igreja paroquial pelo padre Nicolau de Tovar Proença261, e em 1833, o mesmo pároco anotou no assento dos óbitos da freguesia, a morte de uma menina exposta, recolhida em casa de José de Sousa Pinto262.
Na freguesia de São Mamede de Valongo, o envolvimento de indivíduos nas festas de baptizado, nas bodas de casamento e nas festas da invocação do padroeiro e dos santos maiores, geraria convivências discretas aos olhares de pais e mães, de tias e irmãs solteiras, mas que conduziam, inevitavel255 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.325v. 256 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v.
257 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.35-35v. 258 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.37v. 259 ADP, E/27/4/6-4.1, fl.224v. 260 ADP, E/27/4/6-2.2, fl.822. 261 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.11v.
262 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.38v. 80
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mente, pelo desconhecimento do uso de métodos e práticas contraceptivas, ao nascimento de filhos indesejados. Quando a gravidez era completamente ocultada, o recém-nascido era abandonado na berma da estrada, à porta da igreja paroquial ou à porta de casas de famílias abastadas e com meios para criar o exposto. A todos eles era-lhes dado o sacramento do baptismo e um nome. Nesta freguesia são inúmeros os filhos enjeitados, com particular incidência no século XVIII. Nem todos os que eram encontrados ficavam ao cuidado de famílias valonguenses. O seu destino podia ser outro. João, enjeitado de Valongo foi levado para a Maia “para lá o darem e criar”263. Todavia,
em 1681, “foi achado no Padrão do Escoural e trazia hum escrito que chamava Bento”264, nome que lhe foi confirmado no baptismo realizado pelo vigário João Marques. Outros, como “Birgita”, Carla, Josefa, entre 1713 e 1715 fazem parte do grupo dos abandonados e que por caridade foram baptizadas nesta paróquia265. Já antes, havia sido colocada, pela manhã, a enjeitada Mariana, à porta de Pedro da Portela266. Dentro da igreja, no púlpito da capela de Nossa Senhora das Neves, foi abandonado o pequeno João, entretanto baptizado, em 18 de Outubro de 1716; é muito provável que a mãe tenha procurado a igreja para dar à luz, deixando o filho aos cuidados do clérigo Manuel Dias de Sousa267. Alguns eram resgatados da Roda dos Expostos do Porto para serem criados em Valongo onde terminavam os seus dias. Na igreja ou nas suas capelas, eram abandonadas muitas crianças, embrulhadas. Eis um exemplo: “em hum manto azul velho e huma camisa de panno velho e huma (…) velha de houtra branca com os véus bilos (?) e posta em hum cesto que tinha palha painça”268, foi deixada a Ana, entretanto baptizada pelo padre Manuel de
Sousa Dias. A menina foi encontrada na galilé de Nossa Senhora dos Chãos, uma capela desta freguesia, em 1744. No final deste ano, apareceu, na mesma capela, outra menina, aos 23 de Dezembro “aonde o ouvidor Plácido da
263 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v.
264 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.106.
265 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.37, 60v. 266 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.4, 5v. 267 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.79. 268 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.29. 81
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Costa a fez procurar dentro até por aviso que teve e veio a esta igreja de Sam Mamede de Vallongo requerer que a baptizasse”269, o que de facto aconteceu pela mão do padre Joaquim de Sousa Dias. Algumas crianças nascidas de relações proibidas, na cidade do Porto, eram deixadas em Valongo, incógnitas, e abandonadas. Em 1747 foi levada uma menina à paroquial para ser sacramentada, mas que havia nascido na freguesia de S. João da Foz, no Porto. Esta criança foi encontrada por António Álvares Penido e sua mulher Catarina Álvares270. Da Roda da cidade do Porto veio Josefa Maria, enjeitada, inscrita no livro dos enjeitados nº 28 e folhas 191, como “consta de hum bilhete que me veyo da Santa Caza e veyo para caza de António de Souza e sua mulher Maria Gonçalves deste lugar de Valongo”271, de acordo com o testemunho do padre Joaquim de Sousa Dias.
Na segunda metade do século XVIII, fazem-se inúmeras referências a filhos, mães e pais, avôs e avós enjeitados, pois o ostracismo e o abandono, na Roda dos Expostos do Porto eram marcos sociais, como o eram os gafos, os mouros, os judeus e os escravos, estigmas que acompanhavam a pessoa em vida e passavam sucessivamente às suas gerações. Entre 1752 e 1796, o número de indivíduos sem filiação atinge cerca de trinta e três, sendo dez homens e vinte e três mulheres, que aqui casaram e estruturaram as suas famílias. Muitos dos enjeitados foram expostos na Roda da cidade do Porto, e depois recolhidos por famílias valonguenses e outras que vieram servir para esta freguesia, gerando muitos filhos. São exemplo Manuel da Fonseca (oito), Manuel José (nove), António José (cinco), Joaquim José do Rigor (cinco), José Santos (quatro). Algumas enjeitadas, no estado de casadas, tiveram proles mais elevadas, como por exemplo Ana Marques (oito), Joana de Jesus (quinze), Joana da Silva (sete), Custódia (nove), entre outras que foram identificadas, mas que tiveram um número menor de filhos. Para o período considerado o número de enjeitados do grupo feminino representa dois terços deste segmento populacional. 269 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.32. 270 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.95.
271 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.116. 82
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Gráfico n.º 13 – Os expostos no actual território do concelho de Valongo (2.ª metade do século XVIII)
Fonte: ADP, E/27/6/2-5.1; E/27/6/2-6.1; E/27/6/1-4.2
1.4 – Os ritmos de mortalidade 1.4.1 – A sazonalidade e ocorrência dos óbitos O comportamento demográfico de qualquer território considerado assenta basicamente em três grandes pressupostos estruturais: a natalidade, a nupcialidade e a mortalidade. Este último encerra o ciclo de vida de um indivíduo, mas para a maioria dos casos tem consequências sociais e familiares. Nas zonas cunhadas na mais profunda ruralidade, como é o caso da maioria do espaço geográfico em estudo, a morte masculina podia contribuir para o aumento da pobreza, da desagregação do casal enquanto unidade de produção. Por outro lado, era a oportunidade para a sua renovação pelo encabeçamento de um filho que aguardava a sucessão. O concílio tridentino veio obrigar ao registo, em livro, dos óbitos, em todas as paróquias da cristandade, prática que paulatinamente vai integrar a responsabilidade de reitores e curas, que deveriam anotar com toda a parcimónia, o nome do defunto, a sua filiação, se fez testamento ou morreu abintestado (sem testamento), o número de sufrágios pela alma, os bens deixados à Igreja e aos pobres, o tipo de comportamento fúnebre, o traje para a mortalha, constituindo, pois, uma base sólida para o estudo e reconstituição familiar e social, a partir da década de 1580. Precedentemente, e no território do actual concelho de Valongo, desconhece-se qualquer tipo de registo ou assento de óbitos, ou testamentos individuais e avulsos que 83
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possam indiciar qualquer tipo de cadência tanto dos que faleceram de morte natural como de morte excepcional272, provocada pelas insuficientes condições socioeconómicas, pelas frequentes epidemias ou febres que entravam nas casas, dizimando as famílias indefesas, sendo as mais comuns como a pneumonia, a tuberculose, a escarlatina, o sarampo, a difteria, a pulmonar ou bubónica, e a tifóide, para as quais estava ausente uma base científica no âmbito do conhecimento patológico, terapêutico e profiláctico, e que eram originadas pela falta de higiene, subalimentação, miséria, pobreza latente, insuficientes condições de habitação, protecção ao frio, ao vento, à chuva, agasalho permeável, distância ou inexistência de boticários ou médicos num território de população dispersa e relativamente isolada, tão evidenciados nos estudos sobre população. No território do actual concelho de Valongo, as causas que originaram a morte precoce de centenas de indivíduos, de ambos os sexos, não foram registadas, salvo para uma ínfima parte dos defuntos, para a qual foi apontada como mortis causa doenças do foro neurológico “por estar doido”, uma expressão recorrente, anotada pelos confessores quando chamados pelos familiares do moribundo que hoje certamente seria rotulada de forma diferente. A mortalidade nesta geografia tem ritmos e ciclos próprios, remetendo o observador para um registo heterogéneo, sem um denominador comum, seguindo, assim, cada freguesia o seu próprio percurso. Na freguesia de São Vicente da Queimadela (Alfena) (gráfico n.º 14) parece não haver uma sazonalidade demasiadamente marcada, sendo, no entanto, visível que nos meses de Setembro, Novembro, Dezembro e Janeiro a mortalidade natural é mais acentuada, atingindo o seu maior pico no penúltimo mês do ano. A menor taxa de óbitos observa-se no mês de Junho, seguido dos meses de Abril e de Maio (quadro n.º 14).
272 GODINHO, Anabel Silva de Deus – Lisboa através dos registos paroquiais da Sé: população e sociedade (séc.XVI-XVIII). [Disponível em: www.ghp.ics.uminho.pt/eu/.../Final_ Anabela%20 Godinho_CHGMR.Pdf]. [Consultado em: 8/12/2016, p.17]. 84
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Gráfico n.º 14 – Mortalidade média na freguesia de São Vicente de Alfena (1595-1802)
Fonte: ADP, E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1; E/27/4/2-6.2.
Na freguesia de São Martinho do Campo, o registo de óbitos dá-nos uma panorâmica semelhante àquela que verificamos na freguesia de São Vicente de Alfena, sendo Novembro o mês mais dramático, entre 1588 e 1828, seguido dos meses de Dezembro, Janeiro e Fevereiro, baixando significativamente no mês de Março. Os meses de Junho e de Julho correspondem a um período mais brando, que em termos absolutos significa uma redução em cerca de 50% em relação aos meses de Inverno. O mês de Setembro continua a ser um tempo de charneira entre os meses de mortalidade mais aguda e os de menor relevância. Gráfico n.º 15 – Mortalidade média na freguesia de S. Martinho do Campo (1588-1828)
Fonte: ADP, E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1; E/27/4/2-8.6.
Quanto à freguesia de São Lourenço d’Asmes, o ritmo da mortalidade natural é diferente. A sazonalidade dos óbitos registados ente 1586 e 1835 85
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
assume aspectos diferenciados e próprios. O mês de Setembro é, sem dúvida, o período em que morrem mais ermesindenses, isto é, na transição do Verão para o Outono, seguindo-se o mês de Outubro. Ainda com o mesmo nível encontra-se o mês de Janeiro. O período de menor intensidade corresponde aos meses de Fevereiro e de Julho não sendo plausível descortinar qualquer fenómeno excepcional que porventura tenha ocorrido que permita explicar esta evolução. Gráfico n.º 16 – Mortalidade média na freguesia de São Lourenço d’Asmes (1586-1835)
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/5-18.10; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-15.2.
Na freguesia de Santo André de Sobrado, o mês de Setembro representa quase o dobro dos óbitos verificados no mês de Junho, mantendo-se igualmente elevada a mortalidade no período correspondente aos meses de Janeiro, Fevereiro, Novembro e Dezembro (gráfico n.º 17). Gráfico n.º 17 – Mortalidade média na freguesia de Santo André de Sobrado (1602-1835)
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/4/5-20.1; E/27/4/5-20.2; E/27/4/6-21.1; E/27/4/6-22; E/27/6/1-1.1; E/27/4/6-22.
86
Joel Silva Ferreira Mata
Quanto à freguesia de São Mamede de Valongo, um território com características próprias, muito mais populoso, é durante o mês de Janeiro que se regista o maior número de funerais (11.2%), seguido do mês de Dezembro (10%) e de Setembro com cerca de 9.8% dos óbitos ocorridos entre 1590-1825. O período menos viral corresponde aos meses de Maio e de Junho. Gráfico n.º 18 – Mortalidade média na freguesia de São Mamede de Valongo (1590-1825)
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
O ritmo sazonal da mortalidade no território do actual concelho de Valongo pode dividir-se em três grandes períodos cronológicos. O primeiro corresponde ao mês de Abril (8.2%); o segundo abarca os meses de Março, Maio, Junho e Julho (28.8%), e o terceiro, onde a mortalidade é mais elevada, estende-se pelos meses de Janeiro, Fevereiro, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro (63%), com algumas oscilações mas em níveis considerados elevados. Na verdade, a sazonalidade da mortalidade no conjunto das cinco freguesias do actual território do concelho de Valongo demonstra ao longo de vários séculos tendências e divergências. Não há dúvida de que nos meses de Inverno os falecimentos são elevados em todos os lugares, devido às chamadas doenças da estação. Não obstante, a transição do Inverno para a Primavera regista nas freguesias de São Mamede de Valongo e na de São Vicente de Alfena um primeiro pico de óbitos, fenómeno que não acontece com as restantes freguesias. O mês de Junho compreende, sem dúvida, um período mais benigno que expressa uma nítida retracção em relação aos meses anteriores e 87
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
seguintes, sendo, porém, a freguesia de São Vicente de Alfena aquela na qual se verifica a maior fractura que já se preludiava desde o mês de Abril. Por sua vez, o mês de Setembro – um tempo de mudança de um Verão em geral muito quente, seco e árido, para um Outono com a chegada das primeiras chuvas que em certos anos anunciavam um longo período de intempéries que juntamente com as más condições de agasalho, de habitação e alimentação –, culminava com um maior índice de mortalidade em todas as freguesias, sendo mais acentuada nas freguesias de São Vicente de Alfena, de São Mamede de Valongo e em Santo André de Sobrado. O mês de Novembro tem também percursos diferentes. Em Valongo, a mortalidade diminui de forma significativa em relação ao mês de Setembro, mas em São Vicente de Alfena e em São Martinho do Campo a mortalidade é elevada, enquanto que em São Lourenço d’Asmes, é evidente uma descida que se prolonga até ao mês de Fevereiro. Gráfico n.º 19 – Mortalidade no território do actual concelho de Valongo (1586-1835)
Fonte:ADP, E/27/4/2-5.1; E/27/4/2-5.2; E/27/4/2-6.1; E/27/4/2-6.2; E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1; E/27/4/2-8.6; E/27/4/4-14.5; E/27/4/5-18.10; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-15.2; E/27/6/1-2.3; E/27/4/5-20.1; E/27/4/5-20.2; E/27/4/621.1; E/27/4/6-22; E/27/6/1-1.1; E/27/4/6-22; E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
88
Joel Silva Ferreira Mata
1.4.2 – A mortalidade infantil e juvenil Nos territórios de dimensão rural, as causas que conduziam à mortalidade infantil e juvenil, prendiam-se, em larga medida, com a exposição das crianças a perigos constantes, enquanto acompanhavam os pais nos trabalhos agrícolas. A fruta verde, as águas inquinadas e infestadas de mosquitos provocavam vómitos, convulsões graves, disenteria e gastroenterites, ou ainda perturbações digestivas, diarreia e as toxicoses, às quais se associam as doenças propriamente ditas como a varíola, ou bexigas, a difteria e as doenças do foro pulmonar273. No seu conjunto, estes factores causavam,
empiricamente, a morte de cerca de metade dos nascidos entre os primeiros dias de vida e os dez anos274, em termos gerais e europeus, realidade que felizmente não acontece no actual território Valonguense, desde que há registos de óbitos, tendo sempre presente as dificuldades de análise quantitativa que expusemos. Para os padrões medievais e modernos, a idade da criança não era fácil de definir, não havendo, assim, uma padronização que uniformize o conceito. Philippe Ariès distribui as etapas da vida em sete patamares: a infância para os primeiros sete anos de vida; a puerícia até aos catorze; a adolescência que podia atingir os trinta e cinco anos ou, ficar pelos vinte e oito; a juventude que se prolongava até aos quarenta cinco ou cinquenta anos; a senectude, etapa entre a juventude e a velhice; a velhice até aos setenta anos, e a idade dos seniores275, para os mais resistentes. Raphaell Bluteau aceita a infância até aos sete anos de idade, mas a puerícia podia iniciar-se aos três ou quatro anos e prosseguir até aos nove ou dez anos, seguindo-se a adolescência entre os quinze e os vinte cinco a trinta anos276.
Em termos metodológicos iremos ter como ponto de referência as mortes ocorridas até aos doze anos de idade – uma idade simbólica, a partir da qual, 273 LEBRUN, François (s/d) – A Vida conjugal no Antigo Regime. Lisboa: Edição Rolim, pp.123-134.
274 LEBRUN, François (s/d) – ob.cit, p.132.
275 ARIÈS, Philippe (1981) – História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar Editores, p.36.
276 BLUTEAU, Raphael (1712-1721) – Vocabulário Português e Latino. Lisboa: Colégio das Artes Gráficas da Companhia de Jesus, oficina de Pascoal da Silva, ref. por SÁ, Isabel dos Guimarães (2011) – «As crianças e as idades da vida», in História da Vida Privada, dir. José Mattoso. A Idade Moderna, coord. Nuno Gonçalo Monteiro, p.75. 89
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
por exemplo, as meninas já podiam ser madrinhas, disponibilidade que só acontecia com os rapazes aos 14 anos277, aliás como casar – conforme ficou estipulado nas Constituições Sinodais de 1541, que determinam que em cada paróquia houvesse um livro destinado ao registo dos baptizados, crismados e defuntos, e róis de confessados278. Nas constituições sinodais do bispado do Porto, ordenadas por frei Marcos de Lisboa, de 1585 foi também considerado o assento dos casados279. Os assentos elaborados pelos respectivos párocos, não seguem uma metodologia homogénea e uniforme, e as recomendações feitas periodicamente pelos visitadores pastorais que, de vez em quando, censuram o pouco cuidado dos amanuenses quanto ao registo dos elementos essenciais para identificação do falecido, tanto mais que, a este acto, estavam associados os bens da alma que exigiam uma atenção muito cuidadosa, pela sua actualização e a realização das missas deixadas por alma dos defuntos. Esta realidade impede que seja feita, com segurança, a identificação de todos os que morreram na infância, neste território. Por outro lado, a designação dos que partiram no estado civil de “solteiro” ou com a menção de “menor”, referida, muitas vezes, a latere, são expressões evasivas, que no segundo aspecto pode incluir a mortalidade que ocorria em indivíduos até aos vinte e cinco anos de idade. O registo de “solteiro” ou de “solteira” é também complexo podendo abranger pessoas desde a sua juventude à idade sénior e portanto o celibato. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, em determinados períodos cronológicos, o abade anotou a “idade dos inocentes” e dos “juvenis” que faleceram, sem, contudo, introduzir, em qualquer registo, a causa que provocou a morte, ou a doença como acontece nos adultos. O levantamento dos casos integrados na mortalidade infantil foi registado desde 1586 a 1835, com um pequeno lapso de tempo ocorrido entre 1672 e 1743.
277 SÁ, Isabel dos Guimarães (2011) – ob. cit., p.74.
278 Constituições Sinodais do bispo do Porto Ordenadas pelo muito Reverendo y Magnifico S.or Dom Baltasar Limpo, bispo do dicto bispado. Porto: Impressão Vasco Dias Tanquo de Freixenel,(1541).
279 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frei Marcos de Lisboa. Coimbra: António Mariz, Impressor da Universidade de Coimbra (1585), Título 10, Constituição Quarta, p.40. 90
Joel Silva Ferreira Mata
O percurso cronológico mostra algumas particularidades. Entre 17431780, as meninas (59,3%) morriam mais do que os meninos (40,7%); no período 1779 a 1792, inverte-se a tendência, morrendo mais meninos (64,4%) do que meninas (35,6%); entre 1792 e 1835, faleceu praticamente o mesmo número de infantis de ambos os sexos, embora fossem registados mais dois meninos (50,4%) do que meninas (49,6%). A instabilidade política e económica, a pilhagem das tropas francesas e a guerra civil entre miguelistas e liberais são factores que podem ter a sua quota-parte na morte de cerca de quatrocentas e trinta e cinco crianças, nesta freguesia até aos doze anos de idade.
Registo de um óbito neonatal, da freguesia de São Lourenço d’Asmes, em 1780. Fonte: ADP, E/27/4/4-14.6, fl.133.
No período neonatal, correspondente aos primeiros trinta dias, morreram muito mais meninos (62,7%) do que meninas (37,3%), tendência que se manteve até ao primeiro ano de idade (mortalidade infantil), apesar das meninas (41,4%) estarem mais próximas dos inocentes masculinos (58,6%). Com um ano de idade já atingido, mas antes do segundo ano de vida, morreram mais crianças do sexo masculino (52,2%). Uma parte significativa dos óbitos infantis não revela o lugar da freguesia de naturalidade dos pais. No entanto, para os outros – que são a maioria – pode distribuir-se a mortalidade por diferentes lugares (quadro nº 4), destacando-se os lugares de Ermesinde, da aldeia de Sá e o da Cancela, sendo insignificante o das Rapadas, um sítio de “gente de pé rapado”, pobre e marginalizada”280.
280 SOARES, Jacinto (2016) – Ermesinde. O património e a nossa gente. Mosaicos e historiais. Subsídios para a sua monografia II. Ermesinde: Junta da Freguesia de Ermesinde, p.229. 91
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 4 – Mortalidade infantil na freguesia de São Lourenço d’Asmes281 Meninos
Lugares
Meninas
n.º de óbitos
Percentagem (%)
n.º de óbitos
Percentagem (%)
Total
Cancela
39
57.4
29
42.6
68
Ermesinde
53
58.2
38
41.8
91
Ermida
21
45.6
25
54.4
46
Igreja
7
53.8
6
46.2
13
São Paio
17
47.2
19
52.8
36
Sá
53
66.2
27
33.8
80
Rapadas
1
50
1
50
2
Vilar
27
73
10
27
37
Vilar de Matos
33
75
11
25
44
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/4-16.1
Muitos morriam à nascença; outros, viviam algumas horas, ou poucos dias, não dando tempo para chamar o cura da alma para baptizar o infeliz, função que, nestas circunstâncias, era normalmente desempenhada por familiares, vizinhos, padrinhos, testemunhas, ou pela parteira – uma menção muito rara –, como por exemplo, aconteceu com o menino Jerónimo, filho de Tomé de Sousa e de sua mulher Isabel Gonçalves, de Valongo, baptizado quatro dias depois de ter nascido, em 6 de Fevereiro de 1716, por necessidade, sendo levado posteriormente à “igreja para receber as demais cerimónias”282, a cargo do pároco Manuel de Sousa Dias. O nascimento de gémeos não era novidade, mas o de tri-gémeos foi indiscutivelmente um acontecimento singular, embora nenhum dos nascituros tivesse vivido mais do que algumas horas. Com efeito, no dia 8 de Agosto de 1616 foi registado o nascimento, o baptismo e o óbito dos três irmãos Sebastião, Maria e Isabel, que “pario Maria Antónia molher de António Gonçalvez de Sá a três crianças, convém a saber, duas meninas e um menino as quais todas três averão a agoa do baptismo (…) mas logo falecerão todas três por ella parir de ocasião (?) de hũa queda que deo”283. 281 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 282 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.71v.
283 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.31. 92
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 20 – Mortalidade infantil na freguesia de São Lourenço d’Asmes
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/4-16.1
A mortalidade neonatal ou exógena teria sido motivada, em todo o período em análise, por um conjunto de factores que em maior ou menor grau atingiram um elevado número de nascituros, apontando-se genericamente a inexistência de cuidados pré e pós-natais, a falta de assistência médica, as parcas ou nulas condições de higiene durante os partos – que colocavam em perigo tanto os bebés como as mães –, e a alimentação dos lactentes e da primeira infância que era manifestamente insuficiente e inadequada; a insalubridade de certos lugares e a falta de condições mais abrangentes do ambiente familiar terão certamente contribuído para todo o tipo de focos de infecções que ceifaram a vida a mais de quatrocentas crianças em idade juvenil e revela que a convivência com a morte dos filhos de tenra idade era mais uma manifestação social do que propriamente um assunto exclusivamente familiar. Nos nove lugares habitados que identificamos (Rapadas é mais tardio), a mortalidade juvenil teve uma incidência assimétrica, não sendo fácil detectar a origem deste fenómeno “natural”. A mortalidade juvenil masculina concentra-se essencialmente em dois lugares confinantes: Ermesinde e Sá, que em conjunto significa cerca de 42.2%. A mortalidade juvenil feminina estava mais presente em três lugares: Cancela, Ermesinde e na aldeia de Sá, perfazendo cerca de 56.6%. São lugares com populações e ritmos demográficos diferentes, mas, por exemplo, na aldeia de Sá morre quase o dobro dos meninos em relação às meninas nascidas no seio das mesmas famílias o que não deixa de ser preocupante.
93
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Na freguesia de São Martinho do Campo, a mortalidade que foi apurada compreende dois períodos: O primeiro de 1588 a 1685 e o segundo de 1806 a 1828. Em cerca de cento e vinte e um anos de análise, descontinuada, a ideia que se tem deste território é a de que o fenómeno da mortalidade infantil não é representativa, sendo contudo mais elevada nos meninos (60%) do que nas meninas (40%), em clara oposição com o celibato que parece ser elevado, como na freguesia de São Lourenço d’Asmes, e que atinge mais as mulheres (62,5%) do que nos homens (37,5%). Quadro n. º 5 – Mortalidade Infantil na freguesia de São Martinho do Campo284 Lugares
Meninos
Meninas
Balselhas
1
1
Luriz
2
–
Outeiro
–
1
Ponte Ferreira
2
1
Quintã
4
2
Retorta
–
1
9
6
Total
Fonte: ADP, E/27/4/2-8.6; E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1.
A realidade da mortalidade infantil na freguesia de Santo André de Sobrado é bastante diferente, aproximando-se daquela, que encontramos em São Lourenço d’Asmes. Percorrendo o eixo cronológico diacrónico podemos retirar algumas ilações. Em primeiro lugar, a mortalidade infantil entre 17711820 atinge mais as meninas (73,4%) do que os meninos (26,6%); no período decorrido entre 1820 e 1835, a situação é inversa, morrendo, prematuramente cerca de 67,5% das crianças do sexo masculino contra 32,5% do sexo oposto.
284 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 94
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 6 – Mortalidade Infantil na freguesia de Santo André de Sobrado285 Lugares
Meninos
Percentagem (%)
Meninas
Percentagem (%)
Total
Percentagem (%)
Campelo
4
44.4
5
55.6
9
4.3
Costa
3
42.9
4
57.1
7
3.5
Devesa
7
46.7
8
53.3
15
7.2
Ferreira
13
46.4
15
53.6
28
13.5
Lomba
–
–
1
100
1
0.5
Paço
15
46.9
17
53.1
32
15.5
Sobrado
32
57
24
43
56
27
Vilar
31
55.4
25
44.6
56
27
Pinguela
2
66.6
1
33.3
3
1.5
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-1.1; E/27/4/5-20.1; E/27/4/6-22; E/27/4/621.1.
Os lugares e aldeias da freguesia foram atingidos de forma diferente, cujos valores, salvo alguma catástrofe localizada, o que não foi referido, estariam de acordo com os respectivos índices de ocupação e despovoamento. Entre eles distinguem-se, pelo elevado número de registos, o lugar de Sobrado (27%), o de Vilar (27%), o de Paço (15,5%) e o de Ferreira (13,5%), que no conjunto dos nove lugares e aldeias somam cerca de (83%) dos casos de mortalidade até aos doze anos de idade. Na freguesia de São Mamede de Valongo os registos de óbitos entre 1743 e 1835, numa extensão cronológica de quase um século, a mortalidade que atingiu as crianças é complexa e significativa até aos dez anos de idade (quadro n.º 7).
285 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 95
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 7 – A mortalidade infantil na freguesia de S. Mamede de Valongo 1743-1778
Período
1779-1791
1792-1835
meninos
meninas
meninos
meninas
meninos
meninas
0-30 dias
11
12
15
8
21
8
1 a 2 meses
2
3
2
–
3
2
3 a 4 meses
1
4
3
2
4
3
5 a 6 meses
4
1
1
–
3
1
7 a 12 meses
3
8
7
3
5
5
1 ano
8
16
9
6
18
9
2 anos
7
11
7
2
6
5
3 anos
5
2
5
1
8
–
4 anos
3
4
1
1
3
7
5 anos
1
5
4
2
2
2
6 anos
2
2
1
2
1
2
7 anos
1
–
–
2
35
32
8 anos
–
1
1
1
–
2
9 anos
–
1
1
2
1
4
10 anos
–
–
–
–
2
–
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
A mortalidade neonatal e infantil na freguesia de São Mamede de Valongo tem um comportamento assaz complexo ao longo de cerca de um século, considerada em três períodos subsequentes, aleatórios e apenas provocados pela passagem de um livro de registo de óbitos a outro, sem qualquer outro procedimento metodológico. Não obstante, entre 1743-1778, a mortalidade neonatal é numericamente semelhante entre os dois sexos, mas a partir de 1779 a 1835 é mais forte nas crianças do sexo masculino e representa cerca de 69.2%, tendência que também se verifica quando analisamos a mortalidade infantil (até ao primeiro ano de vida), que sendo inferior constitui cerca de 58.4% dos meninos e 41.6% das meninas. Neste período foram registados um total de noventa e seis óbitos nestas faixas etárias, mas apenas nos doze anos subsequentes morreram 69 crianças até ao fim do primeiro ano de idade e nos quarenta e três anos seguintes faleceram cento e dez crianças entre neonatais (26.4%) e infantis (73.6%). Os números sobre os infantis duplicam nos óbitos do sexo masculino em relação ao sexo feminino. 96
Joel Silva Ferreira Mata
1.4.3– Os que morreram celibatários O celibato era outro dos problemas familiares que atingia sobretudo as mulheres. Para constituírem família, eram necessárias certas condições materiais que já especificamos. A tendência para ficarem em casa dos pais é a solução encontrada, sendo certo que os bens da alma ficarão a cargo de irmãos e de sobrinhos que beneficiavam, por vezes, da herança deixada por familiares celibatários. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, em todos os períodos, as moças e mulheres solteiras são sempre em número superior ao dos homens. Quadro n.º 8 – O celibato na freguesia de São Lourenço d’Asmes286 Designação de género
Datas
Homens
Percentagem (%)
Mulheres
Percentagem (%)
Total
1586-1672
5
20
20
80
25
1743-1780
15
55.5
12
44.5
27
1779-1792
5
33.3
10
66.7
15
1792-1835
9
26.5
25
73.5
34
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/4-16.1.
O celibato na freguesia de São Martinho do Campo tem uma morfologia que abrange maioritariamente os lugares de Balselhas (19.8%), Luriz (24%) e a aldeia da Quintã (15.6%), havendo, como mostra o quadro seguinte, uma dispersão por várias localidades que se vão afirmando à medida que evoluímos no tempo, formando novos pequenos núcleos populacionais onde uma certa parte dos seus membros permanecerá celibatária até ao fim da vida.
286 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 97
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n. º 9 – O celibato na freguesia de São Martinho do Campo287 Lugares
Homens
Mulheres
Total
Aldeia
3
3
6
Balselhas
5
14
19
Corredoura
1
3
4
Igreja
1
–
1
Luriz
8
15
23
Outeiro
1
3
4
Ponte Ferreira
6
2
8
Portela
1
3
4
Póvoas
–
1
1
Quintã
7
8
15
S. Gemil
2
6
8
S. Romão de Mouriz
1
–
1
Santa Maria de Duas Igrejas
–
1
1
Retorta
–
1
1
Total
36
60
96
Fonte: ADP, E/27/4/2-8.6; E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1.
O celibato na freguesia de Santo André de Sobrado é muito elevado e quase que triplica nas mulheres (72,3%) em relação aos homens (27,7%). Os lugares mais afectados pelo celibato feminino são o de Vilar (32,9%), de Sobrado (27,5%), de Ferreira (13,1%) e o de Paço (8,9%). É, sobretudo a partir de 1771 até 1835 que morrem mais mulheres solteiras.
287 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 98
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n. º 10 – O celibato na freguesia de Santo André de Sobrado288 Lugares
Homens
Mulheres
Total
Campelo
3
2
5
Costa
6
12
18
Devesa
6
12
18
Ferreira
12
22
34
Paço
7
15
22
Sobrado
14
46
60
Vilar
15
55
70
Penido
–
2
2
Pinguela
1
1
2
Total
64
167
231
Fonte: ADP, E/27/6/1-1.1E/27/6/1-2.3; E/27/4/5-20.1; E/27/4/6-22.
Gráfico n.º 21 – Celibato na freguesia de Santo André de Sobrado
Fonte: ADP, E/27/6/1-1.1E/27/6/1-2.3; E/27/4/5-20.1; E/27/4/6-22.
Na freguesia de São Mamede de Valongo o celibato atinge, com maior incidência, o lugar de Valongo (da Estrada), que é indiscutivelmente o pólo de desenvolvimento do território e em torno da paroquial de São Mamede, com as suas múltiplas ruas ocupadas pelas casas de morada dos almocreves, moleiros, ferreiros, ferradores e vendeiros, e outros profissionais.
288 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 99
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 11 – O Celibato na freguesia de São Mamede de Valongo289 Lugares
Homens
Mulheres
Total
Portela
1
–
1
Susão
4
3
7
Valongo
46
93
139
Total
51
96
147
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
O celibato feminino, na aldeia de Valongo é o dobro do masculino. Esta situação não pode estudar-se sem ter presente o elevado número de moças solteiras que foram mães e que, por isso, não deviam ter casado. Gráfico n.º 22 – O celibato na freguesia de São Mamede de Valongo
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
1.4.4 – Os que morreram de demência Alguns valonguenses globalmente considerados viveram muitas décadas, de doença incurável e natural. Os termos “demência”, “louca”, “sem juízo”, “doido”, “sem entendimento”, “demência do juízo”, “alienação dos sentidos” e “mentecapto”, são aqueles que os párocos responsáveis pela administração dos sacramentos utilizaram para caracterizar os fregueses que não conseguem recebê-los por falta de condições. Nos séculos XVII-XIX, neste ambiente rural, onde viviam vários cirurgiões e boticários, não se vislumbra outra maneira de distinguir os sãos dos doentes, que morriam 289 Apenas foram considerados os óbitos que identificam o lugar. 100
Joel Silva Ferreira Mata
acompanhados pelos familiares, ou sozinhos e de outros que eram encontrados, alguns dias depois, mortos no interior da sua casa de morada. A doença, por demência, atingia todos os estratos sociais, mas os mais retratados são os pobres que enxameavam e infestavam todas as freguesias do actual território do concelho de Valongo, dando à doença de foro neurológico, diagnosticado pelo padre-cura, uma conotação discriminatória e vexatória. Em São Martinho do Campo, entre os que morreram em “estado de loucura” identificam-se mulheres solteiras, mulheres casadas idosas, e viúvas. Alguns fregueses ficaram impossibilitados de receberem todos os sacramentos por perderem o juízo; outros passaram os seus últimos dias em casa de familiares, como Ressurreição Rodrigues, viúva de Agostinho Coelho, que foi viver para casa de seu irmão Manuel Rodrigues, na freguesia da Gandra “para donde veio louca e sem juízo”290; Manuel Ribeiro, do lugar
de Ponte Ferreira foi recolhido em casa de Vicente Carneiro, da freguesia de Sabrosa, onde morreu em 1785291. Em Ermesinde, o celibatário António, deve ter sofrido um ataque que o deixou cinco dias inanimado antes de morrer, em 24 de Março de 1804, sendo sepultado no dia seguinte à tarde “e só com a minha assistência por ser pobre”292, refere o abade João de Figueiredo Fragoso Abreu. O viajante, por terras de Coruche, António João, da aldeia de Vilar, faleceu em lugar incerto do País, encarregando-se a mulher Poliana João que “com os seus filhos farão o que poderem que hera pobre”293, por bens da alma; no hospital do Porto, faleceu Isabel Tomé, mulher de Lourenço Pires, ausente da freguesia, e que não tendo quem a defendesse foi despojada pela sogra Francisca João que “se apossou de tudo o que havia na caza não quis fazer cousa algũa”294.
290 ADP, E/27/4/3-11.1, fl.194.
291 ADP, E/27/4/3-11.1, fls.195-195v. 292 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.198. 293 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.223.
294 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.223v. 101
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Gráfico n.º 23 – Demência na freguesia de São Martinho do Campo (1685-1803)
Fonte: ADP, E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1.
No lugar da Igreja, da freguesia de São Lourenço d’Asmes, faleceu Ana Tomé, sem sacramentos “por estar paralítica e nam se conheceo peyoramento”295; tinha alguma capacidade económica, pois seu marido, José Martins, lhe mandou rezar um ofício com a presença de vinte e quatro clérigos, deixando para este efeito cerca de dois mil, oitocentos e oitenta réis, distribuídos sob a forma de esmolas.296 Gráfico n.º 24 – Demência na freguesia de São Lourenço d’Asmes (1624-1803)
Fontes: ADP, E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-16.1; E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-15.2.
Em Santo André de Sobrado, o padre Jeremias da Silva Pereira referiu que alguns dos seus fregueses não receberam todos os sacramentos por já não apresentarem condições tanto físicas como mentais. A viúva, Antónia Maria, do lugar do Sobrado, recebeu somente a santa-unção porque “lhe não 295 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.236. 296 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.239. 102
Joel Silva Ferreira Mata
deram os mais por andar douda a tempos”297. A celibatária Ana, filha de José da Costa de Pinheiro, do lugar de Ferreira, morreu sem sacramentos “assim por ser parvea como por andar de pé”298; outros, perdiam a memória e a estabilidade emocional, como Maria Melchior, mulher de Custódio do Vale, falecida em 1741, que “por estar com intervallos de douda”299, o padre-cura, não encontrou a estabilidade à freguesa receber os sacramentos. Pertencia ao lugar da Devesa, e seu marido mandou celebrar o ofício de corpo presente com o acompanhamento de dez clérigos e outras catorze missas, conforme registou no assento de óbito o padre-cura Gonçalo Carneiro Melo. Em estado de demência encontrava-se, há muito tempo, Amaro João, da mesma aldeia, que faleceu em 1758300. Outros exemplos podem ser dados
apenas para evidenciarem termos como “por falta de juízo e estuporada”301, ou “por estar privado do juízo de huma maligna”302 ; “por cahir em alienação dos sentidos”303; “por estar de demência a alguns mezes”304, “por estar mentecapta”305, entre tantos outros exemplos que o registo dos assentos de óbitos permitem coligir. Gráfico n.º 25 – Demência na freguesia de Santo André de Sobrado (1697-1835)
Fontes: ADP, E/27/4/5-20.1; E/27/4/5-20.2; E/27/4/6-21.1; E/27/4/6-22; E/27/6/1-1.1. 297 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.31v. 298 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.43. 299 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.47.
300 ADP, E/27/4/6-21.2, fl.211v. 301 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.216.
302 ADP, E/27/4/6-21.1, fl. 229v. 303 ADP, E/27/4/6-22, fl. 879v. 304 ADP, E/27/4/6-22, fl. 514v. 305 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.19.
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Gráfico n.º 26 – A demência em quatro freguesias do território do actual concelho de Valongo
Fonte:ADP, E/27/4/3-9.1; E/27/4/3-11.1 E/27/4/4-14.5; E/27/4/4-16.1; E/27/4/414.6; E/27/4/4-15.2; E/27/4/5-20.1; E/27/4/5-20.2; E/27/4/6-21.1; E/27/4/6-22; E/27/6/1-1.1; E/27/6/1-3.1; E/27/6/1-3.2.
1.4.5 – Os que morreram fora do território valonguense Ou porque emigravam ou porque se encontravam a exercer actividades deambulatórias, muitos valonguenses, por naturalidade, faleceram em localidades muito distintas do território continental, mas também para lá dos oceanos, no Brasil e na Índia, onde procuravam melhores condições de vida. Se pensaram regressar, um dia, nunca o saberemos. Outros foram ganhar a vida em Espanha. Para o Alentejo partiram vários indivíduos, em épocas diferentes e aí encontraram a morte pacífica, como Domingos, filho de Isabel João, do lugar da Quintã, em 1683, tendo chegado a notícia, a sua mãe Isabel João, só em meados do ano seguinte, altura em que lhe foi então rezada uma missa com a presença de cinco sacerdotes, obrigação que devia constar de um testamento do falecido, mas que permaneceu inédito até à data em que foi feito o assento do óbito pelo padre João da Fonseca306; Luís Barbosa, mancebo, do lugar de
Ermesinde, que partira para o Alentejo “avia seis ou sete annos e [que sua mãe] não lhe quis gastar nada por sua alma”307, apesar de ser sua herdeira legítima; por volta de 1666 faleceu, João Moreira, marido de Maria Francisca,
306 ADP, E/27/4/3-9.1, fls.193v-194v. 307 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.215v.
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Joel Silva Ferreira Mata
natural da mesma aldeia, mas que “ate gora não tem feito cousa algũa polla alma do defunto”308. Em Trás-os-Montes foram sepultados vários viajantes da freguesia de São Mamede de Valongo, que documentamos a partir do início do século XVII: Domingos Dias, que faleceu no Mogadouro, sendo realizada uma missa por sua alma em 11 de Setembro de 1607, e a missa do mês, conforme consta à margem do assento de óbito309; Andresa Francisca (?), viúva, que teria fale-
cido a 2 de Dezembro de 1664, mas que seu genro Manuel do Vale Penteado “ate agora se lhe não fez nada”310, dado que seus filhos Gonçalo Lopes e André Lopes se apropriaram do património da falecida; em Boticas morreu Manuel do Vale, casado com Maria João, que mandou rezar duas missas com a presença de quatro clérigos, de acordo com a inscrição lateral lavrada pelo punho do padre António Manuel, coadjutor de Susão311; em Bragança desceu ao silêncio dos mortos, em 1681, António Gonçalves Moreno; sua mulher e os filhos mandaram-lhe rezar dois ofícios, o primeiro ao fim do mês sobre o passamento e outro de aniversário, com a presença de oito clérigos312; em 1709 veio a notícia da morte de Manuel Marques do Vale, natural de Valongo, que foi a enterrar em Vila Pouca de Aguiar, como consta de uma certidão extraída do livro dos assentos dos óbitos dessa freguesia, onde foi celebrada uma missa com cinco padres; na paroquial de São Mamede de Valongo foram rezadas três missas, ao dia, ao mês e no aniversário com a presença de dez religiosos313. Foi sepultado na igreja de Vila Pouca de Aguiar aos 6 dias de Março, e a primeira missa rezada na paroquial de de São Mamede de Valongo tivera lugar somente a 21 de Agosto314. Em 1700, faleceu, em Ribeira
de Pena, o valonguense Manuel Gonçalves Branco, e foi anotado no livro dos assentos dos óbitos de Valongo pelo padre André Alão Durão315.
308 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.225. 309 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.194.
310 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.111v.
311 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.112v. 312 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.285. 313 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.319. 314 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.319. 315 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.361. 105
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Outros faleceram longe da terra, em Almeirim, como o jovem António, em 1655, que foi criado em casa do abade João de Sá, sendo portanto residente na aldeia de Sá, na freguesia de São Lourenço d’Asmes, ficando António João com a “obrigação de lhe fazer o bem da alma por o servir como filho até gora não tem feito nada”316; em Leça da Palmeira foi sepultado outro indivíduo, de condição inversa, chamado Domingos, solteiro, que morreu em casa de João de Brito “que hera seu criado”317. Ficaram por herdeiros seus irmãos Manuel Gonçalves e Isabel Gonçalves naturais da freguesia de São Lourenço d’Asmes, como consta no registo de óbitos a cargo do abade António da Rocha318; no concelho de Fronteira foi enterrado António, solteiro, de menor
idade, sendo seu tutor António Francisco, do lugar de Ardegães que “tem a obrigação de lhe fazer o bem da alma et de lhe cobrar suas soldadas et legitimas conforme o inventairo que se fes”319; em Cete morreu, em 1690, Catarina Fernandes, natural de São Martinho do Campo, do lugar de Luriz, cujo óbito foi registado pelo padre João da Fonseca320; em Mesão Frio, já no século XIX, em 1810, foi sepultado Manuel da Costa, miliciano, que era casado com Maria Pinta; o óbito foi confirmado e registado pelo abade de São Martinho do Campo, com base numa certidão requerida para o efeito, apresentada pela viúva, que ficou designada por testamenteira; o falecido era natural do lugar da Quintã321; desta mesma freguesia – e que veio a falecer em Valongo – era Ana Martins, casada com Manuel José, do lugar da Coletinha. O marido satisfez as obrigações religiosas participando com “metade dos seus bens da alma”322.
Em Lisboa finou, em 1615, António Manuel do Vale que aí ganhava a vida como carvoeiro. Terá falecido há quatro meses, mas só agora, em 16 de Julho, foi celebrada uma missa, com a presença de cinco clérigos323; também em Lisboa, terminou os seus dias Manuel Pinheiro, filho de Domingos Aleixo; era pobre e seu pai não tinha condição de mandar rezar missas pela 316 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.219v. 317 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.223v. 318 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.223v. 319 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.224. 320 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.196.
321 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.212v-213. 322 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.214.
323 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.198v. 106
Joel Silva Ferreira Mata
alma do defunto324; em Setúbal, por volta de 1657, terminou os seus dias Domingos Martins, marido de Domingas Antónia que sabendo do falecimento mandou rezar um ofício na presença de quatro sacerdotes por não ter mais posses325. No Hospital de Todos-os-Santos, de Lisboa, ocorreu a morte de Manuel Martins, o marta, que era casado com Maria do Vale, em 24 de Agosto de 1712326 No desempenho de outra actividade laboral foi vitimado António Fernandes, que vivia há muito tempo em Valongo, mas que era natural de Santa Marta de Penaguião, freguesia onde se deslocou em Setembro de 1627, juntamente com três companheiros para trabalhar nas vindimas. Ao amanhecer foi encontrado morto327; na cidade do Porto faleceu a moça Maria; sua irmã, que vivia em Ponte Carvalha ficou encarregada de lhe fazer os bens da alma como referiu o coadjutor António Manuel328; em Guimarães foi enterrado o almocreve Domingos, filho de Domingos António, solteiro, que pela informação do pároco André Alão Durão ainda não tinha sido feito qualquer acto pio pelo bem da alma329, até Janeiro de 1694, altura em que foi anotado o seu óbito. Em Espanha, encontraram a morte vários valonguenses que aí residiam e trabalhavam temporariamente. Da freguesia de São Lourenço d’Asmes mencione-se Pedro Francisco, do lugar de Ermesinde, falecido em Castela, em 1610, ficando a cargo da mulher Catarina Gonçalves os procedimentos religiosos330; Pedro António do Monte (1637), cuja viúva também não mani-
festou publicamente vontade para mandar rezar missas por alma do defunto por ser pobre e porque o marido deixou muitas dívidas331, razão pela qual se
encontrava a trabalhar em Castela, ou a monte com receio dos credores; Jorge, da aldeia da Cancela (1650) que deixou sua irmã Cecília Antónia, casada com
324 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.103. 325 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.92. 326 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.92.
327 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.305. 328 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.263.
329 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.335v.
330 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.200v. 331 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.207.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
António Manuel, como sua herdeira332; Domingos Álvares (1652), da aldeia de São Paio, designara sua mulher Francisca Fernandes como herdeira, mas que “ate’gora não tem feito cousa algũa”333, conforme denunciou o abade António da Rocha. Da freguesia de São Mamede de Valongo partiu João Martins (1624), serrador de profissão, para Castela onde adoeceu de morte334; Amaro João
(1652) que deixou à viúva os encargos por sufrágio: ao dia e mês, uma missa rezada com a presença de seis padres, e ao ano com apenas cinco religiosos335; em Sevilha (1683) foi sepultado Manuel, de Baltar, que deixou para sufrágio cinco mil réis “que lhe devia António Nogueira”336; Jerónimo (1706), solteiro, que havia já falecido há alguns anos; em 23 de Agosto, seu irmão mandou fazer os bens da alma com ofícios do dia, mês e ano, com cinco clérigos, a cargo do padre André Alão Durão337. Ao lugar de Valongo Susão pertencia o paroquiano Domingos, solteiro, filho de Domingos Manuel, que morreu em Castela, em Dezembro de 1712338. Para o Brasil emigraram vários indivíduos como João Marques (1668), natural de Balselhas, e seu irmão Domingos que morreram “nas partes do Brasil”339; Francisca Manuel (1666), mulher de Miguel Afonso, de Valongo,
que encarregou seu filho Manuel Gaspar, de lhe mandar rezar uma missa com a presença de dez padres, ao mês e ao ano com oito340; também, natural de Valongo, faleceu em Pernambuco, por volta de 1680, Miguel Afonso, cujos herdeiros Manuel Gaspar e Gabriel Luís não se interessaram por mandar realizar qualquer ofício religioso341; Manuel de Sousa, filho do capitão Manuel de Sousa, que faleceu em 1680, em parte incerta do Brasil; seu pai mandou fazer-lhe os ofícios do dia, mês e ano342; João Marques (1690), solteiro, filho 332 ADP, E/27/4/4-14.5,fl.216.
333 ADP, E/27/4/4-14.5,fl.217v. 334 ADP, E/27/6/1-2.3,fl.208.
335 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.82v.
336 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.289.
337 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.378v. 338 ADP, E/27/6/1-4.1,fl.305v.
339 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.185v. 340 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.261v.
341 ADP, E/27/6/1-3.2, fl. 282v. 342 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.328.
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de Manuel Marques, já falecido, e de sua mulher Ana Gaspar morreu “nos estados do Brasil ía anos”343. A caminho de Portugal, vindo do Brasil, faleceu, em pleno Oceano Atlântico, João Luís, solteiro, filho de António Fernandes e de sua mulher Antónia Luís; em 1613 “vieram novas que era morto e alguma coisa trazia344. No século XVIII partiu para o Brasil, onde foi sepultado, o padre Manuel das Neves; a sua morte foi conhecida pelas cartas que enviou André Jorge, seu cunhado345. Em 1740 foi sepultado, no Brasil, Gabriel Mendes346, e no ano seguinte Bento do Vale347.
Registo do óbito de João Luís, solteiro que faleceu no regresso a Portugal, vindo do Brasil. Fonte: ADP, E/27/4/4-16.1, fl.197.
Na Índia foi a enterrar António (1708), solteiro, irmão de Manuel António Neto, morador na Rua Nova, em Valongo; havia partido para o Oriente há muitos anos, desconhecendo-se o seu paradeiro. Nestas circunstâncias, Maria João, mulher de Manuel António “por estar senhores da sua legitima os bens da alma na forma do costume desta igreja com suas ofertas e obradas”348, mandou celebrar três missas: a primeira no dia 30 de Janeiro, e as outras no primeiro e terceiro dias de Fevereiro desse mesmo ano349.
343 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.332. 344 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.197.
345 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.315v. 346 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.359v. 347 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.359.
348 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.314v. 349 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.314v. 109
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
No hospital da cidade do Porto faleceram vários valonguenses: Marta (1648), mulher pobre, da freguesia de São Lourenço d’Asmes 350, que não teve direito à realização de missas como confessou o abade António da Rocha; José de Oliveira (1791), viúvo, natural do lugar de Ermesinde, sendo incerto o dia do seu passamento351, como consta no assento de óbito elaborado pelo padre coadjutor Custódio de São José; Catarina (1626), mulher muito pobre, sobre a qual o abade diz: “e verei se tem algum farrapo que se lhe gaste pela alma”352. Efectivamente, o pároco devia ter encontrado algum valor que justificasse a realização de uma missa com a presença de sete religiosos, como foi anotado a latere; Domingos André (1662), de Valongo, casado com Maria João, do Escoural353; e Domingos Vaz, homem pobre, casado com Maria Dias354.
Na cadeia da cidade do Porto morreu Manuel António, o branco (1664), de Valongo, onde cumpria pena; sua mulher Joana Antónia mandou celebrar uma missa no dia do funeral com a presença de quatro padres, assim como no dia do aniversário355. Além dos mencionados há outros que se estendem pela mesma cronologia mas que não se sabe onde faleceram. Esta circulação de homens e de mulheres dá conta de um certo inconformismo assim como sugere uma certa visão da movimentação social, comercial e das preferências e hábitos dos valonguenses. Os almocreves e os embarcadiços traziam notícias que entusiasmavam e incentivavam ao aventureirismo fatal para muitos dos que partiam.
350 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.214v. 351 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.168v. 352 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.209v. 353 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.111.
354 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.111v. 355 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.110.
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1.5 – A morte por acidente 1.5.1 – Por afogamento Na Idade Média muitos dos acidentes eram causados por queda e atropelamento provocados por cavalos, tragédias que não contabilizamos no actual território concelhio. Numa geografia rural são sobretudo os pequenos, mas fatais acidentes, que levavam à morte precoce de muitos dos seus moradores e por motivos muito diferentes uns dos outros. Natural de Ermesinde, morreu por afogamento, no ribeiro da “Covilham” na freguesia de São Pedro da Cova, a viúva Maria João, que havia sido casada com João da Rocha356; em 1652, Brás Gonçalves, que morava no lugar
da Ermida, morreu afogado no mesmo local. O seu património foi utilizado para saldar dívidas que havia contraído, razão pela qual “não se lhe fes nada polla alma por ser muito pobre”357.
No lugar da Cancela, caiu a um poço e morreu afogada Maria Loureira, mulher de Manuel Fernandes, castelhano, em 1750; foi sepultada no dia seguinte pelo coadjutor José Luís, tendo dado oblatas no montante de oito alqueires de pão, um carneiro e o cesto das oferendas acostumadas, na freguesia358; no ano seguinte, no mesmo lugar teve o mesmo destino Maria
Fernandes, mulher de Bartolomeu André; era pobre e, por isso não deu mais do que uma missa e de oferta a “cestinha”359; em 1765 foi a vez de Maria, mulher solteira, filha de Manuel Jorge, viúvo, do lugar da Cancela, que mandou fazer um ofício com a presença de vinte e sete padres que acompanharam o corpo de sua casa à sepultura; seu pai deu de oferta dez alqueires de pão e o cesto360. Na aldeia de Vilar, da freguesia de Santo André de Sobrado, morreu Frutuoso Pedro, afogado no Rio Ferreira, em 1638361; também António Dias,
marido de Maria Ferreira que moravam no lugar de Ferreira, teve o mesmo 356 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.360.
357 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.217v. 358 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.197
359 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.201. 360 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.233. 361 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.229v.
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fim, no mesmo rio, em 1788, descendo à sepultura envolto num lençol de linho 362 ; do mesmo lugar morreu José Martins Lopes, sepultado em 18 de Fevereiro de 1795 “por sahir de caza de saúde e depois de faltar dois dias aparecer morto no rio abaixo da Ponte Ferreira e sendo conduzido para sua caza foi sepultado nesta igreja”363. No início do século XIX, em 1809, foi encontrada afogada, dentro de um poço, a viúva Rosa Carneiro; o corpo foi e enterrar embrulhado em hábito de religião, com o acompanhamento de sete clérigos, sendo o ofício realizado pelo padre encomendado Joaquim Barbosa364. Fora da freguesia, no rio Douro, e em Vila Nova de Gaia, morreu afogado, em 1740, António, filho de Manuel do Paço, da freguesia de Santo André de Sobrado. Foi sepultado em “Sam Pedro de Riba Gaya extra muros”365. Em São Mamede de Valongo, perdeu a vida, no ribeiro que “desaguava na Presa”, o viúvo Domingos Ferreira, que era natural da freguesia de Santo André de Sobrado366, e que foi sepultado em Dezembro de 1757, pelo
reitor Joaquim de Sousa Dias. À mesma freguesia pertencia Luísa Ribeira, que morava na Rua da estrada que “apareceo morta afogada na cidade do Porto”367, no rio Douro, em 1809.
Na freguesia de São Vicente de Alfena, morreu afogada, no rio Leça, em circunstâncias duvidosas, Maria de Azevedo, viúva, que morava no lugar da Igreja, “estando a lavar no rio”368, em 1740.
1.5.2 – Por acidente de trabalho Acidente de trabalho pode ser considerado aquele que sofreu Mateus, escravo de Manuel Martins, do lugar de Sá, que em 11 de Outubro de 1753 caiu de uma árvore, tendo morte imediata, e foi enterrado no mesmo dia369;
a vítima Francisco Marques das Neves que na Serra de Nossa Senhora dos
362 ADP, E/27/4/6-22, fl.861v. 363 ADP, E/27/4/6-22, fl.875. 364 ADP, E/27/4/6-22, fl.511.
365 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.44. 366 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.191. 367 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.50.
368 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.360.
369 ADP, E/27/4/4-16.2, fl.206. 112
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Chãos, ficou por baixo de um carro de trigo; morava na Rua do Sapal, em Valongo; foi sepultado no interior da igreja de São Mamede de Valongo, com a assistência de seis padres, sendo o serviço litúrgico realizado pelo padre André Alão Durão; a mulher mandou fazer um segundo ofício com dezassete padres e um terceiro com dezasseis370, dispondo cerca de quatro mil, quinhentos e sessenta réis para dar de esmola a todos os clérigos. Na freguesia de Santo André de Sobrado, em 1793, Ana Gomes, do lugar de Ferreira, morreu debaixo de uma pedra; foi sepultada na igreja, envolta num lençol de linho, acompanhada pelos clérigos da freguesia “por esmola por ser muito pobre”371, de acordo com o assento de óbito elaborado
pelo padre Manuel Alvares Ferreira. Dois anos mais tarde, foi registada, a morte do sinistrado Manuel Carneiro, viúvo, morador no lugar da Devesa que foi sepultado sem sacramentos “por se achar morto na lama”372. No alto de um monte da freguesia de Lordelo, foi encontrado o aldeão de Sobrado, João Paulo do Outeiro, em 1709373. O padre que assistiu o serviço fúnebre não mencionou qualquer tipo de familiares do defunto.
1.5.3 – Por acidente não identificado Por acidente não identificado, faleceram, em 1699, Domingos da Rocha374;
Mateus António, do lugar de Valongo, que foi vitimado na freguesia de Rio Tinto375; Maria João, viúva de António Manuel, de Valongo376. Domingos, solteiro, da Rua do Bacelo, de Valongo. O seu funeral foi instruído por sua irmã Maria Correia377; Manuel das Neves, da aldeia de Valongo Susão378; Manuel António das Neves, do lugar de Vilar, da freguesia de São Lourenço d’Asmes que sofreu um “acidente não esperado”379, em 1797; é pouco claro o
370 ADP, E/27/6/1-3.2, fls.311-311v. 371 ADP, E/27/4/6-22, fl.872. 372 ADP, E/27/4/6-22, fl.876.
373 ADP, E/27/4/5-20.1, fl.127v. 374 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.356.
375 ADP, E/27/6/1-3.2, fl. 363. 376 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.370. 377 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.367. 378 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.381
379 ADP, E/27/4/4-15.2, fl. 185v. 113
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registo de Antónia Ferreira, moradora no lugar da Ermida, e que faleceu em 1749 “por lhe sobrevir um acidente”380. Podia ter sido por morte súbita, como aconteceu a muitos munícipes. Miguel Ferreira, de Valongo, cujo passamento ocorrera a 6 de Março de 1707, que não teve direito a qualquer sufrágio por ser pobre, a não ser uma missa por iniciativa do padre António Padilha, mas que ficou a dúvida se a mesma havia sido paga ou não381. Na mesma freguesia valonguense faleceram de
acidente não identificado outros paroquianos como Maria da Costa (?)382, em 1760; Maria Álvares dos Reis, casada como André Lopes, galhete, que em 1749 “cahiu em hum acidente”383.
1.5.4 – Por ouvir missa Havia, porventura, outro tipo de acidentes mal explicados quanto à sua ocorrência. Por exemplo, Manuel Tomé, o “pacheo” que faleceu no dia 20 de Janeiro de 1705, quando sofreu “um acidente”, dentro da igreja paroquial de São Mamede de Valongo, a ouvir missa pelo padre André Alão Durão. Foi sepultado no interior da igreja com um ofício de corpo presente, com a assistência de oito clérigos, tendo faltado à cerimónia dois sacerdotes384.
1.5.5 – Por engasgamento Outros apareciam mortos dentro de casa, tendo falecido, aparentemente, de morte natural o que não pôde ser confirmado. Manuel Dias, “o manquo”, que estando em casa a cear “com o bocado na boca cahio de repente”385, provavelmente engasgado ou por um ataque súbito.
Outro tipo de acidentes que provocava a morte estava relacionado com a queda de raios, inserindo-se nesta categoria a morte provocada a José 380 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.195v. 381 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.311.
382 ADP, E/27/6/2-6.1, fl.166v. 383 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.192. 384 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.371. 385 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.372. 114
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Pereira, de Ermesinde, que vindo de uma feira foi atingido por “huma faísca de raio”386, que o fulminou.
1.5.6 – Por acidentes na estrada Os viajantes, almocreves ou não, podiam também sofrer acidentes de natureza vária, como os provocados por assaltos, intempéries, mau estado das estradas, por animais que saindo do matagal podiam provocar sequelas nas bestas de carga e nos caminhantes. Os registos de óbito assinalam, de forma simples, alguns destes homens que foram encontrados mortos nas estradas, como foi o caso de Sebastião Dias, sapateiro, que indo de Lisboa a caminho de Setúbal foi encontrado sem vida no caminho, em 1640. Deixou vários filhos: Manuel Dias, Sebastião Dias, Frutuoso, solteiro, e as filhas Maria e Águeda. Tinha património, não podendo os filhos eximirem-se ao pagamento dos bens da alma387. Na estrada, morreu, em 1654, Belchior Fernandes, natural do lugar da Devesa, na freguesia de Santo André de Sobrado388; António, filho de João
Jorge e de Isabel João recebeu somente o sacramento da santa-unção e foi absolvido condicionalmente “pella morte ser d´estrada”389; em 1724 foi encontrado já sem vida, na “quelha das varas junto ao ribeiro que he no lugar de Ferreyra”390, um certo Manuel Gonçalves, que sendo natural da aldeia de Vilela, vivia actualmente no lugar do Outeiro, da freguesia Santo André de Sobrado. O homem não foi roubado, pois foi encontrada uma bolsa com trezentos réis, com os quais lhe foram rezadas três missas, pelo padre Jeremias da Silva391. Na freguesia de São Mamede de Valongo, Catarina Gaspar, mulher de António Álvares faleceu em 7 de Março 1696, por ter dado uma queda quando regressava da igreja para sua casa; tinha uma filha que era casada 386 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.224. 387 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.99.
388 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.185v. 389 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.5v.
390 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.12v 391 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.12v 115
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com Inácio Marques392; no ano seguinte faleceu Maria Inês (?)393, mas o pároco responsável pela anotação do óbito não mencionou a causa da tragédia, ou a natureza do acidente. Podem citar-se outros acidentados como Manuel André Lagoa, casado com Maria Ferreira, vitimado em Outubro de 1747 que “morreu de hum desastre”394, e Teresa, peregrina, que faleceu “debaixo de hum carro no lugar
das Telheiras desta freguezia”395, de São Vicente de Alfena.
1.5.7 – Por incêndio na habitação A fragilidade construtiva das habitações da maioria dos habitantes, a fogueira a um canto da cozinha ou no centro do espaço reservado à família, o descuido e o desleixo podiam contribuir para desencadear uma tragédia de consequências fatais. Em São Vicente de Alfena, o reitor Simão da Cunha Porto descreve um acidente mortal de uma criança, vítima de um incêndio que deflagrara no interior da casa onde estava sozinha, em Janeiro de 1720: “Per este tempo enterrey no adro desta igreja sem reservar esmola do acompanhamento e oferta hũa criança que parecia ser de idade perto de hum anno de huuns forasteiros que estavão há huuns dias nesta freguesia dizem lhe pegara o fogo em sua caza e queria que nesta freguesia curar a ditta criança que vinha notavelmente afogueda”396.
1.5.8 – Por homicídio e suicídio A prática de actos criminosos e portanto condenável em qualquer época histórica, apesar das penas duras, acontecia com alguma frequência. Na Idade Média, os condenados eram ostracizados para os concelhos de fron-
392 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.342v- 343. 393 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.347.
394 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.368v. 395 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.335v.
396 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.320-320v. 116
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teira397, um território inóspito, violento e afastado. Por isso, muitos degredados recorriam ao rei pedindo a redução de pena, invocando as más condições que eram oferecidas pelo município. Outros preferiam ser degredados para Ceuta, solicitação que geralmente era aceite pelo rei. A tipologia do crime já foi estabelecida e consta de uma lista que resumidamente enquadra esta temática398: crimes contra o rei, a autoridade e a
ordem pública, contra Deus, contra a pessoa humana, contra a propriedade e a ‘ordem económica’, e contra a ‘moral’ e os bons costumes. Na freguesia de São Martinho do Campo, em 1758, o reitor Teodósio de Vasconcelos Portugal denunciou os crimes contra a propriedade privada, nomeadamente o assalto a casas familiares, com o uso de escadas, cujos autores fugiam para o Brasil e para outros lugares longínquos escapando às malhas da justiça, que acusa de não ser eficaz399.
Quanto ao homicídio, voluntário ou involuntário, podia ocorrer por diversas razões: legítima defesa, acidental ou intencional, de imediato ou ao fim de alguns dias. Em São Mamede de Valongo, em lugar que não foi referido, foi assassinado, Jerónimo Beleágua, que morava na Rua Nova, não sendo registado o móbil do crime. Não devia ter demasiadas posses materiais, uma vez que seu cunhado Feliciano de Sousa lhe mandou rezar um ofício com a presença de apenas seis padres400. Porém, Maria, pequena, muito
pobre, “foi morta cruelmente por cima do Reboredo”401, na freguesia de São Pedro da Cova, na véspera do dia da invocação de São Miguel, de 1674, era natural de Valongo da Estrada, e andaria a mendigar no referido lugar, para sobreviver. Porque não tinha dinheiro ou bens, foi enterrada sem qualquer manifestação religiosa. É possível que Domingos António, de Ermesinde,
397 MATA, Joel Silva Ferreira (2013) – «A Fronteira entre Portugal e Castela (sécs.XIV-XVI) e a fragilidade da negociação», in Lusíada: Revista de Ciência e Cultura, série de Direito. Porto, nº7/8 (2013). Lisboa: Universidade Lusíada Editora, pp.141-66.
398 DUARTE, Luís Miguel (1999) – Justiça e criminalidade no Portugal Medievo (1459-1481). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian / Fundação para a Ciência e a Tecnologia, pp.263 -264. 399 TT, MPRQ/8/76.
400 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.98v.
401 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.275v. 117
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
que em Novembro de 1763 foi encontrado morto num certo caminho incógnito tenha sido vítima de um atentado, por assalto, que lhe ceifou a vida402. Da freguesia de São Mamede de Valongo foram assassinados vários indivíduos no início do século XIX, em pleno período de turbulência política motivada pelas invasões francesas. Assim, em 21 de Março de 1808, Mamede Gonçalves “apareceo morto de huo tiro de huo de bacamarte estando em huo moinho da freguesia de São Martinho do Campo”403, podendo ter sido
provocado por um ajuste de contas, por exemplo, a propósito dos conflitos permanentes pela posse e distribuição da água do rio Ferreira. No mesmo ano foi registado também o homicídio de Rosa Maria de Oliveira, que era casada com Diogo Pereira da Silva e que vivia em Valongo Susão. A malograda foi abatida pelo disparo de “huo tiro de espingarda”404. A vítima foi sepultada no início de Dezembro na capela de Santa Eufémia.
No ano seguinte, fora do território valonguense “foi morto tiranamente perto da Barca da Trofa”405, o brigadeiro Tomás José dos Santos, sendo a ocor-
rência registada no assento dos óbitos pelo reitor Afonso Gonçalves Pereira Capelo Barroso. Por terem sido condenadas, Eufémia e Anastácia foram mortas por “carrasquo”; viviam em Ermesinde e eram filhas de Baltasar André. No registo de óbito, o padre Miguel Valente não indicou a realização de qualquer cerimónia religiosa ou oblatas para os bens da alma406.
Em 22 de Agosto de 1803, foi encontrada, enforcada numa corda, Custódia, mulher solteira, filha de Rosália Moreira, do lugar do Sobrado. Foi sepultada na igreja, e o seu corpo embrulhado num lençol de linho, e teve a assistência de quatro clérigos, além do padre Joaquim Barbosa407. Podia ter sido vítima de um crime hediondo ou ter, a própria, posto termo à vida.
402 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.228v. 403 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.42. 404 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.47. 405 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.50.
406 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.201. 407 ADP, E/27/4/6-22, fl.897.
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Joel Silva Ferreira Mata
1.6 – As elites, minorias étnicas, mendigos e vadios 1.6.1 – As patentes militares e os soldados As Inquirições de 1258, com alguma imprecisão, dão a indicação de que certas unidades campesinas estariam nas mãos de militum408, nas freguesias
de São Martinho do Campo e de Santo André de Sobrado. Porém, mais tarde, no primeiro quartel do século XVI, no foral outorgado a Aguiar de Sousa, em 25 de Novembro de 1513409, as referências à posse militar desapareceram. Por sua vez, no Numeramento de 1527410, efectuado no tempo de D. João III, a metodologia da inquirição assentou exclusivamente no número de moradores de cada freguesia, omitindo-se, por isso, a indicação dos senhorios que estavam, nessa altura, na posse da terra. Mais tarde, as Memórias Paroquiais levadas a cabo no rescaldo do Terramoto de Lisboa de 1755, apesar da prolixa informação sobre as estruturas viárias, produtivas e alguns contornos sociais, nomeadamente quanto aos moradores ausentes, a resposta aos questionários não elucida qualquer conteúdo específico sobre esta matéria, nem em relação à vigilância e segurança das suas populações contra eventuais incursões de bandos de malfeitores que atacavam nas estradas e ladrões que assaltavam as casas impunemente. Neste território municipal identificámos vários indivíduos que serviam no exército pertencendo a regimentos da cidade do Porto e de outras localidades a norte, que combateram e morreram, por exemplo, na fronteira antes e depois das invasões napoleónicas. Na freguesia de São Vicente de Alfena residia José de Paiva, soldado da guarnição do Porto, que em 1720 vivia no lugar de Ferreira411. Entre 1725
e 1727 aparece Domingos Carneiro, “soldado pago”412, também designado como “soldado de Infantaria do Porto”413, morador no lugar da Rua.
408 P.M.H., Inquisitiones, p.577.
409 MARQUES, Maria Alegria (2003) – ob. cit., 111.
410 FREIRE, Anselmo Braamcamp (1905) – ob. cit., pp.259-260. 411 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.30. 412 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.50.
413 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.48v. 119
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Na categoria de cabo-mor, arrolam-se Francisco Pinheiro dos Santos, casado com D. Maria do Rosário, entre 1735-1737414; Joaquim Martins Pinheiro em 1742415; e de 1749 a 1760, António de Paiva Porto, casado com D. Rosa de São José, moradores na sua quinta em Cabeda416, onde nasceram seus filhos. Esquema genealógico do Cabo-mor António de Paiva Porto
Fonte: ADP, E/27/4/2-6.1.
Porém, em 1744 e 1746, António de Paiva Porto, no assento de baptizado das filhas (Dona) Rosa e de Maria, é dado como alferes e não como cabo-mor417. Com a patente de sargento-mor aparece bem documentado, na freguesia de São Mamede de Valongo, Tomás José dos Santos, que era casado com D. Ana Constância Rosa, e morava na Rua da Portelinha. Terá falecido em data anterior a 1714 e fora do território valonguense. Em 25 de Outubro, desse mesmo ano, foi celebrado “huo officio com grandeza”418, para assinalar a trasladação dos seus restos mortais para esta freguesia: “vierão os ossos do sargento-mor Thomas Joze dos Santos marido de Dona Anna Constancia Roza da Rua da Portelinha desta freguesia de São Mamede de Vallongo e forão sepultados na capella do Senhor dos Passos na sepultura donde foi sepultada a dita sua mulher”419, que falecera no dia 8 de Março do refe414 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.74v e 80. 415 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.103v.
416 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.126 e 176.
417 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.109v e 117v-118. 418 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.100v. 419 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.100v. 120
Joel Silva Ferreira Mata
rido ano420. No início do século XIX foi enterrado na igreja paroquial de São Mamede de Valongo, o sargento-mor Alexandre José Ferreira Porto, que era casado com D. Maria Casimira Estrela, e morava na Rua da Portela. Foi a sepultar no dia 29 de Novembro de 1814421. Além destes citam-se alguns capitães a quem poderia estar confiada a segurança da população. No início do século XVIII documentam-se o capitão André da Rocha e Sousa, casado com Francisca Rosa Fernandes, residente no lugar de Baguim, em Alfena. Teve quatro filhos: D. Teresa, Carlos, José e Fernanda422; Francisco Pinheiro dos Santos era casado com Maria do Rosário,
e morava no lugar da Rua. Teve vários filhos: António, José e os gémeos Maria e Francisco, entre 1722 e 1727423; faleceu em 1728 como “capitão desta freguesia”424. Em 1755 surge João Barbosa e mulher Maria Luísa, do lugar do Xisto que a 22 de Maio deste ano baptizou Maria, sua filha425; no ano de 1758 documentam-se dois capitães: Domingos da Silva Dias e sua mulher D. Rosa Maria Angélica, de Alfena; tinha uma irmã, casada com José da Silva. Em 1726, nasceu, Josefa, filha de Maria, mulher solteira que, não sendo da freguesia, veio dar à luz em casa do capitão, ocultando a identidade paternal de sua filha426; deste mesmo ano há referência ao capitão Francisco da Silva Porto e sua mulher D. Maria Teresa Osório427. Em 1758, segundo o reitor Joaquim da Cunha e Sottomayor, desta paróquia, havia, na freguesia de São Vicente de Alfena seis capelas, referindo que a primeira estava em Cabeda, na quinta do capitão Vicente Ferreira (de Alfena), sendo ele próprio o administrador e que era da invocação de Nossa Senhora da Piedade428.
420 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.196v. 421 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.78.
422 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.12-22. 423 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.30-50. 424 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.335
425 ADP, E/27/4/2-6.1, fl. 154. 426 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.7.
427 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.167v 428 TT, MPRQ/2/254.
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Esquema genealógico do capitão Francisco da Silva Portela
Fonte: ADP, E/27/4/2-6.1.
Na freguesia de São Martinho do Campo registam-se dois alferes: Manuel Jorge e mulher Quitéria Luísa de Sousa Neves que viviam em Valongo e que em 1748 foram padrinho e madrinha de Amaro, por sua vez, filho de António Bento e de sua mulher Joana da Silva, de Luriz429; nos dois anos seguintes (1749 e 1750), José, solteiro, foi referenciado como sendo filho do alferes Amaro Ferreira da Costa430. O capitão Luís Ribeiro de Figueiredo, casado com Teresa Campelo431,
apadrinhou várias crianças entre 1718 e 1731432, e eram proprietários, em 1726, da escrava Marcelina que tivera uma filha433, em 1726. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, documenta-se, em 1737, Manuel Luís, “soldado raso”434, casado com Maria João, moradores no lugar da Ermida; Manuel Luís, e mulher Maria Antónia, do lugar de Ermesinde435. No século XVIII identificam-se alguns capitães como Francisco da Vale (Agrela) que tinha três filhos: Manuel do Vale, ainda solteiro em 1709, uma irmã chamada Maria436, e um irmão de nome João que morava na aldeia de 429 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.209v.
430 ADP, E/27/4/3-10.1, fls.213 e 215v. Com efeito, em 1749, aparece como alferes Amaro Ferreira da Corredoura. Contudo, no ano seguinte, é designado como alferes Amaro Ferreira da Costa. 431 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.108.
432 ADP, E/27/4/5- 20.2, fls.46,50v e 59v. 433 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.137. 434 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.122. 435 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.135.
436 ADP, E/27/4/4-15.1, fls.43v e49v. 122
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Sá437; em 1760, faleceu D. Patroninha Teresa de Sousa, viúva do capitão João Figueiredo Maciel, tendo deixado testamento escrito, pelo qual havia instituído que sua filha D. Perpétua Angélica lhe faria os “bens da alma” e envolveria o seu corpo no hábito das freiras de Santa Clara do Porto. Foi enterrada um dia depois da sua morte438; morava no lugar de Ermesinde, onde, em 25 de Setembro de 1749 lhe falecera o escravo Manuel que fora inumado no adro da igreja de S. Lourenço, na manhã seguinte ao seu falecimento, pelo padre coadjutor José Luís439; e a escrava Maria, inocente440, falecida a 18 de Fevereiro de 1756. Do primeiro quartel do século XIX, identificamos o capitão Lourenço Ferreira, filho de Manuel Lourenço Ferreira e de Maria Martinha, casado com Maria Ferreira441, e em 1832, o capitão António José Ferreira442. Do tempo da guerra entre liberais e absolutistas, citam-se o soldado Manuel Gonçalves e mulher que, em 1833, baptizaram suas filhas gémeas Antónia Maria e Margarida das Dores443, e o soldado Manuel José Pires, do
Regimento de Infantaria de Chaves, casado com Francisca Ribeira, que em 2 de Março sacramentaram sua filha Maria Sebastiana444.
Na freguesia de Santo André de Sobrado, registam-se os soldados André António e Domingos Gaspar445, que foram padrinhos de duas crianças entre 1665 e 1668 respectivamente, e o soldado de nome João que morreu em 1666, e era filho de João Dias, do lugar da Costa446.
Da segunda metade da centúria de Seiscentos enumeram-se o capitão Manuel de Sousa, (1659)447 e o capitão Gonçalo Luís que em 1678 era proprie-
437 ADP, E/27/4/4-15.1, fls.40v e 43v. 438 ADP, E/27/4/4-16.1, fl. 222v. 439 ADP, E/27/4/4-16.1, fl. 195v. 440 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.214v. 441 ADP, E/27/4/4-16.2, fl. 5.
442 ADP, E/27/4/4-16.2, fl.64.
443 ADP, E/27/4/4-16.2, fls.68 e 69v. 444 ADP, E/27/4/4-16.2, fl.68.
445 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.73 e 78v. 446 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.191.
447 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.69v. 123
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tário dos escravos Cristiano e Isabel que em 19 de Abril baptizaram sua filha Ana448. Ao serviço do exército, na fronteira alentejana, faleceu em 2 de Junho de 1706, o soldado Manuel Carneiro, natural da aldeia da Devesa, vitimado na praça militar de Almeida, conforme uma certidão passada pelo padre frei João Baptista, da Ordem de São João de Deus, administrador do Hospital Real de Almeida na qual constava que “para elle veio doente Manoel Carneiro soldado auxiliar do Cerco do Porto da companhia do cappitam Simão Gomes da Costa em dezassete de Maio (…) e faleceo em dous de Junho”449 .
A notícia foi divulgada na aldeia por seu pai António João, que lhe mandou fazer um ofício religioso com a presença de dez padres, em 30 de Novembro de 1710. Em 1712 morreu no Hospital de Elvas, o soldado Manuel, solteiro, filho de José Ferreira e de Maria Moreira450, e outro chamado Luís451; em 1725, o soldado Manuel Francisco, do lugar de Ferreira452, e em 1727, há notícia do soldado Manuel António453. Em 1738, Manuel Martins, do lugar de Ferreira, mandou fazer um ofício litúrgico pela alma de José Martins, seu filho, soldado por “nam saber delle há mais de quinze annos”454. Em 1770 faleceu Manuel, solteiro, “soldado do
regimento 121 he coronel brigadeiro Dom António de Lencastre”455; em 1809 o soldado pago, do lugar da Devesa, ao qual lhe foi feito um ofício de corpo presente com o acompanhamento de sete clérigos, que sepultaram o seu corpo embrulhado em hábito de religião aprovada456. Na freguesia de São Mamede de Valongo foram contabilizados vários militares. Desde logo o soldado Manuel Pinto (morto em 1725), casado com Josefa das Neves457; João Marques (1729) que em 4 de Setembro de 448 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.103. 449 ADP, E/27/4/5-20.1, fl.129v. 450 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.309v. 451 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.310.
452 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.329v. 453 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.40v. 454 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.40.
455 ADP, E/27/4/6-21.4, fl.224. 456 ADP, E/27/4/6-22, fl.511v.
457 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.209 e 209v. 124
Joel Silva Ferreira Mata
1729, baptizou João, seu filho, e de Andresa Marques, solteira. A cerimónia foi realizada pelo pároco Manuel de Sousa Dias458; Manuel Dias (1744)459; Manuel Rocha (1747)460; Domingos Álvaro Correia, filho de Maria, solteira, e pai de Maria e de Ana; a primeira foi baptizada em 14 de Março de 1784 e a segunda em 18 de Outubro de 1785461; Carlos António, soldado do “Regimento Numero Primeiro da Quarta Companhia”462, em Setembro de 1809; João, homem solteiro, filho de Teodósia da Costa, residente na Rua dos Bacelos463, sepultado em Fevereiro de 1813. Foi cabo-mor, documentado entre 1779 e 1792, António Paiva Porto, casado com D. Rosa Maria José. Teve uma filha, D. Ana Constança Rosa, casada com o alferes Tomás José dos Santos464. Em 1725 já havia falecido o sargento-mor Manuel de Sousa, casado com Luzia de Sousa, deixando órfã sua filha Joana que neste ano aparece como madrinha do filho de Isidoro da Fonseca e de Vitória Marques465.
No século XVIII, há referências a vários alferes que aparecem na qualidade de pais ou de padrinhos: António Loureiro da Fonseca, casado em primeiras núpcias, com Maria Antónia (1711)466; e em segundas núpcias com
Teresa Gonçalves, baptizou em 31 de Maio de 1714, a filha Teresa estando a cerimónia a cargo do abade Manuel de Sousa Dias, por comissão do reitor André Alão Durão467; João de Sousa Couto e mulher Maria de Sousa (1712)468; do mesmo ano, Domingos Álvares Fontes469; Manuel Lopes Pimentel (1725)470; Manuel Dias da Fonseca (1746)471; Manuel Jorge da Costa, casado 458 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.209 e 209v 459 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.33.
460 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.102.
461 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.116v e 148. 462 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.56.
463 ADP, E/27/6/3-11.3, fl.83v.
464 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.39v, 74, 120, 210 e 263. 465 ADP, E/27/6/1-4.1, fl. 213. 466 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.13v. 467 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.50v. 468 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.31v 469 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.33.
470 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.203v. 471 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.67v.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
com Quitéria Luísa de Sousa Neves, de quem teve três filhos: João, Teresa e Vicente, nascidos em 1759, 1762 e 1763, respectivamente472; Amaro Ferreira da Costa, casado com Maria Antónia. Teve um filho, Manuel Ferreira da Costa, casado com Brites Marques Padilha, e uma filha, de nome Ana, em 1759473; António Pereira de Araújo (1759) casado com Maria Antónia. Teve dois filhos: António e a Rita, 1761 e 1763, respectivamente474. Do último quartel da centúria de Setecentos identificamos três alferes: Tomás José dos Santos, casado com D. Constância Rosa, de quem teve cinco filhos: António (1779), Manuel (1781), Tomásia (1786), Casimiro (1789) e o Tomás (1792)475; Manuel Jorge da Costa, casado com Quitéria Luísa de Sousa476; João José Lopes Dias, filho do alferes José Dias da Fonseca, e casado com Ana Gonçalves477. Esquema genealógico do alferes Tomás José dos Santos
Fonte: ADP, E/27/6/2-7.1.
Em 1758, o reitor Teodósio de Vasconcelos Portugal, responsável pelas respostas dadas ao questionário ordenado por D. José, a propósito do estado do reino após o terramoto de 1755, em Lisboa, na resposta 17 “Se ha couto, cabeça de concelho, honra ou behetria?”478, o reitor denuncia a acção abusiva e arbitrária do capitão José Pereira Enes, morador na freguesia de São Mamede de Valongo que juntamente com o seu alferes Amaro Ferreira da Serra, resi472 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.34v,114v, 136 e136v. 473 ADP, E/27/6/2-6.1, fl.39v.
474 ADP, E/27/6/2-6.1, fls. 88-88v e 132v.
475 ADP, E/27/6/2-7.1, fls.39v, 74v, 159, 210 e 263. 476 ADP, E/27/6/2-7.1, fl.141. 477 ADP, E/27/6/2-7.1, fl.294. 478 ANTT, MPRQ/8/76.
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dente na freguesia de São Martinho do Campo, “obrigão os moradores das ditas partes que ficão dentro da demarcação a hir aos seus alardos fazendo delles seus soldados sem embargo de terem prazos da dita excelentíssima Mitra479, não respeitando ainda as delimitações do território impostas na doação régia, sem qualquer oposição. De facto, esta manifestação dos militares percorrendo o território mostra, de forma inequívoca, que muitos dos que aqui foram identificados exerciam o seu ofício neste território concelhio. No século XVIII anota-se a presença de diversos capitães que viviam na freguesia de São Mamede de Valongo; em 1712 encontramos Vicente de Sousa, casado com Águeda Antónia, de quem teve uma filha chamada Rosa em 1716480. O já referido capitão José Pereira Enes foi casado com Ana da
Silva Loureiro, e é já nomeado em 1754, aquando do baptizado de Bruno, filho de Pedro e de Rita, seus escravos, sendo a cerimónia realizada na paróquia de S. Mamede de Valongo, pelo padre Joaquim de Sousa Dias481. Teve, vários netos: António (1769), Ana (1770), Joaquim (1772), Ana (1773), José (1774), Beatriz (1776), José (1774), Joaquim (1773), António (1774) e Belchior (1776)482, entre outros. A repetição do nome, a vários filhos do mesmo casal, era uma prática frequente e acontecia por duas razões: ou porque o primeiro filho já havia falecido quando nascia o segundo, ou temendo-se a morte de qualquer um deles, sempre ficaria o outro ou outra, sobretudo quando lhes era atribuído o nome do pai ou da mãe para assegurar “um nome de família”483.
A sucessão deve ter caído no capitão Bento José dos Santos, casado com Ana Marques das Neves484, pai do alferes Tomás José dos Santos, por sua vez, casado com Ana Constância Rosa485. Em 1760 aparece Manuel João, por apelido, o “capitão da Carriça”, e mulher Ressureição da Rocha486. 479 ANTT, MPRQ/8/76.
480 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.22e 70-70v. 481 ADP, E/27/6/2-5.2, fls.67v
482 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.52, 52v, 80v, 94, 95v, 99v, 115v, 141v, 155, 183, 139v, 156, 157v e 175v. 483 LEBRUN, François (s/d) – ob. cit., p.116. 484 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.110-110v.
485 ADP, E/27/6/2-7.1, fls.39v, 159, 210 e 263. 486 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.10v e 57-57v.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Esquema genealógico do capitão Vicente Ferreira
Fonte: ADP, E/27/6/2-7.1.
Estes militares estabeleceram, entre si, relações de solidariedade familiar estando presentes nos baptizados dos filhos uns dos outros, na companhia de outras pessoas ilustres não só do território valonguense como do exterior, ligados à administração pública ou à Igreja que assistiam presencialmente ou por procuração. O chanceler da Relação do Porto, António Álvares da Silva e António Luís Pereira Pinto, seu ajudante, que se fez representar no baptizado da filha mais velha do alferes Tomás José dos Santos, por frei António São Guilherme487; nos restantes filhos foram convidados para padrinhos e madrinhas António José de Almada e Melo, e sua mulher D. Ana Joaquina Alencastre; o doutor José Vicente de Sousa Magalhães; D. Maria Leonor Gerardo representada pelo padre José Joaquim dos Santos488; o desembargador Alexandre Nunes de Gusmão, morador na cidade do Porto489; e Carlos Vieira de Melo, coronel de Infantaria Auxiliar do Porto490.
487 ADP, E/27/6/1-4.2, fls. 110-110v. 488 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.187. 489 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.187.
490 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.221v. 128
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Esquema genealógico do capitão José Pereira Enes
Fonte: ADP/E/27/6/1-4.2
1.6.2 – Os soldados que tombaram na guerra Com a restauração da independência proclamada no dia 9 de Janeiro de 1640, o país entrou numa guerra muito longa com Espanha. O desenrolar do percurso político-militar não evitou a concentração de tropas que durante anos consecutivos vigiavam a extensa linha de fronteira entre vizinhos e beligerantes. Em 1659, correu a notícia que cinco filhos da freguesia de São Mamede de Valongo, alistados como soldados, morreram em Janeiro desse mesmo ano, na fronteira do Minho, de doença: Manuel, filho de Maria Marcos, viúva, moradora na Rua da Senhora; Manuel, filho de Gonçalo Gonçalves, de Susão; Manuel, filho de António, do Largo; André, filho de Benta Gonçalves, viúva, domiciliada na Rua de Santo Antão, e outro Manuel, que era filho de outra viúva chamada Catarina Antónia, mulher pobre, e que residia na Rua Velha491. Na fronteira de Elvas havia falecido o soldado Manuel, filho de Pedro Gaspar e de Isabel Duarte, conforme constava de uma certidão que seu pai mandou tirar492. Na guerra que se travava no Alentejo, em 1679, tombou o 491 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.95v.
492 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.104v. 129
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
soldado António, solteiro, por alcunha, o belinha; era filho de Pedro Gaspar e de Isabel Duarte, do Largo. Fez testamento antes de partir, no qual estabeleceu a repartição dos seus bens pelos seus irmãos493. Em lugar que não foi registado, morreu o capitão Manuel da Fonseca, filho de Domingos da Fonseca e de sua mulher Paula Benta, já defunta494, em 1661. Na Galiza, em 1664, caiu o soldado André, filho de Catarina André, viúva de Susão495. Sendo pobre ficaram ao encargo da mãe os “bens da alma”, já que partiu para a guerra sem ter feito testamento. No mesmo ano, no Brasil, na capitania da Baía, morreu, como soldado, Manuel Gonçalves, filho de pai homónimo e de Maria Gonçalves, ambos defuntos. A sua família vivia nas proximidades da paroquial de S. Mamede de Valongo, sendo seu tutor, o irmão que lhe mandou fazer as exéquias fúnebres, com a presença de apenas seis padres, por não ter condições para mais496. Em 1689, no mês de Junho, faleceu, em Sevilha, o soldado Manuel Luís, homem solteiro. Deixou uma escritura na qual designava um legado pio, de sete missas, das rendas de um campo que possuía na freguesia de Santo André de Sobrado, e de outro que estava situado algures na Ponte das Casas do Sapal. Nesse testamento indicou como beneficiários Manuel Luís, o labata, e sua irmã Maria Luís497. No início do século XVIII regista-se o óbito de vários soldados. Em 16 de Setembro de 1707 foi realizado o primeiro ofício religioso, com a presença de cinco padres, pela morte divulgada do soldado João Marques, filho de José Alvares, que havia já falecido em 1705, na campanha de Badajoz. Tinha estado doente e internado no hospital de Elvas. Foi enterrado em lugar desconhecido498. Nesta mesma campanha morreu o soldado João, filho de Domingos Manuel, viúvo, da aldeia de Susão. O pai mandou rezar, por sua alma, um ofício, em 15 de Março de 1706, pelo reitor André Dias Alão499, assim como o
493 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.282v. 494 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.102.
495 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.101v. 496 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.105.
497 ADP, E/27/6/1-3.2, fls.331v-332. 498 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.312v. 499 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.377v. 130
Joel Silva Ferreira Mata
seu companheiro de armas, da mesma patente, Tomé da Rocha, solteiro, que no seu testamento deixou indicações precisas sobre os bens da alma500. Com o mesmo nome, faleceu, em São Mamede de Valongo, em 1707, com todos os sacramentos, outro soldado, filho de Mateus Álvares. Foi sepultado no interior da igreja, com um ofício de corpo presente, e acompanhamento de sete padres501. No mesmo ano, morreu em Espanha, o soldado
João Álvares, cuja notícia trágica da sua morte teria sido trazida por outros soldados que haviam regressado à freguesia, em Abril do ano seguinte. O ofício fúnebre foi mandado realizar, por sua mulher Mariana da Rocha502.
Em 16 de Junho de 1708 foi celebrada uma missa pelo falecimento do soldado António de Sousa que também combatia em Espanha. Os companheiros que regressaram deram a notícia a sua mulher Maria Lopes, que seu marido havia falecido no dia de S. Bartolomeu503. A mesma sorte teve
o soldado José Dias, o manco. A notícia de sua morte foi divulgada pelo soldado João Carneiro que afirmou tê-lo visto morrer em batalha. A sua mulher Maria Gonçalves mandou rezar uma missa pelos bens da alma504.
Ao serviço da coroa, no Brasil, na capitania da Baía, morreram os soldados: Baltasar, solteiro, filho de Baltasar Gonçalves e de Francisca Manuel. Os seus bens foram distribuídos por Simoa Martins, sua irmã, e por Manuel Álvares, seu cunhado e outros herdeiros que estavam obrigados a realizar os ofícios religiosos em memória do defunto, ocorrendo o primeiro em Junho de 1686505; Manuel, solteiro, filho de António João, o baeta. Antes
de partir assegurou os rendimentos necessários para sustentar os pais506;
Manuel, solteiro, filho de Catarina Luís, que deve ter falecido por volta de 1686507. De morte natural sucumbiu o soldado pago, Manuel António das Neves que vivia na freguesia de São Lourenço d’Asmes, no lugar da Cancela, 500 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.376.
501 ADP, E/27/6/1-3.2, fls.313v-314. 502 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.315.
503 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.315v.
504 ADP, E/27/6/1-3.2, fls.317-317v. 505 ADP, E/27/6/1-3.2, fls.328-328v. 506 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.328v. 507 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.335.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
e que faleceu em 30 de Julho de 1790, sendo as cerimónias fúnebres realizadas pelo coadjutor Custódio de São José da Costa Ferreira508.
1.6.3 – Os proprietários de escravos A escravatura era uma prática conhecida desde os povos da antiguidade. Na Grécia, o cidadão podia perder a liberdade por dívidas insolventes. Os romanos consideravam o escravo como parte integrante dos despojos de guerra. Na Idade Média, com algumas variantes, mantém-se a perda de liberdade, por exemplo, para cumprimento de penas judiciais. Com a expansão portuguesa, a África foi, sem dúvida, o alforge que fornecia escravos que enxameavam as cidades portuguesas, como Évora e fundamentalmente Lisboa. Na capital, no século XVI, estima-se que cerca de 10% da população fosse de origem negra, na condição de “peças”. O cronista Gomes Eanes de Zurara, descreve, por meados do século XV, de forma pungente, o quadro dramático da repartição do quinto das “peças” e “meias peças” – nome dado aos escravos juvenis e possantes, no primeiro caso, e das crianças, mulheres e adultos, no segundo, que os “repartidores”, homens que separavam as mães dos filhos, dos pais, das irmãs, conforme a vontade do comprador, na praça de Lagos509. Faziam parte do espólio testamentário como qualquer objecto de valor, roupa de cama, bens patrimoniais rurais ou urbanos, cavalos, jóias ou moeda. Por razões diversas, o escravo podia alcançar a sua liberdade através de uma carta de alforria, tornando-se um súbdito com direitos e deveres como qualquer outro português. Casava, comprava e vendia propriedades e tornava-se arrendatário sem qualquer discriminação.
Com o advento do comércio promovido pelos portugueses entre o Oriente, a África e o Brasil, o transporte negreiro irá tomar proporções elevadas, conduzindo à quebra populacional sobretudo no reino antigo do Manicongo e de Angola. A partir do século XVI, todos os grandes senhores aristocratas, burgueses, clero secular e regular, oficiais do exército tinham serviçais de origem negra. Por exemplo, algumas das freiras do mosteiro 508 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.163v.
509 ZURARA, Gomes Eanes (1989) – Crónica do descobrimento e conquista da Guiné. Nota introdutória, actualização do texto e notas de Reis Brasil. Mem Martins: Publicações Europa-América, p.97. 132
Joel Silva Ferreira Mata
de Santos, em Lisboa, que pertencia à Ordem militar-religiosa de Santiago, como Inês Garcês, no rol dos seus bens, contava com uma escrava negra e seu filho de idade entre sete ou oito anos, ou D. Maria de Mendonça que recebeu de seu irmão, o valor de trinta e sete mil réis de uma escrava que havia vendido, e que foi integrada numa lista onde constavam colheres e garfos de prata510. No século XIX o visconde Sá da Bandeira, baluarte na defesa e intransigência da política liberal, iria proibir o comércio de escravos das colónias ao sul do Equador, pelo decreto de 10 de Dezembro de 1836. A abolição formal da escravatura em Portugal foi declarada em 18 de Agosto de 1856511. No território do actual concelho de Valongo havia três categorias sociais que possuíam escravos para o desempenho de tarefas domésticas, na cozinha, na reparação de celeiros, casas e outros edifícios, e nos campos: os militares, os proprietários fundiários e o clero secular. A proveniência dos escravos é diversa e abrange as colónias de Angola, da Costa da Mina e do Brasil.
1.6.3.1 – Os militares Entre os militares, os capitães são aqueles que mais escravos possuíam, talvez porque alguns tivessem prestado serviço nas colónias. Em meados do século XVII, o capitão Manuel de Sousa tinha dois escravos: Isabel “preta” e Cristiano “preto” que baptizaram sua filha Ana “negra” em 19 de Abril de 1678512; em S. Martinho do Campo, o capitão Luís de Figueiredo possuía
a escrava Marcelina que tivera uma filha Ana, baptizada em 27 de Julho de 1726513; em Valongo, o capitão José Pereira Enes era o grande proprietário de escravos tanto femininos como masculinos. Em 1754 nasce o Bruno, filho de Pedro e de Rita, ambos escravos que viviam na casa do capitão, e no ano seguinte os mesmos geraram a escrava Custódia, sendo ambas as crianças baptizadas pelo padre Joaquim de Sousa Dias514. 510 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.423 e 428.
511 MIGUEL, Carlos Frederico Montenegro de Sousa (1981) – «Escravatura», in Dicionário História de Portugal, vol.I, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, pp. 421-424.
512 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.103. 513 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.137.
514 ADP, E/27/6/2-5.2, fls.81v e 100v. 133
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
De Angola chegaram Pedro dos Santos, Zira de São José e Rita da Costa, que entre 1758 e 1762 geraram Francisca, Joana e Quitéria515; em 1774 a sua escrava Custódia dos Santos teria o filho João, sendo pai um escravo de Manuel Lopes e de sua mulher Catarina Reis516; dois anos depois, Custódia dos Santos, “preta” teria outro filho mas do negro António Pinto, de nome Jerónimo, sendo padrinho e madrinha do baptizado Pedro Santos e Rita Maria517, escravos do capitão; em 1779 nasceria outro escravo de nome José, filho de António Pinto518. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, o capitão João de Figueiredo, morador no lugar homónimo tinha dois escravos: Manuel que morreu em 25 de Setembro de 1749 e Maria, criança, que faleceu em 18 de Fevereiro de 1756519. Além dos capitães, outras patentes militares possuíam “peças” humanas: em São Martinho do Campo, o alferes Amaro Ferreira da Costa possuía Maria, negra, que gerara um filho de nome Francisco, baptizado em 23 de Dezembro de 1749520; em São Mamede de Valongo, o sargento-mor Manuel de Sousa era dono de uma escrava chamada Maria que sacramentou uma filha, com o mesmo nome, em 21 de Maio de 1697, dando por pai Manuel de Oliveira521.
1.6.3.2 – Os senhores laicos Na freguesia de S. Mamede de Valongo são vários os proprietários que desde os finais do século XVII ao último quartel do século XVIII que possuíam escravos: Manuel Ramos das Neves, senhor da escrava Catarina que teve um filho com outro escravo que pertencia à viúva Maria Dias, e que foi integrado na comunidade dos cristãos em 7 de Maio de 1698522; no ano seguinte nasceu outra criança de Filipa, negra, que atribuiu a paternidade a Domingos da
515 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.5-5v,55 e101v. 516 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.152v.
517 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.183-184v. 518 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.36-37v.
519 ADP, E/27/4/4-16.1, fls.195v e 214v. 520 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.124. 521 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.75.
522 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.86v. 134
Joel Silva Ferreira Mata
Silva, natural da freguesia de S. Salvador de Arouca; era pertença da casa de João Marques das Neves. Foi madrinha Maria, escrava do sargento-mor Manuel de Sousa Costa523; no início do século XVIII a negra Filipa, da casa da viúva Catarina da Rocha, deu à luz Antónia, e indicou por pai João Pinto, solteiro, filho de Manuel Pinto, da Rua do Sapal, em Valongo524. A proprietária Ventura Dias Sampaio era possessora da escrava Maria Dias que, com António de França, por sua vez, escravo de Pedro de França, teve uma filha Custódia baptizada pelo reitor Joaquim de Sousa Dias no dia em que nasceu. No ano seguinte nasceu outra filha de nome Maria525; Teresa Loureiro de Jesus, viúva, havia comprado um par de escravos naturais da Costa da Mina, que em 1762 foram pais de João526, e de Rita em 1765527; Manuel Lopes e sua mulher Catarina dos Reis eram donos do escravo António Pinto referenciado em 1774528.
Na freguesia de São Lourenço d’Asmes –, que no século XVIII tinha vários pólos de desenvolvimento económico e social que iam para além do núcleo embrionário em torno da paroquial da invocação de São Lourenço –, encontramos referências a escravos comprados por senhores laicos nas seguintes povoações: no lugar de Sá, Manuel Martins, senhor do escravo Mateus que morreu em 11 de Outubro de 1753 “sem sacramentos por falecer repentinamente”529, e foi enterrado no mesmo dia, à tarde, “por
não poder admitir dilação”530; no mesmo ano foi sepultado outro escravo do mesmo proprietário, sem sacramentos “por falecer repentinamente e por cahir de uma árvore abaixo”531; em 1762 perdeu a vida, o escravo Caetano que pertencia a casa de Francisco Lopes532. No lugar oposto de Vilar de Matos sucumbiu o escravo Miguel, da casa do celibatário Manuel António533;
523 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.96v.
524 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.145.
525 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.118 e 150. 526 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.114 e 115. 527 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.26.
528 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.152v
529 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.206. 530 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.206. 531 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.206. 532 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.208.
533 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.183v. 135
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
no lugar de Ermesinde a escrava Engrácia foi adquirida pela viúva Maria Fernandes, e morreu pouco tempo depois de ter sido comprada; era de menor idade “e não recebeo sacramento algum por não estar cathaquizada na doutrina christão nem se entender por ter vindo a poucos tempos dos Braziis”534.
1.6.3.3 – O clero secular Os abades, reitores e clérigos também tinham capacidade económica para comprar escravos que eram utilizados no trabalho quotidiano de suas casas. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, o reverendo abade Francisco Caetano perdeu a escrava Marcela em 6 de Janeiro de 1749535; em 1740 foi
baptizado um escravo do capelão João Manuel, que tinha aproximadamente sete anos de idade536. Na freguesia São Vicente de Alfena, em 1717 foi admitida ao “rito de passagem” Antónia, filha de Vitória “preta forra e escrava do reverendo de Alfena”537; na freguesia de São Martinho do Campo, o abade João da Fonseca, em meados do século XVIII possuía o escravo José que teve um filho em 1745, com a escrava Maria, propriedade de Amaro Ferreira da Costa538.
A reprodução dos escravos tanto podia acontecer na casa de um só senhor como podia resultar do cruzamento de indivíduos que viviam em casas separadas. Entre outros, citemos o escravo José, que pertencia ao reverendo de São Martinho do Campo que teve um filho com a escrava Maria, estante em casa de Amaro Ferreira da Costa, em 1745539; António Pinto, de
casa de Manuel Lopes e de sua mulher Catarina dos Reis, que gerou um filho chamado João com Custódia dos Santos, assistente na casa do capitão José Pereira Enes540, ou ainda o caso de António França, escravo de Pedro França
534 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.224v. 535 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.193v. 536 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.133v. 537 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.68.
538 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.200v. 539 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.214. 540 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.152v.
136
Joel Silva Ferreira Mata
que teve uma filha de Maria Dias, da casa de Ventura Dias de São Paio541, ou de Francisco, negro, e de Maria, negra, ambos solteiros, ele escravo de Maria Dias viúva e ela do capitão Vicente de Sousa542. No quadro que se segue, arrolamos os possessores de escravos distribuídos pelas categorias estabelecidas e por lugares do território valonguense globalmente considerado. Quadro n.º 12 – Proprietários de escravos (sécs. XVII-XVIII) Tipologia de proprietários
Militar
Laica
Religiosa
Proprietários
Fonte(s)
capitão Gonçalo Luís (Alfena)
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.103
capitão José Pereira Enes (Alfena)
ADP, E/27/6/1-4.2, fls.36-37v e 183-184v
alferes Amaro Ferreira da Costa (Alfena)
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.214; E/27/6/1-3.2, fl.75
sargento-mor Manuel de Sousa (Alfena)
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.75
Manuel Martins (lugar de Sá)
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.206
Maria Fernandes, viúva (lugar de Ermesinde)
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.224v
Francisco Lopes (lugar de Sá)
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.228
Manuel António (lugar de Vilar de Matos)
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.183v
José Campelo (Campo)
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.14v
Teresa Loureiro de Jesus, viúva (Valongo)
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.26
Manuel Lopes e Catarina Marques (Valongo)
ADP, E/27/6/1-4.2, fls.62-62v e 152v
Pedro França (Valongo)
ADP, E/27/6/2-6.1, fls.52-52v
Ventura Dias de Sampaio (Valongo)
ADP, E/27/6/2-6.1, fls.52-52v, 114-115 e 150
Manuel Ramos das Neves (Valongo)
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.86
João Marques das Neves (Valongo)
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.86v
Catarina Rocha, viúva (Valongo)
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.133v
Jacinto de Oliveira Santos (Valongo)
ADP, E/27/6/2-5.2, fl.117
João Manuel (capelão de Ermesinde)
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.133v
Francisco Caetano (abade de Ermesinde)
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.193v
João da Fonseca (abade de São Martinho do Campo)
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.72v
541 ADP, E/27/6/2-6.1, fls.52-52v. 542 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.181v.
137
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
1.6.4 – A “aristocracia” letrada do território 1.6.4.1 – Os eclesiásticos A vida local, em certa medida, desenvolve-se em torno da igreja paroquial, confiada a um ou vários membros da clerezia, que no actual território do concelho de Valongo, na cronologia estudada aparecem com vários designativos: padre, padre-cura, vigário, clérigo, reitor, reverendo, pároco encomendado, coadjutor, abade, cura, diácono, reitor velho, padre de missa, capelão e presbítero, além de licenciados e de clérigos in minoribus. O eclesiástico era, localmente, a pessoa letrada mais importante e a ele recorriam muitos paroquianos para tratar da sua correspondência, ler testamentos, e agir como testemunhas de diversos actos administrativos. Sempre que havia inquirições na freguesia, os enviados régios interrogavam, em primeiro lugar, o clérigo que dava todas as informações acerca da igreja, a quem pertencia a apresentação, e sobre propriedade adstrita à igreja local, além de outras elementos indispensáveis à elaboração da acta da inquirição. Uma boa parte dos sacerdotes, que serviram as freguesias aqui representadas, eram naturais das mesmas, portanto, filhos de famílias, quase sempre influentes no lugar, como se pode ver a propósito dos bens da alma, embora muitos párocos fossem de condição sociofamiliar bastante humilde. Eram naturais da freguesia de São Vicente de Alfena, o padre Francisco Álvares (1625), do lugar de Punhete543, Manuel Henriques (1719-49), do lugar
de Baguim544; António Moreira da Fonseca (1720-55), do lugar da Rua545; José Martins (1723-54), do lugar da Rua546; Luís Moreira (1728), de Punhete547; Vicente Pereira Alves (1736), natural de Cabeda548; Vicente Moreira (1782), de Alfena549; Vicente Moreira (1806), de Punhete550; Joaquim de Almeida 543 ADP, E/27/4/2-5.1.fl.49; 49v.
544 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.137. 545 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.30v; 156.
546 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.137. 547 E/27/4/2-6.1, fl.52v; 53v; 148v. 548 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.78v.
549 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.137. 550 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.137. 138
Joel Silva Ferreira Mata
(1806), de Alfena551; Vicente Moreira Pontes (1813-26), de Punhete552. De São Mamede de Valongo referem-se como sendo naturais desta freguesia Domingos Marques (1628-51) que foi reitor553, e Amaro Álvares (1639-43), mencionado como padre554. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, a responsabilidade estava no abade, que era a dignidade principal, podendo ser auxiliado ou substituído por outros membros da mesma paróquia ou de outras como por exemplo de São Vicente de Alfena, cujos párocos assistem na igreja de São Lourenço d’Asmes. Quadro n.º 13 – Abades da freguesia de São Lourenço d’Asmes Data*
Nome
Fonte
1587-1589
Cristóvão Mendes
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.4; 7
1594
Rui Nogueira
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.14
1604-1617
Miguel Ribeiro
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.19v; 33
1621-1630
António Ramos
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.40;48
1632-1634
Amaro de Meireles
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.53; 55
1635-1639
António da Rocha
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.57; 61
1693-1705
José Magalhães de Araújo
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.2; 24v
1734
Francisco Carneiro
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.110v
1802-
João de Figueiredo Fragoso Abreu
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.70
* Datas limite.
551 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.137.
552 ADP, E/27/4/2-8.3, fl.15; MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A.M. (1973) – ob. cit., p.137. 553 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.185v; 80v. 554 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43v; 53v.
139
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 14 – Curas da freguesia de São Vicente de Alfena Data*
Nome
Designação
Fonte
1543
Melchior Limpo
Padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.136
1543
Simão Vaz
Padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.136
1593
Manuel Dias
Vigário
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.136
Domingos Gonçalves
Vigário
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.5v; 26
1595
Gaspar Vaz
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.5
1596-16
Manuel Alves
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.7; 40
1600
Manuel Farinha
clérigo
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.12v
1603-15
Melchior Moreira
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.19v, 35, 38v
1605
Belchior Moreira
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.23
1605
João Carvalho
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.23
1605-1610
Manuel Belchior
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.22v, 31v
1606
Manuel de Araújo
Padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.136
1606-33
Tomé Gonçalves
Reitor, reverendo, vigário
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.27v; 42v; 49; 57v
1608-39
Manuel Gonçalves
clérigo
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.29v; 67v
1610-38
Francisco Luís
Padre, Clérigo de missa
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.32, 65v
1610
Manuel Belchior
padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.31v
1625
Francisco Alvares
Padre, do lugar de Punhete
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.49; 49v
1628
Pedro Jorge
cura
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.51
1629-85
Manuel de Araújo
Padre
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.51v; E/27/4/2-5.2, fl.61v
1640
Francisco de São Luís
Padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.136
1595-1606
1658
Lázaro André
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.3v
1663
Manuel de Sousa
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.9v
1664-91
Manuel Moreira
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.13; 71
1668-94
António de São Luís
Encomendado
ADP,E/27/4/2-5.2, fl.23v;79
140
Joel Silva Ferreira Mata
Data* 1683 1685-1716 1686
Nome
Designação
Fonte
Matias Martins de Paiva
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.58v
Vicente de Araújo
Reitor, reverendo reitor
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.61v,73v; 79; E/27/4/26.1, fl.12
Santa Leão (?) de Araújo
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.62v
1688-1717
Matias Martins
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.65v; E/27/4/2-6.1, fl.18v
1689-1710
Pantaleão Pinto de Araújo
Encomendado
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.66; 127v
1691-1728
José Martins
Padre, pároco encomendado, coadjutor
ADP, , E/27/4/2-5.2, fl.71v; E/27/4/2-6.1, fl.53v
1709
José Moreira
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.122v
1710
Pedro Vicente
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.127
1710
Vicente da Maia
Padre
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.127
1716
José Martins
Padre, encomendado
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1716-38
João da Silva
Padre, in minoribus
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.15, 86vv
1716-1763
Manuel Henriques
Padre, natural de Baguim
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.15, 51; 188v
1717-37
Simão da Cunha Porto
Reitor
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.18; 27; 348v
1717-1751
Inácio Dias Alão
Padre, in minoribus; reitor
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.20, 24v; 82v
1717
António Moreira
Clérigo in minoribus
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.18v
1717
José Henriques
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.20
1718-19
André da Silva
Padre in minoribus
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.24v, 27
1718-63
Manuel da Silva
Padre, presbítero
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.21v, 25; 44v; 48v; 199
1719-49
Manuel Henriques
Padre, do lugar de Baguim
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1720-55
António Moreira da Fonseca
Padre, natural do lugar da Rua, assistente
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.30v; 156
1722
André Ribeiro da Silva
Clérigo in minoribus
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.36v
1723
José Martins
Padre, do lugar da Rua
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
141
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
1728-54
Luís Moreira
Padre, natural de Punhete
E/27/4/2-6.1, fl.52v; 53v; 148v
1731-46
Manuel Moreira Belo
Clérigo in minoribus
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.60v; 117
1733-34
Vicente Pereira do Cabo
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.66; 70v
1736
Vicente Pereira Alves
Padre, natural de Cabeda
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.78v
1739-40
José Luís
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.90; 96v
1739-65
Manuel Marques
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.89; 198v
1743-64
João Bento
Padre; coadjutor
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.106; 191; 398
1744
José Martins Fonseca
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.111
1745-48
José Martins Arruda
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.112v; 125
1747
Manuel Henriques Arruda
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.120v
1750-60
Vicente Moreira Alfena
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.130v; 178v
1750-80
António Moreira da Fonseca
Coadjutor, padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.381; 394v; MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1751
Bernardo José
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.133
1751-56
Luís dos Santos
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.134; 160v
1752-80
Jerónimo da Cunha Sottomayor
Reitor
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1752
Luís Marques
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.134
1752-65
Manuel da Silva Pereira
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.141; 197v
1753-55
Constantino da Cunha Sottomayor
Padre, reitor a partir de 1756; reverendo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.144; 161; 395v
1755
João Bento Pereira
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.155v
1756-67
Manuel Moreira da Ponte
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.158v; 190
1757
Manuel Moreira
padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.162
1758
José Pereira de Santo Aniceto
Clérigo de Ordens Menores
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.167
1759
José da Silva Alão
Padre
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.172
142
Joel Silva Ferreira Mata
Data*
Nome
Designação
Fonte
1767-80
Manuel Marques
padre, coadjutor
ADP, E/27/4/2-6.2, fl.293v; 314
1779
Manuel Luís Moreira
Padre, de Alfena
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1780-1834
José António Ferreira
Encomendado; reitor
ADP, E/27/4/2-6.2, fl.314v; 445
1781-1827
António Ferreira
Encomendado, reitor
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1782
Vicente Moreira
Padre, coadjutor, de Alfena
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
José Ferreira de Azevedo (Bastos)
padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1806
Vicente Moreira
Padre, de Punhete
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1806 (?)
Joaquim d e Almeida
Padre, de Alfena
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1813
Manuel Henriques
padre
ADP, E/27/4/2-8.3, fl.18
1813-26
Vicente Moreira Pontes
Padre, de Punhete
ADP, E/27/4/2-8.3, fl.15; MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1827-35
José Ferreira de Azevedo
Padre
MOREIRA; CARDOSO, ob. cit., p.137
1831-36
Vicente Moreira
Padre, coadjutor
ADP, E/27/4/2-8.3, fl.40; 449
1794-1803
* Datas limite.
Quadro n.º 15 – Curas da freguesia de São Martinho do Campo Data*
Nome
Designação
Fonte
1588-1609
Gaspar Dinis
Padre, abade
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.195; 28v
1609
Baltasar Peres
Coadjutor; abade
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.28v; 32v
1611-12
João Marques
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.29v; 33
1634
Damião Pinto
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.49
1639
João de Oliveira
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.53
1647-84
Rodrigo Peres
Coadjutor; abade
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.60v; 61v; 194v
1656
Manuel da Fonseca
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.71
143
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
1661-80
Francisco Peres
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.77v; 108
1662-70
João Baptista
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.79v; 90v
1663
Pedro de Sousa
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.80
1668
João da Silva
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.88
1669
António Rodrigues da Costa
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.88v
1674
João Moreira
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.95v
1675
João de Oliveira
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.99
1681
Gonçalo Fernandes
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.108
1681-81
Francisco Pereira
Reverendo padre, abade
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.110v; 120v
1683-1713
João da Fonseca
Abade
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.114v; E/27/4/3-10.1, fl.88
1685-86
João Barbosa
coadjutor
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.120v; E/27/4/3-10.1, fl.1v
1686
Manuel de Almeida
Padre
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.2v
1686
Domingos Fernandes Gil
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.2v
1688
Pedro Fernandes Gil
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.7v
1690
Francisco Ferreira Souto
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.12
1693-1707
Domingos de Sousa
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.24v; 68
1694-1704
António Gomes
Padre, coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.27; 55v
1701-04
João Beleagoa
padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.47v; 56
1704-09
Manuel de Figueiredo
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.57; 75v
1710-19
Manuel Rodrigues
Coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.77v; 112
1714-22
Amaro Pinto
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.90; 123v
1714
Manuel Álvares
Encomendado
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.90v
1714-46
Domingos de [Azevedo] de Carvalho
Reverendo, abade
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.91; 205
1714
António Lopes Duarte
Clérigo in minoribus
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.92v
144
Joel Silva Ferreira Mata
Data*
Nome
Designação
Fonte
1714
João Marques
Clérigo in minoribus
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.92v
1716
Luís de Carvalho
Padre, in minoribus
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.100
1717
João Marques Álvares de Sá
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.104v
1717-20
Manuel Rodrigues
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.107; 116
1717
Luís de Carvalho
Padre
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.107
1747
Manuel Paulino Ferreira
Padre, abade encomendado
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.209
1748-50
Teodósio de Vasconcelos (?) Portugal
Licenciado, abade
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.214v
1748-51
Manuel Coelho
coadjutor
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.212v; 217
1780-84
João das Neves Delgado
Padre, encomendado
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.190; 194
1784-1800
Joaquim Freire de Andrade Bacelar
Padre
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.194v; 2104
1784-93
João Ferreira da Costa
Padre, coadjutor
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.194v; 206
1794-97
João Jorge da Costa
Padre, encomendado
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.207v; 210
1797
Bernardo José de Castro
Padre, encomendado
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.210v
1801
Francisco João Oliveira
Padre
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.214v
1801-
Manuel José Lourenço de Castro
Abade
ADP, E/27/4/3-11.1, fl.214v
* Datas limite.
Quadro n.º 16 – Curas da freguesia de São Lourenço d’Asmes Data*
Nome
Designação
Fonte
1586-94
Jerónimo Freire
Cura
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.2; 14
1600-1602
Amador Ribeiro de Andrade
Licenciado
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.14v; 17
1602-03
Gonçalo Carvalho
cura
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.17; 18
145
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
1603
Baltasar Ribeiro
cura
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.18v
1605-07
António Vieira
padre
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.19v; 23
1611-25
Melchior Moreira
Padre, de Alfena, coadjutor do abade Miguel Valente
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.26v, 27v; 40
1620
Manuel João
padre
ADP, E/27/4/4-14.5, fl36
1621-30
António Ramos
abade
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.40;48
1630
Gaspar Coelho de Carvalho
Padre
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.49
1632-34
Amaro de Meireles
Abade, doutor
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.53; 55
1639
Manuel Gonçalves
Padre
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.62
1699
José Martins
coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.11
1700
Matias Farinha
Coadjutor; pároco encomendado (1705)
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.12; 25v
1706
João Domingues Lopes
Coadjutor, cura
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.29v; 30v
1709
Domingos da Silva
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.42
1710
José Martins
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.45v
1710
João dos Santos
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.45v
1710-25
Amaro dos Santos
Padre, coadjutor (1717)
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.45; 68v; 87
1711-42
António Manuel Varandas
Padre, diácono (1717), coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.48; 69; 91; 138
1720
Martins Farinha da Granja
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.77v
1724-26
Manuel de São Paio
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.85v; 90
1726
João Ferreira Varas
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.92v
1740
Manuel Álvares
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.129v
1742-58
José Luís
Padre, coadjutor, encomendado
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.139v; 198; 218v
1742-50
Francisco Caetano
abade
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.180v; 198
146
Joel Silva Ferreira Mata
Data*
Nome
Designação
Fonte
1750
José António
Reverendo
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.198
1755-81
Constantino de Sousa de Meneses
Abade
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.213; 239; E/27/4/4-14.6, fl.135v
1756-74
António José de Afonseca
Coadjutor, padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.215v; 219v; 242
1758-60
Alexandre Gomes da Silva
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.219v; 222v
1760-61
Manuel Lopes Coelho
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.222v; 225
1761-65
Domingos José Carneiro
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.225; 232
1766-72
Bernardo Pinto de Araújo
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.233; 240v
1774
José Ferreira de Sousa
Padre; coadjutor
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.242; 243v
1777-81
Jerónimo Marques da Silva
Padre
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.246v; E/27/4/4-14.6, fl.136
1781
Manuel Lourenço dos Santos
Padre
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.135v
1781
Inácio Dias Alão
Encomendado
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.136
1782-94
Jacinto José Pereira do Lago
Abade
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.136v; E/27/4/4-15.2, fl.18v
1782-83
António da Silva
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.136v; 138v
1784-86
António Coelho Moreira
Coadjutor
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.140v; 149v
1787-88
António Machado Coelho
Padre
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.150; 154
1789-91
Custódio de São José da Costa Ferreira
Cura coadjutor
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.156v; 188v
1792-1802
Francisco José de Araújo
Coadjutor, encomendado (1794)
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.2; 25; 70
1796-1807
Manuel Lourenço dos Santos
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.38v; 93
1802
João de Figueiredo Fragoso Abreu
abade
ADP, E/27/4/4-14.6, fl.70v
1815
João Rodrigues de Magalhães
Padre, coadjutor
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.239; 239v
147
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
1816-31
Domingos Gonçalves Maia
Padre, capelão
ADP, E/27/4/415.1, fl.244; 245; ADP, E/27/4/4-15.1, fl.56
1820-23
Manuel Joaquim Marques da Silva
Padre
ADP, E/27/4/4-16.2, fl.14v; ADP, E/27/4/415.1, fl.27v
1828-33
António das Neves
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.46v; 66v
1831
Tibúrcio Martins Carneiro
Padre, assistente
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.57; 63v
1833
Joaquim Ferreira
Padre
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.68
* Datas limite. Quadro n.º 17 – Curas da freguesia de Santo André de Sobrado Data*
Nome
Designação
Fonte
1588-1632
Jerónimo Armante
abade
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.1; 27
1634-1641
George
cura
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.27; 40
1641-53
Francisco Beliagoa Carneiro
abade
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.61v
1644-59
Pero d Sousa
coadjutor
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.45; 69v
1659-69
Ribeiro
-
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.69v; 80v
1669-80
Domingos de Sousa
Padre; coadjutor
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.80v; 94, 106v
1670-84
João da Fonseca Gois
Abade; reverendo
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.81v; 84; 114
1671
João Moreira
coadjutor
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.84v
1676-79
João Barbosa
Padre
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.100v; 105
1679
Gonçalo Fernandes
Cura
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.105v
1686
Jorge Ribeiro
Padre
ADP, E/27/4/5-19.12, fl.116v
1687
Manuel Gonçalves Belchior ?
Padre
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.108v
1685-1700
Francisco Fernandes Marques
abade
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.108v; 116
148
Joel Silva Ferreira Mata
Data*
Designação
Fonte
1687
Manuel Gonçalves de Oliveira
Nome
Padre
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.108v
1700-26
Manuel de Almeida
Padre, coadjutor
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.116; E/27/4/5-20.2, fl.17v
1701-1743
Jeremias da Silva Pereira
padre
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.116; E/27/4/5-20.2, fl.49v n
1728-29
Gonçalo Carneiro de Magalhães
Padre cura
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.19; 21
1730
Gonçalo Carneiro
Padre
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.22v
1731-42
Alexandre Gonçalo Carneiro de Melo
Padre (na ausência do abade)
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.24v; 26; 48
1734
Manuel Pacheco da Silva
Padre cura
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.32;
1743
Manuel Gaspar Baltasar
Padre
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.49v
Nicolau de Tovar e Proença
Pároco
ADP, E/27/6/1-1.1, fl.1; 103v
[…] 1820-55
* Datas limite.
Quadro n.º- 18 – Curas da freguesia de São Mamede de Valongo (1589-1825) Data*
Nome
Designação
Fonte
1589-93
Cristóvão Dias
Vigário
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.4v; 16
1592-1604
Gonçalo André
Padre de missa; coadjutor
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.15; 17; 53
1594-95
Baltasar Mendes
Coadjutor
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.22v; 28v
1597
António Dias
Clérigo de missa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.31
1598-99
João Marques
Clérigo de missa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.35;36
1599-1612
Pero Vaz de Sousa
Reitor; vigário
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36v, 41V; 72
1605
António Vieira
Padre de missa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.56
1610
André do Vale
padre
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.68
1612-13
André Barlamonte
Padre
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.72v; 75
149
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
Manuel Marques Fortuna
Padre, reitor; vigário
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.75v; 78; 68v
Manuel Fernandes
Padre
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.157; 186v
1628
Manuel Marques
Padre
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.182v
1628-51
Domingos Marques
Padre, natural deste lugar; reitor
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.185v; 80v
1639-43
Amaro Álvares
Padre deste lugar
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43v; 53v
1649-1704
Manuel Fonseca
Reverendo, padre; coadjutor
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.72v; ADP, E/27/6/1-3.2, fl.153v
1649
Domingos da Fonseca
Licenciado
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.75
1662-98
João Marques
Vigário; “reitor velho”
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.61v; ADP, E/27/6/1-3.2, fl.89
1674
Domingos Vicente (?)
padre
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.60
1674
Simão Álvares
padre
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.66
1676-82
Domingos Francisco de Lordelo
Padre
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.74; 140v
1677
Manuel Álvares
padre
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.84
1679
Domingos Marques
Beneficiado
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.97v
1687
Domingos Ferreira de Lordelo
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.3
1689
Domingos Álvares
Beneficiado na Sé do Porto
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.17
1690
Salvador do Couto
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.24
1691
António Pereira
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.29
1613-47 1621-29
1695-1715
André Alão Durão
Reitor
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.48v; ADP, E/27/6/1-4.1 fl.62
1695-99
Simão Álvares
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.49; 97
padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.102
1699
José Marques
1690
João Marques
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.104
1701-23
Simão Álvares
Encomendado pelo bispo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.121v; ADP, E/27/6/14.1 fl.170v
1702-22
António Padilha
padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.131; ADP, E/27/6/1-4.1 fl.153
1705-06
Domingos Marques do Vale
padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.177; 186v
150
Joel Silva Ferreira Mata
Data*
Nome
Designação
Fonte
1705
Manuel Marques
padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.176v
1707-10
Manuel Álvares
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.201; ADP, E/27/6/1-4.1 fl.3v
1708
Manuel do Vale da Silva
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.209v
1708
Manuel de Sousa
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.211vb
1709-29
Manuel de Sousa Dias
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.220v; ADP, E/27/6/14.1 fl.270v
1709-25
Manuel Álvares
Padre
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.224; ADP, E/27/6/1-4.1 fl.194v
1710-12
Pedro Marques Moreira
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.3; ADP, E/27/6/1-4.1 fl.21v
1710
Manuel da Cruz
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.6v
1711
Augusto Marques do Vale
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.14v
1711
Agostinho Marques
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.14v
1711
Pedro Marques da Silva
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.16v
1715-23
Pedro Marques de Oliveira
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.62v; 241v
1717
António da Cruz Duarte
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.88v
1719-64
António de Sousa Dias
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.101; ADP, E/27/6/2-6.1, fl.154
1723
Simão Álvares
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.170v
1724
Domingos Álvares Fontes
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.180v
1726
Domingos Marques das Neves
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.215
1727
Manuel Álvares de Sousa
Padre
ADP, E/27/6/1-4.1 fl.237v
1743-48
Joaquim de Sousa Dias
Padre, Coadjutor
ADP, E/27/6/2-5.1 fl.175v; 189v
1743-53
Manuel de Sousa Dias
Reitor
ADP, E/27/6/2-5.1 fl.176; 206
1751-66
Joaquim de Sousa Dias
Padre; reitor
ADP, E/27/6/2-5.2 fl.1v; ADP, E/27/6/1-4.2, fl.34
1752
Manuel de Sousa
Padre
ADP, E/27/6/2-5.2 fl.30v
1754
José Ribeiro das Neves
Padre
ADP, E/27/6/2-5.2 fl.47
1753-54
António de Sousa Dias
Padre
ADP, E/27/6/2-5.2 fl.54v; 71v
1758
Manuel Francisco Cecílio
Padre
ADP, E/27/6/2-6.1, fl.3v
1759
Simão Duarte de Oliveira
Padre
ADP, E/27/6/2-6.1, fl.39v
151
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data*
Nome
Designação
Fonte
1764-91
António Dias Álvares
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.5v; E/27/6/1-4.2, fl.244v
1766-67
José Ferreira de Sousa
Padre-cura
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.33v; [52]
1767-68
João de Sousa Fernando
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.52; 71
1767
Manuel Carneiro
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.[52]
1767-96
Afonso Gonçalves Pereira Capelo
Reitor
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.65v; 340
1768
José Ribeiro
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.67v
1768-73
António Duarte das Neves
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.72v; 139
1770-71
Manuel Martinho de Sousa
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.98v; 110
1772-75
José Ribeiro das Neves
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.117; 160v
1772-74
António Duarte
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.118; 152
1774
Francisco Pedro
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.159
1755
José Dias Lopes
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.166v
1782
Manuel Gonçalves Pereira
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.90
1785
João das Neves Delgado
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.134v
1790-94
Manuel Bento da Cunha
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.241v; 285; 288; 308v
1795
Brás José Loureiro
Padre
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.333v
1801-16
Afonso Rodrigues Pereira Capelo Barroso
1816-18
Pedro Marques das Neves
Presbítero; Reverendo encomendado
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.113; 116; 117v
1818-19
António de Oliveira
Pároco encomendado
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.120v; 124
1819-21
José Ribeiro da Silva
Coadjutor
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.124; 132v
1820-22
Francisco Moura Pinto Coelho
Reitor
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.127; 137
1822-25
Manuel Alvares de Oliveira
Coadjutor
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.135v; 150
ADP, E/27/6/3-11.3, fl.2;113
* Datas limite. 152
Joel Silva Ferreira Mata
1.6.4.2 – Os tabeliães As elites de um território rural e afastado culturalmente dos centros urbanos são assimétricas e distribuem-se por um pequeno grupo heterogéneo, formado pelos funcionários que estavam ao serviço de senhorios ausentes, do clero secular e regrante, dos prestadores de serviços de âmbito jurídico e judicial, dos doutores, licenciados, estudantes, cirurgiões, boticários, militares e os proprietários agrícolas que paulatinamente se fixam no território valonguense, e que afirmam a sua presença e prestígio através das suas casas de lavoura, que lhes conferem um estatuto de senhor honrado, homem-bom, poderoso e respeitado, de onde saíam alguns para o estudo e para a religião em diversos níveis hierárquicos, e à porta de quem, como já dissemos, pela calada da noite, eram deixadas, muitas vezes, crianças abandonadas, para aí serem recolhidas e criadas ou enviadas depois de sacramentadas, para a Roda dos Enjeitados da cidade do Porto. No território do actual concelho de Valongo não se conhecem tabeliães aqui fixados, apesar da sua importância na actividade económica, social e religiosa. O notário (tabelião) era um cargo de elevado reconhecimento e de prestígio, criado já no reinado de D. Afonso II555, a quem era confiada a
redacção dos mais diversos actos públicos e “conferia plena fé ou autenticidade aos documentos”556, dominando o “poder da escrita, que dependia da técnica e em parte da arte”557, e que se impunha quer na vida quotidiana das pessoas bem posicionadas socialmente quer no mundo dos camponeses. Tanto o rico como o pobre, senhores laicos ou eclesiásticos, se servem frequentemente da escrita pelo que ela representa, enquanto meio de gestão económica, familiar e social, quanto ao reconhecimento patrimonial fundiário monacal, da Sé do Porto, da Igreja paroquial, dos proprietários laicos 555 RIBEIRO, João Pedro (1867) – Dissertações Chronologicas e críticas sobre a história e jurisprudência eclesiástica e civil de Portugal, 2ª edição, Tomo IV. Lisboa: Academia Real das Sciencias de Lisboa, pp.71-72; BARROS, Henrique da Gama (1959) – História da Administração Pública em Portugal nos séculos XII a XV, 2.ª edição, dir. Torquato de Sousa Soares, T. VIII. Lisboa: Livraria Sá da Costa, pp.368-370; NUNES, Eduardo Borges; CUNHA, Maria Cristina de Almeida (1981) – «Martim Martins, primeiro tabelião de Guimarães», in Actas do Congresso Histórico de Guimarães e sua Colegiada, Vol. 4. Guimarães, pp.25-30. 556 NOGUEIRA, Bernardo de Sá (2008) – Tabelionado e instrumento público em Portugal. Génese e implantação (1212-1279). Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, p.21.
557 SANTOS, Maria José Azevedo (1996) – «A Evolução da língua e da escrita», in Nova História de Portugal, vol.III, ob. cit., p.626. 153
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
e dos contratos de locação que o agricultor acorda verbalmente e uma vez fixada a vontade das partes, o rogatário (tabelião) emitia o documento final558. No território do actual concelho de Valongo, o grupo dos letrados abrangia indivíduos de vários sectores sociais e profissionais patenteados nos registos paroquiais associados pela sua natureza, a certos actos grupos de familiares já referenciados. Os tabeliães constituem, em qualquer cidade, vila ou lugar, um grupo distinto e considerado, passando muitas vezes o ofício de pai para filho, com a intercessão do primeiro a favor do segundo, ao rei que, geralmente aceita. No território valonguense, a presença do tabelião é praticamente inexistente, o que de certa forma não se compreende sobretudo na freguesia de São Mamede de Valongo, dado o seu movimento social e comercial. Sempre que o povo tinha necessidade dos seus ofícios era obrigado a deslocar-se à cidade do Porto ou ao julgado da Maia para elaborar uma escritura de titularidade de um casal, de transmissão do domínio útil por nomeação, de venda ou em caso de recurso judicial quando era apanhado a ocupar uma parcela de terra em situação algo cinzenta e pouco clara juridicamente, não chegando para o efeito apenas a verbalização supostamente contratual quando se alegava a posse por doação na forma de dote de pais para filhos. Da cidade do Porto citem-se os tabeliães das notas que lavraram escrituras para os camponeses da freguesia de São Mamede de Valongo, Santo André de Sobrado e São Martinho do Campo, no século XVI: Gaspar de Couros559, Rui de Couros560, Simão Barbosa561 e Diogo Gaspar562; do julgado
da Maia indicam-se os tabeliães públicos e judiciais Brás Barbosa563, Manuel Farinha564 e Jerónimo Figueiroa565 cujas escrituras foram exibidas aquando da apegação realizada pelo licenciado Cristóvão da Costa de Sá, juiz com alçada, por comissão do Rei, do Tombo dos Bens e das Propriedades que 558 NOGEIRA, Bernardo de Sá (2008) – ob. cit., p.112.
559 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fls.30, 112. 560 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.21v. 561 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.21.
562 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.21v. 563 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.23v.
564 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fls.16v, 65v. 565 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.77v. 154
Joel Silva Ferreira Mata
pertenciam ao Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto e de todas as igrejas e mosteiros e suas anexas566. Não obstante, já em 1529, frequentava as casas de morada de Francisco de Sousa, fidalgo da casa do rei, cidadão da cidade do Porto, e juiz ordinário, o lavrador Jerónimo Vicente, morador em Valongo Susão, que em 22 de Setembro do referido ano foi testemunha de uma escritura de doação realizada por Cristóvão Rodrigues, ourives, irmão da Confraria da Santa Casa da Misericórdia do Porto, a favor deste instituto de solidariedade, sobre uns casais que o testador possuía na freguesia de Águas Santas567. Em 1536,
num diploma de doação, de certos bens fundiários localizados no julgado da Maia, à mesma Confraria, são citados como arrendatários Gonçalo Anes, da freguesia de São Vicente de Alfena e João Anes da freguesia de São Mamede de Valongo568. Também aparece referido numa escritura de venda da terça parte de uns campos e de metade de uma casa, a Catarina Anes, da freguesia de Alfena, viúva de Jorge Anes, carpinteiro, a Sebastião Martins, morador na mesma freguesia569, de 16 de Agosto, que foi lavrada pelo tabelião Gaspar de Couros. No século XVIII, identificam-se, através dos registos paroquiais, dois tabeliães que pertenciam à mesma família e em linha de sucessão directa. O primeiro é Manuel de Sousa, que ascende de João Luís, natural da freguesia de Duas Igrejas, da comarca de Penafiel, e de sua mulher Maria de Sousa570,
que casou, em primeiras núpcias com Maria Antónia, tendo, na década de 1720, dois filhos, sendo o primeiro do sexo feminino que nasceu a 15 de Março de 1726 e o segundo do sexo masculino que recebeu o primeiro sacramento a 13 de Janeiro de 1728571; e em segundas núpcias com Ana João, filha de António João, o curto, e de sua mulher Catarina da Rocha que tiveram uma filha que recebeu o baptismo pela mão do padre Joaquim de Sousa Dias, em 22 de Abril572, dois dias após o nascimento. 566 TT, Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12, fl.1. 567 AHSCMP, Série H, B.co 6, n.º 18, fls.42-44v. 568 AHSCMP, Série D, B.co 5, n.º 1, fl.27v.
569 AHSCMP, Livro de Pergaminhos, m.2, doc.113. 570 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.76.
571 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.217, 245, respectivamente. 572 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.76.
155
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
No cargo de tabelião sucedeu a Manuel de Sousa, seu filho José de Sousa, casado com Maria Jorge das Neves, 573, sendo pais de vários filhos nascidos entre 1752 e 1771, além de outros filhos e filhas identificados, por sua vez, já como pais e mães a partir de 1777 e 1794, sendo uma família constituída no século XVIII por cinco gerações embora o tabelionado familiar esteja compreendido apenas entre 1726 e pelo menos 1771, partindo do princípio que o notário José de Sousa ainda estava no exercício da auctoritas como publica persona, por altura do nascimento de sua filha Ana.
573 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.82v. 156
Teresa (1754)
157
legenda: = casado(a) com
Fonte: ADP, E/27/6/1-4.1; E/27/6/1-4.2; E/27/6/2-5.2. (1779)
Ana Maria Maria (1753) (1753) (1753)
(1752) (1767) (1769) (1771)
(1777) (1780) (1782) (1784) (1786) (1788)
José=Maria Álvares (1774)
Maria José Crispim Maria António (1785) (1786) (1788) (1790) (1794)
António Maria Manuel (1785) (1786) (1787)
José Crispiano (1789) (1790)
José Ana António Ana José de Sousa=Maria Marques João de Sousa Neves=Quitéria de Sousa Maria Jorge das Neves=José da Rocha Felgueiras Ana Jorge das Neves=Manuel da Rocha
(1756) (1757) (1758) (1762) (1764) (1765) (1768)
Maria João Ana Rita Margarida Luísa
(1752) (1755)
Ana Margarida Manuel Maria Manuel José Manuel Maria Margarida João
Quitéria Manuel José de Sousa = Maria Jorge das Neves Eufémia de Sousa=José Marques da Cruz Maria das Neves=Domingos António Lagoa José de Sousa Fernando=Maria Jorge das Neves Afonseca de Sousa=José Marques (1726) (1728)
Manuel de Sousa = Maria Antónia = Ana João
João Luís = Maria de Sousa
Joel Silva Ferreira Mata
Esquema genealógico do tabelião Manuel de Sousa
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1.6.4.3 – Os cirurgiões e os boticários Para acudir a uma população em crescimento e em trânsito sistemático havia alguns indivíduos que exerciam funções profissionais na área da saúde, nomeadamente os cirurgiões e os boticários. Não são muitos os profissionais que se dedicavam à prática da cirurgia. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, em 1719, foi baptizada uma menina com o nome de Maria, e era filha de Isabel Carneira, moça solteira, que morava na aldeia de Sá. O pároco admite ser pai da criança “por conjecturas de dentendo (sic) são sertos he pay desta criança Diogo da Silva Portella, sirurgião desta freguesia”574, o que significa que o autor da desonra não assumiu a paternidade, como aconteceu com tantos outros casos.
Diogo da Silva Portela, cirurgião da freguesia de São Lourenço d’Asmes (1719). Fonte: ADP, E/27/4/4-15.1, fl. 72v.
É provável que esta freguesia fosse atendida por outros cirurgiões que eram provenientes e naturais de outras freguesias e concelhos do exterior, pois já em 1703 nascia um menino, filho de Mariana da Fonseca que confessou ser o pai da criança o cirurgião João Pinto, natural de Lamego575. Em 1739, surge uma nova situação que envolve, desta vez, Custódia, moça solteira que denunciou o cirurgião Domingos da Silva, do lugar e freguesia 574 ADP, E/27/4/4-15.1, fl. 72v. 575 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.19.
158
Joel Silva Ferreira Mata
de Santa Maria de Landim576, que estaria a trabalhar na freguesia de São Lourenço d’Asmes, como progenitor de seu filho. Os cirurgiões faziam parte dos três sectores da área da medicina, entre os físicos e os boticários. Eram profissões masculinas, e o seu imenso saber partia, desde logo, de uma larga teoria de base tradicional e da experiência prática do tratamento e da confecção das mezinhas577. Apesar da sua impor-
tância e do seu estatuto, amplamente reconhecido, os cirurgiões eram originários do Terceiro Estado, do povo, e estavam em pé de igualdade com os lentes universitários, os tabeliães, os físicos e os mesteirais, não conseguindo descolar dentro da escala hierárquica-social para se tornar um grupo isolado e autónomo. O próprio D. Duarte, homem cuidadoso e minucioso, que dividiu o Povo em sete categorias não hesitou em colocar os cirurgiões em terceiro lugar, depois dos lavradores, dos pescadores que formavam o primeiro grupo e dos oficiais mecânicos578.
Na freguesia de São Vicente de Alfena identificamos, na primeira metade do século XVIII, alguns cirurgiões. Com efeito, em 1720, no baptismo de um filho de Vicente André e de sua mulher Maria da Silva, do lugar de Baguim, foram padrinho e madrinha do evento, o cirurgião Manuel da Silva e sua filha Ana, moça solteira, moradores no lugar de Baguim579. Este mesmo
cirurgião tinha um filho chamado André da Silva que, em 1721, era estudante, mas que se envolvera com Luzia, solteira, por alcunha, a castelhana, do lugar da Rua, e foi denunciado pela parturiente, não havendo qualquer indicação de que o estudante tivesse assumido a paternidade580 do filho.
Em Abril de 1722 surge um outro cirurgião chamado António Moreira que havia baptizado, por necessidade, um filho de Manuel da Costa e de Catarina Miguel, moradores no lugar da Codiceira, em virtude do estado de saúde do nascituro inspirar alguns cuidados por ser demasiadamente precário. Este acto foi testemunhado pelo padre Inácio Dias Alão e Manuel 576 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.126v.
577 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – Portugal na crise dos séculos XIV e XV, ob. cit., p.428.
578 DUARTE, (D.) (1999) – Leal Conselheiro. Edição crítica, introdução e notas de Maria Helena Lopes de Castro. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, cap.IV, pp.25-29. 579 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.30v.
580 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.33, 34v. 159
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Fernandes, familiares do reitor desta freguesia, Simão da Cunha Porto, que se encontrava ausente581. Presente em diversos actos religiosos, ocorridos entre 1731 e 1733, cite-se o cirurgião António Moreira Belo, casado com Isabel Martins moradores na aldeia da Ferraria, que em Fevereiro de 1733, terá assistido ao baptizado de Catarina, filha de pai incógnito e de Maria, solteira, filha de Domingas Fernandes, que era viúva582. Entre 1739 e 1752 anote-se o cirurgião Vicente da Silva, casado com Maria do Rosário da Silva, domiciliados no lugar de Baguim, e que em 11 de Agosto de 1739 foram pais de Maria, levada à paroquial três dias depois de ter nascido, pelo padre assistente António Moreira da Fonseca583. Os boticários eram indivíduos que socialmente viviam em plano de igualdade com os cirurgiões e os físicos. Tinham, quanto ao funcionamento do seu estabelecimento público e na produção artesanal das mezinhas, procuradas pelas populações que corresponder a alguns procedimentos por determinação régia. Como exemplo, veja-se o diploma dimanado por D. Afonso V, de Viana a par d’Alvito de 22 de Abril de 1449, pelo qual o monarca estabelece que os boticários tenham no estabelecimento aberto ao público “tantos remedios que valhão a quantia de mil e quinhentas coroas de nossa moeda ou valor dellas porque el Rey mandar correr dos taes tempos”584; estavam sujeitos à visitação dos físicos, gozavam dos mesmos privilégios e isenções dos doutores, físicos; recebiam todas as honras dos cavaleiros; em caso de prisão recebiam menagem; podiam trazer consigo armas ofensivas e defensivas; podiam exibir roupa luxuosa de sedas de ouro e prata, como a traziam os cavaleiros; estavam isentos de prestar certos ofícios no concelho como o de quadrilheiros, curadores, tutores, defender a fronteira, sair como porta-bandeiras; não serviam nas actividades marítimas, nem em terra; como cavaleiro ou como peão, estavam isentos do direito de pousada, isto é, de fornecer palha, cevada, lenha, galinhas, bestas, mesmo que se tratasse do Rei,
581 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.34, 35v. 582 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.36v. 583 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.91v.
584 SOUSA, Germano de (2012) – História da Medicina Portuguesa durante a expansão. Lisboa: Círculo de Leitores, p.267. 160
Joel Silva Ferreira Mata
Rainha ou dos Infantes; não pagavam impostos municipais como as fintas, as talhas; não participavam no restauro dos muros, fontes, pontes, calçadas; estavam isentos da jugada, dos quartos, dos oitavos e da portagem. Quando morria o boticário, a mulher devia manter a botica, gozando dos mesmos privilégios que haviam sido conferidos a seu marido585, equiparando-se ainda o boticário ao físico conforme o alvará de privilégio outorgado por D. Pedro, em 1360586. Por outro lado, o boticário devia possuir, para consulta, diversos livros, como a Pandecta, Mesue, Nicolau, Liber Servitoris e o Quinto Livro do Canon de Avicena587. Na freguesia de São Mamede de Valongo, cite-se o boticário Jerónimo Dias, casado com Rosa Maria de Castro, que em 4 de Março de 1723 levou ao sacramento do baptismo, seu filho António, numa cerimónia celebrada pelo padre António de Sousa Dias, irmão do pároco Manuel de Sousa Dias588. Na mesma época identificamos dois boticários na freguesia de São Vicente de Alfena: Manuel Rodrigues, do lugar da Codiceira que em 1724 teve um filho com Ana, mulher solteira e filha de Antónia Paiva da Serra, do lugar da Gandra589; em 1727, aparece Manuel Rodrigues da Silva, do lugar
da Rua, no baptizado de uma filha de António Moreira Belo e de sua mulher Isabel Martins590; em 1730, o boticário Manuel Pinto da Silva591, e em 1738, um certo Inácio da Silva Almeida, casado com Francisca Antónia Caetana, moradores no lugar da Codiceira592, que exercia o mesmo ofício.
585 SOUSA, Germano de (2012) – ob. cit., pp.268-269. 586 SOUSA, Germano de (2012) – ob. cit.,p.269.
587 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – Portugal na crise dos séculos XIV e XV, ob, cit, pp.476.477.
588 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.165v. 589 ADP, 27/4/2-6.1, fl.40.
590 ADP, 27/4/2-6.1, fl.51v. 591 ADP, 27/4/2-6.1, fl.62v. 592 ADP, 27/4/2-6.1, fl.6.
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Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Registo do baptizado do filho do boticário Manuel Rodrigues (1724). Fonte: ADP, 27/4/2-6.1, fl.40.
Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, na primeira metade do século XVIII, é citado o boticário Jerónimo Dias, casado com Rosa Maria de Castro, que em 4 de Março de 1723 realizaram o baptizado de seu filho António, num acto presidido pelo pároco António de Sousa Dias, irmão do pároco, com licença do padre Manuel de Sousa Dias593.
1.6.4.4 – Os licenciados e os estudantes Os licenciados, sem qualquer outro atributo qualificativo, aparecem na qualidade de padrinhos ou de testemunhas de baptismo. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes identifica-se o licenciado Amador Ribeiro de Andrade, sobre o qual subsiste a dúvida quanto ao seu domicílio594; da freguesia de
São Vicente de Alfena refira-se Manuel da Silva, do lugar da Rua, que foi padrinho de um filho do capitão André da Rocha e Sousa, e de sua mulher Francisca Rosa Fernandes, que foi levado à igreja em meados de Abril de 1718595, e Vicente da Silva, que foi padrinho de uma filha de Manuel da Silva e de Margarida da Silva, residentes no lugar da Rua, em 1756596; na freguesia 593 ADP, 27/6/1-4.1, fl.165v.
594 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.16. 595 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.22.
596 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.159. 162
Joel Silva Ferreira Mata
de São Mamede de Valongo são referidos os licenciados Manuel da Fonseca Marques597, em 1712; Manuel Loureiro da Fonseca598, em 1725; Domingos Álvares Fontes599, em 1727; Pedro Marques das Neves, solteiro, em 1776, filho de Manuel de Paiva600; João Ribeiro das Neves601, em 1749; Manuel Martins da Costa602, em 1759; José Loureiro dos Santos603; José Dias de Oliveira604, e João José de Oliveira605 em 1794. Além dos licenciados, há referência a alguns estudantes na primeira metade do século XVIII como Manuel das Neves (1713), Brás (1722), filho de Domingos Dias Lopes; e António de Sousa (1729), irmão de Rosa, moça solteira, filho do alferes João de Sousa Couto606. Na freguesia de São Lourenço
d’Asmes encontramos Matias da Rocha607, em 1728.
1.6.5 – Os mendigos e vadios A vagabundagem é uma prática comum na sociedade europeia desde muito cedo. Na Idade Média vários fenómenos contribuíram para o aumento de indivíduos que se dedicavam à vadiagem, fazendo desse modo de vida, a forma de garantir a subsistência, fora da esfera social, transformando-se num marginal. As guerras e as pestes, nomeadamente, em Portugal (Peste Negra)608,
alterou comportamentos mentais, sociais, familiares e profissionais. De repente, muitos dos que se dedicavam ao labor da terra, nos casais, nas 597 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.33.
598 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.230-230v. 599 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.230-230v. 600 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.177v. 601 ADP, E/27/6/2-5.1, fl. 126. 602 ADP, E/27/6/2-6.1, fl.34v. 603 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.19v. 604 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.117.
605 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.164v.
606 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.43v, 160v, 259, respectivamente. 607 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.97.
608 MATA, Joel Silva Ferreira (2012) – «As Rendas/foros do rei D. Pedro I (1357-1367) em Lisboa: ementas e contratos registados na Chancelaria», in Lusíada. Economia & Empresa, II série, n.º 14. Lisboa: Universidade Lusíada Editora, pp.87-115. 163
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
herdades e outras propriedades agrícolas tornam-se herdeiros de grandes e médias fortunas. Esta nova situação provocou uma nova identidade, uma nova atitude perante a vida. Os falsos mendigos que se transformaram em mamposteiros encapotados e que andavam de terra em terra a pedir para a construção de obras públicas, como por exemplo para o mosteiro da Batalha, constituíram uma chaga, que o rei procurou combater; a proliferação de falsos religiosos que se dedicavam à vadiagem foi denunciada no tempo de D. Duarte e seus sucessores609. No território que constitui o actual concelho de Valongo, a mendicidade deambulatória era um problema e uma forma de vida, de muitos indivíduos, tanto masculinos como femininos, não só naturais e aqui residentes mas também de fora, dos concelhos próximos e de outras freguesias da Terra e concelho da Maia, como de lugares mais longínquos do Reino. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes morreram algumas pessoas qualificadas de pobres e de muito pobres, homens e mulheres que durante anos viveram da caridade e bondade de alguns residentes que os acolhiam em suas casas e aí os deixavam dormir. Outros, porém, viviam isolados, nos palheiros, entregues a si próprios. No registo dos assentos dos óbitos, os abades – que os elaboravam – tiveram o cuidado de deixarem, para memória futura, algumas informações que nos permitem reflectir um pouco sobre este segmento social. Em 1745 morreu, de morte súbita, o mendigo Paulo Martins, sem sacramentos, que estava recolhido em casa do padre Manuel de São Paio, o qual proporcionou, ao defunto, um ofício fúnebre com a presença de dois clérigos e que foi realizado no dia seguinte, pelo padre Francisco Caetano610; no lugar de Sá vivia
o indigente Luís Álvares, que era casado com Apolónia Ferreira, que mesmo sendo pobre, teve condições para pagar ao pároco cinco alqueires de “pão e cesto”, e mandar rezar uma missa, com a presença de cinco padres, pelo coadjutor José Luís611; na aldeia de Vilar, em casa da celibatária Maria Ferreira estava, por caridade, outro mendigo chamado Manuel da Silva que desceu 609 MORENO, Humberto Baquero (1985) – Marginalidade e Conflitos Sociais nos séculos XIV e XV. Estudos de História. Lisboa: Editorial Presença, pp.37-38. 610 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.186.
611 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.211v. 164
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ao silêncio dos mortos em 1776 “do modo que se enterram os pobres”612. Na verdade, na freguesia de São Lourenço d’Asmes havia muitos pedintes de fora e que aqui aguardavam pelas esmolas dos que tinham compaixão e que aqui permaneceram até morrer, distribuindo-se pelos seguintes lugares: São Paio: em casa do padre Manuel de São Paio viveu, muitos anos, o mendigo Pascoal, solteiro, natural da freguesia de Nespereira, do actual concelho de Cinfães. Teve direito à oferta acostumada dada pelos pobres ao abade Francisco Caetano, e uma missa com a presença de seis padres613;
a mendiga Domingas Teixeira, mulher de António Lopes, igualmente mendigo, era natural da freguesia de Ribeira de Pena, comarca de Vila Real, e que morava na aldeia de São Paio “onde se recolhia”614, faleceu, sem a administração dos sacramentos, por ter morrido de repente; foi enterrada no dia seguinte, pelo mesmo coadjutor; Aldeia de Vilar: em 1754 morreu, em casa de Manuel António, solteiro, a mendiga Maria, que tinha por alcunha, a preta; era alta, rosto comprido, magra, loira, e aparentava ter entre setenta a oitenta anos de idade quando faleceu. Era natural da freguesia de Nossa Senhora da Aparecida (Barcelos). Teve um ofício de corpo presente, por esmola, oferecido pelo seu protector e, foi sepultada “como costuma sepultar-se os pobres que falecem nesta freguesia”615, pelo padre coadjutor José Luís; Lugar de Ermesinde: Engrácia Maria, solteira, originária do arcebispado de Braga: “era baixa e delgada com jeito nos olhos”616; morreu em 27 de Feve-
reiro de 1755, foi sepultada no mesmo dia, na zona destinada aos pobres; nesta condição teve possibilidade de pagar uma missa rezada e dois vinténs, em dinheiro617; da freguesia de Silva Escura (Maia), de onde era natural o
pedinte António, que morreu em 1757, sem sacramentos, por se encontrar morto num palheiro; era pobre, mendigo, de estatura baixa, e foi identificado por quem o conhecia; por sua alma “se lhe fes vesporas e o outro dia hum 612 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.244v. 613 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.189. 614 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.219.
615 ADP, E/27/4/4-16.1, fls.210-210v. 616 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.211. 617 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.211. 165
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oficio de sinco padres com o que se achou”618, no mesmo dia, à tarde, pelo coadjutor António José de Afonseca.
Excerto de um registo de baptismo, no qual se assinala o óbito de um mendigo de Ermesinde. Fonte: ADP, E/27/4/4-16.1, fl.216.
Neste mesmo ano faleceu, sem o sacramento viático “por não estar capas”619, o mendigo António, da freguesia de Santo Amaro, do concelho de Guimarães; era de estatura baixa, magro de rosto, e usava barba comprida. Foi sepultado no dia em que expirou, à tarde, no adro da igreja paroquial de São Lourenço, no espaço reservado para os pobres, também pelo padre coadjutor José de Afonseca620; em 1760 identifica-se uma certa Maria de Jesus, mendicante, desconhecendo-se de onde era natural. Não foi sacramentada por já não estar em condições para tal. O padre Alexandre Gomes da Silva fez-lhe o funeral no dia seguinte ao do óbito621; da Galiza veio viver, por caridade, para esta freguesia, Mariana que morreu em 22 de Junho de 1762; recebeu, por esmola, da Confraria das Almas, um ofício de corpo presente, a cargo do padre José Carneiro, coincidindo o funeral com a visitação pastoral à paroquial de São Lourenço622; o mendigo José Francisco faleceu em 1770 e era natural da freguesia de Cristelo (Maia) e “se lhe deu mortalha da Confraria e tudo mais que se costuma fazer aos pobres que aqui se enterram”623; foi enterrado no dia seguinte, à tarde, no adro da igreja, pelo padre António José de Afonseca; Manuel António, viúvo, pobre e mendigo, oriundo do lugar 618 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.216. 619 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.216. 620 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.216.
621 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.222v. 622 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.226v. 623 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.238v. 166
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de Ferreira, da freguesia de Santo André de Sobrado624, morreu sozinho em Ermesinde. Lugar de Sá: José, pobre, mendigo, natural que “disse ser do reino de Galiza”625, e morava nesta aldeia, num palheiro da casa de José Moura
Cunha, sendo sepultado pela Confraria das Almas, com a dignidade dada aos pobres que moravam nesta freguesia em 1780; foi enterrado no dia seguinte, de manhã, estando o serviço religioso a cargo do padre Jerónimo Marques da Silva; Manuel da Rocha, mendigo que vivia em casa de Manuel Martins de Miranda, faleceu em 1787; era viúvo, muito pobre e de cerca de setenta e cinco anos de idade; era natural da freguesia da Gandra, da comarca de Penafiel. Foi sepultado no dia seguinte ao seu falecimento, envolto num lençol, acompanhado pelos clérigos desta freguesia que lhe fizeram um ofício, por caridade, tendo assistido também o padre António Machado Coelho626. Lugar da Ermida: João Ferreira, que morava sozinho, deixou o mundo dos vivos em 1780; deu de oferta quarenta réis e outros oitenta por uma missa celebrada pelo padre substituto Inácio Dias Alão627; sob a protecção de José Lopes, deste lugar, morreu um mendigo cujo nome de ignorava; era viúvo; a meio da noite foi chamado o padre António Machado Coelho que não lhe administrou a santa-unção “por não estar ainda nos termos disso e se lha abreviou a morte mais sedo do que se esperava”628.
No século XIX a mendicidade, nesta freguesia, foi uma actividade que continuou a ser praticada por indivíduos de ambos os sexos, e que eram naturais de lugares do exterior, uns mais próximos, outros mais distantes. Natural da freguesia de Moreira da Maia, faleceu em 1809, em Ermesinde, o mendigo António; foi sepultado, envolto num lençol, numa campa do adro da paroquial de São Lourenço629; Ana Luís e António Pereira eram naturais da freguesia de São Tomé de Negrelos, e foram enterrados em 1809, com a assistência do abade João de Figueiredo Fragoso Abreu630.
624 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.165. 625 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.249. 626 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.152. 627 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.136.
628 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.152v. 629 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.208.
630 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.209v. 167
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Outros, abandonados à mais extrema pobreza e desqualificação social, de quem nem o simples nome de baptismo ficou registado, deixavam os filhos, à porta da igreja paroquial de São Lourenço, como o corpo já cadáver, de uma menina de sete anos de idade, que o abade João de Figueiredo Fragoso Abreu teve o cuidado de lhe dar sepultura, no espaço destinado aos pobres631; havia outros pobres e miseráveis que viviam em comunhão de espaço com outros com quem deviam partilhar os frutos das oblatas caritativas das gentes de Ermesinde. Assim, de morte súbita, faleceu Luís, menino de oito anos de idade que era filho de Maria, indigente, que morava em casa de Custódio Rodrigues e de Josefa Maria, todos mendigos que vieram pouco antes de 1786 para Ermesinde, sendo naturais do bispado de Aveiro632. Além dos rotulados de “mendicantes”, adjectivo sempre associado à condição de pobre, havia outros que viviam marginalmente, tendo condições para se sustentarem, através do trabalho. O vadio João António vivia no lugar de Ermesinde, e morreu em 1765. Deixou testamento tabeliónico a favor de sua filha Maria com o encargo das obrigações relativas aos bens da alma, correspondentes a dez alqueires de pão, um carneiro e o cesto acostumado; o seu corpo foi sepultado envolto em hábito da Ordem de São Francisco, conforme deixara estipulado, cabendo a presidência da cerimónia fúnebre ao padre António José da Fonseca633. Gráfico n.º 27 – Mendicidade na freguesia de São Lourenço d’Asmes (segunda metade do século XVIII)
Fonte: ADP, E/27/4/4-14.6; E/27/4/4-16.1. 631 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.220.
632 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.149v. 633 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.232.
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Na freguesia de São Martinho do Campo foram sepultados vários mendigos que eram naturais de outras freguesias ou lugares: Manuel dos Santos (1791), pobre, mendigo, da freguesia de Rio Tinto (Gondomar); resignou sem receber os sacramentos porque não lhe chamaram o padre, a tempo; foi sepultado no adro da igreja634; Lino (1810), da mesma condição, faleceu em casa de João (?) Gonçalves, da aldeia de Luriz, sem sacramentos, por não ter dado tempo; foi enterrado no adro da igreja635; um homem natural da Galiza, de nome desconhecido, indigente, que havia estado ao cuidado do hospital da cidade do Porto636, veio a falecer em casa de António Jorge Pinto, em 1813637; José, que andava a pedir e “também a vender sardinha”638; dormia, por caridade, em casa de João Moreira da Capela; foi encontrado morto, na manhã do dia 16 de Janeiro, sendo enterrado no dia seguinte, no adro da igreja paroquial, sem a indicação de que fosse realizado qualquer ofício por alma do desgraçado. Na freguesia de Santo André de Sobrado, os assentos de óbitos dão conta de que muitos dos indivíduos que morreram foram conotados como mendigos, registando logo no início do século XVIII, Maria da Silva, pedinte, de naturalidade desconhecida; foi sepultada na igreja, sendo o acto pio confiado à Confraria que, por caridade lhe mandou dizer uma missa pelo padre Manuel de Almeida639; sem nome, foi encontrado “hum pobre mendi-
cante que andava pedindo esmolas de porta em porta foi encontrado morto em hum ribeiro de Passo que he do mesmo lugar”640; era de estatura baixa, rosto curto e o “corpo cheio de barba”641. Tinha consigo meio alqueire de milho, quinze réis em dinheiro e duas camisas usadas642. Foi sepultado pela
Confraria do Santíssimo Sacramento, com a mortalha dos confrades. A ceri634 ADP, E/27/4/3-11.1, fl.201v. 635 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.213.
636 Na cidade do Porto havia vários hospitais de apoio aos pobres. O registo não refere o nome da instituição que recolhera o mendigo; terá eventualmente estado acamado no hospital de Rocamador, uma vez que esta instituição era a referência da urbe. 637 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.214v. 638 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.220v. 639 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.2.
640 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.207v. 641 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.207v. 642 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.207v. 169
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mónia religiosa esteve a cargo do padre-cura Domingos Dias da Costa, em 23 de Novembro de 1756. Na freguesia de São Mamede de Valongo, de onde era natural, faleceu o pedinte José da Rocha em 1782; foi sepultado na igreja paroquial de São Mamede deste lugar, envolto num lençol de linho, pelo padre José António Ferreira da Silva643; no ano seguinte, cite-se José de Sousa, viúvo, natural de
São Miguel de Beire; teve, por caridade, um ofício fúnebre oferecido pelo padre José António Ferreira da Silva644; Manuel Moreira, por alcunha o gaita, faleceu em 1794; era da freguesia de Rebordãos e foi sepultado apenas com o sacramento da santa-unção “por se tomar da fala e sentidos e não achar capas para os mais”645; na igreja, envolto num lençol branco, acompanhado por vários religiosos, que lhe ofereceram, por esmola, uma missa rezada pelo padre Manuel Alves Ferreira, coadjutor646; José Francisco, viúvo, da freguesia de Meinedo, morreu no lugar de Sobrado, e, desceu à sepultura, envolto também num lençol; na cerimónia fúnebre estiveram presentes três clérigos, além do padre Joaquim Barbosa que rezou a missa647; sem se lembrar do nome próprio, nem de onde viera, regista-se, em 1810, um mendigo que ainda teve tempo de receber o sacramento da santa-unção dada pelo padre substituto Joaquim Barbosa648; Joaquim “tachumba” que morreu em 1814, e foi enterrado na igreja, embrulhado num lençol; teve o acompanhamento de dois eclesiásticos e a missa foi rezada pelo abade Nicolau de Tovar649; Joaquina, mendiga, natural da freguesia de São Julião de Água Longa, foi sepultada na igreja, em 1829 amortalhada num lençol; prestaram-lhe a última homenagem três religiosos650.
643 ADP, E/27/4/6-22, fl.849v. 644 ADP, E/27/4/6-22, fl.850v. 645 ADP, E/27/4/6-22, fl.875. 646 ADP, E/27/4/6-22, fl.875.
647 ADP, E/27/4/6-22, fl.898v. 648 ADP, E/27/4/6-22, fl.513v. 649 ADP, E/27/4/6-22, fl.519v. 650 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.28v.
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1.6.6 – Alguns ciganos cristãos de Alfena Os primeiros indivíduos de etnia cigana devem ter chegado a Portugal na segunda metade do século XV651, provenientes de Castela e que rapida-
mente se instalaram em pequenos grupos em diversos concelhos de norte a sul do País, despertando a atenção, desde logo, pelo exercício de actividades ilícitas como a feitiçaria e a cartomância. Como não estavam integrados socialmente eram considerados marginais, tanto mais que muitos foram acusados, condenados, presos e degredados para a África, pela prática de crimes de furto. O incómodo e canseira que causavam à população levou D. João III, por alvará régio de 13 de Março de 1526, a proibir a entrada de ciganos em Portugal, e ao mesmo tempo, decretou a expulsão dos que aqui residiam652. As primeiras medidas, porém, não resultaram e daí a produção legislativa que irá ser produzida até ao século XIX, consagrando-se, entretanto, em 1603, nas Ordenações Filipinas um título dedicado aos ciganos, pelo qual se reitera a intransigência de entrada de indivíduos desta etnia em Portugal, sob pena de prisão, degredo e perda da sua fazenda653.
Com efeito, e apesar de todas as proibições, o certo é que o número de ciganos em Portugal é cada vez maior e a sua presença está bem patente de Norte a sul do País. Conhecem-se diversos indivíduos que obtiveram comutação de pena que cumpriam nas prisões ou nas galés, concedida por razões de natureza humanitária, em cujas petições, os requerentes alegavam o seu estado de pobreza, de velhice, de doença e abandono familiar654. Na freguesia de São Vicente de Alfena, na primeira metade do século XVII havia certamente uma comunidade de etnia cigana, que vivia em ambiente pacífico e enquadrado socialmente. Só desta forma se explica a conversão de alguns dos seus membros ao Cristianismo e à adopção do ritual do baptismo. Com efeito, em 14 de Setembro de 1634, os ciganos João Francisco e Maria,
651 TORRES, Ruy d’Abreu (1981) – «Ciganos», in Dicionário de História de Portugal, dir. Joel Serrão, Vol. II. Porto: Livraria Figueirinhas, p.69. 652 TORRES, Ruy d’Abreu (1981) – ob. cit., p.69.
653 Ordenações Filipinas, Liv.V, Tit.LXIX. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian (1985), p.1273. 654 FREIRE, Bramcamp Anselmo (1909 – Archivo Historico Portuguez, vol.VII. Lisboa, pp.44, et passim. 171
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ambos solteiros e moradores nesta freguesia, baptizaram seu filho Lázaro, sendo padrinhos Simão Ferreira e Apolónia Moreira também residentes na freguesia. O acto foi celebrado pelo pároco Tomé Gonçalves655.
Registo do baptizado de Lázaro, filho de pais ciganos, da freguesia de São Vicente de Alfena. Fonte: ADP, E/27/4/2-5.1, fl.113.
1.7 – O hospital dos leprosos de Alfena As gafarias ou leprosarias foram instituições criadas para cuidar dos leprosos, um flagelo que se alastrava de forma preocupante, no Ocidente, sendo necessário enquadrar jurídica e socialmente todos aqueles que eram conotados como perigos evidentes para a saúde pública. No concílio de Orleães, de 549, esta questão foi avaliada, declinando-se nos bispos a tarefa de cuidar dos leprosos656, posição que foi posteriormente reiterada no concílio de Lyon, de 583657. Os leprosos deviam ser sustentados pelos bispos, dando assim, origem às “leprosarias nas cidades episcopais”658. No III Concílio de Latrão, realizado em 1179, o cânon 23 trata sobre a adequação das instalações para os gafos659. 655 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.113.
656 BONEFANT, Paul (1965) – Hôpitaux et bienfaisance publique dans les anciens Pays-Bas des origines à la fin du XVIII siècle. Collection Annales de la Societé Belge d’Histoire des Hôpitaux. T.3, 1965, XVIII, p.8. 657 BONEFANT, Paul (1965) – ob. cit., p.8
658 MARQUES, José – A Assistência no Norte de Portugal nos finais da Idade Média. [Disponível em: ler.letras.up/uploads/ficheiros/2188:pdf.]. [Consultado em: 23.12.2016].
659 Terceiro Concílio de Latrão. [Disponível em: http://domuob.wordpress.com/.../serie-concilios-da-igreja-ii-e-iii-concili... [Consultado em: 15/01/2017]. 172
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As gafarias ou leprosarias surgiram no Ocidente no século V, mas seria no século IX, em França, que, na altura, estaria a braços com um profundo surto de lepra proveniente de Espanha, nos séculos VIII e IX660 que o problema se reveste da maior importância. Quanto a Portugal, a sua criação é uma incógnita, pois as primeiras referências são dispersas e imprecisas661. A assistência aos pobres e doentes era feita através da fundação de “hospitais” com a designação de albergarias, mercearias, hospícios e as gafarias destinadas ao isolamento coercivo dos leprosos “que nem sempre eram morfeisos, mas também ulcerosos de várias espécies e czematosos, psoriaficos”662, entre outros, num “encerramento por motivos biológicos663, por se tratar de indivíduos portadores de uma doença cujo “perigo de infeccionar os sãos os fazia alongar dos povos”664.
Com o aparecimento das misericórdias, impulsionadas pela mão de Dona Leonor, nos finais do século XV, os leprosos tiveram um enquadramento mais adequado, assistido e visitado. Na verdade, as primeiras gafarias, em território português são anteriores à fundação da Nacionalidade e surgem no Norte de Portugal. A primeira referência que se conhece data do século X, do ano de 950, altura em que a condessa Mumadona Dias (926968?), mulher de Hermenegildo ou Mendo Gonçalves, já viúva, fundadora do mosteiro de Guimarães, onde se recolheria mais tarde, senhora da vila de Melres e de tantos outros bens fundiários e monacais665, redigiu o seu testamento. Alguns anos mais tarde, em 958 a “Karta de Moreira de Ripa Avizella”666 representa o segundo testamento do século X, no qual os testa-
660 PINA, Luís de (1981) – «Gafarias», in Dicionário de História de Portugal, Vol. III, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, p.91.
661 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – Portugal na crise dos séculos XIV e XV, ob. cit., p.375.
662 PINA, Luís de (1981) – ob. cit., p.91.
663 LE GOFF, Jacques (1984) – A Civilização do Ocidente Medieval, Vol. II. Lisboa: Editorial Presença, p.81.
664 VITERBO, Fr. Joaquim de Santa Rosa de (1993) – «Gafos», in Elucidário das Palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram: obra indispensável para entender sem erro os documentos mais raros e preciosos que entre nós de conservam. Vol. II. Porto-Lisboa: Livraria Civilização, p.290. 665 MATTOSO, José (1987) – A Nobreza medieval portuguesa. A família e o poder. Lisboa: Editorial Estampa, pp.141-142. 666 PINA, Luís de (1981) – ob. cit., p.91.
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dores incluem a distribuição de património sob a forma de benefício pio, doado por remissão de pecados, aos homens e mulheres atingidos pela lepra. A partir de finais da centúria Undécima, os exemplos abundam nos testamentos de reis e de rainhas, de nobres e eclesiásticos. São disso exemplo os beneméritos Dona Urraca (1177), D. Sancho I (1210), D. João Diogo (1263), Dona Marinha Pires (1267), Fernando Petri (1226), D. Afonso II (1221), D. Afonso III (1279), D. Dinis (1322)667, Dona Mafalda (que fundou a gafaria de
Aregos), Dona Isabel (1336 )668, entre tantos outros que deixaram esmolas de valor avultado para os gafos que vivendo socialmente marginalizados procuravam a protecção divina de São Lázaro (também leproso), Santo André e Santa Luzia. Estes homens e mulheres atingidos pelo infortúnio eram rejeitados pela sociedade que os obrigava a viver separados do mundo mas tolerados, sem perda da sua personalidade religiosa. Em 1179, no III Concílio de Latrão, o papa Gregório VII, debruçando-se sobre o tema, autorizou a construção de capelas e cemitérios nos perímetros ocupados pelos leprosos, contribuindo, não obstante, para fazer deles outros tantos mundos fechados “de onde os gafos só podiam sair agitando matracas para que as pessoas deles de apartassem”669. Em muitos lugares era feito um ritual de separação dos leprosos que se generaliza na Europa a partir dos centúrias de Quinhentos e de Seiscentos “com uma cerimónia em que apenas o bispo, com gestos simbólicos desligava o doente da sociedade e fazia dele um morto para o mundo”670. As gafarias portuguesas quanto à sua criação podem agrupar-se na seguinte tipologia: de iniciativa a régia e administradas pelos oficiais do Rei; as municipais como por exemplo as de Braga, Guimarães e Lisboa; as criadas pelos próprios leprosos671.
667 TT, Gaveta 16, mç.1, n.º2.
668 PINA, Luís de (1981) – ob. cit., p.91.
669 LE GOFF, Jacques (1984) – ob. cit., p.82. 670 LE GOFF, Jacques (1984) – ob. cit., p.82. 671 PINA, Luís de (1981) – ob. cit., p.91.
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Ponte de S. Lázaro sobre o rio Leça, na gafaria. Fonte: M.M.V.
A gafaria de Alfena terá sido fundada por João Pires da Maia672, filho de D. Pêro Pais da Maia, alferes-mor de D. Afonso Henriques, entre 1147 e Março de 1169673, e do rei de Leão, Fernando II, entre 1171 e 1186, regressando após a morte do primeiro monarca português674; foi rico-homem de D. Afonso II e de D. Sancho II, e exerceu o governo da tenência da Maia entre 1217 e 1226, herdeiro de uma vasta rede de bens identificados nas Inquirições Gerais do Reino de 1258 “já então nas mãos de seus herdeiros”675. É provável que tenha doado a honra de Alfena aos gafos da cidade do Porto e do seu termo, identificando-se, assim, o doador do território, o que nos leva a aceitar que a gafaria de Alfena tenha sido fundada em data anterior a 1230. As Inquirições levadas a cabo em 1307, no reinado de D. Dinis, referem na “freguesia de Sam Vicente da Queimadella ho Paaço d’Alfena com toda a villa dizem as testemunhas que o tragem os gaffos por honra por razom 672 A cedência da honra aos gafos por João Peres da Maia, entre outros, pode ser
revisitada na Inquirição (traslado que se tirou a respeito das honras e julgados dos lugares de Refoios de Riba de Ave e da Maia, Bouças Gondomar, Aguiar de Sousa e outros lugares). TT, Gavetas, Gav.8, mç.3, n.º2.
673 LEONTINA, Ventura (1996) – «A Nobreza – da guerra à corte», in Nova História de Portugal, Vol. III, ob. cit., p.210.
674 MATTOSO, José (1985) – Identificação de um país. Ensaio sobre as origens de Portugal 10961325. Vol.I – Oposição. Lisboa: Editorial Estampa, p.180.
675 PIZARRO, José Augusto de Sotto Mayor (1999) – Linhagens medievais portuguesas. Genealogias e estratégias (1279-1325). Porto: Centro de Estudos de Genealogia, Heráldica e História da Família Universidade Moderna, Vol. I, p.257. 175
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que foy de Dom Joham Pirez da Maia e deu lhe por sa alma”676, mantendo-se o território com as liberdades inerentes à terra honrada, mesmo antes de ter ocupado a tenência da Maia em 1217677, pois já em 1214, Dona Estevainha inclui, no seu testamento, os “leprosi de Alfena”678. Note-se que os inquiridores registam a existência de um paço, edifício que não havia sido identificado nas Inquirições Gerais do Reino de 1258, mas apenas a propriedade agrícola, sem qualquer menção às múltiplas formas ergológicas típicas dos casais que aí existiam como as casas, os currais, os celeiros, as eiras, os aidos e estrebarias. Não há dúvida que a vila de Alfena, no seu pequeno reduto geográfico, habitada por muito poucos gafos, usufruiu de imensas doações que mostram de certa forma o reconhecimento social desta instituição ocupada por inválidos e “mortos-vivos”.
Referência à freguesia de São Vicente da Queimadela, na inquirição (traslado) de 1473. “Documento cedido pela ANTT” Cota: Gavetas, Gav.8, mç.3, n.º 2.
A gafaria de Alfena fazia parte da rede de hospitais de lázaros da cidade do Porto que contava com a “Gafaria para Lázaros e Lázaras, ou melhor, 676 P.M.H. Inquisitiones, p.390.
677 PIZARRO, José Augusto de Sotto Mayor (1999) – ob. cit., p.257. 678 ADB, Cabido, Gaveta dos Testamentos, n.º 10.
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para doentes de chagas incuráveis”679, outro em Gaia e dois mais distantes do burgo: a leprosaria de Alfena e a de Bouças680. O hospital de São Vicente da Queimadela, Alfena, mereceu a atenção de vários membros da diocese portuense que na hora de elaborarem o seu testamento contemplaram os leprosos alfenenses com certas importâncias monetárias numa dupla perspectiva: auxiliar financeiramente os doentes e ao mesmo tempo assegurarem a intersecção intemporal pelo bem da alma do filantropo. Citam-se, pois, D. João Fernandes (1260) com três morabitinos681; o chantre da Sé do Porto e da Sé de Coimbra, D. Gonçalo Gonçalves (1262), que ofereceu duas libras682; o cónego portuense Abril Pires (1295) que acumulava as funções de abade de Cedofeita deu “aos gaffos d’Alfena hũa libra”683; o bispo D. Vicente Mendes (1266), “item leprossis de Alfena L solidos”684; Vicente Domingues, chantre da Sé do Porto (1312) oferece “hũa libra”685.
Além dos eclesiásticos, outros filantropos burgueses endinheirados e proprietários rurais contribuíram, com as suas esmolas para tornarem a vida dos leprosos de Alfena menos penosa. Em 1491, João Martins Ferreira, filho do caldeireiro Martim Lourenço, da cidade do Porto, domiciliado na Rua da Bainharia, instituiu um morgado em 27 de Outubro à base de uma extensa propriedade rural, dispersa por diversos concelhos do Norte, identificando dois campos, e um moinho que pertenciam à gafaria de Alfena686 . A gafaria de Alfena, em meados do século XIII, exerceu uma certa atractividade sobre os camponeses da Ferraria que devido à decadência da sua feira – como relevam as Inquirições Gerais do Reino de 1258 –, levou várias famílias a procurarem a sua subsistência na herdade “leprosorum d Alfena”687, entre outros destinos o que salienta a relação de proximidade com 679 BASTO. A. de Magalhães (1997) – ob. cit., p.302. 680 BASTO. A. de Magalhães (1997) – ob. cit., p.298.
681 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924), introdução de João Grave: Imprensa Portuguesa, p.397.
682 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924, ob. cit., p.405; ADP, Cabido. Originais, Livro 1688 (30), fl.32. 683 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924, ob. cit., p.414. 684 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924, ob. cit., p.420.
685 ADP, Cabido, Originais, n.º 1607, fl.25; Cabido, Livro 796 – 74 Sentenças, fl.146.
686 AHSCMP, Livro I dos Registos dos foros fidalgos, fls.42-47. 687
P.M.H., Inquisitiones, p.507.
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os gafos. O inquiridor régio apurou, por testemunho verbal de vários alfenenses, globalmente considerados, que “totta villa Alfene est leprosorum”688; possuía, no lugar de Transleça “VI casalia leprosorum Alfena”689 que haviam sido doados por “Dompni Johannis Petri Modie”690. O centro hospitalar, isto é, a casa ou casas nas quais viviam quotidianamente os leprosos estava localizado junto do rio Leça, provavelmente na margem direita, nas proximidades de uma ponte medieval que ainda se conserva, onde foi erigida uma ermida “da Senhora dos Remédios, vulgarmente chamada a Senhora da Ponte, por estar sita no fim da rua vindo de Guimarães para a cidade do Porto, ou passada a ponte, que aqui tem o rio Leça”691. O padre Luís Cardoso refere também que “antes de entrar nesta
ponte, vindo da cidade do Porto, há outra Ermida de S. Lázaro, e tem esta obrigação de prover hum Hospital de Lázaros, cujas casas estão junto da dita Ermida mas já arruinada”692. O edifício que hoje encontramos na margem direita do rio Leça é conhecida pela capela de S. Lázaro, que antigamente se chamava dos Remédios, apelando à sua primeira invocação e devoção dos leprosos que se foram instalando, numa área fértil, bem localizada, à face da estrada, podendo beneficiar das esmolas dos viajantes, mercadores inter-cidades, assim como comercializar os seus produtos de natureza alimentar, como o milho693, o trigo694, ou cera e ferros de arado695, entre outro bens disponíveis, cujo rendimento ajudaria os gafos na sua sobrevivência.
688 P.M.H., Inquisitiones, p.508. 689 P.M.H., Inquisitiones, p.512. 690 P.M.H., Inquisitiones, p.512.
691 CARDOSO, Luís, P.e. (1747) – Dicionário Geográfico. Lisboa, p.275. 692 CARDOSO, Luís, P.e. (1747) – ob. cit., p.275.
693 P.M.H. Inquisitiones, p.507.
694 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924, ob. cit., p.565. 695 Censual do Cabido da Sé do Porto (1924, ob. cit., p.565. 178
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Capela de São Lázaro exclusiva dos gafos (Alfena). Fonte: M.M.V.
As capelas eram administradas pelos senhores dos concelhos das Felgueiras, Vieira e Fermedo e em 1544 por António Luís Pinto696. Em 1618 era seu administrador Borges Pereira, que tinha uma criada que foi madrinha de baptismo de Catarina, filha de Cristóvão Álvares e de sua mulher Maria Vicente, de Alfena697. Em 1758, de acordo com a resposta número onze das Memórias Paroquiais de Alfena, o reitor Joaquim da Cunha de Sotto Maior dá-nos a verdadeira imagem do estado e administração da gafaria: “Tem hum hospital e este se acha alagado por incúria dos administradores que he o possuidor da caza de Simaes, ao quaoall lhe pagam e tem hũa grande renda nesta freguesia, e por varias vezes se lhe tem admoestado por cappitolos de vezita; que o ponha corrente e juntamente a capella, cuja invocação he de S. Lazaro que também necessita de várias couzas, e esta caza está obrigada a todo o necessário para o Hospital como para a capella”698.
696 CARDOSO, Luís, P.e. (1747) – ob. cit., p.275.
697 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.44. 698 TT, MPRQ/2/254.
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O certo é que em 1777, pelo menos, a capela de São Lázaro sofreu obras de beneficiação e de restauro, desconhecendo-se, porém, se a mesma acção abrangeu o estabelecimento humanitário dos leprosos.
Marco indicativo do restauro na capela de São Lázaro (Alfena). Fonte: M.M.V.
1.8 – A morte como expressão da última diferenciação social 1.8.1 – Dos abades, reitores, padres e clérigos: os a testato e os ab intestato A fronteira da vida esbate-se no Reino dos Mortos através do processo escatológico, por etapas, individualmente presenciado e que atinge os recém-nascidos, os infantis, os juvenis e os seniores; os ricos e os pobres; os camponeses e os mesteirais do mundo urbano e periurbano; os detentores de elevados níveis culturais; os fervorosos, dogmáticos e os apóstatas; os que nunca saíram do seu lugar de naturalidade e os viajantes que conheceram outros modos do viver e do sentir quotidiano, independentemente da sua condição social, religiosa, militar, política ou jurídica. Perante a inevitabilidade da morte –, o último ritual da vida –, o homem e a mulher comum ou socialmente diferenciado, devia estar preparado para essa eventualidade que podia tornar-se em fatalidade, se não fosse previamente preparada para 180
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receber a cura da alma através dos benefícios pios e dos respectivos “bens da alma” que o freguês ou paroquiano devia destinar, por vontade própria. O procedimento testamentário, lavrado pelo ductos tabeliónico, seria sempre o mais aconselhável, mais seguro, mais conforme à vontade de todos, tanto dos herdeiros como da Igreja, embora muitos paroquianos, de todas as freguesias, por razões diversas, não expressaram positivamente a sua última vontade. Os curas, reitores ou abades, por vezes, e à margem, anotam a falta do texto, outras vezes não fazem qualquer referência. É provável que os familiares não estivessem interessados que o moribundo, à pressa, doente, preso numa cama ou enxerga, já sem o discernimento mental necessário, chamasse o tabelião das notas para passar a escrito a última vontade. Com diz D. Frei Marcos Lisboa, bispo do Porto, “as ultimas vontades dos defunctos são muito favorecidas pelo direito Canonico, & Civil, & se segue muito prejuízo, & escândalo de se impedir aos defunctos seus testamentos, mandamos sob pena de excomunhão, ipso facto, que nenhũa pessoa, por qualquer via que seja, maliciosamente impedida fazendo se os testamentos livremente”699. A prática da elaboração testamentária (a testato) não é tão linear como parece dar a entender o bispo portuense D. Frei Marcos de Lisboa, pois havia toda uma ritualização prévia que culminava, em situações normais, quando o moribundo ainda estava no uso das suas faculdades mentais, com a sua última vontade. Na verdade, este processo podia ser iniciado com a primeira visita do médico ao leito do enfermo, que perante o quadro clínico por si traçado, devia aconselhar o jazente a solicitar a presença de um sacerdote para lhe ministrar a santa-unção e incentivá-lo a elaborar o seu testamento, pois só assim poderia auxiliar o moribundo. Numa segunda visita, o médico devia inquirir se o doente já havia mandado lavrar o seu testamento pois sem esse requisito jurídico não poderia ajudá-lo sob pena de excomunhão700, situação que os técnicos de saúde evitariam.
699 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frey Marcos de Lisboa. Ec. Coimbra: António de Mariz à custa de Giraldo Mendez, Livreiro (1585). [Disponível em: URI:http://bdigital.sib.pt/bg6/UCBG-SP-Ab-6-25a/globalItems.html]. [Consultada em: 01.12.2016. Constituição Segunda, p.112.]
700 BASTOS, Maria do Rosário (1996) – «Prescrições Sinodais sob o culto dos mortos nos séculos XIII a XVI», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições Sá da Costa, p.111. 181
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No território do actual concelho de Valongo encontramos várias formas de encarar, juridicamente, a morte que parecia ser certa para os acamados de longa duração, e para os que deixaram este mundo por morrerem “repentinamente”, “de repente”, nas expressões mais utilizadas na linguagem dos diferentes abades, curas ou reitores que pacientemente procediam às anotações dos óbitos. As constituições sinodais do bispado do Porto, ao qual pertenciam as freguesias do actual concelho de Valongo não impunham aos sacerdotes a obrigação de mandar os doentes ou idosos fazer os respectivos testamentos, quando tinham bens patrimoniais ou meios financeiros herdados ou outros quer tivessem sido adquiridos, dos quais podiam dispor livremente sem qualquer coacção moral ou religiosa, podendo, no caso de falecerem sem testamento, deixarem o património aos seus herdeiros, ou dispô-lo para a realização de obras pias, não havendo quem reclamasse a sua posse701. Porém, os diversos sacerdotes, curas, abades ou reitores que estiveram ao serviço nas diferentes paróquias do território do actual concelho de Valongo manifestaram procedimentos de registo muito diferentes uns dos outros, quanto à separação do seu património financeiro ou imobiliário, no que respeita à sua afectação aos bens da alma. Na freguesia de São Martinho do Campo, o reverendo abade Baltasar Peres, falecido em 1655, não terá feito testamento nem consta que tenha deixado alguns bens para benefício religiosos702. Todavia, alguns anos mais tarde, em 1681, morreu o reverendo abade Rodrigo Peres, e de acordo com a informação deixada pelo padre João da Fonseca, o jazente morreu ab testato. Não obstante, foram realizados os ofícios do dia, mês e ano, para os quais deixou um legado em dinheiro no valor de cinquenta e nove mil e oitocentos réis, acrescidos de mais cinco mil réis para distribuir pelos clérigos que assistiram ao seu funeral, participando nas cerimónias fúnebres, e ainda cerca de treze mil quatrocentos e treze réis que foram pagos a vinte clérigos e a
701 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frey Marcos de Lisboa, ob. cit., Constituição Primeira, Título 24, p.111.
702 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.220v.
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dez testemunhas que presenciaram a entrega de uma certa importância aos pobres da paróquia que assistissem ao seu enterro703. Já no início do século XIX, o reverendo padre João Jorge da Costa, presbítero desta freguesia, finado a 3 de Outubro de 1803, também não deixou qualquer indicação sobre os bens da alma, recaindo esta obrigação sobre os seus herdeiros que lhe mandaram celebrar três ofícios com o acompanhamento de dez clérigos, conforme se lê a latere, pelo punho do anotador do assento704, gastando em esmolas directamente afectadas aos sacerdotes assistentes cerca de três mil e seiscentos réis.
Algum tempo depois, desceu ao seio da terra o presbítero padre João Ferreira da Costa, natural do lugar da Quintã, que havia feito testamento, instituindo por testamenteiro Manuel de Sousa (?), seu sobrinho, no qual terá deixado cerca de quatro mil e duzentos réis para legados e missas, solicitando para a missa de corpo presente a assistência de quinze religiosos e as restantes apenas dez sacerdotes705. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, os religiosos que entretanto morreram ao serviço dos paroquianos têm, também, quanto aos bens da alma, comportamentos diferentes. Por exemplo, sobre o licenciado Rui Moreira, abade da igreja de São Lourenço, falecido em 1597, fica a dúvida sobre se havia realizado ou não o testamento. O padre Joanes Farinha deixou registado que “dizem que fez testamento”706. O certo é que não consta que tivesse sido feito qualquer ofício em proveito da alma. O reverendo António da Rocha, falecido em 1668, e sepultado na capela-mor707, não deixou qual-
quer indicação, sobre as exéquias fúnebres que deviam ocorrer.
Em meados do século XVIII (1750), em 2 de Dezembro, foi registado o passamento do reverendo abade Francisco Caetano, sem ter feito testamento. Foi sepultado três dias depois, na capela-mor, com um ofício de corpo presente com vinte sacerdotes708. Além disso, foram satisfeitas as ofertas 703 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.191. 704 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.218. 705 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.215.
706 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.194. 707 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.226. 708 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.198. 183
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acostumadas nesta paróquia. Quer dizer, terá deixado cerca de dois mil e quatrocentos réis para dar de esmola aos padres que lhe prestaram a última homenagem. Mais cauteloso e agindo de acordo aos ditames da Santa Madre Igreja, o padre Luís, coadjutor da igreja de São Lourenço d’Asmes, e natural da freguesia de São Vicente de Alfena, fez o seu testamento, instituindo, para os bens da alma a importância necessária para pagar a quinze clérigos, cerca de mil e oitocentos réis, acrescidos das ofertas ao pároco que eram dadas de acordo com a qualidade social do defunto, no dia seguinte ao do seu passamento, cuja cerimónia esteve a cargo do abade Constantino de Sousa Meneses709. Desta mesma época mencione-se o padre José António, beneficiado nesta igreja inumado sem o sacramento da penitência e do sagrado viático e sem a santa-unção “por morrer apressadamente e se não poder chegar a tempo”710 de lhe serem ministrados os sacramentos. Estava, contudo, prevenido; deixou testamento escrito, instituindo a presença de trinta eclesiásticos que acompanharam o féretro no dia seguinte, de manhã. A cerimónia de corpo presente foi presidida pelo coadjutor padre Alexandre Gomes da Silva711. O valor da oferta para os que integraram o cortejo fúnebre terá sido cerca de três mil e seiscentos réis.
Por sua vez, o padre Manuel de São Paio, natural desta freguesia, falecido a 6 de Fevereiro de 1760, nomeou a irmã Maria de Assunção como única herdeira e esta mandou dizer um ofício com a presença de dez sacerdotes assim como satisfez o requisito das oblatas em uso712. Teria despendido para
uma só missa cerca de mil e duzentos réis.
Quanto ao reverendíssimo abade Constantino de Sousa e Meneses cujo óbito foi registado a 24 de Setembro de 1781, não consta que tivesse expressado a sua última vontade por escrito. No entanto, é referido que assistiram no primeiro ofício quarenta e um padres e no segundo e terceiro dez padres, assim como foi dada a oferta de dez alqueires de pão, um carneiro e um cesto. 709 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.221. 710 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.221.
711 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.221v. 712 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.222.
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Foi enterrado na capela-mor, no dia seguinte, pela manhã, estando a cerimónia de corpo presente a cargo do padre Manuel Lourenço dos Santos713, gastando assim, em missas cerca de sete mil trezentos e vinte réis. Duas semanas depois regista-se o óbito do reverendo padre Jerónimo Marques da Silva, cujas cerimónias fúnebres foram mais modestas; não deixou testamento, mas foram realizados três ofícios com a presença de quinze sacerdotes. Foi a sepultar no dia seguinte, estando as celebrações a cargo do encomendado Inácio Dias Alão714; deixou sob a forma de esmolas
aos clérigos a quantia de cinco mil e quatrocentos réis.
Na freguesia de Santo André de Sobrado foi declarado o óbito de alguns sacerdotes que fizeram testamento, aguardando o dia do seu passamento, como o abade Sebastião Álvares Ribeiro, que deixou a sua sobrinha, Joana, solteira, natural desta freguesia, como sua herdeira, instituindo “a obrigação dos bens da alma”715. Os ofícios foram celebrados pelo abade Francisco Marques e o assento efectuado pelo padre Domingos de Sousa.
O reverendo Jerónimo Armante que havia sido abade da igreja paroquial e que falecera em 28 de Julho de 1639, designou por seu testamenteiro, seu sobrinho, o abade Luís Machado. Quanto aos bens da alma, o padre-cura Pedro Georges, responsável pelo assento, não deixou qualquer indicação716. No início do século XVIII regista-se a morte do clérigo António Moreira da Costa, natural do lugar de Vilar. A missa de corpo presente foi celebrada pelo padre Jeremias da Silva Pereira, com a presença de dez clérigos717, gastando em esmolas cerca de mil e duzentos réis.
Em 1719 faleceu o padre Domingos de Sousa, também natural do lugar de Vilar, só com o sacramento da santa-unção “por ser o achaque estupor”718.
Deixou um testamento em que beneficiou um sobrinho com a obrigação de lhe serem ditos três ofícios com a presença de vinte sacerdotes, e ainda quarenta 713 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.135v. 714 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.136. 715 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.192. 716 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.231. 717 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.5.
718 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.6v. 185
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missas a celebrar em altar privilegiado da igreja paroquial, conforme anotou o padre Jeremias da Silva Pereira – que faleceu no dia 1 de Janeiro de 1744, sem se pronunciar sobre os bens sufragâneos. Foi sepultado na igreja, e as exéquias fúnebres estiveram a cargo do padre Manuel Gaspar. O defunto deixou de esmolas a distribuir entre os padres que estiverem presentes cerca de sete mil e duzentos réis. O passamento do abade António Manuel Baldaia de Magalhães, em 1755 foi um acontecimento preparado com todo o rigor, pormenor e perfeição. O direito a ser recordado, neste caso, estava presente desde logo no ritual do cortejo fúnebre e no número dos envolvidos. O seu funeral foi, sem dúvida, uma manifestação que ecoou na freguesia, trouxe ruído, falatório e motivou a presença dos paroquianos que assistiram ao último momento do seu cura, antes de descer ao repouso eterno e aí usufruir da tranquilidade dos vivos719. Com efeito, o seu testamento é uma peça jurídica muito complexa, através da qual assistimos à preparação do ritual da morte na maior serenidade e com tempo, descrevendo minuciosamente diversos aspectos da cerimónia fúnebre, imaginada. No seu testamento promove-se “a imagem de uma morte encenada pelo próprio testador”720, dando à alma um papel protagonizador do testamento em torno da qual se organizava a ritualização721, realizando-se, assim, as exéquias fúnebres de acordo com o estatuto e a condição do defunto722 António Manuel Baldaia de Magalhães: “Que seu corpo foce revestido em havito clerical com huma vestimenta de damasco branco que já pera hece efeito tinha comprado que pera sua alma se fizesse três ofícios gerais pera os padres desta freguesia de Santo Andre de Sobrado e pera os da freguesia de São Martinho do Campo de Sam Miguel da freguesia da Gandra de a freguesia de Santa Marinha de 719 MATTOSO, José (1996) – «O Culto dos mortos no fim do século XI», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições Sá da Costa, p.82.
720 CHIFFOLEAN, Jacques (1988) – «Ce qui fait changer la mort dans la région d’Avignon à la fin du Moyen Âge», in Death in the Middle Ages. Lovaina, p.126.
721 PINA, Isabel Castro (1996) – «Ritos e imaginário da morte em testamentos dos séculos XIV e XV», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições Sá da Costa, p.126. 722 BASTOS, Maria do Rosário (1996) – ob. cit., p.111. 186
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Astromil e freguesia de Rebordosa de Lordelo e Agrella que se daria aos que assistice o primeiro officio a cada hum dos padres duzentos e corenta reis e aos dois offícios a duzentos reis a cada padre a quem assistice aos três offícios como parocho se lhe daria de oferta coatro mil e oitocentos reis; deixou mais mil e quinhentas missas por sua alma de esmola de cem reis cada huma das quais seriam ditas quinhentas nesta Igreja em altar pervegiado de Nossa Senhora do Rosario as mil missas seriam ditas arbítrio de seus testamenteiros aonde milhor lhe paresece das mil seriam coatrocentas pella sua alma e seiscentas comforme a sua tençam; deixou mais que seus testamenteiros o reverendo Manoel Coelho de Mendonça e Henrique Baldaia de Magalhais sem missas de esmolla de oitenta reis aonde foce sua vontade pellas almas daquelles que Deus (…) obrigado que no dia do seu enterro se dece de esmolla a cada pobre a vinte reis e cento e vinte (fl.205) alqueires de pam e vinho e azeite se reparteria pellos desta freguesia pera os mais bens que tinha deixou por seus erdeiros a Timoteo e seus irmãos filhos legítimos de António de Mendonça da freguesia de Menedo deste bispado do Porto; deixou mais (…) a Manuel João António Carneiro Rangel obrigação de lhe mandar dizer trezentas missas, a saber, cem ao Santissimo Sacramento cem a virgem Nossa Senhora da Guia e outras cem pellas almas do Purgatorio; e deixou mais varias deixas (….)723. O comum dos mortais descia ao silêncio da cova, que o acolhia, envolto num lençol de linho, conferindo-lhe a última dignidade, que em certos casos podia já ser usado, roto e velho, como denunciava o padre António Vieira724. Contudo, o reverendo António Manuel Baldaia de Magalhães, quanto ao espectáculo da morte, descreveu cada um dos aspectos com todo o pormenor.
723 ADP, E/27/4/6-21.1, fls.204v-205.
724 VIEIRA, António, Padre (2014) – «Sermão de Santo António», in Obra Completa. Tomo II, 3.ª parte. Ciclo Santoral. Volume X. Sermões Hagiográficos I, coordenação e anotação de Carlota Urbano, José Carlos Lopes de Miranda e Margarida Miranda, introdução de Carlota Urbano e Margarida Miranda. Lisboa: Círculo de Leitores, p.150. 187
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Em primeiro lugar, ordenou que “seu corpo fosse revestido em havito clerical com uma vestimenta de damasco branco que já pera hece efecto tinha comprado”725. O uso do hábito clerical propriamente dito ou ordens monacais para a mortalha é uma prática que remonta a meados do século XIV, entre as mulheres726, e que irá dar a última imagem do morto aos vivos, aos seus familiares e assistentes, uma iconografia de santidade, cumpridos que foram, em princípio, todos os sacramentos que prepararam o moribundo para a viagem derradeira. Em segundo lugar, estabeleceu a realização de três ofícios gerais a celebrar na igreja paroquial de Santo André de Sobrado, como nas de São Martinho do Campo, da Gandra, de Santa Marinha de Astromil, Lordelo e de Agrela, instituindo para cada sacerdote que lhe prestasse a última homenagem na missa de corpo presente, a esmola de duzentos e quarenta réis – uma quantia demasiado elevada quando comparada com todos os outros casos e em qualquer das freguesias – e nos restantes sufrágios, do mês e do aniversário, a oblata de duzentos réis. Em terceiro lugar, deixa a oferta de quatro mil e oitocentos réis para o pároco e para todos os que estivessem presentes nos três ofícios, numa referência explícita ao convite feito aos clérigos, que, de acordo com os valores atribuídos às esmolas da missa de corpo presente, não daria para muito mais do que vinte eclesiásticos. Em quarto lugar, deixou a indicação de mais mil e quinhentos sufrágios, um terço dos quais deviam ocorrer na igreja paroquial do seu domicílio, no altar privilegiado de Nossa Senhora do Rosário, deixando as restantes ao arbítrio dos seus testamenteiros que tinham, assim, liberdade, de mandá-las dizer em qualquer igreja, numa repetição obsessiva, multiplicando os laços entre o mundo dos vivos e dos mortos727, repartidas em benefício de sua
alma (quatrocentos sufrágios) e os restantes seriam ditos “conforme a sua tençam”728, isto é, dos testamenteiros.
725 ADP, E/27/4/6-21.1, fls.204v -205.
726 PINA, Isabel de Casto (1996) – ob. cit., p.128
727 PINA, Isabel de Castro (1996) – ob. cit., p.129 728 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.204.
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Em quinto lugar, deixou aos seus testamenteiros reverendo Manuel Coelho de Mendonça e a Henrique Baldaia de Magalhães, a obrigação para a institucionalização de cem missas, de oitenta réis de esmola, pela alma daqueles que era obrigado. Em sexto lugar, no dia do seu funeral, mandou que fosse distribuído pelos pobres presentes vinte réis a cada um, pois as esmolas atribuídas por ocasião da morte “recordavam, por analogia, a gratuitidade da misericórdia divina que distribuía os seus dons com largueza”729. O testamento do reve-
rendo António Manuel Baldaia de Magalhães não refere se foram escolhidos doze pobres, uma prática difundida entre nós. O apoio aos mais necessitados tanto podia ocorrer em dinheiro como em vestuário ou em géneros alimentícios730, cuja distribuição devia ocorrer depois de terminadas as exéquias fúnebres. O reverendo Baldaia de Magalhães deixou, além de dinheiro, em quantidade não especificada, cento e vinte alqueires de pão (cereais de mistura), vinho e azeite que seriam repartidos na freguesia de Santo André de Sobrado. Finalmente, indicou como seus herdeiros Timóteo, e suas irmãs, filhos legítimos de António de Mendonça, e ainda o encargo de lhe mandarem celebrar trezentos sufrágios, um terço dos quais ao Santíssimo Sacramento, outro a Nossa Senhora da Guia e as restantes pelas “allmas do Purgatorio”731. Além
destas disposições insertas no seu testamento, o reverendo deixou outras que o padre Domingos Dias da Costa não revelou. A soma de todos os sufrágios e os donativos caritativos mostra que o reverendo Baldaia de Magalhães deixou para os bens da alma uma significativa quantia que ultrapassaria os cinquenta e três mil réis, evidenciando o estatuto social do finado, um dos mais elevados da freguesia de Santo André de Sobrado.
Mais modestos e discretos foram os funerais do padre Manuel da Costa, natural do lugar de Vilar, que fez uma doação de todos os seus bens a Custódia Maria, sua sobrinha, que lhe devia mandar celebrar os ofícios gerais do dia, mês e ano, com a presença de quinze clérigos, destinando a cada um 729 MATOSSO, José (1992) - «Sociedade cristã e marginalidade na Idade Média. A gafaria da Nossa Senhora do Monte», in Portugal Medieval. Novas Interpretações, 2.ª edição. Lisboa: Círculo de Leitores, p.127. 730 MATOSSO, José (1992) – ob. cit., p.131. 731 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.205.
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deles, cem réis de esmola, assim como uma centena de missas que não foram especificadas e determinou “que seu corpo fosse de vestido sacerdotal”732, mantendo, assim, a sua identidade até ao fim; do padre Manuel Gaspar, natural do lugar de Sobrado, falecido em Abril de 1775, deixou, por via testamental, as condições necessárias à realização de um ofício com treze sacerdotes. Foi enterrado na igreja e o seu corpo envolto em hábito sacerdotal733 como o anterior; do padre Manuel Paulino, natural do lugar de Ferreira, teve um ofício de corpo presente com a presença de dez clérigos734, que assim lhe prestaram a última homenagem. Sem qualquer aparato circunstancial, foi sepultado em Janeiro de 1797, o reverendo padre Isidoro Pinto Ribeiro, que por testamento indicou como herdeiro universal, o irmão Bernardo que lhe mandou dizer uma missa testemunhada por dez religiosos, além do padre Joaquim Barbosa que nessa altura desempenhava as funções de coadjutor735. Na primeira metade do século XIX regista-se a morte de vários clérigos: do reverendo abade Manuel Pamplona Rangel Baldaia Tovar (1811) abade da igreja paroquial de Santo André de Sobrado, natural do lugar de Sobrado, que, atribuiu a Dona Mariana João, filha de Dona Isabel, domiciliada na cidade do Porto, os encargos religiosos. Nesse diploma tabeliónico, o defunto dispôs o suficiente para a celebração dos três ofícios gerais, no montante de seis tostões; três missas pelo preço de três tostões; três mil missas para remissão de sua alma, deixando para este efeito cento e vinte tostões, e um milhar de missas “pelas almas de seus freguezes que falecerão desde a sua entrada athe o seu falecimento”736. Diferentemente dos outros clérigos,
ordenou a Dona Mariana João que seu corpo fosse amortalhado na forma clerical “metido em hum caixão paramentado com o havito clerical”737. O cortejo fúnebre incorporou cinquenta e dois padres estando nos sufrágios do trigésimo dia e do aniversário cinquenta e seis clérigos, um número que não aparece em qualquer outro acto desta natureza. 732 ADP, E/27/4/6-22, fl.822v. 733 ADP, E/27/4/6-22, fl.829v. 734 ADP, E/27/4/6-22, fl.833. 735 ADP, E/27/4/6-22, fl.880.
736 ADP, E/27/4/6-22, fl.514v. 737 ADP, E/27/4/6-22, fl.514v. 190
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Em 1813, o cortejo fúnebre do padre António Ferreira de Sousa, natural do lugar de Vilar foi mais comedido. No testamento que fez a seu sobrinho António de Sousa, mencionou a realização de uma missa pela esmola de duzentos réis paga a cada um dos vinte padres, e ainda mais quatro centenas de actos litúrgicos semelhantes; foi sepultado na igreja, envolto em hábito de São Pedro, sob o olhar do padre Nicolau de Tovar738. Em Setembro de 1826 morreu o presbítero António Melchior, apenas com o sacramento da santa-unção; era natural do lugar de Vilar. Não deixou testamento. O cortejo fúnebre teve a presença de cinco eclesiásticos e sufrágios do mês e ano, com dez padres. Foi sepultado na igreja e seu corpo amortalhado com os paramentos próprios da sua ordenação739. Em 1833 regista-se o passamento de outro presbítero chamado António Moreira Furtado, natural do lugar de Ferreira, sem ter deixado testamento. Os seus restos mortais foram envoltos, como os do presbítero anterior, nos paramentos da sua ordem, como se lê no registo efectuado pelo pároco Nicolau de Tovar e Proença740. Na freguesia de São Mamede de Valongo, os clérigos no seu conjunto e ao longo do tempo pertenciam a estratos sociais muito diferenciados que viviam em extrema pobreza, como muitos dos seus paroquianos. Em 1599, o vigário Cristóvão Dias deixou a sua alma encomendada na mão dos seus herdeiros que não foram nominalmente nomeados, os quais lhe fizeram “pobremente ofício ao dia do enterro”741, por não haver capacidade financeira para mais.
Sem qualquer indicação, foi enterrado, em Março de 1613, na cidade do Porto, onde faleceu, o vigário Pêro Vaz de Sousa742. Não se sabe se estaria
em casa de familiares, num dos hospitais da Santa Casa da Misericórdia do Porto, ou a tratar de assuntos pessoais.
738 ADP, E/27/4/6-22, fl.518. 739 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.20. 740 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.37.
741 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.192.
742 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.196v. 191
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Quatro anos mais tarde, foi registado o óbito do padre Gonçalo André, que havia designado como herdeiros sua filha e um genro que lhe mandaram celebrar um sufrágio na presença de treze padres e no do mês e ano somente com dez sacerdotes743. Em 1649, ocorreu o óbito do reverendo Manuel Fernandes, que não fez testamento, deixando os encargos da alma a seus herdeiros, que lhe mandaram celebrar o ofício de corpo presente com doze padres e o trintário com igual número de sacerdotes assistentes, e no aniversário com apenas cinco clérigos744. Em Julho de 1656 finou o reverendo Domingos Marques, reitor da igreja de São Mamede de Valongo, declinando nos seus irmãos a responsabilidade dos ofícios, conforme as suas possibilidades. À missa de corpo presente assistiram vinte padres, e outros tantos nos sufrágios do trintário e de aniversário, que foram devidamente quitados conforme anotou o encomendado Manuel da Fonseca745. No ano seguinte faleceu o padre Baptista de Sousa que no seu testamento deixou o dinheiro suficiente para dar esmola a oito padres que deviam estar presentes nos três ofícios gerais746. Todavia, o reitor cessante, Diogo Ribeiro, sepultado em Agosto de 1662, nomeou por seu herdeiro, o sobrinho Manuel Ribeiro que devia mandar celebrar as obrigações dos bens da alma747, habituais na freguesia.
Mais elevado socialmente, o reverendo licenciado Domingos da Fonseca, falecido a 13 de Outubro de 1668, nomeou por testamenteiros os reverendos padres Manuel da Fonseca, Simão Álvares e o epistolante João Marques, aos quais deixou o legado suficiente para os ofícios gerais e para outros eventos que não sendo mencionados integravam o conjunto das instruções deixados pelo testador748. 743 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.201. 744 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.105. 745 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.89v. 746 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.92v.
747 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.106v. 748 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.266v. 192
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Em 1697 foi enterrado o padre Manuel Marques, natural de Valongo, que deixou por via testamentária herdeiros os sobrinhos Gonçalo, Isabel e Luzia, que lhe fizeram todos os ofícios não ficando qualquer obrigação pendente. O defunto reservou também dezasseis mil réis à Confraria do Santíssimo Sacramento para lhe celebrarem missa “todos os anos para todo o sempre emquanto o mundo for”749, e uma esmola de quatro vinténs para suprimento dos ofícios gerais, sob a responsabilidade do padre André Alão Durão750. Mais modesto, com a realização de um ofício litúrgico que contou somente com dez padres, desceu ao leito dos mortos, o reverendo João Marques, que deixou por herdeiro João Dias. Não tinha posses. Foi enterrado no dia 11 de Março de 1700, na capela-mor751, sem indicação sobre a
realização das celebrações sufragâneas.
Dois anos mais tarde, morreu, em Valongo, o padre António Pereira de São Paio, em casa de Bento Ferreira, seu sobrinho. Deixou para o bem da alma a quantia de quarenta mil réis para a celebração de quatrocentas missas. No ofício do dia estiveram presentes vinte clérigos, mas faltaram três752, nada se dizendo quanto às esmolas que lhes deviam ser atribuídas, no valor global de trezentos réis.
Estes exemplos que abrangem a grande parte do território do actual concelho de Valongo servem para ilustrar que os reitores, abades, curas, presbíteros eram de diferentes estratos sociais, tinham níveis de rendimento e de património distintos e agiam em consonância com as constituições sinodais do bispado do Porto, podendo, ou não, lavrar o seu testamento, nomeando os montantes monetários ou outros destinados aos bens da alma, que podiam atingir alguns milhares de ofícios religiosos marcando a sua presença na memória dos vivos no ambiente familiar e paroquiano pela repetição dos actos litúrgicos sufragâneos.
749 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.346v. 750 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.346v. 751 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.356v. 752 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.365v. 193
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1.8.2 – Das elites locais Nem todos os paroquianos tinham a possibilidade de preparar convenientemente o cortejo efémero e a celebração da representação da morte, ou porque vivia miseravelmente, em estado de pobreza, porque havia perdido as faculdades mentais, morria repentinamente, de acidente ou porque falecia ab intestato (sem testamento), não tiveram oportunidade para lavrar recomendações manifestando a sua última vontade, para a chegada à sua derradeira morada. Os ricos e endinheirados, pelo contrário, preparavam, com antecedência, a encenação da morte, com toda a sua expressividade estética e figurativa753 e expressões de luto. Participavam no cortejo fúnebre os familiares, os amigos, os vizinhos, os pobres que sempre apareciam, e os eclesiásticos cujo número era declarado pela vontade do testador, que acompanhavam o esquife desde a sua casa até à deposição, ao som dos sinos, das lamentações, da recitação de salmos, de orações pronunciadas pelos clérigos e que eram imprescindíveis para socializar a última etapa da viagem da vida. Na mentalidade rural, o peso estético, da representação, pronunciava, pela última vez, o estatuto social do defunto754. Os registos analisados mostram quão diferentemente se vivia nas freguesias do actual território do concelho de Valongo.
As Constituições Sinodais do Bispado do Porto, vertendo os aspectos doutrinários do Concílio de Trento, não impunham, como referimos a obrigatoriedade da elaboração do testamento final aos seus paroquianos, como parece ter acontecido também em épocas anteriores, dispondo-se apenas os cuidados a ter em conta quando os testadores instituem ou “mandão fazer officios, exéquias de enterramento presente, mês, e anno”755, sendo o testa-
menteiro ou testamenteiros obrigados a cumprirem, em absoluto, todas as obrigações registadas pelo agora defunto. Quanto aos abintestados, o reitor 753 VILAR, Hermínia Vasconcelos (1996) – «Rituais da morte em testamentos dos séculos XIV e XV (Coimbra e Santarém)», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições João Sá da Costa, p.165.
754 PINA, Isabel Castro (1996) – «Ritos e imaginário da morte em testamentos dos séculos XIV e XV», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições João Sá da Costa, p.128. 755 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frei Marcos de Lisboa. Coimbra: António Mariz, Impressor da Universidade de Coimbra (1585), Título 10, Constituição Terceira, p.112. 194
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ou cura da paróquia da residência do freguês defunto deverá fazer o enterramento celebrando os ofícios gerais de corpo presente, trintário e de aniversário, de acordo com a qualidade da pessoa e as suas possibilidades financeiras, assim como devia ter-se em conta o número de herdeiros. Os órfãos, com idade superior a dez anos a cargo de tutores, por estarem em idade em que já tinham consciência do pecado, estariam sob a alçada dos sufrágios da Igreja, devendo os tutores e herdeiros separar os bens da alma necessários, sob pena de incorrerem em censuras eclesiásticas, cuja absolvição seria dada após o pagamento de quatrocentos réis, repartidos entre a Sé do Porto e o meirinho756. Apesar das recomendações fortemente penalizadoras, no bispado do Porto, os testamenteiros e herdeiros dos defuntos testadores agem, muitas vezes, de forma negligente, defraudando a última vontade dos que descem ao silêncio da sepultura. O bispo D. Frei Marcos de Lisboa adverte os curas e os reitores que assentassem num livro bem encadernado “todas as capellas, aniversários, missas de obrigações, & obras pias perpetuas que alguns defunctos deixarem pera as fazer cumprir”757. Além desta imposição, o reverendo adverte os sacerdotes que escrevessem numa tábua os aniversários, trintários, missas e encargos pios com a indicação do nome do defunto, e essa tábua devia estar “pendurada na Igreja em hum prego”758.
Em São Mamede de Valongo, os abintestados estão em maioria nos registos e há casos curiosos. Em 1657 faleceu Maria Benta, celibatária; deixou poucos bens que pudessem ser afectados aos bens da alma, pois, foi, obrigada a vender o seu património para liquidar algumas dívidas que havia contraído. No fim, ainda sobrou dinheiro para lhe ser rezada uma missa com a presença de quatro padres759; Maria, moça solteira aforrou uma quantia entre quarenta a cinquenta mil réis, mas não fez testamento. Em consequência os cunhados João Pedro, ferreiro, e António André, almocreve, apos-
756 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frei Marcos de Lisboa. Coimbra: António Mariz, Impressor da Universidade de Coimbra (1585), Título 10, Constituição Terceira. 757 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frei Marcos de Lisboa. Coimbra: António Mariz, Impressor da Universidade de Coimbra (1585), Título 10, Constituição Octava, p.115. 758 Constituições Synodais do Bispado do Porto (1585) – ob. cit., p.115. 759 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.90v.
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saram-se deste património financeiro e, dele, mandaram rezar uma missa com a presença de apenas seis clérigos760; A viúva Maria Manuel, a patota, por alcunho, encarregou os seus sobrinhos de lhe mandarem rezar um ofício de corpo presente também com meia dúzia de clérigos, que seriam pagos da quantia de seis mil réis que havia deixado, na mão de Tomé Martins da Malta. Morreu endoidecida, provavelmente sozinha “se bem que estava com o filho a cada 15 dias, pouco mais ou menos”761. No território do actual concelho de Valongo haveria motivos para a inquietação dos bispos. Há vários exemplos de que tanto os herdeiros como os testamenteiros não cumpriam a vontade manifestada pelo testador. A forma como podia ser destinada a terça762 do património do testador defunto
não se enquadrava num critério uniforme. Uns asseguravam o benefício da alma através do testamento propriamente dito, com todo o seu dispositivo jurídico-formal, lavrado por um tabelião, na presença de várias testemunhas; outros paroquianos, ou por não terem condições para se deslocarem à cidade do Porto ou ao Julgado da Maia, manifestavam a sua última vontade oralmente ou “vocalmente”; outros deixavam aos seus herdeiros e familiares a tarefa de “assegurar a salvação individual pela encomendação de orações pelo defunto763. Os legados deixados nos testamentos mostram, com toda a clareza, a verdadeira discriminação social promovida pelo seu autor. Na verdade, as anotações dos reitores e dos curas, nos registos de óbito espelham essa realidade separando nitidamente os endinheirados dos miseráveis que não deixavam qualquer tipo de haveres que pudessem ser utilizados para a celebração de sufrágios a favor da própria alma nem da dos seus parentes já falecidos. Em várias situações, a última vontade do moribundo foi realizada de forma obscura, pois o sacerdote ficava na dúvida se efectivamente haviam sido cumpridas todas as disposições, por desinteresse manifesto dos familiares. Em 1616, foi sepultado, em São Martinho do Campo, o freguês António Gonçalves, natural de Balselhas, que havia deixado testamento mas o padre João da Fonseca tinha dúvidas de que a fazenda arrolada pelo testador fosse 760 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.95.
761 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.345.
762 Constituições Synodais do Bispado do Porto (1585) – ob. cit., p.115. 763 PINA, Isabel Castro (1996) – ob. cit., 113.
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suficiente para realizar todas as obrigações764; em 1659, Domingos Francisco, natural de Luriz não tendo feito testamento escrito, manifestou, entretanto, a sua última vontade oralmente “de palavra” transpondo os benefícios da alma para o valor de um carro de cereais que lhe deviam entregar no ano seguinte, e com o seu valor se “lhe fizesse seus ofícios até donde chegasse”765. Em São Martinho do Campo destacam-se pelas quantias deixadas para o benefício dos defuntos, pelo sacrifício da Missa, pelas esmolas, práticas e devoções a certos santos766, alguns dos seus paroquianos. Em Maio de 1798
faleceu João da Rocha, natural de Balselhas, viúvo, apenas com os sacramentos da penitência e da santa-unção. No seu testamento, para o benefício da alma, recomendou a celebração dos ofícios gerais com o acompanhamento de sete padres; mandou realizar três dezenas de missas com a esmola de cento e vinte réis, cada uma. Metade destas missas seria pela alma de sua mulher já defunta. Pediu que seu corpo fosse amortalhado em um lençol de linho, deixando todo este encargo a seu filho Manuel, que o cumpriu integralmente767, despendendo cerca de três mil e seiscentos réis. No início do século XIX, morreu Manuel Jorge Moreira, casado com Ana Moreira da Rocha, do lugar de Balselhas. No seu testamento nomeou como herdeiros os filhos António, Simão, Manuel e Maria, solteiros, e deixou por sua testamenteira a esposa. Da sua fortuna, reservou cerca de cento e cinquenta mil réis para pagamento dos ofícios gerais, que não dispensavam a presença de dez clérigos; duzentas missas, cinquenta das quais por encomendação da de alguns familiares: do pai António Jorge Moreira, da mãe Maria Antónia, da tia Maria Moreira, do irmão António Jorge Moreira e da irmã Rosa Moreira. A este valor acresce a esmola, em dinheiro, deixada para ser distribuída pelos pobres no montante de dois mil e quatrocentos réis768, correspondentes a cerca de 1.6% das intenções pias.
764 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.209. 765 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.222.
766 MATTOSO, José (1996) «Os Rituais da Morte na liturgia hispânica (séculos X a XI)», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições João Sá da Costa, p.63.
767 ADP, E/27/4/3-11.1, fl.210v. 768 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.215.
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Em 1814, faleceu Eufrásia de Oliveira, viúva de Manuel Jorge, do lugar do Outeiro; deixou no seu testamento cerca de sessenta e seis mil réis para sufrágios: ofícios de corpo presente, trintário e de aniversário pedindo que estivessem presente no cortejo fúnebre dez padres, para os quais reservou duzentos réis a distribuir por cada um deles; seiscentas e sessenta missas, com a esmola ordinária de duzentos réis para os eclesiásticos que estivessem presentes e que intercedessem pela sua alma; cem ofícios pela alma de seu pai e outros tantos pela de sua mãe; cinquenta pelas almas dos avós paternos e maternos, incluindo também os seus padrinhos; cem missas pela de seu primeiro marido José da Silva; cem pela de seu segundo esposo Manuel Jorge, e dez “pelas almas mais desamparadas do Purgatório”769. Foi sua herdeira e testamenteira, a prima Helena, casada com Martinho Gonçalves.
No mesmo ano desceu ao seio dos mortos Manuel Moreira, viúvo, do lugar de Luriz da Ribeira. Para o benefício da alma mencionou, por via testamentária, a quantia de cerca de quinze mil e seiscentos réis, que seriam gastos nas missas do dia, do mês e ano, dando-se a cada um dos dez padres que deviam integrar o cortejo, a importância de cento e vinte réis de esmola; deixou também a incumbência da realização de dez missas pela alma de sua mãe Escolástica Ferreira e cinquenta pela de sua irmã Marina Moreira. Foi seu testamenteiro o filho António Moreira que satisfez integralmente as disposições finais de seu pai770. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes destacam-se alguns ermesindenses, embora os montantes consagrados sejam menores, evidenciando claramente um estatuto social inferior àqueles paroquianos que deixavam fortunas em outras freguesias. Nesta paróquia, os grupos sociais são mais homogéneos, escalonando-se entre os médio ricos, os pobres e os muito pobres. Em todo o caso, podemos salientar alguns titulares que reservaram certas importâncias para terem direito a serem recordados entre os vivos e aliviados na última viagem, com a intercessão dos padres sufragistas acompanhados pelos pobres que se quisessem associar em cada celebração posterior para remissão dos pecados do defunto.
769 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.216. 770 ADP, E/27/4/2-8.6, fl.216. 198
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Da aldeia de São Lourenço cite-se Maria Fernandes, falecida em 1653, mulher de Isac António, que deixou seu marido por herdeiro e pelo menos quinhentos réis para benefício espiritual771; Margarida Antónia, por indicação verbal, nomeou por testamenteiro, o genro António Pereira, que gastou novecentos réis com ofícios772. No lugar de Vilar de Matos faleceu em 1792, Luzia Antónia, esposa de Manuel António encarregando os herdeiros com a obrigação de mandarem dizer duas mil e quatrocentas missas, por sua alma, e pelas das dos seus ascendentes até ao terceiro grau, tios, um irmão e várias irmãs; pedia que seu corpo fosse amortalhado em hábito das religiosas da Ordem de Santa Clara, acompanhado por quinze padres, numa cerimónia que foi presidida pelo abade Jacinto Pereira do Lago773; Ainda no final do século XVI, Gonçalo Afonso, do lugar de Ermesinde, reservou do seu património, quinhentos e quarenta réis para pagar a três padres, e mais não afectou por ter deixado dívidas no valor de duzentos e sessenta e cinco réis774. No princípio do mês de Agosto de 1636 foi sepultada Dona Maria Pais, viúva, da aldeia de Sá; no seu testamento mencionou dois mil e duzentos réis para recompensar a oito padres que deviam fazer parte de todas as cerimónias fúnebres775; em 1643, faleceu Isabel Antónia que reservou quatro mil
cento e quarenta réis, conforme a anotação do abade António da Rocha776. Do mesmo ano, ficou a notícia do falecimento de Justa Gonçalves, viúva de Sebastião Fernandes, que apesar de não ter feito testamento, mandou gastar mil e quinhentos réis777, para a encomendação da alma; com a idade de setenta anos, foi sepultado em 1783, João Ferreira Bernardes que reservou para sufrágios cerca de quarenta e cinco mil réis: para os ofícios gerais com seis padres, duzentas missas pela sua alma, uma centena pela de seus pais e cinquenta missas em memória de seu irmão João e outras tantas pela de sua
771 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218.
772 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v. 773 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.188v. 774 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.193v. 775 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.207.
776 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.209v. 777 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.209v. 199
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mulher e pela de Maria Lourença Rasteira mais cinquenta missas, e ainda outras vinte, com a esmola de cem réis. Foi acompanhado por dezoito sacerdotes atá à sepultura, onde desceu envolto em hábito de São Francisco778; Em 1793, Ana Maria de Jesus indicou por seu herdeiro José Fernandes, de Rio Tinto, que gastou em missas, para além dos direitos paroquiais cerca de quinze mil réis; foi sepultada no dia seguinte ao do seu óbito, com a participação de dez padres779; António de Sousa Cunha (1795) separou cerca de trinta e um mil réis para ofícios em benefício de sua alma, da de seu filho José de Moura Cunha, da de sua mãe e vinte missas pela alma de “sua primeira mulher e outras vinte missas pela alma da segunda mulher”780.
Em 1591, Domingos Fernandes, natural de Vilar, terá nomeado seu filho Domingos Fernandes, para pagar as ofertas correspondentes à presença de quatro padres para o acompanhamento do corpo de sua casa até à sepultura, deixando para o efeito quatrocentos e oitenta réis781. Em 1654, António Fernandes nomeou por herdeira, a mulher Catarina Álvares que, nessa condição, satisfez os ofícios ordinários, pagando seiscentos e cinquenta réis782.
Na aldeia de São Paio faleceu, em Dezembro de 1642, Catarina Gonçalves viúva de António Pires e destinou, por testamento, sete mil réis para sufrágios distribuídos por todos os que lhe prestassem a sua última homenagem783; em 1789 foi anotado o óbito de Manuel da Silva que indicou
por testamenteiro Manuel Moutinho, da aldeia de Ardegães, o qual disponibilizou no benefício da alma do defunto cerca de dezasseis mil e quinhentos réis, as ofertas em uso na paróquia de São Lourenço, e ainda dez alqueires de “milham”. Foi sepultado envolto hábito da Ordem de São Domingos, no dia seguinte ao óbito, pelo cura coadjutor Custódio de São José da Costa Ferreira, com o acompanhamento de dez religiosos784; por testamento verbal,
Manuel de Sousa (1790) instituiu que o seu corpo fosse acompanhado de sua 778 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.138v. 779 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.172.
780 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.180v. 781 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.192v. 782 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v. 783 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.209. 784 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.158. 200
Joel Silva Ferreira Mata
casa até à sepultura por cinco sacerdotes; além das missas de corpo presente, trintário e de aniversário impôs quatro dezenas de missas em proveito de sua alma, de cem réis de esmola, uma a Nossa Senhora da Silva de cento e vinte réis, e pela alma de sua mãe, cinco missas. Não obstante, o cura coadjutor Custódio de São José da Costa Ferreira referiu que ignorava “as testemunhas que presenciaram esta disposição”785. O certo é que foram gastos cerca de quatro mil seiscentos e vinte réis aplicados nos procedimentos supostamente expressados pelo moribundo. Joana Moutinha, viúva, separou das suas poupanças vinte e nove mil réis para as largas dezenas de missas a seu favor, da alma dos pais, do marido, e de Maria Moutinho, (quando falecer) e pelas almas do Purgatório786; José Ferraz de Melo que faleceu (1811) “na sua quinta da Prozella”787.
No seu funeral, pelo bem da alma, foram gastos cerca de dois mil setecentos e sessenta réis, dado que o ofício de corpo presente ocorreu com a presença de vinte três clérigos, e no dia 13 de Maio, do mesmo ano, desceu à sepultura sua mulher Quitéria Moutinha de Jesus, repentinamente, na referida quinta. Os cônjuges haviam feito “testamento de mão comum”788, um ao outro. Ao seu funeral assistiram vinte e seis religiosos reservando de esmola cerca de três mil cento e vinte réis, além das ofertas convencionadas nesta paróquia. A cerimónia foi presidida pelo abade João de Figueiredo Abreu. Do lugar da Cancela, vejamos os seguintes paroquianos: Catarina João falecida em casa de Domingos João, seu sobrinho, na aldeia de Ermesinde. Segundo a indicação do abade António da Rocha “não dispôs nada de sua fazenda e tudo ficou na mão delle”789. O texto não é claro mas tudo aponta
para que o sobrinho não tivesse mandado celebrar os ofícios ou separasse qualquer importância para integrar nas preces os familiares já defuntos de sua tia; em 1789 foi registado o óbito da celibatária Francisca, com setenta anos de idade. Deixou para a cura da alma treze ofícios que deviam ser celebrados no altar privilegiado de Nossa Senhora da Silva, de cinquenta réis de esmola; duzentas missas de vinte réis, e pela alma de seus pais mandou 785 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.161v. 786 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.183.
787 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.214v.
788 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.2155. 789 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v.
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dizer cinquenta ofícios. Na sua longevidade assistiu à morte dos irmãos João António, Maria, Luísa, e Josefa e de seu cunhado Roque João, destinando a cada um dez missas e “finalmente mais vinte missas pelas almas do Purgatório todas de esmola de cem réis”790, obrigações que foram totalmente cumpridas pelo seu testamenteiro Manuel António, seu sobrinho e morador no mesmo lugar. Além destas missas, a testadora ainda instituiu a esmola de dez réis para cada um dos pobres que assistisse ao seu funeral e cinco réis aos de menor idade. À Confraria do Santíssimo Sacramento, da freguesia de São Lourenço d’Asmes ofereceu a verba de mil e duzentos réis, e às capelas de Nossa Senhora, São José, São Sebastião, São Silvestre, Menino Jesus, Nossa Senhora das Dores, Arcanjo São Miguel, deu, individualmente, a quantia de duzentos e quarenta réis a cada uma destas instituições791; Do lugar da Igreja podemos lembrar José Martins (1712) que deixou a seu filho João Martins os encargos religiosos “por assim o encarregar na doação que lhe tinha feito quando lhe doou seos bens. Deixou a sua terça d’alma a sua mulher Maria de Payva com a obrigação de ella lhe mandar dizer cincoenta missas em altar privilegiado desta Igreja”792, no montante
de cinco mil réis. Participaram no cortejo, no dia seguinte, pelas onze horas da manhã, vinte sacerdotes793; António de Sousa (1796) cativou do seu património financeiro cerca de catorze mil e novecentos réis para a realização de dezenas de ofícios. Foi sepultado envolto em hábito da Ordem de São Francisco, no dia seguinte, de manhã, e teve no cortejo fúnebre a presença de dez padres que receberam individualmente cento e vinte réis794. Os paroquianos de nível socialmente mais elevado da freguesia de Santo André de Sobrado distinguem-se também pelo excessivo número de ofícios religiosos que ficavam a cargo de familiares, e dos curas da paróquia a quem competia realizar as missas. De acordo com o direito canónico, as últimas vontades expressadas pelos defuntos, no seu leito, pertencem tanto ao foro
790 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.158v. 791 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.158v. 792 ADP, E/27/4/4-15.2, fl. 170. 793 ADP, E/27/4/4-15.2, fl. 170.
794 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.183v. 202
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eclesiástico como secular795, assim os ofícios regulares (de corpo presente, do trigésimo dia e de aniversário), como outros celebrados na paróquia, como devotadas a determinados psicopompos com altares em outras paróquias. Usando a mesma metodologia da “terça parte” deixada para a cura da alma do encomendado, ou a de seus parentes, que o moribundo aproveitava para trazer à memória nas cerimónias relativas ao seu passamento, citemos, por lugar, as famílias mais representativas, excluindo as oligarquias familiares dos religiosos que já foram tratados em item anterior. Assim, no lugar de Vilar dominavam economicamente a família de Domingos Manuel, falecido em Julho de 1711, e que, à sua morte, deixou vinte mil réis para missas a realizar em altar privilegiado além do necessário para pagar a assistência de doze padres nos ofícios gerais, cuja importância devia rondar os dois mil e quatrocentos réis796; a de André Pereira que se
finou no mesmo ano e que no seu testamento tabeliónico destinou cerca de dez mil réis para suprimento de uma centena de missas e outros cinco mil para os ofícios litúrgicos de corpo presente, trintário e de aniversário, para dar de esmola a vinte padres assistentes no primeiro evento e a quinze nos subsequentes797.
Outra família de fartos recursos era a de Rosa de Sousa, falecida em 22 de Julho de 1728, casada com André de Sousa, que fora sepultada pelo padre Manuel Baldaia de Magalhães. A defunta havia feito testamento conjunto com seu marido e nele dispuseram: “Que os [seus] corpos fossem amortalhados em habito de Religião Sagrada e sepultados dentro da Igreja donde são os fregueses e os acompanharão vinte padres de caza ate a Igreja e assistirão ao oficio de corpo presente aos quaes se dará a esmola costumada e se farão mais dous officios também de vinte padres cada hum dando se lhes a esmola costumada e
795 Constituições Synodais do Bispado do Porto ordenadas pelo muyto Illustre & Reverendissimo Senhor Dom Frei Marcos de Lisboa. Coimbra: António Mariz, Impressor da Universidade de Coimbra (1585), Título 14, Constituição Octava, Título 24, p.115. 796 ADP, E/27/4/5-20.1, fl.130v. 797 ADP, E/27/4/5-20.1, fl.130v. 203
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ao nosso parocho darão as ofertas costumadas, digo as ofertas conforme as nossas qualidades”798. Estes testadores deixaram, por suas almas, seiscentas missas, com a esmola de cem réis; dezanove que deviam ser sufragadas em altar privilegiado, assim como mais uma centena de ofícios pelas almas de seus parentes mais próximos. Encarregaram por administradores do seu legado, a filha Maria e seu marido Pedro Baltasar, que herdaram duas propriedades rústicas: o lameirinho de Fontelo e a leira da Agra da Costa, na condição de mandarem rezar três missas pelo Natal, dos rendimentos destes imóveis799.
Todavia, sendo o testamento uma manifestação de vontade unilateral, os herdeiros de Rosa de Sousa e de seu marido André de Sousa, se porventura não estivessem interessados no património doado nas condições expressas pelos seus mentores, os bens deveriam ser entregues à Confraria das Almas, da freguesia de Santo André de Sobrado, com o encargo pio declarado. À Confraria do Santíssimo Sacramento, os testadores confiaram “cinco medidas”800 que os confrades pagavam aos seus doadores. As missas a celebrar pelo Natal seriam para o bem das almas do casal e pela da de seu filho, o padre António de Sousa e pelas almas dos seus parentes mais próximos. Finalmente ficou a indicação, para se celebrarem mais três centenas de missas, por suas almas e da de seu filho, pela esmola de cem réis unitários. Em todo este percurso viático, o casal obrigou os seus herdeiros a oferecerem à Igreja cerca de cento e oito mil e duzentos réis, além das ofertas ao pároco, de acordo com a qualidade social dos defuntos801.
798 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.194. 799 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.194. 800 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.194. 801 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.194. 204
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Registo do óbito de Rosa de Sousa, com a indicação dos bens da alma. Fonte: ADP, E/27/4/6-21.1, fl.194-194v.
Outra família elitista, deste lugar, terá sido a de José Ferreira Dias, casado com Maria Moreira, falecido em 1782, que no testamento outorgado a seus filhos José e Luzia, tornado público pelo pároco que assistiu aos ofícios religiosos e que diz: “Nelle reduzido a publica forma acho [diz o padre José António Ferreira da Silva] pella mayor parte das testemunhas 205
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do mesmo [testamento] que deixava pella sua alma cento e vinte missas e por algũa acho deixara cento e sincoenta e mais três officios de padres quada hum pella sua alma”802. Neste caso, deixou para as duzentas e setenta missas a quantia de vinte e sete mil réis, não se declarando o número de religiosos que o testador teria indicado para lhe prestarem a última homenagem e encomendá-lo ao trigésimo e dia do aniversário, com esmola assegurada. Em regra seriam dez padres, o que devia perfazer a importância de três mil réis. Assim, José Ferreira Dias entregou cerca de trinta mil réis à Igreja para provimento das exéquias e dos bens da alma.
Testamento de José Ferreira Dias sobre os bens da alma. Fonte: ADP, E/27/4/6-22, fl.247v.
No lugar de Ferreira destaca-se a família de Catarina da Costa, viúva de Luís Fernandes, que falecera em 1782. Ficaram por seus testamenteiros, seu irmão Manuel João da Costa, do lugar do Paço, e herdeiros Manuel do Vale, Maria do Vale e António Ferreira da Costa. O testamenteiro dispôs integralmente o bem pio, assistindo dez sacerdotes “com obrigassam de virem a porta acompanhar hu corpo emthe a Igreja com a esmola de doze vinténs a quada padre e suas ofertas costumadas ao uso e custume da freguesia”803. Outra família abastada seria a de Maria Antónia, viúva de Manuel André que se finou em 1791. Com efeito, o seu féretro foi embrulhado em hábito cisterciense, numa cerimónia acompanhada por nove padres e música 802 ADP, E/27/4/6-22.1, fl.847v. 803 ADP, E/27/4/6-22, fl.848v.
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litúrgica adequada ao acto; nos sufrágios do trintário e de aniversário assistiram dez sacerdotes, apesar de a testadora ter indicado a presença de doze, aos quais seriam distribuídas as ofertas em uso na freguesia804; que fossem rezadas seis missas no altar Senhor dos Aflitos e outras tantas no de Nossa Senhora do Rosário. Para distribuir pelos pobres presentes no funeral, a quantia de quatrocentos e oitenta (ou quinhentos) réis; como derradeira exposição ao mundo dos vivos, a viúva Maria Antónia pediu que no dia de seu enterramento fosse dita uma missa em altar privilegiado e que por ela daria, a título de esmola, cento e cinquenta réis805. Do início do século XIX, aponte-se a família de Manuel Ferreira Pires, falecido a 8 de Julho de 1808, que então confiou em seu filho Timóteo as funções de testamenteiro. O autor designou três missas de vinte clérigos, e que seu corpo fosse amortalhado em hábito de religião aprovada; que fossem celebradas cem missas por sua alma, cinquenta pela de seu pai e sua mãe; vinte e cinco pela alma de sua primeira mulher e outras tantas pela de seu tio António Ferreira, e outras a que estaria obrigado806, pelo seu estatuto social. No total dispôs de cerca de trinta e seis mil réis consagrados no seu testamento para o vínculo religioso. A família representada por Manuel Martins Ferreira – que era marido de Maria André – seria também uma das principais do lugar. Na escritura que outorgou sobre as recomendações finais, dispôs dos ofícios em uso na freguesia; duzentas missas distribuídas equitativamente por sua alma, de sua mulher, seu filho Domingos e pelas “almas das suas obrigações”807 num
total de cerca de vinte e três mil réis.
No lugar do Paço saliente-se a família de Maria João Oliveira, que faleceu em 1797, apenas com o sacramento da santa-unção “por se achar incapas”808. Instituiu o marido José Ribeiro por seu legítimo testamenteiro o qual cumpriu os desígnios de sua esposa quanto à complexa carga do legado pio. Os ofícios de corpo presente, do trigésimo dia e de aniversário deviam
804 ADP, E/27/4/6-22, fl.869. 805 ADP, E/27/4/6-22, fl.869.
806 ADP, E/27/4/6-22, fl.509v.
807 ADP, E/27/4/6-1.1, fls.22, 22v. 808 ADP, E/27/4/6-22, fl.878.
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contar com a presença de dez eclesiásticos; estipulou para encomendação de sua alma quatrocentas missas, trinta pela de seus pais, quinze pela de seus avós “e mais huma moeda de ouro de quatro mil e oitocentos réis”809 cujos ofícios deviam ocorrer em apenas seis meses, a contar da data do óbito; outras duzentas missas por sua alma e pela da tia Helena de Vilar “duas moedas de ouro de quatro mil e oitocentos réis a Senhora das Necessidades de Sobrado e outras duas moedas à Senhora do Amparo das Necessidades que são promessas que fez e estas quatro moedas serão dadas dentro de trinta dias depois de seu falecimento”810. Para cumprimento directo do bem pio com a sua alma, dos pais e da tia, assim como para o pagamento de promessas que não pôde realizar em vida, deixou dos seus bens e heranças cerca de noventa e dois mil e cem réis. De meados do século XVIII podemos eleger outra família socialmente reconhecida à qual pertencia Ana Gaspar, viúva de Domingos Fernandes, falecida em 1752. Optou por não fazer testamento, mas na outorga da escritura de dote a beneficiar o filho António Fernandes, que vivia com ela, indicou a celebração de três ofícios com a presença de quinze religiosos e pediu para ser sepultada na igreja, sendo o corpo amortalhado em hábito de religião acompanhado para a igreja “com música de canto de órgão”811.
Entretanto, e quando tomou, pela última vez o sacramento da confissão “pera morrer dice que não queria musica e pello que se havia de gastar com ella hum (sic) mandasse seu filho dizer pella sua alma vinte missas de esmola de cem reis”812, que o padre Manuel Baldaia de Magalhães se prontificou a celebrar. Esta cristã, moribunda no seu leito, deixou para o benefício espiritual próprio cerca de seis mil e quinhentos reis. Do século XIX, recorda-se a família representada por Manuel Fernandes Pinguela, que faleceu a 30 de Janeiro de 1835, com todos os sacramentos recebidos. A esposa, Ana Duarte foi nomeada por sua testamenteira para afectar os bens da alma da seguinte forma: fazer o funeral conforme o uso da freguesia, e que os ofícios gerais tivessem a presença de dez eclesiásticos. O padre Nicolau de Tovar e Proença certificou que assistiram apenas seis
809 ADP, E/27/4/6-22, fl.880. 810 ADP, E/27/4/6-22, fl.880.
811 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.200v. 812 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.200v. 208
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clérigos. Deixou ainda cinquenta missas pela sua alma, e igual número pela da esposa e dez pelas de seus pais813. No lugar de Sobrado, núcleo central desta freguesia, em território mais interior, mais distante do pólo aglutinador que era São Mamede de Valongo, faria parte da elite local, a família de Isabel Alves, mulher de Domingos André, cujo óbito foi registado em 1731, e que no texto testamentário exarou uma série de recomendações para o bem de sua alma; pediu que o seu cadáver fosse embrulhado em hábito de Santo António, e diversificou os ofícios: o primeiro, de corpo presente, com a assistência de trinta clérigos, os do trigésimo dia e o de aniversário com vinte sacerdotes; destinou cinquenta missas celebradas no altar de Nossa Senhora, e outras tantas no altar do Senhor, de esmola de cem réis a distribuir a cada cura814. A testadora previu cada passo da representação cénica do seu funeral para perpetuar na memória dos vivos por muito tempo. Na igreja, mandou acender duas velas, uma em cada altar, e quatro no altar-mor815; não sendo, porém, inédita a oferta de elementos iluminários816, a sua presença é rara, e está, para notoriedade de alguns, plasmada em alguns testamentos dos valonguenses globalmente considerados. Por outro lado, Isabel Alves pediu que a descida ao convívio dos mortos fosse acompanhada “com música de canto de orgam”817. O seu legado para todo este aparato solene deve ter custado cerca de dezoito mil réis, além das ofertas convencionadas na freguesia. Este acontecimento fúnebre foi presidido pelo padre Alexandre Carneiro, por ausência do abade Jeremias da Silva Pereira818.
813 ADP, E/27/4/6-1.1, fl.43.
814 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26. 815 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26.
816 PINA, Isabel Castro (1996) – ob. cit., p.127. 817 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26. 818 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26. 209
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Registo do óbito de Isabel Alves, da freguesia de Santo André de Sobrado, em 13.10. 1731. Fonte: ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26.
Em meados da centúria de Setecentos, seria influente a família de Domingos André, falecido em Abril de 1754, cujo “testamento de um ao outro” foi apontado minuciosamente no registo do Livro dos Óbitos, pelo padre Manuel Baldaia de Magalhães cujo teor se transcreve: “[No tempo de sua mulher Isabel Alvares] que era viva ficarão ambos seu testamento e nelle quanto ao bem d’alma disseram o seguinte: que levando Deos desta miserável vida querem que seus corpos sejão sepultados dentro da Igreja da dita freguesia (…) e que sejão embrulhados em habito de Santo António e que seu testamenteiro ao diante declarado lhe mande fazer pela alma de cada hum deles três padres seis officios, a saber, a do corpo presente de cada hum deles sera de trinta padres e obradas costumadas e que ao officio de corpo prezente de cada hum deles sua o acompanhamento com musica dos ditos officios; estarão quatro vella acezas no alltar Mayor e duas em cada hum dos collateraes os quaes offcios querem e he sua tenção se façam inteiros sem que se possão partir e que se mandarão dizer pela alma de cada hum deles testadores cem missas de esmola de tostão cada hũa ditas na Igreja da dita freguesia de Sancto Andre de Sobrado: cincoenta no altar privilegiado da Senhora e outras cincoenta no alltar do Senhor; 210
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ditas as ditas cem missas dentro de hum anno depois do falecimento de cada hum deles como também seis officios pela alma de cada hum serão feitos dentro do anno depois do falecimento de cada hum deles testadores; e querem que em primeiro de tudo pelo mais bem parado de seos benefícios satisfação todos os dias bens d’alma”819. Tanto quanto podemos apurar directamente, o casal deixou para despender em legados para encomendação de suas almas, a soma aproximada de vinte mil réis. É um testamento muito completo no qual podemos encontrar os elementos essenciais e necessários ao cerimonial fúnebre de um paroquiano com elevado estatuto social: nomeação do lugar de sepultura, vestuário para o cadáver, ofícios de corpo presente, do trintário e de aniversário, celebrados por três padres (designação inédita), presença de um elevado número de religiosos nos diferentes ofícios a prestar a ambos os cônjuges, a música e cânticos litúrgicos apropriados aos actos fúnebres, as velas para iluminar o altar-mor e os altares do Evangelho e da Epístola, as missas em altar privilegiado e o espaço cronológico de uma ano imediatamente a contar da ocorrência da morte dos testadores, num contínuo de ofícios que explicam a dialéctica vida-morte. Apesar do escrutínio singular, os testadores não evocaram quaisquer missas pelos seus familiares defuntos820, nem pelas almas do Purgatório,
como acontecera com outros legados pios de elevados valores. No entanto, os elementos referidos denotam um cuidado assaz notável com a ritualização cerimonial do cortejo fúnebre até à deposição sob a terra, prolongando a sua vivência no mundo familiar e da comunidade dos vivos pela obsessão dos ofícios religiosos, em torno do percurso viático, pela chamada sistemática e rotineira de familiares, amigos, vizinhos e pobres, à paroquial de Santo André de Sobrado. Também em Sobrado, foi, indiscutivelmente, uma das suas famílias mais notáveis, a da casa do abade António Manuel Baldaia de Magalhães, representada por sua mãe, “a excelentíssima senhora Dona Maria Clara Baldaia
819 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.202v.
820 MATTOSO, José (1996) – «Os Rituais da Morte na liturgia hispânica (séculos VI a XI)», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular. Lisboa: Edições João Sá da Costa, p.63. 211
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de Tovar e Meneses” – referência dada pelo padre-cura Manuel Carneiro da Silva, que fez o assento do óbito ocorrido a 9 de Maio de 1767, em cujo testamento deixou generosamente a quantia de cerca de seiscentos e sessenta mil réis para os bens de sua alma e de outros familiares e residentes em sua casa, cujo conteúdo foi trasladado para o assento de óbito para relevar a organização do cortejo fúnebre, a indumentária extraordinariamente rica e os ofícios religiosos que deviam ser realizados consecutivamente no prazo de meio ano, logo após a sua morte: “[Que] seu corpo fosse sepultado dentro da Igreja de Sobrado donde era padroeira e que se desse ao reverendo parocho as ofertas costumadas e que seu corpo fosse amortalhado em habito do Carmo e por baixo deste habito dos capachos e os corpoladios (?) de Sam Bento e de Nossa Senhora da Conceiçam e hum rozario branco com padre nossos pretos e sobre a capa e habito de sarafina (fl.232v) e que fosse a sua roupa mais comprida de viúva e que seu corpo fosse levado a sepultura por seis pobres e a todos digo a a cada hum dos seis pobres se lhe dece mil e duzentos e que pella sua alma se fizecem tres officios de sincoenta padres o segundo e terceiro e o primeiro fosse geral e todos fosem feitos suçacivamente a dia do óbito; mais deixou pella sua alma quatro mil missas de esmola de cem reis cada huma e mais deixou duas mil missas da mesma esmola de cem reis cada huma, cem missas pella alma do reverendo abbade Jeremias da Silva Pereira e cem missas pelas almas do Purgatorio e as mais focem ditas missas pelas almas de seus pais e avos e tio Manoel Ferreira exceto quarenta que trinta focem pella alma de sua criada que foi Oliveira por nome e des pella alma de Catharina e deixou que se dece a sua criada Anna Maria dous mil e quatrocentos reis cuja obrigação satisfez seu filho o reverendo abbade desta freguesia como deixou a tresladar e a seu filho Joze Pamplona deixou que daria doze mil reis para se fazer huma oferta cada anno ao Senhor dos Necessitados na Igreja de Sam Miguel de Beire a cuja legado nomeou certos prazos, e também deixou ao dito seu filho Joze Pamplona a sua terça d’alma com obrigação de 212
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lhe mandar dizer todos os anos três ternos de missas de Natal e que todas as missas assima fosse ditas no (fl.233) termo de seis meses e nada mais”821. A realidade cerimonial nem sempre coincidia com a última vontade do testador ou da testadora. Com efeito, à missa de corpo presente assistiram sessenta e quatro sacerdotes, na do trigésimo dia cinquenta e três e na do dia do aniversário quarenta e oito clérigos, como demonstração do estatuto social da padroeira Dona Maria Clara Baldaia de Tovar e Meneses. Assim, ficou registado na margem lateral direita do assento de óbito, pela mão do padre-cura Manuel Carneiro da Silva822. No ano seguinte faleceu outra conterrânea chamada Catarina Pereira, viúva de Domingos da Costa que nomeou como sua herdeira e testamenteira Ana Teresa, sua sobrinha conjuntamente com seu marido Domingos Pedro (?) Gonçalves. Na nota tabeliónica que o pároco transcreveu, a autora indicou como sua vontade, que o corpo fosse amortalhado num simples lençol e que lhe fossem rezados três ofícios com a presença de dez padres e ainda trinta missas para a encomenda de sua alma; vinte e cinco em altar privilegiado de Nossa Senhora do Rosário; cinco no altar do Santíssimo Sacramento; e trinta missas pelas almas “do fogo do Purgatorio de oitenta reis cada hũa por hũa ves somente”823. Na viragem do século XVIII para o século XIX trazemos à memória a família de Luzia Moreira, viúva, que faleceu a 3 de Setembro de 1800. Deixou por seu testamenteiro o padre Manuel Moreira, da freguesia de Rebordãos. É das poucas pessoas que pede para ser depositada num caixão, embrulhada em “Hábito de Religião” aprovada. Na missa de corpo presente assistiram somente doze religiosos, apesar de ter deixado esmola para duas dezenas de clérigos. O testador cumpriu o desejo da viúva, mandando proferir quinhentas missas em proveito da alma da própria e cem pelas de seus predecessores. Ao todo, a sobradense Luzia Moreira, de sua terça, deixou cerca de setenta e seis mil e oitocentos réis. 821 ADP, E/27/4/6-21.1, fls.232-233. 822 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.232v. 823 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.238v. 213
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No lugar da Costa, a família do viúvo Francisco Moreira que finou em 1800, é, em termos de bens pios, a mais notável. Além dos bens destinados ao benefício da alma, o testador deixou indicações precisas sobre a distribuição patrimonial pelos seus herdeiros. Quanto aos bens da alma, aplicou cerca de dez mil e oitocentos réis, distribuídos por cinco dezenas de missas, além dos ofícios gerais, com a presença de quinze clérigos, embora no primeiro – o de corpo presente – assistissem somente nove eclesiásticos, como refere o padre Joaquim Barbosa, coadjutor824. A uma das suas afilhadas deixou uma moeda de ouro, a outra, chamada Maria, cinco mil réis, e à filha Ana Custódia, um cordão de ouro, vinte mil réis e a uma certa Maria cerca de vinte e seis mil réis, a outros familiares825, dando a entender que o património em moeda e em jóias andaria pelos sessenta e cinco mil e quatrocentos réis e um cordão cujo valor não é possível calcular.
No lugar da Devesa salienta-se, no século XVIII, a família de Maria Pereira, mulher de Manuel Gaspar, que falecera em 1750. Foi sepultada dentro da igreja paroquial em cerimónia presidida pelo padre Manuel Gaspar. No seu testamento “nuncagnático”826, comprovado por sete testemunhas, mora-
doras no mesmo domicílio da testadora, deixou ao seu administrador dos bens da alma, a quantia de quatro mil e oitocentos réis, mas foi a seu marido que impôs a tarefa de mandar celebrar missas tanto no altar do Santíssimo Sacramento (50%), como no de Nossa Senhora do Rosário827, distribuídas na mesma proporção. Os bens para encomendação da alma do defunto eram geralmente deixados em dinheiro. Alguns testadores, não o tendo, indicavam o rendimento proveniente de prédios rurais ou aquele que poderia resultar da alienação dos mesmos, como fez, por exemplo, Manuel Fernandes, já viúvo, e que faleceu em 1750:
824 ADP, E/27/4/6-22, fl.507v. 825 ADP, E/27/4/6-22, fl.507v.
826 A palavra “nuncagnático” ocorre em diversas ocasiões e parece corresponder ao testamento realizado inter-vivos (marido e mulher), no qual cada um dos cônjuges reserva, para si uma parte do património para dispôr como entender. Será sinónima da expressão “testamento de mão comum” e de “testamento de um ao outro”. 827 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.197.
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“Em huns apontamentos que disse que fes a seu genro Amaro Joam nelles declarou que lhe farião os seus bens d’alma conforme o uso [e neles reservou a sua] a cabadinha chamada de Cutellos em algum tempo do mundo se vendesse que tudo quanto per ella se desse fosse pera a alma delle Manoel Fernandes”828. Estas anotações feitas pelo punho do padre Manuel Baldaia de Magalhães mostram que o mesmo aceitou o legado pio, apesar de não ter tido condições para o confirmar. Em todo o caso, apresenta várias pessoas que terão servido de testemunhas: Manuel Fernandes da Silva, do lugar de Campelo, Manuel George, alferes da freguesia de São Mamede de Valongo, e o padre Isidoro Martins da Costa, do lugar de Sobrado que serviu de relator829. A este mesmo lugar pertencia Maria da Luz, mulher de Manuel da Silveira, que foi sepultada na igreja desta freguesia, pelo padre Manuel Gaspar, a 20 de Janeiro de 1752. No seu testamento deixou vários legados e, entre eles, umas missas para serem celebradas pelo Natal; três ofícios com a presença de quinze clérigos e um ofício pelos defuntos. Porém, com o aproximar da morte, a autora terá alterado o testamento dando-lhe a seguinte redacção: “Sendo que ao depos seo codecillo ende dispôs que seu marido lhe mandaria aumentar pela sua alma emcoanto vivo e que lhe deviam duzentas missas de esmola de cem reis e que cem dellas lhe mandaria dizer seu herdeiro, a saber, cincoenta no altar de Nossa Senhora do Rozario desta freguesia as outras cincoenta a disposisam de seu testamenteiro a quem emcarregou também vários legados a pessoas particulares e nam revogou no dito codecilo os ofícios nem as missas do natal que deixou no testamento”830. Objectivamente, a testadora Ana Gaspar disponibilizou da sua fortuna, pelo menos vinte e quatro mil e quinhentos réis, para o benefício de sua 828 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.197. 829 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.197. 830 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.200. 215
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alma, não entrando, neste valor, os legados inscritos no testamento mas que o padre Manuel Gaspar não quantificou quando procedeu ao registo do assento de óbito. Neste mesmo lugar, sobressai a família de Agostinha de Araújo, viúva de Francisco Pinto, falecida em Fevereiro de 1773, e que deixou por seu testamenteiro o primo António Dias. Porém quando instado pelo padre Manuel Gaspar “nam mostrou a escretura dizendo que a tinha apensa a huns autos”831. No entanto, o corpo da testadora defunta desceu à sepultura
envolto em Hábito de Religião, acompanhado por cânticos litúrgicos ao som do órgão e com a assistência no ofício de corpo presente de quinze padres e nos segundo, terceiro e quarto ofícios, quis Agostinha de Araújo que estivessem presentes dez eclesiásticos. O envolvimento monetário resultante da sua última vontade ascende a quatro mil e quinhentos réis que o primo António Dias cumpriu. Manuel Alves, marido de Ana Pinta, falecido em 1825, com todos os sacramentos, faria parte do cortejo dos mais honrados do lugar. Fez testamento e nomeou sua esposa para dar conta dos bens por sua alma: presença de dez sacerdotes em cada um dos ofícios gerais. Por falta de padres ou por não terem sido avisados, o certo é que na missa de corpo presente assistiram somente cinco religiosos; deixou ofertas para a realização de cinquenta missas que deviam ser celebradas durante o primeiro aniversário832. A quantia separada para todos estes aspectos litúrgicos importou em nove mil e seiscentos réis.
Na freguesia de São Mamede de Valongo, os seus paroquianos estavam distribuídos por Valongo da Estrada, aglutinados em torno da igreja paroquial, num espaço urbano e pela aldeia de Valongo Susão, um espaço geográfico mais afastado do “centro” e mais ruralizante. Não se encontram grandes fortunas deixadas para acções pias relacionados com a encomendação da alma do defunto e à menção de seus familiares. O número de valonguenses pobres é dominante e são muitos os que morrem sem terem feito testamento escrito ou verbal. Em todos os óbitos 831 ADP, E/27/4/6-22.1, fl.825. 832 ADP, E/27/6/1-1.1, fl.17v.
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registados entre 1593 e 1710, os montantes, em dinheiro, deixados para o benefício viático são irrelevantes quando comparados com os que foram confiados à Igreja pelos paroquianos de outras freguesias do actual território do concelho de Valongo. Alguns que eram ricos, com muitas posses, não fizeram testamento mas pediram que lhes fossem feitos alguns ofícios de natureza geral. Entre eles lembremos Margarida João, falecida a 5 de Outubro de 1604 que teve apenas direito ao ofício de corpo presente e o do trigésimo dia, conforme consta em anotação lateral no livro dos registos de óbitos833; também, no mesmo ano é referida Graça Dias que foi despedida com as mesmas cerimónias834; Domingas Aleixa, mulher de Manuel Gonçalves, que morava na Escada do Adro da paroquial de São Mamede não fez qualquer registo tabeliónico, mas o padre Manuel Marques Fortuna indicou que o marido da defunta estava “obrigado a gastar por sua alma porque ficou muita fazenda”835. Nos ofícios de corpo presente assistiram oito padres e no do dia trigésimo e no do aniversário marcaram a sua presença doze clérigos. Terá, para o efeito, gasto cerca de três mil e duzentos réis; Antónia Gonçalves, mulher rica de Valongo, casada com Belchior Pires, lavrador, deixou, para cada ofício, o necessário para dar de esmola a cada um dos oito padres que integraram o cortejo fúnebre, cantaram e rezaram pela alma da defunta. O testamento estava mas mãos do padre-cura Manuel Marques Fortuna836, e a verba convencionada andaria pelos dois mil e quatrocentos réis; Maria Gonçalves, viúva de Manuel António, sapateiro, que fez testamento verbal, pelo qual encarregou seus filhos de lhe mandarem dizer três ofícios no primeiro mês após a sua morte com a assistência de somente cinco religiosos, e que distribuíssem cento e cinquenta réis à Confraria do Senhor, outro tanto à de Nossa Senhora do Rosário, e a Jesus cem, e a Santo António cinquenta réis. O padre Manuel Marques Fortuna confirmou, na margem direita do assento de óbito que as obrigações foram cumpridas. O valor global deixado à Igreja teria sido de cerca de mil novecentos e cinquenta réis. É curioso notar que, por vezes, pedir, ser mendicante, deambulando pelas ruas da freguesia ou de outros lugares dava, aos seus autores, um 833 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.193v. 834 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.193v. 835 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.196v. 836 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.207.
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certo desafogo financeiro que andava ocultado em vida. O seu património era descoberto com a aproximação do toque a finados. Em 1633, no início de Janeiro, faleceu Antónia Gonçalves, a capota, mulher pobre, mendiga a quem não foi feito qualquer ofício. Contudo, sua filha Maria Duarte estava obrigada a mandar celebrar os ofícios gerais em troca de um campo que sua mãe lhe havia dado e por doze mil réis que a defunta havia separado, em vida, para a encomenda de sua alma837. Nesse mesmo ano, faleceu a mãe do vigário Manuel Marques Fortuna, que anotou a hora exacta do seu passamento: às dez horas da noite, terça-feira, dia um de Março838. À missa de corpo presente assistiram doze padres; à do trintário dezasseis e no sufrágio anual dezassete. A esmola para todos estes clérigos importou em cerca de três mil e quinhentos réis.
Por indicação verbal, confirmada pelas testemunhas António Pedro, António da Fonseca, Maria, da baia branca, e Maria de Paiva, a nova, o peão Domingos deixou, por sua herdeira e testamenteira, sua irmã Maria, a quem encarregou de mandar celebrar as missas gerais e em uso na freguesia e anualmente, e para sempre, oito missas que seriam pagas pelos rendimentos provenientes do “campo da Preza”839, que havia deixado a sua filha. No total
terá reservado para os sufrágios gerais cerca de três mil réis e um encargo anual de cerca de oitocentos réis.
A falta de testamento lavrado e outorgado, ou simplesmente verbal – que teria tanto valor como o escrito pelo tabelião desde que confirmado por várias testemunhas – não invalidava a última vontade manifestada pelo paroquiano. Uma simples conversa entre cônjuges tida há muito tempo e trazida à memória, mais tarde, podia ser suficiente para que o defunto tivesse as exéquias de acordo com o seu estatuto e qualidade social. Em 1635 faleceu André António, do lugar de Valongo e à colação foi trazida uma recordação manifestada por sua mulher, Maria Branca que então lhe mandou celebrar as três missas convencionais, com a assistência de dez sacerdotes em cada uma; deu também um carneiro, cereais no valor de um tostão e três canadas de vinho para oblatas; à Confraria do Santíssimo Sacramento quatrocentos 837 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.91.
838 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.91v. 839 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.93.
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réis, à de Nossa Senhora do Rosário e à de Jesus, seiscentos réis, divididos em parte iguais840. No total, em dinheiro despendeu cerca de quatro mil réis, além dos bens alimentares em gado, cereais e vinho. Ainda da primeira metade do século XVIII podemos mencionar, Maria, celibatária, filha de António Gonçalves, do lugar de Valongo Susão, cujos bens foram confiados aos testamenteiros (seus irmãos) que se encarregaram das obrigações dos bens de sua alma e que constam de três ofícios com a assistência de sete padres em cada um deles, mas o padre Manuel Marques Fortuna anotou que o sufrágio anual não foi pago; deixou de esmola um carneiro, cereais no valor de um tostão e duas canadas e meia de vinho841. A viúva Maria João, a galega, que vivia sozinha em sua casa, falecida em 1654, apesar de não ter feito testamento ou dado qualquer indicação verbal, o vigário Manuel Marques Fortuna refere que “do que achou em casa se lhe gastou pela alma em três ofícios dia mês e ano em que se fez de gasto com a obradação de todo ano oito mil reis”842, embora a concorrência aos três ofícios fosse pouca, contando apenas com cinco padres no primeiro e seis nos restantes.
Dentro destes mesmos valores terá despendido Domingos do Vale, falecido em Maio de 1683, que encarregou sua mulher providenciar ofícios com a assistência de vinte e cinco clérigos843 e outros legados não especificados. Em
1685, a família do alferes Gonçalo Ferreira, cuja esposa faleceu em Agosto de 1685 e deixou para os ofícios gerais cerca de quatro mil e quinhentos réis844.
Nos finais do século XVII podemos referir também a família de João Loureiro, de Valongo, falecido em Janeiro de 1698, e que deixou, a cada uma das cinco confrarias da freguesia, dez mil réis e esmolas para os ofícios presenciados por vinte padres845. Foi sepultado no adro da Igreja pelo padre André Alão Durão; o valor total par estes encargos e actos pios somou cerca de cinquenta e sete mil e duzentos réis, e a família de Frutuoso do Couto,
840 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.94.
841 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.100.
842 ADP, E/27/6/1-3.1, fls.86v, 87. 843 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.288v. 844 ADP, E/27/6/1-3.1, fl.292v. 845 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.349v. 219
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natural de Valongo, que indicou sua mulher para administrar os bens da alma distribuídos pelos três ofícios gerais, as ofertas praticadas na paróquia, cinquenta missas a celebrar em altar privilegiado, à Confraria do Santíssimo Sacramento mil e quinhentos réis, à de Nossa Senhora do Rosário dez tostões e outros846, cujo valor terá importado em cerca de doze mil e quinhentos réis e trinta tostões. Do início do século XVIII, não podemos deixar esquecida a família de Manuel António Neto, que faleceu em 1707, com todos os sacramentos, e foi sepultado no adro da igreja paroquial. No dia seguinte ao do seu passamento, a esposa, Maria João, mandou celebrar a missa de corpo presente com a assistência de vinte clérigos, mas compareceram somente dezassete que parecem ter compensado a sua ausência por ocasião da missa do trigésimo dia. De acordo com as instruções insertas no seu testamento foram ditas quarenta missas em altar privilegiado, mas não há referência às oblatas em uso na freguesia847. No total terão sido entregues à Igreja cerca de dezasseis mil e oitocentos réis. Outra família de António do Espírito Santo, do lugar de Valongo, que foi sepultado no adro da Igreja paroquial de São Mamede, em Agosto de 1701 quanto à celebração dos ofícios pela alma do defunto, o reverendo Manuel Marques Fortuna diz o seguinte: “Não se lhe fes officio inda nenhum porquanto não está inda cobrado dinheiro para eles que a sua ultima vontade foi que se lhe fizesse officios de dez padres para o que deixou seis mil reis em mão de Catarina André, viúva, três em mão de Manuel António Grill odes todos pera missas e algũas mais miudezas que lhe devião de seus jornaes algũas pessoas”848. Estas parecem ser, para todo o período considerado, as famílias mais ricas e endinheiradas da freguesia de São Mamede de Valongo, quase todas fixadas em Valongo da Estrada. Porém, os valonguenses parecem ser demasiadamente singulares, pois não surgem referências cerimoniais pautadas pela exuberância do cortejo fúnebre, ao vestuário do defunto, ao canto, à música e à iluminação de altares no interior da igreja paroquial. A rituali846 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.350.
847 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.131v. 848 ADP, E/27/6/1-3.2, fl.361v. 220
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zação da morte parece ser mais abreviada e não se confunde com algumas manifestações que analisamos para outras freguesias.
1.8.3 – Os que morreram e deixaram dívidas Os registos sobre os óbitos permitem reflectir sobre as dificuldades financeiras com que viveram vários valonguenses globalmente considerados. O património legado distribuía-se pelos herdeiros e em geral a terça parte dos mesmos era entregue à Igreja que os administrava de acordo com a vontade manifestada pelos testadores. Em certos casos a multiplicação dos ofícios religiosos era travada pela existência de dívidas contraídas pelo defunto que deviam ser saldadas pelos herdeiros. Também havia alguns que morriam e deixavam créditos que não foram cobrados até à sua morte, o que também foi motivo de impedimento para aumentar o benefício sufragâneo. Vejamos alguns exemplos. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes faleceu em 1592 Gonçalo Afonso, do lugar de Ermesinde, mas nos ofícios nomeados apenas compareceram três clérigos, pois o defunto devia a João Anes, da aldeia de Sá, quinze réis e duzentos e cinquenta a André Gonçalves, do lugar de Transleça849, da freguesia de Alfena.
Em 1641, Catarina Pires, viúva, mulher pobre, natural da aldeia de Sá, instante na casa de Gonçalo Francisco “mandou se vendesse o que tivesse e lhe pagasse dous mil reis que devia ao dito Gonçalo Francisco e o que sobrasse se lhe gastasse polla alma”850. O abade António da Rocha anotou à
margem, que, pela defunta fosse realizada uma missa de corpo presente com quatro padres e a sua oferta no valor de cem réis.
Da aldeia de Outeiro Meão, a viúva Maria Gonçalves “deixou duas caixas que se vendesse e hũa mantilha e hum mantem tudo velho que se vendesse e que della se pagassem quinhentos reis que devia851, e outros bens
móveis de pequena monta.
849 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.193v. 850 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.208v. 851 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.210v. 221
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A doença era, por vezes, a causa de endividamento, como anotou o abade António da Rocha, no registo de óbito de Maria Francisca, cabaneira, que “não teve nada por sua alma por ter tudo gasto em sua doença por ser longa so deixou que Sebastião Fernandes lhe devia um pouco de dinheiro se se cobrasse que lhe gastassem por sua alma e dahy tomasse a obrada”852. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, o paroquiano António da Rocha, finado nos finais da década de 1660, teve apenas direito a um ofício de corpo presente com cinco padres e deu de oferta somente seiscentos réis, e um carneiro como era costume “e não fes o que se devia fazer por estar muitos tempos doente e deixar muitas dívidas”853. Na freguesia de São Mamede de Valongo, do lugar de Susão, faleceu, em 1598, Sebastião Dias, lavrador, ficando à mulher a encomendação “do dia do enterro como pode por ser muito pobre e lhe ficarem muitas dividas”854;
António Domingos, falecido em Julho de 1636, teve um ofício com a presença de quatro padres porque, como anotou o vigário Manuel Marques Fortuna “era pobríssimo”855. Esta situação deve ter sido originada por uma dívida não cobrada de dez cruzados, que em caso de ser saldada devia ser gasta em benefício de sua alma856; Domingas Gonçalves, mulher de Miguel Marcos, sepultada em 22 de Março de 1639, por ter deixado muitas dívidas, por compaixão, o padre Manuel Marques Fortuna emprestou o suficiente para ser celebrada uma missa de corpo presente com a companhia de quatro sacerdotes857, dando à defunta alguma dignidade na hora de descer ao silêncio eterno.
852 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.210v. 853 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.226. 854 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.190v. 855 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.94v. 856 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.94v. 857 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.98.
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1.8.4 – A fome dos pobres e as “missas da carne, pão, vinho, azeite e dinheiro” deixadas pelos ricos Em muitos lugares do Reino, desde a Idade Média tardia, vários testadores, ricos ou remediados, clérigos ou seus familiares deixavam, entre o seu legado pio, sufrágios em benefício próprio ou de alguns antepassados ou familiares próximos como o cônjuge, os filhos, ou tios já falecidos, uma parte significativa sob a forma de géneros alimentícios e em moeda para ser distribuída pelos pobres que participavam e assistiam às celebrações cronologicamente próximas do passamento, na expectativa de exercerem a caridade, por vezes tão ausente, com os mais desfavorecidos, pobres, indigentes, doentes, errantes, leprosos, estropiados e também para se recordar “o que se fez para vencer a morte”858. A “morte faz sempre lembrar que não podemos levar
para a outra vida os bens que possuímos, e portanto convida a distribuir o que é precário”859, cumpridos pela derradeira vez e post-mortem, a quarta obra de misericórdia corporal: “dar de comer aos famintos e pobres”860, que fazia parte do conjunto das catorze obras de misericórdia estebelecidos, por exemplo, no Compromisso das Misericórdia fundada em Lisboa em 1498 por D. Leonor, rainha viúva e Regente na ausência e D. Manuel861e que inspiraria estabelecimentos do mesmo género por todo o País, designadamente a Confraria da Santa Casa da Misericórdia do Porto862, que inclusivamente prestou auxílio a alguns valonguenses que foram recolhidos nos hospitais que estavam sob a sua jurisdição desde 15 de Maio de 1521863, ou que, por qualquer delito passível de encarceramento, cumpriam pena na prisão da cidade portuense, sendo visitados, alimentados, vestidos e confortados pelos confrades, tanto nobres como oficiais mecânicos que serviam pro bono, como mesários no atendimento da vocação da confraria.
858 MATTOSO, José (1996) – «A Morte dos Reis na cronística pré-afonsina», in O Reino dos Mortos na Idade Média Peninsular, dir. José Mattoso. Lisboa: Edições João da Costa, p.187. (187-200)
859 MATTOSO, José (2002) – ob. cit., p. 97.
860 BASTO, A. de Magalhães (1997) – História da Santa Casa da Misericórdia do Porto, Vol. I. Porto: Santa Casa da Misericórdia do Porto, pp.202-203.
861 AMEAL, João (1968) – Dona Leonor Princesa Perfeitíssima. Porto: Livraria Tavares Martins, p.255.
862 A.H.S.C.M.P, Série D, B.co 4, n.º 2.
863 A.H.S.C.M.P, Livro de Pergaminhos, n.º 2, doc. N.º 59-A; BASTO, A. de Magalhães (1997) – ob. cit., p.294. 223
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No território do actual concelho de Valongo, os pobres estavam divididos em várias subcategorias: os pobres propriamente ditos, os muito pobres, os pobríssimos, os miseráveis – expressões tão vulgares e tão comuns, nomeadamente nas freguesias de São Lourenço d’Asmes e na de São Mamede de Valongo. Os assentos dos óbitos preenchidos pacientemente pelos padres-curas, coadjutores ou encomendados revelam uma realidade crua, onde o estigma da pobreza aparece como uma fatalidade. A doença prolongada é, para muitos, o principal estado de pobreza, mencionado em larguíssimas dezenas de paroquianos que chegam ao fim da vida e não têm condições para deixarem os legados pios que dêem alguma tranquilidade quanto ao bem da alma, para remissão dos pecados. No longo período que compreende a Idade Média e Moderna, ser pobre era, em primeiro lugar ser um desqualificado socialmente, um indigente, e sinónimo de doente, de parasita, e, portanto, mal visto pelo estado ou ordem social bem sucedida economicamente. No entanto, à medida que a sociedade se desenvolve, o seu crescimento urbano e periurbano fomenta, cada vez mais, grupos de marginalizados, que concorrem com tantos aristocratas que o morgadio atirava para a errância e a vagabundagem864 e o banditismo.
Outra razão dilacerante no seio do território em estudo, que conduzia ao estado de falência social, era a viuvez e são muitos os homens e mulheres que morrem miseravelmente sem qualquer tipo de meios de subsistência. Outros são mencionados, para memória futura, como possuindo alguns farrapos, que é um sintoma, senão um denominador comum de um certo tipo de valonguenses. Todos estes “pobres em liberdade”865, que vivem em cabanas, case-
bres, em casais, por esmola, em propriedades de grandes casas agrícolas, ou mesmo nas suas imediações, por caridade, gozando de alguma protecção e bonomia e que esperam ansiosamente que um paroquiano, com algum estatuto social faleça e que se tenha lembrado de, no testamento, deixar alguma 864 MORENO, Humberto Baquero (1985) – Marginalidade e conflitos sociais em Portugal nos séculos XIV e XV. Lisboa: Editorial Presença, pp.24-60.
865 GOUJARD, Philippe (1981) - «Èchec d’une sensibilité barroque: les testaments Rouennais au XVIII.e siècle», in Annales, ESE, jan.-feb., 1981, p.37. 224
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coisa para os miseráveis que estavam sempre atentos ao toque de finados, para usufruirem de parte dos bens deixados para com os da sua condição e momentaneamente saciar a fome. O costume, porém, obriga os herdeiros do defunto à entrega do “cesto”, sendo no entanto difícil quantificar o seu conteúdo, a não ser em casos muitos específicos. Em 1690, o padre José de Magalhães de Araújo escreveu na abertura do Libro dos Baptismos e Casados e Crismados da freguesia de São Lourenço d’Asmes, a forma como se faziam, as ofertas entre os diferentes tipos (sociais) dos seus fregueses:
“Achey por estillo nesta freguesia observado que nos enterramentos que os padres tinhão no primeiro officio de corpo prezente tantos alqueires de pão o acompanhavam a sepultura de obrada para o parocho e hum carneiro e o sesto mas sendo cabaneiro não tem carneiro. Falecendo no principio da somana no seguinte domingo são obrigados a ofertar e (?) o sobrado numero de alqueires achey ser the des que passando os padres de 20 nem por isso tem o parocho de obrada mais que 20 alqueires”866.
A nomeação dos pobres nos testamentos dos ricos não é uma característica comum, pois há muitos que deixaram dinheiro suficiente para a realização de dezenas e centenas de missas apelando à protecção das entidades psicopompas benignas, mas esqueceram-se de mencionar os “pobres evangélicos”867, improdutivos que é necessário controlar868, e a muitos deles, com o mesmo fim, enviá-los par os hospitais e albergarias869. A generosidade de alguns valonguenses, em prol dos mais desfavorecidos da paróquia, tem um sentido eminentemente prático, a caridade cristã propriamente dita.
866 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.2v.
867 LUIS MARTIN, José (1973) – «La Pobreza y los pobres en los textos literarios del siglo XIV», in A Pobreza e a assistência aos pobres na Península Ibérica durante a Idade Média. Actas das Primeiras Jornadas Luso-Espanholas de História Medieval. Tomo II. Lisboa: I.A.C., p.588. 868 GOUJARD, Philippe (1981) – ob. cit., p.37.
869 ROMAN, Christian (1982) – «Le Monde des pauvres à Paria au XVIIIe. Siècle», in Annales ESE, juil.-aôut, pp.729-763. 225
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Por outro lado, a preocupação dominante é individual e capta os pobres que “deviam rezar pelos seus benfeitores, cujas almas, assim, escapavam mais seguramente às penas do inferno ou do purgatório”870. Deste modo, a esmola consagrada em testamento formal, tabeliónico, estritamente jurídico, pronunciado verbalmente ou escrito em papéis comuns “em si libertava a consciência de quem realizava e obrigava moralmente aqueles que recebiam a esmola (…). A pobreza ajudava a riqueza a conquistar o Céu”871. A prática de encher a barriga dos miseráveis após o passamento dos favorecidos em vida constituía, para todos os efeitos, “a base da assistência a pobres e gafos”872. Assim, a “esmola acabava por se transformar num acto
ritual”873 que favorece visivelmente os incapacitados e fracos874 em momentos pontuais.
Na freguesia de São Martinho do Campo podem colher-se alguns exemplos desde o início do século XVII. Efectivamente, António Manuel, não sendo um paroquiano demasiadamente abastado, reservou, por indicação verbal, uma obrada completa por duas canadas de vinho e um carneiro875; no início do século XIX, Manuel Jorge Moreira, casado com Ana Moreira da Rocha, domiciliado no lugar de Balselhas falecido em 3 de Outubro de 1803, mandou distribuir, pelos pobres, dois mil e quatrocentos reis876, cerca de 13.6% da totalidade do seu legado pio; a viúva Eufrásia de Oliveira (1814) reservou cerca de sessenta e seis mil réis para a celebração de duzentas
870 VAUCHEZ, André (1995) – A Espiritualidade da Idade Média Ocidental. Séc.VIII-XIII. Lisboa: Editorial Estampa, p.127.
871 BEIRANTE, Maria Ângela (1982) - «Para a História da morte em Portugal (séc.XII-XIV)», in Estudos de História de Portugal. Vol.I. Homenagem a A. H. de Oliveira Marques. Lisboa: Editorial Estampa, p.365. 872 CARVALHO, Sérgio Luís de (1985) – Assistência e medicina no Portugal Medieval. Lisboa: Edição Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, p.11.
873 VAUCHEZ, André (1995) – ob. cit., p.128.
874 MOLLAT, Michel (1966) – «La Notion de pauvreté au Moyen Âge: position des problèmes», in Revue d’Historique d’Eglise de France, T. III, n.º 149, p.8. (5-23)
875 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.203.
876 ADP, E/27/4/3-11.1, fl.215. 226
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missas “dentro do espírito do sistema do dom e do contra-dom”877, mas para os pobres mencionou pouco mais do que três alqueires de pão878. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, na aldeia de São Paio, a residente Catarina Gonçalves (1642), viúva de António Pires indicou, por testamento, sufrágios em três dias consecutivos, com a presença de dez padres, tendo destinado a quantia de sete mil réis para este efeito e para “suas obradas”879; da aldeia de São Lourenço, arrola-se Catarina Gonçalves (1645)
que “fes huns apontamentos”880 nos quais mencionou a obrada de quatro alqueires de milho, um carneiro e um tostão881; Maria Gonçalves, mulher de Gaspar Fernandes, o manco, da aldeia de Vilar, não dispôs de testamento mas seus filhos e herdeiros deram de esmola três alqueires de pão e a obrada do “cesto” no valor de oito vinténs e “hum carneiro que valeria doze vinténs”882; Maria Fernandes (1653), mulher do “judeu” Isac António, da aldeia de São Lourenço declinou no marido a obrigação dos bens da alma e a entrega da obrada no valor de noventos réis883. Na aldeia de Vilar, o morador António Fernandes (1654) destinou aos pobres uma obrada de dez alqueires de pão e a “obrada do dia do cesto” no valor de seiscentos e cinquenta mil réis884, e na aldeia de Ermesinde, a
freguesa Maria João (1662) instituiu de obrada cinco alqueires de milho “estreme”, um carneiro de um ano de idade e por capar e de obrada do cesto cento e oitenta réis885; em 1671, Domingos João, o velho, falecido a 9 de Dezembro teve somente um ofício de corpo presente com a assistência de quatro clérigos, mas não se esqueceu dos pobres deixando a interessante quantia de mil e duzentos réis886. 877 MATTOSO, José (1996) – «Os Rituais da morte na liturgia hispânica (séculos VI a XI)», ob. cit,.p.64. 878 ADP, E/27/4/2-8.2, fl.216.
879 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.209.
880 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.211v. 881 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.211v.
882 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.216v. 883 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v. 884 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v. 885 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.223. 886 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.228. 227
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Alguns fregueses não se preocuparam em indicar quaisquer outros valores além do “costume desta igreja”, ofertas na “forma do costume”, como o fez o padre José Luís, coadjutor da freguesia de São Vicente de Alfena, em 1758887, ou o padre José António Sol beneficiado da igreja de São Lourenço d’Asmes e que faleceu em 1760 sem os sacramentos da penitência, sagrado viático e da santa-unção “por morrer apressadamente e se não poder chegar a tempo”888, mas sempre ficou de oblata dez alqueires de pão, um carneiro e o cesto889. Do lugar da Igreja, Maria Antónia, viúva, mãe do padre António José da Fonseca, coadjutor da igreja de São Lourenço d’Asmes – aqui na qualidade de testamenteiro – destinou, sob a forma de oferta, sete alqueires de pão, um carneiro e o cesto890 que seriam distribuídos pelos pobres e pelo pároco que usufruíra sempre deste tipo de bens.
Na aldeia de Sá, os montantes deixados sob a forma de “ofertas acostumadas” só raramente são referidos, mas Josefa Ferreira (1782), mulher viúva de José Ferreira, que faleceu com a idade de setenta anos, explica que foi entregue ao reverendo pároco, António da Silva, coadjutor, as ofertas em vigor na freguesia no valor de dez alqueires de pão e cesto891; José Ferreira
Bernardes (1783) que morreu também com a idade de setenta anos, reservou ao reverendo pároco a oferta e cesto no valor de quatrocentos e oitenta réis892, representando cerca de 1% do valor global do seu legado pio. No lugar da Cancela, Catarina João, que vivia na aldeia de Ermesinde em casa de Domingos João, seu sobrinho, deu de obrada duzentos réis893;
a celibatária Francisca (1789) que atingiu a vetusta idade de setenta anos, deixou mais de vinte mil réis para a realização de mais de três centenas de actos sufragâneos e declinou em Manuel António seu testamenteiro, a obri-
887 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.219.
888 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.221v. 889
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.223v.
890 A DP, E/27/4/4-16.1, fl.223. 891 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.137.
892 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.138v. 893 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.218v. 228
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gação de dar a cada pobre de maior idade, presente no seu funeral, a esmola de dez réis e aos pedintes de menor idade cinco réis894. Na freguesia de Sobrado a esmola de José Álvares (1751), viúvo, do lugar de Vilar, é referida pelo padre Manuel Baldaia de Magalhães da seguinte forma: “e me consta que a hora de sua morte dissera que se desse a hus pobres que elle então nomeara a roupa de sua cama”895; Dona Antónia
Clara Baldaia de Tovar e Meneses (1767), no seu magnânimo testamento que favoreceu a Igreja através dos bens da alma em mais de meio milhão de réis, declarou ao tabelião das notas que o seu corpo fosse levado à sepultura por seis pobres tendo para o efeito separado mil e duzentos réis896 (cerca de 0.01% do total da acção pia), cabendo a cada um a esmola de duzentos réis, mas o abade da igreja de Santo André de Sobrado, António Baldaia de Magalhães, sepultado na capela-mor em 18 de Janeiro de 1755, separou mais de cinquenta e três mil réis para sufrágios, ordenou que no dia em que fosse enterrado “se desse a cada pobre a vinte reis e cento e vinte alqueires de pam e vinho e azeite”897 que parece ser mais razoável que a oferta deixada para os miseráveis por Dona Antónia Clara Baldaia de Tovar e Meneses. Igualmente significativa parece ser a disposição deixada por Maria Antónia, falecida em finais de 1791 na qual indica que fossem repartidos pelos pobres que se encontrassem à porta de sua casa, no lugar de Ferreira, no dia do seu funeral, cerca de quinhentos réis898, correspondendo a cerca de
0.6% do montante da herança destinada ao benefício viático.
Na freguesia de São Mamede de Valongo, o território, de numerosos profissionais ligados aos mesteres, muitos deles homens de condição, almocreves e comerciantes como os vendeiros e vendeiras, não deram demonstrações de grande solidariedade para com os mais desfavorecidos que pululavam nas ruas e no largo da igreja, tão próximos das suas habitações nos arruamentos circundantes. Em todo o caso, vejamos alguns exemplos que representam uma excepção ao comportamento geral dos largos milhares de 894 ADP, E/27/4/4-14.6, fl.158v. 895 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.199v. 896 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.232. 897 ADP, E/27/4/6-21.1, fl.205. 898 ADP, E/27/4/6-6.22, fl.869. 229
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valonguenses da Estrada e de Susão pelos seus donativos a favor dos desgraçados e mendigos que os acompanharam até à sua última morada. Em 1636 faleceu Maria Francisca, mulher de Domingos Luís que verbalmente indicou, aos seus herdeiros, que fossem dadas as suas obradas no valor de um tostão de pão e um de vinho e um carneiro, em cada um dos três ofícios recomendados: de corpo presente, do trigésimo dia de aniversário899;
Margarida Marques (1638) ofereceu um carneiro, cento e vinte réis de pão e duas canadas e meia de vinho “e mais que pudesse”900; Maria Benta (1641), viúva de André António destina cem réis de pão, um carneiro e três canadas de vinho901, e pela celibatária Maria (1642) da aldeia de Susão902 foi mencionada sensivelmente a mesma quantia para alimento dos pobres. Muitos ricos, homens e mulheres de “qualidade”, de estatuto firmado, que teriam certamente possibilidades económicas e financeiras, não deixaram nada para os vagabundos e famintos, além das obrigações que estavam convencionadas na freguesia de São Mamede de Valongo. Em muitos casos, nem esta oblata obrigatória foi anotada pelos párocos, o que pode ser sinónimo de incumprimento, ou falta de cuidado de quem fez o assento no respectivo livro de óbitos. Entre os pobres, havia aqueles que durante a vida amealharam umas poucas centenas de réis para saciar, pelo menos uma vez, a fome dos moribundos, doentes crónicos e subqualificados da mesma condição social, já que o dador também pertencia ao mesmo grupo de miseráveis. Na aldeia de Sá, da freguesia de São Lourenço d’Asmes, o defunto António João, sepultado em 1661, no seu testamento lavrado “muito tempo antes de falecer e morreo muito pobre e empregado e sua molher o sostentou pollas esmolas não tem mais e deu alqueires de pam”903, e de obrada apenas seis vinténs; Maria
Antónia, mulher de Manuel António, o trapo, do lugar da Ermida, desceu à sepultura um dia depois de ter falecido, mas deu de oferta dois vinténs
899 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.94v. 900 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.97.
901 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.99v.
902 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.100.
903 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.222v. 230
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e “hũa missa como pobre”904 que foi celebrada pelo padre António José da Afonseca, coadjutor. Na verdade, as “missas de pão, vinho, azeite e moeda” eram uma forma airosa que muitos valonguenses encontraram perante a inevitabilidade da morte e da fragilidade da vida, para se lembrarem daqueles que padeciam, num último gesto de caridade cristã, e, ao mesmo tempo associavam-nos para fazer coro nas preces pela encomendação sufragânea. Os pobres, desocupados profissionalmente, estavam sempre disponíveis para enfileirarem nos cortejos fúnebres dos outros, na esperança de que, no fim da missa ou naquela que era realizada no domingo seguinte, lhes coubesse, em parte, um pedaço de pão, um copo de vinho, um naco de carne e talvez um pouco de azeite para curar as chagas e suavizar todo o tipo de escrófulas, ou vendê-lo e, com isso, adquirir algumas moedas para pão e vinho sempre presentes na mesa do rico, do camponês, do mesteiral, do bispo, do rei e sempre que possível na do pobre.
904 ADP, E/27/4/4-16.1, fl.215v. 231
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II Parte: A economia e a estruturação do território agrícola valonguense
1. – A senhorialização do território 1.1 – A implantação senhorial: a coroa, o clero regular, secular e outros O território agrícola, bastante fértil, com bons recursos hídricos foi disputado, desde a Idade Média, por diversos senhorios: a Coroa, a Igreja e alguns senhores laicos e outros do foro militar de origem obscura. As Inquirições Gerais Duocentinas e Tricentinas têm objectivos precisos, e um deles é o de determinar e acabar com o abuso905 sobre a propriedade régia constan-
temente sonegada por todo o tipo de indivíduos, provocando uma reacção da nobreza, por exemplo nas Cortes de Lisboa de 1285, onde a acção régia foi censurada por interferir nos direitos, privilégios e imunidades senhoriais906. Nestes textos, os enviados régios, preocupados com a identificação da propriedade régia, registam o tipo de prédio rústico e a sua composição,
905 PIZARRO, José Augusto de Sotto Mayor (Indrodução, leitura e índices) (2007) – Portugaliae Monvmenta Historica. A Sæcvlo Octavo post Christvm vsqve ad quintvmdecimvm ivssv Academiæ Scientiarvm Olisiponensis Edita. Nova Série. Volume III. Inqvisitiones. Inquirições Gerais de D. Dinis 1284. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, p.XIII.
906 PIZARRO, José Augusto de Sotto Mayor (Indrodução, leitura e índices) (2012) – Portugaliae Monvmenta Historica. A Sæcvlo Octavo post Christvm vsqve ad quintvmdecimvm ivssv Academiæ Scientiarvm Olisiponensis Edita. Nova Série. Volume IV/1. Inqvisitiones. Inquirições Gerais de D. Dinis 1288. Sentenças de 1290 e execuções de 1291. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda e Academia das Ciências de Lisboa, pp.XII-XIII. 233
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
os titulares ao tempo e a natureza do contrato que possuíam, esclareciam os montantes das rendas e a diversidade dos produtos, muitas vezes pela quantidade de semente que era lançada em cada parcela produtiva. Porém, a convocação, audição e registo do testemunho dado por dezenas de inquiridos de diferentes estratos sociais907 incluía também anotações sumárias sobre outros senhorios cuja jurisdição dominial confinava com as terras reguengas. No século XVI, através das cartas de foral outorgadas aos concelhos onde se inserem as freguesias do actual concelho valonguense, o cavaleiro Fernão de Pina utilizou a mesma metodologia, ainda que em situações pontuais, seja mais pragmático e esclarecedor quanto aos senhorios, mencionando os de tradição e outros que podiam ter sido de implantação mais recente. Não há dúvida que na freguesia de São Lourenço d’Asmes dominavam o Rei, o mosteiro beneditino de Santo Tirso de Riba de Ave, o cenóbio de Santa Maria de Águas Santas e o “mosteiro de Cedofeita”908. Em meados da centúria de Quinhentos foram realizados ou confirmados alguns contratos de locação de média duração, do domínio útil de alguns prédios rústicos pertencentes ao ascetério de Águas Santas – uma comenda da Ordem do Hospital em Portugal –, como um casal, algures em Vilar de Matos, que era explorado pela enfiteuta Joana de Abreu, criada do comendador Jerónimo da Cunha909, em 1548, e era constituído por vinte e
uma parcelas agrícolas de dimensões muito variáveis destinadas à produção exclusiva de centeio. Possuía, como cabeça habitacional, um celeiro, uma casa, e uma outra dependência ergológica que servia de cozinha e de espaço social, e ainda duas construções provavelmente de dimensão mais reduzida, para a acomodação de gado910.
907 MATTOSO, José; KRUS, Luís; BETTENCOURT, Olga (1982) - «As Inquirições de 1258 como fonte da História da Nobreza – o julgado de Aguiar de Sousa», in Revista de História Económica e Social, Janeiro-Junho, 1982. 9. Lisboa: Sá da Costa Editora, p.24. (17-69) 908 TT, Leitura Nova, liv.43, fls.30-30v.
909 Efectivamente o contrato data de 2 de Maio de 1548; porém a primeira referência ao comendador Jerónimo da Cunha surge somente em 1551. Cf. COSTA, Paula Maria de Carvalho Pinto (2000) – A Ordem Militar do Hospital em Portugal: dos finais da Idade Média à Modernidade. Militarium Ordinum Analecta. 3/4, 1999/2000. Porto: Fundação Eng. António de Almeida, pp.122 e 457.
910 COSTA, Paula Maria de Carvalho Pinto (2000) – ob. cit., p.457. 234
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Outra unidade de tributação agrária conhecida por Herdade de Ardegães”, pagava por essa mesma altura, um foro misto em numerário, aves de capoeira, um carro de palha, sete alqueires de trigo, seis de milho e sete de centeio. Estava sujeita ao imposto da rébora e ao de passagem. Por transmissão do vínculo senhorial, através da nomeação, o novo arrendatário estava sujeito ao pagamento da entrada, no valor de um carneiro, como reconhecimento do senhorio directo911. Outra unidade de produção de cereais, conhecida pela Devesa da Condessa, na aldeia de São Paio (de Ardegães) estava, na mesma data, a ser explorada pelo foreiro João Eanes, do lugar de Vilar de Matos, que devia ter ocupado o prédio em época muito recente por ser considerado como a primeira vida contratual. Esta unidade de produção de bens alimentares era formada por um campo e uma devesa. O seu aproveitamento cultural implicava a utilização de dezasseis alqueires de centeio em semeadura. Este inquilino pagava de renda, ao mosteiro de Águas Santas, dois alqueires de cada tipo de cereal: trigo, centeio e milho912, apesar de produzir internamente apenas centeio.
Nas freguesias de São Martinho do Campo e de Santo André de Sobrado, a Coroa possuía um conjunto bastante significativo de casais que foram confirmados através de inquirições como refere o cavaleiro Fernão de Pina913. Em São Mamede de Valongo, a senhorialização do seu território rural, em meados do século XIII, estava na posse da coroa, do mosteiro de São Cristóvão de Rio Tinto – que foi transferido para o mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, em 1536914, a Sé do Porto, o mosteiro masculino de
Santo Estêvão de Vilela, por um certo D. Vierum e por alguns herdadores. No foral manuelino outorgado à Terra e Concelho da Maia em 1519, na freguesia de São Mamede de Valongo foram identificados os seguintes senhorios: o rei, tanto em Valongo da Estrada como em Valongo Susão915, cuja repartição acentua o carácter dominante do primeiro topónimo, como consequência de um maior desenvolvimento e mais densamente povoado que o último, e que evidencia uma progressão e diversidade, assim como uma maior espe911 COSTA, Paula Maria de Carvalho Pinto (2000) – ob. cit., p.359. 912 COSTA, Paula Maria de Carvalho Pinto (2000) – ob. cit., p.367. 913 MARQUES, Maria Alegria (2013) – ob. cit., pp.102-103. 914 SOUSA, Bernardo Vasconcelos e (2005) – ob. cit., p.79. 915 TT, Leitura Nova, liv.43, fls.29-29v.
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cialização do trabalho dos mesteirais; o convento de Santa Clara do Porto, o mosteiro de São Vicente de Vilela, o mosteiro de São Pedro de Cete, e o Cabido da Sé do Porto916, além das beneditinas do cenóbio portuense. O Colégio de Nossa Senhora do Carmo, quando passou a incorporar a igreja paroquial de São Vicente de Alfena917, a partir de meados do século
XVI, por possuir alguns prédios rústicos em São Mamede de Valongo, viu a sua titularidade disputada pelo senhorio de São Bento de Avé Maria, em 1593918.
O progresso social irá trazer, às freguesias, determinadas famílias que aí se enraizarão e formarão as suas casas, das quais sairão vários sacerdotes que iriam exercer a sua actividade de curas na paróquia que prestigiavam as respectivas famílias e fortaleciam o seu poder e influência local, disputando território e acção aos senhorios que já se instalaram há muito neste espaço. Quadro n.º 19 – Implantação senhorial (1258) Freguesia
Alfena (São Vicente de)
Aldeias
Senhorio
Alfena
Gafaria
Baguim
Mosteiro de Águas Santas (Ordem do Hospital)
Cabeda
Coroa
Ferraria
Mosteiro de Águas Santas (Ordem do Hospital)
Coroa
Gafaria Mosteiro de Landim
Transleça
Mosteiro de Águas Santas (Ordem do Hospital) Martins Pimentel
916 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv.12.
917 MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., pp.44-75. 918 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv.12, fls.38-59. 236
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Freguesia
Aldeias
Senhorio
Balselhas
coroa
Luriz
Sé do Porto Mosteiro de Rio Tinto
Campo (São Martinho do)
Sé do Porto
São Gemil
Coroa Militium Mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave
Ermesinde Ermesinde (São Lourenço d’Asmes)
Coroa D. Julião do Porto Mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave
São Lourenço
Igreja Paroquial Coroa
“Azomes”
Mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave Coroa Mosteiro de Santo Estêvão de Vilela
Sobrado (Santo André de)
Sobrado
Herdadores Militium Gil Martins de Riba de Vizela
Vilar
coroa Coroa Mosteiro de São Cristóvão de Rio Tinto
Valongo
Sé do Porto
Valongo (São Mamede de)
D. Vierum Coroa Susão
Herdadores Mosteiro de São Cristóvão de Rio Tinto
Fonte: P.M.H, Inquisitiones, pp.505-513 e 517.
1.2 – O casal como base da estrutura económica da família Ao longo da Idade Média, Idade Moderna e das longas décadas que ainda se lhes seguiram até à extinção do regime senhorial, preludiado entre 1821 e 1823, pelos vintistas liberais, e que entrará em queda irrecuperável e definitiva com a publicação do decreto de 30 de Maio de 1834, da autoria do ministro da de Mouzinho da Silveira, que se abate sobre a extinção das 237
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
ordens religiosas masculinas e pela nacionalização do seu imenso património tanto construído como fundiário, posteriormente vendido em hasta pública. Pela lei de 4 de Abril de 1861, seriam desamortizados os bens dos conventos femininos e das igrejas; mais tarde, pela lei de 22 de Junho de 1866, a amplitude da medida chegaria aos bens das câmaras, das paróquias, das irmandades, das confrarias, dos hospitais, dos recolhimentos, das misericórdias e de quaisquer outros estabelecimentos pios ou de beneficência; e pela lei de 28 de Agosto de 1869, seria a vez dos passais, dos baldios e dos estabelecimentos de instrução pública919. O sistema económico assentava na senhorialização da terra, através do direito enfiteutico que consistia, basicamente na cedência da terra agrícola, através de um contrato entre o domus da terra e o arrendatário que se propunha explorá-la mediante o pagamento de uma prestação em bens agrícolas e em dinheiro, consoante fosse acertado entre as partes. A cedência do domínio útil podia ser temporária e sucessiva, em vida de duas ou três pessoas, da mesma família, ou perpetuamente e hereditária, desde que fosse verificada a cláusula da renovação, por nomeação, que devia acontecer em vida do anterior sucessor ao seu descendente. Todo o território do actual concelho de Valongo estava submetido a esta fórmula jurídica, pela qual os camponeses se sentiam seguros e ao senhorio que recebia os géneros da agricultura, da apicultura e a quantidade de moeda acordada entre ambos, estava assegurada a ocupação do solo produtivo. O espaço territorial ocupado por uma família era o casal, que, objectivamente se constituía na unidade agrária e tributária do sistema senhorial, gizado no norte do País, no século X, no tempo de Afonso III das Astúrias920, e que muito contribuiu para a coesão social e para a expansão do território agrícola, pelo consequente aproveitamento das terras incultas, pelo recuo do matagal, pelo aumento da desflorestação de terras de cotas cada vez mais elevadas, e para o inevitável enriquecimento dos senhores que aguardavam com expectativa as rendas que, pelo princípio que adequa a produção à proporcionalidade do cânone fixo ou parciário correspondia a
919 SILVA, António Martins da (1998) – «A Desamortização», in História de Portugal, Vol.5, dir. José Mattoso. O Liberalismo, coord. Luís Reis e João Lourenço Roque. Lisboa: Editorial Estampa, pp.291-292. (291-305.
920 MARQUES, André Evangelista (2008) – «O Casal: uma unidade de organização social do espaço no Entre-Douro-e-Lima (906-1200)», in Medievalista on line, ano 4, n.º 4, p.4. [Disponível em: www.fcsh.unl.pt/iem/medievalista]. [consultado em: 27/04/2015]. 238
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um procedimento que permitiria encher os celeiros, as tulhas, as cubas e as pipas, as salgadeiras e acotovelar os ganchos que suspendiam os enchidos que no seu vasto conjunto garantiam a alimentação directa da casa senhorial, mas também permitiriam excedentes que eram logo transaccionados para a obtenção da moeda. Na verdade, o casal constitui a mola fundamental do sector primário de produção921, a unidade agrária922 de todas as freguesias do actual concelho de
Valongo. Nestes termos, resulta que o casal assumia uma dimensão dupla e simultânea, interligada, uma relação biunívoca: como célula agrícola sobre a qual incidiria a carga tributária923, contratualmente fixada em torno do seu elemento humano que o habita e cultiva, e pelo espaço agricultável ou arroteável, suficientemente capaz de alimentar um núcleo familiar simples924. Desde o Ribatejo, passando pelo centro até ao norte do País, o casal apresentava, quanto à sua composição e forma, matrizes complexas, cuja classificação exige uma certa tolerância sob pena de cairmos num reducionismo mecanicista que impede a sua observação objectiva, local e que no sentido mais pragmático depende do senhorio ou dos seus agentes, do número de camponeses disponíveis, da qualidade da terra, da proximidade de água para a rega, tão disputada, por exemplo, entre os habitantes de Santo André de Sobrado e de São Martinho do Campo. Na sua essência, era constituído, além da casa de morada e seus anexos, por um número variável de parcelas agrícolas, de diferentes aptidões, dispersas pelo povoado que integravam a mesma unidade agrária com o objectivo de garantir um sistema de policultura925, tão necessário à sobrevi-
921 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – Baião em Torno do ano 1500. Coleção Em Torno de Baião: Contributos para a História Económica e Social de Baião, coord. Lino Tavares Dias. Município de Baião / Caleidoscópio, p.118. 922 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – «Uma Descrição de Portugal em 1578-80)», in Portugal Quinhentista (Ensaios), p.125.
923 COELHO, Maria Helena da Cruz (1983) – O Baixo Mondego nos finais da Idade Média. Lisboa: Imprensa nacional-Casa da Moeda, p.101.
924 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – A Comunidade Feminina da Ordem de Santiago: a comenda de Santos em finais do século XV e no século XVI. Um estudo religioso, económico e social. Militarium Ordinum Analecta. Fontes para o estudo das Ordens religioso-militares. 9. Porto: Fundação Eng. António de Almeida, p.305.
925 COELHO, Maria Helena da Cruz (1996) – «O Povo – A identidade e a diferença no trabalho», in História de Portugal, Vol. III, dir. de Joel Serrã e A. H. de Oliveira Marques. Portugal em definição de fronteiras. Do Condado Portucalense à crise do século XIV, coord. 239
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
vência da família camponesa que o habitava. Numa outra perspectiva, assentava em dois elementos que se complementavam entre si: a cabeça, representada pelo património construído e o corpo formado pelos terrenos de lavra926, que no seu conjunto davam lugar à institucionalização da unidade habitacional e económica927, e que, num certo sentido, constituía o barómetro social e económico da geografia rural propriamente dita, mas também do alfoz e dos espaços periurbanos que nos dá “se não a medida exacta do terreno pelo menos a certeza de que se trata de uma propriedade através da qual, uma família, encarada na sua expressão mais lata pode subsistir”928. Na freguesia de São Vicente de Alfena, uma mesma família explorava mais do que um casal, situação que não sendo inédita para outras zonas do País, não deixava de ser singular. O território do actual concelho de Valongo era ocupado e explorado, na sua vertente vocacionada para a lavoura da terra, por camponeses que aceitavam trabalhar para os diversos senhorios que detinham património rural muito significativo: o mosteiro de São Pedro de Cete, de Santo Estêvão de Vilela, de São Bento de Avé Maria do Porto, o mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave, o mosteiro de Santa Clara do Porto, o Cabido da Sé do Porto, o mosteiro de Santa Maria de Águas Santas que era uma comenda da Ordem do Hospital, a igreja paroquial de São Mamede de Valongo, a Gafaria dos Lázaros de Alfena, a Coroa, as diversas Confrarias instaladas nas freguesias do espaço concelhio, e outros senhores laicos que aparecem descritos nas Inquirições Gerais de 1258. Através da realização de uma escritura tabeliónica, o senhorio cedia o domínio útil das parcelas nela referidas, em geral, pela via do emprazamento, em três vidas: marido, mulher e um filho; em certas circunstâncias, não sendo novidade, a primeira vida era atribuída, em simultâneo ao marido e mulher, que à morte do último cedia, por escritura de nomeação, a titularidade a um filho, que, por sua vez, nomearia um seu Maria Helena da Cruz Coelho e Armando Luís de Carvalho Homem. Lisboa: Editorial Presença, p.270. (252-328)
926 COELHO, Maria Helena da Cruz (1983) – ob. cit., p.103.
927 MATTOSO, José; KRUS, Luís; BETTENCOURT, Olga (1982) – «As Inquirições de 1258 como fonte da História da Nobreza – o julgado de Aguiar de Sousa», in Revista de História Social e Económica.9. Lisboa: Sá da Costa Editora, p.27. 928 COELHO, Maria Helena da Cruz (1998) – O Mosteiro de Arouca. Do século X ao século XIII. Arouca: Câmara Municipal, p.105. 240
Joel Silva Ferreira Mata
descendente, terminando um ciclo familiar, findo o qual, o emprazamento, formalmente redigido em linguagem esquemática, condicionava a acção do arrendatário, que apenas devia promover a melhoria das parcelas de terreno pela introdução de benfeitorias como o restauro das casas de habitação, dos celeiros, dos palheiros, dos aidos, das cortes, dos moinhos, ou quaisquer outros elementos ergológicos em benefício do prédio rural no seu extenso conjunto, para que pudesse valer mais permitindo, assim, aumentar as rendas e dar melhores condições produtivas à futura família campesina. Redigido em dois exemplares, o concessionário devia guardar, em lugar seguro, o que lhe era cedido para poder provar o seu direito sempre que este estivesse em causa. A não existência física dificilmente permitiria ao peão do actual concelho de Valongo continuar a permanecer no casal, dando origem a vários conflitos dirimidos judicialmente, como aconteceu com alguns lavradores de São Mamede de Valongo, desde os finais do século XVI ao século XVIII, com diferentes senhorios. O levantamento do património pertencente a alguns institutos religiosos, neste território, permitiu o arrolamento de inúmeros casais, a sua extensão, a sua componente humana, a morfologia, aptidões agrícolas, a diversidade produtiva, criadora e ocupacional, a posse ilegal, que plasmava a paisagem campesina, na sua vertente agro-pecuária, e de pastorícia insignificante – mas presente nas ofertas deixadas para distribuir pelos pobres depois do óbito do benfeitor –, e captava os anseios de quem trabalhava arduamente em diversas parcelas ao mesmo tempo, para rentabilizá-las em simultâneo, uma vez que o senhorio através da apegações e avaliações periódicas se não determinava as quantidades de produção para poder aduzir, por estima, as respectivas rendas, indicava a quantidade e o tipo de semente a lançar em cada pedaço de terra, identificado pelas suas confrontações e qualidade, se tinha água ou se era em terra seca; se era irrigada e a forma como estavam organizados os consortes, registando-se o dia ou parte do dia que lhe cabia a água proveniente da presa, da represa, do rio Leça ou do rio Ferreira, das fontes, das nascentes e de outras quaisquer formas hídricas que pudessem melhorar a produtividade. Os casais do actual território valonguense obedecem à generalização das mesmas unidades estudadas para outras regiões do País. Há, assim, 241
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
características comuns, mas também uma série de particularidades que se adensam e tornam mais complexas à medida que avançamos no tempo, nomeadamente nos séculos XVI-XVIII e inícios da centúria de Oitocentos, que, se não permitem afirmar que estamos perante uma realidade inovadora, pelo menos mostram-nos os traços identitários de uma caterva de gente que labora persistentemente, e não deixa os terrenos ao abandono, mantendo em bom estado de conservação os edifícios de morada e os seus anexos, sendo muito raras as situações de casas prostradas em pardieiros, ou em ruínas, uma prática levada a cabo por diversos enfiteutas, para benefício do arrendatário seguinte, ou por não querer investir numa propriedade que, à sua morte, irá para outra família. A constituição dos casais é, pois, muito variável, assentando em múltiplas parcelas, entre campos, leiras, quebradas, lameiros, hortas, talhinhos, cerradinhos, cortinhas, soutos, tapadas, pedaços de terra, sendo com efeito, dominantes os campos, em zonas de vale e as leiras em áreas mais altas, menos acessíveis ao regadio e consequentemente menos produtivas. Algumas destas parcelas, melhor localizadas, confinavam com os cursos de água, como o campo de Ponte Carvalha, do Moinho, do casal do Agro que eram irrigados pelas águas do rio Ferreira929, e o de Veleira, como a ribeira
da Presa, o campo da Cortinha, e o da Vinha, com o casal (propriedades) que titulava a viúva Maria Gonçalves, com o ribeiro de Ponte Carvalha930; outros ladeavam as artérias viárias principais, como o campo da Cancela, junto da estrada que seguia em direcção ao Porto931; para Ponte Ferreira932 ou o da Eira Velha que confinava com a estrada que ia em direcção à freguesia de São Vicente de Alfena933. Algumas leiras, em menor grau, estavam junta das ruas e caminhos como a leira da Senra, que partia com a estrada que seguia em direcção a Ponte Ferreira934 ou com a ribeira da Presa, como a leira do
929 Arquivo Nacional Torre do Tombo (TT), Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.14v e 15. 930 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.66v, 70. 931 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.20. 932 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.15.
933 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.25v. 934 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.15. 242
Joel Silva Ferreira Mata
Moinho935 do ribeiro da Senra, a da Agra da Senra936, ou a leira do Areeiro que recebia a água do rio Ferreira937. As outras largas dezenas de pequenas parcelas agrícolas ficavam enfaixadas com outras circundantes, exploradas por camponeses diversos e de senhores diferentes podendo comparar a natureza dos solos, partilhar e dividir a água, estabelecer sistemas de regadio em que todos pudessem usufruir da água, auxiliar-se com os animais e alfaias agrícolas, e gerir, à distância, as práticas uns dos outros.
A propriedade rural da aldeia do Couce (Valongo). Fonte: M.M.V.
As leiras, no conjunto dos casais e algumas subunidades (meios, terços e quartos de casais) em São Mamede de Valongo, Santo André de Sobrado e em São Martinho do Campo, no fim do século XVI, quase que duplicam em relação aos campos, embora, no caso de São Martinho do Campo, a relação seja ligeiramente inferior. Em todo este perímetro, não há dúvida, que a paisagem agrária é atravessada por leiras de dimensões muito variadas, superando os campos (quadros n.º 20 e n.º 21). Os quatro primeiros grupos que englobam as propriedades individualizadas até 3000 m2 representam, quer no caso das leiras, quer no caso dos campos, a grande maioria das parcelas de onde o camponês e a sua família retiravam os meios de sobrevivência – cerca de 90.6% e de 71.5%, respectivamente, sendo as propriedades 935 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.112.
936 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.118v.
937 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.161v. 243
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
de maior dimensão que compunham o casal disperso de significado pouco visível938. Quadro n.º20 – Área dos campos (séculos XVII-XVIII) Grupos (m2)
I
Até 500
11
Entre 501-1000
II
III
IV
V
VI
VII
VIII
IX
Percentagem (%) 16.4
15
« 1001-2000
22.3 9
13.4
« 2001-3000
13
« 3001-4000
19.4 4
« 4001-5000
6 4
« 5001-6000
6 4
« 6001-7000
6 5
7.5
« 7001-12000
2
3
IX
Percentagem (%)
Fonte: ADP, K/26/2/5.64.507
Quadro n.º 21 – Área das leiras (séculos XVII-XVIII) Grupos (m2)
I
Até 500
17
Entre 501-1000 « 1001-2000
II
III
IV
V
VI
VII
VIII
23 17
23 22
« 2001-3000 « 3001-4000
29.7 6
8.1 5
« 4001-5000
6.8 2
« 5001-6000
2.7 3
« 6001-11000
4 2
Fonte: ADP, K/26/2/5.64.507.
938 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.311-314. 244
2.7
Joel Silva Ferreira Mata
1.3 – A pressão demográfica e a partição do casal O casal, concebido como o território suficiente para sustentar uma família nuclear (marido, mulher e filhos, enquanto grupo homogéneo, na qualidade de solteiros) não podia ser dividido por outros membros familiares, uma situação que embora proibida, por lei, era, muitas vezes, praticada pelos enfiteutas, em circunstâncias diversas. A divisibilidade da terra e do seu direito era interdita, pela máxima emphiteusis est individua, mesmo que à sucessão surgissem vários herdeiros939, como por exemplo filhos celi-
batários. Em todo o caso, quando era detectada a situação irregular, a autoridade senhorial optava, no território do actual concelho de Valongo, quase sempre, pela constituição de uma nova unidade tributária, conferindo ao seu possessor e principal pagador um novo contrato enfiteutico, depois de ter sido feita a “apegação”940 e vedoria a todas as parcelas a integrar na escritura tabeliónica de cedência do domínio útil da terra, constituindo, assim, um regime, que negando a subenfiteuse, acabava por favorecê-la941. Gráfico n.º 27 – Campos e leiras identificados
Fonte: TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12.
Em 1593, pelas diligências efectuadas por Cristóvão da Costa de Sá, ao serviço das beneditinas do mosteiro de Avé Maria do Porto, inquirindo 939 DURÃES, Margarida – «Herdeiros e não herdeiros. Nupcialidade e celibato no contexto da propriedade enfiteuta», in Revista de História Económica e Social, n.º 21. Lisboa: Liv. Sá da Costa Editora, 1987, p.49. 940 ADP, Livro 1.º das Apegações, K/15/1-55.
941 AMORIM, Inês (1997) – O Mosteiro de Grijó. Senhorio e propriedade: 1560-1720 (formação, estruturas e exploração do seu domínio). Braga: Ed. Autor, p.102. 245
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Domingos Gonçalves e sua mulher Catarina Martins, verificou que estes precaristas cultivavam um meio casal constituído por casa de morada e suas dependências, e terra agrícola que abrangia cinco campos e nove leiras. Os foreiros explicaram, à comissão visitacional, que estavam em posse do meio casal “per vertude de hũa escritura de dote que apresentarão”942, feita por Brás Barbosa, tabelião público e judicial no julgado da Maia, em 8 de Julho de 1568. Esta transmissão foi realizada por Maria Martins, mãe de Catarina Martins “per vertude de um prazo de três vidas que tinha do dito casal943, documento que os titulares exibiram, no qual constava que a sogra de Domingos Gonçalves, primeira vida da totalidade do prédio rústico, decidiu, unilateralmente, dividi-lo, em duas fracções, sem ter dado conhecimento às entidades senhoriais. O juiz Cristóvão da Costa de Sá validou a transmissão ilícita, por tempo indeterminado, isto é, enquanto fosse vivo Domingos, filho de Gaspar Gonçalves, e que por ser já a terceira geração, o contrato caducaria944, pela sua própria natureza jurídica, podendo o cenóbio feminino emprazá-lo de novo, à mesma família ou a qualquer outro valonguense ou forasteiro que estivesse interessado em explorar a terra.
O casal do Vale, na freguesia de São Mamede de Valongo, foi igualmente objecto de partição entre Gonçalo Fernandes e sua mulher Catarina Fernandes, de uma parte, e Francisco Fernandes e sua mulher Maria Fernandes da outra. Os quatro membros, de duas famílias distintas, foram inquiridos em audiência, na casa do ouvidor de São Mamede de Valongo, pelo juiz Cristóvão da Costa de Sá e por Gonçalo de Araújo, procurador das freiras e confessaram que nunca “o casal que trazem amtre si partido esta o dito luguar da Valle”945, na freguesia de São Mamede de Valongo e descre-
veram as suas casas, terrenos, confrontações e rendas. O foreiro Gonçalo Fernandes e sua mulher Catarina Fernandes confessaram, na sua audição que, de facto, possuíam o casal legalmente, constituindo-se primeira e segunda vidas por “hum prazo de três vidas que apresentarão”946, estando reservado ao cônjuge sobrevivo a faculdade de nomear o derradeiro precarista. Esta 942 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.23v. 943 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.23v. 944 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.23v. 945 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.28.
946 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.29v. 246
Joel Silva Ferreira Mata
escritura havia sido exarada na cidade do Porto, em 2 de Fevereiro de 1562, por Gaspar de Couros, tabelião das notas nesta cidade947, não havendo lugar a qualquer protesto ou interdição senhorial. Quanto a Francisco Fernandes e Maria Fernandes que viviam no casal, numa casa térrea, de reduzidas dimensões, coberta de colmo, pobre, que funcionava como cozinha, com sua corte, um celeiro, um aido e uma outra dependência destinada à criação de gado porcino para consumo doméstico, alegou, em sua defesa, que os dois campos, as catorze leiras e as três cavadas que exploravam lhes haviam sido transmitidas por uma escritura tabeliónica realizada pelo mesmo oficial Gaspar de Couros, em Fevereiro de 1562, conferida pelas testemunhas Belchior Monteiro, porteiro do Tombo, e pelos valonguenses Manuel Brás e André Gonçalves948. Quadro n,º 22 – Distribuição dos casais por número de parcelas Grupos
I
de 2-10
4
de 11-15
II
III
IV
Percentagem (%) 20
4
20
de16-20
5
de 21-26
25 7
35
Fonte: TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12.
O casal da Estrada de Valongo estava dividido por duas famílias de arrendatários em proporções desiguais: Isabel Gonçalves, viúva de Gaspar Fernandes, e Maria Gonçalves, também viúva, de Manuel Gonçalves, ambas moradores na Rua Velha, da referida freguesia. Chamadas a depor na presença dos comissários, as duas mulheres, vestidas de preto, responderam cada uma de per si, justificando o seu direito. A primeira declarou estar na posse de um terço do casal e Maria Gonçalves na posse dos dois terços restantes. A viúva de Gaspar Fernandes pagava uma renda de um alqueire de trigo, três de pão meado e três galinhas pelo cultivo do campo 947 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.29v. 948 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.32v. 247
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
da Passagem onde estava a cabeça do seu terço; da Retorta, do Valado; da leira Pequena, da Cancela, da Vinha, do Valado, da Agra de Galegos; das duas do Lameiro e uma outra que estava em mato949, cuja titularidade lhe havia sido conferida por sua mãe Margarida Anes, primeira vida que então lhe “dera os dous (sic) terços em dote”950, por uma escritura efectuada por Manuel Farinha, tabelião público e judicial do julgado da Maia, em 12 de Junho de 1571951. A segunda inquirida revelou ao juiz, também verbalmente, que os dois terços do casal, que possuía, lhe foram cedidos por Isabel Gonçalves e eram constituídos por um corpo de casarias, vários campos e leiras cujo contrato de locação do domínio útil devia ter sido realizado na mesma altura do da viúva Gaspar Fernandes. À morte de ambas, como parece depreender-se do aviso deixado à co-titular, o domínio que estava dividido seria devolvido livremente às freiras do mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, sem qualquer impedimento, para que o senhorio procedesse livremente à renovação contratual a seus filhos ou herdeiros952. Todas as situações de repartição dos casais resultam da pressão demográfica, reflectindo um fenómeno que ocorre de forma descontínua reflecte-se com maior visibilidade em algumas famílias valonguenses, com vários filhos que atingem a maior idade. Por outro lado, os filhos que casam preferem ficar próximos dos assentamentos dos pais, onde as terras já estão desbravadas, agricultadas, podendo arrotear mais um pouco de área, constituindo-se, desta forma, aglomerados populacionais, sempre discretos que pouco a pouco matizam a paisagem rural, verde na Primavera, seca e loira no Verão, de expectativa no Outono e tempestuosa no Inverno. Outro exemplo reconhecido pelo senhorio diz respeito ao prédio das Casas de Baixo, na freguesia de São Mamede de Valongo, que foi repartido entre André Dias e mulher Graça Gonçalves, e António Gonçalves e mulher Joana Dias. Os primeiros exibiram uma escritura passada por Jerónimo de Figueiroa, tabelião público e judicial do julgado da Maia, em 18 de Maio de 1569, a favor de João Dias, pai do actual foreiro André Dias, que o nomeou “em segumda 949 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.63-65. 950 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.65v. 951 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.65.
952 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.65v. 248
Joel Silva Ferreira Mata
vida nos dous terços do dito casal”953, por uma outra escritura efectuada em 15 de Novembro de 1578, na cidade do Porto, pelo tabelião Rui de Couros954. O terço restante explorado pelos co-titulares António Gonçalves e Joana Dias foi-lhes deixado por um contrato enfiteutico, de nomeação, datado também de 15 de Novembro de 1578, no mesmo cartório e tabelião Rui de Couros955.
Partilha de um casal encabeçado inicialmente por André Dias, em São Mamede de Valongo. Fonte: TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv.12, fl.77v.
De facto, um dos processos de colonização dos terrenos agrícolas está na possibilidade consentida de um casal poder ser titulado por mais do que uma família em simultâneo, tornando-se, assim, tantas unidades tributárias, quantos os encabeçamentos que uma unidade-mãe acaba por dar lugar. Em geral, no território do actual concelho de Valongo, este modelo parece não ultrapassar dois núcleos que podem resultar da partilha entre dois filhos e não mais do que isso; dois terços do casal da Poça, na aldeia de Susão Valongo andavam emprazados, em três vidas, a Pedro Dias e mulher Anes Gonçalves, primeira e segunda gerações por uma escritura lavrada na cidade do Porto, pelo tabelião Rui de Couros, em 5 de Abril de 1590; a terça parte restante, porém, estava, precariamente, nas mãos de Francisco Gonçalves e sua mulher Maria Pires, por escritura realizada no mesmo dia, mês e ano956. 953 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.77v. 954 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.77v. 955 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.79.
956 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.101-103. 249
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Com efeito, na segunda metade do século XVI, época em que se verifica um assinalável crescimento demográfico, o senhorio das monjas beneditinas aceitou partir o casal inicialmente atribuído a uma só família, extensível a mais dois familiares na sucessão directa, em duas “fracções autónomas”, cada uma delas com casas de morada e suas conexas, campos, leiras entre outros terrenos para o cultivo do cereal alvo e grãos negreiros, a outros tantos núcleos familiares que descenderiam do primeiro, dando, por consequência, origem a vários contratos, permitindo aos seus titulares a exploração individual e por eles responderiam com os montantes das rendas declaradas, por mútuo acordo, no contrato enfiteutico. Não obstante, no casal do Vale, em São Mamede de Valongo, esta unidade tributária estava nas mãos de três arrendatários distintos, possuindo cada um deles um terço dos bens do casal primitivo. O primeiro, a ser identificado nas apegações de 1593, foi André Gonçalves e sua mulher Catarina Pires, que desfrutavam de uma casa chã, colmada, no sistema binário que funcionava como cozinha e celeiro, e uma casa dependente, mas no mesmo recinto destinada ao gado, que tanto podia ser um aido ou uma corte, cujo perímetro estava ligado por um terreno de esterqueira957. Tinha, para seu sustento, o campo da Cortinha, com uma eira, que confrontava com o caminho de serventia do lugar de Valongo; o campo da “Contença” que estava entalado entre o ribeiro com o mesmo nome e com o caminho que seguia em direcção a Alfena; o campo da Presa, bem situado, junto da estrada que atravessava Valongo; o campo de Baixo, também servido pela água do ribeiro da Presa; de várias leiras como a da Senra, de Ilhar Mourisco, de Soagide na agra de Galega, a da Carvalheira e do Lombo, todas na agra dos Galegos, onde possuía outra propriedade sem designação, no fim da referida agra, que estava ainda em mato e que seria necessário arroteá-la. Este primeiro titular explicou, em audiência, ao juiz Cristóvão da Costa de Sá que tinha uma escritura tabeliónica, pela qual constava que havia feito um emprazamento, em três vidas, em nome de Gonçalo Anes e sua mulher Catarina Gonçalves, seus pais, já defuntos, que, por sua vez, o haviam nomeado como derradeiro concessionário, pois tinham sido constituídos a primeira e a segunda vidas por uma escritura de 31 de Dezembro de 1542, realizada na cidade do Porto, 957 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.114. 250
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pelo tabelião Gaspar de Couros958. Contudo, quando confrontado, o foreiro não tinha consigo a escritura que o nomeava, dando-lhe o juiz dois dias para a exibir, não havendo registo de que o camponês estivesse a fugir à verdade. A segunda família era, nesta altura, formada pela viúva Justa Fernandes, que vivia em Valongo e por essa razão não tinha qualquer casa de morada ou outros elementos ergológicos onde pudesse pernoitar, cozinhar, armazenar palha, cereais ou criar gado, mas apenas enumerou o campo de Ilhar Mourisco que partia entre outras confrontações com o caminho que seguia para Santo André de Sobrado; o campo da Azenha que, por sua vez, estava no enfiamento da estrada que atravessava Valongo, e o campo da Contença, servido pelo ribeiro homónimo, e cinco leiras e meia. A viúva justificou a posse destas terras, sem água, por seu pai Fernandes Anes a nomear por terceira vida, segundo uma escritura que não apresentou, e que teria sido feita por Brás Barbosa, tabelião público e do judicial do julgado da Maia, já falecido. Estando em falta documental, o juiz Cristóvão da Costa de Sá deu, à inquilina das beneditinas do mosteiro de São Bento de Avé Maria, um prazo de dez dias para lhe apresentar o título de posse959. A parte restante do casal estava nas mãos de Afonso António, casado com Margarida Fernandes, ambos agricultores que viviam na aldeia da Pícua, na freguesia de Águas Santas. Do casal da Vale detinham, para cultivo, somente uma leira na agra da Senra que confinava com o ribeiro da Senra e um campo na agra de Galegos. Estas propriedades “não tem agoa nenhũa”960, o que não deixa de ser estranho, pelo menos no que respeita à leira identificada. Já depois de ter terminado o levantamento oral, os concessionários marido e mulher lembraram-se de que tinham também uma terra pequena que estava ainda em mato, na agra da Senra961. A posse destes terrenos agrícolas, sem qualquer tipo de construção, foi conferida por uma escritura da autoria do tabelião Brás Barbosa, em 30 de Março de 1579962.
958 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.116v. 959 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.117v. 960 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.118v. 961 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.119. 962 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.119. 251
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O domínio útil destas propriedades pertencia a Tomé Gonçalves, morador em São Mamede de Valongo, entretanto falecido, que o cedera por uma escritura de dote de casamento a favor do filho do anterior titular, tendo o juiz dado o seu consentimento a António Gonçalves “e asi sera primeira molher Madanela Gonçalves já defumta”963, conforme a escritura de 30 de Março de 1579, da lavra do tabelião Brás Barbosa. Sem objecção do juiz Cristóvão da Costa de Sá, o casal do Outeiro, na aldeia homónima, na freguesia de São Martinho do Campo estava a ser cultivado por três pessoas sem que entre ela houvesse qualquer tipo de partição. Viviam no casal mas em casas separadas, térreas e colmadas, a viúva Maria Gonçalves e João Bartolomeu, seu filho casado com Inês Duarte. À morte da viúva é provável que seu filho lhe sucedesse, por nomeação, e fosse a terceira vida, dando teoricamente início à derradeira vida do contrato outorgado a favor de seu pai. Possuíam um celeiro, um palheiro e uma casa térrea “que serve de bois e tem peguado nellas hum alpemdre coberto colmado”964.
Os três declaram que não possuíam qualquer escritura de emprazamento que os habilitasse à posse “pelo pesohirem seus amtecessores”965, facto que sendo inédito, foi tacitamente aceite pelo juiz Cristóvão da Costa de Sá, pelo ouvidor Francisco António e o procurador Gonçalo de Araújo, evitando-se o despejo e eventuais prejuízos para as profitentes beneditinas pela interrupção do fluxo dos foros.
963 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.119.
964 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.175.
965 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.176v. 252
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O lugar de habitação típico aproveitando a protecção da encosta e a proximidade das leiras, na aldeia do Couce (Valongo). Fonte: M.M.V.
A situação inversa, também pouco visível, foi observada no casal do Carvalho, na aldeia da Quintã, na mesma freguesia de São Martinho do Campo. Tinha, por titular, em 1593, somente o viúvo Alexandre Dias, que vivia na exploração constituída por uma casa térrea que podia funcionar como quarto966, muito simples, um espaço reservado à intimidade dos seus residentes967; uma outra dependência isolada, coberta de telha, destinada à morada do genro Amador Manuel; outra do mesmo género construtivo onde vivia Domingos Afonso, também seu genro. A criação de gado em cativeiro devia ter sido uma actividade interessante deste inquilino principal, foram identificados três casas destinadas a este fim, e ainda uma estrebaria colmada. Completava esta estrutura uma outra casa com cobertura telhada que “serve despejos”968. O viúvo reconhece o cenóbio das profitentes do hábito de São Bento como senhorio, aliás como já o havia feito anteriormente, por escritura efectuada na cidade do Porto, por Gaspar de Couros, em 6 de Outubro de 1555, sendo ele a primeira vida e sua mulher, já falecida, a segunda. Não consta, ainda, que Alexandre Dias tenha feito a nomeação, tanto mais que se desco966 BEIRANTE, Maria Ângela Rocha (1995) – ob. cit., p.122.
967 CHEVALIER, Bernard (1982) – Les Bonnes villes de France, du XVe. Siècle. Paris, p.185. 968 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.197v. 253
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nhece se os seus dois genros estavam ainda casados ou se eram igualmente viúvos, podendo optar por declarar a terceira vida em nome de um dos seus genros. Outra solução seria a de deixar nomeado à posse do casal os dois genros, situação conhecida mas pouco vulgar. Ainda dentro do quadro tradicional respeitante à divisão do casal, sobre o qual recaía aquilo que vulgarmente a documentação consagrou por prazo velho, podemos referir uma parcela transformada em unidade agrária de tributação, correspondente a 20% da totalidade do prédio antigo, globalmente considerado, o emprazamento de apenas um quarto do casal do Cabo, na freguesia de Santo André de Sobrado, realizado pelo comendatário do mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, em 1625, em nome de Jerónimo Pedro, solteiro, e que abrangia mais de trinta parcelas de terreno. Habitava uma casa de elite, de dois pisos, coberta de telha vã, rectangular de 7.5 x 5.5 m2
por piso, numa área bruta de aproximadamente 39.3 m2, por piso. Na parte superior “tem sua logea do mesmo tamanho com sua janella pera o nascente em cima”969; tinha outro prédio: uma casinha, uma eira, um curral, um aido, uma enxerqueira e uma casa nova “a qual ainda esta em puras paredes”970; cultiva campos, cavadas e cavadinhas, diversas leiras, soutos e no fim, no dia da invocação de São Miguel de Setembro, carregava trigo, milho, bragal, galinhas, ovos, cera, mel, carne porcina e moeda, à sua custa, para entregar no mosteiro do senhorio, um percurso realizado uma vez ao ano enquanto o contrato não fosse denunciado.
A partilha dos casais era uma prática que atravessava os diferentes senhorios e esta justificava-se para promover o povoamento rural, pela captação e fixação dos agricultores a terras que já conheciam, sendo mais fácil a sua identificação, não havendo, lugar à míngua das rendas. Havendo mais unidades tributárias, maior será o rendimento senhorial. Desta óptica de interesses partilhava o comendatário do mosteiro masculino de Santo Estêvão de Vilela, que no início do século XVII, aceitou realizar um contrato de emprazamento em três vidas, a João Frutuoso, de São Mamede de Valongo, sobre o meio casal de Cima de Vila, na freguesia de Santo André de Sobrado, que havia vagado por óbito de Graça Domingues; o actual conces969 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, K/26/2/5-64.507, fl.131. 970 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, K/26/2/5-64.507, fl.131. 254
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sionário era filho da falecida e, ao querer exercer o seu direito ao domínio útil que recebera de sua mãe, por nomeação, requereu que fosse realizada uma vedoria que esteve a cargo dos louvados Estêvão de Ferreira (pelo mosteiro) e por Baltasar Fernandes (pelo foreiro). As casas, os campos e as leiras foram identificadas, medidas no sentido longitudinal e horizontal, e fixada a quantidade de cereal para a sementeira e a renda global, a entregar, no cenóbio, no dia 29 de Setembro, durante os anos da vigência contratual, que para o efeito fizeram o seu juramento canónico, atribuindo a renda, foro e pensão “que em suas conciências lhes parecesse bem pagar em cada hum ano ao mosteiro de Villela dereito senhorio”971. Por uma escritura datada de 13 de Outubro de 1603, o mesmo cenóbio mandou efectuar a actualização do meio casal da Vila, na freguesia de Santo André de Sobrado que fora repartido por três grupos de camponeses formados por António Gonçalves e sua mulher Francisca Gaspar; por Francisco Fernandes casado com Joana Fernandes, e por um terceiro precarista chamado António Duarte e mulher Maria Gaspar, que em conjunto habitavam um complexo construtivo cuja cabeça era formada por um palheiro, dois celeiros, duas cozinhas, um aido, duas cortes, uma eira comum e uma horta de 3,85 x 2,75 m, perfazendo uma área aproximada de 11 m2, completamente cercada e fora do alcance dos animais. O corpo externo era formado por vários campos para a cultura cerealífera, outros como o campo do Castanheiro para a produção de trigo, de frutas e azeite; o campinho de Paradela, murado em toda a sua extensão, de cultura mista de cereais e vinha; o soutinho, plantado de novo, vários outros soutos já adultos, cavadas e a metade de um moinho com suas cavadas em redor, ao qual foi atribuída uma das rendas mais complexas e volumosas de todos os contratos estudados972.
Na segunda metade do século XVII, o cabido da Sé do Porto, representado pelo reverendo Francisco Ferreira Pinto, arcipreste na referida Sé, e o padre Amaro Álvares, dela beneficiado, mandaram proceder à avaliação do meio casal do Escoural, na freguesia de São Mamede de Valongo, cuja renovação caiu sobre Maria Francisca, a freira, viúva de Manuel Ribeiro973. Do seu 971 ADP, Livro 1º das Apegações, K /15/ 1-55, fl.109.
972 ADP, Livro 1º das Apegações, K /15/ 1-55, fl.115.
973 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, K/26/2/5-64.507, fls.198-198v. 255
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património habitacional constava apenas uma casa, de um piso, telhada, na Rua de Valongo; a área agrícola era composta por vários campos: da Presa que não estava totalmente aproveitado, jazendo uma parte em mato, mas não foi obrigada a arroteá-lo e talvez por isso, os louvados não estimaram a quantidade e a qualidade de semente que devia ser lançada à terra; o campo de Romariz, completamente murado; o campo do Vale de Dronho também protegido por um muro em todo o seu perímetro, assim como o campo de Ilhar Mourisco cercado de paredes, e o campo da Vale; outras propriedades como a leira da Presa, do tapado da Carigosa de Cima, e a tapada da Carigosa completavam a unidade tributária, da qual o cabido recebia uma renda basicamente em galinhas (seis) e um tostão em numerário974. Na freguesia de Santo André de Sobrado, o comendatário, em 1603, mandou proceder a um auto de vedoria e de apegação ao meio casal de Vila, na aldeia da Devesa, então ocupado por Gaspar Belchior e sua mulher Francisca Gaspar: é uma casa sobradada, composta pela cozinha, no piso inferior e pelo celeiro no sobrado; vários currais, um palheiro e uma eira, que no seu conjunto definem o espaço de convivência familiar; a área de agricultura que os louvados inventariaram ocupava metade de um chão de uma vinha, e vários soutos. A renda era elevada, diversificada nas suas componentes que além dos cereais, incluía tecido, carne suína, um carneiro, um cabrito, mel e cera975. Em meados do século XVIII, voltou-se de novo ao meio casal do Escoural, que em 1745 havia vagado por morte de Manuel Ribeiro Paulo, que era a derradeira vida. Ora a situação que se presencia é diferente das anteriores. Com efeito, foi constituído como cabeça de casal, a partir de 1 de Janeiro de 1745, António João por ser “nelle a mayor parte”976, no qual eram também
consortes o padre Manuel Francisco, Cecílio, João Marques das Neves, João das Neves Roriz, António Francisco, Domingos Ribeiro e José Alves Alão, sendo lavrado o prazo do domínio útil desta unidade agrícola, em nome do referido António João e Ana Ribeira, sua mulher, como primeira e segunda vidas. 974 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, K/26/2/5-64.507, fls,196-198v. 975 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, K/26/2/5-64.507, fl.119. 976 ADP, K/2 Autos de Vedoria, 1639-18316/2/5-64.507, fl.215. 256
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Este processo complexo foi analisado, em Valongo, por Martinho Lopes Morais Alão e Domingos Ribeiro Nunes, cónegos prebendados da Sé Portuense que em presença dos consortes e do louvado Domingos de Carvalho, lavrador, morador em São Mamede de Valongo, em representação dos foreiros e de Manuel Gonçalves Tavares, residente na freguesia de São Martinho de Cedofeita, em nome do Cabido, renovaram o prazo, que agregava várias propriedades dispersas que formavam o referido meio casal do Escoural. Esta divisão patrimonial foi realizada há várias gerações atrás, sendo os actuais consortes membros da mesma família. Assim Maria Ribeira, bisneta de Maria Francisca, primeira vida no prazo antigo, comprou o campo da Vale e entretanto também havia sido contemplada com a parte restante, por dote, para casar Ana Ribeira, neta da referida Maria Francisca. Os restantes consortes apresentaram cada um a forma de aquisição de parte do meio casal. O padre Manuel Francisco Cecílio era consorte por ter comprado uma parte fundiária a José Alves e a sua mulher Catarina Ribeira, bisneta de Maria Francisca; João Marques das Neves, por escritura de dote, que lhe fizera seu sogro Manuel João Montes, casado com Maria Ribeira, neta da referida homónima, a freira; António Francisco, também por dote que recebera de seu pai António Francisco, filho de Maria Francisca, a freira; João das Neves Roriz, por ser casado com Maria Ribeira, a quem seu pai Jacinto Ribeiro, por sua vez, neto de Maria Francisca, a freira, deixou em testamento; Domingos Ribeiro foi igualmente contemplado com uma doação feita pelo pai António Ribeiro, filho de Maria Francisca, a freira; finalmente, José Alves fazia também parte dos consortes por ser casado com Maria Ribeira, bisneta de Maria Francisca, a freira977. O esquema familiar que envolve quatro gerações de camponeses ou consortes explica sumariamente esta situação.
977 ADP, K/26/2/5-64.507, fl.217v. 257
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Quadro genealógico sobre os consortes do meio casal do Escoural (1603)
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.215
O casal que domina a organização do território agrícola do actual concelho de Valongo, com um ou mais titulares do domínio útil, com mais ou menos parcelas, pertence à categoria de casal disperso, numa grande variedade morfológica978. Há, contudo, pequenas bolsas prediais rústicas sobre as quais foram feitos contratos enfiteuticos mais simples. Em 1593, as freiras do hábito beneditino do Porto, pelo mesmo licenciado e juiz Cristóvão da Costa de Sá, morador na cidade portuense, Francisco de Araújo, procurador, e o ouvidor Francisco António inquiriram sobre a posse que António Duarte, morador em Valongo da Estrada, detinha sobre um campo em Sobrado. O precarista exibiu uma escritura datada de 1571, realizada por Jerónimo de Figueiredo, tabelião público do julgado da Maia. Na verdade, a posse efectiva pertencia a Isabel Antónia, por dote de casamento com Pêro Gonçalves que sendo a terceira e última vida, interrompeu o ciclo geracional, pela entrega voluntária do imóvel979. Desta mesma época, cite-se o campo de Campelo, em Valongo da Estrada, foreiro à viúva Catarina Antónia domiciliada em Valongo. Na realidade, a camponesa possuía somente 50% da propriedade “porquanto a metade do dito campo pertence aos pasais da dita igreja”980, de São Mamede 978 MARQUES, André Evangelista (2008) – ob. cit., p.2.
979 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.10v.
980 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.122. 258
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de Valongo. A viúva era a segunda vida e o seu direito enfiteutico foi-lhe reconhecido por uma escritura de nomeação outorgada em 21 de Fevereiro de 1572, pelo tabelião Rui de Couros, da cidade do Porto981. Incerto no Livro das Notas e Prazos Antigos, que abrange a segunda metade do século XV e a primeira metade da centúria de Quinhentos constam dois emprazamentos individuais sobre um campo e um meio campo, de aptidões agrícolas diferentes. O primeiro situa-se na freguesia de São Mamede de Valongo, que o comendatário Brás Brandão, do mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, outorgou a Afonso Gonçalves, mulher e um filho. A rentabilidade deste prédio rústico estava aproveitada em apenas 50%, uma vez que a outra metade da superfície estava em mato. O foreiro titular era obrigado a desbravar o terreno pela cláusula das benfeitorias que devia fazer à sua própria custa. A renda era de baixo valor, no montante de um alqueire e três quartas de trigo, a entregar ao senhorio por dia de São Miguel de Setembro982.
A mesma renda pagavam Sebastião Martins, Catarina Gonçalves, sua mulher, e o filho que lhes viesse a suceder, por um campo demarcado “por marcos com terra de Gonçalo Fernandes de Valongo Susão”983. A subenfiteuse era, como dissemos, absolutamente interdita. No entanto, no século XIX, em 1831, José Monteiro da Maia, viúvo, usufrutuário do seu pai João Monteiro da Maia, da cidade do Porto, com licença do cabido da Sé do Porto, subemprazou a Manuel Gonçalves da Cruz e sua mulher Josefa de Sousa Dias, dois campos que andavam unidos num só, com sua eira e curral denominado campo das Vales, e que estavam na família por sucessão dos antepassados e nomeação de D. Maria Margarida, mãe de José Monteiro Maia984. Os campos, considerados, como uma só unidade, foram medidos pelos louvados Manuel Fernandes Duque, enfiteuta de Valongo e por José Dias, por parte do Cabido, da freguesia de Paranhos, que acharam que o campo mais curto, quase quadrado, media cerca de 52 x 48.5 m, numa área aproximada de 2522 m2; o outro, marcadamente rectangular com cerca de 60.5 x 99 m, com uma área aproximada de 5990 m2; no interior destes dois
981 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.122.
982 ADP, Livro 2.º de Notas e Prazos Antigos, k/2679/1-274.1, fl.106. 983 ADP, Livro 2.º de Notas e Prazos Antigos, k/2679/1-274.1, fl.106. 984 ADP, Autos de Vedoria (1634-1831), k/26/2/5.64.507, fl.236. 259
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prédios havia terra de lavra, mato, alguns sobreiros, uma casa térrea telhada que dava guarida ao gado e uma eira985. O estudo da propriedade rural no actual concelho de Valongo, desde a Idade Média ao século XIX permite interpretar a forma como os diferentes senhorios eclesiásticos faziam a gestão do património fundiário, quer quando se tratava de casais em nome de um só foreiro, que administrava a totalidade das parcelas, quer quando permitia tacitamente a divisão do casal em duas, três ou quatros partes, quer como vimos, em 1831, o subemprazamento que, para evitar o descontrolo sobre a “apegação” e as rendas subtraídas pelo aumento da produção eventualmente ocultada e utilizada apenas em proveito do camponês era uma situação que o senhorio não podia tolerar.
1.4 – A transmissão do domínio útil da propriedade agrícola. 1.4.1 – Por encampação ou interrupção Os contratos de exploração agrícola, em três gerações, podiam ser denunciados unilateralmente e a pedido do agricultor pelo processo denominado por encampação ou interrupção, no qual o titular invocava várias razões ou causas, procurando a rescisão amigável e concertada, com o senhorio, e seus agentes que localmente tinham a seu cargo a gestão do património rural986. As razões concretas, apresentadas pelo peão, assentavam, na seguinte trilogia: idade avançada, doença e cansaço987, que podia transformar-se numa
tetralogia se às causas enunciadas juntarmos a consequente perda de capacidade para suportar a renda, quer em géneros, quer em numerário ou foros mistos988, situação que atingia com maior ou menor incidência os senhorios
laicos, eclesiásticos e religioso-militares989, como acontecia, por exemplo, com o mosteiro de Santo André de Ancede, em Baião990. 985 ADP, Autos de Vedoria (1634-1831), k/26/2/5.64.507, fl.237v.
986 MATA, Joel Silva Ferreira (2016b) – A Comunidade feminina da Ordem de Santiago: a comenda de Santos na Idade Média. Lisboa: Universidade Lusíada Editora, p.147.
987 SOUSA, Bernardo de Vasconcelos (1990) – A Propriedade das Albergarias de Évora nos finais da Idade Média. Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Científica, p. 77.
988 MATA, Joel Silva Ferreira (2016a) – ob. cit. p. 165.
989 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.346-347.
990 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016b) – ob. cit. pp. 164-166. 260
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A maior parte das denúncias era feita por mulheres viúvas, que estavam sozinhas e incapazes de agricultar o casal, deixando os campos, as leiras, as cortinhas, as quebradas e outras propriedades arruinarem-se, impedindo o crescimento descontrolado da vegetação bravia e do mato, assim como deixar cair a casa de morada, construída com materiais frágeis, incapazes de resistirem às intempéries, aos incêndios e a outras calamidades, que facilmente poderão transformar-se em pardieiros, aliás como acontecia nos prédios urbanos das cidades portuguesas da época, nomeadamente em Lisboa e no Porto. Este estado de desinvestimento não interessava aos senhorios pois perdiam as rendas actuais e poderiam diminuí-las quando um novo inquilino fosse ocupar o prédio degradado pelos gastos iniciais, quase sempre avultados, que eram compensados pelo senhorio, recorrendo-se, em geral, à fixação de uma renda inicial mais baixa a vigorar durante um certo período de carência, ou estender-se ao longo do tempo de vigência da primeira vida do prazo e gradualmente atingir os montantes que o prédio rústico, em condições normais de exploração, podia render. Antes que o senhorio reclamasse judicial e compulsivamente a devolução, os agricultores, homem ou mulher libertavam, em certos casos, o casal, evitando gastos em custas processuais, caindo na miséria sem qualquer conforto familiar ou material. Em data imprecisa, Pedro Fernandes, morador em Santo André de Sobrado, renunciou, livremente, nas mãos de Brás Brandão, comendatário do mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, um meio casal, em Sobrado, alegando “ser velho e canssado e ter cassado (sic) seu filho Manuel Pires com sua molher Maria Gonçalvez e lhe darem em dote em casamento ho dito meio casal”991, prescindindo do seu direito; o comendatário aceitou esta mudança de titularidade sem manifestar qualquer tipo de oposição.
No início do século XVII, o mesmo aconteceu com o meio casal do Paço, na aldeia de Vilar, na referida freguesia. Com efeito, Gonçalves Domingues e sua mulher eram a derradeira vida de um emprazamento em que haviam sido nomeados. Para evitar a perda das benfeitorias acumuladas pela família, ao longo de duas gerações, no prédio rústico, propuseram a renovação do mesmo em nome de Isabel Domingues, solteira, sua filha “pera a poderem
991 ADP, Livro 2º das Notas e Prazos Antigos, K/26/9/1-274.1, fl.99. 261
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casar com o dito casal e prometeram e de não ha contradizerem”992 . Neste jogo de interesses mútuos, os senhorios cedem sempre porque não há interregno por falta de interessados. Desta forma um emprazamento normal, em três vidas, dava origem a um contrato renovado que podia atingir, na mesma família quatro, cinco e seis gerações993.
1.4.2 – A sucessão por morte do cabeça de casal: a lutuosa Sempre que ocorria a sucessão, por nomeação, após a morte do concessionário que encabeçava a unidade agrária e de tributação, fosse um casal ou parte dele, desde que estivesse autonomizado, no território do actual concelho de Valongo, o novo precarista estava submetido ao pagamento do “imposto sucessório ao prazo”, conhecido por lutuosa, um tributo que as escrituras enfiteuticas de emprazamento contemplavam na parte final do contrato formalmente estruturado. Esta obrigação tributária, em benefício do senhorio, devia ocorrer entre o luto e o funeral do usufrutuário cessante994.
O seu valor era muito variável, e, em muitos lugares, como por exemplo na diocese de Braga, correspondia, inicialmente, à melhor jóia, progredindo para uma prestação em numerário995. No antigo concelho de São Cristóvão de Nogueira (integrado mais tarde no actual concelho de Cinfães), em 1513, D. Manuel fixou, para a grande maioria das suas aldeias também a “melhor jóia”, mas para outras como Marzeais ou Valbom, do mesmo município, a sucessão implicava o pagamento de cento e oito reais996. Por outro lado, o mesmo senhorio podia tabelar de forma diferenciada a sucessão à unidade agrícola dentro da mesma aldeia ou lugar, como acontecia no couto de Santo André de Ancede997. O próprio rei D. Manuel tratava diferentemente os agri992 ADP, Livro 2º das Notas e Prazos Antigos, K/26/9/1-274.1, fl.50. 993 MATA, Joel Silva Ferreira (2016b) – ob. cit., pp.132-134.
994 VITERBO, Joaquim de Santa Rita (1993) – Elucidário das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram. Vol. II. Porto- Lisboa: Livraria Civilização, p.369. 995 COSTA, Avelino de Jesus (1983) – «Lutuosa», in Dicionário de História de Portugal. Vol. IV, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, p.86.
996 MATA, Joel Silva Ferreira (1992) – «Os Forais manuelinos do actual concelho de Cinfães: os foros», in Actas do Congresso Municipalismo e Desenvolvimento no Noroeste Peninsular. Marco de Canaveses: Câmara Municipal, p.195. (189-197) 997 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – ob. cit. p.173. 262
Joel Silva Ferreira Mata
cultores do concelho de Baião, isentando a sua maioria desta tributação, mas alguns continuavam a pagar ao Senhor da Terra, a melhor jóia998. A lutuosa, na prática, abrangia um universo muito mais alargado podendo, ser remida em moeda, na melhor jóia mas também ser liquidada contra a entrega de certa quantidade de animais de pastoreio, em numerário e produtos manufacturados999. No território do actual concelho de Valongo o valor que pautava os diferentes senhorios consistia na entrega de um valor igual ao da renda. A esta pesada prestação sujeitavam-se, por exemplo, os lavradores que sucediam no meio casal da Vale, que em finais do século XVI “tinhão obrigação conforme a ele de paguar ao dito mosteiro outro tamto como da remda”1000; a quebrada sita em São Mamede de Valongo, nas mãos da viúva Maria André1001; os campos do Valado e do Codeçal, de Andresa Dias, viúva de António Gonçalves1002; o casal de Baixo, em Valongo que andava repartido entre André Gonçalves e António Gonçalves1003; a quebrada do Moinho do Eiro1004; o casal da Vale, dos foreiros André Gonçalves, Justa Fernandes e Afonso António1005; na freguesia de São Martinho do Campo, cite-se o casal do Rio1006, e as propriedades que estavam abrangidas, num só contrato, de Lucas Gonçalves1007, ou o terço de um casal que as irmãs Maria e Catarina, filhas órfãs de André Anes que entretanto já haviam atingido a idade
998 DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1961) – Livro dos Forais Novos da comarca de Trás-os-Montes. Beja: Ed. do Autor, p.45. 999 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – ob. cit. pp.174-176.
1000 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.29v. 1001 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.61.
1002 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.73v. 1003 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.77v. 1004 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.112. 1005 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.117.
1006 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.161.
1007 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.163v. 263
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adulta1008, o casal do Outeiro1009, o casal de Rio Satana, na aldeia de Quintã1010, ou o casal do Carvalho1011, ou da Quintã, na aldeia homónima1012. Ao mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, a sucessão ao prazo de um campo que era explorado em São Mamede de Valongo, a lutuosa consistia na entrega ao respectivo comendatário, de um cabrito, prática que se aplicava a outro meio campo nas proximidades do anterior1013. Quanto ao campo
de Campelo, em Valongo da Estrada, pelos avaliadores das apegações que foram feitas à viúva Catarina Antónia, foi dito que “se não declara aqui o que mande paguar”1014, o que pressupõe que a sucessão estaria isenta do pagamento da lutuosa.
Assim, e com base nas rendas, a lutuosa paga aos senhorios eclesiásticos no actual território de Valongo, podia ser constituída por cabazes diferentes, que incluíam a moeda, cereais, cera, mel, galináceos e em menor escala incorporar produtos manufacturados, os quais reflectem indubitavelmente a natureza e o carácter produtivo da gente que trabalhava e ocupava a terra agrícola e, em alguns casos, em complementaridade com a actividade moageira.
1.5 – Conflitualidade entre senhorios e os camponeses O território ocupado por inúmeros senhorios e por largas centenas de agricultores, apresenta, pela casuística, situações que são suficientemente esclarecedoras e porventura dramáticas para quem vivia da terra, mas que pelo seu estado de saúde, idade avançada ou incapacidade financeira deixava de ter possibilidade de cumprir os seus deveres enfiteuticos. Todos sabiam que o ilícito não compensaria para sempre. Muitos precaristas estavam ocultos, num ambiente cinzento e aí permaneceriam até ao fim da vida se a vigilância dos representantes e procuradores senhoriais fosse menos aper1008 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.166. 1009 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.188.
1010 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.192v. 1011 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.199.
1012 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.192v.
1013 ADP, Livro 2º das Notas e Prazos Antigos, K/26/9/1-274.1, fl.106. 1014 ADP, Livro 2º das Notas e Prazos Antigos, K/26/9/1-274.1, fl.122. 264
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tada. A posse fraudulenta podia durar anos, beneficiando de forma clara o infractor. O recurso judicial foi sempre um meio eficaz, através do qual os senhorios recuperavam os prédios sonegados ou ilegalmente ocupados, e estava implícita nos contratos. A concessão dos prédios obedece a um aparato técnico-jurídico idêntico e comum a todos os senhorios que tinham interesses fundiários no território valonguense e que no exercício da gestão patrimonial vigiavam, de perto, a titularidade e a ocupação dos prédios, evitando a fuga das rendas ou a transmissão ilícita do direito de ocupação dominial indirecta. De todos os casos que a documentação compulsada permite registar, parece ser o processo judicial movido pelo mosteiro de São Bento de Avé Maria contra João Gonçalves e mulher Maria Vicente, moradores em Valongo Susão, sobre a metade de uma quebrada que pertencia às profitendes beneditinas, que os possessores ocupavam sem qualquer escritura que lhes conferisse esse direito. Na verdade, em 23 de Junho de 1593, em Valongo da Estrada, na residência do ouvidor Francisco António, o juiz Cristóvão da Costa de Sá, estando em audiência compareceu, perante si, Gonçalo de Araújo, procurador das freiras beneditinas, acusando os agricultores referidos que possuíam a meia quebrada “sem titolo nem prazo semdo propriedade do dito mosteiro de São Bemto a qual lhe não querião larguar sem demanda”1015, requerendo, portanto, que o juiz os citasse. O interrogatório incidiu fundamentalmente nos seguintes aspectos: a quem os concessionários reconheciam por senhorio; a natureza jurídica da posse; que renda pagavam e se “tinhão duvida a largualla ao dito mosteiro ou aceitar prazo novo”1016. Sobre o senhorio, os
caseiros tinham um entendimento que apontava para o convento de Nossa Senhora do Carmo, da cidade de Coimbra, sendo a renda paga à igreja de São Mamede de Valongo, anexada ao mosteiro de Rio Tinto, no montante de cinco alqueires de trigo; se a interpretação senhorial fosse diferente, João Gonçalves pagaria o foro a quem fosse indicado mas recusava fazer novo contrato. Não obstante, as suas afirmações parecem terem sido corroboradas 1015 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.33v. 1016 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.33v. 265
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pelas escrituras que exibiu, não sendo, contudo, totalmente esclarecedor para o procurador das freiras de São Bento de Avé Maria do Porto. Neste processo judicial, o monacato fez-se representar pelo seu procurador Gonçalo de Araújo, que havia sido nomeado em 18 de Abril desse ano pelo colectivo feminino, formado pelas freiras D. Guiomar de Ataíde, abadessa, Isabel de Araújo, prioresa, Leonor Pimenta, subprioresa, Maria Brandoa de Araújo, freira “barreta”, Maria Monteira, Margarida Araújo e Antónia Borges1017. O libelo apresentado pelas autoras resume-se aos pontos seguintes: acção contra o mosteiro de Nossa Senhora da Graça1018, da cidade de
Coimbra, alegando, em sua defesa, a velha figura do direito consuetudinário que assenta no uso e no costume e que, portanto, as autoras dizem estar em posse antiga de metade da quebrada, reconhecendo, que os eremitas de Santo Agostinho da casa conimbricense eram senhorios da outra metade; que os réus sabiam mas que “fraudulentamemte e com maa fee emprazarão com os padres do dito mosteiro a parte dellas autoras juntamente com a dos ditos padres no prazo que os ditos padres lhes fizeram”1019; que os camponeses ocupavam indevidamente a metade da quebrada sem escritura válida, pois exibiram um diploma de emprazamento que englobava toda a propriedade rústica e que tal aconteceu porque os padres foram iludidos, e, de boa-fé, confiaram nos foreiros que se aproveitaram da ausência do senhorio, prejudicando as beneditinas portuenses. Este processo mostra, desde logo, que as apegações e visitações eram um instrumento eficaz para controlar o património e consolidar a presença senhorial, cujos prédios rurais confrontavam uns com os outros, de senhorios diferentes. Uma vez constituído arguido, João Gonçalves indicou o licenciado Gaspar Moreira, advogado da cidade do Porto para representar sua mulher Maria Vicente, em nome da qual o emprazamento antigo havia sido feito. O esclarecimento judicial passaria, no entender dos réus, pela audição dos padres carmelitas, no prazo previsto na lei. Desta feita, foi notificado 1017 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.36v.
1018 Sobre a Anexaçam da Igreja de Alffena ao Collegio de Nossa Senhora do Carmo, cf. MOREIRA, A. Domingos; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., pp.44-73. 1019 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.38. 266
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o frei Jerónimo de Cristo, reitor dos Carmelitas, dado que os agricultores valonguenses foram citados “porquanto trazião toda a quebrada da sua mão e posohião por vertude de hum prazo de tres vidas que della fizerão”1020. Decorridos os vinte dias processuais compareceu, na cidade do Porto, nas pousadas do juiz Cristóvão da Costa de Sá, frei Manuel, da Ordem do Carmo, em representação do seu reitor, defendendo a validade do prazo antigo, tendo, para o efeito, solicitado ao referido juiz que não admitisse a causa1021. Por sua vez, frei Manuel subestabeleceu Tomás Vaz, que tomou conhecimento dos autos em 28 de Julho, na Rua das Flores, pelo respectivo escrivão1022.
As averiguações judiciais parecem ter mostrado que a quebrada, em toda a sua plenitude, pertencia aos Carmelitas Descalços, que, por sua vez, dependia, por razões que o procurador Tomé Vaz não enfatizou nem o processo parece ter concluído, em termos claros e objectivos, à igreja de São Vicente de Alfena, cujos párocos estavam encarregados do seu povoamento e, por isso, os réus possuíam um emprazamento que lhes havia sido outorgado pela paroquial de São Vicente de Alfena, por volta de 15431023. Nesta
extensa e complexa trama judicial, parece que as beneditinas do mosteiro de Avé Maria da cidade do Porto não recuperaram a meia quebrada porque não havia nada para recuperar, pois não conseguiram provar o seu direito senhorial, continuando João Gonçalves e sua mulher Maria Vicente a pagar o foro como o faziam anteriormente, sem qualquer oposição. Não tendo ficado satisfeito, o procurador Gonçalo de Araújo iria reclamar a outra metade da quebrada à guarda dos foreiros Francisco Rodrigues e de sua mulher Maria Vicente, recorrendo a argumentos formais muito semelhantes. Pelas mesmas circunstâncias, o direito senhorial do prédio pertencia ao já referido mosteiro de Nossa Senhora da Graça de Coimbra, como reivindicava o licenciado Gaspar Moreira, advogado dos réus. Em representação dos Carmelitas apresentou-se, no Porto, frei Manuel dos Reis
1020 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.42v. 1021 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.44v. 1022 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.50. 1023 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.58. 267
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e que em seu nome e dos restantes frades “queria defemder os ditos reos”1024. Ficou também aqui provado que a quebrada pertencia à igreja de São Vicente de Alfena, e que fora alienada por uma escritura de emprazamento realizada em 1579 pelo pároco em funções nesta data, a um ascendente do réu, já falecido que, por sua vez, tinha nomeado o sucessor, estando actualmente ocupado por Belchior Gonçalves e mulher da qual pagavam a renda convencionada. O campo de “Aspera”, em Valongo da Estrada estava nas mãos de Belchior Gonçalves, sapateiro, e de sua mulher Maria Antónia. As diligências senhoriais concluíram que os possuidores precários do domínio útil não tinham qualquer escritura que os habilitasse à ocupação. Este campo pertencia à igreja de São Mamede da freguesia de Valongo. Apanhados em falta, e declarada a posse ilícita, os titulares, voluntariamente, encamparam o prédio, solicitando, em seguida, a sua renovação ou, em seu lugar, a outorga de um novo prazo em três vidas. Na mesma época, o procurador Gonçalo de Araújo insurgiu-se contra Duarte Gonçalves e mulher Antónia Gonçalves que ocupavam a leira da “Vallgua”, sem conhecimento senhorial. O procurador acusou os foreiros de terem comprado o título de posse da propriedade a Ana Pires, mulher viúva de Valongo Susão, e de seguida “a meteram em hum campo seu que he herdade sua o qual se chamava o campo de Vallgua e que da dita leira não pagão cousa allgũa de remda e pemsão ao dito mosteiro e a trazem sonegada”1025. Face à insistência do juiz Cristóvão da Costa de Sá, os arren-
datários recusaram-se a apresentar a escritura de compra e venda, porque não a possuíam, apesar de terem afirmado que haviam pago pela respectiva leira, mil e oitocentos réis, mantendo o foro de um frango que era entregue às beneditinas do Porto, conforme estava sujeita a vendedora1026. A compra, se tivesse sido efectivamente consumada, permitiria aos concessionários anexar a nova parcela ao campo de “Aspera”, propriedade reguengueira, na agra de “Valga”, que confrontava com o já referido Duarte Gonçalves e sua mulher Antónia Gonçalves. Feita a transacção, os compradores confessaram 1024 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.134v. 1025 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.81v. 1026 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.82. 268
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que “ouvirão dizer que [a leira] era propriedade da igreja de São Mamede de Vallomguo anexa ao mosteiro de Rio Tinto e que não tinhão outro titollo mais que a escritura de vemda”1027. Sempre que um arrendatário manifestava a intenção de alienar a posse do domínio útil de um prédio, em seu poder, era obrigado a participar primeiro ao senhorio que podia ou não exercer o direito de preferência, do “tanto por tanto”1028. Não querendo, o locatário podia vendê-lo, desde que sobre o valor
da transacção entregasse ao senhorio o valor correspondente ao laudémio1029 ou quarentena1030. No território do actual concelho de Valongo correspondia à “quinta parte do domínio”, expressão preferencialmente usada nos contratos de emprazamento efectuados pela abadessa do Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto: o “domínio que he devido”1031; metade de uma galinha e a quinta parte do valor da venda1032. Da análise feita pelo procurador, e da confissão dos agricultores valonguenses Duarte Gonçalves e sua mulher, concluiu-se que a venda havia sido ocultada da abadessa D. Guiomar de Ataíde e seu Capítulo, lesando as freiras, pelo menos em trezentos e sessenta réis. Duarte Gonçalves e sua mulher acabaram por renunciar publicamente a posse do prédio, na presença das testemunhas Belchior Monteiro, porteiro do Tombo, Amador Dias, almocreve, domiciliado em Valongo, e Jorge Anes, residente na vila de Arganil1033. Aproveitando a bonomia beneditina e antes que fossem descobertos, os mesmos camponeses devolveram, por renúncia, uma pequena parcela de terra de 1.1 x 0.55 m “dos pasais da igreja de São Mamede de Vallomguo que amda fora deles”1034, sem escritura, dos quais não pagavam qualquer foro. Não tendo manifestado interesse em continuar a usufruir do prédio rústico restituíram-no ao senhorio, por intermédio do procurador Gonçalo de Araújo1035. 1027 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.82.
1028 BARROS, Henrique da Gama (1945) – ob. cit., Tomo VIII, p.204.
1029 AMARAL, Luís Carlos (1997) – São Salvador de Grijó na segunda metade do século XIV. Estudo de gestão agrária. Lisboa: Edições Cosmos, p.77. 1030 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.287-291.
1031 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.65V. 1032 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.112.
1033 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.82v. 1034 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.83v. 1035 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.83v. 269
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Em 1748, o cabido da Sé do Porto impôs, a Manuel da Rocha, que tomou a posse de um meio casal do Escoural, e que se pretendesse alienar o seu domínio útil pagaria 25% do valor da venda declarado1036. Quando, em meados do século XVIII, os cónegos da Sé do Porto visitaram os seus domínios rurais, em São Mamede de Valongo, ao procederem à averiguação que atestaria a legitimação da posse de meio casal também no Escoural, por altura do falecimento de Francisco da Rocha, ao tempo, a derradeira vida do respectivo prazo, o mesmo prédio foi encabeçado por Ana João, viúva do anterior possessor. O Cabido, tendo conhecimento desta artimanha “teve serto ser nullo e de nenhum vigor”1037, negando, assim, a titularidade da
viúva, optando por entregá-la a Manuel da Rocha, filho do defunto “não só por lhe pertencer conforme a direito mas também por apprezentar escriptura de doação pura e irrevogável da viúva sua mai Domingas Anna João”1038. A viúva foi demitida e a transmissão do domínio útil passou para Manuel da Rocha. Este processo trouxe a São Mamede de Valongo o louvado Manuel Ferreira da Silva, e os apegadores reverendo Miguel da Costa Lima de Melo, tesoureiro-mor da Sé do Porto, João de Sousa Lima Alcoforado, arcediago da Régua que propuseram um aumento de 27% de renda em dinheiro, e uma galinha1039.
O elevado valor exigido pelos senhorios tinha como objectivo fixar os agricultores aos prédios rurais e incentivá-los a introduzir benfeitorias para valorizar as propriedades. Apesar de ser uma prática corrente, o certo é que no território do actual concelho de Valongo, muitos camponeses vendiam o seu direito de posse por razões que os diplomas tabeliónicos não registaram, auferindo com estas movimentações de titulares, rendimentos muito vantajosos, mesmo suportando o direito do “domínio”, recuperando algum dinheiro para ajudar à sobrevivência nos últimos anos de vida e na velhice.
1036 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.230. 1037 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.223. 1038 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.223. 1039 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.227. 270
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Aspecto da vida rural na freguesia de Santo André de Sobrado. Fonte: Fundo C.M.V.
2 – O património arquitectónico edificado 2.1 – A casa de morada do camponês valonguense e suas dependências De um modo geral torna-se muito difícil definir, com precisão, qual era o espaço efectivamente ocupado pela família dos camponeses ao longo da Idade Média e Idade Moderna, fora dos perímetros urbanos. Conhecem-se muitos dos seus aspectos, mas no domínio da construção habitacional ou corrente predomina um certo estádio “isotérico”1040. A habitação do mundo
rural é tão singular como os seus residentes; cada indivíduo pugna por um espaço específico, próprio pouco repetível o que dá, à paisagem arquitectónica uma nota única, dispersa no meio das propriedades agrícolas que servem de base à estrutura familiar do camponês. No território do actual concelho de Valongo, nomeadamente nas freguesias de São Vicente de Alfena, e na de São Mamede de Valongo, existem ainda construções ou ruínas ergológicas de habitações de antanho, construídas sob a técnica do “telhão”, utilizando restos de ardósia e de xisto, que eram duas matérias-primas abundantes.
1040 FERRIEIRA, Maria da Conceição (2000/2001) – «Habitação urbana corrente no Norte de Portugal medievo», in Morar. Tipologia, funções e quotidianos da habitação medieval. Ponta Delgada, n.3/4, p.13. 271
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Uma casa construída com pequenos fragmentos de ardósia na freguesia de São Martinho do Campo. Fonte: M.M.V.
Esta realidade verificava-se um pouco por todo o País, embora em alguns locais seja possível descodificar uma “certa homogeneidade construtiva”. Os agricultores que dependiam das freiras do Mosteiro de Santos habitavam casas em diferentes freguesias da capital do Reino muito simples, maioritariamente compostas de uma casa dianteira; em menor grau, os mais abastados tinham moradas formadas pela casa dianteira e uma câmara1041. Em Trás-os-Montes, a situação era idêntica1042. No concelho de Baião, o panorama do património edificado para fins habitacionais, é em tudo semelhante àqueles que encontramos para outras partes do território nacional é em tudo idêntico1043. A historiografia moderna que se dedica a este tema reconhece a dificuldade para catalogar a habitação sobretudo em ambiente rural, tanto mais que a linguagem formal, típica dos tabeliães que redigiam os contratos enfiteuticos, dos procuradores senhoriais que nas Apegações e Visitações empregavam indistintamente os termos “casa”, “casas” sobre o mesmo tipo de 1041 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.271-284.
1042 CONDE, Manuel Sílvio Alves (2011) – Construir, habitar: a casa medieval portuguesa. Braga: CITCEM – Centro de Investigação Transdisciplinar “Cultura, Espaço e Memória “, pp.17-68.
1043 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – Baião em torno do ano 1500. Coleção em torno de Baião: contributos para a História Económica e Social de Baião, coord. Lino Tavares Dias. Município de Baião/ Caleidoscópio, p.77. 272
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prédios, e daí que a “casa” seja considerado um termo polissémico1044, pela simples razão de traduzir um vasto leque de situações construtivas. A casa, qualquer que tenha sido a sua tipologia compartimental, térrea, de dois pisos e, mais dificilmente com outra verticalidade, era sempre a expressão material da família, uma comunidade de pessoas que viviam juntas1045, visivelmente assente nos critérios da comensalidade ou no da
co-residência1046. Num sentido mais restrito, a casa abrigava uma família nuclear mas em sentido mais abrangente, menos comum, podia assumir um sentido polivalente1047, protegendo várias famílias ou membros familiares que ficavam viúvos, doentes ou celibatários ou outros que sendo casados comungavam, em conjunto, do mesmo espaço habitacional, dando origem a habitats familiares muito alargados e pouco vulgares. No século XVI encontramos imensos casos denunciados pelo procurador do cabido da Sé do Porto, aquando da visitação realizada para proceder à inventariação dos chamados Votos de Santiago1048. O emprego e o uso do termo “casa” traduzia uma certa indisciplina formal na literatura jurídica e interna dos agentes senhoriais, e pela análise documental podemos concluir que quando utilizado no singular parece querer referir-se à casa de habitação1049. Por outro lado, esta dupla desig-
nação poderá querer corresponder, em certos locais a um imóvel composto por várias dependências1050, realidade que no território do actual concelho de Valongo está completamente definida para a grande maioria dos imóveis. 1044 BEIRANTE, Maria Ângela da Rocha (1995) – Évora na Idade Média. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian / Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, p.121.
1045 FONSECA, Luís Adão (1989) – La Cristandad Medieval (segunda reimpresión). Pamplona: Ediciones Universidad de Navarra, p.121.
1046 DURÃES, Margarida (1987) – «Herdeiros e não herdeiros. Nupcialidade e celibato no contexto da propriedade enfiteutica», in Revista de História Económica e Social, n.º 21. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, p.53. 1047 FERREIRA, Maria da Conceição (1989) – «Uma contenda entre o cabido de Santo Estêvão de Valença e os lavradores de Afife e Vila Meã (1509)», in Revista de Ciências Históricas Universidade Portucalense Infante D. Henrique, vol. IV. Porto, p.229. 1048 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – ob. cit., pp.204-214.
1049 AMARAL, Luís Carlos (1994) – São Salvador de Grijó na segunda metade do século XIV. Lisboa: Edições Cosmos, p.40.
1050 RODRIGUES, Ana Maria Seabra de Almeida (1995) – Torres Vedras. A vila e o termo em finais da Idade Média. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, p.156. 273
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A ruralidade do território valonguense que, em última análise, ficava nos confins do concelho da Maia e parte do extinto concelho de Aguiar de Sousa, caracterizava-se por uma forte dispersão, da qual resultou, pois, um profundo e difuso perfil construtivo, desde a situação mais simples da mono-construção à mais complexa que abrange diferentes edifícios cuja funcionalidade estava quase sempre adequada ao termo que o designava: celeiro, adega, eira, palheiro, aido ou corte. Em finais do século XVI, o licenciado Cristóvão de Costa de Sá, cidadão da cidade do Porto, juiz do Tombo dos bens, propriedades que pertenciam ao mosteiro de São Cristóvão de Rio Tinto, que havia sido incorporado no mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, em 15301051, procedeu ao levantamento de todo o património monacal representou uma interessante viagem rural nas freguesias de São Mamede de Valongo, Santo André de Sobrado e São Martinho do Campo, deixando o registo predial construído e das propriedades agrícolas que constituíam os casais.
Como era hábito, nestas circunstâncias, a inquirição começava, invariavelmente pela visita ao pároco e à igreja de São Mamede de Valongo. A residência do vigário Cristóvão Dias tinha foros de uma verdadeira casa de habitação urbana. Era sobradada, isto é, de dois pisos, possivelmente construída em granito trazido eventualmente da zona de Paredes e de Penafiel. O telhado era coberto de telha vã, assente sobre ripas1052 suportadas por traves;
internamente era composta por diversos compartimentos: “hũa sala e três camaras”1053, que hoje designamos por quartos e “hũa cozinha com sua logea por baixo”1054, ou seja, uma adega e duas estrebarias; no fundo deste edifício havia uma varanda, já velha, que dava para a igreja; os compartimentos estavam divididos internamente por paredes de taipa1055, procedimento muito comum em diferentes zonas do país. Sem dúvida, que a descrição que ficou registada sobre os materiais utilizados no edifício residencial do vigário, 1051 SOUSA, Bernardo Vasconcelos (dir.) (2006) – Ordens Religiosas em Portugal: Das origens a Trento – Guia Histórico. Lisboa: Livros Horizonte, p.79.
1052 CONDE, Manuel Sílvio Alves (1996) – Tomar Medieval. O espaço e os homens. Cascais: Patrimónia, p.121.
1053 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls. 4-4v. 1054 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.4v. 1055 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.4, 274
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mostra que, este, era, para todos os efeitos, “a última manifestação da diferenciação social”1056. Este complexo estava murado em pedra; circundando o edifício havia uma área descoberta com duas laranjeiras, duas ramadas pequenas, um castanheiro, um pessegueiro, uma ameixoeira; além deste espaço, o vigário Cristóvão Dias podia disfrutar de um outro espaço que servia de horta que também tinha algumas árvores de fruto1057; este recinto amplo era completado pelos “passais da igreja todos tapados em redor de parede”1058. Pertencia também à igreja de São Mamede de Valongo, uma outra casa situada na Rua Direita de Valongo, que funcionava como celeiro destinado à recolha dos dízimos; no seu interior tinha duas tulhas de tabuado1059, para acondicionar os cereais entregues pelos precaristas da freguesia.
Quando os inquiridores procediam ao levantamento do património cenobítico dos casais, a realidade habitacional, e do conforto familiar era bem diferente daquele ambiente que rodeava o vigário. A família do concessionário Sebastião Álvares e sua mulher Catarina Antónia, que morava no casal do Agro, em São Mamede de Valongo, repartido com outros camponeses, vivia apenas numa casa terreira designada de cozinha1060, que era o único
espaço coberto, telhado, onde se desenrolava toda a vida deste núcleo familiar, onde os seus membros comiam, dormiam e aguardavam pela chegada do novo dia de trabalho. Ao contrário, o ferreiro Francisco Gonçalves, que partilhava com o precarista anterior o mesmo casal, vivia muito mais desafogadamente, em seis casas de um só piso e cobertas a colmo: duas destinadas ao recolhimento e cativeiro de gado, um palheiro, a morada do ferreiro e sua mulher Catarina Antónia e uma outra dependência isolada em que “se aguasalha Isabel Fernandes cabaneira”1061. Comum, a todas elas, havia um terreiro de esterqueira, patente em grande número de espaços familiares.
1056 LE GOFF, Jacques (1989) – A Civilização do Ocidente Medieval, vol. II. Lisboa: Editorial Estampa, p.125. 1057 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.4v. 1058 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.4v. 1059 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.5.
1060 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.13v. 1061 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.14 275
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O casal do Vale, pertença da igreja de São Mamede de Valongo estava, nos finais do século XVI, ocupado pelos enfiteutas Gaspar Gonçalves, viúvo, Domingos Gonçalves e sua mulher Catarina Gonçalves, provavelmente familiares do primeiro. A habitação, porém, não era comum aos dois grupos familiares. Ao primeiro pertencia um palheiro térreo coberto por colmo em apenas metade da sua extensão, já que a outra metade servia de cozinha e era telhada1062; é possível que tanto a cozinha como o celeiro servissem de espaço de dormida, situação frequente em diversas explorações agrícolas. A complementar o grupo ergológico havia um aido colmado; sem outra indicação o concessionário Gaspar Fernandes dera conta de que havia ainda um alpendre coberto que servia “de recolher nelle seus carros e outras cousas”1063, numa clara alusão ao transporte carrário utilizado na lavoura de treze parcelas agrícolas entre campos e leiras. No mesmo local, Domingos Gonçalves e mulher Catarina Martins desfrutava de uma casa terreira, coberta de telha vã, que funcionava simultaneamente como cozinha e celeiro; sobre a entrada havia um alpendre igualmente coberto1064, dando à habitação um aspecto mais formal e identificador do lugar de morada destes camponeses; criavam diversos animais em cativeiro pela referência a uma “casa” colmada para o gado e uma corte para a criação de gado porcino1065.
Semeador tradicional (Susão, Valongo). Fonte: M.M.V. 1062 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.20. 1063 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.20. 1064 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.22. 1065 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.22. 276
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No mesmo lugar, havia um outro “casal da Valle” que era lavrado por duas famílias: Gonçalo Fernandes e mulher Catarina Fernandes, e Francisco Fernandes e Maria Fernandes, sua mulher. Cada uma delas vivia em prédios próprios cuja constituição é diferente entre si. A primeira tinha em seu poder uma casa de tipo binário1066, formada por um edifício horizontal, de um só piso, telhado, destinado a cozinha e a celeiro1067; complementava este grupo habitacional e de recolha de cereais, uma casa chã, colmada que servia de curral; fechava este recinto uma eira com seu alpendre aberto e de cobertura frágil que “serve do serviço dela”1068. O segundo titular construiu, herdou ou melhorou edifícios distintos: uma cozinha colmada, de um só piso; uma corte para gado junto desta; uma casa separada destinada ao celeiro, e outra usada como aido e uma corte para a criação de suínos1069. O casal da Estrada de Valongo foi repartido por diversos sucessores em partes distintas. A Maria Gonçalves, viúva, nora de Margarida Anes coube dois terços das propriedades distintas que faziam parte unidade familiar, fiscal e tributária. Fugindo à regra de casa térrea, chã, de um só piso, a casa onde vivia a enfiteuta desafiava timidamente a verticalidade arquitectónica, formando uma habitação em degrau: metade era sobradada e coberta de telha e a outra térrea destinada ao recolhimento de duas mulheres viúvas: Maria Gonçalves e a sogra Margarida Anes1070; criavam gado para o seu
sustento em três dependências colmadas; havia ainda um palheiro que, no seu interior, escondia um lagar1071, aspecto que não é registado em qualquer outro assento, uma vez que a vinha é, nos finais da Idade Média, uma actividade escassa neste território. Não existindo a cozinha, é bem provável que a casa baixa, arrematada em duas águas tenha servido de espaço de comensalidade e de dormida de André Pires e mulher Graça Gonçalves que possuíam o casal das Casas de Baixo, em Valongo; mesmo assim, não sendo de grandes dimensões usufruía
1066 BEIRANTE, Maria Ângela Rocha (1995) – ob. cit., p.121.
1067 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.28. 1068 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.28. 1069 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.30. 1070 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.66. 1071 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.66. 277
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de apenas dois terços, uma vez que a outra parte era habitada por seu cunhado, António Gonçalves e sua mulher Catarina Dias1072. Na aldeia de Valongo Susão, no casal da Poça, o camponês Gonçalo Gonçalves e mulher Maria Pires, declararam ao juiz Cristóvão da Costa de Sá e a Gonçalo de Araújo, procurador das propriedades do hábito beneditino que explorava cerca de trinta parcelas de terra, declarou que o núcleo construtivo era constituído por vários corpos1073. Uma casa mista1074, térrea,
coberta de telha repartida entre cozinha e celeiro, na porta da qual havia uma sacada também coberta de telha; uma corte com dupla função: “serve de corte a ametade della e a outra ametade de despejo da casa”1075; outro elemento edificado para o gado miúdo, e uma casa, igualmente de um só piso, coberta a colmo dividida a meio por uma parede: “hũa [parte] tem hum tear e a outra serve de despejo”1076. Junto da eira tem um palheiro colmado de apoio às tarefas cerealíferas e outras actividades agrícolas desenroladas na eira1077.
Este núcleo construtivo forma um corpo constituído por cinco partes, onde Gonçalo Gonçalves e sua mulher Maria Pires ocupam parte do seu tempo útil, na secagem, debulha, fiação e criação de animais para consumo da casa, comem e dormem, na cozinha ou celeiro, na ausência de uma ou mais câmaras, privilégio que apenas gozava Cristóvão Dias, vigário da igreja de São Mamede de Valongo. Ligava este conjunto arquitectónico simples, os terrenos e as esterqueiras, comuns a outros perímetros habitacionais, onde uma família, os seus animais de corte e os produtos da terra se encontram sob o olhar prudencial do peão. Sob a designação de Casal da Poça, na mesma aldeia de Susão Valongo, que não é aquele que foi referido anteriormente, havia um conjunto de vinte e seis prédios agrícolas dispersos, explorados precariamente por dois grupos familiares encabeçados por Pedro Dias e mulher, e por Adão Brás e sua 1072 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.75 -78.
1073 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – A Sociedade medieval portuguesa. Aspectos da vida quotidiana, 5ª edição. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, p.64.
1074 BEIRANTE, Maria Ângela da Rocha – ob. cit., p. 121.
1075 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.90. 1076 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.91. 1077 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.91. 278
Joel Silva Ferreira Mata
mulher Antónia João, respectivamente. Cada lavrador explorava um grupo de terras diferentes, e de aptidões que permitiam complementar a produção tendo sempre em vista o pagamento das rendas previamente fixadas e que independentemente das características do ano agrícola, eram obrigados a entregar nas instalações do senhorio sob o olhar dos rendeiros que, sem contemplação, exigiam os montantes em trigo, pão meado e dois galináceos.
A policultura nas proximidades do Rio Ferreira, São Martinho do Campo. Fonte: M.M.V.
O ocupante do maior número de parcelas, curiosamente expressa uma maior singeleza habitacional que poderá ser também apanágio de um maior grau de pobreza do que o outro co-titular. Vive numa casa chã, colmada, com a família, onde come e dorme; está rodeada, em parte, por um terreiro de esterqueira1078, formando o corpo mais simples de natureza bicelular1079. O seu co-titular, explorando muito menos parcelas, sem considerarmos as respectivas áreas, que são omitidas, impõe na paisagem agrária o seu sítio, cujo corpo pluricelular1080, ou tri-construtivo é formado por cozinha, corte e palheiro, abertos para um terreiro de esterqueira1081.
1078 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.96. 1079 CONDE, Manuel Sílvio Alves (2011) – ob. cit., p.21. 1080 CONDE, Manuel Sílvio Alves (2011) – ob. cit., p.31.
1081 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.99. 279
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Num certo casal da Vale, no lugar de Valongo, repartido por três grupos de possessores, explorando cada um, campos e leiras de forma autónoma, é singular quanto ao património edificado. O primeiro lavrador, André Gonçalves e sua mulher Catarina Pires declararam possuir uma casa tipo binário formada por cozinha e celeiro, acrescentando uma corte para o seu gado, dando os dois blocos construtivos para um terreiro comum de esterqueira1082. O segundo grupo era formado pela viúva Justa Fernandes e o terceiro estava a cargo de Afonso António e mulher Margarida Fernandes. Na inquirição efectuada pelo licenciado Cristóvão da Costa de Sá, o concessionário declarou não habitar no terço do casal, por viver em Valongo (da Estrada), o mesmo acontecendo com o terceiro co-titular que residia na aldeia da Pícua, da freguesia de Águas Santas, que cultivava apenas a leira na Agra da Serra, um campo na Agra dos Galegos, e uma terra de reduzidas dimensões1083, que ainda não havia sido objecto de arroteamento. Quadro n.º 23 – Lavradores de Valongo (1589-1600) Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1589
Gonçalo Rodrigues
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl. 4v
1589
António Gonçalves
Catarina Pires
Na Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 4v
1589
Duarte Gonçalves
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl. 5
1590
António Gonçalves
Catarina Fernandes
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 6v
1590
António Martins
Isabel Martins
Rua de Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 7
1591
Adão Gonçalves
Ana André
Rua Velha
ADP, E/27/6/12.3, fl. 9
1591
António Gonçalves
Catarina Fernandes
Susão
ADP,E/27/6/1-2.3, fl. [10v]
1591
Francisco Rodrigues
Maria Vicente
Valongo Susão, em Cima de Vila
ADP, E/27/6/12.3, fl. 11v
1592
Pero Anes
Vitorina Gonçalves
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 13
1592
André Dias
Graça Gonçalves
Rua Velha
ADP, E/27/6/12.3, fl. 15
1082 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.114.
1083 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.118v-119v. 280
Joel Silva Ferreira Mata
Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1592
Gaspar Duarte
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl.15v
1593
João Gonçalves
Isabel Afonso
Lugar de Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl.16v
1593
Bartolomeu Gonçalves
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl.16v
1593
António Gonçalves
Catarina Pires
Moradores na Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 17
1593
João Alvares do Souto
Justa Martins
Rua de Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 17v
1593
António Gonçalves
Joana Dias
Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 17v
1593
Bartolomeu Gonçalves
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl. 18
1593
André Dias
Graça Gonçalves
Rua Velha
ADP, E/27/6/12.3, fl. 18
1593
Bartolomeu Gonçalves,
Antónia João
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 19
1594
João Martins
Maria Antónia
Rua de Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 20v
1594
António Martins
Isabel Martins
Rua de Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 20v
1594
Sebastião Álvares
—
—
ADP, E/27/6/12.3, fl. 21v
1597
João Martins
Maria Antónia
Rua de Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 32
1598
João Frutuoso
Francisca Marques
Abaixo da igreja
ADP, E/27/6/12.3, fl. 33v
1600
Gaspar Frutuoso
Francisca Marcos
—
ADP, E/27/6/12.3, fl. 38
Na freguesia de São Martinho do Campo a paisagem arquitectónica do mundo rural era em tudo semelhante à realidade que observamos em Valongo da Estrada, e de Valongo-Susão. As condições em que os agricultores, dependentes dos senhorios, viviam, moravam e trabalhavam, pautavam-se pela mesma ideia fixa traduzida na ligação através de laços enfiteuticos, dando ao precarista, pobre, sem meios, uma oportunidade de subsistência, pelo rasgar a terra e colher pelo seu trabalho maioritariamente braçal e sem descanso, os proventos para a sua subsistência e enriquecimento do respectivo senhor, que lhe cede em regra, por três gerações, o domínio útil de um certo número 281
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de prédios agrícolas, que tanto podem estar próximos uns dos outros como podem distanciar-se do lugar de repouso, do assentamento de morada, obrigando o camponês a deslocações constantes, ao desgaste carrário e ao cansaço dos animais de carga. No casal do Rio, em São Martinho do Campo, a sua exploração estava distribuída a diversos agentes agrícolas: Gonçalo Rodrigues e mulher Graça André; Anes Gonçalves e Francisca André, filha que foi nomeada para encabeçar o prazo titulado por seu pai André Anes. Na circunstância, Gonçalo Rodrigues declarou um assentamento pluricelular: cozinha, celeiro e palheiro que funcionava como estrebaria para animais de tiro ou uso nas tarefas agrícolas; uma casa para acomodar os bois, e um aido, interligado por um terreiro de esterqueira1084. Na sequência da inquirição instruída pelo juiz Cristóvão da Costa de Sá, surge um outro agricultor Lucas Gonçalves e sua mulher Francisca André que apresentam um sítio de morada ligeiramente diferente, horizontal e porventura mais rico. A casa onde vivem sobressai na paisagem por se elevar a dois pisos, sobradada, e coberta por telha assente sobre ripado que repousa em vigas de madeira; uma casa destinada unicamente à confecção de alimentos, e de trabalhos de Inverno; duas casas individualizadas para acomodarem o gado e uma horta, tudo ligado por um terreiro de esterqueira pisado pelo gado, tendo sob a sua responsabilidade cerca de vinte terras para cultivar, que correspondiam apenas a um quarto da totalidade do casal, e que aqui é mencionado como o titular da segunda geração, conforme uma escritura realizada pelo tabelião Rui de Couros1085. Um outro quarto deste casal
estava na posse de Maria e de sua irmã Catarina, filhas órfãs de André Anes “as quaes diserão ser maiores de vimte e cimquo annos e amancipadas”1086; habitavam uma casa baixa e binária entre cozinha e o celeiro, cuja porta de acesso tinha um alpendre; junto, havia uma outra casa térrea “que serve de ovelhas”1087, todas ligadas pela respectiva esterqueira.
Continuando o percurso pela freguesia de São Martinho do Campo, veio à mesa do juiz Cristóvão da Costa de Sá, o peão Gonçalo Afonso e 1084 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.158.
1085 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.161- 163v. 1086 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.164. 1087 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.164. 282
Joel Silva Ferreira Mata
sua mulher para reconhecerem o “direito” senhorio e identificar todas as propriedades que trabalhavam, exibindo, para o efeito a escritura de posse e do casal de Lima na aldeia de São Gemil. Pela descrição e confissão que fez à comissão que procedia à diligência, o foreiro cozinhava num prédio separado do celeiro, podendo dormir num outro, sendo o mais provável, pelo menos no Inverno, optar pela cozinha, aquecida pelo fogo; criavam gado em cativeiro e recolhiam a palha num outro edifício separado. A esterqueira era o elo que dava uma certa unidade ao ambiente residencial e familiar1088. A viúva Maria Gonçalves que vivia na companhia de seu filho João Bartolomeu e sua mulher Inês Duarte possuía, os três, o casal do Outeiro, na aldeia homónima na referida freguesia; viviam em casas separadas, térreas, colmadas, tendo junto o celeiro, o palheiro e uma outra casa destinada à recolha do gado vacum1089; uma corte para guardar as ovelhas, um aido para gado de outra natureza e uma casa “que serve de guado meudo”1090.
O casal do Moleiro, na aldeia da Quintã, em São Martinho do Campo, na posse de Santos Afonso e de sua mulher Maria Gonçalves, apresentava um assentamento habitacional muito completo e diversificado, construído na horizontalidade e formado por um corpo de oito elementos distintos: o celeiro, telhado; uma casa de apoio à eira; uma casa colmada, um aido, uma corte para ovelhas, outra para a criação de suínos, um palheiro e uma eira1091
comum a todos os compartimentos individualizados, em vez do tradicional terreiro destinado à produção de estrume. O camponês explora cerca de vinte parcelas de lavoura. No campo da Goiva, que é banhado pelo rio Ferreira, o foreiro Santos Afonso produz trigo e outros cereais que são triturados num moinho aí existente1092.
Morador no casal do Outeiro, na mesma aldeia, o arrendatário António Gonçalves e sua mulher compareceram em Valongo da Estrada, nas casas de morada do ouvidor Francisco António, e declararam que viviam no referido casal num imóvel de um só piso, em duas águas coberta a colmo, “com hum 1088 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.170. 1089 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.174.
1090 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.175-175v. 1091 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.180.
1092 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.180-183v. 283
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
repartimento pelo meo que a devide em duas hũa serve de cozinha outra de seleiro”1093; tem mais duas casas separadas para o gado, um palheiro e seus terreiros de esterqueiras1094. Percorrendo a aldeia da Quintã, pode mencionar-se também o casal de Rio Satana, na posse de João Gonçalves e sua mulher Isabel Gonçalves, por compra do domínio útil a Inês Anes e a seu marido Francisco André1095;
o respectivo assentamento tinha as seguintes dependências autónomas: cozinha, celeiro, corte para os bois e um terreiro de esterqueira1096. A estrutura patrimonial do casal do Carvalho, na mesma aldeia, ocupado por Alexandre Dias, viúvo, era mais abastado. Morava sozinho numa casa chã, telhada próxima da casa com as mesmas características ergológicas, de Amador Manuel, seu genro, por sua vez, na vizinhança de Domingos Afonso, também seu genro; tinha uma cozinha anexa à sua casa de dormida, uma casa para as ovelhas, um aido e outras três dependências construtivas, em banda, igualmente destinadas à criação e recolha de gado não especificado, uma estrebaria e uma outra casa telhada “que serve despejos”1097.
Na aldeia de São Gemil, no casal do Outeiro do Cortinhal d´Além que andava nas mãos de Gonçalo Fernandes e mulher Domingas Gonçalves, a tipologia construtiva não fugia à regra: celeiro, cozinha, estrebaria, corte e uma eira. Os ocupantes não exibiram qualquer escritura que lhe conferisse a ocupação “por lhes fiquar de seus amtecessores que o posohião”1098 , embora
o direito enfiteutico determinasse que a transmissão só podia ocorrer desde que fosse indicada a sucessão por escritura de nomeação ao respectivo prazo. Na aldeia de Póvoas, na freguesia de São Martinho do Campo, o casal das Póvoas mais pequeno na sua constituição quanto ao número de parcelas agrícolas, é ocupado por Domingos Gonçalves e mulher Isabel Francisca, apresentava em finais do século XVI uma estrutura habitacional constituída por um corpo policelular formado pelos seguintes casas independentes:
1093 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.187.
1094 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.187v. 1095 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.192. 1096 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.190.
1097 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.197-197v. 1098 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.204v. 284
Joel Silva Ferreira Mata
cozinha, palheiro, corte celeiro e uma eira. Acrescenta-se ainda uma ramada à porta do celeiro e junto da cozinha uma horta circundada por uma parede1099, protegendo-a dos animais que facilmente podiam danificá-la e destruí-la. Os foros não contemplam qualquer quota alíquota (quantidade certa e constante) ou parciária em vinho ou produtos verdes. Ainda nesta freguesia foi identificado o casal da Quintã, na posse do arrendatário Amador Martins e sua mulher Margarida Manuel, constituído por um celeiro, cozinha, palheiro, quatro cortes, um aido e os terreiros de esterqueira1100. A organização rural era assim moldada pela mão do agri-
cultor que exercia outras actividades como a de construtor da sua própria casa e dependências. A sobrevivência deste camponês como a de tantos outros dependia da exploração do espaço enfiteutico numa dimensão agro-pecuária, sobressaindo a criação de gado lanígero e bovino tão necessária para a alimentação directa, para a venda e utilização nos trabalhos pesados da agricultura, puxando o arado para lavrar e o carro para o transporte do estrume das esterqueiras até aos campos, a lenha para casa e os cereais para a eira.
À medida que passamos da Idade Média para a Idade Moderna e Contemporânea, o património construído em São Mamede de Valongo altera-se, apresentando em certos casos, os sinais dos tempos pela utilização e combinação dos materiais de construção que visam trazer uma maior solidez aos edifícios, uma operacionalidade mais qualificada e um estética que o mundo rural não estava habituado. Valongo apresenta, assim, algum inconformismo pelas suas manifestações arquitectónicas. É claro que a casa baixa, térrea, implantada sob uma matriz plana, horizontal continuará a ser predominante. Todavia no casal do Escoural, nesta freguesia, em 1662, que era explorado indirectamente por Maria Francisca, a freira, por alcunha, viúva de Manuel Ribeiro, existia uma construção rectangular com uma área aproximada de 57 m2, que era suficiente para aconchegar a viúva com todos
os seus haveres1101. Um outro casal, também no Escoural, era ocupado por Ana João, 1743, entretanto nomeada à sucessão do prazo por um testamento 1099 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.206. 1100 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.210.
1101 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.198. 285
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
lavrado por Francisco da Rocha, seu defunto marido1102. No entanto, morava numa casa sobradada, de dois pisos, estando o rés-do-chão destinado a estrebaria. Este edifício era de forma rectangular e ocupava 82 m2 de área bruta1103; no campo do Bacelo com uma área de 5 663 m2, um rectângulo cujo comprimento era três vezes superior à largura, Ana João possuía uma eira, um palheiro uma horta1104, e uma outra dependência destinada a palheiro, coberto de telha, no campo das Vales, propriedade muito estreita, de perfil irregular. Ao contrário das construções anteriores caracterizadas por um corpo que congregava todas as células, nesta unidade agrícola, as casas estavam dispersas e em parcelas diferentes do mesmo casal. Em 1745, a apegação efectuada ao meio casal do Escoural que estava a ser agricultado pelo caseiro António João e por sua mulher Ana Ribeira, e que entretanto havia vagado por morte de Manuel Ribeiro, foi sujeito a uma vedoria levada a cabo pelos cónegos da Sé do Porto, Diogo Pereira e Francisco Botelho, em representação do Cabido, e dos louvados António António Ribeiro, morador em Valongo, em nome do foreiro, e de Manuel Ferreira, torneiro, domiciliado na cidade do Porto. Os representantes senhoriais e do precarista visitaram e mediram todas as propriedades rurais, incluindo a casa de morada que, segundo a inquirição então produzida e não contestada pelas partes, havia sido, no passado, uma casa terreira de um piso apenas, e que agora era um prédio de dois pisos, telhado e sito na Rua do Largo, no lugar de Valongo, de forma rectangular, que permitia ocupar uma área bruta aproximada de 58 m2, por piso1105.
1102 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fls.207v-208. 1103 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.208. 1104 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.208. 1105 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.215. 286
Joel Silva Ferreira Mata
Uma casa sobradada da aldeia do Couce (Valongo). Fonte: M.M.V
Do meio casal do Vale, na mesma freguesia, que estava na posse de Manuel Dias Lopes, neto de Domingos Dias Lopes, os louvados Manuel Gonçalves Tavares – morador em São Martinho de Cedofeita, da cidade do Porto, escolhido pelos cónegos da Sé portuense Domingos Ribeiro Nunes e Martinho Lopes de Morais Alão –, e Domingos Carvalho, lavrador, residente em Valongo da Estrada, como seu vedor, identificaram o respectivo património construído: várias casas baixas e outras de dois pisos, cobertas em telha, com sua cozinha e duas janelas totalizando a área bruta de 161 m2 aproximadamente1106, manifestando-se aqui uma maior fenestação e arejamento da área ocupada do que em todos os prédios analisados contavam apenas com a porta como sendo a sua única abertura: acesso, renovação do ar, arejamento e saída directa do fumo. O neto de Francisco da Rocha partilhava o meio casal do Escoural em 1748, mas não tinha casas de habitação; possuía, no entanto, no campo do 1106 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.221. 287
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Bacelo uma eira e um palheiro anexo1107. No prazo da Quebrada de Vale de Barreiros, em Valongo, o auto de medição, confrontação e apegação feito à enfiteuta Rita Luís, viúva de Silvério Joaquim, a seu pedido, apresentava em 1830, sob a designação geral de casas térreas e outras sobradas num complexo construtivo rectangular de 15.4 x 10.5 m, numa área aproximada de 161 m2 que foi levantado de novo, com três portais. No sobrado foi aberta uma janela, uma varanda de ferro e uma sacada no meio. Esta abertura central tinha, de ambos os lados, uma outra janela que sobressaía da fachada pela inclusão de um peitoril; a entrada fazia-se pelo lado norte. A posse deste imóvel estava nas mãos do arrendatário José Marques Roque e sua mulher Ana de Sousa Loureiro, por sucessão de Roque Marques, consorte no prazo antigo que entretanto se extinguira. A renda era paga pelos ocupantes de acordo com uma sentença de rateio despachada no Juízo da Correição do Cível do Porto, em 14 de Janeiro de 1751, e que foi apresentada aos louvados1108.
A casa térrea camponesa (Valongo). Fonte: M.M.V.
Na freguesia de Santo André de Sobrado, no século XVII encontramos referências a vários conjuntos ergológicos que os enfiteutas foreiros ao mosteiro de Santo Estêvão de Vilela ocupavam e mantinham em bom estado de conservação pela introdução obrigatória de benfeitorias suportadas unicamente pelo lavrador, sob pena de renúncia contratual e rescisão 1107 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.224.
1108 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl. 231. 288
Joel Silva Ferreira Mata
unilateral que podia ser invocada pelos procuradores ou pelo comendatário senhorial, em evidente prejuízo do locatário e sua família que podiam ficar submetidos ao alvedrio dos representantes monacais. Sempre que a titularidade de um casal, meio casal, terço de casal ou quarto de casal vagava por morte do concessionário, o novo possessor, em geral, pedia que fosse feita uma vedoria, não só para confirmar juridicamente a ocupação mas também para ser feito o arrolamento de todas as propriedades rurais, a habitação e das suas dependências conexas e, a actualização da renda que podia ser mantida, aumentada e raramente diminuída.
Casa da Eira (Valongo). Fonte: M.M.V.
Em 1603 foram praticadas várias vedorias as quais deram ênfase a todos os aspectos relacionados com as parcelas, nomeadamente com a cabeça do casal, ou casas de morada. O meio casal da Vila, na aldeia das Devesas, desta freguesia, visitado pelos louvados Estêvão Ferreira e por Baltasar Duarte, em representação do cenóbio e do agricultor, respectivamente, arrolaram no auto então lavrado para o efeito, várias dependências próximas mas isoladas entre si: uma que agregava o celeiro e cortes, outra que correspondia ao modelo binário1109 de cozinha e celeiro, no segundo piso, sendo, portanto, sobrada, e outras unidades que serviam de aidos, cortes, palheiro e eira1110. 1109 BEIRANTE, Maria Ângela Rocha (1995) – ob. cit., p.121. 1110 ADP, Autos de Vedoria k/26/9/1-274.1, fl.119. 289
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 24 – Dimensão dos palheiros na freguesia de Santo André de Sobrado data
comprimento
largura
área
varas
palmos
metros
varas
palmos
metros
m2
1603
3
1
3.5
2
1
2.4
8.4
1603
2.5
–
2.75
2.5
–
2.75
7.56
1603
4.5
–
4.9
2
–
2.2
10.89
1605
2.5
–
2.75
1.5
–
1.65
4.53
1605
3
–
3.3
2
–
2.2
7.26
1606
2
–
2.2
1.5
–
1.65
3.63
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
Neste mesmo ano, no mês de Fevereiro, foram inspeccionadas mais duas unidades tributárias e fiscais: o casal das Devesas, nas mãos do caseiro João Fernandes, cujo património de lavoura andava pelas vinte e três parcelas dispersas, mas formava um conjunto habitacional de comensalidade e de residência composto por vários elementos comuns a outras unidades agrícolas. No entanto, há sempre diferenças a assinalar. Em primeiro lugar, um bloco binário ou bicelular onde se desenvolviam as actividades de confecção alimentar e de afectos, isto é, na cozinha, e o celeiro que também podia desempenhar um espaço de dormida e de execução de trabalhos de Inverno e de fiação; várias casas cuja função estava directamente associada à criação em cativeiro, de animais de médio porte; um celeiro de dimensões mais reduzidas e por isso chamado o “Celeirinho da Vale”, cujo comprimento era quase três vezes a sua largura e ocupava cerca de 30 m2 de área bruta1111.
1111 ADP, ADP, Autos de Vedoria k/15/1-55, fl.178. 290
Joel Silva Ferreira Mata
Casa de um só piso na aldeia de Couce (Valongo). Fonte: M.M.V.
No mesmo dia (13 de Novembro) o louvado Estêvão Ferreira, pela parte do senhorio, e Belchior Pires, das Devesas, por indicação do camponês Cosme Artur e seu genro Pêro Belchior, deslocaram-se ao casal das Devesas e confirmaram as parcelas que o integravam. A renda não sofreu alteração nem foi apresentada qualquer reclamação dos concessionários, sinal claro de que aceitavam as condições impostas e herdadas dos seus antecessores. Habitavam “hũa casa sobrada”1112 que servia de celeiro, separada da cozinha, cortes, aidos e uma eira toda murada com uma casa que deveria servir para recolher os cereais de forma definitiva ou intermitente, conforme o tempo necessário à exposição, secagem e trabalhos afins o permitissem. A recolha definitiva devia acontecer quando o grão estivesse limpo e separada a quantidade que devia ser levada às tulhas ou celeiros do senhorio, por conta e risco do agricultor. A outra parcela seria guardada no celeiro principal, junto da cozinha, e destinar-se-ia ao consumo doméstico, para venda e para a semente do ano seguinte.
1112 ADP, Autos de Vedoria, k/15/1-55, fl.180. 291
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 25 – Dimensão das cozinhas na freguesia de Santo André de Sobrado (início do séc. XVII) comprimento
largura
área
varas
metros
varas
metros
m2
5
5.5
2.5
2.75
15.13
5
5.5
2
2.2
12.1
5
5.5
2.5
2.75
15.3
3
3.3
1.5
1.65
5.45
6.5
7.15
2.5
2.75
19.6
8.8
8.8
2
2.2
17.6
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
Na aldeia de Vilar, da freguesia de Santo André de Sobrado, o meio casal de Cimo de Vila, em 1605, estava vago por morte de Graça Domingues, que morava em São Mamede de Valongo, tendo o prédio, na sua totalidade, ficado para o seu sucessor João Frutuoso, filho da defunta1113, com cerca de dezassete parcelas além de uma cozinha, um celeiro e uma eira com seu palheiro no interior. O peso tributário, misto, composto por trigo, milho, centeio, cera, uma galinha e dinheiro devia ser pago de uma só vez, no dia da invocação de São Miguel de Setembro, em boas condições para ser armazenado1114.
Quadro n.º 26 – Dimensão dos celeiros na freguesia de Santo André de Sobrado data
Local
1603
Sobrado
comprimento
largura
área
varas
palmos
metros
varas
metros
m2
2
1
2.4
2
2.2
4.8
1603
Sobrado
3
–
3.3
1.5
1.65
5.4
1603
Sobrado
3.5
–
3.85
2
2.2
8.47
1605
Sobrado
2
–
2.2
–
–
–
1605
Meio casal, Cimo de Vila
3
–
3.3
2
2.2
7.26
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
1113 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.40.
1114 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.40v. 292
Joel Silva Ferreira Mata
O meio casal do Paço, na aldeia de Vilar, em Maio de 1606, era ocupado por Gonçalo Domingues e por sua mulher e ambos formavam a derradeira vida, de um contrato em três gerações que terminaria por morte dos actuais usufrutuários ou por encampação ou renúncia apresentada pelos mesmos, em cujo instrumento jurídico devia ser indicado o motivo da encampação. Assim, os dois decidiram renunciar o prédio a favor de sua filha Isabel Domingues, solteira. A vedoria foi solicitada para evitar consequências futuras, pois, findo o percurso das três vidas, verificar-se-ia automaticamente a caducidade contratual. Não obstante, havia formas de transformar um prazo de três gerações em cinco ou seis, através da figura enfiteutica da renovação. O casal de idosos eram auxiliados pela filha, e nesse sentido, manifestaram a intenção jurídica de que a mesma desse sequência ao emprazamento não só para aproveitar o património legado mas também para poder introduzir trabalhos de restauro e de conservação. Por isso, o senhorio devia autorizar, fazendo um contrato novo que vinculasse Isabel Fernandes como a primeira pessoa. Neste ambiente negocial, a renda não sofreu alteração continuando Isabel Fernandes a pagar sete rasas de pão meado, dois galináceos e meia libra de cera, conforme constava na escritura de ocupação do domínio útil em nome de seus pais. Tinha uma cozinha, várias casas de dois pisos, um palheiro e um campo próximo dividido entre a vinha e o cereal, uma horta e uma eira1115. Quadro n.º 27 – Dimensão dos aidos na freguesia de Santo André de Sobrado Data
comprimento
largura
área
varas
metros
varas
metros
m2
1603
7
7.7
2.5
2.75
21.17
1603
2.5
2.75
2.5
2.75
6.87
1603
2.5
2.75
2.5
2.75
6.87
1603
6
6.6
3
3.3
21.78
1629
10
11
6
6.6
72.6
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
1115 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.50v. 293
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
No início de 1625, no auto de vedoria elaborado sobre o quarto do casal do Cabo, na freguesia de Santo André de Sobrado à guarda de Jerónimo Pedro, solteiro, dá conta da existência de uma casa vertical de dois pisos, com uma área bruta de 103 m2, em termos aproximados1116, uma casa que denota pela sua construção, estarmos em presença de um concessionário mais abastado, do tipo burguês1117. A renda paga pelos anteriores proprietários era absolutamente insignificante e meramente simbólica sendo, pois, aumentada em quantidade e diversidade não só dos cereais, partes de carne porcina e em produtos têxteis manufacturados1118.
Quadro n.º 28 – Dimensão das cortes na freguesia de Santo André de Sobrado Data
comprimento
largura
área
varas
metros
varas
metros
metros
1603
3
3.3
2
2.2
7.26
1603
5.5
6.05
2
2.2
13.31
1603
3.5
3.85
3
3.3
12.7
1603
6.5
7.15
2.5
2.75
19.66
1629
2.5
2.75
2
2.2
6.05
1603
6.5
7.15
2.5
2.75
19.7
1643
12.5
13.75
12.5
13.75
189
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
Deste conjunto de vedorias e de inquirições in loco onde se apurava a renda justa em função das características dos campos e das leiras, nomeadamente se tinham água própria, de regadio ou se eram secas, como alguns contratos referem, para defesa do camponês. Em Outubro de 1593, os louvados António de Almeida e João Martins representantes respectivamente do cenóbio de Santo Estêvão de Vilela e do precarista António Tomé e sua mulher Francisca André, que haviam recebido por herança e por doação o casal de Campelo, no lugar de Vila, da freguesia de Santo André de Sobrado, referem no seu testemunho oral que apenas havia uma casa e 1116 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.129.
1117 BEIRANTE, Maria Ângela Rocha (1995) – ob. cit., p.124. 1118 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.129. 294
Joel Silva Ferreira Mata
diversos currais construídos num campo, cujo perímetro estava totalmente vedado. Quanto à renda principal, o titular continuaria a pagar o mesmo que os seus antecessores, um foro misto composto de cereais, cera e um galináceo1119.
Quadro n.º 29 – Dimensão das casas sobradadas (séculos XVII-XVIII) descrição
comprimento
largura
área
varas
metros
varas
metros
m2
Casal do Escoural
9
9.9
7.5
8.25
81.7
Casal do Escoural
8.7
9.6
5.5
6.05
57.9
Casal do Escoural
14
15.4
9.5
10.45
160.93
Casal do Escoural
9
9.9
7.5
8.25
81.7
Vale de Barreiros
14
15.4
9.5
10.5
161
Sobrado
5
5.5
3
3.3
18.15
Sobrado
2.5
2.75
2
2.2
6.05
Fonte: ADP, Autos de Vedoria 1639-1830, K/26/9/1-274.1; Livro 1.º das Apegações, k/15/1-55.
2.2 – Os pardieiros Ao lado, ou confundindo-se com os prédios bem restaurados e bem conservados nas suas paredes, janelas, telhados e portas aparecem, tanto na paisagem “urbanizante” como na paisagem tipicamente rural, os imóveis mais modestos e mais simples1120 em mau estado de conservação, decadentes
ou ruínas. Esta situação acontecia segundo a denúncia senhorial que, para evitar tais situações e como medida preventiva, introduzia, no clausulado formalmente jurídico, a cargo dos tabeliães próprios ou das cidades, vilas e lugares, penalizações elevadas. Os prédios tenderiam a ganhar a designação de pardieiros sobretudo quando o arrendatário da última vida do prazo ficava idoso, doente ou viúvo. Não tendo força nem interesse em investir num imóvel que não iria ser herdado por um familiar directo, guardaria o seu dinheiro e bens para manter a sua subsistência. No actual território do concelho de Valongo, um espaço agrícola onde a grande parte da sua popu1119 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/1-274.1, fl.97.
1120 FOSSIER, Robert (2010) – Gente da Idade Média. Lisboa: Editorial Teorema, p.140. 295
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
lação vivia em casas térreas ou de dois pisos, estas estavam quase sempre bem conservadas, sendo notório o esforço dos arrendatários não só na manutenção do edifício transmitido pelos seus antecessores como também emprestando ao espaço familiar e social um aumento de área coberta, pela implantação de mais um piso, dando à casa de habitação um novo fôlego, um arejamento mais puro e uma divisão dos espaços, criando pequenos compartimentos mais íntimos. Neste território parece não ter existido casas imperfeitas ou por terminar1121, desconfortáveis e exíguas das zonas rurais1122, sintoma de
pobreza, de crises demográficas1123, mas também de abandono. Em condições analíticas, a origem dos pardieiros está na construção rudimentar e frágil1124, nos materiais de assentamento duvidoso1125, e daí a vigilância e pressão dos representantes dos senhorios da terra em qualquer parte do Reino1126, como na periferia de Lisboa e Ribatejo1127.
Os exemplos de degradação da casa e da sua transformação em pardieiro, resto de paredes portantes1128, pouco elevadas das fundações,
alguns pinázios longitudinais que outrora seguravam os vidros ou portadas em madeira, cumeeiras, parecem ser insignificantes no território do actual concelho de Valongo.
1121 MARQUES, José (1980) – «Património régio na cidade do Porto e seu termo nos finais do século XV (subsídios para o seu estudo)», in Actas do Colóquio O Porto na Época Moderna, Vol. III. Porto: INIC, p.86. 1122 SAMPAIO, Alberto (1979) – As Vilas do Norte de Portugal. Estudos económicos. I. Lisboa: Edições Vega, p.153.
1123 CARVALHO, Sérgio Luís (1995) – Assistência e Medicina no Portugal Medieval (uma introdução ao seu estudo). Lisboa: Grupo do Ministério de Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, p.81. 1124 GONÇALVES, Iria (1989) – O Património do mosteiro de Alcobaça nos séculos XIV e XV. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, p.257.
1125 SARAIVA, Anísio Miguel de Sousa (1995) – «A Propriedade urbana das confrarias e hospitais de Coimbra nos finais da Idade Média», in Revista de Ciências Históricas Universidade Portucalense Infante D. Henrique, Vol. X. Porto, p.172.
1126 RODRIGUES, Ana Maria Seabra de Almeida (1996) – «A Formação do património do domínio da Colegiada de São Pedro de Torres Vedras (fim do século XIII-fim do século XV)», in Espaços, Gente e Sociedade no Oeste. Estudos sobre Torres Vedras Medieval. Cascais: Patrimónia, p.123. 1127 MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.282-284.
1128 CONDE, Manuel Sílvio Alves (2011) – A Casa urbana comum, no Alentejo dos séculos XV-XVI, in Construir, habitar: a casa medieval. Braga: CITCEM, p.131. 296
Joel Silva Ferreira Mata
Restos de uma estrutura de uma casa em São Martinho do Campo. Fonte: M.M.V.
Porém, em 1605, no meio casal de Cimo de Vila, na aldeia de Vilar, em Santo André de Sobrado, na altura, ocupado por João Frutuoso, de Valongo, apresentava vários edifícios, mas manteve, mesmo sob o olhar de Estêvão Ferreira, vedor do comendatário do mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, um pardieiro identificado como sendo uma corte, constituída por restos de paredes completamente descobertas1129. É possível que tenha herdado o encabeçamento com esta dependência em mau estado de conservação, ou, por negligência deixou-a ruir durante a vigência da sua ocupação efectiva enquanto enfiteuta. Por morte do capitão Simão Pacheco, arrendatário de um quarto da quebrada da Vale, em São Mamede de Valongo, que em 1677, havia passado para seu filho Jacinto Pacheco, os louvados Manuel Ferreira, morador na Calçada da Relação do Porto, em nome do senhorio e João Gonçalves, picafeijão, por alcunha, sapateiro e residente em Valongo, informaram que o 1129 ADP, Autos de Vedoria, k/26/9/2-277.1, fl.40v. 297
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
assentamento deste quarto de casal que “he hum chão onde esteve uma casa”1130 que estava localizada no interior de um campo de Domingos Bento “que he foreiro o ditto campo a capella da Quinta do Laranjal da cidade do Porto”1131. O capitão deixou arruinar uma casa cuja estrutura desapareceu por completo ficando somente a sua memória.
2.3 – As cabanas Os assentamentos estudados, em maior ou menor grau, conforme o número de corpos construtivos que os integravam, permitiam aos camponeses abrigarem-se do calor, do frio, e dos animais; estabelecer relações de sociabilidade por altura dos grandes eventos da vida: a boda de casamento, o baptizado dos filhos e no cortejo da morte quando o defunto saía de casa e era levado até à igreja para ser sepultado. São habitações rurais, de áreas muito parcas, estreitas, escuras, ar pesado e viciado, mas na base construtiva incipiente realizada com parcos recursos, em xisto, ardósia, madeira ou colmo, habitavam no território do actual concelho de Valongo muitas pessoas, em condições de pobreza extrema e por caridade. No casal do Agro, em São Mamede de Valongo agricultado por Sebastião Álvares e sua mulher Catarina Antónia, em finais do século XVI, onde viviam confortavelmente na sua casa térrea, telhada e com outros equipamentos de apoio, e com cerca de duas dezenas de propriedades cerealíferas, e dois moinhos destinados à produção de farinha de trigo e separadamente de farinha de outros cereais, mas numa das casas que o inventário refere, que parece ser o celeiro “se aguasalha Isabel Fernandes cabaneira”1132. Os cabaneiros e cabaneiras podiam ser sinónimo de pobreza e de extrema pobreza, ou meros assalariados rurais, contratados ao ano1133 que habitava uma cabana. Podiam também chamar-se cavões, quando o objectivo da sua contratação fosse o de rasgar a terra com a enxada1134, de olhar 1130 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.204.
1131 ADP, Autos de Vedoria 1639 -1831, K/26/2/5-64.507, fl.204v. 1132 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.14.
1133 COELHO, Maria Helena da Cruz (1996) – «O Povo – Identidade e a diferença no trabalho», in Nova História de Portugal, Vol. III, ob. cit., p.276. 1134 COELHO, Maria Helena da Cruz (1996) – ob. cit., p276. 298
Joel Silva Ferreira Mata
pelo rebanho, como por exemplo, os que foram sinalizados em 1258 no actual concelho de Guimarães1135, mas podiam estar associados também ao trabalho de extracção do minério de ferro como foi referido nas Inquirições Gerais de 1220, em Tinhela de Susã, na freguesia de São Martinho de Bornes, no concelho de Aguiar de Pena1136. Nesta circunstância, podia estar o cabaneiro João Gonçalves, da freguesia de São Martinho do Campo, que em 1720 foi testemunha do baptizado de Maria, filha de José de Paiva, soldado da guarnição do Porto, e de Ana, solteira, que morava na aldeia de Ferraria, em Alfena1137. Na aldeia de Susão aparecem já referenciados três cabaneiros, entre algumas dezenas de agricultores antigos deste lugar1138.
3 – A carga tributária e fiscal 3.1 – As rendas pagas pelos agricultores aos senhorios As rendas constituídas “por uma prestação principal, o cânon”1139
recaíam sobre os produtos que pelo trabalho braçal e animal podiam ser semeados e cultivados nas leiras, quebradas e nos campos, e sobre a criação de gado em cativeiro ou sobre os animais de pasto. No entanto, as preferências senhoriais podiam variar consoante a parte do território em que estivessem implantados. Esta lógica de gestão patrimonial permitia arrecadar diversos tipos de bens alimentares que enchiam as tulhas, ou obterem produtos manufacturados como a cera para a iluminação, o mel ou carne já curada e a manteiga.
1135 MARREIROS, Maria Rosa Ferreira (1996) – «Os Proventos da terra e do mar», in Nova História de Portugal, Vol. III, ob. cit., p.434.
1136 GOMES, Saúl António (1996) – «A Produção artesanal», in Nova História de Portugal, Vol. III, ob. cit., p.476. 1137 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.30.
1138 P.M.H. Inquisitiones, p.513.
1139 COSTA, Leonor Freire; LAINS, Pedro; MIRANDA, Susana Muűnch (2014) – História Económica de Portugal 1143-2010. Lisboa: A Esfera dos Livros, p.30. 299
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ao centro, pendurado na parede, o alqueire, medida através da qual se pagavam as rendas. Fonte: M.M.V.
O Cabido da Sé do Porto, entre os séculos XVII e XVIII, nos seus casais, campos e quebradas, situados em São Mamede de Valongo, optara por dois tipos de foros: os fixos pela entrega de certa quantidade de moeda; e os mistos, constituídos por trigo, centeio e galinhas. Os foreiros do campo de Cavalo Morto pagavam uma renda composta por um vintém, um alqueire de centeio e uma galinha1140. Em outras unidades agrícolas, de meados do século XVII a meados do século XVIII, a opção consistia na entrega de moeda e vários galináceos.
1140 ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.196. 300
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 30 – Tipologia dos foros na freguesia de São Mamede de Valongo
Data
descrição
tostões
Trigo (alq.)
Centeio (alq.)
Pão meado (alq.)
Milho grosso (alq.)
galinhas
réis
cereais
vinténs
moeda
1662
Campo de Cavalo Morto
1
–
–
–
1
–
–
1
1677
Casal da Vale
–
150
–
–
–
5
–
7
1745
Campo e leira da Baldacha
3
–
–
–
–
1
–
1/4
1745
½ casal do Escoural
–
–
1
–
–
–
–
6.5
1745
Casal da Vale
–
150
–
–
–
5
–
7.5
1745
½ casal do Escoural
–
280
–
–
–
–
–
7
1830
Quebrada de Vale de Barreiros
–
150
–
–
–
5
–
7.5
1831
½ casal do Escoural
–
–
–
–
–
–
60
–
Fonte: ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507.
Quadro n.º 31 – Foros em moeda e galináceos data 1662
Moeda
Descrição Casal do Escoural
Réis
tostões
–
1
Galinhas 6
1677
Casal do Escoural (parte)
–
1
6
1677
Casal do Escoural (parte)
220
–
6
1677
Quebrada da Vale
300
–
3
1743
Casal do Escoural (parte)
280
–
6
Fonte: ADP, Autos de Vedoria, 1639-1831, k/26/2/5-64.507.
As freiras beneditinas da cidade do Porto possuíam vários casais, disseminados pela freguesia de São Mamede de Valongo e de São Martinho do Campo, tendo em relação a estes dois territórios comportamentos distintos que espelhavam a natureza e a aptidão dos seus solos. Em Valongo aparece o trigo em singelo e a indicação de pão terçado que repartido pelos três foreiros 301
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
que exploravam outras tantas partes do casal da Vale: André Gonçalves, a viúva Justa Fernandes e Afonso António1141. Em São Martinho do Campo, o trigo está ausente e aparece em seu lugar a tributação sobre o centeio, acompanhado de algumas galinhas. Além dos agricultores referenciados, nesta freguesia, havia os que se dedicavam também à apicultura, uma vez que as rendas fixadas nos finais do século XVI, por exemplo, no casal de Lima, emprazado a Gonçalo Afonso, se refira à entrega de uma canada de mel; o do rio Satana, de meia canada e o das Póvoas, na posse de Domingos Gonçalves também uma canada1142.
A eira como elemento estrutural do espólio construtivo. Fonte: M.M.V.
No seu conjunto, as rendas pagas nas várias freguesias, somente em espécie monetária, representavam cerca de 13% do total dos registos; entre os cereais dominava a recolha do trigo (43%) em relação ao centeio (32%). Se incluirmos o pão meado, o cereal alvo continuava a ser o mais relevante atingindo cerca de 25% das entregas cerealíferas, seguindo-se o centeio e, por fim, o pão de mistura.
1141 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fls.116-118v.
1142 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fls.172v, 192v e 208. 302
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 28 – Os foros em cereais em São Martinho do Campo (sécs. XVI-XVII)
Fonte: TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12.
No grupo dos galináceos, a par das galinhas surge, em algumas situações a menção a frangões, que também podem ser pedidos isoladamente. Por exemplo, na leira da “Vallgua”, em São Mamede de Valongo, os seus titulares pagavam, em 1593, seguindo a tradição, apenas um frangão1143; no casal da Poça, no dia de São Miguel de Setembro, duas galinhas e dois capões1144; no mesmo lugar, outro casal da Poça cultivado por a Pero Dias a renda era de três alqueires de trigo, dois e meio de pão meado, uma galinha e um frangão1145, correspondente a um terço das suas parcelas; ao mesmo pagamento estava sujeito, por outro terço do mesmo casal, o foreiro Francisco Gonçalves1146. Gráfico n.º 29 – Foros em galináceos pagos ao Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto (sécs. XVI-XVII)
Fonte: TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12. 1143 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.82.
1144 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl. 93v. 1145 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.99.
1146 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.103. 303
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Em moeda, as profitentes do hábito de São Bento arrecadavam, todos os anos, cerca de mil réis dos seus dependentes e camponeses de São Mamede de Valongo e mais de mil e quatrocentos dos seus arrendatários da freguesia de São Martinho do Campo. Um dos senhorios mais representativos do território de Valongo, globalmente considerado era a coroa, e daí as propriedades reguengueiras cujo senhorio directo pertencia ao rei. Em 1513, na freguesia de São Martinho do Campo, as inquirições efectuadas pelo cavaleiro Fernando Pina, aquando da elaboração do foral novo, ao concelho de Aguiar de Sousa, registou vários agricultores que estavam sujeitos a rendas pagas ao monarca. Na aldeia de São Gemil, o foro que abrangia o maior número de contribuintes, andava pelos trinta e seis reais, uma fiã de manteiga, um cabrito, e dois ovos1147, havendo, com efeito, duas excepções: Vicente Anes que pagava apenas a renda em espécie monetária, Lopes Fernandes sujeito a setenta e dois reais, dois cabritos, dois frangões e dois ovos, e João Gonçalves, que suportava um encargo fiscal menor, na ordem dos onze reais e meia fiã de manteiga.
1147 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.114v-115; ADP, n.º2422; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – Os Forais, Manuelinos do Reino de Portugal e do Algarve conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Entre Douro e Minho. Beja: ed. do Autor, pp150-151; BARREIRO, Dr. José do (1922) – Monografia de Paredes. Porto: Tipografia Mendonça, pp.123-136; MARQUES, Maria Alegria (2013) – Foral de Aguiar de Sousa 1513. Paredes: O Planeta da Escrita, p.102. 304
Joel Silva Ferreira Mata
Prédio local
titular
Galinhas
frangões
ovos
maravedis
galináceos
dinheiros
Cabritos
reais
moeda
manteiga (fiãs)
Quadro n.º 32 – Foros pagos à Coroa em São Martinho do Campo (1513)
Aldeia de S. Gemil
moradores
584
–
–
–
–
–
–
–
Vicente Anes
36
–
–
–
–
–
–
–
Fernão Vaz e Luís Eanes
36
–
–
1
1
1
–
–
Luís Eanes e João Afonso
36
–
–
1
1
1
–
2
Martinho Eanes
36
–
–
1
1
1
–
2
João de Carvalho
36
–
–
1
1
1
–
2
João Álvares Ribeiro
36
–
–
1
1
1
–
2
Lopes Anes
72
–
–
–
2
–
2
2
João Gonçalves
11
–
–
1
–
–
–
–
Gonçalo Lopes
36
–
–
1
1
–
–
2
moradores
292
–
–
1
–
3
–
–
Igreja de S. Martinho do Campo
24
3
0.5
–
–
–
–
–
João Anes
260
–
–
–
–
2
–
–
João Anes da Granja
24
3
0.5
–
–
–
–
–
Casal
Afonso Gabriel
24
–
0.5
–
–
–
–
–
Casal
João Anes
48
–
1
–
–
–
–
–
herdades
Sebastião Vaz de Vilarinho
25
–
–
–
–
–
–
–
Montados
Moradores de Vilarinho
90
–
–
–
–
–
–
–
500
–
–
–
–
–
–
–
Aldeia de Balselhas
Casal de Balselhas
Casais de Toronhas
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.114v-115.
305
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Aos moradores da aldeia de Balselhas, o rei exigia uma tributação, repartida por todos, no valor de duzentos e noventa e dois reais, aliás, uma quantia que correspondia a cerca de metade daquela a que estavam submetidos os camponeses da aldeia de São Gemil1148 , exarando-se, para cada arrendatário dos casais não identificados, do casal de Balselhas, das herdades, e dos casais de “Toronha”, rendas em dinheiro que pela sua nomenclatura denotam que foram fixadas há muito tempo. Ao lado do real, de seis ceitis, moeda corrente e de troca na primeira metade do século XVI, surgem outras como o maravedi e o dinheiro, embora em pequenas quantidades. É um processo engendrado pela gestão senhorial, que tirava algum benefício da eventual ignorância dos seus dependentes quanto à actualização e correspondência entre as diferentes espécies monetárias em circulação, como por exemplo os cónegos regrantes de Santo André de Ancede que praticavam o mesmo sistema1149. A paroquial da freguesia de São Martinho do Campo estava também abrangida por este complexo sistema monetário, entregando aos rendeiros do monarca, vinte e quatro reais, três dinheiros e meio maravedi1150.
À chamada do cavaleiro Fernão de Pina faltaram vários foreiros, uns porque simplesmente não compareceram, outros porque estavam fora da freguesia, uma situação pouco comum, uma vez que a presença do representante do rei e o objectivo das inquirições era anunciado previamente. No conjunto dos nove titulares da aldeia de São Gemil, quatro arrendatários foram dados como ausentes, não sendo possível confirmar, pelo respectivo título de posse, os montantes das rendas dos foros anteriormente fixados. Muitos agricultores não tinham autorização formal para ocuparem os prédios rústicos, escusando-se, sempre que podiam, ao pagamento de qualquer tipo de tributação, lesando o senhorio directo. Em situação de incumprimento presencial citam-se Vicente Anes que “nom veo que nom era em casa ficara resguardado a todos seu direito”1151, os foreiros Luís Eanes, João Afonso, João de Carvalho e Rui Anes, por ausência da freguesia. Na aldeia de Balselhas nem o pároco compareceu. Neste contexto, não foi possível proceder a qualquer confirmação tabeliónica, pelo que o cavaleiro Fernão de Pina manteve 1148 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.114v-115. 1149 MATA, Joel Silva Ferreira (2016a) – ob. cit., pp. 187-191.
1150 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.115.
1151 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.114v. 306
Joel Silva Ferreira Mata
a renda que estava a ser paga. Destas duas aldeias os mordomos do rei recolhiam, por ano, cerca de dois mil e duzentos reais, seis dinheiros, dois maravedis e meio, oito cabritos, dez galinhas, dois frangões, vinte e quatro ovos e oito fiãs de manteiga.
A arca para a guarda de cereais. Fonte: M.M.V.
Na freguesia de Santo André de Sobrado, o rei possuía os casais do Cabo, de Campelo, de Paradela e as herdades do Outeiro e outras propriedades que andavam encabeçadas separadamente por diversos enfiteutas. As rendas eram, ao contrário do que acontecia na freguesia contígua, em numerário composto por vários tipos de moedas em circulação: o dinheiro, o maravedi, o soldo e o real que era a moeda predominante no pagamento das rendas à coroa nesta freguesia. Para a conversão monetária indicava-se a paridade de um maravedi para quarenta e oito reais e meio; em cerca de 50% dos foreiros arrolados havia sido fixada uma quantia que abrangia duas ou três espécies de numismas. Numa época aparentemente estável, mesmo assim, os senhorios preferiam fixar parte das suas rendas em moedas cuja desvalorização não fosse tão visível. À chamada apenas faltou Álvaro Anes “que nom veo ficara pera se justificar”1152.
1152 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.115v. 307
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 33 – Foros pagos à Coroa na freguesia de Santo André de Sobrado (1513)
Reais
Dinheiros
maravedis
soldos
moeda
–
João Anes, de Cima de Paços
8.5
6
1
–
–
João Anes, de Baixo de Paços
48.5
–
1
–
João Gonçalves
72
3
–
–
António Anes, do Vilar
24
2
0.5
–
48.5
1
–
–
Fernão Martins
242
1
–
–
Luís Vaz
48.5
–
–
–
Diogo Afonso
48.5
–
–
–
Vicente Martins, de Ferreira
48.5
–
–
–
Álvares Anes
48.5
–
–
–
Casal
Álvaro Martins
72
–
–
40
Casal
Fernão Martins
24
2
0.5
Casal
Álvaro Martins
24
2
0.5
Casal de Paradela
Pedro Álvares e Álvares Anes
48.5
–
–
–
Casal de Campelo
João Afonso, da Costa
48.5
–
–
–
Pedro Álvares, o novo
48.5
–
–
–
Pedro Álvares, o novo
36
–
–
–
Propriedade
Casal – Herdades do Outeiro Casal – Casal de Campelo
Casal do Cabo
Titular
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.115-115v.
A propriedade reguenga inquirida em Valongo da Estrada, por Fernão Pina, evidenciou onze foreiros que encabeçavam cada um, o seu quinhão do reguengo, assim como a almuinha na posse de Gonçalves da Velha1153. As rendas pagas pelos dependentes identificados e seus sucessores eram constituídas em cerca de 36.4% dos casos, por foros mistos, onde a moeda parece ser insignificante, prevalecendo o impulso tributário sobre o pão meado e galináceos, designados por capões, presentes em cerca de 63.6% dos casos, e por dez ovos bem acondicionados.
1153 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.29. 308
Joel Silva Ferreira Mata
Moeda (reais)
Pão meado (alqueires)
Quadro n.º 34 – Foros pagos à Coroa em Valongo da Estrada (1519)
Frangões
Quinhão do reguengo
Diogo Fernandes
3
1
1
1/8
10
Quinhão do reguengo
Maria Luís, viúva
3
1
1
1/8
10
Quinhão do reguengo
Pêro Vaz
3
1.5
1
1/8
10
Quinhão do reguengo
Gonçalo Afonso e Pedro Afonso
4
3
9
1/8
10
Quinhão do reguengo
Gonçalo Fernandes
–
–
0.5
1 /2
5
Quinhão do reguengo
João Rodrigues
–
1
1
1/8
10
Almuinha (parte)
Gonçalo da Velha
–
1
1
1/8
10
Quinhão do reguengo
Francisco Dias
–
0.5
–
–
–
Quinhão do reguengo
João Fernandes
–
3/4
–
–
–
Quinhão do reguengo
Sebastião Álvares
–
2.5
–
–
Quinhão do reguengo
Diogo Fernandes e Maria Luís
–
–
0.5
1/8
Propriedade
Titular
Galináceos Capões
ovos
10
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.29-29v.
Em Valongo Susão, os agricultores trabalhavam em “parte do reguengo”, nas herdades e no campo da Vinha. A renda mista coincidia sobretudo no pão meado, galináceos e moeda. O campo da Vinha pagava apenas quarenta e oito reais; por sua vez, por uma parte do reguengo explorada por Luís Álvares e Maria Gonçalves, por outro pedaço de reguengo entregavam, por cada quinhão três alqueires de pão meado1154.
1154 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.29. 309
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 35 – Foros pagos à Coroa na aldeia de Valongo Susão (1519)
Propriedade
Titular
ceitis
Pão meado (alqueires)
Frangões
Capões
galináceos
Reais
moeda
ovos
Parte do reguengo
Gonçalo Martins
–
–
18.5
2.5
2.5
25
Parte do reguengo
Gonçalo Fernandes
–
–
27.5
3
3
30
Herdades reguengas
João Anes, o velho
8
16
4
4
30
Parte do reguengo
Luís Anes
–
–
3
–
–
–
Parte do reguengo
Gonçalo Afonso
1
3
6
0.5
0.5
5
Herdades reguengas
João Pires e João Anes
3
–
6
1
1
10
Parte do reguengo
Maria Anes
–
–
3
–
–
–
Campo da Vinha
Gonçalo Fernandes
48
–
–
–
–
–
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.29.
Na freguesia de São Vicente de Alfena havia várias unidades agrárias e tributárias do rei. Fernão de Pina convocou todos os possessores de parcelas reguengas que confirmaram as rendas a que estavam sujeitas e o tipo de propriedade que encabeçavam. Quatro eram casais, uma outra é designada por reguengo de Ermesinde, seguindo-se o campo reguengo; o casal do Neto e as leiras que confrontavam com terras de Antão Rodrigues, morador no Porto. As rendas variavam muito de contrato para contrato. Os foros pagos somente em dinheiro recaíam apenas sobre Vasco Fernandes e sucessores ao prazo, pelas leiras que encabeçava e que confrontavam com terras de Antão Rodrigues, morador na cidade portuense; ao foro misto, em moeda, cereais (trigo e pão meado), vinho (20%) e dois feixes de palha estava submetido o casal do Neto, nas mãos de João Álvares; em pão meado, apenas o “campo reguengo”; em trigo, centeio e milho (miúdo), o reguengo de Ermesinde; e outras rendas que englobavam os frangões, as galinhas e grandes quantidades de ovos1155. A produção cerealífera era constituída pelo trigo, centeio, milho e pão meado, que domina, seguido do trigo em singelo que atinge cerca de 27.5% do total das rendas entregues ao almoxarife, mordomo ou rendeiro do rei.
1155 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.29v-30.; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., pp.39-40. 310
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 30 – Rendas pagas à coroa na freguesia de São Vicente de Alfena (1519)
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30.
Neste território, ocupado por ferreiros e suas forjas, ferradores, almocreves e outros grupos ligados aos mesteirais, havia outro senhorio, que detinha dez casais sujeitos apenas ao foro em numerário, que era o mosteiro dos beneditinos de Santo Tirso de Riba de Ave, cujos valores oscilavam entre vinte e trinta e dois reais e meio1156; as leiras que andavam associadas com um casal que pertencia, por herança, a Antão Rodrigues, morador na cidade do Porto, rendia, aos beneditinos, a quantia de cento e vinte reais1157, valor que ultrapassava, várias vezes, aqueles que eram requeridos pelos restantes casais do cenóbio. Simbolicamente, a paroquial de São Vicente de Alfena entregava duas galinhas, ao rendeiro dos monges de hábito negro1158. Na freguesia de S. Lourenço d’Azenes, o campo das Cortinhas estava entregue a Pêro da Cunha que por sua vez, o deu a cultivar a Gonçalo Anes, de Ermesinde, e que pertencia à quintã do Castelo, rendia ao seu directo senhorio, dois alqueires de trigo1159, sendo, de acordo com o foral outorgado à Terra e concelho da Maia, em 1519, a propriedade régia pouco significativa, dominando este espaço geográfico do actual concelho de Valongo, o mosteiro beneditino, masculino de Santo Tirso de Riba de Ave, que aqui detinha inúmeros casais, alguns bem identificados como o casal de Ermesinde, que devia ser monocultural uma vez que pagava a sua renda apenas
1156 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30. 1157 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30. 1158 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30. 1159 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30. 311
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
em cairas de milho1160; os casais de Sá, em posse de Fernando Anes da Cale, que em conjunto rendiam a módica quantia de trinta e seis reais, um alqueire de milho, duas calaças de carne e duas galinhas1161. Mas havia o casal de Cima, de rendimento insignificante, avaliado em cinco reais, meio alqueire de milho e uma galinha1162. O pão terçado atingia três casais no montante de três cairas cada um. Era comum a todos os enfiteutas o pagamento de parte do foro em moeda, cujos montantes variavam entre cinco e trinta e seis reais, e uma parte pouco significativa em milho que andava pelo meio alqueire. Em todas estas unidades agrárias de incidência tributária, criavam-se animais em cativeiro, nomeadamente o gado porcino pelo qual os foreiros davam ao senhorio uma calaça de carne, ficando apenas isentos João do Outeiro e Gonçalo Anes, de Ermesinde. Gráfico n.º 31 – Propriedade do mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave (1519)
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.29v-30v.
O cavaleiro Fernão de Pina dá nota de outros quatro casais cujo senhorio pertencia ao mosteiro de Cedofeita1163; pagam foros mistos em moeda, em montantes baixos, no valor de nove reais e uma galinha. Estavam 1160 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.40. 1161 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.40. 1162 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.40. 1163 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.41. 312
Joel Silva Ferreira Mata
neste conjunto, dois casais no lugar de Vilar, contratados ao foreiro Pedro Afonso1164.
calaças
Galinhas
frangões
Alq.
Pão terçado
rasas
cairas
Centeio
reais
Carne
cairas
Moeda
Quadro n.º 36 – Rendas pagas ao mosteiro de Santo Tirso de Riba de Ave (1519)
Casal
João Anes
9
–
0.5
–
3
1
1
–
Casal
João Fernandes da Cancela
18
–
0.5
–
3
1
1
–
Casais de Sá
Fernando Anes da Cale
36
–
1
–
2
2
–
Casal
Gonçalo Anes
18
–
0.5
–
3
1
1
–
Casal
Maria Anes
5
–
0.5
–
–
1
1
–
Casal
Álvaro Lourenço
18
–
0.5
–
–
1
1
–
Casal
Pedro Anes de Cima
18
–
0.5
–
–
1
1
–
Casal de Ermesinde
Gonçalo Anes, de Ermesinde
–
–
–
2
–
–
1
–
Cabo de terra
Gonçalo Anes, de Ermesinde
18
–
0.5
–
–
1
–
–
Casal
Fernão Álvares
18
–
0.5
1
–
1
1
–
Casal
Gonçalo Anes, de Ermesinde
18
–
0.5
–
–
1
–
2 casais
Gonçalo Afonso
9
–
1
3
–
2
2
2
Casal
João Luís
18
–
0.5
–
–
1
1
–
Casal
Gonçalo Anes de Carvalhal, de Ermesinde
18
–
0.5
1
1
–
casal
João do Outeiro
5
1
0.5
1
–
–
–
–
Casal de Cima
Francisco Luís
5
–
0.5
–
–
1
–
–
Casal
João Fernandes de Sá
5
–
0.5
–
–
1
–
–
Prédio
Titular
Milho
Galináceos
Fonte: TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fls.30-30v. 1164 TT, Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho, fl.30; DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1969) – ob. cit., p.41. 313
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
A análise dos foros nesta altura permite extrair algumas conclusões. As rendas pagas, ao rei, na freguesia de Santo André de Sobrado, eram constituídas apenas em espécime monetária, que compreendia quatro moedas diferentes: o real, o dinheiro, o maravedi e o soldo. Na aldeia de Valongo Susão, a prevalência é constituída pelos cereais na forma não especificada de pão meado, alguma moeda e aves de capoeira. Em Valongo da Estrada não se regista igualmente qualquer tipo de pagamento em cereais, a não ser sob a forma de pão meado; as aves e os ovos acompanham a maioria dos foros, suportando alguns arrendatários importâncias, em moeda, absolutamente modestas e insignificantes. As profitentes do hábito negro do mosteiro de Avé Maria, da cidade do Porto, no tempo da abadessa D. Guiomar de Ataíde, da prioresa Isabel de Araújo e outras freiras, que haviam nomeado seu procurador João de Araújo e o licenciado Cristóvão da Costa de Sá, juiz do Tombo, optaram por um sistema de fixação de rendas complexo do qual dependiam dois aspectos: as prestações em dinheiro, em trigo, centeio, pão meado, terçado, galináceos e a inserção de animais de médio porte, como os carneiros que atingiam alguns arrendatários. Nos séculos XVII-XIX o cabido da Sé do Porto, por sua vez, fazia incidir os seus réditos na entrega de pão meado acompanhado por somas assinaláveis em moeda corrente, os réis, os vinténs e os tostões, galinhas e milho grosso. Na freguesia de São Martinho do Campo, pelo contrário, a apetência senhorial régia incidira sobre o pagamento em moeda, quase sempre expressa em reais, mas também se assinalam algumas rendas cuja componente monetária abarcava o dinheiro e o maravedi; nesta localidade, muitos dos lavradores não compareceram à inquirição, não sendo possível confirmar os títulos da respectiva posse e as rendas afectadas às explorações dos prédios rurais encabeçados lícita ou ilicitamente. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, a tendência dos foros aproxima-se do pagamento em dinheiro, pequenas quantidades de milho e a insistência de carne porcina, e do pão terçado, designação que aparece também em Valongo da Estrada. 314
Joel Silva Ferreira Mata
A incidência produtiva dos prédios rústicos assentava sobretudo na trilogia cerealífera, sendo o trigo a planta panificadora aquela que mais se salienta, sendo transformado nas imensas unidades moageiras localizadas nos rios Ferreira e Leça, e em outros cursos de água de menor influência, embora uma boa parte da produção tivesse outros destinos que visavam arrecadar moeda para benefício senhorial. Quadro n.º 37 – Lavradores de Valongo com domicílio identificado (1602-1615) Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1602
Belchior Pires
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 44v
1614
Belchior Pires
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 80
1614
Belchior Pires
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 80v
1615
Baltasar Gonçalves
Margarida Marcos
Na Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 83v
1615
António Francisco
–
Na Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 83v
1615
Adão Brás
Isabel Gonçalves
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 84v
Quadro n.º 38 – Lavradores de Valongo com domicílio identificado (1616-1620) Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1616
Miguel André
Andresa Ribeira
Escoural
ADP, E/27/6/12.3, fl. 85
1616
Belchior Pires
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 86
1616
António Francisco
–
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 86v
1616
Belchior Pires
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 137
1616
Pêro João
Antónia Alvares
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 137
1617
António Dias
Maria Gonçalves
Rua da Senhora
ADP, E/27/6/12.3, fl. 139v
1617
Domingos Luís
Maria Francisca
Rua da Senhora
ADP, E/27/6/12.3, fl. 140
1617
Baltasar Gonçalves
Baltasar Gonçalves
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 140
315
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1617
António Gonçalves, o branco
Francisca Manuel
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 140v
1618
Belchior Martins
–
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 145
1618
Manuel Brás, o novo
Maria Francisca
Fonte da Senhora
ADP, E/27/6/12.3, fl. 146v
1618
Manuel António
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 147
1618
Domingos Fernandes
Antónia Pedra
Lavradores de Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 147v
1619
Belchior Pires,
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 148v
1619
Manuel António
Catarina Gaspar
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 148v
1619
Pero João
Antónia Alvares
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 148v
1619
André Manuel
–
Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 149
1619
Gonçalo Gonçalves
Catarina André
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 149v
1619
André Manuel
–
Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 150
1619
André Moreira
Maria Brás
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 151
1619
António Francisco
–
da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 152
1620
Pero João
Maria Coelha
Santo Antão
ADP, E/27/6/12.3, fl.!53
1620
Baltasar Gonçalves
Margarida Marcos, lavradora
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 154v
1620
João André
Maria Belchior, lavradora
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 155
316
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 39 – Lavradores de Valongo com domicílio identificado (1621-1628) Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1621
Francisco Rodrigue
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 156v
1621
André Moreira
Maria Brás
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 158v
1621
Francisco Rodrigues
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 160v
1622
Pero João
Antónia Martins
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 160v
1622
Gonçalo Gonçalves
Catarina André
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 161v
1622
Domingos Fernandes
Antónia Pero
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 162
1622
António Pero,
Beatriz Antónia
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 162v
1623
Antónia João André
Maria Belchior, lavradora
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 163
1623
Manuel António
Catarina Gaspar
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 164
1623
Baltasar Gonçalves
Margarida Marcos
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 164
1623
António Francisco
–
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 166
1624
Domingos Luís,
Maria Francisca
Portela
ADP, E/27/6/12.3, fl. 167
1624
André Moreira
Maria Brás
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 169
1624
António Pero
Beatriz Antónia
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 169v
1625
Baltasar Gonçalves
–
Da Vale
ADP, E/27/6/12.3, fl. 172
1625
Sebastião Gonçalves
Ana João
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 172
1625
João André
Maria Belchior
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 172v
1625
Domingos João
Maria Manuel
Rua Velha
ADP, E/27/6/12.3, fl. 173
1625
Pêro João
Antónia Alvares, lavradora
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 173v
1625
Domingos Fernandes, o delgado
2ª mulher Antónia Pêro?
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 173v
317
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1625
Manuel Gonçalves
Maria Gonçalves
Ao Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 174v
1625
Adão Brás
Isabel Gonçalves
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 174v
1626
Domingos Francisco
Margarida Gonçalves
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 177
1626
António Pero
Beatriz Antónia
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 178
1626
André Manuel
–
do Adro
ADP, E/27/6/12.3, fl. 179
1627
João André
Maria Belchior
Valongo
ADP, E/27/6/12.3, fl. 181
1627
António Gonçalves
Francisca João
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 182
1628
Duarte José João,
Maria Duarte
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 185
4 – Os sistemas de regadio: o sorteio e os consortes litigantes O território do actual concelho de Valongo era, como referimos, um imenso espaço morfologicamente apropriado para a diversidade cultural, no âmbito de um sistema que permitia a sobrevivência dos que aqui se sedentarizaram pela prática sistemática e geracional dos prazos, assim como dos senhorios, que moravam longe, muito distantes dos camponeses mas esperavam avidamente pelo tempo da entrega das rendas em géneros, destinando parte dos seus montantes, para consumo e uso doméstico, mas uma grande soma de alqueires de trigo, centeio e mais tarde o milho (grosso) eram lançadas no mercado, mesmo quando o único cliente activo era o rei, através dos seus rendeiros e mordomos, ou por outras pessoas devidamente credenciadas que andavam de lugar em lugar comprando os produtos agrícolas panificáveis, oferecendo aos camponeses valores unitários abaixo daqueles que de facto estavam tabelados e regulamentados, uma prática denunciada nas cortes de Lisboa, de 1456, pois vários concelhos do norte manifestaram-se contra o arbítrio dos oficiais encarregados da aquisição de cereais com destino a Ceuta1165. 1165 Descobrimentos Portugueses – Documentos para a sua História. Suplemento ao Vol. I. Lisboa: Edição de João Silva Marques, INIC, 1988, doc. [138], p.257. 318
Joel Silva Ferreira Mata
Em São Mamede de Valongo, a observação espontânea de paisagem rústica mostra que estamos perante um território heterogéneo, pleno de contrastes, onde prolifera a propriedade agrícola de pequena dimensão, de produção e produtividade assimétrica, recheada de vales, ladeiras, desfiladeiros, montes e serras, e uma profícua actividade moageira instalada fortemente ao longo do rio Ferreira, aproveitando os desníveis orográficos, onde, com o trabalho humano se construíram represas, açudes, canalizações, desvios e aquedutos tendo em vista a optimização do aproveitamento da água, – a “alma da agricultura” –, que várias vezes provocou litígios, e desentendimentos entre agricultores, moleiros, moradores e senhorios. As acções judiciais movidas ao longo dos séculos XVII e XVIII, nomeadamente entre moleiros e agricultores que clamavam pela água, apresentam um denominador comum: a má distribuição hídrica ou a sua apropriação indevida, que causava prejuízos ruinosos aos autores, requerendo-se, judicial e arbitralmente uma solução justa para o aproveitamento da água. Proferida a sentença, o juiz decidia, em função da prova, das vedorias e visita judicial ao local ou locais de conflito, mas o conteúdo da sentença era, por vezes, posto logo em causa, dando origem a uma demanda judicial, procedimento que se arrastava pelos anos fora em claro prejuízo daqueles que se achavam agravados e em evidente benefício para os que comodamente usufruíam de um bem que pertencia a uma vasta comunidade cujas leiras, campos e quebradas bordejavam as margens do rio Ferreira, e dos prédios instalados para a prática de actividades industriais accionadas pela destreza dos moleiros e capacidade visual dos pisoeiros. A resolução conflituosa, discutida e analisada em sede de direito, acarretava para os litigantes perdedores, custas processuais elevadíssimas, e mais onerosas quando a sentença proferida na casa da Relação do Porto não satisfazia as partes envolvidas, e estas recorriam para a Casa da Suplicação de Lisboa, arrastando-se durante anos, intermediados por mais visitas ao território, à realização de inquirições com a audição de todos os interessados ou aqueles que os representavam, aguardando-se nova sentença, que, pelo que se pôde apurar, continuava a ser a provisória. Os campos as leiras, as herdades e as quebradas não estavam simetricamente colocadas permitindo uma distribuição rigorosa e a contento de todos 319
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
os possessores. A sua geografia desigual fazia com que as propriedades mais distantes fossem penalizadas; os caudais desviados que muitas vezes corriam em canais formados por regos abertos na terra não atingiam o seu objectivo, motivando queixas, porque a falta de água se ressentia na colheita. Os proprietários e os concessionários das terras a montante do caudal do Rio Ferreira eram acusados de apresarem a corrente, desviar a água, em quantidade superior àquela que estava estabelecida, dando, mais uma vez, origem a diferendos, e a novos recursos à justiça para dar a cada um o seu direito. Os moradores de Santo André de Sobrado e de São Martinho do Campo deixaram-nos algumas peças judiciais muito interessantes sobre a repartição da água, força motriz de moinhos e pisoeiros e indispensável para a agricultura1166. Em 1716, no calor da contenda que opunha os moradores de São Martinho do Campo aos de Santo André de Sobrado, foram apontados quatro vectores que elucidam o problema em toda a sua complexidade1167:
definição dos dias para cada giro (sorte); como usar a levada; como deixar a levada; uso da água excedente. A resposta a estes quatro quesitos resolveria, em tese, a questão sobre a gestão da água do rio Ferreira, fonte de sobrevivência ancestral para dezenas de famílias que regularmente repartiam entre si o fluxo hidrográfico. A procura de soluções mais directa e provavelmente mais eficaz assentava nas composições amigáveis, nos acordos firmados pelos interessados porque participavam e intervinham pessoalmente no processo, apresentando os seus argumentos e propostas conducentes à estabilização das relações comarcãs tão importantes para as comunidades rurais. As populações de São Martinho do Campo e de Santo André de Sobrado se se digladiavam judicialmente também sabiam resolver os seus diferendos pacificamente; o período que se estende pelo tempo seiscentista e setecentista mostra que o bom senso podia interferir satisfatoriamente evitando querelas judiciais.
1166 MACHADO, Paula Costa (coord.) (2013) – Aqueduto dos Arcos. Reforçar e recuperar memórias das águas e gentes de Campo. Valongo: Câmara Municipal, pp.23-28. 1167 MACHADO, Paula Costa (coord.) (2013) – ob. cit., p.24. 320
Joel Silva Ferreira Mata
O sistema de repartição da água com fins agrícolas e daqueles que lhe estão associados assentava no sorteio, isto é em “tirar sortes”1168, definindo-se, por um processo aleatório, o tempo semanal, mensal, anual ou por uma determinada época (desde o São João ao mês de Agosto) que cada um dos regantes podia usufruir da água corrente dos rios, regatos, nascentes, represas, fontes ou poças. Em todo o caso, a disputa da água entre os moradores de Sobrado e os de Campo mostra que este procedimento podia ser discutível. Tudo dependia se o ano fosse mais chuvoso ou mais seco, sendo as condições climatéricas determinantes para a maturação dos cereais e, portanto, havia, segundo os lesados, necessidade de se atender a estas especificidades, alegando-se a alteração dos giros que eram atribuídos por sorteio.
Aqueduto do Açude (século XVI), Sobrado. Fonte: M.M.V.
O sistema de “lançar sortes” no território do actual concelho de Valongo mergulha as suas raízes na Idade Média, tornando-se uma prática rotineira, e que muito bem se patenteia em alguns lugares, onde o sistema rotativo do aproveitamento da água, para os campos, estava sob a alçada senhorial, que 1168 MACHADO, Paula Costa (coord.) (2013) – ob. cit., p.25. 321
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
não dispensava conhecer e saber a quantidade de água medida em dias de sorte, que cabia a cada foreiro para as suas leiras. No casal da Agra, em São Mamede de Valongo, os agricultores Sebastião Álvares e mulher Catarina Álvares, e seus sucessores confessaram ao juiz do Tombo do mosteiro das beneditinas de Avé Maria do Porto e ao seu procurador nos finais do século XVI “que tinham estas terras toda a aguoa que vem da Pomte Carvalha em todo o anno livremente pera reguar”1169 e que
“da agoa que vem da fomte da Rua do luguar de Vallomguo tem em cada somana hum dia que he o sabado pera reguar”1170. Neste casal, no campo do Moinho, existiam duas casas, de um só piso, de duas águas, cobertas de colmo, onde os seus possessores exploravam dois engenhos moageiros, um para o trigo e outro para cereal de segunda que utilizavam como força motriz, a água do “ribeiro que vai da Pomte Carvalha”1171. A metade do casal da Vale que possuía Domingos Gonçalves e sua mulher Catarina Martins, formado por cerca de dezasseis terrenos agrícolas entre campos e leiras, recebia a água da presa de Lama, durante todo o ano “meo dia em cada somana pera reguar e “mariar”1172. Outro casal da Vale, que andava no século XVI repartido em duas partes, por sorteio havia estabelecido que os arrendatários tivessem água em todo o ano “as terças feiras de cada somana pera reguar e “marviar” e que da agoa da fomte que estaa o moinho telhado tem toda a dita agoa”1173; à outra
parte do casal agricultado por Francisco Fernandes e sua mulher, coubera-lhe a água proveniente da presa e da Fonte de Lamas, semanalmente “has quartas feiras”1174. Em outro casal cuja cabeça estava em Valongo da Estrada,
repartido por várias unidades tributárias, a água que lhe estava destinada provinha de uma represa do Valado durante meio dia de oito em oito dias
1169 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.16. 1170 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.16.
1171 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fls.14v-15. 1172 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.23.
1173 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.29v
1174 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.31v. 322
Joel Silva Ferreira Mata
“asi como lhe abre ha roda”1175, presa que regava por um período igual, sem se especificar em que dia da semana, as outras partes do casal1176. O casal das casas de Baixo (dois terços), em Valongo da Estrada tinha para a rega do campo da Cortinha, da Senra, da vinha da Vale, do campo dos Vales, da leira da Agra da Senra e de outras parcelas, a água da “fomte da Rua de Vallomguo hum dia em cada somana em todo o anno pera reguar e pera ‘marviar’ tem da dita agoa dous dias cada somana”1177 A outra parte,
de António Gonçalves e mulher, o sorteio ditou-lhe apenas um dia por semana, à quinta-feira1178. O número de propriedades a irrigar era o mesmo; no entanto, o tempo necessário ao primeiro enfiteuta era o dobro daquele que gozava o segundo. A maior ou menor proximidade, a altitude dos terrenos em relação à origem da água eram factores que deviam ter pesado na atribuição, “às sortes” da maior ou menor abundância dos recursos hídricos, e por isso, ao casal da Poça (um terço), em Valongo Susão, na posse de Gonçalo Pires, com mais de trinta unidades, entre campos, leiras, herdades e leirinhas, coube somente um dia por semana, sem qualquer outra indicação1179; a outra parte
titulada por Pedro Dias e Ana Pires, sua mulher, que congregava cerca de vinte e seis parcelas aráveis que incluíam também a bouça da “Laguella” e a bouça de “Allmozejos”, “às sortes” tinha agua da presa de Pias “de cada quinze dias hũa abertura que he hum dia em todo o anno pera reguar somente”1180; as propriedades de Adão Brás gozavam de privilégio idêntico, apesar de explorar um número bastante inferior de prédios rústicos. Da presa de Fontelo recebiam água, as cerca de quinze parcelas, entre leiras, campos e cavadas, que estavam entregues ao arrendatário Francisco Fernandes e sucessores e que pertenciam ao casal da Poça1181; a parte da quebrada do moinho do Eiro, cujo domínio útil pertencia a Gonçalo Rodrigues, num conjunto de sete propriedades, coubera-lhe a água da fonte do Valado, durante três 1175 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.72.
1176 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.72v. 1177 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.77. 1178 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.79. 1179 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.93
1180 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.99.
1181 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.103. 323
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
dias por semana consecutivos: de segunda a quarta-feira, e um domingo de quinze em quinze dias1182. Por sua vez, o casal da Vale estava repartido entre André Gonçalves, Justa Fernandes, viúva, e Afonso António, morador na Pícua, na freguesia de Águas Santas. O primeiro titular declarou que para as suas terras o sorteio havia atribuído dois dias alternados, por semana, à segunda e à quinta-feira, da água proveniente da presa de Lamas1183; mas Justa Fernandes denunciou
António Gonçalves, seu confinante, de lhe desviar a água das suas terras1184. Pobre, sozinha, não teve quem defendesse o seu direito. Contudo, não conseguiu comprovar a sua titularidade, pelo que o licenciado Cristóvão da Costa de Sá lhe concedeu um prazo de dez dias para apresentar a escritura de nomeação que dizia possuir de seus pais que a haviam designado como terceira e última vida de um prazo de média duração; deste mesmo casal, os terceiros declarantes, da Pícua, por seu turno, referiram que a leira na agra da Senra e o campo na agra dos Galegos “não tem agoa nenhũa”1185.
Em São Martinho do Campo, o casal do Rio, emprazado a várias pessoas apartadas entre si, era constituído por vinte e cinco unidade agrícolas, que eram fabricadas por Gonçalo Rodrigues e mulher Graça André tem água de “dezoito em dezoito dias e hum dia e hũa noite todo este casal pera amoerem nele seu pão”1186; as terras do co-titular Lucas Gonçalves recebiam da água
da fonte da aldeia da Quintã, “a quarta parte de hum dia cada somana em todo o anno pera reguar e marviar”1187; além deste período tem direito de dezoito em dezoito dias à quarta parte de um dia e uma noite do moinho de “Sahime” durante o ano inteiro “pera moerem nele seu pão”1188; as irmãs
Maria e Catarina, que eram co-titulares neste casal tinham direito somente a um dia semanal da água da referida fonte1189; o casal do Outeiro, na aldeia homónima recebia, da presa do Outeiro, água para as dezasseis parcelas que 1182 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.111v.
1183 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.115v. 1184 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.117v. 1185 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.118v. 1186 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.160. 1187 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.163. 1188 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.163. 1189 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.165. 324
Joel Silva Ferreira Mata
agricultava Maria Gonçalves, viúva, e outros familiares apenas um dia por semana1190; o casal do Moleiro, na aldeia da Quintã, no qual havia um moinho de três mós, duas alveiras e uma negreira, tinha direito da água da referida fonte um dia, ao sábado, durante o ano inteiro1191 sem qualquer restrição; outros possessores deste casal – António Gonçalves e sua mulher Maria Gonçalves – irrigavam os seus imensos campos e leiras com a água proveniente da presa do Outeiro um dia por semana “asi como lhe cabe com os vezinhos em todo o anno”1192. Nesta mesma freguesia, o casal de Rio Satana, tinha direito à água que jorrava da fonte do lugar da Quintã de forma mais restrita, cabendo-lhe apenas meio dia por semana, à terça-feira1193; nas suas proximidades, o casal do Carvalho, concessionado a Alexandre Dias, viúvo e aí residente, recebia para as dezenas de terras que constituíam a unidade agrícola, água originária da fonte da aldeia da Quintã, às quintas-feiras e também da presa de Linharelho1194. Mapa n.º 2 – Plano de Irrigação da freguesia de Santo André de Sobrado
Legenda: 1. Regadio da Vinha da Balsa; 2. Regadio da Balsa; 3.Regadio da Pesqueira; 4.Regadio do Alto de Vilar; 5. Regadio do Chão da Vinha. Fonte: Sala de Topografia da C.M.V. 1190 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.176v. 1191 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.182v. 1192 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.188.
1193 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.192v. 1194 TT, Mosteiro de S. Bento da Avé Maria do Porto, liv.12, fl.198v. 325
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
A casuística mostra-nos ainda que o casal do Outeiro do Cortinhal d’Além, da aldeia de São Gemil, nesta freguesia de São Martinho também fazia parte do sorteio que havia sido feito para distribuir a água da presa do Outeiro, cabendo-lhe, pois, dois dias por semana, para irrigar os campos do Cortinhal, o campo Longo, os da Senra, da Gestosa de Riba, da Fervença, das Quartas da Vinha e as leiras das Travessas, da agra dos Carvalhos, da Retorta, da Cisterna, das Queiroses, dos Sobreiros, da Cavada e do Lombo. São alguns exemplos que mostram a complexidade do sistema de regadio em algumas localidades do actual território do concelho de Valongo. A partilha da água era vital para a sobrevivência daqueles que dependiam directamente do campo, pela exploração do solo, maioritariamente os cereais, mas também dos produtos hortícolas como o feijão que crescia trepando os caules do milho; ao mesmo tempo que movia os engenhos hidráulicos que moíam os diversos tipos de grãos panificáveis assim como a actividade têxtil que esperava o trabalho dos pisoeiros. A apegação efectuada em 1677 pelos cónegos Francisco Botelho e Diogo Pereira, da Sé portuense, ao casal do Vale em São Mamede de Valongo, que havia vagado por morte de Pedro João, e que deu origem a um novo emprazamento encabeçado por Manuel Lopes, entre as várias parcelas pertencentes à unidade agrária constava o campo das Cancelas que “tem uma prezada de agoa cada somana da preza de Lamas”1195; Esta mesma realidade verificava-
-se também no campo das Pereiras, murado em todo o seu circuito embora fizesse parte do casal cultivado por Gonçalves, picafeijão.
O casal do Escoural, do referido senhorio eclesiástico, foi renovado pelos mesmos cónegos a Pedro da Rocha, embora as suas propriedades andassem em mãos de pessoas diferentes; a devesa, que era cultivada pelo titular principal, tinha uma parte em mato e outra produtiva; estava murada, com suas carvalheiras; por sorteio tinha água da presa de Cima, assim como a devesa que andava repartida entre Belchior Marques e Domingos António, o lagartão, cabendo ao primeiro “três dias de agoa da preza de dentro e meyo dia de agoa cada somana da preza de Cima”1196.
1195 ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.200v. 1196 ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.202. 326
Joel Silva Ferreira Mata
Muito mais tarde, em 1743, a vedoria instaurada ao meio casal do Escoural que então titulava a enfiteuta Ana João, viúva, por Fernando Barbosa de Albuquerque, chantre da Sé do Porto, e por Martinho de Morais Alão, cónego da mesma Sé, foi referido pela viúva que a devesa de Guistelas tinha água “de três em três dias em cada somana e hum domingos de quinze em quinze dias e pelo inverno tem agoa de torna e tornaras que assim lhe chamão”1197. Se esta for a mesma devesa que sessenta e seis anos antes estava nas mãos de Belchior Marques, não há dúvida que houve alterações ao sorteio anterior, que ditou um aumento de dias que agora foram atribuídos.
Aspecto e caudal do rio Ferreira, à entrada da aldeia do Couce. Fonte: M.M.V.
Em Setembro de 1748, a medição e a apegação realizada ao meio casal do Escoural, vago por morte do seu último titular, feita por Miguel da Costa Lima e Melo, tesoureiro-mor da Sé do Porto, e por João de Sousa Lima Alcoforado, arcediago da Régua, com a presença de avaliadores de ambas as partes, registou que a referida devesa de Guistelas tinha água de três em três dias, por semana e um domingo como na outra metade emprazada a Ana João, viúva e “pello inverno detem agoa de torna a torna”1198. Outra devesa,
com o mesmo nome, era regada com a água da presa que existia no interior
1197 ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fls.207v-208. 1198 ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fl.224. 327
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
da propriedade e tinha também direito a meio dia por semana da água da presa de Cima1199. O rio Ferreira foi avidamente explorado devido à sua exposição e condição geográfica pelos senhorios de diversa natureza e mais tarde pelos seus proprietários, não moendo somente para consumo interno das famílias, no âmbito de uma economia tradicional, fechada, lenta e monocórdica. A cerca de duas léguas1200 de distância estava a cidade do Porto com toda uma população vocacionada para os mesteres, para o comércio de longo trato com várias partes da Europa, com as suas elites administrativas e burguesas que, como qualquer grande cidade dependia, quanto aos bens alimentares de primeira necessidade dos concelhos limítrofes que faziam parte do perímetro periurbano e do alfoz; à cidade do Porto chegavam constantemente os almocreves de Valongo que pacientemente transportavam, no dorso dos seus muares, sacas de farinha e de outros produtos que Valongo podia oferecer. Daí que quando a conflitualidade entre possessores dos engenhos moageiros se agudizava, a vereação da urbe portuense procurava intervir no sentido de normalizar a produção, como aconteceu em determinada altura do primeiro quartel do século XVIII, pois as perturbações entre os moradores de Santo André de Sobrado e de São Martinho Campo, pela posse da água, afectavam o abastecimento de farinha às terras vizinhas, da Maia e do Porto1201. Concorrendo com uma mentalidade tradicional, há muito tempo que as forças vivas do sector primário da produção espreitavam a economia de mercado bem patenteado pela presença, por exemplo de Pêro de Oliveira, mercador do trigo da cidade do Porto, documentado em São Mamede de Valongo1202, ponto de encontro entre produtores e comerciantes, acerto de encomendas, das suas quantidades e prazos de entrega. A visita aos moinhos e o trilhar de carreiros e de veredas estava destinado aos almocreves e eventualmente aos mercadores, comerciantes mais abastados que os havia em São Mamede de Valongo.
1199 ADP, Autos de Vedoria 1639-1831, k/26/2/5-64.507, fls.224-224v.
1200 FREIRE, Anselmo Braamcamp (1905) – «Povoação de Entre Doiro e Minho no XVI Século», in Archivo Historico Portuguez. Vol.III. Lisboa, p.259. 1201 MACHADO, Paula Costa (coord.) (2013) – ob. cit., p.25. 1202 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.48.
328
Joel Silva Ferreira Mata
A “comunhão e sociedade das águas”1203 era vital para o progresso e movimentação das dezenas de moinhos instalados no rio Ferreira isolados ou sequenciados uns após outros, mas também para os milhares de hectares que a composição do mosaico paisagístico do ambiente rural matizado de verdes de diversas intensidades e de amarelos espigados que os agricultores, suas mulheres e filhos lavravam com o seu trabalho braçal numa atmosfera marcada pela singularidade do dia e da noite, do calor e do frio, da sementeira, da rega, da sega e do armazenamento num constante vaivém, uma repetição crónica de actividades sujeitas ao ciclo vegetativo.
1203 MACHADO, Paula Costa (coord.) (2013) – ob. cit., p.25. 329
330
Joel Silva Ferreira Mata
III Parte: Os grupos profissionais e a distinção onomástica dos moradores valonguenses
1 – Os mesteirais: produção, comercialização e prestação de serviços 1.1 – Os almocreves O almocreve, também conhecido por azemel, recoveiro, caminheiro ou carreteiro1204, era o indivíduo responsável pela distribuição de produtos das mais variadas origens. Transportava mercadorias pertencentes a terceiros mas o próprio também podia agir como um verdadeiro mercador, ainda que em escala de dimensão mais reduzida. Disso são exemplo Melchior Pires (1591), residente na Rua de Alfena1205, André António (1597), casado com Maria Benta, instante na Rua da Senhora da Luz1206, Manuel Gonçalves (1598), casado com Ana Duarte, que vivia acima da Igreja paroquial de São Mamede de Valongo1207, Gaspar de Penido (1620)1208 ou Mateus de Paiva (1620-1621)1209. 1204 MARQUES, A. H. de (1987) – Nova História de Portugal, Vol.IV, dir. Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques. Portugal na crise dos séculos XIV e XV. Lisboa: Editorial Presença, 148. 1205 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.10v. 1206 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.31v. 1207 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34.
1208 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.152v. 1209 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34.
331
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Melhor do que qualquer outro profissional, o almocreve dominava os meios de transporte terrestres e conhecia todo o tipo de estradas, caminhos, ladeiras, veredas e atalhos, constituindo na expressão já clássica de Borges de Macedo “a coluna vertebral dos transportes internos”1210, designação que parece não convencer Oliveira Marques1211. Não obstante, há, contudo, um conjunto de factores que parecem justificar o entusiasmo do primeiro autor1212, como a facilidade de mobilização, a forte capacidade de adaptação ao solo, a relativa rapidez de deslocação dos animais de carga utilizados no transporte e a deficiente rede viária do País. O almocreve era solicitado para prestar serviços a todo o tipo de individualidades, quer fossem clérigos, fidalgos, mercadores ou funcionários administrativos de índole diversa. Não se considerava empregado por conta de outrem mas dependia de todos para sobreviver.
Almocreves de Valongo. Fonte: Fundo C.M.V.
Não era propriamente um solitário, pois, vulgarmente viajava em grupo, tentando minimizar os perigos que a sua profissão implicava. Desempenhava, por isso, uma actividade de alto risco, pela sua fácil exposição nas estradas longas e ermas, onde o crime espreitava com alguma frequência, resultando, muitas vezes, na morte violenta e a perda do respectivo cabedal mercantil. No século XV existem vários exemplos de brutalidade 1210 MACEDO, Jorge Borges de (1983) – «Almocreves», in Dicionário de História de Portugal, Vol.I, dir. Joel Serrão. Porto: Livraria Figueirinhas, p.120.
1211 MARQUES, A. H. de (1987) – ob. cit., p.148, nota 2.
1212 MORENO, Humberto Baquero (1979) – A Acção dos almocreves no desenvolvimento das comunicações inter-regionais portuguesas nos fins da Idade Média. Porto: Brasília Editora, p.7. 332
Joel Silva Ferreira Mata
e de violência extrema, perpetrada contra os almocreves, como foi o caso de João Afonso Faísca e os seus companheiros de viagem que foram assaltados, espancados e roubados quando transportavam vinho para a cidade de Ceuta1213; em 1456, alguns almocreves que haviam comprado azeite ao cenóbio de Santa Cruz de Coimbra com destino à região de Entre-Douro-eMinho foram atacados por assaltantes que os abordaram com a intenção de os assassinar e roubar-lhes as respectivas cargas1214. Mais próximo geograficamente, Lopo Dias, almocreve de Matosinhos, alfoz da cidade do Porto, que carregava pescado para Viseu, foi vítima de uma emboscada nas proximidades da urbe de destino, ficando gravemente ferido1215. Por sua vez, Pêro
de Ceirol, almocreve de Santarém tombou mortalmente, de noite, às mãos do alcaide de Alcanede1216, ou ainda Álvaro Pais, almocreve que fora assassinado em 1452 por outro almocreve de nome Luís Fernandes, escudeiro do infante D. Henrique1217, entre outros exemplos que podiam ser citados.
A carreira dos almocreves dominava, sem dúvida, o comércio interno do litoral para o interior e vice-versa, já que os animais andavam sempre carregados. Mais do que o boi ou o cavalo, usavam as bestas muares no transporte de mercadorias de média e de longa distância pois “ofereciam uma notável resistência às viagens e muito menos problemas de alimentação”1218, deslocando no seu dorso cerca de cento e dez quilos, correspondentes à carga maior1219.
O território do actual concelho de Valongo era servido por dois grandes eixos viários que, partiam da cidade do Porto: um em direcção ao Minho, e outro a Trás-os-Montes. O primeiro atravessava Ermesinde em direcção 1213 MORENO, Humberto Baquero (1979) – ob. cit., p.36.
1214 TT, Chancelaria de D. Afonso V, Livro 3, fl.88, cit. por MORENO, Humberto Baquero (1979) – ob. cit.,p.36.
1215 TT, Chancelaria de D. Afonso V, Livro 20, fl.42, cit. por MORENO, Humberto Baquero (1979) – ob. cit.,p.37.
1216 TT, Chancelaria de D. Afonso V, Livro 18, fl.38, cit. por MORENO, Humberto Baquero (1979) – ob. cit.,p.37.
1217 TT, Chancelaria de D. Afonso V, Livro 12, fl.8; MARQUES, João Martins da Silva (1988) – Descobrimentos Portugueses. Suplemento ao Vol. I, n.º 221 (1979). Lisboa: INIC, pp.342-343; Monumenta Henricina (1960), Vol. XI. Coimbra, n.º 1161, pp.139-142. 1218 ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de (1968) – Vias Medievais. I. Entre-Douro-e-Minho. Porto: Faculdade de Letras do Porto (polic), p.109. 1219 MARQUES, A. H. de Oliveira (1981) – «Pesos e medidas», in Dicionário de História de Portugal, Vol. V, dir. Joel Serrão, p.71. 333
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
a Alfena progredindo para Carreira, Monte Córdova, Roriz, São Martinho do Campo, Santo Tirso, Begães e Negrelos; o segundo, evitando Ermesinde, passava por Rio Tinto, vindo a desembocar na Portela de Valongo, prosseguindo por São Martinho de Muazares (Penafiel), Cepeda, Santa Marta, Croca, Casais, Ataíde, Rial, Manhufe e Amarante1220; estes foram horizontes geográficos mais abrangentes, no Minho, a cidade Guimarães, e em Trás-os-Montes, a cidade de Vila Real, consoante os trajectos calcorreados. Este podia ser o mapa de itinerários possíveis dos almocreves deste perímetro territorial que certamente não se limitou à carga e descarga de mercadorias de e para a cidade do Porto, embora este tivesse sido o grande pólo de actividade da maioria dos almocreves que viviam e tinham família em Valongo.
A Ponte Medieval de São Lázaro, sobre o rio Leça (Alfena). Fonte: M.M.V.
A zona de conforto de uma grande parte destes viajantes situava-se nos aglomerados populacionais mais representativos de Valongo (da Estrada), em redor ou nas proximidades da Igreja paroquial dando à paisagem social o seu forte contributo já que o almocreve trazia bens essenciais para o dia-a-dia do comum dos habitantes, mas era também a ele que os boticários recorriam quando tinham necessidade de componentes para os medicamentos que pacientemente preparavam para aliviar a dor dos que os procuravam. 1220 ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de (1973) – «A Pobreza e a assistência aos pobres na Península Ibérica durante a Idade Média», in Actas das 1as Jornadas Luso-Espanholas de História Medieval, Vol.1. Lisboa: Instituto de Alta Cultura, pp.39-57. 334
Joel Silva Ferreira Mata
Os almocreves eram também os mensageiros das boas e más notícias, do nascimento do herdeiro ao trono, dos ventos de guerra que constantemente pairavam sobre as populações, traziam as novidades e acicatavam a curiosidade dos potenciais consumidores, o que fazia dele um indivíduo muito respeitado.
Ponte do rio Ferreira, de finais do século XIV, ou inícios do século XV. Fonte: Fundo C.M.V.
Os quadros n.os 40-44 dão uma imagem dos arruamentos mais procurados para o assentamento dos almocreves em Valongo da Estrada. E certamente outros havia, se os registos fossem mais pormenorizados, uma vez que numa boa parte, apenas se anota a designação genérica de “morador em Valongo”. Em todo o caso, além daqueles que fixamos, devido à sua maior persistência, havia também almocreves na Rua do Adro, na Calçada acima do lugar de Valongo, na Rua de São Mamede, na Rua da Calçada, na Rua da Fonte, na Rua da Igreja, ao pé da Escada da Igreja, na rua abaixo da Igreja, no Campo da Senhora, na Rua da Senhora da Luz, acima da Igreja, em frente da Igreja, e na Ponte Carvalha, verificando-se, assim, que a grande maioria residia num perímetro que tinha como elemento referenciador a Igreja paroquial, em torno da qual se desenvolveu um extenso leque de relações de sociabilidade e que, portanto, aglutinava e protegia as populações que preferiam viver de forma concentrada. 335
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 40 – Almocreves moradores na Rua de Santo Antão Ano
Nome
Mulher
1591 1594
Baltasar Gonçalves
Antónia Francisca
1596
Filhos(as)
Fonte
Bento
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 11
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.21
Francisca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 29v
1594
António Gaspar
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 21
1617
Manuel Tomé
Francisca João
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.143
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 152
António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170v
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.161v
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 170v
Antónia
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 171
Elisabete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 176v
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 171
1619 1624
António Manuel
Catarina Antónia
1622 1624
Cosme Fernandes
Maria Martins
João Gonçalves
Maria Gonçalves
1624
Marcos Gonçalves
Benta Gonçalves
1631
António Francisco
Beatriz Gonçalves
1624 1625
1632 1634
António Manuel
Catarina Antónia
1645
Beatriz
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.15v
Margarida
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.22
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63v
1635
Gregório Gonçalves
Maria Gonçalves
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.29
1639
António Martins
Maria Antónia
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42
Quadro n.º 41 – Almocreves moradores na Rua Velha Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Fonte
1590
Manuel Fernandes
Maria Gonçalves
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.6
1590
Gonçalo Gonçalves
Catarina Gonçalves
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.7
1593
Tome Brás
Senhorinha Gonçalves
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.16v
1593
António Gonçalves
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 18v
1616
Domingos Tomé
Maria Gregória
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 138v
1616
António João
Antónia Fernandes
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.138v
1616
Cosme Fernandes
Maria Martins
Cosme
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 139
1618
Domingos Tomé
Margarida Luís
João
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.145
1622
Cosme Fernandes
Maria Martins
António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.161
1624
Domingos Dias
Justa Fernandes
André
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.168v
1634
António Francisco
Beatriz Gonçalves
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25
336
Joel Silva Ferreira Mata
Ano 1636 1643 1636
Nome João Baptista André Dias
Mulher
Filhos(as)
Fonte
Maria Manuel
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.30v
–
Justa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54v
Maria Antónia
João
ADP, E/27/6/1-2.3 ,fl. 34
Quadro n.º 42 – Almocreves moradores na Rua Nova, junto à Igreja paroquial Ano 1591 1592
Nome
Mulher
Sebastião Jorge
Domingas Baltasar
Filhos(as)
Fonte
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.9v
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.15v
1591
Domingos Dias
Maria André
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.10v
1591
João Gonçalves
Antónia Fernandes
Joana
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.10v
1591
Bento Gonçalves
Francisca Brás
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11
1594
Jácome António
Maria Gaspar
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 21
1625
António Tomé
Maria Antónia
Jerónima
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 174v
1626
Brás Álvares
Maria Gonçalves
Luísa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 176
1649
António Francisco
–
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.70
Quadro n.º43 – Almocreves moradores no Escoural Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Fonte
1590
Gonçalo Domingues
Catarina Domingues
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.5
1593
Gonçalo Dias
Catarina Dias
Andresa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 17
1601
António Duarte
Isabel Gonçalves
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.41v
1614
António Gaspar
–
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 80
1614
Bento Fernandes
Maria Gonçalves
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81
1614
Baltasar Gaspar
Maria Francisca
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 81
1615
Tome Gonçalves
Francisca Marcos
Francisca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 83v
1619
Manuel Gonçalves
–
–
ADP,E/27/6/1-2.3, fl.148
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.148v
Pêro Fernandes
Catarina Fernandes
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.156v
Ana
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.180
1620
João Martins
Maria Antónia
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.155v
1635
Paiva? Fernandes
1635
Pero Fernandes
Maria Gonçalves
Águeda
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.28
1636
Bartolomeu da Rocha
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.30
1640
Manuel Martins
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.46v
1619 1621 1627
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.26
337
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º44 – Almocreves moradores à Portela Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Fonte
1616
Bento Gonçalves
Catarina Francisca
Adão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 87
Elisabete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 136v
André
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 153
Francisco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.180v
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.159
Elisabete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.139
Francisco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 139v
Diogo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 151
António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.149
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.168v
1616 1620 1627
Francisco João
Margarida André
1621 1617
Domingos Ferreira
Maria Antónia
André Ferreira
Isabel Gaspar
Domingos Francisco
Maria Antónia
Manuel Dias
Joana André
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 178v
1624
Domingos Ferreira
Maria Antónia
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.169v
1631
Pero Gonçalves
Margarida Gaspar
Pedro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.14
1639
Pero Gonçalves
Margarida Gaspar
António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43
1635
Manuel Dias
Joana André
António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25
Sebastião Dias
Maria Luís
Margarida
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.45v
Sebastião
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.55
1617 1619 1619 1624 1626
1640 1643
Os almocreves de Valongo da Estrada tinham relações estreitas com alguns mercadores da cidade do Porto que tratavam dos seus negócios em Valongo da Estrada e que consequentemente solicitavam os serviços dos almocreves aqui residentes para o transporte de bens deste lugar para a cidade. São identificados Pêro de Oliveira (1615), mercador de trigo, morador ao Terreiro, na cidade do Porto1221, João da Costa, mercador portuense (1641)1222, Jorge Fernandes, mercador de vinhos da mesma cidade1223ou Diogo da Fonseca (1633-1637), natural de Alfena, mas mercador na cidade1224.
1221 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.83v. 1222 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.48.
1223 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49v. 1224 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.19.
338
Joel Silva Ferreira Mata
Igreja matriz de São Mamede de Valongo, pólo de desenvolvimento urbano. Fonte: Fundo C.M.V.
É curioso observar que nas restantes freguesias do actual concelho de Valongo, a menção aos almocreves, para a mesma cronologia é praticamente inexistente ou mesmo nula, que é, de certa forma, uma sinal de uma economia interior, rural, fechada para a auto-suficiência e para a satisfação dos foros que os rendeiros senhoriais vigiavam. Na freguesia de São Martinho do Campo, no assento de baptismo da criança de nome António, foi dado por pai João Martins, almocreve, casado com Ana Benta, da aldeia do Outeiro1225, em 1740. No início do segundo quartel do século XVIII, na freguesia de São Vicente de Alfena, no lugar da Rua, é mencionado indirectamente o almocreve António da Silva, cuja esposa Custódia Duarte baptizou Ana, uma nada-morta, à pressa, e que era filha de António da Silva, o corujo, por alcunha e de Ana Pacheca, moça solteira, do lugar da Ferraria, que o indicou por pai da criança, apesar de ter confessado ter “estado com mais homens”1226. O visado não reagiu à denúncia mas também não perfilhou a criança, sem vida, nem a sua esposa se recusou a prestar auxílio caritativo e cristão, conforme registou o reitor Simão da Cunha Porto.
Este mesmo almocreve, em meados de Outubro de 1727, aceitou criar, em sua casa, Teresa, menina enjeitada e que foi abandonada à porta da residência do reitor Simão da Cunha Porto, por uma mulher na casa dos setenta anos, chamada Maria que, por sua vez, havia sido interceptada por um indi1225 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.184v. 1226 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.48.
339
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
víduo que cavalgando na sua direcção lhe entregou a criança, sob ameaça, e que ainda não estava baptizada. A criança foi recebida pela mulher do almocreve António da Silva para a criar em sua casa1227. Além dos almocreves, sem dúvida, uma das profissões dominantes na freguesia de São Mamede de Valongo, havia outros homens que animavam os circuitos comerciais. Os mercadores, homens do negócio comercial que contratavam aqueles, que pagavam o preço, acertavam as quantidades, corriam todo o tipo de riscos inerentes à actividade mercantil, faziam investimentos, procuravam os produtores, representavam o segmento burguês que mais ganhava neste tipo de actividade, pois era ele que, de certa forma, combinava os diversos factores de produção, desde o fornecimento dos cereais, a moagem, o transporte da farinha, o ajustamento do preço, o armazenamento e a venda a retalho ou por grosso, transportando os artigos para mercados mais longínquos e mais lucrativos do que os da cidade do Porto ou de outros lugares da periferia. Em 1601, identificamos o vendeiro André António domiciliado na Rua da Senhora da Luz, na freguesia de São Mamede de Valongo que era simultaneamente um mercador1228, e em 1756, residia nesta mesma freguesia, o
mercador Domingos Marques, casado com Águeda Antónia, e pai de Helena Marques, por sua vez, casada com António Fernando das Neves1229. A presença de mercadores na freguesia de São Vicente de Alfena, ainda que por motivos de cortesia, está patente em 1730, com a identificação de Veríssimo de Sousa e de João Gomes Leite, ambos mercadores da Rua das Flores, na cidade do Porto, que vieram a esta freguesia por ocasião do baptismo do filho de Francisco António e de Maria Pereira, moradores no lugar de Pedrouços de Transleça1230.
Mais pobres e hierarquicamente inferiores aos almocreves, estavam os albardeiros que sendo poucos não deixavam de oferecer os seus serviços transportando, em menor quantidade, mercadorias para curta distância. No século XVIII e também no pólo comercial de São Mamede de Valongo resi1227 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.50.
1228 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.44v.
1229 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.122. 1230 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.56.
340
Joel Silva Ferreira Mata
diam dois albardeiros: António Marques que foi padrinho de um filho de José Marques das Neves e de Maria Álvares1231, em 1744, e Manuel Marques, casado com Ana de Sousa, pais de Maria Marques, por sua vez, casada com António Jorge da Malta1232. Esquema genealógico da família do albardeiro Manuel Marques
Fonte: ADP, E/27/6/1-4.2, fl.131v.
Ligados ao mar e ao transporte de mercadorias ao serviço de um patrão ou sob o comando de um mestre de navio, moravam em São Mamede de Valongo vários mareantes que aí constituíram as suas famílias: Domingos Fernandes, e sua mulher Ana de Sousa que nesta freguesia tiveram seus filhos Mariana, André, Eufémia e novamente outra Eufémia1233; Manuel João (1720), casado com Luzia Gonçalves1234, avô de Isabel e pai de João Álvares que preferiu seguir a profissão de barbeiro1235; António Fernandes, tinha um filho chamado João Álvares, solteiro1236, em 1729; Manuel João, casado com Ressurreição da Rocha, pai de dois filhos entre 1747 e 1749: José e Ana1237; e João Álvares, casado com Ana Dias Lopes1238.
1231 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.22v.
1232 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.131v.
1233 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.74v, 108, 122, 121 e 121v. 1234 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.145. 1235 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.21v.
1236 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.262v.
1237 ADP, E/27/6/2-5.1, fls.97 e 129. 1238 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.129.
341
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
1.2 – Os moleiros A maior parte dos profissionais arrendatários que exploravam os engenhos com uma ou mais moendas, trigueiras, de cereais de segunda ou de mistura, pertenciam ao grupo dos agentes económicos mais importantes do território valonguense, nomeadamente os que estavam ligados ao abastecimento à cidade do Porto, mais autónomos, mas também os que trabalhavam em moinhos senhoriais. Por outro lado, a multiplicação de moinhos traz novas gentes, injectava maior quantidade de moeda em circulação e permitia o seu aforramento, dando uma maior capacidade financeira aos agentes económicos e levava a uma maior ocupação do território humanizado, e a criação de uma “burguesia” endinheirada que dominava uma das actividades mais importantes da região. O rio Ferreira, que nasce em Freamunde, atravessa várias freguesias valonguenses, recortando no seu percurso pequenos vales, que eram aproveitados empiricamente para a cultura de cereais que cresciam graças a sistemas simples de irrigação com a água fluvial; tinha percursos suaves, e deslizantes; apresentava outros troços que desciam de forma abrupta e barulhenta as encostas dos montes, desenvolvendo caudais e quedas de água que estimulavam o engenho e a arte dos valonguenses e a cobiça dos agentes senhoriais com interesses neste imenso território. Neste ambiente de contratastes morfológicos, a paisagem natural foi sabiamente perturbada pela acção humana que soube aproveitar, de forma eficaz, a energia hidráulica para o seu bem-estar, introduzindo, inicialmente e por imposição dos senhores do domínio útil algumas unidades moageiras numa atmosfera medieval e servil que mais tarde tenderia para a individualização dos seus proprietários e iria assumir contornos mais amplos e de uma visão capitalista pela optimização destes meios de produção com características singulares, dando aos moleiros foros de um novo estatuto, já diferenciado profissionalmente, ainda que pouco reconhecido na hierarquia dos mesteirais. No rio Ferreira foi construída uma vasta “rede de moinhos” individualizados, distantes e isolados entre si, ainda que não tivessem sido coevos uns dos outros, assim como, em menor grau, alguns núcleos formados por vários 342
Joel Silva Ferreira Mata
moinhos como o interessante conjunto dos Moinhos do Cuco, a montante da pitoresca aldeia do Couce. Os moinhos e as azenhas, em qualquer perímetro habitacional “representavam o sistema axial da indústria moageira do país na Idade Média”1239,
conceito que facilmente se desenrola ao longo das centúrias subsequentes até à chegada das moagens industriais recentes, que ditaram o abandono e desolação dos moinhos do concelho de Valongo, não só nos do rio Ferreira mas também do rio Leça e de outros de menor escala, de produção sazonal, em especial nos meses chuvosos que permitiam caudais suficientes para mover os engenhos de enxurrada.
Moinho do Abade no rio Leça (Ermesinde). Fonte: Fundo C.M.V.
O acervo documental compulsado é pouco esclarecedor sobre informações fundamentais para compreendermos como funcionavam os engenhos propriamente ditos mas também toda a sua contextualização, tanto humana como estrutural, nomeadamente o horário de funcionamento, a dimensão sociológica dos seus responsáveis e trabalhadores1240; se nestes lugares espreitava o pecado1241, como parece ter acontecido. Com efeito, na freguesia de São Mamede de Valongo, Maria, solteira, por alcunha, a gordelha, foi mãe 1239 MARQUES, A. H. de Oliveira (1978) – Introdução à história da agricultura em Portugal, 3ª edição. Lisboa: Edições Cosmos, p.192. 1240 MATA, Joel [Silva] Ferreira (2016a) – ob. cit., p.156.
1241 LE GOFF, Jacques (1982) – A Civilização do ocidente medieval. Lisboa: Editorial Presença, pp.73-74. 343
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
de Maria, cujo baptizado ocorreu em 28 de Julho de 1638, cinco dias após o seu nascimento. Deu, nessa altura, por pai, João Pêro, o novo, moleiro, filho de João Pêro, o velho, também moleiro, cuja denúncia foi corroborada por Cosme, solteiro, filho de Cosme Fernandes, almocreve e assim foi considerado pelo vigário Manuel Marques Fortuna que procedeu ao seu registo no Livro dos Assentos dos Baptizados1242. Podia ter sido um caso em que a jovem mãe tenha sido atraída ao moinho ou então frequentar o engenho para trocar os cereais por farinha; por exemplo, nos Açores, as mulheres estavam proibidas de frequentarem livremente os moinhos1243; saber se tinham terrenos anexos destinados à pastagem dos animais de carga1244. Outra questão de
extraordinária importância tem a ver se, efectivamente, em Valongo havia engenhos de laboração sazonal que podiam intensificar a sua actividade nos meses mais chuvosos. O moinho construído no monte dos Carvalhos, no casal da Vale, na freguesia de São Mamede de Valongo, encabeçado por Gonçalo Fernandes e mulher Catarina Fernandes, em parceria com Francisco Fernandes, casado com Maria Fernandes “tem mais do enxurro pera reguar e ‘marviar’ o campo do moinho telhado”1245. Todas estas variáveis têm o seu interesse, uma vez que os moinhos constituem uma fonte de rendimento assinalável para os seus possessores1246.
1242 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40v.
1243 ENES, Fernanda (1988) – «Poder político “versus” poder religioso na vida paroquial (os Açores na época medieval)», in Jornadas Sob Formas de Organização e Exercício dos Poderes na Europa do Sul, Séculos XIII-XVIII. Lisboa: História & Crítica, p.806.
1244 MATA, Joel Silva Ferreira (2013) – «O Património construído e fundiário da comenda de Noudar», in Comendas das Ordens Militares: perfil nacional e inserção internacional. Noudar e Vera Cruz de Marmelar, coord. Luís Adão da Fonseca. Militarium Ordinum Analecta. Fontes para o estudo das Ordens Religioso-Militares. Vol.17. Porto: Cepese/ Fronteira do Caos, p.170. 1245 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.29v.
1246 ASCASO SARVISE, Lourdes (1986) – El Monastério cisterciense de Santa Maria de Casbas (1173-1350). Huesca: Instituto de Estudios Alto Aragoneses, p.75. 344
Joel Silva Ferreira Mata
Moinho, em ruínas, no rio Leça, em Alfena. Fonte: M.M.V.
No território do actual concelho de Valongo, a realidade é bem diferente. A actividade no interior dos moinhos também podia ser desenvolvida por mulheres. À entrada do segundo quartel do século XVIII, Maria Antónia, viúva, mãe de Domingos é reconhecida como moleira1247, assim como Maria Duarte, que em 1734 foi madrinha de baptismo de um filho de Manuel de Afonseca Loureiro e de Maria de Afonseca, moradores na Rua Nova, em Valongo1248, havendo certamente outras mulheres que sucediam nos prazos a seus maridos. O titular Santos Afonso, casado com Maria Gonçalves que morava, em 1593, no casal do Moleiro, na aldeia da Quintã, em São Martinho do Campo, tinha instalado no campo da Goiva, um moinho colmado que devia partilhar com a esposa todo o conhecimento na arte de transformar o cereal alvo e negreiro1249. Na última década da centúria de Quinhentos o mesmo devia acontecer a Isabel Gonçalves, mulher de Gonçalo Rodrigues, moradores na Rua Velha de Valongo, que por essa altura partilhavam o moinho do Eiro, com Isabel Duarte, viúva, também domiciliada na Rua Velha1250.
1247 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.173v e 175v. 1248 ADP, E/27/6/2-5.1, fl.31v.
1249 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.181v. 1250 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.110. 345
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
A moleira de Valongo. Fonte: Fundo C.M.V.
O moleiro trabalhava, por regra, em ambiente solitário, hermético ao som monocórdico da trituração e da passagem da água, descarregando grão e recolhendo a farinha, inserido num espaço mental muito redutor. Do moleiro dependia a moagem de cereais para a panificação alva ou “negreira” consoante o tipo e a proporção dos grãos que eram misturados. No casal do Agro, na freguesia de São Mamede de Valongo, no declinar do século XVI, Francisco Gonçalves e mulher Catarina Antónia, entre outras parcelas de terra que trabalhavam, consta o campo do Moinho no qual existiam duas casas térreas e colmadas, e em cada uma delas haavia “hum moinho alveiro e outro negreiro”1251, que confrontavam com o ribeiro “que vai da Pomte Carvalha”1252 e com “o rosio do lugar de Vallomguo”1253. Uma parte do produto do seu trabalho destinava-se ao consumo da casa, outra, porém, mais significativa, era entregue nas mãos dos rendeiros dos magnatas fundiários geralmente conhecidos por senhorio tanto laicos – os senhores das quintãs, dos solares e dos paços – com eclesiásticos, contando-se no território do actual concelho de Valongo o bispo e o cabido da Sé do Porto, os comendatários, priores e prioresas dos múltiplos cenóbios masculinos e femininos que detinham parcelas patrimoniais de pendor agrícola adstritos a um concessionário alienadas, para sempre, ou em gerações. Muitas unidades passaram muito mais tarde para as mãos dos particulares que deram um sentido eminentemente capitalista aos moinhos, rentabilizando e multiplicando os engenhos em função das solicitações face ao desen1251 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.14v. 1252 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.15. 1253 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.15. 346
Joel Silva Ferreira Mata
volvimento demográfico da cidade do Porto, sobretudo a partir dos finais do século XVIII.
Moinho de vento, na serra de Santa Justa, próximo da capela de Nossa Senhora dos Chãos (Valongo).
Fonte: Fundo C.M.V.
Já referimos que no primeiro quartel do século XVII aparece referenciado um certo Pêro de Oliveira, mercador do trigo, morador na cidade do Porto1254; entre 1633 e 1637 surge, por diversas vezes, como padrinho de várias crianças de Valongo; o mercador Diogo Fernandes, natural de Alfena, mas a exercer a sua actividade comercial na urbe portuense1255, e Jorge Fernandes que estava domiciliado junto da porta de Cimo de Vila, da referida cidade1256, que em 1644 aparece descrito como mercador de vinho da cidade1257; mas havia outros como Veríssimo de Sousa1258 e João Gomes Leite1259. Nos dois eixos fluviais principais que atravessam o território do actual concelho de Valongo são ainda visíveis, por entre campos e leiras cerealíferas, entrecortadas aqui e além, por ramadas de vinha branca e tinta, cons1254 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.83v.
1255 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.19, 32v, 33v e 36. 1256 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49v. 1257 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.58.
1258 ADP, E/27/4/2-6.1, fl. 56. 1259 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.56.
347
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
truções feitas em blocos de granito de grão médio, na forma rectangular que outrora foram moinhos, de onde saía parte da farinha para o pão da mesa dos pobres, dos senhores, dos comendatários, das abadessas e das religiosas conventuais, dos rufias que pululavam pela cidade do Porto, dos vadios e dos presos que eram auxiliados pela Confraria da Santa Casa da Misericórdia do Porto1260. A maioria destas engrenagens artesanais de grande fôlego produtivo desapareceu; outras porém, permaneceram no mesmo sítio, escondidas ou perdidas na paisagem, abandonadas, sujas, com as suas paredes que antigamente estavam empoeiradas de farinha e de teias de aranha balbuciantes, permanecem agora apenas com a parte da estrutura inferior, sem portas e janelas, sendo visíveis ainda alguns pedaços de madeira junto das dobradiças. Do tecto pendem grossas traves num circular tosco já apodrecidas, que nos tempos áureos suportavam o telhado, primeiramente em colmo e depois em telha vã. Alguns tiveram mais sorte. Junto de zonas de lazer e de espaços comuns e colectivos, como nas imediações da capela de São Lázaro, na freguesia de São Vicente de Alfena. O moinho que lhe está próximo foi melhorado e aproveitado para a restauração. O sítio dos antigos lázaros, é hoje um lugar extraordinariamente aprazível, onde a memória dos gafos não incomoda.
Moinho de São Lázaro, da Gafaria de Alfena. Fonte: M.M.V. 1260 AHSCMP, Livro da Receita e Despesa. Série L, B.co 1, n.º 4. 348
Joel Silva Ferreira Mata
O património construído, corroído pelo tempo, pelo abandono e incúria dos homens mostra que, de facto, nos anos e nos séculos de antanho a força do braço e a teimosia cerebral de umas largas dezenas de foreiros e de suas mulheres trabalharam e pagaram as suas rendas e impostos sobre o rendimento dos moinhos, considerados quer como unidades de produção autónomas quer integradas num património mais vasto, isto é, num casal. Estes homens constituíam famílias e quando nascia um filho, era baptizado poucos dias depois. Este acto dava sempre lugar a um encontro familiar, mais alargado, e era ao mesmo tempo um dia de festa que conduzia ao fortalecimento e à criação de laços e a redes sociais entre os membros da localidade, e de outros do exterior que participavam no festejo. Quadro n.º 45 – Moleiros de Valongo (1615-1629) Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
1615
Francisco João
Maria Antónia
Maria
Escoural
ADP, E/27/6/12.3, fl. 85
1616
Simão Alvares
Maria Marcos
António
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 85v
1616
Domingos
–
Ana de Prado
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 86
1617
Francisco António
Maria Antónia
Manuel
Junto da Igreja
ADP, E/27/6/12.3, fl. 141
1617
Belchior Manuel
Maria André
Maria
Rua Velha
ADP, E/27/6/12.3, fl. 141
1617
João Pero
–
–
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 142
1618
Simão Álvares
Maria Marcos
Sebastião
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 145
1619
Francisco João
Maria Antónia
Manuel
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 148
1619
Elisabete João Pêro
Isabel Duarte
Elisabete
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 150v
1620
Belchior Manuel
–
–
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 156
1621
Francisco João
Maria Antónia
Maria
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 160
1623
Gonçalo Martins
Francisca João
Justa
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 163
349
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
1623
Belchior Manuel
Maria André
Manuel
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 164
1624
João Pêro
Isabel Duarte
Ana
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 170
1625
Miguel Santos
Jerónima João
Jerónima
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 174
1626
Francisco António
Ana de Prado
Ana
–
ADP, E/27/6/12.3, fl. 175v
1627
João Pêro
–
–
Valongo Susão
ADP, E/27/6/12.3, fl. 182
O critério metodológico seguido não é homogéneo; há párocos que introduzem diversas anotações de interesse relevante, mas há outros que fixaram o acontecimento sob a forma de ementa, isto é, um registo simplificado. Na freguesia de São Mamede de Valongo, foram muitos os moleiros que deixaram o seu nome associado à respectiva profissão. Francisco Manuel, casado com Maria Antónia, em data anterior a 1615, vivia no Escoural, junto da igreja paroquial; teve quatro filhos: Maria (1615), Manuel (1617) outro Manuel (1619) e novamente uma menina chamada também Maria1261, em 1621. Outros como João Pêro, casado com Isabel Duarte tiveram duas crianças do sexo feminino: Elisabete (1619) e Ana (1624)1262, desconhecendo-se o seu domicílio no interior do perímetro da freguesia de São Mamede de Valongo. Quadro n.º 46 – Moleiros da freguesia de São Mamede de Valongo (1615-1627) Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
Maria
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 85
Manuel
Junto da Igreja
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 141
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 148
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 160
Abaixo da Igreja
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 85v
1615 1617 1619
Francisco João
Maria Antónia
1621 1616
Simão Alvares
Maria Marcos
António
1616
Francisco António
Ana de Prado
Domingos
1261 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.85, 141, 148 e 160. 1262 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.150v e 170.
350
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 86
Joel Silva Ferreira Mata
Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
1617
Belchior Manuel
Maria André
Maria
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 141
1618
Simão Álvares
Maria Marcos
Sebastião
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 145
João Pêro
Isabel Duarte
Elisabete
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 150v
Ana
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 170
1623
Gonçalo Martins
Francisca João
Justa
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 163
1623
Belchior Manuel
Maria André
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 164
1625.09.13
Miguel Santos
Jerónima João
Jerónima
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 174
1626.01.27
Francisco António
Ana de Prado
Ana
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 175v
1627.12.16
João Pêro
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 182
1619 1624
Além dos padrinhos, a partir de certa altura, começariam a aparecer as testemunhas tanto masculinas como femininas. Os moleiros convidavam outros profissionais ou seus familiares, podendo ser do mesmo ramo de negócio ou não. Belchior, homem solteiro, filho de Belchior Manuel, moleiro, esteve presente no baptismo de Maria (1630), filho de Jerónimo Martins e sua mulher, acto que esteve a cargo do vigário Manuel Marques Fortuna1263; o lavrador Sebastião Gonçalves, conhecido por “o rocha” e sua mulher Ana João, moradores em Valongo Susão, convidaram, João, solteiro, filho do moleiro João Pêro1264. Em 1629, o moleiro Francisco António e mulher Ana do Prado tiveram por madrinha do baptizado de António, seu filho, Maria Manuel, mulher de Domingos António, almocreve1265. Em 1636, o moleiro António João, casado com Domingas Gonçalves, moradores no Escoural, chamaram Belchior Manuel, também moleiro1266, para um acto semelhante; Belchior Manuel, o novo, colega de profissão1267 de Domingos António (1633) que participou na primeira cerimónia cristã do filho, ou Domingos Manuel e mulher Maria André que atraíram ao convívio João Pêro, o novo, 1263 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.24v. 1264 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25v. 1265 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.4.
1266 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.32v. 1267 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.37.
351
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
moleiro e para madrinha Maria, filha de Bartolomeu António, vendeiro, pequeno comerciante da freguesia de São Mamede de Valongo1268. Por sua vez Belchior Manuel, o novo, já referido, casado com Maria André teve por madrinha do baptizado de Belchior, seu filho, Justa, por sua vez, filha de Santos Fernandes, alfaiate, à época viúvo de Maria Antónia1269. Quadro n.º 47 – Moleiros de São Mamede de Valongo (1629-1646) Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
1629
Francisco António
Ana do Prado
António
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.4
1634
Belchior Manuel
–
Belchior
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.24v
1635
Domingos Martins
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25
1635
João Pêro
Isabel Duarte
João
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25v
1635
Domingos Martins
Maria João
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.26, 35v
1636
João Pêro
Isabel Duarte
João
1636.09
Belchior Manuel
–
–
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.32v
1638
João Pêro, o novo, filho de João Pêro, o velho, também moleiro
–
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40v
1639
Domingos Martins
Maria João
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42
1641
Domingos Martins
–
–
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.48v
1641
Belchior Manuel, o novo
–
Lourenço
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50
1643
Damião Manuel
Catarina André
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54
1643
Belchior Manuel, o novo
Maria André
Belchior
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54v
1268 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42v. 1269 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54v. 352
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.32
Joel Silva Ferreira Mata
Ano
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
Domingos André
Maria Gonçalves
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.56v
Domingos
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63
1643
Belchior Manuel
Maria André
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.57
1644
Domingos Martins
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.61
1646
Belchior Manuel
Maria Antónia
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.64v
1646
Domingos Martins
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.64v
1643 1645
Nome
Na freguesia de São Vicente de Alfena são conhecidos vários moleiros desde o início do século XVIII, como Domingos Gonçalves, do lugar da Rua que havia sido, em 1718, padrinho de Maria, filha de Manuel Moreira, ferreiro, casado com Maria Moreira, também domiciliados na mesma rua1270; Domingos Gonçalves, casado com Maria Carneira que por altura do baptizado do filho Domingos1271 em Setembro de 1723, e mais tarde, em 1733 é referido como moleiro da Azenha1272; do lugar da Codiceira, regista-se o moleiro Manuel Gonçalves, em 1722, inscrito no Livro dos Baptizados, como padrinho de Josefa, filha de José Vicente e de Maria Miguel1273. Quadro n.º 48 – Moleiros de São Vicente de Alfena Ano
Nome
Morada
Fonte
1689
Manuel Fernandes
Rua
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.66
1710
Domingos Gonçalves, moleiro nos moinhos de Pantaleão Pacheco
–
ADP, E/27/4/2-5.2, 127
1710
Maria João moleira nos moinhos de Pantaleão Pacheco
–
ADP, E/27/4/2-5.2, 127
Na freguesia de São Martinho do Campo encontramos moleiros que eram dependentes de indivíduos que não exerciam a mesma profissão e tinham um estatuto social mais elevado, como era o caso de Cristóvão,
1270 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.23-23v. 1271 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.39v.
1272 ADP, E/27/4/2-6.1, fls. 67 e 68v. 1273 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.34.
353
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
moleiro, criado de António Manuel, morador na aldeia de São Gemil1274. Por outro lado, o contrário também acontecia. Havia, com efeito, moleiros que tinham, em sua casa, dependentes, como constatamos com Álvaro Pires, que em 1594, tinha ao seu serviço o criado Silvestre, na aldeia de Luriz1275, cujo registo se prolonga até 1599. Da primeira metade do século XVII identificam-se outros moleiros como António Álvares, Diogo, e Sebastião Afonso, o moleiro1276. Em meados do
século XVIII foi abandonada uma criança do sexo masculino à porta da casa do moleiro António da Silva, residente na aldeia de Balselhas, que resolveu baptizar o enjeitado, dando-lhe o nome de Joaquim1277, desconhecendo-se o destino que foi dado ao infeliz. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, atravessada pelo rio Leça, havia várias unidades moageiras sobretudo na área da Travagem, que laboravam pelo menos desde os primórdios do século XVII. Em 1605 documentamos o moleiro Gonçalo Gonçalves que nessa data baptizou seu filho Lourenço1278,
e nove anos depois foi padrinho do mesmo acto sacramental ministrado a Vanessa, filha de Frutuoso António e de Catarina Gonçalves e, Gonçalo João, todos moradores nesta freguesia, como afirma e declara o abade Miguel Valente1279. Da primeira metade do século XVIII, documenta-se um moleiro Tomé João padrinho de uma filha de Manuel Martins e de Maria Antónia, moradores na freguesia de São Lourenço1280. No início do século XIX, em 1807, surge José da Silva e sua mulher Maria Ferreira “assistente nos Moinhos de Travage”1281 que foram pais em Junho desse mesmo ano. Este casal de moleiros vivia no prédio que desempenhava a função produtiva e de habitação, desconhecendo-se, porém, se havia junto do edifício alguma área descoberta destinada a almuinhas, hortas, aidos ou terrenos de pasto destinados aos animais de carga, enquanto aguardavam os carregamentos.
1274 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.7.
1275 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.15v.
1276 ADP, Dep. G., fls.26, 36 e 49.
1277 ADP, E/27/4/3-10.1, fls.216-216v. 1278 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.20v. 1279 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30. 1280 ADP, E/27/4/4-15.1, fl.84. 1281 ADP, E/27/4/4-15.2, fl.30. 354
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 49 – Moleiros da freguesia de São Lourenço d’Asmes Ano
Nome
Morada
Fonte
1605
Gonçalo Gonçalves
–
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.20v.
1614
Gonçalo João
–
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30.
1723
Tomé João
–
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.84.
1807
José da Silva
Moinhos da Travagem
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.30.
Já na freguesia de Santo André de Sobrado vivia, em casa do moleiro José João, um certo António, solteiro, que deveria trabalhar para o primeiro1282, sendo por isso, seu dependente, ou criado.
Em alguns casos, a profissão de moleiro passou de pai para filho como, por exemplo, João Pêro, o novo, filho de João Pêro, o velho, ambos moleiros na freguesia de São Mamede de Valongo1283. O moleiro durante séculos não era apenas um profissional que transformava somente o grão em farinha. Era sobretudo um agricultor mais completo que, juntamente com a mulher titulava uma escritura enfiteutica que lhe conferia a pose agrícola de um conjunto de propriedades sob a designação geral de “casal” cuja renda global incidia sobre o trabalho agrícola e o trabalho complementar do moinho. Assim, em 1593, foi requerido pelo licenciado Cristóvão da Costa de Sá e pelo procurador Gonçalo de Araújo o título das propriedades do casal do Moleiro, na aldeia da Quintã, na freguesia de São Martinho do Campo, tendo comparecido, à citação, Santos Afonso, moleiro e sua mulher Maria Gonçalves, moradores no referido casal que prontamente identificaram todas as parcelas. O título de posse não foi exibido “por lhes fiquar de seus amtecessores”1284. Os titulares indicaram cerca de três dezenas de pequenas
parcelas, a estrutura habitacional, o campo do Forno, do Linharelho, do Arnado, da Estrada, as leiras do Castanheiro, da Retorta, do Campo, da Pena, da Cortinha, do Morteiro, de Linhares, das Cortinhas, e a leira no Linhar Pequeno. Além destas terras dispersas, o foreiro Santos Afonso abriu a porta de um moinho localizado no campo da Goiva que confinava com 1282 ADP, E/27/4/5-20.2, fl.16. 1283 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40v.
1284 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fl.182v. 355
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
o rio de Ponte Ferreira, constituído por “três moendas duas alveiras e hũa negreira”1285, razão pela qual a agricultura e a moagem de cereais eram consideradas actividades complementares. Quadro n.º 50 – Moleiros da freguesia de São Martinho do Campo Ano
Nome
Fonte
1591
Cristóvão
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.7
1594
Álvaro Pires
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.12
1619
António Álvares
ADP, Dep. G, fl.16
1627
Diogo
ADP, Dep. G, fl.36
1630
Santos Afonso
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.9v
1633
Belchior Pinto
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.20v
1638
Sebastião Afonso
ADP, Dep. G, fl.49
1761
António da Silva
ADP, E/27/4/3-10.1, fls.216-216v
Também dos finais da centúria de Quinhentos, foi referenciado o casal do Agro, na freguesia de São Mamede de Valongo que, em 1593, estava na posse de Sebastião Álvares e de sua mulher Catarina Álvares, sucessora de sua mãe Ana Borges1286 que havia sido repartido com Francisco Gonçalves e mulher Catarina Antónia. Entre as diversas propriedades pertencentes a este casal, foi identificado o campo do Lameiro, da Chousa, da Cancela, da Ponte Carvalha, do Lameiro, da Veleira, do Redondo, e outras parcelas, assim como o campo do Moinho com duas casas cobertas de colmo, tendo cada uma “hum moinho alveiro e outro negreiro”1287. Assim, agricultor e moleiro fundem-se numa só pessoa, numa actividade que se complementa para a sobrevivência dos que habitavam a unidade campesina mas também daqueles que esperavam o tempo das rendas para uso das casas senhoriais e para a comercialização dos excedentes com o objectivo de realizarem moeda, tão necessária para a aquisição de outros bens essenciais.
1285 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.182. 1286 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.16.
1287 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.14v. 356
Joel Silva Ferreira Mata
1.3 – Os padeiros e as padeiras À actividade da moagem nos engenhos hidráulicos sucedia-se a panificação entregue nas mãos competentes dos homens e das mulheres tanto de São Mamede de Valongo como de São Vicente de Alfena, como de outras localidades cuja relevância não se insere no propósito da comercialização directa com a cidade do Porto. O interesse pelo fabrico de pão, de qualidade insuspeita, sabor, conservação e apresentação, deve ter despertado primeiramente o interesse da abadessa D. Guiomar de Ataíde, da prioresa Isabel de Araújo, da subprioresa Leonor Pimenta e da freira barreta Maria Brandão1288, que, na esteira das
conventuais que as antecederam, em finais do século XVI, mandaram fazer o arrolamento das suas propriedades senhoriais, exploradas por dezenas de camponeses e alguns moleiros, para actualizar as rendas, descarregadas no celeiro do mosteiro, na cidade do Porto, e terão aberto o caminho para a divulgação do pão nomeadamente de São Mamede de Valongo.
A relação entre as profitentes do hábito beneditino ganhou foro de defesa pública e cível no início do século XVIII quando as freiras saíram a terreiro em defesa das padeiras valonguenses, prejudicadas pela deliberação tomada na sessão de 13 de Agosto de 1803, pois as mulheres obreiras “forão mandadas despejar fazendo as ir para a Praça Nova1289. O monacato femi-
nino pediu o regresso das vendedeiras para o Largo da Feira, argumentando que a sua presença animava o comércio de bens de primeira necessidade e, ao mesmo tempo, socializavam um espaço com particular interesse para as religiosas, pela visibilidade que davam ao cenóbio, concluído em 15371290, e portanto, era já “de tempo antiquíssimo [que] vendem o pão no largo do terreiro da feira difronte do seu mosteiro”1291.
É, pois, possível que esta tenha sido uma das portas de entrada para a valorização e comercialização do pão de Valongo, na sua confecção diferenciada e que despertou rapidamente o interesse da Vereação da cidade do Porto, institucionalizando-se, a partir do século XVII, o abastecimento de 1288 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv.12, fl.36v. 1289 ADP, Fundo Monástico, cx.4745, docs. divs.
1290 ADP, Mosteiro de São bento de Avé Maria do Porto, liv. n.º 4674, fl.6v. 1291 ADP, Fundo Monástico, cx.4745, docs. divs.
357
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
pão levado nas canastras das padeiras e no dorso dos animais conduzidos silenciosamente pelas dezenas de almocreves que muitas vezes venciam as “duas legoas”1292 que separavam Valongo do Porto, na companhia das mulheres que se dedicavam à venda do pão. A freguesia de São Vicente de Alfena, desde a segunda metade do século XVI, também concorria com o seu pão e as padeiras para o abastecimento da urbe. Em 1577, várias profissionais prestaram juramento e foram licenciadas pelo juiz competente da cidade do Porto, para poderem exercer livremente a sua actividade sob a condição de que “se obrigavam a lhe não faltar pão cozido com pena de pagar por cada vez que forem compemdidas cada hũa delas quinhentos reis”1293. A freguesia de São Mamede de Valongo irá impor-se no comércio do pão com a cidade dado a sua posição estratégica e hidrográfica beneficiando directamente dos engenhos do rio Ferreira, cujo estatuto de parceiro comercial (produtor) estava de acordo com a “grandeza e população desta freguesia que he huma das mayores e mais povoadas”1294. Na verdade, Valongo era, em 1836, o concelho menos povoado na sua área de inserção.1295
No ocaso do século XVII e início do século XVIII, esta freguesia “era progressiva e arruada, caracterizada pelos seus almocreves e padeiras, o que mostra que o desenvolvimento fora alcançado pela almocrevaria e pelo fabrico daquele alvo e excelente pão (as famosas ‘roscas de Valongo’)”1296. Esta tendência parece ser anterior como se infere do levantamento dos diferentes profissionais desde os finais do século XVI. Para responder às necessidades religiosas, os valonguenses reclamaram a construção de uma igreja matriz mais espaçosa, mais adequada ao progresso populacional, porventura mais moderna, cunhando precisa1292 FREIRE, Braamcamp (1905) – ob. cit., P.259.
1293 CRUZ, António (1967) – Algumas observações sobre a vida económica e social da cidade do Porto nas vésperas de Alcácer Quibir. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p.LIII; publ. MOREIRA, Domingos A.; CARDOSO, Nuno A. M. (1973) – ob. cit., p.42.
1294 AZEVEDO, Maria José Coelho (1999) – A Igreja matriz de Valongo. Arquitectura (17941836). Porto: Faculdade de Letras (polic.), p.70. 1295 Decreto de 6 de Novembro de 1836, Mapa anexo n.º 2.
1296 «Valongo», in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol.34. (s/d). Lisboa/Rio de Janeiro, p.48. 358
Joel Silva Ferreira Mata
mente uma nova mentalidade social, ganhadora e empreendedora, mas que o Cabido feminino do hábito beneditino não correspondeu inteiramente, resistindo aos ventos de feição despesista mas incontornáveis, uma vez que a velha matriz exigia gastos constantes para a sua manutenção reclamados pelos visitadores1297. Neste sentido, o povo resolveu “quotizar-se para as obras com cinco réis por cada alqueire de trigo importado e um real sobre cada quartilho de vinho e de azeite e sobre cada arrátel de carne destinada ao consumo local”1298. Efectivamente, aos moinhos do rio Ferreira chegava o trigo proveniente das províncias do Alentejo e de Trás-os-Montes1299, assim como do estrangeiro, nomeadamente o trigo americano, “mais caro, era procurado com empenho por todos os padeiros por ser a sua qualidade mais superior e de melhores resultados pela excellencia do pão que produzia”1300.
Alguns valonguenses faleceram em diversas partes do Reino, e apesar da grande parte não ser identificada profissionalmente, é provável que fossem almocreves ou indivíduos associados ao comércio e trânsito de cereais para as moendas do rio Ferreira. Este movimento social, elitista e urbanístico era, como vimos, habitado pelos diversos mesteirais e lavradores, uns mais endinheirados do que outros, mas também por “muitos padeiros que sustentão o Porto de pão que eles lá levão a vender”1301, uma visão já oitocentista, altura em que a panifi-
cação assume a sua dimensão industrial.
O périplo pelos registos de baptismos, casamentos e de óbitos dá-nos a indicação de alguns padeiros e padeiras que viveram neste território. Em 1594, Maria Gonçalves, padeira de Valongo Susão, baptizou sua filha Maria, desconhecendo-se, entretanto, o seu estado civil, que não foi declarado1302; em finais do século XVIII aparece uma certa Catarina, viúva, padeira de
1297 AZEVEDO, Maria José Coelho (1999) – ob. cit., p.38.
1298 «Valongo», in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol.34. (s/d). Lisboa/Rio de Janeiro, p.48.
1299 REIS, Joaquim Alves Lopes, P.e (1904) – A Villa de Vallongo. Suas tradições e história, descripção, costumes e monumentos. Porto: Typographia Coelho, (a vapor), pp.134-135. 1300 REIS, Joaquim Alves Lopes, P.e (1904) – ob. cit., p.214.
1301 COSTA, António Carvalho da (1868) – Corografia Portuguesa. Braga: Typographia de Domingos Gonçalves, 2.ª edição, vol.II, p.231.
1302 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.24.
359
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Valongo1303. Em São Vicente de Alfena surgem, na primeira metade do século XVIII, referenciados os padeiros Manuel de Sousa, casado com Ana Martins, moradores no lugar da Codiceira1304, e Manuel Pinto, marido de Maria Antónia, do mesmo lugar1305. De meados da centúria de Setecentos cite-se o padeiro Manuel Francisco que em 1756, seria ainda homem solteiro1306.
O padeiro de Valongo. Fonte: M.M.V.
Um dos obstáculos à circulação assentava no mau estado de conservação da artéria viária que ligava São Mamede de Valongo à cidade do Porto. No início do século XIX, António Lourenço Dias, juiz do couto de Campanhã, é favorável à retoma dos trabalhos de construção da Estrada Real, para proteger os caminhantes em geral e “principalmente às padeiras de Valongo”1307. O aquecimento dos fornos de cozer pão era feito com lenha colhida nos montes da freguesia e confinantes. A procura incessante de arvoredo 1303 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170. 1304 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.39.
1305 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.48v e 65, respectivamente. 1306 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.122v.
1307 AZEVEDO, Maria José Coelho (1999) – ob. cit., p.88. 360
Joel Silva Ferreira Mata
florestal levou à devastação das serras, obrigando tanto homens como mulheres carreteiros, a percorrerem distâncias cada vez maiores e a interferirem com o direito comarcão, estabelecido pelo uso e costume, opondo, em 1790, os moradores da freguesia aos de São Pedro da Cova que tentaram impor demarcações à desflorestação do monte de Santa Justa até ao Couce. Nem sempre o diálogo foi o caminho percorrido para resolver os diferendos entre as duas freguesias, e daí terem surgido desordens com aspectos de verdadeira violência1308.
1.4 – Os ferreiros Indiscutivelmente que um dos maiores legados profissionais que podemos salientar neste território tem a ver com a actividade da metalurgia essencialmente ligada à transformação do minério de ferro, nas forjas das inúmeras oficinas onde pacientemente se trabalhava, ao som do martelo, da bigorna e do arrefecer das peças na água. O ferreiro moldava tudo aquilo que a clientela certa ou esporádica procurava. Das suas mãos calejadas e experimentadas surgiam os equipamentos para a actividade agrícola como as relhas de arado, as enxadas, os sachos, as foices e outros utensílios1309, tão
comuns na vida dos moradores, como podiam forjar armas ou objectos de índole diversa. Com o decorrer do tempo, a arte da ferraria iria criar especializações que estariam na origem do aparecimento de subsectores como o de ferrador, de alfageme, de armeiro ou de cutileiro1310.
Na freguesia de São Mamede de Valongo viveram, casaram e tiveram os seus filhos, alguns ferreiros como Francisco José (1589), morador na Rua Velha casado com Catarina Fernandes, onde criaram três filhos: José, Andresa e Bartolomeu1311. Outros, como Sebastião Dias, preferiram viver em Valongo 1308 SILVA, João Belmiro Pinto; GOMES, Catarina Sofia; COSTA, José Carlos da (2001) – Valongo. Um salto para a modernidade… Valongo: Anégia Editores, p.31.
1309 COELHO, Maira Helena da Cruz (1996) – «O Povo – identidade no trabalho», in Nova História de Portugal, Vol.III, dir Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques. Portugal em definição de fronteiras 81096-1325). Do Condado Portucalense à crise do século XIV, coord. Maria Helena da Cruz Coelho e Armando Luís de Carvalho Homem. Lisboa: Editorial Presença, p.280. (252-308). 1310 COELHO, Maira Helena da Cruz (1996) – ob. cit., p.281. 1311 ADP, E/27/4/1-2.3, fls.4v, 12 e 17.
361
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Susão1312, e, no Sapal residiam Álvaro João, casado com Maria Antónia e sua filha Maria1313, (em 1626), e António Bento casado com Justa Duarte1314, além de outros cujos domicílios não foi possível localizar. Se Valongo era o lugar dos almocreves, Alfena era uma espécie de viveiro de ferreiros. Efectivamente, conhecemos largas dezenas de homens que fizeram deste mester a sua vida profissional, e durante séculos, em gerações sucessivas, confeccionaram objectos para as populações mais próximas como de outras de proveniências e de trajectos mais longínquos. Quadro n.º 51 – Ferreiros da freguesia de São Mamede de Valongo Ano 1589 1591
Nome Francisco Gonçalves
1593
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
–
José
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 4v
Catarina Fernandes
Andresa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 12
Bartolomeu
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 17
1593
Sebastião Dias
Maria Duarte
Maria
1599
Domingos Bento
Maria Martins
Bernardo
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 18v
1616
Gaspar António
Maria Francisca
Francisca
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 136v
1624
António Álvares
Margarida André
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 170
1626
Álvaro João
Maria Antónia
Maria
Sapal
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 176
Sapal
ADP, E/27/6/1-2.3, fls.31v e 39v
1636 1638 1641 1635 1636
Valongo ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 18v Susão
Manuel
António Bento
Justa Duarte
António Alvares, o velho
–
Maria Antónia
Bento Duarte Justa António
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.51v
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.27v
Manuel
Sapal
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.31v
1638
António André
Maria Manuel
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.39v
1639
António Alvares
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42
1312 ADP, E/27/4/1-2.3, fl.176. 1313 ADP, E/27/4/1-2.3, fl.176. 1314 ADP, E/27/4/1-2.3, fl.31v.
362
Joel Silva Ferreira Mata
Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
1643
João Pêro
Madalena André
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.57v
1644
António Bento
Antónia Duarte
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.60v
1647
João Pêro
Madalena
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.66v
1650
João Pêro
Madalena André
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.79
1724
António Álvares
Maria do Vale
Caetano
–
ADP,E/27/6/1-4.1, fl.186v
Manuel das Neves
Catarina de Paiva Dias
António
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.6v
Joana
Rua da Portela
1745
Manuel Gonçalves
Maria Loureira de Afonseca
José
–
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.33v
1745
João das Neves
Josefa das Neves
Luís
–
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.48v
1749
Domingos Gonçalves
Catarina de Sousa
António
–
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.131
1749
João da Rocha
Catarina Dias
Bento
–
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.140
1778
João Moreira
Clara de Sousa
Ana Joaquina
–
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.28v
1743 1744
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.26
São Vicente de Alfena era um dos pontos de apoio da rede viária que ligava a cidade do Porto a Guimarães, e que ficava no limite do julgado da Maia, ao qual pertencia. Pela sua importância no apoio aos caminheiros comuns e aos romeiros, foi instituída no reinado de D. Afonso III, a feira de Ferrarias1315, em Alfena, fazendo parte de um total de dezasseis em todo o Reino, tendo em vista a sua utilidade pública, assim como o desenvolvimento urbano para motivar e estimular o comércio local1316. Porém, pouco tempo depois, em 1258, apurou-se que a população do lugar da Ferraria havia decaído cerca de 42% em relação a épocas anteriores,1317.
Entretanto e com a criação da feira da cidade do Porto, também em data anterior a 1258 e do reinado de D. Afonso III, a vila de Ferrarias entrou em
1315 MARQUES, A. H. de Oliveira; DIAS, João José Alves (2003) – Atlas Histórico de Portugal e do Ultramar Português. Lisboa: Universidade Nova, Centro de Estudos Históricos, p.93.
1316 VENTURA, Leontina (1996) – «Afonso III e o Desenvolvimento da autoridade régia», in Nova História de Portugal, Vol. III, ob. cit., p.143.
1317 BARROS, Henrique da Gama [1947-1949] – História da Administração Pública de Portugal nos séculos XII a XV, 2ª edição, dir. Torquato de Sousa Soares, Tomo V. Lisboa, Sá da Costa Editora, p.95. 363
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
declínio1318, vindo a desaparecer ainda no século XIII1319. Esta feira, de organização desconhecida1320, se não cumpriu o seu desiderato – o de dar origem a cidade, ou a um povoado de maior dimensão e a uma rede de comunicações e de comércio1321–, nem por isso deixou de manter e de desenvolver a metalurgia pela mão de dezenas de ferreiros que não podendo comercializar os seus produtos no seu habitat, com o apoio da almocrevaria manteve a sua identidade profissional continuando a laborar ao calor da forja. Entre 1599-1713 conhecem-se cerca de quatro dezenas de ferreiros, trinta e dois dos quais estavam disseminados pelos seguintes lugares: Alfena, sem qualquer especificação (25%), Ferraria (21.9%), Codiceira (12.6%), Xisto (12.6%), Rua de Cima (6.2%), São Roque (3.1%), Transleça (3.1%), Baguim (3.1%), Souto (3.1%), Rua (3.1%) e Torrão (3.1%), mantendo o lugar de Ferraria a tradição desta actividade. Por outro lado, o posicionamento relativo dos artesãos estaria associado a grupos populacionais diferentes uns dos outros. É curioso referir que muitos ferreiros mantinham no seu círculo de convivência social um certo número de ferradores, homens que estavam muito próximos dos primeiros. Vejamos alguns exemplos: Francisco, solteiro, de Transleça foi pai (solteiro) de um filho homónimo com Margarida, também solteira, que era filha de António Gonçalves, ferreiro; foi madrinha de baptismo Isabel, por sua vez, filha de Gaspar Gonçalves, ferrador1322. Em
1614, Francisco João e Catarina Belchior, sua mulher, de Alfena, convidaram para madrinha do baptizado de João, seu filho, Isabel, moça solteira, filha do “ferrador de Alfena”1323; mais tarde, em 1616, Damião Francisco e mulher, moradores em Alfena, convidaram para o baptizado de seu filho, André, solteiro, por seu turno filho do ferreiro António Gonçalves1324; ou Gaspar,
1318 RAU, Virgínia (1982) – Feiras medievais portuguesas. Subsídios para o seu estudo. Lisboa: Editorial Presença, p.94. 1319 ALMEIDA, P.e Carlos Alberto Ferreira de (1968) – ob. cit., p.172.
1320 RAU, Virgínia (1982) – ob. cit., p.209.
1321 MARQUES, A. H. de Oliveira (1996) – «A Circulação e a troca de produtos», in Nova História de Portugal, Vol.III, ob. cit., pp.508-509.
1322 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.34v. 1323 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.37.
1324 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.40v. 364
Joel Silva Ferreira Mata
filho de Gonçalo Vicente, ferrador de Alfena que em 1618 apadrinhou o filho de Melchior Fernandes e de Luzia Domingues, de Transleça1325. Gráfico n.º 32 – Ferreiros da freguesia de São Vicente de Alfena (1599-1733)
Fonte: ADP, E/27/472-5.1
As relações de convivência familiar com indivíduos do mesmo grupo profissional – ferreiros – também eram comuns. Entre outros, lembremos Simão, solteiro, ferreiro, filho de António Gonçalves, também da mesma profissão que esteve presente na festa religiosa motivada pelo nascimento de Maria, filha de Gonçalo Francisco e de sua mulher Apolónia1326, em 1609, e que alguns anos mais tarde, ainda solteiro, teve uma filha de nome Catarina, com Maria, igualmente solteira, sendo a paternidade denunciada pela mãe da criança1327; em 1701, surge Manuel André, eventualmente irmão de Alexandre Mendes que exerce a mesma actividade artesanal1328; em meados de 1716 é referido como padrinho de Ana, filha de João Fernandes, ferreiro, e de Isabel Gaspar, um certo Manuel António “ferreiro da Rua”1329; no ano
seguinte e anotado na mesma função religioso-social, Manuel de Sousa, ferreiro do lugar do Xisto que terá ido à Ferraria, a convite do ferreiro Vicente de Sousa e mulher Maria Moreira, para a cerimónia motivado pelo nascimento do filho Vicente1330; do mesmo lugar aparece um outro Manuel 1325 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.41v. 1326 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.30v. 1327 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.35.
1328 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.101v. 1329 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.12v. 1330 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.19.
365
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
António, ferreiro, casado com Ana Luzia que, em 1718, assiste ao baptizado de Luzia, filha de João de Sá e de Ana da Silva, sua mulher1331. Contudo, sem pretendermos ser exaustivos, recordamos o relacionamento e a aproximação social com o tecelão Marco Carvalho que esteve presente no baptizado da já referida Catarina, filha de Simão, ferreiro1332, ou
do sapateiro Manuel Moreira que aceitou ser testemunha no baptizado de Maria, filha do ferreiro homónimo e de Maria Moreira, do lugar da Rua1333, em 1718.
1.5 – Os ferradores O espectro profissional dos mesteirais era muito diverso, sobretudo em zonas com uma actividade comercial significativa como parece ter sido Valongo da Estrada, nos confins da Terra da Maia, o que, de certa forma, mostra a importância do território, não só como ponto de apoio na ligação entre o horizonte litorâneo e o mundo transmontano, na encruzilhada que ligava o Porto a Vila Real, com passagem pela vila de Amarante e as múltiplas ramificações que abrangiam pequenas localidades que se estendiam a partir do eixo viário principal. O ofício de ferrador, uma das artes de trabalhar e aplicar o ferro, está bem documentado, o que mostra a sua importância no âmbito das actividades artesanais do território do actual concelho de Valongo. A prática de ferrar os animais exigia alguma técnica, embora, à medida que a aplicação da ferradura se generalizou a partir da Idade Média, o seu domínio tivesse passado da mão dos especialistas para todos aqueles que insistentemente necessitavam de ter os animais em boas condições de locomoção. Havia ferraduras de diferentes tipos como as correctivas e as patológicas1334. O ferrador tanto
estava ocupado em tempo de paz como em tempo de guerra. No primeiro caso, a ênfase do seu trabalho estava vocacionada para os animais de trans1331 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.20v. 1332 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.35.
1333 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.22v.
1334 Ferraduras (s/d), in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol.11. Lisboa: Editorial Enciclopédia, pp.138-142. (138-142). 366
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porte individual e carrário, e no segundo fundamentalmente para apetrechar os meios de locomoção da cavalaria militar. No território do actual concelho de Valongo, os ferradores marcavam a sua presença nomeadamente em Valongo Susão, como espaço mais amplo e mais abrangente, mas também em certos lugares mais restritos ou em arruamentos. Não obstante, sendo, por exemplo, em menor número que os almocreves, há notícias de muitos outros ferradores para os quais não ficou o respectivo registo topográfico, mas que faziam parte do número de homens que dominavam a técnica de ferrar os animais. Alguns seguiam a profissão dos pais com quem aprenderam o ofício desde as tarefas mais simples aos aspectos mais vocacionais, como é o caso de António da Silva, documentado entre 1777-1781 e que era filho de Manuel da Silva, também ferrador1335. Na freguesia de São Mamede de Valongo é, no século XVIII, que as referências aos ferradores aparecem nos registos paroquiais, estando estes profissionais associados às relações sociais e familiares, no âmbito do baptismo de crianças, quer como pais, quer como padrinhos ou testemunhas. Neste sentido, aparece o ferrador Manuel da Silva, casado como Catarina de Sousa que nos finais de 1721 baptizaram um menino cujo assento foi inscrito pelo pároco Manuel de Sousa Dias1336; Manuel Álvares e sua mulher Ana Rocha
já defuntos em 1721, cujos nomes são lembrados para referenciar sua filha, mulher solteira que entretanto teve um filho mas ocultou a sua paternidade1337; João de Sousa, casado com Simoa Marques; Manuel de Sousa, filho órfão de pai em 1727, e Manuel da Silva, irmão de Maria da Silva, casada com Manuel Marques Bojo1338. Em 1750 aparece Manuel da Silva, casado com Catarina Marques, moradores na Rua, e que foram apadrinhar o filho de Manuel Gonçalves da Rocha e de Catarina Pinta, da freguesia de São Martinho do Campo1339.
1335 ADP, E/27/6/1-4.2, fls.40v e 76. 1336 ADP, E/27/6/1-4-1, fl.145v. 1337 ADP, E/27/6/1-4.1, fl.237.
1338 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.248, 248v, 239v, 260-260v.
1339 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.215 e E/27/6/2-5.1, fl.18. 367
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Em 1759 documentamos o ferrador Manuel da Silva e sua mulher Catarina Marques que estiveram presentes no baptizado do filho de Domingos de Almeida e de sua mulher Justa Marques, na qualidade de padrinho e madrinha1340, respectivamente; em 1764 é oportuno recordar António Dias e sua mulher Joana da Silva1341. Em 1770, o ferrador José Marques e sua filha Maria Marques da Silva1342 foram documentados, pelos mesmos motivos dos ferradores anteriores. Do último quartel do século XVIII identificamos o ferrador Manuel da Silva1343.
Quadro genealógico da família do ferrador Manuel da Silva
Fonte: ADP, E/27/6/1-4.2, fls.40v, 76, 184.
Na freguesia de Alfena temos notícia de alguns ferradores da primeira metade do século XVIII, mantendo-se, de certa forma, o prestígio desta localidade de passagem para Guimarães, já sem o fulgor que parecia ter em tempos anteriores. As razões pelas quais são mencionados nos registos paroquiais, são, em tudo, idênticas àquelas que apresentamos para o mesmo ofício na freguesia de São Mamede de Valongo: ou pais ou padrinhos: Miguel Pinto (1714), do lugar da Codiceira; Manuel Martins, morador no lugar do Xisto, assistente na Codiceira, casado com Ana Moreira, e Manuel Pinto, ambos da mesma aldeia1344. Em todo o caso, o nome do ferrador Miguel Pinto que é referenciado várias vezes, e aparece em duas ocasiões, como sendo pai de Manuel, moço solteiro, que teve uma filha com Maria, também solteira, por alcunha, da “venda” da Codiceira, dada como “concubina”, baptizada em 1340 ADP, E/27/6/2-6.1, fls. 28, 29v. 1341 ADP, E/27/6/2-6.1, fl.141v. 1342 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.97v. 1343 ADP, E/27/6/1-4.2, fl.40v.
1344 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.33v, 43, 62v, 76,76v. 368
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27 de Abril de 1720 que se chamava Teresa1345. O envolvimento entre ambos, terá continuado, pois no ano seguinte nasceria outra criança, cuja paternidade foi, de novo, atribuída ao filho do ferrador Miguel Pinto1346, que pela segunda vez não assumiu a respectiva paternidade. Porém, o próprio Manuel Pinto terá estado envolvido com a “concubina” pois em 25 de Abril de 1725 foi baptizada uma criança do sexo feminino, tendo a mãe dado por pai o referido ferrador da Codiceira (e não do lugar do Xisto) que também não quis reconhecer a filha1347. Este ferrador
ver-se-ia envolvido num escândalo familiar e público da mesma natureza motivado pela denúncia feita pela jovem, solteira, de nome Ana, do lugar da Ferraria, que o acusou de ser o pai de uma menina que terá nascido em 10 de Abril de 1735. O lesado recorreu judicialmente, tendo obtido duas sentenças que o ilibaram da acusação movida pela mãe da criança: uma da correição do crime e outra do cível, que atestavam que o requerente não era o pai de Maria1348. No ano seguinte, o ferreiro, casado com Catarina Martins, baptizou sua filha Maria, apadrinhada pelo padre Vicente Pereira do Cabo, e Ana, solteira, sua cunhada, na presença das testemunhas João Martins e Vicente de Paiva, do lugar da Codiceira, sendo o ofício religioso celebrado pelo reitor Simão da Cunha Porto1349. Quadro n.º 52 – Ferradores da freguesia de São Vicente de Alfena Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1714
Miguel Pinto
–
Codiceira
ADP, /27/4/2-6.1, fl.6v
1732
Manuel Martins
–
Lugar da Codiceira
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.62v
1756
Domingos da Silva
–
Lugar do Outeiro
ADP, E/27/4/2-6.1, fl. 158
1736
Manuel Moreira
Ana Moreira Lugar da Codiceira
ADP, E/27/4/2-6.1, fl. 76v e 76
1345 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.29-29v. 1346 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.33v. 1347 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.43.
1348 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.73v. 1349 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.79v. 369
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Na freguesia de São Martinho do Campo havia também alguns profissionais ligados à metalurgia do ferro, documentados em meados do século XVIII: Brás Afonso, que residia em Luriz e que estivera no acto que levou à pia baptismal de um filho de Gaspar Ferreira1350, e Pedro Gonçalves1351, também de Luriz que baptizara uma filha em 13 de Maio de 1640. Na primeira metade do século XVIII aparecem três ferreiros: Manuel João (1710), do lugar do Outeiro, cujos filhos Manuel e Maria, ambos solteiros, nesta data, aceitaram participar no baptizado de uma filha de Amaro da Costa e de Ana Álvares, sua mulher, moradores na aldeia da Quintã1352; António
Gonçalves (1733) que esteve presente no acto sacramental da pequena Catarina, filha de Manuel João, carpinteiro e de Catarina João, do Outeiro1353, e João de Sousa, ferreiro de Ponte Ferreira1354.
1.6 – Os alfaiates O vestuário, tanto masculino como feminino, do nobre, do burguês, do artesão ou camponês proporcionava ao alfaiate a atribuição de um estatuto absolutamente reconhecido na hierarquia dos mesteirais das zonas urbanas, periurbanas ou do seu termo ou alfoz, integrado já em territórios tipicamente rurais, onde os horizontes culturais, sociais e económicos eram muito diferentes do mundo urbano propriamente dito. O alfaiate estava classificado de acordo com o tipo de tecido com que trabalhava ou com a natureza das peças que confeccionava, designando-se, assim, “os alfaiates de pano de cor, alfaiates de pano de linho, alfaiates de pano de burel, botoadores, calceteiros (fabricantes de calças), gibeteiros ou jubeteiras (fabricantes de gibões), ataqueiros (fabricantes de atacas), sombreiros, etc.”1355, embora no levantamento dos alfaiates do território do 1350 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.49. 1351 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.55.
1352 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.78v.
1353 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.128. 1354 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.135.
1355 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – Nova História de Portugal, Vol. IV, dir. Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques. Portugal na crise dos séculos XIV e XV. Lisboa: Editorial Presença, p.121. 370
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actual concelho de Valongo não seja possível distinguir uns dos outros, por falta de informação. É certo que a partir do século XIII, com a expansão económica e social, e pela natureza das transacções comerciais, e os contactos entre gentes muito diferentes entre si, assiste-se a uma profunda metamorfose a nível do traje que se vai aprimorar nomeadamente entre os burgueses ricos e os nobres, que, pelo uso de vestuário de qualidade e de bom corte, aproveitavam as manifestações culturais, religiosas ou administrativas para ostentarem o luxo da sua indumentária, introduzindo, desta maneira, uma nota visível sobre a sua posição social. É evidente que a população que vivia nos espaços rurais, como era o caso de Valongo não estaria preocupada com a confecção diversificada e rica. O traje rústico era simples, para permitir o desempenho profissional nos campos, podendo ser mais cuidado quando homens, mulheres e crianças participavam nas festividades religiosas em torno do santo padroeiro, das confrarias, nas procissões, nos funerais, nos casamentos ou nos baptizados dos filhos. A confecção podia incluir diversos tipos de matérias-primas. No caso do território do actual concelho de Valongo, o mais comum devia ser o linho produzido em várias parcelas de terrenos designados por exemplo de “linhar pequeno”, uma leira que integrava as terras do casal do Moleiro, na aldeia da Quintã, na freguesia de São Martinho do Campo, que nos finais do século XVI era titulado por Santos Afonso, moleiro e mulher Maria Gonçalves1356; a mesma designação foi dada a uma leira do casal de Rio Satana, nessa freguesia, assim como “a leira de linhares1357; no casal do Carvalho também na aldeia
da Quintã, a cargo do concessionário Alexandre Dias, viúvo, menciona-se o “linhar pequeno”1358; o casal da Quintã, contratualizado ao foreiro Amadeu Martins e mulher Margarida Manuel refere “a leira de linhares”1359, entre outros.
1356 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.180-183. 1357 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.191-192.
1358 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.196-197v. 1359 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, livro 12, fls.210-211v. 371
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Vida rural em Valongo. Fonte: Fundo C.M.V.
O linho no seu longo percurso até chegar à fase final, de tecido propriamente dito exigia um conjunto de tarefas que estavam primeiramente a cargo dos agricultores, como a preparação do solo, a estrumagem, a rega, e a monda, passando depois para as mulheres, o trabalho da arrancada; no Inverno, abrigado da chuva e do frio, no interior da casa de morada ou no celeiro, sedava-se, fiava-se, dobava-se, urdia-se e tecia-se, dando forma às fibras pela confecção de longos metros de bragal que podia ser posteriormente vendido pelos camponeses como integrar as rendas a entregar aos senhorios. Em 1603 foi realizado um auto de vedoria que incluiu avaliadores da parte do mosteiro de Santo Estêvão de Vilela, e do concessionário António Gonçalves, sobre o meio casal da Ilha, em Santo André de Sobrado, constituído por cerca de trinta e seis parcelas – que na descrição não referem a existência de linhares –, foi confirmado que o titular incluiria na renda constituída por diversos elementos, a entrega, no dia de São Miguel de Setembro, também quatro varas de bragal1360. A produção de bragal tanto podia estar a cargo das mulheres, como por exemplo de Catarina Varela, referenciada em 1625, altura em que sua filha Domingas foi madrinha de baptismo de Jerónima, filha de António Tomé, 1360 ADP, Livro 1º das Apegações, k/15/1-55, fl.116. 372
Joel Silva Ferreira Mata
moleiro e de sua mulher Maria Antónia, moradores em Valongo1361, como por homens como é o caso de Marco Carvalho, morador em Alfena, na “casa do Mendes” que em 1612 também foi padrinho de Catarina, filha de Simão, solteiro, da casa do “ferreiro de Alfena”, segundo denúncia pronunciada pela mãe, Maria, também solteira, domiciliada no mesmo lugar1362. A lã, fibra animal, seria um dos recursos para os alfaiates de Valongo. Em Alfena, nos finais do século XVI, havia um tosador chamado Gonçalo Duarte que era casado com Isabel Antónia1363, tendo o mesmo apadrinhado,
em 1600, o pequeno Domingos, filho de Catarina André, moça solteira e do padre Manuel Farinha1364. Em 1616, Ângela “filha do tosador de Alfena”1365 foi madrinha de Mateus, filho de Gaspar João e de Maria Moreira, do lugar da Ferraria1366.
Os alfaiates identificados no actual território do concelho de Valongo são inúmeros o que faz pensar que os mesmos trabalhavam para as pessoas mais próximas mas também aceitariam encomendas de clientes de outros domicílios, designadamente da cidade do Porto. Em São Vicente de Alfena, os alfaiates aparecem documentados no declinar do século XVI, com o registo, em 1597, de Manuel Gonçalves e de Manuel Carvalho, homem solteiro1367, actividade que devia ter alguma
expansão, uma vez que na primeira metade de Setecentos são vários os alfaiates que dão o seu nome e estão presentes em actos públicos de matriz religiosa: Francisco Martins (1725), casado com Maria Pereira, morador no lugar da Codiceira1368; Vicente Pereira (1721), casado com Catarina Antónia, do lugar do Xisto1369; Francisco Martins (1721), do lugar da Codiceira1370; João
1361 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.174. 1362 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.35. 1363 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.6v.
1364 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.13v. 1365 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.39. 1366 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.39.
1367 ADP, E/27/4/2-5.1, fls.5 e 8. 1368 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.42v. 1369 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.33. 1370 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.33. 373
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Fernandes (1723), do lugar de Cabeda1371; João Pereira (1728), do lugar do Xisto, que era casado com Cristina Luís1372; Domingos João da Silva (1748), natural da freguesia de São Lourenço d’Asmes, mas que vivia no lugar do Outeiro, na freguesia de São Vicente de Alfena e aparece mencionado no assento do baptizado de uma menina que fora enjeitada à sua porta1373. Quadro n.º 53 – Alfaiates da freguesia de São Vivente de Alfena Data
Nome
Fonte
1597
Manuel Gonçalves
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.5
1597
Manuel Carvalho, solteiro
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.8
Na freguesia de São Martinho do Campo encontramos desde os finais do século XVI à primeira metade do século subsequente os seguintes artesãos alfaiates: António (1595), que morava em Luriz e que decidira apadrinhar uma filha de António Gaspar e de Maria Brás, ambos solteiros e também residentes no mesmo lugar1374; da aldeia de Balselhas refere-se um João Gonçalves (1598)1375; do couto de Luriz, em 1600 é documentado António Gonçalves1376; no mesmo ano aparece um certo João1377, assim como um António, de Luriz1378. Vinte anos mais tarde é referenciado António Gonçalves, o alfaiate1379, cuja participação em eventos religiosos do primeiro sacramento está registada até 1633, seguindo-se outros como: Domingos João, casado com Isabel João, do lugar da Quintã, pai de quatro filhos que nasceram nos seguintes intervalos protogenésicos: Maria (1692), Manuel (1695), João (1697) e Amaro (1699)1380. No início do século XVIII aparece um certo João Rodrigues, alfaiate como testemunha do reconhecimento cristão de duas crianças1381 e em 1743, também na qualidade de testemunha do 1371 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.36. 1372 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.51.
1373 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.125. 1374 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.12. 1375 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.17.
1376 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.20v. 1377 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.21.
1378 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.21v. 1379 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.44v.
1380 ADP, E/27/4/3-10.1, fls.17v, 31v, 37 e 43. 1381 ADP, E/27/4/3-10.1, fls.8v e 85v.
374
Joel Silva Ferreira Mata
baptizado de Custódia, filha de Francisco Lopes e sua mulher, menciona-se João Martinho, alfaiate1382. Quadro n.º 54 – Alfaiates de São Martinho do Campo Ano
Nome
Mulher Filhos(as)
Morada
Fonte
1595
António
–
–
Luriz
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.12
1598
João Gonçalves
1600
António Gonçalves
–
–
Balselhas
–
–
1600
João
–
–
1692 1695 1697
Balselhas
Maria Domingos João
Isabel João
1699
Manuel João
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.117 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.20v ADP, E/27/4/3-9.1, fl.21 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.17v
Quintã
Amaro
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.31 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.37 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.43
1712
João Rodrigues
–
–
–
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.82v
1743
João Martins
–
–
–
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.193
Na freguesia de Santo André de Sobrado documentamos os alfaiates desde os finais do século XVI: Gonçalo Gonçalves, do lugar de Ferreira, que participou, em 1600, no baptizado de uma filha de Gonçalo Miguel, da aldeia de Paço, e de sua mulher Isabel Gaspar, celebrado pelo abade Jerónimo Armante1383; na mesma aldeia, trabalhava em 1629, André João, casado com Maria Antónia que deixou o seu nome registado num acto religioso idêntico1384, e irá exercer a sua actividade até pelo menos 1640, altura que será padrinho de Isabel, filha de João Álvares da mesma aldeia, conforme o assento deixado pelo padre George1385. Esta actividade mesteiral era também pouco significativa na freguesia de São Lourenço d’Asmes. Com efeito, em 1615, Gaspar Gonçalves, “o manquo”, e sua mulher Maria Gonçalves levaram o filho Martinho, em 12 de Novembro de 1615, tendo participado na qualidade de madrinha uma certa Esteva, alfaiata de profissão, filha de “hũa cega do lugar de Cabeda”1386, 1382 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.193. 1383 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.5v.
1384 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.25v. 1385 ADP, E/27/4/5-19.12, fl.38. 1386 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30v.
375
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
confirmando-se a profunda heterogeneidade dos grupos sociais e económicos entre as cinco freguesias consideradas como territórios isolados.
Legenda: Engenho do linho, actualmente no pátio da Escola EB1, Xisto (Alfena). Fonte: M.M.V.
Não há dúvida que a freguesia de São Mamede de Valongo (da Estrada), do trânsito, do centro de abastecimento dos almocreves, viajantes, albardeiros ou simples caminheiros era um lugar mais desenvolvido, mais cosmopolita, mais endinheirado e aburguesado. Era em Valongo que estavam instaladas a maior parte das actividades económicas de todo o território concelhio como o entendemos hoje. As freguesias de Ermesinde, Alfena, São Martinho do Campo e Sobrado eram tipicamente rurais, cujos habitantes estavam ocupados sobretudo com a agricultura e a moagem por complementaridade, enquanto que em Valongo, lugar mais populoso, mais anfitrião, mais visitado, lugar onde se discutiam e acertavam negócios com os agentes da burguesia da cidade do Porto, com os almocreves que penetravam o nordeste transmontano, podia oferecer vários produtos e artigos, inclusive a confecção de roupa de qualidade, dando ao alfaiate um estatuto de significado reconhecido, caso contrário não seria possível encontrar, num espaço geográfico tão limitado, um elevado número de mesteirais ligados directamente à indústria da confecção, para o qual também contribuíram os profissionais deste mesmo ramo assistentes em Valongo Susão.
376
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 55 – Alfaiates de São Mamede de Valongo (1600-1628) Ano
Nome
1600
Gaspar, solteiro
Mulher
Filhos (as)
Morada
Fonte
Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40
1600
Manuel
Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.39v
1600
Catarina
Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40
1611
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.69
1617
Tomé
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.139v
1617
Justa
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.140
1618
Tomé
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.146v, 149
Maria
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.143v
Maria
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.150v
1621
Luzia
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.160v
1621
Luzia
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.160v
1623
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.166
1624
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 169
1625
Luzia
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.175
1626
Pêro
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.178
Margarida Gonçalves
João
Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.45
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.137
1618 1619
1602
Pêro Gonçalves
João Gonçalves
1616 1620 1623
Bento Fernandes
Catarina Tomé
António Maria Antónia
1617
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.152
Andresa
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63v
Justa
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.140v
1615
Gaspar Martins
Maria João
Francisca
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.82v
1615
André Soares
Maria Duarte
Manuel
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.84
Pêro Gonçalves
Catarina Tomé
António
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.86
Catarina
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3,fl.167v
André António, o novo,
Maria Benta
Domingos
–
André
1616 1624 1617 1620
377
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.143 Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.156
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
1618
Gaspar Martins
Maria João
1618
Pêro Gonçalves
1620 1621 1621 1624 1626 1624 1625 1625
Mulher
Morada
Fonte
Antónia
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.145v
–
Maria
Adro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.146v
André António
Maria Benta
André
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.156
André Soares
Maria Duarte
Elisabete
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.156v ADP, E/27/6/1-2.3, fl.160
Domingos Duarte
–
André António
Maria Benta
Maria
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.168
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.172
Catarina Gaspar (2ª mulher)
António
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.175
João
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.175
Bento Fernandes
João Dias
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.169 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.176
1625 1627
Filhos (as)
Andresa Luís
1628
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.180v
Manuel Maria
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.185v
1627
António Carneiro
–
–
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.180v
1628
Bento Francisco
Catarina Gonçalves
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.183v
Manuel Fernandes
Isabel André
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.185v
Sebastião
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.30
1628 1636
É, porém, na freguesia de São Mamede de Valongo que se regista o maior número de referências a este ofício, cujos artesãos se distribuíam por Valongo Susão, Escoural, Rua Velha, Adro da igreja paroquial, e na Portela. Refira-se, por exemplo, que Pêro Gonçalves, morador no Escoural, casado com Catarina Tomé, foi pai dos seguintes filhos: Manuel (1600), Catarina (1600), Justa (1611), António (1616), Tomé (1617), Maria (1618), Maria (1619), Luzia (1621), Catarina (1624), Luzia (1625), Pêro (1626) e Manuel (1628)1387. 1387 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.39v, 40, 69, 86, 139v, 143v, 150v, 160, 166, 175, 178 e 185v. 378
Joel Silva Ferreira Mata
Gráfico n.º 33 – Domicílio dos alfaiates da freguesia de Valongo (1600-1777)
Fonte: ADP, E/27/671-2.3; E/27//6/1-4.2
Os alfaiates relacionavam-se com homens de outros ofícios não só quando os convidavam para as reuniões familiares por ocasião da integração dos filhos na religião mas também quando aceitavam entrar em casa dos mesteirais vizinhos para o mesmo fim. Deste modo, tanto sapateiros, ferradores, lavradores, almocreves, serradores e moleiros1388 podiam trocar informações de âmbito profissional que fossem úteis a cada um nomeadamente aqueles que podiam trazer ou indicar novos clientes. Quadro n.º 56 – Alfaiates de São Mamede de Valongo (1635-1777) Ano
Nome
Mulher
Filhos (as)
Morada
1635
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.28
1637 1639
Domingos João
1642
Maria Antónia
1644 1637 1639 1641
Fonte
Domingos
Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36v
Maria
Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.44
Gonçalo
Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.51v
João
Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.60
Domingos Duarte
–
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.35
Manuel Fernandes
Maria André da Portela (2ª mulher)
Domingos
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42v
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50v
1388 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.39v, 83, 84, 86, 137, 143v, 145, 160, 169, 180v, 175, 176 e 178. 379
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
Mulher
1639 1641 1644
Domingos Fernandes
Jerónima Benta
1648
Filhos (as)
Morada
Fonte
Catarina
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43v
Manuel
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50v
Domingos
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.58v
–
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.69
1642
Bento Fernandes, o “mixelhão”
–
Justa
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.53
1777
Francisco Pinheiro
–
–
–
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.6v
1.7 – Os sapateiros Segundo o Regimento das Procissões de Évora, de finais do século XV, os sapateiros estavam classificados em 11º lugar, juntamente com os serradores, curtidores e obreiros, e imediatamente abaixo dos alfaiates1389. Em Lisboa, no
início de Duzentos, os sapateiros, como oficiais mecânicos eram, em número superior aos alfaiates e outros grupos de artesãos1390. Nos grandes centros urbanos viviam e trabalhavam, ao lado uns dos outros, na Rua dos Sapateiros. No território do actual concelho de Valongo, em nenhuma das suas freguesias existiu um arruamento directamente associado aos sapateiros. Em São Mamede de Valongo os sapateiros estendiam-se pela Rua Velha, Escoural, Campo da Senhora, Rua Antiga, abaixo da Igreja paroquial, e no Sapal, podendo morar e trabalhar em outros lugares, dado o número de sapateiros para os quais não foi fixado o seu domicílio e oficina; viviam de forma dispersa, embora muito próximos uns dos outros, em torno da igreja matriz. Muitos deles dedicavam-se à agricultura que seria o seu mister principal. João Gonçalves, casado com Maria Antónia1391, sendo sapateiro,
explorava as terras que pertenciam ao cabido da Sé do Porto1392; Francisco 1389 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – A Sociedade Medieval Portuguesa, 5ª edição. Lisboa: Sá da Costa Editora, p.137.
1390 GOMES, Saúl António (1996) – «A Produção artesanal», in Nova História de Portugal, ob. cit., p.483. 1391 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.22 e 64v.
1392 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.14. 380
Joel Silva Ferreira Mata
Gaspar, casado com Antónia André1393 era arrendatário de umas terras do mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto1394; António Gonçalves e mulher Maria Álvares, pais de Margarida (1590), Isabel (1593) e de Catarina (1596)1395 também partilhavam o ofício de sapateiro com o de agricultor1396, ou de Belchior Gonçalves, casado com Maria Antónia1397, moradores na Rua Velha que, em 1593, foram acusados de ocuparem ilicitamente o campo de “Aspera”, na agro da “Vallgua”, em Valongo da Estrada1398. Gonçalo de Araújo, procurador das profitentes de Santo Bento do Porto, movera uma acção judicial contra o sapateiro e sua mulher, por não apresentarem qualquer escritura que lhes garantisse a posse do referido campo, não pagando qualquer importância em dinheiro ou bens sob a forma de renda às religiosas. O procurador provou que o campo de “Aspera” pertencia à igreja de São Mamede e Valongo, anexa ao mosteiro de São Cristóvão de Rio Tinto, por sua vez unido ao cenóbio de São Bento de Avé Maria do Porto1399. Sem argumentos ou justificações, o sapateiro e sua mulher desistiram da demanda, aceitando as condições que lhes fossem impostas como enfiteutas, “por justa vedoria”1400, cujo contrato não foi confirmado. Quadro n.º 57 – Sapateiros de São Mamede de Valongo identificados pelo domicílio Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte
1589
Manuel António
Maria Gonçalves
Rua velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 4v
1590
Margarida António Gonçalves,
Maria Alvares
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 5v
1590
Manuel António
Leonor, solteira
Lugar de Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 5v
1593
António Gonçalves
Maria Alvares
Rua do Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 16
1593
Baltasar Fernandes
Rua Nova
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 17
1393 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.22.
1394 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.14v. 1395 ADP, E/27/6/1-2.3, fls.5v, 16 e 27v, respectivamente.
1396 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.64. 1397 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34.
1398 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.106v. 1399 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.106v. 1400 TT, Mosteiro de São Bento de Avé Maria do Porto, liv. 12, fl.107. 381
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 20
1593
Francisco Alvares
Catarina João
Campo da Senhora
1594
Francisco Gaspar
Antónia André
Rua da Senhora
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 22
1595
Jácome Afonso
Lugar de Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 26v
1596
António Gonçalves
Maria Alvares
Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 27v
1597
Gaspar Brás
Graça Gonçalves
Rua Antiga
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 30
1598
Sebastião Dias
Maria Duarte
Abaixo da Igreja
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 33v
1598
Melchior Gonçalves
Maria Antónia
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 34
1602
António Dias
Maria Gonçalves
Rua da Senhora
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 44v
1614
Manuel António
Rua Velha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 79
1614
António Fernandes
Antónia Luís;
Escoural
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 81
1624
António de Sousa
Maria de Sousa
Sapal
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 171
Gráfico n.º 34 – Domicílio dos sapateiros da freguesia de São Mamede de Valongo (1589-1624)
Fonte: ADP, E/27/6/1-2.3.
382
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 58 – Outros sapateiros da freguesia de São Mamede de Valongo Ano
Nome
Mulher
Fonte
1590
António Gonçalves
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 5
1592
Melchior Gonçalves
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 15
1594
João Gonçalves
Maria Antónia
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 22
1594
Manuel António
Leonor, solteira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 22
1597
Baltasar Fernandes
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 32v
1597
Sebastião Dias
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 33
1599-1617
António Fernandes
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 36v, 141
1600
Jácome António
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 39v
1601
António Dias
Maria Gonçalves
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 41v
1601
Baltasar Francisco
Grimanessa Duarte
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 41v
1602
Baltazar
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 44v
1615
Marcos Fernandes
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 82
1616
António Fernandes, o novo
Águeda Alvares
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 86
1616
André
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 137
1621
Manuel António, o velho
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 156v
1623
Manuel André
Simoa Francisca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 165
1626
António de Sousa
Maria de Sousa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 176
1715
António Álvares
Maria da Rocha
ADP, E/27/6/1-4.1, fl.66v
1718
Manuel André
Maria João
ADP, E/27/6/1-4.1, fl.169
1721
João Gonçalves
–
ADP, E/27/6/1-4.1, fl.129
1762
António de Sousa
Ana Duarte
ADP, E/27/6/2-6.1, fl.97v
1765
António de Sousa
Maria da Rocha Felgueiras
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.12v
1788
Manuel Luís, solteiro
–
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.195v
Na freguesia de São Vicente de Alfena, no declinar da centúria de Quinhentos, documentamos os sapateiros João Gonçalves e mulher Isabel Farinha, e um Pêro João1401. No século XVII são vários os artífices do calçado nesta freguesia: Adão Pires1402, em 1609; no lugar da Rua moravam Manuel Moreira1403 e Manuel António que em 1736 tinha dois filhos: Manuel Moreira, 1401 ADP, E/27/4/2-5.1, fls. 5 e 11, respectivamente. 1402 ADP, E/27/4/2-5.1, fl.31.
1403 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.23v. 383
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
de Baguim, e Maria, solteira1404; no lugar do Xisto vivia José Ferreira1405, em 1718; em Baguim documenta-se, em 1724, António João, casado com Isabel de Aguiar, avós de Bernarda, filha de Manuel Esteves e de Senhorinha Antónia1406, e na Ferraria encontramos Manuel Ferreira1407, em 1722. Na freguesia de São Martinho do Campo contabilizamos alguns oficiais mecânicos do calçado durante o século XVII que aparecem referenciados nos assentos de baptizados de seus filhos, como padrinhos ou como testemunhas destes actos. Residiam no lugar do Outeiro, Manuel João, pai de João e de Catarina1408; Domingos João, casado com Maria Paula e pais de Antónia
(1653), Maria (1656), Catarina (1661), Domingos (1664), Manuel (1673) e de António (1677)1409 ; no lugar de Balselhas vivia e trabalhava na sua oficina Manuel João, casado com Antónia André, pais de quatro filhos: Maria, Catarina, Manuel e João1410. Quadro n.º 59 – Sapateiros da freguesia de São Martinho do Campo Ano
Nome
1616
António Gonçalves
Filhos(as)
Morada
Fonte
João
–
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.33
1645
Maria
Lugar de São Gemil
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.59
1653
António
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.67
Maria
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.71v
1656 1661
Domingos João
1664
Mulher
Maria Paula
Catarina Domingos
Lugar do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.77v ADP, E/27/4/3-9.1, fl.83
1673
Manuel
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.95
1677
António
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.100v
António
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.112v
1682 1682 1682
Manuel João
Maria Marques
Manuel Maria
–
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.112v ADP, E/27/4/3-9.1, fl.112v
1404 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.77.
1405 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.23 e 24v. 1406 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.41v.
1407 ADP, E/27/4/2-6.1, fls.35 e 35v.
1408 ADP, E/27/4/3-10.1, fls.1v e 10v, respectivamente.
1409 ADP, E/27/4/3-9.1, fls.67, 71v, 77v, 83, 95 e 100v, respectivamente. 1410 ADP, E/27/4/3-9.1, fls.6, 20v, 21, 34v e 49v, respectivamente. 384
Joel Silva Ferreira Mata
Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Morada
Fonte
1686
João
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.1v
1688
Domingos
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.6
1690 1691 1693
Manuel João, do Outeiro
Maria Marques
1697
Teresa Ana Catarina
Lugar do Outeiro
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.11 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.17 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.25v
Amaro
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.37v
1699
Isabel
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.42v
1688
Maria
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.6
1692 1696
Manuel João
Antónia André
1702
Catarina Manuel
Lugar de Balselhas
João
ADP, E/27/4/3-10.1, fls.20v-21 ADP, E/27/4/3-10.1, fl.34v ADP, E/27/4/3-10.1, fl.49v
As suas ferramentas especializadas incorporavam o grupo do segundo lugar das importações portuguesas provenientes de vários pontos da Europa1411, podendo, no entanto, alguns utensílios serem produzidos nos locais. Quadro n.º 60 – Os sapateiros do território do actual concelho de Valongo Ano
Nome
Freguesia
Fonte
1598 (?)
João Gonçalves
Alfena
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.5
1598
Pêro João
Alfena
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.5
1609
Adão Pires
Alfena
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.31
1718
Manuel Moreira
Alfena
ADP, E/27/4/2-6.1; 22v
1788
Manuel Luís solteiro
Valongo
ADP, E/27/6/1-4.2, fl.195v
1.8 – Os vendeiros e as vendeiras O comércio local estaria animado por todos aqueles e aquelas que dispunham dos bens produzidos nos campos, nas hortas e nas leiras que fabricavam ou outros que compravam directamente aos almocreves e mercadores que isoladamente e em condições precárias procuravam na transacção comercial uma forma de sobrevivência, de trocar bens para adquirir e aforrar moeda, sempre escassa em terras do interior. É certo que no território do 1411 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – ob. cit., p.164. 385
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
actual concelho valonguense não há referência a locais de comercialização fixos como o mercado, o açougue, a fanga ou a feira (excepção feita à freguesia de São Vicente de Alfena, em meados do século XIII), como em vários locais de pendor urbano ou periurbano1412, mas possuímos uma lista de indivíduos do sexo masculino e do sexo feminino que se dedicavam à comercialização de vários artigos que não aparecem especificados no acervo documental compulsado, embora em algumas situações a referência profissional possa ser um indicador daquilo que o respectivo vendeiro podia oferecer sob a forma de preço, aos potenciais compradores, tanto do aro da freguesia ou da povoação como aos que porventura viessem, sobretudo a São Mamede de Valongo, com a intenção de adquirirem os produtos ou ainda os viajantes e caminheiros que atravessavam a freguesia em direcção a Amarante e a Vila Real, no sentido ascendente ou à cidade do Porto, no sentido descendente. Os produtos identificados nas rendas pagas a toda a espécie de senhorios servem de denominador aos artigos que podiam ser transaccionados neste território. Aos cereais, omnipresentes, podiam juntar-se outros bens já transformados como o mel, a cera, o queijo, o sebo, o bragal, assim como as mercadorias transportadas pelos almocreves, no dorso dos seus animais muares, como o peixe fresco e da estação, salgado ou fumado1413. Curiosa-
mente, o foral da Terra e Concelho da Maia não integra o Título de Portagem, que regula a entrada e a saída de mercadorias deste espaço geográfico onde estavam as actuais freguesias de Ermesinde, Alfena e Valongo, mas no foral de Aguiar de Sousa, o cavaleiro Fernão de Pina, não o descrevendo em rubrica própria, remete a matéria para o foral dado a Gouveia que, por sua vez, envia o leitor para o foral atribuído à cidade da Guarda, em 1 de Junho de 15101414, nele se resguarda a tributação sobre os cereais e seus derivados; a
linhaça, o sal, o vinagre e o vinho; os panos de seda, lã, algodão e linho; dos 1412 MARQUES, A. H. de Oliveira (1981) – «Mercados», in Dicionário de História de Portugal, Vol.IV – ob. cit., pp.269-271; MARQUES, A. H. de Oliveira (1987c) –ob. cit., pp.142-153; MORENO, Humberto Baquero (1982) – «O Mercado na Idade Média», in Estudos de História de Portugal. Homenagem a A. H. de Oliveira Marques, Vol.I. sécs.X-XV. Lisboa: Editorial Estampa, pp.309-227; BARROS, Henrique da Gama (s/d) – ob. cit., Vol. 5, pp.95-96.
1413 COELHO, Maria Helena da Cruz (1996) – «O Povo – a identidade e a diferença no trabalho», ob. cit., p.285. 1414 DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1961) – Forais manuelinos do reino de Portugal e do Algarve conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo de Lisboa. Beja: Ed. do Autor, pp.1-6. 386
Joel Silva Ferreira Mata
carneiros, cabras, bodes, ovelhas, cervos, corços, ou gamos; dos cordeiros, borregos, cabritos e leitões; da caça de coelhos, lebres, perdizes, patos, adens, pombos, galinhas; dos curtumes; do calçado de qualquer espécie; das peles de raposa, martas ou forros; da cera, mel, sebo, unto, pez, resina, breu, sabão, alcatrão; dos corantes para a indústria tintureira dos panos; das especiarias; dos produtos para os boticários; do açúcar; do vidro; dos perfumes; dos metais, do ferro, das armas e ferramentas e do ferro em barra; do pescado, da fruta seca e verde; das bestas cavalares ou muares; dos escravos; da telha e louça, as mós, utensílios em madeiras; as fibras naturais1415 que estavam sujeitas ao pagamento tributário conforme a natureza da carga maior, menor ou o costal abrangendo, no caso restrito do actual território de Valongo as freguesias de Santo André de Sobrado e a de São Martinho do Campo. Estes artigos podiam ser oferecidos pelos vendedores (vendeiros) e vendedoras (vendeiras), nas suas tendas, ou em lugares que dessem visibilidade aos seus produtos, nomeadamente em Valongo (da Estrada), de passagem, de circulação, de paragem, de pausa, de descanso de homens e de animais, de carga e descarga, e servir as intenções dos produtores e comerciantes. Na freguesia de São Mamede de Valongo, a grande maioria dos vendeiros que identificamos através dos registos paroquiais, não são referidos topograficamente. Alguns, porém, viviam no Campo da Senhora, abaixo e no Adro da igreja paroquial, na Rua da Senhora, na Rua da Senhora da Luz e na Portela. De trato mais elevado que o comum dos vendeiros sobressai André António, casado com Maria Benta, moradores na Rua da Senhora da Luz, que em 30 de Dezembro de 1610, baptizou o filho David, e era, ao mesmo tempo, vendeiro e mercador1416. Numa boa parte dos identificados, as esposas
desempenhavam a mesma função que os maridos e ficaram nos assentos como mães e vendeiras: Domingas Gonçalves (1617), casada com Miguel Marcos, moradores junto do Adro da Igreja paroquial1417; Maria Ribeira (1619), casada com Belchior Ferreira, residentes também nas proximidades 1415 DIAS, Luiz Fernando de Carvalho (1961) – ob. cit., pp.3-5. 1416 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.44v. 1417 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.85.
387
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
do Adro da igreja paroquial1418; a viúva Catarina Antónia que em Outubro de 1619 baptizou uma filha1419, e outra em 1620, de nome Paula1420, e que em 1624 aparece casada com Domingos António de quem teve uma filha integrada religiosamente no dia 20 de Janeiro desse mesmo ano1421; Maria da Conceição (1633), casada com Domingos Teixeira1422; Andresa Brás (1641), mãe de uma menina baptizada em Abril1423, e Andresa Francisca (1641), casada com João Francisco1424. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, encontramos Sebastião Fernandes (1629), casado com Isabel Francisca, de quem teve dois filhos entre 1629 e 1631 e que moravam na aldeia de Sá1425. Mais enigmático é o caso de Domingos António “vendeiro da estrada”1426 que aparece como padrinho, em 1662. É provável que o abade António da Rocha responsável pelo assento do baptismo estivesse a referir-se ao topónimo e, nesse sentido, estaria a localizar o vendeiro em Valongo da Estrada, e não propriamente ao local de venda ao público, ou então quis dizer que se tratava de um indivíduo que vendia os seus artigos na estrada, à sua porta. Em 1732 surge o vendeiro João Lopes, viúvo, que teve um filho com Maria Ângela, moça solteira, do lugar da Ermida, patenteado nas informações que foram prestadas ao abade José Lopes Roque da Maia1427. Na
freguesia de São Martinho do Campo aparece um certo Gonçalo Francisco, em 1626, mas em Valongo1428.
1418 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.149.
1419 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.150v. 1420 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.153.
1421 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.166v. 1422 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.20v 1423 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49. 1424 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50.
1425 ADP, E/27/4/4-14.5, fls.46 e 57. 1426 ADP, E/27/4/4-14.5, fl.91.
1427 ADP, E/27/4/4-15.1, fls.108. 1428 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.178.
388
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 61 – Domicílio dos Vendeiros da freguesia de São Mamede de Valongo Ano
Nome
Mulher
Morada
Fonte ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11v
1591
António de Paiva
Catarina Brás
Campo da Senhora
1592
Bento Anes
Catarina Marcos
Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 13
1593
Bento Martins
Catarina Marcos
Abaixo da Igreja
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.20
1598
Francisco Ferreira
Antónia Francisca
Rua da Senhora
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34v
1600
Domingos Dias
Maria André
Valongo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.38
1601
André António “vendeiro mercador”
Maria Benta
Rua da Senhora da Luz
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.44v
1617
Miguel Marcos
Domingas Gonçalves, vendeira
Abaixo do Adro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.85, 142v
1618
Bento Gonçalves
Catarina Francisca
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.143v
1618
Bento Gonçalves
–
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.146v
1618
Marcos Gonçalves
Joana André
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.147
1618
António da Fonseca
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.147v
1619
Belchior Ferreira
Maria Ribeira, vendeira
Junto ao Adro
E ADP, /27/6/1-2.3, fl.149
1624
André Manuel
Isabel Antónia
Adro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.169
1628
António Carneiro
–
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.184
1636
Manuel Marques
–
Portela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.32
Gráfico n.º 35 – Domicílio dos vendeiros na freguesia de São Mamede de Valongo (1591-1636)
389
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 62 – Vendeiros(as) da freguesia de São Mamede de Valongo (não identificados por domicílio) Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Fonte
1592
Aleixo Dias
Maria Gonçalves
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 13
1593
André António
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.16
1593
Francisco António
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.18v
1598
Domingos António
Catarina Antónia
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.35
1614
Manuel Ribeiro
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.78v
1615
João Martins
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81
1615
Bento Gonçalves do Ribeiro
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.82v
1616
António da Fonseca
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.138v
1619
–
Catarina Antónia, viúva, vendeira
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.150v
1619
Marcos Gonçalves
Joana André
Joana
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.151
Catarina Antónia, viúva, vendeira
Paula
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.153 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.155v
1620 1620
João Martins
Justa Gonçalves
Ana
1620
Marcos Gonçalves
Joana André
Joana
1621
Miguel Santos
Jerónima João
Miguel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.157v
1621
Manuel António
Andresa Brás
Adão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.159v
1621
André António, o velho
1623
Manuel António
Andresa Brás
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 165v
1624
Domingos António
Catarina Antónia, vendeira
Conceição
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.166v
1627
Domingos Teixeira
1628
Miguel Marcos
Domingas Álvares
Jerónima
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.184v
1629
Gonçalo Lopes
Andresa Francisca
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.186
1629
André António
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.3v
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.160
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.179v
390
Joel Silva Ferreira Mata
Quadro n.º 63 – Vendeiros da freguesia de São Mamede de Valongo Ano
Nome
Mulher
Filhos(as)
Fonte
1631
Manuel António
Domingas Antónia
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11v
1633
Domingos Teixeira
Maria da Conceição, vendeira
Manuel
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.20v
1635
Manuel António, o corisco
Domingas Antónia
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.26
1635
Gonçalo Lopes
Andresa Francisca
Domingos
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.28v
1636
António da Fonseca
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.31v
1636
Domingos da Fonseca, ferrador e vendeiro
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34
1639
Domingos da Fonseca
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43
1639
André de Paiva
Catarina Manuel
Catarina
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.45
1640
(†)Bartolomeu António
Andresa Brás
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.47v
1641
João Francisco
Andresa Francisca
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.48
1641
Manuel Marques, o recachado
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49
1641
–
Andresa Brás, vendeira
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49
1641
João Francisco
Andresa Francisca, vendeira
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50
1641
Manuel Marques
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50v
1642
João Francisco
Andresa Francisca
Maria
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.52
1642
Brás Alvares
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.52v
1646
Brás Alvares
–
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.65
O protagonismo profissional dos pequenos comerciantes, vai contrastando com a ideia traduzida pelo inquiridor que em 1530 apresentava a freguesia de São Mamede de Valongo à distância de “duas leguoas pera o sertão”1429, que aliás deu a mesma indicação para a freguesia de São Vicente de Alfena.
1429 TT, Gaveta 15, mç. 24, n.º12; FREIRE, Anselmo Braamcamp (1905) – ob. cit., p.259. 391
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
1.9 – Os barbeiros O barbeiro também fazia parte do grupo dos oficiais mecânicos, distinguindo-se dos outros pela sua especificidade. No Regimento das Procissões de Évora, estavam incluídos nos “homens de armas”, em oitavo lugar, juntamente com os ferreiros, ferradores, armeiros, cutileiros, seleiros, bainheiros, esteiros e latoeiros1430, à frente dos alfaiates ou dos sapateiros. Bispos e reis
tinham, entre aqueles que os serviam, um barbeiro, como por exemplo o arcebispo bracarense D. Fernando da Guerra1431.
O trabalho do barbeiro destinava-se ao sector masculino e progrediu conforme os ventos da moda. No início do século XIV rapava-se o bigode e a barba. Em contrapartida, o cabelo crescia até aos ombros. Depois, e ainda na primeira metade da centúria de Trezentos, regressou o costume de usar barba e bigode. Entretanto começou a cortar-se o cabelo e a partir de meados do século XV, o cabelo volta a usar-se comprido1432. As navalhas para fazer
a barba e as tesouras para cortar o cabelo, em grande parte, eram importadas1433.
A barba, nos grupos sociais hierarquicamente inferiores que atingiam os agricultores era um sinal importante e identificava o peão, sendo “o seu atributo viril”1434. No actual território valonguense assinalamos o ofício de barbeiro em diversos lugares, embora em número reduzido quando comparado com o registo de outros ofícios dos mesteres dentro dos mesmos parâmetros cronológicos. Na freguesia de São Lourenço d’Asmes, no primeiro quartel do século XVIII, documenta-se um Pedro Fernandes que havia presenciado o baptizado de Maria, filha de João de Paiva e de sua mulher Maria Miguel, estantes em Baguim, na freguesia de São Vicente de Alfena1435. 1430 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987) – ob. cit., p.137.
1431 MARQUES, José (1979) – O Testamento de D. Fernando da Guerra, sep. De Bracara-Augusta, T. XXXIII, fasc.75-76 (87-88). Janeiro-Dezembro. Braga. 1432 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987c)– ob. cit., p.470.
1433 MARQUES, A. H. de Oliveira (1987b) – ob. cit., p.164
1434 COELHO, Maria Helena da Cruz (1996) – «O Povo – a identidade e a diferença no trabalho», ob. cit., p.257. 1435 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.16.
392
Joel Silva Ferreira Mata
Em São Vicente de Alfena, em 1693, surge um outro Pedro Fernandes1436 que pode muito bem tratar-se da mesma pessoa; do início do século XVIII menciona-se o barbeiro Manuel da Silva, padrinho e parente de João e sua mulher Isabel Pacheca, da Ferraria1437; na freguesia de São Martinho do Campo são nomeados Francisco Moreira (1709) e Manuel Lopes1438. Em São Mamede de Valongo, o primeiro barbeiro que foi identificado é Francisco Gaspar1439,em 1613; no mesmo ano há, de novo, uma referência
a um outro barbeiro de nome João Marques que aceitou ser padrinho de uma filha de Manuel Nogueira e de sua mulher Catarina Marques, e em 1727, é dado já como defunto, mas teve um filho Manuel Ferreira Coimbra, ainda solteiro; foi casado com Maria Ferreira1440; no lugar de Valongo Susão, o barbeiro Lázaro Mendes foi várias vezes referenciado entre 1615-1629, e na sua última menção aparece casado com Andresa Martins, por altura do baptizado de Maria, sua filha1441. Mais tarde, sem indicação domiciliária, anota-se o barbeiro Vicente da Cunha e mulher Maria Barbosa que a 20 de Dezembro de 1645 baptizou sua filha Ângela1442. Em meados do século XVIII, há um Domingos António, casado com Maria de Sousa, em 1747, tendo estado presente, já no ano anterior, no baptizado de um filho de Manuel Gonçalves e de Quitéria Alves1443; em 1752, refere-se João Álvares, casado com Maria Ribeira, e filho de Manuel João, mareante, por apelido, o carriço1444, e de Luzia Gonçalves1445. Na freguesia de São Martinho do Campo foram barbeiros Pedro João e de Pedro Vaz (1634) ambos intervenientes na qualidade de padrinhos1446, e em 1675, João Dias, o barbeiro1447, por alcunha. 1436 ADP, E/27/4/2-6.1, fl.16.
1437 ADP, E/27/4/2-5.2, fl.122.
1438 ADP, E/27/4/3-6.10.1, fls.80-80v e 152. 1439 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.78.
1440 ADP, E/27/6/1-4.1, fls.42, 236v. 1441 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.4v.
1442 ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63v.
1443 ADP, E/27/6/2-5.1, fls.71v, 97v. 1444 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.133. 1445 ADP, E/27/6/2-5.2, fl.21v.
1446 ADP, Dep. G, fls.42v e 46-46v. 1447 ADP, E/27/4/3-9.1, fl.97v.
393
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Quadro n.º 64 – Barbeiros do território do actual concelho de Valongo ano
freguesia
nome
mulher
fonte
Alfena (São Vicente de )
Pedro Fernandes
–
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.76
Manuel da Silva
–
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.110
Pedro Fernandes
–
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.16
Pedro João
–
ADP, ADP, Dep. G, fl.42v
João Dias
–
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.97v
Francisco Moreira
–
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.74
1711
Manuel Lopes
Isabel Duarte
ADP, E/27/4/3-10.1, fl.80
1613
Francisco Gaspar
–
ADP, E/27/6/1-2.3, fl. 78
1613
João Marques
Maria Ferreira
ADP, E/27/6/1-4.1, fl.236v
Lázaro Mendes
Andresa Martins
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.4v
Vicente da Cunha
Maria Barbosa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63v
1747
Domingos António
Maria de Sousa
ADP, E/27/6/2-5.1, fl.97v
1752
João Álvares
Maria Ribeira
ADP, E/27/6/2-5.2, fl.21v
1693 1704 1717
Ermesinde (São Lourenço d’Asmes)
1632 1675 1709
1615 1645
Campo (São Martinho do )
Valongo (São Mamede de )
1.10 – Aspectos onomatológicos dos profissionais e moradores valonguense: as alcunhas O nome era o elemento identitário mais importante e, muitas vezes, único, dos camponeses, dos profissionais ligados aos mesteres e a outras actividades artesanais assim como da área da prestação de serviços. Ao nascer, o indivíduo recebia o nome, de baptismo que, em muitos casos, coincidia com o nome dos progenitores que, assim asseguravam a herança onomatológica. Muitos meninos e meninas receberam o nome de santos ou de santas, ou de comemorações religiosas como a Páscoa, por terem nascido no dia da efeméride marcada pelo calendário litúrgico. A onomástica dos largos milhares de nascituros do território valonguense globalmente considerado, só aparentemente parece ser diversificada, rica e complexa, aliás como acontecia em todo o território nacional1448. Até ao 1448 Sobre o tema, cf. ALVES, Ana Maria (1983) - «Onomástica quinhentista. Subsídio para um estudo de mentalidades na 2.ª metade do século XVI», in Estudos de História de Portugal. Sécs.XVI-XX. Homenagem a A. H. de Oliveira Marques. Lisboa: Editorial Estampa, pp.119-144; DIAS, João José Alves (1996) – ob. cit.; GONÇALVES, Iria Vicente 394
Joel Silva Ferreira Mata
casamento, o indivíduo tinha o nome próprio de baptismo1449, adoptando, posteriormente, um ou mais sobrenomes ou apelidos, embora houvesse, neste território, vários rapazes e raparigas com nome próprio e apelido antes de casar. O processo encontrado para distinguir e individualizar a identidade de pessoas homónimas, do mesmo lugar ou aldeia, consistiu, pois, na adopção de uma alcunha, que tanto podia ser de natureza geográfica, moral, social, profissional religiosa, física ou outra, cuja classificação apresentamos, embora certo tipo de alcunhas possa ser agrupado de forma diferente da tipologia aqui referida. Algumas alcunhas inventariadas desde os finais do século XVI até ao fim do primeiro quartel do século XIX mantiveram-se até aos nossos dias para continuar a diferenciar e a identificar as pessoas, passando algumas delas a constar como apelido1450.
(1971) – «Amostra de antroponímia alentejana do século XV», in Do Tempo e da História, Vol.IV. Lisboa, pp.173-212; idem (1976/77) – «Notas de Demografia Regional: a comarca de Leiria em 1537», in Revista da Faculdade de Letras, I. Lisboa, pp.405-454; MATA, Joel Silva Ferreira (2007) – ob. cit., pp.391-405; MAURÍCIO, Maria Fernanda (1986) – «O Tombo da Comarca da Beira como fonte para a História Económica e Social da região», in História & Crítica, n.º 13. Lisboa: Faculdade de Letras de Lisboa. Junho de 1986, pp.3352; RODRIGUES, Ana Maria S. A. (1996) – «A População de Torres Vedras em 1381», in Espaços, Gente e Sociedade no Oeste. Estudos sobre Torres Vedras medieval. Cascais: Patrimónia, pp.45-67; VASCONCELOS, J. Leite de (1928) – Antroponímia Portuguesa. Lisboa. 1449 MONTEIRO, Nuno Gonçalo (2010) – ob. cit., p.151.
1450 SOARES, Jacinto (2016) – ob. cit., pp.245-250, para a freguesia de Ermesinde 395
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
A. Alcunhas da freguesia de São Vicente de Alfena I. De natureza física Data
Nome
Alcunha
fonte
1643
Pero Henriques
O velho
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.92
1677
Isabel
A “bel”
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.46
1680
Pedro Anes
O novo
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.52v
1691
Manuel Moreira
O belo
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.71v
1716
Manuel António
O novo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.12v
1722
João André
O novo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.35v
1729
João de Paiva dos santos
O lindo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.55v
1731
Manuel Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.59
1732
Manuel Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.63
1737
Manuel Moreira Barbeitos
O novo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.81v
II. De natureza social Data
Nome
Alcunha
fonte
1604
Maria
A preta
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.21v
1604
Maria
“A preta de alcunha”
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.23
1667
Maria
A pega
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.20
1694
Maria
A negra
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.79
1696
João
O negro
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.80
1707
Maria
A conda
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.117
1713
Manuel de Paiva
O conde
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.3
1727
Teresa
A enjeitada
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.50
1735
António José
O enjeitado
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.72v
1735
António
O enjeitado
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.73
1736
Maria
A conda
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.75v
1752
Maria do Rosário
A preta
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.137
1752
João Pinheiro
O preto
ADP, E/27/4/2-6.1, fl..137
1752
João de Melo
O preto
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.137
1755
Francisco Ferreira
O preto
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.153
1755
Antónia de Jesus
A preta
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.153
396
Joel Silva Ferreira Mata
III. De natureza moral Data
Nome
Alcunha
fonte
1604
Maria
A preta
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.21v
1615
Isabel
A melra
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.38v
1616
Maria
A mentecapta
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.39
1665
Pero Anes
O porco de Cabeda
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.[13v]
1670
Catarina
A fresca
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.28
1674
Catarina
A justa
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.[38v]
1686
Maria
A formiga
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.63
1689
Isabel
A cardosa
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.67
1704
Maria
A “goreveja”
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.108
1706
Isabel
A alonsa
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.115
1709
Maria João
A maralha
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.123v
1709
Luzia
A pisca
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.123v
1715
Maria
A grila
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.8v
1716
Maria Moreira
A sobreira
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.11
1718
Maria
A castelhana
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.21v
1719
Manuel António
O garrão
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.28v
1727
António da Silva
O coruja
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.48
1727
Isabel de Paiva
A gandarela
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.49
1731
Vicente André
O pisco
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.59v
1731
Maria
A caniça
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.59
1733
Maria Francisca
A borralha da eira
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.67
1733
Maria
A canifa
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.68
1736
Vicente Moreira
O barbo
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.75v
1757
Maria
A camela
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.164
IV. De natureza profissional Data
Nome
Alcunha
fonte
1598
Gonçalo Pires
O barbeita de Alfena
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.10
1699
Manuel de Paiva
O ferreiro do ouro
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.92v
1729
Manuel Moeira
O fuseiro
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.54v
1733
Maria Manuel
A agra
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.66
1733
Maria Francisca
A borralha da eira
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.67
1733
Domingos Gonçalves
O moleiro da azenha
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.68v
397
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
V. De natureza geográfica/naturalidade Data
Nome
Alcunha
fonte
1598
Gonçalo Pires
O barbeita de Alfena
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.10
1626
Maria Fernandes
A galega
ADP, E/27/4/2-5.1, fl.49
1679
Isabel de Paiva
Da pereira
ADP, E/27/4/2-5.2, fl.49
1718
Maria
A castelhana
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.21v
1719
Manuel António
O garrão
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.28v
1719
Catarina
A castelhana
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.28v
1720
Maria
Da venda
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.29v
1734
Manuel Moreira
O castelhano
ADP, E/27/4/2-6.1, fl.69
B. Alcunhas – Freguesia de São Martinho do Campo I. De natureza física Data
Nome
Alcunha
fonte
1589
Gaspar Miguel
O novo de Sobreira
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.2
1598
João Gonçalves Ilhão
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.18v
1605
João Enes
O novo de Balselhas
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.26
1610
António Gonçalves
O novo da Ponte Ferreira
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.29
1621
Maria
A nova
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38
1621
Domingos Martins
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38v
1621
Domingos Martins
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38v
1621
João Gonçalves
O novo do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38v
1640
Domingos Palos
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.55
1640
Domingos Martins
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.55
1641
Gaspar António
O gordo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.56v
1641
Brás Moreira
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.56v
1643
João Dias
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.57v
1643
Domingos Palos
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.57v
1644
Maria
Nova da Ponte
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.58
1654
Domingos Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.68v
1658
Gaspar António
O calvo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.74
1669
Pedro Gonçalves
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.88v
1669
Pedro Gonçalves
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.88v
1670
João de França
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.90
398
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1671
João Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.91
1673
Maria Gonçalves
A nova
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.95
1674
António Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.97
1676
André Gonçalves
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.99v
1680
António Gonçalves
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.106v
1680
António Gonçalves
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.106v
1681
Bartolomeu João
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.109v
1681
João Martins
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.111
1685
Manuel Gaspar
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.120v
1687
Manuel João
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.2v
1687
Bartolomeu João
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.3
1687
Maria Ferreira
A moça
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.3
1688
Bartolomeu João
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.6v
1690
José da Rocha
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.12
1691
Manuel João
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.15
1692
João Gonçalves
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.17v
1692
Domingos António
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.20
1692
João Fernandes
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.21v
1692
Manuel Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.22
1694
Manuel Ferreira
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.28v
1695
Domingos António
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.30v
1696
Manuel Coelho
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.33
1697
Manuel João
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.35v
1698
João Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.40
1699
Manuel Coelho
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.44
1699
José da Rocha
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.44
1699
Manuel João
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.44
1701
Manuel Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.47v
1701
Manuel Ferreira
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.47v
1702
Manuel Gaspar
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.49v
1702
Manuel João
O branco
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.50
1710
Manuel Coelho
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.78
1711
João Dias
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.81
1720
Manuel Francisco
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.115
1720
Manuel João
O novo da Ponte
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.122
1723
Manuel Francisco
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.124v
399
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1723
Manuel Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.125v
1724
João Carvalho
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.129
1725
Manuel Francisco
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.133
1725
João Bento
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.138
1725
Manuel Coelho
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.142
1736
Manuel Coelho das Póvoas
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.164
1738
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.180v
1743
Manuel António
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.194v
II. De natureza social Data
Nome
Alcunha
fonte
1725
Manuel Francisco
O novo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.133
1741
José
O enjeitado
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.187
1741
Martinha dos Anjos
A enjeitada
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.187v
1742
Eufémia
A enjeitada
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.190
1743
Josefa
A enjeitada
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.199
1748
João António
O enjeitado
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.212
III. De natureza moral Data
Nome
Alcunha
fonte
1658
Gaspar António
O calvo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.74
1686
Domingos Gonçalves
O campeão de Valongo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.2v
1693
Maria
A escamada
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.23
1694
Manuel Ferreira
O velho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.28v
1696
António
O tomã
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.34v
1699
Domingos António
O pedra
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.41
1699
Manuel João
O zangalho
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.43v
1702
Manuel João
O branco
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.50
1706
Antónia João
A franca
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.65v
1707
Manuel João
O cabeda
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.69v
1711
Isidoro Campelo
O bravo (?)
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.79v
1711
Manuel João
A janete
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.81
400
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1725
Domingos André
O frei
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.132v
1738
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.180v
IV. De natureza familiar Data
Nome
Alcunha
fonte
1616
Maria
A neta
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.33
V. De natureza profissional Data
Nome
Alcunha
fonte
1614
António Gonçalves
O peleiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.31v
1618
Pedro Gonçalves
O pedreiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.35
1620
Maria João
A currais
ADP, E/27/4-14.5, fl.36
1623
António Gonçalves
O pedreiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.40
1629
António Gonçalves
O alfaiate
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.46
1633
António Gonçalves
O padeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.48
1635
João Gonçalves
O perú
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.50
1642
João Gonçalves
O peruleiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.57
1645
Domingos João
O sapateiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.59
1676
Domingos João
O sapateiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.99
1701
Manuel João
O “pixoeiro” do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.47
1707
Manuel João
Perueiro do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.67v
1736
Manuel João
perueiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.164
401
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
VI. De natureza geográfica Data
Nome
Alcunha
fonte
1621
João Gonçalves
O novo do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38v
1639
João Gonçalves
O ilhão
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.52v
1644
Maria
Nova da Ponte
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.58
1686
Domingos Gonçalves
O campeão de Valongo
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.2v
1698
João Gonçalves
O ilhão
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.38v
1701
Manuel João
O “pixoeiro” do Outeiro
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.47
1720
Manuel João
O novo da Ponte
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.122
VII. De natureza religiosa Data
Nome
Alcunha
fonte
1725
Domingos André
O frei
ADP, E/27/4/3-9.1, fl.132v
C. Alcunhas – Ermesinde (São Lourenço d’Asmes) I. De natureza física Data
Nome
Alcunha
fonte
1586
António Pires
O novo
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.2v
1587
João Anes
O novo
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.4v
1588
Gonçalo Francisco
O novo de Vilar
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.5v
1589
António Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.6v
1615
Gaspar Gonçalves
O manco
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30
1616
Maria Gonçalves
A manca do Carvalhal
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.31v
1640
Maria
A “cadrada”
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.63v
1662
Domingos João
O velho
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.90v
1662
Domingos João
O novo
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.90v
1662
André António
O cambado
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.91
1792
José António
A chiquela
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.3v
1798
Pedro
O cambado
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.53
402
Joel Silva Ferreira Mata
II. De natureza social Data
Nome
Alcunha
fonte
1586
António Pires
O novo
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.2v
1589
Catarina
A preta de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.7v
1601
Isabel
A filha da preta
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.15
1765
João António
O vadio
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.232
1792
Manuel José Pires Queiroga
O criado
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.2
III. De natureza moral Data
Nome
Alcunha
fonte
1608
Gonçalo Fernandes
O currais
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.24
1609
Gonçalo Fernandes
O varela
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.25v
1614
Gonçalo Fernandes
O varela de S. Paio
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.29v
1634
Isabel
A formiga
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.55v
1644
Maria Gonçalves
A zevia
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.69v
1651
Isabel João
A “grillotes”
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.79
1653
Maria
A sonça (?) de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.82
1653
Isabel João
A raba
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.82
1654
André António
O ergues de Vilar de Matos
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.83
1657
Maria
A louca (?) de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.85v
1660
Manuel João
O patacão da Granja
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.89
1703
Isabel João
Viúva do arroto
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.20v
1710
Maria
Farola da aldeia da Cancela
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.45v
1712
Catarina
A galgueira
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.52
1715
Manuel António
“Tarollo do arroto”
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.62v
1716
Maria
“tanchana” da aldeia de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.65
1718
Maria
A rabela
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.70
1720
Maria
A rabela da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.75
1721
Maria João
A trapa da aldeia de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.78
1721
Catarina
A galreira
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.79
1721
Maria
A garraxa
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.79
1727
Manuel António
O verdelho
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.93v
1733
Josefa
A enguiça
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.108v
403
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1736
Manuel Luís
O cabeção
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.118
1740
Marina Solurina
A faria do lugar de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.128
1742
António Manuel
O tarolo
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.138v
1746
Manuel
O garraio de S. Paio”
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.189
1747
Maria
A taria
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.131
1745
Manuel Luís
O cabeças
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.207
1756
Manuel João
O manhoso
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.215
1756
Manuel António
O trapo
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.215v
1757
Domingas
A chiquela
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.216v
1758
João António
O cachinho
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.220
1762
José António
O chiquela
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.226
1762
João António
O cachinho
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.227
1764
António
O cacho
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.229
1764
Manuel António
Do tantão
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.229v
1764
Manuel António
Do funtão
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.230v
1764
Maria
A pinta
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.230
1792
José António
O chiquela
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.3v
IV. De natureza familiar Data
Nome
Alcunha
fonte
1601
Isabel
Filha da preta
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.15
1640
Maria Gonçalves
A serva da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.63v
1652
Maria
A neta de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.81
1703
Isabel João,
A viúva do arroto
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.20v
404
Joel Silva Ferreira Mata
V. De natureza profissional Data
Nome
Alcunha
fonte
1608
Gonçalo Fernandes
O currais
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.24
1614
Domingos João
O mestre
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30
1614
Gonçalo João
O moleiro
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30
1615
Esteva
A alfaiata
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.30v
1620
Maria João
A currais
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.36
1629
Sebastião Fernandes
O vendeiro
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.46
1640
Maria Gonçalves
A serva da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.63v
1662
Domingos António
O vendeiro da Estrada
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.91
1804
Antónia Ferreira
“assistente nos moinhos da Travagem”
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.77
1804
José da Silva
“assistente nos moinhos da Travagem”
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.77
VI. De natureza geográfica Data
Nome
Alcunha
fonte
1588
Gonçalo Francisco
O novo de Vilar
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.5v
1589
Catarina
A preta de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.7v
1600
Maria Gonçalves
A galega da aldeia de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.14v
1613
João Fernandes
O novo de Vilar
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.29
1614
Gonçalo Fernandes
O varela de S. Paio
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.29v
1616
Maria Gonçalves
A manca do Carvalhal
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.31v
1640
Maria Gonçalves
A serva da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.63v
1645
Isabel
A galega
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.70v
1647
Margarida
Do Poço
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.73
1654
André António
O ergues de Vilar de Matos
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.83
1657
Maria
A louca (?) de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.85v
1660
Manuel João
O patacão da Granja
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.89
1660
Melícia Miguel
Da Estrada
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.89
1661
Isabel João
A galega de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.90
1662
Domingos António
O vendeiro da Estrada
ADP, E/27/4/4-14.5, fl.91
1709
Ana Antónia
A rasteira da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.39
1710
Maria
A farola da aldeia da Cancela
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.45v
405
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1716
Maria
A “tanchana” da aldeia de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.65
1720
Maria
A rabela da aldeia de Sá
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.75
1721
Maria João
A trapa da aldeia de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.78
1740
Marina Solurina
A faria do lugar de Ermesinde
ADP, E/27/4/4-15.1, fl.128
1746
Manuel
O garraio de S. Paio”
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.189
1762
Mariana
A galega
ADP, E/27/4/4-16.1, fl.226v
1804
Antónia Ferreira
“assistente nos moinhos da Travagem”
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.77
1804
José da Silva
“assistente nos moinhos da Travagem”
ADP, E/27/4/4-15.2, fl.77
D. Alcunhas de Sobrado (Santo André de) I. De natureza física Data
Nome
Alcunha
fonte
1605
Pero Anes
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.10v
1606
André Gonçalves
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.11v
1612
Pero Palos
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.14v
1612
Sebastião Fernandes
O velho
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.14v
1640
João Ferreira
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.37
1641
Gaspar Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.41v
1642
Manuel Jerónimo
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.42
1642
Pedro Gonçalves
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.42
1642
Manuel Álvares
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.42v
1644
André Pires
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.45v
1647
Paulos Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.50v
1665
Domingos Pedro
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.72v
1665
Domingos André
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.73v
1665
António Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.73v
1666
João Palos
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl74v
1666
Domingos Pedro
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.74v
1667
João André
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.75
1671
António João
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.85v
406
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1674
Domingos Martins
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl. 94
1685
Domingos Martins
O novo
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.114v
1704
Manuel Gaspar
O velho
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.118
1704
João Fernandes
O velho
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.119
1705
Domingos Manuel
O velho d’além
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.120
1705
Domingos Álvares
O velho de Vilar
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.120
1706
Manuel Gaspar
O velho de Sobrado
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.121v
1706
Manuel Gaspar
O velho de Paço
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.122
1706
Manuel Jerónimo
O novo
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.123
1714
André Manuel
O velho
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.2v
1714
Manuel Jerónimo
O velho
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.3
1715
Manuel Gaspar
O moço
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.5
1715
João Gaspar
O velho
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.7v
1716
Manuel Gaspar
O cabo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.9
1716
Manuel André
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.10
1716
Maria João
A nova da aldeia de Sobrado
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.15
1720
Manuel André
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.21v
1722
Pedro Melchior
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.26v
1725
Manuel Fernandes
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.36v
1728
Manuel Gaspar
O moço
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.45v
1728
António João
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.20
1731
Manuel Fernandes
O velho
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.57v
1733
Manuel Gaspar
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.66v
1733
Pedro Melchior
O novo
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.67
1757
Manuel Gaspar
O gago
ADP, E/27/4/6-21.1, fl.209
1771
Manuel Ribeiro
O novo
ADP, E/27/4/6-22, fl.823
407
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
II. De natureza social Data
Nome
Alcunha
fonte
1595
Maria
A enjeitada
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.3v
1675
Maria
A branca
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.99
1678
Ana
A negra
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.103
1678
Isabel
A preta
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.103
1685
Maria
A preta
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.
1693
Graça Armante
Negra pobre
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.112
1696
Domingas
A órfã
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.211v
1736
Maria
A enjeitada
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.35v
1776
António
O Enjeitado
ADP, E/27/4/6-22, fl.832
1829
Joaquina
A mendicante
ADP, E/27/6/1-1.1, fl.28v
III. De natureza moral Data
Nome
Alcunha
fonte
1675
Maria
A branca
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.99
1678
Ana
A negra
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.103
1678
Isabel
A preta
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.103
1685
Maria
A preta
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.
1693
Graça Armante
Negra pobre
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.112
1718
Manuel Fernandes
O loio
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.16
1729
Domingos Gaspar
Casas novas
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.20v
1736
Maria
A enjeitada
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.35v
1741
Domingos André
O Tomé
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.45v
1748
Manuel Fernandes
Do covo
ADP, E/27/4/6-21.1, fl.195v
1834
Ana Fernandes
A pegas
ADP, E/27/6/1-1.1, fl.40
Alcunha
fonte
IV. De natureza profissional Data
Nome
1624
Isabel André
A rendilheira
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.24
1636
Domingos
Filho do alfaiate de Paços
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.29v
1642
Isabel
Filha da rendilheira
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.42
1701
Silvestre João
Cesteiro do Paço
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.116
1718
José João
O moleiro
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.16
408
Joel Silva Ferreira Mata
V. De natureza geográfica Data
Nome
Alcunha
fonte
1614
Maria Gonçalves
Do Brasil
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.222
1636
Domingos
Filho do alfaiate de Paços
ADP, E/27/4/5-19.12 , fl.29v
1701
Silvestre João
Cesteiro do Paço
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.116
1705
Domingos Manuel
O velho d’além
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.120
1705
Domingos Álvares
O velho de Vilar
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.120
1706
Manuel Gaspar
O velho de Sobrado
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.121v
1706
Manuel Gaspar
Do Outeiro de Sobrado
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.12
1706
Manuel Gaspar
O velho de Paço
ADP, E/27/4/5-20.1, fl.122
1716
Maria João
A nova da aldeia de Sobrado
ADP, E/27/4/5-20.2, fl.15
E. Alcunhas de Valongo (São Mamede de) I. De natureza física Data
Nome
Alcunha
fonte
1591
João Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11v
1593
Gonçalo Lopes
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.116v
1593
Gonçalo Martins
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.19v
1600
Gonçalo Lopes
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.37v
1606
Maria
A parda
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.58
1606
Maria
A pequena
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.59
1606
Maria
A branca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.60v
1611
Maria Gonçalves
A branca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.68v
1612
António Gonçalves
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.71
1614
Manuel António
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.80
1614
Francisco Jorge
O tacão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81
1615
Manuel António
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.84v
1616
Maria
A carreira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.136
1616
Manuel do Vale
O ermitão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.137
1616
António Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.140v
1618
Francisco
O manco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.147v
1610
António Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.155
1621
André António
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.160
409
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1624
Sebastião Dias
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170
1624
Sebastião Dias
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170
1625
Domingos Fernandes
O delgado
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.173v
1628
Pero Fernandes
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.183v
1630
Maria
A parda, candeeira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11
1632
João Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11v
1632
António Dias
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.14v
1635
António Álvares
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.27v
1637
Belchior Manuel
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.37
1637
Maria
O gordelha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.40v
1638
João Baptista
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.41
1638
Cosme Fernandes
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.41v
1639
Manuel Brás
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43
1641
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50
1644
Miguel Brás
O velho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.58
1644
Francisco João
O meão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.59v
1645
Manuel Dias
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.62
1645
Baltasar Gonçalves
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63v
1646
Maria
A anainha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.64v
1649
Manuel Gonçalves
O novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.71
1663
Manuel António
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.66v
1664
Manuel António
O branquinho
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.72
1664
Manuel Dias
O manco
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.75v
1665
Manuel da Rocha
O velho
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.77v
1666
António
O moreno
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.3v
1666
Maria
A gorda
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.4
1666
António Pero
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.5v
1667
Manuel da Rocha
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.16
1669
Domingos Fernandes
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.28v
1670
Maria Antónia
A valeira
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.33
1670
Domingos Manuel
O novo da Vale
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.34
1670
Manuel Gaspar
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.34
1673
Mateus de Paiva
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.58v
1674
António Martins
O novo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.67
1676
António Pereira
O novo do Susão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.76v
1677
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.86
410
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1680
Manuel Gonçalves
O brancudo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.100
1681
Manuel Gonçalves
O moreno
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.106v
1684
Manuel Bento
O curto
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.153
1687
António Ribeiro
O grande
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.2v
1687
António de Sousa
O velho
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.4v
1687
Manuel Bento
O velho
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.5
1687
Manuel Gonçalves
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.7v
1688
Manuel Fernandes
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.12
1688
Manuel João
O manco
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.13v
1689
João Dias
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.14v
1690
António de Sousa
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl20v
1691
João Pereira
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.25
1694
Gonçalo João
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.43v
1697
António Ribeiro
O pequeno
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.70v
1702
Maria Francisca
A cheia
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.133
1702
Manuel Luís
O beiçudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.136
1704
António Lopes
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.155
1705
Manuel Luís
O beiçudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.176v
1705
Manuel Dias da Cruz
O redondo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.177
1705
Manuel Álvares Rego
O velho
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.180v
1706
Gonçalo João
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.186v
1706
António João
O curto
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.194v
1706
Manuel Luís
O beiçudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.195v
1707
Manuel bento
O novo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.202
1707
Gonçalo Gonçalves
O novo de Susão
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.203
1709
Manuel João
O velho
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.224
1710
António Dias
O manço
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.118
1710
Maria
A galega
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.4v
1712
António Francisco
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.30v
1713
Manuel António
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.42v
1715
António João
O curto
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.65v
1716
Miguel
O velho
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.73
1716
António Manuel
O velho
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.74
1716
António Ribeiro
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.76v
1716
António Francisco
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.81
1717
Manuel de Sousa
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.87
411
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1719
Manuel João
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.103
1719
Domingos Dias
O ruço
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.105
1719
João Gonçalves Brito
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.107v
1719
Francisco Jorge
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.112v
1720
António João
O gordo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.118
1721
Francisco Jorge
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.139
1721
Manuel Gaspar do Vale
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.140v
1722
António Francisco
O coxo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.149
1722
Maria João
A curta
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.154
1723
Domingos de Sousa Fernando
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.171v
1724
António Ribeiro
O pequeno
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.188v
1725
António Dias
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.198v
1726
Manuel de Barros
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.220
1723
Pedro da Costa Lima
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.241v
1729
Manuel Alvares
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.269v
1743
Manuel João
O coxo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.2
1743
Manuel António
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.7v
1744
Manuel Bento
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.21v
1744
António Moreira
O pardo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.22v
1744
Roque Marques
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.23
1744
João Martins
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.25v
1745
Manuel João
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.52v
1750
Manuel Alvares Portela
O novo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.152
1756
Catarina João
A curta
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.140
1760
Teresa João
A curta
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.50
1760
Maria João
A curta
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.50
1760
António Martins
O curto
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.61
1763
Maria de Sousa
A branca
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.126
1766
António da Rocha Felgueiras
O velho
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.43v
1768
Inácio Marques
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.75v
1770
Manuel Dias Paterno
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.93
1771
António Jorge das Neve
O novo
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.107
412
Joel Silva Ferreira Mata
II. De natureza social Data
Nome
Alcunha
fonte
1609
Domingos
O preto
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.65
1611
Maria Gonçalves
A branca
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.68v
1614
Maria
A caseira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.78v
1615
Maria
A enjeitada de Sobrado
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v
1616
António Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.140v
1610
António Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.155
1621
Gaspar Dias
O rei
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.158
1628
Domingos Francisco
O preto de Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.183
1632
João Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.11v
1637
Isabel
A colaça
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36
1641
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.50
1664
Manuel António
O branquinho
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.72
1666
António
O moreno
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.3v
1667
Manuel Marques
O conde
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.17v
1672
Manuel Álvares
O patriarca
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.46v
1674
Manuel Luís
O patriarca
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.62
1677
Manuel Gonçalves
O branco
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.86
1680
Manuel Gonçalves
O brancudo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.100
1681
Manuel Gonçalves
O moreno
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.106v
1686
João André
O rei do saramago
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.207v
1722
Manuel Marques Guerra
O mouro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.160v
1749
Brás João
O servo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.144v
1754
José Dias
O enjeitado
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.65v
1755
Manuel Moreira
O bruxo
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.93v
1763
Maria de Sousa
A branca
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.126
1764
António Fernandes
O duque
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.150
413
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
III. De natureza moral Data
Nome
Alcunha
fonte
1594
Gonçalo Gonçalves
O moreira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.23v
1600
António Gonçalves
“O tarrio de Valongo Susão”
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.38
1601
Maria
A crespa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42v
1602
António Gaspar
O rocha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.45v
1602
Francisco António
O Montanhão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.46v
1608
Gaspar Gonçalves
O camacho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.62v
1609
Margarida Gonçalves
A mirilhoa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.66
1610
Maria
Filha do racha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.55
1614
Francisco Jorge
O tacão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81
1615
Manuel Gonçalves
O cabeda
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v
1615
Manuel
O charrete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.83v
1616
Manuel Gonçalves
O cavaco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.86v
1616
Domingas
A bouta de Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.87
1616
Gaspar de Penido
O tratante
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.138
1616
André Jorge
O carneiro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.138
1616
António Gonçalves
O gemo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.140
1617
Maria
A magalhoa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.142
1618
Francisco António
O diabrete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.147v
1619
António Gonçalves
O pião
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.148v
1619
Maria Gonçalves
A balhoa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.149v
1610
António Gonçalves
O cambado novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.155
1621
António João
O carneiro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.161
1622
Maria
A padilha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.161v
1624
Manuel António
O charrete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170
1624
Gaspar Gonçalves
O torres
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170v
1625
Maria Antónia
A galha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.173
1625
Domingos Fernandes
O delgado
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.173v
1626
Domingos Fernandes
O bairrana
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.177v
1627
André Manuel
O gaguete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.179
1628
André João
O veludo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.187
1630
Maria André
A marracha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.6
1630
Domingas
A milhã
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.8v
1632
Manuel António
O corisco
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.15
414
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1634
Francisco (?) Jorge
O cação
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.23
1634
Maria Francisca
A gema
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.23
1634
Manuel Marques
O recachado
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.24v
1635
Sebastião
O rocha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25v
1635
Maria
A ladrincha
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.27v
1636
Maria Duarte
A capota
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.32v
1636
Bento Fernandes
O mexilhão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.34
1637
António Francisco
O massague
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.37
1638
Domingas
A milhã
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.41
1639
Antónia
A cossouxa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.42
1639
Maria
A chena
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.43
1640
Maria
A berlamonta
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.46v
1640
Catarina
A moussa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.47
1641
Francisco Fernandes
O faramengo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.48v
1641
Francisco António
O diabrete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49
1641
Domingos João
O escalona
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.49v
1641
Belchior Manuel
O bicho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.53v
1643
Joana Francisca
A louva
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.57
1643
Maria Francisca
A mela
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.57v
1645
António Manuel
O carracho
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.63
1646
António Gonçalves
O cambado novo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.65
1649
Antónia
A cossoura
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.69v
1649
Domingos Duarte
O mexilhão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.73
1663
Maria
A viloa
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.66
1663
Manuel Lopes
O grilo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.68
1663
Manuel Gonçalves
O bomba
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.68v
1663
João Gonçalves
Pica-feijão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.68v
1663
Manuel António
O carracho
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.69v
1664
Isabel
A parciosa
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.71v
1669
Domingos António
O nainho
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.26
1672
Maria Feijão
A ravessa
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.51v
1675
Margarida
A chapa
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.73
1675
Domingos António
O olheiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.74
1676
Domingos da Silva
O esporado
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.78
1676
António João
O baeta
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.79v
1678
Manuel António
O chiolo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.86v
415
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1678
Manuel João
O manso
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.91
1678
António Gonçalves
O campeão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.92
1679
Domingos Martins
O carrasco
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.94v
1679
Maria Benta
A“abelluda”
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.97
1680
António Ribeiro
O longal
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.98v
1680
Domingos Francisco
O poça
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.98v
1680
Domingos António
O montanhão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.99v
1681
Manuel Gonçalves
O moreno
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.106v
1681
Maria Manuel
A bicha
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.107v
1681
Manuel
O bojo
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.108v
1682
Maria Gonçalves
A pedra
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.138v
1683
Domingos Gonçalves
O palaio
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.144v
1683
Domingos António
O cheiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.147v
1684
Manuel Lopes
O pessegueiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.149
1684
Domingos António
O olheiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.151v
1685
Simão Álvares
O “forgrão”
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.134v
1686
Maria Manuel
A bicha
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.204v
1686
Maria Marques
A guerra
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.208
1687
António Ribeiro
O grande
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.2v
1689
João Pero
O baeta
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.18v
1691
Domingos Francisco
O pula
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.251691
1691
Manuel Tomé
O “pacheo”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.29v
1692
Maria Manuel
A bicha
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.31v
1693
Domingos António
O cheira
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.41
1693
Manuel António
O grilo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.41v
1698
António de Sousa
A “casaluna”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.91v
1699
Manuel Lopes
O galhete
ADP, E/27/6/1-3.2, fl101v
1700
João Domingues
O manso
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.103
1710
António Dias
O manso
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.118
1702
Maria Francisca
A cheia
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.133
1703
Domingos Marques
“Mencatudo”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.143v
1703
Manuel de Sousa
Tacano
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.149v
1704
João Dias
O manso
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.151v
1704
Maria Francisca
A “pareçosa”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.158
1704
António Lopes
O campanudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.159v
1705
Gonçalo João
O soniomeleiro”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.176v
416
Joel Silva Ferreira Mata
Data
Nome
Alcunha
fonte
1706
Domingos António
O crespo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.185v
1706
Domingos Fernandes
O poça
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.186
1706
António João
O bicho
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.186v
1706
João Dias
O manso
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.188v
1706
Manuel João
O “xeixo”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.194v
1706
António da Fonseca
O “pacheo”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.195v
1706
Manuel Luís
O beiçudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.195v
1707
António de Sousa
A “casalluna”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.204
1708
Manuel da Rocha
A remexias
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.205
1708
Manuel Francisco
O tosco
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.208
1714
Manuel António
O crespo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.53
1716
Manuel António
O grilo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.80
1717
Inácio Dias
A rabona
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.82v
1717
Manuel Dias
O tirano
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.90
1718
João Gomes
O palheiro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.91
1719
Manuel António
O melro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.112v
1720
Manuel Marques
O bojo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.115v
1720
Maria Lopes
A nogueira
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.117
1720
António Lopes
O faleira
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.120
1720
António Dias
A rabona
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.128
1722
Manuel Gonçalves Damião
O menino
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.154
1722
Manuel Marques Guerra
O mouro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.160v
1723
Domingos Dias
O magano
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.163
1724
Manuel António
O chiolo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.181
1724
Manuel João
O carriço
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.193v
1725
Tomé Gonçalves
O bomba
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.206
1729
Maria
A ninfa, por sobre nome
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.262v
1744
Quitéria Maria
Da hora
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.20
1744
António Moreira
O pardo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.22v
1751
Francisco
O milhenta
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.164v
1752
João Alvares
O pegas
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.24
1753
António Martins
O treme terra
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.62
1754
Manuel Moreira
O serrobilha
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.66
1754
Matias Gonçalves
o menino
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.75
417
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Data
Nome
Alcunha
fonte
1754
Manuel Fernandes do Vale
O pisco
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.90
1755
Manuel Moreira
O bruxo
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.93v
1755
João Alvares
o pegas
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.96
1755
Manuel de Sousa
O sardona
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.101
1756
Isabel Marques
A leucádia
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.136
1757
João Álvares Bairrana
O pega
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.160v
1759
Maria Marques
A boceta
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.28
1759
João da Rocha
O arraiola
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.29v
1759
Manuel de Sousa
O cerrado
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.35
1761
Manuel Ribeiro de Sousa
O chamusca
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.81
1761
Manuel Bento
O cachopo
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.90v
1762
Manuel Lopes da Cruz
A taleira
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.96
1762
Vicente de Sousa
O alecrim
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.103
1762
Manuel Fernandes
O sobradelos
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.115v
1763
Catarina Gonçalves
A régua
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.128v
1768
Manuel Marques
O bandeirinha
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.73v
1768
Vicente de Sousa
O alecrim
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.73
1777
João Gonçalves
O pica
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.11
1781
João Francisco
O estouradas
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.68
IV. De natureza familiar Data
Nome
Alcunha
fonte
1637
Isabel
A colaça
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36
1665
Manuel António
O neto
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.78
1672
Manuel Álvares
O patriarca
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.46v
1674
Manuel Luís
O patriarca
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.62
1687
Manuel António
O neto
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.6
1708
Manuel Marques
O neto
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.217
418
Joel Silva Ferreira Mata
V. De natureza profissional Data
Nome
Alcunha
fonte
1602
Francisco António
O montanhão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.46v
1615
Manuel Gonçalves
O cabeda
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v
1615
Pedro Gonçalves
O maiato
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.84
1616
Gaspar de Penido
O tratante
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.138
1624
Manuel António
O charrete
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.170
1628
Justa Gonçalves
A ferreira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.182v
1634
André Gonçalves
O seirão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.25
1637
Manuel Fernandes
O mareante
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36v
1637
António Francisco
O massague
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.37
1638
Domingas
A milhã
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.41
1640
António Gonçalves
O ferreira
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.46v
1644
António Gonçalves
O marinheiro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.59v
1663
João Gonçalves
O pica-feijão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.68v
1670
Maria Antónia
A valeira
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.33
1675
Domingos António
O carreteiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.69v
1675
Domingos António
O olheiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.74
1679
Domingos Martins
O carrasco
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.94v
1680
Domingos António
O montanhão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.99v
1680
Maria Marques
A valeira
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.102
1684
Domingos António
O olheiro
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.151v
1690
Domingos António
O carreteiro
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.20v
1694
Manuel João
O “peroucho”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.48
1702
José Gonçalves
O cevada
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.133
1705
Domingos Marques
O mercatudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.181
1706
Manuel João
O “peroucho”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.188v
1706
João Pero
O “peroucho”
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.189
1707
António Álvares
O campanudo
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.199
1716
António Alvares
O campanudo
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.70
1718
João Gomes
O alheiro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.91
1720
João Marques
O caixeiro
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.115
1749
Brás João
O servo
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.144v
1750
Manuel de Sousa
O “peroacho”
ADP, E/27/6/2- 5.1, fl.148v
1760
Manuel de Sousa
O carquejeiro
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.53
1766
Manuel Barbosa
Do moinho
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.38
1769
Manuel Alvares
O campanudo
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.80
419
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
VI. De natureza geográfica Data
Nome
Alcunha
fonte
1696
António Ribeiro
O estrangeiro
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.29
1600
António Gonçalves
“O tarrio de Valongo Susão”
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.38
1615
Manuel Gonçalves
O cabeda
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81v
1615
Pedro Gonçalves
O maiato
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.84
1616
Domingas
A bouta de Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.87
1625
Francisco João
O maia
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.172
1628
Domingos Francisco
O preto de Valongo Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.183
1643
Manuel António
O brasileiro de Susão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54v
1643
Pêro Gonçalves
O maia
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.54v
1649
Maria
A galega
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.69
1670
Domingos Manuel
O novo da Vale
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.34
1676
António Pereira
O novo do Susão
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.76v
1682
Maria Antónia
A galega
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.109
1682
Manuel António
O galego
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.138v
1700
Manuel António
O brasileiro
ADP, E/27/6/1-3.2, fl112v
1707
Gonçalo Gonçalves
O novo de Susão
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.203
1710
Maria
A galega
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.4v
1720
João António
O galego
ADP, E/27/6/1- 4.1, fl.119v
1757
Maria de Sousa
A sevilhana
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.142v
1757
João Gonçalves
O castelhano
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.157
420
Joel Silva Ferreira Mata
VII. De natureza religiosa Data
Nome
Alcunha
fonte
1613
Manuel
O ermitão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.78
1616
Manuel do Vale
O ermitão
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.137
1612
Beatriz
A bispa
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.158v
1622
Manuel Tomé
O cardeal
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.161v
1625
Simão Francisco
O reverendo
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.177v
1627
Domingos Álvares
O frade
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.179
1640
Domingos António
O frade
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.45v
1647
Maria Francisca
A frade
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.68
1665
Maria
A reverenda
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.77
1666
António Manuel
O frade
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.81
1672
Manuel Álvares
O patriarca
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.46v
1684
Domingas
A cónega
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.149
1684
Maria
A reverenda
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.153
1693
Manuel António
O frade
ADP, E/27/6/1-3.2, fl.40
VIII. De natureza militar Data
Nome
Alcunha
fonte
1599
Duarte Dias
O sargento
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.36
1600
Catarina
O sargento
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.38
1614
Duarte Dias
O sargento
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.80
1615
Duarte Domingues
O sargento
ADP, E/27/6/1-2.3, fl.81
1664
Marcos Gonçalves
O sargento
ADP, E/27/6/1-3.1, fl.74v
1756
Manuel João
O capitão carriço
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.122v
1756
António João
O “tinente”
ADP, E/27/6/2- 5.2, fl.134
1758
Manuel João
O capitão
ADP, E/27/6/2- 6.1, fl.10v
1768
Manuel Marques
O bandeirinha
ADP, E/27/6/1- 4.2, fl.73v
421
422
Joel Silva Ferreira Mata
Conclusão
O percurso histórico que realizamos teve como ponto de partida as Inquirições Gerais de 1258 e termina em 1835, uma vez que no ano seguinte assistimos à criação de uma nova realidade administrativa e municipal. As inquirições de 1258 são um marco importante para todo este território, pela menção da componente humana, religiosa e fundamentalmente pelo levantamento cadastral da propriedade reguenga, mas também de todo um conjunto de informações que permitem contextualizar os senhorios eclesiásticos e laicos, assim como as aptidões do solo agrícola. Entre os extremos foram tomados como pontos de referência outros levantamentos intermédios como a carta de foral atribuída à Terra e Concelho da Maia – que integrava as freguesias de São Lourenço d’Asmes (Ermesinde), São Vicente de Alfena e a de São Mamede de Valongo –, e aquela que foi outorgada ao concelho de Aguiar de Sousa, do qual faziam parte as freguesias de São Martinho do Campo e a de Santo André de Sobrado; o numeramento decretado por D. João III, nos finais da década de 1520, que contabiliza o número de moradores destas cinco freguesias que faziam parte do Título da Cidade do Porto, e que nos dão a verdadeira localização de Alfena e de Valongo no “sertão”, isto é, em território eminentemente rural. Em meados do século XVIII, na sequência do Terramoto de 1755, surgiram, em 1758 as Memórias Paroquiais elaboradas com base num ques423
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
tionário previamente elaborado, dirigido aos párocos locais, que responderam a todos os quesitos apresentados, com objectividade ou denúncia (por exemplo o estado de degradação do hospital dos gafos, em Alfena), e que permite aferir e interpretar certos vectores tanto de índole económica como social (por exemplo a emigração), o rejuvenescimento ou recuo demográfico (indicação do número de homens e de mulheres em idade adulta, e os de menor idade, quantificados por género). Nos finais do século XVIII servimo-nos de outro tipo de levantamento demográfico, realizado por Custódio José Gomes de Vilas-Boas, que foi elaborado com fins específicos, mas que se revelou muito útil para compreender a componente sociológica do território. Já no século XIX interpretamos o registo populacional apresentado pela Comissão que propôs a freguesia de São Mamede de Valongo a cabeça de concelho. Além deste tipo de fonte, utilizados, em grande escala, os Registos Paroquiais, que aparecem em finais do século XVI e constam do assento dos baptizados, casados e dos óbitos ocorridos em cada freguesia, ricos em informações de natureza familiar, profissional, financeira e económica, e apesar do critério subjacente à sua elaboração apresentar diferenças assinaláveis, o seu manancial permite interpretar as tendências e ritmos demográficos em cada uma das paróquias, assim como reflectir sobre a doença de inúmeros fregueses, a morte acidental e provocada, o endividamento de alguns e o estatuto social de todos desvendado no fim de tudo, quando, perante a inevitabilidade da morte o moribundo expressa a sua última vontade manifestada nos chamados “bens da alma”. O objectivo deste estudo é o de contribuir para o conhecimento dos homens e das mulheres mais ignoradas e anónimas do território, mas que desde os tempos mais remotos, independentemente de quem os dominou, escravizou e libertou, desbravaram a floresta, plantaram carvalhos e castanheiros, abriram valas, cercaram campos, organizaram a propriedade rural, sulcaram caminhos, construíram casas, aidos, celeiros e palheiros, desenharam um certo perfil quotidianamente vivido e sofrido, matizado por diversos factores de natureza psicológica, que paulatinamente moldariam uma certa identidade, forjada pela tenacidade e persistência laboral, familiar e social, envolvida pela dimensão religiosa, fio condutor ético e moral, 424
Joel Silva Ferreira Mata
desde a integração do indivíduo na sociedade cristã (pelo baptismo) ao passamento do paroquiano, pela encomendação da alma. O freguês nunca estava sozinho, mesmo quando morria sem a última visita do reitor, abade ou padre-cura. A freguesia de São Mamede de Valongo obteve o estatuto de cabeça de concelho devido à contribuição de alguns vectores, como a sua localização no percurso entre a cidade do Porto e o interior transmontano (e por isso chamar-se “Valongo da Estrada”); o uso e a utilização dos recursos hídricos do rio Ferreira como força motriz, que permitia o funcionamento de largas dezenas de moinhos; a sua relação privilegiada com a cidade do Porto, precisamente pela acção comercial desenvolvida pela venda de farinha trigueira e de segunda, e especialmente pela qualidade do pão aqui confeccionado e posteriormente carregado no dorso de muares conduzidos pelas largas dezenas de almocreves, alguns padeiros e padeiras que a documentação evidencia. Nesta azáfama encontramos algumas padeiras de Alfena, devidamente credenciadas pelo juiz da cidade do Porto, que assim contribuíram, pelo seu empenho, para realçar o significado e importância dos agentes agrícolas e moageiros, quer de Alfena, quer de Ermesinde. Nesta abordagem do tecido social e económico, optamos por uma metodologia “estratigráfica”, sincrónica e transversal, cruzando, sempre que possível, o elemento familiar – no qual estavam estruturados todos os aspectos da vida valonguense –, com a objectividade das unidades de produção e de tributação (os casais), não deixando, porém, de interpretar o pulsar paroquial numa perspectiva dinâmica, própria e singular das suas gentes. Este território é formado, então, por cinco paróquias e apresenta características específicas quando individualmente consideradas, mas a base do seu perímetro globalmente interpretado é a mesma, isto é, a propensão para a policultura dos cereais. Contudo, a freguesia de São Mamede de Valongo foi sempre mais dinâmica e desenvolveu-se em torno da igreja matriz de São Mamede, organizado em arruamentos onde indiscriminadamente estavam domiciliados todo o tipo de oficiais mecânicos, e em especial, os almocreves que sobressaíam pelo seu elevado número, o que reflecte bem o impacto da actividade comercial, a par dos ofícios associados à “indústria” artesanal da 425
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
metalurgia do ferro e de outros segmentos profissionais. O destaque desta freguesia levaria, então, em 1836, à sua elevação a cabeça de concelho. Com este estudo pretendemos contribuir para o melhor conhecimento dos valonguenses (globalmente considerados) que foram sobrecarregados durante séculos pelos senhorios laicos, eclesiásticos e pela coroa, e que transportaram grande parte do resultado do seu trabalho para o benefício das instituições que persistentemente vigiavam a titularidade, a propriedade, as rendas e disciplinavam a posse do domínio útil do solo, procediam judicialmente contra os seus dependentes, mas no seu contexto geral, o território evoluiu, a paisagem agrária modificou-se e humanizou-se em consequência do característico comportamento demográfico.
426
Joel Silva Ferreira Mata
Fontes e bibliografia
Fontes manuscritas Arquivos Nacional da Torre do Tombo Chancelaria de D. Afonso V, Livro 3. Chancelaria de D. Afonso V, Livro 12. Chancelaria de D. Afonso V, Livro 18. Chancelaria de D. Afonso V, Livro 20. Gavetas, Gaveta 8, mç.3, n.º2. Gavetas, Gaveta 14, mç.5, n.º6. Gavetas Gaveta 15, mç. 24, n.º12. Gavetas, Gaveta 16, mç.1, n.º2. Leitura Nova, liv.43. Livro 5 de Inquirições de D. Afonso III, 1258 Livro dos Forais Novos da Comarca de Entre Douro e Minho Memórias Paroquiais, vol.2, n.º 54, pp.473-478 (MPRQ/2/254). Memórias Paroquiais, vol.13, n.º 8, pp.51-54 (MRPR/13/8). Memórias Paroquiais, vol.8, n.º 70, pp.463-466 (MRPR/8/76). Memórias Paroquiais, vol.35, n.º186, pp.1391-1400 (MPRQ/35/186). Memórias Paroquiais, vol.38, n.º 34, pp.181-188 (MRPR/38/34). Mosteiro de S. Bento de Avé Maria do Porto, Liv. 12. 427
Contributos para a História Económica e Social do concelho de Valongo entre 1258-1835. Perspectivas
Arquivo Distrital de Braga: Cabido, Gaveta dos Testamentos, n.º 10. Arquivo Histórico da Santa Casa da Misericórdia do Porto Livro da Receita e Despesa. Série L, B.co 1, n.º 4.
Livro de Pergaminhos, m.2, doc.113. Livro de Pergaminhos, n.º 2, doc. N.º 59-A. Livro I dos Registos dos foros fidalgos. Série D, B.co 5, n.º 1. Série H, B.co 6, n.º 18, fls.42-44v. Série D, B.co 4, n.º 2. Arquivo Distrital do Porto
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Joel Silva Ferreira Mata
E/27/4/2-8.3. E/27/4/2-8.6. E/27/4/3-9.1. E/27/4/3-10.1. E/27/4/3-11.1. E/27/4/3-12.1. E/27/4/4-14.5. E/27/4/4-14.6. E/27/4/4-15.1. E/27/4/4-15.2. E/27/4/4-16.1. E/27/4/4-16.2. E/27/4/5-17.9. E/27/4/4-16.1. E/27/4/5-18.10. E/27/4/5-19.2. E/27/4/5-19.12. E/27/4/5-20.1. E/27/4/5-20.2. E/27/4/6-1.1. E/27/4/6-2.2. E/27/4/6-4.1. E/27/4/6-21.1. E/27/4/6-21.2. E/27/4/6-21.4. E/27/4/6-22.1. E/27/4/6-22. E/27/6/1-1.1. E/27/6/1-2.3. E/27/6/1-3.1. E/27/6/1-3.2. E/27/6/1-4.1. E /27/6/1-4.2. E/27/6/2-5.1. E/27/6/2-5.2. 429
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