Renda de Bilros de Peniche - Caderno de especificações para a certificação

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2.3.4) Limitações da indústria das Rendas de Bilros de Peniche na segunda metade do século XIX O bom acolhimento que as rendas de Peniche foram tendo, em Portugal e no estrangeiro, na segunda metade do século XIX, não ocultava, porém, os problemas que essa indústria então enfrentava, uma realidade apontada por diversos autores da época. Entre esses problemas pontificavam a ausência de ligação das rendas de Peniche às tendências do mercado, sendo o trabalho das rendilheiras exercido isoladamente e sem qualquer tipo de orientação superior, a utilização de matérias-primas desadequadas, a má remuneração das artesãs e a falta de conhecimentos na área de desenho das mulheres encarregues de fazer os piques, o que resultava em produtos esteticamente pouco apelativos e monótonos. Pedro Cervantes Figueira, por exemplo, considerava que os prémios obtidos nas exposições portuenses foram um “(…) resultado assaz lisonjeiro para uma indústria, que vegeta sem direção, dispersa, entregue ao esforço próprio dos indivíduos pobres, desprotegidos e privados do estímulo do interesse, que tudo anima e vivifica.” (FIGUEIRA: 1865, p. 4) Segundo este autor, que apontava para a existência em Peniche de cerca de 1000 rendilheiras na década de 60 do século XIX: “Esta indústria, estando sujeita à flutuação e ao capricho dos consumidores, carece de uma inteligente direção, que espreite as exigências da moda, e procure mercados para os seus produtos (…) A direção a que nos referimos, é nossa humilde opinião, que só se lhe poderia dar por meio de uma companhia, que se encarregasse de escolher os desenhos das rendas, de adquirir as melhores linhas e sedas para a sua fabricação, de procurar mercados para elas, de satisfazer encomendas por uma módica percentagem, enfim de velar pelo bem acabado dos artefactos.” (FIGUEIRA: 1965, p. 5)

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De salientar como, já no século XIX, eram defendidas opiniões tão sensatas e plenas de atualidade para colmatar os problemas da indústria rendeira então (como agora) sentidos. Outra disfunção do setor prendia-se com o modo como eram comercializadas as rendas e que garantiam as maiores margens de lucro para os intermediários e vendedores. Explica Pedro Cervantes Figueira que: “Ainda na escola, já as mães d´estas raparigas lhes procuram rendeiros: rendeiro é um homem, ou mulher, que negoceia em rendas e faz adiantamentos às fabricantes em dinheiro, em comestíveis, e em artigos de vestuário, sempre cotados por um preço exorbitante, para receber em paga as rendas que vão produzindo: logo que os rendeiros têm reunido uma porção de rendas, entregam-nas aos vendedores, que são outros homens ou mulheres, que vão percorrer Lisboa, Porto e outros sítios de concorrência, como Caldas, Figueira, praia da Nazaré, foz do Douro no tempo dos banhos. Estes vendedores recebem 10 por cento de comissão de venda.” (FIGUEIRA: 1865, p. 3) O autor acrescenta ainda que as mães das rendilheiras mais novas, “(…) começam a pedir [aos rendeiros] vestuário, calçado e comestíveis, à custa da almofada das filhas, isto é, por conta das rendas que hão de ir fazendo; os adiantamentos sucedem-se e as pobres infelizes vão pagando, mas (…) nunca chegam a limpar o rol, porque três ou quatro vinténs por dia, preço de rendas pagas por metade do seu valor, nunca chega para saldar a conta da capa, do vestido, dos açafates, da linha e dos comestíveis vendidos pelo preço que costumam pagar os que vivem a crédito.” (FIGUEIRA: 1983)

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