Valongo e a Primeira Grande Guerra

Page 1

MANUEL AUGUSTO DIAS

Valongo e a Primeira Grande Guerra Valongo e a Primeira Grande Guerra

MANUEL AUGUSTO DIAS


FICHA TÉCNICA Edição: Câmara Municipal de Valongo Título: VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA Autor: Manuel Augusto Dias Prefácio: Xxx Capa: Xxx Contra Capa: Xxx Execução Gráfica: Xxx Impressão: Xxx ISBN: Depósito Legal n.º 1.ª Edição - Valongo, 2018 500 exemplares

(Reservados os direitos de reprodução) 2


Abreviaturas do CEP (Corpo Expedicionário Português)

A

Amb. – Ambulância A.R. – Assistência Religiosa A.R.C. – Área de Reserva do Corpo

B

B.A. – Brigada de Artilharia B.I. – Brigada de Infantaria Bat.I. – Batalhão de Infantaria B.Min. – Batalhão de Mineiros B.M.L. – Bateria de Morteiros Ligeiros B.M.M – Bateria de Morteiros Médios B.M.P. – Bateria de Morteiros Pesados B.O. – Bateria de Obuses B.R. 75 – Bateria de Reforço 75 BrigInf – Brigada de Infantaria B.S.C.F. – Batalhão de Sapadores de Caminhos de Ferro B.T.T. – Bateria de Tiro Tenso

C

C.A. – Comboio Automóvel C.A.M. – Companhia de Administração Militar C.A.M.M. – Comissão de Assistência aos Militares Mobilizados C.A.T.F. – Coluna Automóvel de Transporte de Feridos C.A.P. – Corpo de Artilharia Pesada C.A.P.I. – Corpo de Artilharia Independente C.C. – Companhia de Comando C.C.I. – Campo Central de Instrução C.C.St. – Casualty Clearing Station (Hospital de Evacuação Britânica) C.C.F.O. – Comando em Chefe das Forças em Operações C.D. – Cantina Depósito C.D.T. – Companhia Divisionária de Telegrafistas C.E. – Corpo de Exército C.E.C.E.P. – Comando das Escolas do C.E.P. C.E.M. – Chefe de Estado Maior C.E.M.C. – Curso de Estado-Maior Conjunto

C.E.M.E. – Chefe do Estado-Maior do Exército C.Eng.C. – Comando de Engenharia do Corpo C.Eng.Div. – Comando de Engenharia Divisionária C.E.P. – Corpo Expedicionário Português C.E.R. – Comissão de Estudos de Reorganização C.G.Art. – Comando Geral de Artilharia C.H. – Coluna de Hospitalização C.I. – Campo de Instrução C.M. – Coluna de Munições C.M.P. – Cruzada das Mulheres Portuguesas C.Mina. – Companhia de Mineiros C.Pr.C. – Companhia de Projetores de Campanha C.P.P.G.P. – Comissão Protetora dos Prisioneiros de Guerra Portugueses C.R. – Centro de Reabastecimento Com.S.C. – Comando de Sapadores do Corpo C.Q.G.C. – Comando do Quartel General do Corpo C.Q.G.Div. – Comando do Quartel General Divisionário C.S.A. – Companhia de Serviços Auxiliares C.S.C – Companhia de Sapadores do Corpo C.S.M. – Companhia de Sapadores Mineiros C.Trab. – Companhia de Trabalhadores do Corpo C.T.C. – Companhia de Telegrafistas do Corpo C.T.F. – Coluna de Transporte de Feridos C.V.P. – Cruz Vermelha Portuguesa

D

D.A.C. – Depósito de Adidos do Corpo D.A.Div. – Depósito de Adidos Divisionário D.A.F. – Depósito Avançado de Fardamento D.A.M.G. – Depósito Avançado de Material de Guerra D.A.P. – Depósito de Artilharia Pesada D.B. – Depósito de Bagagens D.C. – Depósito de Cavalaria D.Conv. – Depósito de Convalescentes D.D. – Depósito Disciplinar D.E.I. – Depósito de Expediente e Impressos 3


MANUEL AUGUSTO DIAS

D.F.B. – Depósito de Fardamento de Base D.I. – Depósito de Infantaria D.M. – Depósito Misto ou Destacamento Misto D.M.B. – Depósito de Material da Base D.O.F.B. – Depósito de Oficinas de Fardamento da Base D.P.Metr.P. – Depósito de Pessoal de Metralhadoras Pesadas D.P.Mort. – Depósito de Pessoal de Morteiros Del.Q.G. – Delegado do Quartel General Del.Q.G.B. – Delegado do Quartel General da Base D.R. – Depósito de Remonta D.R.O. – Divisão de Reforço de Obuses D.S.V. – Depósito do Serviço Veterinário

E

Eq.Av. – Esquadrilha de Aviação Eq.Av.Bomb. – Esquadrilha de Aviação de Bombardeamento Eq.Av.Caça – Esquadrilha de Aviação da Caça Eq.Av.R.T. – Esquadrilha de Aviação de Regulação de Tiro E.D. – Estação Depósito E.Div. – Escola Divisionária E.E.B. – Escola de Enfermagem da Base E.F. – Encarregado de Funerais E.G. – Escola de Gás E.M. – Estado-Maior E.M.E. – Estado-Maior do Exército E.M. e M – Estado-Maior e Menor E.Metr.L. – Escola de Metralhadoras Ligeiras E.Metr.P. – Escola de Metralhadoras Pesadas E.M.P. – Exército Metropolitano Português E.M.T. – Escola de Morteiros de Trincheira E.P. – Escola de Pioneiros E.P.O.M. – Escola Preparatória de Oficiais Milicianos ER – Estação Reguladora E.Rem. – Esquadrão de Remonta E.Sn. – Escola de Sinaleiros e Anexos E.T.E. – Estação Testa de Etapes E.T.E.C. – Estação Testa de Etapes do Corpo E.T.E.E. – Estação Testa de Etapes de Estrada E.T.E.F. – Estação Testa de Etapes Fluvial E.T.E.Div. – Estação Testa de Etapes Divisionária E.T.O.P. – Escola de Tiro Observação e Patrulhas 4

G

G.A. – Grupo Automóvel G.B.A. – Grupo de Baterias de Artilharia G.B.M. – Grupo de Baterias de Morteiros G.B.O. – Grupo de Baterias de Obuses G.B.V. – Grupo de Bagagens e Víveres G.C. – Grupo de Companhias Ciclistas G.C.C. – Grupo de Companhias de Ciclistas G.C.P. – Grupo de Companhias de Pioneiros G.H. – Hospital Geral (Hospital Britânico) G.M. – Grupo de Metralhadoras G.N.R. – Guarda Nacional Republicana

H

H.B. – Hospital da Base H.C.B. – Hospital de Cirurgia da Base H.C.V.P. – Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa H.M.B. – Hospital de Medicina da Base H.S. – Hospital de Sangue

I

I.S.P. – Inspeção Superior das Pagadorias

L

L.C.G.G. – Liga dos Combatentes da Grande Guerra L.R. – Local de Reabastecimento

M

M.M.B. – Missão Militar Britânica M.L. – Missão de Ligação

N

NEP – Norma de Execução Permanente

O

O.B. – Ordem de Batalha O.C. – Grupo de Observadores do Corpo O.D.M.G. – Oficina e Depósito de Material de Gás O.E. – Ordem do Exército ou Oficina de Espingardeiro O.L.A. – Oficina Ligeira de Artilharia O.L.A.A. – Oficina Ligeira de Ambulâncias Automóveis O.S. – Ordem de Serviço O.S.C. – Ordem de Serviço do Corpo


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

P

P.A. – Parque Automóvel P.C.E.P. – Prebostado do C.E.P. P.D. – Porto de Desembarque P.E. – Porto de Embarque e Pelotão de Estafetas P.S. – Posto de Socorros P.S.A. – Posto de Socorros Avançado P.T. – Posto de Transporte

Q

Q.G.1 ou 2 – Quartel General da 1.ª ou 2.ª Divisão Q.G.B. – Quartel General da Base Q.G.C. – Quartel General do Corpo Q.G.T. – Quartel General Territorial Q.M.G. – Quartel-Mestre General Q.P.I. – Quadro Permanente de Instrutores

R

R.A. – Regimento de Artilharia R.C. – Regimento de Cavalaria R.D.E. – Regulamento Disciplinar do Exército R.D.M. – Regulamento de Disciplina Militar R.E.J. – Repartição de Expediente e Justiça R.I. – Regimento de Infantaria e Repartição de Informações R.I.O. – Repartição de Instrução e Organização R.O. – Repartição de Operações R.S. – Repartição dos Serviços R.S.M. – Regimento de Sapadores Mineiros

S

S.A. – Serviços de Administração S.Ab. – Serviço de Aboletamentos S.Ag. – Serviço de Agricultura S.Ad. – Serviços Administrativos S.Av. – Serviço de Aviação S.B.F. – Serviço de Beneficiação de Fardamento S.C.B. – Serviço de Censura da Base S.C.E.M. – Sub-Chefe do Estado Maior S.E. – Secção de Estamotologia S.E.B.R.P. – Serviço de Expedição de Bagagem e Registo de Perdas S.E.M. – Serviço de Estado Maior

S.D.Obs. – Secção Divisionária de Observadores S.G. – Serviço de Gás S.H.B. – Serviço de Higiene e Bacteriologia S.H.T.F. – Secção Hipomóvel para Transporte de Feridos S.J. – Serviço de Justiça S.L.M.I. – Secção Ligeira de Munições de Infantaria S.M.V. – Secção Móvel Veterinária S.P. – Serviço de Polícia S.Pag. – Serviço de Pagadorias S.Pomb. – Serviço de Pombais Militares S.P.C. – Serviço Postal de Campanha S.P.C.V. – Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha S.P.G. – Serviço de Prisioneiros de Guerra S.P.M. – Sub-Parque de Munições S.R. Serviço de Reclamações S.S. – Serviço de Saúde S.Sn. – Serviço de Sinaleiros S.Sv. – Serviço de Salvados S.T.A. – Serviço de Transportes Automóveis S.Tecnica A. – Secção Técnica Automóvel S.T.C. – Serviço Telegráfico do Corpo S.T.D. – Serviço Telegráfico Divisionário S.T.F.V. – Serviço de Transportes Ferro-Viários S.T.S.F. – Secção de Telegrafia Sem Fios S.V. – Serviço Veterinário

T

T.D. – Trem Divisionário T.B.V – Trem de Bagagens e Víveres T.E.A. – Trem de Engenharia Automóvel T.G. – Tribunal de Guerra T.G.B. – Tribunal de Guerra da Base T.G.C. – Tribunal de Guerra do Corpo TIA – Trabalho de Investigação Aplicada T.O. – Teatro de Operações

5



Índice l

Introdução

1. O deflagrar do grande conflito 2. A posição do governo português 2.1. A Ditadura do General Pimenta de Castro 3. A entrada de Portugal na Guerra, na Frente Ocidental 3.1. Apreensão dos barcos 3.2. Declaração de Guerra da Alemanha a Portugal 3.3. A entrada de Portugal na Guerra vista pela imprensa nacional 3.4. Governo da União Sagrada 3.5. A censura no tempo da Guerra 3.6. Resistência à entrada de Portugal no palco europeu da Guerra 4. O CEP na Frente Ocidental 4.1. A vida nas Trincheiras 4.2. Apoio religioso 4.3. Manifestações de fé 4.4. As cartas e os livros 4.5. Iniciativas de apoio aos soldados portugueses 4.6. A visita do Presidente da República aos nossos combatentes 4.7. Equipamentos militares e armas usadas na Guerra 4.8. Primeiro soldado português morto em França

7


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4.9. O soldado português que foi condenado à morte 4.10. Prisioneiros, feridos e mutilados 4.11. A falta de homens em Portugal, no tempo da Guerra 4.12. Batalha de La Lys 4.13. Armistício 4.14. Os primeiros “heróis” desembarcaram a 23 de novembro de 1918 4.15. A celebração da Vitória 5. Os expedicionários de Valongo 5.1. Contextualização histórica do município valonguense no tempo da Guerra 5.2. O esforço de guerra da freguesia de Alfena 5.3. O esforço de guerra da freguesia de Campo 5.4. O esforço de guerra da freguesia de Ermesinde 5.5. O esforço de guerra da freguesia de Sobrado 5.6. O esforço de guerra da freguesia de Valongo

l

l

l

8

Conclusão Cronologia Bibliografia


MANUEL AUGUSTO DIAS

l

Prefácio

Evocar o Centenário da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) é da maior relevância e importância para a atualidade, não só porque se tratou de um conflito mundial que extrapolou os limites da Europa, mas também porque representou um momento determinante, uma rutura profunda no percurso da História Contemporânea Europeia e Mundial, cujos efeitos fraturantes e duradouros envolveram e determinaram muito significativamente a História de Portugal. A Primeira Guerra Mundial mudou a geopolítica e as sociedades, uma transformação ainda sentida atualmente.

valonguenses que há cem anos serviram a Pátria e a República em nome do valor da Paz na Europa. A presente obra assume-se como uma singela homenagem e um hino de coragem a todos os combatentes valonguenses, que de uma forma altruísta, arriscaram a sua vida neste conflito, com a esperança na conquista do prestígio nacional, por uma tentativa de legitimação nacional e consolidação política do jovem regime republicano. Ao autor da obra os parabéns pela iniciativa e aos combatentes e suas famílias a nossa reconhecida homenagem. José Manuel Ribeiro Presidente da Câmara Municipal de Valongo

Podemos afirmar que hoje, 100 anos mais tarde, ainda é uma ferida em cicatrização. Portugal, por sua vez, mergulhou em querelas políticas intermináveis e numa frágil situação social e económica. Assim, neste âmbito, o município de Valongo não poderia abdicar da salvaguarda e promoção da memória coletiva, apoiando uma publicação que destaca os 9


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

10


MANUEL AUGUSTO DIAS

l

Introdução

Fig. 1 – Imagem de Abertura (sem legenda)

H

á cem anos a Europa e o Mundo estavam em Guerra. As características deste conflito, em que Portugal também participou, foram de tal ordem de grandeza que seria denominada, e bem, como Primeira Grande Guerra ou Primeira Guerra Mundial. Todo o país contribuiu com homens que se viram mobilizados para ela, muitos ainda na “flor da idade”. O Governo Republicano, desde o início do conflito, apostou na entrada de Portugal na Guerra. Nestes últimos anos em que se vem invocando o 1.º Centenário desse conflito, não poderíamos esquecer essa Guerra que alastrou a um inusitado número de países, e que envolveu operações militares na terra, mar e céu e recorreu a novos armamentos, nomeadamente, ao tanque blindado, à metralhadora ou aos gases. 11


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Portugal, uma das três repúblicas europeias (as outras eram a Suíça e a França), esteve diretamente envolvido, porque era aliado do Reino Unido mas, sobretudo, porque estava em jogo o futuro das colónias em África. Era convicção dos republicanos que o alinhamento com os Aliados nos daria, no momento da negociação da paz, força para reivindicar a manutenção desses territórios. Dada a pertinência do tema, e no mês em que se comemora o centenário do Armistício, achámos interessante fazer a evocação da participação portuguesa, destacando o nome dos expedicionários que nasceram no município de Valongo e que se viram, de repente, mobilizados para o grande conflito europeu. A inventariação da totalidade dos combatentes portugueses mobilizados para a I Guerra Mundial e dos que lá perderam a vida não se tem afigurado tarefa nada fácil, nem está ainda concluída. Desde que se está a evocar o seu centenário têm sido feitos significativos esforços no sentido de aprofundar o estudo do envolvimento militar português no conflito e de divulgar os nomes dos nossos heróis. A dispersão das fontes documentais por diversos arquivos (nacionais, regionais e municipais; arquivos militares, administrativos e judiciais), as contradições, por vezes, encontradas em alguns dos dados recolhidos ou, mesmo, a inexistência de elementos identificativos sobre os militares que tombaram ao serviço da Pátria dificultam muito esta árdua tarefa. Daí que nos cemitérios militares espalhados pelos diferentes teatros de operações muitos dos nossos militares aí permaneçam sepultados

12

de forma anónima, tendo na lápide em vez do seu nome a palavra Desconhecido. Outros há que nem da sua sepultura se conhece a localização. Antes de iniciar a identificação das dezenas de expedicionários valonguenses que serviram a sua Pátria na Flandres, permitam-me que utilize algum espaço desta publicação para vos falar dos antecedentes deste grande conflito, do seu alastramento, da posição do governo português, da declaração de Guerra da Alemanha a Portugal, dos que estavam contra a entrada de Portugal no palco europeu da Guerra, da preparação dos nossos soldados, da partida do CEP (Corpo Expedicionário Português) para a Frente Ocidental, da vida nas Trincheiras, da Batalha de La Lys e, finalmente, do Armistício. Informo que no final do livro os leitores dispõem de uma cronologia que permite acompanhar o dia-a-dia desta Guerra e que, logo no início desta publicação, existe uma listagem das principais abreviaturas usadas nos Boletins do CEP, principal fonte para a identificação dos homens que foram mobilizados para a guerra do município de Valongo. A terminar este texto introdutório não posso deixar de agradecer à Câmara Municipal de Valongo o interesse manifestado nesta publicação que serve também para evocar os homens de Valongo que há cem anos ajudaram a honrar os valores da paz e da liberdade.


MANUEL AUGUSTO DIAS

1. O deflagrar do grande conflito

E

fetivamente, há pouco mais de um século, e depois do violento ataque levado a cabo no dia 28 de junho de 1914, em Sarajevo (capital da Bósnia), de que resultou o assassínio do Arquiduque Francisco Fernando e de sua esposa, herdeiros do trono da Áustria-Hungria, adivinhava-se o início do conflito a qualquer momento, mal terminasse o prazo do Ultimato que resultou desse atentado. E assim foi de facto. Milhões de homens foram recrutados para este enorme conflito (só a Rússia mobilizou à volta de 13 milhões). Portugal, ao longo da Guerra deslocou para várias frentes mais de 100 mil soldados, dos quais morreriam à volta de 8000. A maioria pereceu em Moçambique, França e Angola, na terra, mas também no mar e até em Portugal, para onde vieram repatriados muitos soldados vítimas de doença ou de ferimentos graves, aos quais muitos não foram capazes de resistir. A frieza e o rigor dos números, que a estatística se encarrega de divulgar, dão-nos a conhecer as causas das mortes, os locais onde ocorreram em maior número, mas não servem para avaliarmos nem de perto nem de longe o drama vivido por cada uma das vítimas que a guerra, direta e indiretamente, ceifou.

Fig. 2 – A Ilustração Portuguesa, de 6 de julho de 1914, dá destaque ao atentado de Sarajevo 13


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Passado um mês certo sobre o atentado de Sarajevo começava a 1.ª Guerra Mundial: de um lado, os países da Tríplice Aliança (Alemanha e Áustria-Hungria; a Itália, também membro desta aliança, não entraria na Guerra ao lado dos seus aliados) e do outro, os países subscritores da Tríplice Entente (França, Rússia e Grã-Bretanha). Aquele assassinato foi, sem dúvida, a causa imediata para o início da Guerra que começou um mês depois (28 de julho de 1914), esgotado o Ultimato que a Áustria-Hungria fizera à Sérvia. Mas, desde há algum tempo, outros problemas atingiam profundamente as principais nações europeias no início do século XX. O século XIX havia criado feridas difíceis de curar, com os interesses territoriais das principais potências a vir ao de cima, provocando o esgrimir de argumentos entre as várias representações diplomáticas. Alguns países estavam extremamente descontentes com a divisão da Ásia e da África, ocorrida no final do século XIX, sobretudo na Conferência de Berlim (1884-1885), também de má memória para Portugal. A Alemanha e a Itália tinham ficado fora do processo neocolonial. Enquanto isso, a França e a Inglaterra viam reforçados os seus interesses coloniais, explorando territórios bastante ricos em matérias-primas. A rivalidade entre a Alemanha e a França também estava exacerbada, pelo facto desta ter perdido, na sequência Guerra Franco-Prussiana, já na segunda metade do século XIX, as ricas províncias da Alsácia e da Lorena, que pretendia reaver o mais depressa possível. 14

Fig. 3 – A 1.ª página do diário republicano da noite – A Capital – dando notícia do início da Guerra, que parecia ser ainda, e apenas, um conflito limitado à Península Balcânica


MANUEL AUGUSTO DIAS

Colidia o revanchismo francês com o pangermanismo que pretendia unir todos os países de origem germânica numa só grande nação alemã, na sequência do que já fizera Bismark no século anterior. A guerra estava prestes a alastrar à Europa e ao Mundo. No dia 29 de julho de 1914, o diário republicano da noite, intitulado A Capital, logo na primeira página, dava conta das piores notícias que vinham da região balcânica, embora o título deixe perceber ainda alguma esperança de que o conflito não alastre ou se circunscreva à região, como tinha acontecido dois anos antes (de facto, em outubro de 1912, verificou-se uma situação de guerra na região balcânica, que envolveu a Sérvia, Montenegro, a Grécia, a Roménia, a Bulgária e o Império Otomano).

Os preparativos bellicos, no entretanto, prosseguem com signifcativa actividade. A França envia para a fronteira os regimentos de artilharia e infantaria que andavam em manobras e chamará tropas de Marrocos, onde ficarão apenas as necessarias para a manutenção da ordem e segurança dos nacionais. A Allemanha chamou ás fileiras as reservas de dois annos. Os inglezes teem 29 couraçados concentrados em Portland e, segundo consta, vão tambem convocar os reservistas. Todas as licenças da marinhagem dos navios de guerra ancorados em Gibraltar foram suspensas. Esperava-se que hoje atingissem o numero de 500:000 homens as tropas austro-hungaras concentradas nas fronteiras austro-servia e austro-montenegrina».

O título é o seguinte: “Evita-se a conflagração? / As chancellarias trabalham n’esse sentido, mas, ao mesmo tempo, apressam-se os preparativos bellicosos / A GUERRA AUSTRO-SERVIA”. E logo a abrir o artigo informam-se os leitores: «As noticias telegraphicas recebidas durante a noite traduzem a enorme anciedade produzida por esta interrogação que todos se formulam: - Localisar-se-há a guerra? A conflagração europeia será, finalmente, um facto? Os esforços da chancellaria ingleza, a cujo lado se encontra abertamente a França, continuam a empregar-se no sentido de evitar que se desencadeie a tormenta, avassalando toda a Europa. 15



MANUEL AUGUSTO DIAS

2. A posição do governo português

O

s republicanos que, desde 1910, tinham reorganizado o exército português, criando o serviço militar obrigatório para todos os portugueses do género masculino, não queriam que se repetisse a humilhação que tinham apontado ao governo monárquico português aquando do Ultimato Inglês de 11 de janeiro de 1890, na sequência da implementação do projeto Mapa Cor-de-Rosa que Portugal reivindicara para a África. Por isso, logo que a Guerra alastrava na Europa, com sucessivas declarações de guerra, no verão de 1914, Portugal declarava estar pronto para entrar no conflito, para o qual podia mobilizar centenas de milhares de homens se necessário fosse. Assim, ainda antes da Guerra ter completado um mês, já Portugal decidia organizar uma expedição militar com destino à defesa da África Portuguesa (Angola e Moçambique). Há cem anos, quando os vários países da Europa se envolviam diretamente nesta guerra que havia de ter proporções nunca vistas, pela manutenção dos seus impérios, Portugal afirmou publicamente, nos seus órgãos de poder (Parlamento e Governo) e na imprensa que estava interessado em cumprir os seus compromissos com os Aliados (referindo-se explicitamente à Inglaterra) e, portanto, não afirmaria nunca a sua neutralidade. O Portugal republicano era, como se sabe, profundamente nacionalista e, por isso, estando em jogo também os territórios coloniais, não podia deixar de participar nesta Guerra, independentemente dos reais sentimentos

Fig. 4 - A Capital, de 13 de agosto de 1914, 1.ª página. Aí se afirma que o Portugal republicano está pronto para entrar na Guerra

17


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

da sociedade portuguesa. Portugal não só participou na Guerra (em África – Moçambique e Angola –, e na Frente Ocidental) como a terminou com um grande número de mortos e feridos. Pequenos monumentos de homenagem aos Mortos da Grande Guerra – a lembrar o trágico sofrimento que viveram grande número de famílias portuguesas – existem um pouco por todo o território nacional e até em França, onde muitos portugueses pereceram. Os fatores que levaram os dirigentes republicanos a forçar a participação militar na Guerra são vários e conhecidos: desde logo a convicção da manutenção do Portugal Africano, se os portugueses interviessem do lado vencedor; por outro lado, a possibilidade de união de todas as fações republicanas (“União Sagrada”) em torno da mobilização para a Guerra e o esperado prestígio internacional do novo regime republicano português; para, finalmente, também se poder dizer que Portugal, entrando no conflito, cumpria as suas obrigações para com a sua velha aliada – a Inglaterra. Entretanto, no final do verão de 1914, o conflito ia alastrando: no dia 4 de agosto de 1914, a Inglaterra declara guerra à Alemanha – esta declaração de guerra é considerada por muitos como a decisão que torna esta guerra europeia verdadeiramente uma Guerra Mundial. Dois dias depois, o Império Austro-Húngaro declara guerra à Rússia. A Sérvia e o Montenegro declaram guerra à Alemanha. A 13 de agosto, a França e a Inglaterra estão também em guerra com o Império Austro-Húngaro. Portugal, compreendendo os motivos profundos des18

te embate, e ainda com um império para defender, em África e na Ásia, não pode ficar indiferente ao que acontece na Europa e no Mundo. É preciso insistir perante os nossos leitores com a ideia de que os republicanos portugueses se mostraram, desde sempre, profundamente patrióticos, não pondo qualquer hipótese de perda de território nacional. Foi aliás esta característica que os guindou para o poder, após o triunfo da revolução de 4 e 5 de outubro de 1910. Eles cresceram afirmando os valores nacionais e lutando contra a humilhação em que os nossos “inimigos” nos puseram na sequência do “Mapa cor-de-rosa”. Não é pois, de estranhar, que partidos políticos, governo, militares e muito do povo mais politizado com a matriz republicana, se mostrem unidos nesta hora de mobilizar Portugal para a guerra. O jornal A Capital do dia (13-8-1914), noticiando a evolução da guerra, logo na primeira página, relativamente, a Portugal afirma: «A situação de Portugal no conflicto europeu está definida. Defeniu-a o governo no Parlamento portuguez, com o caloroso aplauso dos representantes da Nação. Não ha, nem deve, nem pode haver outra definição. Estamos ao lado da Inglaterra. Não faltaremos a nenhum dos deveres que a nossa situação de aliados d’esse grande e nobre paiz nos impõe. Esta situação é tão clara, tão terminante, tão categorica, tão franca, tão leal, que só de ouvir pronunciar indevidamente a palavra neutralidade a opinião publica se sobresalta e se indigna. O admiravel instincto popular, que é tantas vezes o melhor dos politicos, e que sempre representa


MANUEL AUGUSTO DIAS

as mais nobres aspirações, não a consente, não admite, não a emprega. Tambem o governo a não emprega nos seus actos officiaes. Nem a poderia empregar, porque não faria sentido, nem com as declarações do seu chefe, no Parlamento, que a todo o governo obrigam, nem com a expressão da vontade d’este Parlamento, que está acima do próprio governo, porque representa a vontade soberana do Paiz. Não! Portugal não está n’uma situação de neutralidade. Está n’uma situação de franco e declarado apoio á Inglaterra.» Mais à frente, ainda na 1.ª página, escreve-se, no mesmo diário, sob o título “Se fosse necessario Portugal mobilisaria 40:000 homens prontos a entrar em campanha”:

militares, está em condições de poder repor as coisas no seu verdadeiro pé, sem exageros optimistas, improprios da sua honestidade, nem pessimismos que não se compadeceriam com as afirmações de patriotismo que elle, por tantas vezes, e em occasiões dificeis, tem feito. Ouçamol-o: (…) É que quando por ahi se afirmava que não tinhamos armas, nem equipamentos, nem artilharia, o que se queria era acentuar que não havia possibilidade de pôr em pé de guerra os 180.000 ou 200.000 homens que constituem, n’este momento, o nosso exercito activo. Mais nada. Mas para duas divisões, pelo menos, ha e sobra. Podemos, sem contestação, mobilisar em poucos dias um corpo de exercito de 35.000 a 40.000 ho-

«É bem possível que á força de se dizer que a nossa preparação militar pouco ou nada vale, haja quem julgue que Portugal se encontra na impossibilidade de mobilisar forças numerosas, de maneira a poderem entrar imediatamente em campanha. É um equivoco, como tantos outros em que por ahi se vive e que não será de todo mau desfazer. Tem, para isso, a palavra o deputado sr. Sá Cardoso, que pela sua situação especial e pelo profundo conhecimento que possue das coisas

Fig. 5 – Ilustração Portuguesa, 7 de setembro de 1914. Dá notícia da saída do 1.º contingente expedicionário português para Angola. 19


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

mens, com 25.000 de infantaria e 12 baterias de artilharia com 72 peças Schneider-Canet, eguaes ás que o exercito francez usa e estão por lá obrando prodígios.» Cinco dias depois, a 18 de agosto de 1914, o governo português decide organizar uma expedição militar com destino a Angola e a Moçambique.

Menos de um mês depois, a 11 de setembro, parte de Lisboa a primeira expedição militar, destinada a Angola, sob o comando do Tenente-coronel Alves Roçadas. Estas forças expedicionárias, compostas de um batalhão de infantaria, um pelotão de metralhadoras, uma bateria de artilharia e um esquadrão de cavalaria desembarcam em Moçâmedes, no sul de Angola, a 1 de outubro.

Fig. 6 – Expedicionários portugueses no norte de Moçambique (1.ª Guerra Mundial) 20


MANUEL AUGUSTO DIAS

E, no mesmo dia 11 de setembro, parte também o Corpo Expedicionário para Moçambique, este sob o comando do Tenente-coronel Massano de Amorim. Começava, assim, a participação efetiva de Portugal na Primeira Guerra Mundial. O objetivo do Corpo Expedicionário Português com destino a África, no caso de Moçambique, era tentar recuperar o território do Quionga, no norte daquela colónia, que se encontrava na posse dos alemães, desde praticamente o início da Guerra (meados de agosto de 1914, e tentar contrariar a concretização dos objetivos alemães de se apoderarem daquele espaço. O comandante do Corpo Expedicionário Português destinado a Moçambique o Tenente-coronel Massano de Amorim (nascido em Fronteira, Portalegre, no dia 14 de janeiro de 1862; e falecido na Índia, em Nova Goa, a 2 de junho de 1929, no desempenho do cargo de Governador Geral da Índia. Ao longo da sua vida, para além de prestigiado militar foi, também, Governador Geral de Angola e de Moçambique). A viagem de ida foi muito atribulada (como seria também a de regresso, um ano depois), pelo grande número de cavalos que o navio também transportava. O vapor “Durham Castle” aportaria a Lourenço Marques, no dia 16 de outubro de 1914. O Corpo Expedicionário foi obrigado a fazer o transbordo, na capital moçambicana, do barco “Durham Castle” para outro vapor, o “Moçambique”, onde seguiu para o Porto Amélia. Pretendia-se que fosse capaz conquistar e reocupar o território do Quionga, mas tal acabaria por não se revelar possível. A expedição instalar-se-ia então em Porto Amélia, onde chegou

no dia 1 de novembro de 1914. Era constituída por um total de 1539 homens, provenientes do 3.º Batalhão do Regimento de Infantaria n.º 15 (Tomar), da 4.ª Bateria do Regimento de Artilharia de Montanha (Évora), do 4.º Esquadrão de Cavalaria n.º 10 (Vila Viçosa), de pessoal de Engenharia (Lisboa), de pessoal dos Serviços de Saúde (Lisboa) e de pessoal de Administração Militar (Lisboa). Nada estava preparado para receber os soldados da metrópole, até o embarcadouro principal se encontrava em ruínas desde um ciclone que o havia destruído no ano anterior e havia muitas casas que se encontravam sem telhado, pela mesma razão. Os barcos ficaram ao largo, e os soldados portugueses foram carregados às “cavalitas” por indígenas. Dos muitos soldados mobilizados em Portugal e que tomaram parte numa das expedições para Moçambique, muitos morreram, por motivo de doenças e não propriamente por situações de efetivo combate. De facto foram as doenças o fator que mais atingiu as nossas tropas em Moçambique. As doenças mais mortíferas foram do tipo respiratório como Bronquites, Gripes e Pneumonias; ou as que resultavam da má qualidade da água como as Disenterias, ou ainda as provocadas por deficiências alimentares como o Escorbuto, e também as infetocontagiosas por causa das poucas condições de higiene que os soldados tinham, bem como as doenças tipicamente tropicais, como a Malária. Esta 1.ª expedição regressaria a Lisboa, no início de dezembro de 1915. Fiquemos com a notícia do acontecimento, relatada em “A Capital” do dia 6-12-1915.

21


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

«A chegada do “Moçambique” Fundeou hoje no Tejo o paquete “Moçambique”, da Empreza Nacional de Navegação, trazendo mais um troço das forças expedicionárias que partiram no anno passado para Moçambique. O paquete era esperado ás 8 horas, mas só ás 9,25’ foi recebido um telegrama comunicando que o barco demandava a barra. O temporal fóra da barra era medonho, não se vendo qualquer barco de pequena cabotagem. O “Moçambique” veiu rio acima com meia velocidade até parar em frente do Bom Sucesso onde recebeu a visita de saude. Os expedicionários, não se importando com as fortes bategas de agua que constantemente cahiam, vinham na tolda do navio. Quem olhasse para o “Moçambique” não via senão um mar de cabeças. O paquete veiu depois avançando rio acima cada vez com menos velocidade até ao caes. Eram 12 horas e 43’ quando atracou no Caes da Areia junto do “Zaire”, chegado no sabbado. Algumas centenas de pessoas abrigam-se nos caes e armazéns. A chuva cae cada vez com mais força, levantando verdadeiras nuvens de fumo e galgando as ondas a muralha. A banda de infantaria 2 estava ali, a fim de acompanhar os expedicionarios. Apenas o “Moçambique” atracou foi lançada a ponte, começando a sahida dos passageiros civis, em grande numero. A sahida foi feita a custo, devido á chuva e ao grande numero de pessoas, vendo-se os guardas civicos em sérios embaraços para abrir alas. Officiaes e sargentos, muitos dos quaes com enormes barbas, veem sahindo acompanhados por amigos e pessoas de familia.

22

Na tolda, junto ao castello, está formado o contingente de cavalaria 3, sendo o primeiro a sahir o de artilharia 2, que seguiu logo para o quartel de Campolide. Desembarcaram depois os de infantaria 16, 17, 18 e 19 e corpo de administração militar. Esses contingentes abrigam-se no caes enquanto não cessa a chuva. Entre os officiaes que regressaram contam-se de infantaria 16 os srs. major Romeiras de Macedo, tenente Athayde de Azevedo Franco e medicos Levy e Cardoso; da administração militar o tenente Rebello. Da 3.ª bateria do 2.º grupo de artilharia 3, tenentes Vasconcelos e Ventura; da 2.ª bateria, 3.º grupo capitão Teixeira e veterinário Lobato; da 1.ª bateria, 2.º grupo, capitão Azevedo e tenentes Ramires e Oliveira e da 2.ª bateria, 6.º grupo, capitães Gameiro e Teixeira e alferes Teixeira e Diogo. De cavallaria 7 vieram o capitão Lourenço e veterinário Beja, tenente Daria e alferes Barata. Tambem vieram o capitão Alegria e alferes Portugal e Lobo Ferreira, tenente dr. Monjardino e capitão Freire. Dar uma nota exacta de todos os passageiros que vieram é impossível. Em Porto Amelia embarcaram 43 officiaes, 55 sargentos e 810 cabos e soldados e em Mossamedes 24 officiaes, 33 sargentos e 479 cabos e soldados. No dia 30 falleceu uma praça de infantaria 15 e no dia 26 outra de cavalaria.


MANUEL AUGUSTO DIAS

2.1. A Ditadura do General Pimenta de Castro Em Lourenço Marques ficaram doentes 4 praças e em Loanda 9. Durante a viagem o “Moçambique” sofreu fortes temporaes á sahida de Porto Amelia, passagem do Cabo e á entrada da nossa barra. O “Moçambique” traz um importante carregamento de produtos coloniaes.» No princípio de 1915, a Primeira República viveu um período de Ditadura, sob a presidência do General Pimenta de Castro, que tinha como objetivo prioritário tentar pacificar as lutas políticas internas, preparar eleições legislativas de que haveria de sair um governo forte, capaz de gerir um país envolvido na Primeira Guerra Mundial.

Fig. 7 – O general José Joaquim Pereira Pimenta de Castro assumiu o poder entre janeiro e maio de 1915

Em 25 de janeiro de 1915, o General Pimenta de Castro é encarregado de, em ditadura, formar governo, com o objetivo primeiro de tentar pacificar a Nação e preparar as próximas eleições legislativas. Muitos corpos administrativos nunca saudaram o novo Governo, e por isso foram dissolvidos. No dia 22 de abril, por exemplo, a Câmara de Lisboa era intimada a ceder o lugar à Comissão Administrativa [e como os vereadores se recusaram foram presos]; no dia seguinte, foram dissolvidas as Câmaras do Porto, Aveiro, Faro, Leiria, Arronches, Mafra, Torres Vedras, Portalegre e Monção; e dias depois, a dissolução de Câmaras prosseguiu. A 14 de maio de 1915, republicanos, militares e civis, levam a cabo um movimento revolucionário que causou centenas de mortos e feridos, mas que, poucos dias depois, restabelece a ordem republicana, tendo sido, de novo (como em 5 de Outubro), proclamada a República das janelas da Câmara de Lisboa. Com o regresso da normalidade democrática, os corpos administrativos eleitos retomam os seus lugares. De facto, nesse dia 14 de maio, Lisboa “acordou” com tumultos muito violentos. Para além dos seus evidentes contornos políticos – pretendia acabar-se com a ditadura do general Pimenta de Castro (que governara sem o Congresso) e provocar também a demissão de Manuel de Arriaga, que na sua condição de Presidente da República havia nomeado, em janeiro do mesmo ano, aquele general como Presidente do Ministério (não admira, pois, que um e outro tenham sido declarados por grande número de republicanos ligados ao Partido Democrático de Afonso Costa, a 4 de maio de 1915, “fora da lei” e os seus atos nulos) – foi também a manifestação dos tempos difíceis que se viviam na conjuntura da 1.ª Guerra Mundial, com a generalização de assaltos a armazéns e 23


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

a padarias de verdadeiras multidões urbanas que procuravam comida. O movimento contestatário que esteve na origem destes distúrbios é reprimido violentamente, provocando pouco mais de uma centena de mortos (102) e centenas de feridos, dos quais 250 feridos com gravidade. Conforme observou Júlio Dantas, tratou-se de um ato revolucionário mais impetuoso e mais sangrento que o próprio 5 de Outubro de 1910.

O Dr. Álvaro de Castro – que seria o novo Presidente do Ministério após o triunfo do golpe – dirigira-se estrategicamente a Santarém para anular o eventual envio para Lisboa de tropas fiéis ao governo de Pimenta de Castro.

Esta onda contestatária ao Ministério de Pimenta de Castro era bem evidente, desde finais do mês anterior, em alguns jornais democráticos que apelavam explicitamente à insurreição.

Embora se tenha resumido a apenas um dia de confrontos, o golpe do dia 14 de maio de 1915 foi bastante violento, sendo de destacar o envolvimento na luta, de civis armados que atuaram contra a própria polícia.

Este episódio revolucionário, em plena Primeira República, foi precedido pela constituição de uma Junta Revolucionária constituída no dia imediatamente anterior ao golpe e que era composta pelos seguintes republicanos democráticos: Sá Cardoso, Norton de Matos, Álvaro de Castro, Freitas Ribeiro e António Maria da Silva, o único civil da Junta. Contavam com o oficial da Marinha (Capitão de Fragata), Leote do Rego, como comandante operacional da insurreição. Leote do Rego, durante as operações revolucionárias, desencadeadas na madrugada de 14 de maio, assalta o cruzador Vasco da Gama, de que resultou a morte do respetivo comandante, o Capitão de Mar e Guerra Assis Camilo. As operações navais eram dirigidas, superiormente, pelo Capitão-tenente Freitas Ribeiro, sendo distribuídas armas aos civis no Arsenal. Aliás, como se percebe, a Marinha Portuguesa foi a principal força militar desta revolta, tendo chegado a disparar a sua artilharia e contado com a sublevação de marinheiros no Arsenal e o envolvimento de vários navios de guerra. 24

Entretanto, o chefe do governo, refugiado no Quartel do Largo do Carmo, constatando a desproporção de forças que tinha contra si e o ultimato feito por Leote do Rego, demitiu-se ao fim da tarde de dia 14.

O jornal A Capital, do dia 16 de maio de 1915, dedica toda a 1.ª página a este movimento revolucionário, com os títulos “O Movimento Constitucional / O povo, de armas na mão, afirma que a Republica nunca será um regímen de dictaduras” e quando dá pormenores da preparação do movimento, refere as reuniões em casa do Dr. Álvaro de Castro e de Leote do Rego, aludindo igualmente ao envolvimento de Freitas Ribeiro e de António Maria da Silva. Entrando em mais pormenores, aquele periódico da capital escreve: «Póde dizer-se que a idéa da revolução nasceu trez dias depois de se constituir o gabinete Pimenta de Castro. Mas apenas meia duzia de individualidades, dentro do partido democrático, acalentavam com esperanças de triunpho, na atmosphera de vinganças, suspeições e odios que se tinha creado contra aquelle partido». O governo ditatorial de Pimenta de Castro chegava, efetivamente, ao fim, na sequência deste golpe e, pouco depois, por efeito do mesmo golpe, também o primeiro Presidente da República, Manuel de Arriaga, se demitiria.


MANUEL AUGUSTO DIAS

3. A entrada de Portugal na Guerra, na Frente Ocidental A entrada de Portugal na Guerra, no teatro de operações europeu está diretamente relacionada com a apreensão dos barcos alemães ancorados nos portos do Império Português, por ordem do Governo Republicano.

No dia 17 de fevereiro de 1916, o Reino Unido pede a Portugal a apreensão dos barcos inimigos ancorados em portos nacionais, a que Portugal acede, colocando-nos assim na Guerra Mundial, frente europeia.

Fig. 8 – Marinheiros da armada portuguesa içam o pavilhão português a bordo do navio Enérgie, fundeado no rio Tejo em 1916 25


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3.1. Apreensão dos barcos O decreto de apropriação dos navios alemães em portos portugueses foi publicado no “Diário do Governo” de 23 de fevereiro de 1916 e o preâmbulo é do seguinte teor: «Atendendo aos interesses da economia nacional, no que respeita aos meios de transporte marítimos que cada vez se tornam mais difíceis e dispendiosos, sendo um dos motivos dessa dificuldade a falta de navios que façam esse serviço. Atendendo a que semelhante assunto se prende diretamente com o atual problema das subsistências, que é de salvação pública e por isso reclama instantemente medidas urgentes e adequadas às imperiosas necessidades do país (…)». Ao todo nesse mês de fevereiro seriam apreendidos 72 navios alemães que operavam em portos portugueses: 40 em Portugal: 38 em Lisboa, 1 no Porto e 1 em Setúbal; 4 na Madeira, no porto do Funchal; 6 nos Açores: 3 em Ponta Delgada e 3 na Horta; 8 em Cabo Verde, no porto de S. Vicente; 3 em Angola, no porto de Luanda; 6 em Moçambique: 3 em Lourenço Marques, 1 na Beira e 2 na Ilha de Moçambique; 5 na Índia Portuguesa: no porto de Mormugão. Neste mesmo dia, muito antes de qualquer declaração de guerra formal entre a Alemanha e Portugal na Europa, embora nas colónias a situação de guerra efetiva já existisse desde 1914, “A Capital” dava a informação, logo na 1.ª página, da ajuda militar portuguesa à velha aliada inglesa: 26

«E num bello dia, no Tejo, á clara luz do sol, viu-se um barco de guerra portuguez, o Liz, arvorar o pavilhão britannico, e sahir para o oceano, a tomar o seu posto de combate. / Não ignoram isto os allemães, não são em tão pequena quantidade que um só estabelecimento de Lisboa não venda, por mez, 16:000 exemplares do A. B. C., o orgão germanophilo da visinha Hespanha. Não o ignora ninguem, porque é verdade, porque é a evidencia. Mas é a imprensa que tem a culpa de se saber o que toda a gente pode saber, nem seria confessavel pretender que que se não soubesse!». Na edição do mesmo dia 17 de fevereiro de 1916, página 2, o repórter de “A Capital” vai ao encontro dos barcos alemães aprisionados em Lisboa, com a finalidade de ouvir a opinião dos responsáveis pelas embarcações apreendidas. Daí transcrevemos as seguintes passagens dessa reportagem: «Navegamos em direcção de Santa Apolonia e tomamos o rumo dos navios allemães, fundeados no nosso Tejo. A minha curiosidade de reporter cresce obsecadamente á medida que me approximo d’esses colossos de ferro sujeitos n’este momento ás contingencias emmaranhadas da politica universal. Entre apertadas filas de navios hollandeses, francezes, inglezes e portuguezes que coalham o rio, procuro avistar uma das embarcações germanicas.» A primeira embarcação alemã encontrada é o “Westerwald”, ancorado no Tejo desde Agosto de 1914, interrompida a viagem do México para Hamburgo, e refugiado em Lisboa, precisamente por causa da guerra.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Não estando presente o Comandante, fala o Imediato, um homem que o repórter afirma aparentar ter cerca de 30 anos. À questão que lhe é colocada, de declarar o que pensa acerca da posse dos navios alemães pelo governo português, responde: «Não acredito, não acreditamos nós, tripulantes do “Westerwald” que essa posse se effective; se assim fosse, já a estas horas era um facto. Temos fé de que o governo portuguez enverede por outro caminho… Depois… que tripulantes tem Portugal para os nossos navios? Nem os marinheiros portuguezes e hespanhoes reunidos seriam suficientes para constituírem as suas frotas. Contam com os inglezes? Mas, então, Portugal entra abertamente em hostilidades comnosco». Daí, o jornalista de “A Capital” segue para outro navio alemão refugiado em Lisboa, desde o início da guerra, o “Bulow” – uma embarcação com 9 mil toneladas que vinha do Extremo Oriente para Bremen. O respetivo comandante responde com prudência: «Não tenho opinião sobre o assumpto. A minha opinião será a do governo do meu paiz. Não creio que o governo portuguez resolva coisa alguma sem ouvir primeiramente o governo alemão. Da opinião dos governos – um que eu respeito como sendo do meu paiz e outro a que devo a graça d’esta hospitalidade – nascerá depois a minha. Digo sómente que vim para aqui confiado que me vinha refugiar em um porto neutral e que, por emquanto, estou convencido de que me não enganei». Segue-se o “Phoenicia”, carregado com 3555 toneladas, que vinha do Chile para Hamburgo. Trouxe mercadorias destinadas à Companhia União Fabril mas ainda tem

muita carga. À mesma pergunta, o Comandante respondeu: «Não creio que o governo portuguez proceda, sem um accordo com o meu paiz, visto que foi a neutralidade de Portugal que nos levou a procurar hospitalidade no porto de Lisboa…». O mesmo Comandante revelou que também se encontrava na capital portuguesa, a bordo do “Cherusker” (mais tarde baptizado com o nome “Leixões”) preciosidades arqueológicas escavadas por alemães no território da antiga Pérsia. Por outra fonte, ficámos a saber que essas peças arqueológicas eram provenientes de Assur, na antiga Mesopotâmia, e, entre elas, se encontravam uma estátua suméria e pequenas placas com inscrições cuneiformes bem como um cofre com mais de 3000 anos. O espólio seria, posteriormente, enviado para a Universidade do Porto. Já em 1926, os alemães pretenderam reaver esse tesouro. Após negociação, os alemães aceitaram dar, em troca, cerca de 600 várias outras peças de valor histórico, com destaque para o espólio egípcio, que podem ser observadas no Museu Natural da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

3.2. Declaração de Guerra da Alemanha a Portugal A requisição dos navios mercantes alemães fundeados nos portos portugueses foi a razão mais forte para que Guilherme II decidisse apresentar a Declaração de Guerra ao Governo Português, por intermédio do ministro alemão em Lisboa, Von Rosen, a 9 de março de 1916, formalizando uma situação de guerra que, de facto, já há algum tempo se vinha travando no sul de Angola e no norte de Moçambique. 27


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Declaração de Guerra Alemã «Senhor Ministro. Estou encarregado pelo meu alto Governo de fazer a V. Ex.a a declaração seguinte: O Governo português apoiou, desde o começo da guerra, os inimigos do império Alemão por actos contrários á neutralidade. Em quatro casos foi permitida a passagem de tropas inglesas por Moçambique. Foi proibido abastecer de carvão os navios alemães. Aos navios de guerra ingleses foi permitida uma larga permanência em portos portugueses, contrária à neutralidade, bem como ainda foi consentido que a Inglaterra utilizasse a Madeira como base naval. Canhões e material de guerra de diferentes espécies foram vendidos ás Potências da Entente, e, além disso, á Inglaterra um destruidor de torpedeiros. O arquivo do vice-consulado imperial em Moçâmedes foi apreendido. Além disso, foram enviadas expedições á África, e foi dito então abertamente que estas eram dirigidas contra a Alemanha. O governador alemão do distrito, Dr. Schultz-Jena, bem como dois oficiais e algumas praças, em 19 de Outubro de 1914, na fronteira do Sudoeste Africano alemão e Angola, foram atraídos, por meio de convite, a Naulila, e ali declarados presos sem motivo justificado, e, como procurassem subtrair-se à prisão, foram, em parte, mortos a tiro enquanto os sobreviventes foram à força feitos prisioneiros. Seguiram-se medidas de retorção da tropa colonial. A tropa colonial, isolada da Alemanha, precedeu na suposição, originada pelo acto português, de que Portugal se achava em estado de guerra com o Império Alemão. O Governo português fez representações por motivo das últimas ocorrências, sem, todavia, se referir ás primeiras. Nem sequer respondeu ao pedido que apresentámos de ser intermediário numa livre troca de telegramas em cifra com os nossos funcionários coloniais, para esclarecimento do estado da questão. 28

A imprensa e o Parlamento, durante todo o decurso da guerra, entregaram-se a grosseiras ofensas ao povo alemão, com a complacência, mais ou menos notória, do Governo português. O chefe de Partido dos Evolucionistas pronunciou na sessão do Congresso, de 23 de Novembro de 1914, na presença dos ministros portugueses, assim como na de diplomatas estrangeiros, graves insultos contra o imperador da Alemanha, sem que por parte do presidente da Câmara, ou dalgum dos ministros presentes, se seguisse um protesto. Às suas representações, o enviado imperial recebeu apenas a resposta que no boletim oficial das sessões não se encontrava a passagem em questão. Contra estas ocorrências protestámos em cada um dos casos em especial, assim como por várias vezes apresentamos as mais sérias representações e tornámos o Governo português responsável por todas as consequências. Não se deu, porém, nenhum remédio. Contudo, o Governo Imperial, considerando com longanimidade a difícil situação de Portugal, evitou então tirar mais sérias consequências da atitude do Governo português. Por último, a 23 de Fevereiro de 1916, fundada num decreto do mesmo dia, sem que antes tivesse havido negociações, seguiu-se a apreensão dos navios alemães, sendo estes ocupados militarmente e as tripulações mandadas sair de bordo. Contra esta flagrante violação de direito protestou o Governo Imperial e pediu que fosse levantada a apreensão dos navios. O Governo português não atendeu este pedido e procurou fundamentar o seu acto violento em considerações jurídicas. Delas tira a conclusão que os nossos navios imobilizados por motivo da guerra nos portos portugueses, em consequência desta imobilização, não estão sujeitos ao artigo 2.0 do tratado de comércio e navegação luso-alemão, mas sim à ilimitada soberania de Portugal, e, portanto, ao ilimitado direito de apropriação do Governo português, da mesma forma que qualquer outra propriedade existente no pais. Além disso, opina o Governo português ter procedido adentro dos limites desse artigo, visto a requisição dos navios


MANUEL AUGUSTO DIAS

corresponder a uma urgente necessidade económica, e também no decreto de apropriação estar prevista uma indemnização cujo total deveria mais tarde ser fixado. Estas considerações aparecem como vazios subterfúgios. O artigo 2.0 do tratado do comércio e navegação refere-se a qualquer requisição de propriedade alemã em território português. Pode ainda assim haver dúvidas sobre se a circunstância de os navios alemães se encontrarem pretendidamente imobilizados em portos portugueses modificou a sua situação de direito. O Governo português violou, porém, o citado artigo em dois sentidos, primeiramente não se mantém na requisição dentro dos limites traçados no tratado, pois que o artigo 2.0 pressupõe a satisfação duma necessidade do Estado, enquanto que a apreensão, como é notório, estendeu-se a um número de navios alemães em desproporção com o que era necessário a Portugal para suprir a falta de tonelagem. Mas, além disso, o mencionado artigo torna a apreensão dos navios dependente dum prévio acordo com os interessados sobre a indemnização a conceder-lhes, enquanto que o Governo português nem sequer fez a tentativa de se entender, quer directamente, quer por intermédio do Governo alemão, com as companhias de navegação. Desta forma apresenta-se todo o procedimento do Governo português como uma grave violação do Direito e do Tratado.

de agora em diante como achando-se em estado de guerra com o Governo português. Ao levar o que precede, segundo me foi determinado, ao conhecimento de V. Ex.a tenho a honra de exprimir a V. Ex.a a minha distinta consideração.»

Por este procedimento o Governo português deu a conhecer que se considera como vassalo da Inglaterra, que subordina todas as outras considerações aos interesses e desejos ingleses. Finalmente a apreensão dos navios realizou-se sob formas em que deve ver-se uma intencional provocação à Alemanha. A bandeira alemã foi arriada dos navios alemães e em seu lugar foi posta a bandeira portuguesa com a flâmula de guerra. O navio almirante salvou por esta ocasião. O Governo Imperial vê-se forçado a tirar as necessárias consequências do procedimento do Governo português. Considera-se

Fig. 9 – O jornal “Republica” do dia 10 de março de 1916 informa, na 1.ª página, que Portugal está em estado de guerra 29


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3.3. A entrada de Portugal na Guerra vista pela

apoio ao governo republicano. Republicanos, monárquicos, católicos, todos se unem por Portugal, esquecendo, temporariamente, as quezílias que os opõem.

Após a Declaração de Guerra que a Alemanha apresentou a Portugal no dia 9 de março de 1916 o país entrou em polvorosa. O Parlamento reuniu logo no dia seguinte e todos os grupos parlamentares se manifestaram, patrioticamente, a favor da entrada na Guerra. A imprensa nacional nos dias seguintes faz eco da entrada de Portugal no Conflito Mundial sendo unânime na manifestação de

A reação da imprensa nacional, quanto à entrada de Portugal na Primeira Guerra Mundial na sequência da Declaração de Guerra por parte da Alemanha a Portugal, a 9 de março de 1916, foi claramente favorável. Ficam os seguintes excertos que bem ilustram a nossa afirmação.

imprensa nacional

Fig. 10 – As tropas portuguesas apressam a preparação para a Guerra (na imagem publicada na Ilustração Portuguesa de 27-3-1916, um corpo de infantaria regressa ao Quartel após desfile pelas ruas da capital) 30


MANUEL AUGUSTO DIAS

O Seculo «Ella (a Allemanha) não comprehende, na sua inconsciencia moral como um paiz pequeno como o nosso se atreva, atravez de todos os riscos a ser fiel aos seus deveres. E, como não comprehende, ameaça-nos e injuria-nos! Chama-nos “vassalos da Inglaterra”. Ah! Valem mais os vassalos da Inglaterra que os bandidos coroados para quem a liberdade dos povos é uma velharia condemnada e os tratados internacionais desprezíveis farrapos de papel. Enfim a Allemanha deve ter reconhecido mais uma vez que os povos, por pequenos que sejam, sabem manter o seu brio sem temor das suas violencias. A declaração de guerra não faz mais que estreitar os laços que já nos uniam á Inglaterra e unir toda a familia portugueza ao redor da bandeira da patria.» O Mundo «Para a frente portuguezes! Abraçados á bandeira nacional, defendamol-a com fervor e abnegação. A Portugal rasgam-se novos destinos de gloria. Trabalhemos, de almas juntas e de coração em communhão, para deixar a nossos filhos um patrimonio mais forte, mais feliz, mais prospero e mais livre, do que aquelle que esta geração herdou. É o nosso dever, amigos! Mas tenhamos fé, tenhamos confiança e marchemos unidos como um só homem!» Republica «O dia de hontem no parlamento portuguez foi d’aquelles que resgatam e consolam. Se todo o paiz, á semelhança do que fez o Congresso, em que se calcinaram as animadversões, unir todas as suas energias e todos os seus esforços n’uma suprema aspiração de salvação nacional, a Patria não ha de soçobrar e a Republica viverá!»

Fig. 10A – A 1.ª página de “O Seculo / edição da noite” de 10-3-1916

31


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

A Opinião «Não é a primeira vez que portuguezes e inglezes combatem lado a lado. Em mais de uma batalha memoravel, derramámos juntos um sangue generoso. Hontem como hoje esta fraternidade d’armas ha de dar-nos a victoria. A guerra está declarada. Vamos para a guerra gritando: - Viva Portugal, nunca vencido!» A Ordem (jornal católico) «Muita vez, e não será demais hoje repetil-o, temos afirmado o nosso patriotismo, a nossa dedicação á causa sagrada da Patria, que póde pedir-nos todos os sacrificios, na certeza absoluta de vêr os seus votos integralmente executados. Será para nós uma gloria o oferecermos á Patria todo o nosso sangue, toda a nossa vida, se ao morrermos tivermos a certeza do Dever cumprido e se podermos legar aos nossos vindouros um nome honrado e glorificado pelo máximo sacrificio. Deus, fazendo-nos nascer portuguezes, impoz-nos a obrigação de defendermos a honra do Paiz até á ultima gotta do nosso sangue, e nós, catholicos portuguezes, havemos de cumprir esta obrigação de alma alevantada e cheios de de aquella sagrada coragem que animou os antepassados e fez d’elles heroes dos mais celebrados e santos dos mais venerados que tem o Ceo.» A Nação «A Patria é tudo e ante esse tudo, não existem considerações que divirjam no proposito. Obrigam-nos a sacrificios, obrigam-nos a eventualidades, boas ou más; obrigam-nos ao desempenho d’uma missão, d’um encargo, que é a pedra de toque do nosso caracter de cidadãos. 32

Escusamos de addicionar exemplos que a historia nos aponta, porque se tal fizessemos, poderia suppôr-se que existiria, quanto mais não fosse, um simulacro em assumptos de natureza patriotica. Declarou a Allemanha guerra a Portugal, o elementarissimo dever de portuguezes é a defeza energica, lealissima, da terra em que nasceram.» O Dia «Limitamo-nos a annunciar este sensacional successo e fazemol-o sob a mais penosa impressão, certos de que todos os que não forem inconscientes, pensem como pensarem, monachicos ou republicanos, mas portuguezes pelo cerebro ou pelo coração, hão de estar no momento historico actual subjugados pela mesma dolorosa opressão. Viviamos ha larguissimos annos em paz; um seculo inteiro decorreu, desde que findaram as campanhas peninsulares, sem termos que nos defrontar com um estrangeiro inimigo e, apagados na primeira metade do seculo XIX os echos de luctas civis que precederam e ainda seguiram a definitiva implantação do Constitucionalismo, só os movimentos republicanos vieram abrir um parenthesis na tranquilla paz em que nascemos e nos educamos e na qual o Destino não quis ter a generosidade de permitir que ainda adormecesse na morte esta geração de expiação! E que terrível expiação!» A imprensa portuense também se manifesta O Comércio do Porto «Façamos, pois, valer, por todos as formas, o nosso direito e teremos assim dado um grande passo para assignalar a nossa attitude na contingencia que se nos depara.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Nem por sermos uma nação pequena esse Direito vale menos do que o das nações poderosas. Negar isto seria juntar mais um libello a tantos outros que ahi estão a condemnar a civilisação do secculo em que vivemos. Depois do procedimento que a Allemanha adoptou para com a Belgica, a nação pequena em territorio, mas grande no espirito de patriotismo e abnegação de seus filhos, não podíamos esperar que ella voltasse para Portugal olhos benignos, achando-nos ligados á Gran-Bretanha, por uma alliança que vem de seculos. Em todo o caso da benignidade ou rancor de olhar á negação do Direito e da Justiça que nos assitem, vae uma grande distancia.» A Montanha «Altivamente o povo portuguez acceita o repto! D’ora avante já não ha partidos, já não ha dissidencias politicas que nos separem. Seremos unidos, todos os homens de bem d’este paiz e iremos até onde os acontecimentos nos levarem, ou para vencer com gloria ou para morrer com honra.

Mas, para que essa reconciliação que não importaria em caso algum uma abdicação, (reservando cada um para depois da paz o direito de luctar pelas suas convicções politicas) se faça, é urgente e indispensavel que suspendam imediatamente todas as leis de excepção; é preciso que, á semelhança de que fez a republica franceza, se abram as fronteiras aos portuguezes iniquamente expulsos do território portuguez pelo único crime de praticarem o bem christamente.» A Lanterna «Que todos os verdadeiros e honestos portuguezes cumpram os seus deveres, sacrificando-se dentro dos limites da sua acção social, sejam commerciantes, industriaes, funcionários, militares, agricultores, capitalistas ou operários, e as durezas da nossa situação hão de attenuar-se sem as calamitosas e fataes consequencias que a falta de patriotismo nos pode trazer n’este momento histórico, em que temos um grande dever a cumprir e um glorioso nome a sustentar.»

Portugal, n’esta velha pátria ilustre, mais uma vez honrará a sua brilhante historia.»

3.4. Governo da União Sagrada

Liberdade (jornal católico) «Filhos da mesma pátria, com eguaes deveres para com ella, impõe-se, perante o inimigo commum, o esquecimento d’aggravos, que é nobilíssimo, o silencio das nossas paixões pessoaes e politicas, e a união de todos.

Depois da Alemanha ter declarado, formalmente, Guerra a Portugal, os republicanos fizeram tudo para conseguirem a união dos vários partidos republicanos, por forma a formarem um governo forte, capaz de mobilizar os portugueses para Guerra. Não foi fácil, porque havia muitas pessoas, mesmo entre os republicanos que eram contrários à participação portuguesa no primeiro grande conflito do século XX. A verdade é que, apenas oito dias depois daquela declaração de guerra, haveria de constituir-se o denominado governo da “União Sagrada”.

N’esta situação e em tal momento essencialmente nacionais, impõe a salvação comum o estabelecimento de uma plataforma em que caibam todas as correntes de opinião que dividem o paiz.

33


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Efetivamente, apenas dois partidos republicanos entraram no novo governo: o Partido Democrático, de Afonso Costa, e o Partido Republicano Evolucionista, que tinha como líder, António José de Almeida, que seria, de resto, o chefe do novo governo. Esta “União Sagrada” duraria pouco mais de um ano, exatamente 406 dias, ou seja, do dia 15 de março de 1916 ao dia 25 de abril de 1917. Recordemos algumas ocorrências no mês seguinte à tomada de posse do governo da “União Sagrada”. Abril ficou, desde logo, marcado por uma crise das subsistências que provocou um enorme mal-estar na população portuguesa, havendo também a registar uma greve no setor da construção civil. Nesse mesmo mês foi concluída a ocupação do Quionga em Moçambique, território de que tínhamos sido desapossados em 1894. Álvaro de Castro seria nomeado governador de Moçambique. No dia 4 de abril, e na sequência da declaração de Guerra, por parte da Alemanha, é proibida a entrada de alemães em território português e são obrigados a sair os alemães aqui residentes, ficando presos os que tinham entre 16 e 45 anos e fez-se o sequestro dos respetivos bens (23 de Abril). A 14 de abril foi proposta uma lei de ampla amnistia, que abrangia os responsáveis pelas incursões monárquicas. Esta proposta acabou por gerar um protesto do próprio Manuel de Arriaga. A 20 de abril seria instaurada também a censura postal. No Parlamento é proposta a Cruzada das Mulheres Portuguesas. Pelo Decreto n.º 2 357, de 29 de abril, é regulada a expor34

tação, reexportação e importação de géneros de primeira necessidade. Era proibida a exportação para o estrangeiro de lãs, salitre, nitrato de sódio, fios e cordões para instalações elétricas. É proibida ainda a exportação para as colónias de combustíveis, automóveis e géneros alimentícios de que haja escassez na metrópole. Ficam livres de direitos pautais as importações de gados, cereais, à exceção do trigo, batatas e carnes. O envio de militares para a Guerra prejudicaria o país. A mão-de-obra escasseou nas cidades e nos campos. Com as medidas implementadas a nível militar, os sindicatos alertavam as famílias para a possibilidade da família se dividir graças à guerra, fazendo com que a censura fosse novamente implementada como forma de “calar” a população para que não houvesse grandes polémicas. A participação na Guerra teve inegáveis repercussões a nível social e económico. A inflação tornou-se galopante e como forma da contrariar, o Governo aumentou os salários dos funcionários do Estado de maneira a aumentar-lhes também o poder de compra. Cresceu a oposição quer ao Governo, quer à República por não perceberem o objetivo da entrada na Guerra. Seguiram-se várias revoltas, particularmente a Revolta de Machado Santos, a 13 de dezembro (de que adiante trataremos), que agravou as perseguições e a censura. Seriam detidos vários deputados e suspensos vários jornais. Efetivada a participação na Guerra, o governo da União Sagrada desfazer-se-ia na Primavera de 1917.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Quem foi António José de Almeida?

Porto) e de 1908. Esteve igualmente envolvido na Revolução triunfante, no dia 5 de Outubro de 1910, que instauraria a República. O seu combate contra o regime monárquico, em acentuada corrupção e decrepitude, acentuou-se tanto no Parlamento (tendo sido eleito para as duas últimas legislaturas da Monarquia), como na imprensa (fundou e dirigiu vários jornais, o mais importante e prestigiado foi, sem dúvida, o “República”, em janeiro de 1911; e escreveu artigos bastante incisivos contra o regime político vigente, como o “Bragança, o Último”, em que atacava o monarca e o regime). Era ainda aluno da Faculdade de Medicina, em Coimbra, quando publicou esse artigo no jornal académico “Ultimatum”. Foi considerado insultuoso para o rei D. Carlos, que o processou. Defendido pelo Dr. Manuel de Arriaga, apanharia três meses de prisão.

Fig. 11 – António José de Almeida (1866-1929)

António José de Almeida foi um importante ativista do movimento republicano português e maçon como muitos outros republicanos do seu tempo. Nasceu no dia 27 de julho de 1866 em Vale da Vinha (Penacova) e faleceu em Lisboa, no dia 31 de outubro de 1929. Revelar-se-ia extremamente popular pelos seus dotes oratórios. De grande empenhamento político, seria muito relevante a sua participação na preparação das intentonas revolucionárias de 1891 (1.ª Revolta Republicana do

Terminado o seu curso em 1895, seguiu para Angola e, depois, para S. Tomé e Príncipe, onde exerceu a sua profissão de médico, até 1903. Nesta data regressou a Lisboa, tendo, pouco depois, partido para França para estagiar em várias clínicas, donde regressou no ano seguinte. Em Lisboa de novo, teve consultório, primeiro na Rua do Ouro, depois no Largo de Camões, entrando, ao mesmo tempo, na vida política ativa. Nesta condição, foi candidato pelo Partido Republicano, em 1905 e 1906, tendo sido eleito deputado nas segundas eleições, em agosto de 1905. No ano seguinte, em plena Câmara dos Deputados, sobe acima da mesa, e apela aos soldados, que haviam sido chamados para expulsar os deputados republicanos do Parlamento, para que proclamem de imediato a República. 35


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Estabelecida a República, coube-lhe em 1910 assumir a responsabilidade pelo Ministério do Interior, do Governo Provisório Republicano, o que provocou um grande desgaste da sua figura, pois teve de enfrentar graves problemas de ordem social. Revelaram-se tão profundas as divergências, pessoais e políticas, com outro importante republicano, Afonso Costa, e outros democráticos, que António José de Almeida protagonizou uma importante e definitiva cisão no Partido Republicano Português, vindo a criar o seu próprio partido: Partido Republicano Evolucionista, bastante mais conservador. Apesar desta cisão no panorama político-partidário republicano, acederá a chefiar o Governo da União Sagrada, acumulando o desempenho dessas funções com as de Ministro das Colónias, no momento em que Portugal decide entrar na Primeira Guerra Mundial. Segue-se o interregno sidonista, em que António José de Almeida é perseguido. Findo o domínio político de Sidónio Pais, com a sua eliminação física, é eleito Presidente da República, em 1919. Nessa qualidade visitará o Brasil, quando naquele país se registava uma forte corrente nativista que se exprimia por atos xenófobos contra os portugueses. António José de Almeida, com os seus invulgares talentos oratórios, consegue minimizar os efeitos desta onda contestatária. Em toda a vigência da Primeira República (1910-1926), foi o único Presidente que completou o seu mandato. O insigne estadista republicano, António José de Almeida, sofrendo de gota, passou os últimos anos numa cadeira de rodas, vindo a falecer no dia 31 de outubro de 1929, há 84 anos. 36

3.5. A censura no tempo da Guerra É normal em tempo de guerra que o poder arranje forma de controlar os meios de informação em nome da segurança e dos interesses da Nação. Foi precisamente o que aconteceu durante a Primeira República, logo após a Declaração de Guerra a Portugal, por parte da Alemanha, em março de 1916. Assim, pela Lei n.º 491, de 12 de março de 1916, o Congresso da República determinou que o poder executivo passava a ter “todas as faculdades necessárias ao estado de guerra com a Alemanha”. O governo poderia, pois, conferir indicações às autoridades policiais para apreenderem todo o tipo de publicação que, de alguma forma, atentasse contra a segurança e defesa da Pátria, ou que se manifestasse contra a entrada na guerra, uma vez que tal atitude podia ser entendida como alta traição contra Portugal. Os periódicos que tivessem este tipo de comportamento podiam mesmo ser suspensos. Na 1.ª fase da guerra, entre agosto de 1914 e março de 1916, em que os nossos militares só combatiam em Angola e Moçambique, por não ter havido ainda a Declaração de Guerra da Alemanha, os jornais ainda tinham alguma liberdade. Alguma, porque ainda podiam acompanhar de perto os debates parlamentares sobre a guerra, mas havia já uma prática de vigilância sobre a imprensa abusadora que podia determinar apreensão, suspensão, multas e penas de prisão para diretores, jornalistas ou mesmo donos das tipografias que os imprimissem.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Os jornais portugueses passam, no entanto, a publicar regularmente informações que chegam das frentes de combate, tendo como fontes telegramas de agências noticiosas. Claro que os jornais republicanos que defendem a entrada de Portugal na guerra, como o “República”, de António José de Almeida, “O Século”, de Silva Graça, ou “O Mundo” têm a vida facilitada, já os que são contra, como “O País” ou “A Luta” sentem uma pressão maior por parte das autoridades. Assim, a censura prévia aos meios de comunicação, faz com que a opinião pública aceite a entrada dos nossos soldados no conflito mundial, em nome do interesse patriótico, e condene todos aqueles que são contra. O jornal “A Capital”, quando o CEP iniciava os combates na Frente da Flandres francesa, critica a censura ainda mais rigorosa. Sob o título “Nova Phase da Censura” informa as recentes remodelações da Comissão de Censura que passará a ser constituída por elementos civis e militares, competindo a estes últimos fiscalizar apenas as informações e os comentários que se refiram a assuntos de carácter militar. Já os primeiros teriam a incumbência de analisar o conteúdo político e seriam recrutados entre professores, mas o jornal não concorda e acusa os professores, em geral, de não entenderem nada nem de política nem de jornais. “Como não sabem nada, cortam tudo”, conclui. Contudo, o jornal aceita que há necessidade de cortar abusos, pois há “folhas que manteem até secções que são positivamente infames, porque n’ellas se anavalha a própria Patria, e a calumnia floresce, como um cogumelo venenoso”. Mas com esta forma de censura “o governo não pensa senão em crear mais um processo de repressão e de silencio, caracteristico d’aquella politica funesta que mereceu os protestos do Times…”, acusa “A Capital”, na sua edição do dia 22 de março de 1917.

Fig. 12 – Escrevendo uma carta para a família (Ilustração Portuguesa, 26-2-1917)

Também os nossos soldados, em Guerra, viam as cartas que dirigiam aos familiares serem censuradas pelos seus superiores, pois não podiam falar das operações militares nem queixarem-se dos naturais padecimentos que diariamente sofriam. 37


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3.6. Resistência à entrada de Portugal no palco europeu da Guerra

No período da 1.ª Grande Guerra, Portugal tinha um regime republicano que pretendia prestigiar-se internacionalmente e garantir intacto todo o seu território. Por isso entrou na Guerra, também na Frente Ocidental. Contudo, nem todos concordaram. Foi o caso de Machado dos Santos, o herói da implantação da República. António Maria de Azevedo Machado Santos, um dos fundadores da República Portuguesa, nasceu a 10 de janeiro de 1875, em Lisboa. Com 16 anos alistou-se na Marinha. Em 1907 juntou-se a um grupo de conspiradores contra os monárquicos para preparar uma revolução republi-

cana. Entrou, também, na organização secreta da “Carbonária” em 1908 e, nos acontecimentos revolucionários dos dias 4 e 5 de outubro de 1910, ficou conhecido como o “herói da Rotunda”, ou o “pai da República”, em virtude da heroicidade assim evidenciada. Em 1916, quando se tratava de preparar a entrada de Portugal na 1.ª Guerra Mundial, no palco europeu, não concordou e lutou para evitar que tal acontecesse. Foi derrotado e preso. Em dezembro de 1916, a Primeira República vivia mais um dos seus momentos revoltosos. Para ele, muito contribuiu a crise de subsistências que se agravava levando ao aparecimento de protestos na imprensa. Por outro lado, Portugal preparava-se para entrar na Guerra, na Frente Ocidental, ao lado da Inglaterra e da França.

Fig. 13 – A edição da noite d’O Seculo, de 14 de dezembro dá pormenores da notícia da tentativa revolucionária ocorrida na véspera em Tomar, mas com repercussões noutras localidades do país 38


MANUEL AUGUSTO DIAS

A 13 de dezembro, desse mesmo ano de 1916, eclodiu, em Tomar, uma tentativa falhada de revolução, liderada por Machado Santos, o herói da implantação da República, contra a mobilização para a Frente Europeia. O plano desta “revolução” terá sido de Vasco de Carvalho, que contou com a colaboração do Capitão Eurico Cameira e de muitas outras pessoas, que nos dias seguintes seriam presas. As notícias sobre esta revolta foram censuradas. Mesmo assim soube-se que se publicou um falso número do “Diário do Governo”, com a demissão do Ministério e a nomeação de um outro, sob a presidência de Machado dos Santos. O estado de sítio era declarado também. Esta insubordinação militar teria repercussões em várias localidades do País, nomeadamente na Figueira da Foz, em Castelo Branco e em Lisboa. O motivo mais importante para o ato revolucionário terá sido o facto de Machado Santos e os restantes envolvidos não concordarem com a saída das tropas portuguesas para a Frente Europeia, da 1.ª Guerra Mundial. O plano revolucionário pretendia que Machado dos Santos conseguisse sair com as tropas de Tomar, passando por Abrantes para cercar Lisboa; no entanto, não chegou a Abrantes pois foi confrontado com Abel Hipólito que o prendeu no dia 14 de dezembro, sendo levado para bordo do “Vasco da Gama”. No dia da Revolta de Tomar, o Ministro da Guerra, Norton de Matos, fez sair um Cartaz, sob o título “Serviço da República / Secretaria da Guerra”, com o seguinte conteúdo: «Um grupo de revolucionarios tentou lançar a perturbação no País neste momento gravissimo em que a Patria mais necessita de todo o amor de seus filhos.

Fez imprimir clandestinamente e distribuir um falso “Diario do Governo”, contendo a falsa nomeação dum suposto ministerio em nome do qual tentaram expedir ordens ás autoridades militares e civis. Cumpre ás populações manterem a maior serenidade perante estes actos de revolta assentes sobre uma burla mesquinha, pois o Governo da Republica dispôz de todos os meios para fazer abortar este movimento, que constituiu no momento presente, um gravissimo crime de lesa-Patria. / O Ministro da Guerra / Norton de Matos». A edição da noite de “O Seculo” de 14 de dezembro de 1916 garante que Lisboa está tranquila e que o Governo controla a situação, informa ainda que o Parlamento vota o “estado de sítio” e que continuam a fazer-se prisões. A notícia da 1.ª página começa assim: «Os acontecimentos de hontem foram hoje o assunto dominante em toda a cidade, apezar de que esta se manteve sempre com o seu aspéto habitual, sem conflitos ou qualquer nota que viesse perturbar o seu socego.» Este jornal dá conta de várias bombas encontradas em diversos pontos da cidade nesse dia: de madrugada, no Terreiro do Trigo, um funcionário municipal foi gravemente ferido pela explosão de uma bomba, às 5h30 foi encontrada outra nas “escadinhas de Ponte de Lima”, às 8h30 outra no “Largo de D. Rosa”, às 9h, um guarda de serviço deu com uma, na Rua Damasceno Monteiro, em “forma de laranja, de grandes dimensões”, descobriu-se ainda outra na Rua do Terreirinho e na Rua do Arco, a S. Paulo, «tambem foi encontrado um embrulho com 21 balas para espingarda». 39


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

O plano desta “revolução” teria sido de Vasco de Carvalho, que contou com a colaboração do Capitão Eurico Cameira e de muitas outras pessoas, que nos dias seguintes seriam presas. Em setembro de 1917, a imprensa volta a falar do assunto. Assim, na sua edição do dia 1 de setembro, o “Diário Nacional” sob o título “O julgamento do fundador da república” dá publicidade à nota de culpa e às testemunhas apresentadas por Machado dos Santos para um julgamento que deveria iniciar-se em Viseu, no Tribunal Militar, a partir de 5 de setembro. Da “nota de culpa” retiramos o seguinte excerto: «Attendendo a que, pelo presente auto do corpo de delicto e mais documentos, se verifica que nos dias 13 e 14 de Dezembro do anno findo, nas cidades de Thomar, Castello Branco, Abrantes e Figueira da Foz, se produziu um movimento revolucionario por parte das guarnições militares das referidas cidades, com o fim de substituir o actual governo por outro, sob a presidencia do capitão de mar e guerra Antonio Maria d’Azevedo Machado dos Santos, e no qual tomaram parte activa os seguintes individuos (…) / Verifica-se que existem tambem contra elles, nos autos, provas concretas e suficientes para lhes ser instaurada a acusação como auctores do crime de sedição militar (…)». Entre as testemunhas apresentadas por Machado dos Santos surgem nomes do maior relevo político, como Bernardino Machado e António José de Almeida, Presidente da República e Chefe de Governo, respectivamente, à altura dos acontecimentos. Contudo, no dia 6 de setembro de 1917, o diário republicano conservador, “A Opinião” dava conta do adiamento do julgamento: «Marcado primeiro para o dia 5 d’este mez, trans40

ferido depois para 7, o julgamento acaba de ser adiado sine die. Assim o informava a nota do conselho de ministros de hontem. / Pretendem alguns que esses adiamentos proveem de meras formalidades judiciaes, nada tendo com eles o poder executivo, que se mantem alheado do assumpto. / Assim devia ser, realmente, pois o governo não tem que ingerir-se nas questões afectas ao poder judicial, cuja independencia é, ou deve ser, absoluta. / Mas tem de concluir-se que tal se não dá, visto o julgamento ter sido discutido em conselho pelos ministros, que resolveram o seu adiamento, parece que por questões de ordem publica.» A questão colocada pelo articulista de “A Opinião” é pertinente e dá para compreender a instabilidade social e política que já no tempo da Guerra, e também por causa dela, se vivia em Portugal: «O adiamento motivado por causa de possiveis alterações da ordem publica, que não se sabe a proposito do que se dariam, prova o completo desprezo pelos mais sagrados direitos individuaes. Como se explica que haja receio de que a ordem se altere, efectuando-se o julgamento, e o não haja de que ela seja alterada justamente porque ele se não realisa?». Machado dos Santos acabaria por ser libertado e, em 1919, salva de novo a República ao derrotar, em Monsanto, um grupo de revolucionários monárquicos que tiveram mais sorte a norte (no Porto) onde durante cerca de um mês instituíram a denominada “Monarquia do Norte”. Outro modo a que Machado dos Santos recorreu para lutar contra o governo dos “democráticos” e para afirmar as suas ideias políticas, foi a criando um novo partido, o Partido da Federação Republicana. Contudo, não teve a adesão pretendida e decide acabar a sua carreira política, passando a dedicar-se à vida pessoal.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Fig. 14 – Machado Santos (1875-1921). Militar e político

Mesmo assim, em resultado dos ódios semeados em tantas “tentativas revolucionárias” acabaria assassinado, na trágica “noite sangrenta” ocorrida a 19 de outubro de 1921, em Lisboa, ocasião em que foram assassinados, também, outros importantes políticos republicanos como foi o caso de António Granjo, então chefe do Governo e Ministro do Interior, José Carlos da Maia, outro histórico da proclamação da República, o comandante Freitas da Silva, secretário do Ministro da Marinha e o coronel Botelho de Vasconcelos.

41


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

42


MANUEL AUGUSTO DIAS

4. O CEP na Frente Ocidental “Milagre de Tancos” Na primavera de 1916 é constituído o Corpo Expedicionário Português, sob o comando do general Norton de Matos, ministro da Guerra. O Corpo compõe-se de 30 mil homens, que recebem instrução preliminar nos quartéis das 2.ª, 5.ª e 7.ª Divisões antes de se preparam, de forma bastante intensa, em Tancos, tendo em vista a sua partida para a França. Este esforço de preparação é vulgarmente conhecido por “Milagre de Tancos”.

A 1.ª fase de instrução ocorrera em quartéis de maior proximidade com as regiões de onde vinham os soldados, nomeadamente, no Norte: Covilhã, Guarda, Lamego e Viseu, e no Centro: Abrantes, Castelo Branco, Leiria e Tomar. Aí, os jovens recrutados e aqueles que se voluntariaram para o serviço militar, receberam treino, entre os meses de fevereiro e março de 1916. Daí seguiram para Tancos que se tornou o “ponto de encontro” para milhares de homens, instalados provisoriamente num “mar” de tendas, enquanto os graduados se

Fig. 15 – Os treinos de infantaria, em Tancos (Ilustração Portuguesa, série II, nº. 563, Lisboa, 04 de dezembro de 1916) 43


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

acomodavam em numerosas construções de madeira. E foi nessas condições que decorreu o “Milagre de Tancos” que em pouco tempo pretendeu preparar os homens para uma Guerra de proporções mundiais.

vez que por terra punha em causa a neutralidade espanhola, e como não dispúnhamos de suficientes meios navais de transporte, solicitámos à Inglaterra que pusesse à nossa disposição alguns dos seus navios de transporte.

Quando a instrução em Tancos terminou, os homens feitos soldados, regressaram aos quartéis de onde tinham vindo, ficando a aguardar a ordem de seguirem para França. Como os quartéis não podiam acomodá-los a todos em condições minimamente aceitáveis, os responsáveis militares concederam-lhes licenças registadas, em que puderam regressar a casa, às suas famílias, voltando, muitos deles, às antigas ocupações que conheciam bem.

Mesmo assim, os navios não eram adequados à sua finalidade, uma vez que haviam sido concebidos para a realização de viagens de três horas, que era quanto demorava a ligação entre a Inglaterra e a França, enquanto a viagem que iam fazer entre Lisboa e Brest demorava três dias. Por isso, estes barcos não estavam preparados para as pessoas dormirem ou para aí serem confecionadas refeições.

Mas à medida que ficava mais próxima a “guia de marcha” para a Guerra, a desmoralização aumentava e alguns, também estimulados pelas famílias, resistiram. E quanto mais se aproximava a hora do embarque maior era a resistência. Houve alguns que fugiram para Espanha, outros que reivindicaram lesões e doenças e ainda houve casos de deserções. Até o momento do transporte foi conturbado. Registaram-se diversas insubordinações em todo o país.

Para agravar esta situação, os primeiros soldados a embarcar permaneceram nos barcos cerca de 10 dias, frente ao Terreiro do Paço e só no dia 31 de janeiro, cerca das 19 horas, é que partiram em direção ao seu destino.

Em finais de janeiro de 1917, na barra do Tejo, estavam embarcados os primeiros soldados portugueses, centenas deles, que no início de fevereiro começariam a chegar a Brest, porto francês de desembarque das nossas tropas. O transporte dos nossos militares para França foi uma das grandes dificuldades reais com que Portugal se debateu para concretizar a participação lusa no teatro de guerra europeu. O transporte só era viável por mar, uma 44

Fig. 15A – Milhares de militares portugueses a caminho da Guerra


MANUEL AUGUSTO DIAS

Nesse período de espera para a Guerra, houve um episódio no Tejo, que divertiu os soldados – as acrobacias de um aeroplano pilotado por um português. O jornal “A Capital”, de domingo, dia 28 de janeiro de 1917, página 1, sob os títulos “Aeroplanos que atacam comboios de tropas / Como se explica a audacia e a habilidade do tenente de marinha portuguesa Caseiro” dá a notícia: «Na passada segunda feira, o aviador portuguez, tenente de marinha Caseiro, demonstrando uma audacia grande e uma excepcional habilidade de piloto de aeroplanos, veiu da escola de Vila Nova da Rainha de viagem até Lisboa e “passeou” sobre a cidade a alturas varias que, por vezes, chegaram a ser inferiores a 80 metros sobre os telhados da casas. / Depois, executando multiplas espiraes, procurando conhecer as condições atmosphericas e encontrando-as favoraveis, desceu até 15 metros do nivel do Tejo e evolucionou em volta dos transportes de tropas, em “zigzags” impressionantes! Os soldados saudavam a passagem do aeroplano portuguez com vivas e palmas. / O corajoso aviador desceu ainda mais, quasi a 10 metros da agua! Ao passar pelo submersivel “Espadarte” o tenente Caseiro saudou de viva voz o seu comandante (…)». Ainda relativamente às condições em que eram transportados os nossos combatentes, um dos militares graduados descreveu o seu alojamento no barco como «(...) uma espécie de jazigo com duas prateleiras de lona sobrepostas de cada lado e um pequeno lavatório ao meio» e a comida era «(...) comida inglesa, quase sempre cheirando a cebo das botas.». Os praças ainda conheciam piores condições, muitos deles tinham de dormir no chão, espalhando-se pelos corredores.

Fig. 16 – A hora da refeição no barco a caminho de França (Ilustração Portuguesa, 16-4-1917)

A 1.ª leva de combatentes do CEP (Corpo Expedicionário Português), que foi desembarcando ao longo de todo o mês de fevereiro, totalizou cerca de 12 mil e 500 soldados, transportados em 9 navios (2 portugueses, Pedro Nunes e Gil Eanes; e 7 ingleses, Bellerophon, City of Banares, Inventor, Bohemian, Rhesus, Flavia e Lasmedon), tendo chegado nas seguintes datas a Brest, no dia 2 de fevereiro, 4 navios; no dia 19 de fevereiro, 2 navios; no dia 20 de fevereiro, 1 navio; no dia 21 de fevereiro, 2 navios; no dia 25 de fevereiro, 3 navios; e no dia 26 de fevereiro, 1 navio. Depois de uma curta estadia em Brest, porto de desembarque das tropas portuguesas, seguia-se o transporte, de comboio, até à região de “Aire”, zona destinada às tropas do CEP. 45


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4.1. A vida nas Trincheiras Antes de nos debruçarmos sobre alguns aspetos da vida dos combatentes portugueses nas trincheiras durante a Primeira Guerra Mundial, anos 1917 e 1918, nos campos da Flandres, vamos explicitar, de forma sintética, a organização do CEP (Corpo Expedicionário Português).

A organização do CEP

Fig. 17 – Combatentes portugueses desembarcando em França (Ilustração Portuguesa, 5-3-1917)

E foi num clima agreste, de neve, chuva e frio, língua e costumes tão diferentes dos seus, que as tropas portuguesas tiveram de suportar mais de um mês de treino complementar, junto do exército britânico, para se poderem “familiarizar” com as armas inglesas com que iam combater e com as novas formas da guerra que iam conhecer de perto.

O CEP apresentava a seguinte constituição: Quartel-General do Corpo; Quartel-General da 1.ª Divisão; Quartel-General da 2.ª Divisão. A Infantaria estava organizada em 6 Brigadas – 1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª, 5.ª e 6.ª – cada uma tinha um Quartel-General, 4 Batalhões de Infantaria e uma Bateria de Morteiros Ligeiros de 75 mm. A 1.ª Brigada (da 1.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 21 (Covilhã), pelo Batalhão de Infantaria n.º 22 (Portalegre), pelo Batalhão de Infantaria n.º 28 (Figueira da Foz) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 34 (Mangualde). A 2.ª Brigada (da 1.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 7 (Leiria), pelo Batalhão de Infantaria n.º 23 (Coimbra), pelo Batalhão de Infantaria n.º 24 (Aveiro) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 35 (Coimbra). A 3.ª Brigada (da 1.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 9 (Lamego), pelo Batalhão de Infantaria n.º 12 (Guarda), pelo Batalhão de Infantaria n.º 14 (Viseu) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 15 (Tomar).

46


MANUEL AUGUSTO DIAS

A 4.ª Brigada (da 2.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 3 (Viana do Castela), pelo Batalhão de Infantaria n.º 8 (Braga), pelo Batalhão de Infantaria n.º 20 (Guimarães) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 29 (Braga). A 5.ª Brigada (da 2.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 4 (Faro), pelo Batalhão de Infantaria n.º 10 (Bragança), pelo Batalhão de Infantaria n.º 13 (Vila Real) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 17 (Beja). A 6.ª Brigada (da 2.ª Divisão) era constituída pelo Batalhão de Infantaria n.º 1 (Lisboa), pelo Batalhão de Infantaria n.º 2 (Lisboa), pelo Batalhão de Infantaria n.º 5 (Lisboa) e pelo Batalhão de Infantaria n.º 11 (Évora). A Artilharia estava organizada em 6 Grupos de Baterias de Artilharia – 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º e 6.º – cada um englobando 3 Baterias de 8 Peças de 75 mm e uma Bateria de 4 Obuses de 114 mm. Tinha também 6 Baterias de Morteiros Médios de 152 mm e 2 Baterias de Morteiros Pesados de 236 mm. Da Engenharia faziam parte os seguintes serviços: Companhia de Telegrafistas de Corpo; 1.ª e 2.ª Companhias Divisionárias de Telegrafistas; Secção de Telegrafia sem Fios (englobando 2 subsecções divisionárias); 1.ª e 2.ª Companhias de Sapadores de Corpo; 6 Companhias Divisionárias de Sapadores Mineiros; Secção de Pombais Militares; Batalhão de Mineiros; 2 Grupos de Companhias de Pioneiros. Metralhadoras tinha 6 Grupos, cada um englobando 2 Baterias de Metralhadoras Pesadas de 7,7 mm.

O Serviço de Saúde era garantido por 5 secções de Ambulâncias (1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª e 5.ª), 2 Colunas Automóveis de Transporte de Feridos e 6 Secções Hipomóveis de Transporte de Feridos. Faziam ainda parte do CEP, Grupo de Esquadrões de Cavalaria, transformado em Grupo de Companhias de Ciclistas; 1.ª e 2.ª Secções Divisionárias de Observadores; 1.ª e 2.ª Secções Móveis Veterinárias; 1.º e 2.º Trens Divisionários; 1.º e 2.º Grupos Automóveis; 1.ª e 2.ª Companhias de Serviços Auxiliares. A Base de Retaguarda era constituída pelo Quartel-General da Base; 1.º, 2.º e 3.º Depósitos de Infantaria; Depósito de Cavalaria; Depósito de Remonta; Depósito Misto; Depósito(s) Disciplinar(es); Tribunal de Guerra da Base; C.M.C.A.; Hospital Cirúrgico; Hospital de Medicina e Depósito de Convalescentes; Estação de Evacuação; Depósito de Material de Engenharia; Depósito de Material de Guerra; Depósito de Material Sanitário; Depósito de Material Veterinário; Depósito de Material de Subsistências; Depósito de Material de Fardamento e Aquartelamento; Depósito de Material de Bagagens; Oficina de Montagem de Munições de 75 mm. Além destas forças do CEP dispunha ainda das seguintes unidades que foram colocadas sob comando direto do 1.º Exército Britânico: Corpo de Artilharia Pesada, englobando 2 Grupos, cada um com uma Bateria de Obuses de 233 mm, uma Bateria de Obuses de 202 mm e uma Bateria de Obuses de 152 mm; Batalhão de Sapadores de Caminhos de Ferro; Companhia de Projetores de Campanha. Existia também um Corpo de Aviação que não chegou a ser ativado, sendo os seus pilotos integrados em unidades de aviação britânicas e francesas. 47


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Primeiras declarações sobre as nossas tropas em França Apesar de ter sido reposta a censura na imprensa portuguesa durante a 1.ª Guerra Mundial, de resto bem evidente nas respostas abaixo, a verdade é que os jornais portugueses iam dando conta, dentro do possível, da forma como os nossos combatentes se iam aclimatando ao norte de França, para onde foram combater no final do inverno de 1916/1917. O Adido Militar Português em Paris, o Tenente-coronel Ortigão Peres, numa curta viagem a Portugal, deu uma rápida entrevista ao diário republicano “A Manhã”, que se publicou no dia 12 de abril de 1917. Dessa troca de impressões reproduzimos algumas passagens que dão para entender como se estavam a dar por lá os combatentes da 1.ª leva do CEP. P (pergunta) “– As nossas tropas em França?”

Fig. 18 - Nas trincheiras portuguesas (Ilustração Portuguesa, 10 de setembro de 1917)

R (resposta) “– É a melhor possivel a atmosfera que envolve o nosso nome em França. O nosso esforço é justamente sentido. Todos os dias se dão constantes demonstrações do que afirmo…”. P “– Já entraram em combate as nossas tropas…” R “– Sim, mas acção certamente muito limitada. As nossas tropas estão no período da instrução, e, de vez em quando, aproximam-nas das linhas de combate, entrando mesmo em fogo, para as habituar e para que a instrução resulte mais positiva (…)”.

48


MANUEL AUGUSTO DIAS

P “– E baixas?” R – Insignificantissimas. Nada, porém, posso acrescentar. (…)”. P “– Tem-se falado muito no apreço em que é tida a artilharia portuguesa.” R “– Sim, é certo. Mas em Portugal exagera-se um pouco o exclusivismo dêsse apreço. Os oficiais e soldados de todas as armas teem merecido rasgados louvores. Afirmo-lhe: o nosso nome e o nosso esforço são tidos em notavel conta. (…) Ainda ha dias, depois da tomada de Noyon, o general…, comandante das tropas francesas, num almoço solene para que recebi convite, fez ao nosso exercito e á nossa terra as melhores referencias, e com tal sinceridade que, intimamente, elas me comoveram (…)”. No mesmo jornal, também na 1.ª página, vêm excertos de uma carta escrita no dia 7 de abril, por um oficial português do CEP no Norte de França, que relata alguns pormenores de interesse. Daí transcrevemos também pequenos excertos: «Sempre o mesmo mau tempo por cá. Ontem, 6, foi o dia em que vi mais neve, desde que aqui estamos. Tudo ficou coberto de uma especie de camada branca, mas os nossos soldados, embora a tiritarem de frio, não perderam o bom humor de sempre e tal, como fazem as crianças na Noruega, entretiveram-se a fazer uma figura enorme de mulher, sentada sobre uma grande bola. A figura representava a Republica. Foi o acontecimento do dia. Pena é que seja formalmente proibido tirar fotografias.

(…) O trabalho é intenso: dura das 7 horas da manhã, que é como quem diz do nascer do dia, até ao pôr do sol. Trabalha-se ao ar livre e a alimentação é excelente, tendo demais a mais a liberdade de cozinhar os generos como entendermos. Em geral são os médicos as donas da casa nos nossos mess. E dão-se então belas surpresas: aparecem mayonnaises, mesmo sem haver peixe, que é coisa que ainda não vimos senão em pinturas. (…) Todos se admiram da facilidade com que os nossos soldados compreendem já o francês e o inglês. Não ha nenhum já que não saiba chamar mesdemoiselles ás aldeãs dos arredores do acampamento (…)».

Almada Negreiros em “reportagem de guerra” Há cem anos, António de Almada Negreiros esteve na frente ocidental, como repórter de Guerra (com ele, mais dois jornalistas portugueses – Paulo Osório e Augusto de Castro – foram os primeiros “enviados especiais” da imprensa portuguesa a uma frente de Guerra, enviando as notícias e reportagens para “O Século” e para o “Diário de Notícias”), junto dos soldados portugueses e de lá escreveu uma reportagem, com o título “Portugal na Guerra / No Sector Portuguez”, que foi publicada na primeira página de “O Século” do dia 29 de maio de 1917. É daí que extraímos algumas passagens.

49


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

(…) O nosso garboso soldado (…) aprendeu já a ser… economico; a ser mais sobrio, a apreciar devidamente, civilisações que nem suspeitava ou conhecia apenas.

Fig. 19 - Soldados portugueses nas trincheiras

«Estou ha dias junto das nossas tropas, e, dia a dia, a deliciosa impressão inicial se arraiga em mim, em arroubos de alegria. Vêr um exercito portuguez instalado n’uma provincia da França, querido dos camaradas estrangeiros, e recebido amoravelmente pelos habitantes do paiz, seria já um facto assás jubiloso. Mas a organização perfeita dos serviços, a ordem e a disciplina dos nossos homens, e a sabia direcção que a todos os ramos de atividade marcial sabem imprimir os oficiaes, mais me fazem exultar de satisfação intima, á media que frequento a nossa gente. 50

Eu tenho-o visto, atento ao estudo e á pratica dos deveres, não só nas escolas onde se prepara esta guerra “sui-generis”, mas nos proprios exercicios desportivos. Produz a melhor impressão, porque se amolda, sem constrangimento, ao novo meio; porque deligencia engrandecer-se, sob o duplo aspéto da higiene do corpo e da disciplina do espirito. – “Admiravel materia prima” – dizia-me hoje, referindo-se-lhe, um dos nossos distintíssimos oficiaes. Admiravel a todos os respeitos, poderei eu acrescentar, sem exagero. (…) D’este formoso e aguerrido exercito se pode dizer o que os romanos diziam das suas hostes, que ele está completamente apto para a guerra: “Bonus bello”. Tenho percorrido todas as trincheiras, redutos, abrigos e campos de instrução; todas as escolas de tiro e de lançamento de granadas; todos os polignos de exercicios de morteiros, de obuses e de artilharia ligeira. Por toda a parte as propensões basilares do nosso homem se evidenciam, com tendência pronunciada para o aperfeiçoamento completo. Reve-


MANUEL AUGUSTO DIAS

lam-se-lhe aqui, rapidamente, todas as qualidades atavicas. Bem dizia Wellington, em oficio de 29 de setembro de 1811, dirigido ao conde de Liverpool, que “as tropas portuguezas dão provas da maior firmeza e disciplina. Os artilheiros portuguezes – acrescentava o vencedor de Watterloo – são dos que, mesmo mutilados, se não arredam das suas peças”. O soldado portuguez (…) é o mesmo de então. Não degenerou. A raça portuguesa, que debutou na Historia com o heroismo de um general serrano, que só morto á traição foi vencido, é a unica, em todo o mundo, que tem conseguido guardar um paiz sem fronteiras naturaes, pelo esforço heroico dos seus filhos. Este é o certificado indiscutivel da sua ancestral coragem.» A terminar, acerca dos nossos soldados, escreve: «Deles dizia o tenente general José de Miranda Henriques, em carta de 2 de maio de 1809, ao marechal Beresford, marquez de Torres Vedras. “V. ex.ª virá ao conhecimento de que a palavra medo se não encontra nos dicionarios da guerra portugueza” / (…)

4.2. Apoio religioso Tomada a decisão de partir para a Frente Ocidental da Primeira Guerra Mundial, o clero português propôs-se participar, através do envio de capelães, para fazer a assistência religiosa dos combatentes portugueses que, como se sabe, eram profundamente religiosos. Não foi fácil para o governo republicano, que primava pelo anticlericalismo, aceitar esta proposta. Mas a pressão do governo britânico parece ter sido determinante para a sua aquiescência, já em finais de 1916. Mesmo assim a lei abre a possibilidade de irem fazer o acompanhamento religioso dos nossos soldados, ministros de todas as confissões religiosas. Capelães de todo o país voluntariaram-se para a Guerra

Eis o que eu acabo de verificar no sector portuguez, – a duzentos metros dos “boches”. Na zona dos exercitos, em França, maio de 1917. / Almada Negreiros».

Fig. 20 O Padre Luís Lopes de Melo deixou a Paróquia da Sé Velha de Coimbra para ir assistir religiosamente os nossos combatentes na 1.ª Grande Guerra 51


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Num tempo em que a maior parte dos homens recrutados precipitadamente para a Guerra era analfabeta, nunca tinha saído da terra onde nasceu, a escola frequentada era a da catequese e a ida ao domingo à Igreja, sendo a principal ocupação uma agricultura de subsistência, depressa se compreende que nesta fase difícil das suas vidas a presença de um sacerdote era indispensável. Ele para além de padre seria, certamente, um amigo, um bom conselheiro, um psicólogo. Alguém tinha de contribuir para a elevação do moral dos soldados, longe da terra, longe da família e muito perto da fome, desespero e da miséria. Até para o Estado esta perspetiva era positiva e deveria ter sido motivadora de estímulo para recrutar mais capelães. Os soldados alemães e os britânicos conscientes do importante papel que estes “diretores espirituais” poderiam ter nas suas tropas, recorreram a eles em grande número. Mas o governo republicano português não; aliás, dificultou ao máximo a sua participação. Foi o mais alto dignitário da Igreja em Portugal ao tempo, o Cardeal Patriarca, António Mendes Belo, que em nome do Clero português pediu ao Presidente da República que permitisse a incorporação de Capelães nas unidades militares que se estavam a preparar para seguir para a Guerra na Europa. Na sequência deste pedido, e também por pressão do Governo Britânico, os principais responsáveis portugueses (Presidente da República e Ministro da Guerra) acabaram por ceder. Surgiu assim o Decreto n.º 2942, datado de 18 de janeiro de 1917, que criava a Assistência Religiosa junto do 52

Exército Português na Grande Guerra. Mas pelos artigos do mesmo, que se transcrevem a seguir, verifica-se a discriminação negativa, quase humilhação, com que eram tratados aqueles mentores espirituais. Eram equiparados a alferes, não tinham direito a qualquer remuneração paga pelo Estado, estavam sujeitos às leis e regulamentos militares e as cerimónias de culto que promovessem não podiam perturbar os serviços e a disciplina das tropas. O referido Decreto n.º 2942 referia, concretamente, o seguinte: «Artigo 1.º A assistência religiosa aos militares que a desejem e que façam parte de fôrças em operações de guerra, será dada por ministros portugueses das respectivas religiões: a) Que, na qualidade de militares ou equiparados, entrem na composição das fôrças em operações; b) Que se ofereçam para acompanhar essas fôrças; c) Que sejam antigos capelães militares. d) Art. 2.º Os generais comandantes das fôrças em operações de guerra permitirão que os ministros das diversas religiões que façam parte dessas fôrças dêem aos militares membros das suas comfissões e assistência religiosa que eles desejarem, contando que as manifestações do culto e as práticas cultuais não perturbem os serviços de campanha e a disciplina das tropas. § único. Os ministros das diversas religiões poderão transportar por conta do Estado as alfaias religiosas de que estritamente careçam para a assistência religiosa e práticas cultuais.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Art. 3.º Os ministros não militares das diversas religiões que se ofereçam para acompanhar as fôrças em operações serão equiparados a alferes e como tais terão direito a transportes, alimentação e alojamento, não lhes sendo porém abonado qualquer vencimento por conta do Estado. (…) § 2.º (…) ficam para todos os efeitos sujeitos às leis e regulamentos militares, e as suas famílias adquirem direito à pensão de sangue, nos termos da legislação em vigor.» Este Decreto foi assinado por Bernardino Machado, Presidente da República e Norton de Matos, Ministro da Guerra. O número de capelães portugueses foi sempre limitado tendo em consideração o efetivo militar mobilizado para a Guerra e isso ficou a dever-se claramente à desconfiança que os governantes republicanos tinham sobre o serviço prestado e a prestar pelos capelães com os combatentes portugueses, na Frente Ocidental. O seu contacto com os soldados era vigiado de perto pelo poder político português, como se pode depreender da seguinte ordem enviada aos “Serviços Postais de Campanha” relativamente a dois livros que os soldados estavam proibidos de receber por determinação do Ministro da Guerra, Norton de Matos.

Soldado Português, pelo Padre José Lourenço de Mattos; O Manual do Soldado Português, adoptado pela Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha. Porque o primeiro contém doutrina contra as Instituições vigentes e à Constituição Política da República e o segundo porque o seu título quase indica que todos os soldados portugueses são católicos o que não é verdade. V.Ex.ª aprenderá e remeterá a esta secretaria [Quartel-general do CEP] todos os exemplares que aí dêem entrada.» (FPC/EHS/CX1, Arquivo CEP - Serviço Postal de Campanha). Apesar de todos estes obstáculos, o Presidente da República, Bernardino Machado, e o Ministro da Guerra, assinaram em 30 de novembro de 1916 o Decreto 2869 que permitia, finalmente, aos comandantes das forças militares em operações militares, na 1.ª Grande Guerra, que incorporassem os “ministros portugueses das diversas religiões”. O conteúdo deste Decreto é do seguinte teor:

«Ordem Serviço SPM, nº 49, de 27 de Agosto de 1917,

«Usando da autorização concedida ao Govêrno pela lei n.º 491, de 12 de Março de 1916, e tendo em consideração os princípios de liberdade de consciência, consignados nos n.os 4.º, 5.º e 7.º do artigo 3.º da Constituição Política da República Portuguesa: hei por bem, sob proposta do Ministro da Guerra, e ouvido o Conselho de Ministros, decretar o seguinte:

Por ordem de Sua Ex.ª o General [Tamagnini de Abreu], em virtude do determinado por sua Ex.ª o Ministro da Guerra, as forças que fazem parte do CEP não podem receber os seguintes livros: O livro do

Artigo 1.º Os generais comandantes das forças militares em operações de guerra permitirão que seja dada assistência religiosa aos militares, que assim o desejem, com intervenção de ministros portugueses das respectivas religiões. 53


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

§ único. As condições desta assistência serão fixadas em regulamento especial. Art. 2.º Ficam revogadas as disposições em contrário. O Ministro da Guerra assim o tenha entendido e faça executar. Paços do Govêrno da República, 30 de Novembro de 1916.– Bernardino Machado – José Mendes Ribeiro Norton de Matos». E, de facto, os capelães portugueses tiveram um papel de grande destaque ao longo da Guerra. Os combatentes portugueses já se batiam nas trincheiras da Flandres há três meses quando lá chegaram os primeiros capelães portugueses. Estes homens que tinham como principal objetivo o apoio religioso e moral aos soldados portugueses serviram em regime de voluntariado, deixando a tranquilidade das suas paróquias para correrem o mesmo risco de vida que qualquer outro combatente.

Fig. 21 O Cónego da Sé da Guarda, José do Patrocínio Dias chefiou o Corpo de Capelães Portugueses

Alguns desses Capelães que se voluntariaram Os primeiros sacerdotes que se tornaram capelães do Corpo Expedicionário Português partiram em abril de 1917. Um deles foi o Padre José do Patrocínio Dias, Cónego da Sé da Guarda, que se ofereceu como capelão voluntário em dois de fevereiro de 1917 e que viria a ser o Coordenador do Corpo de Capelães. Embarcou para França com o primeiro grupo de capelães, em abril de 1917. Quando se deu a Batalha de La Lys, assegurava a assistência religiosa no Hospital de Sangue n.º 2. 54

Outro dos capelães a partir para a França para assistir os soldados portugueses foi o Padre Luís Lopes de Melo, Pároco da Sé Velha de Coimbra, já acima referenciado. Nascera no concelho de Gouveia, em Moimenta da Serra, no dia 18 de fevereiro de 1885, contava pois 32 anos, quando embarcou para França. Segundo o Arquivo Geral, Secção Especial do Corpo Expedicionário Português, o Pároco da Sé Velha de Coimbra, em 22 de março de 1917, desembarcou no P. D.; em 10 de setembro de 1917 é ferido acidentalmente por estilhaços de granada e a 9 de abril toma parte na Batalha de La Lys. Seria lou-


MANUEL AUGUSTO DIAS

vado pelo Comandante do Batalhão de Infantaria N.º 9 «pela maneira zelosa e dedicada como tem desempenhado as funções de assistente religioso dos oficiais e praças deste Batalhão, porque assim tem dado sempre a maior demonstração de espírito de sacrifício que está animado» (O. S. N.º 223 do B. I. N.º 9 de 11de agosto de 1917). Foi igualmente louvado pelo General Comandante do CEP «pelas constantes provas de dedicação, energia e heróica conduta que demonstrou por ocasião do bombardeamento da Ambulância n.º 1, pela decisão e iniciativa como nos dias 9, 10, 11 e 12 de Abril se manteve na frente, percorrendo as estradas em busca dos feridos e conduzindo-os às Ambulâncias e ainda pelo denodado esforço com que contribuiu para o salvamento do material hospitalar. Ao tentar pela última vez em 12 de abril penetrar no H.S.1, foi o carro que conduzia atingido pelas balas inimigas, mas só retirou quando teve a certeza de que na frente não existia soldado algum que precisasse de auxílio». (O.S. N.º 230 de 23 de agosto). Foi condecorado com a Cruz de Guerra de 2.ª classe. Em 10 abril de 1919 foi presente no Q. G. C. donde seguiu para os Hospitais da Bélgica em visita aos militares portugueses que ali estavam internados. Em 24 de junho, vai em diligência a Paris, sendo presente em 25 na Delegação Portuguesa de Paris. Louvado uma 2.ª vez, pelo General Comandante do C.E.P., «pela inteligência, critério e dedicação profissional com que tem dirigido o serviço de assistência religiosa». (O.S. Nº 172 de 30 de Junho de1919). Embarcou em 7 de julho para Lisboa a bordo do transporte “Pedro Nunes” onde chegaria a 10 de julho de 1919, com duas Cruzes de Guerra e depois com a Torre e Espada. Retomaria novamente a freguesia de Sé Velha que dois anos e meio antes tinha deixado.

Outros sacerdotes que se voluntariaram para esta patriótica iniciativa de assistirem os seus compatriotas mobilizados para a Guerra e que partiram no 1.º grupo (abril de 1917) foram Álvaro Augusto dos Santos, Pároco em Lisboa; Avelino Simões de Figueiredo, Capelão em Lisboa; José Bernardino da Silva, Pároco de Moledo (Lourinhã); Manuel Caetano, Pároco de Cós (Alcobaça); Martim Pinto da Rocha, Pároco em Alpedriz (Alcobaça); Manuel Rodrigues Silvestre, Pároco de Cela (Alcobaça); Manuel Pereira da Silva, Pároco de Nossa Senhora da Batalha (Porto); Alexandre Pereira de Carvalho, Pároco de Vila Verde (Felgueiras); António Augusto de Almeida Coelho, Pároco de Pena Verde (Aguiar da Beira); José Ferreira de Lacerda, Pároco de Milagres (Leiria) e Diretor do semanário de Leiria, “O Mensageiro”; Jacinto de Almeida Mota, Pároco de Trevões; Ângelo Pereira Ramalheira, Pároco de Vila (Ílhavo); José Manuel de Sousa, Pároco de Gemeses (Esposende); Paulo Evaristo Alves (Pároco de Coimbra); e Manuel Roiz Silveira, Pároco de Cela (Alcobaça). O 2.º grupo de Capelães portugueses partiu para a “Frente” de combate em junho de 1917. Entre os que partiram identificamos os seguintes: Joaquim Baptista de Aguiar, Pároco nas Oficinas de S. José (no Porto); António Rebelo dos Anjos, Pároco de Salreu; António Tavares de Pina, Pároco de Dornelas (Aguiar da Beira); Carlos Moreira Coelho, Pároco de Carvalhosa e Banho (Marco de Canaveses); António de Almeida Correia, Pároco de Aguiar da Beira; e Manuel Francisco dos Santos, Pároco do Seminário dos Meninos Desamparados em Campanhã (Porto). 55


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Já na fase final da Guerra, mais concretamente em junho de 1918, foi publicado o Decreto N.º 4489, de 4 de junho de 1918, que, finalmente, integrou no Exército os capelães voluntários com os vencimentos correspondentes ao posto de Alferes e que abriu o âmbito da assistência religiosa aos hospitais, navios, asilos ou qualquer estabelecimento onde existissem doentes, feridos, mutilados ou repatriados de guerra. Este Decreto concretizou as pretensões da CCARC (Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha) ao permitir ao comandante do CEP, sob proposta dos comandantes das unidades, autorizar a transferência para o serviço de assistência religiosa dos oficiais e praças necessários. De maio a julho de 1918 partiram os seguintes capelães para França (alguns deles são nomes repetidos dos acima referidos por terem, entretanto, vindo a Portugal): Abel Pereira de Almeida, José Francisco Faustino, António Rodrigues Bartolomeu, Jaime de Gouveia Barreto, José Dias Rodrigues, Avelino Simões de Figueiredo, José Ferreira de Lacerda, Jacinto de Almeida Mota, Manuel João Gonçalves, Alexandre Pereira de Carvalho, Manuel Francisco dos Santos, Manuel Frazão, João Augusto de Sousa, Joaquim Antunes Pereira dos Santos, António Alves Pacheco e Manuel Ramos Pinto. Em agosto de 1918, mais três capelães portugueses partiram para França: Domingos Afonso do Paço, Pároco de Viana do Castelo; Casimiro Rodrigues de Sá, Pároco de Padronelo; e José de Pinho, Pároco de Penafiel.

56

O Corpo de Capelães Voluntários em França chegou a ter um efetivo máximo de 36 padres. Em fevereiro 1918 partiram também alguns sacerdotes como capelães para Moçambique. Entre eles ficam os seguintes nomes: Manuel Tavares da Silva; João Luís Esteves (de S. Pedro de Arcos, Ponte de Lima); Jorge Duque Nogueira; José da Silva Moroso (Pároco de Vila Chã, Alijó); Artur Tavares Dias (Chãs de Tavares, Mangualde); e Alfredo Bento da Cunha.

4.3. Manifestações de fé Os jovens portugueses que os governos republicanos mobilizaram para a Primeira Guerra mundial há um século estavam profundamente marcados pela fé cristã. Por isso, as nossas tropas, quer as que foram para a África, tiveram, como acima se viu, o acompanhamento de padres católicos, como seus capelães. Pese embora o anticlericalismo de toda a propaganda republicana, a fé não só se manteve como até parece ter-se reforçado entre aqueles que tiveram a desdita de serem enviados para as “frentes” de combate. Ora aconteceu que os soldados portugueses que foram para a Flandres tiveram a proteção de um Cristo Crucificado que sempre os acompanhou nas trincheiras e que com eles foi ferido “mortalmente” durante a Guerra. Essa imagem de Cristo Crucificado acabaria por vir para Portugal no 40.º aniversário da Batalha de 9 de Abril, encontrando-se no Mosteiro da Batalha, junto ao túmulo do Soldado Desconhecido.


MANUEL AUGUSTO DIAS

A história do “Cristo das Trincheiras” Os portugueses que integraram o Corpo Expedicionário Português foram enviados para a Flandres, mais concretamente para a região entre Lacouture e Neuve-Chapelle, onde encontraram um cruzeiro que, colocado num alto, dominava totalmente a paisagem plana que se estendia a seus pés. Durante quase todo o tempo de campanha, esse Cristo pregado na cruz ali esteve ao vento, à chuva e também na Guerra, atraindo os olhares dos soldados portugueses, muitos dos quais crentes. No dia 9 de Abril de 1918, dia da tristemente célebre Batalha de La Lys, sobre aquele espaço caiu um nunca mais acabar de fogo de artilharia, que se prolongou durante várias horas. Foi a ofensiva da Primavera de 1918 do exército alemão. Neuve-Chapelle quase desapareceu do mapa, na sequência desse ataque maciço. Aquele chão ficou cheio de corpos de soldados e entre eles, cerca de 7.500 eram portugueses (da 2ª Divisão do CEP), desaparecidos, mortos e feridos. No final desta terrível batalha para as tropas portuguesas, apenas o Cristo se manteve em pé, mas também mutilado. A batalha amputou-lhe as pernas, parte do braço direito e uma bala furou-lhe o peito. Se fosse de carne viva, como os nossos soldados, eram um dos milhares que estavam prostrados, feridos de morte.

Fig. 22 Um aspeto do Cristo das Trincheiras após a Batalha de La Lis

Finda a batalha, o “Cristo das Trincheiras” regressou ao seu “pedestal”, mas os portugueses nunca mais o esqueceram e o Governo de Salazar, já na década de 1950, pediu ao governo francês aquele Cristo “mutilado” a quem recorreram, com muita fé, os nossos soldados e os que sobreviveram acreditaram que foi este “Cristo” que lhe valeu. E o Governo francês correspondeu ao pedido e hoje esse mesmo “Cristo das Trincheiras” está junto ao túmulo do Soldado Desconhecido, na Sala do Capítulo do Mosteiro da Batalha.

57


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

da África (Moçambique), para o Panteão do Mosteiro da Batalha. Foi, ainda, decidido que a cerimónia seria efetuada no dia 9 de abril de 1921 (3.º aniversário da Batalha de La Lys) e esse dia, os governos republicanos, declararam-no mesmo feriado nacional. O “Cristo das Trincheiras” chegara a Lisboa de avião, cinco dias antes, Sexta-feira Santa. Ficou em exposição na Capela do edifício da Escola do Exército até 8 de abril, data em que foi conduzido ao Mosteiro da Batalha e no dia seguinte, a 9 de abril de 1958, foi colocado à cabeceira do túmulo do “Soldado Desconhecido”, na sala do Capítulo, onde ainda hoje se encontra. A imagem foi acompanhada desde França por uma delegação de portugueses antigos combatentes da Grande Guerra, que residiam em França, e por uma delegação de deputados franceses, chefiada pelo Coronel Louis Christians. As cerimónias foram apoteóticas e milhares de portugueses desfilaram perante a imagem em Lisboa. Fig. 23 O Cristo das Trincheiras no mosteiro da Batalha, junto ao túmulo do Soldado Desconhecido

Efetivamente, os soldados que pereceram na 1.ª Guerra Mundial foram lembrados para sempre. Um pouco por toda a Europa se construíram monumentos em sua memória, ou se honraram os restos mortais, daqueles que morreram sem a devida identificação dos respetivos cadáveres. Foi o caso de Portugal que, no dia 18 de março de 1921, assistiu à transladação de dois Soldados Desconhecidos, um da França (precisamente da Flandres) e outro 58

No dia 9 de abril, pelas 11 horas, compareceram no Mosteiro da Batalha numerosas autoridades civis e militares, nomeadamente, os Embaixadores de Portugal em França e de França em Portugal, os Adidos Militares da França, da Bélgica e dos Estados Unidos, as altas patentes portuguesas do Exército, Marinha e da Força Aérea. As cerimónias iniciaram-se ao meio dia. O “Cristo das Trincheiras” foi então colocado à cabeceira do túmulo do “Soldado Desconhecido”. Terminadas as orações o Adido Militar Francês conferiu aos dois “Soldados Desconhecidos” duas Cruzes de Guerra, as quais foram depositadas sobre a campa rasa.


MANUEL AUGUSTO DIAS

O Jornal Diário de Lisboa, sob o título “As cerimónias de hoje na Batalha / Em comemoração do 9 de Abril / Tiveram excepcional realce com a presença / Do ministro da Defesa e da missão especial francesa”, chama o assunto à 1.ª página, onde os enviados especiais do jornal escrevem o seguinte preâmbulo: «- Nove de Abril. Quarenta anos transcorreram sobre o sangrento desastre do Corpo Expedicionário Português nas trincheiras. Neuve Chapelle. Mas há derrotas que são vitórias, quando delas se pode tirar a lição da superação do homem pela vontade heroica. É a morte que tantas vezes confere um sentido á vida! Os soldados da Republica Portuguesa que, há 40 anos na batalha de La Lys, tombaram, em defesa dos ideais de Paz e Liberdade das democracias aliadas, sob as vagas de assalto das baionetas germânicas, decerto tiveram consciência, no momento extremo do seu sacrifício, de que jamais a Pátria os esqueceria. Não se esqueceu o Mundo. Os próprios inimigos tudescos tiveram a elegância de se curvar perante o inegável valor desses soldados lusitanos (…)».

O primeiro Natal na Guerra Foi em dezembro de 1917 que os combatentes portugueses do CEP passaram o seu primeiro Natal muito longe das famílias, num ambiente hostil em todos os aspetos. Era tempo de Guerra, de frio, humidade e de carências de toda a ordem, tanto físicas como afetivas.

Fig. 24 As nossas tropas na Frente de combate (in Ilustração Portuguesa, 31 de dezembro de 1917) 59


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Em Portugal continental, apesar de não haver propriamente guerra a situação também não era boa. Sidónio Pais ocupara, recentemente, o poder por via revolucionária, instituíra a “República Nova” e a vida política e social estava agitada. As famílias sentiam-se incompletas para a celebração da “Festa da Família” – nome do “Dia de Natal” no calendário republicano – com tantos dos seus membros mobilizados para a Guerra e os preços de alguns produtos, nomeadamente do pão, do azeite e da batata, eram elevados para os rendimentos dos mais pobres (o ordenado médio diário era 60 réis, ou seja 60 centavos do escudo). O jornal “República”, de 27 de dezembro de 1917, nas duas primeiras colunas da sua primeira página lembra os nossos expedicionários, sob o título: “Natal de Guerra”. É daí que transcrevemos alguns excertos que se seguem. «(…) Mas os que estão longe, os soldados, os que andam na guerra? Esses, sim. Esses são os mais desgraçados. (…). São milhares nas terras ensanguentadas da França e na África longinqua. E é o primeiro Natal que os de França passam na guerra. Lembremo-nos dêles, que todos temos lá parentes ou gente querida e que êste Natal deve ser bem triste para a sua alma nostálgica de portugueses. Para os chorar? Não. (…). Lembremo-nos dêles para os exaltar. É certo que nêste dia há de haver por êsse país fóra muitas consoadas humedecidas de lágrimas, muita tristeza, muita dôr, muitas saudades dos ausentes e que nas trincheiras distantes milhares de homens, al60

guns a cair varados pelas balas, terão mais viva do que nunca a visão nostálgica das coisas suaves que êste Natal de guerra lhes fez abandonar e porventura perder para sempre. Mas é verdade tambem que uma missão heroica os chamou a longes terras e que o seu sacrifício é necessário á independência, á grandeza e ao futuro da Pátria. Não os choremos. Lembremo-nos só dêles para os bemdizer e para os exaltar. Eles virão… E noutro Natal – no próximo talvez – sentar-se-hão ás nossas mezas e todas as lágrimas serão enxugadas e todas as tristezas passarão e o sol de Portugal parecer-nos-há mais vivo e mais lindo. Quando êles voltarem… Sim. É assim que devemos falar dêles nesta hora saudosa. Há de ser lindo. (…) E no Tejo claro das conquistas, doirado pelo sol, as suas figuras de guerreiros hão de ter aos nossos olhos extáticos as proporções daqueles velhos nautas, destemidos e herois, os nossos maiores, que voltaram também num belo dia, nas náus antigas, depois das descobertas e com o convés ainda cheio das rosas da partida… (…). E voltarão talvez para estarem cá no Natal do ano que vem. E será suavissimo êsse Natal. E mais uma vez o menino dôce de cabelos loiros fará um milagre: o milagre de no-los restituir.» Esse “milagre”, como sabemos hoje, para grande número de soldados portugueses só ocorreu no ano de 1919, mas no Natal de 1918, felizmente, já a primeira Guerra Mundial havia terminado.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Sabemos que no primeiro Natal, em Guerra, no ano de 1914, tinha havido na “Frente de Combate” uma espécie de “Trégua de Natal”, na região da Bélgica e da França. «(…) No dia 24 de Dezembro, porém, em certos pontos da frente ocidental, os alemães colocaram nos parapeitos das trincheiras árvores iluminadas e os Aliados juntaram-se a eles numa paz improvisada: foi a trégua de Natal da Primeira Grande Guerra (…). Depois de promessas gritadas entre trincheiras, alguns soldados dedicaram cânticos de Natal aos adversários. Outros emergiram para dar apertos de mão e partilhar cigarros. Muitos concordaram a estender a paz até ao dia de Natal para se poderem encontrar de novo e enterrar os mortos. Cada lado ajudou o outro a cavar sepulturas e a realizar homenagens fúnebres. Os soldados partilharam comida e presentes, trocaram botões de uniformes como lembranças e defrontaram-se em partidas de futebol (…)». Relativamente ao Natal de 1917, primeiro ano em que os nossos combatentes estavam em França, uma outra fonte que consultámos (www.4tons.com), refere o seguinte:

«O Natal de 1917 ocorreu durante a Primeira Guerra

Mundial. Na França, exércitos de milhões de soldados enfrentavam-se uns aos outros em desesperados ataques. Os alemães e os aliados viviam em frias e lamacentas trincheiras no solo, em linhas paralelas, com centenas de metros de arame farpado, e uma faixa de “terra de ninguém” entre eles. Cada lado golpeava o outro com milhões de quilos de bombas e gases venenosos. Dezenas de milhares eram feridos e mortos. Ao descerem as sombras da noite de Natal, os homens pensaram com saudade no Natal no seu lar. E essa

saudade fê-los odiar ainda mais a horrível guerra que se travava. Ela parecia tão pecaminosa, comparada ao Natal. Repentinamente, às 10h e 30 minutos da noite, a artilharia alemã parou (…). Os soldados aliados interrogaram-se sobre o que estaria acontecendo. O que é que os alemães estariam a preparar? Estariam a preparar-se para usar gases venenosos de novo, ou esse intervalo seria antes do ataque maciço? Pouco tempo depois, os canhões dos aliados, na retaguarda, ficaram em silêncio também. Os soldados, nas trincheiras, aguardaram ansiosamente no meio da estranha calmaria que se abateu sobre a frente de batalha. Isso era tão estranho, após o grande barulho da artilharia, que os soldados falavam cochichando. Chegaram, então, as incríveis notícias: o alto comando alemão havia solicitado uma trégua para o Natal! Quando faltavam dez minutos para a meia-noite, os clarins soaram o toque de cessar-fogo. A trégua era oficial! De ambos os lados fogueiras iluminaram a noite escura. Os aliados viram então os soldados alemães saírem de suas trincheiras sem quaisquer armas. Pararam junto aos montões de barro e tiraram seus capacetes. Então alguém começou a cantar “Tudo é paz. Tudo amor.” Pasmados os soldados aliados saíram também de suas trincheiras e uniram as suas vozes no maravilhoso hino de Natal. Antes de terminarem, engenheiros de todos os lados abriram caminhos através do arame farpado. Momentos depois, os soldados que haviam sido inimigos passaram através dos buracos abertos no arame. De mãos estendidas, cumprimentaram-se como se se tratasse de amigos que há muito tempo se não viam. Intérpretes ajudavam-nos quando possível, 61


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

mas as diferenças linguísticas não pareciam ter importância. Alegremente mostraram fotografias de familiares. Experimentaram os chapéus e capas uns dos outros, e riram da sua nova aparência. Então alguém sugeriu que deveriam trocar presentes também. E, assim, voltaram apressadamente às trincheiras a fim de ver o que encontrariam. Os aliados trouxeram latas de doces e de carne, e os alemães deram-lhes salsichas e outros alimentos. Os capelães dos dois lados improvisaram, até, um serviço religioso.»

4.4. As cartas e os livros Apesar de muitos dos soldados portugueses mobilizados para a Guerra não saberem ler nem escrever (alguns até aprenderam no tempo que lá permaneceram) as cartas eram a única ligação possível com a família e com a terra natal. Este tipo de correspondência era dirigido normalmente às mães (como a que se encontra na imagem), às namoradas, às esposas, aos pais, aos irmãos e, às vezes, até aos filhos e nelas se queixavam naturalmente dos padecimentos que diariamente sofriam. Estas cartas eram censuradas pelos responsáveis que, às vezes, se davam ao trabalho de cobrir com tinta negra a palavra ou palavras que não podiam deixar passar (no excerto da carta, na imagem, está sublinhada a expressão “mortos de fome” que certamente, seria cortada se o seu autor a tivesse pretendido enviar). Doutras vezes, estas cartas nem sequer chegavam ao destino, eram imediatamente destruídas ou enviadas para os superiores, havendo algumas no Arquivo Histórico Militar.

Fig. 25 Soldados portugueses escrevendo cartas, nas trincheiras 62


MANUEL AUGUSTO DIAS

mas palavras ilegíveis assinaladas), e interessante quanto ao seu conteúdo. O seu autor foi o soldado José Martins, natural de Casas Novas, do concelho de Chaves. «frança, 11 do 8 de 1918

Minha Crida e Saudosa mãe Comuito gosto e prazer lancei mão ha pena Somente para Saver da sua emportente Saude e Juntamente atoda a nossa familia pois que eu fico bem Graças A Deus minha minha mãe tenho [ilegível] que [ilegível] de licença peço-lhe que me mande 30 milrreis que com algum que eu tenho para ver se lá vou que este dinheiro não se gasta todo mas é preciso mostralo para-se [ilegível] Alguma demora

Fig. 26 Nesta carta dirigida por um soldado português, na expressão “i trazemnos mortos de fome” o censor, certamente não deixaria de cortar as últimas três palavras

As cartas serviam também para pedir dinheiro, dar notícias de outros combatentes do mesmo lugar ou de lugares vizinhos e para tranquilizar os familiares. A carta que se a seguir se transcreve foi divulgada por Gil Manuel Morgado dos Santos, no seu livro “A Saga de um Combatente na I Guerra Mundial, de Chaves a Copenhaga” (2014), escrita num português que evidencia grandes dificuldades no domínio da escrita, mas que é entendível (apesar de algu-

Pellos Cumboios tellos para gostar não esteja arreperare para a diracão mande-mo o mais breve que possa que tem de vir num chéque mande-mo numa carta rezistada que elle não-se perde que os meus colegas também o teem recevido aver-se vou a essas terras que estes lêdroes não nos deixão lá ir que as tropas já-se revoltarão que até os entregarão as englezes que eu [riscado] ahi não gostava de ver os defuntos mas agor já não me custa nada que se vêêm morrer todos os dias. Minha mãe tenho para lhe dizer que no dia nove de abril que tevemos um combate que tivemos de Cavar todos que todo o C.E.P. cavou e se os Alemães dão outro avanço o C.E.P. acavou que atté tive de [ilegível] a minha roupa toda que ande-mos 5 dias que não comemos nada e a nossa roupa da cama era o chão andemos 22 dias com mantas e a nave e o gelo a cair que o encoento nos escapemos muitas graças que muitos meus camaradas lá ficarão como foi o Antonio Pialho que ficou com a cabeça cortada. E o Albaro da tia Izabêl também morreu ó está prezioneiro e o Elias 63


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

e outro cabo de Rebordondo estes morrerão da nossa terra hôra o José Chiscaro ficou bôm e o Antonio Jorge ficou sem novidade que eu estive depões do combate com elles agora já há muito tempo que não estive com elles e não esteja com quidado em mim que eu estou muito longe das trinxeiras que estou ao pé de Paris num depozito de bagagens não me falta couza alguma muitos abraços deste Seu filho José Martins. A Deus A Deus».

A importância dos livros Os livros e os jornais portugueses revelaram-se de uma grande importância para os nossos combatentes integrados no Corpo Expedicionário Português. Para aqueles que já sabiam ler era uma excelente forma de passar o tempo, em comunhão, por via da leitura, com a cultura da sua saudosa Pátria. Para aqueles que não sabiam ler era um estímulo à aprendizagem para também poderem desfrutar daquele prazer. E houve muitas centenas de soldados portugueses que aprenderam a ler e a escrever durante o cumprimento do serviço militar e mesmo durante o tempo em que combateram na frente ocidental. Os regulamentos militares sempre se preocuparam com esta matéria, determinando que os comandantes das unidades deveriam estabelecer a hora da consulta dos livros nas bibliotecas regimentais, para oficiais, sargentos e praças.

Fig. 27 A correspondência expedida e recebida pelo CEP, durante os anos da Guerra (1917-1919)

Os números da correspondência expedida (mais de 14 milhões e meio) e recebida (quase 18 milhões), mais a do correio interno do Corpo Expedicionário Português (mais de meio milhão) de acordo com o gráfico que se publica dão para perceber a importância que este meio de comunicação tinha para os nossos combatentes e suas famílias. 64

Luz de Almeida, Inspetor das Bibliotecas Populares e Móveis preocupou-se com a reorganização dos Serviços das Bibliotecas e Arquivos Nacionais das bibliotecas móveis destinadas ao Corpo Expedicionário Português. Desta importância atribuída ao livro, resultou também a produção de diários e de memórias, produzidos tanto por praças como por sargentos e oficiais. Mas houve também escritores e jornalistas que muito escreveram sobre a primeira Grande Guerra. Há livros de memórias de militares que serviram no CEP, como os do general Costa Gomes, comandante da 1.ª Brigada, mas também os há da autoria de Jaime Cortesão, de Augusto Casimiro


MANUEL AUGUSTO DIAS

ou de André Brun, que deixaram a sua marca na literatura portuguesa. Além do Estado, houve uma série de instituições e associações cívicas que se envolveram na constituição de bibliotecas móveis destinadas ao Corpo Expedicionário Português. Entre elas recorde-se a Cruzada das Mulheres Portuguesas, as Madrinhas de Guerra, a Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha ou a Cruz Verde, que organizaram a recolha de livros e jornais e providenciaram o seu envio para os soldados. Uma palavra de reconhecimento, também, para os capelães, com destaque para os padres José Ferreira de Lacerda (de Leiria) e Avelino de Figueiredo que fundaram as Casas de Leitura para os soldados na “Frente”. Importa ainda recordar a iniciativa lançada pelo jornal “O Século”, em maio de 1917, que, à semelhança do que já se fazia no Reino Unido, apelou à população portuguesa para que enviasse jornais, mesmo depois de lidos, para os nossos soldados. Ao mesmo tempo apelou ao Governo para que colocasse caixas em vários pontos da cidade, para juntar estes jornais oferecidos pelo público. Dando o exemplo, este periódico enviava, todos os dias, cerca de centena e meia de jornais para o CEP. Também “A Ordem” e outros títulos lhe seguiram o exemplo. Entre os milhares de livros que chegariam à linha da frente, havia romances, livros de poesia e de teatro, romances históricos, livros de aventuras, livros de história, manuais escolares, livros educativos e tantos outros.

interior, Machado Santos, de Júlio Dantas, de Luz de Almeida e de Fidelino de Figueiredo à sede da Inspeção das Bibliotecas Populares e Móveis, instalada no edifício da Biblioteca Nacional. Aí se refere que milhares de livros irão ser enviados para os combatentes portugueses: «são vinte as bibliotecas com 4.000 livros que vão ser enviadas para França, com destino ao nosso corpo expedicionário. / A convite do sr. dr. Julio Dantas, o sr. ministro do interior visitou as salas onde estão instaladas a livraria do antigo convento de Varatojo e a biblioteca de Fialho de Almeida. / No final da visita o sr. Machado Santos teve palavras de muito louvor para os funcionários da Biblioteca Nacional».

4.5. Iniciativas de apoio aos nossos soldados Após o início da 1.ª Grande Guerra surgiram várias associações cívicas que procuraram angariar fundos com destino aos nossos soldados, que combatiam em África e na Flandres, ou às suas famílias, algumas das quais, sem eles, ficavam muito fragilizadas. Uma dessas iniciativas foi “A Venda da Flor”, que decorreu em Lisboa, no dia 15 de março de 1917, por iniciativa de um grupo de mulheres. Já no final do mês de março de 1917 a iniciativa a favor dos soldados do CEP passou por um “Serão de Arte”.

Sobre esta temática, “O Século” de 12 de janeiro de 1918, na 1.ª página dá a notícia da visita do ministro do 65


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

país, onde a Cruzada das Mulheres Portuguesas tinha os seus núcleos, organizou, em 1917, cursos de enfermagem destinados a formar enfermeiras para servirem nos hospitais militares do País e nos corpos expedicionários. A 1.ª Festa da Flor de Lisboa teve lugar há cem anos, ocorreu na tarde do dia 15 de março de 1917, antecipando, em cerca de uma semana, o calendário de entrada na “Primavera”. Pelos relatos da imprensa do tempo, as senhoras da alta sociedade lisboeta desceram às ruas e praças da cidade, misturaram-se com o povo e, em troca de uma flor colocada ao peito de cada homem que encontravam, recebiam um donativo em dinheiro, que, todo somado, deu algumas dezenas de contos, como informa a “Ilustração Portuguesa”, de 26 de março de 1917. Fig. 28 Jaime Cortesão comprando uma flor (Ilustração Portuguesa, 26-3-1917)

A “Festa da Flor” Uma das associações que se encarregou de angariar fundos para os nossos expedicionários foi a “Cruzada das Mulheres Portuguesas” fundada no dia 20 de março de 1916, por iniciativa de um grupo de mulheres, entre as quais se encontrava Elzira Dantas Machado, a esposa do então Presidente da República, Bernardino Machado. Os seus Estatutos foram aprovados por Alvará do Governo Civil de Lisboa a 19 de agosto de 1916 e existiu até ao início do Estado Novo, tendo sido sua última Presidente, Ana de Castro Osório. Para além de iniciativas como a Festa da Flor, que ocorreu em várias cidades e vilas do 66

O jornal republicano conservador “A Opinião”, de 15 de março de 1917, noticia com mais pormenor a 1.ª “Festa da Flor”, da capital, a favor dos combatentes portugueses na Grande Guerra, a que, segundo aí se escreve, aderiu a população de Lisboa tendo evidenciado significativo entusiasmo: «a população da capital, sempre generosa e bôa, soube corresponder, com uma tocante unanimidade, á sympathica iniciativa tomada por algumas senhoras da nossa sociedade elegante. Festa de graça, festa de beleza, tao humanitaria pelos seus fins, como encantadora pela forma da sua realização, quem entre nós, lhe poderia negar o seu concurso?». De acordo com o jornal “A Opinião”, às duas horas da tarde, uma Comissão da entidade organizativa foi recebida em Belém. O Presidente da República, Bernardino Machado «esteve conversando com as senhoras uma das quaes lhe colocou á lapela uma flôr, recebendo em seguida um donativo importante».


MANUEL AUGUSTO DIAS

Às 3 da tarde, relata o mesmo periódico, «a venda da flor tomou grande intensidade, espalhando-se pela cidade 160 senhoras, que entravam nos carros electricos, faziam parar os automóveis, visitavam bancos, redacções, etc. / O Banco de Portugal deu um conto de reis e o Montepio Geral, duzentos mil reis.» Em frente ao Parlamento, as senhoras também receberam valiosos donativos dos deputados e senadores. Os ministros deram 10$000 reis cada um. «Algumas senhoras que passavam na rua do Carmo colocaram flores ao peito dos moços de fretes. Nem um deixou de dar o seu obulo. O mesmo sucedeu n’outros pontos da cidade. Um inglez declarou que queria bater o record das flores dando por cada uma 500 réis. Ás 4 horas da tarde possuia 20. Damas elegantes vestidas entravam em tabernas e carvoarias. O acolhimento foi sempre o mesmo em toda a parte».

Um Serão de Arte a favor dos nossos combatentes Cerca de 15 dias depois da “Festa da Flor”, surgiu outra iniciativa destinada ao apoio aos nossos combatentes na Grande Guerra – Um Serão de Arte, no qual estiveram envolvidos Sousa Lopes e Afonso Lopes Vieira. O 1.º como artista, mas seria também soldado. Adriano de Sousa Lopes nasceu em Vidigal, nas proximidades de Leiria, no dia 20 de fevereiro de 1879. Foi um pintor ligado ao movimento modernista português. A sua primeira exposição individual foi precisamente esta, em finais de março de 1917. Seria também neste ano que partiria para

Fig. 29 Um soldado ferido na guerra, da autoria de Adriano de Sousa Lopes, pintor oficial do CEP

a Frente de Combate como oficial artista, imortalizando, pela pintura, muitos dos momentos em que participou o exército do Corpo Expedicionário Português. Alguns dos seus quadros estão atualmente no Museu Militar Português. Em 1978, a Câmara Municipal de Lisboa atribuiu o seu nome a uma das ruas da capital. O 2.º, Afonso Lopes Vieira, teve a honra de inaugurar a Exposição. Lopes Vieira nasceu em Leiria um ano antes do conterrâneo pintor (26 de janeiro de 1878) e já era então um reputado poeta nacional. Frequentaria a Universidade de Coimbra, tornando-se bacharel em Direito, no dealbar do século. Ainda tentou dedicar-se à advocacia, como o pai, mas seriam as letras a sua vocação e realização profissional. Mas voltando ao Serão de Arte a que acima aludimos, entre os vários meios de comunicação que se lhe refe67


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

rem, optámos por transcrever algumas passagens de “O Seculo”, do dia 29 de março de 1917, edição da noite, onde, na sua primeira página, se faz referência a essa primeira Exposição do pintor Sousa Lopes que ocorreu na noite de 28 de março de 1917, há cem anos, no Salão da Sociedade Nacional de Belas Artes. O produto desta Exposição reverteria a favor dos feridos da Guerra.

As Madrinhas de Guerra

A Exposição, segundo este periódico, contava «com mais de duzentos quadros, perto de cem desenhos e aguas-fortes, esculturas, retratos, paisagens, manchas, figuras, sombras, bustos (…)». Este Serão de Arte teve no ato inaugural, a convite do artista, a presença do poeta leiriense Afonso Lopes Vieira que, a certa altura afirmaria: «O pintor Sousa Lopes sente, como nós sentimos todos, que a nossa epoca deve ser de absoluta, de fervente, de heroica solidariedade com os que combatem. E se a guerra, até agora, nos interessava já tão directamente, como portuguezes e latinos, esse interesse passou a ser o da nossa propria alma e do nosso próprio sangue, desde que nas linhas de combate, ao norte de França, se encontram (…) soldados que o nosso paiz enviou para a frente». Mais adiante, no discurso que foi publicado em vários jornais, Afonso Lopes Vieira revela outra razão de esta Exposição tratar também da Guerra e do seu resultado pecuniário reverter a favor dos nossos combatentes: «é que ele proprio vae partir dentro em breve para o campo de batalha, para pintar aí os aspetos mais belos que a nossa cooperação militar vier a produzir. O artista é, pois, um soldado que combaterá com os seus pinceis, como os outros combatem com as suas armas, e vae combater por honra de Portugal e da nossa Arte, servindo ao mesmo tempo um ideal de pintor e de portuguez». 68

Fig. 30 A edição n.º 8 da “Alma Feminina” – Boletim Oficial do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas dá destaque às Madrinhas de Guerra


MANUEL AUGUSTO DIAS

Há cem anos milhões de pessoas sofriam diariamente as afrontas de uma guerra que não havia maneira de parar. Nos campos de batalha, homens de muitas pátrias, infligiam-se toda a espécie de sevícias procurando incutir no “inimigo” o medo, mesmo o terror, acreditando que assim a vitória fosse mais rápida e fácil. Curiosamente, ou talvez não, porque o Homem sempre foi um poço de contrastes, enquanto uns se matavam, outros seres humanos davam tudo o que podiam para tentar minorar o sofrimento dos soldados e das suas famílias. Já acima referimos algumas iniciativas que iam precisamente neste sentido, como “A Festa da Flor” ou “Serões de Arte”. Agora vamos dar destaque às “Madrinhas de Guerra” transcrevendo do seu Boletim n.° 8, de Agosto de 1917, algumas passagens que ajudam a compreender melhor quem eram e quais os seus objetivos. As “Madrinhas de Guerra” eram uma «comissão de pessoas perfeitamente conhecedoras do alcance moral e social da obra a que se dedicam e a quem cabe o encargo de dirigir e auxiliar, sendo preciso, as senhoras que se disponham á humanitaria e simpatica missão de ligar interesse e repartir um pouco da sua sensibilidade com aqueles que se estão batendo para nos garantir o socego do nosso lar e o bem estar geral». As Madrinhas de Guerra surgiram quase no início deste conflito mundial e prestaram excelentes serviços. O seu principal propósito é «auxiliar os soldados no campo de batalha ou quando doentes nos hospitais, fazendo-lhes compreen-

der que, apesar de longe das suas terras, eles não são esquecidos, e que os que ficam procuram corresponder ao seu sacrificio velando-lhes pelas familias e tomando uma parte sentida nas suas alegrias e nas suas tristezas. A ideia é imensamente simpatica, não só pelo grande fundo da bondade que encerra, mas, ainda, por poder ser realisada por qualquer senhora». Em Portugal, como noutros países em guerra estas “Madrinhas” conseguiram ser, efetivamente, um oásis num deserto de desumanidade. «As Madrinhas de guerra foram instituidas para conseguir um fim generoso e nobre. Esse fim (...) é constituir cada madrinha, de per si, uma segunda familia para o soldado, interessando-se pelo seu destino e dos seus, rodeando-o de mimos, dando-lhe, emfim, a impressão de que, exactamente, porque se está batendo, e o seu sacrificio é muito grande, é que o reconhecimento e dedicação que ele nos merece é, também, enorme e profundo». Concluímos este espaço dedicado às Madrinhas de Guerra, com a transcrição de uma carta de Diamantino Duarte Soares, publicada em “A Semeadora”, 30 de dezembro de 1917. «Minha boa e ilustre Madrinha Desejo a sua prosperidade primeiro que tudo. Eu bom felizmente. Acabo de receber hoje o vosso memorável livro que eu ancioso esperava, porque, logo pelo titulo que vi no seu jornal, entendi, que devia ser importante. Ainda não pude ler muitas paginas, mas por essas que já li e pelas gravuras, vi que o livro que v. ex.ª tão generosamente se dignou oferecer-me não é um livro, mas sim uma verdadeira gloria da Patria Lusitana; uma maravilha na literatura, uma joia preciosa para um bom patriota! Sinto-me feliz, minha boa senhora, por possuir hoje um tão precioso registo 69


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

dos nossos feitos heróicos, das nossas conquistas, dos nossos grandes homens! Quando Camões estava á morte e via fugir-lhe a Patria, disse que se sentia feliz por morrer com a sua Patria; pois eu hoje sinto-me igualmente feliz, porque se morrer, morro longe da Patria, mas morro acompanhado da «Minha Patria», titulo tão bem merecido por este livro! Fico muitíssimo obrigado à minha Madrinha, e creia que dez ou vinte francos não me produziriam tão grande contentamento como o vosso glorioso livro. Recebi em 2 do corrente um postal da Madrinha, dentro dum envelope onde vinha também uma carta de minha Mãe, e em 4 do corrente igualmente recebi o seu postal e em que me dizia que me ia mandar o livro. Em 7 do corrente recebi outro postal assinado pela sr.ª D. Albertina Benício, em que igualmente me indicava a vinda do livro. Pela reorganisação das tropas de telegrafistas, a minha direcção de futuro, será: “Diamantino Duarte Soares, 2.º sargento da 1.ª Companhia Divisionária de Telegrafistas – Q.G.1 do C. E. P.” O pedido da minha Madrinha para que eu lesse o livro aos meus soldados, será satisfeito, para que se enraíze melhor nos seus corações o amor da Patria, se é que para alguns esteja desvanecido. Pô-lo-hei á disposição dos homens da minha estação e depois a algum outro da companhia, quando eu veja que é capaz de mo restituir, pois eu hoje fico com uma amisade cega ligada a este livro, cuja falta sentiria bastante. Sou, de v. ex.ª, afilhado muito respeitador / Diamantino Duarte Soares».

4.6. A visita do Presidente da República aos nossos soldados

Fig. 31 Bernardino Machado 1851-1944

Bernardino Luís Machado Guimarães nasceu no Rio de Janeiro, no dia 28 de março de 1851, sendo o único Presidente da República Portuguesa a nascer fora do território nacional. 70


MANUEL AUGUSTO DIAS

Foi duas vezes Presidente da República e das duas vezes viu o seu mandato ser interrompido por revoluções: 1.º, a 5 de dezembro de 1917, pelo golpe de Sidónio Pais, e a 28 de maio de 1926, pela revolução nacionalista de Gomes da Costa. Em outubro de 1917, Bernardino Machado faz a primeira deslocação de um Presidente da República Portuguesa ao estrangeiro, neste caso, para visitar as nossas tropas em operações militares na Frente de combate. Na frente das operações militares portuguesas em França, os nossos expedicionários recebem a visita do seu Presidente da República (de 8 a 17 de outubro), bem como de Afonso Costa, presidente do Conselho de Ministros, e de Augusto Soares, Ministro dos Negócios Estrangeiros. O jornal “A Manhã” de 8 de outubro de 1917 dá a notícia da partida para França, de Bernardino Machado: «Vai partir para França, de visita ao sector português, o sr. presidente da Republica. Não é uma viagem politica; não é uma viagem diplomatica; é uma romagem patriotica (…)» Bernardino Machado aproveitou a ocasião para se avistar com alguns líderes políticos estrangeiros, nomeadamente, Afonso XIII, Rei de Espanha (9 de outubro de 1917), Raymond Poincaré, Presidente da República de França (10 de outubro), Jorge V, Rei de Inglaterra (18 de outubro) e Alberto I, Rei da Bélgica (22 de outubro). Foi a primeira vez que um Presidente da República Portuguesa se deslocou ao estrangeiro. Devido à censura pouco se sabe em pormenor do contacto do Presidente com os soldados portugueses.

Fig. 32 Bernardino Machado visita soldados feridos, no Hospital da Base n.º 2, em Ambleteuse

O jornal “O Seculo” de 25 de outubro de 1917, na primeira página, dá a notícia pormenorizada do regresso do chefe do Estado depois de ter estado na “Frente de Combate”. Regressou de comboio, desde Hendaia até Lisboa. Naquela última cidade francesa antes de entrar em território espanhol, o Presidente da República visitou o Casino local onde, algum tempo depois, iria ser instalado o Hospital Português. De Hendaia o comboio presidencial seguiu para Irún, onde Bernardino Machado foi recebido pelas autoridades espanholas da vila que fizeram questão de cumprimentar o Presidente Português. Em Valladolid entraram várias personalidades espanholas que acompanharam o Presidente português até Salamanca. Em todas as estações onde o comboio parava, a Guarda Civil formava e apresentava armas, juntando-se também muitos curiosos para verem o comboio presidencial, mas os polícias espanhóis 71


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

que acompanhavam o Presidente não os deixavam aproximar demasiado. Às 3h45m o comboio passou a fronteira para Portugal e parou em Vilar Formoso, sendo lançados alguns morteiros e foguetes. Havia muita gente à espera de Bernardino Machado e uma Banda Filarmónica tocou a “Portuguesa”. O Presidente apareceu à janela da carruagem e foi saudado com muitos “vivas”. Às 9 horas o comboio chegou à Pampilhosa e aí entraram os Ministros da Guerra, do Trabalho, o Comandante da GNR e outras personalidades, estando a guarda de honra a cargo do Regimento de Infantaria 28. 25 minutos mais tarde a composição chegava a Coimbra. Várias autoridades locais estiveram presentes, formou o Batalhão de Infantaria 35, com a respetiva banda que interpretou o Hino Nacional. O comboio seguiu para o Entroncamento, onde chegou ao meio dia, havendo novas manifestações de regozijo que se repetiram em Santarém com a presença do Batalhão de Infantaria 34 e várias autoridades militares, centros republicanos, coletividades e muito povo. Depois, o comboio só parou em Campolide, onde entraram pessoas da família de Afonso Costa. Em Lisboa, muito povo aguardava o chefe de Estado, bem como os membros do governo, todo o corpo diplomático, governador civil, administradores dos concelhos do distrito, oficiais e adidos militares, magistrados e muitas outras pessoas. Escreve “O Século” que «entre constantes aclamações e palmas, organisou-se o cortejo, abrindo-o uma força de cavalaria da guarda republicana, de espadas desembainhadas, seguindo na primeira carruagem os srs. presidente do ministério e ministros dos estrangeiros e trabalho. (…) Fechava o cortejo uma força de cavalaria da guarda republicana fazendo cauda inumeros automoveis e trens com personalidades em destaque e a restante comitiva do chefe de estado. (…) Durante o trajeto o sr. presidente foi alvo de entusiasticas manifestações de simpatia popular». 72

O filho do presidente da República também foi para a Guerra

Fig. 33 O alferes de cavalaria Bernardino Machado em França, em1917

A 1.ª Guerra Mundial tocou a todos. Até o filho mais velho do então Presidente da República, Bernardino Machado, nela participou. Na frente de batalha, vendo-se impedido de atuar enquanto militar de cavalaria, ofereceu-se para exercer a função de oficial sinaleiro, com responsabilidades na montagem e segurança das linhas de comunicação, uma atividade também de alto risco.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Durante a Batalha de La Lys, no dia 9 de Abril de 1918, sofreu com gravidade os efeitos dos gases, tendo sido evacuado para cuidados hospitalares. É sobre a sua participação na Guerra que trata um artigo publicado no jornal “República” do dia 28 de fevereiro de 1918, que, de seguida, em parte se transcreve, quando seu pai estava exilado em França, por imposição da autoridade sidonista, que então governava o país.

«Visto que tanto se malsinou a boateou malévolamente quanto á situação do filho mais velho do snr. Dr. Bernardino Machado, ao tempo em que êste estava em pleno e constitucional exercício das suas funções de presidente da República, e que fazia parte do corpo do exército português em França, justo é que se fique sabendo quais são e teem sido as funções que êle tem exercido. Foi êle proprio, o snr. Alferes de cavalaria Bernardino Machado que o disse ao Jornalista que o entrevistou em França e cuja entrevista foi inserta na Capital de 25 do corrente e á qual não tiveramos ainda ensejo de fazer referencia, devido á estreiteza de espaço de que dispomos e aos complexos assuntos que dia a dia vão chamando a nossa atenção. Assim, vêmos pelas declarações do snr. Alferes Machado, que êle partiu para França em 2 de julho do ano passado, indo para o grupo de esquadrões (…) Pertencia êle ao regimento de cavalaria 4, e o grupo para que foi era o 2, constituído por uns 800 homens. Depois foi para sinaleiro da artilharia nas seguintes circunstancias: - como o grupo de esquadrões não ti-

nha nada a fazer, dadas as condições em que se está fazendo a guerra de frentes, foi dissolvido por uma ordem do quartel general do C.E.P., sendo, com as praças que o constituíam, formadas depois as companhias de ciclistas. A seguir, saiu depois uma circular aos subalternos de cavalaria convidando, os que quizessem servir como sinaleiros de artilharia e fazerem a respectiva declaração. O snr. Alferes Machado foi um dos que se ofereceram, indo então fazer a escola de sinaleiro, durante 18 dias, apenas, na pequena povoação de Roquetoir, proximo de de Aix-sur-la-Lys. Foi durante o tempo em que a cavalaria esteve inactiva que o snr. alferes Machado fez serviço no quartel general na censura de correspondência, onde o foi encontrar o tal convite que ele se apressou a aceitar. Estava êle no front havia três meses; hoje está lá há oito, como oficial sinaleiro de artilharia, cujas funções consistem em manter as comunicações, velar pela segurança das linhas, percorrê-las incessantemente, cuidar da disciplina das praças sob o seu comando, e ver o que elas fazem. “Este serviço – exclareceu modestamente o snr. alferes Bernardino Machado – não é comparavel em perigo ao da infantaria nas trincheiras, mas o risco ainda assim não é pequeno, vendo-se os sinaleiros ás vezes em palpos de aranha, pois que estão na zona perigosa, tendo de a percorrer a toda a hora, muitas vezes debaixo de fogo das metralhadoras inimigas”. Tal é a situação na frente de batalha do filho do snr. dr. Bernardino Machado, a quem a calunia e o ódio apontavam como um… emboscado.» 73


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4.7. Equipamentos militares usadas na Guerra

e

armas

Fig. 34 Exercícios a bordo do submarino “Espadarte” em junho de 1916. Este foi o primeiro submarino a entrar ao serviço da marinha portuguesa, em abril de 1913. 74


MANUEL AUGUSTO DIAS

Portugal é dos primeiros países do mundo a ter submarinos A 1.ª Guerra Mundial ainda nem tinha começado, quando foi entregue a Portugal o seu 1.º submarino, batizado com o nome de “Espadarte”. Foi encomendado ainda no período da Monarquia, no reinado de D. Carlos (1907) e formalmente entregue a Portugal no dia 15 de abril de 1913, em Spezia (em cujos estaleiros navais foi construído), na Itália (região da Ligúria), enriquecendo o equipamento militar da Armada Portuguesa. Foi seu primeiro comandante o leiriense Primeiro-tenente Joaquim de Almeida Henriques. O “Espadarte” entrou ao serviço da Marinha de Guerra Portuguesa um ano antes da 1.ª Guerra Mundial se ter iniciado, fazendo com que Portugal se tornasse num dos primeiros países do mundo a dispor da nova e implacável arma submarina. Aqui ficam alguns dados do novo equipamento militar português: 45 metros de comprimento, 245 toneladas de peso quando navegava à superfície, 300 toneladas em imersão; autonomia para cerca de 1500 milhas; 14 nós de velocidade, quando à superfície, apenas 8 nós se imerso; profundidade máxima: 40 metros; armado com 4 torpedos, dispõe de 2 turbos lança-torpedos. A sua tripulação era constituída por 21 marinheiros, entre oficiais, sargentos e praças. O Submarino português estreou a 1.ª esquadrilha com bandeira portuguesa e participou na 1.ª Guerra Mundial com mais 3 submarinos portugueses: “Foca”, “Golfinho” e “Hidra”. A Revista da Armada (n.º 473), de abril de 2013, recordando o centenário do “Espadarte” aponta algumas dificulda-

des na operacionalidade desses primeiros submergíveis: «Os submarinos construídos antes da primeira guerra mundial eram geralmente descritos como lentos, frágeis, com demoradas entradas em imersão, inconfortáveis e somente capazes de navegar em imersão por períodos de poucas horas. Acresce que eram mecanicamente pouco fiáveis, os periscópios eram de qualidade inferior, os motores Diesel ainda não tinham atingido níveis de desenvolvimento aceitáveis». O primeiro submarino português chegaria a Lisboa, apenas no dia 5 de agosto de 1913, após 3 meses de uma atribulada viagem desde Spezia. O jornal “A Capital” na véspera da sua chegada a Lisboa, sob o título “Viagem Tormentosa / A do Espadarte / de Spezzia para Lisboa deve terminar hoje”, descreve bem a fragilidade do submarino: «A viagem do primeiro submersivel da armada portuguesa tem sido uma prolongada odisseia. Logo á sahida de Spezzia sofreu avarias nos dois motores de combustão, derramando-se o oleo lubrificador, partindo-se o embolo da embrayage e parte da camisa interna d’um dos cylindros. Percorridas cem milhas, nova avaria se manifestou, partindo-se a embrayage do veio das manivelas. Successivas contrariedades dificultando o funcionamento dos machinismos, tornando indispensaveis immediatas reparações forçaram-o a arribar a Marselha. Chegado a Marselha reconheceu-se que os dois motores de combustão estavam avariados, e os motores electricos tiveram que ser postos em acção. D’este porto para Barcelona a viagem não foi mais tranquila; os motores Diezel inutilisaram-se, tendo-se que recorrer mais uma 75


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

vez aos motores electricos. Por fim segue o rumo de Valencia, mas outra vez se torna indispensavel arribar para reparar os motores que outra vez ainda se tinham inutilizado.» A atribulação da primeira viagem deu sobretudo experiência à tripulação que aprendeu a superar as dificuldades e contrariedades que iam aparecendo, conforme referiu à imprensa, na hora da chegada a Lisboa, o respetivo Comandante, Primeiro-tenente Joaquim de Almeida Henriques. Almeida Henriques nasceu em Leiria no dia 28 de maio de 1875, vindo a falecer 70 anos mais tarde, em Lisboa, aos 26 de setembro de 1945. Acumulou as funções de 1.º Comandante de Submarino da Marinha Portuguesa com as de 1.ª Comandante da 1.ª esquadrilha de submarinos da Armada. Entrou na Escola Naval aos 18 anos e foi subindo paulatinamente na hierarquia da Marinha, até chegar a Contra-almirante, no dia 21 de março de 1937, sendo então nomeado Subchefe do Estado-Maior Naval, e ocupando, também, o cargo de Superintendente dos Serviços da Armada. Uma carreira de sucesso coroada com uma série de condecorações. Esteve, igualmente, ligado ao ensino naval, dirigindo em 1936, a Escola Náutica, e, mais tarde, torna-se Diretor e primeiro Comandante da Escola Naval, evidenciando todo o seu sentido de responsabilidade e organização tendo contribuído, decididamente, para a transferência da principal estrutura de ensino naval, para as novas instalações do Alfeite, no outro lado do Tejo.

76

Fábricas de armas portuguesas ao serviço da Guerra A Primeira Grande Guerra para além de absorver uma enorme quantidade de homens, provenientes de todos os países diretamente envolvidos, atraiu um grande manancial de armamento de todas as qualidades, tamanhos, preços e origens. Portugal, país diretamente envolvido neste conflito, também esteve associado à produção e fornecimento de armas para a Primeira Guerra Mundial. No início do período republicano o órgão responsável pelas indústrias militares era a Direção do Arsenal do Exército, que contava com dois estabelecimentos, a Fábrica de Pólvora Negra e a Fábrica de Material de Guerra. Em 1912 a Fábrica de Armas de Santa Clara passou os seus equipamentos de fabrico e reparação de armas para Braço de Prata, continuando a fabricar munições, equipamentos e arreios. Com o despoletar a Primeira Grande Guerra, no verão de 1914, surgiram novas necessidades de material de guerra e, logo em outubro de 1914, os nossos aliados britânicos pediram a Portugal 20.000 Mauser-Vergueiro e 20 milhões de cartuchos. O pedido foi aceite, mas só foi possível enviar 12 milhões de cartuchos. Em 1917, Portugal tinha as suas fábricas a produzir material de guerra para os Aliados. Mas nem tudo corria bem, em termos empresariais, neste ramo. No final de 1917 foi notícia a dissolução da Empresa Industrial Portuguesa, que então era constituída por grandes fábricas e considerada a maior empresa industrial do país e uma das maiores da Península Ibérica, para se tornar propriedade de um privado, o republicano Francisco da Silva Sampaio Pombinha.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Fig. 35 “O Século”, de 8 de agosto de 1917, publicava na sua 1.ª página, esta foto onde se veem dezenas de “varinas” transportando, à cabeça, granadas produzidas nas fábricas militares portuguesas

A notícia surgiu em toda a imprensa portuguesa. No diário republicano “A Manhã” foi dada à estampa na primeira página, da edição n.º 270, de 1 de dezembro de 1917, sob o título “Entre o ferro e o fogo / A Empresa Industrial Portuguesa cessa e as suas grandes fabricas passam a um único explorador / 300 granadas por hora para os aliados”. Os jornalistas daquele matutino visitaram aquela fábrica, localizada em Santo Amaro, nos finais de novembro

de 1917, logo após a mudança de proprietário. Registaram, assim, as primeiras sensações: «sentiamos o resfolgar das maquinas, atordoava-nos o ruido infernal, o movimento doido, a vida exagerada, para nós desconhecida, de tudo aquilo que nos passava em redor.» Mais adiante, os repórteres de “A Manhã” encontram, afixada, uma “Ordem de Serviço”, datada de 29 de novembro de 1917, que explica as recentes mudanças ocorridas naquela unidade de produção: 77


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

«Cessa a laboração por conta da Empresa e continuação da mesma por conta do sr. Francisco da Silva Sampaio Pombinha. – Os corpos gerentes e accionistas da Empresa, achando-se imensamente desgostosos com os consecutivos prejuizos anuais…, etc., etc., deliberaram cessar desde a presente data a exploração… (…) resolveram os corpos gerentes que se aceitasse a proposta do sr. Francisco da Silva Sampaio Pombinha para a exploração das fabricas de Santo Amaro. Nesta conformidade e nos termos do respectivo contrato que acaba de ser assinado, previne-se todo o pessoal que a começar de hoje a exploração das fabricas da Empresa passa a ser feita por aquele senhor, a quem já foram entregues todos os edificios, maquinismo, utensílios…, etc… - (aa) Luis Ferreira da Silva Viana, F. E. de Serpa». O novo industrial declarava, pouco depois, aos jornalistas o seu objetivo: «–Vou dedicar-me a esta obra enorme, que eu sinto de espantosas responsabilidades, com todo o ardor da minha mocidade e da minha alma. Farei disto uma coisa digna de Portugal. Trata-se de uma grande batalha, e vencê-la-hei…». Prosseguindo na visita à fábrica os jornalistas surpreendiam-se a cada passo: «– Mas isto é espantoso! Como adivinhar que em Portugal já havia uma industria montada assim com tamanho poder! / Passámos pelas salas do expediente, pelas casas das maquinas reparadoras e de construção, labirinto medonho, onde o ruido unisono de dezenas de monstros de ferro e aço, enormes, potentosos, ligados a veios monumentais por correias vertigi78

nosas, tudo trabalhando quasi ao mesmo tempo, parece que propositadamente para nos atormentar, punha uma nota de indiscutível, de prodigiosa vida. Curvados, dezenas de operários, que mal nos viam passar, que não nos sentiam mesmo, afogavam o olhar ansiedado nos complicados engenhos. Entrámos na casa dos tornos, onde maquinismos complicados, falando em roncos, aterram a poderosa, quasi miraculosa imaginação do ignorado autor, e passámos a ver de corrida, já na febre, quasi na alucinação, tontos, mas tontos! (…) á casa dos chefes modelos, onde milhões, não milhares, de peças de todos os tamanhos, de todos os tipos, atestam os 43 anos de prodigiosa actividade daquela grande casa, já importantíssima, e que agora, sob o influxo dominador daquele homem sobrio, de poucas palavras, gelado quasi, que nos acompanhava, vai entrar no campo das rialidades da industria e honrar, dignificar Portugal. / De súbito, porém, estacámos. Iamos a entrar num pateo. Visão fantástica, como a de um “film”. Que é isto? Olhamo-nos. Á roda de nós milhares de granadas de 75, de 95, de 115, de 155 erguem-se espantosas por todos os lados, umas brilhantes, luminosas, outras em bruto, todas em filas enormes, como num campo de aprovisionamento, na véspera de batalha. E ao fundo as oficinas de forja, onde grandes linguas de fogo, incandescências, ferro em braza, lumareus, piras incendiadas davam áquilo tudo uma visão de morte, uma visão de guerra. (…) – Trabalhamos febrilmente para os aliados. Dentro de pouco tempo, nesta fabrica e na outra de Alcantara, que eu proprio ergui e dirijo – refere Francisco Pombinha – faremos 3:000 granadas por dia! (…) Trezentos destes monstros, que custam 20$00 cada um, em cada hora que passa».


MANUEL AUGUSTO DIAS

Nesta fábrica, que ocupava uma área de 22 mil metros quadrados, trabalhava um operário-mestre que colheu formação nesta arte em várias nações estrangeiras, nomeadamente na Bélgica, França e Alemanha. Foi ele que acompanhou os jornalistas de “A Manhã”, na fase final desta visita à fábrica: «–Corri tudo por essas terras do estrangeiro. Há lá grandes coisas! O que os senhores estão a ver muito perto já está das fabricas de Liege e do Creusot. E no futuro, com os planos que me acabam de ser confiados… / Calou-se. Entendemos. Estamos agora debaixo de medonhas pontes enormes, chamados “pontes mantes” movidas por electricidade. São verdadeiros ciclopes, titans, pontes que giram com a velocidade de um carro por sobre as nossas cabeças e deslocam molas de ferro e aço de oito e seis mil quilogramas. Chega a ser fantástico, aquilo. Mete medo. Parece que desaba tudo (…). Presenciamos a “usinagem” das granadas e dos obuses, que dentro em pouco passarão pelas mãos de 400 mulheres; olhamos os modelos maravilhosos, milagres da balística, e, alfim, cançados, extenuados, entramos numa oficina enorme, que parece não ter fim, onde tudo é fogo, outra vez braseiro, lava incandescente, Vesuvios permanentes, numa especie de inferno onde passam, como sombras, operarios que domam, quasi como deuses, o ferro e o aço luminoso, que já nos arde cá dentro, e queima, e revolve, e asfixia quanto mais nos aproximamos dos fornos, das caldeiras, das rodas que em velocidades salpicam estrelas, ainda astros, ainda soes, no sobrenatural incendio fantástico que tudo aquilo vai sendo. (…).» E a visita prossegue, e a reportagem também, com a descrição dos jornalistas surpreendidos com tudo aquilo que viram e que há cem anos era o que de mais moderno havia na fabricação de munições militares em Portugal.

Armas utilizadas na Primeira Grande Guerra Para além de um conjunto de armamento já utlizado em conflitos anteriores, importa destacar algumas das armas que surgiram pela primeira vez na Grande Guerra, nomeadamente, o lança-chamas, as granadas, os tanques, os gases, os aviões de guerra e os submarinos. Podemos afirmar com toda a propriedade que esta foi a primeira Guerra em que se combateu na terra, no mar, por baixo do mar e no ar. O lança-chamas foi introduzido pelos alemães logo no início da guerra e causou grande pavor nas tropas adversárias, que mais tarde também o adoptariam. Era utilizado para abrir caminho para a infantaria poder avançar. As granadas foram muito popularizadas no decurso da Primeira Guerra Mundial sobretudo depois de 1915, tendo sido produzidas milhões de unidades durante o conflito, uma vez que esta arma era muito eficaz no ataque às trincheiras e aos túneis adversários. Outra arma particularmente eficiente que surgiu na 1.ª Grande Guerra foram os tanques que causaram grande surpresa e pânico junto das tropas alemãs. Foram sobretudo as tropas americanas que, entrando já numa fase adiantada do conflito, recorreram a eles de uma forma mais sistemática. O último ano da Guerra (1918) foi aquele em que os tanques foram usados em maior escala e de forma coordenada com outros esforços ofensivos, da responsabilidade da artilharia e da aviação para permitir o avanço da infantaria. O armamento químico apesar de ter sido usado antes desta Guerra, foi no seu curso que teve um uso mais continuado, quer do lado aliado quer do lado das po79


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

tências centrais. Os primeiros a usarem granadas de gás não letal foram os franceses, logo no início do confronto armado, para tentarem suster uma ofensiva alemã. Mas seriam os alemães os primeiros a recorrer de forma mais sistemática a este tipo de armamento. A primeira vez que os alemães recorreram ao gás venenoso na Guerra, foi no dia 22 de abril de 1915, utilizando o gás cloro.

Fig. 37 Homens e animais tiveram de usar máscaras para se protegerem dos gases Fig. 36 Cilindros que dispersavam 180 toneladas de cloro no ar sobre o inimigo

Apanhados de surpresa, os combatentes afetados inalaram o gás e imediatamente começaram a sentir-se mal, sofrendo problemas respiratórios. Depois disto, também o exército aliado passou a usar armamento químico. Mais tarde (1917) utilizou-se também o gás mostarda, que provocava vómitos, problemas respiratórios, de pele e, em alguns casos, cegueira temporária. Calcula-se que os ataques com armas químicas possam ter provocado cerca de 90 mil mortos. As máscaras, que chegaram a ser usadas por homens e animais, eram o melhor meio de se protegerem deste tipo de ataques. 80

A aviação, que no princípio do século XX, se começava a desenvolver, também foi aplicada na Guerra. Aliás, foi a 1.ª vez que tal sucedeu, e ao princípio, as missões da aviação limitavam-se à observação e ao reconhecimento do inimigo. Só mais tarde a aviação foi utilizada como eficaz arma de combate. Portugal também disponibilizou alguns pilotos para este primeiro grande conflito. Finalmente, outra arma que se utilizou nesta Guerra pela primeira vez, foi o submersível. Os submarinos revelar-se-iam, de facto, uma poderosa arma para a guerra no mar. Portugal teve pelo menos quatro ao serviço da Pátria, durante a Primeira Grande Guerra, como acima se viu. Mas algumas das suas “viagens” foram bastante atribuladas e o seu poder muito reduzido.


MANUEL AUGUSTO DIAS

4.8. Primeiro soldado português morto em França A segunda leva de combatentes portugueses ainda nem há um mês e meio havia chegado à Flandres e já tinha uma primeira morte a lamentar. A do soldado António Gonçalves Curado, natural da Barquinha. Na sua ficha do CEP, em “observações” está escrito o seguinte: “Faleceu na primeira linha em 4 de Abril de 1917, por virtude de ferimentos recebidos em combate, ficando sepultado no cemitério inglês de Laventie”.

Sobre a sua morte, o general Tamagnini de Abreu, um dos responsáveis pela preparação do CEP em Tancos e também comandante do CEP em França, escreveu o seguinte no seu diário, em 8 de abril de 1917, dia que, nesse ano, coincidiu com Domingo de Páscoa: «Chegou a comunicação oficial dos ingleses da morte do soldado e dos ferimentos dos outros. Afinal, não foram estilhaços da granada que o mataram. Caiu sobre o abrigo em que os homens estavam uma granada que fez abater o tecto e o soldado ficou com a cabeça esmigalhada e os outros, feridos. (…) Aquele pobre soldado que estava abrigado à retaguarda morre esmagado por um desabamento! C’est la guerre!». António Gonçalves Curado nasceu em Vila Nova da Barquinha, distrito de Santarém, em 29 de setembro de 1894, filho de José Gomes Curado e de Maria Clara. À data dos acontecimentos, o parente vivo mais próximo era a sua mãe que residia em Carvalhais de Lavos, Figueira da Foz. Seria, também, na Figueira da Foz que faria a sua recruta, como soldado de Infantaria, integrando o Batalhão de Infantaria n.º 28 desse Regimento, cabendo a António Curado o n.º 234 como soldado da 4.ª Companhia.

Fig. 38 António Gonçalves Curado na Capa da “Ilustração Portuguesa”, de 14 de maio de 1917

Depois da sua morte e quando se tratou da trasladação dos restos mortais houve grande polémica entre a Figueira da Foz, terra onde se fez soldado e vivia a sua mãe, e Vila Nova da Barquinha, terra da sua naturalidade. Os seus restos mortais seriam trasladados do cemitério português de Richebourg, depois de ter sido sepultado, primeiramente, no cemitério inglês de Laventie, para a sua terra natal por intermédio da extinta comissão dos Padrões da Grande Guerra, no dia 18 de agosto de 1929. 81


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Aquela controvérsia teve repercussões no fim da década de 1920, na imprensa regional (A “Voz dos Combatentes” e “Gazeta de Coimbra”) e até nacional (“Diário de Notícias”). Entre os argumentos enunciados a favor da Figueira da Foz, lêem-se no “DN” os seguintes: «A mãe e os irmãos do soldado Antonio Gonçalves Curado, são de aqui naturais e residentes; e é para a Figueira da Foz que reclamam os restos mortais de seu filho e irmão; o pai do primeiro soldado português morto em França, era natural e foi residente em Carvalhais de Lavos, do concelho da Figueira da Foz onde morreu; (…) É na Figueira da Foz que está o regimento a que pertencia e pertence inquestionavelmente, o primeiro soldado português morto na Grande Guerra; e portanto é nesta cidade que há direitos adquiridos sôbre a posse dos restos mortais de António Gonçalves Curado». O resultado acabaria por ser a edificação de dois monumentos em sua memória nas duas localidades: na Figueira da Foz, a colónia francesa em Portugal já tinha tomado a iniciativa de o homenagear, por isso foi à sua custa que se erigiu um pequeno monumento em sua memória, que foi inaugurado no dia 3 de abril de 1932, na praça Luís de Camões, próximo do monumento aos Combatentes Mortos na I Grande Guerra; em Vila Nova da Barquinha, o Monumento aos Mortos da Grande Guerra, seria inaugurado no dia 11 de abril de 1937, prestando esse concelho homenagem aos seus mortos na Guerra de 1914-1918, colocando na base do referido monumento os restos mortais de António Gonçalves Curado, 1.º soldado do C. E. P. falecido em combate e natural daquela freguesia. O jornal a Gazeta de Coimbra, n.º 2375 de 3-8-1929, num artigo intitulado “O Primeiro Morto”, assinado por J. Arnaut Pombeiro, escreve, a este propósito, o seguinte: 82

«As charnecas do concelho da Barquinha, desde esta linda vila ribatejana até Tancos e Praia, foram ocupadas em 1916 por uma populosa cidade de muitos milhares de bravos “serranos”, pitorescamente denominada “Paulôna”. Eram os homens que vinham de todo o país aprender a sciencia e a arte da guerra, afim de partir em defesa da Pátria. Todos quantos partiram para a Grande Guerra levaram gratas recordações da Barquinha e das suas freguezias de Tancos e Praia, onde deram os primeiros passos na dura arte, que iam praticar, aprendendo a honrar a Pátria, como o fizeram sempre os Portugueses de todos os tempos. A Barquinha ficou pois, gravada no coração de todos os combatentes. Mas foi maior o seu concurso, foi mais alem o seu papel, no momento histórico que então atravessavamos. Á aprendisagem méramente técnica que lhes ministrara em terras de Portugal, quiz a Barquinha juntar um lampejo de sentimento vivo e chocante, no primeiro momento de combate. Quiz-lhes ensinar também como se morria pela Pátria, quiz abrir o caminho glorioso da Eternidade, a rota luminosa a percorrer por quantos bem merecessem da Pátria. E ofereceu um filho seu, um filho querido e amantíssimo, à primeira bala inimiga. E desde então, desde a morte gloriosa dêsse Heroi que nem teve tempo de experimentar a volúpia do comba-


MANUEL AUGUSTO DIAS

te que desejara ardentemente, – desde êsse momento, o povo da Barquinha tudo tem feito para conseguir reaver o seu Filho. Finalmente, a patriótica Comissão dos Padrões da Grande Guerra ouviu os clamores daquele povo suplicante, e levou a efeito a sua trasladação. No dia 18 do corrente mês, regressará à Barquinha, ao seu lar – ao lar dos conterrâneos – o Heroi que vai repousar no Largo dos Combatentes, na bâse do monumento que lhe é dedicado, regressando assim de novo ao convívio de quantos o conheceram antes da sua entrada nos portais da História. Ele ficará sendo, êsse tumulo colocado numa praça pública, a expressão máxima sempre patente e visível do sentimento requintado dum povo que vive e que quer viver. Pois, que simbolo mais eloquente e impressionante pode escolher uma nação, que o exemplo dum seu Filho, mixto de mártir e de herói, que ao primeiro vôo da sua exaltação patriótica, ao esboçar o primeiro sonho de glória, cai varado pela primeira bala inimiga, – dando aos seus camaradas o exemplo culminante do sacrifício estoico sem compensações, o dum soldado que morre fulminado, primeiro que ninguém ao soar pela primeira vez no campo de batalha, o toque incendiário do clarim que lhe gritava: “Fogo!”? A Barquinha, guardando avaramente adentro dos seus muros os restos mortais do soldado Antonio Gonçalves Curado, fica sendo mais um lugar sagrado das peregrinações patrióticas – o tumulo do Soldado Conhecido, o eleito pela Providencia para marchar na frente de quantos heróis morreram pela Pátria.»

Os restos mortais de António Curado seriam trasladados do cemitério português de Richebourg para a sua terra natal por intermédio da extinta comissão dos Padrões da Grande Guerra, no dia 18 de agosto de 1929. Era soldado n.º 234, da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 28. O Monumento aos Mortos da Grande Guerra da Barquinha foi inaugurado no dia 11 de abril de 1937. Na base do monumento repousam os restos de António Gonçalves Curado, 1.º soldado do C. E. P. falecido em combate e natural da freguesia da Barquinha.

4.9. O soldado português que foi condenado à morte

O expedicionário português que foi executado em meados de setembro de 1917, em França, tinha embarcado em Lisboa, seis meses antes, isto é no dia 16 de março de 1917. A recusa em cumprir uma pena de prisão correcional com que foi punido fê-lo desejar passar-se para o lado inimigo, convencido de que iria encontrar um antigo alemão (nem mais nem menos que um dos bisavôs do atual presidente da câmara portuense) para quem trabalhara no Porto, sua terra natal. Afinal acabou fuzilado, acusado de atraiçoar a pátria que devia defender.

83


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

«No sector português / O fuzilamento / reconstituição do facto Em jornal da noite referia ontem o seguinte: Teem aparecido varias versões acerca do julgamento e execução do soldado chauffeur, fuzilado na frente portuguesa. Informações fidedignas permitem-nos restabelecer com exactidão o modo como os factos se passaram. Esse soldado fôra condenado a 30 dias de prisão motivada por ter faltado com o automóvel a seu cargo numa ocasião em que este era necessário, para um serviço urgente. As penas de prisão cumprem-se na primeira linha, pelo que o chauffeur foi conduzido para ai; durante o tempo de prisão o detido levantou as suspeitas dos soldados por causa das muitas preguntas que lhes dirigia, procurando informar-se de qual o dispositivo das forças e principalmente das aberturas do arame farpado. Comunicadas as suspeitas aos oficiais, passou o detido a ser vigiado de perto, confirmando a sua atitude de constante investigação as duvidas já suscitadas acerca das suas intenções. Fig. 39 Primeira página do Boletim do CEP de João Augusto Ferreira de Almeida

Há cem anos a imprensa portuguesa noticiava a execução de um soldado português na Frente de combate, por motivo de traição à Pátria, sem, no entanto, o identificar, nem referir a data da ocorrência. A notícia que transcrevemos foi publicada no jornal “República” de António José de Almeida, de 3 de outubro de 1917. 84

Apanhado de surpreza, foi-lhe encontrado um papel em que vinham indicados as posições das aberturas, elemento da maior importancia para facilitar a penetração do inimigo nas nossas trincheiras. Este documento foi o corpo de delito do processo que logo se lhe instaurou, e de que resultou a sua condenação á morte. O reu recorreu da sentença nos termos legais, que de resto foi confirmada, razão porque medeou cerca de um mez entre a condenação e a execução.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Felizmente, foi este o único caso em que um português, dos sessenta mil que tão valorosamente se batem, se esqueceu do que devia á sua patria, aos seus companheiros e a si mesmo. O nefando crime, devidamente castigado com a unica pena admissivel em tais casos, certamente se não repetirá, tanto mais que a policia militar inglesa está tão bem organizada, que dificilmente os traidores podem chegar a consumar os seus infames desígnios. (…)» Sabe-se que o referido combatente era João Augusto Ferreira de Almeida, tinha 23 anos (feitos já em território francês, no dia 3 de abril) e era natural do Porto (Lordelo do Ouro). Era filho de João Ferreira de Almeida e de Angelina Augusto. Em tempos, no Porto, João de Almeida teria sido chofer de um alemão chamado Adolfo Hofle, radicado na cidade do Porto, que foi bisavô do atual presidente da Câmara, Rui Moreira. Esse alemão estimava-o tão bem que lhe terá dado vontade de se passar para o lado alemão na esperança do encontrar. No seu boletim do CEP conta que foi punido uma primeira vez, no dia «22/7/917 com 60 dias de prisão correcional, porque sendo chaufeur do carro automóvel de agua em serviço na ambulância 5, se ausentou sem autorização, com o mesmo carro, em 8 do corrente, pelas 13h 30m, regressando no dia 9 pelas 15 horas, do que resultou sencivel prejuizo para o serviço d’abastecimento de água a uma unidade, tendo depois declarado que fora a Wavrans onde se juntára com o mecanico n.º 577 e o chauffeur n.º 501 da secção do C.A. que ali estacio-

na, o que se provou ser falso; e ainda porque tendo-lhe sido determinado, em 12 de julho, pelo comandante de um grupo de companhias de infantaria 1, que deslocasse o referido carro de um local para o outro, por prejudicar o serviço do bivaque, respondeu com modos pouco respeitosos e declarando na frente das praças das mesmas companhias, que faria ver ao Snr. Chefe do Estado Maior a inconveniencia das ordens que lhe eram dadas, infringindo assim os deveres n.os 1.º, 2.º, 4.º, 5.º, 24.º e 43.º do art.º 4.º do R.D.E.» Os seus camaradas (sete soldados e dois sargentos) declararam, como testemunhas, que o acusado não pretendia cumprir a punição que lhe tinha sido aplicada, evidenciando antes a intenção de fugir para o lado dos alemães. E, ainda no mês de julho, para concretizar o seu propósito, se teria dado ao trabalho de investigar a forma de chegar à parte onde se encontrava o inimigo, não escondendo as suas intenções em desertar e de levar informações ao exército alemão. O Tribunal de Guerra do Corpo Expedicionário Português, a quem competiu julgar este caso, era presidido pelo coronel de Infantaria António Luís Serrão de Carvalho e teve como juiz auditor Joaquim de Aguiar Pimenta Carreira. Houve um júri que era constituído por um major, dois capitães e dois alferes. O referido Tribunal de Guerra reuniu-se a 15 de agosto tendo decidido condenar à morte Ferreira de Almeida. A defesa ainda recorreu da sentença, mas o melhor que conseguiu foi a anulação do julgamento e a marcação de um novo para o dia 12 de setembro seguinte.

85


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Concretamente, o soldado condutor Ferreira de Almeida era acusado de ter cometido os seguintes factos criminosos: «1.º - Tentara passar para o inimigo, para o que perguntara a várias praças o caminho a seguir, chegando até a oferecer dinheiro com o fim de obter essa informação. 2.º - Quereria indicar ao inimigo os locais ocupados pelas tropas portuguesas, constando em duas cartas itinerárias de que a praça era portadora.» Na sequência da acusação, o Juiz auditor ditou os seguintes quesitos: «1.º - O facto de o arguido em 29 de julho, encontrandose na primeira linha, tentar passar para o inimigo perguntando a várias praças o caminho, oferecendo a uma dinheiro para que lhe prestasse essa informação; 2.º - O facto de o arguido querer indicar ao inimigo os locais ocupados pelas tropas portuguesas, constantes de duas cartas itinerárias de que era portador; 3.º - O mau comportamento do réu; 4.º - O crime ser cometido em tempo de guerra; 5.º - O réu ter cometido o crime com premeditação; 6.º - O crime ter sido cometido, tendo o agente a obrigação especial de o não cometer; 7.º - O estar ou não provado o imperfeito conhecimento do mal do crime.» O júri provou, por unanimidade, os 3.º e 4.º quesitos; o 2.º não foi provado por unanimidade; o 1.º, 5.º e 6.º foram provados por maioria; e o 7.º não foi provado por maioria. 86

Na sequência deste julgamento, João Ferreira de Almeida seria executado às 7h 45m do dia 16 de setembro de 1917, por um pelotão de fuzilamento, conforme determinado, poucos dias antes, pelo Tribunal de Guerra. Um camarada de armas refere-se assim ao momento derradeiro: «De súbito um automóvel que chega, ao mesmo tempo que um frio de pena paira sobre serranos portugueses. Do auto desce um rapaz ainda novo, vinte e dois anos, talvez. Enverga o fardamento de chauffeur, dólman de oficial e calção à chantilly. Acompanha-o um capelão militar. É o condenado. Ao descer, encara com uma espécie de terror a força armada que o rodeia e, no seu olhar triste, há qualquer coisa de angústia pungente». Naquela manhã de 16 de setembro de 1917 onze homens, comandados pelo major Horácio Severo de Morais Ferreira, constituíam o pelotão de fuzilamento que executou Ferreira de Almeida, de olhos vendados. A execução decorreu no lugar de Picantin, próximo de Laventie, região de Pas de Calais, não muito longe da cidade de Lille. Ferreira de Almeida foi sepultado no Cemitério de Guerra nesse local, mais tarde, contudo, o seu corpo seria trasladado para o cemitério português de Richebourg (covão 19 da fila 6, no talhão B) onde se encontram mais 1830 antigos expedicionários portugueses que a Guerra matou.


MANUEL AUGUSTO DIAS

4.10. Prisioneiros, feridos e mutilados No período da Primeira Guerra Mundial a pior Batalha que sofreu o Exército Português, foi a de La Lys Os combatentes portugueses, nas primeiras quatro horas de batalha que se desencadeou na madrugada de 9 de abril de 1918, conheceram milhares de baixas, entre mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros. O número de prisio-

neiros portugueses estima-se em quase 7 mil e quinhentos soldados. Um deles era ao tempo Tenente-Coronel, e foi pai do 2.º Presidente da República, no período do Estado Novo, General Craveiro Lopes. No período em que esteve preso, o Tenente-Coronel João Carlos Craveiro Lopes escreveu um “Diário”, onde narra as dificuldades então vividas.

Fig. 40 Vários milhares de combatentes portugueses foram feitos prisioneiros dos alemães no dia 9 de Abril de 1918

João Carlos Craveiro Lopes, então com 47 anos, foi um dos milhares de militares portugueses, que se tornou cativo das forças alemãs naquela trágica manhã do dia 9 de abril de 1918.

Nos sete meses em que conheceu a condição de prisioneiro, como oficial do exército português, passou ao papel aquilo que era o dia-a-dia dos prisioneiros portugueses que pôde testemunhar de tão perto. 87


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

O seu filho Francisco Craveiro Lopes, na altura Tenente, também havia sido mobilizado para a 1.ª Guerra Mundial, mas para Moçambique. Mais tarde, em 1926, o oficial capturado pelos alemães chegará a general. O filho Francisco, que combatera em Moçambique, chegará a marechal e será o segundo presidente da República do Estado Novo. Após desentendimentos com Salazar, será substituído no cargo por Américo Tomás. Serve de fonte a este apontamento sobre os prisioneiros de Guerra a divulgação que foi feita pela RTP, de alguns aspetos do “Diário de um Prisioneiro de Guerra”, graças à cedência que dele fez o Coronel João Craveiro Lopes, que é neto do seu autor e que, no contexto da evocação do centenário da Primeira Guerra Mundial, entendeu e bem que se trata de um documento de enorme valor histórico.

A captura dos prisioneiros portugueses e as condições em que resistiam… «Os militares portugueses renderam-se e foram feitos prisioneiros. Tiveram de entregar armas, cinto, capote. Foram conduzidos para a retaguarda e ao cabo de várias horas de marcha chegaram a Illies, local do Quartel-General da Divisão alemã, “onde o general nos mandou ir à sua presença, apertando-nos a mão e oferecendo para tomarmos uma chávena de chá”. Prosseguiram depois a marcha e, em 15 de abril, chegaram a Karlsruhe, seguindo daí para o campo de Rastadt, onde ficarão nos meses seguintes. Os alemães separavam os prisioneiros segundo a patente e tinham 88

campos especificamente destinados aos oficiais. No de Rastadt, havia um quarto por cada cinco oficiais prisioneiros. Foram vacinados contra tifo, varíola e cólera. Havia também oficiais superiores ingleses e franceses. As normas do campo determinavam que os prisioneiros fizessem continência a qualquer oficial alemão e que se levantassem quando este entrasse. Podiam deitar-se sobre a cama durante o dia, tirando as botas. Estavam avisados de que seriam alvejados se se aproximassem do arame farpado». Outra história de captura de prisioneiros, no mesmo dia 9 de Abril de 1918, durante a referida Batalha de La Lys, é testemunhada pelo Alferes de Artilharia – 2.ª Bateria, 7.º Regimento de Artilharia, Carlos Olavo Correia de Azevedo: «São 11 da manhã [9 Abril 1918] (...). Não há nada mais torturante, angustia maior do que esta incerteza (...). Uma ordenança que mandei ao 1º obus com uma ordem de fogo não voltou mais; dois homens que mandei a um paiol para trazerem umas granadas não voltaram mais! Tenho a certeza de que ficaram pelo caminho, feridos ou mortos! (...) Os momentos que se seguiram foram de absoluto recolhimento. Tinha a certeza de que ia morrer. Pensei naqueles que longe chorariam a minha perda: a minha família, alguns amigos seguros, todos os que sofriam a minha ausência (...). Um soldado que tinha saído veio-me dizer que há alemães no Pont du Hem, quer dizer, à retaguarda da nossa posição, vindos dos lados de Laventie. Estamos perdidos, cercados, prisioneiros! (...) Nunca me senti tão desgraçado pelo inesperado de uma situação cuja probabilidade afastei sempre do


MANUEL AUGUSTO DIAS

meu destino. Vencido (...) resolvi sair à frente dos soldados que tinha. Confesso que me dominava um misto de humilhação e de tristeza, por me sentir vencido, sem meios de resistência (...). Quando os alemães me aperceberam, encaminharam-se na minha direcção e o oficial que os comandava apontou-me uma pistola (...). Marchei serenamente, direito a ele, sem um gesto, sem uma palavra (...). O boche baixou a pistola e indicou-me o caminho [para a retaguarda alemã]. Segui então, direito a Neuve Chapelle, pela estrada de La Bassèe (...). Em Neuve Chapelle, parei para ser enquadrado com outros prisioneiros (...) que nos haviam de guardar até o fim do nosso destino.» Uma das primeiras entradas do “Diário” de Craveiro Lopes, a que a RTP deu atenção, foi à do dia “29 de Abril” de 1918, em que Craveiro Lopes, vinte dias após o seu aprisionamento, escreve: «Leio, dormito e convivo, procurando assim enganar a fome e passar o tempo o mais depressa possível (…) Deitei-me às 8h30, depois de um passeio pelo campo, admirando frondosas árvores da Floresta Negra». Se um oficial prisioneiro se queixa de passar fome, imagine-se o que se passava com a maioria dos combatentes portugueses, que eram simples soldados. Outros testemunhos conhecidos dão-nos conta de que os prisioneiros passavam muito mal em termos de alimentação. Como se já não bastasse o facto dos hábitos alimentares serem completamente diferentes daqueles a que estavam habituados, os prisioneiros de guerra dependiam total e exclusivamente da comida que os guardas alemães lhes davam, o que fazia com que a fome fosse quase uma constante. Mesmo no período normal

de Guerra, não sendo prisioneiros, alguns se queixavam da alimentação escassa, então como cativos o problema agravou-se e de que modo. A fome fazia com que os soldados passassem por situações de grande fragilidade física e mental, levando a uma enorme desmoralização que, não raro, descambava em confrontos físicos entre si. Voltando ao “Diário” de Craveiro Lopes, também ele, elegia o problema da alimentação como um dos problemas principais para os prisioneiros, fossem de que nacionalidade fossem. Ao longo dos sete meses de cativeiro, o Tenente-Coronel Craveiro Lopes dedica-lhe muitas entradas do seu “Diário”. Aí se verifica que quase todos os “menus” tinham por base, «batatas, milho, beterraba, carne de foca e outros recursos gastronómicos característicos dum tempo de penúria». Ao longo de mais de meio ano como prisioneiro de guerra, as queixas sobre a alimentação são recorrentes, embora sejam mais incisivas nalguns momentos de maior escassez. Quando a fome era maior, chegava a «dar-se o caso de se entornar um caldeirão de sopa, e de os prisioneiros andarem com canecas a recolher do chão o que fosse ainda aproveitável para poderem comer». As reivindicações por causa da falta de alimentação eram tantas que o próprio Craveiro Lopes teve a iniciativa de organizar uma Comissão, a que presidiu, tendo em vista a permanente troca de impressões com o Comandante do Campo de prisioneiros, tendo em vista a melhoria da alimentação e outros aspetos da vida quotidiana dos prisioneiros naquele Campo. 89


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Os dias em que a fome apertava mais eram aqueles em que o número de prisioneiros aumentava e o pouco alimento tinha de ser dividido por mais “bocas”. Assim aconteceu a 8 de junho de 1918, quando o Tenente-Coronel Craveiro Lopes, passa para o seu “Diário” este desabafo que demonstra bem o sofrimento que ali se vivia: «Estamos na situação mais desgraçada que se pode imaginar! Mil vezes as trincheiras com todos os perigos».

Em abril de 1916 foram requisitados centenas de médicos, enfermeiros e enfermeiras, porque os que faziam parte dos quadros do Exército eram insuficientes. Dos 380 médicos que foram integrados no CEP, apenas 97 eram do quadro do exército. 582 enfermeiros, 54 enfermeiras e 1232 maqueiros constituíam os operacionais do Serviço de Saúde do CEP. Na 1.ª linha, ao nível de Batalhão, existiam postos de socorro avançado, cada um com 1 médico, 2 enfermeiros e 4 maqueiros; na retaguarda, havia, ao nível de brigada, postos de socorro com hospital de campanha intermédio, com 2 médicos, 4 enfermeiros e 15 maqueiros. Na retaguarda havia Ambulâncias que eram autênticos Hospitais, a funcionarem em tenda de campanha. Na retaguarda havia Hospital de medicina e cirurgia, Hospital de doenças venéreas, Hospitais de sangue e Depósito de Convalescentes. Dezenas de milhares de expedicionários portugueses tiveram de ser assistidos nas Ambulâncias e no Hospitais.

Fig. 41 Automóveis ambulâncias ao serviço do CEP

Os feridos e mutilados da Guerra Um exército enviado para a Guerra tem de se preocupar desde logo com a Organização dos Serviços de Saúde e o CEP revelou esse cuidado. O Serviço de Saúde era garantido, como já vimos, por 5 secções de Ambulâncias (1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª e 5.ª), 2 Colunas Automóveis de Transporte de Feridos e 6 Secções Hipomóveis de Transporte de Feridos. 90

O diário republicano da noite, “A Capital” de 23 de janeiro de 1918 dá destaque à questão de “Os nossos mutilados da Guerra”, um outro título, apelando à urgência da organização dos serviços de apoio a estas vítimas do Grande Conflito que assolava a Europa e o Mundo, desde 1914. Muitos dos feridos vinham mutilados, o que lhes retirava não só a capacidade militar mas também, na maior parte dos casos, a capacidade de angariar o seu sustento e o das suas famílias. O jornal acusa as autoridades portuguesas de esquecerem estes soldados que se sacrificaram pela


MANUEL AUGUSTO DIAS

Pátria, não lhes pagando o pré, as pensões e as reformas, por não haver nada legislado sobre o assunto. Afirma mesmo que há casos de soldados que não recebem o pré há 6 meses e mais, que há evacuados de África que há mais de um ano que não recebem qualquer importância e evacuados de França, a quem se devem meses de trabalho em campanha e, também, meses de hospitalização. Enquanto não se legisla sobre este caso, o articulista (José Pontes – desportista, jornalista, médico e político) defende que os estropiados, enquanto se encontram nas escolas de reeducação, deveriam receber como se estivessem em campanha e as famílias a pensão.

O remédio para alguns mutilados da Guerra A questão dos mutilados da Guerra foi, várias vezes, notícia na comunicação social portuguesa de há cem anos, apelando-se à urgência da organização dos serviços de apoio a estas vítimas. Acusavam-se as autoridades portuguesas de esquecerem estes soldados que se sacrificaram pela Pátria, não lhes pagando qualquer remuneração, por não haver nada legislado sobre o assunto. Ora, “A Capital” de 7 de fevereiro de 1918 divulga notícias animadoras a este respeito, sob o título “Pernas provisorias / Pernas definitivas”, com o subtítulo “E os nossos mutilados já marcham e já andam sem as martyrisantes muletas…” Aí se dá conta dos benéficos resultados que alguns dos mutilados estão a conhecer, manifestando a sua gratidão pelo trabalho médico. Muitos dos estropiados melhoraram bastante e alguns estão quase curados

das suas lesões, melhorando muito também o seu estado de espírito, que até então andava muito deprimido. O autor do artigo, o médico José Pontes, refere como se conseguiu o “milagre” da “cura”: «o meu collega dr. Aurelio Ferreira resolveu abreviar a execução do projecto de ter em Santa Izabel uma officina, não de prothese, mas de apparelhagem de pre-reeducação. Chamou, como artista, o soldado Bastos, que fôra mobilisado e que, em tempos e durante anos, fôra empregado d’uma casa portuense de orthopedia. E conseguiu, para dar viabilidade á sua obra, a dedicação d’um medico, que é um especialista conhecido, que se tornou notavel pelos seus conhecimentos orthopedicos e que occultando o seu nome n’esta cooperação de assistência aos mutilados, trabalha com o mesmo enthusiasmo que teem aquelles que cegam pela vaidade de fazer coisas para que conste que as fazem. D’esta maneira, improvisando “pernas artificiaes”, os mutilados da guerra já marcham e já andam sem auxilio de muletas… São quatro os militares que abandonaram as muletas, e utilizam as “pernas provisorias” (…) Não necessitaram de horas de treino para se acostumarem á marcha, tanto mais que os aparelhos não pesam muito. São feitos com duas tiras de madeira fina, a de freixo, com um bocado de cartão e com um pouco de tarlatana. Nada mais!... Movimentam-se com facilidade e manteem-se firmes e estaveis na posição em pé. Alguns d’estes militares conseguiram licenças para ir á terra. Para lá foram hontem dois d’elles, contentissimos. 91


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

- Ó sr. doutor, sou capaz de andar quatro leguas… Quando me virem imaginam que só me falta o pé… O soldado que assim dizia enganava realmente. Mexia-se bem. E de pé, empertigado, indicava que tinha uma “perna artificial”, por se ver o taco de madeira que rematava o pilão e que assentava sobre o pavimento. Depois, como o seu coto da coxa tivesse força muscular e movimentos faceis, o jogo funccional da anca parecia o de um homem normal.» Mas nem todos tiveram a mesma sorte. O articulista refere o caso de um alferes que também precisava de uma “perna provisória” mas que «tem um coto muito pequeno e, depois, esteve durante muito tempo sem o trabalho massotherapico, que é, incontestavelmente, o melhor preparador d’uma boa prothese».

4.11. A falta de homens em Portugal, no tempo da Guerra A população portuguesa, que na última década do século XIX (logo após a debelação da crise financeira de 1890) e na primeira do século XX (até à implantação da República), tinha conhecido um assinalável crescimento demográfico, viu esse ritmo positivo diminuir substancialmente no decurso da segunda década do século XX, sobretudo na sua segunda metade, muito por culpa da Guerra, mas também da Pneumónica e da Emigração. Agora vamos tratar, sobretudo, da emigração que se fez na conjuntura da Guerra, para a nossa aliada Inglaterra. 92

Fig. 42 Tropas portuguesas a caminho de França


MANUEL AUGUSTO DIAS

Em 1890, Portugal rondava os 5 milhões de habitantes, mas em 1911, já éramos quase 6 milhões (5,9 milhões), o que representa um crescimento demográfico na ordem dos 20% em 20 anos. Contudo nos 10 anos seguintes, o número de portugueses só aumentou 100 mil pessoas (6 milhões), o que representa pouco mais de 1,5% em 10 anos. Este diminuto crescimento da população portuguesa decorre de três razões que se agravaram mais na segunda metade da década de 1910: a 1.ª Guerra Mundial (1914-1918, sendo que a partir de 1917, mais de 50 mil expedicionários portugueses rumaram à “Frente Ocidental”); a Pneumónica (também chamada “gripe espanhola”, que matou dezenas de milhares de pessoas nos anos de 1918 e 1919, causando maior número de mortos entre os portugueses do que propriamente a Guerra. Houve regiões de Portugal onde morreram mais de 10% da sua população); e a Emigração (a maior parte dos portugueses emigrava para o Brasil e Estados Unidos da América, e, depois da Guerra, também para a Argentina e Venezuela). Contudo, durante a 1.ª Grande Guerra, houve saída de muitos dos homens válidos que não foram mobilizados para a Guerra, para trabalharem na Inglaterra, como serradores, carpinteiros e outras profissões do género, em substituição dos ingleses que desempenhavam esses ofícios e que tinham sido recrutados para o conflito. Para este baixo crescimento populacional da 2.ª década do século XX também contribuiu a elevada taxa de mortalidade infantil, demonstrando como naquele tempo os serviços de saúde pública ainda eram muito débeis num país que mantinha um perfil predominantemente rural. A população trabalhadora rondava os 50% e entre as mulheres, trabalhavam cerca de 25 %. A maior parte delas

estava ligada às atividade domésticas, não trabalhando fora do ambiente familiar. A população portuguesa das primeiras décadas do século XX distribuía-se maioritariamente pelas duas cidades mais importantes de Lisboa e Porto e eram também os distritos da faixa ocidental que tinham maior densidade populacional, pois aí vivia mais de 50% da população portuguesa (Braga, Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria, Santarém, Lisboa e Setúbal). Estes 8 distritos correspondem sensivelmente a um terço da área de Portugal continental. Dada a pequenez, em termos populacionais, do nosso país de há um século, Portugal teve de fazer das tripas coração para conseguir abastecer com homens e equipamento militar, em permanência, as três frentes de Guerra em que interveio: Angola, Moçambique e Flandres. Mais de cem mil homens foram recrutados para as fileiras do exército e como se tal não bastasse, e não fosse já sangria bastante para se fazer notar ao nível da produtividade agrícola e industrial, e ao nível da própria estrutura familiar, ainda saíram milhares de homens para trabalhar em países estrangeiros, nomeadamente em França e na Inglaterra. Num dos jornais que consultámos encontramos várias referências a estes milhares de emigrantes portugueses que as necessidades da Guerra atraíram. No diário republicano conservador “A Opinião” (de 25 de julho de 1917) que se publicava em Lisboa, encontrámos, logo na primeira página, a divulgação do conteúdo de um prospeto publicitário, que era distribuído em várias feiras/mercados semanais por todo o país (este foi recolhido na Feira de Santo Tirso), onde eram amplamente anunciadas as enormes vantagens em ir trabalhar para o estrangeiro, neste caso para a Inglaterra. 93


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Os maiores benefícios garantidos eram as viagens grátis até ao local de trabalho, fornecimento de casa, cama e roupa para a cama, alimentação desde Lisboa até ao local de trabalho e a possibilidade de ganharem duas libras de ouro, por semana, ou até mais. Para as famílias depauperadas por tantos sacrifícios e privações, que tivessem homens válidos esta oferta sabia a “sorte grande”. Aí vai o conteúdo desse folheto “miraculoso”: «Passagens Gratis / Para a / Gran-Bretanha / (Inglaterra) / Concede-as a Agencia Annibal / Vieira D’Abreu, Suc. / Rua do Loureiro, 40 – Porto / (Em frente á Estação de S. Bento). O governo inglez necessita de serradores, carpinteiros e outros individuos habilitados a trabalhar em serviços semelhantes, que se encarreguem de cortar arvores e traçal-as. O recrutamento d’estes individuos é feito em Portugal e o governo inglez oferece as seguintes vantagens: 1.º - Viagens gratis até ao local de trabalho em Inglaterra desde a estação do caminho de ferro da cabeça de Districto, e ali, casa, cama e roupa para a cama bem como alimentação desde Lisboa até ao local de trabalho. 2.º - Ordenado mínimo de UMA LIBRA OURO, por cada semana de trabalho, sendo o trabalho diario de 9 horas, mas se trabalharem mais horas, estas serão pagas á parte e por maior preço. Os contratados podem querendo, trabalhar por empreitada e n’este caso pódem ganhar DUAS LIBRAS OURO por semana e mais. Podem seguir para aquele paiz / 1.º - Todos os individuos que se encontrem isentos definitivamente do serviço militar, o que devem provar com a sua resalva (sic) militar. / 2.º - Todos os individuos que embora não 94

se encontrem isentos definitivamente do serviço militar, mostrem pela sua caderneta militar (documento que devem apresentar) ter mais de 31 annos. N’este numero estão comprehendidos aqueles que tendo sido presentes ás juntas da revisão ficaram apurados ou foram isentos condicionalmente, isto é, estes também pódem seguir desde que tenham mais de 32 annos. / 3.º - Todos os individuos com mais de 45 annos e menos de 52 que se verifique terem a robustez precisa. Estes devem ser portadores da sua certidão de edade devidamente reconhecida, se esta não fôr do Registo Civil. Como esclarecimento devemos declarar que todos os indivíduos que seguiram para Inglaterra aproximadamente ha 10 mezes teem mandado para suas famílias quantias que variam entre 500$000 e 600$000 réis». Eram dados, depois, esclarecimentos concretos para os interessados saberem onde podiam encontrar os encarregados pelo representante do governo inglês do recrutamento de trabalhadores portugueses para emigrarem para Inglaterra. No caso dos eventuais interessados da região de Santo Tirso, os folhetos distribuídos davam os seguintes esclarecimentos complementares: «O agente encarregado pelo representante do governo inglez de recrutamento de trabalhadores para Inglaterra, encontra-se todas as segundas-feiras na Vila de Santo Tirso, na relojoaria do sr. Avelino Carneiro Pinto para fazer os contractos dos indivíduos que queiram seguir para aquele paiz e dar as informações precisas. Os contractados teem de apresentar seis retratos em ponto pequeno para colar nos passaportes e nos restantes documentos do contracto. Há ainda uma pequena despeza a fazer que por diminuta não se menciona».


MANUEL AUGUSTO DIAS

4.12. Batalha de La Lys

A Batalha de La Lys ocorreu precisamente há cem anos. Começou na madrugada do dia 9 de abril de 1918 e prolongou-se por mais alguns dias. O nosso esforço de guerra foi grande, sobretudo em França, tendo-se saldado por um enorme endividamento público que trouxe grandes dificuldades financeiras à República que, de crise em crise (política, económica e social), sucumbiria em 28 de maio de 1926, perante uma ditadura militar, que evoluiria, a partir de 1933, para o “Estado Novo” salazarista e marcelista, que só findou com a revolução de “25 de Abril de 1974”. As baixas humanas portuguesas na 1.ª Guerra Mundial foram uma consequência ainda mais terrível: 2100 mortos em França (em dois anos de guerra); 4811 mortos em Moçambique (ao longo de 4 anos de combates); 810 mortos em Angola (durante os dois anos de luta). Feridos e incapacitados foram quase 15000 e os desaparecidos atingiram cerca de 6000. Efetivamente, os portugueses não podem esquecer os dias dessa terrível batalha, porque La Lys marcou tragicamente a participação portuguesa na “Frente Ocidental” da 1.ª Grande Guerra, tantos foram os mortos, os feridos e os desaparecidos em combate.

Fig. 43 9 de Abril de 1918 – Batalha de La Lys

Nesse dia, a frente de combate estendeu-se por 55 quilómetros, estando o lado dos Aliados guarnecido pelo 11.° Corpo Britânico, do qual faziam parte 84000 homens, entre os quais cerca de 20000 portugueses que integravam a 2.ª divisão do Corpo Expedicionário Português (CEP), superiormente comandado pelo general Gomes da Costa. Oito divisões do 6.º Exército Alemão pretendiam concretizar a ofensiva germânica, que visava ultrapassar o rio Lys e tomar as cidades de Calais e Boulogne-sur-Mer. 95


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. 44 Lançamento de gases na batalha de La Lys

96

Os alemães iniciaram um violento bombardeamento de artilharia cerca das 4 horas e 15 minutos da madrugada e apenas em 15 minutos destruíram todas as comunicações por fio entre a “frente” e o quartel-general português. O assalto às trincheiras portuguesas ocorreu por volta das 7 horas. Quatro divisões alemãs, isto é, cerca de cem mil homens, avançaram contra 20000 portugueses.

Nas trincheiras, onde a sobrevivência era dura (frio, fome e humidade), estavam soldados portugueses misturados com os ingleses numa convivência difícil, dada a dificuldade de comunicarem por desconhecimento mútuo das línguas (é preciso lembrar que muitos soldados portugueses nem o ensino primário tinham e, por isso, o desconhecimento da língua inglesa era absoluto).

Apesar de vários exemplos de resistência verdadeiramente heroica, especialmente por parte da 4.ª brigada portuguesa, a verdade é que os soldados portugueses são submersos por esta ofensiva maciça. As tropas portuguesas, ao longo das intermináveis primeiras quatro horas das trinta que a batalha durou, perderam à volta de 7500 homens, contando mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros, entre os quais 327 oficiais e muitas centenas de sargentos.

O exército português desmoralizado e inferior em número foi esmagado. Entre as várias razões que explicam esse estrondoso e dramático desenlace são, normalmente, apontadas as seguintes: o facto das tropas inglesas terem recuado nas suas posições, deixando mais vulneráveis os flancos do CEP; o golpe militar sidonista de dezembro de 1917, que quase abandonou os combatentes portugueses à sua sorte, não fazendo a prevista substituição dos soldados portugueses na “frente”; Sidónio Pais chamou


MANUEL AUGUSTO DIAS

a Portugal muitos oficiais com experiência de guerra que não regressaram ao seu posto de comando e lá fizeram falta; o armamento alemão era muito melhor em qualidade e quantidade que o português e o inglês; e o ataque alemão foi desferido no dia em que as tropas portuguesas tinham recebido ordens para irem para posições à retaguarda.

Testemunho do capelão Manuel Caetano sobre o 9 de Abril O Padre Manuel Caetano, Capelão Militar na “Frente” dá o testemunho, na 1.ª pessoa, sobre como viveu o dia 9 de Abril de 1918. As suas palavras, datadas de 21 de abril de 1918, foram publicadas em “O Mensageiro”, edição do dia 16 de maio de 1918, na primeira página. Na transcrição, os espaços entre parêntesis retos, correspondem a texto cortado pela censura que no jornal aparecem em branco, por se referirem a locais que não podiam ser identificados. «Como estou vivo? Pela protecção da Virgem. Estava com a 6.ª B. I. em [ ] Pelas quatro e um quarto, começou um bombardeamento infernal. Nem no Somme foi tão intenso. Calculam em 60:000 as granadas de gaz! A barragem em volta de [ ] tornava impossivel a passagem. Um oficial do C. M. duas vezes tentou atravessar a barragem para ir á séde da Brigada, mas teve de desistir. Pelas 6 horas cái ferido um oficial com quem eu estava e mais dois oficiaes. Conduzo-os á secretaria, que se

transformou em P. S. (Posto de Socorros). Uma granada lança fôgo á casa da Brigada. Duas cáem na cavalariça e matam e ferem parte dos solipedes. Apenas um se salvou. As communicações estão cortadas. Não se sabe o que se passa na frente. Da retaguarda não se recebem ordens. O bombardeamento continúa violento, intenso. Da artilharia pedem noticias e perguntam quaes os pontos que devem ser batidos. Anuncia-se que há oficiaes feridos e que é preciso um carro de transporte. Ao nosso P. S. continuam afluindo grande numero de feridos militares e civis. O comando não tem elementos para proceder. Manda ordens aos batalhões por meio de estafetas, e ciclistas, mas estes vão e não voltam. O motociclista é ameaçado de morte porque tendo sido encarregado de levar duas notas á Direcção em [ ] volta sem ter cumprido a missão, tendo abandonado a moto. O estado do alferes ferido, Francisco Pinto Vidigal, agrava-se. É preciso evacua-lo imediatamente. Mas… não ha carros transportes. O bombardeamento, incidindo de preferencia sôbre as estradas torna difícil, senão impossivel a passagem. O dignissimo comandante, Coronel Pedrosa, lembra-se então do carro ligeiro da Brigada. É preciso um oficial para o acompanhar. Pergunta quem se presta a isso. Foi o Capelão, que estava com o dr. Adelino Fernandes, tratando um ferido civil, quem se oferece para esse serviço. Manda-se vir o carro. Neste meio tempo chegam dois ciclistas e um motociclista dizendo não terem podido passar e sem terem cumprido a missão de que tinham sido encarregados. Oferece-se o capelão para tambem desempenhar essa missão. 97


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Seriam 8 e meia horas, quando saí da Brigada. Tomei o caminho de [ ] A estrada estava cortada em vários pontos. O nevoeiro era densissimo. O fumo das granadas tornava-se por vezes espesso. Muitas vezes tinhamos que parar. Marchavamos sempre a passo. As granadas rebentavam constantemente. O ar estava envenenado pelos gazes. Depois de muitos trabalhos e de perigos constantes chegamos a [ ] Ahi caiu uma granada junto do nosso carro. Entreguei os documentos que trazia, perguntei onde devia deixar o ferido, pedindo para mandar imediatamente 2 carros a [ ] Mandaram-me para a Ambulancia 7, em [ ] Fui. Já estava abandonada. Em [ ] era um horror! Cadaveres e feridos! Aqui o bombardeamento era estupendo por motivo dos depositos ali existentes. Deixei o ferido na Ambulancia 1, em [ ]

O rebentar das granadas era constante, ininterrupto. Eu, como uma simples machina, já indiferente a tudo e a tudo disposto, avançava louco, apavorado. Um horror que ainda hoje me faz tremer! Depois de uma hora de viagem, sempre com a morte deante dos olhos, cheguei ao comando do batalhão de infantaria 5. Rodeiam-me e perguntam-me donde venho. Sem poder falar, apresento os documentos de que era portador.

Parte da minha missão estava cumprida. Faltava a mais espinhosa: Levar as ordens aos batalhões. Dirigi-me á estrada de [ ] passando por [ ] Os nossos batalhões de reservas avançavam. Deviam ser 10 horas.

Perdi tudo. Só tenho o fato do corpo. (…)».

Cheguei a [ ] na estrada [ ] encontro dois automoveis e 3 camiões abandonados e espatifados. Meter o carro na estrada seria portanto uma imprudencia. Mando-o abrigar junto de uma casa. Visto um capote de soldado, digo ao chauffeur: se eu me demorar mais de uma hora, vá dizer á Brigada que estou ferido ou morto. Meto-me a pé pela estrada fóra. Neste momento estava louco, mas era preciso cumprir as ordens. A barragem nesta estrada era simplesmente cerrada. A estrada estava coberta de ferro, arvores cortadas, restos de casas destruídas. 98

Perguntam-me quem sou. Tiro o capote e mostro a cruz do braço. Todos á uma perguntam: como foi possível fazer a travessia de [ ] aqui? Peço recibo e parto em direcção á [ ] (…) Vou dizer missa pelos mortos. Depois darei informações. No seu Boletim do CEP, o texto justificativo do Louvor confirma o conteúdo do seu testemunho: «Louvado porque durante a batalha de 9 de Abril mostrou decidida coragem e assombroso sangue frio na transmissão d’ordens atravez de zonas bombardeadas e estradas barridas por metralhadoras inimigas, salvando nos trajectos percorridos, alguns feridos graves. Ordem do Q.G.C, n.º 151 de 5 de junho»


MANUEL AUGUSTO DIAS

4.13. Armistício

Fig. 45 Ilustração relativa à assinatura do Armistício e seus intervenientes no interior da carruagem (11-11-1918)

O cessar-fogo ou o Armistício com que terminaria a Primeira Grande Guerra, de tão má memória para Portugal, entrou em vigor às 11 horas do dia 11 do mês 11 (novembro) de 1918. O dia 11 de novembro de 1918 encheu de contentamento muitos milhões de pessoas que se viram finalmente livres da Guerra, com a definitiva rendição da Alemanha. O local da reunião, que durou três dias, foi mantido em segredo: só algumas fotografias e desenhos testemunham a existência do encontro. Com a assinatura do Armistício entre as delegações dos principais países beligerantes, chegariam ao fim as hostilidades que duraram 4 anos e três meses.

Nesta reunião em que se deliberou o fim da Guerra participaram, do lado dos Aliados, o General Weygand, o Marechal Foch, os Almirantes Britânicos Rosslyn Wemyss e G. Hope; e, do lado alemão, o Ministro de Estado Matthias Erzberger, o General Detlof von Winterfeldt do Exército Imperial, o Conde Alfred von Oberndorff dos Negócios Estrangeiros e o comandante Ernst Vanselow da Marinha Imperial. Foi dentro de um vagão de comboio, na floresta de Compiègne, que foi assinado o Armistício de Compiègne, entre os Aliados e a Alemanha, que poria fim às hostilidades na frente ocidental da Primeira Guerra Mundial, em que Portugal também participou com milhares de homens, quer na defesa das nossas colónias em África, quer no teatro de guerra, na Europa Ocidental. Terminada a Guerra impôs-se reorganização do mapa político da Europa e o estabelecimento de uma nova ordem internacional. Os tratados de paz, assinados em 1919 e 1920, alteraram profundamente o mapa político europeu, ao confirmarem a desintegração dos impérios Alemão, Austro-húngaro, Russo e Otomano que deram origem a novos países independentes, sobretudo no leste Europeu. Deste modo, a realidade política e étnica foi substancialmente modificada, criando novos problemas no relacionamento entre as nações. Na sequência da “Conferência de Paris” (1919) foi fundada a SDN (Sociedade das Nações) com o objetivo prioritário de estabelecer uma nova ordem internacional, em que as relações entre estados seriam reguladas pelo direito internacional, acreditando-se, assim, que, de futuro, seria evitado o recurso à guerra para a resolução dos conflitos. 99


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

A sede da SDN foi em Genebra (Suíça) e Afonso Costa (grande estadista português da Primeira República) chegou a ser eleito (em março de 1926) para presidir à sua sessão extraordinária. O facto dos EUA não a integrarem e de ser obrigatória a unanimidade de decisões limitou, como se sabe, a sua eficácia que foi posta definitivamente em causa com o eclodir da 2.ª Guerra (1939). Mas, deste 1.º conflito mundial, houve consequências que não podemos ignorar: a Europa habituada a dominar o mundo (nos aspetos económico, financeiro, político, militar e cultural) vê-se, subitamente, debilitada em resultado da Guerra que matou milhões de pessoas, feriu e mutilou ainda mais, inutilizou terras e fábricas, criou enormes défices orçamentais, aumentou desmesuradamente a dívida pública e provocou extraordinários surtos inflacionistas. Este cenário verdadeiramente devastador esteve na origem de grande agitação social e política que provocou a implementação dos regimes ditatoriais, como foi o caso da Rússia (com o triunfo da Revolução Bolchevique), da Itália (com a ascensão política de Mussolini) e de Portugal, que viu definhar a sua 1.ª experiência democrática da 1.ª República, substituída, a 28 de maio de 1926, por uma ditadura militar que evoluiria, já na década de 1930, para o “Estado Novo” salazarista. A Europa, como continente, conheceria, paulatinamente, a perda da sua hegemonia internacional para os EUA (Estados Unidos da América), que conseguiram um enorme desenvolvimento económico à custa da Europa que não conseguia produzir para si nem para os seus mercados internacionais. 100

Assinada a paz, a economia americana conhece uma depressão, mas consegue a reconversão rápida e a década de 1920-1929 foi de uma grande prosperidade económica, à custa do crescimento do mercado interno, do desenvolvimento comercial, industrial e da especulação bolsista. O progresso técnico e o “fordismo” são também fatores importantes dessa prosperidade. No início dessa década, os EUA tinha cerca de metade do “stock” de ouro mundial. Já no pós-2.ª guerra mundial, a Europa iniciou uma nova aposta: a sua união, como forma de recuperar o tempo perdido. É aí que, atualmente, nos situamos à espera de melhores dias, no contexto da política internacional.

4.14. Os primeiros “heróis” desembarcaram a 23 de novembro de 1918 Na manhã do dia 23 de novembro de 1918, chegavam a Lisboa, os primeiros combatentes portugueses, após a assinatura do Armistício, ocorrido 12 dias antes. Eram 485 militares do CEP, que bem poderiam ser titulados de heróis e de vitoriosos. Mas, apesar de ser Sábado, para além de alguns familiares e das entidades representativas do Estado e das Forças Militares, não havia mais ninguém para receber festivamente aqueles que tanto tinham sofrido na frente de combate, ao serviço da Pátria. A bordo vinha também, aquele que poucos anos depois se haveria de cobrir de glória, o então capitão tenente piloto aviador da Armada, Artur de Sacadura Freire Cabral.


MANUEL AUGUSTO DIAS

A imprensa cumpriu bem a sua missão. O jornal “A Capital”, por exemplo, carregou nos diversos títulos da notícia: como antetítulo escolheu “Ditosa Patria que taes filhos tem”, como título propriamente dito, “O Regresso dos Heroes” e subtítulo “Voltaram hoje da França amada, soldados portuguezes”. Elogia os heróis que regressam da Guerra que venceram e critica o povo de Lisboa que não os recebe condignamente. «(…) Fômos assistir, ha poucas horas ainda, ao desembarque dos nossos soldados, que da terra sagrada da França, cobertos de gloria, cheios de honra, regressam alegres, depois da Victoria. A muitos d’elles foi um acendrado patriotismo que para lá os arrastou, a crepitar no altar a chamma ardente dos grandes ideaes; outros partiram porque o dever lhes apontou esse caminho, á primeira vista eriçado de escolhos, repleto de perigos, no termo, afinal, tapetado de honras e de heroismos.

Fig. 46 O primeiro desembarque de combatentes portugueses após o Armistício (Ilustração Portuguesa 2-12-1918)

(…) Regressaram os heroes, simplesmente, sem alarido, quasi sem enthusiasmo. A população do Lisboa, que outr’ora vibrava em enthusiasmo nos grandes dias, não os foi receber festivamente – como devia, como era dever imperioso de todos nós, cujo futuro, com o seu sangue e o seu braço, elles garantiram solidamente. Dir-se-hia, na quasi indifferença que observámos, ter-se quebrado na alma do lisboeta aquella corda tão sensivel, tantas vezes clangorando sons magestosos de epopeia, nas occasiões solemnes em que o delirio dos grandes momentos o tomava todo.

101


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Aparte pessoas das famílias dos soldados, viam-se apenas alguns curiosos o duas ou tres pessoas que o dever do officio para lá obrigou a ir – áquella maçada, como ouvimos, indignados, a uma d’ellas. No emtanto, os nossos heroicos soldados, indifferentes á frieza da recepção vinham alegres, prazenteiros (…)». Este último excerto dá razão ao Padre José Ferreira de Lacerda, Alferes capelão-militar da 3.ª Brigada de Infantaria e Diretor de O Mensageiro, de Leiria, que aí fez publicar alguns artigos escritos na Guerra, com o título geral «Em Campanha». No artigo saído a 1 de agosto de 1917, e escrito a 20 de julho de 1917 afirma: «Conheço o nosso soldado, actualmente, desde a caserna até às trincheiras, desde o sobrado da casa que nos serve de capela e onde centenas e centenas deles, todos os dias, vão orar, buscar alentos, revigorar a fé, até ao momento em que os vejo saltar a trincheira, altas horas da noite, para seguirem ou voltarem de alguma patrulha ou raid. Sempre risonhos, sempre valorosos. Não há soldados como os nossos. (…) O povo é inconsciente, é a eterna criança. Às horas que eles aí dançam e cantam, estão os irmãos e os filhos a cair varados por balas, estilhaços de morteiros e gazes. Não calcula o que sinto, o sofrimento do nosso soldado. E são tão bons, tão dóceis! Que impressão ao verem a morte sempre diante deles! (…)».

4.15. A celebração da Vitória A vitória dos Aliados foi celebrada de forma entusiástica um pouco por todo o mundo, mas sobretudo por parte dos países vencedores, como foi o caso de Portugal. O Corpo Expedicionário Português, que combateu em França, entre fevereiro de 1917 e novembro de 1918, revelou uma inovadora preocupação de documentar, para memória futura a sua participação ao lado dos Aliados Ocidentais, Inglaterra e França. Por isso, seguiram para a Flandres, integrados no CEP um pintor – Adriano Sousa Lopes (já acima referido), e um fotógrafo – Arnaldo Garcês. Este último, Arnaldo Garcês Rodrigues, de seu nome completo, foi o fotógrafo oficial do mesmo Corpo Expedicionário. Muitas das imagens da linha da frente, dos combatentes portugueses, na Flandres foram da sua autoria e muitas delas foram publicadas na “Ilustração Portuguesa”, revista semanal do jornal “O Século”. Arnaldo Garcês Rodrigues nasceu em Santarém no dia 18 de outubro de 1885 e era filho de Joaquim Garcês e de Maria Amália Rodrigues. Quando, ainda novo, chegou a Lisboa, com a sua família a sua primeira ocupação profissional, após a conclusão do ensino primário, foi a de aprendiz de relojoeiro. Pouco depois, descobriria que era a fotografia sua verdadeira vocação. Num tempo em que a fotografia dava ainda os primeiros passos e em que a maior parte dos jornais não publicava fotografia nenhuma, Arnaldo Garcês, revelando grande gosto e jeito para a fotografia, começou a fazer trabalhos

102


MANUEL AUGUSTO DIAS

que agradaram a jornais de Lisboa, granjeando nessa arte alguma fama e prestígio, ao ponto do Ministro da Guerra, Norton de Matos, máximo responsável pela criação do Corpo Expedicionário Português, em 1916, o convidar para acompanhar a preparação dos nossos combatentes em Tancos. Em termos de formação escolar tinha apenas a instrução primária, mas foi um autodidata que procurou aumentar os seus conhecimentos, sobretudo de fotografia, em livros mais técnicos, alguns deles em língua francesa. Antes da Guerra já havia feito a reportagem fotográfica da Implantação da República. Depois da preparação do CEP em Tancos, fotografou a partida do primeiro contingente português, o Treino Militar na Flandres e o Quotidiano das Trincheiras, com a preocupação de não fotografar feridos, mortos ou os massacres da Guerra, pois, a censura que surgiu no contexto da Guerra não permitiria a divulgação de imagens que mostrassem o sofrimento dos nossos soldados nas trincheiras. Arnaldo Garcês integrou a força expedicionária à Flandres, pertencendo ao Quartel-General do Corpo, Secção Fotográfica, ficando, explicitamente, isento do serviço militar propriamente dito. Foi Alferes graduado. Embarcou em Lisboa, no dia 17 de fevereiro de 1917. No dia 11 de julho de 1919, por despacho do Estado-Maior Interino, Arnaldo Garcês Rodrigues, recebe guia de marcha para seguir no dia 12 de julho para Paris a fim de desempenhar o serviço da sua especialidade, a cobertura do “Desfile da Vitória”, no dia 14 de julho de 1919, onde desfilaram 400 combatentes portugueses.

Fig. 47 Desfile da Vitória, em Paris, no dia 14 de julho de 1919

No Desfile da Vitória em Paris, que decorreu no aniversário da Tomada da Bastilha, os soldados do Corpo Expedicionário Português, integrado nas forças aliadas do marechal Foch, desfilaram na Place de L’Etoile sob o comando do Major de Infantaria Ribeiro de Carvalho, tendo como Porta-bandeira o Tenente de Infantaria Perestrello D’Alarcão e Silva, do Regimento de Infantaria n.º 22. Arnaldo Garcês fotografa, igualmente, a participação dos batalhões de combatentes portugueses nas festas da vitória que se realizaram em Bruxelas e em Londres, nos dias 22 e 29 de julho de 1919, respetivamente.

103


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. 48 Desfile das tropas portuguesas em Bruxelas

Em Bruxelas, no dia 22 de julho de 1919 desfilou um contingente do Corpo Expedicionário Português, que se integrou no Cortejo das Forças Aliadas sob o comando do Major de Infantaria André Brun, tendo como Porta-bandeira o Tenente de Infantaria Perestrello D’Alarcão e Silva. A este evento histórico de particular relevância, assistiram na Tribuna de Honra, entre outras entidades, o Rei Alberto da Bélgica e o Rei D. Manuel II (no exílio),

Fig. 49A Amigável receção em Londres às tropas portuguesas

Fig. 49B Desfile das tropas portuguesas em Londres 104


MANUEL AUGUSTO DIAS

Londres, capital do império britânico, velho aliado de Portugal, organizou uma imponente “Parada da Vitória” onde viu desfilar os seus militares, bem como outros representando as nações aliadas, como era o caso de Portugal. Os soldados que representavam o Corpo Expedicionário Português passaram frente à Tribuna de Honra, onde se encontrava o rei inglês, Jorge V, e também D. Manuel II (ali exilado e que, durante a Guerra, desempenhou relevante papel no auxílio aos soldados nacionais) tal como sua mãe, a Rainha D. Amélia.

Também Lisboa, no dia 14 de julho de 1919 transformado propositadamente em feriado nacional, para celebrar a Assinatura da Paz, organizou uma pomposa Parada Militar em que participaram soldados portugueses e americanos.

Fig. 50A A Festa da Paz em Lisboa (Ilustração Portuguesa, 21-7-1919)

105


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Da “Ilustração Portuguesa” de 21 de julho de 1919, transcrevemos o apontamento de reportagem que se segue. «Tambem em Lisboa se comemorou festivamente o dia 14 de Julho, a gloriosa data da França republicana, que fica d’ora em deante perpetuando a celebração da mais imponente cerimonia de toda a historia contemporanea – a assinatura do tratado de paz entre os paizes aliados e associados e a Alemanha. Todavia, aqui, as festas da Paz, que foram levadas a efeito com a maxima solenidade e entusiasmo, tiveram um outro assinalado motivo, que constituiu ainda uma larga manifestação de merecido orgulho nacional. Prestou-se homenagem aos nossos heroes da grande guerra, outros lidimos precursores da libertação do jugo teutonico, que ameaçava estender-se a todo o órbe. D’entre as diversões comemorativas, a que revestiu maior brilhantismo, foi a parada militar, que o sr. presidente da Republica passou em revista, e em que, além dos contingentes das guardas republicana e fiscal, da armada e dos outros corpos da guarnição de Lisboa, tomaram parte deputações das unidades do C. E. P. e alguns mutilados. A uns e outros, foram particularmente dispensadas entusiasticas ovações, de que participaram os marinheiros americanos que, incorporados no cortejo militar, prestaram o seu concurso á consagração do ultimo feito das nossas armas.»

106

Fig. 50B Um aspeto da Parada Militar de Lisboa, no Dia da “Festa da Paz” 14 de julho de 1919


MANUEL AUGUSTO DIAS

5. Os expedicionários de Valongo Serve este capítulo para tratar especificamente do esforço de guerra que o município de Valongo, à semelhança do resto do País, fez no período da Grande Guerra, que terminou há um século.

longuenses, ao passo que só em Moçambique morreram 41 soldados naturais do município de Valongo. Todos eles serão identificados, freguesia a freguesia, mais para diante.

Os dados disponíveis não nos permitem afirmar que os combatentes identificados como sendo naturais do município de Valongo e que discriminamos freguesia a freguesia (considerando a divisão administrativa anterior à reforma de 2013) sejam todos os que efetivamente serviram a Pátria portuguesa, quer na campanha de África, quer na da Flandres, durante a Primeira Grande Guerra.

Só para se poder fazer uma comparação com o vizinho concelho de Gondomar, este tinha em 1920, 41.818 habitantes (quase 3 vezes mais que o concelho de Valongo, na mesma data, que tinha 14.763) e mobilizou para a Flandres 251 combatentes (se fosse também 3 vezes mais combatentes que Valongo, deveriam ter sido apenas 168, já que Valongo viu saírem para França 56). Já agora faça-se também a comparação entre Rio Tinto e Ermesinde. A freguesia de Rio Tinto tinha em 1920, 11.105 (2,5 vezes mais que a população de Ermesinde, na mesma data, que era 4403) e mobilizou para a Flandres, meia centena de combatentes (se fosse também 2,5 vezes mais combatentes que Ermesinde, deveriam ter sido apenas 35, já que Ermesinde só contribuiu com 14). De Rio Tinto morreram 7 soldados em África (6 em Moçambique e 1 em Angola), de Ermesinde morreram 15, todos em Moçambique.

De facto, o Arquivo Geral do Exército, em Lisboa, onde existem os processos microfilmados dos expedicionários que foram enviados para a África Portuguesa (sobretudo para Angola e Moçambique), logo após o início da Grande Guerra, no verão de 1914, tem-se confrontado com dificuldades técnicas que inviabilizaram uma maior profundidade neste trabalho de pesquisa. É minha convicção que o município de Valongo foi chamado a um maior esforço de mobilização para a África (principalmente para Moçambique) do que propriamente para a Flandres, ao contrário do que aconteceu na generalidade dos concelhos do país, mormente no centro. Para a Flandres, ao serviço do Corpo Expedicionário Português, estiveram pouco mais de meia centena de va-

107


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. A – Tropas de Artilharia sobre o tabuleiro superior da Ponte de D. Luís, no Porto, a caminho de Valongo (Ilustração portuguesa de 26-10-1914)

108


MANUEL AUGUSTO DIAS

Desde o início da Grande Guerra, como se pode ver na Cronologia, no final desta publicação, várias expedições de militares saíram de Portugal, com o objetivo de ir reforçar as tropas colonialistas (entre estas contavam-se muitos soldados indígenas, recrutados e treinados por sargentos e oficiais idos da metrópole), na defesa do sul de Angola e do norte de Moçambique que haviam sido atacados sem qualquer prévia declaração de Guerra. Assim, logo no dia 18 de agosto de 1914, foi tomada a decisão de ser organizarem expedições militares com destino a Angola e Moçambique, para proteger as colónias de incursões ou ataques alemães e menos de um mês mais tarde, a 11 de setembro de 1914 seguia para Angola um corpo expedicionário de 1.500 homens, sob o comando do tenente-coronel Alves Roçadas, bem como uma expedição militar para Moçambique, comandada por Pedro Massano de Amorim. No dia 1 de novembro de 1914

chegava a Porto Amélia, no norte da colónia de Moçambique, o primeiro contingente militar. Era composta por um batalhão, uma bateria e um esquadrão. Quatro dias depois, a 5 de novembro de 1914, novo contingente militar para Angola, comandado pelo capitão-tenente Coriolano da Costa. Tornavam-se preocupantes os incidentes com tropas alemãs nas zonas de fronteira. Já em outubro de 1915, partem de Lisboa novos contingentes militares para Moçambique sob o comando de Álvaro de Castro (infantaria, cavalaria, sapadores mineiros e artilharia). Já no final do mesmo mês partem mais tropas com destino a Angola, a bordo do “Zaire”. No mês seguinte (novembro de 1915), mais uma expedição para Moçambique, sob o comando de Moura Mendes, major de artilharia. Em maio de 1916 partiu uma terceira expedição militar para Moçambique e em janeiro de 1917, uma quarta expedição.

109


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. B – Ilustração portuguesa de 26-10-1914 mostrando os soldados recrutados no norte em exercícios nas serras de Valongo

110


MANUEL AUGUSTO DIAS

Um episódio da Guerra em Moçambique Considerando o tamanho de Portugal, o esforço português foi enorme para juntar as forças expedicionárias que haveriam de defender o império português, tendo vivenciado situações de guerra continuada na África e na Europa. O total de homens mobilizados para o cumprimento do serviço militar atingiu os 150 mil. O envio de militares para a África acabava por ser bem entendido por todos, uma vez que se tratava de garantir a sobrevivência da soberania portuguesa naqueles territórios coloniais que, sem qualquer declaração de guerra, foram atacados em 1914 pelas forças alemãs, ao passo que a participação das nossas tropas na Frente Ocidental foi claramente de natureza política. A verdade é que no ano de 1917 dezenas de milhares de combatentes portugueses rumaram a França e granjearam o interesse da imprensa, que quase esqueceu os nossos soldados em África. O jornal “Portugal” (Diário do Partido Republicano Português) de 27 de outubro de 1917 traz o assunto para a sua primeira página, sob os títulos “Os Esquecidos / Os nossos soldados em Africa são dignos rivais dos “serranos” / Um episodio da Campanha no Nyassa”. A certa altura transcreve um depoimento do sargento José da Silva Ribeiro, referente a uma força de reconhecimento enviada a Nevala que seguiu pela margem Norte do Rovuma, em que participaram a 21.ª e a 24.ª companhias que caíram numa emboscada, a 4 de Outubro, preparada pelos alemães. Seguem-se alguns excertos desse testemunho.

«Eram quasi quatro horas da tarde quando a coluna seguia a estrada numa parte em que, do flanco direito, era vedada por mato muito alto e espesso, impenetrável, e onde a vista não atingia mais de 3 a 4 metros pelas malhas apertadas daquele tecido de verdura, havendo tambem do flanco esquerdo mato emaranhado, mas mais baixo. / Quando o meu pelotão, que seguia na testa do grosso da coluna, entrava numa curva suave que a estrada fazia para a direita, ouve-se um tiro na frente, imediatamente seguido de fogo vivíssimo, que vinha de mato do lado direito, e que parecia quasi feito á queima-roupa. É facil calcular a nossa primeira impressão. Em poucos segundos o meu pelotão estendeu em frente ao mato. O comandante, tenente Tavares, ainda de pé e segurando uma mula que escouceava, mandou abrir fogo vivo. Estavamos numa ratoeira. A estrada era batida de entrada por fogos de metralhadoras, que se cruzavam com o fogo violento que nos era dirigido do mato. / Do lado oposto havia um precipicio que o mato ocultava, um escarpado cortado quasi a pique e que devia servir de sepultura a muitos se se tivesse estabelecido a confusão com que os alemães contavam para o seu plano. E por isso ele lhes saiu frustrado. (…) O combate durou quasi uma hora, tendo os alemães de desistir do seu intento, desmoralisados por tão energica resistencia. / Concentrámo-nos numa vasta clareira e preparámo-nos para ali ficar, começando a abrir trincheiras. / Verificámos então que as nossas baixas eram: na 21.ª companhia o alferes Camisão, 1 sargento e 1 cabo europeus mortos e não me recordo se 6 ou 7 indigenas, e na minha companhia 2 indigenas mortos e 2 feridos, todos do meu pelotão.» 111


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Dos 56 combatentes valonguenses que serviram a Pátria na Flandres acabaria, felizmente, por morrer apenas 1, o 2.º Sargento, Manuel Ferreira dos Santos Júnior, natural de Ermesinde. As freguesias de Ermesinde e de Valongo foram as que sendo mais povoadas contribuíram também com maior número de expedicionários, 14 cada uma. Seguiu-se Alfena e Campo, com 12 cada uma e, por último, Sobrado com apenas 4 combatentes. Dividindo os 56 militares por postos, temos: 42 soldados, 8 primeiros-cabos, 5 segundos sargentos e 1 primeiro-sargento.

5.1. Contextualização histórica do município valonguense no tempo da Guerra

Relativamente aos combatentes naturais do concelho de Valongo que faleceram em Moçambique, durante a Primeira Grande Guerra, apurámos a seguinte lista (por ordem decrescente): Ermesinde, 15; Campo, 8; Valongo, 7; Sobrado, 6; e Alfena, 5. A partir do subcapítulo 5.2, discriminar-se-ão os combatentes que foi possível identificar na documentação disponível de todo o município valonguense, que integraram o Corpo Expedicionário Português, freguesia a freguesia (considerando a divisão administrativa anterior à reforma de 2013) e, em cada uma, pela ordem alfabética do nome dos antigos combatentes. No final da divulgação desses nomes identificar-se-ão aqueles que morreram ao serviço da Pátria, em Moçambique, também, freguesia por freguesia e por ordem alfabética.

Fig. C – Mapa do concelho de Valongo

112


MANUEL AUGUSTO DIAS

Figs. D e E – Brasão e Bandeira do Município de Valongo

A ordenação heráldica do brasão, da bandeira e do selo do município de Valongo foi publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 116, de 19 de junho de 2007. Brasão - escudo de prata, com um molho de cinco espigas de trigo de verde, atadas de ouro e acompanhadas por duas mós de negro, abertas e realçadas de ouro. Em contrachefe, duas faixetas ondadas de azul. Coroa mural de prata de cinco torres. Listel branco, com a legenda a negro: “Município de Valongo”. Bandeira - gironada de oito peças de negro e verde. Cordão e borlas de negro e verde. Haste e lança de ouro. Selo - nos termos da lei, com a legenda: “Câmara Municipal de Valongo”.

Fig. F – Centro de Valongo vendo-se ao fundo o antigo edifício da Câmara Municipal

Breve apontamento histórico Valongo, ao contrário da maior parte dos concelhos do país, que deixaram de o ser pela grande reforma administrativa do “Setembrismo” (que transformou muitos em simples freguesias), foi um dos poucos criados de novo, nessa altura, mais concretamente no dia 28 de novembro de 1836, comemorou-se recentemente o 180.º aniversário. Surge no contexto do triunfo dos Liberais sobre os Absolutistas e a tal decisão não será estranho o facto dos valonguenses terem apoiado a causa de D. Pedro, durante o Cerco do Porto, nomeadamente na Batalha da Ponte Ferreira (S. Martinho de Campo) e noutros confrontes que ocorreram nas proximidades da Santa Rita (Ermesinde). 113


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Mas a ocupação humana da região é muito anterior, perdendo-se na memória do tempo. As características geomorfológicas do território do atual município comprovam uma grande riqueza geológica e paleontológica que importa valorizar em termos de turismo da natureza. Muitos vestígios evidenciam a presença romana na exploração aurífera das serras de Valongo. A evolução histórica do território que hoje se denomina “Valongo” acompanhou o que aconteceu com toda a região evolvente. Terras e água proporcionaram o cultivo de cereais, e a sua transformação em pão (como se vê no Brasão do Município), tendo-se Valongo convertido num dos maiores fornecedores de pão à cidade do Porto, desde os tempos medievos.

A proclamação da República no município valonguense

Criado o concelho de Valongo, agregou a si as freguesias de Alfena, Campo, Ermesinde e Sobrado. No final da segunda década do século XX, a primeira do regime Republicano, que é quando ocorre a Primeira Grande Guerra, o município de Valongo tinha 14.763 habitantes (em 1911, tinha 13.811). A freguesia de Alfena tinha 2.222 (em 1911, tinha 2.268, foi uma das que viu a sua população diminuir entre 1911 e 1920); a freguesia de Campo tinha 2395 (em 1911, tinha 2.315); a freguesia de Ermesinde tinha 4.403 (em 1911, tinha 3.545); a freguesia de Sobrado tinha 2.138 (em 1911, tinha 1.965); e a freguesia de Valongo tinha 3.605 (em 1911, tinha 3.718, foi a freguesia do concelho que viu a sua população diminuir mais entre 1911 e 1920); Figs. G e H – A antiga Câmara Municipal de Valongo e o Primeiro executivo republicano do município de Valongo (foto cedida pelo Arquivo Municipal) 114


MANUEL AUGUSTO DIAS

O regime republicano está indelevelmente ligado ao envolvimento de Portugal na Grande Guerra e, sobretudo, à sua entrada na Frente Europeia, na Flandres francesa. É, por isso, pertinente, vermos como se instalou o novo regime na autarquia valonguense. Proclamada a República na capital do país, competia fazer-se, nos dias imediatos, a transferência dos poderes administrativos em todo o território nacional, começando, naturalmente, pela sede dos municípios, para depois se passar a cada uma das freguesias. De acordo com a respetiva ata, a proclamação da República em Valongo fez-se no dia 10 de outubro, estranhamente na presença da antiga vereação, composta pelas seguintes personalidades: António Mendes Moreira (Presidente), João Marques Nogueira Pombo, Monsenhor Paulo António Antunes, José Joaquim Ribeiro Teles e Feliciano Ferreira da Rocha (vereadores efetivos), Manuel da Silva Baltazar Brites, Augusto Sobral, Serafim Pereira dos Santos, António Caetano Alves Pereira e António de Castro Moutinho Neves (vereadores substitutos), o Dr. Joaquim da Maia Aguiar (Administrador do Concelho) e muitos outros cidadãos da vila e freguesias rurais do concelho. É, pois, o antigo Presidente da Câmara, António Mendes Moreira, quem proclama a República em Valongo.

Ata da proclamação da República Portuguesa «Aos dez dias do mês de Outubro de ano mil novecentos e dez, nesta vila de Vallongo e Paços do Concelho, achando-se reunidos o Presidente Anto, digo, da Câmara, Antonio Mendes Moreira, os vereadores efectivos João Marques Nogueira Pombo, Monsenhor Paulo Antonio Antunes, José Joaquim Ribeiro Teles e Feliciano Ferreira da Rocha, os vereadores substitutos Manuel da Silva Baltazar Brites, Augusto Sobral Serafim Pereira dos Santos, Antonio Caetano Alves Pereira e Antonio de Castro Moutinho Neves, e meritíssimo administrador do concelho, Doutor Joaquim da Maia Aguiar e muitos outros cidadãos da vila e freguesias rurais do concelho para o efeito de ser proclamado a Republica Portuguesa, tomou a palavra o presidente da municipalidade Antonio Mendes Moreira e disse que, tendo sido implantada pelo exército e pelo povo da Capital, a Republica Portuguesa e abolidas as instituições monárquicas, a este município compete também pronunciar-se sobre tão glorioso acontecimento de que se esperam resultados úteis e profícuos para o progresso e prosperidade da pátria. Que a implantação da República e a constituição do Governo provisório, são factos positivos e já oficialmente reconhecidos pelas cidades de Lisboa, Porto e quase todas as terras importantes do país. Que não pode Vallongo deixar de aderir também ao novo regime, que, estamos convencidos, é para bem de todos os portugueses e vem marcar uma nova e luminosa era de regeneração e de prosperidade para a pátria. 115


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Que em nome, deste município, congratula-se com o notável acontecimento há-de ficar registado em letras de ouro das páginas da história pátria e declara solenemente proclamada a Republica Portuguesa. Estas palavras foram acolhidas entusiasticamente por toda a assembleia de cidadãos e funcionários públicos que se achavam presentes, levantando-se vivas à pátria, à Republica Portuguesa, ao Governo provisório, ao exército, etc. Pelo administrador Doutor Joaquim da Maia Aguiar foi uma, digo, feita, uma apologia calorosa e entusiástica do novo regime republicano que tinha de ser implantado e unamimente, digo, unanimemente proclamado, fazendo o confronto das instituições republicanas tendentes ao progresso, à prosperidade da gloriosa pátria portuguesa que se há-de ressurgir de novo e florescer como outrora, com as instituições monárquicas que ruíram pela imoralidade, corrupção e má administração dos negócios públicos. – Enalteceu as qualidades dos dirigentes da Republica Portuguesa e levantou vivas â Pátria, à Republica Portuguesa, ao concelho de Vallongo, etc. que foram calorosamente correspondidos. Para constar se lavrou a presente acta que vai ser assinada por todos, depois de lida por mim, Francisco José Ribeiro Seara, secretário da Câmara que subscrevo e assino.» Seguem-se 103 assinaturas, dos cidadãos que estiveram presentes. (livro de Atas da Câmara Municipal de Valongo, fl. 296v). Só no dia seguinte, 11 de outubro de 1910, é que reuniu pela 1.ª vez a Comissão Municipal Republicana de Valongo, nomeada pelo Governador Civil, depois de lhe terem sido indicados os nomes pelo administrador Dr. 116

Joaquim da Maia Aguiar, que acumulou também a presidência dessa Comissão. Assim, a 1.ª Comissão Municipal Republicana teve a seguinte constituição: Dr. Joaquim Maia Aguiar (Presidente da Comissão Municipal Republicana de Valongo e Administrador); Luís Augusto Marques Sousa (Vice-Presidente); Vicente Moutinho de Ascensão, Jacinto Fernandes de Oliveira e Augusto Dias Marques de Oliveira (Vogais). Dos cinco elementos, três são de Ermesinde: Presidente e Administrador, Vice-Presidente e primeiro vogal.

A escolha do Feriado Municipal (24 de junho) Para cumprimento ao Decreto de 12 de outubro de 1910, em que o Governo Provisório da República determinava que cada município escolhesse um dia no ano para seu feriado municipal, e que este fosse escolhido «entre os que representam as festas tradicionaes e caracteristicas», a Comissão Municipal Republicana, depois de ouvir as Comissões Paroquiais, decidiu na sua sessão de 6 de fevereiro de 1911, fixar o feriado municipal de Valongo, no dia da festa de S. João, 24 de junho, sendo que no concelho, situado no Grande Porto, esta festa tem grande impacto no povo e, na freguesia de Sobrado, adquire um colorido muito especial com a saída à rua dos Bugios e Mourisqueiros, em bonitas coreografias a que as máscaras emprestam extraordinária beleza. Apenas a Comissão Paroquial de Valongo impediu a unanimidade da decisão, porque preferia o dia 17 de agosto, que é consagrado à festa do seu Padroeiro – S. Mamede – e, nesse tempo, era motivo para festas grandiosas na vila.


MANUEL AUGUSTO DIAS

5.2. O esforço de guerra da freguesia de Alfena

Figs. J e L – Brasão oficial e Bandeira

Brasão - Escudo de prata com uma ponte de dois arcos, de branco, sobre um rio de duas bandas onduladas de azul. No disco, um disco de azul e um sol de ouro, com dezasseis pontas, sendo oito retilíneas e oito ondeantes. Nos flancos, dois ramos de alfafa, sua folha, um folhado e florido e outro folhado e frutado. Coroa mural de prata de cinco torres, branco listel com CIDADE DE ALFENA. Bandeira - Esquartelada de branco e azul, debruada a cordão da mesma cor e com armas ao centro.

Fig. I - Mapa da localização da freguesia de Alfena Orago – S. Vicente Área – 15,7 Km2

Justificação Heráldica A prata no campo do escudo, significa esperança que sempre acompanhou a gente desta terra e é também, uma alusão à antiga atividade mineira da região onde Alfena se insere. Os dois ramos do alfenheiro, um florido, e dado que a sua flor é alfena, esta deu origem ao nome ALFENA. O outro frutado com vin117


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

te e uma bagas, cada uma representando os lugares da freguesia. A flor simboliza também a juventude da sua população, e o fruto, a maturidade e as obras realizadas. A ponte românica sobre o Rio Leça é um dos seus monumentos mais antigos (hoje conhecida por Ponte de S. Lázaro). Fica situada no antigo lugar de Alfena, hoje da Rua. As duas faixas onduladas de azul, representam o rio Leça, elemento paisagístico primordial no desenvolvimento de Alfena. O Sol em ouro representa a vida e a pujança que fizeram crescer esta terra e a sua cor simboliza a eternidade; tem como fundo um disco em azul que simboliza o universo e a sua cor a fidelidade, a alegria e a nobreza.

Fig. M - Ponte de S. Lázaro, autêntico ex-libris de Alfena

118

Breve apontamento histórico

São conhecidas diferentes interpretações para a origem do topónimo Alfena. Segundo o P.e Carvalho da Costa, na sua “Corografia Portuguesa”, datada de 1706, o nome Alfena teria tido origem numa batalha que aqui se travou, logo no século VIII, tempo inicial da Reconquista Cristã, acrescentando que na língua árabe “alfella” significa batalha. Este autor fala também da existência de um pelourinho, símbolo da autonomia municipal, que existiria no lugar de Rua, ao tempo, centro do lugar, na confluência das estradas reais, Porto-Guimarães, Maia-Valongo. Já Pinho Leal, no último quartel do século XIX, afirma que Alfena alude a “planta”. E no seguimento de Pinho Leal, os investigadores Pedro Machado e António Losa – conforme se pode ler no Sítio da Web da Junta de Freguesia de Alfena – referem que a interpretação mais correta é a que associa o topónimo ao nome “al-henna” «planta arbustiva então abundante no local, de flores brancas e bagas negras e que servia para tingir». A freguesia de Alfena é a mais setentrional do município valonguense e insere-se na Grande Área Metropolitana do Porto, confrontando, a nordeste com a freguesia de Água Longa (Santo Tirso); a noroeste com a freguesia de Folgosa (Maia); a sudoeste com a freguesia de Ermesinde (Valongo); e a sudeste com a freguesia de Valongo, sede do Concelho. O crescimento demográfico das últimas décadas, justifica que a Assembleia da República tenha promovido a sede da freguesia a Vila (30 de junho de 1989) e a Cidade (6 de abril de 2011). Em termos de comunicações rodoviárias, a cidade de Alfena é servida pela


MANUEL AUGUSTO DIAS

autoestrada A41, que lhe permite o acesso rápido a outras autoestradas (A42, A3, A4), e, através delas, a quase toda a Área Metropolitana do Porto, ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro e ao Porto de Leixões.

Transferência de poderes no início da República

Tendo em consideração que foi no período da República que se deu a Primeira Guerra Mundial e que foram os governos republicanos que tudo fizeram para que Portugal não ficasse neutro neste grande conflito, tem sentido mencionar a transferência de poderes que nessa altura se operou, também, a nível local. Curiosamente, o executivo Junta da Paróquia de Alfena, do período monárquico, foi o que mais tempo esteve em funções no município de Valongo, já em plena República. Teve a sua última reunião, que consta em ata, a 2 de outubro de 1910 e tinha a seguinte composição: Abade Manuel Martins de Castro (Presidente), Júlio Moreira dos Santos (Secretário), Manuel Alves de Sousa, José Marques de Sousa e Manuel Moreira da Rocha (Vogais). O Pároco e, por inerência, Presidente da Junta de Paróquia era Manuel Martins de Castro Ferreira (natural de S. Pedro da Cova), coadjuvado por Manuel Vieira de Leite. O 1.º Presidente da Comissão Municipal Republicana foi Manuel André Moreira Júnior (desde 4 de novembro de 1910; em 9 de abril de 1911 sucedeu-lhe Carlos dos Santos Almeida). A posse da Comissão Paroquial Republicana apenas teve lugar no dia 4 de novembro de 1910. A sua constituição tinha mais os seguintes elementos: Manuel André Moreira Júnior (secretário), Joaquim de Sousa Santos, Quintino Vieira da Silva e Américo de Paiva e Sousa (vogais). A sede provisória da Junta foi na Codiceira, em casa do cidadão Florindo de Sousa Almeida.

Fig. N – Antiga Igreja Matriz de Alfena

Na sessão da posse, os membros da Comissão, fazendo uma revisão aos livros deram pela falta dos livros de atas, desde 26 de julho de 1872 até 8 de dezembro de 1901.

119


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Aquando do arrolamento dos bens da Igreja a favor do Estado, na sequência da Lei da Separação das Igrejas do Estado, foi Carlos dos Santos Almeida quem assinou os autos, juntamente com o Secretário de Finanças, Joaquim de Carvalho Costa e Camões, e o Administrador, Dr. Joaquim Maia Aguiar. Assim, no dia 11 de agosto de 1911, passaram para o Estado: a antiga Igreja com uma torre de 3 sinos, 7 altares e todas as alfaias litúrgicas; a residência paroquial com quintal, campo do Passal, a capela de S. Roque, na Codiceira (em muito mau estado); e a Capela de S. Lázaro.

Número de fogos

Número de habitantes

Aldeia Nova

12

68

Baguim

36

174

Cabeda

49

251

Codiceira

26

122

Ferraria

23

115

Gândara

32

117

Igreja

57

217

Outeirinho

24

93

Outeiro

31

128

Punhete

5

28

Reguengo

56

267

QUADRO I.1 - POPULAÇÃO DE ALFENA EM 1911

Rua

54

222

(por lugar e este por ordem alfabética)

Transleça

36

166

Várzea

15

73

Xisto

19

101

Total da freguesia

475

2.142

Em 1911, no início do regime republicano, a freguesia de Alfena tinha 2.142 habitantes distribuídos por vários lugares, conforme se pode ver no Quadro I.1.

A freguesia de Alfena era constituída, então, por 15 lugares, que a seguir enumero, agora pela ordem decrescente do número dos seus moradores: Reguengo (267), Cabeda (251), Rua (222), Igreja (217), Baguim (174), Transleça (166), Outeiro (128), Codiceira (122), Gândara (117), Ferraria (115), Xisto (101), Outeirinho (93), Várzea (73), Aldeia Nova (68) e Punhete (28). 120

Lugares da freguesia


MANUEL AUGUSTO DIAS

QUADRO I.2 – Combatentes da freguesia de Alfena que foram mobilizados para a Grande Guerra (França)

Nome

Posto

Localidade

Observações

1 – Adelino José de Oliveira

Soldado

Reguengo

Reg.º de Artilharia 6

2 – Adriano Ferreira

Soldado

Alfena

Reg.º de Artilharia 6

3 – Álvaro Moreira

Soldado

Alfena

Grupo de Baterias de Obuses

4 – António Martins Prata

Soldado condutor

Alfena

Reg.º de Artilharia 6

5 – António Rodrigues de Almeida

1.º Cabo

Alfena

Reg.º de Artilharia 6

6 – Artur Brás

Soldado

Alfena

Prisioneiro em La Lys

7 – Augusto da Silva Rei

2.º Sarg.º

Alfena

Reg.º de Sapadores Mineiros

8 – Diamantino Moreira da Silva Pinto

Soldado

Alfena

Prisioneiro em La Lys

9 – Ezequiel da Silva Leal

Soldado ferrador

Alfena

Reg.º de Infantaria 32

10 – Luciano Ferreira da Costa

Soldado

Alfena

Reg.º de infantaria 31

11 – Manuel Carneiro Real

Soldado

Várzea

Regressou da Guerra doente

12 – Serafim Leal

Soldado ferrador

Alfena

Reg.º de Infantaria 15

121


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

1 – Adelino José de Oliveira Soldado n.º 68, integrado no CEP, no R.A. 6, C.M. n.º 2, da 2.ª S.L.M.I.. Quando foi mobilizado já era casado com Olinda Brás da Silva. Era filho de Jacinto José de Oliveira e de Maria Marques da Costa. Natural do Reguengo, Alfena, residia em Alfena. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917 e desembarcou na capital portuguesa no dia 9 de abril de 1919. Foi colocado na 2.ª P.B.A. em 21 de janeiro de 1918, onde ficou com o n.º 490 da 3.ª Bateria. Passou à 2.ª Companhia do B.S.C.F. onde ficou com o n.º 453 em 22 de julho de 1918. Abatido ao B.S.C.F. e à 2.ª Companhia em 1 de março de 1919. Marchou nesta mesma data a apresentar-se no Q.G.1 a fim de ali receber ordens quanto ao seu destino.

Fig. 1 - Adelino José de Oliveira - Soldado

122


MANUEL AUGUSTO DIAS

2 – Adriano Ferreira

Foi o soldado n.º 69 e integrou o CEP, no Regimento de Artilharia 6, C.M. n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Infantaria e teve a placa de identidade n.º 28351. No momento da incorporação já era casado com Maria de Almeida. Filho de Beijamim Ferreira e de Júlia Alves de Sousa, era natural e residente em Alfena. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Baixou ao Hospital de Sangue n.º 1 em 7 de janeiro de 1918, tendo sido evacuado para um dos Hospitais da Base no dia 11 do mesmo mês. Colocado no Depósito de Bagagens em 1 de abril de 1918. Colocado no D.Art.C. em 8 de agosto. Baixou a um dos hospitais da Base, em 22 de setembro. Evacuado do H.B.1 para o Porto de Desembarque, em 4 de novembro, a fim de ser repatriado por ter sido julgado incapaz de todo o serviço, em sessão de 14 de outubro de 1918, no H.B.1. Repatriado em 23 de outubro de 1918 a fim de gozar 60 dias de licença da Junta. Embarcou no “Gil Eanes” em 19 de novembro de 1918, tendo desembarcado em Lisboa no dia 23 de novembro de 1918.

Fig. 2 - Adriano Ferreira - Soldado

123


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3 – Álvaro Moreira Foi soldado telegrafista da Companhia de Comando com o n.º 17, integrado no CEP no 1.º Grupo de Bateria de Obuses, 1.ª Bateria, com a placa de identidade n.º 50385. Nasceu em Alfena no dia 13 de outubro de 1895 e era filho de António Moreira e de Ana Martins Moreira, residentes na mesma freguesia. Assentou praça no dia 13 de janeiro de 1916. Embarcou em Lisboa no dia 23 de março de 1917 chegando a França no dia 26 de março. Foi colocado no 6.º Grupo de Artilharia, 1.ª Bateria, onde esteve entre 1 de agosto e 11 de setembro de 1917, ficando com o n.º 856. No dia 26 de junho de 1917 foi para a 1.ª linha. Em 10 de janeiro de 1918 esteve em Calonne. Continuou na 1.ª linha até 9 de abril de 1918, data da Batalha de La Lys. Em 16 de setembro passou à 2.ª Bateria do 6.º G.B.A., ficando a fazer parte da Secção de Sinaleiros, adstrita à formação do Estado Maior e Menor. Foi punido no dia 10 de dezembro de 1917 pelo Comandante da 4.ª Bateria, com 8 dias de detenção, porque sendo o mais graduado dos telefonistas que nesta data estavam de serviço na posição consentiu que se acendesse o lume na estação de onde proveio muito fumo, numa ocasião em que havia balões inimigos em frente da Bateria. Tomou parte na batalha de La Lys em 9 de abril de 1918. Foi condecorado com a Medalha Comemorativa da expedição a França (O.S. n.º 51 do 6.º G.B.A. de 21 de fevereiro de 1919)

124

Fig. 3 - Álvaro Moreira - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

Repatriado com o 6.º G.B.A. em 30 de abril de 1919, desembarcou em Lisboa no dia 4 de maio de 1919.

4 - António Martins Prata Foi o soldado condutor n.º 64 e teve a placa de identidade n.º 27873. Foi integrado no CEP, no Regimento de Artilharia n.º 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado já era casado com Joaquina de Sousa. Era filho de Domingos Martins Prata, já falecido, e de Margarida Martins Almeida, natural da freguesia de Alfena e morador na freguesia de S. Julião de Água Longa, concelho de Santo Tirso. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Baixou ao Hospital em 3 de novembro de 1917, tendo tido alta em 8 do mesmo mês. Foi colocado na Coluna de Munições 1, em 8 de janeiro de 1918. Foi evacuado para o P.E., em 26 de maio de 1918, a fim de ser repatriado nos termos da circular 475/11 da R.S. do Q.G.C. de 25 de maio de 1918. Desembarcou em Lisboa, no dia 19 de junho de 1918.

Fig. 4 - António Martins Prata - Soldado

125


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

não corresponde o titulo da imagem com a pessoa do texto...

5 - António Rodrigues de Almeida Teve a categoria de Primeiro-Cabo, no CEP e era natural de Alfena, filho de António Rodrigues de Almeida e de Ana Joaquina Miranda. Foi integrado no Regimento de Artilharia 6, Companhia de Morteiros n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Infantaria, teve a placa de identidade n.º 73135 e foi 1.º Cabo com o n.º 124. Quando foi mobilizado já era casado com Maria Moreira Bacela. Embarcou no dia 21 de agosto de 1917, tendo sido colocado no 4.º G.B.A., em 11 de outubro de 1917. Presente no D.M. onde ficou adido para efeitos administrativos, fazendo serviço nas Escolas do CEP a partir de 3 de julho de 1918. Punido em 25 de maio de 1918 pelo Comandante da Bateria com 4 dias de detenção por ter faltado à “formatura da data d’água das 16 h do dia 20 do corrente” e ao toque do cabo de dia e faxinas feito às 19 h do mesmo dia. Concluiu o curso de tiro antiaéreo de metralhadoras ligeiras com aproveitamento em 23 de agosto de 1918. Apresentado na sua unidade, vindo do D.M. da Base, em 25 de agosto de 1918. Punido em 11 de outubro de 1918 pelo Comandante da Bateria com dez dias de detenção e alterado para 20 dias de prisão disciplinar pelo Comandante do Grupo porque quando aquele oficial o interrogava sobre a falta à instrução, respondeu-lhe com expressões e modos pouco corretos. Punido em 29 de novembro de 1918 pelo comandante do 126

Fig. 5 - António Rodrigues de Almeida - 1.º Cabo


não corresponde o titulo da imagem com MANUEL AUGUSTO DIAS a pessoa do texto... Grupo com vinte dias de detenção porque vindo na vanguarda da força a pé, quando da marcha da Bateria para Lavantie, e seguindo numa cadência demasiado curta que prejudicava a marcha quando um oficial lhe ordenava que marchasse com a cadência habitual não cumpriu prontamente esta ordem sendo necessário que o mesmo oficial tomasse uma atitude enérgica para que a cumprisse dando assim um mau exemplo às praças menos graduadas que também marchavam. Embarcou para Portugal com o 4.º G.B.A., em 3 de maio de 1919, a bordo do “Maryland”, tendo desembarcado em Lisboa, no dia 6 de maio de 1919.

6 - Artur Brás Foi o soldado n.º 573 integrado no CEP no Regimento de Sapadores Mineiros, 1.º Batalhão, 4.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 54693. No momento da mobilização era casado com Maria Ferreira Lima. Era filho de Vicente Brás e de Olinda da Silva, natural e residente na freguesia de Alfena. Embarcou em Lisboa, no dia 26 de maio de 1917. Participou na Batalha de La Lys, tendo desaparecido na sequência desse combate, no dia 9 de abril de 1918. Por comunicação da Comissão de Prisioneiros de Guerra foi feito prisioneiro, sendo internado no Campo de Dülmen, localizado na Vestefália. Este campo de Prisioneiros destinava-se a praças. Em 24 de agosto de 1918, a 3 meses do final do conflito, estavam internados neste Campo 300 praças.

Fig. 6 - Artur Brás - Soldado

127


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Também se encontravam aqui ingleses capturados no dia 9 de Abril de 1918 durante a grande ofensiva alemã. Artur Brás foi presente no dia 16 de janeiro de 1919, sendo repatriado para Portugal, onde desembarcou, no dia 28 de janeiro de 1919.

7 - Augusto da Silva Rei

Serviu o CEP no Regimento de Sapadores Mineiros, integrado na 4.ª Companhia, onde teve, como soldado, o n.º. 411 e desempenhava a função de tratador de cavalos. A placa de identidade foi a n.º 55073-A. Era natural de Alfena, filho de Domingos da Silva Rei, então já falecido, e de Delfina Moreira Rainha. Embarcou em Lisboa, no dia 26 de maio de 1917 e regressou no dia 11 de janeiro de 1919. Punido no dia 1 de abril de 1918 pelo Comandante de Companhia com seis dias de detenção por se apresentar na formatura para a distribuição de subvenção de campanha com o cabelo excessivamente comprido, infringindo assim o 10.º dever do art.º 4.º do R.D.E.. Em 4 de novembro de 1918 foi aumentado à 3.ª Companhia S.M, ficando com o n.º 956. Punido no dia 21 de dezembro de 1918 pelo Comandante da Companhia com 5 dias de detenção, atendendo ao seu exemplar comportamento, por se não ter apresenta128

Fig. 7 - Augusto da Silva Rei - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

do no dia que lhe foi determinado, alegando ter perdido o comboio, o que constitui infração dos n.os 4 e 5.º do R.D.E. (O. Comp.ª n.º 638 de 2-12-1918). Presente na Delegação de Paris em 6 de janeiro de 1919, a fim de seguir para Portugal no gozo de 53 dias de licença de campanha, com princípio no dia 5.

8 - Diamantino Moreira da Silva Pinto

Soldado n.º 574, integrado no CEP, no Regimento de Sapadores Mineiros, 1.º Batalhão, 4.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 54658. No momento da mobilização já era casado com Maria de Sousa Moreira. Era filho de Manuel Moreira da Silva Pinto e de Felismina da Silva Sousa, natural e residente na freguesia de Alfena. Embarcou em Lisboa no dia 26 de maio de 1917. Foi considerado desaparecido na Batalha de La Lys, no dia 9 de abril de 1918. Por comunicação da Comissão de Prisioneiros de Guerra soube-se que foi feito prisioneiro sendo internado no Campo de Dülmen, tal como tinha acontecido ao seu camarada de armas e conterrâneo, Artur Brás. Presente em 22 de dezembro de 1918. Embarcou para Portugal, em 1 de janeiro de 1919, a bordo do transporte “Gil Eanes” tendo desembarcado em Lisboa, no dia 5 de janeiro de 1919.

Fig. 8 - Diamantino Moreira da Silva Pinto - Soldado

129


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

9 - Ezequiel da Silva Leal

Foi Soldado ferrador, com o n.º 654, tendo sido integrado no Regimento de Infantaria n.º 32, 1.º Batalhão. Era solteiro, filho de José da Silva Leal e de Felismina Martins Prata e era natural e residente na freguesia de Alfena. No dia 1 de julho de 1917, no Batalhão de Infantaria 32, em Penafiel, houve um motim grave de resistência à ordem de marcha para Lisboa, quando este batalhão se recusou a apresentar no Quartel. Esta situação de resistência à ida para a Guerra só foi totalmente controlada 13 dias depois e foi necessária a intervenção da Guarda Nacional Republicana. Tal situação não parece ter afetado Ezequiel da Silva Leal que embarcou em Lisboa, no dia 4 de julho de 1917. A 24 de agosto de 1917 foi colocado no Batalhão de Infantaria 9, tendo seguido, em 21 de julho de 1918 para o D.S.V. da Base, por transferência. Baixou ao hospital n.º 35 em 7 setembro 1918, donde teve alta em 17 de setembro; voltou a ter baixa em 19 de novembro e alta dois dias depois. Seguiu para o P.E. a fim de ser repatriado em 30-4-1919 do L.M.B.1. Desembarcou em Lisboa, no dia 28 de maio de 1919.

Fig. 9 - Ezequiel da Silva Leal - Soldado

130


MANUEL AUGUSTO DIAS

10 - Luciano Ferreira da Costa

Foi o soldado n.º 700, integrado no CEP, na 1.ª Divisão de Infantaria, Regimento de Infantaria n.º 31, 1.ª Companhia e teve a placa de identidade n.º 30204A. Era filho de Delfim Ferreira da Costa e de Albina Gomes, natural e residente na freguesia de Alfena, no lugar do Reguengo. Embarcou em Lisboa no dia 12 de setembro de 1917. Baixou ao Hospital n.º 2, em 8 de fevereiro de 1918. Em 1 de novembro de 1918, passou à S.Ad.B., vindo do extinto Departamento de Infantaria. Em 12 de dezembro de 1918 seguiu da S.Ad.B. para o L.R.13 a fim de ali fazer serviço. Em 1 de abril de 1919 foi aumentado ao efetivo da Secção Administrativa do Com. M. em Ambleteuse. Punido no dia 9 de abril de 1918 pelo Comandante do D.I. com 15 dias de detenção por ser conivente no desvio de duas latas com gorduras de carne não aproveitadas no rancho geral. Fez parte da Companhia de Representação a Paris e Bruxelas em julho de 1919, quando se fez a celebração do dia da Vitória, 14-7-1919, e a que já nos referimos atrás (no subcapítulo 4.15.). Desembarcou em Lisboa, no dia 18 de outubro de 1919. Fig. 10 - Luciano Ferreira da Costa - Soldado

131


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

11 - Manuel Carneiro Real

Soldado natural do lugar da Várzea, freguesia de Alfena, onde nasceu no dia 30 de setembro de 1891 e foi batizado no dia 4 de outubro de 1895 pelo Padre Manuel Martins de Castro Ferreira. Filho de José Carneiro Real, jornaleiro, e de Maria Rosa Martins, governanta da casa, ao tempo da mobilização era residente em Ermesinde (na Palmilheira). Integrou o CEP, regressando da Guerra doente. Na sessão da Junta de Freguesia de Ermesinde, de 18 de julho de 1920, refere-se que o cidadão Manuel Carneiro Real, ex-combatente do CEP, morador na Palmilheira se encontrava, naquela data, a viver em circunstâncias muito precárias, em virtude de doença adquirida ao serviço da Pátria e que, por isso, o executivo da Junta lhe concedeu um donativo de quinze escudos. O Processo Individual deste ex-militar, como de outros, encontra-se microfilmado, no Arquivo Geral do Exército (em Lisboa), mas há meses que não é possível a visualização/reprodução destes documentos por avaria dos equipamentos.

132

Fig. 11 – Registo de Batismo de Manuel Carneiro Real - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

12 - Serafim Leal

É irmão do combatente acima, Ezequiel da Silva Leal. Serviu o CEP integrado na 2.ª Divisão, na Ambulância n.º 3, no 3.º Grupo de Companhias de Saúde. Foi, como o irmão, soldado ferrador; este com o n.º 558 e com a placa de identidade n.º 24491, da série A. Era solteiro, filho de José da Silva Leal e de Felismina Martins Prata, natural e residente em Alfena. Embarcou em Lisboa no dia 8 de agosto de 1917. Baixou ao Hospital em 12 de setembro de 1917, tendo tido alta em 2 de outubro. Baixou à Ambulância n.º 8 em 3 de outubro, tendo tido alta em 10 de outubro. Presente em 17 de junho de 1918 vindo da unidade. Seguiu para o P.E. a fim de ser repatriado em 23 de julho de 1918. Punido em 9 de agosto de 1918 pelo Comandante do 5.º Contingente de evacuação com 5 dias de prisão disciplinar por praticar um gesto indecoroso na formatura para a 3.ª refeição, do dia anterior, e na ocasião em que se encontrava presente um seu superior, um 2.º sargento, que presidia à mesma, infringindo assim os n.os 2.º e 11.º do art.º 4.º do R.D.E. (O.S. n.º 15 do 5.º contingente de 9-81918). Repatriado já no mês de outubro, desembarcou na capital portuguesa no dia 14 de outubro de 1918.

Fig. 12 - Serafim Leal - Soldado

133


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

A guerra na África Portuguesa

Fig. 13 – Soldados portugueses com destino a Angola e Moçambique (Ilustração Portuguesa)

O império alemão em África colidiu com os interesses portugueses e o Governo Republicano reagiu de imediato com a formação de corpos expedicionários destinados a Angola e a Moçambique. Os alemães atacaram o norte de Moçambique e o sul de Angola. Em Moçambique ocuparam o Triângulo de Quionga e isso obrigou Portugal a entrar na Guerra, mesmo antes de ter havido uma formal declaração de Guerra da Alemanha a Portugal, essa só ocorreu, como vimos, no dia 9 de março de 1916. As campanhas militares de 1914 a 1918 travadas na África Portuguesa eram diferentes, no aspeto quantitativo e qualitativo das travadas no solo europeu. Aqui era mais uma guerra de movimento dependente da iniciativa de quem se sentia mais forte em cada momento. Os alemães utilizavam uma tática de guerrilha. 134

Os aliados estavam em África em maior número e tinha armas individuais superiores (os portugueses usavam a Mauser de 1904, enquanto os alemães ainda lutavam com a Mauser de 1877). Os expedicionários portugueses utilizavam camiões FIAT. O contingente português chegou a ter cerca de 20 mil homens (vindos da metrópole) e 12 mil africanos, mais 90 mil carregadores. Mas as tropas portuguesas estavam mal treinadas, eram desorganizadas e sentiam-se desmoralizadas. O General Gomes da Costa chegou a afirmar, a este propósito, o seguinte: «(…) preparação é coisa que não existe em Portugal: tudo se faz por impulsos, bruscamente, segundo as necessidades do momento». As companhias indígenas ainda eram piores, em armamento e preparação para o combate. Além disto, os portugueses tiveram de contar com a adversidade do clima e das condições sanitárias. O decreto que manda organizar as expedições militares para Moçambique e Angola é datado de 18 de agosto de 1914. Os primeiros militares portugueses chegam a Moçambique a 1 de novembro de 1914, mas os primeiros confrontos já haviam ocorrido junto ao rio Rovuma na noite de 24 para 25 de agosto. Em outubro, surgiriam também os primeiros ataques no sul de Angola. Soldados portugueses continuaram a ser enviados para estas duas colónias portuguesas, mas só o fim da Guerra e os tratados sequentes, permitiram a devolução a Portugal das terras ocupadas pelo exército alemão. As doenças que mais assolavam as tropas metropolitanas eram o paludismo (causada pela picada do mosquito), a doença do sono (causada pela mosca Tsé-tsé) e as doenças intestinais, causadas pela pouca higiene que os militares praticavam (Amós Gonzaga, 2011)


MANUEL AUGUSTO DIAS

Soldados de Alfena que morreram na Guerra em Moçambique

Cinco dos combatentes oriundos da freguesia de Alfena morreram em Moçambique. Foram os seguintes (por ordem alfabética):

fantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 20 de agosto de 1917, em Nangalana, vítima de disenteria e sezonismo.

1 - Ascensão Dias do Vale, soldado n.º 295, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer no dia 26 de julho de 1917, vítima de paludismo. Não se sabe o local da sepultura.

4 - Manuel da Silva Talaia, soldado n.º 84, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que seguiu para Moçambique, onde acabaria por falecer no dia 28 de setembro de 1917, em Mocímboa da Praia, vítima de diarreia amibiana.

2 - Diamantino Fernandes Vendas, soldado n.º 466, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer em data desconhecida, vítima de disenteria. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 12980.

5 - Manuel de Oliveira, soldado n.º 360, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde acabou por falecer no dia 7 de julho de 1917, vítima de disenteria e paludismo. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 13506.

3 - Manuel da Silva, soldado n.º 321, do Regimento de In-

135


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

5.3. O esforço de guerra da freguesia de Campo

Figs. 32 e 33 – Brasão e Bandeira de Campo

Brasão oficial e Bandeira Brasão - Escudo de prata, uma capa de púrpura (clâmide) rasgada e aberta em pala e envolvendo nos flancos uma espada abatida de negro, posta entre duas espigas de trigo verde; nos cantões do chefe, uma palmeta de azul e em ponta; três burelas ondeadas de azul e prata. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco, com a legenda a negro: “CAMPO – VALONGO”. Bandeira - É azul e tem cordões e borlas de prata e azul. Haste e lança de ouro.

Justificação Heráldica Fig. C – Mapa da localização da freguesia de São Martinho de Campo Orago - São Martinho Área - 11 Km2

136

A ordenação heráldica do brasão e bandeira da freguesia de São Martinho de Campo foi publicada no Diário da


MANUEL AUGUSTO DIAS

República, III Série, de 8 de novembro de 2001. As cores e os elementos do seu brasão aludem à riqueza da terra, à fertilidade proporcionada pelo rio Ferreira e também à sua história.

Fig. 17 – Ponte Ferreira, em Campo. Aqui se deu o recontro militar das Guerras Liberais que ficou conhecida por Batalha da Ponte Ferreira

Breve apontamento histórico O nome de São Martinho de Campo já surge nas inquirições de 1258. No séc. XIX, aparece referenciado com o nome de “Recezinhos de Ponte Ferreira”. Pertenceu à Abadia do Convento de Vilela tendo passado, mais tarde, para a alçada do Bispo do Porto e, em termos administrativos, a sua freguesia foi integrada no então Concelho ou Julgado de Aguiar de Sousa, passando para Valongo,

com a criação deste concelho, pela reforma administrativa setembrista (1836). São conhecidas as riquezas naturais da sua terra, onde têm sido explorados, a ardósia, as quartzites, o antimónio e o volfrâmio, em acumulação com a prática agrícola, nas suas terras, a que as águas do Ferreira proporcionam especial fertilidade, produzindo milho, vinho, feijão, batata, legumes. São, igualmente, relevantes as indústrias de moagem, panificação, têxteis, transformação de ardósias, móveis ou metalomecânica. A negra ardósia, um dos ex-líbris do concelho, bem conhecida em todo o país, pois era usada em quase todas as escolas, uma vez que dela eram feitos os quadros escolares e, em formato mais pequeno, “as pedras”, que todos os alunos tinham e onde fizeram as primeiras letras e as primeiras contas, continua a extrair-se em São Martinho de Campo, quer para consumo nacional, quer internacional. A freguesia de São Martinho de Campo foi elevada a Vila no dia 12 de junho de 2001. Atualmente a antiga Freguesia de São Martinho de Campo juntou-se à de Sobrado constituindo uma nova estrutura orgânica da administração local denominada “União de Freguesias de Campo e Sobrado” no âmbito da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, que procedeu à reorganização administrativa do território das freguesias, através da criação de freguesias por agregação ou alteração dos limites territoriais.

137


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Transferência de poderes no início da República Na freguesia de São Martinho de Campo a transferência de poderes, da Monarquia para a República, fez-se no dia 30 de outubro de 1910. Compareceram os cidadãos: Dr. Joaquim Maia Aguiar, Administrador e Presidente da Autoridade Civil do Concelho; José de Sousa Magalhães, Abade Presidente da Junta de Paróquia cessante; Amaro Martins da Rocha, José Jorge da Costa, António Dias da Silva, José de Sousa Dias e Francisco Aires Baptista, como membros nomeados para Comissão Paroquial Republicana da freguesia. Curiosa e até surpreendente é a postura, bem republicana, do pároco da freguesia, que no ato de posse, fez a seguinte intervenção:

Fig. 18 – Igreja Matriz de Campo 138

«Que não causasse repugnancia a membro algum o ser nomeado para uma commissão republicana, porquanto a Republica é a mais bella e a mais perfeita de todas as formas de Governo, e a que mais nivela os direitos do homem. Que com a Republica o chefe da nação não precisava de nascer em berços doirados, mas sim de se destacar entre os seus concidadãos pela nobreza dos seus actos por forma a chamar para elles a attenção do povo; que podia ser o infimo dos cidadãos pelo berço, e vir a ser o primeiro notabilisando-se pelos seus actos. Que a Republica podia ser um passo agigantado para a grandeza do nosso paiz. Que os Estados da America são to-


MANUEL AUGUSTO DIAS

dos republicanos e o seu progresso é bem sensivel. Que depois que no Brazil se implantou a Republica, elle tem feito a admiração de todos os povos cultos. Que era certo que o governo da Republica ha de ser feito por homens, e que em todos os homens ha defeitos, porque perfeito é Deus; mas que na Republica todos nós temos mais facilidade de escolher os menos defeituosos. Por isso que nos não preocupemos com o nome e que façamos porque Portugal, á sombra da bandeira da Republica, progrida e progrida muito». Perante tal discurso, o Administrador não podia ficar indiferente. Para além de agradecer as referências do Abade ao novo regime, «fez sentir aos membros da Commissão quanto era nobre a missão que lhes era confiada e pediu-lhes que na administração dos bens da parochia fossem o mais solicitos e zelosos possível, mais do que na administração dos seus proprios bens, da qual só tinham a dar satisfação á familia, ao passo que d’aquella tinham a dar satisfação, não só á auctoridade tutelar, mas tambem a todos os cidadãos da parochia, ainda ao mais pobre, pois que pelo novo regímen todos eram eguaes e tinham eguaes direitos. Pediu-lhes mais que nas suas de-

139


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

QUADRO II.1 - POPULAÇÃO DE CAMPO EM 1911 (por lugar e este por ordem alfabética) Número de fogos

Número de habitantes

Aldeia

3

18

Azenha

30

Balselhas

Número de fogos

Número de habitantes

Luriz

18

72

134

Outeiro

22

94

20

90

Ponte Ferreira

10

33

Borbulhão

12

39

Portela

13

50

Capela

31

117

Póvoas

16

70

Chã

24

107

Quinta de Baixo

16

73

Coche

23

97

Quinta de Cima

51

231

Coletinha

107

399

Retorta

98

351

Corredoura

4

18

Ribeira

38

152

Costeira

19

52

Terra Feita

4

23

Igreja

3

18

População dispersa

3

6

Lameiras

13

44

Total da freguesia

578

2.288

Lugares da freguesia

liberações fossem sempre justos e imparciaes, não vendo nunca nos seus administrados amigos nem inimigos, mas tendo sómente em vista promover os melhoramentos materiaes da parochia quanto caiba em suas forças, o

140

Lugares da freguesia

Coletinha (399), Retorta (351), Quinta de Cima (231), Ribeira (152), Azenha (134), Capela (117), Chã (107), Coche (97), Outeiro (94), Balselhas (90), Quinta de Baixo (73), Luriz (72), Póvoas (70) Costeira (52) Portela (50), Lameiras (44), Borbulhão (39), Ponte Ferreira (33), Terra Feita (23), Aldeia (18), Corredoura (18) e Igreja (18).


MANUEL AUGUSTO DIAS

Quadro II.2 – Combatentes da freguesia de S. Martinho de Campo que foram mobilizados para a Grande Guerra (França)

Nome

Posto

Localidade

Observações

1 – Aprígio Jorge Pinto

Soldado

Balselhas

Prisioneiro na Batalha de La Lys

2 – Augusto Dias da Silva

2.º Sarg.º

Campo

Reg.º de Artilharia 6

3 – João da Rocha Martins

Soldado

Campo

Reg.º de Sapadores Mineiros

4 – João Martins da Rocha

Soldado maqueiro

Campo

4.º Grupo de Metralhadoras

5 – Joaquim dos Santos

Soldado

Campo

Reg.º de Obuses de Campanha

6 – Joaquim Martins da Rocha

2.º Sarg.º

Campo

Reg.º de Obuses de Campanha

7 – José Coelho

Soldado condutor

Coletinha

Reg.º de Artilharia 6

8 – José de Melo Guimarães

Soldado

Campo

Reg.º de Artilharia 6

9 – José Nogueira dos Santos

Soldado

Campo

Grupo de Baterias de Obuses

10 – José Luciano de Sousa Magalhães

Soldado

Campo

Reg.º de Artilharia 6

11 – Manuel Monteiro

Soldado condutor

Campo

Reg.º de Artilharia 6

12 – Serafim Dias Moreira

Soldado condutor

Ponte Ferreira

Reg.º de Artilharia 6

141


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

que esperava confiadamente». A freguesia de Campo era constituída, então, por 22 lugares (mais população dispersa – 6 moradores), que a seguir enumero, agora pela ordem decrescente do número dos seus moradores:

1 - Aprígio Jorge Pinto

Foi o soldado n.º 703 do CEP, integrado na 1.ª Divisão de Infantaria, Regimento de Infantaria n.º 31, 1.ª Companhia e teve a placa de identidade n.º 30207A. Era filho de António Jorge Pinto e de Florinda Ferreira Martins, natural e residente em Balselhas, freguesia de S. Martinho de Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 12 de setembro de 1917. Foi colocado no Q.G. da 6.ª B.I. em 21 de novembro de 1917. Foi punido em 11 de janeiro de 1918 pelo Comandante da Companhia com 10 dias de detenção por se ter recusado

Fig. 19 - Aprígio Jorge Pinto - Soldado

142


MANUEL AUGUSTO DIAS

a cumprir uma ordem, sendo preciso empregar os meios violentos para que fosse cumprida. Desapareceu na Batalha de La Lys, em 9 de abril de 1918, tendo sido feito prisioneiro. Presente em 16 de janeiro de 1919, foi repatriado, desembarcando em Lisboa no dia 28 de janeiro de 1919.

2 - Augusto Dias da Silva

Segundo sargento (serralheiro), n.º 20, integrado no Regimento de Artilharia 6, C.M. n.º 2 e 2.ª S.L.H.J., com a placa de identidade n.º 28294. Era filho de António Dias da Silva e de Ana Moreira, natural e residente em Campo. Embarcou em Lisboa no dia 21 de agosto de 1917. Foi colocado na Oficina de Artilharia, em 30 de novembro de 1917. No dia 1 de abril de 1918 foi colocado no D.M.B.. Entrou no gozo de 10 dias de licença de Campanha, nos termos do art.º 3.º da O.S. n.º 348 de 20-12-1917, em 8 de março de 1919. Presente do regresso de licença em 17 de março de 1919. Fig. 20 - Augusto Dias da Silva - 2.º Sargento

143


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Foi condecorado com a medalha comemorativa da Expedição a França em 21 de fevereiro de 1919. Seguiu em diligência para Guarbeque, em 28 de abril de 1919, tendo-se apresentado no mesmo dia (O.S. n.º 179 as G.R.M.G). Repatriado nos inícios de junho, desembarcou em Lisboa no dia 9 de junho de 1919.

3 - João da Rocha Martins

Foi o soldado n.º 403, integrado no CEP, no Batalhão de Mineiros, Regimento de Sapadores Mineiros, 3.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 65143. Quando foi mobilizado para a Guerra já era casado com Margarida de Oliveira. Era filho de António Martins e de Margarida Ferreira, natural e residente em Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 26 de setembro de 1917. Punido em 22 de outubro de 1917 pelo Comandante da Companhia com dois dias de detenção por ter «sido encontrado na estrada e tendo sido avisado em ordem da Comp.ª foi após a referida, encontrado deitado na mesma, infringindo o dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.». Punido em 12 de novembro de 1917 pelo Comandante do Batalhão com 8 dias de detenção por ser encontrado a jogar as cartas, infringindo assim o dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.. Foi colocado na 1.ª Companhia do Batalhão de Mineiros 144

em 1 de dezembro de 1917, onde ficou com o n.º 236. Punido em 26 de fevereiro de 1918 pelo Comandante da 1.ª Companhia com dois dias de detenção por ter faltado nesse dia a uma revista de armamento e aparelhos de antigás o que constituiu infração aos deveres 4.º e 5.º do art.º 4.º do R.D.E.. Baixou à Ambulância n.º 5 em 9 de março de 1918, sendo evacuado para o Hospital de Sangue n.º 1, em 10 e daí para o H.S .n.º 2, no mesmo dia. Teve alta no dia 16 de abril, seguindo, no mesmo dia, para o Q.G.C.. Baixou ao H. em 30 de abril, tendo tido alta em 9 de maio de 1918. Foi punido no dia 9 de maio de 1918 pelo chefe da Ambulância n.º 4 com 6 dias de detenção por se ter ausentado sem licença do Hospital e ter faltado ao recolher, infringindo assim os n.os 4.º e 5.º do art.º 4.º do R.D.E.. No dia 11 do mesmo mês, foi colocado na Companhia de Projetores de Campanha. Punido em 22 de maio de 1918 pelo Comandante da Companhia com dois dias de detenção por ter faltado à formatura para a 3.ª refeição de 21 e 2.ª refeição de 22, infringindo o dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.. Seguiu em diligência ao Q.G.B. em 19 de agosto. Presente na unidade em 20. Já depois da Guerra ter terminado, foi punido em 29 de janeiro de 1919 pelo Comandante da 1.ª Companhia com 8 dias de detenção porque tendo sido nomeado com


MANUEL AUGUSTO DIAS

Fig. 21 - João da Rocha Martins - Soldado

145


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

antecedência para um serviço da Companhia faltou ao mesmo, o que constituiu infração do dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.. Seria repatriado no início do mês seguinte, desembarcando em Lisboa, no dia 7 de fevereiro de 1919.

4 - João Martins da Rocha

Foi o soldado maqueiro n.º 193 e teve a placa de identidade n.º 41861, integrado no CEP, no 4.º Grupo de Metralhadoras, 1.ª Bateria. Quando foi mobilizado era solteiro. Filho de João Martins Rocha e de Maria Ferreira, residia, ao tempo da mobilização, em S. Martinho de Campo, concelho de Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 25 de julho de 1917. Baixou à Ambulância n.º 8, no dia 24 de março de 1918, sendo evacuado para a Ambulância n.º 5, no dia seguinte (25) e daí foi evacuado para o Hospital de Sangue n.º 1, no dia 26 de março e, ainda no mesmo dia, seguiu para o Hospital Canadiano, tendo tido alta para o Depósito Misto no dia 28 de março de 1918. Seguiu para o Depósito de Infantaria no dia 3 de abril. Foi colocado na Bateria de Morteiros Pesados e na 3.ª

146

Fig. 22 - João Martins da Rocha - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

Companhia com o n.º 103, no dia 31 de outubro de 1918. Seguiu para Portugal com o 6.º Batalhão em 15 de abril de 1919, a bordo do “Miller”, desembarcando em Lisboa, no dia 19 de abril de 1919.

5 - Joaquim dos Santos

Foi o soldado n.º 118, integrado no CEP, no 1.º G.B.M., 4.ª Bateria, Regimento de Obuses de Campanha, 1.ª Bateria, com a placa de identidade n.º 50346. Era filho de Serafim dos Santos e de Margarida Dias de Carvalho, natural e residente em S. Martinho do Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 25 de março de 1917. Punido em 10 de dezembro de 1917 pelo Comandante da Bateria com 4 guardas por ter chegado 5 minutos mais tarde à formatura para a 2.ª refeição do dia 8 de dezembro, infringindo o disposto no n.º 5 do art.º 4.º do R.D.E.. Punido em 5 de fevereiro de 1918 pelo Comandante do grupo com 15 dias de detenção porque durante o serviço de terraplanagem furou propositadamente, com a picareta com que trabalhava, um balde que lhe tinha sido emprestado por um 2.º cabo inglês que estava no mesmo serviço e ainda por ter abandonado, sem autorização aquele trabalho, infringindo assim os n.os 5 e 15 do art.º

Fig. 23 - Joaquim dos Santos - Soldado

147


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4.º do R.D.E.. Foi evacuado para o P.E. em 26 de maio de 1918, a fim de ser repatriado nos termos da comunicação 475 de 25 de maio de 1918 da R.S do S.G.C., desembarcando em Lisboa, no dia 19 de julho de 1918.

6 - Joaquim Martins da Rocha

Foi Segundo sargento com o n.º 225, integrado no CEP, no Regimento de Obuses de Campanha, 1.º Batalhão do Q.G., 3.ª Bateria, como chefe de secção e tinha a placa de identidade com o n.º 50609A. No momento da mobilização já era casado com Maria Isaura Ferreira Barbosa. Era filho de Amaro Martins da Rocha e de Ana Ferreira Barbosa, natural e residente em S. Martinho do Campo, em Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 22 de abril de 1917. Colocado no D.Art.C. em 15 de agosto de 1918. Nas observações do seu boletim do CEP há registos que foram alterados e, sem haver a possibilidade de cruzamento de fontes, restam algumas dúvidas, razão por que optei por Fig. 24 - Joaquim Martins da Rocha - 2.º Sargento

148


MANUEL AUGUSTO DIAS

transcrever apenas aqueles que figuram com maior nitidez de escrita. Uma das observações refere que foi «abatido ao efectivo do 3.º G.B.A. por motivo de se encontrar ausente (O.S. n.º 131 do 3.º G.B.A. de 3-8-918)». Foi considerado repatriado no dia 3 de maio de 1919.

7 - José Coelho

Foi Soldado Condutor (mais tarde seria promovido a Cabo), e era natural do lugar de Coletinha, freguesia de S. Martinho de Campo, concelho de Valongo. Filho de Luís Coelho, jornaleiro, e de Maria Ferreira Dias, tecedeira, nasceu no dia 24 de março de 1895, sendo batizado no dia seguinte. Quando foi mobilizado ainda era solteiro. Foi alistado no dia 4 de agosto de 1915, tendo sido incorporado no Regimento de Artilharia 6. Ficou pronto da recruta no dia 4 de julho de 1916, integrando o CEP, no 1.º Batalhão de Obuses de Campanha, com o n.º 71 e teve a placa de identidade n.º 72088. Embarcou em Lisboa, com destino a França, no dia 15 de abril de 1917. Passou ao Batalhão de Sapadores de Caminho-de-Ferro no dia 20 de julho de 1919. Entrou em licença de campanha, por Ordem do Quartel-General, em 7 de setembro, indo domiciliar-se em S. Martinho do Campo, no concelho de Valongo.

Fig. 25 - Registo de Batismo de José Coelho - Soldado

Antes do serviço militar já sabia ler e escrever (a maioria dos soldados portugueses não estava ainda alfabetizada). Foi punido, pelo Comandante da Bateria, no dia 7 de outubro de 1916, com “quatro guardas” por ter alterado o plano de uniformes fazendo uso de um barrete sem a altura regulamentar; e igual pena lhe foi imposta, no dia 11 de novembro de 1916, pelo Comandante do Regimento, por ter faltado ao toque de cabos de dia, apresentando-se 5 minutos mais tarde. De ambas as penas seria amnistiado por D. 5787-5-A de 15 de outubro de 1919 (O.E. n.º 16 de 21 de junho). 149


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Foi repatriado, em abril de 1919, desembarcando em Lisboa, no dia 1 de maio de 1919. Casou no dia 17 de maio de 1923 com Maximina Martins da Hora, vindo a falecer no dia 17 de agosto de 1951, com 56 anos.

8 - José de Melo Guimarães

Foi o Soldado n.º 60, integrado no CEP, no Regimento de Artilharia n.º 6, C.M. n.º 2, 2.ª S.L.M.I. e teve a placa de identidade n.º 28342. Quando foi mobilizado já era casado com Joaquina Ferreira Dias. Filho de António de Melo Guimarães e de Ana Pinto, era natural e residente em S. Martinho do Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Baixou ao H.S. n.º 2 em 13 de janeiro de 1918, tendo alta em 19 de janeiro. Foi colocado na C. a G.C. em 29 de outubro de 1917.

Fig. 26 - José de Melo Guimarães - Soldado

150


MANUEL AUGUSTO DIAS

Aumentado ao efetivo de Trem do Q.G.C. em 11 de março de 1919, onde se achava como adido. Presente no Porto de Embarque a fim de ser repatriado em 1 de junho de 1919, desembarcando em Lisboa no dia 17 de junho de 1919.

9 - José Nogueira dos Santos

Foi o Soldado n.º 82, integrado no 1.º Grupo de Baterias de Obuses, 1.ª Bateria, com a placa de identidade n.º 50317, da série A. Filho de António Nogueira Costa e de Maria dos Santos. Embarcou em Lisboa no dia 23 de março de 1917. Punido em 9 de agosto de 1917 pelo Comandante da Bateria com 4 guardas por ter faltado à formatura da limpeza de gado de 5 do corrente. Punido em 19 de agosto de 1917 pelo Comandante da Bateria com 8 dias de detenção por ter faltado, novamente, à formatura para a limpeza do gado, sendo considerado reincidente no cometimento de faltas desta natureza. Punido em 6 de setembro de 1917 pelo Comandante do Grupo com 8 dias de prisão disciplinar por ter faltado à formatura para a água e limpeza de gado de 2 de setembro e ainda porque tendo sido encarregado pelo sargento de dia de encher os tanques para o gado deixou de cumprir esta ordem não podendo depois ser forçado

Fig. 27 - José Nogueira dos Santos - Soldado

151


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

ao cumprimento da referida ordem por se ter ausentado sem licença do acampamento, infringido os n.os 4 e 5 do art.º 4.º do R.D.E.. Punido no dia 15 de setembro de 1917 pelo Comandante do Grupo com 15 dias de prisão correcional por se ter ausentado sem licença da limpeza de arreios, respondido inconvenientemente ao comandante de escalão quando lhe ordenava que mandasse compor o fato e ainda por não ter cumprido uma ordem dada pelo mesmo comandante do 3.º escalão, transmitida por um cabo, para regressar ao escalão, sendo reincidente em faltas análogas, infringindo os n.os 1, 5 e 24 do art.º 4.º do R.D.E..

Aumentado ao efetivo do D. Art.ª C. em 16 de setembro de 1918, nos termos da O.C. n.º 200 de 24 de julho de 1918, onde ficou com o n.º 305 (O.S. do D.Art.ª C. de 16 de setembro de 1918). No dia 26 de setembro de 1918 foi transferido para o Depósito Misto, conforme O.S. do Comando do Q.G.B. n.º 214 da mesma data. Seguiu do Depósito Misto para a sua unidade em 6 de outubro de 1918 (O do Q.G.B. n.º 281 de 8 de outubro de 1918).

Punido em 15 de janeiro de 1918 pelo Comandante do Grupo com 6 dias de detenção por ter faltado à formatura para a 2.ª refeição, infringindo o n.º 5 do art.º 4.º do R.D.E..

Colocado na Divisão de Artilharia em 16 de outubro de 1918.

Punido em 17 de janeiro de 1918 pelo Comandante da Bateria com 2 guardas por não ter comparecido pontualmente à formatura para a 3.ª refeição, infringindo assim o n.º 5 do art.º 4.º do R.D.E..

Foi condecorado com a medalha comemorativa da ex-

Punido no dia 23 de novembro de 1917 pelo Comandante de Bateria com 8 dias de detenção, atendendo ao seu comportamento anterior, porque numa revista passada pelo Comandante de Escalão foi encontrado o arreio que lhe está distribuído em péssimo estado de limpeza, demonstrando desleixo tanto mais condenável, quanto é certo que têm sido repetidas as recomendações feitas sobre o assunto, infringindo com o seu procedimento o disposto no n.º 8 do do art.º 4.º do R.D.E.. Diligência em 16 de abril de 1918. Presente na unidade 152

em 3 de maio.

Encontra-se no Q.G.B.. Presente no Depósito Misto onde ficou adido, fazendo serviço desde 26 de setembro.


MANUEL AUGUSTO DIAS

pedição a França, conforme O.S. n.º 31 de 27 de fevereiro de 1919.

Seguiu em 1 de abril de 1918 para o D.M.B. por transferência.

Embarcou para Portugal com o E.M. e a 3.ª G.B. em 17 de março de 1919, no “Helenus”, chegando a Lisboa no dia 20.

Foi colocado na 2.ª Bateria do 1.º Grupo de Baterias de Artilharia, em 21 de abril de 1918, onde ficou com o n.º 545.

10 - José Luciano de Sousa Magalhães

Em agosto foi aumentado à 2.ª Bateria, onde ficou com o n.º 850. Presente no D. Art.ª C. ido do 6.º G.B.A. em 1 de outubro de 1918. Colocado no D.M.G.2 em 16 de novembro.

Foi o Soldado n.º 112, tendo integrado o CEP, no Regimento de Artilharia n.º 6, 1.ª Bateria, Coluna de Munições 2 e teve a placa de identidade n.º 33702. Nasceu no dia 24 de junho de 1894, em S. Martinho do Campo e era filho de António de Sousa Magalhães e de Maria Ferreira Pinto, residentes em Quintã de Baixo, na freguesia de S. Martinho do Campo. Assentou praça em 13 de junho de 1916.

Presente na Secção de Adidos, a fim de ser repatriado do D.M.B., em 17 de julho de 1919. Aumentado ao efetivo do D. Art.ª P. C. e à 4.ª secção com o n.º 228 em 1 de outubro de 1918, nos termos da O.C. n.º 200 de 24 de julho de 1918 (O.S. do D.Art.ª C. de 1-10-1918). Abatido ao efetivo do 6.º G.B.A. em 30 de setembro de

Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917 e desembarcou em 24 de agosto. Entrou na 1.ª linha em 15 de novembro de 1917 até 9 de abril de 1918 (Relação do D.Art.C. de 28-10-1918). Punido em 28 de janeiro de 1918 pelo Comandante do 11.º C.B. com 8 dias de detenção por ter perdido a placa de identidade. Em 12 de março de 1918 foi colocado no Depósito Avançado de Munições.

153


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. 28 - José Luciano de Sousa Magalhães- Soldado

154


MANUEL AUGUSTO DIAS

1918, por ter passagem ao D. Art.ª Camp.ª. Foi adir ao O.R.M.G. em 17-11-1918. Deixou de adir à Formação dos O.R.M.G. desde 16 de maio de 1919 (O.S. dos O.R.M.G. de 16 de maio de 1919). Regressou a Lisboa, no dia 11 de fevereiro de 1920.

11 - Manuel Monteiro

Foi o Soldado Condutor n.º 95 e teve a placa de identidade n.º 27900. Foi integrado no CEP no Regimento de Artilharia 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado já era casado com Rita Correia de Carvalho. Filho de António Monteiro e de Marta de Oliveira era natural de S. Martinho de Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Punido no dia 5 de setembro de 1917, pelo Comandante da Coluna com 10 dias de prisão disciplinar por ter, propositada e violentamente, entornado um copo de café que um cabo lhe distribuíra, tentando, em seguida, agredir o mesmo cabo. Foi colocado no Depósito de Material da Base, no dia 1

Fig. 29 - Manuel Monteiro- Soldado

155


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

de abril de 1918. Foi considerado desaparecido no dia 9 de abril, tendo sido feito prisioneiro. Presente em janeiro de 1919. Embarcou para Portugal no dia 31 de janeiro de 1919, desembarcando em Lisboa, no dia 4 de fevereiro de 1919.

12 - Serafim Dias Moreira

Foi o Soldado Condutor n.º 79 e teve a placa de identidade n.º 27885. Foi integrado no CEP no Regimento de Artilharia 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado era solteiro. Filho de Amaro Dias e de Rosa Martins era natural e residente no lugar da Ponte Ferreira, da freguesia de S. Martinho de Campo. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917, tendo chegado a Brest no dia 25 de agosto de 1917. Foi colocado na Coluna de Munições n.º 1, no dia 8 de janeiro de 1918. Presente no Depósito Misto em 12 de junho. Seguiu para o Porto de Embarque no dia 13, a fim de ser repatriado. Embarcou para Portugal no dia 9 de setembro de 1918, desembarcando em Lisboa, no dia 13 de setembro de 1918. 156

Fig. 30 - Serafim Dias Moreira- Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

Soldados de Campo que morreram na Guerra em Moçambique

Oito dos combatentes naturais da freguesia de Campo morreram em Moçambique, durante a Primeira Grande Guerra. Foram os seguintes (por ordem alfabética): 1 – Albino Moreira, soldado n.º 399, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer no dia 15 de agosto de 1917, vítima de disenteria e paludismo. Foi sepultado em Mocímboa da Praia. 2 – Faustino Moreira dos Santos, soldado n.º 346, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi destinado a Moçambique, onde acabou por falecer no dia 3 de agosto de 1917, vítima de paludismo. Foi sepultado em Mocímboa da Praia. 3 – Firmino Benido, soldado n.º 38, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 15 de janeiro de 1918, vítima de meningite cérebro espinhal. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 13197. 4 – José dos Santos, soldado n.º 339, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde faleceu no dia 17 de julho de 1917, vítima de infeção palustre. Foi sepultado em Mocímboa da Praia.

5 – José Ferreira de Abreu, soldado n.º 284, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 9 de janeiro de 1918, vítima de anemia palustre. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 13182. 6 – José Ferreira de Abreu Júnior, soldado n.º 364, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário destinado a Moçambique, onde faleceu no dia 28 de julho de 1917, vítima de Impaludismo. Foi sepultado em Nangalana. 7 – Manuel Joaquim Jorge Pinto, soldado n.º 370, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi combater para Moçambique, onde viria a falecer no dia 2 de agosto de 1918, vítima de disenteria aguda. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 12801. 8 – Manuel Joaquim Ribeiro, soldado n.º 347, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer no dia 7 de julho de 1917, vítima de disenteria. Foi sepultado em Mocímboa da Praia.

157


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

5.4. O esforço de guerra da freguesia de Ermesinde

Figs. 32 e 33 – Brasão e Bandeira de Ermesinde

Brasão oficial e Bandeira Brasão - Escudo mantelado, flanco dextro de vermelho, uma grelha de ouro apontada a chefe, flanco sinistro de negro, duas espigas de milho e uma de trigo, cruzadas e atadas por uma fita verde em chefe, parte de roda dentada de prata; contra chefe facetado ondeado de prata e azul. Coroa mural de cinco torres, já que se trata de uma cidade. Em listel de branco, sotoposto ao escudo, a legenda em letras de negro, maiúsculas – “CIDADE DE ERMESINDE”.

Fig. C – Mapa do concelho de Ermesinde

158

Bandeira - Circundada em branco e verde. Cordões e Borlas em prata e verde. Haste e Lança douradas. No centro da bandeira, o escudo da cidade.


MANUEL AUGUSTO DIAS

Justificação Heráldica A grelha simboliza a morte pelo fogo de São Lourenço de Asmes, santo venerado pelas gentes de Ermesinde. As espigas de milho e trigo simbolizam a sua riqueza agrícola. A parte da roda dentada simboliza o crescente desenvolvimento industrial verificado nesta Cidade. O facetado ondeado simboliza o Rio Leça. O negro significa trabalho, sabedoria e terra fértil. O vermelho recorda as lutas violentas aqui registadas e significa valentia, confiança e generosidade. A prata significa humildade, riqueza e eloquência. O azul significa zelo, lealdade e galhardia. O ouro significa as tradições gloriosas, a fidelidade e a fé. O verde significa esperança e liberdade.

Breve apontamento histórico

Fig. 34 – A Fábrica de Cerâmica de Ermesinde, em plena atividade há cem anos

Implantada na parte noroeste do Concelho de Valongo, e com apenas 7 km2 de área, tornou-se durante a Primeira República a mais populosa freguesia do município valonguense. Atravessada pelo rio Leça que dá grande fertilidade aos poucos terrenos agrícolas que restam, esta cidade apresenta uma topografia pouco acidentada, com uma altitude média que ronda os 90m. Apesar de haver poucas referências documentais escritas quanto à sua ancestralidade, ela não pode ser posta em causa, dadas as condições excelentes que permitiram a fixação humana desde tempos muito 159


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

remotos. Estas terras pertenceram aos Mosteiros de Águas Santas, de Santo Tirso e de Rio Tinto. Neste último mosteiro houve uma abadessa chamada D. Ermezenda, donde alguns estudiosos fazem derivar o nome de Ermesinde que, até ao século XX, foi apenas um dos lugares da freguesia. Há, no entanto, quem afiance que a D. Ermezenda que dá nome a Ermesinde seja a D. Ermezenda Guterres, de finais do século IX, princípios do século X, que casou com o Conde Hermenegildo Guterres, a quem D. Afonso III (o Magno), Rei de Leão, incumbiu de governar e defender as terras de Tuy, Porto e Coimbra da permanente ameaça muçulmana. A atual designação “Ermesinde” vem só de 1911, quando os dirigentes republicanos locais pediram aos constituintes republicanos que mudassem o nome de S. Lourenço de Asmes para este (que até então era apenas o de uma das aldeias da freguesia), o que foi deferido. Um documento do séc. XI, relacionado com o mosteiro de Águas Santas, faz referências explícitas a S. Lourenço de Azomes [Asmes] e a “Ermezenda” [Ermesinde]. Nas inquirições de 1258 mandadas fazer por D. Afonso III, há também referências a “Ermezenda” e à “Paróquia de São Lourenço” e no Foral que D. Manuel I concedeu à Maia, em 19 de maio de 1519, são nomeados vários lugares da paróquia maiata de S. Lourenço, nomeadamente, Cancela, Fonte, Ermesinde, Carvalhal e Sá. A construção das linhas de caminho-de-ferro do Douro e do Minho em 1875 e a sua bifurcação em 160

Ermesinde fez com que esta zona começasse então a povoar-se, mais rapidamente. A partir de 1836, esta freguesia foi integrada no concelho de Valongo, que ainda integra. Graças ao seu constante progresso e crescimento, Ermesinde foi elevada à categoria de Vila em 12 de junho de 1938 e, em 13 de julho de 1990, passou a cidade. Beneficiando de uma privilegiada localização e com boas acessibilidades ferroviárias e rodoviárias (A4, A41 e A3), Ermesinde tem tudo para continuar a prosperar.

Transferência de poderes na freguesia de S. Lourenço de Asmes (27-10-1910) O protagonismo de Ermesinde, no concelho de Valongo, é bem evidente na constituição da Comissão Municipal Republicana, já que 3 dos seus 5 membros são de S. Lourenço de Asmes, e ocupam os cargos mais importantes (Presidente e Vice-Presidente). Tal não é de estranhar, já que as personalidades republicanas de maior destaque no concelho, residiam nesta freguesia que tinha um Centro Republicano bastante dinâmico.


MANUEL AUGUSTO DIAS

nhor Paulo António Antunes (também vereador da Câmara de Valongo até ao dia 11 de outubro), a dar posse da Junta de Paróquia à nova Administração Republicana que era constituída pelos seguintes cidadãos: Amadeu Ferreira Sousa Vilar (que também era o Regedor), José Rebelo Pinto dos Santos, José Maria Ferreira de Matos e Vítor José de Araújo e Sá. Segundo a ata da Junta da Freguesia, de 27 de outubro de 1910 (fls. 19, 19 v e 20), que abaixo se transcreve na íntegra, na ocasião da transmissão de poderes, Paulo António Antunes afirmou que se congratulava com a nomeação da referida Comissão, a quem muito considerava e que pela sua parte acompanhava o novo regime republicano. Secretariou a Comissão Administrativa o secretário do Regedor, Rosendo Rodrigues dos Santos.

Fig. 35 – Antiga igreja de S. Lourenço de Asmes, ao tempo da implantação da República. O seu pároco era Monsenhor Paulo António Antunes

Em S. Lourenço de Asmes, a República foi proclamada no dia 27 de outubro e foi o novo Administrador do Concelho, o insigne republicano ermesindense Dr. Joaquim Maia Aguiar, acompanhado do Monse-

Ata da sessão de posse da Comissão Paroquial Republicana de S. Lourenço de Asmes «Aos vinte e sete dias do mês d’Outubro de mil nove centos e dez (era christã) pelas onse horas da manhã, nesta freguezia de S. Lourenço d’Asmes e sala das Sessões da Junta de parochia desta freguezia achando-se prezente os Cidadãos D.r Joaquim da Maia Aguiar, Administrador deste Concelho de Vallongo, Amadeu Ferreira de Sousa Villar, José Rebello Pinto dos Santos, José Maria Ferreira de Mattos, Victor José d’Araújo e Sá, Manoel Moreira Alves, vogais effectivos da Commissão parochial e Manoel Monteiro Al-

161


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

ves, Domingos Antonio das Neves, Anthero Monteiro de Moura, e José da Silva Paredes vogais substitutos (faltando por motivo justificado o vogal substituto primeiro nomeado Antonio José d’Oliveira Ferraz) e os membros da junta sessante Rev.º Parocho Mgr Paulo Antonio Antunes, Manoel Antonio Marques, Manoel Martins de Castro – assim como Augusto Sobral e Joaquim Gomes da Costa. Pelo Administrador do Concelho foi declarado que em virtude da lei dava posse á comissão parochial que tem de gerir os negócios desta freguezia. O Rev.º Parocho disse que tinha recebido um officio da Adm.ão do Concelho para entregar a Administração da parochia á commissão parochial e que em antes de o fazer declarava que se congratulava por a nomeação da Commissão a quem muito considerava e que pela sua parte acompanharia o novo regimem Republicano. A Junta sessante entregou ordens de pagamento n.os 11 com o recibo junto n.os doze, treze, quatorze, dezasete e dezasete dezoito, com recibos passados nas mesmas ordens de pagamento, isto com respeito ás contas deste corrente anno. Do anno de mil nove centos e nove entregou a mesma as ordens de pagamento numero um, dous, tres, quatro, cinco, seis, sete, oito, onse, dose, dose, treze, quinze (esta com o competente recibo junto), de Antonio Almeida Costa e Companhia outra com o mesmo quinze, outra numero quinze, dezasete, dezoito, dezanove, vinte e vinte e um. A importancia das contas pagas em mil nove centos e nove são de Duzentos setenta mil cento e noventa 162

reis. A importancia dos recibos do anno de mil nove centos e dez nas ordens de pagamento é de trezentos dezaseis mil nove centos e oitenta. O secretario da Junta sessante Joaquim Gomes da Costa entregou dous livros d’actas um que principiou em dezaseis d’Abril de mil oito centos noventa e nove e terminou em cinco de dezembro de mil nove centos e nove athé a data przente, dous livros Diario de Contas da Junta de Parochia, um que principiou em oito de Janeiro de mil oito centos e oitenta e terminou em 31 de Dezembro de mil nove centos e sete e o outro que principiou em (31) trinta e um de Dezembro de mil nove centos e oito athé ao prezente foi também entregue o Caderno de lançamento parochial do anno de mil nove centos e nove, tambem foi entregue pelo Rev.º Parcoho um documento d’Objectos existentes na Egreja da Formiga no anno de 1879 mil oito centos setenta e nove. O cidadão Amadeu Ferreira de Sousa Villar que presidiu a esta sessão disse que hindo a hora bastante adiantada dava a sessão por terminada e marcando o dia trinta pelas tres horas da tarde para nova sessão. Encerrada a sessão da qual se lavrou a prezente acta que vae ser assignada depois de lida em voz alta. E eu Rosendo Rodrigues Santos secretario do regedor a subscrevi. Resalvo a entrelinha que diz Amadeu.» [Assinam: Joaquim da Maia Aguiar, Amadeu Ferreira de Souza Villar, Paulo Antonio Antunes, José Rebello Pinto dos Santos, Jose Maria de Mattos, Manoel Moreira Alves, Victor José d’Araujo e Sá e Joaquim Gomes da Costa].


MANUEL AUGUSTO DIAS

Pouco tempo depois da transferência de poderes, no entanto, os incidentes com o Pároco Paulo António Antunes sucedem-se. Primeiro, por causa da divisão do Cemitério, entre católicos e não católicos, mais tarde, por outros motivos. Segundo Humberto Beça (Ermezinde / Monografia), Monsenhor Paulo António Antunes ao abandonar a paróquia, integrou as incursões monárquicas em Trás-os-Montes, que tiveram lugar na altura do primeiro aniversário da implantação da República, e que pretendiam o retorno à Monarquia. Perante a ameaça de ser preso, ainda de acordo com a mesma fonte, o antigo pároco de Ermesinde ter-se-á refugiado no Brasil. Na sua antiga Paróquia, formou-se entretanto uma Associação Cultual que, apesar de tudo, duraria pouco tempo. No período da Primeira Guerra Mundial, a Freguesia de Ermesinde teve como Presidentes de Junta de Freguesia, José Ferreira do Vale (até 2 de janeiro de 1918) e António Silva Baltazar Brites (durante a “Monarquia do Norte” e até 8 de março de 1919).

163


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

QUADRO III.1 - POPULAÇÃO DE ERMESINDE EM 1911 (por lugar e este por ordem alfabética)

Número de fogos

Número de habitantes

Passal

13

55

113

Porto-Carreiro

12

70

55

269

Quinta da Formiga

3

29

Costa

31

129

Rapadas

46

185

Ermida

42

164

75

371

Estação

40

200

S. Paio

63

361

Formiga

4

46

Souto

16

70

Gandra

17

81

Souto do Moinho

22

77

Igreja

23

98

Travagem

22

96

Liceiras

14

59

Vilar

135

565

Outeiro de Sá

16

64

Vilar de Matos

14

78

Palmilheira

47

200

Total da freguesia

760

3.502

Número de fogos

Número de habitantes

Arregadas

24

122

Ermesinde

26

Cancela

Lugares da freguesia

164

Lugares da freguesia


MANUEL AUGUSTO DIAS

A partir de 1920 Ermesinde passou a ser a freguesia mais populosa do concelho de Valongo Decorrida a 1.ª década de regime republicano, Ermesinde viu o número dos seus habitantes aumentar 25%, passando para 4403 habitantes, tornando-se a freguesia do concelho mais habitada. A freguesia de Valongo passava, então, a ser a segunda mais populosa (3605 habitantes), seguindo-se-lhe Campo (com 2395), Alfena (com 2222) e, por fim, Sobrado (com 2138). Um ano após a implantação da República, a população de Ermesinde somava 3502 habitantes, conforme se pode ver no Quadro III.1 onde se apresenta a população por cada um dos lugares que integravam a freguesia, nesse tempo. A freguesia de Ermesinde era constituída, então, por 23 aldeias, que a seguir enumero, agora pela ordem decrescente do número dos seus moradores: Vilar (565), Sá (371), S. Paio (361), Cancela (269), Estação (200), Palmilheira (200), Rapadas (185), Ermida (164), Costa (129), Arregadas (122), Ermesinde (113), Igreja (98), Travagem (96), Gandra (81), Vilar de Matos (78), Souto do Moinho (77), Souto (70), Porto Carreiro (70), Outeiro de Sá (64), Liceiras (59), Passal (55), Formiga (46) e Quinta da Formiga (29). Em 1920, segundo Humberto Beça, a população de Ermesinde atingia 4440 pessoas, das quais 2211 eram do sexo masculino e 2161 do sexo feminino; 55 ho-

mens e 13 mulheres estavam ausentes. No mesmo ano, a Junta da Freguesia mandou fazer o censo da população, mas chegou a dados substancialmente diferentes: 860 fogos e aproximadamente 5.500 habitantes (cf. Atas da Junta da Freguesia de Ermesinde, de 9.5.1920, fl. 91v.). Em 1928, teria quase 5500 habitantes.

165


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Quadro III.2 – Combatentes da freguesia de Ermesinde que foram mobilizados para a Grande Guerra (França)

Nome

166

Posto

Localidade

Observações

1 – Albino

Soldado

Ermesinde

Escola de Equitação

2 – Adriano de Sousa

1.º Cabo

Ermesinde

Reg.º de Baterias de Obuses

3 – Carlos Monteiro

Soldado

Ermesinde

Comboio automóvel

4 – Custódio Leite

Soldado

Ermesinde

Reg.º de Infantaria 31

5 – Domingos Gomes da Costa

Soldado

Ermesinde

Reg.º de Infantaria 6

6 – Domingos Moutinho Leavo

Soldado

Ermesinde

Reg.º de Infantaria 31

7 – Domingos Pereira Fernandes

1.º Cabo condutor

Ermesinde

Reg.º de Infantaria 6

8 – Joaquim da Silva Panelo

Soldado

Vilar

GNR / 5.º Batalhão

9 – Joaquim de Oliveira

Soldado

Ermesinde

Secção Automóvel

10 – Manuel de Oliveira Júnior

Soldado

Ermesinde

Reg.º de Sapadores Mineiros

11 – Manuel Ferreira Bento

Soldado

Ermesinde

Reg.º de Infantaria 31

12 – Manuel Ferreira do Vale

Soldado

Ermesinde

Grupo de Baterias de Obuses

13 – Manuel Ferreira dos Santos Júnior

2.º Sarg.

Ermesinde

Faleceu no dia 19-10-1918

14 – Manuel Moutinho

Soldado

Ermesinde

Grupo de Baterias de Obuses


MANUEL AUGUSTO DIAS

1 - Albino – Soldado.

Natural e residente em Ermesinde, integrou o CEP (Corpo Expedicionário Português), na Escola da Equitação, 1.º Esquadrão. Teve a placa de identidade n.º 67405 e como soldado era o n.º 121. Quando foi mobilizado era solteiro, filho de António de Oliveira e de Olívia Moutinho da Silva. Embarcou em Lisboa, no dia 2 de julho de 1917, com destino a França. Foi colocado no D.to do Q.G.B. em 9 de maio de 1918. Foi adir ao D. Mx. em 8 de outubro de 1918. Presente no E.R. ido do D.I. em 10 de outubro. Presente no Q.G.B. ido do serviço de Polícia da Base por ter terminado a pena de 30 dias de prisão correcional, que ali foi cumprida, em 3-9-1918, regressando ao Depósito do Q.G.B., onde presta serviço. Recolheu à sua unidade em 8-10-1918, ido do D. Mx. onde estava adido (O. do Q.G.B. n.º 292 de 19-10-1918). Condenado pelo d. G. do Corpo, por despacho de 11 do corrente na pena de trinta dias de prisão correcional, em 4-7-1918 (O.S. do Q.G.C., n.º 188 de 12 de julho de 1918). Em setembro de 1918 marchou para o Q.G.B. em 4, por ter cumprido a pena imposta pelo D.G.C. (O.S. da

mesma data do D.P.B.) Punido em 26-9-1918 pelo seu comandante interino da Base com vinte dias de detenção por se ter ausentado do seu acampamento sem licença para “Calais” e apresentar-se só no dia imediato. Em maio de 1919 foi punido com 15 dias de prisão correcional porque achando-se de guarda valeu-se do seu posto de serviço do qual se ausentou para tentar roubar sacas de aveia da arrecadação respetiva o que não conseguiu por ter sido pressentido a tempo, pelo que infligiu os n.os 5.º e 19.º do art.º 4.º do R.D.E. (O.S. n.º 13-5-1919). No dia 21 de maio de 1919 marchou para o D.D.1. Presente no Porto de Embarques a fim de ser repatriado em 2 de junho de 1919.

167


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. 36 – Albino - Soldado

168


MANUEL AUGUSTO DIAS

2 - Adriano de Sousa

1.º Cabo com o n.º 200, foi integrado no CEP no 1.º R.B.O., 1.ª Bateria, tendo a placa de identidade n.º 50339, série A. Natural e residente em Ermesinde, era filho de António de Sousa e de Júlia Rodrigues Faria. Embarcou em Lisboa no dia 20 de março de 1917. Baixou ao H.B.2 em 10 de junho de 1918, tendo tido alta em 13 de agosto. Colocado no D. Art. C. em 16 de agosto onde ficou com o n.º 179 da 4.ª Bateria. Foi louvado pelo muito zelo, dedicação e competência no desempenho do seu serviço e sangue frio nos momentos de perigo (O.S. do 4.º G.B.A. de 6 de janeiro de 1919 com o n.º 933 de 28.3.1919). Colocado no 4.º G.B.A. em 30 de setembro de 1918. Foi repatriado com o 4.º G.B.A., em 16 de maio de 1919, tendo chegado a Lisboa, em 19 de maio de 1919.

Fig. 37 – Adriano de Sousa - 1.º Cabo

169


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3 – Carlos Monteiro

Foi integrado no CEP, Comboio Automóvel, 3.º G.C.A.M. Teve a placa de identidade n.º 65680 e como soldado foi o n.º 417, 3.ª série. Quando foi mobilizado era solteiro, filho de Francisco Monteiro e de Ana Soares. Natural e residente em Ermesinde. Embarcou em Lisboa no dia 26 de setembro de 1917. Punido em 26-10-1917 pelo Comandante doo 3.º GCA, com 10 dias de detenção por urinar dentro de um cantil de um seu camarada. Punido em 15-11-1917 pelo Comandante do 1.º Escalão com 4 guardas porque na noite de 14 ter satisfeito uma necessidade corporal nas mantas de um seu camarada sem que mostrasse doença que justifique a prática de tal ato. Foi colocado no Serviço de Transportes Automóveis em 1 de abril de 1918, onde ficou com o n.º 923. Punido em 23-4-1918 pelo Comandante do P.A. com 4 guardas por faltar à formatura do recolher. Punido em 31 de maio de 1918 pelo Comandante do P.A. com duas guardas por não cumprir prontamente uma ordem dada pelo oficial de dia. Punido em 1 de junho de 1918, pelo Comandante do P.A. com seis dias de detenção por ter respondido inconvenientemente ao sargento de dia quando lhe 170

dava uma ordem de serviço. Punido em 25 de junho de 1918 pelo Chefe da Secção Técnica Automóvel com 4 dias de detenção porque achando-se de serviço na construção de barracões foi encontrado sentado e sendo admoestado riu-se da admoestação infringindo o n.º 4 do art.º 4.º do R.D.E.. Punido pelo Diretor da ambulância 4 em 1 de fevereiro de 1919, com 10 dias de detenção, atendendo ao seu comportamento anterior, por haver faltado à formatura do rancho, tendo-se ausentado do acampamento sem autorização, infringindo o art.º 4 e 5.º do R.D.E.. Punido em 17 de fevereiro de 1919, pelo Diretor da Ambulância 4, com 15 dias de prisão correcional por se ter ausentado do estacionamento de noite e em grupo, utilizando abusivamente 2 mulas e um carro de esquadrão, pertencente a esta Ambulância, estando ausente sem licença durante algumas horas, dando lugar a que uma das muares tivesse regressado bastante ferida, infringindo assim os deveres expressos nos números 4, 5, 12 e 15 do art.º 4.º do R.D.E. com referência às disposições do § 1.º do art.º 78 do mesmo regulamento. Esta punição seria alterada para 60 dias de prisão correcional, pelo General Comandante da 2.ª divisão, no dia 19 de fevereiro de 1919. Marchou a apresentar-se na sua unidade da SAAB, em O.S. da S.A.B., de 23-11-1918. Presente no PE em 20 de março de 1919, ido do D.N.1. Aumentado ao efetivo da CAF em 5-10-1918. Abatido ao efetivo do DD1 indo para o P.E. em 19-3-


MANUEL AUGUSTO DIAS

1919. Abatido ao efetivo do CAFF com passagem a Ambulância 4 em 20-12-1918 (OS n.º 269 do CAFF1). Embarcou para Portugal ido da S.A. do P.E. em 28 de março de 1919, no “Helenus”, desembarcando em Lisboa, no dia 31 de março de 1919.

Fig. 38 – Carlos Monteiro - Soldado

171


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4 - Custódio Leite

Soldado natural e residente em Ermesinde, tendo integrado o CEP, na 1.ª divisão de Infantaria, como soldado do Regimento de Infantaria n.º 31, 1.ª Companhia, onde teve a placa de identidade n.º 30206-A e o n.º 702, como soldado. Era solteiro, filho de António Leite e de Serafina Ferreira e residente na Rua do Hotel de Sá, em Ermesinde. Embarcou em Lisboa no dia 12 de setembro de 1917. No seu boletim do CEP, não há mais quaisquer observações a não ser a de que embarcou para Portugal em 19 de dezembro de 1917 a fim de responder no Tribunal Militar do Porto. Três dias depois (22 de dezembro de 1917) desembarcava em Lisboa.

Fig. 39 – Custódio Leite - Soldado

172


MANUEL AUGUSTO DIAS

5 - Domingos Gomes da Costa

Soldado que integrou o CEP na 1.ª divisão de Infantaria, Regimento de Infantaria n.º 6, 1.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 63307 e como soldado era o n.º 405. No momento da mobilização já era casado com Maria Ferreira; era filho de Joaquim Gomes da Costa e de Maria Ferreira da Costa e residente em Ermesinde. Embarcou em Lisboa, no dia 15 de maio de 1917 e regressou à mesma cidade, no dia 22 de outubro de 1917, cinco meses depois, por ter sido julgado incapaz de todo o serviço, em sessão de 9 de julho de 1917, tendo passado ao D.A.B. em 23 do mesmo mês. Seguiu para o P.D. a fim de ser evacuado para Portugal em 30 do mesmo mês. Seguiu para Portugal por via terrestre em 17 de outubro de 1917.

Fig. 40 – Domingos Gomes da Costa - Soldado

173


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

6 - Domingos Moutinho Leavo

Foi um soldado ermesindense que integrou o CEP, na 1.ª Divisão de Infantaria, Regimento de Infantaria n.º 31, 1.ª Companhia. Teve a placa de identidade n.º 30208-A e foi o soldado n.º 704. Era filho de Joaquim Moutinho Leavo e de Maria Moreira dos Santos e residente no lugar de Vilar, casa n.º 3. Embarcou em Lisboa no dia 12 de setembro de 1917. Nas observações da sua ficha do CEP consta que baixou ao Hospital n.º 2 em 8 de novembro de 1917. Seguiu para Portugal com 60 dias de licença da Junta a fim de ser repatriado em 22 de julho de 1918. Foi punido no dia 9 de abril de 1918 (curiosamente a data da Batalha de La lys) pelo Comandante do Departamento de Infantaria, com 15 dias de detenção por ser conivente no desvio de duas latas com gorduras de carne não aproveitadas no rancho geral. Foi repatriado em 23 de outubro de 1918, desembarcando em Lisboa no dia 28 de outubro de 1918.

Fig. 41 – Domingos Costa Leavo - Soldado

174


MANUEL AUGUSTO DIAS

7 - Domingos Pereira Fernandes

Foi 1.º Cabo Condutor, com o n.º 9 e a placa de identidade n.º 27799. Integrou o CEP, no Regimento de Artilharia n.º 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado era solteiro. Filho de Manuel Pereira Fernandes, já falecido, e de Margarida Francisca de Oliveira era natural e residente em Ermesinde, na Rua do Passal, n.º 74. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Foi colocado no 6.º Grupo de Baterias de Artilharia, em 12 de outubro de 1917. Foi evacuado para o P.D. a fim de ser repatriado por precisar de mais 30 dias de repouso, em 27 de maio de 1918. Aumentado ao efetivo do Depósito de Artilharia do Corpo e à 2.ª Secção, com o n.º 404, em 23 de outubro de 1918, nos termos da O.C. n.º 200, de 24 de julho de 1918. Ausente por excesso de licença, desde 18 de outubro de 1918 (O.S. do D. Art.ª C. de 22 de outubro de 1918). Abatido ao efetivo do D. Art.ª C. por ordem do Q.G.C. em 31 de janeiro de 1919 (O.S. do D. Art.ª C. de 31-11919). Embarcou para Portugal a bordo do transporte inglês “Czaritza” em 9 de setembro, desembarcando em Lisboa, no dia 13 de setembro de 1919.

Fig. 42 – Domingos Pereira Fernandes - 1.º Cabo

175


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

8 - Joaquim da Silva Panelo

Soldado (GNR) foi integrado no CEP, no Batalhão n.º 5, na 1.ª Companhia. Teve a placa de identidade n.º A66147 e como soldado teve os n.os 116 e 1194. Era natural de Vilar (Ermesinde), e no momento da sua integração no CEP já era casado com Maria Barbosa da Silva, que residia na freguesia de Cedofeita, bairro ocidental do Porto. Era filho de Domingos da Silva Panelo e de Felismina Marques Ferreira. Embarcou em Lisboa, no dia 15 de maio de 1917. Baixou ao Hospital de Brest em 9 de junho de 1917, tendo tido alta em 10 de setembro. Baixou novamente ao Hospital de Brest em 2 de abril de 1918, tendo tido alta em 25 do mesmo mês. Punido em 5 de fevereiro de 1918 pelo Comandante do P.D. com 12 dias de detenção por ter sido encontrado a jogar a dinheiro com alguns camaradas. Punido em 2 de abril de 1918 pelo Comandante do P.D. com 15 dias de detenção porque tendo terminado o serviço de patrulha internacional foi para um animatógrafo sem licença, onde esteve até às 22 horas, em vez de se recolher imediatamente ao aquartelamento como devia. Repatriado a bordo do transporte “Pedro Nunes” em 14 de outubro de 1919 – Serviço de Adidos, desembarcou na capital portuguesa em 18 de outubro de 1919. 176

Fig. 43 – Joaquim da Silva Panelo - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

9 - Joaquim de Oliveira

Soldado ermesindense que integrou a Secção Automóvel do CEP. Teve a placa de identidade n.º 26835 e foi o soldado n.º 287. Era filho de José de Oliveira e de Maria Moreira, residente na Rua Elias Garcia, n.º 1012. Embarcou em Lisboa no dia 2 de agosto de 1917 e aí desembarcou em 16 de fevereiro de 1919. Seguiu em 8 de abril de 1918, para a S.F.A. para fazer o exame para chofer. Presente em 20 por ter desistido do referido exame. Punido em 2 de junho de 1918 pelo Comandante da Companhia com dois dias de prisão disciplinar por ser encontrado mal uniformizado fora do aquartelamento contra o que está expressamente determinado, infringindo os deveres 4.º, 8.º e 10.º do art.º 4.º do R.D.E.. Punido em 22 de junho de 1918, pelo Comandante de Companhia, com um dia de prisão disciplinar por ter faltado à formatura para a 3.ª refeição de 21, infringindo o dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.. Punido em 12 de dezembro de 1918 pelo Comandante com 10 dias de detenção por não se ter apresentado numa revista de roupa com a devida compostura, infringindo o dever 10.º do art.º 4.º do R.D.E..

Fig. 44 – Joaquim de Oliveira - Soldado

177


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Licença de campanha por dez dias em 24 de dezembro de 1918. Presente em 3 de janeiro de 1919. Abatido ao efetivo do T.C.A. por ter regressado a Portugal com a C.P.C. – O.S. n.º 44, de 13 de fevereiro de 1919.

10 - Manuel de Oliveira Júnior

Soldado n.º 572, que integrou o Regimento de Sapadores Mineiros, na 3.ª Companhia, tinha a placa de identidade n.º 54815. Natural e residente em Ermesinde, era filho de Manuel de Almeida e de Maria Ferreira. Embarcou em Lisboa no dia 26 de maio de 1917. Durante o tempo que permaneceu na Guerra, consta nas “Observações” que baixou à Ambulância n.º 4 em 19 de junho de 1917. Foi isento condicionalmente em sessão de 25. Teve alta em 27 do mesmo mês. Em 21 de junho de 1918 baixou ao n.º 4 Stationary Hospital, tendo tido alta do Hospital inglês no dia 28 do mesmo mês. Foi repatriado para Portugal, desembarcando em Lisboa no dia 8 de julho de 1919. Fig. 45 – Manuel de Oliveira Júnior - Soldado 178


MANUEL AUGUSTO DIAS

11 - Manuel Ferreira Bento

Soldado n.º 564 da 1.ª Divisão de Infantaria, 2.ª Companhia, Regimento de Infantaria n.º 31, com a placa de identidade n.º 30404-A. Natural e residente em Ermesinde, quando foi mobilizado já era casado com Delfina Moreira. Era filho de pai incógnito e de Margarida Moreira, já falecida. O parente mais próximo era a esposa, que residia na freguesia de Sobrado. Embarcou em Lisboa no dia 12 de setembro de 1917 e aí regressou no dia 4 de outubro de 1918.

Fig. 46 – Manuel Ferreira Bento - Soldado

179


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

12 - Manuel Ferreira do Vale

Foi o soldado n.º 174, integrado no CEP, no 1.º G.B.O., 1.ª Bateria, R.O.C. e tinha a placa de identidade n.º 50260. Era filho de José Teixeira do Vale e de Angélica Martinho Pereira, natural de Ermesinde e residente na Rua Elias Garcia, n.º 645. Embarcou em Lisboa, no dia 23 de março de 1917. Seguiu em diligência para a 3.ª Bateria do Grupo, em 3 de janeiro de 1918. Presente em 9 de janeiro. Foi ferido em combate, em 9 de março de 1918, dia em que baixou ao Hospital, sendo evacuado para o Hospital n.º 32, em 11 de março, tendo tido alta no dia 25 do mesmo mês. Foi colocado no D.Art.C., em 16 de agosto, onde ficou com o n.º 181 da 3.ª Bateria. Da Escola de Sinaleiros seguiu, em 4 de janeiro de 1919, para o D.Art.C., tendo sido retirado desta unidade em 3 de fevereiro de 1919. Daí foi adir ao 6.º G.B.A., no mesmo dia. Foi condecorado com a Medalha Comemorativa da Expedição a França. No dia 30 de abril de 1919 foi repatriado com a 2.ª B. do 6.º G.B.A., desembarcando em Lisboa, no dia 4 de março de 1919. Fig. 47 – Manuel Ferreira do Vale - Soldado

180


MANUEL AUGUSTO DIAS

13 - Manuel Ferreira dos Santos Júnior

Foi 2.º Sargento, teve o n.º 515, foi integrado no CEP, na Divisão de Infantaria, 2.ª Companhia, Regimento de Infantaria n.º 31 e tinha a placa de identidade n.º 24734. Era natural e residente em Ermesinde, filho de Manuel Ferreira dos Santos e de Ana Ferreira de Jesus. Embarcou em Lisboa no dia 14 de fevereiro de 1918 e acabaria por falecer em França, no dia 19 de outubro de 1918. A este propósito, o seu Boletim do CEP refere o seguinte: «Ferido por desastre em serviço em 19 de Outubro de 1918, dia em que baixou ao H. S. n.º 8. Faleceu no mesmo, no referido dia, sendo sepultado no cemitério civil de Herbelles, coval n.º 9». Mais tarde, o seu corpo terá sido trasladado para o Cemitério de Richebourg l`Avoué (Talhão C, Fila 11, Coval 7) conforme se pode ver na imagem.

Fig. 48 – Manuel Ferreira dos Santos Júnior - 2.º Sargento

181


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Fig. 49 – Campa de Manuel Ferreira dos Santos Júnior no Cemitério de Richebourg l`Avoué

182


MANUEL AUGUSTO DIAS

14 - Manuel Moutinho

Foi o soldado n.º 235 do CEP, integrado no 1.º G.B.O., 1.ª Bateria e teve a placa de identidade da série A, n.º 50228. Natural de Ermesinde, era filho de Albino Moutinho e de Maria de Sousa. No momento da mobilização já era casado com Silvina Moreira dos Santos, que residia na freguesia de Alfena, no lugar de Transleça. Embarcou em Lisboa, no dia 23 de março de 1917. Foi colocado na 3.ª Companhia do B.S.C.F. onde ficou com o n.º 107, em 23 de julho de 1918. Embarcou para Portugal em 10 de janeiro de 1919 a fim de escoltar praças condenadas a penas maiores. Presente no D.A.C. onde ficou adido, aguardando ordens do Q.G.C. (O.S. do D.A.C. n.º 308 de 18 de novembro de 1918). Desembarcou na capital portuguesa no dia 13 de janeiro de 1919, sendo retirado ao efetivo da unidade em 14 de fevereiro de 1919, em virtude do art.º 2.º da O. n.º 37 do Q.S.do CEP, de 8 de fevereiro. Fig. 50 – Manuel Moutinho - Soldado

183


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Soldados de Ermesinde que morreram na Guerra em Moçambique

Quinze dos combatentes naturais da freguesia de Ermesinde morreram em Moçambique, durante a Primeira Grande Guerra. Foram os seguintes (por ordem alfabética): 1 – Antero da Silva, soldado n.º 125, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer no dia 30 de agosto de 1917, vítima de sarampo. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 12867. 2 – António da Silva Martins Júnior, soldado n.º 307, do Regimento de Sapadores Mineiros, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 27 de outubro de 1917, vítima de tifo malária. Não se conhece o local da sua sepultura. 3 – Américo Gomes, soldado n.º 345, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi combater para Moçambique, onde faleceu no dia 7 de julho de 1917, vítima de disenteria. Não é conhecido o local onde foi sepultado. 4 – Augusto Moreira, soldado n.º 464, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que seguiu para Moçambique, onde viria a falecer no dia 14 184

de julho de 1918, vítima de disenteria. Não se conhece o local da sua sepultura. 5 – Daniel Pejão, soldado n.º 407, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde faleceu em data desconhecida, vítima de disenteria. Também não é conhecido o local onde foi sepultado. 6 – David de Almeida, soldado n.º 529, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 25 de abril de 1918, vítima de paludismo. Foi sepultado no Cemitério de Goba, Coval 7. 7 – Domingos de Sousa Gomes, soldado n.º 1087, da Companhia de Telegrafistas de Praça, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 29 de agosto de 1916, por causa desconhecida. Foi sepultado no Cemitério de Namoto, Coval desconhecido. 8 – Domingos Moreira Nogueira, soldado n.º 341, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde faleceu no dia 5 de julho de 1917, por diarreia amibiana. Foi sepulta-


MANUEL AUGUSTO DIAS

do no Cemitério de Mocímboa da Praia. 9 – Joaquim de Sousa Rasteiro, soldado n.º 149, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde faleceu em 4 de julho de 1917, vítima de paludismo. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 10 – José Ferreira das Neves, soldado n.º 334, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 21 de agosto de 1917, vítima de impaludismo. Foi sepultado em local desconhecido. 11 – José Pejão, soldado n.º 328, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que seguiu para Moçambique, onde viria a falecer no dia 4 de setembro de 1917, vítima de diarreia. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 12 – Joaquim Moreira dos Santos, soldado n.º 314, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde faleceu no dia 24 de julho de 1917, vítima de enterite. Não é conhecido o local onde foi sepultado. 13 – Manuel Ferreira Barbosa, soldado n.º 477, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 11 de setembro de 1917, vítima de impaludismo. Foi sepultado em local desconhecido. 14 – Manuel Teixeira, soldado n.º 416, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer em data

desconhecida, vítima de impaludismo. Não é conhecido o local onde foi sepultado. 15 – Serafim Pinto da Silva, soldado n.º 345, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 30 de julho de 1917, vítima de tifo malária. Foi sepultado em local desconhecido. No Mosteiro da Batalha, existe uma placa comemorativa do 3.º aniversário da Batalha de La Lys, dedicada aos valorosos soldados portugueses da Grande Guerra, que se bateram naquela trágica batalha de 9 de Abril de 1918, e que foi mandada gravar pela Junta da Freguesia de Ermesinde (a inscrição dessa placa é a que, a seguir, se reproduz).

HOMENAGEM DA FREGUESIA DE ERMESINDE – DISTRITO DO PORTO EM 9 DE ABRIL DE 1921 AOS SOLDADOS DE PORTUGAL SIMBOLIZADOS NOS DOIS HERÓIS DESCONHECIDOS QUE BEM SOUBERAM MORRER PELA HONRA E PARA GLÓRIA DA PÁTRIA. VIVA A REPÚBLICA

185


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

5.5. O esforço de guerra da freguesia de Sobrado

Figs. 52 e 53 – Brasão e Bandeira de Sobrado

Brasão oficial e Bandeira Brasão - Escudo de prata, uma rosa heráldica de pétalas de vermelho, botoada de ouro e folhada de verde, sobreposta a um crescente de azul e entre duas espigas de trigo de verde. Em contrachefe, três montes de verde moventes dos flancos. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco, com a legenda a negro em maiúsculas: “SOBRADO – VALONGO”. Bandeira - Esquartelada de verde e branco, cordões e borlas de prata e verde. Haste e lança de ouro.

Justificação Heráldica Fig. 51 – Mapa do concelho de Sobrado Orago - Santo André Área – 19,4 Km

186

A ordenação heráldica do brasão e bandeira da freguesia de Santo André de Sobrado foi publicada no Diário


MANUEL AUGUSTO DIAS

da República, III Série, de 4 de agosto de 2003. Os elementos que figuram no Brasão da Vila de Sobrado são uma referência à sua ruralidade, à sua história e à sua fertilidade.

Fig. 54 – Casa do Visconde de Oliveira do Paço, em Sobrado, início do séc. XX

Breve apontamento histórico

Alguns lugares da Paróquia de Santo André de Sobrado já são mencionados nas Inquirições Gerais de 1258. Trata-se da maior freguesia do concelho de Valongo, também ela atravessada pelo rio Ferreira. Povoada desde tempos remotos, existem ainda muitos vestígios da presença de romanos e mouros. E é da antiga convivência entre cristãos e mouros, ainda antes da nacionalidade, que resultou uma tradição festiva ainda revivida nos dias de hoje – a festa das Bugiadas no dia de S. João – a que

acorrem milhares de pessoas que já conhecem esta tradição uma das mais originais do País. Sobrado era uma das freguesias que antes de ser integrada no concelho de Valongo pertencia ao Julgado de Aguiar de Sousa. Já no século XIX, a literatura sobre Sobrado, declara que a sede da freguesia possuía uma boa Escola Régia onde era lecionado o ensino primário, tinha uma excelente Igreja, embora sem torre sineira (que poucos anos depois seria construída a expensas de um conterrâneo que emigrou para o Brasil, onde foi bem sucedido), e um bom Cemitério. Com a criação do concelho de Valongo, em 1836, foram integradas, para além das freguesias maiatas de Valongo, Ermesinde e Alfena as freguesias de Campo e de Sobrado. No ano de 2001, mais concretamente, no dia 19 de abril, Sobrado foi elevada a Vila. Após o processo de reorganização administrativa, no âmbito da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, a Freguesia de Santo André de Sobrado juntou-se à Freguesia de São Martinho de Campo constituindo uma nova estrutura orgânica da administração local denominada “União de Freguesias de Campo e Sobrado”.

187


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Transferência de poderes na freguesia de Sobrado

local, verifica-se que no dia 28 de outubro de 1910, foi recebido o ofício do Administrador a comunicar os nomes dos elementos da Comissão Municipal Republicana que deveriam comparecer no domingo, dia 30 de outubro, pelas 12 horas, na casa de sessões da Junta a fim de tomarem posse, certamente conferida pelo Administrador do Concelho, Dr. Joaquim da Maia Aguiar. O que é interessante é verificar que no dia 24 de março de 1911, o mesmo Administrador, pondo em prática as determinações do Governo Provisório, com um cunho claramente anticlericais, comunica à Junta Republicana de Sobrado e a todas as outras do concelho, que as verbas até então destinadas ao culto seriam destinadas, daí em diante, à instalação de Bibliotecas Populares. A 19 de abril seguinte, o Administrador pede à Comissão Republicana Paroquial para ouvir os negociantes e industriais da freguesia sobre o dia mais conveniente para o descanso semanal pedindo para depois lhe ser comunicado.

Fig. 55 - Igreja de Santo André de Sobrado

Na freguesia de Sobrado, a transferência de poderes ocorreu no dia 30 de outubro de 1910. Embora não tenhamos tido acesso ao respetivo livro de atas, pela consulta do registo do correio entrado na Junta de Paróquia 188


MANUEL AUGUSTO DIAS

QUADRO IV.1- POPULAÇÃO DE SOBRADO EM 1911 (por lugar e este por ordem alfabética) Número de fogos

Número de habitantes

Campelo

15

70

Balsa

31

139

Costa

18

92

Devesa

20

98

Felgueira

8

47

Ferreira

29

136

Fijós

32

120

Gândara

17

72

Lomba

45

175

Paço

33

161

Sobrado

119

492

Vilar

93

381

Total da freguesia

864

3.678

Lugares da freguesia

A freguesia de Sobrado era constituída, então, por 12 lugares que a seguir enumero, agora pela ordem decrescente do número dos seus moradores: Sobrado (492), Vilar (381), Lomba (175), Paço (161) Balsa (139), Ferreira (136), Fijós (120), Devesa (98), Costa (92), Gândara (72) Campelo (70) e Felgueira (47). 189


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Quadro IV.2 – Combatentes da freguesia de Sobrado que foram mobilizados para a Grande Guerra (França)

Nome

190

Posto

Localidade

Observações

1 – Abel da Silva Vitória

Soldado

Lomba

Trem de Bagagens e Víveres

2 – Adelino Ferreira dos Santos

Soldado

Sobrado

Grupo de Baterias de Obuses

3 – António Fernandes Moreira Júnior

Soldado

Paço

Grupo de Baterias de Obuses

4 – Joaquim Ferreira Neto

Soldado servente

Sobrado

Secção de Metralhadoras Pesadas


MANUEL AUGUSTO DIAS

1 - Abel da Silva Vitória Soldado n.º 545, que integrou o CEP, no Trem de Bagagens e Víveres, 1.º Escalão, Regimento de Cavalaria n.º 9, 3.º Esquadrão e teve a placa de identidade n.º 29079. Filho de António da Silva Vitória, já falecido no momento da mobilização, e de Angelina Dias, residente no lugar da Lomba, freguesia de Sobrado. Embarcou em Lisboa no dia 2 de julho de 1917. Punido em 4 de junho de 1918 pelo art.º 2.º da ordem do Comandante do Q.G. com 4 dias de detenção por não cumprir prontamente a ordem que lhe deu o Comandante para cortar o cabelo. Deixou de adir ao P.D.1 em 14 de março de 1919. Presente de diligência em 16 de março de 1919 (O.S. n.º 439 de 16 de março de 1919). Presente no D.P. do CEP em 29 de março de 1919, ido do D.P. da 1.ª Divisão. Diligência ao D.D.1 indo do comando do Q.G.C., em 26 de abril de 1919. No dia 15 de junho de 1919 teve passagem ao D.D.1 para o quadro permanente (O.S. do Q.G.C. n.º 164 de 16 de junho de 1919). Repatriado com o D.D.1 em 5 de julho de 1919, desembarcando na capital portuguesa em 8 de julho de 1919. Presente no P.D.1, na 1.ª Secção e no 1.º Escalão em 6 de novembro de 1919.

Fig. 56 - Abel da Silva Vitória - Soldado

191


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

2 - Adelino Ferreira dos Santos

Foi o soldado n.º 175, integrado no CEP, no 1.º G.B.O., 1.ª Bateria, com a placa de identidade n.º 41142. Era filho de José Ferreira dos Santos e de Maria Ferreira, natural e residente em Sobrado. Embarcou em Lisboa, no dia 23 de março de 1917. No dia 3 de janeiro de 1918 seguiu para a 3.ª B.ª do grupo em diligência. Presente em 9, vindo da 3.ª Bateria, do grupo. Baixou ao Hospital da Base em 29 de maio de 1918. Foi repatriado com a 5.ª C.S.C.G. em 27 de abril de 1919. No final da Guerra, desembarcou em Lisboa, no dia 1 de maio de 1919.

Fig. 57 - Adelino Ferreira dos Santos - Soldado 192


MANUEL AUGUSTO DIAS

3 - António Fernandes Moreira Júnior

Foi o soldado n.º 36, integrado no CEP, no 1.º G.B.O., 1.ª Bateria, com a placa de identidade n.º 50319. Era filho de António Fernandes Moreira e de Vitorina Moreira, residentes no lugar de Paço, da freguesia de Sobrado. Embarcou em Lisboa no dia 23 de março de 1917. Seguiu para o D.M. a fim de ser evacuado para Portugal em 11 de junho de 1918 por lhe terem sido concedidos 30 dias de licença. Embarcou para Portugal em 9 de setembro de 1918, desembarcando em Lisboa, no dia 13 de setembro de 1918.

Fig. 58 - António Fernandes Moreira Júnior - Soldado

193


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4 - Joaquim Ferreira Neto

Soldado Servente com o n.º 208 e a placa de identidade n.º A27525. Foi integrado no CEP no Depósito de Infantaria, Secção de Metralhadoras Pesadas, 3.º Grupo de Metralhadoras, 4.ª Bateria. Quando foi mobilizado para a Guerra era solteiro. Filho de Manuel Ferreira Neto e de Ana de Almeida era natural e residente em Sobrado, concelho de Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 14 de julho de 1917. Foi colocado na 4.ª Companhia do Batalhão de Infantaria 5, onde ficou com o n.º 867, em 4 de agosto de 1917. Foi punido no dia 30 de março de 1918 pelo Comandante de Companhia com 10 dias de detenção porque tendo desatendido uma ordem transmitida por um graduado não compareceu a uma formatura de pelotão. Regressou a Portugal no dia 19 de julho de 1918.

Fig. 59 - Joaquim Ferreira Neto - Soldado

194


MANUEL AUGUSTO DIAS

Soldados de Sobrado que morreram na Guerra em Moçambique

Seis dos combatentes naturais da freguesia de Sobrado morreram em Moçambique, durante a Primeira Grande Guerra. Foram os seguintes (por ordem alfabética): 1 – André Martins Lopes, soldado n.º 902, do Regimento de Artilharia de Montanha, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde acabou por falecer no dia 24 de dezembro de 1918, vítima de gripe. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 14982. 2 – Joaquim Dias de Oliveira, soldado n.º 476, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi defender Moçambique, onde acabaria por falecer no dia 11 de outubro de 1917, vítima de disenteria. Foi sepultado na Ilha de Moçambique. 3 – José André Gaspar, soldado n.º 97, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 23 de fevereiro de 1918, vítima de disenteria e paludismo. Foi sepultado

no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 13281. 4 – Manuel Alves Sousa Júnior, soldado n.º 293, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde veio a falecer no dia 19 de outubro de 1917, vítima de disenteria amibiana. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 12989. 5 – Manuel Coelho, soldado n.º 518, do Regimento de Infantaria n.º 31/21, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 12 de julho de 1917, vítima de perniciosa. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 6– Manuel Ferreira da Costa Júnior, soldado n.º 317, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 27 de julho de 1917, vítima de impaludismo e disenteria. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 195


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

5.6. O esforço de guerra da freguesia de Valongo

Figs. 61 e 62 – Brasão oficial e Bandeira de Valongo

Brasão - Escudo de verde, faixeta ondada de prata, carregada de uma tira ondada de azul; em chefe, um báculo de pastor de prata e uma palma de ouro, passados em aspa; em ponta, três espigas de trigo, de ouro, atadas de vermelho no pé. Coroa mural de prata de três torres. Listel branco com a legenda a negro: “FREGUESIA DE VALONGO”. Bandeira - De fundo amarelo, cordões e borlas de ouro e verde.

Justificação Heráldica Fig. 60 - Mapa da localização da freguesia de Valongo Orago – São Mamede Área – 24 Km2

196

A ordenação heráldica do brasão e bandeira da freguesia de São Mamede de Valongo foi publicada no Diário da República, III Série, de 8 de janeiro de 1999. Os elementos que figuram no Brasão da freguesia de Valongo são


MANUEL AUGUSTO DIAS

uma referência à fertilidade do seu vale, que a converteram em terra de pão, e à mineração de ouro que aqui se fez no tempo da ocupação romana.

Fig. 63 – A antiga Estação de Valongo, na Linha do Douro

Breve apontamento histórico O território da atual freguesia de Valongo revela indícios de ter sido habitado pelo Homem desde tempos muito remotos. Há, nas Serras de Santa Justa e de Pias, vestígios de civilizações castrejas da Idade do Ferro, havendo referências a três castros, denominados Alto do Castro, Castro de Pias e Castro de Couce. A existência de espólio romano nestes altos povoados galaicos, como mós, “tegulae” e outras peças de cerâmica sugere que também tenham sido ocupados pelos romanos, que aqui exploraram, de forma sistemática e intensa, o ouro. Aliás, o nome da própria freguesia não esconde a origem latina “Vallis Longus”. Por Valongo passavam também vias ro-

manas de grande importância, nomeadamente Porto-Guimarães, que servia para levar o ouro até ao Porto, e daí grande parte seguia para Roma. Há, igualmente, vestígios da ocupação sueva, visigótica e muçulmana. Finda a Reconquista Cristã nesta região e dadas as boas condições que os terrenos férteis e as linhas de água proporcionavam ao território da freguesia foi o mesmo ocupado de forma definitiva, sendo bem antigos os lugares de Valongo, Susão e Couce, junto ao rio Ferreira. A produção de cereais, sobretudo o trigo, a sua moagem e sequente panificação trouxeram grande fama a Valongo como o grande centro produtor e distribuidor de pão e de biscoitos destinados ao abastecimento da cidade do Porto e de toda a região, uma vez que por aqui passava uma das estradas mais importantes na ligação do Porto ao interior.

Transferência de poderes na freguesia de Valongo Na freguesia de Valongo foi o Abade Guilherme Gonçalves Branco, Presidente da Junta, que no dia 28 de outubro, com João de Sousa Fernandes Luz, secretário da mesma, conferiu posse à nova Comissão Republicana de que faziam parte: José Francisco Pereira (Presidente), Vicente Duarte Dias, José Moreira Marques, Manuel Romeiro Alves do Vale e Adolfo de Sousa Paupério (vogais efetivos), nomeados pelo Governador Civil do Porto e confirmado pelo Administrador e Presidente da Autori197


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

dade Civil do concelho, Dr. Joaquim da Maia Aguiar que também esteve presente bem como o Regedor interino da vila, Belmiro Martins Castro.

«A Commissão Parochial Republicana de Vallongo, reunida pela primeira vez depois de proclamada a Republica, resolve saudar no povo de Lisbôa, na Marinha e no Exercito os heroes da Revolução, especialmente o intrepido marinheiro Machado dos Santos; e egualmente resolve exarar na presente ata um voto de profundo sentimento, pelos portuguezes que perderam a vida n’essa lucta gloriosa». E na reunião seguinte, a 13 de novembro de 1910, a nova Junta de Paróquia, demonstrando que estava de “pedra e cal” com o Governo Provisório da República, aprovou uma proposta, apresentada pelo vogal Adolfo de Sousa Paupério, que era do seguinte teor:

Fig. 64 - Igreja Matriz de Valongo

No dia 30 de outubro de 1910, reuniu, pela primeira vez, a Comissão Paroquial e aprovou por unanimidade a seguinte proposta do seu presidente: 198

«Que fosse lançado na presente ata um voto de louvor ao Ex.mo Sr. Ministro da Justiça, o cidadão D.or Affonso Costa, pelas leis sabias e justas pelo mesmo até hoje promulgadas, e referendadas pelo Governo Provisorio da Republica Portuguesa, especialmente, as que alteraram o Codigo Civil sobre a sucessão e disposições testamentarias; Que se espere a conclusão do arrolamento e liquidação do exame dos bens e haveres, dividas ativas e passivas da junta de Parochia, de 20 para 15%, a favor dos parochianos d’esta villa; Finalmente que é do dever desta Commissão, cumprir o mandado que lhe foi confiado com muita prudência e moderação, pois que, havendo legados importantes para diversas obras que têm de ser feitas de accordo e com os votos conformes dos herdeiros dos respetivos bemfeitores, era bom que para tal fim houvesse o mais breve possível uma approximação entre esses herdeiros e esta Comissão».


MANUEL AUGUSTO DIAS

QUADRO V.1 - POPULAÇÃO DE VALONGO EM 1911 (por lugar e este por ordem alfabética)

Número de fogos

Número de habitantes

Couce

11

70

Pereiras

3

23

Susão

140

602

Valongo

706

2.961

População dispersa

4

22

Total da freguesia

864

3.678

Lugares da freguesia

A freguesia de Valongo era constituída, em 1911, por 4 lugares (mais população dispersa, 22 habitantes) que a seguir enumero, agora pela ordem decrescente do número dos seus moradores: Valongo (2961), Susão (602), Couce (70) e Pereiras (23).

199


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Quadro V.2 – Combatentes da freguesia de Valongo que foram mobilizados para a Grande Guerra (França)

Nome

200

Posto

Localidade

Observações

1 – António Dias

Soldado

Susão

Reg.º Infantaria 18

2 – António Gomes de Oliveira

Soldado

Valongo

Grupo de Baterias de Obuses

3 – António Moreira Soares

1.º Cabo condutor

Minas de Vale de Achas

Grupo de Baterias de Morteiros

4 – Cândido Ferreira Sopé

1.º Cabo

Valongo

Batalhão de Cavalaria

5 – Francisco (Almeida)

Soldado corneteiro

Valongo

Ferido em combate 25-8-1918

6 – Jacinto Monteiro de Jesus

1.º Cabo guarda-fios

Valongo

Companhia de Telegrafistas

7 – João Ventura Cardoso

Soldado

Valongo

Companhia de Administração Militar

8 – José Alves do Vale

1.º Cabo

Valongo

Trem de Bagagens e Víveres

9 – José Borges da Silva

1.º Cabo Condutor

Valongo

Prisioneiro na Batalha de La Lys

10 – José da Silva Freire

Soldado

Valongo

Reg.º de infantaria 18

11 – José Dias de Almeida

Soldado servente

Valongo

Reg.º de Artilharia 6

12 – Manuel da Rocha Camões

Soldado

Valongo

Reg.º de Artilharia 6

13 – Manuel Dias

1.º Sarg.

Valongo

Escola de Enfermeiros

14 – Manuel Madeira

2.º Sarg.

Valongo

Reg.º de Obuses de Campanha


MANUEL AUGUSTO DIAS

1 - António Dias

Soldado n.º 651, foi integrado no CEP, no 3.º D.I., Regimento de Infantaria n.º 18, 1.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 66226. Era filho de José António Dias e de Brígida de Sousa Ferreira, natural e residente em Susão, freguesia e concelho de Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 11 de julho de 1917. Foi colocado na Companhia de Trabalhadores do Corpo em 15 de janeiro de 1918. Julgado incapaz de todo o serviço em sessão de 22. Seguiu para o P.D. em 12 de março. Embarcou para Portugal a bordo do Cruzador Auxiliar “Gil Eanes” em 7 de abril, desembarcando em Lisboa no dia 10 de abril de 1918.

Fig. 65 - António Dias - Soldado

201


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

2 - António Gomes de Oliveira

Foi integrado no CEP, como Soldado da 1.ª Companhia de Comando, com o n.º 78, do 1.º G.B.O., 1.ª Bateria e teve a placa de identidade n.º 50299. Era filho de José Joaquim Gomes Oliveira e de Ana Ferreira Martins, sendo natural e residente em Valongo. Embarcou em Lisboa no dia 23 de março de 1917. Baixou à Ambulância n.º 5, em 19 de outubro de 1917, tendo tido alta no dia 23 do mesmo mês. Passou ao T.D.2 (tendo sido aumentado ao seu efetivo) em 26 de março de 1919, ido do T.D.1, a fim de ser repatriado. Embarcou para Portugal no dia 20 de abril de 1919, a bordo do “Maryland”, desembarcando em Lisboa, no dia 23 de abril de 1919.

Fig. 66 - António Gomes de Oliveira - Soldado

202


MANUEL AUGUSTO DIAS

3 - António Moreira Soares

Foi Primeiro-Cabo Condutor com o n.º 15H, integrado no CEP, no 2.º Q.B.M., R.O.C, 2.ª Bateria e teve a placa de identidade n.º 50525. Era filho de José Maria Soares e de Maria Martins Moreira, residentes nas Minas de Vale de Achas, na freguesia de Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 23 de março de 1917. Baixou ao H.S. n.º 8, em 1 de novembro de 1918, tendo tido alta em 8 do mesmo mês, seguindo para a sua unidade. Foi condecorado com a medalha comemorativa da expedição a França, art.º 1.º da O.S. n.º 31 de 27 de fevereiro de 1919 do 3.º G.B.A.. Embarcou para Portugal com o E.M. e M. do 3.º G.B.A. em 17 de março de 1919, desembarcando em Lisboa, no dia 20 de março de 1919.

Fig. 67 - António Moreira Soares - Soldado

203


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

4 - Cândido Ferreira Sopé

Primeiro-Cabo com o n.º 19, foi integrado no CEP, no B.Cl.4, 4.ª Companhia, com a placa de identidade n.º 56207. Filho de José da Silva e de Margarida Ferreira Sopé, natural e residente em Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de abril de 1917. Punido em 11 de janeiro de 1918 pelo Comandante da 5.ª Companhia com 2 dias de detenção por não ter cumprido as instruções recebidas, infringindo assim o dever 4.º do art.º 4.º do R.D.E.. Passou ao S.E.M.M. em 10 de agosto de 1918. Foi repatriado com o E.M.M. do B.S.C.Ferro em 27 de abril de 1919, desembarcando em Lisboa, no dia 1 de maio de 1919.

Fig. 68 - Cândido Ferreira Sopé - 1.º Cabo

204


MANUEL AUGUSTO DIAS

5 – Francisco (Almeida)

Soldado Corneteiro n.º 67 e com a placa de identidade n.º 41903. Foi integrado no CEP no 4.º Grupo de Metralhadoras, 1.ª Bateria. Quando foi mobilizado já era casado com Clementina Correia de Jesus. Filho de Bernardo Almeida, já falecido, e de Ana de Jesus, também já falecida, era natural de Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 25 de julho de 1917. Foi punido no dia 12 de fevereiro de 1918 pelo Comandante do Batalhão com 8 dias de detenção por ter sido encontrado a jogar as cartas na caserna, contra o que está determinado. Passou a fazer serviço no 3.º Grupo de Metralhadoras a partir de 5 de maio de 1918. Foi punido no dia 22 de julho de 1918, com 3 dias de detenção, por não se ter apresentado a tempo de entrar ao serviço, comparecendo na parada dez minutos mais tarde, quando aquela formatura já tinha sido dividida pelo Sargento-ajudante, infringindo o n.º 5 do art.º 4.º do R. D.E.. Voltou a ser punido no dia 27 de julho de 1918, com 4 guardas, porque tendo terminado o castigo de 3 dias de detenção se não apresentou aos oficiais e sargentos da Bateria, como lhe cumpria, infringindo o n.º 4 do art.º 4.º do R.D.E..

Fig. 69 - Francisco Almeida - Soldado

Ferido em combate no dia 25 de agosto de 1918, dia em 205


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

que baixou ao Hospital de Sangue n.º 8, tendo tido alta no dia 8 de setembro. Presente na Bateria de Morteiros Pesados e colocado na 3.ª Companhia com o n.º 4, em 31 de outubro de 1918, conforme O.S. n.º 1, do mesmo Batalhão.

Portugal com a Escola de Sinaleiros em 5 de abril de 1919, no “Pedro Nunes”, desembarcando em Lisboa, no dia 9 de abril de 1919.

Foi punido no dia 5 de fevereiro de 1919, com 5 dias de detenção, por ter faltado no dia 3 de fevereiro à 3.ª refeição, infringindo o dever n.º 5, do art.º 4.º do R.D.E.. Baixou ao Hospital por ter caído do comboio 3069 quando se dirigia de Busnes para Cherbourg, Porto de Embarque, onde se apresentou no dia no dia 1 de março de 1919, seguindo para Portugal, desembarcando em Lisboa, no dia 5 de março de 1919.

6 - Jacinto Monteiro de Jesus Natural de Valongo foi Primeiro-Cabo do CEP, n.º 750, guarda-fios, integrado na Companhia de Telegrafistas 1.ª C.D.F. e teve a placa de identidade n.º 72938. Filho de Emília Monteiro de Jesus era solteiro quando foi mobilizado. Era natural de Valongo. Embarcou no dia 15 de maio de 1917, desembarcando em França no dia 18 de maio de 1917. Seguiu para o Q.G.1 em 19 do mesmo mês. Seguiu para a 1.ª B.I. em 20 de junho de 1917. Seguiu para a 1.ª C.D.T. em 1 de fevereiro de 1919. Punido com 5 dias de detenção, em 14 de fevereiro de 1919, pelo diretor da Escola de Sinaleiros por ter faltado ao 1.º tempo de instrução do mesmo dia. Embarcou para 206

Fig. 70 - Jacinto Monteiro de Jesus- 1.º Cabo


MANUEL AUGUSTO DIAS

7 - João Ventura Cardoso

Soldado n.º 203, que foi integrado no CEP, na 3.ª Secção do Grupo da Companhia de Administração Militar e teve a placa de identidade n.º 34691. Era filho de Artur Ventura Cardoso e de Maria Aniceta Ferreira, natural e residente na freguesia e concelho de Valongo. O parente vivo mais próximo indicado era seu irmão, António Ventura Cardoso que residia na Foz do Douro, na cidade do Porto. Embarcou em Lisboa, no dia 9 de janeiro de 1918. Baixou ao Hospital de Brest em 17 de março de 1918, tendo tido alta a 2 de abril. Em 18 de junho baixou à enfermaria, tendo tido alta no dia 25 do mesmo mês. Em sessão de 17 de junho de 1918 foi julgado incapaz de todo o serviço. Foi repatriado no dia 15 de julho de 1918, a bordo do “Gil Eanes”, desembarcando em Lisboa, no dia 23 de julho de 1918.

Fig. 71 - João Ventura Cardoso - Soldado

207


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

8 - José Alves do Vale

Primeiro-Cabo n.º 135, porta-mochila, integrado no CEP, no T.B.V., 2.º Escalão, Regimento de Infantaria n.º 31, 7.ª Companhia e com a placa de identidade n.º 68 519. Era filho de João Alves do Vale e de Rita Gonçalves de Sousa, natural e residente em Valongo, na Rua do Padrão, n.º 39. Embarcou em Lisboa no dia 2 de julho de 1917. Foi colocado no Trem Divisionário da 1.ª Divisão em 13 de agosto de 1917. Baixou à Ambulância 5 em 19 de outubro de 1917, tendo tido alta em 23 do mesmo mês. Punido em 20 de julho de 1918, pelo Comandante do Trem com 10 dias de detenção por se encontrar a jogar a dinheiro, infringindo o n.º 20 do art.º 4.º do R.D.E.. Aumentado ao efetivo do P.D.2 em 28 de março de 1919, ido do P.D.1, a fim de ser repatriado. Regressou a Portugal a bordo do Maryland, onde embarcou no dia 20 de abril de 1919, tendo desembarcado em Lisboa, no dia 24 de abril. Fig. 72 - José Alves do vale - 1.º Cabo

208


MANUEL AUGUSTO DIAS

9 - José Borges da Silva

Foi Primeiro-Cabo Condutor com o n.º 79 e teve a placa de identidade n.º 27804. Foi integrado no CEP no Regimento de Artilharia 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado era solteiro. Filho de Manuel Borges da Silva e de Cândida Clara Gaia era natural e residente em Valongo. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917, tendo chegado a Brest no dia 25 de agosto de 1917. Baixou ao Hospital no dia 9 de setembro de 1917, tendo tido alta no dia 14. Foi colocado no 6.º Grupo de Baterias de Artilharia no dia 11 de outubro. Baixou ao Hospital de Sangue n.º 1 no dia 15 de dezembro de 1917, sendo evacuado para o Hospital Canadiano n.º 3, no dia 29 de mesmo mês e ano. Teve alta no dia 5 de janeiro de 1918. Foi dado como desaparecido na Batalha de La Lys, dia 9 de abril de 1918, tendo sido feito prisioneiro. Foi presente no dia 20 de novembro de 1918, sendo repatriado no “Gil Eanes” no dia 21 de janeiro, desembarcando em Lisboa, no dia 25 de janeiro de 1919. Fig. 73 - José Borges da Silva - 1.º Cabo

209


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

10 - José da Silva Freire

Foi o Soldado n.º 641, integrado no CEP, no Regimento de Infantaria n.º 18, 1.º Batalhão, 3.ª D.I., 3.ª Companhia e teve a placa de identidade n.º 66769. Era filho de Manuel Dias Gonçalves Freire e de Rosalina Nogueira da Silva, natural de Valongo. No período da mobilização o parente vivo mais próximo indicado foi o pai, que vivia em Matosinhos. Embarcou em Lisboa no dia 12 de julho de 1917. Foi colocado no Batalhão de Infantaria n.º 7, em 19 de agosto de 1917. No dia 7 de abril de 1918 foi colocado na 1.ª Companhia do Bat. I. 28, onde ficou com o n.º 763. Em 12 de outubro de 1918 seguiu, em diligência, para a 176.ª Divisão Britânica, de onde regressou em 16 do mesmo mês e ano. Foi aumentado a Infantaria 21, vindo da Infantaria 18, em 2 de novembro de 1918. Embarcou para Portugal com o Regimento de Infantaria 21, em 25 de fevereiro de 1919, desembarcando em Lisboa no dia 28 de fevereiro de 1919.

210

Fig. 74 - José da Silva Freire - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

11 - José Dias de Almeida

Foi o Soldado Servente n.º 177 e teve a placa de identidade n.º 27857. Foi integrado no CEP no Regimento de Artilharia 6, Coluna de Munições n.º 2, 2.ª Secção Ligeira de Munições de Artilharia. Quando foi mobilizado era solteiro. Filho de João Dias de Almeida e de Iria Martins Moreira era natural e residente em Valongo, na rua da Boavista, n.º 20. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917, tendo chegado a Brest no dia 25 de agosto de 1917. Foi colocado na Escola de Morteiros Pesados no dia 27 de setembro de 1917. No dia 1 de outubro de 1918 foi colocado no Depósito de Artilharia do Corpo e no dia 11 de novembro de 1918 seguiu para o 4.º Grupo de Baterias de Artilharia. É interessante a seguinte nota que consta no seu Boletim do CEP: «Entrou na 1.ª linha em 1-11-917 a 3-4-918 tendo tomado parte em todas as ações que se deram n’aquele período e no sector de Ferme du Bois (Relações do D.A.C. 28-X-918)». Foi repatriado com o 4.º Grupo de Baterias de Artilharia, no dia 16 de maio de 1919.

Fig. 75 - José Dias de Almeida - Soldado

Desembarcou em Lisboa no dia 19 de maio de 1919.

211


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

12 - Manuel da Rocha Camões

Soldado n.º 53 foi integrado no CEP, no Regimento de Artilharia n.º 6, C.M. n.º 2, 2.ª S.L.M.J. e teve a placa de identidade n.º 28335. No momento da mobilização já era casado com Josefina Ferreira Dias. Era filho de Joaquim da Rocha Camões e de Maria Moreira e natural de Valongo. O parente vivo mais próximo era a esposa que vivia em Sobrado de Cima. Embarcou em Lisboa, no dia 21 de agosto de 1917. Foi promovido a 1.º Cabo no dia 5 de novembro de 1917. Baixou ao H.S. n.º 1, em 7 de dezembro de 1917, tendo sido evacuado para um dos hospitais da Base, no dia 9. Evacuado para o Hospital Canadiano n.º 3 em 12. Evacuado para o Hospital n.º 25 no mesmo dia. Alta no dia 20 de dezembro. Foi colocado na Secção Auto do Q.G.B. em 17 de abril de 1918. Colocado no P.A. em 6 de junho. Colocado no H.M.B. em 1 de julho. Baixou ao H.B.1 em 14 de agosto de 1918. Teve alta em 5 de setembro, passando para o D.C.B. Foi-lhe dada licença de Campanha por 10 dias, com início em 4 de fevereiro de 1919. Presente em 14 de fevereiro. Foi autorizado a usar a medalha comemorativa da Expedição a França (O.S. n.º 52, de 21 de fevereiro de 1919). Repatriado com a formação do Q.G.C. em 7 de julho de 1919, desembarcou em Lisboa, no dia 10 de julho de 1919. 212

Fig. 76 - Manuel da Rocha Camões - Soldado


MANUEL AUGUSTO DIAS

13 - Manuel Dias

Foi 1.º Sargento do Corpo Expedicionário Português com o n.º 19, desempenhando as funções de Enfermeiro Hípico do Quartel-General do Corpo, fazendo parte da Escola de Enfermeiros. Quando foi mobilizado para a Guerra já era casado com Palmira Gonçalves Vieira Dias. Era filho natural de Amélia Dias, já falecida. Nasceu em Valongo, mas vivia com a esposa em Viana do Castelo, na Rua de Monserrate, n.º 9. Embarcou em Lisboa, no dia 14 de março de 1917. Foi louvado pelo zelo e diligência com que sempre desempenhou os serviços da sua especialidade e outros de que acidentalmente foi encarregado (O.S. do CEP n.º 114, de 20 de junho de 1917). Gozou 20 dias de licença de campanha com início no dia 12 de outubro de 1917 e fim no dia 1 de novembro, data em que se apresentou ao serviço. Foi louvado pelo zelo e atividade que desenvolveu ultimamente no cumprimento das ordens que lhe foram dadas para que num certo prazo de tempo, todo o gado de trem fosse ferrado com ferragem especial, medida esta que se impunha a resolver urgentemente, pois logo que caíram as primeiras neves se reconheceram as sérias dificuldades que se deparavam ao serviço dos transportes hipomóveis e os graves riscos que corriam as viaturas e respetivas equipagens, se ele não tivesse atuado logo e

Fig. 77 - Manuel Dias - 1.º Sargento

213


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

prontamente (Ordem de Serviço do Quartel General do Corpo, n.º 3, em 3 de janeiro de 1918). Foi abatido ao Quartel-General do Corpo e repatriado no dia 27 de maio de 1919 (Ordem de Serviço do Comando do Quartel General do Corpo, n.º 144, de 28 de maio de 1919).

14 – Manuel Madeira

Foi natural de Valongo, filho de José Madeira (já falecido) e de Maria Rocha. Como Segundo Sargento teve o n.º 176 e foi integrado no CEP, como 1.º Reforço do Regimento de Obuses de Campanha. Teve a placa de identidade n.º 65275. Embarcou em Lisboa, em 20 de setembro de 1917. Colocado no 5.º G.B.A. em 15 de janeiro de 1918. Colocado no 6.º G.B.A. em 15 de julho. Baixa ao H.B.2 em 7 de agosto. Alta para o D.C.B. em 23 de outubro. Presente na unidade em 6 de novembro de 1918. Tomou parte na Batalha de La Lys de 9-4-1918. Foi-lhe concedida licença por 10 dias, com princípio em 13 de fevereiro de 1919. Presente em 23. Foi repatriado com a 4.ª B. do 6.º G.B.A. em 30 de abril de 1919. Desembarcou em Lisboa, em 4 de maio de 1919. Fig. 78 - Manuel Madeira - 2.º Sargento 214


MANUEL AUGUSTO DIAS

Soldados de Valongo que morreram na Guerra em Moçambique

Sete dos combatentes naturais da freguesia de Valongo morreram em Moçambique, durante a Primeira Grande Guerra. Foram os seguintes (por ordem alfabética): 1 – Augusto Marques da Silva, soldado n.º 232, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi defender Moçambique, onde acabou por falecer no dia 23 de outubro de 1917, vítima de disenteria. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques, Coval 12994. 2 – João Marques de Azevedo, 1.º cabo n.º 518, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde viria a falecer em data desconhecida e por motivo desconhecido. Não se conhece o local onde foi sepultado. 3 – Joaquim Ferreira Sofia, soldado n.º 221, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi enviado para Moçambique, onde faleceu no dia 22 de agosto de 1917, vítima de disenteria e paludismo. O seu corpo ficou no mar. 4 – Joaquim Pereira Neves, soldado n.º 296, do Regimen-

to de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde viria a falecer no dia 31 de julho de 1917, vítima de paludismo pernicioso. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 5 – José da Rocha Martins, soldado n.º 340, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que foi para Moçambique, onde faleceu no dia 13 de julho de 1917, vítima de acesso pernicioso e cerebral. Foi sepultado no Cemitério de Mocímboa da Praia. 6 – Laurindo Alves Carneiro, soldado n.º 533, do Regimento de Artilharia n.º 6, do Corpo Expedicionário que combateu em Moçambique, onde acabaria por falecer no dia 11 de julho de 1918, vítima de doença. Não se conhece o local onde foi sepultado. 7 – Manuel dos Santos Mota Júnior, soldado n.º 451, do Regimento de Infantaria n.º 31, do Corpo Expedicionário que esteve em Moçambique, onde viria a falecer no dia 19 de setembro de 1917, vítima de anemia palustre e disenteria. Foi sepultado no Cemitério de Lourenço Marques. 215


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Conclusão

216


MANUEL AUGUSTO DIAS

A primeira Grande Guerra, que a Europa e o Mundo conheceram entre 1914 e 1918, provocou dezenas de milhões de vítimas, entre as quais quase 20 milhões de mortos, somando civis e militares. Portugal tendo participado na Guerra, contabilizou, à sua escala, também muitas vítimas, entre mortos e feridos. Terão sido, no total, perto de 8 000 mortos (quase 5 000 em Moçambique, pouco mais de 2 000 em França – os últimos estudos apontam para 2 086: 2 012 praças e sargentos e 74 oficiais – e pouco mais de 800 em Angola), quase o mesmo número de feridos (a grande maioria em França) e praticamente o mesmo número de prisioneiros (a grande maioria na Batalha de La Lys, em 9 de abril de 1918). Na Flandres, os últimos estudos apontam para exatamente 2 086 combatentes portugueses mortos, assim dis-

criminados: 1 310 morreram em combate, 70 em resultado dos gases, 121 por desastre, 529 por doença e 56 foram vítima da pneumónica. No dia do Armistício, 11 de novembro de 1918, havia na força expedicionária portuguesa 21 267 baixas, entre as quais, 5 224 feridos, 6 678 prisioneiros e 7 279 incapazes para o serviço (muitos deles sofriam de tuberculose pulmonar) Os soldados do concelho de Valongo, como se viu nos capítulos anteriores, na sua grande maioria, terão seguido para Moçambique, logo nos primeiros contingentes, onde muitos acabariam por morrer, vítimas de doença. Para a França quase todos seguiram a partir de março de 1917 e ao longo de todo esse ano (o primeiro contingente havia partido de Lisboa no final de janeiro de 1917, mas sem militares de Valongo), já com o duplo objetivo 217


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

de substituir aqueles que haviam partido em janeiro de 1917 ou de reforçar o efetivo militar português naquele palco de guerra. Para a Flandres, ao serviço do Corpo Expedicionário Português, estiveram pouco mais de meia centena de valonguenses. Com base nos dados a que foi possível aceder, felizmente, morreu apenas um combatente do concelho de Valongo (o Segundo Sargento, Manuel Ferreira dos Santos Júnior, de Ermesinde, que menos de um mês antes de terminar a Guerra foi vítima de um fatal “desastre em serviço”), o que dá uma taxa de mortalidade

bastante baixa (1 morto para 56 expedicionários, quando, a nível nacional, a proporção é de 1 morto por cada 26 combatentes).

O mesmo não aconteceu em Moçambique onde morreram 41 soldados naturais do município de Valongo. Não sabemos, pela impossibilidade de aceder às fontes fidedignas, quantos soldados oriundos do concelho de Valongo foram integrados nos corpos expedicionários que se constituíram com destino a Moçambique e a que já fizemos referência no capítulo 5 desta publicação. Mas sabemos que dos soldados que para lá partiram, o número de vítimas mortais é francamente perturbador. Todos eles foram identificados, freguesia a freguesia. Dos 41 expedicionários valonguenses que foram enviados para Moçambique e morreram durante a Guerra, naquele território português, a grande maioria, como se viu, faleceu por doença. Destes, pela ordem decrescente, 15 eram naturais da freguesia de Ermesinde, 8 da freguesia de Campo, 7 da freguesia de Valongo, 6 da freguesia de Sobrado e 5 da freguesia de Alfena.

Fig. 79 - Cemitério Militar Português em Richebourg l`Avoué, onde está sepultado o ermesindense Manuel Ferreira dos Santos Júnior 218

Dos 15 soldados ermesindenses que morreram em Moçambique, 9 não se sabe onde foram sepultados, 3 foram sepultados no Cemitério de Mocímboa da Praia (no norte de Moçambique), 1 em Goba (no interior sul, não muito longe da antiga capital, Lourenço Marques), 1 no Cemitério de Lourenço Marques e 1 em Namoto (também no norte de Moçambique).


MANUEL AUGUSTO DIAS

Dos 8 soldados naturais da freguesia de Campo que morreram durante a Grande Guerra em Moçambique, 4 foram sepultados no Cemitério de Mocímboa da Praia, 3 no Cemitério de Lourenço Marques e 1 Nangalana, também no norte de Moçambique. Dos 7 combatentes da freguesia de Valongo, que faleceram durante a Primeira Grande Guerra, em Moçambique, 2 foram sepultados no Cemitério de Lourenço Marques, 2 no Cemitério de Mocímboa da Praia, 1 ficou no mar e 2 não se sabe onde terão sido sepultados. Dos 6 expedicionários da freguesia de Sobrado que morreram na Guerra em Moçambique, 3 foram sepultados no Cemitério de Lourenço Marques, 2 no Cemitério de Mocímboa da Praia, 1 no Cemitério da Ilha de Moçambique (também no norte deste território, próximo do porto de Nacala). Dos 5 militares portugueses da freguesia de Alfena que morreram ao serviço da Pátria portuguesa em Moçambique, 2 não se conhece o lugar da sepultura, 2 foram sepultados no Cemitério de Lourenço Marques e 1 no Cemitério de Mocímboa da Praia. Em conclusão, quanto ao lugar do enterramento dos 41 combatentes naturais do concelho de Valongo, que morreram em Moçambique, 12 foram sepultados no Cemitério de Mocímboa da Praia, 11 no Cemitério de Lourenço Marques, 1 no Cemitério de Nangala, 1 no Cemitério de Goba, 1 no Cemitério de Namoto, 1 no Cemitério da Ilha de Moçambique, 1 no Mar e 13 foram sepultados em local desconhecido.

Fig. 80 - Mausoléu em ruínas no Cemitério de Mocímboa da Praia, em Moçambique, onde foram sepultados 12 combatentes naturais do concelho de Valongo Foto de Manuel Roberto (2014) in: http://www.momentosdehistoria.com

Se distribuirmos os 41 mortos valonguenses pelos anos em que ocorreram essas mortes verificamos que o ano em que morreram mais foi o de 1917, com 27 mortos (10 de Ermesinde, 5 de Campo, 4 de Alfena, 4 de Sobrado e 4 de Valongo), 8 no ano de 1918 (3 de Campo, 2 de Ermesinde, 2 de Sobrado e 1 de Valongo), 1 no ano de 1916 (de Ermesinde) e em 5 casos não é conhecido o ano da morte. Todas estas vítimas merecem ser recordadas pela sua entrega à defesa da Pátria. É verdade que existem, um pouco por todo o país, pequenos monumentos de homenagem aos Heróis e aos Mortos da Grande Guerra. Mas há muitas localidades que esqueceram os seus expedicionários.

219


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Nesta conjuntura do Centenário da Grande Guerra e, mais próximo de nós, do Armistício, muitos estudos têm sido feitos e é natural, e desejável, que outros monumentos evocativos, ou simples placas toponímicas, surjam a lembrar o trágico sofrimento que atingiu, em primeiro lugar os nossos soldados que combateram, mas também o grande número de famílias que ficaram, temporária ou definitivamente, sem os seus entes queridos. Finda a Guerra, começou a tratar-se da Paz. A Delegação Portuguesa à Conferência de Paz foi presidida, em primeiro lugar, pelo Prof. Egas Moniz (Prémio Nobel da Medicina), e, a seguir, pelo grande estadista republicano que foi Afonso Costa. A este último enviou a Junta da Freguesia de Ermesinde (sem dúvida, a freguesia do concelho de Valongo que maior esforço de Guerra fez, ao ver mobilizados 14 homens para a Flandres e ao registar 16 mortos na Guerra, 15 em Moçambique e 1 em França) um telegrama com o seguinte conteúdo: «Presidente Delegação Portuguesa á Conferência de Paz. Junta Freguesia de Ermesinde associa-se reclamações interesses portugueses e aplaude atitude de V.ª Ex.ª; a Mr. Clemenceau, Presidente do Ministerio Francez». Poucos dias depois, chegou a resposta de Afonso Costa agradecendo as felicitações e cumprimentos que lhe haviam sido dirigidos da parte da Junta da Freguesia de Ermesinde, por telegrama (cf. atas da Junta da Freguesia de Ermesinde de 1 e de 29 de junho de 1919). Sendo Portugal um dos vencedores da Grande Guerra, ao lado dos Aliados, e tendo sabido reivindicar a sua condição de vencedor nas negociações para a paz, conseguiu manter as suas colónias em África durante mais cinco décadas e meia, mas perdeu a liberdade e a democracia durante quase meio século. 220

Fig. 81 – Soldados portugueses numa trincheira

A 1.ª Guerra Mundial revelar-se-ia, pelos seus efeitos, o evento político-social que mais contribuiu para a decadência e definitiva queda da Primeira República Portuguesa. Mas, Portugal, dentro das suas possibilidades, contribuiu diretamente para a Paz e para a nova ordem internacional que valorizou a Liberdade e o princípio das Nacionalidades. Este livro é uma forma de prestar sentida e justa homenagem aos nossos antepassados valonguenses que se bateram, patrioticamente, pelos valores da Paz, da Liberdade e da Solidariedade.


Cronologia



MANUEL AUGUSTO DIAS

PRIMEIRA GRANDE GUERRA – DIA A DIA 28 de junho de 1914 Assassinato do arquiduque Francisco Fernando Assassinato do arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do trono da Áustria-Hungria. - Orçamento do ministério da Guerra Discute-se no parlamento português o orçamento do ministério da Guerra. O ministro confidencia a um dos deputados, sobre o que o exército tinha ou não tinha para assegurar a defesa nacional: «Não digo que tem pouco, digo que não tem nada». 23 de julho de 1914 A Áustria envia um Ultimato à Sérvia A pretexto do atentado de Sarajevo, em que foi assassinato o arquiduque Francisco Fernando, A Áustria envia um Ultimato à Sérvia, onde exige a condenação do atentado e a punição dos seus autores. O governo austríaco pretende resposta da Sérvia até sábado, 25 de julho, às 18 horas. 28 de julho de 1914 Inicia-se a 1.ª Grande Guerra O governo austríaco considera a resposta da Sérvia destituída de sinceridade no propósito de acabar com a propaganda anti-austríaca e, por isso, as forças austríacas iniciaram a invasão da Sérvia, passando o Danúbio, e através da Bósnia, atravessando o

Drina. - Primeiras Declarações de Guerra A Áustria-Hungria declara guerra à Sérvia. A Rússia mobiliza, dando início às movimentações que levarão ao desencadear em 4 de Agosto da Primeira Guerra Mundial. 1 de agosto de 1914 Mais Declarações de Guerra A Alemanha declara a guerra à Rússia. A França ordena a mobilização geral dos exércitos. 3 de agosto de 1914 Pedido inglês ao governo português Ainda antes de declarar guerra à Alemanha, o Governo britânico propõe a Portugal que se abstenha de fazer qualquer declaração de neutralidade, que não favoreceria os interesses britânicos, que assim não poderia contar com o apoio de Portugal, caso fosse necessário. - A Alemanha invade Luxemburgo e a Bélgica A Alemanha invade o Luxemburgo e a Bélgica e declara a guerra à França. 4 de agosto de 1914

223


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Garantias britânicas

12 de agosto de 1914

O Governo britânico, que nesta data apresenta a sua declaração de guerra à Alemanha, informa o governo português que, em caso de ataque alemão a colónias portuguesas, se considera ligado pelos termos da aliança anglo-portuguesa. 5 de agosto de 1914 Pedido inglês O Governo britânico reitera o pedido anterior, para que Portugal se abstenha de declarar a sua neutralidade. 7 de agosto de 1914 Reunião do Congresso da República Reunião extraordinária do Congresso da República para aprovar as linhas mestras da política externa na nova situação de guerra na Europa. Declaração oficial de Bernardino Machado, relembrando os deveres da aliança com a Grã-Bretanha, aos quais Portugal não se furtaria. O governo apresenta uma proposta de lei conferindo ao executivo as faculdades necessárias para garantir a ordem em todo o país, salvaguardar os interesses nacionais, bem como ocorrer a qualquer emergência de carácter económico e financeiro. (Lei n.º 275, de 8 de Agosto de 1914, aprovada por unanimidade). 10 de agosto de 1914 Questão das Subsistências Prevendo dificuldades no abastecimento de produtos de primeira necessidade, o Governo proíbe a elevação dos preços dos géneros alimentares.

224

Decretada a organização de expedição militar É decretada a organização de uma expedição militar com destino à África Portuguesa. - Primeiro crédito extraordinário para o Ministério da Guerra É decretado o primeiro (de vários) créditos extraordinários para o Ministério da Guerra. As despesas militares tornar-se-iam uma fatia muito significativa no Orçamento de Estado. “Sendo insuficientes, nas atuais circunstâncias, as verbas orçamentais destinadas a material de preparação para a guerra e tornando-se necessário e urgente proceder à aquisição desse material, a reconhecimentos militares e outras despesas extraordinárias do Ministério da Guerra, tendentes à manutenção da ordem e salvaguarda de interesses nacionais (…)”, é concedido um crédito extraordinário para o Ministério da Guerra de 1.000.000$. 13 de agosto de 1914 Pedido inglês O Governo Britânico solicita licença de passagem de tropas pela Beira, Moçambique, a caminho da Niassalândia. 15 de agosto de 1914 Posição de D. Manuel II face à guerra Carta de D. Manuel II a João de Azevedo Coutinho, informando ter-se oferecido como voluntário a Jorge V de Inglaterra, para combater na guerra em curso, assumindo assim uma posição aliadófila.


MANUEL AUGUSTO DIAS

18 de agosto de 1914

15 de setembro de 1914

Organização de expedições para Angola e Moçambique

Pedido de auxílio por parte da República Francesa

São organizadas expedições militares com destino a Angola e Moçambique, para proteger as colónias de incursões ou ataques alemães.

A República Francesa, com o apoio britânico, pede auxílio a Portugal, designadamente em material de guerra, mais concretamente canhões. O Governo português decidiu não enviar material militar sem a participação dos homens necessários ao seu manejo, ao mesmo tempo que exige a intervenção das restantes Armas.

24 de agosto de 1914 Ataque alemão ao posto de Maziúa Forças alemãs, com tropas indígenas, atacaram o posto de Maziúa, sito na margem sul do Rovuma, em Moçambique. Alguns ocupantes foram mortos, nomeadamente o chefe do posto, enquanto outros dispersaram. 27 de agosto de 1914

1 de outubro de 1914 Chegada da força expedicionária a Angola A força expedicionária comandada por Alves Roçadas chega a Moçâmedes, Angola. A força era composta de um batalhão de infantaria, um pelotão de metralhadoras, uma bateria de artilharia e um esquadrão de cavalaria. 10 de outubro de 1914

Defesa das colónias O Governo britânico garante a defesa das colónias portuguesas em caso de ataque alemão. 11 de setembro de 1914 I Grande Guerra em África Parte para Angola um corpo expedicionário de 1.500 homens, sob o comando do tenente-coronel Alves Roçadas, bem como uma expedição militar para Moçambique, comandada por Pedro Massano de Amorim.

Memorandum britânico Eduard Grey, primeiro ministro inglês, envia ao representante português em Londres um memorandum convidando Portugal a abandonar a atitude de neutralidade para se colocar activamente ao lado da Inglaterra e dos aliados. Poderia agora seguir para o teatro de guerra europeu uma força de artilharia, seguida de outras das restantes armas.

13 de outubro de 1914 Organização de um corpo expedicionário para a frente europeia Discutiu-se em Conselho de Ministros, na sequência do Memorandum Grey, a organização de um corpo expedicionário para 225


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

combater na frente europeia. O general Jaime Leitão de Castro foi o nome escolhido para o comandar. A resposta de Portugal foi favorável ao memoradum inglês. 16 de outubro de 1914 Forças Expedicionárias em Lourenço Marques Chegam a Lourenço Marques forças expedicionárias idas de Portugal. 16 a 19 de outubro de 1914 Primeiro incidente de Naulila Forças alemãs penetram no território de Angola, próximo de Caluxeque, na margem esquerda do Cunene. Soldados portugueses matam 3 soldados alemães. Estes, como resposta, atacam vários postos fronteiriços e no dia 31 exterminam a guarnição do posto de Cuangar, na fronteira com a atual Namíbia (antiga colónia alemã). 18 de outubro de 1914 Tropas portuguesas em Porto Amélia As tropas portuguesas partem de Lourenço Marques para Porto Amélia. 19 de outubro de 1914 Missão Militar junto do Estado Maior Britânico Partida de uma missão militar, composta pelos capitães Ivens Ferraz, Fernando Freiria e Azambuja Martins para conferenciar com o estado-maior britânico. 226

20 de outubro de 1914 Movimentos Monárquicos Movimentos revolucionários monárquicos em Mafra e Bragança. Declaram-se contra a participação de Portugal na Guerra. 22 de outubro de 1914 Concentração em Lubango das forças de Alves Roçadas As forças expedicionárias de Alves Roçadas e forças provinciais acabam a sua concentração em Lubango, no planalto de Moçâmedes, preparando a defesa do sul de Angola contra quaisquer investidas de tropas vinda da África Alemã do Sudoeste. 31 de outubro de 1914 Massacre de tropas portuguesas A guarnição de Cuanza, em Angola, é massacrada por militares alemães, agravando a situação na fronteira com a colónia alemã (atual Namíbia). - Ataque alemão a Cuangar, Angola Na sequência do agravamento das tensões no Sudoeste de Angola, forças alemãs atacaram de surpresa o posto de Cuangar, na margem esquerda do rio Cubango, distrito do Bié, em Angola. São mortos o comandante, 3 oficiais e várias praças (europeus e indígenas) e o posto incendiado. - Alves Roçadas determina a organização das Forças Alves Roçadas determina a organização das chamadas “Forças em operações ao Sul de Angola”, com as forças expedicionárias e forças da província.


MANUEL AUGUSTO DIAS

1 de novembro de 1914 Chegada do contingente militar a Moçambique Chega a Porto Amélia, no norte da colónia de Moçambique, o primeiro contingente militar. Era composta por um batalhão, uma bateria e um esquadrão. 5 de novembro de 1914 Novo contingente militar para Angola De Lisboa partem forças militares para Angola, comandadas pelo capitão-tenente Coriolano da Costa. Tornavam-se preocupantes os incidentes com tropas alemãs nas zonas de fronteira.

como aliado da Grã-Bretanha. Aprovada por unanimidade (Lei n.º 283, de 24 de Novembro de 1914). Com base nas autorizações concedidas pelo Parlamento, o governo decreta a mobilização de uma divisão. 24 de novembro de 1914 Autorização para intervenção militar É publicado em suplemento do Diário do Governo, pela Presidência do Ministério, a lei n.º 283. O seu Artigo único declara que “é o poder executivo autorizado a intervir militarmente na atual luta armada internacional, quando e como o julgar necessário aos nossos altos interesses e deveres de nação livre e aliada da Inglaterra, tomando para esse fim as providências extraordinárias que as circunstâncias de momento reclamam.”

16 de novembro de 1914 Convenção Luso-Britânica Convenção Luso-Britânica, em que se declaram em vigor os antigos Tratados de Aliança. 17 de novembro de 1914

30 de novembro de 1914 Censura O Decreto n.º 1117 estabelece a censura à imprensa, ficando proibida a publicação de notícias referentes às forças da terra e do mar, que não tenham origem oficial. 1 de dezembro de 1914

Proibida Peça de Teatro É proibida a subida ao palco de uma revista, no Teatro da Rua dos Condes, por dar um quadro pouco abonatório do exército português.

Novos contingentes militares para Angola Seguem para Angola reforços de infantaria e de cavalaria. 12 de dezembro de 1914

23 de novembro de 1914 Reunião extraordinária do Congresso da República

Invasão do Cunene

Bernardino Machado apresenta uma proposta que autoriza o poder executivo a intervir militarmente quando e como julgue necessário,

O território do Cunene, em Angola, continua a ser violado por forças alemãs. 227


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

15 de janeiro de 1915

17 de dezembro de 1914 Forças alemãs no Cunene

Presidente da República reúne com líderes políticos

Forças alemãs, sob o comando do major Frank, acampam nas margens do Cunene.

O presidente da república, Manuel de Arriaga, reúne os principais dirigentes políticos para ouvir a sua opinião sobre a política seguida pelo Partido Democrático, de Afonso Costa, de empurrar Portugal para a guerra.

18 de dezembro de 1914 Desastre de Naulila Derrota das forças militares portuguesas face às alemãs, em Naulila, no Sul de Angola. Este encontro salda-se com vários mortos da parte portuguesa (quase 70, entre praças e oficiais). Os portugueses abandonam temporariamente o Cuamato, Roçadas e Humbe. Neste contexto de combates entre portugueses e alemães, as populações africanas de Huíla, no sul, revoltam-se.

16 de janeiro de 1915 Convenção Luso - Belga Portugal ratifica a Convenção Luso-Belga, para o estabelecimento de comunicações entre Angola e o Congo. 19 de janeiro de 1915

19 de dezembro de 1914 Forças portuguesas abandonam Humbe As forças portuguesas abandonam Humbe, depois do paiol do Forte Roçadas ter explodido. Retiram mais para norte, para Gambos, com intenção de defender Lubango, no Sul de Angola. - Populações africanas do Sul de Angola revoltam-se Motivados pelos combates entre forças europeias, as populações africanas da Huíla, no Sul de Angola, revoltam-se. São dirigidas pelo soba Mandume, da terra Cuanhama. 8 de janeiro de 1915 Alemães a bordo do “San Miguel” Um cruzador inglês faz fogo contra o vapor português San Miguel, junto à barra de Lisboa, tendo em vista aprisionar 15 alemães embarcados na Madeira. 228

Telegrama Um telegrama do Sr. Rosen para o Sr. Augusto Soares dá conta de que já por duas vezes, vapores portugueses têm sido detidos próxima da costa portuguesa por cruzadores ingleses para serem aprisionados os passageiros alemães. 20 de janeiro de 1915 Mais forças para Angola Os jornais portugueses noticiam a partida de mais forças militares para Angola.


MANUEL AUGUSTO DIAS

20-21 de janeiro de 1915

12 de fevereiro de 1915

Movimento das Espadas

Passagem de tropas em território moçambicano

«Movimento das Espadas». A maior parte dos oficiais da guarnição de Lisboa, chefiados por Machado Santos e Pimenta de Castro, protesta por considerar que a demissão de um seu colega, o major João Craveiro Lopes, foi efetuada por motivos políticos.

Foi autorizada a passagem de um contingente britânico da Rodésia do Sul através do território português da Beira (Moçambique), para combater forças alemãs.

25 de janeiro de 1915 Ditadura de Pimenta de Castro O presidente da república, Manuel de Arriaga, demite o governo de Afonso Costa e encarrega, em ditadura, o general Pimenta de Castro de formar um novo governo com intenção de preparar eleições. A participação dos militares nos assuntos políticos torna-se cada vez maior. 27 de janeiro de 1915 Alemães em Angola O ministro da Alemanha, em Lisboa, protesta contra as medidas tomadas pelo Governador Geral de Angola contra os alemães aí residentes. 3 de fevereiro de 1915

27 de fevereiro de 1915 Nomeação de Pereira d’Eça Pereira d’Eça é nomeado comandante das Forças em operações no Sul de Angola e Governador Geral da colónia. 3 de março de 1915 Afundamento do “Douro” O vapor português “Douro” é afundado por alemães. 4 de março de 1915 Deputados proibidos de entrar no Parlamento Os deputados do Partido Democrático de Afonso Costa são proibidos de entrar no Parlamento. Os deputados e senadores democráticos reunidos em Loures, no Palácio da Mitra, aprovam uma moção declarando o ministério fora-da-lei.

Novos contingentes militares para Angola Partem para Angola mais contingentes militares, para responder a renovados ataques das forças alemãs, vindas da África Alemã do Sudoeste.

21 de março de 1915 Pereira d’Eça desembarca em Luanda O novo comandante das Forças em operações no Sul de Angola e Governador Geral da colónia desembarca em Luanda. 229


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

9 de abril de 1915 Corte de cabo submarino

Tumultos em Lisboa

Corte do cabo submarino alemão entre Horta e Nova Iorque.

Em Lisboa, grupos tumultuosos de pessoas assaltam armazéns e padarias à procura de comida. Aproveitando a situação, republicanos civis e militares levam a efeito um movimento revolucionário que custa centenas de mortos e feridos.

22 de abril de 1915 Comissão Administrativa em Lisboa Os vereadores da Câmara Municipal de Lisboa são intimados a ceder o lugar à Comissão Administrativa nomeado pelo governo. São presos por terem recusado. 23 de abril de 1915 Protesto do governo alemão O governo alemão protesta contra a proibição de fornecimento de carvão no porto da Horta. 30 de abril de 1915 União Operária Nacional em congresso pró-paz A União Operária Nacional participou entre 30 de abril e 2 de maio no Congresso Internacional Pró-Paz que teve lugar em Ferrol, na Galiza. 10 de maio de 1915 Manifestações Republicanas Grandes manifestações republicanas em Lisboa.

230

14 de maio de 1915

15 de maio de 1915 Fim da Ditadura de Pimenta de Castro O governo ditatorial de Pimenta de Castro é demitido, sendo nomeado João Chagas para formar o novo ministério. O general Norton de Matos é escolhido para ministro da Guerra. 17 de maio de 1915 Atentado ao Primeiro-Ministro Português Devido ao atentado no Entroncamento a João Chagas, que fica gravemente ferido e cego de um olho, José Ribeiro de Castro é nomeado, mais tarde, chefe do governo. 29 de maio de 1915 Combate de Tchipelongo Tem lugar em Angola o combate de Tchipelongo. - Teófilo de Braga é Presidente da República interino Teófilo Braga é nomeado presidente da república interino, devido à demissão no dia 15 de Maio de Manuel de Arriaga.


MANUEL AUGUSTO DIAS

25 de junho de 1915

12 de julho de 1915

Humbe e Donguena

Portugal toma conhecimento da rendição alemã em África

Constituição dos destacamentos de Humbe e Donguena no sul de Angola.

O general Pereira d’Eça é informado cerca da rendição da colónia alemã.

1 de julho de 1915

4 de agosto de 1915

Nova Lei Eleitoral

Créditos extraordinários para contingentes militares

Os militares no ativo passam a ter direito de voto. Os analfabetos continuam a não poder votar.

O Governo é autorizado a abrir dois créditos extraordinários para acorrer às despesas com os contingentes militares enviados para Angola e Moçambique.

5 de julho de 1915 Divisão Naval de Defesa e Instrução É constituída da Divisão Naval de Defesa e Instrução comandada por Leote do Rego. 7 de julho de 1915 Reocupação de Humbe, Angola As forças portuguesas reocupam Humbe, no sul de Angola.

11 de agosto de 1915 Prisão de súbditos alemães em Luanda O ministro da Alemanha em Lisboa reclama contra a prisão de súbditos alemães em Luanda. - Reocupação do forte do Cuamato O forte do Cuamato, no sul de Angola, é reocupado pelas forças do comando do general Pereira d’Eça. 18 de agosto de 1915

9 de julho de 1915 União Sul-Africana vence as forças militares alemãs O general Botha, comandante em chefe das forças da União Sul-Africana, vence as forças militares da África Alemã do Sudoeste.

Combate de Môngua Em Môngua, Angola, tropas portuguesas travam combates com forças armadas alemãs.

231


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

1 de setembro de 1915

7 de novembro de 1915

Orçamento extraordinário de guerra

Expedição para Moçambique

A lei n.º 372 consigna a obrigatoriedade de elaborar dois orçamentos: um ordinário e outro extraordinário de guerra.

Mais uma expedição para Moçambique, sob o comando de Moura Mendes, major de artilharia.

4 de setembro de 1915 Ocupação da embala do soba dos Cuanhama Tropas saídas de Môngua ocupam a embala do soba dos Cuanhama. 7 de outubro de 1915

10 de novembro de 1915 Estado toma posse de fábrica O Estado toma posse da Fábrica de Adubos e Produtos Químicos da Póvoa de Santa Iria, que se encontrava paralisada.

Partida de contingentes militares para Moçambique Parte para Moçambique Álvaro de Castro com novos contingentes militares de infantaria, cavalaria, sapadores mineiros e artilharia. 15 de outubro de 1915 Regresso do Batalhão de Marinha Chegada a Lisboa do Batalhão de Marinha expedicionário a Angola. 28 de outubro de 1915 Tropas portuguesas com destino a Angola Partida de mais tropas para Angola, a bordo do “Zaire”, que saiu, nesta data, de Lisboa.

232

23 de novembro de 1915 Portugal é autorizado a participar na guerra Em reunião extraordinária do Congresso da República o governo é autorizado a participar na guerra ao lado da Grã-Bretanha e a ceder, desde logo, 20.000 espingardas com 600 cartuchos cada uma e 56 peças de artilharia pedidas pelo governo britânico. 29 de novembro de 1915 Afonso Costa Nomeado Chefe de Governo Afonso Costa, restabelecido de uma fratura do crânio, provocada pela saída precipitada de um carro elétrico devido ao receio de um atentado bombista, é nomeado chefe do governo, constituído unicamente por membros do Partido Democrático.


MANUEL AUGUSTO DIAS

4 de dezembro de 1915

7 de fevereiro de 1916

A questão do volfrâmio

Portugal requisita meios de transporte

O Estado proíbe a livre exportação de volfrâmio.

Requisição de todos os meios de transportes indispensáveis à economia nacional. É, também, aprovada a Lei das Subsistências.

30 de dezembro de 1915 Pedido inglês O Foreign Office consulta o governo português sobre a possibilidade de requisitar os navios mercantes alemães surtos em portos nacionais (continente, ilhas e ultramar), fazendo saber que seriam de grande utilidade no esforço de guerra. No entanto, e segundo os ingleses, tal ato não implicava necessariamente a quebra de neutralidade - o que não interessava ao partido intervencionista de Afonso Costa. 8 de janeiro de 1916 Artigo no Times sobre Portugal e a Guerra É publicado um artigo no jornal britânico “Times” sobre Portugal e a Guerra, referindo a posição aliadófila de Portugal e a disposição em cooperar com a Inglaterra e contendo uma análise da situação política interna portuguesa. 29 de janeiro de 1916 Carestia de vida Têm lugar assaltos a estabelecimentos comerciais em Lisboa, no distrito de Évora e em alguns locais do norte do País, juntamente com conflitos com a Guarda Nacional Republicana e atentados bombistas.

17 de fevereiro de 1916 Pedido britânico O governo britânico, invocando a aliança luso-britânica, pede ao governo português a requisição dos barcos alemães surtos em portos nacionais. 23 de fevereiro de 1916 Requisições de navios alemães É feita a requisição de vapores alemães surtos em portos nacionais e coloniais. Em abril e julho deste ano foi igualmente feita a requisição de vapores austro-húngaros. No total, o governo requisitou 72 navios. Estas requisições foram feitas ao abrigo do decreto n.º 2229, cuja fundamentação remetia para os alegados interesses da economia nacional, nomeadamente pela importância dos navios para ajudar a resolver o magno problema das subsistências. A operação de requisição foi dirigida por Leote do Rego, comandante da divisão naval. 9 de março de 1916 Declaração de guerra por parte da Alemanha A Alemanha declara guerra a Portugal. Seguiu-se, pouco depois, o corte de relações diplomáticas com a Áustria-Hungria. A resposta da Alemanha prende-se com a requisição que havia sido 233


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

feita dos vapores ancorados em portos nacionais. Antes desta situação, já se haviam verificado numerosos recontros e combates no teatro de guerra africano entre Portugal e a Alemanha, que, no entanto, não haviam motivado o corte de relações diplomáticas e/ ou declaração de guerra. O representante da Alemanha entrega a declaração de guerra ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Soares. Na declaração de guerra, o Governo Imperial explicita as suas razões, salientando que desde o início do conflito Portugal apoiara os inimigos do Império Alemão, “por atos contrários à neutralidade”. Um dos exemplos dados era a passagem de tropas inglesas através de Moçambique, do mesmo modo que as expedições enviadas para África eram consideradas como hostis à Alemanha. Acrescentava ainda que “A imprensa e o parlamento durante toda a existência da guerra entregaram-se a grosseiros insultos contra o povo alemão sob uma proteção mais ou menos notória do Governo Português.” O Governo alemão “(...) numa indulgente deferência para com a difícil situação de Portugal, evitou até tirar sérias consequências da atitude do Governo Português.” De facto, em diversas ocasiões, Portugal tratara a Alemanha com uma inusitada dureza. Mas com a apreensão dos navios alemães, “O Governo Imperial vê-se forçado a tirar as necessárias consequências do procedimento do Governo Português. Considera-se de hoje em diante como estando em estado de guerra com o Governo Português.” 10 de março de 1916 Leitura da declaração de Guerra É lida no Congresso da República a declaração de guerra da Alemanha. - O Ministro plenipotenciário alemão abandona Lisboa Parte de Lisboa o barão de Rosen, Ministro Plenipotenciário alemão em Portugal. Sidónio Pais, Ministro Plenipotenciário português na Alemanha, por seu lado, abandona Berlim. 234

- Reunião do Congresso da República Foi convocado o Congresso para o Executivo expor a situação internacional de Portugal, sendo-lhe concedida a seguinte autorização: “São conferidas ao poder executivo todas as faculdades necessárias ao estado de guerra com a Alemanha, nos termos do artigo 26.º, n.º 14 da Constituição.” - Demissão do Governo Afonso Costa O Gabinete de Afonso Costa, face à situação de guerra com a Alemanha, pede a demissão do ministério para negociar a constituição de um Governo de União Nacional, um executivo que, à semelhança do que se passava noutros países beligerantes, incluísse ministros de vários quadrantes políticos. 12 de março de 1916 Mobilização de indústrias Munindo-se de instrumentos que lhe permitam fazer face às necessidades da economia de guerra, a lei n.º 493 autoriza o Governo a mobilizar qualquer indústria, quando necessário para os interesses da defesa nacional e da economia. 15 de março de 1916 Criação da Junta Patriótica do Norte É criada, no Porto, a Junta Patriótica do Norte. Tinha como fins a propaganda patriótica e a assistência às vítimas da guerra. 16 de Março de 1916 Governo de “União Sagrada” É constituído o governo dito de “União Sagrada”. Embora a designação deste Executivo prometesse um largo espec-


MANUEL AUGUSTO DIAS

tro político partidário, à semelhança do que aconteceu na Europa, nomeadamente em França, a sua composição, no entanto, apenas incluía democráticos e evolucionistas e um independente, deixando de fora vários partidos do campo republicano, bem como católicos e monárquicos. Tinha, ainda assim, o apoio de unionistas e socialistas. A Presidência (acumulada com as Colónias) coube a António José de Almeida, líder do partido Evolucionista, ficando os democráticos com as pastas chave: Finanças (Afonso Costa), Guerra (Norton de Matos), Estrangeiros (Augusto Soares). Para além destes, faziam parte do Ministério: António Pereira Reis com a pasta do Interior; Luís Augusto Pinto Mesquita de Carvalho, com a Justiça; Azevedo Coutinho com a Marinha; António Maria da Silva com o Fomento, pasta que transitou para Fernandes Costa; e Joaquim Pedro Martins com a Instrução. Pereira Reis cederia a pasta a outro independente, Brás Mouzinho de Albuquerque. - Ministério do Trabalho e Previdência Social É criado o Ministério do Trabalho e Previdência Social, poucos dias após a declaração de guerra da Alemanha a Portugal. 18 de março de 1916 Cortejo saudando Brasil e Aliados Realiza-se em Lisboa um cortejo de saudação ao Brasil e Nações Aliadas, a que se seguiria, no dia 26, outro cortejo em homenagem ao Presidente da República, Bernardino Machado, organizado pela Mocidade Republicana Radical (intervencionista). Trata-se de duas manifestações dos partidários da entrada de Portugal na guerra europeia.

20 de março de 1916 Mobilização das classes de licenciados O Ministro da Guerra, Norton de Matos, é autorizado a convocar, total ou parcialmente, para preparação militar, as classes de licenciados que julgar conveniente. - Cruzada das Mulheres Portuguesas É criada a Cruzada das Mulheres Portuguesas, presidida por Elzira Dantas Machado, esposa do Presidente da República, Bernardino Machado. Tinha como objetivo a prestação de assistência moral e material aos que dela necessitassem em tempo de guerra. Durou até 1938. 23 de março de 1916 Lei de censura prévia A Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto protesta contra a lei de censura prévia. 24 de março de 1916 Serviço de requisições militares Criação provisória, no Ministério da Guerra, de uma repartição destinada exclusivamente a tratar de todos os assuntos que se relacionem com o serviço de requisições militares, ficando diretamente subordinada ao respetivo Ministro. 25 de março de 1916 Manifestação de apoio Realizou-se em Braga uma manifestação de apoio às Forças Armadas Portuguesas, ao Brasil e aos Aliados. 235


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

- Deixam de ser reconhecidos como representantes consulares de nações neutrais os súbditos alemães e austríacos O governo, na situação de guerra com a Alemanha, determina que deixem de ser reconhecidos como representantes consulares de nações neutrais os súbditos alemães e austríacos. 28 de março de 1916 Censura prévia Pela Lei n.º 495 os periódicos e outras publicações periódicas passam a estar submetidos à censura prévia, enquanto durar o estado de guerra. Os jornais passariam a ostentar, em espaço branco, as partes do texto cortadas pela censura. - Afundamento da primeira mina rocegada no Tejo O Berrio afunda a primeira mina rocegada na barra do Tejo, levando a bordo o Almirante W. de Salis. 1 de abril de 1916 Manifesto do Diretório do Partido Republicano O Diretório do Partido Republicano Português emite um manifesto salientando a necessidade de propaganda das causas e origens da participação de Portugal no conflito europeu. A propaganda intervencionista revelar-se-ia, contudo, insuficiente face às dificuldades criadas pela guerra. 2 de abril de 1916

236

10 de abril de 1916 Tomada de Quionga O território de Quionga, Moçambique é retomado pelas tropas portuguesas. Pela Convenção de 1886, o rio Rovuma fora considerado o limite entre Moçambique e a nova colónia alemã. Poucos anos depois, a Alemanha ocupou Quionga, ao sul do Rovuma, junto à barra desse rio. Os protestos e reclamações de Portugal não tiveram sucesso, acabando por assinar a Convenção Adicional de Agosto de 1894 que retirou a Portugal a soberania na foz do rio e em territórios a norte de Cabo Delgado. O acordo por troca de notas (1904), para a delimitação das possessões portuguesas e alemãs, regulara definitivamente esta questão. 20 de abril de 1916 Alargamento da censura Censura sobre toda a correspondência postal expedida e recebida por Portugal. Alarga-se a censura telegráfica. - Expulsão de alemães É editado o decreto que estipula a expulsão de todos os súbditos alemães residentes em Portugal. 23 de abril de 1916 Caducidade da cidadania portuguesa O governo determina que caduque a qualidade de cidadão português para os filhos de alemães nascidos em Portugal.

Comício de apoio à participação de Portugal na Guerra

- Ataque das tropas alemãs ao posto de Namoto

Realiza-se em Braga um comício de apoio à participação de Portugal na Guerra.

Ataque das tropas alemãs ao posto de Namoto nas margens do Rovuma, que provoca pequenos confrontos e algumas baixas.


MANUEL AUGUSTO DIAS

3 de maio de 1916 Reconhecimento da utilidade pública da Aliança Internacional da Estrela Vermelha Reconhece, como instituição de utilidade pública, a Aliança Internacional da Estrela Vermelha, para assistência aos animais nos campos de batalha. 4 de maio de 1916

15 de maio de 1916 Ocupações alemãs em Moçambique Os alemães ocupam Xivinda, em Moçambique. 16 de maio de 1916 Corte do cabo telegráfico New York II O cabo alemão New York II é cortado nas proximidades dos Açores.

Intendência dos Bens dos Inimigos É criada a Intendência dos Bens dos Inimigos, organismo do Ministério das Finanças que tinha como atribuições administrar, fiscalizar, gerir e liquidar os bens arrolados aos súbditos alemães, na sequência da declaração de guerra a Portugal. 8 de maio de 1916

19 de maio de 1916 Cruzador Adamastor chega ao rio Rovuma Chegada do cruzador Adamastor à foz do Rovuma com a missão de preparar a sua travessia. 26 de maio de 1916

Ataque alemão a Nhica, Moçambique Ataque alemão ao posto de Nhica, em Moçambique.

Primeira tentativa, sem sucesso, de passagem do Rovuma

- Secção de Auxiliares da Defesa Marítima

A 26 e 27 de maio de 1916, o cruzador Adamastor e a Canhoeira Chaimite fazem fogo sobre as posições alemãs localizadas nas margens do Rovuma.

É criada uma Secção de Auxiliares da Defesa Marítima constituída pelos tripulantes de todos os barcos da marinha mercante, empregados no serviço da defesa dos portos e barras, pilotos da barra e sócios dos clubes náuticos.

27 de maio de 1916 Combate de Namaca

12 de maio de 1916 Ataque alemão a Mitimone Ataque alemão ao posto de Mitimone, Moçambique.

As forças portuguesas, nas quais se incluem forças da Guarda Republicana de Lourenço Marques, desencadearam um ataque de artilharia seguido por ataques simultâneos de duas colunas, com o objetivo de passarem o Rovuma, em Moçambique, mas são impedidas por forças alemãs. 237


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

28 de maio de 1916

15 de junho de 1916

Expedição militar em direção a África

Convite do governo inglês

Partida da terceira expedição militar para Moçambique.

O governo inglês convida Portugal a tomar parte ativa nas operações militares.

Junho de 1916 Chamados ao serviço militar os cidadãos entre 20 e 45 anos Os cidadãos entre os 20 e os 45 anos são chamados a prestar serviço militar. O país ficaria gradualmente privado de parte significativa da mão-de-obra ativa. 9 de junho de 1916 Conferência dos Aliados em Paris Afonso Costa, na qualidade de ministro das Finanças, e Augusto Soares, na qualidade de ministro dos Negócios Estrangeiros deslocam-se a Paris para participar na Conferência interaliada. A questão económica é central neste encontro. Outro dos assuntos discutidos é a necessidade da Alemanha restituir os territórios ocupados.

- Ataque alemão ao posto de Unde Ataque alemão ao posto de Unde que é repelido pelas tropas portuguesas que atravessam o Rovuma em perseguição dos alemães. 21 de junho de 1916 Negociação das condições de participação de Portugal na guerra Afonso Costa parte para Londres a fim de negociar as condições da participação portuguesa na Guerra. 27 de junho de 1916 Ataque alemão a Negomano Ataque alemão ao posto de Negomano, em Moçambique.

- Ataque alemão a Macalogi Ataque das tropas alemãs ao posto de Macalogi, que é repelido pelas tropas portuguesas que atravessam o Rovuma em perseguição dos alemães. 13 de junho de 1916 Ataque alemão a Namaca Ataque das forças alemãs ao posto de Namaca. 238

1 de julho de 1916 Exército britânico ataca no Somme O exército britânico ataca no Somme, para tentar diminuir a intensidade do ataque alemão a Verdun, defendida pelo exército francês, que tinha começado em 21 de fevereiro.


MANUEL AUGUSTO DIAS

2 de julho de 1916 Ataque alemão a Nangadi Ataque alemão ao posto de Nangadi, em Moçambique

31 de julho de 1916 Ataques alemães em África Os alemães atacam Nangadi, em Moçambique.

3 de julho de 1916 1 de agosto de 1916

Tancos Exercícios militares em Tancos. 11 de julho de 1916 Prejuízos pela chamada de cidadãos ao serviço militar O Decreto n.º 2498 procura atenuar os prejuízos e reduzir ao mínimo os transtornos acarretados aos cidadãos pela sua chamada ao serviço militar, concedendo, designadamente, subvenções às famílias no caso de estas não disporem de outros meios de subsistência. 15 de julho de 1916 Portugal na guerra europeia A Grã-Bretanha convida Portugal a tomar parte ativa nas operações aliadas na Europa. 22 de julho de 1916 Corpo Expedicionário Português

Novo ataque a Nangadi Novo ataque pelas tropas alemãs ao posto de Nangadi. Estas conseguem cortar as linhas telegráficas e isolar o posto. 7 de agosto de 1916 Reunião do Congresso da República Reunião das duas câmaras (a dos Deputados e a dos Senadores) para discutir a situação internacional de Portugal e a participação no teatro de guerra europeu. Contou com a presença do Presidente da República e com Afonso Costa e Augusto Soares. Era de capital importância a questão comercial e financeira: medidas comuns entre aliados; empréstimos a Portugal pela Inglaterra, bem como a questão política e militar. 8 de agosto de 1916 Ataque português além-Rovuma Um destacamento de tropas portuguesas parte de Maziua, atravessa o Rovuma e ataca um posto fronteiriço alemão.

Constituição, em Tancos, sob o comando do general Norton de Matos, do Corpo Expedicionário Português (CEP), composto por 30 mil homens. 239


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

12 de agosto de 1916

30 de agosto de 1916

Força naval inglesa no Tejo

Missão militar

Uma força naval inglesa chega ao Tejo para saudar a República portuguesa, sinal da renovada aliança entre os dois países.

Chega a Portugal um missão militar anglo-francesa, no âmbito de um reforço de cooperação entre os aliados, para preparar a intervenção portuguesa no teatro europeu.

15 de agosto de 1916 Ataque de uma coluna de transporte de víveres em Moçambique Uma coluna de transporte de víveres que se dirige de Namoto para Nachimoca, em Moçambique, é atacada. 24 de agosto de 1916 Propaganda a favor da intervenção portuguesa Realiza-se junto do mosteiro da Batalha um comício a favor da intervenção de Portugal na guerra. Seria um dos mais marcantes atos de propaganda intervencionista. - Canhoeira Ibo atingida por um torpedo Pelas 22 horas, a 60 milhas da barra de Lisboa, a canhoeira Ibo é atingida por um torpedo lançado pelo submarino alemão U-22. 29 de agosto de 1916 Ataque ao posto de Negomano Neste ataque as tropas portuguesas sofreram um morto e vários feridos e as tropas alemãs 7 mortos e um número desconhecido de feridos.

240

31 de agosto de 1916 Restabelecimento da pena de morte A República abre uma exceção à abolição da pena de morte no “caso de guerra com país estrangeiro, em tanto que a aplicação dessa pena seja indispensável e apenas no teatro de guerra”. Esta medida é muito discutida, nomeadamente pelo deputado socialista Costa Júnior. A Lei n.º 635 de 28 de setembro de 1916, altera várias disposições da Constituição. 4 de setembro de 1916 Economia de guerra É criada a Comissão Portuguesa de Ação Económica contra o Inimigo, tendo como competências a coordenação das providências adotadas para dificultar o abastecimento do inimigo e combatê-lo no plano económico. 18 de setembro de 1916 Ocupação dos postos alemães de Mayembe e Tshydia A coluna Nhica atravessa o Rovuma sem qualquer resistência das forças alemãs e ocupa os postos alemães de Mayembe e Tshydia.


MANUEL AUGUSTO DIAS

19 de setembro de 1916

8 de outubro de 1916

Travessia do rio Rovuma

Infantaria 13 parte para Tancos

Uma força expedicionária portuguesa, comandada por Ferreira Gil, atravessa, junto à foz, o rio Rovuma, em Moçambique, penetrando em território ocupado por alemães.

O Primeiro Batalhão do Regimento de Infantaria 13, de Vila Real, parte para Tancos.

28 de setembro de 1916 Alterações na Constituição A Lei n.º 635 altera várias disposições da Constituição. Cumpre salientar que os feitos cívicos e atos militares podem passar a ser galardoados com ordens honoríficas, condecorações ou diplomas especiais. Abre-se, outrossim, uma exceção à abolição de pena de morte no “(…) caso de guerra com país estrangeiro, em tanto quanto a aplicação dessa pena seja indispensável e apenas no teatro da guerra”. 1 de outubro de 1916 Primeira escola de aviação portuguesa Inauguração da primeira escola de aviação portuguesa, em Vila Nova da Rainha. 4 de outubro de 1916 Combate de Maúta Combate de Maúta, em Moçambique. Uma coluna portuguesa comandada por Liberato Pinto é atacada em Maúta por forças alemãs. Do combate resultam 32 militares mortos e 14 feridos.

26 de outubro de 1916 Tomada do fortim de Nevala A escolta de reconhecimento e a coluna de Massasi que ali tinha chegado tomam o forte depois de um intenso combate de artilharia. As forças alemãs retiram depois de destruírem parte da fortaleza e envenenado a água. - Combates em Nevala Recontro entre as forças portuguesas e alemãs nos Poços de Nevala, Moçambique. Nevala, situada na margem esquerda do rio Rovuma, era um objetivo central na campanha militar no norte de Moçambique, no final de 1916. - Ofensiva portuguesa Ataque português a Lubindi, Moçambique. 8 de novembro de 1916 Combate de Quivambo Uma coluna portuguesa, comandada pelo major Leopoldo da Silva, quando se dirigia para Mikindani, é intercetada por forças alemãs. Deste combate em território moçambicano resultaria a morte do comandante da força portuguesa.

241


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

- Ataque ao posto de Mahuta Os alemães atacam o posto de Mahuta ferindo o comandante do posto e alguns indígenas, mas são repelidos com dezassete baixas. 15 de novembro de 1916 Vapor Machico atacado a tiro junto às Canárias O Vapor Machico é atacado a tiro junto às Canárias por um submarino inimigo, na viagem de regresso de Madagascar para França com um carregamento de couros e conservas. 22 de novembro de 1916 Combate em Nevala, Moçambique As forças alemãs, reforçadas por marinheiros provenientes do cruzador Koeningsberg, atacam as forças portuguesas e ocupam o posto de Nevala, no norte de Moçambique, após um cerco de 7 dias. As forças portuguesas irão retirar a 28, depois de um novo recontro. Este cerco causa a morte a cinco militares (um segundo sargento, um soldado europeu e três indígenas). - Ataque alemão à Ribeira de Nevala Para recuperar Nevala, as tropas alemãs começaram por atacar a zona da água. Foi um combate muito violento chegando-se à luta corpo a corpo. 28 de novembro de 1916 Ataque aos reforços de Nevala As forças portuguesas que partem de Mahuta para reforçar os 242

sitiados em Nevala são atacadas e não conseguem chegar ao destino. - Retirada de Nevala Durante a noite as tropas portuguesas abandonam o posto de Nevala e marcham em direção ao Rovuma em pequenos grupos dispersos. 30 de novembro de 1916 Assistência religiosa a militares O Decreto n.º 2896 permite a assistência religiosa a militares. A República, no contexto da guerra, dá abertura à Igreja Católica na vida militar, o que constitui um sinal positivo no relacionamento mútuo. 1 de dezembro de 1916 Ataque ao posto português de Nagandi, Moçambique Forças alemãs atacam o posto de Nagandi, em Moçambique, que é incendiado pelo fogo de artilharia alemã, obrigando as tropas portuguesas a retirar para sul. Em finais de dezembro estes postos seriam recuperados pelas forças portuguesas. - Ataque a Sikumbiriro Ataque alemão ao posto de Sikumbiriro que é queimado e abandonado. - Alemães reocupam o posto de Nichichira As tropas alemãs vindas de Nevala reocupam o posto de Nichichira na margem do Rovuma. As forças portuguesas retiram e queimam todos os recursos que não podem transportar.


MANUEL AUGUSTO DIAS

3 de dezembro de 1916 Bombardeamento do Funchal Tem lugar, pela primeira vez, o ataque de um submarino alemão a território nacional com o bombardeamento do Funchal. S. Vicente, em Cabo Verde e Ponta Delgada, nos Açores, serão também atacados nesse ano, bem como em 1917. 4 de dezembro de 1916 Canhoeiras Ibo e Beira perseguem submarino alemão As canhoeiras Ibo e Beira, em serviço de vigilância do cabo submarino em São Vicente de Cabo Verde, saem em perseguição de um submarino inimigo. 13 de dezembro de 1916

tilharia pesada. Em janeiro de 1917, o governo português resolve enviar tropas, formando um Corpo de Artilharia Independente (CAPI). 30 de dezembro de 1916 Missão militar a França Chegam a Paris vários militares portugueses. O chefe de Estado-maior do CEP, major Roberto Baptista, desloca-se a França para preparar o envio de tropas portuguesas. - Restrição do consumo de eletricidade e gás O decreto n.º 2922 restringe o consumo de eletricidade e de gás devido à conjuntura de guerra, designadamente às dificuldades de importação de “hulha”. Este decreto restringe tanto a iluminação pública como a privada. 3 de janeiro de 1917

Revolta de Tomar Revolta de Tomar, dirigida por Machado Santos, afirma-se contrária ao Governo da União Sagrada e ao embarque de tropas para França. 18 de dezembro de 1916 Afundamento de um vapor português

Regulamentação da participação portuguesa na guerra É assinado um documento, entre Portugal e o Reino Unido, que estabelece as condições da colaboração militar portuguesa, no conflito mundial, nomeadamente no teatro de operações europeu. O CEP fica subordinado ao BEF (British Expeditionary Force).

Um submarino alemão afunda o vapor “Cascais”, que era um antigo barco germânico. 26 de dezembro de 1916 Pedido do governo francês

4 de janeiro de 1917 Protestos em Lisboa Protestos, em Lisboa, contra o encerramento dos estabelecimentos e da iluminação pública e particular.

O governo francês sugere ao governo português o envio de militares de artilharia para guarnecer 20 a 30 baterias francesas de ar243


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

5 de janeiro de 1917 Expedição militar parte rumo a Moçambique A quarta expedição militar embarca para Moçambique. 7 de janeiro de 1917 Acordo luso-francês dá origem ao CAPI O governo francês concorda com a proposta portuguesa de disponibilizar pessoal de artilharia necessário para 25 baterias de artilharia pesada, sob um Comando Superior Português. Tem assim origem o Corpo de Artilharia Independente (CAPI). 17 de janeiro de 1917 Corpo Expedicionário Português O decreto n.º 2938 manda proceder à concentração do CEP. É publicado no Diário do Governo um “Relatório acerca da participação de Portugal na Guerra Europeia”. À falta de um Livro Branco sobre as negociações diplomáticas conducentes à entrada de Portugal no teatro europeu, o governo publica uma “exposição oficial e justificativa” dos motivos e razões da participação portuguesa no conflito. Este documento trata dois pontos centrais na argumentação intervencionista: as obrigações da aliança luso-inglesa e a necessidade de defesa das colónias, não deixando de explicar as “vantagens” da participação portuguesa, sobretudo políticas. 18 de janeiro de 1917 Nomeação do comandante do Corpo Expedicionário Português

244

O general Fernando Tamagnini de Abreu é nomeado comandante do Corpo Expedicionário Português. 26 de janeiro de 1917 Os primeiros portugueses em França Partida do primeiro contingente português para a frente de batalha em França. 30 de janeiro de 1917 Partida do Corpo Expedicionário Português A 1.ª Brigada do Corpo Expedicionário Português, sob o comando de Gomes da Costa, parte para França, a bordo de 3 vapores britânicos. O CEP ocuparia um setor em Artois perto de Armentiêres, junto dos britânicos. 2 de fevereiro de 1917 Chegada do Corpo Expedicionário Português A 1.ª Brigada do CEP chega a Brest, França. Dias depois chegará à frente na Flandres francesa. 3 de fevereiro de 1917 Nova restrição do consumo de eletricidade e gás Na conjuntura da I Guerra Mundial, o Governo, pelo decreto n.º 2976, limita o consumo de eletricidade e gás para iluminação e restringe o horário de utilização da luz elétrica ou de gás


MANUEL AUGUSTO DIAS

8 de fevereiro de 1917 O CEP chega à zona de concentração em França As tropas portuguesas chegam àquele que será o seu local de concentração, na zona de Thérouane, na Flandres francesa.

É constituída a Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha. 1 de abril de 1917 Afonso Costa em França e Espanha

12 de fevereiro de 1917 O general Tamagnini propõe a elevação do CEP de Divisão a Corpo de Exército A elevação do Corpo Expedicionário Português de Divisão a Corpo de Exército é proposta pelo seu comandante, o general Tamagnini de Abreu e Silva. Esta proposta é a aceite a 20 do mesmo mês. 14 de fevereiro de 1917 Possibilidade de mobilização de Brito Camacho

Tem início uma viagem diplomática de Afonso Costa a França e a Espanha. 4 de abril de 1917 As tropas portuguesas entram nas trincheiras As tropas portuguesas entram nas trincheiras ainda subordinadas às forças da Grã-Bretanha, fazendo parte do seu processo de instrução, durante o qual se adaptação ao quotidiano nas trincheiras.

Discute-se no parlamento a possibilidade de mobilização de Brito Camacho, que integraria uma expedição a Moçambique. Para os unionistas tratava-se de uma forma de afastar o seu líder partidário.

- Primeira baixa do Corpo Expedicionário Português António Gonçalves Curado é a primeira baixa mortal do Corpo Expedicionário Português em França.

23 de fevereiro de 1917

6 de abril de 1917

Partida do 2.º contingente do CEP Parte de Lisboa, para França, o 2.º contingente do Corpo Expedicionário Português. 22 de março de 1917 Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha

Organização da Escola de Morteiros do CEP É organizada a Escola de Morteiros de Trincheira do Corpo Expedicionário Português. 8 de abril de 1917 Infantaria 13 parte para França

245


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

O Batalhão do Regimento de Infantaria n.º 13 parte para França.

7 de maio de 1917 Entrada em funcionamento da Escola de Gás do CEP Entra em funcionamento a Escola de Gás do Corpo Expedicionário Português, em Mametz.

11 de abril de 1917 Fundação do Instituto dos Mutilados Fundação do Instituto dos Mutilados de Arroios pela Comissão de Assistência aos Militares Mobilizados, da Cruzada das Mulheres Portuguesas, sendo responsável pelo mesmo o capitão médico Alfredo Tovar de Lemos. 20 de abril de 1917 Corpo Expedicionário Português - CEP O Corpo Expedicionário Português passa a ser constituído por duas Divisões. 24 de abril de 1917 Ataque a navios mercantes Um submarino alemão ataca dois navios mercantes a sul de Sagres, acabando por afundar um deles. 25 de abril de 1917 3.º Governo presidido por Afonso Costa Constituição do terceiro governo presidido por Afonso Costa, devido ao fim do ministério da União Sagrada.

246

10 de maio de 1917 Missão oficial do Ministro da Guerra a França e Inglaterra O general Norton de Matos desloca-se em missão oficial a França e a Inglaterra. Em Londres, discute designadamente a questão dos transportes das tropas (reforços) que deveriam ser feitos em barcos ingleses. 16 de maio de 1917 Conferência Parlamentar Internacional do Comércio Realiza-se, em Roma, entre os dias 16 e 19 de maio, a Conferência Parlamentar Internacional do Comércio. A delegação portuguesa é chefiada por António Macieira. 17 de maio de 1917 Convenção militar É assinada, entre Portugal e França, uma Convenção militar para o emprego das forças portuguesas de artilharia pesada na linha francesa de operações em França. Trata-se da regulamentação do Corpo de Artilharia Independente (CAPI), com pessoal de 10 baterias, comandado por João Clímaco Pereira Homem Teles. 19 de maio de 1917 Assaltos a mercearias em Lisboa e no Porto Ocorrem assaltos a mercearias e armazéns em Lisboa e no Porto devido à falta de alimentos provocada pelo racionamento, o que


MANUEL AUGUSTO DIAS

leva à declaração do estado de sítio. 20 de maio de 1917 Declaração do estado de sítio Declaração do estado de sítio na cidade de Lisboa e concelhos limítrofes, devido às revoltas que tinham tido lugar em Lisboa. Daqui decorre a suspensão total das garantias constitucionais. 21 de maio de 1917 Norton de Matos em Londres para tratar do transporte dos reforços do CEP O Ministro da Guerra, general Norton de Matos, chega a Londres para acordar a disponibilização de navios para transporte dos reforços militares do Corpo Expedicionário Português. 30 de maio de 1917 Tem início a responsabilização do CEP por setores da Frente A primeira brigada de infantaria, da primeira divisão do Corpo Expedicionário Português, ocupa um setor na Frente de batalha. 1 de junho de 1917 Português prisioneiro de guerra De acordo com o “Diário de Notícias” de 24 de agosto de 1918, o primeiro militar português é capturado no dia 1 de junho de 1917. 2 de junho de 1917 Cruzada das Mulheres Portuguesas a favor da intervenção na Guerra

Comício em Braga de apoio à participação portuguesa na guerra, por iniciativa do núcleo bracarense da Cruzada das Mulheres Portuguesas. 4 de junho de 1917 O primeiro ataque ao setor português O setor defendido pela primeira brigada portuguesa do CEP é, pela primeira vez, atacado pelos alemães. 16 de junho de 1917 Greve Geral Tem lugar uma greve geral, é apenas um dos vários momentos de greve que decorrerão no ano de 1917. 4 de julho de 1917

Bombardeamento alemão a Ponta Delgada A cidade de Ponta Delgada (Açores) é bombardeada por um submarino alemão, na sequência de notícias da criação de uma base militar inglesa no arquipélago. A cidade é defendida pelo navio americano Orion, que se encontrava no porto para reparações. 7 de julho de 1917 Encontro dos comandantes do CEP com o rei de Inglaterra Os comandantes portugueses do Corpo Expedicionário Português encontram-se com o rei Jorge V de Inglaterra, em Fauquembergues.

247


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

10 de julho de 1917 Ataque alemão a Montepuez As tropas alemãs atacam o posto de Montepuez, cidade sede de distrito na província de Cabo Delgado, em Moçambique, mas são repelidas. - A 1.ª Divisão do CEP responsabiliza-se por parte do setor português na Frente A primeira Divisão do Corpo Expedicionário Português, que estará subordinada ao XI Corpo de Exército britânico comandado pelo general Haking, assume a responsabilidade da sua parte do Setor Português na Frente. 11 de julho de 1917 Sessões secretas na Câmara dos Deputados Por resolução de 6 de julho do mesmo ano, a Câmara de Deputados reuniu em sessões secretas. A requisição das mesmas foi feita por 20 deputados nos termos do regimento. Estes desejavam interrogar o governo sobre vários assuntos e, designadamente, sobre a intervenção de Portugal na guerra europeia, quer em termos de contingentes militares, quer em termos de aquisições de material; sobre as expedições militares a África; sobre as vantagens territoriais e/ou económico-financeiras asseguradas a Portugal no caso da vitória aliada; sobre os contratos de cedência dos navios requisitados; sobre os meios de que dispunha o governo para custear a guerra e quais já tinham sido utilizados até ao momento; e a quanto montavam os créditos usados da conta que lhe fora aberta pelo governo inglês nos termos dos ajustes feitos em Londres em 1916. Estas sessões reuniram de 11 a 31 de julho.

248

26 de julho de 1917 Naufrágio do caça-minas “Roberto Ivens” A 12 milhas ao sul de Cascais, o caça-minas “Roberto Ivens” choca com uma mina que, ao explodir, parte o navio ao meio, afundando-o. Dos 22 tripulantes, apenas sete sobreviveram. 31 de julho de 1917 Terceira batalha de Ypres. O 2.º Exército britânico começa uma ofensiva na zona de Ypres, na Flandres belga, a norte do sector português da frente. A cidade de Passchendaele será tomada por forças canadianas em Novembro. O objetivo de conquistar a zona costeira da Bélgica, de maneira a diminuir a intensidade da guerra submarina alemã, não é atingido. 1 de agosto de 1917 Sessão secreta no Senado da República Os senadores desejavam interrogar o governo sobre vários assuntos e, designadamente, sobre a intervenção de Portugal na guerra europeia, quer em termos de contingentes militares, quer em termos de aquisições de material, como já havia feito a Câmara de Deputados entre 11 a 31 de julho. 21 de agosto de 1917 Curso de enfermeiras para os hospitais militares O Ministério da Guerra autoriza a Comissão de Enfermagem da Cruzada das Mulheres Portuguesas a criar um curso de enfermagem destinado a preparar enfermeiras para os hospitais militares do país e dos corpos


MANUEL AUGUSTO DIAS

expedicionários. 1 de setembro de 1917 Mobilização Mobilização, como parte do exército de campanha e sob a autoridade do Ministro da Guerra, de todo o pessoal dependente da Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones e Fiscalização das Indústrias Elétricas. 10 de setembro de 1917 Filmes censurados É estabelecida a censura militar aos filmes que façam alusão à guerra. 14 de setembro de 1917 Aprisionamento de soldados alemães por tropas portuguesas na Frente Ocidental Tem lugar o primeiro ato de aprisionamento de soldados alemães por tropas portuguesas na Frente Ocidental, protagonizado pelo alferes miliciano Gomes Teixeira, quando, à frente do seu pelotão, aprisiona quatro soldados alemães. 16 de setembro de 1917 Fuzilamento de um militar português Fuzilamento de um militar português na Flandres, o único condenado à morte durante a guerra. Trata-se de João Ferreira de Almeida que apenas há seis meses se encontrava em solo francês; foi acusado de traição e fuzilado.

23 de setembro de 1917 Brigada do Minho A 4.ª brigada de Infantaria (a «Brigada do Minho»), parte da 2.ª divisão, entra em setor na linha da frente. 30 de setembro de 1917 Rebocador “Minho” repele submarino inimigo Com o apoio de um vapor francês, que tinha sido atacado por um submarino inimigo ao largo da Fuzeta, o rebocador “Minho” atira sobre esse mesmo submarino, que acaba por mergulhar e desaparecer. 8 de outubro de 1917 Afundamento do “Viajante” O “Viajante”, da marinha mercante portuguesa, é afundado por um submarino alemão, ao largo de Porto Santo. - Visita oficial a França e a Inglaterra Bernardino Machado, Afonso Costa e Augusto Soares partem em visita oficial a França e Inglaterra. 11 de outubro de 1917 Visita à frente europeia O Presidente da República, Bernardino Machado e o chefe do Governo, Afonso Costa, iniciam a visita às tropas portuguesas destacadas em França.

249


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

13 de outubro de 1917 Visita ao Quartel-general do Corpo Expedicionário Português Bernardino Machado visita o Quartel-general do CEP. É feita a primeira cerimónia de condecoração de militares, com a entrega de Cruzes de Guerra a 10 oficiais, 8 sargentos e 27 cabos e soldados do CEP. 17 de outubro de 1917 Chegada do primeiro contingente do CAPI Corpo de Artilharia Independente Chega a França o primeiro contingente do Corpo de Artilharia Independente. Passará a chamar-se Corps d’Artillerie Lourde Portugaise (CALP). 19 de outubro de 1917 Museu Português da Grande Guerra O Decreto n.º 3486 cria em Lisboa um Museu que se denominará Museu Português da Grande Guerra. Os intervencionistas consideravam que a participação de Portugal faria parte da “gesta heróica” da nação. É neste contexto que se deve inserir a criação deste museu. «Atendendo a que o país realiza atualmente, em França e na África, o maior esforço militar da sua história, cooperando com os aliados na guerra que mais decisiva influência exercerá na marcha da civilização e no destino das nações; (…) convém que desde já se reúnam, organizem e classifiquem todos os materiais e elementos dispersos que possam contribuir para perpetuar a memória da intervenção armada de Portugal e para documentar, duma forma quanto possível completa, o esforço da nação e a obra política e militar da República».

250

25 de outubro de 1917 Bernardino Machado regressa a Lisboa após visita oficial Bernardino Machado chega a Lisboa, após a sua visita às tropas portuguesas em França. 28 de outubro de 1917 Transporte de tropas Os britânicos retiram os últimos dos navios que se encontravam ao serviço do CEP, o que vai agudizar a questão do transporte de tropas e tornar muito difícil a sua substituição na frente de combate. 30 de outubro de 1917 Base naval norte-americana em Ponta Delgada Nota do ministro dos EUA em Lisboa, Thomas Birch, pedindo o estabelecimento de uma base naval em Ponta Delgada e a concessão de “facilidades” nos Açores. O governo português, tendo consultado o Foreign Office, concorda com o estabelecimento de uma base, para ser utilizada durante a guerra. Em novembro, é feito o pedido do estabelecimento de uma companhia de aviação, aceite pelo governo português. «Em 30 de novembro pergunta o ministro americano se o governo português estaria disposto a dar ordens às autoridades dos Açores para cooperarem nas operações defensivas com as forças sob comando do Almirante Dunn. Respondeu-se afirmativamente.» (Medeiros Ferreira, “Portugal e os EUA nas duas guerras mundiais: a procura do plano bi-lateral” in Cadernos Navais, n.º 9, março-junho de 2004). 1 de novembro de 1917


MANUEL AUGUSTO DIAS

É criado o Grupo de Companhias Ciclistas O Grupo de Esquadrões de Cavalaria do Corpo Expedicionário Português é extinto sendo convertido em Grupo de Companhias Ciclistas. 2 de novembro de 1917 Vapores brasileiros Guahiba e Acary torpedeados e afundados Os vapores brasileiros Guahiba e Acary são torpedeados e afundados em São Vicente de Cabo Verde pelo submarino inimigo U-151. A canhoeira Ibo recolhe 28 náufragos. 5 de novembro de 1917 O CEP assume a responsabilidade da defesa do Setor Português na Frente O Corpo Expedicionário Português assume a responsabilidade da defesa do Setor Português na Frente. Anteriormente, encontrava-se subordinado ao Exército Britânico. 10 de novembro de 1917 Questão das Subsistências Repetem-se os assaltos a várias padarias em Lisboa. Durante os anos da I Guerra Mundial e devido à escassez dos bens e à alta dos preços, este tipo de explosão social tornou-se muito frequente. 13 de novembro de 1917 Propaganda inimiga

O decreto n.º 3544 determina que durante o estado de guerra sejam impedidas de circular, apreendidas e suspensas todas as publicações periódicas, nacionais ou estrangeiras, que tenham intentado ou intentem fazer propaganda sistemática em favor dos inimigos ou tendente a deprimir a alma da nação ou a honra do seu exército. 20 de novembro de 1917 O 3.º exército britânico ataca O 3.º exército britânico ataca em direção a Cambrai, a sul do setor português da frente. Os tanques britânicos (480 ao todo) são usados pela primeira vez em grupos compactos. 21 de novembro de 1917 Movimentações alemãs em Moçambique Após os combates em Nevala, as forças alemãs de Lettow-Vorbeck dirigem-se para a fronteira com Moçambique. 25 de novembro de 1917 Combate de Negomano, Moçambique Os portugueses são surpreendidos pelas forças alemãs, sob o comando de Von Lettow, em Negomano, Cabo Delgado, Moçambique. O resultado é um verdadeiro desastre para os portugueses. O ataque alemão fez vários mortos, oficiais, soldados europeus e africanos e o comandante Teixeira Pinto, abatido a tiro. Foram, ainda, feitos prisioneiros. 26 de novembro de 1917 251


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

A 2.ª Divisão do CEP assume um setor na Frente A 2.ª Divisão do Corpo Expedicionário Português assume a responsabilidade da sua parte do Setor Português na Frente. 30 de novembro de 1917 Assistência religiosa aos militares em campanha O Governo permite a assistência religiosa aos militares em campanha, que assim o desejem, através da participação de ministros portugueses das respetivas religiões. 2 de dezembro de 1917 Alemães ocupam Nanguar, Moçambique Depois de Negomano as tropas alemãs avançam e Wahle, que se afastara de Lettow para procurar alimentos, ocupa o posto português de Nanguar. 3 de dezembro de 1917 Combate de M’Cula, Moçambique Combates em M’Cula, 50 Km para o interior de Moçambique. Este recontro com as forças alemãs foi desfavorável às armas portuguesas. As tropas portuguesas, comandadas pelo capitão Francisco Pedro Curado, resistem do dia 3 até 8 de dezembro às forças alemãs, que consistiam num destacamento que se separara da coluna principal, que se dirigia mais para o interior de Moçambique. 5 de dezembro de 1917 Ainda a questão das subsistências

252

No mesmo dia que começava a insurreição sidonista em Lisboa, registaram-se tumultos no Porto, Ermesinde, Rio Tinto e Gondomar, por causa das subsistências. - Golpe Sidonista Sidónio Pais, embaixador de Portugal em Berlim de 1912 a 1916, na altura professor da escola de Guerra (Academia Militar), e major, chefia uma revolução que o levará ao poder três dias depois. O movimento e a situação política que criou será conhecida por «Dezembrismo». Quatro dias depois (9 de dezembro) o Congresso é dissolvido e no dia 12 o Presidente da República, Bernardino Machado é destituído. 12 de dezembro de 1917 Bombardeamento do porto do Funchal O porto do Funchal é bombardeado pela segunda vez. - Perseguição de submarino alemão Os barcos patrulha Dekade I e Mariano de Carvalho saem para o mar em perseguição de um submarino alemão (U-155) que bombardeara a cidade do Funchal, na ilha da Madeira. 24 de dezembro de 1917 Centro de Aviação Marítima de Lisboa Inicia as operações de guerra o Centro de Aviação Marítima de Lisboa com dois pequenos aparelhos F.B.A. Rotativos.


MANUEL AUGUSTO DIAS

1 de janeiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Em Moçambique forças militares alemãs tomam o Posto de LUAMBALA a oeste do lago Niassa e o Posto de MEGARAMA na foz do rio Lúrio. 2 de janeiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Em Moçambique forças alemãs tomam o Posto de MEGUFI na foz do rio Lúrio. 4 de janeiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Força alemãs tomam o Posto do LÚRIO (Moçambique). 6 de janeiro de 1918 Tentativa contrarrevolucionária Tentativa de ação contrarrevolucionária levada a cabo por marinheiros da Armada. 8 de janeiro de 1918 Proposta de criação da SDN O Presidente norte-americano, Woodrow Wilson, apresentou 14 medidas tendentes a garantir a Paz Mundial, entre as quais a criação da Sociedade das Nações (SDN). - Avanço das forças alemãs em Moçambique

Em Moçambique os alemães tomam o Posto de MAPARARA. 10 de janeiro de 2018 Dissolução dos corpos administrativos Na sequência da Revolução de Sidónio Pais (Dez 1917), o decreto n.º 3738, dissolve todos os corpos administrativos e manda os Governadores Civis nomear comissões, para substituição das Juntas Gerais, Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia. 12 de janeiro de 1918 Digressão de Sidónio Pais ao norte de Portugal Início da digressão de Sidónio Pais ao norte de Portugal, às cidades do Porto, Braga, Coimbra, Guimarães e Viana do Castelo. Foi recebido calorosamente em todas as regiões visitas. 15 de janeiro de 1918 Segundo contingente do CAPI O segundo contingente do Corpo de Artilharia Independente, sob o comando do tenente coronel Tristão da Câmara Pestana, chega a França, onde ficará subordinado ao comando francês. 15 de janeiro de 1918 Destituição do Presidente da República Bernardino Machado, destituído do cargo de Presidente da República, abandona Portugal e vai residir em Paris.

253


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

18 de janeiro de 1918 Base naval norte-americana em Ponta Delgada Instalação de uma base naval norte-americana em Ponta Delgada, sob o comando do Almirante H. O. Dunn. 20 de janeiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Em Moçambique forças alemãs tomam o Posto de NACAROA. 21 de janeiro de 1918 Redefinição da ação do Corpo Expedicionário Português Convenção luso-britânica para redefinir e regulamentar o futuro do Corpo Expedicionário Português (CEP). Na altura da tomada do poder por Sidónio Pais, o CEP debatia-se com a falta de transportes e de reforços. Sidónio Pais vai aceitar o “plano de Derby”, já anteriormente gizado, que consistia na formação de uma só divisão na Frente, que seria integrada num Corpo de Exército Britânico. 23 de janeiro de 1918 Beatificação do Condestável Nuno Álvares Pereira foi beatificado pelo Papa Bento XV. 27 de janeiro de 1918 Afundamento do “Serra do Gerês” 254

O pesqueiro português “Serra do Gerês” é afundado no mar das Berlengas por um submarino alemão. 31 de janeiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Em Moçambique forças alemãs tomam o Posto de CHIURE. 2 de fevereiro de 1918 Pedido de exoneração do comandante interino do CEP O tenente coronel Ferreira Martins, comandante interino do Corpo Expedicionário Português, pede a exoneração. 10 e 11 de fevereiro de 1918 Avanço das forças alemãs em Moçambique Em Moçambique, no dia 10 de fevereiro, forças alemãs ocupam MALEMA (Entre os Rios) e no dia seguinte ocupam o Posto de NAUAVA.

14 de fevereiro de 1918 Digressão de Sidónio Pais ao sul do país Após ter visitado o Norte (em janeiro) o Presidente da República deslocou-se ao Alentejo e Algarve (Évora, Faro, Loulé, Silves, Olhão, S. Brás de Alportel, Vila Nova de Portimão e Beja).


MANUEL AUGUSTO DIAS

23 de fevereiro de 1918 Foi revogada a Lei de Separação do Estado das Igrejas O decreto n.º 3856, modifica e revoga a Lei de 1911 considerada “violenta” e “atentatória da liberdade de consciência e pensamento” numa tentativa de melhorar as relações com a Igreja. 2 de março de 1918 Ataque alemão na Flandres Ataque alemão contra o setor português na Flandres, durante o qual setenta militares do CEP foram aprisionados. 3 de março de 1918 Tratado de Brest-Litovsk Assinatura do tratado de Brest-Litovsk entre a Alemanha e a Rússia soviética. A Rússia abandona a guerra. 9 de março de 1918 Criação dos Ministérios da Agricultura e das Subsistências e Transportes Ainda durante o estado de guerra são criados os Ministérios da Agricultura e das Subsistências e Transportes. 11 de março de 1918 Sufrágio Universal O sufrágio universal é instituído, pela primeira vez, em Portugal.

13 de março de 1918 Fim do Museu Português da Grande Guerra O decreto n.º 3920 anula o decreto que criou o Museu Português da Grande Guerra. O espólio passa para o Museu de Artilharia. A criação deste Museu foi uma iniciativa dos políticos que defendiam a entrada de Portugal no conflito, muito especialmente os democráticos. O sidonismo anula uma importante medida simbólica do “partido intervencionista”. 16 de março de 1918 A 1.ª bateria do 1.º grupo de artilharia do CAPI (Corpo de Artilharia Independente) entra em ação. 18 março de 1918 Reorganização do CEP Início da reorganização do CEP, visando fazer retirar a 1.ª Divisão para a retaguarda, reduzindo o escalão de Corpo de Exército (a duas Divisões) para apenas uma Divisão. 19 de março de 1918 É tomada a decisão da transferência do CAPI para o CEP É tomada a decisão da transferência do CAPI para o Corpo Expedicionário Português. No entanto, esta não se efetua devido ao ataque alemão de 21 de Março. 20 março de 1918 Tropas da Guarnição de Lisboa

255


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Criação do Corpo de Tropas da Guarnição de Lisboa, como sistema de forças da confiança do Presidente Sidónio Pais. 21 de março de 1918 Tem início a «Kaiserschlacht» Começo da «Kaiserschlacht», a ofensiva alemã na Frente Ocidental. 22 de março de 1918 Rendição do CEP O Decreto n.º 3959 determina as condições para a rendição dos militares do Corpo Expedicionário Português. - Combates entre alemães e portugueses Em Moçambique travam-se combates entre alemãs e portugueses em ÚMPUUA. 23 de março de 1918 Caça-minas Augusto Castilho dispara sobre submarino inimigo O caça-minas “Augusto Castilho” avista o periscópio de um submarino inimigo, disparando sobre o mesmo. 26 de março de 1918 Alto-comissário do Governo nas ilhas dos Açores É instituído, durante o estado de guerra, o cargo de alto-comissário do Governo nas ilhas dos Açores.

256

- Inauguração do Hospital de Base n.º 1 Instalado na retaguarda do CEP, na zona de Ambleteuse, o Hospital de Base n.º 1 destinava-se a acolher e tratar feridos e doentes que necessitavam de um período de recuperação prolongado, seguindo o modelo dos “General Hospitals” ingleses. 27 de março de 1918 A rendição do pessoal do CEP é impedida A ofensiva alemã no Somme impede a rendição do Corpo Expedicionário Português decretada no dia 22 de março. 30 de março de 1918 Criação da Obra de Assistência de 5 de Dezembro O Decreto n.º 4031 da Presidência do Ministério cria uma Comissão Central de sete membros encarregada do estabelecimento e administração das sopas económicas dentro da cidade de Lisboa (Obra de Assistência de 5 de Dezembro). 2 de abril de 1918 Conflitos em Alcântara Devido à crise de subsistências que tem lugar durante a guerra, dão-se conflitos em Alcântara, Lisboa. 4 de abril de 1918 Insubordinação na Flandres Insubordinação de tropas portuguesas na Flandres, que


MANUEL AUGUSTO DIAS

se recusam a avançar para as primeiras linhas. 5 de abril de 1918 Insubordinação nas fileiras portuguesas na Frente A 2.ª Brigada do CEP recusa ocupar as linhas da Frente. A mais grave insubordinação ocorreu no Batalhão de Infantaria 7 (Leiria). Os homens deste Batalhão (BI 7) foram cercados por forças do BI 21 e do BI 22 e acabaram por se render. 6 de abril de 1918 Reorganização do Corpo Expedicionário Português O CEP, nas vésperas da Batalha de La Lys, é reorganizado deixando de existir. A 2.ª divisão, reforçada, continuaria no setor português enquanto a 1.ª era enviada para a reserva. A 2.ª divisão ficaria subordinada ao exército britânico (XI Corpo do Exército Britânico). 8 de abril de 1918 É tomada a decisão de render a 2.º Divisão O Comando britânico decide render a 2.ª Divisão portuguesa por uma Divisão britânica, rendição prevista para se iniciar na noite de 9 para 10 de abril. 9 de abril de 1918 Batalha de “La Lys” Vigorosa ofensiva alemã no setor português que desarticula o Corpo Expedicionário Português (CEP). As baixas cifram-se em mais de 7.000 homens, entre soldados e oficias. O ataque tem lugar na madrugada de 9 de abril,

quando as tropas portuguesas da 2.ª Divisão do CEP estavam para retirar da Frente, depois de longos meses sem serem rendidas (bastante mais do que era recomendado), devendo ser substituídos por militares britânicos. O 6.º Exército alemão, sob o comando do general Von Quast, lança nove divisões entre La Bassée e Armentières, cujas posições estavam defendidas por três divisões inglesas e uma portuguesa (integrada no 1.º Exército britânico, chefiado pelo general Horne). Esta ofensiva na Flandres surpreendeu a divisão portuguesa, abrindo uma brecha na frente inglesa, permitindo aos alemães avançar para o centro do dispositivo, ultrapassando Laventie e atingindo La Lys entre Estaires e Sailly. Com a madrugada inicia-se o bombardeamento alemão que se transformou em fogo contínuo. Ao princípio da manhã verifica-se o assalto feito pelas tropas alemãs. São capturados cerca de seis mil portugueses da segunda divisão e quase 100 peças de artilharia. As tropas alemãs avançam também noutras direções. 10 de abril de 1918 O antigo CAPI embarca para a Grã-Bretanha O antigo CAPI dirige-se para o porto francês do Havre, para embarcar para a Grã-Bretanha, para receber instrução. Três baterias ficam à disposição do exército francês. 11 de abril de 1918 O antigo CAPI recebe ordem de embarque O antigo CAPI recebe ordem de embarque no porto de Havre em França para receber instrução na Grã-Bretanha. Três baterias ficam à disposição do exército francês. 12 de abril de 1918 Retirada de baterias de artilharia 257


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Algumas baterias de artilharia portuguesas são retiradas do CEP para integrarem unidades britânicas em combate.

13 de abril de 1918 Infantaria retira para a nova linha de defesa A 1.ª e 2.ª brigadas de infantaria retiram para a nova linha de defesa em construção entre Lilliers e Stennberg. 28 de abril de 1918 Sidónio Pais é eleito Presidente da República Eleições presidenciais, por modo direto, sendo Sidónio Pais o único candidato, e legislativas. Por discordarem com a política de Sidónio Pais, os três partidos (Partido Democrático, Evolucionista e Unionista) decidem não concorrer ao ato eleitoral. 29 de abril de 1918 É criado o embrião de uma polícia política Através do decreto n.º 4166 os serviços policiais e de segurança ficam subordinados à Direção Geral de Segurança Pública do Ministério do Interior. Era criada uma Polícia Preventiva para vigilância e informação contra alegados crimes políticos ou sociais, sendo o embrião de uma polícia política. 9 de maio de 1918 Centro de Aviação Marítima de Aveiro

258

É realizado o primeiro voo no Centro de Aviação Marítima de Aveiro. - Sidónio Pais, Presidente da República Cerimónia de Proclamação de Sidónio Pais como Presidente da República eleito. Foi decretado feriado nacional e o Presidente da República proferiu um discurso na Câmara Municipal de Lisboa, (no mesmo local onde tiveram lugar os discursos de 5 de Outubro 1910 e a 14 de Maio de 1915). 15 de maio de 1918 Navio de salvação Patrão Lopes dispara sobre um submarino inimigo O navio de salvação Patrão Lopes, que rebocava a barca Portugal do Porto para Bordéus, dispara sobre um submarino inimigo na Biscaia, ao largo de Gijon. 17 de maio de 1918 Sidónio Pais reconhecido internacionalmente como Presidente de Portugal A Inglaterra, França, Espanha, EUA, Brasil, Argentina, Uruguai, Noruega, Holanda, Bélgica, Cuba e China reconhecem o novo chefe de Estado e a Inglaterra vem de seguida elevar a sua representação em Portugal para embaixada. 27 de maio de 1918 Ataque alemão Ataque alemão ao setor francês da frente, próximo de


MANUEL AUGUSTO DIAS

Paris. - Manifestação operária em Lisboa Teve lugar em Lisboa uma manifestação operária (convocada pela União de Sindicatos Operários de Lisboa) registando-se graves conflitos com a polícia. 30 de maio de 1918 Novo ataque alemão em Moçambique Em Moçambique forças alemãs atacam novamente o Posto de MALEMA. 1 de junho de 1918 Combate de Umpuhua, Moçambique De 1 a 6 de junho de 1918 tem lugar o Combate de Umpuhua. Von Lettow Vorbeck atravessa o rio Lúrio e, no distrito de Moçambique, tem um confronto com as forças aliadas. Retira para Namekala no rio Lalaúa, afluente do Lurio. 6 de junho de 1918 1.ª intervenção americana na frente ocidental A 6.ª divisão americana contra-ataca o exército alemão. É a primeira intervenção de uma unidade americana na frente ocidental. 13 de junho de 1918 Comissão Protetora dos Prisioneiros de Guerra Portugueses

Reunião de constituição da Comissão Protetora dos Prisioneiros de Guerra Portugueses no salão da revista “Ilustração Portuguesa”, em Lisboa. 16 de junho de 1918 Nova missão para a 1.ª Divisão do CEP Em França a 1.ª Divisão do CEP, (comandada pelo General Bernardo de Faria) após ter sido reorganizada (a duas Brigadas) aproveitando o que restava do CEP, fica responsável pela defesa da linha LILLERS – STÉNBECQUE 16 e 17 de junho de 1918 Novos avanços dos alemães em Moçambique Em Moçambique os alemães ocupam o ILLE e o ALTO MOLOCUÉ (16 junho) e o Posto de MACHENA, no dia seguinte.

23 de junho de 1918 Alemães apoderam-se dos depósitos da Companhia de Lugéla A 25.ª Companhia indígena ao deslocar-se de Munhiba para Mocuba cai numa emboscada inimiga e foi forçada a retirar e o inimigo apoderou-se dos depósitos da Companhia do Lugéla. 24 de junho de 1918 Canhoeira Limpôpo afasta submarino inimigo

259


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

A canhoeira Limpôpo avista os periscópios de um submarino inimigo a quatro milhas a sul do Cabo da Roca e leva-o a desaparecer. 1 de julho de 1918 Combate de Nhamacurra, Moçambique As tropas alemãs, comandadas por Muller, que penetraram no interior do território de Moçambique, chegam a 40 Km de Quelimane e atacam o depósito de uma grande companhia açucareira. Travam-se combates entre estes e forças anglo-portuguesas. 4 de julho de 1918 Reorganização do Corpo Expedicionário Português Início da reorganização do Corpo Expedicionário Português, com as tropas que sobreviveram a La Lys, de modo a assegurar a continuação da participação portuguesa na frente europeia. A 1.ª Divisão do CEP passa a estar subordinada ao 5.º Exército britânico. 10 de julho de 1918 Nova aproximação à Igreja Católica Prosseguindo a política de aproximação entre o Estado Português e a Igreja Católica, foi restabelecida a Legação de Portugal junto da Santa Sé. 15 de julho de 1918 «Ofensiva da Paz» O exército alemão ataca em direção a Paris.

260

18 de julho de 1918 2.ª Batalha do Marne Segunda Batalha do Marne. O exército alemão recua em frente de Paris. 23 de julho de 1918 Novo ataque alemão em Moçambique Em Moçambique os alemães tomam o Posto de NHAMARROI. 27 de julho de 1918 Novo ataque alemão em Moçambique Em Moçambique os alemães tomam o Posto de CHALAUA. 29 de julho de 1918 Novo ataque alemão em Moçambique Em Moçambique os alemães atacam novamente o Posto de METIL destruindo a estação de caminho de ferro. 6 de agosto de 1918 Novo ataque alemão em Moçambique Em Moçambique forças alemãs atacam o Posto de LUVATE a Oeste de CHALAUA. 8 de agosto de 1918 Conferência sobre a situação dos prisioneiros de guerra


MANUEL AUGUSTO DIAS

Conferência do conde de Penha Garcia da Sociedade de Geografia, em Lisboa, sobre a situação dos prisioneiros de guerra. - “O dia mais negro do exército alemão” Os exércitos aliados retomam a ofensiva. O 4.º exército britânico ataca o setor alemão em frente de Amiens. Segundo o general Ludendorff é «o dia mais negro do exército alemão». 10 de agosto de 1918 Combates entre ingleses de alemães Combate entre tropas britânicas e alemãs em CHALAUA. 12 de agosto de 1918 Comissão Protetora de prisioneiros recebida pelo Presidente da República O Presidente da República recebe, em Sintra, dirigentes da Comissão Protetora dos Prisioneiros de Guerra Portugueses. 25 de agosto de 1918 Novo comandante do Corpo Expedicionário Português O general Garcia Rosado, nomeado em Julho deste ano, assume o comando do CEP em França. Substitui o general Tamagnini de Abreu

28 de agosto de 1918 I Guerra Mundial em Moçambique Os alemães retiram dos territórios compreendidos entre o Lúri e o Rovuma (onde se encontrava estabelecida a companhia do Niassa) atravessando outra vez este rio. A sua ocupação, desde o início da I Guerra, deu origem a várias destruições e a significativas baixas humanas. Durante algum tempo, o general Von Lettow-Verbeck, que escapara do Tanganica à frente de 2000 homens, sustenta em Moçambique uma guerra de guerrilha. 2 de setembro de 1918 Racionamento É tornado público um edital do Diretor Geral de Subsistências restringindo o consumo de vários géneros alimentícios. Nas semanas seguintes realizaram-se diversos protestos e comícios contra a carestia de vida. 6 e 8 de setembro de 1918 Alemães avançam sobre os britânicos Em Moçambique forças alemãs tomam Postos ocupados por britânicos. (ULUA a 6 setembro e MILNEBERA a 8 setembro). 8 de setembro de 1918 Consequências da guerra - o racionamento Distribuição de senhas de racionamento e cartas de consumo. 14 de setembro de 1918 261


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

Os comícios são proibidos São proibidos os comícios contra a carestia de vida. 17 de setembro de 1918 Críticas à política de guerra sidonista Paulo Osório publica, em Paris, uma brochura intitulada “Portugal e a Guerra”, com severas críticas e acusações contra a política de Sidónio Pais. - Os alemães avançam em Moçambique Os alemães reocupam o Posto de MUEMBE. Fim da terceira fase da campanha em Moçambique. 23 de setembro de 1918 Lucros de guerra É criado um imposto especial sobre os lucros de guerra. 28 de setembro de 1918 Os alemães dirigem-se para a Rodésia do Norte Os alemães deslocam-se para o interior do seu território por LICOPOLE dirigindo-se para a Rodésia do Norte. Estavam em KASAMA quando a guerra terminou 29 de setembro de 1918 Bulgária abandona a Guerra A Bulgária assina um armistício e abandona a Guerra.

262

30 de setembro de 1918 Imposto sobre os lucros de guerra Em reunião na Associação Comercial de Lisboa, banqueiros, representantes de direções de bancos e negociantes manifestam-se contra a aplicação do imposto sobre os lucros de guerra. 11 de outubro de 1918 Tentativa revolucionária Em Lisboa teve lugar sem sucesso uma tentativa revolucionária parlamentar, contra o governo de Sidónio Pais. 12 e 13 de outubro de 1918 Declarado o estado de emergência Tentativa revolucionária em diversas localidades do país. É declarado o estado de emergência pelo governo, que consegue controlar a situação. 14 de outubro de 1918 Afundamento do “Augusto de Castilho” O caça minas “Augusto de Castilho” é torpedeado por um submarino alemão (U-139). O seu comandante Carvalho de Araújo morre no afundamento juntamente com parte da tripulação, mas permite a fuga do paquete S. Miguel. 15 de outubro de 1918 Extinção do CAP Em França foi extinto o Corpo de Artilharia Pesada (CAP) do CEP.


MANUEL AUGUSTO DIAS

16 de outubro de 1918 “A Leva da Morte” O transporte de um grupo de presos, em Lisboa, provoca um tiroteio que leva à morte de algumas pessoas. 22 de outubro de 1918 Abastecimentos Criação da Secretaria de Estado dos Abastecimentos. 25 de outubro de 1918 Extinção do CAPI Neste dia foi extinto o Corpo de Artilharia Pesada Independente (CAPI). 29 de outubro de 1918 Checoslováquia e Hungria tornam-se países independentes A República da Checoslováquia é proclamada em Praga. A Hungria proclama a sua separação do Império. 3 de novembro de 1918 Cessar-fogo É declarado o cessar-fogo com as forças armadas austro-húngaras. 10 de novembro de 1918 Tropas portuguesas perseguem os alemães

Em França na sequência da ofensiva aliada iniciada a 8 de outubro, algumas unidades portuguesas integradas em unidades britânicas, passam o Rio Escalda, perseguindo os alemães em retirada. 11 de novembro de 1918 Armistício É assinado o armistício que termina a I Guerra Mundial. A notícia é recebida em Lisboa (às 7 horas, no posto radiotelegráfico de Monsanto), aliás como no resto dos países, não só os beligerantes como os neutrais, com grande júbilo. Lisboa é uma capital em festa, engalanada e embandeirada. 12 de novembro de 1918 Rendição das forças alemãs em Moçambique Após ter tomado conhecimento da assinatura do Armistício pelo seu general, o comandante alemão Lettow-Vorbeck rende-se. - Manifestação de júbilo pela vitória aliada e pelo fim da guerra É organizada uma manifestação de júbilo pela vitória dos Aliados e pelo fim da guerra, do Terreiro do Paço a Belém. Sidónio Pais não deixaria de se associar a estas comemorações. 23 de novembro de 1918 O regresso do CEP Chegada a Lisboa das primeiras tropas do Corpo Expedicionário Português. 263


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

3 de dezembro de 1918 O Congresso da República comemora a assinatura do Armistício O Congresso da República comemora a assinatura do Armistício com uma reunião das duas câmaras.

23 de dezembro de 1918 Toma posse o Governo de Tamagnini Barbosa Toma posse o XVII Governo, chefiado por Tamagnini Barbosa. Este governo mantinha os mesmos princípios do governo anterior de Sidónio Pais.

6 de dezembro de 1918 Tentativa para assassinar Sidónio Pais Tentativa sem sucesso de assassinato do Presidente Sidónio Pais.

23 e 24 de dezembro de 1918 Sublevação Militar em Lisboa Nestes dias registou-se uma Sublevação militar em Lisboa, por diversas unidades ( Regimento de Lanceiros, Regimento de Queluz, Cavalaria 2 e 4 e parte da Escola de Guerra).

9 de dezembro de 1918 O primeiro contingente de prisioneiros do CEP regressa a Portugal O primeiro contingente de prisioneiros militares do Corpo Expedicionário Português a ser repatriado parte para o porto de embarque em Cherburgo.

264

2 de janeiro de 1919 Chegada de militares prisioneiros de guerra Chegada a Portugal dos primeiros 710 militares prisioneiros dos alemães.

14 de dezembro de 1918 Sidónio Pais assassinado Sidónio Pais é assassinado em Lisboa, na Estação do Rossio, baleado por um sargento do exército.

3 de janeiro de 1919 Manifesto da Junta Militar do Norte Manifesto da Junta Militar do Norte, do Porto, que se assume como representante do sidonismo.

16 de dezembro de 1918 Canto e Castro é Presidente da República Canto e Castro é eleito Presidente da República, pelas duas câmaras do Congresso.

12 de janeiro de 1919 Movimento revolucionário em Santarém Movimento revolucionário, de cariz republicano, em Santarém, que leva a confrontos com o exército durante alguns dias.


MANUEL AUGUSTO DIAS

18 de janeiro de 1919 Início da Conferência de Paz Inicia-se a Conferência de Paz, em Versalhes, França. A delegação portuguesa é chefiada por Egas Moniz. 19 de janeiro de 1919 A Monarquia é proclamada em Lisboa e no Porto Organiza-se uma Junta Governativa do Reino dirigida por Paiva Couceiro, que declara o estado de sítio em todo o território continental, com suspensão total das garantias constitucionais, durante trinta dias, para o completo restabelecimento da ordem. O movimento ficará conhecido por “Monarquia do Norte”. 20 de janeiro de 1919 Manifestações em Lisboa de apoio à República Organizam-se Batalhões de Voluntários para combaterem a insurreição monárquica do Norte. 24 de janeiro de 1919 Monárquicos são derrotados em Lisboa A revolta monárquica é subjugada em Lisboa. 13 de fevereiro de 1919 Fim da “Monarquia do Norte” Após combates no litoral centro as tropas governamentais entram no Porto. A «Monarquia do Norte» é derrotada, terminando a Guerra Civil.

17 de fevereiro de 1919 Liberdade de trânsito e de comércio É restabelecida, depois de um período de transição, a liberdade de trânsito e de comércio. Durante a I Guerra Mundial os diferentes governos foram obrigados a ter um papel de maior intervenção na economia que seria, no essencial, abandonado no pós-guerra. 12 de março de 1919 Afonso Costa na Conferência de Paz Afonso Costa é nomeado presidente da delegação portuguesa à Conferência de Paz. 17 de março de 1919 Delegação portuguesa à Conferência de Paz Norton de Matos, Afonso Costa, Augusto Soares, João Chagas e Teixeira Gomes são nomeados delegados à Conferência de Paz. 26 de abril de 1919 Fim da censura postal em Portugal Apenas em 1919 chega ao fim a censura postal em Portugal. - Alves Roçadas assume o comando do CEP O general Alves Roçadas assume o comando do Corpo Expedicionário Português.

265


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

6 de maio de 1919 Afonso Costa contra a versão proposta do Tratado de Paz Na Conferência da Paz, Afonso Costa discursa contra o texto de Tratado proposto. 14 de maio de 1919 Condecoração da Cruzada das Mulheres Portuguesas A Cruzada das Mulheres Portuguesas é condecorada com a Grã-Cruz da Ordem de Torre e Espada, de Valor, Lealdade e Mérito. 3 de junho de 1919 Exposição de desenhos humorísticos do CEP Inauguração de uma Exposição de desenhos humorísticos do Corpo Expedicionário Português, da autoria do capitão Meneses Ferreira, no Salão Bobone. 28 de junho de 1919 Tratado de Paz É assinado em Versalhes, França, o Tratado de Paz que estipula, nomeadamente, as cedências territoriais e as reparações devidas após o fim do conflito. - Quionga volta a fazer parte do território nacional Com a assinatura do Tratado de Versalhes, Quionga é formalmente restituída a Portugal, após ter sido reocupada em abril de 1916.

266

14 de julho de 1919 Desfile de tropas portuguesas em Paris Um contingente militar português desfila em Paris, sob o Arco de Triunfo, na festa da Vitória. - Festa da Paz em Lisboa Grande Parada Militar em Lisboa para celebrar a Festa da Paz, com o desfile militar de antigos combatentes da Primeira Grande Guerra. - Festa da Paz Celebração da Festa da Paz, com a plantação da “Oliveira da Paz” em Portalegre. 22 de julho de 1919 Desfile de tropas portuguesas em Bruxelas Um contingente militar português desfila em Bruxelas, para assinalar a Vitória dos Aliados na Primeira Grande Guerra. 29 de julho de 1919 Desfile de tropas portuguesas em Londres Um contingente militar português desfila em Londres, junto à Tribuna de Honra, ante o rei inglês, Jorge V. 30 de julho de 1919 Padrões concelhios Início da Propaganda de Homenagem Nacional aos


MANUEL AUGUSTO DIAS

Mortos da Grande Guerra. 20 de setembro de 1919 O Regimento de Infantaria n.º 13 recebe a Cruz de Guerra Entrega, pelo ministro da Guerra, da Cruz de Guerra ao Regimento de Infantaria n.º 13. 25 de setembro de 1919 Restituição de Quionga, Moçambique Por decisão do Conselho Supremo das Potências Aliadas e Associadas, o território moçambicano de Quionga é restituído a Portugal. No decurso da I Guerra Mundial, este território tinha já sido ocupado por forças portuguesas. A soberania tinha sido perdida em 1894. 10 de janeiro de 1920 Afonso Costa é nomeado representante português na SDN Nomeação de Afonso Costa para representar Portugal na primeira Assembleia da Sociedade das Nações. 30 de janeiro de 1920 O Parlamento aprova o Tratado de Paz O Tratado de Paz é aprovado pelo Parlamento português. 2 de março de 1920 Incorporação de Quionga no território nacional

É incorporado na colónia de Moçambique o território de Quionga que tinha sido um pomo de discórdia com a Alemanha desde os finais do século XIX. Fora um dos cenários da I Guerra Mundial em Moçambique. 18 de março de 1920 Compensações a exigir da Alemanha São marcados prazos em que os cidadãos portugueses podem apresentar quaisquer reclamações relativas a compensações a exigir da Alemanha. 2 de Abril de 1920 Ratificação do Tratado de Paz A Lei n.º 962 aprova, para ratificação, o Tratado de Paz e o Protocolo anexo, assinados em Versalhes em 28 de junho de 1919. 6 de abril de 1920 Fim do estado de guerra O decreto n.º 6516 declara findo o estado de guerra entre Portugal e a Alemanha. Os combates militares tinham terminado quase dois anos antes, em 1918, com a assinatura do armistício de 11 de Novembro. 10 de junho de 1920 Lápide em homenagem aos mortos do Regimento de Infantaria n.º 3 É inaugurada a lápide em homenagem aos mortos do Regimento de Infantaria n.º 3 em Viana do Castelo.

267


VALONGO E A PRIMEIRA GRANDE GUERRA

- Inauguração da lápide de homenagem aos mortos do Regimento de Infantaria n.º 12 A Lápide, descerrada em 10 de junho de 1920, na fachada do quartel do Regimento de Infantaria 12, lembra o nome dos soldados do mesmo Regimento mortos em combate na I Guerra Mundial. - Inauguração de Lápide de homenagem aos mortos do Grupo de Metralhadoras n.º 2 A Comissão Técnica de Infantaria promove, no quartel do 2.º Grupo de Metralhadoras, na Guarda, a inauguração de uma lápide comemorativa com os nomes dos 13 militares deste 2.º Grupo que morreram em França e em África. 18 de novembro de 1920 Afonso Costa na Comissão de Organização Jurídica das Nações Afonso Costa é nomeado Vice-Presidente da Comissão de Organização Jurídica na Liga das Nações. 4 de dezembro de 1920 Comando militar português em Quionga Quionga volta a ter um comando militar português, perdido em 1894. 31 de dezembro de 1920 Homenagem ao Soldado Desconhecido A Lei n.º 1099 autoriza o Governo a transladar, para o Mosteiro dos Jerónimos, os cadáveres de dois Soldados 268

Desconhecidos. A República procurava que a I Guerra Mundial passasse a fazer parte da gesta heroica, não só republicana como nacional. 9 de março de 1921 Monumento aos Mortos da Grande Guerra de Condeixa-a-Nova Inauguração do Monumento aos Mortos da Grande Guerra de Condeixa-a-Nova. 9 de abril de 1921 Romagem ao Mosteiro da Batalha Romagem ao Mosteiro da Batalha. Cerimónias de inumação do Soldado Desconhecido (corpos de dois soldados desconhecidos mortos em combate em África e na Flandres) com a presença do Presidente do Conselho e do Presidente do Ministério, representantes dos países “aliados”, do episcopado e, ainda, um representante de D. Manuel de Bragança. - Inauguração da lápide evocativa à memória de Luís Gonzaga Ribeiro Inauguração da lápide evocativa à memória de Luís Gonzaga do Carmo Pereira Ribeiro, capitão de infantaria morto na Batalha de La Lys.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.