Regressando aos Mercados Há muito que se ouve falar do regresso de Portugal aos mercados. Vantajoso? O regresso aos mercados para este “pequeno país à beira mar plantado” é na realidade um importante passo para reforçarmos a nossa imagem e a credibilidade do programa de ajustamento. Programa este que tantos entraves colocou e coloca na mente dos portugueses, por estar a ser feito à custa de qualquer sacrifício sem olhar a meios e sobretudo sem atender às suas consequências, que se estão a revelar desastrosas se pensarmos nisto na perspectiva das famílias. Na verdade, só austeridade imposta levará num futuro próximo a uma solução incomportável. Na realidade, nos últimos anos o setor financeiro tem sido fortemente pressionado, por reguladores e outros stakeholders, no sentido da transformação do seu modelo de negócio, para que se proceda à conversão das instituições financeiras em entidades mais reguladas e menos alavancadas, e assim, mais seguras. A reestruturação do setor financeiro foi um imperativo do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro em curso desde 2011. Aqui propõem-se a reestruturação do setor financeiro, com especial ênfase na desalavancagem e na redução do rácio crédito/depósitos, com uma consequente exigência de requisitos de capital mais elevado. Como Portugal vê atualmente a banca nacional a servir de principal financiador de empresas públicas e privadas, muito devido às restrições de financiamento internacionais impostas pelo risco soberano, o regresso aos mercados financeiros é visto como um imperativo para reestabelecer a ordem financeira interna. Mas não podemos estar só a fazer sacrifícios pessoais, precisamos de crescimento e de aumentar a empregabilidade, reforçando assim o mercado interno. O nosso tecido empresarial é pautado por um grande número de
pequenas e médias empresas (PME) que se sentem estranguladas financeiramente e que necessitam urgentemente de conseguir recorrer a capital para manter o investimento, ou até para muitas, para conseguirem continuar a sobreviver neste ambiente austero. Precisamos assim de manter a circulação da moeda e é aqui que a banca entra com um papel fundamental. Poderá o leitor questionar-se, aliás como também o faço a mim mesma, qual o propósito da ajuda estatal aos bancos se os elementos que diretamente suportam este apoio estão no seu limite de endividamento? Existem de facto famílias que neste momento estão a passar dificuldades. Está sim a ocorrer um retorno ao passado e agora deixamos de fazer coisas que há bem pouco tempo atrás continuávamos a fazer sem pensar nas consequências, sem olhar para trás, por puro sentimento de deleite. Passamos nós neste momento a dar valor aos sacrifícios pelos quais os nossos avós passaram? Será que paramos para pensar como suportavam eles viver uma vida em que se contavam os tostões? Como era possível viver sem festas, concertos, férias, hipermercados ou centros comerciais, roupas de marca, informática e net? Estilo de vida moderno, imposto pelos pares, que tanto nos apraz e ao qual agora temos de dizer não, mesmo que não seja por vontade própria? Certamente já se questionaram. Provavelmente, não encontraram uma resposta. Temos somente de ter consciência de que apesar das dificuldades e das exigências que este programa de ajustamento se nos impõe, e até mesmo de algumas situações de injustiça que advêm deste cumprimento forçado, a execução do programa é imperial e continua a ser o caminho mais provável para que Portugal consiga obter a normalidade financeira, económica, social e quiçá política de que tanto necessita no curto, médio e longo prazo. A aceitação da dívida portuguesa nos mercados financeiros é reveladora de um sentimento de acreditação neste pequeno país. O esforço
está a ser recompensado e os nossos “parceiros” acreditam nas nossas capacidades. Nesta conjuntura de condicionamentos estritos ao crescimento dos balanços dos bancos e o consequente indispensável crescimento da poupança, o mercado de capitais deve ter um papel muito mais relevante no financiamento da economia e alocação eficiente dos recursos financeiros. Só assim vamos conseguir contribuir para o crescimento vigoroso e sustentável da economia nacional, assente na poupança e no investimento, motores do crescimento económico. Não precisamos de estudar economia ou finanças para conseguir perceber que o regresso aos mercados é um passo importante para um país que necessita de ver reforçada a sua credibilidade a nível internacional. Conseguimos mostrar aos outros que também somos capazes de evoluir certamente, mas esta afirmação aposta em políticas de consolidação orçamental e reformas económicas estritas que se estão a reflectir no campo social e não pelos melhores motivos. Todavia, possibilitam o financiamento da economia nacional, quer para o Estado, quer para os bancos e as empresas, sendo necessário que tudo retorne à normalidade possível. Se é este o melhor caminho? Só o tempo o dirá, pois não deixa de ser um “pau de dois bicos” a temática do retorno de Portugal aos mercados financeiros.
Mara Teresa da Silva Madaleno Professora
Auxiliar
Convidada,
Universidade
de
Departamento de Economia, Gestão e Engenharia Industrial (DEGEI)
Aveiro,