O CAMINHO DE FERRO em Coruche
Exposição comemorativa do centenário da linha Setil-Vendas Novas 1904-2004
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O CAMINHO DE FERRO em Coruche
2004
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ÍNDICE Abertura
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Os caminhos de Ferro em Portugal - breve visão histórica
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Dionísio Simão Mendes, Presidente da Câmara Luís Batalha
Coruche - de Setil a Vendas Novas
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Luís Batalha
Coruche e as acessibilidades - uma leitura nos anos 50
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A linha do Setil a Vendas Novas. 1904 a 2004
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Linha do Setil a Vendas Novas - Infra-estruturas - Exploração comercial Material circulante
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No cais da memória
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João dos Santos Gonçalves Gilberto Gomes
José Eduardo Neto da Silva
Isabel Maria Andrade Chaparro
Do Rossio à Charneca
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Gonçalo Ribiero Telles
Linha de Vendas Novas - Um olhar sobre o futuro
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O Caminho de Ferro nas actas da Câmara
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Augusto Marques e Maria de Lurdes Silva (entrevista)
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Manuel Margarido Tão
Raquel Fernanda Caçador Marques
Luís Batalha Eugénia Dias
Catálogo Dulce Patarra
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ABERTURA
Quando há cem anos o caminho de ferro chegou a Coruche uma grande janela de esperança se escancarou aos olhos dos Coruchenses. O transporte de pessoas e mercadorias, as ligações de médio e longo curso, a proximidade conseguida numa época em que as estradas eram dif difíceis e perigosas, constituíram elementos determinantes nas expectativas de progresso que o comboio simbolizava. A exposição que ora apresentamos é o repositório da importância que o comboio teve no Concelho ao longo de um século e só foi possível íível a sua montagem pelo contributo de muitas pessoas a quem agradecemos a cedência de peças, objectos, fotos, as informações e os testemunhos. Reconhecemos ainda a colaboração e parceria da Escola Secundária de Coruche manifestas no envolvimento de alunos e professores. Ontem como hoje, as acessibilidades continuam na ordem do dia – reconstituir o passado, compreender esse tempo longínquo, ajuda a encontrar os caminhos do futuro. O futuro de Coruche passa inevitavelmente por novas acessibilidades – o IC 10 e o IC 13 são vitais para a afirmação da região do Vale do Sorraia. Se dúvidas houvesse, a história do comboio aqui documentada ajudaria a aclarar as ideias. Com o passado constrói-se o futuro... O Presidente da Câmara
(Dionísio Simão Mendes, Dr.)
H I ST Ó R I A
Cavalgada de campinos no dia da inauguração (fragmento) Foto Desenho: Illustração Portugueza, 25 de Janeiro de 1904
História
OS CAMINHOS DE FERRO EM PORTUGAL Breve visão histórica Luís Batalha Antropólogo Museu Municipal de Coruche
O século XIX foi um tempo de instabilidade e mudança em Portugal. A eminência de uma invasão francesa obrigou a corte a mudar-se para o Brasil em 1807. O príncipe regente, D. João VI, vai assumir o governo a partir do Brasil, deixando a metrópole sem governo e à mercê do saque e da esfera de influência napoleónica. A ausência do príncipe regente vai simultaneamente dar mais autonomia e maior capacidade de gestão à colónia brasileira, que passa, em 1815, a ostentar o título de Vice-Reino. Nesse mesmo ano, 1807, as tropas napoleónicas, comandadas por Junot, instalam-se em Lisboa e vão exercer a sua influência na gestão administrativa do país. A resistência popular e a acção das forças anglo-portuguesas vão obrigar à retirada dos franceses e repelir outras duas invasões napoleónicas. Contudo, estes episódios deixam o país numa profunda crise económica e social. Em 1821 a corte regressa a Portugal, mas, com a independência do Brasil, em 1822, o país perde uma colónia, as riquezas e o comércio daquele território e, ainda, o herdeiro da coroa, D. Pedro IV, o primeiro Imperador do Brasil. Pelo que a juntar-se a um ferido orgulho nacionalista, que resulta da perda do Brasil, devemos considerar a existência de uma grave crise económica e social, resultante quer do período de invasões francesas, quer da hostil presença britânica. D. Miguel, irmão de D. Pedro, vem personificar o regresso a uma linha política de carácter absolutista que reage contra as novas ideias liberais. Sucede-se uma guerra civil, entre partidários absolutistas liderados por D. Miguel e partidários liberais liderados pelos seguidores de D. Pedro. A vitória liberal acontece em 1834, após o regresso de D. Pedro IV, que entretanto abdicara da coroa do Brasil. Assim, é somente no reinado de D. Maria II, com Costa
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Cabral, que surge um verdadeiro ímpeto no melhoramento dos transportes e das vias de comunicação, tendo sido publicado o primeiro documento ferroviário, as Bases que o Governo de Sua Majestade Fidel Fidelíííssima ssima oferece para a constru construçã ção de caminhos de ferro em Portugal por meio de concessãoo de privil priviléégios égios, em 18 de Outubro de 1845, o qual não teve quaisquer resultados práticos. O processo de construção dos caminhos de ferro foi condicionado pelas dificuldades estruturais e económicas de um paíss perif periférico pleno de convulsões sociais e políticas. Podemos então dizer que, em Portugal, o aparecimento dos caminhos de ferro beneficiou da conjectura política mais favorável, áável, posterior à revolução de Abril/Maio de 1851, levada a cabo pelo Duque de Saldanha e que pôs fim ao governo Cabralista, bem como a um longo período caracterizado por um clima de instabilidade e de agitação social, a que se chamou Regenera o. Regeneraçã A Regeneração proporcionou a emergência de vários partidos políticos, dos quais se destacaram o Histórico e o Regenerador que, tendo uma relativa proximidade ideológica, consubstanciaram um regime de alternância de poder a que se chamou rotativismo. A estabilidade política, que se instalou com a alternância de poder, durante a segunda metade do século XIX, proporcionou um aumento no investimento e a expansão dos caminhos de ferro (até 1886 construíram-se 2153km de via, que contribuíram para o desenvolvimento da indústria siderúrgica e de outras directamente relacionadas com a construção do caminho de ferro). Esta situação permitiu consubstanciar o mercado interno, nomeadamente ao nível íível da agricultura e do comércio. Todavia, criou-se um clima político favorável á à ável criação de grupos de influência, bem como à criação de uma certa inércia política e ideológica que originaram um crescente endividamento e enfraquecimento do Estado. É, também, esta estabilidade política que vai favorecer “oo desenvolvimento da agricultura, que se far farááá,, simultaneamente, pelo aumento da superf superfííície cie cultivada e pelo aperfei aperfeiççoamento das téécnicas té cnicas de cultivo e dos instrumentos de trabalho.”.1 1. In I Neto; Vaquinhas, 1993,, Nova Hist Históóória ria de Portugal.
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História
O aumento da área cultivável, áável, através do arroteamento dos solos, ““particularmente acentuado nos vales dos grandes rios (Douro, Mondego, Tejo, Sado) ou dos seus afluentes (Ponsul, Zêzere, Sorraia)” 2 e do desbravamento de terras, tem como consequência o aumento dos níveis ííveis de produtividade e o surgimento de novas culturas, como a batata ou o arroz, como indica Ana Firmino em relação à exploração da cultura do arroz, constatando a existência do “registo desta produ produção na 3 Herdade do Monte da Barca jjá em 1846”. De facto, o caminho de ferro era uma forma de aproximar mercados e regiões. Consistia num meio de transporte mais rápido, mais barato e mais seguro, estimulando o investimento e a economia. No entanto, em Portugal, a implementação dos caminhos de ferro não foi pacífica. Se, por um lado, alguns viam na construção do caminho de ferro um verdadeiro impulso para a economia do país, por outro, havia quem acusasse aquele meio de transporte de ser mais um luxo do que uma necessidade, receando a invasão dos capitais estrangeiros. Para muitos o investimento deveria ser feito nas estradas e nãoo na via fférrea, para os mais nacionalistas era mais uma “invenção” o” dispensáável vinda do estrangeiro. Mesmo algumas das mais reputadas figuras portuguesas do século XIX, como Almeida Garret, manifestaram as suas renitências perante a chegada deste meio de transporte. A primeira proposta para construção do caminho de ferro vem do estrangeiro por intermédio de Hardy Hishop. A proposta consistia na ligação de Lisboa a Madrid, através de Badajoz, ligando assim a capital do reino à vizinha Espanha. Esta era uma etapa fundamental na ligação de Portugal à Europa, quebrando o isolamento a que estava sujeito e, como tal, prioritária. Contudo, o primeiro troço de caminho de ferro construído em Portugal é, somente, inaugurado a 28 de Outubro de 1856, por D. Pedro V, contando com um total de 36km, entre Lisboa e o Carregado. Esta construção aconteceu já depois da revolução 4, num contexto de maior estabilidade política, com a subida ao poder dos Regeneradores, os quais “tinham jjá uma concep concepção moderna e ainda hoje actualizada sobre o papel dos meios de transporte” transporte”, 5 nomeadamente sob a 2. In Neto; Vaquinhas, 1993, Nova Hist Históóória ria de Portugal . 3. In Firmino, 2003, Catálogo O Homem e o trabalho – a magia da mão. 4. Revolução de 1851, que põe fim à governação de Costa Cabral. 5. In Mendes, 1993, Nova História de Portugal
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governação de Fontes Pereira de Melo, o primeiro ministro das obras públicas, responsável áável pelo grande investimento político e económico na reestruturação dos transportes em Portugal. Uma pesada herança para o século ééculo XX O comboio surgiu, simultaneamente, como consequência natural do progresso tecnológico adjacente à Revolução Industrial, bem como motor impulsionador de desenvolvimento, capaz de gerar alterações determinantes na vida económica e social dos locais em que se instalou. A sua implementação tardia no nosso país deveu-se ao clima de instabilidade política e social, durante um período em que havia uma indefinição sobre as linhas que iriam conduzir Portugal até ao século XX. Com a introdução dos caminhos de ferro surgem e desenvolvem-se aglomerados populacionais e industriais. Surgem alterações à própria noção de distância, com implicações na circulação de pessoas e bens. Com o comboio as viagens tornam-se mais ffáceis e rápidas, permitindo uma maior circulação de mercadorias e influenciando directamente quer o aumento da produção quer o volume das trocas. No entanto, estas vantagens trazidas pela velocidade dos comboios não foram potenciadas, tendo sido descurados os acessos às estações, bem como a construção de eixos rodoviários que complementassem as virtudes deste novo meio de transporte. A precariedade destas vias não permitia, assim, um fluxo de pessoas e mercadorias rápido ou eficaz. Encontrando-se a Europa num período em que questões como a identidade e o espaço territorial eram muito sensíveis, ííveis, depressa o caminho de ferro se tornou num elemento estruturante da própria nacionalidade, que viria a ter um papel preponderante na viragem para o século XX. Com as pessoas circulam as ideias, opiniões, críticas e diferentes maneiras de pensar. Tudo fica mais próximo, países e populações outrora mais distantes, o contacto com as diferenças, uma nova forma de contactar o outro, num novo
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História
processo de globalização, que promove, então como hoje, a circulação de ideias e utopias. Numa Europa em que as especificidades regionais e identitárias estão num processo de afirmação e em que o optimismo exacerbado da era vitoriana trazz na sombra um espectro de atritos e rivalidades, podemos dizer que o caminho de ferro revolucionou o conceito de espaço geográfico e mobilidade e em última análise a forma como as pessoas se relacionam. Mais do que as inovações técnicas, as novas ideias, os novos conhecimentos, os progressos na medicina, na ciência ou na comunicação, o século XIX trouxe aos europeus uma crença na sua superioridade racional face aos demais. Os exploradores, geógrafos e antropólogos davam a conhecer novos povos e novas culturas, cuja base comparativa assentava essencialmente na ideia de primitividade que estava associada ao outro, consubstanciando, por oposição, a ideia da perfeição europeia (considerando os europeus como povos mais evoluídos). Deste modo, o desenvolvimento ocidental era considerado como um estado superior de civilização, por oposição ao estado selvagem que o olhar ocidentalizado distinguia. Ora, todo o século XIX, tendo o comboio como ícone do desenvolvimento, deixou, também, uma pesada herança de rivalidades e nacionalismos exacerbados. O caminho de ferro e o desenvolvimento tecnológico e militar viabilizaram uma corrida ao armamento, sem precedentes, que deixava perceber o fim da ilusão civilizacional europeia e que culminou na primeira guerra mundial, quando a selvajaria tomou o lugar da civilização. O século XIX serviu como período de incubação para o século XX. Os transportes, a comunicação, o armamento, a energia, todas estas indústrias puderam desenvolver-se e implementar-se, criando fortes alicerces que fazem depender toda a sustentação económica da actualidade da sua esfera de influência. O conforto, a facilidade de acesso à informação e a velocidade são hoje factores de que o mundo ocidental não abdica, valorizando aquelas indústrias cuja sustentação está
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precisamente na capacidade de alimentar dependências. Sendo a velocidade, no século XX e no século XXI, ainda, sinónimo de desenvolvimento e progresso, aquele que foi o século dos recordes mostra sinais claros de continuidade. Na actualidade, a viabilidade dos transportes ferroviários tem um futuro assegurado, permitindo, por um lado, uma rápida e eficaz deslocação dentro dos grandes centros urbanos, semi periferias e periferias e, por outro lado, constitui uma verdadeira alternativa aos transportes rodoviários e aéreos, em trajectos inter-regionais e mesmo continentais, aliando à velocidade a variante qualidade, preço e segurança. Nos principais aeroportos europeus o interface de ligação aos centros urbanos é assegurado pela ferrovia, considerando que aqueles se localizam na generalidade longe das cidades.
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História
FONTES E BIBLIOGRAFIA
Periódicos Gazeta dos Caminhos de Ferro, 1988 a 1904. Obras ARAÚJO, Ana Cristina Bartolomeu de – “As invasões francesas e a afirmação das ideias liberais”, Nova História de Portugal Portugal, Direcção de José Mattoso, Círculo de Leitores, vol. V – O Liberalismo, 1993. BENTO, Heraldo – Um olhar sobre Coruche, Edição da Câmara Municipal de Coruche, 2003. FIRMINO, Ana – “A magia do engenho e a arte da paisagem”, Catálogo O homem e o trabalho – a magia da mão, Coordenação geral de Cristina Calais, 2003. MENDES, J. Amado – “Comércio, transportes e comunicações” comunicações”, Nova História de Portugal, Direcção de José Mattoso, Círculo de Leitores, vol. V – O Liberalismo, 1993. NETO, Margarida; VAQUINHAS, Irene – “Agricultura e mundo rural: tradicionalismos e inovações” inovações”, Nova História de Portugal Portugal, Direcção de José Mattoso, Círculo de Leitores, vol. V – O Liberalismo, 1993. RAMALHO, Margarida Magalhães – Comboios com Histórias, Instituto Nacional Ferroviário, 2000. QUEIRÓS, Amílcar Barros de – Os primeiros caminhos de ferro de Portugal Portugal, 1976. Lei de classificação, agrupamento e concessão de linhas férreas e do Fundo Especial de Caminhos de Ferro, Direcção Geral de Caminhos de Ferro, Decreto n.º 13:829 de 17 de Junho de 1927.
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Estação de Coruche no ano do centenário Foto: Museu Municipal
Locomóvel na estação da Quinta Grande (14 de Janeiro de 1904) Foto cedida pela Herdade da Quinta Grande
Estação de Coruche no dia da inauguração Foto: Arquivo da CMC
História
CORUCHE - DE SETIL A VENDAS NOVAS Luís Batalha Antropólogo Museu Municipal de Coruche
Até à Revolução Industrial e mesmo até meados do século XIX, os transportes terrestres eram assegurados por veículos de tracção animal, os quais serviam quer para a exploração agrícola quer para o transporte de pessoas e mercadorias. Deste modo, a deslocação assentava fundamentalmente em estruturas rudimentares, quer ao nível dos meios de transporte (recorrendo à força humana e à tracção animal) quer ao nível das vias de comunicação, resultando, como podemos verificar em inúmeras descrições da época, numa deslocação extremamente lenta e desconfortável. Considerando este cenário, não será estranho constatar a importância dos meios de transporte fluviais e marítimos, não só na circulação comercial mas, também, no transporte de pessoas. Assim, durante o século XIX processa-se uma verdadeira revolução nos transportes. Além da proliferação de vários tipos de carros e diligências, surgem também os primeiros impulsionadores dos caminhos de ferro. Existiu uma verdadeira necessidade de expansão do mercado e, sem dúvida, o modelo ferroviário, em ampla expansão, tinha já demonstrado resultados bem positivos em países como a Inglaterra ou a França, nomeadamente no que concerne ao desenvolvimento da indústria. A velocidade dos caminhos de ferro foi consideravelmente importante para a circulação de pessoas, de correspondência postal e de mercadorias. No entanto, este continuava a ser, no final do século XIX, muito lento e dispendioso, quando se pretendia chegar a determinados pontos do território nacional. Era, também, à data, impossível partir de comboio do Sul para o Norte do país, atravessando o Tejo, visto não existir à passagem do século qualquer ligação ferroviária entre o Ca-
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minho de Ferro do Sul e o Norte do país. Esta dificuldade em atravessar o Tejo causava grandes complicações nas comunicações, quer de passageiros, que tinham de fazer o transbordo de Santa Apolónia até ao Barreio por via fluvial, quer de mercadorias, como podemos ler em 1902, que “com o actual regimen havia maiores embaraços em mandar mercadorias de Sacavém ou Queluz para Setúbal, Faro ou Estremoz, do que em as enviar para a Sibéria.” 1 Esta ligação foi assegurada já no século XX, com o ramal Setil-Vendas Novas. Inaugurado no dia 14 de Janeiro de 1904 pelo rei D. Carlos, constituiu uma real melhoria nas ligações entre o Ribatejo e o Alentejo. Após a sua inauguração foi possível fazer em três horas uma viagem de comboio entre Lisboa e Vendas Novas. A importância estratégica da linha é indiscutível: as grandes propriedades e a intensa actividade e exploração agrícola tornaram imprescindível a sua construção. Esta permitiu o escoamento dos mais variados produtos da região, bem como a circulação de trabalhadores sazonais nas propriedades agrícolas do concelho. Aquando da inauguração da linha de Setil a Vendas Novas, a navegabilidade do Sorraia fazia deste rio a principal via para a circulação de mercadorias a nível local. Existem, também, relatos acerca das fragatas que, até aos anos vinte, subiam até ao Couço, 2 local de onde partiam com “cereais, legumes, aves de capoeira, fruta, carvão, etc. No regresso traziam várias mercadorias, tais como têxteis, calçado, ferramentas, barricas com atum em salmoura (...)” 3 e outras. Já nos anos vinte do século XX, o assoreamento do rio vai fazer do caminho de ferro o meio privilegiado para o escoamento de mercadorias até, mais tarde, na segunda metade do século, ser preterido pelo transporte terrestre.
1. Gazeta dos Caminhos de Ferro. 1 de Junho de 1902. 2. In “A Hora”, 1938, p. 119. 3. In BENTO, Heraldo, 2003, p. 25.
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História
A construção... de Setil a Vendas Novas A ligação ferroviária entre a linha do Norte e Vendas Novas foi concedida por alvará em 22 de Setembro de 1887, sendo posteriormente modificado em 13 de Dezembro de 1888. A urgência numa ligação desta natureza não foi, no entanto, suficiente para anular as dificuldades políticas e económicas que entretanto surgiram ao longo da década de no-
Portaria de 13 de Janeiro autorizando a abertura da via férrea de Vendas Novas à estação de Setil. Fonte: Diário do Governo, quinta-feira, 14 de Janeiro de 1904.
venta do século XIX. E, deste modo, somente em 13 de Janeiro de 1904 sai a portaria que vai autorizar a abertura da linha de Vendas Novas a Setil, cujo custo total foi de seis milhões de francos em ouro. A construção da linha foi então levada a cabo pela companhia real e confiada ao Engenheiro Vasconcellos Porto. Este tenente-coronel de engenharia e chefe de exploração da Companhia Real dos Caminhos de Ferro era um dos mais reputados engenheiros portugueses, tendo dirigido trabalhos na Beira Baixa e no ramal de Cascais. Da dificuldade em transpor o Tejo e os cursos de água
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adjacentes surgem com a construção da linha várias situações que importava superar. Assim, torna-se necessário um elevado volume de terraplanagens (1 200 000 metros cúbicos), bem como um elevado número de trincheiras, nomeadamente na encosta de Coruche. A ligação Setil-Vendas Novas previa inicialmente que a ligação fosse em Santana (Cartaxo) e não no Setil, como é possível constatar nos jornais e revistas da época. Contudo, foi construída uma ligação em bypass, que permitia um desvio estratégico dos
António Vasconcellos Porto. Engenheiro em Chefe responsável pela construção da Linha Setil/Vendas Novas.
Fonte: Revista Occidente. 20
de Janeiro de 1904
comboios de mercadorias provenientes ou com destino ao Norte do país, evitando que a circulação passasse na estação de Setil. Assim, partindo de Vendas Novas, pouco antes de chegar ao Setil, existe uma ponte metálica; é nesta que se divide a linha, uma em direcção ao Setil e outra, que faz também a ligação à linha do norte, em direcção a Santana. Mais tarde, já nos anos Pormenor do bypass. Ligação da linha Setil/Vendas 90, vai acentuar-se a imNovas à linha do norte. portância desta ligação, que Planta de 1947 servia essencialmente aos Fonte: Gestão de Cadastro e Arquivo Técnico. Refer, EP. comboios que asseguravam o transporte de mercadorias para o Norte do país. Este crescente de importância fica a dever-se à passagem do Comboio de Carvão que faz o abastecimento da Central Eléctrica do Pego e que implicou uma redefinição daquele traçado, tendo-se construído uma extensão com um quilómetro de linha (uma concordância), paralela à li-
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História
nha do norte, e que permitia que um comboio com aquelas dimensões não interferisse com o tráfego desta importante ligação entre Lisboa e o Norte de Portugal. A linha Setil-Vendas Novas é utilizada, ainda, para a passagem do Comboio Azul. Este comboio assegura, actualmente, o transporte de automóveis e passageiros durante todo o ano, entre a estação de Campanhã e a estação de Faro (com ligações a Lagos e Vila Real de Santo António). O Comboio Azul parte de Faro, todas as sextas-feiras às 15h30, passando em Coruche, sem paragem, chegando a Santarém às 20h57 e a Campanhã às 00h35; às 22h30 de domingo parte de Campanhã, passando em Coruche, novamente sem paragem, terminando a sua marcha em Faro às 7h10. Outra característica desta linha é o significativo número de pontes mandadas erigir e que perfazem um total de quinze. Destas, a de maior dimensão é uma estrutura com 840 metros de comprimento e 14 tramos de 60 metros assentes em 13 pilares. O peso total da ponte ronda as 1600 toneladas e foram utilizados na sua montagem 155 mil rebites, constituindo uma das maiores pontes ferroviárias metálicas construídas na época, à qual foi dado o nome de Ponte D. Amélia. Sobre o rio Sorraia foi construída uma ponte com 100 metros, em três tramos, uma ponte de 30 metros e, ainda, um viaduto de 30 metros. Sobre o Sorraia Velho foi construída uma ponte com 10 metros e, ainda, sobre os alvercões deste rio, mais um total de quatro pontes, com 30 metros de comprimento. Estas estruturas são constituídas por tabuleiros metálicos apoiados em pilares de alvenaria e cantaria. A construção da linha implicou o recurso a cerca de 5000 trabalhadores, oriundos das localidades que circunscrevem a linha, mas também do Algarve, da Beira Alta, da Beira Baixa e de Albergaria, ficando o serviço médico localizado em Vallada, Muge, Coruche e Vendas Novas. Todo este esforço permitiu que a obra terminasse um ano antes do prazo previsto. A chegada a Coruche Em Portugal, viajar de comboio entre o Norte e o Sul do país, atravessando o rio Tejo, era completamente impossível no início do século XX, visto não existir qualquer ligação ferroviária entre o Caminho de Ferro do Sul e o Norte. Deste modo, a inauguração da linha de Caminho de Ferro de Setil a Vendas Novas, a 14 de Janeiro de 1904, que contou com a presença do rei D. Carlos, representou uma grande mudança no panorama ferroviário, com implicações quer a nível regional quer no contexto nacional. 21
O dia 14 de Janeiro estava um pouco nublado, o termómetro marcava 12 graus em Vendas Novas, facto que em nada prejudicou os festejos. A locomotiva que puxava o comboio real era uma máquina Compound com o n.º 69, e partiu do Rossio às 11 horas da manhã. Já no Setil, esta terá sido substituída e, embora não seja possível indicar com precisão, é provável que se tratasse de uma máquina 110-135, devidamente orda série 110 - 135. Possinamentada para o evento. Locomotiva velmente a máquina que conduziu O buffet teve lugar o comboio real, no dia da inauguração, entre a estação de Setil e num espaço junto à estaVendas Novas. ção de Setil, tendo sido Foto cedida pela AMF servido para quarenta pessoas, dispostas em T, onde ao centro ficou o rei D. Carlos, ladeado pelo Ministro das Obras Públicas, o Conde de Paço Vieira, e pelo vice-presidente do concelho de administração da Companhia Real. O menu constou do seguinte: Buffet Oeufs brouilliesau truffs Filets de sole á la Marechale Filets de boeuf á la Godard Aspic de froie graes au Bellove Dindonneaux au cresson Asperge en branche Sauce Mousseline Vinhos Sautenre Bourgogne Pontet Canet Champagne Moët et Chandon O comboio chegou a Coruche pelas catorze horas e catorze minutos; à sua espera estavam autoridades judiciais, administrativas, o presidente da Câmara e os vereadores, camponeses, camponesas e centenas de campinos a rigor, bem como a 22
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banda Coruchense, que tocou tanto na chegada do comboio como no seu regresso de Vendas Novas. A receptividade dos grandes lavradores e da população em geral à inauguração do caminho de ferro foi entusiástica e, mais uma vez, o comboio surgia como ícone de progresso e desenvolvimento. Toda a vila se encontrava mobilizada para a inauguração, com bandeiras, flores, forquilhas, ceifeiras, charruas e outros objectos ligados à agricultura local, nomeadamente na estação de Coruche, local onde se concentrou a maior parte da multidão. A organização desta recepção é referenciada nos jornais da época como sendo das que mais destaque merecia. A recepção ao rei D. Carlos e ao Eng. Vasconcellos Porto foi muito entusiástica e, de acordo com os relatos, assumiu contornos de aclamação. A Câmara Municipal de Coruche, não estando directamente implicada na organização do evento, foi responsável pela distribuição de um bodo a duzentos pobres, fornecendo também foguetes para a ocasião. Os periódicos deram uma grande cobertura ao acontecimento: “Foi, como dissémos já, o povo d´este concelho [Coruche] que mais se salientou nos festejos com que saudou a passagem do primeiro comboio pelas suas terras. El-rei foi enthusiasticamente acclamado [...]. Calcula se em 5:000 pessoas as que estavam na estação, que se achava ricamente ornamentada e com expres- Estação de Coruche no dia da inauguração. 14 de Janeiro de 1904. sivo gosto, tendo cobrejões Foto cedida pela Herdade da Quinta Grande a engalanal-a e festões de verdura que se desprendiam desde o topo até ao chão.[...] Quando o comboio se poz em marcha, os campinos seguiram á desfilada até junto da ponte do Sorraia, produzindo lindo effeito esse desfile.” “O Século”, sexta-feira, 15 de Janeiro de 1904
“Em quasi todas as paragens havia grandes multidões, musicas e foguetes; mas a recepção foi imponentissima em Coruche Coruche, centro da região mais rica do trajecto, e que mais beneficia com a nova linha. [...] Logo adiante, no apeadeiro da Quinta Grande – a bella propriedade do 23
sr. visconde de Coruche – as ornamentações eram tambem vistosas; entre ellas figuravam diversas machinas agricolas funccionando, movidas por uma locomovel.” “Diário Illustrado”, sábado, 16 de Janeiro de 1904
A abertura ao público da linha ocorreu no dia 15 de Janeiro de 1904, passando a dispor de três comboios ascendentes, de Setil a Vendas Novas (com os números 301, 303 e 305), e três comboios descendentes, de Vendas Novas ao Setil (com os números 302, 304 e 306); os horários e a velocidade da época permitiam que o comboio n.º 303, Rossio-Setil-Vendas Novas, saísse de Lisboa às 7h59 directo ao Setil (8h51), chegando a Vendas Novas às 10h50. A bordo do comboio que inaugurou a ligação regular de passageiros seguia o Eng. Vasconcellos Porto, bem como o Sr. Paul Chapuy da Companhia Real dos Caminhos de Ferro, tendo estes sido, novamente, aclamados por centenas de pessoas. O comboio partiu, precisamente às 7h59m da estação do Rossio, devendo destacarse o ambiente festivo que se Desenho alusivo à estação de Coruche repetiu, nomeadamente em no dia da abertura ao público da linha Coruche e em Vendas NoSetil/Vendas Novas. vas. Nesta viagem inaugural Ilustração: Jornal “O Século” 16 de Janeiro de 1904 seguiram de Coruche mais de 300 pessoas em direcção a Vendas Novas, acompanhadas pela Banda Coruchense, onde, segundo o Diário de Notícias de 16 de Janeiro, “o povo coruchense foi recebido admiravelmente pelo povo de Vendas Novas”. Começava o serviço regular de passageiros e mercadorias entre Setil e Vendas Novas, interrompido ao serviço de passageiros durante a Segunda Guerra Mundial e o qual ainda existe regularmente com duas circulações diárias Santa Apolónia-Setil-Vendas Novas. Apesar de a automotora não representar tecnologia de ponta, o certo é que, hoje, é possível sair de Lisboa às 6h20m e chegar a Coruche antes das 8h00m.
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História
Horário em vigor a partir de 14 de Dezembro de 2003
FONTES E BIBLIOGRAFIA Periódicos O Século, 1903 e 1904. Diário de Notícias, 1903 e 1904. Diário Illustrado, Janeiro de 1904. A Folha do Sul, Dezembro de 1903 e Janeiro de 1904. Gazeta dos Caminhos de Ferro, 1988 a 1904. Illustração Portugueza, 1903 a 1905. Occidente, 1903 e 1904. Diário do Governo, 9 de Abril de 1887. Diário do Governo, 22 de Setembro de 1887. Diário do Governo , 13 de Dezembro de 1888. Diário do Governo, 13 de Janeiro de 1904. A Hora, tomo IV, Dezembro de 1938. Revista de Obras Públicas e Minas, tomo XXXIII, Julho a Setembro, 1902. Obras RAMALHO, Margarida Magalhães – Comboios com Histórias, Instituto Nacional Ferroviário, 2000. QUEIRÓS, Amílcar Barros de – Os primeiros caminhos de ferro de Portugal, 1976. Processo particular do Eng. Pedro Inácio Lopes – MOPT. Lei de classificação, agrupamento e concessão de linhas férreas e do Fundo Especial de Caminhos de Ferro, Direcção Geral de Caminhos de Ferro, Decreto n.º 13:829 de 17 de Junho de 1927.
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Diligência que efectuava o trajecto Coruche/ estação da CP - 1950 Foto: Arquivo da CMC
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História
CORUCHE E AS ACESSIBILIDADES (Uma leitura nos anos 50) João dos Santos Gonçalves Engenheiro Agrónomo Texto escrito em 1956, in “O concelho de Coruche - subsidio para o estudo da sua monografia”, tese de final de curso de engenheiro agrónomo apresentada ao Instituto Superior de Agronomia
O Concelho é atravessado, na direcçãoo aproximada Norte-Sul, pela EN N.º 114, ligando o Cabo Carvoeiro a Évora, que se cruza, uns dois a três quilómetros ao sul de Coruche, com a EN N.º 119 vinda do Montijo e servindo Couço e Mora. Vinda de Salvaterra de Magos chega até à sede do Concelho a EN N.º 114-3. Existe também uma estrada que parte da EN N.º 119, Quinta Grande, e chega até às Figueiras de Lavre. Destas estradas a única que se encontra de acordo com a sua categoria e importância é a que vem de Santarém, acabada de alcatroar há cerca de ano e meio. De Coruche para Montemor encontra-se apenas com alcatrão um troço de uns 3km, chegando próximo do cruzamento do Monte da Barca. O resto é macadame feito de seixos que, pela sua forma arredondada, se destacam com facilidade. E são assim todas as restantes estradas mencionadas, à excepção de uns 7km da que vem de Salvaterra, alcatroados em 1955, encontrando-se os sete que faltam em muito mau estado. Estas são as vias de comunicação rodoviária mais importantes e, acrescentaremos, quase únicas no Concelho. Descrevemos em seguida as comunicações ferroviárias, feitas através do ramal Setil-Vendas Novas. V rias pessoas no-lo têm dito, e já o lemos algures, que Vá o traçado desta linha obedeceu mais a interesses particulares do que ao gerais, sendo por isso que passa ttão afastada dos centros populacionais. É possível íível que assim tenha sido pois, vendo o mapa, nos parece muito mais lógico o caminho que devia ter seguido: o ramal sairia da Azambuja e não do Setil,
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passando a Salvaterra de Magos, na margem esquerda, serviria os populosos Foros de Salvaterra, os Foros da Fajarda e chegaria a Coruche. É este caminho mais curto que o actual e afigura-se-nos mais útil por atravessar terras mais importantes e mais densamente povoadas. Foi, no entanto, um grande melhoramento para a região, sobretudo para o transporte de mercadorias. Para os passageiros torna-se incómodo, pelas esperas nas várias estações do trajecto, motivadas pela carga e descarga de mercadorias. Um enorme benefício para toda a importantíssima área que o ramal atravessa seria a entrada ao serviço de modernas automotoras com ligações adequadas, sobretudo aos comboios da linha do Norte, visto ser menor o movimento para as linhas do Sul e Sueste. A primeira locomotiva de serviço chegou a Coruche há mais de meio século: a 1 de Agosto de 1903. Na vila efectuaram-se grandes manifestações de regozijo pelo facto. A inauguração oficial do ramal só se efectuou no ano seguinte, sendo assim descrita por Alberto Pimentel: “Mas o entusiasmo atingiu o delírio no dia da inauguração oficial da linha, a 14 de Janeiro de 1904, quando o primeiro comboio, conduzindo El-Rei, o Ministro das Obras Públicas e outras pessoas, chegou à estação de Coruche para seguir até Vendas Novas. É indescritível íível o aspecto festivo que ofereciam os arredores da estação. Nos terrenos altos uma compacta massa de camponeses, homens e mulheres, saudava a passagem do comboio, dando vivas, acenando com as carapuças, os chapéus e os lenços. Em baixo, ao nível íível da estação, do lado Norte, estavam postados 100 campinos a cavalo com os seus lindos fatos em pleno carácter Ribatejano. E junto à linha fférrea, quase sobre os rails, enfileiravase uma extensa multidão de povo, que, ao aproximar-se o comboio, prorrompeu uma ovação entusiástica, delirante. Sob a marquise, viam-se as damas de Coruche de pé, saudando. Toilettes alegres, claras e elegantes. Alguns rostos lindamente coloridos, graciosamente juvenis, frescos como flores de Primavera. À frente, na extremidade do cais, para fazerem o seu
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cumprimento a El-Rei, as autoridades da Comarca e do Concelho. Depois dos vivas oficiais, um outro viva (que não estava talvez autorizado pelo protocolo) rompeu, fremente, de várias carruagens do comboio: Vivam as damas de Coruche! Doces sorrisos de agradecimento recompensaram este viva espontâneo, uníssono. Enquanto o comboio avançava em linha, os campinos acompanharam-no galopando e agitando as carapuças verdes. Espectáculo soberbo, o dessa bela raça de homens fortes! Um deles caiu mas rapidamente montou, com a agilidade de um acrobata, seguindo os outros. Esse veloz e pitoresco esquadrão, à paragem do comboio, continuou galopando com a velocidade de uma flecha disparada no ar. Grandes aplausos saudaram esta inesperada e oportuna exibição dos campinos, que daí a pouco, quando o comboio regressou de Vendas Novas, tornaram a aparecer galopando ao lado dele até que, estacando de repente, formaram em linha e fizeram continência despedindo-se. Todos os convidados se mostraram satisfeitos de ver o garboso e ágil esquadrão dos campinos. Não eram soldados disciplinados; mas eram corações leais e sinceros, embora rudes. Eram representantes de uma pitoresca região do País, homens valentes, homens fortes, sempre prontos a encarar o perigo com estoica serenidade e coragem coragem”. Por nós nada mais temos a acrescentar ao que Alberto Pimentel escreveu mas queremos destacar a simpatia e a justiça com que falou dos campinos, dos velhos campinos doutros tempos. Os de agora ainda usam o barrete verde e vestem a jaqueta encarnada, calçam meias brancas arrendadas e sapatos de vitela ensebada, onde reluzem esporas. Também ainda montam incomparavelmente a cavalo e são dextros no manejo do pampilho, conduzindo as manadas ou separando o gado para as corridas. Mas os tempos são outros e eles evoluíram com o andar dos anos. E embora o sintamos profundamente, tanto como o mais castiço filho destas terras, cremos que a sua missão está prestes a terminar. O progresso se encarregará de acabar com os restos da tradição e oxalá esta não fique reduzida a uns fantoches sem verdade, que se vão buscar à pressa em dia de cortejo histórico.
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Ocorre-nos agora citar um caso pitoresco que se passou quando D. Carlos veio inaugurar a linha. Entre os camponeses estava uma mulher que, ao indicarem-lhe quem era El-Rei, exclamou com a maior admiração: “Mas é um home como mê Manel!” . No seu espírito rude e ignorante o Rei não tinha as formas dos outros mortais. Devia ser diferente; daí a sua desilusão. Ainda hoje é vulgar ouvir esta frase a propósito de qualquer pessoa ou facto que não correspondam ao que nos haviam dito ou ao que nós havíamos imaginado. De Coruche para Vendas Novas, enquanto atravessa terras do Concelho, segue o ramal pela charneca fracamente habitada e sem povoação alguma que mereça referência. Como acontece com a estrada nacional que segue para o Sul, a via fférrea atravessa os campos de Coruche em aterro, seguindo este em linha recta até à estação da Quinta Grande e tendo, neste curto percurso de cerca de 3km, cinco viadutos em ferro. Ao contrário deste, o aterro da estrada é sinuoso, por se supor este traçado mais resistente à força corrosiva das águas das cheias. No entanto, ou porque o estudo não foi perfeito ou porque as correntes mudaram de direcção, tem sido ele muito mais atacado que o do caminho de ferro. E estas são, actualmente, as principais vias de comunicação do Concelho. Em tempos não muito distantes ainda a via fluvial desempenhava importante papel na economia da região. O Sorraia, que tanta riqueza dá a estes campos, era navegável áável até ao Couço, 25km a montante de Coruche. Gentes antigas ainda se lembram das fragatas aí irem buscar cortiça e levar sal. Acima do Couço alguns quilómetros deixava de ser navegável áável por causa dos afloramentos rochosos. Gil Vicente, em a “Nau d’Amores”, já se referia aos barcos de Coruche: “Caravela de Coruche Vai por nabos a Pombeiro” Mais recentemente, há uns 50 anos, ainda vinham a Coruche fragatas que efectuavam o tráfico entre a vila e Lisboa. Existem ainda hoje, junto ao rio, várias designações toponímicas evocando esses tempos. Tais são o “Largo do Porto
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João Felício”, o “Largo do Porto João Ferreira” e a “Travessa do Porto Zambado”. Esta navegação cessou com o progressivo assoreamento do rio, que a impediu por completo. Será interessante referir que a própria vila se encontrava, em tempos, num plano de cota mais baixa que o actual havendo notícia de se terem encontrado restos de edif edifícios a notáveis ááveis profundidades. Actualmente o Sorraia, com um leito larguíssimo e aumentado pelos extensos alvercões que as cheias vão cavando através do campo, é um longo e desolador areal no Verão, havendo meses, como aconteceu este ano, em que nem o mais ténue fio de água corre nas areias escaldantes. Soltas as águas dos arrozais, por Agosto, muda o seu aspecto de um dia para o outro. E, se acaso vêm uns dias de chuva, quase fica a rasar os cômoros das margens, ninguém reconhecendo, na marcha impetuosa das suas águas, a débil corrente de há uma semana. Será,, cremos, um grande benef benefício para estes campos a regularização do seu curso, já contribuindo em muito para este fim o plano que está actualmente em execução. Duas barragens, com a capacidade total de 370 milhões de metros cúbicos, estão a ser construídas, uma na ribeira de Sor, or, cerca or de Montargil e daqui tirando o nome, e a outra na ribeira de Raia, a barragem do Maranhão; segue-se depois a construção da rede destinada a irrigar os vales das ribeiras de Seda, Raia e Sor or e do rio Sorraia, tendo um desenvolvimento de 170km. As obras do Maranhão foram visitadas, há alguns meses, pelo Presidente da República, sinal bem evidente do interesse que o Governo põe na execução deste plano, o mais grandioso que se tem feito entre nós neste género e que irá beneficiar uma área de 15 248 hectares. A via fluvial, apesar do grande desenvolvimento da camionagem, ainda hoje colabora no transporte de muitas mercadorias de Lisboa para Coruche. V Vêm, trazidas pelas elegantes fragatas de enormes velas latinas, até ao cais fluvial de Benavente, que há pouco recebeu grandes melhoramentos. Aí são descarregadas e distribuídas aos destinatários por camionetas, pertencentes aos donos dos barcos. As carreiras são regulares, semanais, sendo a partida de Lisboa ao sábado. Na segunda-feira à tarde ou na terça de manhã estão as mercadorias em Coruche, tratadas com cuidado e pagando muito pouco pelo
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transporte. Para finalizar este capítulo resta-nos falar das estradas camarárias e caminhos. Sob este aspecto é confrangedor o que se observa. Além das estradas nacionais, que já referimos, não existe mais nenhuma com o piso em macadame. Mesmo as municipais são simples caminhos endurecidos pelo trilhar de animais e carros ao longo dos anos. Localidades importantes no concelho, como as antigas vilas da Erra e da Lamarosa, estão pouco menos que isolados, perdidas do mundo. Bem servidas encontram-se apenas o Couço, Fajarda, Biscainho, Branca e Santana. Por aqui se poderá concluir o transtorno que a economia e o bem-estar das populações sofre com esta falta. Devemos acrescentar, prestando justiça a quem de direito, que alguns melhoramentos se irão efectuar, entre os quais avulta a construção de uma estrada para a Lamarosa e de outra passando pelos Foros do Biscainho.
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Linha Setil - Vendas Novas Foto: Museu Municipal
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A LINHA DO SETIL A VENDAS NOVAS. 1904-2004 Gilberto Gomes CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP
Notas para uma concessão Está por fazer a história da linha do Setil a Vendas Novas, ou seja, a história da ligação das linhas do Sul e Sueste com a rede do Norte e Leste da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses. As linhas a sul do Tejo foram linhas do Estado até 1927, enquanto as segundas pertenciam à principal empresa privada, de capitais maioritariamente franceses, em que o Estado liberal, paulatinamente, foi assumindo uma posição incontornável. á ável. Datam de 1877 os debates no seio da prestigiada Associação dos Engenheiros Civis sobre a rede ferroviária portuguesa e a necessidade de ligação das redes a norte e a sul do Tejo, avançando-se com as soluções de Vendas Novas a Santarém e o prolongamento de Estremoz a ElMapa da rede ferroviária em 1910. vas. Na mesma época, sublinha-se a A sul do Tejo e a norte do Douro asimportância de uma linha que, pas- sinalam-se os caminhos de ferro do sando por Coruche, corresse ao longo Estado, Sul e Sueste e Minho e Douro, respectivamente do Vale do Sorraia até Ponte de Sor, onde entroncaria na linha do Leste. Foto: Arquivo Fotográf ico da CP - Caminhos de Ferro Portu Portugueses, EP Em 22 de Setembro de 1877, a linha de Santarém a Vendas Novas foi concedida, como caminho de ferro do sistema americano sobre o leito da estrada, a Eduardo da Costa Correia Leite. A linha deveria passar por Coruche e Canha, ficando o con-
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cessionário com a obrigação de proceder à sua transformação para leito próprio e em via larga quando o rendimento bruto da mesma atingisse 2500$000 réis. A 13 de Dezembro de 1888 foram alteradas as condições iniciais da concessão, passando a linha a ser construída em leito próprio e em bitola de 1,67 metros - na designada via larga. Em 1888, num período de expansão da economia portuguesa, funda-se a Companhia dos Caminhos de Ferro Meridionais, empresa de inspiração da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses, a viver à época um ciclo de grande expansão. Entre 1884 e 1891 a Companhia Real foi dominada por um grupo financeiro liderado pelo Marquês da Foz, minoritário no capital accionista da sociedade, que, devido a um artif artifício jurídico, obteve na Assembleia Geral de 9 de Setembro de 1884 os destinos da companhia. Nesta, a “assembleia selvagem de Santa Apol Apolónia” nia”, como lhe chamou o Jornal do Comércio é ércio de Henri Burnay, trocam-se posições no poder da Companhia Real. A entrada na Companhia do grupo Foz significou a perturbação dos negócios ferroviários do banqueiro Burnay e do grupo francês que ele representava. A saída em 1891 do grupo Foz, com a falência da Companhia Real, traz de volta à Comissão Administrativa da Companhia Henri Burnay. Por outro lado, interessa ter presente que a linha projectada como necessária na ligação das duas redes, desde os debates da Associação dos Engenheiros, se apontara como fundamental na defesa dos interesses do próprio Estado, possuidor da rede a Sul do Tejo, logo a nova linha deveria ficar na posse dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste. O aparecimento da Companhia dos Caminhos de Ferro Meridionais, cujo presidente era o conde de Moser, membro proeminente do grupo Foz, com assento no Conselho de Administração da Companhia Real, assim como o próprio empreiteiro geral da construção, o prestigiado engenheiro Pedro Inácio Lopes, ex-Director Geral da Companhia Real, situa-nos no quadro de expansão da principal empresa ferroviária portuguesa e, numa lógica de concentração do tecido empresarial ferroviário, num processo idêntico em toda a Europa. A crise de 1891 significou a paragem dos trabalhos de construção da linha de Vendas Novas ao Setil. A Companhia
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ficou na situação de “suspensão de pagamentos” decretada pelo Tribunal do Comércio de Lisboa, com a substituição do seu Conselho de Administração e com a empresa a ficar amarrada ao Convénio de 1894 com os Obrigacionistas franceses. Em 1900 estabeleceu-se um contrato entre a Companhia Real e a Companhia dos Meridionais para arrendamento, construção e exploração da linha de Setil a Vendas Novas. Contudo, só em 1902 as duas companhias ferroviárias conseguiram um acordo com as casas bancárias Comptoir d’Escompte e Bernard & Jarislowski de Paris, de modo a financiarem a conclusão dos trabalhos. A Companhia Real tomou a empreitada da obra, ficando à frente dos trabalhos o Eng. Vasconcellos Porto, chefe do Serviço de Construção da Companhia Real, coadjuvado pelo Eng. francês Audouard da Casa Fives-Lille, responsável áável pela ponte Rainha D. Amélia, Eng. Eugénio Reynaud, empreiteiro das fundações, e o Eng. Adjunto Oliveira Bello. A linha inscreve-se na linha do Leste ao quilómetro 56,629 e, na do Sul, ao quilómetro 56,997, apresentando uma extensão de 69 249 metros. Os trabalhos de construção incluíram algumas modificações ao projecto primitivo, melhorando as condições de traçado e de tracção, com alteração de rampas de 18% para 12% e o raio de curvas de 300 para 400 metros. A construção contou com inúmeras obras de arte, das quais se destacam as três pontes das valas de Azambuja, de Muge e a do Tejo, assim como as do Sorraia. De salientar, ainda, o aterro entre a estação do Setil e o rio Tejo, adequado para vales inunA ponte sobre o Tejo no Setil dáveis ááveis e preparado Foto: Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP para dar vazão aos caudais das cheias.
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Nas diversas frentes de construção chegaram a trabalhar 5000 operários. Das estações existentes, a de Setil (estação de entroncamento) apresentava-se como a mais importante. As restantes estações eram: Muge (ao km 7), Marinhais (ao km 12), Agolada (ao km 27), Coruche (ao km 31), Quinta Grande (ao km 34), S. Torcato (ao km 46), Lavre (ao km 51), Canha (ao Km 58) e Vidigal (ao Km 65). A inauguração A inauguração realizou-se a 14 de Janeiro de 1904. O comboio real, composto por uma locomotiva Compound, ostentando na frente as bandeiras nacionais ladeando a coroa e o escudo portugueses, rebocava 10 carruagens de 1.ª classe, 4 salões, sendo um o real, um fourgon e uma carruagem de 2.ª classe. A composição saiu da estação do Rossio às 11 horas e chegou ao Setil às 12.01h. À entrada das agulhas uma força militar de Infantaria 16 fez a continência, “enquanto a banda do corpo e a Filarmónica Academia Instrutiva do Pessoal dos Caminhos de Ferro tocaram o hino nacional”. Após uma hora para refeição, o comboio avançou para a nova linha, parando à entrada da ponte sobre o Tejo, onde D. Carlos descerrou a bandeira com a inscrição “Ponte Rainha D. Amélia”. Após retomar a viagem inaugural, o comboio entrou na estação de Coruche, onde, segundo as palavras de Leonildo Mendonça e Costa, da Gazeta dos Caminhos de Ferro: “ direita, estacionava “À na linha do cais um comboio, simulando um trem de mercadorias pronto a partir, carregando com todos os Estação da rede do Sul e Sueste produtos da agricultura lonos finais do séc. XIX cal: os cereais, o gado bravo e Foto: Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro ííno, no, a corti cortiçça, a palha, e os Portugueses, EP suíno,
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trabalhadores do campo. À esquerda enfileirava-se uma brilhante guarda de honra, formada por mais de cem campinos vestindo os seus característicos íísticos fatos e cavalgando bem ajaezados animais. O efeito foi surpreendente e mereceu os aplausos entusiásticos áásticos de todos. A esta estação estava ornamentada com cobrej cobrejões, guizeiras, chocalhos, pás, áás, enxadas e outros aprestos agrícolas. í ” De acordo com a reportagem do jornal O Século é ,o éculo espectáculo era digno de registo: com a chegada do comboio a Coruche, os campinos a saudarem o Rei com as suas varas postas em continência, ou, quando o comboio retomou a viagem, a acompanharem a composição à desfilada até à ponte do Sorraia. O Sul e a ligação a Lisboa A ligação da rede do Sul e Sueste com a linha do Leste constituía um debate antigo a nível íível do sector ferroviário. Não estava somente em causa a ligação ao Norte e Centro do País, mas igualmente a Espanha e à Europa. E, como escrevia Oliveira Martins, para o Portugal de meados de oitocentos “na pausa do Império” ério” ério” rio”,, apanhar a Europa constituía um imperativo. De início, os Caminhos de Ferro do Sul e Sueste apresentaram diversas pretens pretensões de entroncar a linha saída de Évora, passando por Estremoz, prolongando-a até Elvas. Posteriormente, perante a resistência da Companhia Real, que se sentia atacada na sua concessão, elegeu-se o Crato para estação de entroncamento, com a Companhia Real a sugerir preferencialmente a estação de Ponte de Sor. Viviam-se, então, os anos de expectativa no tráfego espanhol que se esperava acorrer a Lisboa, segundo o discurso oficial da época, a Lisboa que seria a Porta da Europa. Nos finais do século XIX, já sem as pretensões do tráfego espanhol, estabilizou-se o traçado de ligação de Santarém a Vendas Novas, acabando por se escolher Santa Ana /Setil. O projecto consistia numa ligação ferroviária atravessando os concelhos de Cartaxo, Benavente, Coruche, Montemor e Aldeia Galega (Montijo), admitindo-se que o rendi-
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mento expectante seria idêntico ao da linha do Sul. Esperavase que concelhos limítrofes, como Almeirim e Avis, rebatessem o seu tráfego para as ligações do Baixo Alentejo e do Algarve. Porém, cedo se compreendeu que a importância da linha proposta ultrapassava, maioritariamente, o interesse de desenvolvimento local e regional, uma vez que estava em causa a viabilidade de uma ligação que poderia articular duas redes ferroviárias. Faltam trabalhos de investigação para o século XX, que permitam quantificar as mercadorias que transitavam de rede, através da estação de transmissão de Vendas Novas. Contudo, o interesse da linha Setil-Vendas Novas perfilava-se no imediato, principalmente na captação de tráfegos de e para Lisboa. O crescimento da rede do Sul e Sueste, centrado no território a Sul do Tejo, levava ao Barreiro todo o tráfego que demandava Lisboa. A estação do Barreiro, a 11 quilómetros de Lisboa e sujeita a nevoeiros nos meses de Inverno, apresentava-se demasiado longe da capital, o que levou a rede do Estado a projectar o Ramal de Cacilhas, com uma estação para Passageiros e Grande Velocidade na zona da Margueira. A estação de passageiros em Lisboa, instalada provisoriamente desde 1860 nas antigas instalações da estação da Companhia dos Barcos a Vapor Tejo e Sado, frente ao torreão poente da Praça do Comércio até 1932, constituiu o exemplo flagrante do arrastar de uma solução com o Porto de Lisboa. Os sucessivos planos de instalação da estação na 1.ª Secção do Porto de Lisboa fixaram a imagem de um antigo barracão sobre estacas e sem condições para o desempenho das funções que se lhe pedia. Quanto às Mercadorias (Pequena Velocidade), a ligação fazia-se do Barreiro, em Composição a vapor a chegar ao fragatas e alvarengas puxadas Barreiro por rebocadores, quer para as Foto: Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP instalações junto à Doca de Santo Amaro quer directamente para a ponte-cais de Santa
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Apolónia. A suspensão do Ramal de Cacilhas, que acabou por ficar no Seixal, cristalizou a situação do Barreiro como estação terminal da rede do Sul na sua ligação a Lisboa. A linha de Vendas Novas ao Setil apresentava-se, pois, num quadro de articulação de redes, como alternativa a uma ligaçãoo dif difícil, morosa e de custos acrescidos. Assim, num quadro de expectativas de tráfego, as ligações estruturantes apresentavam-se como: – Ligação Pinhal Novo (Ramal de Setúbal) a Santa Ana - Pelo Barreiro 77 km - Pela linha de Vendas Novas 114 km - Diferença + 37 km – Ligação Casa Branca a Santa Ana - Pelo Barreiro 152 km - Pela nova linha 106 km - Diferença - 46 km – Ligação de Beja a Santa Ana - Pelo Barreiro - Pela nova linha
215 km 170 km - Diferença - 45 km
A ligação Barreiro-Lisboa levava aproximadamente uma hora, com o tempo de embarque associado, e com o agravamento do preço de transporte de passageiros e bagagens entre a Praça do Comércio e Santa Apolónia. Assim, esperava-se que os tráfegos gerados em Setúbal (peixe fresco para exportação, principalmente para Espanha) procurassem a nova linha para evitar a deslocação ao Barreiro. Mesmo para passageiros, o transbordo em Vendas Novas e Santa Ana, esperava-se apresentar com vantagens sobre a ligação pelo Barreiro. A ausência de mercadorias da rede do Sul sobre a linha do Leste e Norte, antes da linha do Setil a Vendas Novas, reflectia os custos agravados da travessia do Tejo no Barreiro. Com a excepção do peixe, já observado, e das lãs, cujo tráfego chegou às 1000 toneladas/ano, usufruindo de uma
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tarifa combinada entre as duas companhias, a maior parte das mercadorias não passava de uma rede para a outra. Coruche nos finais do século ééculo XIX Nos finais do século XIX Coruche era vincadamente um importante centro agrícola, cuja produção passava por: cortiça, trigo, arroz, milho, favas, centeio, legumes, vinha, pinhal e gado. A indústria era quase inexistente, com pequenos estabelecimentos na produção de rolhas, uma moagem a vapor e algumas azenhas de moagem de milho e descasque de arroz. A vila inseria-se na grande bacia hidrográfica do Tejo, por onde as comunicações com a capital se executavam através do porto de Salvaterra de Magos. Mesmo após o estabelecimento da linha do Leste, o rio continuou a ser percorrido por barcos com mercadorias até aos anos 30 do século XX, ou seja, até à revolução da estrada e da camionagem. Os carros utilizados para o transporte de mercadorias eram puxados a bois ou a muares e, em média, nos finais do século XIX, transportar 15kg para a estação de Santarém custava 55 réis, para Salvaterra de Magos 45 réis e para a estação de Vendas Novas 70 réis. Um passageiro levado à estação custava 1000$000 réis. As únicas estradas macadamizadas eram as que se apresentavam para Salvaterra de Magos e para Santarém, todas as restantes eram caminhos vicinais. A inauguração da linha Setil a Vendas Novas constituiu um marco importante contra o isolamento, potenciando novas oportunidades e permitindo Comboio de carvão no itinerário deslocações mais rápidas e dos granéis baratas. Daí que, e de acordo com Foto: Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP as notícias do jornal O Século é , os éculo sócios do Clube Coruchense e
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da Sociedade Musical nomearam o Eng. Vasconcellos Porto sócio honorário. E, como motivo de regozijo pela inauguração da linha fférrea, uma comissão de moradores, acompanhada de uma banda de música, percorreram as ruas da vila em manifestações de entusiasmo. Conclusão Cem anos após a inauguraçãoo da linha fférrea do Setil a Vendas Novas é certamente importante alinhar alguns elementos que permitam uma leitura de caracterização e uma identificação das linhas de força que o Caminho de Ferro viabilizou: - Antes de mais é de destacar que após 50 anos de caminhos de ferro em Portugal, o país possuía o know how suficiente para projectar, desenhar e executar a construção de um projecto ferroviário. A Companhia Real, ao criar o seu próprio Serviço de Construção, desde os finais dos anos 80, respondia às necessidades do sector. Ficaram de fora, na construção da linha Setil-Vendas Novas, o trabalho especializado das fundações das pontes e da aquisição dos equipamentos; - As soluções empresariais encontradas para a concessão da linha passaram por um quadro de relações de poder entre grupos económicos que, com o advento da crise de 1891 e a substituição do grupo dirigente da Companhia Real, provocou o adiamento das soluções financeiras. A construção de 70km de linha fférrea com algumas obras de arte de grande envergadura exigia um financiamento que a depauperada Companhia Real não estava em condições de suportar; - O estabelecimento da ligação das redes a norte e a sul do Tejo não alterou, de início, a matriz de fluxos regionais nas ligações do Sul, quando o destino/origem se apresentava como Lisboa. Esta foi uma realidade inquestionável áável em relação a passageiros. Os passageiros continuam a passar pelo Barreiro na ligação a Lisboa. Quanto a mercadorias (Pequena Velocidade), a estação
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de trânsito Vendas Novas T (Trânsito) observa um crescimento acentuado de expedições com destino a Lisboa, sem, contudo, o Barreiro perder posição. Quer isto dizer que, apesar do estado incipiente dos trabalhos de investigação, quanto ao tráfego entre redes para o século XX, é possível íível delinear que o tráfego ferroviário do Barreiro perdurou até: 1) Anos 60 - A lógica de redes distintas parece ter prevalecido sobre algumas das premissas colocadas de início, mesmo após o arrendamento dos Caminhos de Ferro do Estado em 1927. A inauguração da ponte Salazar (hoje 25 de Abril), com a deslocação de algum tráfego para a estrada e a especialização do tráfego de mercadorias no caminho de ferro, permitirão constituir pistas de investigação a percorrer com interesse; 2) Anos 90 - Com o encerramento e desmobilização das grandes unidades industriais da Cuf no Barreiro (principalmente com a paragem das ffábricas de ácido cido sulf sulfúrico a partir das pirites, bem como com a produção de adubos, cuja cadeia de distribuição assentava nas estações ferroviárias); - Sempre se apresentaram frágeis os fluxos de mercadorias intra-regionais N/S, obrigando à passagem pelo Setil. Algumas, sendo volumosas, como os adubos, são as chamadas mercadorias pobres, ainda por cima sazonais, e correndo muitas vezes em material próprio das adubeiras, recorrendo à companhia somente para a tracção. A Cuf instalada no Barreiro é não só o primeiro porto fluvial do Tejo mas uma excepção quanto ao tráfego gerado para toda a rede. - A modernização, nos nossos dias, do eixo ferroviário Setil-Vendas Novas veio-lhe consagrar a sua vocação de tráfego de mercadorias (Pequena Velocidade), como se explicita com itineráário itinerá rio dos granéis é , (carvão para as cimenteiras e para a Central do Pego a partir de Sines); - O adiamento da construção de linhas aprovadas como necessárias no Plano Geral da Rede Ferroviária do Continente
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de 1927 originou um conjunto de ineficiências, cujas soluções se voltam hoje a colocar. O adiar da ponte ferroviária de Lisboa ao Montijo, lançada a concurso nos anos 30, e já apontada como necessária em 1876 por Miguel Pais, de modo a entroncar com o Ramal do Montijo (Pinhal Novo-Montijo), que se deveria prolongar a Alcochete, ligando-se posteriormente à linha do Sorraia, onde passaria por Santo Estêvão, Quinta Grande, Couço, Montargil e Ponte de Sor, permitiria: A linha do Sorraia
1) Em relação Foto: Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP à Península de Setúbal, fecharia uma malha ferroviária, partindo--se do princípio que a ponte do Tejo em Lisboa contemplaria, de início, a solução ferroviária; 2) Por seu lado, a linha do Sorraia possibilitaria encurtar 40km na ligação Lisboa à fronteira, em terrenos de f cil construção, que permitiriam o aumento da velocidade; fá - A caracterização da linha do Setil-Vendas Novas como linha de mercadorias é igualmente o reflexo de um país cuja população se deslocou para a faixa litoral. Mesmo hoje, nos actuais sistemas de informação em desenvolvimento na DGTT, como o SIGITI, a oferta para passageiros no eixo ferroviário Setil-Vendas Novas não existe.
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Estratégia
Cem anos após a chegada do Caminho de Ferro a Coruche, a CP Caminhos de Ferro Portugueses, EP, herdeira das antigas companhias ferroviárias, revê-se na partilha de sua memória com a colectividade. E hoje, tal como em 1904, a aposta no Caminho de Ferro é uma aposta no Futuro.
FONTES E BIBLIOGRAFIA Publicações periódicas ó ódicas O Anuário Comercial de Portugal, anos 1899, 1900, 1910 e 1920. A Gazeta dos Caminhos de Ferro, 1904 (diversos números). O Ocidente, 1904 (diversos números). O Século, 1904 (diversos números). Obras ALEGRIA, M. Fernanda – A organiza organização dos transportes em Portugal (18501910 , Memória do Centro de Estudos Geográficos, Lisboa, 1990. 1910) Plano Geral da Rede Ferroviária áária do Continente, 2 vols., Lisboa, 1929. Relatóório Relató rio da Comissão para Estudar o Plano da Rede Ferroviária áária ao Sul do Tejo, Lisboa, 1899. Companhia dos Caminhos de Ferro Meridionais, escrituras de 25/11/1899, de 3/05/1902 e 27/06/1928.
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Automotora1 Nohab Foto cedida: AMF
Estação de Coruche Foto cedida: AMF
Loc. 1509 - série 1501 a 1512 Foto cedida: AMF
Loc. série 201 a 224 Foto cedida: AMF
Estratégia
LINHA DE SETIL A VENDAS NOVAS Infra-estruturas - Exploração comercial - Material circulante
José Eduardo Neto da Silva Presidente da Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário
A inauguração desta linha nos primeiros anos do século XX foi, sem dúvida, uma data memorável. áável. Pela primeira vez o Norte e o Sul do país quebravam o isolamento imposto pelas barreiras naturais e ficavam ligados por comboio, o meio de transporte mais importante da época. Ficavam também em contacto com o isolado Sul as restantes redes de caminho de ferro nacionais. Estavam, assim, completos os 69,4km, que se iniciavam na estação de Setil, na linha do Norte e Leste ao Km 56,4, e que terminavam na estação de Vendas Novas ao Km 56,8 da linha do Sul (hoje linha do Alentejo). Para melhor servir as localidades atravessadas por esta linha foram construídas, inicialmente, sete estações: Muge (ao Km 6,6), Marinhais (Km 11,9), Coruche (Km 31,6), Quinta Grande (Km 34,1), Lavre (Km 50,9), Canha (Km 57,6) e Vidigal (Km 65). Esta última estaçãoo teve vida ef efémera pois servia quase exclusivamente a família real e, pouco tempo após a implantação da República, foi desactivada. Contava ainda esta linha com 3 apeadeiros: Morgado (ao Km 3,3), Agolada (Km 27,2) e S. Torcato (Km 45,8). Posteriormente, os apeadeiros de Agolada e S. Torcato foram transformados em estações. Entre os anos de 1935 e 1940 surgiu o apeadeiro de Salgueirinha a meio caminho entre as estações de Quinta Grande e S. Torcato. O traçado desta linha pode considerar-se excelente. Não existem túneis mas sim algumas obras de arte de envergadura, na forma de pontões e pontes, algumas metálicas, onde o expoente máximo ááximo está na ponte de D. Amélia (ao Km 4,795)
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com 840 metros de comprimento e 14 tramos e assente sobre 13 pilares, uma das maiores da Península Ibérica. Actualmente o caminho de ferro já não a utiliza pois foi desactivada nos anos 80 e construída ao lado outra de betão. Toda a extensão da linha é de via única, sendo os cruzamentos efectuados nas estações espalhadas ao longo do percurso. As comunicações entre as estações eram feitas, no início, telefonicamente, competindo aos agentes das respectivas estações pedirem, por este meio, avanço para os respectivos comboios; o chamado cantonamento telef telefónico é ainda hoje prática corrente em algumas das nossas linhas. Quase nos finais dos anos 60, esta linha foi dotada do sistema CTC (Controlo de Tráfego Centralizado), o primeiro existente no nosso país. Um único agente instalado na estação de Setil, onde havia sido instalado um painel com o diagrama de todas as estações, controlava a marcha de todos os comboios que circulavam entre aquela estação e Vendas Novas, abrindo e fechando sinais mas, ao contrário do que se podia prever, as agulhas eram comandadas pelo próprio comboio à medida que se movimentava. O agente avisava também as guardas de passagem de nível íível quando os comboios se iam aproximando das mesmas. Foi também criado, para melhor fluidez do tráfego, um novo ponto de cruzamento entre Marinhais e Coruche e o apeadeiro de Salgueirinha foi dotado de uma linha desviada para resguardo e cruzamento de comboios. Nos finais dos anos 80 foi construída uma concordância, a partir da estação de Vidigal, com destino a Bombel, ao Km 51,6 da linha do Sul. Este troço evitava a ida das composições a Vendas Novas, para inversão de marcha, permitindo assim uma entrada directa a comboios de e para Setúbal, Barreiro e Sines. Para atender ao crescente tráfego de mercadorias, a linha foi também totalmente remodelada, com substituição de carris e rectificação de alguns traçados, eliminadas algumas passagens de nível íível e as restantes automatizadas. A partir de 1996 é introduzido progressivamente um novo sistema de sinalização de última geração para eliminar de vez o anterior, já obsoleto, e avançava em bom ritmo a electrificação da linha até Bombel, que começou a funcionar em pleno em 1998.
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Paradoxalmente, o troço entre Vidigal e Vendas Novas não foi electrificado, resultando actualmente numa exploração mista com material eléctrico e diesel. A construção desta linha obedeceu a dois princípios bem definidos. O primeiro era fazer escoar os produtos de toda uma vasta região agrícola, como é o vale do Sorraia, e disso são exemplos as expedições a partir da estação de Coruche e em regime de pequena velocidade, em 1923, sendo os números eloquentes: Trigo - 644 545kg Milho - 199 022kg Arroz - 662 010kg Palha e Forragens - 928 397kg Farinha - 1 618 204kg Cortiça - 1 333 710kg Carvão vegetal - 114 227kg O segundo factor, e não menos importante, era a ligação entre as linhas do Estado Sul e Sueste com as linhas da Companhia Real e, logicamente, a toda a rede ferroviária nacional e, ainda, a Espanha. Havia a premente necessidade da zona sul fazer chegar a todo o país, o mais rapidamente possível íível e a preços mais vantajosos, os produtos produzidos na recém-criada indústria do Barreiro, bem como os cereais e cortiça do Alentejo e os géneros frescos oriundos do Algarve. Evitava-se, assim, o atravessamento do rio Tejo que encarecia os produtos. Em sentido contrário transportavam-se os artigos manufacturados do Centro e Norte do país para as províncias do Alentejo e Algarve. Com o passar dos anos, o transporte rodoviário foi-se implantando pouco a pouco e as estações da linha do Setil a Vendas Novas foram perdendo o movimento de outrora e encerrando uma após outra. No entanto, o tráfego de mercadorias em trânsito foi resistindo. O transporte de adubos provenientes da empresa CUF do Barreiro e destinados ao Norte do país foi durante as décadas de 50 e 60 o tipo de tráfego mais significativo, além dos cereais. A instalação de indústrias na península de Setúbal e mesmo na zona de Sines, bem como a potencialização dos seus portos, são hoje a razão da existência deste percurso. Os
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cimentos vindos da ffábrica do Outão, em Setúbal, o carvão do porto de Sines para a Central T Térmica do Pego de Abrantes, o transporte de automóveis e seus componentes, sucata, madeira, químicos e contentores foram e são, muitos deles, os produtos que circulam nesta linha e que propiciaram a sua recente modernização. Quanto ao tráfego de passageiros, se é hoje quase irrisório, nos primeiros tempos, pelo contrário, foi bastante significativo. Numa época em que a única alternativa ao comboio (para a maioria dos cidadãos) era o carro de tracção animal ou, nesta zona, o rio, a linha de Setil a Vendas Novas conheceu os seus dias de glória. Por exemplo, e voltando ao ano de 1923, venderam-se na estação de Coruche 179 bilhetes de 1.ª classe, 1089 de 2.ª e 1135 de 3.ª. No entanto, e ainda nesse ano, a estação de Muge foi a que registou maior movimento: 441 passageiros em 1.ª classe, 1176 em 2.ª e 2238 em 3.ª. A estação mais fraca foi a de Lavre, no que se refere a passageiros de 1.ª e 2.ª classes, com 8 e 68 passageiros respectivamente, enquanto que em 3.ª classe a estação de Agolada movimentou somente 261 bilhetes. Esta linha, ao longo da sua existência, teve sempre diversos inconvenientes que lhe limitaram uma grande afluência de passageiros. Praticamente todas as estações estão longe das localidades que servem e as ligações no Setil foram sempre deficientes, com longos períodos de espera às circulações de Lisboa ou Norte do país, o mesmo acontecendo em Vendas Novas para quem demandava o Sul. Os comboios, bastante morosos, eram quase sempre mistos (mercadorias e passageiros) e perdiam bastante tempo nas estações, em cargas e descargas e mesmo manobras para deixar e tomar vagões. Por outro lado, as carruagens, provenientes de outras linhas e já com muitos anos de serviço,, eram antigas e bastante desconfortáveis á . O advento de boas estradas e de modernos autocarros foi o que bastou para que os passageiros, lentamente, fossem abandonando o comboio. Nos anos 60 houve uma tentativa de recuperar algum tráfego com a introdução de veículos automotores, mais confortáveis ááveis e rápidos, mas era tarde de mais. À excepção de uns poucos que não tinham alternativa e de outros que sempre se mantiveram fiéis ao caminho de ferro, os passageiros haviam voltado as costas ao comboio. Cada vez
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menos circulações e cada vez mais horários desajustados têm contribuído para que as viagens na linha de Vendas Novas passem em breve à história. Actualmente, nem mesmo as circulações em trânsito (caso do chamado Comboio Azul que liga o Norte ao Sul do país) terão a sua passagem assegurada por esta linha. A travessia ferroviária da ponte 25 de Abril e as obras de beneficiação do percurso para o Algarve ditarão o futuro deste comboio de passageiros que semanalmente ainda atravessa as terras do Sorraia. As características de tráfego na linha de Setil a Vendas Novas condicionaram o tipo de material de tracção (locomotivas) nos comboios que circularam neste percurso. Como foi já referenciado, o grande movimento da linha era baseado no transporte de mercadorias, sendo os passageiros transportados em carruagens que eram incorporadas aos designados comboios mistos, deslocando-se estes morosamente devido às cargas que transportavam. As locomotivas a vapor que melhor se adaptavam a estes serviços eram providas de rodas motoras de pequeno diâmetro, metro, desenvolvendo, assim, as velocidades impostas pelas cargas a transportar e pela fragilidade de alguns vagões. É quase certo que foram largamente utilizadas nesta linha as locomotivas da série 110 a 135, pertencentes ao depósito do Entroncamento, as quais, uma vez chegadas à estação de Setil e após os procedimentos técnicos, cumpriam seguidamente a sua escala de serviço que terminava em Vendas Novas. Estas máquinas foram construídas entre os anos de 1863 e 1881 para a Companhia Real. Segundo imagens da época, a locomotiva inaugural da linha de Setil a Vendas Novas e que rebocou o comboio real poderá ter sido uma unidade desta série. No entanto, poderiam ter sido igualmente locomotivas das séries 17 a 22, de 1862, ou 32 a 37, de 1865, semelhantes no aspecto mas vocacionadas para comboios de passageiros, como era o caso. Com o incremento do tráfego e de cargas mais pesadas a transportar foi necessário recorrer a locomotivas mais potentes, como foram as da série CP 201 a CP 214 (CP 601 a CP 614 a partir de 1931), com quatro rodados conjugados e construídas em 1890, também pertencentes ao depósito do Entroncamento.
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Como em 1927 a CP absorve a Companhia dos Caminhos de Ferro do Estado, rede do Sul e Sueste, passam a circular nesta linha as locomotivas daquela rede e pertencentes ao depósito do Barreiro. Estão neste grupo as máquinas da série CPss 1701 a 1719 (CP 701 a 719 a partir de 1952) e as CPss 01201 a 01210 (CP 0181 a CP 0190 desde 1952). Seriam igualmente populares nesta linha as locomotivas construídas entre 1913 e 1920, das séries CP 051 a CP 058 (CP 0151 a CP 0158 a partir de 1931) e CP 0101 a CP 0124 (CP 0201 a 0224 desde 1931), sendo estas últimas as mais potentes do parque a vapor nacional. A entrada ao serviço, em 1948, de locomotivas diesel, proporcionou uma mudança de estratégia no tráfego e a linha do Setil a Vendas Novas teve também a sua parte neste novo ciclo. A utilização das locomotivas americanas ALCO das série 1501 a 1512 ou 1521 a 1525, primeiramente com um comboio recoveiro procedente do Algarve e posteriormente noutros serviços, foi marcante para este percurso. À medida que a electrificação das linhas ia sendo uma constante (caso da linha do Norte), libertavam-se muitas outras locomotivas diesel e a série 1301 a 1312, de 1952, também marcou presença na linha de Setil a Vendas Novas. O incremento de tracção diesel ditou, nesta linha, o fim das locomotivas a vapor, o que se verificou em 1968. Entretanto, em 1965 foram colocadas no percurso de Setil a Vendas Novas as anteriormente citadas automotoras Nohab, que se encarregaram dos serviços de passageiros, embora coexistindo com os comboios mistos. Este tipo de veículos assegura ainda hoje o já reduzido número de circulações de passageiros. Nos finais dos anos 70, algumas circulações ef meras com automotoras de marca Allan marcaram também efé presença nesta linha. Com a consequente modernização do parque de locomotivas diesel, novas unidades apareciam nesta linha. Foram presença constante máquinas da série 1401 a 1467 construídas em 1967, 1551 a 1570 de 1973 (que se notabilizaram nos comboios de cimento entre Setúbal e Braga), 1801 a 1810 de 1968 (na tracção do comboio sazonal entre Porto e Algarve e volta) e ultimamente as séries 1901 a 1913 e 1931 a 1947, ao serviço desde 1981, popularizadas na tracção do Comboio Azul
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entre o Porto e o Algarve (1931/1947) e do comboio de carvão entre Sines e a Central T Térmica do Pego (1901/1913). A electrificação desta linha entre Setil e, como já foi dito, Bombel, ocasionou a drástica redução da tracção diesel na quase totalidade do trajecto, seguindo o exemplo da eliminação do vapor nos anos 60. As locomotivas térmicas vão dando lugar às suas concorrentes eléctricas das séries 2501 a 2515, 2551 a 2570 e às modernas 5601 a 5630.
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M E M Ó R I A
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Telefone de via Colecção: José Amado Foto: Museu Municipal F
Memória
NO CAIS DA MEMÓRIA Isabel Maria Andrade Chaparro Professora de Filosofia Escola Secundária de Coruche
No cais longínquo da memória avistamos figuras da infância que fomos nós... Percursos breves de vida, construídos íídos nas margens da linha da saudade, momentos indizíveis, ííveis, contornados pelas janelas do tempo, vivências com destino marcado pela razãoo do espa espaço... Atenção senhores passageiros, o comboio da linha de Vendas Novas vai partir dentro de momentos, ouvia-se na estação da mudança. Tínhamos desembarcado no Setil e, tudo o resto, que simplesmente era o Entroncamento, tinha ficado para trás! O destino desta viagem era Coruche, terra que persistiu pela memória do comboio que já passou... Aquela viagem preenchia o meu imaginário de três anos, garantida pelas brincadeiras que se podiam ter na grande gare do Setil. Sim! Se não atravessássemos as linhas do Norte, e se a automotora se atrasasse, mais tempo tinha para observar os peixinhos do pequeno jardim que se estendia no prolongamento da estação. Às vezes, as perguntas sobre as horas a que chegava a automotora sobejavam para me distrair. O facto do Chefe de Estação dizer à minha mãe que conhecia bem o seu pai, o Chefe de Distrito de Coruche, o Sr. Andrade, era um bom prenúncio para mais umas correrias por entre os recortes dos canteiros de flores. A espera da passagem para a outra linha era tão inesgotável, áável, em termos de curiosidade, que o instante tornara-se numa paisagem interior, reinventada pela recordação. A nova configuração do outro lado suspendia o olhar por entre as casitas cheias de roupa, pequenas hortas cercadas por velhas travessas e uma terra cor de cinza. Por entre os vagões, silenciados pelo vazio da carga, espreitavam-se os salgueiros tombados pelas águas de um qualquer rio...
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Lembro-me de uma ponte! Alta e com muitos ferros, daquelas que o tempo não pinta para além da erosão dos anos. Lembro-me do fim da tal ponte! Corriam-se as janelas e tudo o resto era eternamente permitido. Sobre os assentos da carruagem erguia-me para além do friso de metade da janela, o vento passava por entre as mãos e os cabelos entrelaçavam-se nos verdes contrastes da terra. Lembro-me de fechar a mão ao vento, desafiar a velocidade do andamento do comboio, em que o braço não podia voltar a percorrer o que o corpo já não via. Jogos de memória com palavras que ecoam de saudade... As estações não contavam na viagem do Ramal, contava, isso sim, o apito que se ouvia em cada paragem. A partida deste comboio simbolizava, antes de mais, uma festa antecipada pela presença, sempre feliz, do meu avô na estação de Coruche. Lá estava o avô! Olhar dum azul feito de lágrimas, sorriso aberto e franco, figura castiça do ferroviário dos tempos da ganga azulada. Abeirava-se da plataforma da estação, desconfiado do horário à tabela do comboio, e ia falando, num gesto de contratempo, com o Chefe de Coruche, o Sr. Vicente. Era mais do que sabido que o avô tinha avisado da nossa chegada, os cumprimentos repetiam-se por entre os que partilhavam as tarefas do destino desta estação. Agora, perdera-me no tempo... Aquela vontade de ver o Chefe dar partida ao comboio transformava o meu horizonte, prolongava a saudade de alcançar a casa caiada que mais além se avistava. Quanto mais tempo a automotora permanecesse na linha, num frenesim de encomendas que subiam e desciam pelas mãos dos carregadores, menos conseguia ver as cancelas, fechadas ao sinal da senhora da passagem. A ordem inversa deste olhar, impedido de ver o essencial, era trocada pela visita de reconhecimento àquele poço grande, suspenso no ar e cheio de água. O jardim, percorrido num instante, continuava! Ainda bem... A sua permanência fora, vezes sem conta, recordada nas idas com o avô à estação para fazer os relatórios do dia ou, somente, para ver o movimento dos comboios de mercadorias. Lá vai ele! O barulho dos rodados, misturado com o estalar das travessas, percorria a gare principal da estação, deixando nos homens um rosto habituado às manobras do ferro. O brilho desvelado pela partida do comboio estendia-se pelos
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Memória
carris, a luz voltava a preencher os espaços entre os pilares, desenhavam-se , no cais do adeus, os relevos dos velhos painéis de azulejos. O cais da descarga ficava do lado do rio, como todas as coisas que me recordo de ter vivido. A casa da guarda, ou... simplesmente a casa da minha avó, estava ali. As flores ladeavam um pequeno quadrado de muros baixinhos e, logo à frente, na cozinha do lume rasteiro, uma estanheira com pratos de esmalte, panelas de barro e um pequeno cortiço. Ao lado, construído com madeira da via, estava o escritório do avô. Na secretária ainda se vêem as folhas diárias com a inscrição da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, canetas de aparo, lanternas de mão e toda uma panóplia de utensílios própria do Chefe de Distrito. Naquela que era a casa da guarda recordo, na penumbra do silêncio em que se encontra, o estremecer do chão pelos rodados dos comboios, o bater à porta nas noites frias em que lhe pediam para abrir as cancelas, o barulho dos carros trilhando as travessas gastas pelo movimento dos que por lá passaram e uma voz de gratidão que permaneceu pela vida fora... Abrir as cancelas aos que circulavam entre os afazeres da terra e as moagens do arroz foi o seu destino. Avisto-a na sombra que resta da cabine de telefone, vejo a sua farda cinzenta de barras vermelhas, no bolso, matizado a vermelho, uma figura de um carril ladeado pelas iniciais da companhia que servira durante mais de quarenta anos. Braço ligeiro erguido ao alto, cores que se viam nas bandeiras da linha, petardos Troca de testemunho que se ouviam em tempos de Foto: Isabel Chaparro aflição, cancelas que se sentiam fechar pelo rasto poeirento marcado no chão. Sempre a vi assim, decidida em não deixar que o lugar cedesse ao esquecimento de um qualquer sinal vindo
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quer da Quinta Grande quer da estação que dali se avistava. A ti Raquel, nome pelo qual era conhecida por entre aqueles que fizeram parte da história desta estação, parava o tempo da passagem e o regresso da viagem. Nestes percursos, breves de vida, percepciono sensações que se cruzam pela presença, já quase esquecida, do comboio na paisagem da lezíria. Nas velhinhas travessas, que ainda conservam o cheiro característico do creosote, desafiava-se o tempo do surgir do comboio, contado pelos saltos que se podiam dar entre os simétricos espaços salpicados de pedras. O vento, embalado pelos canaviais, levava o som do comboio pela incerteza do destino e, ao anoitecer, a duração do eco da sua passagem expressava as crenças do povo na chuva que aí vinha. Momentos dizíveis ííveis abertos pelas janelas da história que hoje se comemora, vivências construídas pelas manobras dos sinais do tempo, trajectos acessíveis ííveis aos que enfrentaram as contrariedades da via, caminhos cruzados pelas amizades que dali partiram para sempre... As palavras, que hoje se escrevem, evocam a memória daqueles para quem a estação fez parte da sua história de vida... Aos meus avós [Chefe de Distrito: Sr. Andrade Guarda de Passagem de Nível: í ível: Sr.ª Raquel Rodrigues Sapage] Sr. Vicente Chefe de Estação); Sr. Roxo (Chefe de Lance); Sr Batoque (Factor); Sr. Santos (Factor); Sr. Mendanha (Factor); Sr. Domingos (Factor); Sr. Zé Tadeia (Carregador); Sr. Amaro (Chefe de Brigada de telecomunicações e sinalização); Sr. Zé Alves (Brigada de telecomunicações)... Manuel Cardinho e Mercedes F. do Carmo;
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Memória
Manuel Botas e Alice Botas; António Espanhol; Menina Teresa; Espanhol ti Chica da taberna, Aida, Conceição e Maria Castela; Custódia Figueiredo e marido; Sr. Fernando da Central, ao Paulinho, meu companheiro de brincadeira... e a todos aqueles cuja memória me trai... A minha mais sincera homenagem...
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Particular: Bárbara Santos Foto: Museu Municipal
No horizonte perdido de linha avistamos sinais perdidos no tempo... velhas lanternas que guiavam a marcha dos comboios
A automotora perder-se-ia na curva do adeus, sem antes me ter deixado uma passagem de experiências intransponíveis de esquecer...
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Estação da Quinta Grande - pormenor dos azulejos (2004) Foto: Museu Municipal
Estação de Coruche - pormenor (2004) Foto: Museu Municipal F
Estação da Agolada (2004) Foto: Museu Municipal
DO ROSSIO À CHARNECA Gonçalo Ribeiro Telles Arquitecto Texto publicado originalmente no Guia Expresso das Mais Belas Viagens de Comboio (21 de Setembro de 2002)
A viagem de comboio que melhor retenho na memória e que mais marcou a minha vida profissional era a que periodicamente realizava pelo Natal entre Lisboa e Coruche. Um menino que brincava na Urbana Avenida da Liberdade e aprendia a ler e a contar numa escola de bairro lisboeta sentia-se deslumbrado sempre que descobria um mundo totalmente diferente: o campo e o casarão que, apesar de situado na vila, respirava ruralidade, as folhas de milho da Lezíria, a perder de vista, e o misterioso montado, por vezes ainda charneca, onde se sentia, como fantasmas, o caminhar secreto das quadrilhas de malfeitores e os restos humanos deixados pela guerra civil e pela Patuleia. Montado que, na minha meninice, apenas já era só atravessado pelas varas de porcos charnequenhos e pelas vacas bravas cujos bezerros, mais tarde, após ferrados, toureados e amansados, se tornariam em prestáveis ááveis trabalhadores com nome próprio e acariciados pelo abegão. Atravessava o comboio a então província da Estremadura, lembrança da divisão que separava cristãos de mouros, que longe de ser uma linha era a faixa de território onde se aliavam as paisagens colinares, a norte do Tejo, a Lezíria, a borda-de-água, constituída pelo rio e respectivos aluviões, que foram gradualmente enchendo o afundamento terciário aberto pela força das águas vindas desde a meseta ibérica, alimentadas pelos vários afluentes, e que há muito já são serenas e tranquilas, mesmo na altura das maiores cheias. A meio da tarde entrava, com pais, irmão e criada, na fumegante estação do Rossio para iniciar uma viagem que ia durar entre quatro a cinco horas, com um transbordo demorado na estação do Setil. A primeira sensação era a da escuridão do túnel e do clarão de luz que nos alegrava na estação de Campolide. A partir de então, sucediam-se as estações es perif periféricas de
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Lisboa: Braço de Prata, Cabo Ruivo, Olivais e Sacavém, onde acabava a cidade. Neste trajecto, um casario humilde mas bem proporcionado e localizado alternava com hortas, quintas e olivais, do lado direito surgia o Tejo, com toda a sua força, grandeza e deslumbramento, ainda, então, as fragatas o percorriam. As margens de grande extensão eram ocupadas por uma agricultura intensiva, hortas que surgiam entre um desenho de pequenas valas que se continuavam pelas marachas que dividiam as salinas. Era um mosaico de território que começava a desaparecer devido aos aterros que iriam permitir a implantação nesses aluviões de unidades fabris, consequência da industrialização progressiva, iniciada para os lados de Alcântara, prolongada para o Barreiro e que, por incúria do planeamento, ia subvertendo as paisagens que atravessamos, destruindo os recursos naturais que, mais tarde, serão necessários para o desenvolvimento regional e abastecimento das populações. A lezíria do Tejo e as suas extensas margens aluvionares planas, ubérrimas rrimas e fférteis, dominam as vistas, do lado direito do comboio, até ao Setil, enquanto do lado esquerdo surge um alcantilado de barrocas erosionadas, em grande parte devido à abertura da linha de caminho de ferro e da estrada que a acompanha também desse lado. Ainda hoje o processo erosivo continua a fazer estragos. Nessa estrada, em Alhandra, recordo-me de ter assistido, do comboio, à corrida desenfreada de um touro que perseguia pessoas, que iam fugindo para dentro das casas situadas ao longo da estrada. Na estação de Vila Franca de Xira deslumbravam-me os painéis de azulejos alusivos aos campos do Ribatejo. No Setil, esperava-nos o comboio para Vendas Novas. Tinha de se fazer um transbordo por vezes moroso, o que dava tempo para me impressionar com as ravinas que a erosão tinha esculpido. Era noite quando, depois do comboio atravessar a ponte Rainha D. Amélia sobre o Tejo, penetrávamos áávamos nas profundezas da charneca e dos montados do Ribatejo. O perpassar dos troncos e braços das árvores que se vislumbrava das janelas do comboio parecia uma dança de noctívagos íívagos fantasmas.
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Memória
O apitar compassado do comboio marcava a sua marcha que, por isso, parecia veloz. Para lá daquele primeiro plano de árvores próximas era o mistério dum espaço sem limite que sempre me impressionou, ao percorrer os montados de sobro. Só de quando em quando, surgia a luz de uma casa isolada, único sinal humano na escuridão. De repente, abria-se a porta da carruagem, não havia corredor, e por ela entrava o revisor, que picava os bilhetes e cumprimentava afavelmente os presentes. Passávamos áávamos pelos Marinhais e Muge e, já perto de Coruche, surgia o eucaliptal, fechado e tétrico, da Herdade da Agolada, que ainda mais ocultava a noite. Finalmente, chegávamos á ávamos à estação de Coruche, onde nos esperava o Tio Chico, no velho Chandler que nos levava até casa. Todas as manhãs ouvia o comboio da manhã a atravessar as pontes do Sorraia e a apitar vitoriosamente tal feito, e lá seguia até Vendas Novas. O som mais elevado anunciava chuva. O pouca-terra, pouca-terra e o apito estridente já não se ouvem à passagem do comboio nas pontes, mas nunca mais os esqueci e ainda hoje os oiço na minha memória, marcando compassadamente o passar do tempo, fazendo reviver saudosas recordações.
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Passagem de um comboio de mercadorias na estação de Coruche (2004) Foto: Museu Municipal
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Futuro
LINHA DE VENDAS NOVAS: Um olhar sobre o futuro
Manuel Margarido Tão Doutorado em Economia de Transportes pela University of Leeds (UK)
A Linha de Vendas Novas ocupa, pela sua posição, um lugar charneira na articulação da rede ferroviária de Portugal. Tal como na época da sua inauguração, é através da Linha de Vendas Novas que se faz a uniãoo ffísica das linhas ao Sul do Tejo com as do restante país. De 1904 a 1949, essa condição de uniãoo vital vital, permaneceria inigualada, complementada, a partir de então, com a conclusão do troço Cabeço de Vide a Portalegre-estação, permitindo o encaminhamento de tráfegos ferroviários Norte-Sul alternativamente pelo interior Alentejano. Com o Ramal de Portalegre-estação a ver-se afectado pela suspensão maciça de serviços ferroviários, no início da década de noventa, só muito raramente vê hoje a passagem de circulações, geralmente sempre em situações de recurso, quando a união estratégica, de Setil a Vendas Novas, se encontra temporariamente obstruída. De novo elevada, na prática, à condição de única ligação ferroviária Norte-Sul, a Linha de Vendas Novas contará, no curto prazo, com a concorrência da nova ferrovia Lisboa-Pinhal Novo, a inaugurar na sua totalidade em meados de 2004, e ainda, quatro anos mais tarde, da união Évora-Elvas, providenciando um itinerário de acesso entre o Centro de Portugal, o Alentejo e Algarve, com saída directa para a Extremadura espanhola. A condição específica da nova linha Lisboa-Pinhal Novo, com um atravessamento do estuário do Tejo através da Ponte 25 de Abril, parece garantir que a mesma será empregue quase exclusivamente para tráfegos de passageiros, incidindo particularmente nas relações suburbanas da margem Sul e ainda nos serviços rápidos Inter-Cidades, que gradualmente se forem estabelecendo, entre a capital e outros centros urbanos, do Alentejo e do Algarve. Quanto à nova união, de Évora para
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Elvas, integrada no projecto Terminal XXI XXI, permitirá, decerto, uma articulação funcional, em perfeitas condições técnicas, do Centro e Sul de Portugal por via fférrea, à custa, porém, de um longo desvio pela Linha do Leste, penalizante em distância ffísica para todo o movimento de cargas, exceptuando-se, naturalmente, algum fluxo a estabelecer entre a Extremadura espanhola e o Noroeste da Península, incluindo a Galiza, encontrando no território português a sua rota preferencial. A Linha de Vendas Novas terá sempre, no tráfego de mercadorias Norte-Sul, o garante da sua perenidade, assegurado por uma infra-estrutura de qualidade, na qual se conta a quase integral electrificação em 25 kV 50 Hz e um dos mais modernos sistemas de Comando de Tráfego Centralizado em funcionamento na Europa. A pequena porção de linha por electrificar, compreendida entre Vidigal (bifurcação da Concord ncia de Bombel cordâ Bombel) e a estação de Vendas Novas, será convertida à nova forma de tracção, o mais tardar até 2008, quando a abertura do novo trajecto entre Évora e Elvas implicar a extensão das catenárias para Sul, a partir de Bombel. Porém, algumas interrogações se colocam quanto à viabilidade da exploração do serviço de passageiros ao longo do trajecto da Linha de Vendas Novas, mercê do carácter despovoado da maior parte do território atravessado pela mesma, com uma consequente fraca capacidade de geração de tráfego à escala local. As maiores e mais notáveis ááveis excepções à limitada procura potencial de passageiros encontram-se todas compreendidas entre Setil e Coruche, com destaque particular para as estações de Marinhais e Coruche, bem localizadas relativamente às povoações respectivas. O esquelé esquelético ético padrão de oferta actual, assegurado com recurso a material já obsoleto (automotoras Suecas Diesel NoHAB, de 1948), consistindo em dois serviços regulares diários em cada sentido, sem seguimento ou continuidade assegurados entre Setil e Lisboa, não se afigura realisticamente atractivo, para considerar-se alternativa fiáável e aceitável áável a outras opções de deslocação, tanto a nível íível regional como meramente local. A perspectiva de retirada de serviço eminente das últimas unidades NoHAB, ensombra a continuidade da oferta ferroviária de passageiros actualmente praticada na Linha de Vendas Novas. E a lacuna – por ora subsistente – de continuidade eléctrica entre Vidigal e Vendas Novas não
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perspectiva o emprego de unidades eléctricas na totalidade da linha, pelo menos a muito curto prazo. Uma possível íível e desejáável recuperação da componente passageiros na Linha de Vendas Novas, sem envolver qualquer montante de investimento significativo, para além da adaptação de plataformas em algumas estações e apeadeiros da linha, consistiria no prolongamento de um número limitado de serviços suburbanos Santa Apolónia-Azambuja a Coruche, tendo-se em consideração o potencial não negligenciável áável deixado pela deficiente cobertura de transportes públicos rodoviários entre Lisboa e este centro regional ribatejano da margem esquerda do Tejo. Na prática, um serviço suburbano limitado Santa Apolónia-Coruche faria uso de unidades quádruplas eléctricas que actualmente permanecem imobilizadas na estação da Azambuja, a certas horas do dia, valendo-se o serviço de algum canal-horário nal-horá ário disponível íível na linha. Três a cinco serviços diários para cada sentido, implementados numa primeira fase, de modo experimental, consistindo em prolongamentos da marcha de suburbanos, não importariam se não em custos de pessoal reduzidos, considerando-se marginais todos os restantes, diluindo-se mesmo estes nos do restante tráfego utilizador do trajecto da Linha de Vendas Novas, compreendido entre Setil e Coruche. Um padrão de serviços de passageiros definitivo, operado entre Lisboa e Coruche, deveria então seguir-se à fase experimental, empregando-se já material mais adequado, mas de carácter polivalente (como as Unidades Triplas Eléctricas remodeladas, já em uso entre a capital e Tomar), permitindo funcionar na prestação de expresso suburbano, com paragens muito limitadas entre Santa Apolónia e Setil, de molde a garantir a cobertura da totalidade do trajecto (89km) num tempo não superior a 1h15m. A criação desta nova acessibilidade colocaria Coruche num posicionamento peri-urbano, relativamente a Lisboa, permitindo deslocações es ffáceis casa-trabalho, facto que exigiria, por parte do planeamento municipal, a atenção e o cuidado necessários, na definição prévia e atempada de intensidades de ocupação de solo urbanizável, áável, privilegiando-se particularmente a baixa densidade e a tipologia habitacional unifamiliar, como garantia basilar de preservação da qualidade de vida à escala local.
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A restante Linha de Vendas Novas a Sul de Coruche, afigura-se efectivamente pouco geradora de tráfego de passageiros. O preenchimento a médio prazo da electrificação entre Vidigal e Vendas Novas, permitirá o emprego, sem limitações, de material de tracção eléctrica em todo o percurso, embora o transporte de passageiros apenas se possa considerar de alguma importância em eventuais serviços de longo-curso transitando entre o Norte e o Sul, sem passagem por Lisboa. Nestas condições encontrar-se-á, de facto, o chamado Comboio Azul Azul, de ligação directa entre o Porto e o Algarve, cuja frequência poderia vir a tornar-se diária, sendo acompanhada por outra circulação de reforço em dias específicos, no Horá Horáário rio de Ver Verãão. Finalmente, e a médio-longo prazo, há que antever cenários futuros, resultantes do impacto das diversas possíveis í íveis medidas, centradas sobre o desenvolvimento de toda a restante rede ferroviária envolvente, no decurso do século XXI. Caso viesse a construir-se um aeroporto internacional nas proximidades da Ota, o mesmo deveria ver-se servido por trajectos ferroviários, consistindo tanto na chamada Rede Transeuropeia de Alta Velocidade, como num novo troço da rede ferroviária convencional, de bitola larga Ibérica é . O último consistiria, érica principalmente, numa nova linha diametral, em via dupla electrificada, de união da Linha do Norte, na estação de Carregado-Alenquer, à Linha do Oeste, entroncando no Bombarral. Mas a necessidade de permitir a alguns serviços regionais de passageiros da Linha do Norte rebater devidamente na Ota, o tráfego de alta velocidade do TGV Lisboa-Porto, implicaria a existência de um troço complementar da rede convencional, em via dupla e electrificada, entre a Ota e Reguengo/Setil. Estaria assim criada, em conjunção com a Linha de Vendas Novas, uma Grande Cintura Ferroviária á , externa à ária Grande Lisboa, e unindo simultaneamente as linhas do Oeste, do Norte e do Sul, de uma forma algo idêntica ao previsto no último Plano Ferroviário Nacional, datado de 1927. A Linha de Vendas Novas tornar-se-ia assim um elo primordial no tráfego de mercadorias que, oriundo de Sul, distribuir-seia tanto para a Linha do Norte como para a Linha do Oeste, a qual, por seu turno, devidamente modernizada, assumiria o papel de reforço de capacidade, num eixo muito mais amplo, iniciando-se em Portugal na fronteira de Valença e acabando
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em Vila Real de Santo António, com a passagem em ponte para a Andaluzia, de molde a articular funcionalmente todo o sistema logístico Atlântico, desde a Galiza a Algeciras, e ao acesso da futura ligação intercontinental Espanha-Marrocos. A Linha de Vendas Novas, pelo seu posicionamento, é intrínseca à própria existência da rede ferroviária em Portugal, não se vislumbrando qualquer cenário realista no qual a mesma se afigure dispensável. vel vel. No médio prazo, adivinha-se uma alteração considerável áável no contexto institucional regulando as actividades transportadoras, com particular incidência, por pressão política supranacional, na transposição das disposições constantes no Protocolo de Kyoto, determinando uma internalização obrigatória dos seus custos externos, até agora repartidos pela sociedade. O recurso a modos de transporte sustentáveis, ááveis, tanto para o transporte de passageiros como de mercadorias, assume-se como a única forma possível íível das actividades transportadoras se eximirem ao pagamento sistemático de direitos de emissão, com consequências inevitáveis ááveis no custo final dos seus serviços. Com o previsível íível e desejáável aumento da utilização do caminho de ferro, ao longo do século XXI, preferencialmente articulado com outros modos de transporte sustentáveis, ááveis, como a via marítima, assumir-se-á como inevitável áável dotar a ferrovia de investimentos, privilegiando, sobretudo a nível íível das linhas de bitola larga Ibérica érica o revigoramento da malha ferroviária érica ária exisária tente. As linhas convencionais continuarão sendo as únicas suportando tráfego misto (ao contrário da igualmente muito necessária Rede Transeuropeia de Alta Velocidade, orientada exclusivamente para o transporte de passageiros de longo curso), afigurando-se imprescindível íível a reabilitação e modernização de trajectos existentes e o complemento dos mesmos através de construção de outros, completamente novos. E é precisamente neste contexto que se encontra a Linha de Vendas Novas: o de uma uniãoo vital vital, cujo âmbito territorial deverá ainda expandirse, no sentido de abraç abra ar, na sua vertente suprema de trajecto concêntrico, três das grandes magistrais ferroviárias, irradiando da Área Metropolitana de Lisboa em todas as direcções possíveis: Oeste, Norte e Sul.
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ANEXOS
O CAMINHO DE FERRO NAS ACTAS DA CÂMARA Raquel Fernanda Caçador Marques Técnica Superior de Arquivo Responsável pelo Arquivo da Câmara Municipal de Coruche
Os preciosos livros das actas transportam-nos ao passado cada vez que neles procuramos algum acontecimento ou simplesmente os lemos. Dispõem de personagens bem definidas e acontecimentos que cabem não só na história do concelho como do país e do mundo. Quem escreveu um livro de actas desfaz-se na memória com o passar do tempo, mas imprimiu a sua marca pessoal naquilo que escreveu, sem saber que escrevia uma história, quão era importante o seu trabalho... A colecção de livros de actas que integra o acervo do Arquivo Municipal tem início em 1880. A chegada do comboio a Coruche é-nos descrita nestes livros, ilustrando a euforia daqueles momentos, de expectativa de progresso e desenvolvimento do país, com destaque para a província do Alentejo. As entidades representativas do concelho preocupam-se com a vinda de Sua Majestade El-Rei D. Carlos, o que origina alguma agitação na gestão camarária. A dois de Dezembro de 1903 é incluída, no orçamento da Câmara, a verba de duzentos mil reis para ser aplicada nos festejos a fazer com a inauguração do Caminho de Ferro e na passagem do Rei. A 30 de Dezembro de 1903 deliberam que se mande fazer um estandarte e as faixas para os vereadores, fossem iluminados os Paços do Concelho e se comprasse o fogo-de-artif cio, assim como fossem afixados editais em todo fogo-de-artifí o concelho dando conta do acontecimento. Delibera-se ainda dar um bodo (distribuição gratuita de alimentos aos pobres em dias festivos).
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A 13 de Janeiro de 1904, véspera da inauguração, é deliberada a composição do bodo que seria dado a duzentos pobres: um quilo de carne, um quilo de arroz, um p pão e vinte e cinco réis em dinheiro. É ainda apresentado um of ofício do Administrador do Concelho rogando à Câmara a sua comparência pela uma hora da tarde, na estação desta vila, para apresentação de cumprimentos e homenagem ao Régio Visitante. A 20 de Janeiro de 1904, em reunião de Câmara, é dado conhecimento à mesma da devolução de algumas circulares; curiosamente, algumas destas pessoas viriam a integrar, mais tarde, os movimentos republicanos. A mensagem apresentada pelo Exmo. Senhor Presidente da Câmara, Senhor Doutor Alfredo Augusto Cunhal Patrício, é transcrita para o livro de actas. É uma mensagem explícita e clara, que segue os padrões da época, reforça sentimentos, como a lealdade, o reconhecimento, e o seu acendrado amor e dedica dedicação ao Rei, cheia de emoção e de expectativa de desenvolvimento da vasta província do Alentejo, cujos extensos terrenos estavam desaproveitados. Refere ainda que a púrpura que mais brilha é a que resulta das obras que contribuem para o bem de todos e o desenvolvimento do país. Ressaltando os sentimentos de humildade e submissão ao Rei, termina com um Viva toda a Família íília lia Real Real.. Mas há uma frase nesta mensagem que continua actual N o é o Setil que ddá a mão a Vendas Novas. É o Norte que se abra Nã abraça estreita e directamente com o Sul do País í. ís
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ANEXOS
Acta da Reunião de Câmara (30 de Abril de 1903, Livro n.º 9, fls. 23 e 23 v.º) – extracto
O senhor Presidente deu conhecimento à Câmara de que a comissão encarregada de levar a representação a sua Excelência o Ministro das obras públicas, na qual se pedia a construção de um caminho de ferro que, partindo daqui, vá a Avis, tinha sido muito bem recebida, dando o mesmo excelentíssimo Ministro as mais agradáveis esperanças para que a referida construção seja feita e prometendo que no primeiro decreto a publicar sobre caminhos de ferro incluiria na rede este que, com tanta justiça, se pede. Mais informou o senhor Presidente que os Deputados pelos círculos de que fazem parte os três concelhos, Avis, Mora e Coruche, se achavam presentes no dia em que a referida comissão reuniu em Lisboa, mostrando todos a sua boa vontade para o bom resultado dos desejos da comissão; que entre os senhores deputados se salientou o Deputado senhor Lourenço Cayola, pelo muito que tem prestado a favor desta causa. A Câmara por unanimidade resolveu agradecer ao senhor Presidente as suas informações e que por meio de telegrama se agradecesse aos Excelentíssimos ministros e deputados os seus serviços. 73
Acta da Reunião de Câmara (2 de Dezembro de 1903, Livro n.º 9, fls. 37 v.º) – extracto
José Jacinto da Silva Santos Verador em 1904 Foto: Colecção Aníbal da Costa Freire Correia
Alfredo Augusto Cunhal Junior Presidente da Câmara em 1904 Foto: Colecção Maria Alice Cunhal Patricio Rapazote
Em virtude da proposta apresentada pelo Senhor Presidente, foi por unanimidade deliberado que no orçamento ordinário para o futuro ano de mil novecentos e quatro desta Câmara fosse incluída, no caso de haver receita, a verba de duzentos mil réis para ser aplicada com os festejos a fazer por ocasião da inauguração do caminho de ferro e da passagem de Sua Majestade El-Rei na mesma ocasião.
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ANEXOS
Acta da Reunião de Câmara (30 de Dezembro de 1903, Livro n.º 9, fls. 40 v.º e 41) – extracto
Por proposta do Senhor Presidente foi por unanimidade deliberado: primeiro, que pela Câmara fossem feitos os convites às Damas e Cavalheiros para assistirem à manifestação feita por esta corporação no dia da inauguração do caminho de ferro no caso da vinda nessa ocasião de Sua Majestade; segundo, que os Vereadores se apresentassem com os distintivos legais; terceiro, que fosse mandado fazer o estandarte; quarto, que se adquirissem as faixas para os vereadores; quinto, que o edifício dos Paços do Concelho fosse iluminado na noite da referida inauguração; sexto, que fosse comprado o fogo necessário para tal fim; e sétimo, que fossem afixados editais em todo o concelho anunciando o dia em que é inaugurado o caminhos de ferro. Com relação à compra de estandarte pronunciou-se contra o Vereador, o Senhor Ribeiro Telles, sendo por isso esta deliberação aprovada por maioria.
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Acta da Reunião de Câmara (7 de Janeiro de 1904, Livro n.º 9, fls. 43 e 43 v.º) – extracto
Pelo Senhor Presidente foi mandado ler - Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor - A fim de poderem ser cumpridas as disposições do decreto de seis de Outubro de mil oitocentos e noventa e oito, publicado no Diário do Governo. número duzentos e vinte sete, de um do mesmo mês, na parte em que manda ouvir sobre o plano das vias férreas na respectiva região os governadores civis, as câmaras municipais e as associações agrícolas, industriais e comerciais, legalmente constituídas; tenho a honra de enviar a Vossa Excelência o plano da rede de Caminhos de Ferro que a Comissão nomeada por portaria do Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria, de vinte e sete de Setembro de mil oitocentos e noventa e nove, julga satisfazer mais convenientemente às condições topográficas e às necessidades económicas administrativas da zona do país, compreendida entre o Tejo e o Mondego, e de rogar a V. Ex.ª que se digne de o examinar e de formular acerca dele as considerações que tiver por conveniente para esclarecer a comissão a fim de o aperfeiçoar quanto possível. Outrossim, roga V. Ex.ª se digne de responder aos quesitos da nota junta. Deus Guarde a Vossa Excelência. Lisboa, trinta e um de Dezembro de mil novecentos e três. O Presidente da Comissão José J. de Paiva Couçeiro. A Câmara, tomando na devida conta este ofício, pediu ao Senhor Presidente que se encarregasse de responder aos referidos quesitos, encargo que aceitou de boa vontade. 76
ANEXOS Acta da Reunião de Câmara (13 de Janeiro de 1904, Livro n.º 9, fls. 44 v.º e 45) – extracto
Por a Câmara foi por unanimidade deliberado que, por ocasião da passagem de Sua Majestade El-Rei na estação do caminho de ferro do Setil a Vendas Novas, no dia da inauguração da mesma linha férrea, além do já deliberado em sessão ordinária do dia trinta do mês de Dezembro último, como sinal de regozijo, fosse dado um bodo a duzentos pobres, constando esse bodo de um quilo de carne, um quilo de arroz, um pão e cento e vinte réis em dinheiro, entrando esta despesa e outras que se façam com as manifestações a Sua Majestade El-Rei no orçamento ordinário em confecção para mil novecentos e quatro. O senhor deu conhecimento da circular sob número um, datada de doze do mês corrente, da Administração deste Concelho, na qual lhe é participado que por comunicação oficial desta data e do Excelentíssimo Governador Civil deste Distrito deve ter lugar amanhã, quatorze do mês corrente, a inauguração do caminho de ferro de Setil a Vendas Novas. E dignando-se Sua Majestade El-Rei assistir a este acto, rogo a comparência desta Câmara na estação desta Vila pela uma hora da tarde, a fim de se prestarem os devidos cumprimentos e homenagem ao Régio Visitante. Em seguida pelo Senhor Presidente foi dito que ia fazer cumprir o que se acha já deliberado a este respeito.
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Acta da Reunião de Câmara (20 de Janeiro de 1904, Livro n.º 9, fls. 45 v.º - 46 e 46 v.º - 47 e 47 v.º - 48) – extracto
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ANEXOS
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ANEXOS
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O Senhor Presidente deu conhecimento de que, tendo mandado circulares de convite a todas as pessoas de representação do Concelho e mandado afixar editais anunciando a inauguração do caminho de ferro do Setil a Vendas Novas e a passagem de Sua Majestade à estação desta Vila, cumprindo assim a deliberação da Câmara constante da acta da sessão ordinária do dia trinta do mês de Dezembro último, lhe foram devolvidas as seguintes circulares de Mário Augusto de Mendonça, Carlos Nunes Vieira Raposo, Augusto César Raposo, Luís Nunes Raposo, João Patrício Correia Gomes e José Manuel da Silva Guisado Júnior, pedia para ficar consignado na acta este facto, a que a Câmara por unanimidade anuiu. Foi mandada ler uma circular sob o número oito, datada de dezasseis do mês de Janeiro corrente, da Administração deste Concelho, no qual em nome do Excelentíssimo Governador Civil deste Distrito agradece à Câmara a sua comparência na estação desta Vila no dia da inauguração do caminho de ferro. A Câmara declarou ficar inteirada. O Senhor Presidente deu igualmente conhecimento à Câmara de que em data de treze do corrente mês tinha recebido o ofício que se segue cujo teor é o seguinte. Excelentíssimo Senhor. A Comissão que promove os festejos do caminho de ferro e a recepção de Sua Majestade que deve passar amanhã na estação do caminho de ferro desta Vila, tem a honra de participar a Vossa Excelência que foram dadas ordens para que a Câmara da digna Presidência de Vossa Excelência seja recebida na estação sem o respectivo bilhete de entrada e nesta tenha lugar especial. Deus guarde a V. Excelência, Coruche, treze de Janeiro de mil novecentos e quatro. Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Coruche - Luís Patrício Correia Gomes, Carlos Nunes Vieira Raposo, Joaquim Ribeiro Telles. A este ofício informou o senhor Presidente que tinha respondido pela forma seguinte. Excelentíssimo Senhor. Agradeço a Vossa Excelência e aos seus colegas a graciosa intenção de convidar a Câmara a que tenho a honra de presidir para a recepção de Sua Majestade na estação de caminho de ferro desta Vila; mas devo lembrar-lhes que a Câmara como representante deste concelho tem o seu lugar na homenagem a prestar a Sua Magestade El-Rei, por indicação das autoridades competentes, entre as quais não figura o nome de Vossa Excelência nem daqueles que escreveram os seus nomes no ofício cuja recepção julguei dever acusar. O senhor Presidente informou mais, que na ocasião da estada de Sua Majestade El-Rei, na estação do caminho de ferro, desta Vila, quando teve lugar a inauguração do referido caminho de ferro do Setil a Vendas Novas, tinha apresentado a sua
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ANEXOS
Majestade a seguinte mensagem. Senhor - A Câmara Municipal de Coruche, em seu nome e em nome dos habitantes do Concelho, vem respeitosamente apresentar a vossa Majestade a devida homenagem da sua lealdade, do seu reconhecimento e do seu acendrado amor e dedicação. Senhor, Um dos Augustos Predecessores de Vossa Majestade, o Fundador da nossa independência libertou do poder dos agarenos esta antiquíssima povoação. Destruída posteriormente, repovoou-a. Os seus gloriosos sucessores, desde então e como que à porfia, a ampararam e protegeram, ouvindo os seus procuradores e tomando adequadas providências. Reservava, porém, a Divina Providência a Vossa Majestade o prestar-lhe o maior benefício que poderia exigir-se aos progressos da moderna civilização. Senhor: A cultura dos extensos terrenos até hoje desaproveitados na vasta província do Alentejo depende principal, se não unicamente, do movimento fácil, rápido e compensador dos seus produtos. O trabalho remunerado é fecundo, fertiliza os campos e multiplica os povoadores. A do Alentejo terá mais que duplicado a sua população e triplicado a sua riqueza. Coube a Vossa Majestade, inaugurando esta ferro-via, contribuir poderosamente para a solução de um problema antigo que os melhores esforços e os mais vivos anhelos de outros tempos não conseguiram resolver. Não é Setil que dá a mão a Vendas Novas. É o Norte que se abraça estreita e directamente com o Sul do País. Dessa íntima união hão-de resultar benefícios superiores a toda a previsão. Senhor: Vossa Majestade consubstancia a independência da pátria - pátria querida, que, mais que prosperidade, deve a própria existência à gloriosa Dinastia de Bragança. Somente por ela e com ela poderá subsistir o lidar independente, nobre e honrado do cidadão português. Mas, senhor, nunca a Púrpura Real é mais atraente, nunca brilha com mais vivido esplendor, nunca infunde maior respeito que quando consagra com a sua prestigiosa e amorável presença as obras gigantescas que hão-de contribuir para o bem geral e para o engrandecimento do País. Finalmente, Senhor, a minha palavra em demasia pobre é apenas suficiente para significar o desejo de cumprir um dever sagrado e nem sequer tentarei dar a expressão aos sentimentos de submisso afecto e vivo entusiasmo que inundam os corações dos habitantes deste Concelho para com Vossa Majestade e para com toda a Família Real, por tantos e tão assinalados benefícios. Por isso terminarei pedindo vénia para clamar: Viva Sua Majestade El-Rei. Viva Sua Majestade a Rainha. Viva Sua Majestade a Rainha Senhora Dona Maria Pia. Viva Sua Alteza o Príncipe Real. Viva toda a Família Real. A Câmara por unanimidade aprovou o memorial que
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Alexandre de Senna Cunhal (Administrador do Concelho em 1904) Foto: Colecção Jorge Brito e Abreu
José Pedro Ribeiro Telles Vereador em 1904 Foto: Colecção Maria Joana Barata Baptista
acaba de ser lido, bem como a resposta ao ofício da comissão encarregada dos festejos por ocasião da inauguração do caminho de ferro. O senhor Presidente mandou também proceder à leitura do seguinte telegrama: Excelentíssimo Presidente da Câmara Municipal de Coruche. A Vossa Excelência e a Câmara da sua Presidência muito agradeço seu comparecimento ontem na estação dessa Vila e cumprimentos a El-Rei. Felicito-o e congratulo-me com a Câmara pela importante e respeitosa manifestação prestada a sua Majestade e associo-me ao regozijo dos habitantes desse Concelho pela inauguração do caminho de ferro pelas incalculáveis vantagens que lhes advém de tão importante melhoramento. O governador Civil J.E. Simões Baião.
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ANEXOS
AuGUSTO MARQUES e MARIA DE LURDES SILVA (Entrevista)
Luís Batalha Antropólogo Eugénia Dias Técnica Superior de Animação Cultural e Educação Comunitária Museu Municipal de Coruche
O Concelho de Coruche está situado na margem sul do rio Tejo, numa zona de transição entre o Ribatejo e o Alentejo. A sua localização é bastante central no contexto do território nacional, situando-se num eixo histórico-geográfico entre Lisboa, Santarém e Évora. Neste contexto, a rede ferroviária do concelho, isto é, a linha Setil-Vendas Novas atravessa quatro freguesias do concelho, estabelecendo a delimitação entre as freguesias de Fajarda e Coruche; atravessa depois esta freguesia, delimitando também as freguesias de Santana do Mato e da Branca. Ao longo deste percurso encontramos a localidade de S. Torcato, na freguesia de Coruche, perto da junção das freguesias da Branca e de Santana do Mato. Em S. Torcato, ao contrário de outras localidades, a estação não se encontra distante, permitindo uma proximidade grande entre a população e o comboio. Quer com o assegurar do transporte de mercadorias quer no transporte de passageiros, a centralidade de S. Torcato, face a outras localidades próximas (a poente as localidades de Fazendas da Torre, Fazendas dos Pelados, Fazendas das Figueiras, Foros da Branca e, ainda, a leste, Brejoeira, Carapuções, Crilheira e Cortiçadas de Lavre), contribuiu largamente para a afirmação daquela estação enquanto pólo distribuidor de pessoas e bens.
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O comboio foi, então, durante mais de metade do século XX o meio de transporte privilegiado para as populações que, não deixando de se deslocar a pé ou em carroças, utilizavam o comboio para as deslocações à vila. Este era também o meio de transporte onde embarcavam mercadorias como a cortiça, o carvão, a lenha e a carqueja, bem como o meio de transporte para os militares que cumpriam o serviço militar obrigatório em Vendas Novas. S. Torcato é um caso sui generis de interacção entre o comboio e a população, que se prolongou até à massificação do transporte rodoviário, já durante os anos 60/70. A crescente oferta deste meio de transporte, aliada aos desadequados horários dos comboios, contribuíram para um esvanecimento desta interacção. Na actualidade o comboio só raramente pára em S. Torcato, enquanto as mercadorias continuam a passar... mas sem parar. Esta singularidade levou-nos a realizar uma entrevista ao Sr. Augusto Marques (AM), antigo trabalhador ferroviário no departamento de material e tracção, e à Sra. Maria de Lurdes Silva (MLS), sua esposa. Em nosso entender, a entrevista constitui-se como um meio privilegiado para dar voz ao entrevistado e assume-se como um documento oral genuíno, cujo testemunho passa direcSr.a Maria de Lurdes Silva e Sr. Augusto tamente para o leitor. Marques. Assim, às 15h30m 29 de Março de 2004 do dia 29 de Março de Foto: Museu Municipal 2004 realizou-se a entrevista. O local de encontro para a realização da mesma foi a residência do Sr. Augusto Marques, em S. Torcato. Esta pretendia abordar, essencialmente, a estação de S. Torcato e a sua importância no âmbito da comemoração do centenário da linha Setil-Vendas Novas. Após a nossa chegada à pequena localidade de S. Torcato fomos calorosamente recebidos pelo entrevistado e pela sua esposa, o que contrapunha com o cinzento e o frio dia que se fazia sentir. Depois de instalados em casa do Sr. Augusto
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ANEXOS
Marques, iniciou-se a entrevista. - Onde e quando nasceu? AM - Eu nasci nas Fazendas do Pelados, freguesia e concelho de Coruche. Nessa altura, bem, nessa altura era freguesia de Santana do Mato, em 18 de Julho de 1931. Foi quando eu nasci. - E os seus pais, como é que se chamavam? AM - A minha mãe Luísa íísa sa Teresa e o meu pai Ant Antóónio Marques. Ali fui criado, a 3,5km aqui da esta estação de S. Torcato. O correio nessa altura vinha aqui para a esta estação de S. Torcato, para uma mercearia junto aqui à estaçã esta o, e nós óós víínhamos procurar aqui a essa mercearia; dum modo geral, vinha-se aqui de oito em oito dias... - O correio vinha de... AM - (...) vinha de comboio; as pessoas vinham aqui buscar a sua saquetazinha e, llá nas localidades, as pessoas iam ao posto do correio fazer o que nós óós fazííamos aqui, quer dizer, o correio dos meus pais vinha aqui para S. Torcato. - Havia pessoas que vinham cá buscar o correio e o levavam para as localidades? AM - Das outras localidades vinha um funcionário áário buscar a mala e as pessoas depois iam a esse posto buscar o seu correio. De um modo geral, o posto do correio era numa mercearia, onde as pessoas iam procurar o seu correio - (...) Vinha todos os dias o correio? AM - (...) Todos os dias as pessoas, quando queriam enviar a sua cartinha, iam llá pôr à caixinha. As pessoas todos os dias tiravam e metiam na mala (...); ganhavam x dos CTT [por] vir trazer a mala aqui ao comboio [e que] vinha num compartimento da carruagem. O funcionário áário dos CTT com as malinhas fazia a distribui o: uma para ficar aqui em S. Torcato e para os Foros da tribuiçã Branca, outra para os Carapu Carapuções, e recebia uma e entregava outra, né?, e fazia assim. O Sr. Augusto Marques era filho de agricultores. Na sua família ninguém trabalhou como ferroviário e apesar de, em 1954 (altura em que começou a trabalhar como ferroviário), possuir apenas esta oportunidade de emprego, decidiu experimentar trabalhar nos caminhos de ferro, começando nas operações da via como eventual em Caxarias, onde esteve durante seis meses. - Fazia exactamente o quê? AM - Aíí fui trabalhar de pá e picareta; veja bem, pá e picareta para o túnel de Albergaria para alargar a via, porque aquilo só tinha uma via e depois era preciso alargar a terraplanagem; não havia máquinas quinas naquela altura nem nada, e ent então aquilo foi a pá e picareta (...), andei llá seis meses; depois (...) acabou-se a verba,
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foi suspenso e vim-me embora. Vim-me embora e (...) fiquei aqui ao pé de casa. Fui chamado aqui para a Quinta Grande, fui fazer a linha número dois aqui da Salgueirinha, também éém só tinha uma linha. (...) Em 1954 (...) nãoo me recordo jjá o mês, êês, s, foi... jjáá não me recorda bem, em 54 (...) estive ali uns meses parado, enfim, a trabalhar nas terras do meu pai, não é?, na agricultura, não me recorda bem os meses que tive em casa. Depois fui chamado, fui para ali. Ali estive mais uns meses, depois dali jjáá fui para a repara reparaçã ção só da linha, jjá nãoo fui para as terras da CP llá para os vagões, es, jjá fui só para a repara reparação, jjá era um pouco melhor, não é? Andava a apertar os parafusos e tal, a corrigir as avarias, ia aprendendo com os outros mais velhos, com os oper operááários rios (...), jjáá me ia habilitando para o futuro para ingressar no quadro (...) para os oper operáários. ários. - Ainda estava como eventual? Ou já estava... AM - Nessa altura era eventual (...). Olhe, na CP era o seguinte: só trabalhava os dias que ganhava, não tinha regalias nenhumas, não descontava para a segurança social, nadinha, se faltasse não ganhava e é que não podia faltar, se eu pedisse um dia de licença para tratar de qualquer coisa da minha vida particular eu tinha que pedir autoriza autorização, se faltasse, eles mandavam-me logo embora, se eu faltasse sem autoriza autorização deles, sem ser concedido, eles mandavam-me logo embora, porque eles se precisassem de um tinham dez a oferecerem-se. Mesmo assim a pagarem mal, as regalias, que mal davam para as sopas, quando queriam um tinham dez. - Depois continuou sempre a trabalhar na via? Sempre a trabalhar na via, mesmo quando casou? AM – Nã N o, não. Eu depois estive um... eu estive um ano aí na via, mas aquilo, eu considerava aquele servi serviço da via, naquele tempo, os escavadores da CP, ttá a perceber? Eu considerava-nos escavadores da CP, e ent então, eu não queria ficar ali, eu queria outro emprego. (...) Entretanto o Sr. Augusto conseguiu mudar de trabalho. Trocou o trabalho na via por outro no Departamento de Material e Trac o. Esteve dois anos em Lisboa e em 1958 vai trabalhar para Tracçã o Setil, casando duas semanas depois com Maria de Lurdes Silva. - [Dona Maria de Lurdes Silva], o que é que se lembra ao nível íível da estação e dos comboios? Quais são as recordações mais antigas que tem? MLS – Muitas! Muitas! (...) Vinha o comboio das três, ê ês, vinha o comboio das nove, ia-se levar as cartas àss ambul ambulâncias... chamava-se as ambul ambulâncias. - Entãoo passava a inf infância toda, mesmo a adolescência, muito perto dos comboios, [por]que a estação também não era muito longe daqui?
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ANEXOS
MLS - É aqui (...). - Normalmente aqui em S. Torcato isso acontecia com todas as pessoas, quer dizer, as pessoas gostavam muito do comboio? MLS - Mesmo as pessoas mais novas que eu gostavam de ir ao comboio ver os militares que iam no comboio (...), iam para o norte, ia tudo ver os militares (...). AM - Os militares e muitos passageiros que havia, né?, era um divertimento, né? (...) - (...) as pessoas [que] trabalhavam na estação (...) eram pessoas daqui? MLS – Nã N o, geralmente os que trabalhavam na esta estação era[m] dos da via, e esses da via quase sempre vinham do Norte, eram destacados porque nessa altura cada qual não ia para onde queria, do norte iam para o sul, do sul iam para o norte. Geralmente, essas pessoas que vinham do norte traziam logo as esposas para fazer ali sinal ao comboio. Daqui só se fosse alguma substituta. Naquela altura também éém era tudo para elas, elas faziam 24 horas. As guardas faziam 24 horas. (...) - (...) Como é que era o movimento a nível íível da circulação de passageiros? Havia muita gente que vinha para aqui para a estação? Muitas pessoas utilizavam o comboio? AM – Entã Ent o, olhe, a esta estação servia aqui, para poente, servia Fazendas da Torre, Fazendas dos Pelados, Fazendas das Figueiras, Foros da Branca (...); llá para o fundo da Branca vinha tudo para aqui, é mais de 10km, vinham a pé (...) apanhar o comboio para ir para Coruche, para ir para Lisboa, para ir para Santarém; éém; vinham a pé das Fazendas [das Latadas], que são mais de 10km (...), vinham a pé, éé, recordo-me que era garoto, nem bicicletas havia; recordo-me da primeira bicicleta aqui nos Foros da Branca. - E utilizavam o comboio para ir a Coruche. AM - A Coruche, Santarém, éém, Lisboa. (...) Aqui para a parte leste aqui da esta estação, para este lado, era Brejoeira, Carapu Carapuções, Crilheira e Corti Cortiçadas de Lavre; (...) eu andava aqui nos comboios e falava com muita gente que vinham dali e depois seguiam no comboio, falava com eles. - Estamos a falar mais ou menos de que altura? Anos... AM - (...) 50, 60. - Quer dizer, nos anos 60 ainda havia muita afluência? MLS – Muita! Muita! AM - E daí para tr tráááss ainda mais, porque nessa altura jjáá havia outros transportes, e daí para tr tráááss muito menos havia, não é?, [por isso] ainda mais recorriam ao comboio daí para tr trááás, s, né?, porque nos anos 40 isso aí é que era, (...) não havia outro meio de
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transporte. (...) Era garoto quando (...) vinha aqui buscar as cartas (...) à mercearia, (...) aquele casario que o Sr. vê ali, nessa altura, na altura, nestas casas havia era pilhas de corti cortiça e pilhas de carvão à espera de embarque. - Havia aqui embarque de carvão e embarque de cortiça? AM – Cortiç Corti as, carvão e lenhas. - Era a nível íível dos particulares ou havia alguma empresa que fazia essa embarcação? AM - Havia empresa, que era a Mondete. MLS - Era de corti cortiça só, óó,, (...) de lenha jjáá eram vários, áários, (...) eram pessoas particulares AM - Isso eram particulares não eram (...) era a Mondete, at tinha ali uma casa de madeira . até - Iam em vagões próprios? MLS – Era, era em vagões próprios, óóprios, os vagões que tinham aqueles ferros (...). AM - (...) o [metano] embarcava aqui em vagões. - Ia em direcção a Vendas Novas ou em direcção...? AM - Ia para vários áários sítios. í (...) AM - (...) ainda me recorda, porque havia aí muita gente a trabalhar. Chamavam-lhe os metaneiros que faziam o metano (...). Havia as talhas, que eram sessenta molhos daqueles, (...) depois aquilo secava, depois iam nos carroceiros aí nos carros dos bois, nos carros das mulas, das parelhas, a carregar aqui para a estação, descarregavam ali, à espera, (...) à espera que viessem os vagões. Depois, quando vinham os vagões, carregavam aquilo para os vagões. (...) A carqueja, também éém havia aí os carquejeiros, [andavam a] arranjar carqueja aí pelo mato, fazia[m] molhitos pequenos que também éém ia[m] para Lisboa. (...) Dividiam em molhinhos que era para vender em Lisboa para acender os fogareiros. - Isso era mais para as casas das pessoas? AM - Era para acendalhas dos fogareiros das padarias. MLS - Há H 50 anos, 60, em Lisboa era tudo com um fogareirozinho a carvão; o; eu estava llááá,, era pequena, andava lláá na escola, que eu tinha llá um irmão, e era tudo com os tais molhinhos que iam daqui de carqueja; (...) aquilo llá nãoo havia ggááás, s, depois é que começaram a aparecer as máquinas a petróleo. óóleo. (...) - E onde é que se encontrava aqui carvão? MLS - Em qualquer monte, (...) em qualquer monte faziam carvão. Agora não. [ Já] tê t m fornos próprios óóprios e tal, mas naquela altura não; no meio do chaparral do montado faziam os fornos e faziam o carvão e, depois, os depósitos óósitos era tudo aqui [na estação]. (...) - Quanto tempo é que demorava daqui até Lisboa?
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ANEXOS
MLS - (...) agora ultimamente jjá eram duas horas. (...) Na era dos nazis não havia comboios de passageiros, (...) à volta de [19]45 não havia comboio de passageiros. AM - Faltou o combustível. í ível. MLS – (...) [Só por] grande favor é que os chefes e os [maquinistas] deixavam que as pessoas fossem a Coruche, só por grande favor. (...) - E como é que faziam para ir a Coruche? MLS - Iam a pé. é (...) E na altura das feiras toda a gente é. ia para Coruche para a feira e para a festa, era aqui que tudo vinha embarcar; (...) eles não aumentavam as carruagens. - S. Torcato era aquela estação que reunia mais pessoas para irem para Coruche? MLS – Exactamente, a Quinta Grande não reunia tanta gente, esta aqui é que reunia mais gente. (...) - Quando é que começaram a reparar que começou a haver menos gente a utilizar o comboio? (...) MLS - H Há vinte anos para cá. á (...) á. - Se bem que esta área não vos favorece muito. Neste momento existe a circulação de passageiros de manhãzinha logo muito cedo não é? MLS – Pois, não favorece. O meu filho para chegar ao Porto a gente tinha que o ir levar a Santarém. (...) AM - A automotora pára áára só quando tem passageiros. Se houver passageiros pára áára sempre. (...) - Acham que se houvesse mais comboios as pessoas andavam mais de comboio aqui em S. Torcato? MLS - Eu não sei dizer (...). AM - Acho que não, o, porque as pessoas ttêm carro (...), por exemplo, as pessoas para irem llá acima à vila, o comboio fica cá em baixo. - E se houvesse (...) uma camioneta da carreira a fazer [um percurso] da estação para o centro da vila? AM - Mas você sabe que a esta estação (...) é um problema (...). - Mesmo para os estudantes não compensava mais o comboio? MLS - Nã N o compensava porque tinham que andar a pé (...). AM - Eu acho que com a CP esses horários sãoo dif difíceis de negociar (...). - E se houvesse outros horários rios melhores, era mais ffácil? MLS - É difí dif íícil cil (...). (...)
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- Quando é que a estação fechou, lembram-se de ter fechado a estação? MLS - Eu o ano não me recordo. - Mas foi há pouco tempo? MLS – Nã N o, jjá foi há muitos anos. Primeiro entregaram a particulares, (...) depois acabaram por fechar mesmo; quando a de Coruche fechou, esta fechou primeiro. (...) MLS - Mas já fechou há coisa de uns vinte anos. (...) - Então acham que a população já não sente a falta do comboio? MLS - Nã N o (...). - Quando é que deixou de trabalhar na CP? AM - No dia 1 de Fevereiro de 1987. - Depois disso decidiu ficar ainda ligado aos comboios ou sente falta da vida que tinha em relação à profissão que tinha? Gostava de trabalhar? AM – Sim, eu gostei de ser ferroviário áário mas, [mas] quer dizer, eu não sentia falta de me vir embora, eu tinha a minha ocupa o particular (...). paçã MLS - O comboio era lindo, (...) era uma alegria (...). - Lembra-se ainda que máquinas é que passavam para além destas? AM - A princípio íípio eram as máquinas a vapor as F200, as 500... (...) AM - (...) depois vieram ent então essas [máquinas] diesel, depois vieram as 300 e as 1500. As 300 eram umas maquinazitas mais leves, pesavam à volta de 70 toneladas, e havia as 1500, umas máquinas mais pesadas, mais poderosas, [que] pesavam à volta de 104 toneladas cada uma, máquinas que levavam mais tonelagem e mais poderosas, (...) máquinas quinas muito boas, os motores de trac tracção sãoo el eléééctricos. ctricos. (...) Os motores a diesel sãoo uma central el eléééctrica ctrica que produzem electricidade para os motores de trac tracção (...). MLS - Mas em suma, para mim, o melhor transporte é o ferroviário, áário, rio, (...) sem compara comparaçã ção nenhuma! (...) - E porquê? MLS – [Existe] mais comodidade, vai-se à casa de banho, vai-se àquela janela, vai-se à outra, conversa-se com esta pessoa, conversa-se com aquela... (...) - O comboio que passa aqui é sobretudo o do mercadorias, não é? AM - É sobretudo de mercadorias. MLS - E jjá não se faz como se fazia! (...) AM - (...) os comboios naquele tempo, aqui há 70 anos, (...) circulavam desligados, quer dizer, não tinham mangueiras sequer; (...) os comboios eram comandados por freio manual, ia um
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ANEXOS
homem, o guarda freio, à cauda, ia um ao meio do comboio [e] ia o outro à cabeç cabe a, o guarda freio da máquina. - Eles é que faziam o freio? AM - Eles é que faziam o freio, o maquinista dava o sinal por meio de apito quando queria que eles apertassem o freio, (...) quando precisava que eles apertassem dava-lhe toque por meio de apito e eles apertavam, quando queriam que eles alargassem davalhe sinal por meio de apito, (...) era tr trêêêss guardas freios. (...) AM - (...) depois, mais tarde, veio o freio vácuo, áácuo, mas nem todos tinham; jjá todos tinham conduta geral, mesmo aqueles que não tinham freio vácuo áácuo cuo tinham a passagem, depois punham ent entãão o vag vagão com o freio vácuo á à cauda, (...) à cabeç ácuo cabe a tinha que ir um vag o com freio vácuo, vagã áácuo, depois iam uns tantos sem freio, ao fim de uns tantos, era obrigat obrigatóóório rio outro com freio, depois outros tantos sem freio, depois outro com freio e depois, à cauda, tinha que ir outro com freio; depois jjá era só um guarda freio à cauda; mesmo assim, com esses freios largos, tinha que ir um guarda freio à cauda, (...) jjá era um pouco melhor (...). - Com esses comboios a funcionar assim lembram-se de alguns acidentes que tenham havido ao longo dos anos? MLS - Houve foi muitos acidentes de material, assim com vítimas í ítimas é que não. (...) - Acha que S. Torcato perdeu importância, o comboio trazia mais importância à estação? MLS - Trazia para os arredores, [as pessoas] que vinham aqui embarcar agora passam de carro, a gente nem os vê... ê ê... (...)
Bibliografia Poirier, JJean e S. Clapier-Valladon e P. Raybaut - Histórias de vida: teoria e prática, Oeiras: Celta, 1995
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C A T Á L O G O
CATÁLOGO
Dulce Patarra Técnica Superior de Conservação e Restauro Museu Municipal de Coruche
1 - Apito de locomotiva Metal 58,5 x 28 x 15 cm Câmara Municipal do Entroncamento 2 - Baú Caixa em chapa metálica, de cor preta, com tampa de abrir com pega Metal 34 x 42 x 31,5 cm Museu Nacional Ferroviário 3 - Armário de bilhetes Madeira 100 x 137 (aberto) x 26,5 cm Museu Nacional Ferroviário 4 - Farol da frente da máquina (N. de fabrico 313) Metal e vidro 54,5 x 31 x 25,5 cm Câmara Municipal do Entroncamento Inv. n.º 4340
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5 - Lanterna de sinalização Metal e vidro 37 x 15,4 x 22 cm Câmara Municipal do Entroncamento Inv. n.º 4349 6 - Lanterna de sinalização Metal e vidro 34,5 x 15 x 22,5 cm Particular - Bárbara Santos 7 - Marcador de bilhetes Metal 22,5 x 10,2 x 15,5 (aberto) cm Museu Nacional Ferroviário 8 - Panela de pressão Recipiente em alumínio, com tampa Matéria: alumínio 29 x 21 x 20,5; ø 19 cm (c/ tampa) Museu Nacional Ferroviário 9 - Seringa de lubrificação Metal 101 (aberta); ø 8,5 cm Museu Nacional Ferroviário
10 - Bandeira de sinalização vermelha Matéria: madeira e têxtil 48,5; Ø 3,5 cm e A. 39,9 x L.47 cm Câmara Municipal do Entroncamento 11 - Bandeira de sinalização amarela Madeira e têxtil 48,5; Ø 3,5 cm e A. 37,5 x L. 47,5 cm Câmara Municipal do Entroncamento 12 - Bandeira de sinalização verde Madeira e têxtil 48,5; Ø 3,5 cm e A. 37,2 x L. 49,5 cm Câmara Municipal do Entroncamento 13 - Telefone de via ericsson Metal e plástico 29,5 x 25,5 ou 232 (c/fio) x 14 cm Particular - José Amado 14 - Corneta Metal 4,5 x 27 x 12 cm Particular - Bárbara Santos 15 -Illustração Portugueza 25 de Janeiro de 1904 1º ano ; n.º 12 Empresa do jornal “O Século” 39,5 x 61,5 (aberto) cm Particular - Colecção de Jorge Brito e Abreu
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16- Legislação de 1899 a 1904 Caminhos de Ferro do Estado Decreto de 27 de Novembro de 1902 / Relatório 20 x 29 (aberto) cm Particular - Colecção de Jorge Brito e Abreu 17 -Boné do Fiscal Séc. XX (meados) Têxtil 12 x 25 cm Particular - Augusto Marques 18 - Fato de Chefe de Estação Séc. XX (meados) Têxtil Particular 19 - Manequim do Rei D. Carlos Fato de Homem Séc. XX Sobrecasaca; Calças; Colete; Camisa; Gravata; Colarinhos; Luvas; Sapatos; Polainas Réplica Museu Nacional do Tarje 20 - Cartola Pelúcia preta e Fita de gorgorão preta 0,80 (copa); Ø 18; 19 (aba) cm Réplica Museu Nacional do Tarje
21 - Manequim da Rainha D. Amélia Vestido (2 peças) Século XX (Início) Têxtil (Sarja de lã creme) Réplica Museu Nacional do Tarje 22 - Chapéu Séc. XX (início) Organza creme c/ aplicações de flores de tecido e penas de avestruz em tons policromos Réplica Museu Nacional do Tarje 23 - Manequim do Príncipe Luís Filipe Fato de Homem Sobrecasaca (inicio do séc. XX); Inv. n.º 18.989 Calças Inv. n.º 15.946 Camisa; Gravata; Colarinhos; Luvas; Sapatos; Polainas; Réplicas Museu Nacional do Tarje 24 - Manequim do Príncipe Fato de Marujo Blusão (inicio do séc. XX) Sarja de algodão branco Inv. n.º 13. 081 Calças Linho branco Inv. n.º 3.647 Museu Nacional do Tarje 25 - Bata de guarda de passagem de nível da REFER Particular - Bárbara Santos
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Ficha Técnica CAT CATÁLOGO Edição: Câmara Municipal de Coruche Museu Municipal de Coruche Coordenação geral: Domingos Francisco Investigação e Textos: Dulce Patarra, Eugénia Dias, Gilberto Gomes. Gonçalo Ribeiro Telles, Isabel Chaparro, João dos Santos Gonçalves, José Eduardo Neto da Silva, Luís Batalha, Manuel Margarido Tão, Raquel Fernanda Caçador Marques, Revisão: Ana Paiva
Agradecimentos: António Joaquim, Augusto Marques e Maria de Lurdes Silva Manuel Escudeiro, Jorge Brito e Abreu, Maria Joana Barata Baptista, Aníbal da Costa Freire Correia, José Joaquim Ferreira Neto Pré-Press, impressão e acabamento: Guide - Artes Gráficas, Lda ISBN: 972-98829-5-9 Depósito Legal: Tiragem: 1000 exemplares
Design e paginação: Domingos Francisco Fotografias e desenhos: Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário, Museu Municipal de Coruche, Jorge Brito e Abreu, Illustração Portugueza, Revista Occidente, Gestão de Cadastro e Arquivo Técnico da Refer, EP, Jornal “O Século”, Herdade da Quinta Grande, Manuel Ribeiro – CP Caminhos de Ferro Portugueses Arquivo Fotográfico da CP – Caminhos de Ferro Portugueses, EP, Arquivo da CMC, Isabel Chaparro
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EXPOSIÇÃ EXPOSIÇ XPOSIÇÃO ÃO Organização Câmara Municipal de Coruche Museu Municipal de Coruche Coordenação geral Domingos Francisco Textos, investigação e consultoria científica Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário, Escola Secundária de Coruche, Jorge Brito e Abreu, José Eduardo Neto da Silva Luís Batalha Manuel Margarido Tão Concepção Gráfica Domingos Francisco Revisão Ana Paiva Maqueta Ricardo Correia Miniaturas Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário Restauro Relvas Fotografias Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário, Museu Municipal de Coruche, Herdade da Quinta Grande, Arquivo da CMC Colecção Jorge Brito e Abreu, José Joaquim Ferreira Neto, Maria Joana Barata Baptista, Aníbal da Costa Freire Correia
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Execução e Montagem Museu Municipal de Coruche Impressão Digital Optimo, Publicidade Lda. Iluminação, pintura e carpintaria Divisão de Obras da Câmara Municipal de Coruche Empréstimos Alunos da Escola Secundária de Coruche, Associação dos Amigos do Museu Nacional Ferroviário, Associação Para o Estudo e Defesa do Património Cultural e Natural do Concelho de Coruche, Augusto Marques, Câmara Municipal do Entroncamento, CP - Companhia Portuguesa, Herdade da Quinta Grande, Jorge Brito e Abreu, José Amado, Museu Nacional Ferroviário, Museu Nacional do Traje, Refer, EP Agradecimentos Ana Freitas, Aníbal Serafim, António Joaquim, Carlos Silva, Fátima Agrela, Firmino Joaquim Escaninha, Florindo Dias Brites, Gilberto Gomes, Graça Ribeiro da Cunha, Isabel Chaparro, José Eduardo Neto da Silva, Luís Filipe Lopes, Madalena Bráz Teixeira, Manuel Escudeiro, Paula Neves Vertic, Rita Guiomar, Rosa Gomes, Rui Reis e a todos aqueles que, de uma forma ou de outra, com dedicação e empenho, contribuiram para que esta exposição fosse possível
APOIOS:
ESCOLA SECUNDÁRIA
COM 3º CICLO DO ENSINO
ASSOCIAÇÃO DE AMIGOS DO MUSEU NACIONAL FERROVIÁRIO
BÁSICO DE CORUCHE
ASSOCIAÇÃO PARA O
ESTUDO E DEFESA DO
PATRIMÓNIO CULTURAL E NATURAL DO CONCELHO DE CORUCHE
Museu Nacional do Traje