Edu O. (Org.) Edu O., Fafรก Daltro e Lucas Valentim (Aut.)
Judite Quer Chorar, Mas Não Consegue! é um momento de grande inspiração neste começo de milênio: é imprescindível, como nos diz Garaudy, não apenas viver a vida, mas, sobretudo, ter a ousadia de dançá-la com uma força tal capaz de fazer crer que há sim um outro mundo possível, um mundo mais forte e justo, muito mais belo e verdadeiro e mais: que é possível vivenciá-lo em toda a sua plenitude.
Apresentação Por Edu O.
Saja (Filósofo)
em 2007
De uma dor a um nó na garganta... então, tudo isso virou Dança. Mas não só. Foi mais ou menos assim que começou a história de Judite: com uma viagem que deveria ser longa, uma febre e aquele choro preso. Imediatamente, como uma tempestade que desaba sem chance para o guarda-chuva veio o título “Judite quer chorar, mas não consegue!”. Passei uma madrugada em claro sem entender o que me acontecia. Por que aquele nome? Por que aquele nó? E aquilo seria dança, pintura, poesia? Música, teatro, desenho? Assim, foram chegando a mandala, a escada, a folha que mais tarde eu saberia uma “comigo-ninguém-pode” e mais tarde a turma toda que me acompanha até hoje. Turma grande que depois eu conto. O que estou querendo dizer, na verdade, é que tudo isso não determinava em que Judite se transformaria. Não era certo que se configuraria apenas num espetáculo de Dança contando a história de uma lagarta que tem medo da vida, das transformações e que a partir de um sonho com as pipas entende que é inevitável voar. Logo ela, Judite, que tanto se transformou! Primeiro espetáculo, depois oficinas, livro, desenhos, música, audiolivro com narração de Malu Mader, contação de história, e até num encontro com crianças chamado “Despertando Judites”. É sobre essa parte da história que vamos falar aqui. Através do registro de fotos, texto, desenhos, esquemas coreográficos, esperamos que este material auxilie professores, possíveis multiplicadores dessa ideia, em trabalhos corporais e artísticos com seus alunos.
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Nos rastros da lagarta A escolha de Judite, ao que tudo indica, é mesmo viajar para muitos lugares. Seus desaparecimentos e surgimentos onde se menos espera, são como buraquinhos que se abrem para uma nova história que precisa ser contada através de caminhos e rotas que se bifurcam de um modo nada comum. Transparente em suas decisões, pois logo nos chama a atenção o rastro incomum que invade sem pedir licença os espaços-lugares onde pretende iniciar mais uma das suas estórias. Parece que, ao ficar olhando o mundo em cima da planta – comigo ninguém pode – está a imaginar aonde poderia ir. Sutilmente invade os ambientes sem ser convidada, pra te dizer coisas difíceis. Até na mala de Luiza a danadinha achou um meio de pegar carona para chegar a outras paragens... Talvez a quantidade de perninhas (quantas serão?) precisa ser rearranjada, porque a lagartinha aborboleta a todos por onde passa. Ela tem seus artifícios para chegar a lugares não imagináveis. Como nós, se transforma para dar lugar aos novos encantamentos. Invade, se aboleta, passa dias, absorve a todos, construindo vagarosamente e em silêncio
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Mas enfim... Judite... o que é? Quem é Judite? a roupa nova da borboleta que irá surgir... “Judite quer chorar, mas não consegue!” é um projeto de Dança, criado pelo coreógrafo e dançarino Edu O., em 2006. A coreografia aborda o medo, a resistência às transformações naturais e inerentes ao processo de amadurecimento e crescimento do homem. O espetáculo propõe, acima de tudo, uma reflexão sobre a solidão humana, questionando o ser indivíduo numa contemporaneidade padronizada e repleta de repetição de símbolos e ícones. A estética e pesquisa de movimento da obra são baseadas nas histórias em quadrinhos e nos desenhos animados. O trabalho que, inicialmente, não tinha como objetivo atingir especificamente o público infantil foi aos poucos absorvendo este público que hoje se tornou majoritário nas apresentações. As crianças se encantam com a história de Judite, uma lagarta que se recusa a virar borboleta com medo do mundo que a espera, até que sonha brincando com as pipas e vê a possibilidade de voar. Ao longo do tempo, o trabalho ganhou inúmeros desdobramentos, como: livro infantil, audiolivro narrado por Malu Mader, contação de história e oficinas de dança para crianças. Foi a partir da experiência obtida com os inúmeros workshops, ao longo das várias temporadas do espetáculo que nasceu a proposta “Despertando Judites”.
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de artesanato, atividades culturais e pedagógicas. O trabalho se centrou em desenvolver experiências perceptivas no campo da dança, através de jogos lúdicos, exploração espacial e de objetos vinculados à estória da lagarta Judite. Estrategicamente organizado, observava-se o interesse dos participantes quando um dado assunto era disponibilizado, para em seguida aprofundar em ideias que iam aos poucos ajustando as experiências em dança que se configuraram através da elaboração de estórias, exploração do objeto, elaboração de espaço (distâncias, aproximações, lados direito e esquerdo, etc). Os exercícios propostos buscavam meios para que em grupo ou individualmente, cada criança pudesse expressar suas ideias, sentimentos e conceitos que lhes são mais importantes. Logo, os princípios trabalhados buscaram meios para que as crianças se confrontassem consigo mesmas e pudessem expressar suas próprias visões de mundo. Fomentar a compreensão de espacialidades e sensibilização estética foi outro ponto de interesse desse projeto, consequentemente, o desenvolvimento da autonomia e da expressão corporal de cada sujeito de alcance artístico intensamente singular e intrinsecamente social. Este projeto se configura em estímulos de exploração de um ambiente construído ludicamente, onde os participantes (as crianças) encontram diferentes possibilidades para pesquisas corporais que possam interagir nos elementos dispostos no momento das proposições. Para isso, foram
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infância. Disse também que a lagarta ne m s e os da
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nome, idade e s o b r e os
O projeto Despertando Judites consiste na sistematização de procedimentos metodológicos para crianças com vista no desenvolvimento da criação de movimentos a partir da exploração dos elementos cênicos e da temática da obra “Judite quer chorar, mas não consegue!”, oferecendo um espaço para experimentação e criação artística junto a crianças e jovens. Visa também colaborar com a formação de professores, permitindo que estes vivenciem novas possibilidades de desenvolvimento Logo, além de conhecer o e crescimento dos alunos, a partir da utilização de novos mundo diretamente, pode elementos e novas formas de atuação. Assim, no período entre Novembro de 2012 a Abril de 2013 foi realizada a captar e comunicar seu conheprimeira experiência “Despertando Judites”, na Instituicimento de coisas e pessoas ção Beneficente Conceição Macedo (IBCM), localizada através de muitas formas simno bairro de Pernambués, em Salvador/Bahia. Nessa bólicas tais como, a linguagem, ocasião, o projeto contou com o apoio do Edital Setorial os gestos, os sons, bem como de Dança 2012 (SECULT/BA). A IBCM é uma organização sem fins lucrativos, fundada em 1989,dos pordiversos Conceiçãomovimentos do Macedo. A instituição atua na prevenção do HIV/AIDS e corpo. também oferece apoio às pessoas que convivem com o vírus, assistência a moradores de rua, acompanhamento a gestantes que possuem o vírus – para que a criança não venha a adquirir a doença no parto – creche em horário integral para crianças que convivem com o vírus, além de uma pesada campanha em combate a discriminação dos portadores do HIV/AIDS. A creche abriga 70 crianças que recebem reforço escolar, além das refeições e acompanhamento médico. Aos jovens são desenvolvidos cursos
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O Contato Improvisação é um modo de organização em dança que se constrói através de ações dialógicas entre os parceiros. Aborda o corpo a partir de um estudo mais profundo dos movimentos, estimulando ações baseadas em princípios de organizações reais, criadas no momento e na ação de atuar. Aqui o corpo é exposto repetidamente a novos modelos perceptuais e desafiadores através da escuta corporal. O contato é físico, mas se articula com o emocional que dá sentido e contextualiza a comunicação humana. Com esta prática o indivíduo é estimulado a descobrir sua própria linguagem, sendo encorajado a explorar seus movimentos. Cada um é agente tendo o controle sobre sua própria aprendizagem, possibilitando o fortalecimento da autonomia. A forma de dançar surge da experiência e das estratégias que o corpo pode estabelecer consigo mesmo e com o parceiro de dança. Esta característica de sociabilidade deste tipo de dança permite o improviso em conjunto, não importando o nível individual de conhecimento técnico ou corporal. É uma dança que pode ser praticada por pessoas de todas as idades e diferentes limitações corporais, por este motivo vem sendo uma fonte de informação sobre novos desenvolvimentos em dança e seu entendimento. Neste sentido o projeto se propunha a pensar uma dança implicada no desenvolvimento criativo-cognitivo e motor da criança, estimulando as potencialidades latentes para criar resultados significativos na criação e na aprendizagem
produzidos objetos relacionados aos elementos cênicos do espetáculo “Judite...”, como: um tapete representando a casa de Judite; um grande tecido pendurado para exploração do casulo; um túnel de tecido para que as crianças experimentassem o rastejar como lagarta, entre outros. Os exercícios foram orientados com o objetivo de estimular a criatividade através da dança, do brincar e da ludicidade, percepção corporal, noção de espacialidade, contato com o outro, utilização de diferentes linguagens artísticas como forma de auto-expressão, ajustando em si mesmo sua capacidade afetiva, cognitiva, ética, estética e de relação interpessoal, com o intuito de estimular a criação de histórias dançadas. Numa proposta que visava unir diferentes linguagens como literatura, artes visuais, dança, teatro e música, as crianças foram estimuladas a desenvolverem um roteiro com criação de personagem, corporalidades, ambientes, e construção de imagens. O projeto que desenvolvemos junto a esta instituição teve como princípio norteador das investigações corporais a técnica de dança do Contato Improvisação - Contact Improvisation - para ampliar potencialidades latentes na criação e aprendizagem de danças, compreendendo que processos e configurações corporais (sejam de que natureza for) são instâncias singulares. Ou seja, “Um corpo não transfere para o outro o que aprendeu, não há depósitos e adiantamentos de informações nos corpos. Experiência não se empresta.” (BITTENCOURT, 2012, p. 83).
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não conseguimos definir... É um mergulho no submundo pessoal de sensações que somos obrigados a marginalizar e até esquecer, um encontro daqueles sentimentos fortes e oponentes, que nos angustiam de uma maneira que deles fugimos... queremos chorar e não conseguimos porque não nos damos este direito, queremos voar e não nos permitimos porque muitas vezes duvidamos de nós mesmos... Enfim, assistir a este “experimento” é participar de uma metamorfose sentimental. É forte, é
CIRANDA DA ROSA
de danças que ocorrem no trânsito entre corpo/sujeito e ambiente/contexto pois: “Quando um corpo se move em dança, há todo um mundo que se move em torno e com ele. [...] Para que um corpo crie movimento um mundo de relações se estabelece. São acordos múltiplos, que se tecem entre o corpo (que por si só já é um conjunto plural) e o ambiente que se dobra e desdobra em contextos que orbitam em torno de danças sígnicas e participam dela. [...] Estamos falando de um corpo que problematiza os seus relacionamentos com o ambiente e busca soluções no próprio mover-se.” (TRIDPALLI, 2008, p. 10) “O corpo ao dançar, organiza o que antes era possibilidade, discerne lógicas de movimentos, informações de um processo. É corpo o tempo todo, não há mágica para se dançar. Corpo/ sujeito “vivente” e coimplicado no ambiente cultural, social, político, por isso, “coletivizado” e corresponsável na produção de informações, que aprende, porque aprender é o único modo para se continuar existindo e sobrevivendo no mundo.” (TRIDAPALLI, 2008, p. 24)
Brincar de roda como forma de socialização e aproximação entre o grupo. Foi feita uma ciranda onde a partir de músicas de roda, já conhecidas do grupo, como por exemplo: “O cravo brigou com a rosa”, “Alecrim dourado”, “Ciranda Cirandinha”, entre outras, pudéssemos introduzir os elementos que fazem parte do projeto. Uma ciranda que não se restringe apenas em andar em círculos, mas que evolua para danças construídas no momento, em colaboração com as crianças.
denso, é memorável.
Fernando Souza (pedagogo)
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2007
Pode-se dizer, a partir dessa reflexão, que a ação de construir significados (estabelecer coerências) trata de aspectos singulares a cada sujeito e determinantes na relação dinâmica e dialógica de criar e aprender. Tal experiência é possível de ser observada nos processos de criação, quan-
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io d e fic
do, por exemplo, os participantes (neste caso as crianças e os professores) estabelecem conexões, propõem aproximações, cruzam informações, e provocam outras organizações, afinal, não se constrói o novo do nada, trata-se sempre de outras articulações. Incluímos nesta observação os professores, pois sabemos também da necessidade de instrumentalização para lidar com a criação como processo de aprendizagem para professores do ensino infantil. Embora esta proposta não tenha sido uma oficina direcionada para esses profissionais, eles também foram contemplados na medida em que foram convidados a participarem como ouvintes e colaboradores nos dias de oficina. Possibilitando assim, a compreensão do que foi trabalhado com tal proposta de entendimento da dança, favorecendo a manutenção dos conceitos trabalhados e possibilidades criativas no desenvolvimento corporal da criança. A seleção das proposições, imagens, desenhos, fotografias e dos objetos utilizados nas oficinas junto ao grupo de crianças da IBCM, seguiram caminhos que, e de acordo com os assuntos elencados, deram margens a outras invenções. Isto porque, à medida que os participantes tinham acesso às proposições, as relações que eles estabeleciam com os objetos elencados foram disparadoras de ideias (espaciais, gestuais, comportamentais),
Cada componente indica um tipo de movimento para a ciranda girar.
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1- As crianças ao entrarem na sala se deparavam com um tubo enorme de tecido colorido. Esse outro ambiente estimulava a imaginação, além de exigir diversas organizações no corpo para se locomover num espaço restrito. Assim, atravessavam a sala como bichinhos da terra, ora se arrastando, ora empurrando e, em outros momentos, como bolinhas risonhas. A participação foi geral.
que exigiam do grupo de professores imediatas reorganizações do assunto. Não se pretendia deixar escapar o que se estava construindo/despertando no momento. Caracteristicamente, um processo colaborativo que observa a escuta do outro, suas necessidades e proposições entendidas como um bem comum, no desejo de alcançar certos resultados que facilitassem o acesso ás informações que iam surgindo no percurso de cada encontro.
Metodologia da Lagarta
2- Um circuito construído com várias faixas de fita adesiva colorida cruzando o chão, trabalhando o equilíbrio e estimulando a criatividade com variação de deslocamento. As crianças só podiam se deslocar em cima da fita, como se fosse uma corda-bamba. Utilizavam os pés, pés e mãos, pés-mãos-costas, sentadas, etc... Pulavam, corriam, andavam em câmera lenta, de costas...
O curso foi dividido em quatro módulos, havendo fusão entre as atividades, de acordo com as necessidades. A divisão em módulos não significava uma cronologia de execução, mas uma organização e sistematização dos conteúdos e atividades logicamente inter-relacionadas e flexíveis:
Módulo I Se esta rua fosse minha
3- Um tapete vermelho foi estendido no chão, servindo como um espaço/lugar para apreciação das demais atividades. Um momento onde as crianças podiam escolher apreciar o que os outros colegas faziam.
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No mundo cultural os símbolos e simbolizações são tão intensos que é difícil encontrar nessa esfera algo que não tenha significado. Esse é um ponto de interesse do projeto, por isso mesmo o uso de objetos cênicos e suas respectivas reconfigurações teve papel importante na exploração de sensibilizações. Basta olharmos a própria vida
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Foram criados 3 ambientes proporcionando diferentes explorações:
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JARDINS E BORBOLETAS PARA JUDITE
EXPLORANDO ESPAÇOS
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Utilizando papel A4 e lápis de cera, as crianças pintam com uma única cor as bordas do papel e em seguida transformam este papel numa flor para compor um jardim para Judite (a escolha da cor e forma da flor fica a critério de cada aluno). Em seguida, pintaram outro papel com três ou mais cores (quanto mais colorido melhor) e fizeram um leque com este papel. Ao apertar o centro do leque, este ganha uma forma parecida com uma borboleta. Com esta borboleta em mãos, as crianças são estimuladas a criarem vôos.
No dia em que esta atividade foi realizada, surgiram diversas propostas muito interessantes. Algumas faziam o pouso da borboleta em partes do corpo, outras corriam batendo as asas de papel ao redor do jardim de flores. Estimulamos a observação do barulho que a borboleta de papel fazia que se assemelhava aos de asas reais, buscando despertar a atenção para sutilezas que possam surgir. Terminaram esta atividade cantando, espontaneamente, a música “Borboletinha”.
cotidiana que nos deparamos com um fluxo intenso de símbolos, compreende-los é algo necessário em todos os aspectos para podermos estabelecer as relações possíveis, aquelas em que um elemento determinado ou um conjunto de elementos ali contidos representam certos objetos ou experiência do mundo, inevitavelmente, esses símbolos invadem o território da arte. Assim pensado, os trabalhos observavam aspectos como trabalho de espacialidade, explorando a arquitetura existente no local de trabalho, os ambientes que foram construídos com os elementos próprios da pesquisa, os espaços do corpo e espaços imaginados, e também reconhecimento dos espaços, apropriação destes, “corporificação” dos espaços construídos com os objetos produzidos a partir dos elementos cênicos. De forma gradativa buscamos trabalhar o empoderamento nas crianças, compreendendo o corpo também como espaço a ser descoberto.
Módulo II Mão na massa Criação dos objetos para a pesquisa (casulo de tecido, tapete com a trajetória de Judite, tubo de tecido), trabalhos manuais com massa de modelar/argila dando corpo a objetos, desenhos, objetos em arame, colagem e pintura. Neste módulo foram aplicadas, a partir dos objetos, as propostas corporais oriundas do espetáculo Judite quer chorar, mas não consegue!
Borboletinha tá na cozinha Fazendo chocolate para a madrinha Poti, poti Perna de pau Olho de vidro E nariz de pica-pau (pau, pau) 13
A TURMA DO JARDIM P lant
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Este encontro visava estimular a conversa entre as crianças/participantes e educadores para a aproximação afetiva com a equipe do projeto. Para isso,
1. Foi solicitado que as crianças recriassem a história de Judite que já haviam escutado, acrescentando o nome de um colega que continuaria a história a partir do ponto que o primeiro finalizasse. (pode fazer essa atividade com histórias conhecidas das crianças) 2. A partir do que as crianças falavam e do que surgia nas falas, as outras faziam os movimentos. Eles criaram histórias com leão, cobra, passarinho, lagarta, borboleta, etc. 3. O tapete de Judite servia como um espaço de transformação e a proposição era de quando entrar na área verde do tapete, eles tinham que imitar um bicho para o grupo adivinhar. 4. Repetiam o bicho escolhendo um colega que deveria copiar o movimento. Esta atividade foi bastante interessante para a observação e concentração do grupo. Os meninos mais dispersos não conseguiam copiar detalhes dos movimentos do outro, o que era bem evidente em quem estava atento ao que havia sido solicitado. Os alunos de 2 anos eram os que mais se aproximavam do que o que colega fazia.
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as cores do arco ír o ã s is. Ír ete S is é um . e t e s a cois a os o
guimos alcançar. e s n o c e u oq h n a m a ot m e t o que tem nos olh os... Você vê? O abism Borboletando Conclusões
Módulo III Quem conta e canta um ponto dançado... Coreografando histórias no corpo; Produção de textos; Contação de história. Estimular a criação de histórias próprias, criando novas Judites a partir das experiências e interesses de cada participante, o que acarretou num trabalho complexo, com inúmeras possibilidades corporais vivenciadas tanto individualmente quanto coletivamente, quando as crianças compartilhavam suas experiências, movimentos e suas danças. Trabalhou-se também com Contação de Histórias e cirandas de músicas infantis, com intuito de estimular a produção de novos textos, estimular a fantasia, a criatividade, construção de novos ambientes.
Módulo IV Olhando a história através da máquina Registro em fotografia organizado pelos participantes das oficinas, buscando valorizar as sensibilidades dos diversos olhares. Bem como chamar atenção para novos olhares através de recortes espaciais, percepção de detalhes e do todo, e observação de texturas.
...este espetáculo me remete às minhas Judites... até mesmo as mais inconscientes gritam querendo sair! Um encontro com conflitos mais íntimos, que incomoda e seduz com ousadia e beleza, num convite à vida que se deseja viver...
Lívia Rocha (Pedagoga)
Pudemos observar durante todo o processo de realização do projeto Despertando Judites que estreitar a relação entre o publico infanto-juvenil e a arte é uma ação importante para o estímulo da sua formação integral. Gardner (1994), explica que durante as etapas de habilidades artísticas dos anos pré-escolares, não é necessário intervir ativamente. Para ele, basta facilitar os materiais para que esses pequeninos se envolvam em suas próprias imaginações, muitas vezes despercebidas pelos professores. Criar, inventar, imaginar são ações que envolvem certos níveis de interpretação e organizações neuronais (HERNANDEZ, 2010; GARDNER,1994). Muitas crianças vivem envoltas por mensagens estéticas em seu cotidiano e muitas vezes tais mensagens não são aproximadas de uma reflexão, não possibilitam uma interação aprofundada ou um olhar crítico sobre as mesmas e os símbolos (artísticos ou não) que ali estão dialogando. Gardner (1994) chama a atenção para o fato que desenhos e metáforas fazem parte do universo infantil, e que a compreensão da infância se limita a seus encontros reais com os objetos e pessoas de seu mundo. Logo, além de conhecer o mundo diretamente, pode captar e comunicar seu conhecimento de coisas e pessoas através de muitas formas simbólicas tais como, a linguagem, os gestos, os sons, bem como os diversos movimentos do corpo. Viabilizar os instrumentos para que a criança na tenra idade exercite sua via artística tem lugar de interesse nesse projeto.
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CORRIDA DA LAGARTA
CASULOLÁGRIMA Uma malha azul foi pendurada no centro da sala, formando um grande casulo onde as crianças entravam e exploravam o material através de indicações de espreguiçar, encolher, trabalhando expansão e contração e também eram estimuladas a explorarem livremente, mesmo que fosse apenas para sentir o conforto e o aconchego daquele material.
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Esta atividade tinha por objetivo promover a construção da individualidade dos participantes e pode ser realizada com qualquer história infantil.
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Após essa vivência, foi distribuído papel cartão colorido e massa de modelar, para que a turma fizesse a transposição do que foi visto, criando cada um as suas Judites em técnica de modelagem.
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Em dupla, abraçados, os alunos devem atravessar a sala rolando no chão. Não pode perder o contato em momento algum. Observar a transferência de peso, cuidado com o colega, pontos de apoio.
As crianças foram estimuladas a relembrar (verbalmente) tudo o que tinham visto/experimentado anteriormente. Organizadas em círculo tinham um tempo para falar sobre o vídeo e também listar os elementos cênicos e de figurino de Judite.
porque, quando trabalhamos sob a perspectiva da arte, sejam elas em qualquer linguagem, os dispositivos perceptivos que são acionados, como bem explica Fernando Hernandez (2009), Arte Educador, não separa o sujeito que aprende e o que ensina (com suas inquietudes, temores ) do processo de ensinar e aprender a compreender o mundo e as situações emergentes. Aqui se encontram implicadas as relações dos sujeitos consigo mesmo e com os outros. A possibilidade de favorecer uma concepção do sujeito que é capaz de se apaixonar por aprender de forma crítica se a oportunidade lhe é dada.
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O CASULO DE JUDITE
Sabe-se, e é evidente, que a cidade, os museus, os objetos domésticos e escolares, apresentam informações que vão ao longo do tempo moldando o olhar e o pensamento estético de meninos e meninas envoltos nesses contextos, inclusive os adultos. Gardner (1994) explica que quanto mais acesso a trabalhos artísticos que favoreçam experimentos e que possam ser criados livremente quando pequenos, a chance de voltarem a retornar a essas atividades artísticas é grande. Logo, ao propor experiências em arte, para crianças, de maneira autônoma e criativa, se estará favorecendo a exploração do seu potencial criativo e imaginativo. Ou seja, estimulando-as a conhecer produtos de diferentes linguagens artísticas a partir de seus próprios critérios de seleção, o que as posicionará como agentes ativos em sua percepção. Desafios que instigam sua curiosidade e abrem as brechas para as possíveis relações entre suas diversas capacidades de crescimento e aprendizagem pessoal e cultural. Através da arte o sujeito acessa seus conteúdos internos integrando o consciente ao inconsciente reestruturando comportamentos e ações. Certamente, o acesso ao meio artístico lhe proporcionará uma via especial, e até única, de abordar temas importantes que, enquanto jovens, ainda não conseguem explicar verbalmente. Foram muitos os desvios e frutíferos os alcances desse projeto até o momento, no entanto, acreditamos que essas ações poderão, num futuro próximo reverberar em suas vidas. Isto
Pela primeira vez as crianças tiveram contato com imagens do espetáculo “Judite quer chorar, mas não consegue!” a partir da exibição do DVD de uma apresentação.
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A brincadeira consiste em se locomover como uma lagarta (deixando a criança livre para criar o seu próprio movimento. Cada uma cria a sua maneira de andar) até um ponto de chegada. A regra principal é se deslocar lentamente. O objetivo é ser o último a chegar.
NASCENDO NOVAS JUDITES
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GARDNER, H. Educación artística e desarollo humano. Barcelona: Ed. Paidós, 1999. GREINER, Cristine; KATZ, Helena. Por um teoria do corpomídia. O corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Ed. Annablume, p. 125-134, 2005. HERNANDEZ, Fernando. Educación y Cultura Visual. Barcelona: Ed. Octaedro. 2010. MACHADO, Adriana. A natureza da permanência: processos comunicativos complexos e a dança. Dissertação de Mestrado – PUC/SP, São Paulo, 2001.
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TRIDAPALLI, Gladistoni. Aprender investigando: a educação em dança é criação compartilhada. Dissertação de Mestrado – UFBA/BA, Salvador, 2008.
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Equipe Aborboletada Idealização: Edu O. Artistas-educadores: Edu O., Lucas Valentim e Ana Luiza Reis Coordenação pedagógica: Fátima Daltro Consultoria pedagógica: Nilzete Araújo Elaboração dos brinquedos pedagógicos: Dinorah Oliveira e Nei Lima Video: Victor Venas Fotografia: equipe do projeto Produção Executiva: Catarina Gramacho Assistente de produção: Nei Lima Projeto Gráfico, Diagramação e Tratamento de imagens: Fernanda Pinheiro (nandapc) Revisão: Ingrid Oliveira
Equipe IBCM Coordenador Administrativo: Alfredo Dorea Presidente: Maria Conceição Macedo Coordenadora: Creche Ana Paula Nery Secretária: Gilcelia Souza De Santana Assitente Social: Mariana Guedes Auxiliares de Classe: Luciana Pereira Araujo Barbosa, Edilene Pareira Arújo, Diana Araújo Do Carmo, Janete Grizostom
d o s.
BARBOSA, Ana Mae; COUTINHO, Rejane. Arte/Educação como Mediação Cultural e Social, (org.). São Paulo: Editora UNESP, 2008.
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Referências Bibliográficas
Foram utilizadas almofadinhas em formato de frutas para trabalhar com pontos de apoio do corpo. As almofadas eram colocadas em lugares estratégicos, onde as crianças deveriam se apoiar com os cotovelos, joelhos, nádegas, cabeça, ombros, provocando desafios ao corpo. Mobilizar diversas partes do corpo para encontrar certos equilíbrios, mesmo que temporários, estimulam diversas valências físicas que se relacionam á coordenação motora como um todo (psicomotricidade), ajustes corporais que vão otimizando a organização em diversas estruturas do corpo. A criança faz uma pose e em seguida, um colega distribui as almofadinhas em pontos estratégicos do corpo como cotovelos, joelhos, ombros, cabeça, mãos ou pés. Como você consegue se movimentar sem deixar cair as almofadas? Que saberes do corpo é aqui acionado? Uma infinidade de ajustes dialogam internamente ajustando os segmentos, a distribuição e descarga do peso, o entendimento do lugar/posição do corpo em relação ao ambiente. E tudo isso elaborado pelo corpo.
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1. Foi produzido um tapete com base de carpete, onde foram colocados objetos artísticos que foram utilizados em “Judite” elementos referentes à obra Judite quer chorar... (borboletas, frutas, flores, folhas) feitos com pelúcia, material plástico de diversas texturas, tecido e espuma, como estímulo à diversas sensações. Para proporcionar mais oportunidades de exploração das crianças, dividimos a turma das crianças maiores, trazendo assim uma experiência muito rica para o trabalho proposto. Tínhamos planejado desenvolver diferentes qualidades de movimentos nos elementos que o tapete trazia. Porém, ao longo do encontro percebemos que havia uma necessidade prévia de exploração do que estava sendo apresentado a eles pela primeira vez. Assim, trabalhamos com noções espaciais, com as coerências individuais e partilhadas das formas de arrumação, relação com as diferentes texturas e exploração das noções de respeito e convívio. 2. Lançamos alguns problemas para eles resolverem como, por exemplo, se eles morassem naquela casa e tivessem com frio, como fariam, onde dormiriam, onde seriam os espaços de descanso? As dicas estimulavam o imaginário possibilitando a criação de redes de referências que sincronizavam com as suas experiências particulares. Analogias surgiam (e convocando eles a fazerem analogias) entre o que eles conheciam como sofá, cama, cozinha, sala de lanche e ou cozinha, e como seriam esses elementos na casa de uma lagarta. Os espaços macios eram sempre relacionados com cama e espaços de descanso.
FLORES NO CAMINHO
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Currículos dos autores
Carlos Eduardo Oliveira é Mestre em Dança pelo PPGDANÇA/UFBA, Bacharel em Artes Plásticas, com especialização em Arteterapia, coreógrafo/intérprete do Grupo X de Improvisação em Dança. email: eduimpro@gmail.com
PRODUÇÃO
Profa. Dra. Fátima Campos Daltro de Castro - Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia/UFBA. Pósdoutorado pela Faculdade de Belas Artes-Universidade de Barcelona-CAPES/MEC/2011. Líder do Grupo de Pesquisa “Poética da Diferença”, articulando a pesquisa artística e acadêmica, com ênfase em acessibilidade. Membro do Colegiado de Dança/PPGDANÇA. Diretora/ coreógrafa/dançarina do Grupo X de Improvisação em Dança. E-mail: fadaltro@gmail.com Lucas Valentim é mestre em Dança pela UFBA. Desde 2007 vem atuando junto ao Núcleo VAGAPARA- coletivo de artistas residentes em Salvador/BA. Desenvolve diversos trabalhos artísticos e pedagógicos onde vem atuando enquanto professor, ator, diretor, dançarino, coreógrafo e produtor. Email: lucas.valentim0@gmail.com
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Ontem foi dia de Casulo. Abraço forte. Casulo-tecido, Casulo-faixa, Casulo-colo. Trabalhar com crianças pequenas amplia muito as possibilidades do que planejamos, das ideias que levamos para compartilhar com elas. Ontem Judite esteve presente no medo que sentiram de terem movimentos limitados, da falta de liberdade que uma determinada atividade propunha e então voaram colorido. Quanto mais eu penso no que acontece ali naquela sala, de como vamos construindo com eles e a mente cheia de emoção e elaboração não descansa e o corpo, ao chegar em casa, cai como morto, como quem pede socorro. Os olhos sempre brilhando e o colo que é nosso acaba sendo abraçado pelos corpos-lagartas-borboletas daqueles meninos.
Edu O.