Abeta Summit 2019

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Foto: Praia de Indaiauba - Aurelio Rufo - Sectur Ilhabela

Sejam bem-vindos a Ilhabela!!!! O ABETA SUMMIT 2019 é bem especial, celebramos este ano, o aniversário de 15 anos da ABETA! Chegar até aqui foi uma jornada de lutas, vitórias, derrotas, alegrias e tristezas, como é a vida. Mas estamos vivos e seguimos lutando, em nossa busca de ajudar o Brasil a se transformar num lugar mais civilizado, socialmente justo e modelo de sustentabilidade para o planeta. O maior Encontro Brasileiro de Ecoturismo e Turismo de Aventura, acontece sem interrupções desde 2003, e reúne as pessoas e as empresas mais comprometidas com nosso sonho de transformar o Turismo de Natureza do Brasil, na melhor referência mundial do segmento. A ABETA e seus associados, acreditam que esse é um sonho possível. Acreditamos na força da cooperação, do associativismo, do profissionalismo e da boa vontade. Nossos agradecimentos à comunidade de Ilhabela que nos acolheu de braços abertos e nos apoiou; a prefeitura municipal, em especial a Secretaria de Turismo, que não mediu esforços para superar os desafios da realização do evento, e ao trade turístico local, que se uniu em torno da ABETA para que vocês, participantes do congresso, tenham em Ilhabela, uma experiência inesquecível no desfrute da Vida Natural. Aproveitem cada momento! Teriana Selbach, Presidente da Abeta

Nosso arquipélago vive um momento importante no turismo e o Abeta Summit vem agregar com as ações e direcionamentos que vamos seguir. Ilhabela é muito mais que belas praias, somos a maior reserva de Mata Atlântica da atualidade e esse título nos abre grandes possibilidades tanto no turismo de aventura como no ecoturismo. Queremos atrair um novo público, que esteja interessado em toda essa beleza que nos cerca, se aventurando por nossas trilhas, matas e mar, sempre de forma sustentável e ajudando a fomentar e preservar esse paraíso.

Abeta Summit 2019

3a edição - Ano 3 - Agosto 2019

5 15 anos de vida natural

14 Turismo náutico: uma questão cultural?

8 Exuberante beleza!

18 Percepções sobre a Educação ao Ar Livre

10 ABETA Summit: a vida ao ar livre se encontra aqui

24 O papel do Turismo de Natureza na economia

12 Turismo de Base Comunitária resgata cultura caiçara e promove experiências genuínas em Ilhabela

28 Monitoramento e avaliação do cicloturismo no Brasil. Como estamos e para onde podemos ir?

ABETA - Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura

expediente

Maria das Graças Ferreira, Prefeita de Ilhabela

Presidente: Teriana Selbach Vice-presidente: Vinícius Viegas Diretor de Relações Institucionais: Marcos Dias Soares Diretor de Qualificação e Sustentabilidade: Tiago Correa Diretor de Comunicação: Fernando Angeoletto Diretor de Mercado: Vinícius Martins Diretora Técnico: Pollyana Pugas Diretor Executivo: Luiz Del Vigna Gestora Executiva: Andréia Moraes

Edição Diagrarte Editora Ltda-ME www.diagrarte.com.br (19) 99932-1809 contato@diagrarte.com.br Jornalista Responsável e Projeto Gráfico: Elaine Cristina Pereira (Mtb 15601/MG) Revisão: Marília Bustamante Abreu Marier Foto capa: Luís Daniel Molinari Impressão: Gráfica Mundo Distribuição Gratuita - impressa e eletrônica

Os artigos assinados são de responsabilidade de seus autores Direitos reservados. Para reproduzir é necessário citar a fonte. Para versão eletrônica acesse www.diagrarte.com.br/ naturale-edicoes www.abeta.tur.br Impresso no Brasil com papel originado de florestas renováveis e fontes mistas.


15 anos de vida natural:

a história da ABETA e da cultura da vida ao ar livre no Brasil O ano era 2003. O país, continental e com rica variedade de relevos e ecossistemas, levava a fama do turismo de sol e praia, e nada mais. Mas alguns “malucos” inquietos, entre guias, condutores, empresários e operadores do turismo, além de esportistas e entusiastas da cultura ao ar livre criaram, após um encontro numa feira de turismo, um grupo de discussão na internet. Este movimento virtual foi a semente que contribuiu, em 2004, para a criação da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura, a ABETA. O tempo passou. Lá se foram 15 anos de uma até então nova cultura instaurada no turismo brasileiro: a da vida natural, do ecoturismo e do turismo de aventura. “Foi realmente um momento muito interessante e marcante na nossa vida e para o país como um todo. Através do grupo de discussões na internet, começamos algo do zero, algo que até então não existia”, afirmou o primeiro presidente eleito pela ABETA, Felipe Aragão. De acordo com ele, não havia ninguém, nenhuma associação ou grupo que pudesse defender os segmentos ecoturismo e o turismo de aventura. “Começamos a frequentar eventos de turismo, como o da ABAV, da Adventure Sports Fair e da Braztoa.

Fotos: Ion David

Por Márcio Mecca

Com o auxílio do recém-criado Ministério do Turismo, conseguimos sair da informalidade para criar oficialmente a ABETA. A missão era representar e qualificar o segmento da vida ao ar livre e promover essa cultura, mas sem tomar o lugar de ninguém, reunindo e juntando quem acreditava nessa proposta”, explica Aragão. No início da formação da entidade, “o maior desafio foi justamente reunir os empresários do turismo de natureza. Queríamos trazer essas pessoas com um espírito mais livre que ainda não se sentiam representadas. O outro desafio foi manter esse grupo unido, sair da inércia, pensar e agir”, lembra Luiz Del Vigna, empresário, associado e co-fundador da ABETA. Esse cenário foi a oportunidade ideal de aliar o amor pelas atividades ao ar livre à atuação profissional no segmento, compartilhando com outras pessoas os benefícios do contato com o espaço natural e o imenso potencial de prazer e contemplação. Ao lado do presidente Aragão, a primeira diretoria da história da ABETA foi formada por Gustavo Timo, Massimo Desiati, Ion David, Israel Waligora e Ronaldo “Nativo” Franzen Jr. Corrobora com essa visão o exministro do Turismo Luiz Barretto, que reforça o papel e a importância da 5

Agosto 2019


ABETA desde a criação. “À época, o Brasil era muito focado no segmento tradicional, de sol e praia, mas precisávamos dar outras oportunidades para novos setores da cadeia do turismo. A criação da associação permitiu ao Brasil chamar atenção a um segmento que tem um poder enorme para ser um vetor econômico, gerador de renda e riqueza. E que ainda vai crescer muito”, comenta ele. Foi aí que entrou a ABETA, que teve um papel crucial no desenvolvimento de um setor tão importante, que une a qualidade da vida natural com a sustentabilidade. “Nosso papel é defender os interesses do setor e inspirar os associados e profissionais da vida ao ar livre, empresários e agentes do poder público. Trabalhamos para inspirar e inspiramos para transformar. Estimulamos o trabalho com o turismo de forma responsável, consciente e com respeito ao meio ambiente”, reforça Luiz Del Vigna, o Luizão, atual diretor executivo. Desta forma, lembra ele, “é possível desenvolver mais os negócios, potencializando os destinos turísticos e, por consequência, o ecoturismo e o turismo de aventura como um todo”. Os 15 anos da ABETA comprovam a assertividade da associação na proposta pela vida natural, superando os desafios, crescendo de forma sustentável e participando do desenvolvimento social, turístico e econômico do país. Segundo a atual presidente da entidade Teriana Selbach, “o segmento cresceu, apareceu e amadureceu. Ao longo desses anos, a ABETA trabalhou com foco na formalização empresarial, na qualificação profissional e na sustentabilidade”. O objetivo? Transformar em realidade o sonho que acompanha a associação e inspira os atores do segmento desde o nascimento: tornar o Brasil a referência mundial em turismo de natureza. E fazer do turismo a maior fonte de receitas internacionais.

A força do associativismo e o poder da representatividade É importante destacar que a ABETA, sem a força do conjunto, não é nada; e sem esse conjunto não há desenvolvimento no turismo de natureza. O que move a associação é a força do associativismo, a ideia de que “juntos somos mais fortes”. Com quase 200 associados localizados nos estados brasileiros, a entidade tem a organização e a união necessárias para ter representatividade junto ao governo. 6

Dentro deste grupo, estão agências de viagem, parques temáticos, atrativos turísticos, meios de hospedagens, organizadores de eventos, escolas de atividades ao ar livre, consultores e instituições comprometidas com a cultura da vida ao ar livre, que formam uma rede conectada, antenada e especializada em diferentes atividades turísticas, e oferecem experiências e vivências, com a máxima segurança. “Fundamos a ABETA porque precisávamos de uma entidade representativa. Ou o setor se envolvia e ganhava poder de organização e governança, ou seríamos alijados do processo. Assim, a ABETA é uma resposta a normalização do setor de ecoturismo e turismo de aventura”, explica o ex-coordenador geral Gustavo Timo. São estas empresas que, juntas, comprovam o papel e a relevância deste setor para o Brasil e para o mundo, estimulando a criação de políticas públicas e a destinação de recursos para gerir e qualificar os segmentos de Ecoturismo e Aventura. As constantes parcerias firmadas com o Ministério do Turismo, Sebrae nacional e estaduais, CNC, Braztoa, ATTA, Embratur, Secretarias de Turismo dos Estados e Municípios e demais órgãos públicos e privados, só são possíveis porque existe uma demanda organizada e concentrada por parte dos empresários. “É a força do associativismo que consegue sensibilizar o governo da importância do segmento e captar investimentos públicos, como o consagrado Programa Aventura Segura”, avalia o ex-presidente da ABETA Israel Waligora.

O que foi o Programa Aventura Segura? Se houve algum tempo em que praticar ecoturismo e turismo de aventura no Brasil significava riscos, hoje a situação é bem diferente. Afinal, os turistas precisam – e merecem – curtir a natureza com toda a segurança. A emoção e aventura continuam, mas agora o ecoturismo e turismo de aventura podem ser sinônimos de descobertas, diversão e segurança para todos os amantes da vida ao ar livre. É turismo com prazer e diversão, é claro, mas também com gestão, procedimento, normas e qualificação. E o que deu a esse turismo novos contornos e possibilidades foi o Programa Aventura Segura, o PAS, que trouxe um diagnóstico e perfil do segmento à época. Iniciado em 2006 em parceria com o Ministério do Turismo e o Sebrae Nacional,


Fotos: Ion David

a ABETA executou o Programa Aventura Segura, que foi baseado no desenvolvimento e aplicação de 32 Normas Técnicas (hoje já são 37) para o segmento de Turismo de Aventura e Ecoturismo. O resultado foi mais do que positivo: quase R$ 5 milhões investidos, com impacto em mais de 5 mil pessoas qualificadas nos cursos presenciais e à distância, com 480 empresas mobilizadas, de 17 regiões do Brasil, em 13 estados diferentes. O PAS também foi um verdadeiro marco do turismo brasileiro, já que permitiu às micro e pequenas empresas do ecoturismo e turismo de aventura estarem mais preparadas para receber os turistas e oferecer as atividades ao ar livre. Em sintonia com o Projeto de Normalização e Certificação em Turismo de Aventura, iniciado em 2003, e com o importante apoio do Sebrae, o Brasil alcançou quase uma centena de pequenas empresas com a certificação em Sistema de Gestão da Segurança de Turismo de Aventura. São essas normas que definem as responsabilidades da empresa na operação segura das atividades, tais como caminhadas, rafting, arvorismo, cicloturismo, cavalgada, mergulho e tantas outras. “Nós criamos uma rede muito forte e, com isso, conseguimos apoios muito importantes para a execução do Programa. Esse fortalecimento da governança local foi fundamental para os resultados positivos que obtivemos”, afirmou Leonardo Persi, atual Coordenador de Normalização e Certificação da ABETA. Este fato coloca o Brasil como um dos países que mais realiza ações para criar diferenciais competitivos para o empresariado, com foco na operação segura e de qualidade do turismo de natureza. “O Brasil é o país com o conjunto mais consistente de normas voltadas para o segmento de turismo de aventura e ecoturismo. A participação da ABETA neste processo é fundamental, o que demonstra a importância do associativismo e da organização do segmento”, explica Persi. De acordo com Gustavo Timo, coordenador do projeto à época, “as normas deveriam transformar o cenário da operação do turismo de aventura no Brasil, contribuindo para a organização do conhecimento disponível e criando uma referência para a operação segura e responsável dessas atividades”. E transformaram. Não só pela certificação, qualificação, capacitação de profissionais

e empresas, mas também pela criação de manuais de boas práticas voltados ao segmento. O conteúdo técnico direcionado aos empresários e profissionais do setor tinha a missão de traduzir as Normas Técnicas criadas para uma linguagem mais acessível e próxima dos operadores de turismo. Ao todo foram 11 manuais, sobre os temas: Gestão Empresarial, Sistema de Gestão da Segurança, Competências Mínimas do Condutor de Turismo de Aventura, Arvorismo, Caminhada e Caminhada de Longo Curso, Canionismo e Cachoeirismo, Escalada, Espeleoturismo, Turismo Fora de Estrada, Rafting e Acessibilidade em Ecoturismo e Turismo de Aventura. Neste cenário, a ABETA comemora 15 anos de vida natural conectada com tudo o que acontece no segmento. Seguindo firme na missão de capacitar o setor e promover a cultura da vida ao ar livre, abraçando, congregando e unindo todos e todas em prol do sonho que é tornar o Brasil uma referência ainda maior no turismo de natureza. Com o segmento de ecoturismo e turismo de aventura sendo o que mais cresce a cada ano mundialmente – com índices próximos a 20% de crescimento, segundo a OMT (Organização Mundial de Turismo) –, o Brasil já foi reconhecido pelo Fórum Econômico Mundial como o país com o maior potencial mundial para o uso de recursos naturais pelo turismo. Apesar de estarmos no caminho certo, é sabido que ainda falta muito para transformar os recursos naturais e culturais em negócios inovadores, criativos e sustentáveis. Institucionalmente, a ABETA, por meio do Conselho Nacional de Turismo do MinTur e do Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade da CNC, sempre procurou sensibilizar o poder público e a iniciativa privada sobre o papel e a importância do Turismo de Natureza na economia brasileira, produzindo riqueza, emprego e impostos de forma sustentável. “Mas só chegaremos lá quando enxergarmos que sozinhos não temos a força de transformação. Cabe a todos nós lutar pelo sucesso e pelos ideais de nosso segmento e da nossa entidade. A causa é de todos nós, e se a causa é legítima, a força dela também será”, avalia Teriana. “Juntos podemos influenciar políticas públicas, combater a informalidade, profissionalizar ainda mais o segmento, estimular a preservação ambiental, o respeito às leis e promover a vida ao ar livre e a valorização do patrimônio natural, cultural e cenográfico do Brasil”, conclui a atual presidente da ABETA. 7


Exuberante beleza! Por Bianca Colepicolo

Tais características criam uma rica flora, com árvores centenárias, e fauna, com mais de 350 espécies de aves, entre elas o papagaiomoleiro, eleito a ave símbolo da cidade. Além de uma grande diversidade de vida marinha que conta com baleias, golfinhos, tartarugas, raias, polvos, corais e muitas espécies de peixes. Se não bastasse a exuberante beleza natural, o imaginário dos visitantes também é estimulado com histórias e lendas de piratas e tesouros contadas em uma das 14 comunidades tradicionais caiçaras espalhadas pela ilha. Para completar a experiência, há mais de oito mil leitos em meios de hospedagem, variada gastronomia, passeios em embarcações e jipes off-road e muitos eventos culturais ao longo do ano. O ABETA Summit não poderia vir em hora mais apropriada. Uma honra que nossa casa seja a casa da ABETA!

Foto: Praia Vermelha - Aurelio Rufo - Sectur Ilhabela

O arquipélago, localizado no Litoral Norte do Estado de São Paulo, possui as dez maiores montanhas insulares do país e 84% de Mata Atlântica totalmente preservada no meio do oceano. Por este motivo, seu Parque Estadual é considerado Patrimônio Natural e Reserva da Biosfera pela Unesco. Ilhabela não poderia ter escolhido outro sobrenome que não fosse “Vida natural”. As 42 praias cenográficas e a charmosa vila caiçara fizeram do nosso município um destino de veraneio glamoroso, mas com a evolução dos conceitos de Turismo Sustentável e Turismo Regenerativo, nós apostamos no Ecoturismo e na Aventura para embasar o desenvolvimento econômico de Ilhabela. Temos trilhas que proporcionam aventuras até picos com mais de mil metros de altura, paisagens únicas, refrescantes cachoeiras, área de mangue e extensa faixa costeira.



Foto: Alexandre Cappi

ABETA Summit:

a vida ao ar livre se encontra aqui Por Márcio Mecca

O Congresso Brasileiro de Ecoturismo e Turismo de Aventura – ABETA Summit nasceu antes mesmo da criação da ABETA. Foi em 2003, dentro da Adventure Sports Fair, graças ao parceiro Sérgio Franco e suas sempre pioneiras iniciativas em prol do ecoturismo e turismo de aventura. O evento tomou corpo, cresceu e amadureceu, assim como a própria ABETA. Ao longo desses 16 anos, o ABETA Summit foi realizado em outras edições da Adventure Sports Fair e da ABAV, antes de “quebrar” as fronteiras e organizar o evento com o DNA da associação e a cara do segmento, ao ar livre e em meio à natureza. Com o apoio das secretarias estaduais de turismo e inúmeras associações e entidades parceiras, além dos associados ao redor do Brasil, o ABETA Summit já percorreu as cidades de Socorro-SP, Brotas-SP, Três Coroas-RS, Território Mantiqueira (Santo Antônio do Pinhal-SP, Campos do Jordão-SP e Gonçalves-MG) e Conceição do Mato Dentro-MG. Neste ano, a 16ª edição ancora em Ilhabela, no litoral paulista. “Para nós é o grande momento em que nos encontramos. Há uma troca muito importante que se dá entre os participantes, numa espécie de convenção de pessoas que partilham dos mesmos ideais, sonhos e emoções. Então, ao mesmo tempo que é profissional, é emocional, e se cria um clima particular e especial”, explica um dos co-fundadores da ABETA e coordenador do ABETA Summit, Luiz Del Vigna. Considerado um dos mais im-

portantes fóruns de discussões do setor, o congresso da vida ao ar livre reúne de forma dinâmica e interativa, empresários, gestores públicos, consultores, acadêmicos, ativistas, jornalistas, guias e condutores de atividades em ambientes naturais. Seu principal objetivo é reunir o segmento da vida ao ar livre para gerar e compartilhar conteúdo, informação e conhecimento à cadeia produtiva do turismo, discutindo e debatendo os rumos do setor; promover o relacionamento entre os participantes; e curtir experiências ao ar livre. O ABETA Summit leva ao destino anfitrião capacitação turística, com oficinas de qualificação, gestão de segurança, condução e atendimento, por exemplo. Além de inspirar empre-

sários e poder público a se organizarem e fortalecerem enquanto destino e produtos turísticos. Tudo isso se transforma num verdadeiro legado a todos os envolvidos na operação e planejamento das atividades turísticas locais, causando um impacto positivo e perene, capaz de transformar para melhor o turismo de natureza do local, assim como os produtos turísticos, serviços e competência dos agentes. De acordo com Luiz Del Vigna, “o ABETA Summit é um momento catalizador do segmento, que congrega e agrega em todos os sentidos. É este encontro que reforça a ideia do associativismo e da colaboração em prol do objetivo comum que é potencializar a cultura da vida ao ar livre”.

10 Agosto 2019


Foto: Efrain Davila - Sectur Ilhabela


Foto: Florie Thielin

Turismo de Base Comunitária resgata cultura caiçara e promove experiências genuínas em Ilhabela

Por Márcio Mecca

As experiências com o TBC em Ilhabela A troca, integração e conexão com outras culturas talvez sejam os grandes diferenciais do TBC, que se torna uma experiência transformadora ao turista e a quem o recebe. Além de trilhas com guias locais, sempre agendadas, que oferecem o contato com a natureza e possibilidade de contemplação, o roteiro do TBC em Castelhanos inclui visitas às vilas caiçaras. Lá, os turistas se hospedam e se alimentam de pratos típicos e receitas tradicionais passadas de geração a geração, enquanto ouvem dos anfitriões, histórias da comunidade. “Compartilhamos com os turistas a nossa memória, as receitas da nossa família”, comenta Laureana de Souza Lúcio de Jesus, uma das responsáveis pela alimentação da operação. Também é possível fazer parte de uma oficina de redes de pesca ou de cestaria e conhecer o artesanato típico do local, bem como a visita ao cerco, encabeçada por Irineu de Souza Lúcio, pescador e presidente da Associação Castelhanos Vive. “A pesca é uma atividade do nosso berço, a família toda trabalhava com o pescado. E com o TBC, a gente traz o turista para perto da gente, mostrando nossa tradição, valorizando nossa cultura. E para nós é muito importante e gratificante, inclusive pela sobrevivência da nossa comunidade”, explica Irineu. “Estamos muito felizes por receber o grupo do ABETA Summit, que abraça nossa causa e nos dá a oportunidade de mostrar e divulgar nosso trabalho”, finaliza Angélica dos Santos, membro do TBC de Castelhanos.

Foto: Frederico Guidorizzi

É possível entender o Turismo de Base Comunitária (TBC) como o conjunto de iniciativas e atividades turísticas protagonizadas por comunidades locais e tradicionais que, quando bem estruturadas e gerenciadas, impactam positivamente a região. Nesta vertente do turismo, a troca de experiências entre visitantes e o destino é genuína, além de proporcionar uma gestão sustentável, fortalecer a cultura local, agregar valor aos roteiros e gerar empregos e renda para a região. Ilhabela iniciou em 2017, o TBC na região dos Castelhanos. O local reúne 6 comunidades tradicionais caiçaras em uma das praias mais preservadas e belas da ilha. Suas raízes vêm da mistura entre os indígenas que habitavam a ilha, com escravos africanos e piratas europeus que ali ancoravam. Vivendo de forma isolada, os caiçaras criaram uma conexão próxima à natureza, com cultura baseada na pesca, no artesanato e na gastronomia tradicional e típica dos seus ancestrais. “A região de Castelhanos é uma das mais exploradas turisticamente na ilha, com alto fluxo de pessoas. Porém, as duas vilas caiçaras, a do Canto Ribeirão e Canto da Lagoa pouco participavam da operação turística que já estava consolidada. A participação tímida, era restrita à venda de pescados aos quiosques e embarque e desembarque de turistas”, explica Daniela Marcondes, turismóloga, pesquisadora e consultora da Maembipe Ecoturismo, que atua diretamente no desenvolvimento do TBC nos Castelhanos junto à comunidade. Ela conta que este foi justamente o grande desafio, uma vez que a proposta do TBC é empoderar e tornar a comunidade protagonista deste modelo. Como tudo tem sido de uma forma orgânica, foi preciso se organizar enquanto grupo e participar ativamente dos conselhos e câmaras temáticas, mapeando, assim, potenciais atores internos e externos para colaborarem com a iniciativa. E para isso a participação da Associação Castelhanos Vive e o engajamento dos atores locais foi e tem sido crucial para a formatação dos roteiros de TBC. Também membro da Associação Castelhanos Vive, Laurinda Maria de Moraes Lúcio se envolveu na iniciativa através de amigos e abraçou a causa. “Nessa dinâmica, conhecemos outras pessoas ao mesmo tempo que transformamos nossa vida para crescer pessoalmente e economicamente, dentro da comunidade. Estamos ainda nos primeiros passos, mas esperamos nos desenvolver a curto prazo. Já fizemos alguns intercâmbios para entender a proposta do TBC em outras comunidades. E isso é muito bacana pois agrega muito na nossa vida e nessa iniciativa aqui em Ilhabela”, explica ela. O Núcleo de Turismo Comunitário, criado em 2017, passou por um projeto de qualificação e capacitação para aprimorar e estruturar os roteiros de TBC. Isso preparou a comunidade caiçara para oferecer aos turistas a oportunidade de vivenciar momentos de prazer e diversão genuínos, integrados à natureza, ao mesmo tempo em que cuidam e zelam desta área ambiental preservada e tão rica que é Ilhabela. 12

Agosto 2019


17 Agosto 2019


Turismo náutico: uma questão cultural? Por Klaus Peters

por onde foram atacados, invadidos e saqueados durante séculos. Diante dessa vulnerabilidade ergueram proteções que criaram não apenas barreiras físicas, mas principalmente culturais. É possível que essa teoria também se aplique ao Brasil, onde as barreiras culturais, ampliadas pela estigmatização em relação ao poder econômico, vêm sendo gradualmente superadas através do entendimento das oportunidades de geração de emprego e renda associadas à exploração sustentável desse fantástico patrimônio natural. Um recente estudo encomendado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo demonstrou que, atualmente, uma marina com 300 embarcações movimenta R$ 140 milhões por ano na região e gera 780 empregos. Além das belas praias, ilhas e enseadas paradisíacas nos 8.500 km de nosso litoral, é nas águas interiores – rios, lagos e reservatórios – que temos um potencial ainda maior, com 60.000 km de vias navegáveis e gigantescos reservatórios em regiões de rara beleza e diversidade. A implantação de estruturas de apoio náutico, que representam o elo de integração entre o ambiente aquático e o terrestre, é fundamental para que a náutica, e toda a cadeia de turismo ligada a ela, se desenvolva à altura desse potencial. Contudo, é essencial que essas estruturas sejam planejadas, implantadas e operadas de acordo com as melhores práticas para proteger o meio ambiente e manter a balneabilidade dos corpos d’água. Superado o estigma cultural, a próxima missão será demonstrar que as atividades náuticas são um excelente meio para promover a consciência ambiental, assim como representam uma forma fascinante de ensinar um número expressivo de pessoas a descobrir, apreciar, valorizar, proteger e preservar a fauna e flora desses ambientes.

Foto: Fernando Tomanik - Sectur Ilhabela

Diante do imenso potencial do turismo náutico no Brasil, a falta de estruturas de apoio pode ser justificada, em parte, pela dificuldade e morosidade na obtenção das licenças e aprovações, mas também é consequência da pouca familiaridade dos brasileiros com o universo náutico. Desde os tempos em que tudo que chegava ou saía do país era feito por via marítima, e grande parte da logística de transporte para o interior dependia da navegabilidade dos rios, essa relação com a água vem gradativamente perdendo importância na vida dos brasileiros até, literalmente, virarem as costas para o mar – e para todos os outros corpos d’água. Consequentemente foi sendo apagada, geração após geração, a cultura marítima ou de navegação. Na Colômbia, onde houve um processo semelhante, existe a teoria que esse distanciamento ocorreu porque culturalmente associavam a origem dos maiores sofrimentos de seu povo ao mar,





Foto: Terra Nativa

Percepções sobre a

Educação ao Ar Livre Por Paulin Antar Talaska

“O futuro pertencerá ao ser inteligente natural — aqueles indivíduos, famílias, empresas e líderes políticos que desenvolvem uma compreensão mais profunda do poder transformador do mundo natural e que equilibram o virtual com o real. Quanto mais high-tech nos tornamos, mais natureza precisamos.” Richard Louv

“Será que devemos sempre ensinar nossos filhos apenas usando os livros?”, perguntou certa vez o naturalista David Polis (Wabisabi Learning. 2017. 5 ways outdoor education can prepare our students for the future),

e em seguida declarou: “que eles olhem para as montanhas e as estrelas lá em cima... que se deixe olhar a beleza das águas e as árvores e as flores na terra. Eles então começarão a pensar, e pensar é o começo de uma verdadeira educação”. A Educação ao Ar Livre é a promoção da sala de aula sem paredes que ajuda a recriar o elo natural entre o estudante e seu entorno. Envolve a criatividade e oferece recurso educativo que permite o livre desenvolvimento de estratégias e de habilidades que serão aplicáveis ao longo da vida. Estudos recentes defendem os efeitos positivos das vivências em ambientes naturais sobre as habilidades de aprendizagem, comprovando o que antes era tido como uma intuição ou até mesmo um debate. Um artigo publicado em fevereiro de 2019 (Kuo et al.Front Psychol) traz luz e evidências para a pergunta: “será que as experiências de contato com a natureza promovem mesmo o aprendizado?” A Dra. Ming Kuo, da Universidade de Illinois, junto com outros pesquisadores, analisaram trabalhos que revelam de forma mais convincente o

quanto o contato com a natureza produz mudanças na perseverança, na resolução de problemas, no pensamento crítico, na liderança, no trabalho em equipe e na resiliência. Felizmente, o ambiente natural exerce um fascínio que vai além de sua inteligência e formas plásticas. Hoje, a natureza como inspiração para a tecnologia é base para lições poderosas do que é funcional e do que é apropriado aqui na Terra. A Biomimética (https://www.bio-inspirations.com/), por exemplo, é uma das tendências que podem levar uma empresa ao sucesso mostrando formas de inovação e possibilitando a criação de produtos e soluções baseados na observação da natureza. É a imitação da vida, que explica como a colaboração é importante para a sobrevivência de todas as espécies pois, juntos, ampliamos recursos, temos proteção, reduzimos o estresse e compartilhamos do mesmo espaço. Na Inglaterra, crianças de 125 escolas são mais felizes, mais saudáveis e mais motivadas para aprender, graças a um projeto encomendado pela Natural England que transformou o ambiente externo em uma sala de aula e ajudou as escolas a transformarem suas maneiras de ensinar. O projeto Natural Connections (Natural EnContinua na página 20.

18 Agosto 2019



Continuação da página 18. gland & Plymouth University. 2016. www.gov.uk)

forneceu fortes evidências de que o aprendizado ao ar livre tem múltiplos benefícios para as crianças em idade escolar: 92% dos professores entrevistados disseram que os alunos estavam mais envolvidos com o aprendizado ao ar livre e 85% tiveram um impacto positivo em seu comportamento. A maioria das crianças também relatou que aprendeu melhor e alcançou mais resultados com o aprendizado fora da sala de aula convencional: 92% dos alunos envolvidos no projeto disseram que gostavam mais de suas aulas quando estavam ao ar livre e 90% se sentiam mais felizes e saudáveis. Em mais de 20 anos de observação sobre o tema, notamos que é no campo que despontam os talentos, o coleguismo, a sinergia em grupo e a consideração e análise mais próxima perante as dificuldades. Ao conectar a educação ao ambiente natural, o aprendizado dos estudantes adquire um contexto de incentivo e o desejo de estudar através da motivação pelo trabalho em equipe e o senso de preservação ecológica. Em seu estudo “Os Efeitos da Educação Baseada no Ambiente e na Motivação de Realização dos Alunos”, os pesquisadores Julie Athman e Martha Monroe (2004. The effects of Environmental-Based Education on Students´ Achievement Motivation. Journal

estudaram 400 o o alunos do 9 e 12 ano e descobriram que os níveis de motivação para educação ao ar livre eram mais altos do que os tradicionais apresentados em salas de aula convencionais. Mais recentemente, o autor e ambientalista Richard Louv traz em seu trabalho “A última criança na natureza”, que diante da limitação do contato com a natureza, as crianças deixam de desenvolver habilidades sociais e físicas, ficam mais estressadas e dispersas. Neste sentido, o autor cunhou o termo “transtorno de déficit de natureza” que diz respeito aos vários problemas físicos e mentais que são decorrentes de uma vida desconectada do mundo natural.

of Interpretation Research)

Em 2011, Louv retornou com “The Nature Principle”, em que argumenta que a aprendizagem ao ar livre funciona porque exige melhor uso dos sentidos. O autor nos mostra como explorar os poderes restauradores do mundo natural que pode aumentar a acuidade mental e a criatividade; promover a saúde e bem-estar; construir empresas, comunidades e economias mais inteligentes e sustentáveis e, finalmente, fortalecer laços humanos.

“Em 15 anos de promoção da vida ao ar livre, a Abeta dedicou um esforço enorme para regulamentar as práticas de ecoturismo pautadas na segurança e seriedade inerentes ao desenvolvimento de suas atividades. Deste estímulo temos o cuidado para o “fazer” da educação ao ar livre e o valor a ele atribuído, assegurando as boas práticas além de contribuir para a formação de indivíduos respeitosos com o meio ambiente, entusiastas da vida em comunidade e ao ar livre.” Apesar das evidências para a extensão da aprendizagem ao ar livre, há vários obstáculos no caminho. Um desses obstáculos é a preocupação entre professores e pais com o risco no ambiente natural, aumentando a relutância para desafios tão diversos. O jornalista Tim Gill escreveu sobre a aversão ao risco por parte de pais e instituições que afeta muitas atividades com crianças em seu livro “No Fear” (Gill, T. 2007. No Fear–growing up in a risk averse society.Calouste Gulbekian Foundation). Segundo Gill, “a longo prazo, o progresso em todas as questões depende da geração futura crescer em

direção a tornarem-se adultos engajados, autoconfiantes, responsáveis, cidadãos resilientes: pessoas que sentem que têm algum controle sobre seus destinos e estão vivas para as consequências de suas ações. Isso só acontecerá se a sua infância incluir alguns ingredientes simples: contato frequente, desregulado e auto-dirigido com pessoas e lugares além das esferas imediatas da família e da escola, e a chance de aprender com seus erros”. Neste sentido, experiências ao ar livre com segurança, permitem que o risco não seja mais um obstáculo e sim algo que temos que lidar e planejar para evitar. Em 15 anos de promoção da vida ao ar livre, a Abeta dedicou um esforço enorme para regulamentar as práticas de ecoturismo pautadas na segurança e seriedade inerentes ao desenvolvimento de suas atividades. Deste estímulo temos o cuidado para o “fazer” da educação ao ar livre e o valor a ele atribuído, assegurando as boas práticas além de contribuir para a formação de indivíduos respeitosos com o meio ambiente, entusiastas da vida em comunidade e ao ar livre. No mundo de hoje, com a complexidade e tantas crises chegando, essa conexão com mais do que apenas nós mesmos, mais do que apenas pessoas, é muito importante. Quando nascemos, pensamos que somos únicos, distintos... mais tarde em algum momento, principalmente quando viajamos para bem longe, percebemos que há pessoas diferentes umas das outras, lugares diferentes e fascinantes. E só quando viajamos ainda mais longe é que então descobrimos quantas coisas compartilhamos. Quando se está na natureza, o tempo se move de modo diferente, é muito mais lento e grandioso. Will Nixon (1997. Letting nature shape childhood), lembra que “Usar o mundo real é o modo como o aprendizado aconteceu para 99,9% da existência humana. Somente nos últimos 100 anos nos colocamos em uma caixinha chamada sala de aula...” Viva a vida e a educação ao ar livre!

20 Agosto 2019



A Pérola da Mantiqueira

Gonçalves

MINAS GERAIS

18 Agosto 2019


Aventura e ecoturismo Gonçalves é um destino localizado no sul de Minas Gerais, perfeito para quem gosta de contato com a natureza e para a prática de atividades ao ar livre. As paisagens privilegiadas do município são um convite para contemplação ou para modalidades mais radicais. Há trilhas que levam a cachoeiras com belas quedas d´água e a picos de mais de 2.000 metros de altitude, com vistas de tirar o fôlego. Nelas, é possível observar aves e a rica fauna e flora.

Acervo da Prefeitura Municipal

Boia-cross - Boulder - Cascading - Escalada esportiva Mountain bike - Passeios de 4x4 - Quadriciclo Observação de aves - Trilhas - Picos de altitude

www.goncalves.mg.gov.br

Foto: Roberto Torrubia

Foto: Roberto Torrubia

Foto: Roberto Torrubia Foto: Roberto Torrubia

Foto: Roberto Torrubia

Foto: Rodrigo Pompeu

Foto: Clodoaldo Costa

Foto: Douglas Carlos

Os atrativos naturais também são cenários perfeitos para esportes de aventura, como boia-cross, rapel e montanhismo, entre outros. Quem gosta de aventura off-road pode se divertir em estradas de terra para veículos 4x4, quadriciclo e mountain-bike. Aqui, emoção e tranquilidade caminham lado a lado.


O papel do Turismo de Natureza na economia Por Pedro da Cunha e Menezes

Uma vez, visitando um Parque Nacional no Quênia em companhia de seu diretor, recebemos pelo rádio a informação de que havia um casal de leões copulando. Meu anfitrião, desviou o carro e nos dirigimos ao local. Chegando lá, o Chefe do Parque afirmou que “sua população” de grandes felinos tinha alta taxa de fecundidade, o que provava a eficiência da Área Protegida. Com efeito, a cena era impressionante. Após longos minutos de fascinação, olhei à volta e me surpreendi com a quantidade de veículos. Contei um, dois, três... eram algumas dezenas. Meu lado conservacionista gritou incomodado obrigando-me a questionar: “Será que não é excessivamente estressante para os leões transar debaixo de tantos olhares?” A reposta foi rápida e singela: “Claro que sim. Você também não se sentiria incomodado em fazer amor na frente de uma audiência?” Seguiu-se um silêncio constrangedor que durou alguns minutos. Foi o tempo para a ficha do queniano cair. Aí ele me olhou nos olhos e me deu uma aula de gestão que jamais esqueci: “Você sabe que o Quênia é um país pobre? Sabe que nossa população é de 50 milhões de pessoas e que temos menos de 20% de

terra arável? É muita gente para pouca terra fértil. Esse parque é terreno agricultável; só não está todo plantado por que rende mais com a conservação do que com a agricultura. Aqui no Quênia, para não morrer de fome, todos, absolutamente todos, têm que trabalhar, inclusive os leões”. Durante anos, a corrente de pensamento do movimento ambientalista brasileiro se opôs à visitação em áreas protegidas, por considerá-la impactante à conservação, o que gerou a elaboração de planos de manejo restritivos, com pequenas áreas abertas à pratica de ecoturismo e com regras que proíbem não só a construção de hotéis e teleféricos, mas restringe atividades como o ciclismo, as travessias de pernoite, a escalada, etc. Por outro lado, quando se planeja o desenvolvimento, há uma corrente que entende as normas de proteção à natureza como impedimento ao progresso econômico do Brasil. Hoje, há quem defenda o recorte de unidades de conservação para assegurar a construção de estradas, linhões, represas e outras obras de infraestrutura. Entretanto, o caminho do meio, seguido por locais em que a conservação e a economia andam juntas, possuem uma relação ganha-ganha. Em alguns países, como o Quênia, a África do Sul e a Namíbia, os valores advindos dos ingressos das áreas protegidas é, sozinho, capaz de cobrir grande parte do orçamento para a manutenção e salários dessas unidades de conservação. Nesses países,

os Serviços de Parques Nacionais possuem diretorias de uso público que dialogam com o setor privado. A lógica é cristalina. Embora a gestão das unidades de conservação em si mesma seja deficitária, o montante arrecadado na sua visitação é, na verdade, uma parcela do que esse tipo de turismo gera. De acordo com estudo de Thiago Beraldo e Helene Simões, no ano de 2017, as 10,7 milhões de visitas às unidades de conservação federais geraram um gasto de R$ 2 bilhões nos munícipios em que estão localizadas, mantendo 80 mil empregos diretos, com a geração de R$ 3,1 bilhões em valor agregado ao PIB e mais R$ 8,6 bilhões em vendas. Segundo o trabalho, “somente o setor de hospedagem arrecadou R$ 613 milhões, seguido pelo setor de alimentação com R$ 432 milhões. Os resultados demostram que a cada R$ 1 real investido, R$ 7 retornam para a economia”. Esses gastos geraram R$ 905 milhões em impostos para as três esferas de governo. Cadu Young, Rodrigo Medeiros, Camila Rodrigues, Claudia Rosa e Leandro Fontoura incluíram unidades estaduais e municipais em seu cálculo, chegando ao resultado para 2016, de um impacto econômico de R$ 6 bilhões com 133.500 empregos gerados, com visitação de 16.839.623 pessoas. Estudo publicado em 2015 no Jornal PLOS Biology estimou o total de visitas a áreas naturais no mundo em 8 bilhões por ano, gerando um gasto direto de US$ 600 bilhões anuais. Para chegar ao patamar em que

Foto: Arquivo Abeta

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24 Agosto 2019



a conservação se justifique pela quantidade de emprego e renda por ela geradas, é necessário que haja uma política de estado sólida e continuada. Nesse sentido, os primeiros passos foram dados pelo atual Governo com a criação de uma Coordenação-Geral de Meio Ambiente no Ministério do Turismo e uma Secretaria de Ecoturismo no Ministério do Meio Ambiente. Estão montadas as estruturas para que avancemos. Falta-nos, porém, informação, o que o mercado chama de inteligência comercial. Quem é o ecoturista, quanto gasta por dia, que atrações busca, qual sua idade, qual seu gasto diário, que tipo de serviços demanda? Países com robustas indústrias de ecoturismo, como Austrália, Nova Zelândia, África do Sul e Equador fizeram esse dever de casa. Na década de 1980, os dois países da Oceania mapearam que o perfil de seu ecoturista era o jovem, mochileiro, com pouco dinheiro, mas muita energia. Verificaram que seu interesse não era por museus ou gastronomia, mas por atividades com adrenalina. Identificaram que, sendo a Oceania um destino longínquo da Europa e América do Norte, principais destinos emissores, as viagens nunca eram inferiores a três semanas. Com essas informações, montaram a infraestrutura voltada para esse tipo de público: roteiros lineares de até 3.000 km, com núcleos de atrativos a cada 150-300 km, com rede de albergues e campings e sistema de transporte de vans voltado para esse público com origem e destino porta a porta, nos próprios albergues de cada cidade. Com isso fomentaram um

mercado, até então, não tradicional que alimenta a economia de cidades médias e pequenas e de zonas rurais. As atrações foram feitas sob medida para as aspirações do viajante: trilhas, trilhas com pernoite, trilhas para bicicleta, rafting, canyoning, rapel, bungee jumping, mergulho e snorkel, voo duplo de parapente, salto duplo de paraquedas, observação de baleias, observação de pássaros, etc. Os albergues concentram a hospedagem em dormitórios comunais, mas atendem um espectro de turista que vai desde o que busca um local para acampar até a oferta de dois ou três quartos com banheiro privativo. A lógica dos albergues e do transporte serviu também para criar um ambiente de troca de informações boca a boca entre os viajantes com a respectiva indicação de atrativos e atividades nas diferentes áreas núcleo de cada grande roteiro. No Brasil, no âmbito do ICMBio, foram feitas duas apostas baseadas em informações operacionais, sem o rigor científico da Oceania. No primeiro caso, uma simples notícia de jornal dizia que as vendas de bicicletas haviam aumentado em 300% nos anos de 2015 e 2016, em Brasília. Essa informação, associada à observação in loco do aumento do uso da Floresta Nacional de Brasília por mountain bikers, fez o Instituto desenvolver uma rede de 135 km de trilhas para o esporte nas unidades no Distrito Federal e em Goiás. No segundo caso, a verificação de que as travessias de Veadeiros, Itatiaia e Serra dos Órgãos estavam operando com capacidade máxima, fez com que o ICMBio, investisse na implementação da Rede Brasileira de Trilhas, que hoje tem mais de 2.000 km de caminhos sinalizados. Em ambos os casos, as apostas foram corretas. A visitação aumentou muito.

Agora, o ICMBio e muitos órgãos estaduais de gestão de áreas protegidas estão entrando em nova fase, com as concessões de uso público em Parques e Florestas. Trata-se de movimento importante para dinamizar o ecoturismo e melhorar a qualidade dos serviços. Devemos aproveitar para planejar que as unidades concessionadas tenham políticas de visitação integradas em que haja a viabilização econômica não só daquela unidade, mas do roteiro, pensado para um período de férias de 30 dias. Essa é a aposta, por exemplo, do Caminho das Araucárias, trilha de longo curso que está sendo implementada com participação da Abeta, cujo objetivo é dinamizar o eixo Três Coroas-Canela-Gramado x São Joaquim, utilizando como áreas núcleos as concessões de uso público a serem feitas nas Florestas Nacionais de Canela e São Francisco do Sul e nos Parques Nacionais de Aparados da Serra, Serra Geral e São Joaquim, além de passar no Parque Estadual no Tainhas, no Parque Natural Municipal da Ronda, na Estação Ecológica Estadual de Aratinga e na APA Estadual da Rota do Sol. A proposta é oferecer gastronomia e cultura na Serra Gaúcha e Catarinense, acompanhada de um roteiro que pode ser feito de bicicleta, a pé, a cavalo ou de carro, com a possibilidade de incorporar no trajeto, as atividades de rafting, canyoning e rapel. O desenho do traçado, em construção, precisa do conhecimento do perfil do ecoturista, pois isso definirá a quantidade de atrativos por núcleo, o tipo de acomodação a ser oferecido, a periodicidade dos transportes e os serviços associados. É hora de darmos as mãos e buscarmos essas informações, não só para o Caminho das Araucárias, mas para o Brasil como um todo.

26 Agosto 2019

Foto: Arquivo Abeta

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Monitoramento e avaliação do cicloturismo no Brasil.

Foto: Ion David

Como estamos e para onde podemos ir?

Por Luiz Saldanha, Juliana DeCastro e Adriana Marmo

Assim como qualquer outra atividade turística, o cicloturismo requer elementos de três grandes dimensões do planejamento: (1) infraestrutura específica e de apoio; (2) promoção do destino; e (3) monitoramento e avaliação. Atualmente, no Brasil, nota-se bastante preocupação em relação às duas primeiras dimensões enquanto a última costuma ser deixada de lado — até pela sua aparente complexidade e necessidade de alocação de recursos técnicos para tal. Apesar de serem apresentadas como dimensões distintas, todas são interdependentes para que o cicloturismo em determinada localidade ocorra com sucesso e de forma sustentável. Sem conhecer o perfil dos cicloturistas que visitam determinada localidade e que circundam outros destinos de cicloturismo pelo país, a dificuldade aparece desde o traçado de um roteiro e outros elementos estruturantes até a elaboração de um plano de divulgação e recepção de visitantes para a subsistência da respectiva rota de cicloturismo. Em países com rotas em escalas nacionais bem consolidados, como a França e o Estado de Quebec (Canadá), existe uma grande preocupação e investimento em monitoramento e avaliação para que se entregue ao usuário uma experiência bem diversificada e com alta quali-

dade de serviço, além de uma efetiva participação da comunidade local e um controle sobre o uso público sustentável das áreas verdes (legalmente protegidas ou não). Tendo em vista a necessidade de dados para a caracterização da atividade em nível nacional de forma atualizada, entre 2018 e 2019 foram realizados dois importantes estudos para o entendimento da atividade em escala nacional. O primeiro deles foi A Economia da Bicicleta no Brasil (ver mais em http://economiadabicicleta.org. br/), no qual o cicloturismo foi inves-

tigado junto a outras 16 temáticas relacionadas à bicicleta. Já o segundo estudo, O Cicloturista Brasileiro 2018 (ver mais em planett.com.br/ocb18), foi direcionado exclusivamente para a atividade e buscou revisitar as poucas pesquisas de perfil do cicloturista que foram realizadas desde 2008. Para se compreender mais consistentemente o panorama atual da atividade, faz-se necessário abranger todos os setores da cadeia produtiva do cicloturismo. O papel dos pesquisadores (dentro ou fora da esfera acadêmica) é de integração de dados primários dos diferentes atores e partes interessadas (cicloturistas, sociedade civil organizada, setor público, iniciativa privada e a própria academia) para devolver em forma de infor-

mação direcionada para cada perfil de uso — gestão de rotas de cicloturismo, atingir uma demanda potencial, organizar uma cicloviagem, etc. Sendo assim, a representatividade de operadores e agentes de turismo especializados na atividade influencia diretamente na contextualização sobre as oportunidades de um nicho crescente de mercado e as dificuldades encontradas para a operacionalização de seus serviços para possibilitar a entrega de mais informações sobre o setor, além de discussões sobre políticas públicas, orientação de investimento e direcionamento de novos estudos para o crescimento da atividade no país. A Aliança Bike e o PLANETT se uniram à ABETA para desenvolver uma pesquisa de aproximação com a realidade prática dos guias, operadores e agentes de turismo voltados para o cicloturismo. Uma pesquisa preliminar foi realizada para se alinhar uma dinâmica de apresentação no ABETA Summit 2019 que inclua a perspectiva desses atores visando entregar resultados compatíveis com as necessidades do setor em médio e longo prazo. Acompanhe a situação desta pesquisa no Portal do Observatório do Cicloturismo (veja em planett.com.br/ observatorio-do-cicloturismo).

28 Agosto 2019




31 Agosto 2019





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