Renda de Bilros de Peniche - Caderno de especificações para a certificação

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2.3.6) A Crise da Indústria das Rendas de Bilros de meados do século XX O fulgor das rendas de bilros de Peniche nas primeiras décadas do século XX foi o canto de cisne desta indústria. As duas guerras mundiais, a industrialização e o crescimento urbano acelerado tiveram enormes repercussões no papel social da mulher, cuja emancipação foi acompanhada por profundas modificações no mundo da moda. A posição de relevo que as rendas tinham no vestuário ou na decoração do lar foi desaparecendo, provocando uma drástica diminuição do seu consumo ao longo do século XX. A crescente concorrência provocada pelas rendas mecânicas das fábricas têxteis apresentou também um desafio significativo às rendas manuais, apesar da sua produção se limitar à renda corrida, de pouca largura e escassa variação de motivos. A verdade, porém, é que as rendas corridas mecânicas vendiam dez vezes mais do que as manuais da mesma tipologia. Neste sentido, as fábricas dominavam em meados do século XX o mercado das rendas mais baratas, deixando para as manuais as de confeção mais complexa e, logo, mais cara. (SOUSA: 1942) Para além destes fatores, a industrialização favoreceu a empregabilidade das mulheres numa série de outros setores económicos, como vimos atrás com as fábricas de conservas, facto que acentuou a concorrência na procura de mão-de-obra, limitando a expansão da indústria manual das rendas. Repare-se que em 1940 o ganho diário das rendilheiras não excedia os 3 escudos diários. Com a eclosão da II Guerra Mundial e o período de crise generalizada que inaugurou, a indústria rendeira entrou numa profunda recessão.

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Caderno de Especificações para a Certificação

No relatório publicado a propósito do Inquérito à Indústria de Rendas, realizado em 1940 por Mário Queiroz Botelho de Sousa, refere-se que a indústria de rendas em Peniche e Vila do Conde se encontrava então bastante reduzida face ao passado, consequência de uma redução enorme da procura. A este propósito, refere o autor, que “As causas fundamentais desta diminuição de consumo não podem deixar de ser atribuídas à evolução da moda e dos costumes contemporâneos. Para verificar tal asserção basta fazer uma comparação entre os vestuários femininos de há 100 anos, ou mesmo de há 30, e os actuais. Nota-se logo que a renda já quase se não usa, a não ser em roupas interiores. Mas, nestas, foi tal a simplificação e redução em número e na dimensão, que o gasto de renda para as guarnecer diminuiu extraordinariamente. Mas não foi só deste modo que a moda prejudicou a renda de bilros, pois, também, a aplicação de outras rendas, especialmente mecânicas (…) lhe vieram fazer concorrência.” (SOUSA: 1942, p. 983) Esta situação, agravada pelo período de crise provocado pela guerra, redundou numa diminuição dos preços das rendas, o que resultou, finalmente, numa diminuição do número das rendilheiras a nível nacional e mesmo à extinção de alguns centros produtores, como Setúbal, Viana do Castelo e Lagos. Mário Queiroz Botelho de Sousa calculava que em 1940 deveriam existir 1000 rendilheiras no país, repartidas entre Vila do Conde e Peniche concluindo que “A indústria tem vivido entregue a si própria sem orientação ou auxílio de qualquer entidade.” (SOUSA: 1942, p. 987)

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