Modos de usar:
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Modos de usar:
Daniela Zorzal
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Gabriel Borem
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Ludmila Cayres
Piatan Lube
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Rubiane Maia
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Thiago Arruda
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A Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo tem a honra de apresentar o catálogo da mostra “Modos de usar:” que esteve em cartaz de janeiro a maio de 2015 no Museu de Arte do Espírito Santo Dionísio Del Santo - MAES. A mostra, composta por obras dos artistas Daniela Zorzal, Gabriel Borém, Ludmila Cayres, Piatan Lube, Thiago Arruda e Rubiane Maia, refere-se ao resultado da produção desenvolvida através do Edital 0015/2013 de fomento às Artes Visuais, realizado pela Secult – ES. Para o museu é de suma importância abrigar a produção dos artistas-bolsistas do Edital pois representam os mais novos projetos de pesquisa em arte contemporânea em nosso Estado. Com curadoria de Júlio Martins, a exposição abrigou, além dos trabalhos dos seis artistas capixabas, treze obras do acervo do museu, em um projeto curatorial arrojado que reuniu a produção de arte capixaba de diferentes épocas por diversas linguagens e aspectos. Dionísio Del Santo, Elpídio Malaquias, Maurício Salgueiro, Nice Avanza e Raphael Samú foram os artistas selecionados pelo curador. Além dos trabalhos de arte, este catálogo contém o registro das atividades culturais e educativas realizadas no período de exposição, que também contou com a 6ª edição do “MAES em Letras”, projeto que visa difundir o acervo da Biblioteca de Artes Visuais do museu. A educação tem papel primordial nas políticas da instituição. A mostra contou com uma programação educativa extensa e variada, na qual recebemos o público para diversas atividades e interações, fazendo do MAES um museu vivo e em constante diálogo com a sociedade. João Gualberto Moreira de Vansconcellos Secretário de Estado da Cultura Anna Saiter Diretora do MAES 20
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Modos de usar: algumas notas e instruções
Não procure o significado, procure o uso. Ludwig Wittgenstein,citado pelo artista Rirkrit Tiravanija
Para se estabelecer o verdadeiro valor de uma funcionalidade, deve-se levá-la até seus limites. Yevgeny Zamyatin, citado pela artista Tania Bruguera
1. sobre a condição de usuário: Ao levantar a questão da lógica do uso nas práticas artísticas contemporâneas e, sobretudo, ao propor e implementar usos alternativos dos espaços expositivos e do acervo do MAES na exposição “Modos de usar:”, partimos de uma inquieta constatação – ficamos acostumamos a uma relação apaziguada com a arte, marcadamente contemplativa, excessivamente passiva e previsível. O teórico da arte Stephen Wright reconhece uma ‘virada usológica’ em todos os setores da sociedade nas últimas décadas e estuda a emergência da figura do “usuário” na produção cultural recente. Para o autor, “espectadores são para espetáculos, assim como usuários são para... o usual” (traduz tanto aquilo que oferece uso como o habitual, cotidiano). Assim entendido, o uso não pretende desdobrar nem aprofundar esforços de participação e interatividade do público, mas definir novas possibilidades de se relacionar com as obras, estabelecer modos autoreguladores de engajamento e operação que transformam o próprio estatuto da arte. Na condição de usuário, 22
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consumo e produção – de informação, sentido e valor – são instâncias que coincidem. Segundo Wright, “[As noções de uso e usuário vão] contra três consistentes edifícios conceituais da ordem contemporânea: a cultura do especialista (expert culture), para a qual os usuários são invariavelmente despreparados (misusers); a condição do espectador (spectatorship), na qual o usuário é inerentemente oportunista e cheio de auto-interesse; e ainda mais vigorosamente, o regime do proprietário (ownership), que procura reduzir os valores de uso e direitos de utilização livre. No entanto, a condição de usuário continua a ser tenaz, assim como é indisciplinada.”
Podendo operar numa lógica que não é moderna, o uso firma-se como dimensão da subjetividade política contemporânea. No campo estético, a possibilidade do uso oferece uma plataforma de experimentação que arruína o discurso da autonomia da arte. Admitindo que este discurso responda a uma situação histórica, e que no séc. XIX tenha garantido um espaço alternativo de exercício de liberdade para o campo artístico ao circunscrever sua prática numa esfera separada da tutela de instâncias extraestéticas, bem como do utilitarismo racionalista do campo social, não faz sentido, no entanto, torná-lo um argumento ontológico e definitivo, nem forçar sua projeção sobre a arte da segunda metade do séc. XX. Para que surja a possibilidade do uso, a arte deve escapar da intransigência formalista e tocar o real em sua dimensão política e estética, tendo em vista que: “a arte autônoma se tornou menos um espaço de autodeterminação e experimentação do que uma prisão – uma esfera onde se deve conformar às leis de permanente exceção ontológica, o que deixou o mundo da arte autônoma recorrente no cinismo.”
Se o discurso da autonomia da arte determinou a produção artística da modernidade na primeira metade do 24
séc. XX, nos anos 1960 o engajamento político e o desejo de fundir arte e vida na produção cultural já denunciam a consciência da insuficiência deste pensamento e da necessidade de sua superação pela própria redefinição das práticas artísticas. E em nossa era de catástrofes e globalização, haveria algum sentido em pensar a produção artística isolada, ainda que relativamente, de suas condições contextuais, geo-políticas, culturais? É instigante pensar, seguindo a historiadora da arte Mabel Tapia e seu endereçamento ao vocabulário da estética kantiana, que opera-se, pelo uso, uma “desativação da função estética da arte”, no sentido de torná-la inoperante em seu alheamento do mundo, em sua compreensão desencarnada e despolitizada. Assim, ao transpor seus limites disciplinares e ideológicos, a arte se capacita para atuar no mundo real e afetá-lo. Paralelamente, a partir da “Estética Relacional”, o curador Nicolas Bourriaud anota observações sobre a mesma questão – a desconstrução do discurso da autonomia da arte por meio das operações de uso – chamando atenção para trabalhos de artistas contemporâneos que criam protocolos de uso para modos de representação e estruturas formais existentes. De acordo com Bourriaud, “o uso é um ato de micropirataria, o grau zero da pósprodução”, o uso permite formas de apropriação contextual e interpretativa que repõem e redefinem funcionamentos na percepção e na linguagem: “[essas práticas artísticas] mostram uma vontade de inscrever a obra de arte numa rede de signos e significações, em vez de considerá-la como forma autônoma ou original. Não se trata mais de fazer “tábula rasa” ou de criar a partir de um material virgem, e sim de encontrar um modo de inserção nos inúmeros fluxos da produção. “As coisas e os pensamentos”, escreve Gilles Deleuze, “crescem ou aumentam pelo meio, e é aí que a gente tem de se instalar, é sempre este o ponto que cede”. A pergunta artística 25
não é mais: “o que fazer de novidade?”, e sim: “o que fazer com isso?”. Dito em outros termos: como produzir singularidades, como elaborar sentidos a partir dessa massa caótica de objetos, de nomes próprios e de referências que constituem nosso cotidiano? Assim, os artistas atuais não compõem, mas programam formas: em vez de transfigurar um elemento bruto, eles utilizam o dado.”
2.“Signos” à espera de sintaxes, uso como ativação: Com as palavras a seguir um crítico literário tentou listar alguns dos procedimentos e intenções que moveram o escritor Georges Perec em seu livro “A vida modo de usar: Romances”: “Construir a Torre de Babel, escrever um romance que contenha todos os tipos de romances; colocar em cena dezenas de vidas simultaneamente; evocar modos de usar da existência tão diversa quanto possível; deixar seguir múltiplos tempos a partir desse espaço fechado; obrigar a evocação de milhares de objetos, emblemas, imagens e dar vida a esse propósito; juntar o prazer da infância (jogos, encaixes, listas, quebra-cabeças, livros de aventuras, trocadilhos, adivinhas, cadeias ao infinito) e combinatórias mais sofisticadas; abolir, subverter, ultrapassar fronteiras entre texto e imagem, narrativa e ícones, transformar a literatura em uma cópia miniaturizada do mundo e da literatura; aprender a olhar e ler errando sem parar; metamorfosear o enciclopedismo em material romanesco; estruturar claramente um romance labiríntico, tornar móvel um romance-imóvel, dirigir um romance-jogo de xadrez (em todos os sentidos da palavra). Estas são algumas das proezas do acrobata Georges Perec.”
Em suas primeiras páginas, páginas que se repetem no meio do romance, Perec faz considerações sobre a arte do “puzzle” que poderiam fornecer reflexões interessantes para pensarmos, no campo da arte, as instâncias da imagem, da forma e da percepção, para além da Gestaltheorie e 26
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“Signos”, de Dionísio Del Santo, 1988.
mesmo da Semiótica. Atentando à qualidade de enigma e mistério que o termo em inglês preserva, Perec observa que o puzzle não permite decompor-se, não é determinado por suas peças, antes o contrário, “o conhecimento do todo e de suas leis, do conjunto e de sua estrutura, não é passível de ser deduzido do conhecimento separado das partes que o compõem” . Somente reunidas e articuladas as peças ganharão sentido e legibilidade no conjunto, e é por tentativas dedicadas e exercitando a intuição, sobretudo, que o armador faz o puzzle encontrar sua forma completa. A conclusão de Perec indica, entretanto, que há uma partilha subjacente a se insinuar pela aleatoriedade: “Podemos deduzir daí algo que é, sem dúvida, a verdade última do puzzle: apesar das aparências, não se trata de um jogo solitário – todo gesto que faz o armador de puzzles, o construtor já o fez antes dele; toda peça que toma e retoma, examina, acaricia, toda combinação que tenta e volta a tentar, toda hesitação, toda intuição, toda esperança, todo esmorecimento foram decididos, calculados, estudados pelo outro.”
Se pensarmos na inseparabilidade entre forma e conteúdo na “arte do puzzle” e em seu caráter dialógico e circunstancial, suas necessidades e urgência de ativação, as leituras e metáforas com as artes visuais nos rendem interpretações interessantes e, novamente, endereçamentos críticos ao formalismo. Mas há algo que aproxima a dinâmica das peças do puzzle, tal como descrita por Perec, ao tratamento formal do pintor Dionísio Del Santo, como percebeu também o historiador da arte brasileira Walter Zanini num apontamento nos anos1980: “Quase à maneira de um puzzle, ele [Dionísio Del Santo] arma mundos fantasiosos valendo-se de formas geométricas distribuídas com precisão no espaço. Fundem-se a elas equilibradas 28
dosagens de cor contrastante.”
Em “Signos” , Dionísio Del Santo estrutura uma geometria irregular de encaixes e arestas, carregadas de indeterminação, aberta a possíveis rearranjos: uma geometria inconclusa, que não define uma permanência no grid, não encontra estabilidade no plano pictórico. Os signos se encaixam de maneira provisória, intercambiável, são unidades mínimas que se oferecem às múltiplas possibilidades de conjugações e escritas. Os signos, à espera das tantas sintaxes que lhes queiram conectar, de tantos usos possíveis, estão a reiterar a necessidade e a importância do envolvimento do visitante na construção do discurso. Cabe ao visitante, e este é na verdade um convite da exposição, contribuir e engajar-se na produção – literal e simbólica – do sentido das obras exibidas em “Modos de usar:”. Georges Perec classifica algumas peças de quebracabeça por “homenzinhos”, enquanto que Dionísio Del Santo contamina o vocabulário geométrico com hibridismo e antropomorfia. A forma, em Dionísio, segue a vocação latino-americana de compor “geometrias sensíveis”, que escapam ao rigor geométrico ao interpretar e absorver as tendências construtivas sob conluios e contágios com formulações figurativas e temáticas locais. Poderíamos dizer, portanto, que o pintor faz uso não-normativo do vocabulário geométrico, imprevisto pela gramática da pintura abstrata. 3. ativar uma exposição, modos de usar: Os artistas Daniela Zorzal, Gabriel Borem, Ludmila Cayres, Piatan Lube, Rubiane Maia e Thiago Arruda, selecionados pelo Edital 015/2013 da Secult, apresentaram na exposição “Modos de usar:” alguns dos trabalhos que 29
resultaram das pesquisas desenvolvidas ao longo da Bolsa Ateliê. Contudo, mais que exibir resultados acabados, interessou tornar acessíveis e evidenciar os processos, as hipóteses e os experimentos realizados pelos artistas. Todos os projetos reunidos na exposição lidam com alguma noção ampliada de “uso”: seja na proposição de usos alternativos do espaço e da lógica museológica, ou no trato das imagens (considerando suas propriedades materiais ou discursivas, ambas manipuláveis segundo a intenção de uso), seja na ambição crítica em relação às normatizações técnicas e no uso livre e inventivo da linguagem, seja nas exigências que endereçam à percepção e às demandas de colaboração para sua realização. Os trabalhos elaboram instâncias em aberto, inconclusas, que aguardam o envolvimento do espectador, tendo em vista que o uso implica numa experiência dialógica.
barco em papel, reconhecendo na madeira do objeto a matriz de sua xilogravura, ou quando Daniela Zorzal queima e enruga a superfície de suas fotografias da cidade de Piúma ou ainda quando Gabriel Borem interfere diretamente em revistas de arte, cortando e reeditando seu conteúdo imagético e textual, o que se evidencia é justamente a dimensão material da imagem – concreta, utilizável – e sua implicação inevitável na construção do sentido. São procedimentos que constituem, entre outras leituras, usos criticos das linguagens. As idéias de uso, portanto, não se esgotam em funcionalidades e interatividades mecânicas, nem na instrumentalização alienada do consumo, mas são construídas e se oferecem como forças de apropriação poética.
No projeto colaborativo “Tabebuias - Cozinhas Experimentais”, Piatan Lube cartografou as árvores frutíferas na cidade de Vitória e instaurou no museu uma plataforma intensa de encontros com o público ao longo do período da exposição para trocas e disseminação dos frutos, colheitas de safras pela cidade, preparo e consumo coletivo de alimentos com frutas no MAES. Rubiane Maia converteu o museu em cenário de estúdio fotográfico para sua performance “À primeira vista: uma maçã e duas cadeiras”, na qual fotografou mulheres comendo maçãs, e num laboratório onde observou a decomposição de maçãs reais. Ludmila Cayres também se valeu de métodos e objetos de estudo do campo científico para gerar dados poéticos que compõem um relato espaço-temporal cromático da latitude 20⁰ Sul, em Manguinhos, no litoral do Espírito Santo, e Iquique, no Chile. Quando Thiago Arruda registra por contato o casco de um 30
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4. Piatan Lube e Nice, partilhar dos frutos da terra: As diversas atividades propostas por Piatan Lube em “Tabebuias - Cozinhas Experimentais” definem um uso coletivo para o espaço do museu que se choca com restrições institucionais e museológicas. O espectador é convidado a abandonar sua habitual passividade diante das obras e tornar-se um usuário da plataforma de intensas trocas, convívio e partilha de alimentos. Segundo o artista, trata-se de “uma obra que provoca e proclama a cidade como casa–cozinha (coletiva e pública) e ao museu reserva o encontro de forças e de ativismo como um espaço real de vida e ação, não de mera contemplação”. Ao reunir as diversas instâncias de pesquisa colaborativa e articulações poéticas em torno das árvores frutíferas existentes na ilha de Vitória, mapear sua incidência na cidade, suas espécies e períodos de colheita e maturação, o artista instaurou em sua sala no MAES uma plataforma de trocas e disseminação das frutas colhidas por toda a cidade de forma colaborativa, envolvendo a participação do público. As oficinas e vivências que aconteceram ao longo do período da exposição propõem encontros em torno da colheita dos frutos, expedições nas regiões ao redor do MAES e a produção coletiva de doces, sucos, geléias e afetos. O visitante–usuário é convidado a ativar as dimensões sensitivas e comunitárias propostas pelo trabalho. A cena pintada por Nice em “Colhendo Cacau” nos traz um registro da delicadeza poética que envolve os processos ligados aos “frutos da terra”, metáfora do escritor André Gide para a descoberta dos sentidos. Desde o plantio à colheita, passando pela partilha do alimento e do sabor (uma questão também presente nas investigações de Rubiane Maia), as atividades em torno dos frutos possibilitam novos pensamentos coletivos, práticas de sociabilidade na cidade e usos das instituições. 32
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“Colhendo cacau”, de Nice, 1971
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5. Rubiane Maia e “Meninas vendendo massan”: Nas fábulas que tece para si mesma e nas quais enreda o próprio corpo, a performer Rubiane Maia parece querer incorporar o fraseado longo do escritor Marcel Proust, para quem o instantâneo e o efêmero são capazes de se desdobrar entre intensas descrições e memórias afetivas, pela via preferencial da experiência dos sentidos. Em “Esboços de um corpo desconhecido”, série de ações performáticas realizadas para vídeo, a artista investiga na extensão da pele do seu corpo as reações que lhe provocam as diferentes materialidades dos alimentos. Tal como as vendedoras pintadas por Elpídio Malaquias, que individualizam cada um dos frutos que estão a oferecer em sua venda, Rubiane Maia também encontra no fragmento e na sensação as possibilidades de recompor ou gerar suas narrativas, tendo o corpo por referência de contato e cognição. É também motivada por esse desejo de incorporar, de trazer à inteireza do corpo as experiências, que Rubiane Maia põe à prova do tempo um conjunto de maçãs no espaço expositivo. A instalação “Sim” consistiu em 40 pequenos nichos na parede em que foram alojadas maçãs vermelhas. A primeira delas foi colocada inteira e intacta e as seguintes foram mordidas gradualmente, até o completo desaparecimento. As frutas permaneceram ao longo do período de exposição em processo de decomposição. Afastada de sua consistência sígnea, símbolo do pecado original, por exemplo, entre tantas implicações iconográficas, a maçã compareceu ali em sua dimensão material e irrevogável aos sentidos, incluindo o cheiro e o processo de seu apodrecimento.
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“Meninas. vendendo massan”, de Elpídio Malaquias, s/d
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6. Gabriel Borem e um uso antropofágico: Por fins da década de 1980, Dionísio Del Santo enfatizava a importância da execução como instância inseparável do ato criador. Em suas “serigrafias de matriz espontânea”, o artista criava interferências únicas sobre cada peça impressa, como nos explica a historiadora da arte capixaba Almerinda Lopes: “Sobre um fundo monocromático de tons baixos,sobrepunha uma composição de linhas estilhaçadas e estruturas geométricas de tons mais claros e efusivos. O autor lançava sobre a matriz, no ato da impressão, partículas de papel picado ou rasgado, que modificavam a composição e atribuíam, na maioria dos casos, certo lirismo a essas obras gráficas. Os fragmentos irregulares atenuavam a rigidez geométrica, criando uma euforia rítmica, festiva e pulsante de estruturas não fixas, que algumas vezes fazem lembrar constelações. Por esse processo, imprimiu também tiragens de obras únicas, recorrendo à sobreposição de tintas opacas e transparentes.”
É notável que, na mesma medida em que a imagem produzida por Dionísio atenuava a rigidez do vocabulário geométrico, o rigor tradicional da técnica de serigrafia também era contaminado por vetores disformes, marcas únicas, da subjetividade e do acaso. Nesse sentido, o gesto experimental de Dionísio encontra correspondência com os “cortes” e procedimentos editoriais que Gabriel Borem realiza em suas “Edições Limitadas”. Neste trabalho, o artista define estratégias de edição que operam diretamente em exemplares de revistas de arte e cultura por meio de cortes e reencadernações. O procedimento consiste em desmembrar as revistas de suas capas e soltar cada uma de suas páginas. Com base em uma proporção de aproximadamente 25% da área do tamanho de cada publicação é feito um gabarito que projeta as áreas de corte; em cada página é feita uma seleção de 44
recorte com o gabarito. A seguir, as páginas e a capa são reunidas e encadernadas em uma nova edição, respeitando a ordem das páginas mas com o tamanho aproximado de um quarto do exemplar original. Exemplares de revistas como Artforum, Bravo!, Dasartes, etc. tiveram seus conteúdos imagéticos e textuais reorganizados segundo critérios e interesses pessoais do artista. Este gesto faz coincidir leitura crítica e reescrita interpretativa destes materiais, em sua maioria produzidos a partir da perspectiva do mercado de arte e dos centros hegemônicos. O artista extrai, discursiva e escultoricamente, uma versão possível e à sua escala daquilo que poderia ser considerado uma referência normativa para sua prática e inserção na indústria cultural. Trata-se de uma atitude antropofágica, portanto, que se alimenta somente daquilo que lhe interessa no outro, e que assimila o que vem de fora segundo as suas próprias medidas. Foi importante, por essa razão, localizar o trabalho do artista na sala ocupada originalmente pelo educativo do museu, integrando-a ao espaço expositivo. O trabalho definiu ali um ambiente de sala de leitura, onde se disseminou uma “pedagogia do corte”, cuja ênfase está na construção de releituras pessoais. Os cortes e enquadramentos de Gabriel Borem definem uma didática “antropofágica” quando a leitura torna-se uma exercício crítico de apropriar-se das informações e remodelá-las segundo a intenção de seu uso: “Prática artística ou prática literária – “o texto é a prática do papel”, diria James Joyce – olhar ou ler com a tesoura nas mãos não significa somente recortar, selecionar, citar, mas também e principalmente, descartar, eliminar, atirar no lixo os restos. Recortar e colar são, sem dúvida, hábitos de leitura. Chateaubriand lembra o moralista Joseph Joubert: “Quando lia arrancava dos livros as páginas de que não gostava, reunindo assim uma biblioteca 45
pessoal composta de volumes estripados, encadernados em capas frouxas”. Antoine Compagnon cita o guarda florestal, que declara: “leio com a tesoura nas mãos, desculpem, e corto tudo o que me desagrada...”.
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“S/T”, de Dionísio Del Santo, 1989
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7. “Este é o Paraíso”: Daniela Zorzal e Ludmila Cayres Num pedaço pequeno de papel Elpídio Malaquias empenha suas canetas bic nas cores vermelha e azul para, em linhas sucintas, traçar o horizonte de uma paisagem onde lê-se, assim, como se fosse uma informação prosaica: “Este é o paraíso”. Mesmo com materiais precários e recursos de linguagem extremamente rudimentares o artista é capaz de inventar e habitar um lugar, por sua simples enunciação poética. Daniela Zorzal e Ludmila Cayres propõem, a partir das suas pesquisas de campo e estratégias de imersão nas realidades visitadas, dar a ver situações que habitualmente estão submetidas a zonas de invisibilidade.
cor, sob a transitoriedade da luz, que formam a geografia contínua de Manguinhos a Iquique, estudada por Ludmila Cayres. As fotografias e a videoinstalação apresentadas pela artista mostram dados dos céus de duas cidades que se localizam a 20º Sul de latitude: Manguinhos, no litoral brasileiro e Iquique, no Chile. Ludmila Cayres produziu registros nas duas localidades pelo período de um ano, acompanhando as quatro estações. Nos vídeos, experimenta-se a simultaneidade da duração do nascer do sol no mar ao leste capixaba e do seu ocaso no mar a oeste da região Tarapacá chilena. Já o conjunto de fotografias apresenta outro mapeamento poético desta cartografia, num estudo cromático dos horizontes.
Daniela Zorzal conhece bem os usos que as imagens podem adquirir. Vivendo na cidade de Piúma, no litoral sul capixaba, a fotógrafa percebeu a dessemelhança existente entre a cidade em seu cotidiano ordinário e a auto-imagem que vendia nas temporadas turísticas. “Cotidiano de uma cidade que não saiu da concha” é um ensaio fotográfico no qual a artista expõe os contrastes sociais e contradições do lugar onde vive, enquadrando as outras faces da cidade, com problemas estruturais e de saneamento básico que, no entanto, são esquecidos a cada carnaval. O tom documental e direto das fotografias é ainda acentuado pelas intervenções realizadas diretamente em sua superfície. Daniela Zorzal queima e enruga o papel fotográfico, confere uma consistência retorcida e crua às suas imagens, o que confirma a dimensão crítica de seu olhar. Em fins do século XIX, o pintor Claude Monet demonstrou em sua série de pinturas da fachada da catedral de Rouen como a luz erigia a cada intervalo breve de tempo uma nova arquitetura cromática à percepção. São estados da 50
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“Esse é o Paraíso”, de Elpídio Malaquias, s/d
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8. Thiago Arruda e Raphael Samú, sobre usos da linguagem: Em “Confluência”, Thiago Arruda realiza uma montagem em sua sala ao reunir 3 trabalhos de sua pesquisa: 1. uma série de 4 “ocogravuras” que registram a maré em períodos diferentes do dia, tendo barcos ancorados à paisagem. A “ocogravura” é uma técnica desenvolvida pelo artista, com matrizes em material transparente, o que permite visualizar as camadas ao longo do processo de impressão e interpor cores, gestos, arranjos geométricos e manchas que ocupam a superfície do papel com um vocabulário eclético. O artista prolonga e segmenta os desenhos, projeta linhas no registro realista, produz texturas, se vale de repertórios diversos no colorido e faz uso livre e eclético dos recursos gráficos. As camadas que se sobrepõem são comentários na imagem e construção da imagem, ao mesmo tempo. O acúmulo de registros sobrepostos na constituição da imagem parece falar sobre um estado de saturação da linguagem.
nas paredes ao lado. Este trabalho é o eixo do que reconhecemos por modelo instalativo de ocupação da sala. É em torno do barco que o visitante passeia por entre os outros trabalhos. Rodeado por imagens que o representam, o barco é uma presença ostensiva no espaço. Ainda que submetido à modulação do cubo branco, o barco pretende abolir a representação, por sua presença tangível, real. Ao seu redor, os registros de seus cascos criam figurações que não se originam da correspondência visual, mas por índices de contato direto com a realidade. Tal como as 3 cadeiras de Joseph Kosuth (uma fotografia, uma definição de dicionário e um objeto real), que investigam os limites da linguagem, em “Confluência” Thiago Arruda articula e problematiza a convivência de regimes da imagem e da representação a partir de um mesmo dado: um barco, o mesmo que Raphael Samú registrou em tantas das suas gravuras.
2. uma xilogravura de grandes dimensões (180 x 240 cm) que registra em tom expressionista uma figura humana solitária num barco envolvido por ondas agitadas, embarcações naufragando à volta. Estamos diante de um registro que se veicula à tradição modernista do expressionismo, genealogia que vai de Van Gogh a Osvaldo Goeldi. A crença expressionista de interpretar o mundo pela subjetividade exacerbada encontra aqui mais outra imagem de desconsolo e desorientação frente à realidade, metaforizada por um mar revolto. 3. um barco real, montado no centro da sala sobre cavaletes, tendo o bico apontado para a xilogravura, e as impressões das laterais do seu casco impressas por frotagem em grandes dimensões (150 x 600 cm) 58
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“S/T”, de Raphael Samú, 1955
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9. usos produzem redefinições:
[1] WRIGHT, Stephen. Toward a Lexicon of Usership. Eindhoven: Van Abbemuseum, 2014. p.1. (tradução nossa; grifo nosso).
À luz da obra “Escultura II”, de Maurício Salgueiro, foram reunidos trabalhos de Dionísio Del Santo e Elpídio Malaquias que integram o acervo do MAES. O visitante foi convidado a acionar a escultura interativa para iluminar a sala, inicialmente escura, o que ressaltava novamente a importância de seu envolvimento para que a experiência artística acontecesse plenamente.
[2] WRIGHT, Stephen. Toward a Lexicon of Usership. Eindhoven: Van Abbemuseum, 2014. p.12. (tradução nossa).
Embora as luzes coloridas da escultura sejam inadequadas para iluminar obras de arte, a dimensão do uso de seus recursos e efeitos se mostrava disponível no trabalho para esta função pelo simples fato de ser constituído materialmente por lâmpadas industriais. Assim, a luz que emanava da obra de Maurício Salgueiro foi levianamente utilizada para iluminar a própria sala onde foi montada junto a outras obras. Interessou à curadoria reconhecer o uso como uma força latente nesta obra e experimentar o alcance da ideia de realizar um uso – literal e poético – de uma obra de arte na exposição.
[6] Idem. p.14.
[3] BOURRIAUD, Nicolas. Pós-produção: como a arte reprograma o mundo contemporâneo. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p.13. (grifo nosso). [4] BURGELIN, Claude. Georges Perec. Paris: Éditions Seuil, 1988. p.177. [5] PEREC, Georges. A vida modo de usar: Romances. São Paulo: Cia das Letras, 2009. (1ª edição francesa: 1987). p.11.
[7] ZANINI, Walter.História Geral da Arte no Brasil. São Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. p.682. [8] A obra “Signos”, de Dionísio Del Santo, escolhida para ser identidade visual do projeto, foi montada à entrada, junto ao texto curatorial, como introdução à exposição “Modos de usar:”. [9] LOPES, Almerinda. Dionísio Del Santo. Vitória: Artviva, 2008. p.31. [10] MELENDI, Maria Angélica. “Memórias dos outros”. In: ANAIS do XXIII Colóquio de História da Arte. Org: Sonia Gomes Pereira, Roberto Conduru. Rio de Janeiro: CBHA / UERJ / UFRJ, 2004. p. 288.
Sob esta mesma fonte de luz, o espaço da sala foi qualificado pela ocupação do setor educativo do MAES que ali realizou oficinas, encontros, palestras, visitas guiadas entre outras atividades nas quais os visitantes produziram desenhos, escritos e materiais que foram exibidos nas paredes da sala do museu, ao lado das obras selecionadas do acervo. O espaço foi sendo construído a partir dessas vivências, que reconfiguraram as relações entre o visitante, as obras e a instituição. Júlio Martins, curador
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“S/T”, de Dionísio Del Santo, 1973
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“Esse é ramo da esperança”, de Elpídio Malaquias, s/d
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“Escultura II”, de Maurício Salgueiro, 1963-4
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Ver por ver o que não quer ser visto ou ver sem ver o que quer ser visto? Contrastes e nuances de realidades de uma cidade que vive para fora de si e da fotógrafa que decidiu ver.
Vejo um objeto. Vejo o mundo ao meu redor. Qual o significado destas afirmações? Para os fins da vida cotidiana, o ver é essencialmente um meio de orientação prática, de determinar com os próprios olhos que uma certa coisa está presente num certo lugar e que está fazendo uma determinada coisa. Rudolf Arnheim
Ao fotografar sua cidade e procurar fazê-lo da sua maneira, Daniela Zorzal acabou por aprender a ver, apenas porque decidiu assim. Antes mesmo de me ater ao fato de que procurou criar um suporte diferenciado trazendo a tridimensionalidade ao suporte da fotografia, normalmente bidimensional, ela nos traz visões únicas de sua cidade. Piúma é um pequeno município no sul do estado do Espírito Santo, conhecido por sua receptividade e hospitalidade com os turistas de várias partes do Brasil, que vem no verão e no Carnaval usufruir de suas praias e dos constantes eventos que juntam pequenas multidões na rua principal que segue a beira-mar. Essa realidade é uma entre tantas
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outras que o Espírito Santo e outros estados enfrentam em seus municípios interioranos estabelecidos no litoral. A renda levantada durante o ano é concentrada apenas na conservação das festas e dos blocos que entretêm os turistas, e todas as necessidades de infraestrutura básica que deveriam manter a integridade da cidade e aumentar (ou pelo menos continuar no mesmo patamar) o bem-estar dos piumenses são completamente ignorados. O interessante é que por mais que o projeto “Contrastes: Cotidiano de uma cidade que não saiu da concha”, seja embrionado nesta terra adubada por questões políticas, a reflexão filosófica que chegamos é de tão amplo espectro quanto o da gestão dos bens públicos. As imagens que Daniela apreendeu podem ser separadas em dois momentos únicos vivenciados pela cidade: a polvorosa do verão e do carnaval, com seus conhecidos arquétipos; e a pacata e abandonada cidade do período sem turismo, em que a beleza natural fica subjugada, escondida, minimizada. O ambiente sinestésico das festas fica impresso nas cores saturadas da coleção, combinada com as texturas obtidas da deformação do plástico pelo calor, tal como as pessoas se transformam quando no calor das festas e da aglomeração (“O puxador de Rebanho”, foto de um puxador de corda, comum funcionário de trios, responsável por isolar a turba daqueles que pagaram e “Profusão”, uma imagem em plongée da massa; são os objetos dessa intervenção em que este símbolo do calor humano é melhor representado pela artista). Preciso apontar o fato de que, ainda dentro de uma discussão ontológica, com exceção de duas imagens, as fotografias foram apreendidas no nível de seus acontecimentos. Este ponto demonstra não apenas um trabalho jornalístico ou antropológico, mas a disposição da fotógrafa de registrar aquilo que realmente está em seu Mundo. 78
O disponibilizar o seu corpo próprio para o desafio de providenciar uma imagem, um relato visual daquilo que ali aconteceu e que somente ela havia presenciado daquela maneira. Ao ver as imagens, conseguimos sentir o cheiro acre dos corpos suados pelo sol e pelo esforço. Conseguimos sentir o calor que emana dos céus ao chão e é ampliado pela aglomeração. Ao estar concentrada no visor da câmera poderá a fotógrafa ser desafiada pelo acaso e ser vítima de qualquer violência, pois está em posição claramente fragilizada. Diametralmente oposta está a “Reflexo/Retrato” (imagem de um buraco no asfalto da rua principal da cidade e que margeia o mar), que em sua construção está clara toda a dimensão do tempo disponibilizado pela fotógrafa para a organização simbólica. Naquele instante, tinha ela total noção das coisas que a cercavam. Teve tempo de marcar os símbolos daquele Mundo observando que a poça d´água feita em um buraco surgido no asfalto abandonado tinha a forma de um coração e que no reflexo da água aparecia apenas o nome Piúma. É assim que esta fotógrafa-artista em formação (todos estamos sempre) passa do surreal ao impressionista, do simples registro do momento ao singelo retorno político de seus ideais. Mostrar ao Mundo que a cerca de que ela decidiu ver e que isso basta.
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“Cotidiano de uma cidade que não saiu da concha”, de Daniela Zorzal, fotografias interferidas, 2013- 4
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Linha de Corte (Communication Breakdown)
Arte é um processo de intervenção radical no curso de vida e duração dos materiais e objetos envolvidos no ato criação: vontade de dar significação e sentido aos artefatos – culturais e/ou naturais – que nos circundam. As ações em arte contemporânea são ricas em manifestações que propõem uma maior interação entre linguagens – propostas que congregam o artesanal (manufatura) e o tecnológico (meios gráficos, proposições virtuais, etc.). Por este caminho segue a produção de Gabriel Borem – artista tecnosensivel, que busca, a cada proposição/provocação, instaurar um olhar mais atento ao espectador de sua obra: um olhar de ressignificação e memória pulsante... ... Lembro-me do primeiro contato com a proposição de construir textos em aberto com as revistas - paisagens de ideias: coloco deste modo por perceber que uma revista e/ou livro, periódico ou mesmo um conjunto de textos são um universo de palavras com um uso especifico (ou pensamos ser): leitura, divulgação de determinadas visões
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e modos de vida, enfim divulgação de um ideário/universo com recortes bem definidos. Esta ação/edição de Edições Limitadas, que teve seu processo embrionário com uma revista Bravo! - anterior a outras, de motivação semelhante, como os projetos “Ilhas” e “Urbanorâmicas”, já apontava para o trato com a (re)edição de uma paisagem em particular. Os textos e imagens passíveis de leitura no universo destas revistas são um conjunto de ideias que, com esta ação de corte, tornamse uma espécie de memória imagem/texto formal, ficando liberadas da condição de corpo de ideias em bloco. Atrevo-me a dizer que esta atitude implica em uma tentativa de livrar a linguagem de sua função utilitária e, por consequência, transformá-la – como propôs Mallarmé em seus escritos - em um campo de explorações e descobertas, numa tentativa de propor ao leitor a participação ativa e colaborativa neste processo... Boas leituras!
Luciano Cardoso, verão de 2015
“Edições Limitadas”, de Gabriel Borem, livros de artista, 2014
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Giraolho, gira sol Temos a arte para não morrermos da verdade Friedrich Nietzsche
Nietzsche talvez estivesse falando que, de fato, não há realidade alguma: apenas a certeza de que existimos, vivos - com ar nos pulmões, corações em ritmo e modos de usar. De que somos carregados de lastros e lastros de experiências intransferíveis, únicas e pessoais. Chaves que abrem as portas para sermos quem somos: individualidades conscientes de um dado contexto objetivamente real, sujeitos de nós mesmos. O paradoxo reside na oportunidade diária, a cada fração de instante que passa, de escolhermos o que e como vivemos: um processo criador da ficção da própria vida, que ao mesmo tempo em que nos molda e constitui, é a invenção de nossas invenções. Nesse sentido, a verdade imutável e unívoca nos aniquilaria ao cessar o contínuo fluxo criativo das escolhas, dos encontros e dos devires. Por sina criamos, por isso estamos vivos! É possível dizer que todo trabalho de arte nasça de uma certa latência poética presente em qualquer aspecto daquilo que chamamos vida. Essa vibração, por vezes, entra em uma frequência próxima da percepção das pessoas e é ela que o(a) artista consegue captar, melhor
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seria dizer que ele(a) vibra junto, arrebata-se com a poesia presente na situação potencial da arte. Daí em diante vem o suor da elaboração conceitual e contextual que possibilitará ao trabalho de arte estar autonomo no mundo em comum, para que seja acessado/criado por outros sujeitos. Assim, estamos aqui diante de um trabalho de arte: “20º Sul”, da artista Ludmila Cayres. Como fotógrafa, a artista sempre lidou de maneira bem particular com questões ligadas à luz natural. Pouco tempo antes da elaboração desta obra que se apresenta diante de nós, Ludmila vinha construindo uma série de fotografias tiradas sempre sob o mesmo ponto de vista e diante de um mesmo objeto de interesse. Variava, contudo, o horário e, portanto, a luz-cor de cada imagem. Na busca por uma síntese maior para a elaboração de uma proposta em arte, chegou à conclusão de que essa luz, buscada por meio de seus reflexos nas coisas, possuía uma fonte primária e inesgotável: o sol. Não foram precisas muitas revoluções solares no pensamento para entender que ele atuaria e tensionaria o trabalho, pressionando a imagem fotográfica em direção à fotografia no video: tão certo quanto o trânsito desse astro no disco celeste ser o responsável pelos dias e noites que germinam, um dentro do outro, o tempo emergiu para a proposta como uma questão central do fenômeno da luz e da cor. O eixo fixado em 20º Sul abaixo do equador, altura em que vivemos na região metropolitana de Vitória, quando girado no globo, mostrou o caminho até Iquique - litoral do pacífico norte do Chile. Assim, elegeuse filmar a alvorada e o crepúsculo solares nos horizontes extremos das terras continentais da América do Sul: o sol que nasce no litoral capixaba se põe do outro lado, no horizonte de Iquique. Os videos aqui apresentados contém, portanto, uma dimensão fenomenológica do trabalho, o tempo do sol nascer e de seu ocaso, a sucessão dos dias, as estações 110
do ano, o espectro de cores que variam de acordo com a inclinação dos raios solares ao adentrarem nossa clarabóia atmosférica, esse prisma monumental sobre nossas cabeças. Mas, como a câmera filmadora olha fixamente para o olho em fogo que fere a imagem, a extensão cromática mais ampla desse mesmo fenômeno fica fora de quadro. Assim, cabe novamente à imagem fotográfica dar a dimensão dessa cor-luz que a artista busca em sua proposta, apresentadas aqui, em oito conjuntos de fotografias dividas pelas duas localidades e as quatro estações do ano. Um processo que situa-se entre a magia e a ciência, como uma espécie de alquimia da vida. Os videos e as fotos que aqui se exibem, em certa medida, dissecam o ventre cósmico que constitui tais fenômenos de cor e luz, os quais acontecem corriqueiramente ao longo dos nossos dias, displicentemente vividos por nós. Quando, sob o olhar sensível da artista, tais infimidades aparecem ressaltadas de uma escala afetiva, ação da dimensão humana de quem estava lá presente no fenômeno, essas imagens adquirem sentido: não por servirem a propósitos artísticos mas porque, por meio destes, aparecem para nós como uma reflexão, um pensamento acerca do exato instante que nos situa no aqui-agora e a poesia latente das infimidades que nos cercam. É assim que a artista fecha o seu ciclo de interesse e apara as arestas do seu trabalho, transmuta-se em girassol que mira nossa estrela no caminho de leste a oeste. Com o próprio olho aparelhado, cambia-se de lá pra cá e de cá pra lá, transita entre o nascer e o por do sol, enquadra as cores dispostas na paleta celestial, vive tais momentos: os captura, organiza e apresenta. Cria, por fim, a ficção real da vida e da arte. Gabriel Borem 111
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“20º Sul Manguinhos, 20º Sul Iquique”, de Ludmila Cayres, videoinstalação, 2014
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Tabebuias - Cozinhas Experimentais, Museu e cozinha - modos de resistência
A cidade, como a conhecemos, é um modelo em colapso. Dragou os rios, cimentou a floresta, apartou comunidades, dividiu negros e brancos. A propósito do nome, Vitória é mais do que um exemplo dessas falências. Ela é uma espécie de “laboratório do neoliberalismo”, como define Rato - um dos seus artistas marginais mais geniais. Qual o papel do artista neste cenário? Do que e como existir em sua potência vital? Por mais de um ano o artista Piatan Lube vem gestando suas respostas. Em um intenso processo de investigar a cidade e a si mesmo, Piatan descobriu seu “modo de usar” a cidade, suas redes, suas paisagens, seus sabores, suas histórias. Em “Tabebuias - Cozinhas Experimentais”, o artista quer resistir à vitória do apartheid entre humanos e natureza. Ele quer sobreviver ao cimento restituindo os laços primordiais que nos sustentam como espécie conectada à biosfera.
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Piatan critica o caos com a doçura de um doce de goiaba colhida no quintal. Esta é a potência do artista, celebrar a vida em sua sabedoria vegetal. E como toda celebração, a obra em questão é coletiva. Nos lembra os momentos de compartilhamento das boas colheitas, das festas em que se reparte a fartura da terra e ao mesmo tempo se agradece por seus frutos. As goiabeiras, pitangueiras, nos ensinam sobre a resistência. Brotam entre as frestas da cidade. Crescem, frutificam, se espalham. Afirmam o verde no cinza. Tornam orgânicos os dias de metal e pó preto. “Tabebuias - Cozinhas Experimentais” é um processo coletivo e constante. Iniciou com o mapeamento colaborativo das árvores frutíferas da capital, como um convite para que os moradores encontrassem suas frutas, reencontrassem suas raízes, olhassem para aquilo que floresce, vira polpa e fenece. Passou pela coleta dos frutos e pelo plantio de mudas. E para celebrar tudo isso, o artista convida todos a desfrutarem as cores, sabores e saberes das suas árvores frutíferas dentro do Museu. Assim, Piatan resignifica também este espaço sacralizado da arte, tornando-o lugar de comunhão, fluxo, (im)permanência. Nos mostra que museu é também cozinha – local de encontro.
Na comunhão dos alimentos sugere um happening, uma performance coletiva, que nos lembra que a arte e o rito nasceram juntos. Nos sugere revisitar os nossos cânones – tão eurocêntricos, tão formalistas, tão fixados em gêneros. Nos faz encostar a vida na arte, nos presenteia com a delícia deste neologismo sábio: bioarte. Os resultados de “Tabebuias - Cozinhas Experimentais” seguem se fazendo e refazendo. Sem autoria, brotando em cada árvore plantada no processo; crescendo, livres de veneno e do agronegócio, nos galhos resilientes dos quintais, cozinhas, becos.
Gabriela Canale
O artista dá lugar ao espectador atento, aquele que sabe reconhecer a grandiosidade sábia dos ciclos naturais. Lembra que tudo que existe morrerá (fardo quase invisível em um tempo em que tudo tende ao eternamente jovem ou descartável – cuja morte nos é escondida). Lembra que as formas foram e são sabiamente esculpidas pelo tempo em cada fruto que brota da terra. Pode olhar para as frutas com a mesma curiosidade que reconhece a tridimensionalidade da escultura. Pode reconhecer nos vermelhos e amarelos repletos de frutose a dimensão cromática da pintura. 128
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Performar
O verbo convoca o corpo a ampliar sentidos em direção ao esgarçar de seus contornos. Rubiane Maia, em À primeira vista, empresta-se a constituir híbridos que intercambiam afetos e memórias que perpassam corpos em contato com uma diversidade de sons, cores, texturas, formas, luminosidades… Da série composta por três trabalhos, vou me detalhar em “Esboços de um corpo desconhecido”, onde os alimentos se insinuam por meio de diferentes elementos: as flores de uma árvore antes do gosto de seus frutos, a panela que reverbera o tilintar de metais que se chocam, o vinho, o óleo, o pó, os grãos, as cores, as velocidades… …as lentes postas sobre um tripé se convertem no olhar que acompanha os sutis movimentos do seu corpo. Nessa série, só um alimento é levado à boca. Arrancado de sua função, abrem-se numa diversidade lúdica e imagética, constituindo breves filmes-registros. Junto a um corpo, a performance se faz atrás da câmera e irá se refazer mais uma vez na corporeidade em duo que irá assumir para
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se mostrar ao público. Tudo parece fazer parte de um meticuloso plano-ação que é chamado ao desconserto na tortuosidade fluida dos encontros que se tecem entre corpo e alimento.
amarronzada, mantém-se parada desafiando o branco dos ladrilhos a se entregarem ao amarronzamento. Afirmação silenciosa e delicada de uma pele marrom que transborda seus poros para colorir de si o mundo.
Deitada junto ao chão, se contrai ao toque de uma chuva de grãos de arroz. As mãos entrelaçadas acolhem o óleo que escorre por seus braços, promovendo um bailado suave e frenético do verbo esfregar, enquanto os pés o compartilham com a madeira do assoalho. O corpo encontra alimentos e move-se.
Os lábios são o meio por onde o ar se esvai em direção ao pequeno monte de farinha branca, que nesse encontro transforma-se em poeira. Ao fundo, as rachaduras e manchas na parede são marcas que fazem lembrar o tempo. Duração do sopro a desfazer o trigo. O respirar de uma existência diz do tamanho de seu sopro. Fôlego, encher e esvaziar dos pulmões, um esforço.
Performar se faz jambar. Os pés tocam as pétalas delicadas e se metamorfoseiam de rosa sendo jambo. O ritmo meio apressado contrasta a cor. Cor de um espaço na memória guardado num canto de terra de alguma cidadela. Os passos rápidos convocam o urbano a tocar o campo, pisando-lhe, tirando-lhe a cor e o cheiro para que se transforme em pé. Performar se faz amarelar. As mãos se enredam junto à trama de macarrão, levam a boca uma manga, que escorre entre os dedos, provocando-nos seu sabor. A boca suga seu suco avermelhando-se. Grãos de milho, lançados no espaço, caem tilintando sobre a superfície branca ou delimitado-se no copo de vidro transparente que se dá a ver.
Ar percorrendo os finos grãos e os lançando ao vento, retirando-lhes momentaneamente o peso, fazendo-os desafiarem a gravidade que os prende ao solo. Lançar-se. Desfazer contornos. Performar. Refazer contornos. Contrair-se. Performer-transmutando-se em direção a uma imagem que se lança para fora de enquadres.
Leila Domingues Machado
Corpo, deitado, entregue à água da banheira. Parece imóvel. Vislumbra-se o movimento da água por acoplagem ao movimento da respiração do corpo inerte. Olhos fechados. Silêncio. O corpo recebe o tempo sobre si. Performar se faz cafezar. Amarronzar-se, amarronzando ao redor. O cheiro impregnando o corpo, lhe arranca o gosto de uma época. O corpo se entrega ao processo tornandose em parte pó, derretendo-se na água de um banho que não escorre pelo ralo. A água antes transparente e agora 146
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“Sim”, de Rubiane Maia, instalação com maçãs, 2014
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“Esboços de um corpo desconhecido”, de Rubiane Maia, video, 2014
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“À primeira vista: uma maçã e duas cadeiras”, de Rubiane Maia, performance, 2014
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Confluência
Ostentando com legítimo orgulho uma intensa e variada produção, Thiago Arruda é sem dúvidas um destacado expoente da geração de artistas capixabas a que pertence. Nos nanquins e intervenções urbanas do início de sua trajetória, em suas gravuras ou em suas matrizes, se faz sensível a enorme energia que ele empenha no processo. Thiago Arruda altera a matéria rígida com as mãos, ora com força, ora com persistência, empregando longas horas semanais na ação de fazer, efetivamente. Os estudos prévios para suas obras são relativamente curtos. Sua vontade de fazer não pode ser contida no ato em si, que dirá na dispendiosa duração de um planejamento detalhado. Compulsivo e quase inconsequente, quer usar todo o espaço reservado, todo o tempo disponível. Tem tudo sob seu controle; no entanto, pouco preza pela manutenção disso, torturando a si mesmo, não tendo o direito de descansar até que termine. Ao fim, pode-se dizer que falta polimento – e esse ruído, sua assinatura, é talvez
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o aspecto visual mais deslumbrante do seu trabalho. “Confluência”, o presente projeto, foi definido pelo artista como “uma investigação em gravura enquanto linguagem que aborda a realidade”. Thiago Arruda trabalhou inicialmente sob a premissa de que cada uma das diversas práticas artísticas – como fotografia, objeto, xilogravura, desenho, performance – era insuficiente para representar o real em plenitude, sendo mais ou menos adequadas em abordagens específicas, de acordo com suas particularidades. Contudo, sua noção de realidade parece ter se alterando e, aos poucos, se aproximando da sensação do real (em sentido lacaniano). Assim, o real não poderia mais ser alcançado plenamente pelas práticas artísticas – e nem pela linguagem de uma maneira geral –, se tornando algo inacessível ao símbolo, podendo apenas ser vislumbrado pelo flash da imagem. Neste desafio, o de comunicar algo irrepresentável, Thiago Arruda empenhou-se em elaborar, visualmente, pistas para o vislumbre de uma coisa desvinculada da própria visibilidade. O artista cercou um tema – uma embarcação a remo – abordando-o por três caminhos: xilogravura, policromia, apropriação. Na confluência de meios ele buscou expandir o regime do visível e do dizível, tanto experimentando subjetividade e verossimilhança quanto compartilhando um depoimento – não dele, mas do próprio objeto.
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Ações educativas e modos de usar
A exposição “Modos de usar:” no MAES foi, desde o início, para a equipe educativa, uma proposta instigante e desafiadora. Instigante porque trabalharíamos com artistas locais, proporcionando um diálogo e uma proximidade que nem sempre são possíveis em outras mostras em museus; desafiadora porque seria a primeira vez que essa equipe, constituída de uma educadora-coordenadora e cinco educadores-estagiários, tomaria a frente do projeto educativo sem nenhum apoio externo, ou seja, sem a contratação de um profissional especializado para a realização de uma curadoria educativa, uma prática constituída por anos na história do MAES. A equipe esteve próxima à curadoria da exposição durante todo o período de construção da mostra. Júlio Martins, como curador, nos apresentou uma maneira de trabalho que ia ao encontro à maneira que o educativo vivencia seus próprios meios de criação: a da relação horizontal, de construção colaborativa. A partir daí foi natural a nossa aproximação e todo o processo criativo da curadoria e da curadoria educativa foi compartilhado, aberto à discussão. Esta relação de proximidade proporcionou à equipe uma experiência diferenciada e extremamente enriquecedora, pois tivemos a oportunidade de experimentar a concepção da exposição como um todo, de maneira que não se pensa o educativo separado ou a partir da curadoria, mas como parte dela. Em nossos diversos encontros, nos quais conversávamos sobre o projeto curatorial, a ideia de “uso” trazia o questionamento: como encontrar uma nova forma de usar a sala educativa e como encontrar um novo uso para o ambiente expositivo? A vontade de trabalhar com 182
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o acervo do museu era latente e logo surgiu a proposta: criar um ambiente educativo-expositivo trazendo para a sala educativa obras pertencentes ao acervo do museu. A forma como Júlio Martins propôs a apresentação dessas obras nos pareceu muito oportuna, pois iluminar as obras de Dionísio Del Santo e Elpídio Malaquias a partir de um gesto do visitante só reforçava o caráter como pensamos o espaço educativo: de ser um lugar, para além da fruição, também de construção, que convoca a ação do espectador. Assim, diferente de abrigar uma exposição dos trabalhos do acervo, a sala do educativo foi pensada como um lugar em construção, a ser estruturado processualmente, com intervenções que aconteceram no decorrer da mostra. Montamos um espaço com recursos para receber diversas ações. Encontro de educadores, rodas de conversas, palestras, aulas de desenho de observação, debates, encontros educativos com grupos agendados, foram várias atividades desenvolvidas na sala durante o período da exposição. Esses encontros e vivências geraram registros no espaço: as paredes foram ocupadas com expressões das atividades pedagógicas e artísticas das pessoas que ali passaram e quiseram permanecer um tempo a mais e ler um livro, desenhar, brincar com a luz. A sala constituiu-se como um organismo vivo, sendo utilizada de diversas maneiras, reconfigurada de acordo com as ações planejadas. Serviu de suporte para experimentações tanto para os visitantes como para os educadores, seja na proposição de oficinas ou na criação de relações poéticas com os trabalhos em exposição. Dessa maneira, ao criar um ambiente educativo-expositivo fomos na direção contrária a como esses dois espaços geralmente são pensados. Espaços educativos que 184
funcionam como ateliês geralmente são separados dos ambientes expositivos. Na exposição “Modos de usar:” nós os reunimos, rompemos os limites de cada um tornando-os um lugar único: de fruição e de criação, simultaneamente. No mesmo ambiente em que estavam expostos Dionísio Del Santo, Elpídio Malaquias e Maurício Salgueiro foram colocados à disposição dos visitantes materiais para produzir desenhos, textos, colagens e paredes livres para que eles pudessem ser expostos. Nos momentos em que não tínhamos atividades programadas ou atendimento aos grupos, a sala permanecia como um espaço poético, imbuído de sensações e cores. Porém para que esses vestígios fossem vistos era necessário, primeiramente, um gesto, uma ação, um toque para que a partir da luz da obra de Maurício Salgueiro tudo viesse à tona. A ação do visitante, de trazer luz ao ambiente, funcionava como um convite à participação, de atuar na construção daquele espaço. Aos poucos as paredes foram sendo tomadas por papéis de diversas formas e tamanhos. A união dos trabalhos produzidos pelos visitantes, expostos na mesma parede em que estavam obras de artistas consagrados era uma provocação às questões que ainda permeiam grande parte do público de museus: do artista como um gênio criador, a arte como algo inatingível, ou fruto de um dom que poucos possuem. “Modos de usar:” nos fez repensar o uso dos dispositivos e estratégias até então empregadas pelo Núcleo Educativo. Gerou deslocamentos de olhares, proporcionou novos experimentos, resultou em diversos modos de vivenciar as experiências educativas. Eventos que geralmente aconteceriam no auditório foram deslocados para os ambientes expositivos, como as vivências com os artistas; novas dinâmicas e relações com o espaço e o público foram criadas; houve a realização do “MAES na Fachada” 185
como uma recriação do tradicional “MAES na Tela”; junto à biblioteca, o “MAES em Letras” foi reconfigurado. No lugar de livros em vitrines, os visitantes puderam manipular cadernos com cópias de textos e assim conhecer uma parte do nosso acervo bibliográfico. Os educadores-estagiários estiveram à frente de várias ações de que antes não participavam ativamente, como a criação do programa de atividades, junto à coordenação. Em “Modos de usar:” vivenciamos novos modos de fazer educação no MAES, não só na relação com o público, mas principalmente no processo educativo anterior, interno, entre nós educadores, constituindo-nos como uma verdadeira equipe, vivenciando diariamente processos de aprendizagens.
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André Magnago iniciou-se na produção de gravura em 2006 no curso de Artes Plásticas da UFES, onde foi monitor nas disciplinas de impressão e formou-se Bacharel. Foi artista residente do Ateliê 904 (Vila Velha-ES) e atualmente é pesquisador autônomo e integrante do Grupo Célula de Gravura e da Sociedade Gráfica Leão-Magnago. Entre os prêmios recebidos destaca-se o Prêmio Bolsa Ateliê em Artes Visuais 2011, da Secult-ES. Daniela Zorzal começou a ter interesse pela fotografia desde a infância, quando acompanhava o trabalho do pai. É graduada em Comunicação Social pelo Centro Universitário São Camilo e cursou pós-graduação em Artes Visuais: Cultura e Criação no Senac - RJ. É fundadora do Consciente Coletivo, integrando artistas de diversas linguagens na produção de trabalhos autorais. Gabriel Borem utiliza no núcleo de suas propostas conceitos como: ação, lugar, apropriação, deslocamento, transfiguração e síntese. Participou de mostras coletivas e individuais e foi premiado quatro vezes pelos editais Bolsa Ateliê (2008, 2011 e 2013) e Mostra de Artes Visuais para Itinerância (2014) da Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo. Gabriela Canale é artista-educadora e curadora. Doutora em Literatura Comparada (USP) e professora de Artes Visuais na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). Tem investigado relações interartes, com experiência em arte cibernética, fotoperformance, fotoliteratura, videoinstalação e videodança. É fundadora do Coletivo SIM! de arte-educação no qual desenvolve projetos de arte-educação e cultura.
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Júlio Martins é Mestre em Artes Plásticas pela Escola de Belas Artes - UFMG. Participou em 2009 do Programme Courants du Monde, na Maison des Cultures du Monde (Paris). De 2008 a 2011 foi Curador Geral do Museu Inimá de Paula (Belo Horizonte). Foi Curador Viajante do Rumos Artes Visuais 2011-2013, Instituto Itaú Cultural (São Paulo). Em 2012 realizou a exposição “through the surface of the pages ...” no DRCLAS, Harvard University (Cambridge). Leila Domingues Machado é Pós-Doutora em Psicologia Clínica pela PUC - SP. Professora do Departamento de Psicologia e do Mestrado em Psicologia Institucional da UFES. Coordena o LIS (Laboratório de Imagens da Subjetividade), coletivo que realiza ações de arte urbana/arte política/performances pelas ruas da cidade - #clínicaurbana: Escutatória e BalançaÊ!. Luciano Cardoso é artista plástico, pós-graduado em Arteterapia em Educação e Saúde na UCAM e Bacharel em Artes Plásticas pela UFES. Venceu o Prêmio TARU de Arte Contemporânea em 2007. Ludmila Cayres é artista e educadora. Graduou-se em Artes Plásticas pela UFES. Participa de exposições desde 2003. Apresentou nesses 10 anos trabalhos de diversos materiais e natureza expressiva como desenhos, pinturas, fotografias, performances e instalações site-specific. Se interessa por propostas coletivas de tornar o espaço expositivo como plataforma ativa de discussão. Atualmente é coordenadora e curadora do Núcleo Educativo do MAES. Piatan Lube é mestrando em Artes pela UFES. Discutindo as relações entre cidade e natureza, ser humano e meio 204
ambiente, suas propostas redefinem o espaço institucional e a postura do artista e da obra a paritr de proposições colaborativas. Realizou o “Caminho das águas” em Vitória e Florianópolis pelo Edital Arte e Patrimônio 2009 do MinC IPHAN; “Renascente”, exposição individual no Casarão de Viana, 2012 e “Aquarum”, Funarte, 2013. Rubiane Maia é graduada em Artes Visuais e Mestre em Psicologia Institucional pela UFES. Em 2010-11 coordenou com Marcus Vinícius (in memorian) o projeto TRAMPOLIM - Plataforma de Encontro com a Arte da Performance. Em 2012-13 participou de encontros, festivais e residências no Brasil, Argentina, França, Reino Unido, Espanha, Itália, Portugal e Irlanda. Além da 9th Kaunas Biennial UNITEXT na Lituânia. Em 2014 lançou seu primeiro livro: ‘autorretrato em notas de rodapé’. Em 2015 participou da exposição Terra Comunal - Marina Abramović + MAI, SESC Pompéia, São Paulo. Teófilo Augusto da Silva é Mestre em Cognição e Linguagem pela UENF (2012), Especialista em Artes Visuais pelo Senac (2010) e Bacharel em Comunicação Social pela UFES (2006). Fotógrafo profissional, professor universitário e pesquisador na área de Artes, Comunicação e Filosofia. Thiago Arruda é mestrando em Arte e graduado em Artes Plásticas pela UFES. Membro do Grupo Célula de Gravura e LABGRAV/UFES. Aficionado pelas artes gráficas, direciona sua pesquisa aos diferentes meios da gravura. Em sua produção plástica explora temáticas pessoais e, recorrentemente, autobiográficas. As narrativas se caracterizam por um estilo marcante e por vezes intimista, evocam uma espécie de memória coletiva.
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Governo do Estado do Espírito Santo Governador do Estado Paulo Hartung Vice-Governador do Estado César Colnago Secretário de Estado da Cultura João Gualberto Moreira de Vasconcellos Subsecretário de Estado da Cultura José Roberto Santos Neves Subsecretário de Estado de Gestão Administrativa Ricardo Pandolfi Assessoria de Comunicação Paula Norbim Márcia Almeida Erika Antonia Piskac Museóloga Paula Nunes Costa
Museu de Arte do Espírito Santo Dionísio Del Santo Diretora Anna Saiter Núcleo de Ação Cultural e Educativa Ludmila Costa Cayres
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Iarla Santana Silva José Luiz C. Macedo José Renato Carneiro José Waldyr Gomes Juliana Farias dos Santos Kathielen Moreira Sales Neuza Maria Nascimento Wanessa dos Santos Rodrigues
Núcleo de Pesquisa e Documentação Renato Luiz Duarte de Morais - Bibliotecário Matheus Boni Bittencourt Núcleo Administrativo Rosane Baptista Renato Sodré de Abreu Ivone Carvalho - Supervisora de Espaço Cultural
Exposição “Modos de usar:”
Estagiários Ayla Lourenço Motta Giulian Soares Ola Isabela Lopes Polato Jolyan Mariane de Oliveira Juan Victor Gonçalves Marcos Marques Pereira Nathalia Prattes Vanderson S. C. dos Passos
Curadoria Júlio Martins Artistas Daniela Zorzal Gabriel Borem Ludmila Cayres Piatan Lube Rubiane Maia Thiago Arruda
Apoio Técnico Edson da Silva Ilda Chagas Cardoso
Orientadores Andre Magnago Gabriel Borem Gabriela Canale Leila Domingues Machado Luciano Cardoso Teófilo Agusto da Silva
Equipe de segurança Arquiles Alves Anderson do Nascimento Miranda Diego Araujo Rodrigues Erasmo Vasconcelos Fernanda Rangel Vieira Selma de Oliveira Roberval Ramon Tarcísio Pereira dos Santos
Artistas do Acervo Dionísio Del Santo Elpídio Malaquias Maurício Salgueiro Nice Avanza Raphael Samú
Equipe de Apoio Antonio Luiz Pereira Pinto Bianca da Conceição Gabriel dos Santos 208
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Peixoto, Companhia de Transportes Urbanos da Grande Vitória – Ceturb, Consciente Coletivo, Daniel Eliziario “Montanha”, Débora Klumb, Dª Prosperina, Dori Sant’Anna, Elaine Pinheiro, Família Caucoto Oliva, Famílias Costa e Cayres, Fernando Alvarez Gomez, Filipe Borba, Francielle Bonet Ferraz, Galeria Homero Massena, Galeria de Arte Espaço Universitário – UFES, Giani Piol, Glauco Arruda, Grupo Célula de Gravura, Isabela Martins, Ivo Godoy, Joana Quiroga, Joani Caroline, João Fraga “Joca”, Josi Gallina, Juliana Dadalto, Juliana Nicolini, Julio Tigre, Laboratório de Gravura - LABGRAV-UFES, Lígia Sancio, Luiz Monteiro, Maria Aparecida Gobetti, Maria Barros, Maria das Graças Rangel, Maria de Lurdes Lube Pestana, Maria Regina Reis Ramos (Grupo Oficina de Restauro - MG), Martha Terra dos Reis, Melina Almada, Monica Neves Leão, Neillor da Vitória, Neusa Mendes, Oswaldo Pedroto, Paula Ayala Hoffmann, Reinaldo Freitas Rezende, Renan Andrade Silva, Roberto Mattos, Rodrigo Hipólito, Rodrigo Poltronieri (in memorian), Sandra Santos, Saulo Brasil, Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Viana - SEMCET, Secretaria Municipal de Educação da Serra - SEDU, Secretaria Municipal de Educação de Vila Velha - SEMED, Tetê Rocha, Thays Alves Costa, Vera Lucia Lube Moreira, Verônica Stigger.
Projeto Expográfico Júlio Martins Projeto Gráfico e edição Júlio Martins Editoração Visual Danza Estratégia e Comunicação Fotografia Érika Piskac Ludmila Costa Cayres Mosaico Imagens Programa Educativo Coordenação e Curadoria Educativa Ludmila Costa Cayres Arte Educadores Ayla Lourenço Motta Jolyan Mariane de Oliveira Juan Victor Gonçalves Ludmila Costa Cayres Nathalia Prattes Vanderson S. C. dos Passos MAES em Libras Jefferson Santana (Centro de Educação - UFES) Valquíria Avancini (Tradutora - Libras) Agradecimentos
GOVERNO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
Almerinda Lopes, Ana Luiza Mathias, Ana Santiago, Aparecido José Cirillo, Ateliê Guilhotina, Bianca Rodrigues Barbosa, Carla Borba, Carla Martins, Carlos Augusto Ribeiro Fraga “Phill”, Carolina Martins, Casa Mata, Charles 210
Secretaria da Cultura
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