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FELINOS A LU TA P E L A S O BR E V I V Ê N C I A
WILD CATS - THE STRUGGLE FOR SURVIVAL
AP O IO CU LTU RAL
A P O IO INSTITU CIO NAL
FELINOS A LU TA P E LA SO B RE V I V Ê NCI A
WILD CATS - THE STRUGGLE FOR SURVIVAL
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ARAQUÉM ALCÂNTARA
QUEM SÃO FELINOS
FELINOS QUEM Sテグ
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FELINOS A LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA WILD CATS THE STRUGGLE FOR SURVIVAL
PREFÁCIO PREFACE
CONSERVAÇÃO É PRECISO FELIDS SPOTTED LIVES
INTRODUÇÃO INTRODUCTION
JAGUATIRICA OCELOT
ONÇA-PARDA PUMA
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12 16 20 30 48
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GATO-MARACAJÁ
84
GATO-PALHEIRO
MARGAY
PAMPAS CAT
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GATO-DO-MATO-GRANDE
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GATO-DO-MATO-PEQUENO
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GATO-MOURISCO
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ONÇA-PINTADA
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BIBLIOGRAFIA
GEOFFROY’S CAT
ONCILLA
JAGUARUNDI
JAGUAR
BIBLIOGRAPHY
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FELINOS
A luta pela sobrevivência Fernando VonZuben DIRETOR DE MEIO AMBIENTE ENVIRONMENTAL DIRECTOR
WILD CATS
The struggle for survival
Tetra Pak
U
m dos maiores desafios para toda a Humanidade neste princípio de século, sem dúvida, tem sido a necessidade da preservação da vida sob todas as nuances que ela apresenta. Cada ser vivo, seja animal ou vegetal, tem a sua função e importância para as condições de vida como um todo. E a isto se dá o nome de biodiversidade. É como se cada ser vivo fosse uma engrenagem numa imensa máquina e, quando se perde uma das engrenagens, o bom funcionamento da mesma é comprometido. Felinos - A Luta pela Sobrevivência é uma obra de referência, ilustrada com fotografias e ilustrações que emolduram o universo desses magníficos predadores que chegaram ao continente sul americano, há mais de 4 milhões de anos, vindos do norte e aqui dominaram as florestas tropicais. Esta obra, única em sua concepção, mostra a importância dos felinos na proteção das florestas, suas histórias, suas cores e o contexto onde vivem; acompanhadas de textos atualizados. O enfoque principal da obra é levar a natureza para perto do leitor, cada vez mais atento às questões ambientais. Temas como a manutenção de florestas, a perda da biodiversidade, a sustentabilidade, bem como o aquecimento global, fazem parte do cotidiano da sociedade brasileira e uma tendência ao aumento dessas preocupações é evidenciada por várias pesquisas de opinião realizadas recentemente. As ações da atividade humana ao longo dos tempos têm afetado dramaticamente a biodiversidade, com devastação de habitats que levaram à extinção de milhares de espécies. Portanto, cabe ao próprio homem a tomada de consciência para preservar a vida. A atitude é individual, mas o esforço é coletivo e envolve todos os segmentos da sociedade, inclusive os setores produtivos. Consciente de sua responsabilidade de empresa que tem no respeito à vida um compromisso histórico, a Tetra Pak empunha a bandeira em defesa da biodiversidade através de um amplo leque de ações voltadas à preservação e à educação ambiental. Através de programas próprios ou patrocínios de projetos em praticamente todo o território nacional, a empresa tem atuado diretamente junto a espécies ameaçadas, ao mesmo tempo em que leva informação e conscientização às populações envolvidas incentivando práticas conservacionistas e sustentáveis. O Brasil hoje abriga a maior biodiversidade do planeta, com uma ampla variedade de biomas que reflete a enorme riqueza da sua flora e fauna. Esta abundante variedade de vida, que se traduz em mais de 20% do número total de espécies da Terra, coloca o Brasil no posto de principal nação entre os 17 países de maior biodiversidade. Por si só, estes dados já dão a dimensão da importância da responsabilidade do país, num planeta onde muitas nações já devastaram os seus biomas. Estima-se que a crescente taxa de extinção das espécies hoje está entre mil e 10 mil vezes maior do que a natural, demonstrando que a vida no planeta já não pode suportar tal pressão. O resultado já é palpável, como
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o aquecimento global e seus efeitos nefastos sobre o clima e a vida em geral. Os efeitos são imediatos, assim como urgentes também têm que ser as ações e a tomada de consciência de todos, pois a extinção é para sempre. Assim, proteger a vida em toda sua diversidade é uma bandeira que a Tetra Pak leva adiante, porém, a responsabilidade ainda é de cada um. De cada cidadão-consumidor, que prefere os produtos ecologicamente corretos e adota atitudes ambientalmente saudáveis. Afinal nós, humanos, fizemos um buraco enorme na natureza nos últimos 10.000 anos. Agora temos a habilidade, e talvez a obrigação moral, de consertar um pouco do estrago. A maior parte do que faremos - expandindo e protegendo áreas selvagens e populações de espécies ameaçadas de extinção - ditará a nossa própria sobrevivência no planeta.
One of the greatest challenges for Mankind in this early 21st century has been, with no doubt, the need to preserve life in all of its nuances. Every living thing, animal or plant, has its role and importance in sustaining life as a whole. This is what we call biodiversity. It is as if every living being were a gear in an enormous machine, and when one of the gears is lost, the functioning of the entire machine is compromised. Wild Cats – The Struggle for Survival, is a reference book, featuring photographs and drawings to illustrate the universe of these magnificent predators that came from the north, arriving in South America over 4 million years ago, to conquer our tropical forests. The up-to-date text in this unique book highlights the key role that felids play in the maintenance of the forests, exploring their stories, colors and the context in which they live. The main focus of the book is to bring Nature closer to the readers, who are becoming ever more sensitive to environmental issues. These issues, including the protection of forests, the loss of biodiversity, sustainability and global warming, are part of every Brazilian`s daily life and are a growing concern, as shown by a number of recent polls. Human activity has dramatically affected biodiversity over time, as the devastation of habitats has led to the extinction of thousands of species. It is, therefore, man’s responsibility to change attitudes and increase awareness to the need to preserve life. The attitudes required may be of individuals, but the effort must be collective and involves all segments of society, including the industrial sector. Aware of its responsibility as a business with a life-long commitment of respect for life, Tetra Pak stands in defense of biodiversity through a wide range of actions in conservation and environmental education. Either through its own programs or by sponsoring projects across the country, the company works directly with endangered species, but it also provides information, raises awareness and encourages conservation and sustainable practices. Brazil presently harbors the planet’s greatest biodiversity, with a wide variety of biomes that reflect the richness of the country’s wildlife. With over 20 percent of the total number of species on Earth, this abundant variety of life makes Brazil first among the 17 most biodiverse countries in the world. These numbers alone underscore the importance of the country’s responsibility towards a planet where too many nations have already devastated their biomes. It is estimated that the increasing rate of species extinction is now 1,000 to 10,000 times greater than the natural rate. Life on the planet can no longer withstand such pressure, and the consequences, including global warming and the adverse effects on the climate and on life in general, are evident. As the effects of this trend are immediate, the actions we need to take and the awareness we have to raise must also be urgent, for extinction is forever. To protect life in all of its diversity is a cause that Tetra Pak heartily supports, knowing, however, that the responsibility actually lies on each and every one of us, on every citizenconsumer who chooses to buy environmentally-friendly products and adopts environmentally sound attitudes. After all, we, as humans, have been destroying and altering Nature for the past 10,000 years. We do now have the capacity, however, and maybe even the moral obligation, to repair some of the damage. Most of what we do, in this sense – by expanding and protecting wild areas and populations of endangered species, for instance – will dictate our very survival on Earth.
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PREFÁCIO Peter G. Crawshaw Jr.
PREFACE
PESQUISADOR RESEARCHER
Instituto Biotrópicos
O
livro Felinos - A luta pela sobrevivência surgiu da ideia do fotógrafo Paulo Fridman de fazer um ensaio fotográfico sobre as espécies brasileiras de felinos e de desenvolver uma obra que revelasse a atual situação destes animais, tão ameaçados pelo desenvolvimento humano. Assim, em 2012, começou a desenhar-se a ideia. Estabelecida a parceria com a Abook Editora, o projeto foi formatado e apresentado ao Ministério da Cultura, que concordou com o seu teor e o aprovou em maio de 2013. No final de 2012, fui procurado por Alberto deC. Alves e Dina Faria, da Abook Editora, que me convidaram a trabalhar com eles na produção do livro, como responsável pela curadoria e revisão da parte técnica do texto. Considerando a situação difícil em que se encontra a conservação da grande maioria de felinos, não só a nível global, mas, e principalmente, dos nossos gatos neotropicais, eu imediatamente vi no livro, uma possibilidade de contribuir para um melhor conhecimento das diferentes espécies, como um canal de comunicação para com o publico leigo, que não tem acesso aos trabalhos técnicos e acadêmicos sobre esse grupo tão importante da nossa fauna. Por mais usado que esteja o jargão de que “é preciso conhecer para querer conservar”, creio que ele nunca vai deixar de ser verdadeiro. A tramitação seguinte, que implicava na viabilização financeira do projeto, encontrou um parceiro que não poderia estar mais alinhado com os objetivos do livro. A Tetrapak de imediato se engajou com o Felinos - A luta pela sobrevivência e fez o aporte de recursos no início de 2014. O projeto saiu do papel e começou assim a sua materialização. Reunida a equipe editorial, composta pelas jornalistas Patricia Broggi e Adriana Teixeira, bem como a diretora de arte Stella Prada, foi tempo de contatar outro parceiro natural: a Mata Ciliar, que desenvolve um trabalho essencial na preservação destes animais. E, assim, chegamos aos estágios finais da edição e à publicação do livro. A partir de agora, só posso esperar que o “nosso filho” realmente venha a desempenhar o papel para o qual ele foi idealizado, de mostrar um pouco mais do que são os nossos felinos. As pessoas ainda são presas a crenças muitas vezes errôneas, imputando perigos e prejuízos imaginados ou quase sempre exagerados, e desconhecendo a importância real que cada uma delas tem, nos ambientes onde ocorrem. Com o desenvolvimento desenfreado das últimas cinco décadas, caracterizado por alterações profundas nos diferentes biomas e nos habitats que os compõe, a grande maioria das espécies da nossa fauna tem perdido inexoravelmente seus espaços, sendo empurradas de encontro à extinção. Nunca, na história do nosso planeta, tantas espécies foram extintas – desapareceram para sempre! – em tão curto espaço de tempo. Pelo seu papel como predadores, muitas vezes competindo com o Homem por alimento, ou representando um risco potencial à sua integridade física, os carnívoros sempre tiveram com ele uma convivência difícil, sendo sistematicamente perseguidos. Mesmo em tempos atuais, alguns países desenvolvidos ainda têm programas de
WILD CATS PREFACE
controle de algumas espécies, consideradas daninhas, muitas vezes subsidiados por diferentes instâncias do governo. Nos últimos vinte anos, um campo da Biologia e Ecologia que tem se tornado cada vez mais importante é o de Conflitos entre Fauna e Humanos (do inglês Human -Wildlife Conflict), como uma decorrência da pré-histórica dificuldade de coexistência entre o Homem e algumas espécies da fauna. Os carnívoros, incluindo principalmente os felinos, figuram nos estudos sobre esse tema, notadamente as espécies maiores. Através da interdisciplinaridade entre os campos da Ecologia, Comportamento Animal, Biologia, e as Ciências Sociais, especialistas tentam diferentes técnicas e alternativas de manejo para identificar formas de reduzir os conflitos e melhorar o convívio entre as populações humanas e a fauna. Os efeitos negativos do Homem sobre a fauna se fazem sentir de diversas maneiras: perseguição direta e indireta, desmatamentos e a consequente redução das áreas necessárias às diferentes espécies, para as diversas atividades econômicas, construção de estradas que agora cortam até os últimos refúgios da fauna, fragmentação de populações, entre outros. Com isso, algumas espécies mais sensíveis a alterações se veem mais prejudicadas e encurraladas. No entanto, algumas, mais adaptáveis, aprendem a conviver e até a tirar vantagem de algumas mudanças nos ambientes. Exemplo disso é a onça-parda, que tem utilizado algumas lavouras, como a cana-de-açúcar, para, através da proteção conferida pela altura das lavouras, estender e recolonizar áreas antes dominadas por pastagens e lavouras mais rasteiras. Elas têm até dado cria em meio à cana, muitas vezes com incidentes trágicos, como quando ocorre o corte com máquinas (agora proibido), atingindo filhotes pequenos demais para fugir. Com a expansão das lavouras de cana, ligando como corredores as áreas naturais remanescentes, a população de pardas tem aumentado, resultando em uma frequência cada vez maior de indivíduos sendo atropelados nas estradas e chegando a centros urbanos populosos. Existem indicações que mesmo a onça-pintada pode estar aprendendo a usar esses corredores de agricultura, em algumas áreas no interior de São Paulo. Além de apresentar dados técnicos sobre cada uma das espécies que ocorrem no Brasil, o livro menciona também, em linguagem acessível, alguns dos problemas que elas encontram, para sua sobrevivência. Eu espero que tanto crianças e adolescentes como adultos possam tirar desse livro o senso de urgência e a necessidade de preservarmos a biodiversidade em geral, da qual tanto dependemos. E como parte essencial dela, em particular, de proteger os felinos, que são a bem dizer um instrumento de aferição com o qual, através da sua presença e da saúde das suas populações, podemos avaliar a qualidade dos ambientes que ocupam, como bioindicadores que são. Para isso, basta adequar um pouco os nossos costumes e atitudes, principalmente os moradores rurais, para deixar um pouco de espaço para que a onça-pintada, a onça-parda, a jaguatirica, e todos os gatos silvestres menores não venham a ser somente uma lembrança em artigos e livros, e que nossos netos e bisnetos, e os bisnetos deles, possam sentir a emoção de encontrar suas pegadas, de sentir a sua presença marcante nos nossos campos e matas.
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PREFÁCIO FELINOS
The book Wild Cats – a struggle for survival was born out of photographer Paulo Fridman’s idea to do a photographic essay of Brazilian wild cat species. The main purpose of the project was to expose to a greater public the current status of these animals as they are threatened by human development. The year was 2012 and the initiative began to take shape. Thanks to a partnership with publisher Abook Editora, the project was put into format and a proposal was submitted to the Ministry of Culture. Their approval came through in May 2013. In late 2012, Alberto deC. Alves and Dina Faria, from Abook Editora publisher, invited me to work with them as technical advisor for the book. Considering the conservation challenges that most felids face today, not only globally, but especially some of the Brazilian Neotropical cats, I immediately saw in the book a chance to help broaden the knowledge that the general public has of the different wild cat species. The book would therefore be an excellent communication channel for lay readers that don`t have access to technical and academic writing on this important group of our wildlife. No matter how old the saying “we must know something before we want to save it”, I believe the truth behind it is eternal. For the next step, that is, the financial feasibility of the project, a new partner came aboard and they could not be more aligned with the book’s purpose. Tetra Pak immediately committed to Wild Cats – a struggle for survival and provided the necessary funding in early 2014. The project could finally leave the planning stage and set its way to publication. After the editorial team was put together, with journalists Patricia Broggi and Adriana Teixeira, and art director Stella Prada, another natural partner joined in: the Mata Ciliar Association, whose essential work has focused on the conservation of these animals. And so we came to the final stages of editing and publishing the book. From now on, I can only hope that “our child” is able to achieve the role for which it was designed: to give the general public a better understanding of Brazilian cats. People hold the often mistaken beliefs that these cats are a threat to people or exaggerate the losses they may inflict on domestic animals, from predation. More importantly, they don`t know the great importance that each of these species has in its own environment. The rampant development of the las five decades has made profound changes in the different biomes and habitats. As a result, the vast majority of species of our wildlife has inexorably lost space, being pushed towards extinction. Never in the history of our planet, have so many species become extinct – gone forever – in such a short period of time. Because of their role as predators, often competing with man for food, or representing a potential or perceived risk to our lives and wellbeing, carnivores have always had a difficult coexistence with mankind, and we, in turn, have systematically hunted them. Even today, some developed countries still have government-funded control programs for species that are considered harmful. Over the last twenty years, Human-Wildlife Conflict, as a branch of Conservation Biology, has become increasingly important, even though its roots are grounded in the prehistoric clash between man and some species of wildlife. Carnivores, including felids, and especially the larger species, are a constant presence in these studies. Through interdisciplinary research across fields such as Ecology, Animal Behavior, Biology, and Social Sciences, specialists are developing techniques and management alternatives to reduce conflict and improve coexistence between human populations and wild animals. The negative effects of man on wildlife appear in several ways: in direct and indirect hunting, in deforestation and the reduction of the areas occupied by different animal species, and in the resulting fragmentation of their
WILD CATS PREFACE
populations. Some of the reasons behind this are the economic activities, and, last but not least, the construction of roads, which today cut through some of the last refuges of wildlife. Species that are sensitive to changes are the most affected as the space they require is ever more reduced. Other more adaptable species, however, learn to coexist and even take advantage of environmental changes. One example is the puma, which has used the protection offered by tall crops, such as sugar cane, to expand and recolonize areas that were previously dominated by short pastures and lower crops. They now even give birth among these crops, sometimes causing tragic incidents, when the (now banned) harvesting machines would kill young cubs that were too small to escape on their own. The great expansion of sugar cane plantations has created corridors that connect remaining natural areas, thus increasing puma population. This increase, on the other hand, has resulted in them becoming frequent victims of road kills and some animals appearing in populated urban areas. There is some indication that even jaguars may be learning to use these agricultural corridors in areas of S達o Paulo state. This book not only features up-to-date technical data on each cat species living in Brazil, but also uses accessible language to emphasize some of the problems they face in their struggle for survival. I hope that children and teenagers, as well as adults, can sense in it the urgency and the need to preserve biodiversity, on which we depend so much. And an essential part of biodiversity that must be protected is wild cats. They are an important means with which we can evaluate the quality of the environments they occupy by monitoring their presence and the health of their populations. They are true indicator-species and as such, we all, but particularly rural residents, that share their environments, must learn to adjust some habits and attitudes, to guarantee enough space for the wild cats. Only so can we ensure that the jaguar, the puma, the ocelot, and all smaller felids do not become just a fading memory in articles and books, and that our grandchildren and their grandchildren, and so on, can experience the thrill of coming upon their tracks and of sensing their overpowering presence in their wild habitats.
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CONSERVAÇÃO, É PRECISO! Cristina Adania VETERINÁRIA E COORDENADORA DE FAUNA VETERINARIAN DOCTOR AND WILDLIFE COORDINATOR
Associação Mata Ciliar
A
FELIDS SPOTTED LIVES
Associação Mata Ciliar é uma entidade civil, sem fins lucrativos, que desenvolve diferentes ações voltadas, principalmente, à preservação de matas ciliares, extensão rural e educação ambiental em diversas regiões do país. Desde 1997, sediamos o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) na cidade de Jundiaí (SP) com o intuito de prestar atendimento médico veterinário aos animais da fauna local em situação de risco. Paralelamente, criamos o Centro Brasileiro para Conservação de Felinos Neotropicais, que tem o objetivo de implantar estratégias para a conservação das oito espécies de felinos selvagens que ocorrem no país. Trata-se de um centro de referência internacional que promove pesquisas, principalmente, na área da biotecnologia aplicada à reprodução, com um programa pioneiro na técnica de transferência de embrião (TE) em uma espécie silvestre na América Latina. No nosso dia a dia, recebemos animais resgatados em consequência de tráfico, queimadas, caça, desmatamento, entre outros motivos. O nosso trabalho engloba várias ações de preservação que, ao final, convergem para um único ponto: a melhor qualidade de vida das comunidades através da conservação da biodiversidade. Isso se traduz em diferentes atividades propostas pela Associação Mata Ciliar e, sem dúvida, as mais importantes são a educação e mobilização comunitária. Estes trabalhos buscam envolver os vários atores regionais em ações que promovam a proteção e ampliação dos habitats naturais, de maneira a fornecer abrigo, alimentação e reprodução dos felinos selvagens que ocorrem no Estado de São Paulo. Neste contexto, a educação tem sido um veículo para levar às pessoas, o conhecimento sobre as características e comportamentos dos felinos que ocorrem no Brasil. Essa ação se torna ainda mais essencial devido ao empobrecimento de nossas paisagens e ao desaparecimento desses animais. Assim, pode-se resumir a importância deste livro: daremos voz a esses felinos. São os nossos animais que estão retratados aqui. As histórias reproduzidas não são exclusivas de cada um, apesar de estarem em primeira pessoa, mas na verdade, elas acabam se repetindo, com tintas diferentes na vida de outros animais da mesma espécie. Esses relatos são o grito desses animais que precisam ser conhecidos, preservados e valorizados. Acreditamos que este livro dará força à essência da nossa missão: ”o respeito à natureza gera frutos para um futuro melhor”.
WILD CATS LETTER
Associação Mata Ciliar is a civil, non-profit organization focused on the conservation of riparian areas (gallery forests), agricultural extension and environmental education in several regions of the country. Since 1997, we established the Centre for Wild Animal Rehabilitation (CRAS) in the city of Jundiaí (SP), providing veterinary care to local wildlife at risk. Simultaneously, we also created the Brazilian Center for the Conservation of Neotropical Wild Cats, whose goal is to implement strategies for the conservation of the eight wild cat species that occur in Brazil. With ground-breaking research in the area of embryo transfer, the Center is considered an international reference in Neotropical wildlife research, especially in the area of biotechnology applied to reproduction. As an important part of our daily routine, we receive wild animals rescued from the illegal wildlife trafficking, from forest fires, hunting, deforestation, and others. Our work includes a variety of conservation actions that ultimately converge on to a single point: to offer human communities the best quality of life through the conservation of biodiversity. To achieve this, Associação Mata Ciliar promotes a number of actions, the most important of which are, without a doubt, education and community awareness. We seek to engage regional stakeholders in actions that lead to the protection and recovery of natural habitats, as well as providing food and shelter and fostering the reproduction of wild cats in the State of São Paulo. Given the increasingly depleted and modified landscapes and the threat of extinction to several species of felids in Brazil, education plays an essential part to make people aware of their characteristics and behavior. Therefore, the main purpose of this book is to give voice to these wild cats. All animals portrayed in this book are residents of our Center. Their stories are not exclusive, even though they are narrated in the first person. Each story will, despite their peculiarities, repeat itself over and over in the lives of different individuals of the different species. These narratives are a cry for help from animals that need to be known, cherished and protected. We believe that this book will bring to light the essence of our mission: “to respect nature now is to sow the seeds for a better future.”
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FABIO COLOMBINI
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FELINOS WILD CATS
F
elinos remetem à sedução. O olhar incomparável, a sinuosidade das passadas, a cauda dançando no ar – pura elegância. Admirados por sua força e coragem, eles reinam no topo da cadeia alimentar. Por isso mesmo inspiram uma sensação de atração e respeito, mas também de medo e distanciamento. Como o leão na África e o tigre na Ásia, a onça-pintada é a rainha de nossas paisagens, da floresta à caatinga. Além de toda sua ginga, encanta a singularidade de sua pelagem magnífica, dourada, salpicada de manchas escuras. Quando melânica, então, é a tradução da beleza: o pelo nasce negro, se desvendando em pintas quando reflete a luz do sol. Um primor da natureza. Se a onça é rainha nacional, os outros felinos não deixam a desejar. Temos a onça-parda (ou puma, suçuarana), de pelagem uniforme e macia; a jaguatirica, exímia caçadora; o gato-maracajá, com sua longa cauda; o gato-mourisco, da cor das chamas ou cinza-escuro quase preto. Ao todo são oito espécies diferentes em território brasileiro – um quarto das existentes no planeta. Verdadeiro privilégio da nossa biodiversidade, que se revela nos remanescentes nichos ecológicos de clima, relevo e vegetação tão diversos e com quase 200 mil distintas espécies vegetais e animais. Mas a biodiversidade é um privilégio que também se traduz em uma responsabilidade. Como resultado do progresso desordenado e de um uso dispendioso dos recursos naturais e da grande ocupação humana, nosso ecossistema se desequilibra. Justamente um dos nossos maiores tesouros fica comprometido, pois a devastação do meio ambiente atinge proporcionalmente os animais, em especial os felinos silvestres.
Cats are all about seduction – their incomparable look, the sinuosity of their walk, the tail dancing in the air. Sheer elegance. Admired for their strength and courage, they reign at the top of the food chain. That’s why they inspire a feeling of attraction and respect, but also of fear and aloofness. As the lion in Africa and the tiger in Asia, the jaguar is the king of the Americas and of the Brazilian landscapes, from theforest to the Caatinga1. It swaggers away, fascinating the observer with the uniqueness of its golden coat speckled with dark spots. When melanistic, it is the very translation of beauty: the black coat breaks out in spots when reflecting the sunlight. It is a masterpiece of nature. If the jaguar is the national king, the other felids do not linger far behind. There is the puma (or suçuarana) with its uniform and smooth coat; the ocelot, the skillful hunter; the margay, with its long tail; the jaguarundi and its color of flames or close to black dark gray. Altogether there are eight different species in Brazilian territory – a quarter of all cat species existing on the planet. This is a true privilege of our biodiversity, which reveals itself in the remaining ecological niches, where climate, topography and vegetation variations flourish in the almost 200,000 different plant and animal species. But biodiversity is a privilege that also translates into a great responsibility. As a result of uncontrolled
WILD CATS INTRODUCTION
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PAULO FRIDMAN
QUEM Sテグ FELINOS
WILD CATS INTRODUCTION
Para eles, as florestas tropicais, por exemplo, devastadas no Brasil mais rapidamente do que em qualquer outro país do mundo, representam seu habitat natural. Sem ele, os felinos tornam-se vulneráveis. Onde a raça humana enxerga o progresso para sua subsistência, os felinos experimentam o efeito contrário, ou seja, ameaça à sua sobrevivência enquanto espécie. O risco da extinção ronda desde os animais de maior porte, como a onça-pintada e a parda, aos de médio porte, como a jaguatirica. Mesmo os felinos de menor porte, como o gato-do-mato-pequeno e o palheiro, não estão a salvo de serem profundamente atingidos pelas mudanças sistemáticas que o homem provoca ao seu redor e que se refletem nas florestas e matas – o habitat natural e essencial para todos eles. A restrição de seu território é um dos aspectos de maior ameaça aos felinos. Predadores de hábitos solitários costumam delimitar sua área de atuação em grandes espaços para conseguirem se alimentar e acasalar. A destruição do ecossistema e o surgimento de novas estradas que cortam o país são fatores preponderantes para a diminuição de oferta de comida e estão por trás da principal causa de morte dos felinos, os atropelamentos. Ao tentar atravessar essas estradas, na maior parte das vezes se tornam vítimas. Nas pequenas áreas remanescentes de vegetação, os animais veem suas possibilidades de sobrevivência muito reduzidas. Apesar de terem um medo natural dos homens, em algumas situações acabam por se aproximar demais em busca de comida, atacam seus rebanhos ou se arriscam em áreas urbanizadas, causando apreensão e, até mesmo, raiva. De caçadores que são,
progress, of the wasteful use of natural resources and of large-scale human occupation, our ecosystems have become imbalanced. With this, one of our greatest treasures is now threatened as the devastation of the environment seriously affects animals and, in particular, wild cats. Tropical forests, for example, more speedily devastated in Brazil than in any other country in the world, represent the natural habitat for felids. Without them, they become vulnerable. What the human race identifies as vital progress for its livelihood, felids experience the opposite effect: a threat to their survival as a species. The risk of extinction threatens both the larger animals, such as the jaguar and the puma, and the midrange ones like the ocelot. Even smaller cats, such as the oncilla and the Pampas cat, are deeply affected by the systematic changes that man causes around them, as these changes impact the forests and natural habitats that are essential to all cats. The restrictions to their territory are one of the greatest threats to felids. As predators of solitary habits, they tend to limit their activity to large spaces in order to find food and to mate. The destruction of ecosystems and the construction of new roads across remaining natural habitats significantly reduce their food supply. More importantly, roadkills are currently one of the main sources of mortality for felids, as they inadvertently try to cross these roads. Confined to ever decreasing islands of vegetation, animals see their chances of survival greatly reduced. Although they have a natural fear of men, they may get too close to them while searching for food and, as a consequence, may attack livestock. This, of course, causes apprehension and even anger. From hunters, the natural predators become prey.
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INTRODUÇÃO FELINOS
viram caça. Esse conflito entre felinos e o homem, tanto nas áreas urbanas quanto em fazendas de criação de animais, é outra causa importante de mortalidade. O problema só poderá ser contornado através da conscientização da população e a valorização das espécies. O habitat recortado e restrito, também impacta em outro ponto vital para a sobrevivência de um animal: a troca de material genético entre os diversos indivíduos. Esse mecanismo natural é o responsável pelo fortalecimento e perpetuação de uma espécie. Mas isso só acontece quando os animais podem se deslocar livremente pelo terreno, se estabelecer e colonizar novos espaços para procriar. Para os felinos, portanto, as estradas, além de um perigo, se tornam agentes de fragmentação da paisagem. Uma solução seria aplicar os conceitos de uma inovadora ciência: a Road Ecology. Uma subdisciplina da Ecologia, que busca alternativas de convivência entre empreendimentos viários, que são fundamentais para o desenvolvimento social e econômico, e a biodiversidade. Uma das propostas encontradas é a criação de túneis ou passarelas verdes que facilitem o seu trânsito. Além da fragmentação de seu habitat, comprometendo alimentação e reprodução, a sobrevivência dos felinos também se vê atingida pela caça. Tanto a caça direta movida pelo homem, para aproveitamento de sua pele e carne, quanto a caça indireta, dos animais que lhe servem de presas. Ambas representam um grande impacto na manutenção dessas espécies, por mais que seja um crime inafiançável em todo território nacional, já que até hoje continua a ocorrer de modo indiscriminado, pela fiscalização deficiente. Se por um lado o cenário crítico nos biomas brasileiros revela a vulnerabilidade dos felinos, por outro, portanto, reforça a urgência de sua preservação. Que se leve em consideração as razões emocionais, passando pelo fascínio que os felinos exercem devido a sua beleza e poder, ou pelo orgulho que devemos ter da nossa biodiversidade. Mas que se leve em consideração razões também muito importantes, diretamente ligadas à eficiente manutenção do equilíbrio ecológico. Nossos felinos silvestres têm um papel relevante nele e não apenas merecem, mas, principalmente, precisam ser preservados. A ausência de um predador na cadeia alimentar de um bioma causa desequilíbrio ecológico, já que propicia a multiplicação de algumas espécies, comprometendo a estabilidade entre fauna e flora. Como predador de topo de cadeia, a onça, por exemplo, se alimenta de vários animais
This conflict between felids and men, both in urban areas and around livestock and cattle ranches, is another important cause of mortality. Solutions to these problems can only be achieved through local awareness, changing attitudes, and recognizing the importance of conserving these animals. With fragmented and restricted habitats, another vital point greatly affects the survival of a species: the exchange of genetic material between individuals. This natural mechanism, responsible for strengthening and perpetuating a species, only takes place when the animals can move freely, colonize new areas, and settle to breed. Therefore, in addition to the danger they represent to wildlife in general, roads can also become agents of landscape fragmentation. One possible solution is to apply the innovative concepts developed by a relatively new branch of ecology, Road Ecology, to promote the coexistence of roads – a key element of social and economic development – and biodiversity. One example is the construction of green under- or overpasses to facilitate animal transit. In addition to the fragmentation of their habitat, which impairs feeding and reproduction, the survival of felids is also impacted by hunting – both the direct, profit-driven poaching for the animal’s pelt and meat, and the indirect hunting of animals that serve as their prey. Even though hunting is prohibited nationwide, it still represents a great impact to the maintenance of these species, since even today it goes on indiscriminately, due to poor law enforcement.
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ARAQUÉM ALCÂNTARA
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INTRODUÇÃO FELINOS
menores, que consomem folhas, frutos e sementes, assim, o felino acaba por cumprir importante papel no controle de herbívoros e até mesmo de predadores (meso-predadores) abaixo dela. A ordem natural do sistema alimentar entre os diferentes grupos de animais funciona como mecanismo de controle direto e indireto das populações de animais e também de plantas. A falta de uma peça nessa cadeia afeta profundamente o equilíbrio dos ecossistemas e, em última instância, a manutenção de florestas saudáveis das quais os seres humanos dependem diretamente. Há tempos que os felinos fazem parte de nossa terra. Estudos sugerem que tenham vindo para o continente sul-americano há quatro milhões de anos. Os famosos naturalistas alemães, Von Martius e Von Spix, que percorreram o Brasil entre 1817 e 1820 coletando espécimes e conhecendo o país, reuniram suas impressões no famoso livro “Viagem pelo Brasil”. Na obra, há quase 200 anos, já era citada a presença de alguns felinos, como a “verdadeira onça” (pintada), a “onça vermelha” (parda), o “gato montês” (maracajá) e o gato-mourisco. Na mesma época, Visconde de Taunay, escritor e importante pensador do Brasil do séc. XIX, também destacava a presença das onças e de outros felinos silvestres. Por seu fascínio, poder, velocidade e vigor, esses animais sempre serviram de assunto para diversas histórias do folclore, para clássicos da literatura infantil e, inclusive, de inspiração na decoração de produtos de artesanato. Isso sem falar nas diversas culturas sul-americanas, entre elas a amazônica, que consideravam a onça uma divindade. Hoje já ocorrem investidas do turismo ecológico para os felinos, ainda que exclusivamente para a onça-pintada, transformando-a em uma atração para turistas dispostos a pagar para avistar esses animais no Pantanal e também em uma iniciativa experimental na Amazônia. Pode ser uma alternativa de renda para diversas áreas de nosso país. Razões não faltam para justificar como é imprescindível a propagação de planos de preservação para as espécies ameaçadas de felinos silvestres. Por conta do risco que enfrentam na situação atual de devastação dos biomas, é essencial um plano de monitoramento das populações remanescentes. Para isso depende-se também da execução de ações de sensibilização e educação da população. É importante a compreensão de que felinos silvestres, ainda que se assemelhem a gatinhos domésticos, não podem se tornar animais de estimação, muito menos podem ser caçados por prazer ou como retaliação ao ataque a rebanhos.
If on one hand the critical scenario across landscapes reveals the vulnerability of felids, on the other it underscores the urgency of their preservation. This may be for reasons rooted in emotions: the fascination that cats inspire for their beauty and power, or the pride that we should feel for our rich biodiversity. However, other equally important reasons must be taken into consideration, reasons directly related to the functional maintenance of ecological balance. Our wild cats have an important role in this balance and not only do they deserve, but, above all, need to be preserved. The absence of top predators in an ecosystem’s food chain causes ecological imbalance, as it allows for the multiplication of some species, jeopardizing the stability between fauna and flora. As a top predator in the chain, the jaguar, for example, feeds on a number of smaller leaf-, fruit-, and seed-consuming animals, and has, therefore, a major role in the control of herbivores and even other predators (mesopredators) below it. The natural order and function of the food system among different animal groups serves as a direct and indirect control mechanism of animal and plant populations. If a part of this chain is missing, that will profoundly affect the ecosystem balance and, ultimately, maintenance of healthy forests on which humans depend directly. Cats have been part of our land for a very long time. Studies estimate that they arrived in South American four million years ago. The famous German naturalists, Von Martius and Von Spix, who traveled across Brazil between 1817 and 1820 collecting specimens and studying the country, gathered their impressions in
WILD CATS INTRODUCTION
PAULO FRIDMAN
the famous book Travels in Brazil. Close to 200 years ago, their work already mentioned the presence of felids such as the “verdadeira onça” (the jaguar), the “onça vermelha” (puma), the “gato montês” (margay) and the “gato-mourisco” (jaguarundi). At the same time, the Viscount of Taunay, an important writer and philosopher of the nineteenth-century in Brazil, also highlighted the presence of jaguars, and other wild cats. For the fascination that they elicit, for their power, speed and vigor, these animals have always been the subject of folk stories, of classics in children’s literature and even the inspiration in handicraft decoration. Several South American cultures, including those in the Amazon region, even considered the jaguar a deity. Today, eco-tourism is directed specifically at the jaguar, with tourists paying considerable amounts to sight these animals in the Pantanal and, experimentally, in the Amazon. This has proven to be a successful alternative source of income for these areas. Many factors validate the importance of multiplying conservation plans for endangered wild cat species. Because of the risk they face in the current state of habitat devastation, we must develop monitoring and management plans for the remaining populations. This depends to a large extent on the implementation of actions focused on awareness and education. People must understand that wild cats, aside from their similarity to domestic kittens, cannot become pets, let alone
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QUEM SÃO FELINOS
NOSSOS FELINOS SILVESTRES TÊM PAPEL FUNDAMENTAL NA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECOLÓGICO Our wild cats have a key role in the maintenance of environmental balance
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WILD CATS INTRODUCTION
O país já possui algumas boas experiências de preservação desses animais. Mas os recursos captados e os projetos desenvolvidos ainda são insuficientes frente ao tamanho do problema. É preciso disseminar treinamento e técnicas para resgate seguro de animais, capacitar profissionais com experiência no manejo de felinos e desenvolver estratégias de reintegração adequadas. Outra vertente importante do planejamento de preservação das espécies passa por programas de reprodução assistida e monitoramento dos animais, tanto em cativeiro quanto na natureza. É o homem usando seus conhecimentos para dar uma ajuda à natureza, como o que já é feito nos projetos da Associação Mata Ciliar, um centro de reabilitação e pesquisa de felinos que é um alento em direção à preservação animal. Há 24 anos estudam de maneira sistematizada os felinos tropicais a partir de um centro com base na cidade de Jundiaí (SP), de onde obtém informações para a manutenção de um banco de dados referentes às espécies com população diminuída por causa das alterações de seus habitats naturais. Além dos dados de classificação zoológica, a Associação Mata Ciliar já conseguiu desenvolver o nascimento da primeira jaguatirica de proveta, em 2007, e atualmente empenhase em criar estratégias para a reintrodução de algumas das espécies de felinos à vida livre. Um sonho. Felinos livres e sadios ocupando a porção que lhes é de direito em seu habitat. Um projeto. Felinos como símbolo da biodiversidade nacional e ícones de uma transformação na mentalidade do homem, que ao preservar se torna consciente de sua responsabilidade com a natureza. Uma esperança. Felinos nos fazendo compreender que destes seres também depende a vida da própria existência humana.
The country has had a few positive conservation initiatives with these animals. However, fund raising and the number of projects developed are still too little to properly address a problem of this magnitude. One of the most pressing needs is to train professionals in the techniques required for safe handling and rescue of felids, and learn about strategies for adequate reintegration. Another important aspect of species preservation planning involves programs for captive husbandry and assisted reproduction, as well as animal monitoring and reintroduction to their habitat. This is man using his knowledge to give Nature a helping hand, as already happens in the projects led by Associação Mata Ciliar, a felid rehabilitation and research center that conducts important work in wildlife conservation. For the past 24 years, they have systematically studied small Neotropical felids fromtheir headquarters located in the city of Jundiaí (SP), where they maintain a database with information on the different species with reduced populations affected by changes to their natural habitats. In addition to working on aspects of zoological classification data, the Associação Mata Ciliar was successful in promoting the birth of the first test-tube ocelot in 2007, and currently strives to develop strategies to reintroduce some species of felids into the wild. A dreAm. Free and healthy cats occupying the space that is rightfully theirs in their natural habitats. A project. Cats as a symbol of our national biodiversity, as icons of a new vision of Humanity, who, by preserving, understandstheir responsibility to nature. A hope. Cats help us understand that on these wild species and on Nature also depends the future of mankind on Earth. 1 Caatinga, one of the six major ecoregions ecosystems of Brazil, is a type of desert desert shrubland characteristic of the Brazilian northeastern backlands (translator’s note).
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JAGUATIRICA FELINOS
JAGUATIRICA
WILD CATS OCELOT
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OCELOT
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JAGUATIRICA Ocelot
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eja pelo corpo esbelto e sinuoso, pela visão e audição aguçadas, ou ainda pela destreza para subir em árvores e a habilidade para pescar, a jaguatirica foi dotada pela natureza para o papel de caçadora. Entretanto, hoje em dia é tida mais como presa. Já foi vítima do tráfico de animais ou peles e, ainda, chega a ser alvo dos fazendeiros e da população rural que a perseguem por atacar animais domésticos, embora causem menos prejuízos do que a onça-pintada e a parda, pois atacam preferencialmente galinheiros. Não é de hoje que jaguatiricas se esgueirando pelas florestas tropicais chamam a atenção dos cientistas. Até há pouco tempo era classificada como integrante do gênero Felis, só mais recentemente, entrou para o grupo Leopardus, a exemplo do ocorrido com outros gatos silvestres neotropicais. Algumas particularidades da espécie contribuíram para a distinção, como o corpo esguio, mas que pode chegar até 125 cm de comprimento total, apesar da pouca altura (não ultrapassa os 50 cm). Guarda também semelhanças com o seu primo próximo, mas de menor tamanho, o gato-maracajá. Possui a cauda curta, que não chega a aproximadamente metade do comprimento do corpo. A sua pelagem com bandas longitudinais e cauda com manchas em forma de anéis, não deixa dúvida de que seja um gato selvagem do gênero Leopardus, e não seja confundido com um gato doméstico crescido. A jaguatirica pode apresentar variações regionais em coloração, do cinza-amarelado ao amarelo-claro mais forte ou castanho-ocre. Somente o ventre tende a ser esbranquiçado, enquanto as manchas negras formam rosetas abertas que às vezes podem se juntar nas laterais – característica similar ao padrão das onças-pintadas, felino de outro gênero - e ao mesmo tempo é a qualidade que a distingue de outros do mesmo gênero, como o próprio gato-maracajá já citado. Para um estudioso da área, é fácil identificar uma jaguatirica pela pegada: almofada arredondada e quatro dedos sem a marca das unhas (como as pegadas dos canídeos). As garras são retráteis, quando não estão em uso ficam protegidas em uma espécie de bolso na pele. Além disso, a pata dianteira é maior do que a da traseira – outra semelhança com a onça-pintada. A diferença? A pata da jaguatirica é bem menor. Na origem do nome também há semelhanças: de procedência tupi, o termo jaguatirica significa onça (iaguara) que se arrasta (tyryk). Nas histórias
Be it the slender, sinuous body, the sharp vision and hearing, or even the tree-climbing dexterity and fishing skills, the ocelot has been well endowed by nature for its role as a hunter. Nowadays, however, this cat is more widely regarded as prey. It was one of the main victims of fur trafficking in the past, and today it is still part of the illegal animal trade for pets. It is also a target for ranchers and people living in rural communities, who hunt it in retaliation for attacking domestic animals, though it causes less harm than the jaguar or the puma, since it attacks mainly domestic fowl. For a long time, ocelots have been sneaking around tropical forests attracting the attention of scientists. Until not long ago, it was classified as a member of the genus Felis, and only recently did it join the Leopardus group, as occurred with other Neotropical wild cats. Some peculiarities of the species have contributed to this distinction, for instance, the slender body, with up to 4 feet (49 inches) in total length, despite the low height (not exceeding 20 inches). It also has similarities with its close, yet smaller cousin, the margay, for its short tail, which does not reach half its body length. Its coat with
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ADAPTA-SE EM PAISAGENS VARIADAS, EM TERMOS DE CLIMA, RELEVO E VEGETAÇÃO Ocelots can adapt to a variety of landscapes, in terms of climate, topography and vegetation types
longitudinal stripes and tail marked by ring-like spots, leave no doubt that it is a wild cat of the Leopardus genus, not to be confused with an overgrown domestic cat. The ocelot can display regional variations in color, from yellowish gray to a bright light yellow or ochre-brown. Only the abdomen tends to be whitish, while black spots form open rosettes, which sometimes meet on the sides –not unlike the pattern of jaguars, a felid of a different genus. It is this characteristic pattern of pelage that distinguishes the ocelot from other species of the same genus, such as the margay. For a specialist, it is easy to identify an ocelot by its footprint: a rounded track with a heel-pad and four toes that don’t display the claw marks (as do canid tracks). In a cat, the claws are retractable, and when not in use, stay protected in skin pockets. Also, the front paws are larger than the rear feet – another similarity with the jaguar. But what is the difference between them? The ocelot’s paw is much smaller. There are also similarities on the origin of their names: of Tupi origin, the ocelot’s original name, jaguatirica, means jaguar (iaguara) that creeps (tyryk). In the tales of the Brazilian caboclos2, which blend indigenous knowledge with hunting tales, many of these stories speak of jaguars in regions of the country that are known to be the habitat of ocelots. In other words, this was a case of mistaken identity. In size, it loses only to jaguars and pumas, being the largest of the Neotropical small cats with an average weight of around 24 lbs. It leads a solitary life, restricted to an area that can vary from 0.8 to 8 mi2. It usually does not travel far beyond its domain when it is after a prey, except when
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WILD CATS OCELOT
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do caboclo brasileiro, mesclando o saber indígena aos “causos” de caçador, muitas delas falam de onça-pintada em várias regiões do país que são sabidamente habitat de jaguatirica. Em outras palavras: o povo levou gato por lebre, ou, melhor dizendo, jaguatirica por onça! Em tamanho só perde mesmo para as onças, tanto a parda quanto a pintada, ocupando a posição de maior gato silvestre brasileiro com peso médio em torno de 11 kg. Solitária, tem uma vida restrita a uma área que pode variar de 2 km² a 20 km². Geralmente não avança muito além do seu domínio atrás de uma presa, a não ser que seja necessário. E, nesse caso, prefere fazê-lo à noite, quando há menor risco em atravessar espaços abertos. Por isso também a maior parte das vezes sua caça é noturna, passando o dia em uma gruta ou tronco de árvore, se escondendo ou dormindo para a investida mais tarde. Apesar de subir bem em árvores, busca seus alimentos principalmente no solo e, quando a oferta escasseia, pode ir atrás de peixes. Da Caatinga ao Cerrado, encontram-se felinos dessa espécie por todo o Brasil, com exceção do Pampa gaúcho. Ela ocorre ainda no norte da
necessary. And, in this case, it prefers to do it at night, when the risk of crossing open spaces is smaller. That also explains why most of its hunting is nocturnal. The animal spends the day in a cave or tree trunk, hiding or sleeping. Although the ocelot is a skillful tree climber, it looks for food mainly on the ground, and, when supply is scarce, it may search for fish. From the Caatinga to the Cerrado, felids of this species can be found throughout Brazil, with the exception of the Pampas of Rio Grande do Sul. It also ranges from northern Argentina, all the way to Texas, USA. The variation of habitats reveals the great adaptability of this felid, as it occurs in landscapes with widely varied
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OPORTUNISTA, A DIETA DE UMA JAGUATIRICA VARIA DE ACORDO COM O HABITAT E A CONCORRÊNCIA DE OUTROS FELINOS
climates, topography and vegetation types. This is also reflected in the ocelot’s food, which is strictly carnivorous and based on birds, reptiles (including snakes), small and medium mammals and even carrion, on occasion. An opportunistic hunter, the ocelot has a diet that varies with the resources available in the different habitats and, to a degree, with the competition from other cat species. Nevertheless, it is because of its adaptability that the ocelot is facing conservation problems. As they can adapt to degraded environments and with the reduction of their prey, ocelots often risk danger and approach human settlements in search of food, and can at times be persecuted by rural residents either in retaliation for preying on poultry or for animal trafficking. Still, a recent review of the ocelot’s global status by the International Union for Conservation of Nature (IUCN), places it out of immediate danger of extinction. Today, researchers in veterinary medicine work with this felid in aspects of assisted reproduction and in-vitro fertilization in captive conditions. Even though these techniques may never replace reproduction in wild populations, it will hopefully be used in individual cases of supplementation or restocking of individuals in the wild.
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The opportunistic diet of an ocelot varies according to the habitats and competition from other cat species
Argentina, até o Texas, nos EUA. A variação de habitats revela a imensa capacidade de adaptação deste felino, adequando-se em paisagens bastante variadas em termos de clima, relevo e vegetação. Isso se reflete também na sua alimentação, estritamente carnívora, à base de aves, répteis, incluindo cobras, pequenos mamíferos e até carniça. Caçadora oportunista, a dieta de uma jaguatirica varia de acordo com a oferta do habitat e a concorrência de outros felinos. Contudo, é exatamente por conta dessa grande adaptabilidade que a jaguatirica acaba enfrentando problemas em relação à sua conservação. Suportando bem a vida em ambientes degradados e se aproximando perigosamente das cidades em busca de presas, por vezes podem ser caçadas para o tráfico de animais. Por outro lado, com a destruição do habitat natural e a diminuição de sua caça, as jaguatiricas atacam os animais domésticos e, consequentemente, são perseguidas por moradores rurais. Apesar disso, uma recente revisão do status global da jaguatirica, pela International Union for Conservation of Nature (IUCN), a coloca como fora de perigo imediato de extinção. Atualmente estudiosos da área de medicina animal trabalham com este felino em pesquisas reprodutivas em cativeiro e fertilizações in vitro que, embora nunca substituam as populações de vida livre, podem ser utilizadas para casos pontuais de suplementação de populações na natureza.
Caboclo: a Brazilian mestizo, a person of mixed Indigenous and European background.
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They tend to avoid bright open spaces to ambush their prey and to protect themselves from predators
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EVITA ESPAÇOS ABERTOS COM LUMINOSIDADE PARA SURPREENDER A PRESA E PROTEGER-SE DE PREDADORES
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LUA “
Rifle de caçador mata jaguatirica. Carro também. A mão pesada do homem quando não mata o
bicho, destrói a floresta e a jaguatirica não tem o que comer. Para muitos felinos, o homem é o inimigo. Menos para mim. Nasci graças à mão do homem. Sou uma filha da proveta. Fui concebida em um laboratório. Um capricho dos cientistas. Quem são meus pais biológicos, não sei. De um lado veio um óvulo, de outro o espermatozoide e aí nasceu Lua, eu, muito prazer. Sei que o progresso que o humano comanda põe em dúvida o nosso futuro de bicho. Mas também pode ser a resposta para a gente sonhar com um futuro. Tem sabedoria também no bicho homem, que replicou no laboratório o fluxo genético que mantém a minha espécie. Na natureza, os filhotes machos são despachados para outras bandas, longe de onde nasceram, para espalhar seus genes em mais territórios. Comigo os cientistas copiaram a natureza e procuraram a combinação certa, só que na proveta. Sou uma boa mistura. Ou era melhor ter deixado a natureza agir? Não sei. Ela anda enfraquecida, doente. E só com ela eu não estaria aqui. Sou fruto daquela combinação, daquele instante, dentro daquele laboratório. Sou o que pode ser feito agora, para que outras iguais a mim existam no futuro.
Fui gestada na barriga quente da Raquel. Ganhei uma mãe. Comigo veio seu instinto maternal. Raquel pulava, eu pulava também. Ela comia, eu comia também. Dormia, eu dormia também. Foi lá no útero de jaguatirica que comecei a aprender a ser jaguatirica. E aqui fora ela me amamentou e me ensinou o que faltava e o que foi possível. Aprendi a subir em árvore, a me esconder em gruta, a caçar não, porque não tem campo livre para correr... Aqui a gente não caça, por mais que sinta vontade. Essa vontade a proveta não tira. Ficamos juntas todo o dia, na verdade, toda noite. A gente gosta de lusco fusco e de escuro. É de noite que me sinto uma jaguatirica completa. Um dia desses vamos nos separar. Não fico triste, não. Essa é a minha natureza. Sou bicho solitário. É assim que somos. Vou ficar por aqui. Preciso ser observada, medida, examinada. Precisam ver se eu vinguei. Pois eu vinguei sim. Já são sete anos de vida vivida como bicho. Só o RG diz proveta, porque sob a brisa das árvores sou é muito gato silvestre! Dizem que a gente não sente falta do que não conhece, mas fica um certo vazio, de não ser o que deveria ser. Sou importante. Fui a primeira jaguatirica a nascer assim na América do Sul. Agora há a intenção de repetir a experiência. Muitas e muitas vezes. E tentar com outros felinos. Esse bicho homem é ambicioso. Quer que o próximo bebê jaguatirica nasça e cresça em um lugar maior do que o meu. Como se fosse livre, aprendendo desde filhote como é a vida na natureza para poder ser solto. Boa ambição
”
essa. E na moral da minha história o homem aprende que, no lugar de tirar a vida, ele pode criá-la.
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LUA “
Hunters’ rifles kill ocelots. Cars too. The heavy hand of man, when it doesn’t kill these animals directly, destroys
the forest and the food they need to survive. For many felids, man is usually the enemy. But not for me. I was born thanks to a helping hand of man. I am a product of a test-tube. I was conceived in a lab, as a dream of scientists. I never knew my biological parents. From one side came the ovule, from another the sperm, and then I was born. Lua is my name, nice to meet you. I know that the so-called progress, as humans command it, casts a shadow on our future as species. But, if well used, it can also provide answers to help us dream of a future. Despite the heavy hand, there is also wisdom in man: in the lab, he was able to replicate the genetic flow that characterizes my species. When male cubs get to adult size, in the wild, they are forced by their mothers to disperse from their natal areas, so they can establish their own home ranges and spread their genes. With the experiment that created me, scientists replicated Nature, in an attempt to find the right combination, in controlled conditions. I turned out to be a good blend, I think. Or would it be better to let Nature act on her own? I don’t know. Man has made Nature weak, sick, in most places. If it depended on her alone, I would probably not be here. I am the result of that combination, of that moment within that lab. I am living proof of what can be done at present, so that possibly others like me may exist in the future.
I was gestated in Raquel’s warm womb and, therefore, gained a foster mother. Because of me, her maternal instinct was stimulated. When Raquel jumped, I jumped. When she ate, I ate. When she slept, I slept. It was there, in that ocelot’s womb, that I started learning how to be an ocelot. And when I was born, she nursed me and taught me what was missing, and what was possible, given the limitations of a captive environment. I did learn how to climb a tree, how to hide in a cave, but not hunting, because there were no open fields to run in ... Here where I live, you don’t hunt, no matter how much you want to. And that instinct is something the test-tube will never take from you. We would spend all days together, every night, actually. We like the twilight and the darkness. It is at night that I feel like a wholesome ocelot. One of these days, I know we will go separate ways. That doesn’t make me sad, though. It’s in my nature. I’m a solitary animal. That’s the way ocelots are. I’ll stay here. I must be constantly monitored, measured and examined. They must be sure that I am healthy, to prove I was a successful experiment. And I have proved that, I know. It’s been seven years I’ve been living the life of an ocelot. Only my ID card says test-tube, because, given that chance, underneath the forest breeze, I would be a very wild cat! They say you don’t miss what you don’t know, but I sure feel a kind of emptiness inside, a strange sense that you’re not what you should be. I’m important. I was the first ocelot to be born this way in South America. Now they want to repeat the experience. Many, many times. And to try it with other felids. Humans are ambitious. They want the next ocelot baby to be born and grow up in a bigger place than mine. And if given the right conditions, to teach him what life is like in the wild, so he can be reintroduced into Nature. This is a good plan, isn’t it? And if my story has a lesson
”
to be learned, it is that man can learn that instead of destroying life, he can create it.
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Areas of dense and humid vegetation, such as the Pantanal, are yet another of the ocelot’s habitats
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AS ÁREAS DE COBERTURA VEGETAL MAIS DENSA, ESPECIALMENTE ÚMIDA, COMO O PANTANAL, SÃO TAMBÉM HABITAT DA JAGUATIRICA
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Leopardus pardalis SCIENTIFIC NAME: Leopardus pardalis OUTROS NOMES: jaguatirica, maracajá-verdadeiro OTHER NAMES: jaguatirica, maracajá-verdadeiro CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Leopardus GENUS: Leopardus SUBESPÉCIES NO BRASIL: L. p. pardalis, L. p. mitis SUBSPECIES: L. p. pardalis, L.p.mitis SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: fora de perigo imediato de extinção CONSERVATION STATUS: not immediately endangered
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ONÇA-PARDA FELINOS
WILD CATS PUMA
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PUMA
ONÇA PARDA
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WILD CATS PUMA
ONÇA-PARDA Puma
A
s patas tocam o chão de forma macia, silenciosa, graças à camada de pelos que as envolvem. Lembram as de um leão, só que em menor escala. Não que seja um animal pequeno, tem 70 cm de altura e é o segundo maior felino das Américas. A coloração uniforme, marrom acinzentada com áreas laterais do focinho, e ventre da cor branca é outra similaridade com os leões, e é por isso que em terras catarinenses foi apelidada de leão baio. Mas a verdade é que a suçuarana (outro de seus nomes) é uma onça mesmo, apesar de não trazer nenhuma das pintas características. Aliás, elas nascem com manchas escuras e pintas grandes, mas desaparecem aos poucos até as 14 semanas de idade. Acontece com a onça-parda o mesmo que com alguns outros felinos: sua pelagem pode mudar de cor conforme a região que habita. O tom marrom acinzentado se tinge de avermelhado quando são indivíduos do norte do Brasil. Os animais que vivem em áreas mais abertas geralmente têm uma tonalidade mais clara. O tamanho varia também pela região e pelo sexo. Os machos normalmente são maiores (o mesmo acontece com outras espécies) chegando a pesar 100 kg, mas o peso médio fica entre os 30 e 60 kg. As suçuaranas que vivem mais próximas da linha do equador são menores do que as que vivem em latitudes maiores. Uma característica comum a todas é a longa cauda, até 60 cm, com a ponta preta. A onça-parda tem uma área de vida bem ampla e variável, de 10 a 155 km² e pode ser encontrada em quase toda a América, de boa parte da Argentina até a metade oeste da América do Norte, porém, em algumas dessas regiões, foi considerada extinta. A espécie tem a capacidade de se adaptar a ambientes variados, ocorrendo em diversos biomas brasileiros, da Caatinga e Cerrado às florestas, inclusive em áreas alteradas pelo homem. Por conseguirem cobrir grandes distâncias, a chance de poderem manter o fluxo genético entre populações é maior, garantindo a essencial troca de genes entre os animais. É possível que no futuro essa tenha que ser feita através de manejo dirigido, para aumentar as chances de sobrevivência de populações pequenas e isoladas. A sobrevivência da espécie, aliás, anda ameaçada principalmente por causa das estradas movimentadas que cortam a maioria das regiões e que são quase intransponíveis, mesmo para os homens, imagine para uma suçuarana! Os atropelamentos estão entre as principais causas de
The paws softly, silently touch the ground thanks to the layer of fur padding them. They resemble a lion’s paws, only smaller. Still, this is not a small animal; it is 27 inches tall and is the second largest felid in the Americas. The even grayish brown color, touched with specks of white around the sides of the muzzle and belly, show yet another resemblance to the lion, and that’s why, in the state of Santa Catarina, the puma is known as bay lion3. Though the suçuarana (another of its many names) shares the Portuguese name “onça” with the jaguar, it does not feature the characteristic spots of the larger cat. In truth, when the puma is born, it does show large dark spots, but they gradually disappear before the animal is 14 weeks old. As happens with other cats, the puma’s coat can have different colors depending on the region where it lives. The grayish brown is tinged with a reddish hue when they come from northern Brazil. The animals living in open areas usually feature a lighter shade. Size also varies by region and gender. Males are usually larger (as happens with other cat species) and may reach up to 220 lbs in weight, though the average weight usually varies from 66 lbs to 132 lbs. Pumas living closer to the equator are
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ONÇA-PARDA FELINOS
LUIZ CLAUDIO MARIGO / TYBA
smaller than those living in greater latitudes. A common feature to all is their long tail, up to 24 inches in length with a black tip at the end. The puma inhabits a wide and diverse home range, covering from 3.8 mi² to 60 mi² and can be found almost everywhere in the Americas, from much of Argentina to the eastern half of North America. It is, however, considered extinct in some of these regions. The species can adapt to a variety of environments, appearing in a number of Brazilian biomes: from the Caatinga and Cerrado to forests, including areas altered by man. Because they can cover great distances, they have a greater chance of maintaining the genetic flow between populations, insuring the essential exchange of genes between animals. It is possible that, in the future, this genetic exchange may have to be used deliberately in management (by man), in order to increase the chances of survival of small and isolated populations. The survival of the species is, in fact, in danger mainly because of the busy roads that cut through most of the regions where the animals live. If many of these roads are nearly impassable for man himself, what chances can a puma have? Road kills are one of the leading causes of mortality, usually among young males. When a male cub reaches sexual maturity, its mother sends it away so she
mortalidade, geralmente de machos jovens. Quando um filhote macho atinge a maturidade sexual é afastado pela própria mãe para que ela possa se reproduzir novamente, enquanto ele segue para longe procurando estabelecer seu território, onde irá caçar por conta própria e acasalar. Isso se não for atropelado no meio do caminho. Outra causa de morte prematura é a caça. No sul do país, por exemplo, onde ovelhas são criadas em áreas de campos entremeados por florestas, chamados de capões, as onças caçam com desenvoltura e buscam abrigo nos mesmos. Os fazendeiros, enraivecidos por suas perdas, saem à sua caça armados e, infelizmente, muitas vezes são bem sucedidos. Grande predadora, como todos os felinos, a suçuarana caça principalmente por emboscada, com arrancadas que atingem altas velocidades em pouquíssimo tempo. Seu corpo esguio com comprimento médio entre 90 e 150 cm, os membros fortes e as longas patas traseiras facilitam escaladas e saltos, um ponto positivo na hora da caça ou mesmo da fuga de alguma perseguição. Embora não goste tanto da água quanto a pintada, a onça-parda nada bem, caso tenha necessidade. Suas presas favoritas são mamíferos silvestres, como tatus, capivaras, veados e roedores, mas, na sua falta, ela pode adquirir o hábito de predar animais domésticos, entre eles, potros, bezerros, ovelhas ou porcos. Mata pela mordida, geralmente abocanhando a presa na área dorsal do pescoço ou na garganta, que acaba morrendo por sufocamento. Quando se
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GRANDE PREDADORA, A SUÇUARANA CAÇA POR EMBOSCADA E ALCANÇA ALTAS VELOCIDADES RAPIDAMENTE FABIO COLOMBINI
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A great predator, the puma hunts by ambush and quickly reaches high speeds
ONÇA-PARDA FELINOS
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can breed again. The young puma, meanwhile, leaves its natal area, to establish its own territory where it will hunt and mate – if it is not killed by a vehicle before that. Another cause of premature death is illegal hunting. In southern Brazil, for instance, where sheep are raised in pastures interspersed with capões (islands of forest), pumas eventually prey on the domesticated animals. Enraged by their losses, ranchers hunt them and, regrettably, are often successful. A great predator, like all felids, the puma hunts primarily by ambush, with sprints that reach high speeds. Its slim body, with an average length of 35 to 59 inches, strong limbs and long hind legs, facilitates climbing and jumping, a strong point for hunting and escaping from possible chances. Although it does not enjoy the water as much as the jaguar, the puma is a good swimmer, if the need arises. Its favorite prey are wild mammals such as deer, armadillos, capybaras, but, in their absence, the puma can acquire the habit of preying on domestic animals, such as colts, calves, sheep and pigs. It kills with a bite usually delivered to the dorsal area of the neck, or to the throat, killing by suffocation. When it feels satiated, the puma cleverly covers the carcass with dry leaves, fragments of tree trunks or bark and hides it from other predators, returning later to finish the meal. Although pumas can be found active at different times of day, they prefer to hunt at dusk or at night. They have a lonely life and can only be sighted with others of their species on very specific occasions: during the mating season, when males may battle over a female in heat, causing eventual clashes among them; in the period between suckling and hunt training, when cubs accompany their mothers; and in the pre-dispersal phase, when they can sometimes be seen side-by-side with their siblings, their bulks now close to adult size. Gestation lasts from 90 to 96 days, with a litter size of 3 to 4 cubs. Females may nurse for three months, but cubs start to eat meat when they are six weeks old. At the age of six months, they occasionally accompany their mother on hunts and, when between one and a half and two years of age, they go off to live alone.
sente saciada, esconde habilmente a carcaça com folhas secas, pedaços de troncos, ou cascas, para protegê-la de outros predadores, e volta para terminar a refeição mais tarde, até que não reste mais nada. Embora possa ser encontrada em diferentes horas do dia, sua preferência é por atividades ao entardecer ou à noite. E vive solitária. Somente é avistada com outras de sua espécie em situações muito específicas: durante a época reprodutiva, em que machos podem disputar uma fêmea no cio, chegando a brigar entre si; no período entre a amamentação e o treinamento de caça quando as mães estão acompanhadas dos filhotes; e na fase pré-dispersão, ao lado de irmãos jovens de porte quase adulto. A gestação dura entre 90 e 96 dias, quando nascem geralmente entre 3 e 4 filhotes. As fêmeas poderão amamentar por três meses, mas os filhotes já começam a comer carne com seis semanas de vida. Com seis meses acompanham ocasionalmente sua mãe em caçadas e a partir de um ano e meio a dois anos partem para viver sozinhos.
SOLITÁRIA, SÓ CONVIVE COM OUTRAS DE SUA ESPÉCIE NA ÉPOCA DA REPRODUÇÃO, QUANDO NASCEM OS FILHOTES ATÉ A FASE DE DISPERSÃO
Bay/baio – the bay color is used both in Portuguese (baio) and in English (bay) to describe horses hair coat color. However, in the two languages they represent different hues: in English, bay corresponds to a reddish brown or copper, while baio, in Portuguese, corresponds to light yellow or beige. (TN)
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They have a lonely life and are only sighted with others of their species during the mating season, when cubs are born, up to the dispersal phase
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EM REGIÕES ABERTAS COMO O CERRADO, A ONÇA-PARDA TEM TONALIDADE MAIS CLARA
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In open areas, such as the Cerrado, the puma’s coat has a lighter shade
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CURIÓ “
Meu sotaque é manso, sou mineiro, sô. Meus irmãos e eu nascemos para
os lados de Uberaba. Se fosse de Santa Catarina seria um leão baio, bah, mas aqui, em São Paulo, sou suçuarana ou onça-parda. Éramos três, hoje só restam dois. E nem nos damos bem. Coisa de macho, luta pela dominância. Fica cada um para o seu lado, esquecido um do outro. Minha terra natal fica no coração de Minas Gerais. Nos campos floridos, um paraíso para a onça-parda. Paraíso também para o gado e os animais domésticos, é aí que a coisa complica. Até que me adapto, adoro o Cerrado, gosto da floresta, vivo bem na Caatinga e me divirto em um descampado, mas me colocar no meio do gado e dos animais domésticos, é muita tentação... Fui arrancado cedo do meu chão. O que três filhotes podiam fazer de mal? Não sei, não. Nem conheci meu Cerrado, os dias quentes de verão, as árvores retorcidas... Lembro de nada, não, já se vão 14 anos. Mudamos de terra e de identidade. Meu irmão fazia barulho de pássaro, virou Bem-te-vi. De tabela, ganhei nome Curió e o outro irmão, Sabiá. Éramos quase bebês. Tomei leite de mamadeira. De duas em duas horas. Veterinária travestida de mãe. Mãe que não conheci. Veterinária dava leite. Veterinária fazia massagem para defecar. Veterinária estimulava para urinar. Veterinária com algodão molhado como lambida. Veterinária. Veterinária. Acostumei. Hoje o bicho homem para mim é como se fosse da família. Mais que meu irmão.
Foi o jeito de eu não morrer. Eu sei. Mas também foi o jeito de matar minha alma selvagem. Pareço mansinho. É só chegar perto de onde estou que me aproximo. Acostumei. Perdi o medo. Espero um carinho. Aqui não sinto fome. Tenho carne todo dia. Fiquei grande. Peso: 45 kg. Altura: 70 cm. Comprimento: 1,71 cm. Instinto: 0. De vez em quando um ratinho despercebido atiça o resto da minha natureza. Aí eu caço, sou bom nisso. Emboscadas são meu forte. Rápido, escalo facilmente. Venço. E a sensação de vitória me faz muito bem. Engulo de vez
”
minha vítima. Sinto o gosto do poder. Me sinto livre, atrás das grades.
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CURIÓ “
My gentle drawl will tell you I come from Minas Gerais. My brothers and
I were born in the vicinity of the city of Uberaba. If I had come from Santa Catarina, I’d be called a bay lion, but here in São Paulo, where I am now, they call me suçuarana or puma. There used to be three of us; now only two remain. But we don’t get along. It’s a male thing, the fight for territory. Each sticks to their own turf, oblivious of the other. My home lies right in the heart of Minas Gerais state, whose blossoming fields are a true paradise for a puma, but unfortunately, the region is equally heavenly for cattle, and that can betricky for both of us. I adapt quite easily, mind you. I love the Cerrado4; I like the forest; I can live in the Caatinga and I have fun in open fields, but to be around cattle andother domestic animalscan at times be too tempting for me. I was too soon ripped from my land. What wrong could three little cubs do? I dunno. I never saw my Cerrado, the hot summer days, the twisted trees... I don’t remember anything. Fourteen years have passed since that day. We changed land and we changed identity. My brother used to chirp like a bird, so he became Bem-te-vi. Likewise, they named me Curió, and the last brother was Sabia5. We were practically babies. I drank bottled milk – every two hours. A she-veterinarian covered up as my mother, a mother which I could never follow and learn from. In addition to feeding me milk, the veterinarian massaged my belly to help me defecate; she stimulated me to urinate, and used a wet cotton cloth to clean me. The veterinarian. The veterinarian. I got used to her. Today, man is family to me. He is my brother. I depend entirely on him.
It was the way to keep me alive. I know. But, that was also how they killed my untamed soul. I am now tame and gentle. Just get close to where I am and I’ll walk to you. I got used to it. I lost my fear. I expect to be fondled. I feel no hunger here. I am fed meat every day. I got big. Weight: 99 lbs. Height: 27 inches. Length: 67 inches. Wild Instincts: 0. Sometimes, an unwary mouse stirs up what’s left of my nature. Then I hunt; I am good at it. Ambushes are my specialty. I’m fast, I climb easily. I win. The taste of victory makes me feel real good. I swallow my victim in one gulp. I feel the taste of power. Somehow, I feel free behind the bars. 4 5
”
Cerrado - a vast tropical savanna ecoregion of Brazil, particularly in the states of Goiás and Minas Gerais (TN). Bem-te-vi, Curió and Sabiá are the names of three very Brazilian birds. In English they correspond to the great kiskadee, the bullfinch, and the rufous-bellied thrush, respectively (TN).
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Puma concolor SCIENTIFIC NAME: Puma concolor OUTROS NOMES: onça-parda, suçuarana, leão-baio, onçavermelha, leão da montanha OTHER NAMES: onça-parda, suçuarana, bay lion, onça-vermelha, mountain lion CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Puma GENUS: Puma SUBESPÉCIES NO BRASIL: P. c. capricornensis e P. c. greeni SUBSPECIES IN BRAZIL: P. c. capricornensis and P. c.greeni SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: vulnerável CONSERVATION STATUS: vulnerable
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See english data in page 177
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MARGAY ZIG KOCH
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Fテ。IO COLOMBINI
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GATO-MARACAJÁ Margay
É
no olhar que se distingue o gato-maracajá. Esse é seu traço mais marcante. Simplesmente porque seus olhos, em proporção ao tamanho da cabeça, são grandes, protuberantes e refletem a luz como faróis no escuro, quando focados com uma lanterna. Outra característica que chama a atenção são as orelhas: arrebitadas e com pontas arredondadas. Tem porte pequeno, chega a 50 cm, sem contar a cauda que tem aproximadamente 35 cm. Seu peso adulto é de 2,5 a 3,5 kg. Sua habilidade em uma árvore é surpreendente. Com a elegância típica dos felinos e muita rapidez, ele é capaz de escalar um tronco com a maior facilidade. Na verdade o animal vive uma parte significativa de seu tempo entre os galhos, sendo o mais arbóreo dos felinos americanos. Basicamente porque na evolução foi abençoado com uma aerodinâmica perfeita para isso. Esguio e leve, ele pode se equilibrar até à ponta dos ramos. Sua cauda mais longa é o acessório perfeito para manter o equilíbrio. Além disso, sua extrema habilidade para saltar – chega a pular 3,7 m na horizontal – e as suas garras, são fundamentais em manobras que permitem se pendurar nos ramos com apenas uma pata. Mas sua característica mais importante, e exclusiva entre os felinos brasileiros, é que seu tornozelo é dotado de articulações que giram até 180 graus, o suficiente para ficar de cabeça para baixo em árvores, coisa que só o leopardo nebuloso asiático também é capaz de fazer. Por conta dessa tendência pela vida arbórea, o habitat preferido do maracajá são as florestas, inclusive as matas de galeria do Cerrado brasileiro. Pode ser encontrado em todo o país, exceto nos Pampas do Rio Grande do Sul e na região da Caatinga nordestina. Está presente também desde o norte do México, ocorrendo na América Central até ao norte do Uruguai e da Argentina, com exceção do Chile. É a sua afinidade com as árvores que define a dieta do animal. Geralmente suas presas são roedores arbóreos, além de outros pequenos mamíferos e pássaros de pequeno porte. Uma curiosidade que o ajuda na hora da caça, e só recentemente descrita, é sua capacidade desenvolvida de produzir sons, chega a fazer um barulho que se assemelha a um filhote de sagui. Essa habilidade se denomina “mimetismo ofensivo”, já que com ela consegue enganar suas presas. Vantagem de um lado, desvantagem de outro: seu porte menor
It is mainly in the eyes that you identify the margay. They are this cat’s most striking feature simply because, in relationship to the size of the head, its eyes are large and bulging and, when focused by a flashlight at night, shine brightly in the dark, almost like headlights. The ears are another distinctive feature: turned upwards and rounded at the tip. The animal is small, reaching 20 inches, without including the tail, which adds another 14 inches to its total length. The adult weight ranges from 5.5 to 7.7 lbs. The margay has remarkable climbing skills and, with typically feline elegance and great agility, it can easily climb and move through tall trees. In fact, the animal lives a considerable part of its life among the high branches, considered the most arboreal of all American felids. Evolution blessed it with perfect aerodynamics to achieve that. Slim and lightweight, it can balance itself even at the very end of branches. Its longer tail is the perfect accessory for balance. Moreover, its extreme jumping skills – it can jump up to 12 feet horizontally – as well as its claws, are fundamental to execute maneuvers that allow it to hang on branches hanging from one foot only. Its most important feature, unique among Brazilian felids, is its ankles whose articulations can rotate up to 180 degrees, allowing the margay to hang itself upside down from a tree, something that only the Asian clouded leopard can do.
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Because of this propensity for arboreal life, the margay’s preferred habitat is the forest, including the Brazilian Cerrado’s gallery forests. It can be found throughout the country except in the Pampas ecosystem of Rio Grande do Sul and in the Caatinga region of the Northeast. It is also present from northern Mexico, through Central America to northern Argentina and Uruguay, with the exception of Chile. It is the margay’s affinity with trees that defines the animal’s diet. Their prey are usually arboreal rodents, and other small mammals and birds. A curious trait that is very useful in hunting, and only recently described, is the margay’s developed ability to produceand imitate sounds. It can even make a sound that resembles that of an infant marmoset. This ability is called “offensive mimicry”, as the animal manages to attract or deceive its prey. However, where there are pros, there are bound to be cons: with the margay’s small size, it has to be always on the alert, because the hunter can quickly become prey of larger cats, or other predators. The margay (Leopardus wiedii) is often mistaken and compared to the ocelot (Leopardus pardalis). An example of this is the fact that, in northern Brazil, the ocelot is called “maracajá-verdadeiro” or “maracajá-grande”, where the word “maracajá” refers to the margay (therefore, real margay, or large margay). This confusion does have a good reason: the two species are more closely related than any of the other cats and actually descend from a recent common ancestor. Despite the similarities in color and spot pattern, however, the ocelot is more than twice the size and weight of the margay. Their color, incidentally, goes from grayish yellow to ochre-brown, with a few intermediate shades. The spots may vary; in some parts of the body they are solid, in others, such as the flanks, they form large rosettes, complete and well spaced. The lower part is lighter, ranging from yellow to white, and the tail has well defined stripes and a dark tip. As happens with other felids, the back of the ears is black with a white circular spot, resembling a pair of lurking eyes. Being essentially a solitary and nocturnal animal, it only meets others of its kind during mating, which lasts from four to ten days. Gestation is 80-84 days and usually results in a single young – the occurrence of twins has not yet been observed. Probably because of the small litter, females, unlike other felids, have only two teats. At one year of age, they already have adult size, and, at two years, they reach sexual maturity. In the wild, the margay lives about 13 years, while in captivity they can live up to 21.
ESSE GATO PODE IMITAR O BARULHO DE UM FILHOTE DE SAGUI, O QUE O AJUDA MUITO A TER SUCESSO EM SUAS CAÇADAS
o faz ser um animal que precisa estar sempre atento, porque de caçador facilmente pode virar caça, de felinos maiores, por exemplo. O gato-maracajá (Leopardus wiedii) costuma ser confundido e comparado com a jaguatirica (Leopardus pardalis), um exemplo disso é que no norte a jaguatirica é também conhecida como gato-maracajá-verdadeiro (ou grande). A confusão tem razão de ser, os dois estão mais proximamente relacionados do que com outros felinos, pois são descendentes de um ancestral recente em comum. As similaridades são grandes, a bem da verdade, embora a jaguatirica tenha pelo menos o dobro do tamanho e do peso, mas ambos possuem coloração e padrão de pintas muito semelhantes. Sua cor, aliás, vai do amarelo-acinzentado ao castanho-ocre, com algumas tonalidades intermediárias. As manchas são variáveis, em algumas regiões do corpo têm pintas sólidas, em outras, como as laterais, rosetas largas, completas e bem espaçadas. A parte inferior é mais clara, variando do amarelo para o branco. E sua cauda tem faixas bem definidas e a ponta escura. Como acontece com outros felinos, a parte de trás das orelhas são pretas com uma mancha branca circular, lembrando um par de olhos à espreita. Animal essencialmente solitário e noturno, só se encontra com outro de sua espécie na época do cio, que dura de quatro a dez dias. A gestação é de 80 a 84 dias e seu fruto geralmente é um único filhote – a ocorrência de gêmeos não foi constatada. Provavelmente por conta dessa ninhada pequena, as fêmeas, diferentemente de outros felinos, possuem apenas duas mamas. Em um ano, no máximo, o filhote atinge o tamanho de um adulto e aos dois anos chega à maturidade sexual. Na natureza o maracajá vive por volta de 13 anos, enquanto que em cativeiro pode viver 21.
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This cat can make a sound that resembles that of an infant marmoset, increasing its chances of successful hunting.
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It is the most arboreal of felids. Its extremely long tail is perfect to keep balance up the trees. Not surprisingly, the forest is its favorite habitat.
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É O MAIS ARBÓREO DOS FELINOS. A CAUDA BEM LONGA É PERFEITA PARA DAR EQUILÍBRIO NAS ÁRVORES. POR ISSO SEU HABITAT PREDILETO SÃO AS FLORESTAS
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MANDIOCA “
Adoro uma árvore. Pular de um galho para o outro. Ficar de ponta cabeça.
Escalar um tronco em um piscar de olhos e ali ficar para caçar filhote de pássaro desavisado. Instinto para isso, gato-maracajá aprende no berço, quando é livre, vendo a mãe imitar barulhinho para atrair o bicho. Na natureza, as árvores é que me dão tudo o que preciso, por isso, tecnicamente os gatos da minha espécie são tidos como arborícolas. Não que tenha asas nem outro atributo para voar, não. Sou gato, no nome e na raça. No instinto e na agilidade. Mas me acostumei a conviver com humanos desde muito cedo, tanto que fui até batizado: Mandioca, nome escolhido por uma dupla de estagiárias americanas que se encantaram com os sabores deste nosso Brasil, e comigo também. Foi pelas mãos delas que vim morar na Mata Ciliar. Tem outros da minha espécie aqui onde moro. Uma turma mais velha, que se acostumou a ficar junta. Eu não.
Sou de poucos amigos. De poucos parentes. Não gosto de outros felinos. Dizem que sou bravo, arisco. É a minha natureza. E mesmo no cativeiro, a cada dia, me sinto mais próximo dela. Estou desacostumado da presença do homem – ainda bem. Me reencontrei com meu instinto de felino macho e quero ser o dono do meu recinto – porque é meu território. Quando chega o homem tratador, que cuida aqui do meu espaço, eu me escondo. Ele entra, mexe, deixa comida e vai embora. Só usa camiseta preta para não me irritar, se colocar uma branca vou achar que é provocação. A sério. Quando ele aparece fico lá em cima, mudo, no meu esconderijo. Ninguém me vê. Só depois das três da tarde dou o ar da minha graça. E que graça. Sou bem bonito, sabe. Mas não foi sempre assim. Quando fui resgatado pelas estagiárias estava meio machucado. Não lembro direito o que foi que aconteceu. Sei que não cai de árvore, não – isso seria impossível! Eu precisava de cuidados. De comer direito. E por isso fui trazido para cá. Sou prioridade aqui, porque venho de um bioma que corre muito perigo na natureza: a Mata Atlântica. Procuram uma fêmea maracajá para procriar e garantir que meus filhotes nasçam por aqui, protegidos, mas aprendendo a se virar sozinhos para serem soltos na natureza. Lá, na Mata Atlântica, o lugar de
”
onde eu nunca deveria ter saído.
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MANDIOCA “
I love trees. Love leaping from one branch to another, hanging upside down,
climbing up and down a tree trunk in a heartbeat and staying up there to hunt unwary birds. The instinct for that, a margay learns in the cradle when born in the wild, watching mother imitate noises to attract the prey. In the wild, it is up in the trees that I get everything I need, so technically cats of my kind are considered an arboreal species. That doesn’t mean that I have wings or other flying features. I am a cat, in name and form, in instinct and skills. But very early I got used to living among humans, so much so that they baptized me Mandioca6, a name chosen by a pair of American interns who were thrilled with the many flavors of Brazil, and with me too. It was by their hands that I came to live at the Mata Ciliar Rescue and Research Center. There are others of my kind here where I live. They’re part of an older gang who got used to being together. I did not.
I’m a cat of few friends. And few relatives. I don’t like other cats. They say I’m aggressive, aloof. This seems to be in my nature and character, and even in captivity, I feel more true to it. I am not used to the presence of man – thank Heavens for that! I have rediscovered my male cat’s instinct and I want to be the master of my enclosure – after all, it’s my only territory. When the man who takes care of me and of my enclosure appears, I hide. He enters, moves around, leaves food and goes away. He always wears a black shirt to avoid bothering me. If hecame in wearing a white shirt, I would take it as a provocation. No kidding! When he appears I stay up in my hiding place, soundless. No one sees me. After three o’clock, I finally show myself. And what a graceful presence I am! I am quite handsome, you know. But it was not always so. When I was rescued by the intern girls, I had been somehow wounded. I can’t remember exactly what had happened. All I know is that I didn’t fall off a tree – that would have been impossible! But I needed some care. I needed a correct diet. And so they brought me here. I am considered a priority here, because I come from a much endangered biome, the Atlantic Forest. They are looking for a female margay to breed with me, and to make sure that we have young here, where they will be protected, but where they will also learn to fend for themselves so they can be released back into the wild. In
”
the Atlantic Forest, the place where my species has always been intended to live! 6
Mandioca: manioc is a shrub nativeto South America and cultivated for its popular edible root. (TN)
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TRIPÉ “
Quando o humano me vê, para, repara e faz cara... de pena. Sou um gato-
-maracajá de dois anos e meio e já vi muito essa expressão nos olhos de vocês. De tempos em tempos recebemos visitas de escolas aqui na Mata Ciliar. São crianças da cidade, que não conhecem animais silvestres e passam o dia aqui para aprenderem sobre a mata e a fauna. Depois de algumas atividades na sala, elas vão sentir o gostinho da vida ao ar livre. É quando passam pelo meu recinto, apontam umas para as outras e soltam umas exclamações de pena. Pena? Vai entender. Parece que é por conta do meu número de patas. Tenho três, por isso me chamam de Tripé. Mas essas crianças todas só têm duas, então estou em vantagem, não? Acho que era eu que devia ter dó delas. Aqui no meu recinto somos três gatos-maracajá. Todos os outros têm quatro patas. Mas eles não ganham nada com isso, afinal eu corro como eles, subo em árvores e até caço, como eles. Aliás, tem uma diferença sim: aqui quem manda sou eu. Sou o dominante. Briguei com os outros de quatro patas pelo meu lugar e ganhei.
Mas eu não nasci assim, não. Quando era pequeno e livre, fui inventar de atravessar uma estrada. Como felino que sou, gosto de me movimentar, e hoje está difícil ir de um lugar para o outro sem cruzar com uma estrada. Aí me encontrei com um carro. 50 cm e 3 quilos em comparação com um carro? Fui atropelado, como muitos da minha espécie. Se por um lado tive esse azar de me encontrar com um carro, acabei tendo sorte, sobrevivi e vim parar aqui no cativeiro, onde ter três patas não faz diferença na competição pela sobrevivência. Aqui dentro eu venci os outros dois gatos, mas lá fora seriam muitos outros. Tanto animais iguais a mim, quanto maiores. Eu poderia ter sido caçado por outro felino e aí a minha quarta pata faria falta. Por isso estou bem satisfeito aqui. Tenho minha árvore, meus colegas de recinto para me impor e sou cuidado. É algo bom que os homens fizeram por mim. E é essa história que eu gostaria que aquelas crianças atrás da cerca pudessem entender.
”
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When someone sees me, they stop, take a good look and put on a sad face.
I am a 2-and-a-half-year-old margay and I have seen this same expression in many human eyes. From time to time we receive school children that come to visit the Mata Ciliar Center. They are city kids who don’t know much about wild animals and so they spend the day here to learn about the forest and wildlife. After some classroom activities, off they go to experience some of the life in the outdoors. That’s when they come to my enclosure, point me out to each other and let out some exclamation of sorrow. Why do they feel sorry for me? Go figure. It seems it’s because of my legs. I have only three of them; that’s why they call me Tripé7. But all of these children have only two, so I’m better off, am I not? From this standpoint, I think I’m the one who should feel sorry for them. Here in my enclosure there are three of us margays. All the others have four legs. But that doesn’t make them better than me, that’s for sure! I run as fast and as well as them, I climb trees and even hunt as well as them! Actually, there is one difference: I’m the boss here. I’m in charge. I have fought the four-legged ones for my territory and I have won.
But I wasn’t born like this. When I was smaller and free, crossing a road seemed like a good idea. As the cat that I am, I like to move around and nowadays, it is really difficult to get from one place to another without having to cross a road. That’s when I came face to face with a vehicle. What could my 20 inches and 6.6 pounds do, against a huge vehicle? I was run over, as happens with many of my kind. If on the one hand it was bad luck to be hit by the car, I was lucky enough to have survived and been brought to captivity, where I was adequately treated and where having three legs makes no difference in the struggle for survival. Here I beat the other two cat companions, but, out there, in the wild, there would be many more. Some would be like me, others bigger. I could be chased by stronger competitors and then a fourth leg would likely make a difference. That’s why I’m happy here. I have my tree in my enclosure, my mates to boss around and I am cared for. In the end, all things considered, it was a good thing, what men did for
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me. That’s the story I’d like those children behind the fence to understand.
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Tripé: tripod (TN)
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Leopardus wiedii SCIENTIFIC NAME: Leopardus wiedii OUTROS NOMES: gato-maracajá, maracajá-peludo, gato-peludo, gato-do-mato OTHER NAMES: gato-maracajá, maracajá-peludo, gato-peludo, gato-do-mato CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Leopardus GENUS: Leopardus SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: vulnerável CONSERVATION STATUS: vulnerable
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PAULO FRIDMAN
GATO-PALHEIRO FELINOS
WILD CATS PAMPAS CAT
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PAMPAS CAT
GATO PALHEIRO
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LUCIANO CANDISANI
WILD CATS PAMPAS CAT
GATO-PALHEIRO Pampas Cat
A
primeira impressão que se tem deste animal é se tratar de um gato doméstico avantajado, de pelo amarronzado, patas listradas e cauda curta. Mas as aparências enganam muito neste caso, já que simplicidade não tem nada a ver com o gato-palheiro, um dos menos estudados no mundo. Nativo da zona ocidental central da América do Sul, transitou durante séculos na Cordilheira dos Andes, entre o Equador e Chile, atingiu o deserto da Patagônia e os Pampas na Argentina e no Uruguai – onde já é tido como extinto. É atualmente associado a ambientes abertos, mas também já foi encontrado nas florestas úmidas da Bolívia, Equador, Chile e Peru. No Brasil, concentra-se na região norte do Mato Grosso e no estado de Goiás, além dos Pampas gaúchos. Esses gatos selvagens, raramente observados na natureza e de presença pouco comum em cativeiro, chamam a atenção pela sua grande capacidade de adaptação em ambientes tão distintos. E também por terem vivido milhares de anos próximos a outras espécies, sem que se conheçam casos de hibridização. Atualmente, os próprios cientistas reavaliam suas hipóteses e há quem defenda que, na verdade, esse gato tenha se dividido em espécies diversas, sendo que apenas à chilena corresponderia o nome científico de Leopardus colocolo. Para os felinos brasileiros, que vivem em áreas abertas e de grande biodiversidade como o Cerrado, Pantanal e os Pampas, estaria reservada a nomenclatura de Leopardus braccatus, que também se dividiria em duas subespécies, de acordo com levantamento taxonômico: o gato-dos-pampas e o gato-do-pantanal. O fato é que sua história de evolução tem muito a revelar sobre seu estado de conservação hoje em dia. Entre os gatos do mato é o mais raro, contribuindo para isso a perda das áreas de habitat natural da espécie para a agricultura, além dos frequentes casos de atropelamento. Pequeno – não ultrapassa os 4 kg – esse felino, que gosta de viver em áreas abertas, tem pouca chance de sobrevivência às margens das estradas que os homens ergueram na sua paisagem nativa. Como ocupam áreas de vegetação e clima tão distintas, os gatos-palheiros acabam apresentando diferenças morfológicas significativas também. Os indivíduos do Cerrado têm uma tonalidade marrom-avermelhada e patas negras, total ou parcialmente. Já os do sul do país, da região dos Pampas, carregam o tom cinza-amarelado na pelagem, com a parte do
At first sight, you might think this animal is an oversized domestic cat with its brownish coat, striped legs and short tail. But appearances can be deceiving in this case, as simplicity has nothing to do with the Pampas cat, one of the least studied cats in the world. Native of the western part of central South America, the species was established for centuries in the Andes, between Ecuador and Chile,and eventually reached the Patagonia desert and the Pampas in Argentina and Uruguay (in this latter country it has been considered extinct). It is currently associated with open environments, but it has also been found in forested environments in Bolivia, Ecuador, Chile and Peru. In Brazil, it seems to concentrate mainly in northern Mato Grosso and Goiás states, as well as the Pampas of Rio Grande do Sul. These wild cats, rarely observed in the wild and whose presence in captivity is rare, are noteworthy for their great adaptability to such different environments. Having lived for thousands of years close to other related cat species, there were no known cases of hybridization. Today, however, scientists are reassessing the genetic status of the species and some argue that, in fact, it has diverged into several species, of which only the Chilean form corresponds to the scientific name Leopardus colocolo. For the form found in Brazil, which live in open areas
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GATO-PALHEIRO FELINOS
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OS INDIVÍDUOS DO CERRADO TÊM UMA COR MARROMAVERMELHADA E PATAS NEGRAS. JÁ OS DO SUL DO PAÍS SÃO CINZA-AMARELADOS
of great biodiversity such as the Cerrado, Pantanal and the Pampas, the name assigned is Leopardus braccatus, but this also splits into two subspecies according to recent taxonomy: the Pampas cat and the Pantanal cat. The fact is that its evolutionary history apparently still has much to reveal about its conservation status today. It is the rarest among the Neotropical wild cats and contributing factors for this are the loss of the species’ natural habitat areas to agriculture and the high mortality due to road kills. Small – with no more than 8.8 lbs – this cat, which usually lives in open areas, has little chance of survival when crossing the roads that have been built in its native landscapes. Since they occupy areas of diverse vegetation and climate, Pampas cats inevitably feature significant morphological differences among them. Animals from the Cerrado in Central Brazil have a reddish-brown hue and, either totally or partially, black legs. However, in the southern Pampas region, they have a yellowish graycoat, with the lighter part of the abdomen showing dark spots or a dorsal strip of long hair that goes from head to the tip of the tail. When under stress, the hairs stand on end, giving it a larger appearance to, supposedly, intimidate the enemy. What is invariable – and characteristic – in this wild cat is its compact and flexible body, the small and pointed ears, and tawny eyes. This smooth appearance is what most makes it resemble a domestic cat, but that impression only lasts until it opens its mouth, displaying a set ofsharp teeth and a wild temperament. Like other felids, which among the order Carnivora are among the most specialized in eating meat, the Pampas
PAULO FRIDMAN
Pampas cats from the Cerrado of Central Brazil have a reddishbrown hue and black legs. In the south, however, they feature a yellowish gray coat
WILD CATS PAMPAS CAT
FABIO COLOMBINI
ventre mais clara com pintas escuras ou com uma faixa dorsal de pelos longos da cabeça até à ponta da cauda. Quando fica com medo ou nervoso, esses pelos ficam arrepiados, dando-lhe uma aparência de maior porte, para intimidar o inimigo. O que é invariável – e característico – neste gato silvestre é seu corpo compacto e flexível, as orelhas pequenas e pontiagudas, e os olhos marrom-amarelados. Esse conjunto de aparência suave é o detalhe que mais assemelha a espécie aos gatos domésticos. Até que ele abra a boca revelando os afiados dentes e seu temperamento selvagem.
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cat has extreme dexterity to grab the prey and specialized teeth for tearing flesh, with especially sharp molars. Another characteristic typical of felids, which is strongly observed in this species, is the skeleton adapted to jump. They show only four toes in their hind paws, while the front paws have five, but the first digit does not touch the ground, therefore appearing as only four, on the tracks. Even though they are equipped with characteristics that allow for easy adaptation to the environment, allowing them to survive from mountainous regions to the plains, this species also suffers from changes to their habitat. Since they live within a restricted area of up to 5.8 mi² and have diurnal and crepuscular habits, they are an easy target for predators. Field observations have shown that Pampas cats are active in hunting, feeding and mating during the crepuscular period between 4PM and 8PM, and between 8AM and 10AM. It has also been shown that, in addition to a mainly carnivorous diet, that relies basically on small mammals (mainly rodents), the Pampas cat also feeds opportunistically on birds and their eggs, insects and small reptiles. However, diet differences are directly proportional to the differences in the habitat types it occupies. In Brazil, for instance, they can choose their prey items from the fauna characteristic of the Cerrado and Pantanal to the more temperate region of the Pampas. There is strong indication that hybrids of this species with the oncilla (Leopardus tigrinus) are emerging.
A exemplo de outros felinos, que entre os animais da ordem Carnivora são os mais especializados no consumo de carne, o gato-palheiro tem extrema destreza para abocanhar a presa e dentição especializada para rasgar a carne, com destaque para os pontiagudos molares. Outra característica típica dos felinos, fortemente observada nesta espécie, é o esqueleto adaptado para saltar, mostram apenas quatro dedos nas patas traseiras, enquanto nas dianteiras há cinco, mas o primeiro dedo desta pata da frente não toca o chão, por isso que aparecem só quatro dedos em suas pegadas. Mesmo dotado de características que permitem a fácil adaptação ao ambiente, podendo sobreviver desde regiões montanhosas até às áreas mais planas, é uma espécie que sofre com a alteração de seu habitat como nenhuma outra, por ter uma área de vida muito restrita de até 15 km² e hábitos de diurnos a crepusculares, tornando-se, portanto, um alvo fácil aos predadores. Observações de campo demonstram que o gato-palheiro concentra suas atividades de caça, alimentação e reprodução entre as 16 h e 20 h ou pela manhã, das 8 h às 10 h. Outra revelação de campo é que além da dieta carnívora, à base de pequenos mamíferos (principalmente roedores), o gato-palheiro também se alimenta de aves e de seus ovos, de insetos e pequenos répteis. Sem dúvida, a variedade alimentar é diretamente proporcional às diferenças de habitat: no Brasil, por exemplo, eles têm à disposição desde a fauna do Cerrado e Pantanal às porções mais temperadas dos Pampas. Existem fortes indicações de que estejam se formando híbridos desta espécie com o gato-do-mato-pequeno (Leopardus tigrinus).
MATREIRO, O GATO-PALHEIRO TEM UMA TÁTICA PARA INTIMIDAR O INIMIGO: ERIÇA SEUS PELOS PARA FICAR COM UMA APARÊNCIA MAIOR The astute Pampas cat uses a strategy to intimidate the enemy: its hairs can stand on end to give it a larger appearance
WILD CATS PAMPAS CAT
ARAQUÉM ALCÂNTARA
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Small mammals from the Cerrado are part of the pampas cat essentially carnivorous diet
LUIZ CLĂ UDIO MARIGO
WILD CATS PAMPAS CAT
PEQUENOS MAMÍFEROS DO CERRADO FAZEM PARTE DA DIETA DO GATO-PALHEIRO, ESSENCIALMENTE CARNÍVORA
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PAULO FRIDMAN
GATO-PALHEIRO FELINOS
WILD CATS PAMPAS CAT
TEODORO “
Nasci ao ar livre. Cheio de espaço em um canavial grande, grande. No Mato
Grosso do Sul. Nós gatos-palheiros gostamos de áreas assim. Era uma boa vida. Tinha a liberdade e uma mãe que estava sempre comigo. Dava de mamar. Lambia meu corpo. Aos poucos me ensinava o que era ser um gato-palheiro. E me protegia. Cuidado com gavião, cuidado com a jaguatirica, muito cuidado porque eles são nossos predadores. Às vezes ela saia, mas depois voltava. Saía, voltava. Até que não voltou mais. Sumiu. Eu tinha dois meses. Quem apareceu foram uns homens. Policiais que viram o canavial como um perigo para mim, e resolveram me ajudar. Fui parar em um veterinário, homem médico que ajuda animais. Ali acharam que eu era apenas gato. Acharam que eu era bonitinho. Acharam que eu ficaria bem em uma caixinha enquanto crescia. Acharam muita coisa, até que eu me enfezei.
Me arrepiei todo. Mostrei meus dentes. E fiquei bravo. Bem bravo. Deixaram de me achar bonitinho. Entenderam que eu não era um gatinho e que tinha um instinto assim, selvagem. Mesmo dentro da caixa não me queriam mais por ali. Mas nós, gatos-palheiros, somos poucos. Muito poucos. Somos raros. Ameaçados de extinção. Os zoológicos me queriam. Muitos. Precisam de informações sobre minha espécie. Querem me estudar. Querem me reproduzir. Querem me salvar. Quem me ganhou foi a Mata Ciliar e por isso foram me buscar. Foi uma longa viagem até aqui. De Nova Andradina no Mato Grosso até Jundiaí no Estado de São Paulo: 811 quilômetros, 11 horas dentro de uma caixa, presa no banco com cinto de segurança. Na estrada, raios e trovões. Eu não gostei daquilo e tive medo. Medo, sim! Eu era um filhote silvestre, mas um filhote sozinho. Agora já tenho 6 meses. Logo que cheguei tinha outro gato-palheiro aqui. Uma fêmea, de 23 anos. Tentaram nos colocar juntos. Queriam que nos adaptássemos um ao outro. Não deu tempo. Uma semana depois que cheguei ela ficou doente. Não queriam que eu também ficasse. Fomos separados. E ela morreu. Enquanto não encontram uma outra de minha espécie para que eu possa acasalar e deixar descendentes, estou sozinho de novo. Não quero saber de ninguém. Continuo bravo. Ponha a mão na minha grade para ver. Minha cauda ouriça toda. E mostro os dentes. Não me acostumo com os homens. Ainda
”
gosto de caçar. Saberia me virar de novo na natureza. Quem sabe, um dia.
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GATO-PALHEIRO FELINOS
TEODORO “
I was born in the outdoors with lots of space around a big sugarcane plantation in Mato
Grosso do Sul state, Brazil. We Pampas cats like open spaces like that. It was a good life. I had freedom and a mother who was always with me. She nursed me, licked my body. She slowly taught me what it was to be a Pampas cat. And she protected me. Watch out for the hawk; watch out for the ocelot. Be very careful, they are our predators. Sometimes she would leave, but then she’d come back. She’d leave and then come back. Until one day she didn’t come back. She vanished. I was two months old then. But somebody did come, a few men. Policemen who thought the sugarcane field was dangerous for me, and decided to help. I ended up at the clinic of a veterinarian, a medical doctor specialized in treating animals. They mistook me for just a cat. They thought I was cute. They thought I’d be comfortable in a box while I grew up. They thought a great deal, until I got angry.
I bristled all over. I showed my teeth. And I was mad. Very mad. They stopped finding me cute. They finally understood that I was not a kitten and that I had a wild nature. Even closed in a box they did not want me around anymore. But we Pampas cats are few. Very few. We are rare. We are endangered. Zoos wanted me. Many of them. They need information about my species. They want to study me. They want to breed me. They want to save me. Mata Ciliar was the group that got me in the end and they came for me. They took me on a long journey. From Nova Andradina in Mato Grosso do Sul state, to the city of Jundiaí, in São Paulo state, it was a drive of 503 miles, 11 hours in a box, attached to the seat with a seatbelt. On the road, there was thunder and lightning. I did not like that at all and was frightened. Yes, frightened. I was wild, it’s true, but I was also a kitten all alone. I am now six months old. When I first got here, there was another Pampas cat. A female, 23 years old. They tried to put us together. They wanted us to adapt to each other. There was no time. A week after I arrived she got sick. They didn’t want me to get it too. So we were separated. And she died. They now are searching for another female of my kind with which I can mate and produce young. But meanwhile, I’m still alone. Actually, I don’t want to be with anybody. I’m still hostile. Put your hand on the wire net of my enclosure and you will see. My tail will bristle up. And I’ll show my teeth. I can’t get used to men. I still like to hunt. I know I will
”
survive in the wild again, if given the chance. Maybe one day, who knows?
WILD CATS PAMPAS CAT
PAULO FRIDMAN
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GATO-PALHEIRO FELINOS
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DE FÁCIL ADAPTAÇÃO AO AMBIENTE, SOBREVIVE DE REGIÕES MONTANHOSAS ATÉ ÁREAS MAIS PLANAS Easily adapted to the environment, it survives both the mountains and the plains
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LUIZ CLÁUDIO MARIGO
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO (DA ESPÉCIE BRASILEIRA): Leopardus braccatus SCIENTIFIC NAME (FOR THE BRAZILIAN SPECIES): Leopardus braccatus OUTROS NOMES: gato-palheiro, gato-dos-pampas, gato-do-pantanal OTHER NAMES: gato palheiro, gato-dos-pampas, gato-do-pantanal CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Leopardus GENUS: Leopardus SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: vulnerável CONSERVATION STATUS: vulnerable
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GATO-DO-MATO-GRANDE FELINOS
GEOFFROY’S CAT
GATO DO MATO GRANDE
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PAULO FRIDMAN
WILD CATS GEOFFROY’S CAT
GATO-DO-MATO-GRANDE Geoffroy’s Cat
A
s histórias envolvendo o gato-do-mato-grande têm um sotaque gaúcho. Felino de pelagem quase cinza habita exclusivamente o Rio Grande do Sul, de norte a sul. Por seu porte não representa tanto risco para o homem, apesar de ser perseguido por caçar galinhas com frequência, e não aparece entre os animais em extinção. Mas, mesmo assim, sua vida não tem sido fácil em solo brasileiro. Contribui para isso a devastação de seu habitat natural, a região dos Pampas, com relevo de fácil acesso aos homens e muito utilizada pela agricultura. Esse felino, batizado Leopardus geoffroyi, ganhou alcunha de “grande”, mas o nome, de fato, é um pouco exagerado para seu menos de meio metro de altura. Caberia melhor a um animal que tivesse o porte de uma onça-pintada ou uma onça-parda. No entanto, o adjetivo se refere à comparação desta espécie com outro felino menor: o gato-do-mato -pequeno. Como costuma chegar até 8 kg, ou seja, o dobro do peso da espécie menor, passou a ser conhecido por gato-do-mato-grande. A cabeça é proporcional ao tamanho do perfil e o corpo, com comprimento médio de 58 cm, compete com sua cauda de 32 cm. Original da Patagônia é encontrado na região que vai do extremo sul da América do Sul até à Bolívia, preferencialmente em florestas secas e savanas, incluindo a área boliviana limítrofe ao Mato Grosso do Sul. Como é de se esperar, guarda semelhanças com o padrão da família, pois não seria apenas no nome que esses felinos se aproximam de seu parente próximo, o gato-do-mato-pequeno. Ambos são manchados e de pequeno porte. Mas longe de um ser a versão crescida do outro. O gato-do-mato-grande tem uma pelagem que tende mais para a cinzenta, com pintas sólidas. Esse padrão de pintas, por sinal, é outra característica típica da espécie, não chegando a formar rosetas, como as do gato-do-mato-pequeno ou as da onça. Durante a vida adulta, esse felino costuma definir seu espaço entre 4 a 10 km² e ali se estabelece, para se desenvolver, caçar e reproduzir. Por conta da variação de ecossistema na área que delimita para viver, o gato-do-mato-grande pode consumir desde mamíferos de médio e pequeno porte, a aves, répteis, roedores, incluindo a lebre europeia, uma espécie exótica. Todas caçadas preferencialmente à noite, a hora predileta para investir em suas presas.
Stories involving geoffroy’s cat tend to have a southern flair. A cat of a grayish coat, it inhabits exclusively the state of Rio Grande do Sul, the southernmost state in Brazil. With its relatively small size, it does not represent much danger to man, but is often persecuted for hunting chickens, in rural houses. Despite this, however, it does not appear in the list of endangered species. Nonetheless, its life on Brazilian regions has not been very easy. Contributing to that is the devastation of its natural habitat, the Pampas ecosystem, whose topography makes it an easily accessible region for agricultural development. This cat, taxonomically named Leopardus geoffroyi, has earned in Brazil the vernacular name of “large wild cat” (direct translation), but the name is, in fact, an overstatement, considering its height of less than half a meter. Although the name would likely be better applied to an animal the size of a jaguar or a puma, the adjective actually refers to a specific comparison between this species and another smaller cat, the oncilla (or, in a direct translation from the Portuguese, “small” or “lesser” wild cat). Since it may attain weights of up to 18 lbs (i.e., more than double the weight of the smaller species), geoffroy’s cat has become known as the “large” wild cat8.
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GATO-DO-MATO-GRANDE FELINOS
With nocturnal habits, geoffroy’s cats start their hunts preferably after sunset
The head is proportional to its profile, and to the length of the body, with an average of 23 inches, is added another 12 inches of the tail. Occurring from Patagonia, geoffroy’s cat is found from the southern tip of South America all the way to Bolivia, with an apparent preference for the dry forests and savannahs, including the Bolivian border area near the state of Mato Grosso do Sul, where, however, it has not been recorded so far. As one may expect, it has similarities with the family pattern, and it is not in the Portuguese name only that this felid compares to its close relative, the oncilla: both are spotted and classified as small felids. But far from one being a larger version of the other, geoffroy’s cat has a coat that tends to gray, with solid black dots. This dotted pattern, incidentally, is another typical feature of this species, in which the rosettes shown in the oncilla and the jaguar do not appear. When it reaches adulthood, this cat usually definesa home range of 1.5 to 4 mi² and settles there to hunt and reproduce. Due to the differences in food availability in the regions it inhabits, geoffroy’s cats can choose from prey items that range from birds and reptiles to small- and medium-sized mammals, including the European hare, an exotic species. All are hunted preferably at night, when they are most active. Of solitary habits as is the norm formost cats, geoffroy’s cat is usually seen alone. It is rarely found in pairs, which only happens at mating time. Once breeding has occurred, the couple goes separate ways, with the female being responsible for taking care of the young. Pregnancy lasts three and half months, or 72-76 days, and litters may have from 1 to 3 cubs. The already rich diversity of cat species in Brazil may be further increased. During their evolution together, geoffroy’s cat and the Pampas cat (Leopardus colocolo), both of which belong to the genus Leopardus, lived in the same original region (Patagonia) without presenting cases of hybridization (inter-species crossing). Ancestral
PAULO FRIDMAN
WILD CATS GEOFFROY’S CAT
ADRIANO GAMBARINI
De hábitos solitários como é comum aos felinos, o gato-do-mato-grande faz às vezes de ermitão - dificilmente é encontrado aos pares. Isso só acontece no momento do acasalamento, depois o casal se separa e as fêmeas irão cuidar de suas crias sozinhas. Costumam procriar entre 1 a 3 filhotes por gestação, que tem duração de três meses e meio, entre 72 a 76 dias. Entretanto, a privilegiada riqueza brasileira em espécies de gatos silvestres pode estar mudando esse cenário. Durante anos os felinos do gênero Leopardus, ao qual pertencem o gato-do-mato-grande e o gato -palheiro (Leopardus colocolo), conviveram no mesmo espaço original (a Patagônia) sem ter apresentado casos de hibridização (cruzamento entre espécies). É provável que mecanismos ancestrais do processo de especiação sejam a causa disso. Porém, no Brasil, na área de transição entre os ecossistemas gaúchos, há indícios recentes de reprodução do gato-do-mato-grande com o gato-do-mato-pequeno. Até aqui, os registros dos pesquisadores da área certificavam que durante cerca de 1 milhão de anos esses dois gatos-do-mato evoluíram
DE HÁBITOS NOTURNOS, O GATO-DOMATO-GRANDE COSTUMA SAIR À CAÇA SÓ DEPOIS QUE O SOL SE PÕE
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GATO-DO-MATO-GRANDE FELINOS
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mechanisms in the speciation process most likely were responsible for maintaining this separation. In the transition area between the different ecosystems in southern Brazil, however, recent evidence now suggests interbreeding of geoffroy’s cat with the oncilla. Studies conducted to date have shown that these two wild cats have evolved in different areas, for about 1 million years. While the oncilla evolved a preference for rainforests, geoffroy’s cat chose large expanses of open vegetation. Thus, the preference for such diverse habitats, coupled with other possible environmental factors, seem to have been the cause for the isolation of these felids. In southern Brazil, however, the recent identification of hybrids between these two species, in the central region of the state of Rio Grande do Sul, suggests marked changes in the evolution of felids of the Leopardus genus. These new facts present a unique situation of significant proportions – which not by accident takes place in Rio Grande do Sul, a state whose notablefelid diversity is even greater than that found in the Amazon region. As a transitional zone between the known preferences of these two species, this region has apparently created ideal conditions for the meeting and mating of these different species of cats.
em áreas distintas. Enquanto o gato-do-mato-pequeno seguiu para as florestas úmidas, o gato-do-mato-grande escolheu as áreas de vegetação aberta. Assim, a opção por habitats tão distintos, somada a outros possíveis fatores ecológicos, estariam envolvidos no isolamento destes felinos. Mas no Brasil, a identificação recente de espécimes híbridos de gatodo-mato-grande com gato-do-mato-pequeno, principalmente na região central do estado do Rio Grande do Sul, levanta a hipótese de mudanças ecológicas marcantes na evolução dos felinos do gênero Leopardus. Trata-se, portanto, de uma situação exclusiva e de particularidades significativas – não por acaso ocorridas no Rio Grande do Sul, Estado que se destaca na diversidade de felinos, maior, inclusive, que a da Amazônia. Por ser um bioma de transição entre as predileções dessas duas espécies, cria a situação propícia para o encontro e acasalamento desses felinos distintos e a consequente hibridização.
EM AMBIENTE NATURAL É COMUM VIVER DEZ ANOS, JÁ EM CATIVEIRO SUA EXPECTATIVA DE VIDA AUMENTA PARA CATORZE ANOS In the wild, it usually lives up to 10 years, whereas in captivity its life span can reach up to 14 years
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In Portuguese, gato-do-mato-pequeno and gato-do-mato-grande, respectively (TN)
WILD CATS GEOFFROY’S CAT
PAULO FRIDMAN
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This felid is easily recognizable for its grayish coat and solid black dots. It lives in most of Rio Grande do Sul, from the north to the south of the state
ZIG KOCH
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FELINO RECONHECIDO PELA DE PELAGEM ACINZENTADA COM PINTAS SÓLIDAS, HABITA EXCLUSIVAMENTE O RIO GRANDE DO SUL, DE NORTE A SUL
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GATO-DO-MATO-GRANDE FELINOS
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WILD CATS GEOFFROY’S CAT
GRANDE “
Sou o Grande. Um gato-do-mato-grande. Tenho 27 anos. Idade de ancião para os da
minha espécie. Tenho o que os humanos chamam de qualidade de vida: alimentação regrada, exercícios diários e cuidados médicos. A fórmula funciona pois, mesmo senil, sou conhecido por caçar presas vivas com destreza e agilidade. Meus dentes são fortes, minhas garras afiadas. Nunca procriei, mas ainda poderia. Meu destino foi outro. Meu reino é um recinto de 3x5 m. Maior que muita suíte de humano por aí! Na vizinhança sei que mora uma espevitada jaguatirica. Mas nunca nos vemos. Sou fiel aos meus hábitos – suspeito que minha longevidade venha desse instinto. A manhã é sagrada para mim: fico tomando sol, deitado. Revigorado, depois disso, arrisco saltos nos troncos, às vezes brinco com uma bola ou com um coco, às vezes me distraio com um aroma diferente que é deixado ali de propósito, para despertar minha curiosidade. O pôr do sol é minha deixa: é hora de comer.
Minha vida é exatamente assim há sete anos. Antes de vir para esse refúgio, nos zoos onde morei, a vida também era assim. Vida de cativeiro é rotina. Na origem podia ter sido diferente, pois sou filho das paisagens amplas do sul do Brasil – região dos gatos-do-mato-grandes, como eu, enquanto o homem não devasta de todo o nosso habitat. Por enquanto, convivemos. Somos bem adaptáveis, restringimos nossa área pela oferta de presas e, tendo alimento suficiente, não oferecemos risco às galinhas. Portanto, na medida do possível, estamos sendo deixados em paz pelo homem. O problema é a falta de espaço mesmo, está tudo ocupado por vocês. De humanos entendo muito, porque fui capturado bem cedo, com minha família, e passei uma existência comprida mudando de cativeiro em cativeiro. No sul mesmo morei em Foz de Iguaçu, em uma casa comum – de onde fui resgatado e instalado em um criadouro oficial em Itaipu, especializado em reprodução de gatos da minha espécie, do gato-do-mato-pequeno e de jaguatiricas. Tempo depois fui parar em Bauru, sudeste do Brasil, em um zoológico. Bicho viajado eu sou. É de se entender que essa coisa de ser alimentado, tratado e receber atenção, eu domino. O cheiro humano não me assusta. Mas querer enfiar os dedos no pelo do meu dorso, isso não! As garras que escondo na pata arranham mesmo, para demonstrar meu limite ao contato físico. Mania de homem achar que gato-do-mato-grande quer carinho de mão de gente, onde já se viu tamanho atrevimento! Entendo que esteja aqui para ser estudado. E até gosto disso. A partir desse trabalho que os cientistas fazem comigo, outros da minha espécie vão sair ganhando. De certa forma, sou alimento à esperança dos homens de entenderem melhor os felinos e ajudá-
”
los a sobreviver. Grande, o meu destino, afinal.
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GATO-DO-MATO-GRANDE FELINOS
GRANDE “
I’m Grande. A geoffrey’s cat. I am 27 years old. For my species, that is a very old age! I have what
humans usually call “a life of high quality”: a balanced diet, daily exercises and medical care. This formula seems to be working, because even though I’m getting on in years, I am known for hunting my prey with dexterity and agility. My teeth are still strong, my claws are sharp. I have never bred, though I could, even at my age. That was simply not my destiny – which was decided by humans. My kingdom is a 9 foot 10 inches x 16 foot 4 inches enclosure. That is larger than many human habitations one sees out there! I know that a bubbly ocelot lives in the neighborhood, but we never meet. I am faithful to my habits – I suspect my longevity has something to do with that instinct. The morning is sacred to me: I lie down and bask in the sun. I feel invigorated after that and then I boldly take a few leaps around the tree trunks, or play with a ball or a coconut. Sometimes I get distracted with a strange scent someone has left here on purpose, just to arouse my curiosity. The sunset is my cue: time to eat.
My life has been exactly like that for seven years now. Before coming to this retreat, life was more or less the same in all the zoos where I lived. Life in captivity equals routine. In my original place it might have been different. I am an animal from the vast landscapes of southern Brazil. That’s the region of all geoffroy’s cats like me, so long as man doesn’t end up devastating our habitat, converting it all to agriculture lands. For now, we coexist, where the natural habitats still permit. We are very adaptable, we use our area according to the prey available and we do not represent a risk to humans. Provided we have enough of our natural prey, we leave chickens alone, and man also usually leaves us alone. The problem is really lack of space. You guys have occupied most of it already. I understand humans quite well, because my family and I were captured very early in life and I have spent a long time in captivity, moving from place to place. While in the south, I lived in Foz do Iguaçu, initially as a pet in a household. I was then rescued from there and sent to an official rescue and breeding center, which is part of the big Itaipu Hydroelectric Dam Project. They specialized in breeding felids, including those of my own kind, as well as oncillas and ocelots. Sometime later, I found myself in a zoo, in the city of Bauru, in southeastern Brazil. As you can see, I have travelled a lot. It’s easy to understand why I have become a master at getting food, good treatment, and people’s attention. Human scent doesn’t scare me. But don’t you come up sticking your fingers in the fur of my back. I won’t take that! The claws hidden in my paws can scratch for real and they show my limits to physical contact. Men seem to have the idea that geoffroy’s cats enjoy a person’s hand petting their back. Have you ever seen such audacity! I understand that I am here to be studied. And I even like that. From the work that scientists are doing on me, others of my kind will hopefully win in the end. In a way, I nurture the hope that men will
”
have a better understanding of felids and will help them survive. Isn’t my destiny great, after all?
WILD CATS GEOFFROY’S CAT
PAULO FRIDMAN
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Leopardus geoffroyi SCIENTIFIC NAME: Leopardus geoffroyi OUTROS NOMES: gato-do-mato-de-pelo-curto, geoffroy’s cat OTHER NAMES: gato-do-mato-grande, gato-do-mato-de-pelo-curto CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Leopardus GENUS: Leopardus SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: está ameaçada de extinção, categoria vulnerável CONSERVATION STATUS: endangered, vulnerable category
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GATO-DO-MATO-PEQUENO FELINOS
GATO DO MATO PEQUENO
WILD CATS ONCILLA
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ONCILLA
LUIZ CLÁUDIO MARIGO
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ADRIANO GAMBARINI
WILD CATS ONCILLA
GATO-DO-MATO-PEQUENO Oncilla
E
le não passa de 3 kg de peso, tem aspecto delicado com pequenas patas, se assemelhando bastante ao gato doméstico, exceto na pelagem. É talvez o que mais se pareça com ele entre todos os gatos silvestres, porém não há nada de calmo ou dócil nesse felino. Apesar de pequeno é um gato selvagem – o menor entre todos do Brasil e o segundo na América do Sul, perdendo para o kodkod (Leopardus guigna) que vive nos Andes chilenos e em algumas áreas da Argentina. Tem o corpo esbelto e de grande agilidade e não faz o gênero de quem se empoleira em árvores, não! Este felino é bastante rápido, mas um animal de hábitos bem terrestres e que caça à noite, principalmente pequenos roedores e lagartos. Se for muito necessário, para se proteger, por exemplo, sobe em árvores. De dia, quando em atividade, costuma se esconder em troncos de árvores caídas. Dificilmente utiliza mais de 25 km² como área para se alimentar e reproduzir. Pelo próprio nome dado a esta espécie, as comparações com seu primo próximo, o gato-do-mato-grande, são muitas. Além de perder na estatura, claro, ele tem outras diferenças importantes, como a coloração geralmente no tom amarelado – bem claro ou mesclado com castanho. É até comum confundir sua pelagem com a da jaguatirica e a do gato-maracajá, contudo, há também gatos-do-mato-pequenos com pelagem preta (chamado de melânico, por causa da concentração de melanina). As características que bem diferenciam este felino são as estrias transversais circulares e escuras por toda a lateral do corpo, como rosetas (e não pintas sólidas) abertas ou fechadas. E o marcante mesmo em um gato-do-mato-pequeno são seus pelos da nuca voltados pra trás (ele é voltado para a frente no maracajá), os olhos sem grande saliência e a cauda, que é relativamente mais curta. Os pesquisadores que se aprofundam no conhecimento da filogenia dos felinos acreditam que há 70 mil anos, durante um período de clima mais úmido, o gato-do-mato-pequeno tenha acompanhado a expansão das florestas, seu ambiente favorito, e por isso tenha se espalhado pelo continente americano, desde a Costa Rica até ao norte da Argentina, além do Brasil. Aqui, habita todos os biomas. Convive muito bem tanto com os arbustos espinhentos da Caatinga, vegetação de restinga, em ambiente costeiro e, igualmente, fica à vontade na paisagem de vegetação esparsa do Cerrado. Só não vive no extremo sul gaúcho – território do gato-do-mato-grande.
It weighs no more than 6.6 lbs; its delicate appearance with small paws makes it quite resemble the domestic cat, except for the distinctive spotted coat. It may well be the wild cat that most resembles the domestic kind, yet there’s nothing quiet or docile about this felid. In fact, the oncilla is the smallest wild cat in Brazil, and second only to the kodkod (Leopardus guigna), that lives in the Andes of Chile and in marginal areas of Argentina. Despite the slender body and great agility, the species does not wander up in the trees, like the closely related margay! The oncilla has more terrestrial habits, hunting mostly at night, especially small rodents and lizards. However, when necessary, as to escape enemies, for instance, they will climb a tree. During the day, when active, the oncilla tends to hide in the hollow trunks of fallen trees. It usually uses an area of no more than 9.6 m2 to feed itself and mate.
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GATO-DO-MATO-PEQUENO FELINOS
From the common name given to this species in Portuguese, “small or lesser wild-cat”, arise countless comparisons to its close cousin, geoffroy’s cat, called the “large wild-cat”. Besides evidently losing in size, the oncilla is also different, in the color of its pellage, usually of a yellowish hue, which is either very light or mixed with brown. In fact, the oncilla’s coat is commonly mistaken with that of the ocelot or the margay, but some oncillas can also show a black coat (these are known as melanistic, due to the concentration of melanin). The feature that most distinguishes this cat is the circular and dark stripes that cover the side of its body as open or closed rosettes (not solid spots). Other features that help differentiate oncillas from the margay are the smaller, non-projected eyes, the hair turned backward on the nape (it runs forward on the margay), and the relatively shorter tail. Studies of felid phylogeny have suggested that 70,000 years ago, during a period of moister climate, the oncilla followed the expansion of forests, its favorite environment, and therefore spread over the American continent, from Costa Rica to northern Argentina, including Brazil. Here it lives in every biome, coexisting very well with both the Caatinga’s thorny bushes, and the sandy dunes vegetation in coastal environments. The oncilla is equally at home in the Cerrado’s sparse vegetation. The only place where it does not live is the extreme south of Rio Grande do Sul state, which is geoffroy’s cat’s territory. In general, oncillas from northern and northeastern Brazil are lighter in color, while those from the south and southeast have a darker coat with larger rosettes. Until recently, it was accepted that the physical similarities between individuals from such different biomes indicated that they belonged to the same species. The latest genetic researchof this felid, however, has shown a separation into two species (see the new oncilla below). Currently their populations are considered highly endangered due to habitat loss, developed into crops and pasture for livestock, as well as to retaliation by rural residents when some individuals acquire the habit of attacking their chicken coops. Another important mortality factor is due to road kills. In addition, conservation strategies are hindered due to insufficient knowledge on the biology of the species. Therefore, great hope is placed on in vitro fertilization techniques, much the same as those used on humans, which may aid in the managementof isolated and endangered populations. This alternative has been tested for some time now in oncillas in captivity.
LUIZ CLÁUDIO MARIGO
COM TRÊS QUILOS E UM PORTE MIÚDO, PODE FACILMENTE SER CONFUNDIDO COM UM GATO DOMÉSTICO. PURO ENGANO, SUA NATUREZA É SELVAGEM Weighing no more than 6.6 lbs, the oncilla’s delicate appearance makes it resemble a domestic cat, but make no mistake: this is a wild cat by nature
Em linhas gerais, os gatos-do-mato-pequenos das regiões norte e nordeste do Brasil são mais claros; enquanto que os do sul e sudeste apresentam pelagem mais escura e rosetas maiores também. Até bem recentemente aceitou-se que as semelhanças físicas entre os indivíduos de biomas tão distintos indicavam serem da mesma espécie. Porém, a mais recente investigação a respeito da genética deste felino resultou no possível desmembramento em duas espécies (ver a frente o GATO-DO-MATO-PEQUENO-NOVO). Atualmente suas populações são consideradas altamente ameaçadas devido à perda de habitat para plantações e pastagem, bem como à retaliação de moradores rurais, quando os felinos da região passam a atacar galinheiros. Outro fator importante de mortalidade são os atropelamentos. Há ainda pouco conhecimento sobre a biologia da espécie, dificultando a atuação em estratégias de conservação. Por isso mesmo, é com grande esperança que as técnicas de fertilização in vitro, as mesmas utilizadas em humanos, possam vir a auxiliar no manejo de populações isoladas e ameaçadas de extinção. Tal possibilidade vem sendo testada há algum tempo em gatos-do-mato-pequenos em cativeiro.
FELINOS BRASILEIROS ONÇA PARDA
FÁBIO COLOMBINI
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GATO-DO-MATO-PEQUENO-NOVO New Oncilla
Through some genome studies, Brazilian researchers have identified that the oncilla species from southern Brazil is distinct from the species that occurs in the northeast. Despite the great physical resemblance between these wildcats, genetic differences have proved sufficient to classify the northeastern oncilla as Leopardus tigrinus, thus keeping the original name, and rename the southern species with the new nomenclature: Leopardus guttulus. The research originally investigated hybridization, are phenomenon in the evolution of felids, when individuals of closely related species mate, possibly developing, over time, a new species and/or subspecies. This situation was observed when it was finally possible to analyze oncillas living in the northeast and compare them to the felids that had been previously studied in the Atlantic Forest region, further south in the country. By comparing the genetic material of these cats, researchers found that there were enough differences to separate them into two species. By using specific criteria defined by Taxonomy (the branch of Science that is responsible for classifying and naming plants and animals) the more studied felid, the southernform, received the name guttulus, while the old name, tigrinus, was given to the “new” cat, with less biological knowledge. From appearance alone, it is almost impossible to tell the two cats apart, as both present the same basic characteristics: the size of a small domestic cat, coat patterns somewhat similar to that of the ocelot and the margay, and a body weight between 4.4 and 6.6 lbs. The most noticeable details include the new oncilla’s coat of slightly lighter color, smaller spots, and somewhat longer tail. It is estimated that the separation took place some 100,000 years ago and some hypotheses on the causes propose that the Atlantic Forest cat colonized the Caatinga and Cerrado, initiating the change. Another possibility is
Através do estudo de seu genoma, pesquisadores brasileiros identificaram que a espécie de gato-do-mato-pequeno do sul do país é diferente da espécie que ocorre no nordeste. Apesar da grande semelhança física entre esses gatos selvagens, há diferenças genéticas que levaram a classificar o gato-do-mato -pequeno do nordeste como Leopardus tigrinus, mantendo o nome antigo, e rebatizar a espécie do sul com a nova nomenclatura: Leopardus guttulus. A pesquisa originalmente investigava a hibridização, fenômeno que ocorre raramente na evolução dos felinos, quando indivíduos de espécies muito próximas se acasalam, podendo formar, com o tempo, novas espécies e subespécies. Essa situação foi observada quando se pôde finalmente analisar os gatos-do-mato-pequenos que viviam no nordeste e compará -los com os felinos já estudados anteriormente na região da Mata Atlântica, mais ao sul do país. Ao comparar o material genético desses gatos, os pesquisadores descobriram que, na verdade, haviam diferenças suficientes para separá-los em duas espécies distintas. Por critérios específicos da ciência de nomenclatura dos seres vivos (taxonomia), os felinos mais conhecidos, do sul, ganharam o nome guttulus, enquanto o antigo tigrinus ficou justamente com os “novos” gatos – aqueles sobre os quais há muito pouco conhecimento biológico catalogado. Pela aparência é quase impossível distinguir os felinos, já que ambos mantêm as características básicas – tamanho de um gato doméstico pequeno, manchas na pelagem semelhante às da jaguatirica e do maracajá, e peso entre 2 a 3 Kg. Destaca-se apenas o detalhe de que o gato-do-mato-pequenonovo teria pelagem um pouco mais clara, manchas menores e cauda um pouco mais comprida. A estimativa é que a separação tenha ocorrido há 100 mil anos e algumas hipóteses sobre a causa disso passam pelo gato da Mata Atlântica ter colonizado a Caatinga e o Cerrado, provocando a mudança. Existe ainda a possibilidade que as espécies nem sejam irmãs, e que o gato-do-mato-pequeno-novo (L. guttulus) esteja, de fato, mais próximo do gato-do-mato-grande. Essa última hipótese deve-se a uma descoberta de aspecto comportamental do citado estudo: casos de cruzamento com o gato-do-mato-grande e baixa diversidade genética nas duas espécies. As prováveis causas para essa hibridização ainda não teriam sido identificadas, pois ainda nem se definiu com precisão a distribuição geográfica do gato-do-mato-pequeno-novo, e nem o critério para avaliar se ele está ou não em risco de extinção. Mas desconfia-se que a interferência humana, em forma das modificações de habitat e desmatamento, poderia, sem dúvida, justificar como duas espécies que durante tempo permaneceram sem se acasalar, deixassem de se reconhecer como distintas e, assim, começassem a se reproduzir.
WILD CATS ONCILLA
LUIZ CLÁUDIO MARIGO / TYBA
RECENTEMENTE UM ESTUDO GENÉTICO MOSTROU QUE A POPULAÇÃO DE GATOSDO-MATO-PEQUENOS DO SUL NÃO CORRESPONDE AOS ESPÉCIMES DO NORDESTE A recent genetic study shows that the population of southern oncillas is different from those found in northeastern Brazil
that the two species may not even be so closely related, and that the new oncilla, L. guttulus, is, in fact, closer to geoffroy’s cat. The latter theory derives from a behavioral discovery described in the same previously-mentioned study: cases of intercrossing with geoffroy’s cat and low genetic diversity between the two species. The probable causes for this hybridization have not been identified as yet, as the geographic distribution of the new oncilla, as well as the criteria for properly assessing the degree of its threat status, remain to be accurately defined. The study surmises, however, that human interference, in the form of habitat modification and deforestation, might explain how two species that, for a long time, had not inter-bred, would stop recognizing each other as distinct, and thus begin to reproduce.
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NAS REGIÕES NORDESTE E NORTE, COMO NA AMAZÔNIA, A PELAGEM DO GATO-DO-MATOPEQUENO É MAIS CLARA
MARCOS AMEND
WILD CATS ONCILLA
In the northeastern and northern regions, such as the Amazon, the oncilla’s coat has a lighter color
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GATO-DO-MATO-PEQUENO FELINOS
PAULO FRIDMAN
WILD CATS ONCILLA
PRINCESA “
Tenho pouca história para contar. Mal nasci. Contam que fui encontrada por
aí, sem mãe, perdida. Por certo estava começando a explorar o terreno, saí da área verde e fui parar na rural. Uma família me pegou. Tive uma escolha muito difícil para fazer: minha vida ou minha liberdade? Fiquei com a vida. Tenho agora pouco menos de dois meses e me sinto velha. Vai ver é porque deixei do lado de fora os campos a perder de vista, as árvores de todos os tipos, as presas saborosas... Vai ver é porque aqui dentro meu horizonte será medido em metros. Meu dia será preciso. Minha vida sem surpresas. Tudo pelo bem maior. O plano que têm para mim é virar material de estudo. Serei alimentada, agasalhada, cuidada e serei multiplicada. Isso mesmo, faço parte de um projeto de reprodução em cativeiro. Vai salvar minha espécie? Não, mas pode ajudar. Pois é, destino de adulto em corpo de filhote. Apesar de tudo, me sinto amada – um sentimento que não faz muita diferença quando estamos no habitat natural e não temos contato com o bicho homem. Mas, no cativeiro, ele é determinante. Mais do que o amor, há a sabedoria. Aqui, apesar de presa continuarei a ser silvestre. Nada de gatinha. De biluzinho. De colinho. À noite sou recolhida para a maternidade, um lugar aquecido para sobreviver ao frio do inverno, afinal, ainda sou bebê. Durante o dia tenho meu próprio recinto e posso explorar meu espaço, descobrir seus segredos. Estou com humanos, mas não sou deles, como é o destino de outros felinos, retirados do seu habitat natural e forçados ao convívio humano. Serei tratada como bicho selvagem, que é o que sou. Ficarei, o máximo possível, próxima da minha essência de gato-do-mato-pequeno. Como os outros que aqui vivem. Somos irmãos de espécies diferentes. Sobreviventes da ocupação desenfreada que tomou conta do nosso território, que agora é território do homem. Quem sabe um dia, com a tal conscientização e graças a programas como esse do qual faço parte, homens e animais convivam com menos problemas. É a nossa única esperança.
Meu nome é Princesa, mas deveria ser Promessa.
”
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GATO-DO-MATO-PEQUENO FELINOS
PRINCESA “
I don’t have much of a story to tell. I am still too young. It is said that I was found
out there, no mother, lost. I had probably begun to explore my surroundings, left the safety of the forest and ended up in a rural area. A family of humans took me in. I had to make a tough choice: my life or my freedom? I took life. I am now just under two months and I already feel old. Maybe it’s because, in the outside world, I left the natural landscapes as far as the eyes can see, the trees of all different varieties, my favorite prey ... Maybe it’s because in here my horizon is measured in scant meters. My day will be precisely controlled. My life slips away, without surprises. All in the name of a greater good, I hope. The plan they have for me is to use me as research material: I will be fed, kept warm, cared for and reproduced. That’s right. I am part of a captive reproduction project. Will it save my species? Maybe not, but it may help. So, that’s it. I have the fate of an adult in the body of a kitten. I feel I am loved, in spite of everything. Love is a feeling that doesn’t make much difference when you are in the wild, with no contact with the human animal. But, in captivity, it is a key factor. More than love, there is wisdom. Here, albeit captive, I still have my wild nature. No kitty cat. No baby talk. No sitting on laps. At night I’m taken into the maternity quarters, a heated place to keep me alive during the cold winter. After all, I’m still a kitten. During the day I have my own enclosure and I can explore my space, discover its secrets. I am cared for by humans, but I don’t “belong” to them, as was the fate of other cats taken from their natural habitats and forced into human society. I am treated as a wild animal, which is what I am. I will stay, as much as possible, true to my oncilla essence. Like the others who live here. We are brothers from different species. We are survivors of the frenzied occupation that has modified our territory, a territory that now belongs to man. Maybe one day, with the development of the much-talked-about environmental awareness, and as result of management and conservation programs such as this one of which I am part, men and animals will be able to live together with less conflict, for mutual benefit. That’s our only hope.
My name is Princesa, but maybe it should be Promessa9.
”
9
This is a play on the Portuguese words Princesa (Princess) and Promessa (Promise) (TN).
WILD CATS ONCILLA
PAULO FRIDMAN
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GATO-DO-MATO-PEQUENO FELINOS
WILD CATS ONCILLA
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DURANTE ANOS, A MAIOR CONCENTRAÇÃO DE GATO-DO-MATOPEQUENO OCORRIA NA MATA ATLÂNTICA AO SUL DO PAÍS For years, the largest concentration of oncillas occurred in the Atlantic rainforest located to the south of the country
ALBERTO DEC. ALVES
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Leopardus guttulus SCIENTIFIC NAME: Leopardus guttulus OUTROS NOMES: gato-do-mato, pintadinho, gato-macambira, tirica OTHER NAMES: gato-do-mato, pintadinho, gato-macambira, tirica CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Leopardus GENUS: Leopardus SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: ameaçado CONSERVATION STATUS: endangered
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PAULO FRIDMAN
GATO-MOURISCO FELINOS
WILD CATS JAGUARUNDI
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GATO MOURISCO JAGUARUNDI
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ADRIANO GAMBARINI
WILD CATS JAGUARUNDI
GATO-MOURISCO Jaguarundi
D
a cor das chamas do fogo ou mais para as cinzas de uma fogueira, o gato-mourisco apresenta uma pelagem curta e cerrada, desprovida de pintas, que se tinge em três nuances uniformes: laranja ou ruivo vivo, cinza ou preto, dependendo de sua procedência. Dizem que é mais um truque da natureza para ele se confundir com a paisagem em que vive. Os alaranjados e cinzas são naturais do Pantanal e do Cerrado, para se camuflar entre a vegetação de árvores de pequeno porte e de galhos tortuosos. Já os mais escuros, cinzas ou pretos, são mais encontrados nas florestas, tanto tropicais quanto subtropicais. Adaptável, gosta de viver em bordas de banhados, na beira dos rios ou lagos, mas também aparece em lugares secos com vegetação aberta. Sua faixa de distribuição vai do sul do Texas, nos EUA, ao Peru, Argentina e Paraguai. No Brasil é encontrado em quase todo o território, porém em baixas densidades. Tem um porte diferente dos outros felinos, porque suas pernas são proporcionalmente mais curtas em relação ao corpo e a cabeça é pequena e um pouco achatada, lembra uma lontra ou uma irara. As orelhas pequenas e arredondadas contribuem para essa semelhança. Além disso, os olhos são próximos um do outro e voltados para frente. Tem cerca de 1 m de comprimento total, sendo que em média um terço corresponde à cauda, sendo maior do que um gato comum. Em relação à vida arbórea, é considerado o mais terrestre dos pequenos felinos brasileiros. Vivem em áreas que podem variar de menos de 10 km2 a mais de 80 km². Está mais ativo nos extremos do dia, ao nascer do sol ou na hora em que ele se põe. Costuma se movimentar com muita rapidez e tem hábitos solitários, comumente sendo visto aos pares de dezembro a maio, quando ocorre geralmente a época da reprodução. Depois disso o casal se separa, pois a responsabilidade com a cria é da mãe: são exclusivamente as fêmeas que ensinam noções de sobrevivência e alimentação aos filhotes. A gravidez dura entre 63 e 75 dias. Quando se aproxima a hora do parto, a fêmea costuma procurar uma toca ou uma moita onde espera o nascimento da prole. Nascem de 1 a 4 filhotes. Esses animais serão considerados adultos quando completarem 2 anos, momento de se separarem de suas mães e seguirem sozinhos. Para o mourisco, a expectativa de vida na natureza é de 15 anos.
Either with the color of flames or of the ashes of a dying fire, the jaguarundi has a coat of short, dense fur, with no spots or other markings, which can be of one of three uniform colors: bright orange, gray or black, depending to a large extent, on the animal’s origin. It is said that these differences in pelage color is another trick of nature to blend with the landscape where it lives. The orange and gray types are more common in the Pantanal or the Cerrado, where they camouflage in the vegetation of small twisted trees.The darker gray or black types are mostly found in both tropical and subtropical forests. Adaptable, it likes to live on the edge of marshes, on the banks of rivers or lakes, but also appears in dry places with open vegetation. Its distribution stretches all the way from southern Texas, in North America, to Peru, Argentina and Paraguay. In Brazil it is found practically throughout the country, but in low densities. Its body shape is different from that of other felids’ because of the proportionately shorter legs in relation to the body and the small and somewhat flattened head. It resembles the shape of an otter or weasel. The small and rounded ears contribute to the similarity. Furthermore, the eyes are close to each other and face forward. It is about 39.4 inches in total length, with one third, on average, corresponding to the tail, making it longer than an ordinary
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PAULO FRIDMAN
cat. It does not normally climb trees, and is considered the most terrestrial of the small Neotropical cats in Brazil. Jaguarundis live in areas that vary from less than 3.9 m2 to more than 30 m2. It is more active during the sunrise or sunset periods. It usually moves very fast and has solitary habits, but can be seen in pairs from December to May, their usual mating season. After mating, the pair goes separate ways, as the mother is responsible for raising the young, and teaching them survival and feeding skills. Gestation lasts between 63 and 75 days. When birth time approaches, the female seeks a burrow or a thick bush where she waits for the birth of her offspring. One to 4 kittens are born. These
As pegadas de quatro dedos, e com uma almofada que lembra um coração invertido, do mourisco têm tamanho (comprimento entre 3 a 4 cm e a largura de 2,5 a 3,5 cm) próximo às do gato-maracajá, porém menores que as da jaguatirica. Conhecido também pelo nome de jaguarundi (proveniente do tupi-guarani, iauára undi), o mourisco assemelha-se a um gato doméstico quando se enrodilha para dormir e descansar, ou mesmo quando se lambe todo para se limpar. Puro engano, de domésticos eles não têm nada: lembram os guepardos africanos ao emitir uma espécie de pio, disfarce para se aproximarem mais de suas presas. Acontece que os mouriscos têm uma característica
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ADRIANO GAMBARINI
With its short legs, rounded ears and small and somewhat flattened head, the jaguarundi resembles more closely an otter than a cat
COM PERNAS CURTAS, ORELHAS ARREDONDADAS E CABEÇA PEQUENA E ACHATADA, SE ASSEMELHA MAIS A UMA LONTRA DO QUE A UM GATO
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GATO-MOURISCO FELINOS
animals are considered adult when they are two years old, at which time they are forced to separate from the mother and go their own ways alone. For the jaguarundi, life expectancy in the wild is about 15 years. The jaguarundi’s four-fingered footprint and pad resembling an inverted heart is similar in size (length between 1.2 - 1.6 inches and width of 1.0 - 1.4 inches) to that of the margay’s, but smaller than the ocelot’s. The name jaguarundi comes from the Tupi-Guarani, iauáraundi. It resembles a domestic cat when it rolls up to sleep and rest, or even when it licks itself clean. But make no mistake; there’s nothing domestic about this cat. It turns out that they have a singular characteristic: they are very vocal. Not only do they meow, purr and hiss, like many cats, but they can also produce various bird-like sounds. Like African cheetahs, jaguarundis emit a sort of chirping vocalization to stealthily approach their prey. Their diet consists preferably of birds, but they also take small mammals, reptiles, amphibians and fish. Their prey is usually no heavier than 2.2 lbs. Well known for their courage, jaguarundis are hardly ever intimidated. If threatened, they will face any opponent. They tend to be aggressive with men, especially in captivity, and they tend to resist life in caged enclosures. In the wild, they tend to be less aggressive and are quite tolerant of human proximity. Still, they can attack chicken coops, which renders them vulnerable to being shot or captured in traps. Also, with the encroaching of cities and rural development, the jaguarundi has suffered from the decline of its natural habitat. The animal is still considered vulnerable rather than endangered, because of its high reproductive capabilities, good adaptability and from the fact that its uniform coat lacks the market appeal of spotted skins. The species became better known in 2012, when its picture, as well as that of an ocelot, appeared on a series of Brazilian postal stamps, as a way to increase the knowledge of the general public of the different species of Brazilian wildlife, for the purposes of conservation.
particular: são muito vocais, além do miar, ronronar e sibilar, comum aos gatos, eles também emitem sons que se assemelham a um pássaro. Sua dieta tradicional consiste, preferencialmente, de aves, mas come pequenos mamíferos, répteis, anfíbios e peixes. Geralmente presas de até um quilo de peso. São conhecidos por sua coragem e dificilmente se amedrontam. Se forem ameaçados, são capazes de enfrentar qualquer adversário. Tendem a ser mais agressivos com o homem, especialmente em cativeiro, pois demoram muito a se habituar à vida em recintos com grades. Na natureza não costuma ser agressivo e tolera bem a proximidade com os humanos, porém, para se alimentar pode atacar galinheiros, o que o torna suscetível a levar um tiro ou mesmo a cair em armadilhas. Além disso, com o avanço das cidades e das fazendas, os mouriscos acabaram sofrendo com a diminuição de seu habitat natural. O animal ainda é considerado apenas em situação vulnerável e não em extinção, porque contam, a seu favor, com uma reprodução relativamente alta, sua adaptabilidade e a sua pelagem sem o atrativo das manchas e pintas, com baixo valor econômico, portanto. Esse gato passou a ser mais conhecido em 2012, quando uma foto sua e outra de uma jaguatirica estamparam uma série de selos postais brasileiros com o objetivo de divulgar para o grande público as espécies da fauna do país para fins de preservação.
ALÉM DE MIAR, RONRONAR E SIBILAR, COMUM AOS GATOS, ELES TAMBÉM EMITEM SONS QUE SE ASSEMELHAM A UM PÁSSARO
WILD CATS JAGUARUNDI
Not only do they meow, purr and hiss, like many cats, but they can also produce various bird-like sounds
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ARAQUÉM ALCÂNTARA
WILD CATS JAGUARUNDI
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O GATO-MOURISCO PODE SER ENCONTRADO EM TODOS OS BIOMAS BRASILEIROS, ATÉ NA CAATINGA The jaguarundi can be found in every Brazilian biome, including the Caatinga
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PAULO FRIDMAN
GATO-MOURISCO FELINOS
WILD CATS JAGUARUNDI
GUARANÁ “
Foi longa a viagem que me trouxe aqui. Apertado e acuado em uma caixa, na boleia
de um caminhão. Saí de Alagoas, destino incerto. O motorista do caminhão me jogava uns pedaços de carne crua pelo trajeto. Enganava a fome, mas não nutria. Felino silvestre precisa de osso, de vísceras, ou seja: tudo de uma presa, esta é a carne que nos alimenta, a carne que sabemos caçar, livres, na natureza. Mas na caixa improvisada, não tinha liberdade e nem presa viva. Homem fez o que sabia. Desse tempo de filhote, me lembro da viagem e dos humanos me confundindo também com um gato doméstico. Até me davam comida na mão! Ah, se soubessem do risco. Ferocidade de gato-mourisco escondida na pelagem de filhote. Hoje, já com 6 anos, quando vejo uma vassoura nas mãos do tratador, corro para brincar com ela. E aí se tiver uma perna desavisada por perto... Não me aproximo da gente que passa por aqui cuidando de mim diariamente. E nem eles querem isso. Esperam que eu seja cada dia mais o que devo ser: um gato-mourisco. Meu passado humanizado, alimentado pelas pessoas e com contato físico forçado, devia ficar esquecido. Por isso passei um tempo na reabilitação só subindo em árvore, só caçando presa viva. Deu resultado. Desenvolvi agilidade, destreza, agressividade. E uma mordida poderosa como ela só! Já tentei usá-la para cortejar a fêmea que vive perto de mim. Mas ela não quis saber de nada, gata-mourisco mais velha de cativeiro do que eu. Não tento mais. Mas sei que os cientistas daqui ainda vão buscar novas alternativas para que eu possa reproduzir, porque estou na idade certa para isso e também porque sou raro: um gato-mourisco de pelagem alaranjada.
Foi por causa do meu pelo que ganhei o nome Guaraná. Me adaptei a ele. Assim como me adaptei à alimentação e ao meu recinto. Fico na parte de baixo, a Cerveja, na de cima. Nós, gatos-mouriscos aceitamos bem dividir o território entre iguais. De vez em quando eu subo para a área dela, atraído por algum cheiro ou só para me exercitar nos galhos mais altos. Gosto disso. Mas embaixo é ótimo também, porque fico perto dos saguis que passeiam livres e das maritacas voando rasteiro. Exercito meu instinto de caça e pratico pulos. Quem me vê, e não conhece os da minha espécie, duvida da minha habilidade, por causa das pernas curtas. Mas esse é um dos meus segredos: a perna é curta, mas a cauda é longa – e é nela que mora meu ponto de equilíbrio. Outro segredo muito meu, é o som que sei fazer, imitando o pio dos pássaros. Ah, sou imbatível nesse truque! Quando chega o lusco fusco e ninguém vê direito por conta da falta de luz, ali no meu recinto, onde o sol bate pouco – como eu gosto – eu faço o que sei
”
melhor fazer: ver sem ser visto! E ganho a minha presa. É meu instinto silvestre.
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GATO-MOURISCO FELINOS
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GUARANÁ “
It was a long journey that brought me here. I was squeezed and trapped inside a small box in a truck
cabin. I left the state of Alagoas, in northeastern Brazil, my destiny uncertain. The truck driver would throw me pieces of raw meat along the way. That would momentarily kill my hunger, but it didn’t nourish me enough. Wild cats need bones, bowels, whole prey. That is the meat that feeds us, the meat that we hunt for, when we are free in the wild. But in that makeshift box, I had no freedom and no live prey. Luckily, that man did what he could for me. From my time as a kitten, I remember the trip and that humans were mistaking me for a domestic cat. They even hand fed me! Oh, if they only knew the danger, the fierceness of a jaguarundi hiding under the skin of a small kitten. Today, at age six, when I see a broom at work in my enclosure, I run to play with it. But watch out for the unsuspecting leg... I don’t go near the people who come every day to take care of me. And they don’t want me to. They expect me to gradually become what I am supposed to be: a jaguarundi. My humanized past, when people fed me and filled me with forced physical contact, must be forgotten. That was the reason why I spent time in an intensive rehabilitation program, climbing trees, hunting live prey. It worked. I developed agility, dexterity, aggressiveness. And the most powerful bite you will ever see! Just try me! I tried using my new skills to court a female who’s around here. But she didn’t go for it. She is also a captive jaguarundi; and she is older than me. I’ve given up, for now. But I know the local researchers won’t give up in searching for alternatives to help me breed. After all, I’m at the right age, and I’m also rare: an orange-coated jaguarundi.
It was because of the color of my coat that they named me Guarana10. I got used to it. I got used to the food they provide, too, and to my enclosure. Cerveja11, my female roommate, stays at the top perches on the upper levels of our enclosure, and I stay at the bottom, at ground-level. Jaguarundis don’t mind sharing their territory with their peers. From time to time I climb up to her area, attracted by some scent or just to work out on the higher branches. I like that. But down below, it is great too, because I can get close to the wild marmosets that roam free in the compound, and to the low-flying maritacas . I exercise my hunting instinct and practice my leaps. Those who see me and know my species,doubt my ability because of the short legs. But that’s one of my secrets: the legs are short, but the tail is long – and in the tail is my balance advantage! Another of my singular secrets is the variety of sounds that I can make. I can imitate the chirping sounds of birds. When it comes to that trick, nobody can outdo me! Come dusk time and nobody can see me well because of the dim light. There, in my enclosure, where the sun rarely shines–that’s the way I like
”
it– I do what I do best: I see without being seen! And I hunt my prey. That’s my wild instinct. Guaraná: native to the Amazonbasin and especially common in Brazil, this climbing plant is best known for its fruit, a brownish-red berry whose high concentration of caffeine makes it a powerful stimulant (TN). 11 Cerveja: Portuguese for beer (TN). 10
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FICHA TÉCNICA
SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO (DA ESPÉCIE BRASILEIRA): Puma yagouaroundi SCIENTIFIC NAME: Puma yagouaroundi OUTROS NOMES: gato-mourisco, gato-vermelho, gato-preto, jaguarundi e maracajá-una OTHER NAMES: gato-mourisco, gato-vermelho, gato-preto, jaguarundi and maracajá-una CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Puma GENUS: Puma SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: vulnerável CONSERVATION STATUS: vulnerable
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ONÇA PINTADA
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JAGUAR
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ONÇA-PINTADA Jaguar
E
spécie de identidade nacional quando se fala em felinos, a figura da onça-pintada no Brasil aparece no imaginário popular, nos livros escolares e nos folders turísticos, assim como o futebol, Carnaval e Amazônia. Não é para menos: é o terceiro maior felino do mundo, figurando ao lado do leão e do tigre – animais que nem existem por aqui, mas com quem a onça tem parentesco direto, já que pertence ao mesmo gênero Panthera. Contudo, apesar de toda a atenção que este felino silvestre recebe, a situação da espécie em termos de preservação está longe de ser orgulho nacional. Os mais recentes dados levantados sobre as populações de onças -pintadas no Brasil indicam que ao menos em um dos biomas tropicais, a Mata Atlântica, o felino está em grande risco. Espécie que habita desde o sul dos EUA até o norte da Argentina, justamente na Mata Atlântica, com apenas 12% de mata preservada, as onças-pintadas restantes (aproximadamente 250) ainda lutam para sobreviver. Também nas áreas de Caatinga, a exploração desordenada do bioma vem levando à contínua fragmentação de seu habitat e perda de suas presas naturais, fazendo com que o felino passe a atacar os rebanhos locais e, consequentemente, seja perseguido e abatido pelos criadores. Por esse motivo, assim como na Mata Atlântica, a onça da Caatinga e a do Cerrado estão criticamente ameaçadas de extinção. Apenas na Amazônia e no Pantanal, acredita-se que as populações de onças no Brasil estejam em melhor estado. Maior predador das florestas tropicais, é um animal territorial ocupando uma área de 140 km² em média, podendo ultrapassar 300 km2. Essa distribuição, é claro, varia de acordo com a disponibilidade de alimento em cada ecossistema, e a densidade da população. De hábitos solitários, onças-pintadas têm extrema agilidade, se saindo muito bem na água e em terra, pescando, nadando em grandes rios, caçando jacarés e escalando árvores com grande desenvoltura. Tem um comportamento oportunista em relação à caça, sendo capaz de atacar uma presa a qualquer hora do dia, embora preferencialmente tenha hábito crepuscular. A alta temperatura entre meio-dia e 4 horas da tarde é, contudo, capaz de torná-la menos ativa. Sempre robusta e musculosa, enquanto na Caatinga uma onça-pintada fêmea pode pesar 30 kg, um macho do Pantanal chega a incríveis 140 kg. Seja de qualquer porte, é temida pelo homem, mesmo que,
Because it represents the national identity when it comes to felids, the image of the jaguar frequently appears in popular Brazilian imagination, in school books and tourist brochures, as much as football, Carnival and the Amazon. That is not surprising as the jaguar is the third largest felid in the world, ranking right below the lion and the tiger – animals that don’t exist in Brazil, but of which the jaguar is direct kin, belonging to the same genus, Panthera. Nevertheless, despite all the attention that this wild cat receives, in terms of its conservation prospects, the species’ situation is far from a source of national pride. The most recent data collected on jaguar populations in Brazil indicate that, at least in one of the country’s tropical biomes, the Atlantic Forest, this felid is at grave risk. Though the species is found from the southern United States all the way to northern Argentina, precisely in the Atlantic Forest, where only 12% of the forest is preserved, remaining jaguars (estimated at 250 animals) are still fighting to survive. Likewise, in the Caatinga, the uncontrolled exploitation of the biome has led to continued fragmentation of jaguar’s habitat and loss of its natural prey, which forces the animal to attack domestic herds
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The jaguar is an excellent hunter with a powerful build and well-developed muscles. It is estimated that one in every ten attacks is successful
and, consequently, to be hunted and killed by ranchers. For this reason, as happens in the Atlantic Forest, the jaguar is critically endangered in the Caatinga and in the Cerrado. Only in the Amazon and in the Pantanal, can the Brazilian jaguar be considered to be in better shape. As the top predator of the tropical forests, the jaguar is a territorial animal, occupying individual areas of 54 m2, on average, but sometimes exceeding 115 m2. Of course, home range size varies according to food availability in each ecosystem, as well as to population density. Jaguars have solitary habits and extreme agility, doing very well both in the water and on land, fishing, swimming in large rivers, hunting caimans (the South American relatives of the alligator) and climbing trees with great ease. When it comes to hunting, they show opportunistic behavior, hunting prey at any time of day. However, they show a clear preference for dusk periods. During the high temperatures between noon and 4 pm, they tend to reduce their activity. Although always robust and muscular, a Caatinga female jaguar usually weighs only around 65 lbs, while a male from the Pantanal can reach more than 300 lbs. Regardless of its bulk, however, the jaguar is always feared by man. Even though the animal chooses to avoid contact and human presence, living in inhospitable locations of difficult access – as difficult as they are to be found at present – they are never safe from their most cruel predator, man, who usually considers them a threat. Despite the jaguar’s great power, attacks on humans are extremely rare. With the strength of its bite, it can pierce through turtle and armadillo shells and even penetrate the tough hide of caimans12. Thanks to this ability, the jaguar can kill large prey such as anacondas, black caimans, the pirarucu fish and tapirs – prey that can weigh more than 700 lbs – and carry its carcass while swimming. Discreet and cunning, the jaguar has great chances
FÁBIO COLOMBINI
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LUIZ CLAUDIO MARIGO / TYBA
EXCELENTE CAÇADORA QUE É, TEM MÚSCULOS FORTES E TORNEADOS. ESTIMA-SE QUE A CADA DEZ INVESTIDAS DA ONÇA, UMA É CERTEIRA
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of success on a hunt. It is estimated that one in every 10 attacks is successful. In addition to its ability to blend invisible into the landscape, the jaguar often studies its prey, usually choosing the easiest, slowest, or otherwise more vulnerable animals, whether inexperienced or injured. During a chase, jaguars can reach high speeds and top this with a precise lunge, jumping far and high with extreme ease. Still, it cannot keep up high speeds for very long, particularly when it is being chased by man, who uses dogs especially trained for this sort of hunt. One characteristic that differentiates jaguars from pumas is its behavior with the killed prey: the jaguar does not usually cover it, like the puma, but drags the carcass for distances up to one mile to a more protected location. Not surprisingly, it is the coat that makes a jaguar unique.The patterns created by black rosettes with small central spots on a golden background are the jaguar’s equivalent to human fingerprints. The beauty of its coat was largely the cause of man’s relentless pursuit of the animal until the 1970’s, to meet the demands of international fashion. Today, the conflict with ranchers and habitat degradation are the greatest threats. A jaguar’s footprints are similar in structure to that of an ocelot, though much larger (4.7 inches long x 4.5 inches wide is the average measurement of a male jaguar’s forepaw, while a male ocelot’s is 2.2 x 1.9 inches). The probability of mistaking the tracks of an ocelot with those of a jaguar cub –which may be similar in size – is reduced by the fact that jaguar cubs would certainly still be accompanied by the mother. In fact, jaguar cubs stay with their mothers from birth to 18-24 months, as she is responsible for teaching them how to hunt and fend off enemies.
The third largest cat in the world, the jaguar is an excellent swimmer and climbs trees with grace and ease
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Caiman - a close relative of the alligator (TN)
de sua parte, prefira fugir desse contato. Faz o que pode para evitar a presença humana, vivendo em locais inóspitos e de difícil acesso – o que sobrou ao animal –, a salvo de seu cruel predador, o homem, aquele que mitifica o felino como ameaça. Embora a onça-pintada tenha, de fato, um grande poder de ataque, são extremamente raros casos de investidas contra humanos. Com a força de sua mordida, consegue perfurar cascos de tartaruga, de tatus e a couraça de jacarés. Por essa habilidade, a onça-pintada pode perfeitamente abater presas grandes como sucuris, jacarés-açu, pirarucus e antas, que pesam até 350 kg, e, inclusive, carregar a presa abatida enquanto nada. Discreta e astuta, a onça tem também grandes chances em uma caçada, estimando-se que a cada dez investidas, uma seja certeira. Além da capacidade de se camuflar na paisagem, ela costuma estudar suas presas, normalmente selecionando as mais fáceis ou mais lentas, como animais inexperientes ou machucados. Durante uma perseguição, atinge altas velocidades, com um bote certeiro, saltando em distância e em altura com extrema desenvoltura. Porém, não é capaz de manter velocidade por muito tempo, como quando é perseguida pelo homem, com o uso de cachorros especialmente treinados para esse tipo de caçada. Uma característica que a difere da onça-parda é seu comportamento com a presa depois de abatida: a pintada não costuma cobri-la, como a parda, mas arrasta a carcaça por até 1,5 km de distância, até um local mais protegido. Porém, como é de se supor, é a descrição de sua pelagem que faz uma onça-pintada ser única. O padrão de rosetas pretas com pequenas manchas centrais em um fundo dourado equivale na onça-pintada às digitais humanas. A beleza da sua pelagem foi, em grande parte, a causa da perseguição movida pelo homem, até a década de 70, para atender às demandas da moda internacional. Atualmente, o conflito com fazendeiros e a alteração de habitats representam as maiores ameaças. As pegadas de uma onça-pintada são semelhantes, em proporções, às da jaguatirica, mas bem maiores (12 cm comprimento x 11,5 cm largura sendo as medidas médias da pata dianteira de um macho de onça-pintada, e 5,5 cm x 5,0 cm, aquelas de um macho de jaguatirica). A probabilidade de se confundir as pegadas de uma jaguatirica com as de um filhote de onça-pintada - em um período em que as medidas das pegadas das duas espécies podem se sobrepor - é reduzida pelo fato de, quando nessa idade, o filhote certamente ainda estaria acompanhado de sua progenitora. Na verdade, os filhotes de onça-pintada permanecem com a mãe entre o nascimento e a idade de 18 a 24 meses, sendo ela responsável por ensinar os mesmos a caçarem e a se defenderem de inimigos.
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TERCEIRO MAIOR FELINO DO MUNDO, A ONÇA-PINTADA É EXÍMIA NADADORA E ESCALA ÁRVORES COM GRAÇA E DESENVOLTURA
ARAQUÉM ALCÂNTARA
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Even though it is critically endangered, this species is in better shape in the Amazon and in the Pantanal
LUIZ CLĂ UDIO MARIGO
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APESAR DE CRITICAMENTE AMEAÇADA DE EXTINÇÃO, NA AMAZÔNIA E NO PANTANAL É MELHOR O ESTADO DA ESPÉCIE
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PAULO FRIDMAN
ONÇA-PINTADA FELINOS
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PRETINHA “
Acostumada às estepes e às florestas tropicais, mimetismo é meu lema. Onça de pelo escuro sei
que há quem desconfie da minha identidade... Mas sou onça, sim! Preste atenção quando o sol bate nas minhas costas, olhe bem e verá minhas pintas. Sou onça-pintada. Meu pelo é escuro porque carrego na herança genética a elevada concentração de melanina. Não é doença de onça, não! É capricho da mãe natureza mesmo, essa mãe generosa que gera seus filhos sem discriminação.
Sou animal nascido para ser livre, correr, saltar, caçar. Mas quase não sobrevivi para cumprir meu destino de felino. Fui ferida, passei privação, perdi meus instintos. Também fui socorrida, amparada, assistida. Não morri, mas precisei reaprender a ser bicho. Nasci onça-pintada, na Ilha de Marajó, em ninhada de dois filhotes. Eu preta, minha irmã pintada. Havia calor, a foz de um grande rio e palmeiras buriti. E havia uma mãe onça. De repente não havia mais. Sei que apareceu um bicho grande, com cheiro forte e mãos pegajosas que nos tirou dali e nos colocou em outro lugar, sem aroma de floresta nem barulho de rio. Era uma casa de bichos homens. O chão macio sob minhas patas, de uma hora pra outra, virou um quadrado de cimento com um muro ao redor; o leite quente e rico em proteína que um dia sorvi foi trocado por outro de vaca, bebido em um plástico com bico. Nada de presa para caçar, nem de espaço para correr. De vez em quando, carne pronta para comer e nunca, nunca uma árvore para subir. Meu instinto ficou represado, oprimido, esquecido em mim. Fui definhando, sem estímulos, sem obstáculos, sem músculos, sem adrenalina. Natureza selvagem encerrada em cativeiro é morte certa. Podia ser que a intenção do bicho homem que me caçou fosse boa, pois não virei tapete nem enfeite na parede. Mas, sabe... onça domesticada é diferente. Passei fome de comida e de vida, em quantidade e qualidade. E minha história de onça só não acabou por aí porque pude ser resgatada pelos veterinários da Mata Ciliar. Corpo abatido, desnutrido, com crescimento tardio com a metade do tamanho que deveria ter. Nem de pé podia mais ficar. Recebi remédios, tratamentos, fiz exames e atravessei uma longa viagem encaixotada até chegar onde estou. Andei até de avião. Agora vivo nesse refúgio no meio da cidade. Não tenho mais o rio, nem a onça-mãe, nem o buriti – mas também não me lembro mais deles. É melhor do que onde estive, pois aqui não há sofrimento, nem fome, nem dor. Hoje tenho ração para reequilibrar meu desenvolvimento, fisioterapia na água para restabelecer meus movimentos, tratador humano que não quer me adestrar, mas sim me ensinar o caminho de volta à minha natureza selvagem. A reabilitação física é minha nova condição. Faço progressos, já caminho e escalo troncos. Estou crescendo. Tudo indica que voltarei a saltar. Ganhei a atenção de que precisei, na condição de animal ferido. Ganhei a consideração que merecia, na condição de espécie vulnerável. Ganhei o amor de que necessita todo o ser vivo. Ah, e ganhei um simpático nome – Pretinha – e também ganhei este espaço para contar a minha história.
”
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PRETINHA “
I’m used to the savannas and to the tropical forests; mimicry is my specialty. Being a melanistic or black jaguar,
I know some may not know... but I’m a jaguar, don’t ever doubt it! Just look at my coat when the sun shines on it; look closely and you’ll see my spots. I am a real jaguar. The color of my coat is dark because my genetic legacy has bestowed on me a high concentration of the black pigment called melanin. This is no jaguar disease, I tell you! It’s just one of Mother Nature’s whims, the generous mother who breeds her children free from all discrimination.
I was born to be free, to run, to jump, and to hunt. But I barely survived to fulfill my cat fate. I was deeply wounded; I went through deprivation on most of my basic needs and, as a result, I lost some of my instincts. I was also rescued, supported, assisted. I did not die, but I had to learn how to be an animal again. I was born on the island of Marajó, in a litter of two cubs. I was black, and my sister, spotted. I remember there was heat, the mouth of a large river and Buriti palm trees. And there was mother jaguar. Suddenly she was no more. All I know is that a large animal came over with his strong smell and sticky hands. Hetook us away and put us somewhere where there was no river and no forest smells or sounds. I later learned that it was a house of man. The soft ground under my paws suddenly became an enclosure of cement, surrounded by a wall; the protein-rich, warm milk I had once suckled from my mother was replaced by cow’s milk sipped from a plastic nipple. No prey to hunt, or space to run. From time to time, there was some ready-to-eat meat, but never, ever a tree to climb. My instincts were obstructed, oppressed, forgotten in me. I languished away, no drive, no obstacles, no muscles, and no adrenaline. When locked in captivity, a wild nature finds a form of death. I understand that the intentions of the human animal who captured me may have been good, in their own way. After all, I did not become a rug nor was my head mounted on a wall. But, as they say... a caged jaguar is something else. I starved for food and life, both in quantity and quality. And the only reason my jaguar story did not end there is because I was rescued by the vets from Mata Ciliar. My body was worn-down, as the result of a wrong diet, which also stunted my growth and left me half the size I should have been. I couldn’t even stand on my own anymore. I was given medication, treatment, exams and went on a long journey, locked in a box, to get to where I am now. I even flew in an airplane. Now I live in this rescue center in a big city. I no longer have the river, mother jaguar, or even the Buriti palms – but I don’t remember them anymore, either. I do know, however, that this is better than where I was before, for here there is no suffering, no hunger, no pain. Today I am given food so my development can find a new balance, including physical therapy in the water, so my movements can be properly restored. I was also given a human caretaker not interested in modifying my behavior, but in teaching me the way back to my wild nature. Physical rehabilitation is my new condition. I’m making progress: I am already walking normally and climbing trees. I’m growing. If all goes well, I will be able to jump again. I finally have the attention I needed, given my previous status as a wounded animal. I now have the consideration I deserve as a vulnerable species. I received the love that every living being needs. Oh, and I got a nice little name –
”
Pretinha – and access to this book, where I can tell my story.
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JULIETA “
Nasci livre na floresta, mas cedo fui caçada e ganhei uma coleira. Cresci em
uma corporação militar na selva amazônica, participando de desfiles como se fosse amestrada. O batalhão tinha orgulho do meu poder. Só não tinha poder sobre a minha natureza... Ninguém adestra uma onça, não. De uma hora para outra posso não gostar. Posso me incomodar. Posso ferir. E foi o que fiz com aquele cinegrafista que resolveu entrar no meu recinto. Nas mãos, uma câmera, aos meus olhos, uma ameaça. Assustada, acabei amedrontando aquele homem. Aliás, a todos eles. De repente se deram conta de que não sabiam algo muito claro: que eu já era onça feita.
De uma hora para outra ninguém mais queria saber de desfilar meu poder. Queriam é se ver livre de mim. Mas como se livrar de uma onça? Quem vai querer um bicho como eu? Preciso de três quilos de carne por dia, de espaço para me exercitar, comida para caçar, quilômetros para percorrer e rios para atravessar... Onça precisa é da natureza – e isso, que homem pode dar? Em cativeiro, um felino como eu é uma dor de cabeça. Difícil de alimentar, cuidar e manter. Quem me salvou, o pessoal da Mata Ciliar, sabia disso. Foi preciso muito empenho: vencer a distância de São Paulo à região amazônica, cumprir uma infinidade de autorizações, dispor de caixa adequada para o transporte e comprar passagem de avião – para mim e para o veterinário. E para todas essas coisas foi preciso quem pagasse a conta, o tal do patrocínio. Quer dizer, patrocínio para tudo isso e mais dinheiro para me sustentar por uns 20 anos, que é o que tenho pela frente. Faz dois anos dessa história, o tempo que estou aqui. Tudo caminha bem agora, de acordo com os planos que os homens têm para me manter viva e saudável. Vou ser onça de cativeiro para sempre, mas nunca mais serei humanizada ou exibida. Um dia desses usaram tranquilizantes para me fazer dormir e poderem finalmente tirar a coleira, pequena, com risco de me sufocar. Acordei mais livre. Mais onça até! E logo aproveitei para dar um bom mergulho na piscina do meu novo recinto, porque é assim que reza a minha natureza. Sou onça feita e tenho muito ainda para viver.
”
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JULIETA “
I was born free in the forest, but too soon I was captured and put on a leash.
I grew up in a military compound in the Amazon jungle, and was exhibited in parades as If I was tame. My military owners were proud of my power. But they had no power over my nature ... Nobody can tame a jaguar, no sir. In an instant, I may be startled and react by instinct, if I don`t like something; I may get annoyed. And I may hurt somebody. That’s what I did to the cameraman who decided to come into my enclosure, with a camera in his hands, which in my eyes, represented a threat. I was frightened and ended up scaring the man. I actually scared a bunch of them. Suddenly they realized something that they didn’t know and which then became very clear: I had become a grown jaguar.
All of a sudden no one wanted to parade my powers anymore. All they wanted to do then was to get rid of me. But how can you get rid of a jaguar? Who will want a pet like me? I am expensive to maintain: six pounds of meat a day, enough room to exercise in, food to hunt, miles to walk and rivers to cross ... jaguars need nature. How could man possibly give us that? A cat like me in captivity is quite a headache. I am hard to feed, hard to care for and hard to keep. Those who saved me - the Mata Ciliar people – they knew. It was hard work: overcoming the distance between the regions of Amazonas and Sao Paulo, complying with so many required permits, having the proper shipping box and paying for the airfares – both for me and the vet. Someone had to pay the bill. That is what they call sponsorship. That means I need money for all that, and even more money to pay the bill to sustain me for the next 20 years – give or take a few – which is what I may have ahead of me. This story happened two years ago; that’s how long I’ve been here. Things are going well now, according to the plans to keep me alive and healthy. I will forever be a jaguar in captivity, I know that, but I will never again be “humanized” or displayed as a trophy. One day they gave me tranquilizers to put me to sleep and finally remove the collar, which I had overgrown, that was almost choking me. I woke up feeling liberated, feeling even more like a jaguar than before! I quickly went for a swim in the pool of my new enclosure because that’s my
”
natural way. I am a grown jaguar and I still have a lot of life to live.
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SPECIES CHARACTERISTICS NOME CIENTÍFICO: Panthera onca SCIENTIFIC NAME: Panthera onca OUTROS NOMES: jaguar, jaguar-canguçu, jaguaretê, onça-preta ou jaraguá-pichuna (versão melânica) OTHER NAMES: jaguar, jaguar-canguçu, jaguaretê, onça-preta or jaraguá-pichuna (melanistic version) CLASSE: Mammalia (mamíferos) CLASS: Mammalia (mammals) ORDEM: Carnivora (carnívoros) ORDER: Carnivora (carnivores) FAMÍLIA: Felidae (felídeos) FAMILY: Felidae (felids) SUB-FAMÍLIA: Felinae (felinos) SUB-FAMILY: Felinae (felids) GÊNERO: Panthera GENUS: Panthera SUBESPÉCIES: Panthera onca onca, P. onca hernandesii, P. onca centralis, P. onca arizonensis, P. onca veraencrucis e P. onca palustris SUBSPECIES: Panthera onca onca, P. onca hernandesii, P. onca centralis, P. onca arizonensis, P. onca veraencrucis and P. onca palustris SITUAÇÃO DE EXTINÇÃO: criticamente ameaçada de extinção CONSERVATION STATUS: critically threatened
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LUIZ CLÁUDIO MARIGO
BIBLIOGRAFIA FELINOS
WILD CATS INFORMATION CARD
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BIBLIOGRAPHY
BIBLIOGRAFIA
BIBLIOGRAFIA FELINOS
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BIBLIOGRAFIA BIBLIOGRAPHY
CRAWSHAW JR., P. G. A personal perspective on livestock depredation by large cats in Brazil. Uma perspectiva sobre a depredação de animais domésticos por grandes felinos no Brasil. Natureza & ConservaADANIA, C.; H. DINIZ, L. S. M.; GOMES, M. S.; FILONI, C.; SILVA, J. C. R.
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Avaliação das condições veterinárias e de manejo dos pequenos felinos
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177
INFORMATION CARD WILD CAT
OCELOT
PUMA
MARGAY
PAMPAS CAT
GEOFFROY’S CAT
ONCILLA
JAGUARUNDI
JAGUAR
BODY LENGTH
27 inches (23 to 32 inches). Males are up to one third larger than females
48 inches (from 33 to 60 inches). Males are up to one third larger than females
1 foot 8 inches, male and female are approximately the same size
23.6 inches (from 20.8 to 27.5 inches)
22.9 inches (from 17 to 27 inches), males are slightly larger than females
21.5 inches (from 17.7 to 25.2 inches), male and female are approximately the same size
average of 25.6 inches for males and 23.6 inches for females
57 inches (from 43 to 69 inches), males are up to one third larger than females
TAIL
between 12 and
25 inches (from
14 inches, on
9.8 inches
12.7 inches (from 9.4
11.4 inches (from
17.7 inches
from 16 to 27 inches
LENGTH
18 inches
18 to 31 inches)
average
(from 8.7 to 12.6 inches)
to 14.4 inches)
7.9 to 15 inches)
for males and 15.7 inches for females
HEIGHT
up to 20 inches
27 inches (from 21 to 32 inches)
from 11.8 to 18.9 inches
from 11.8 to 13.8 inches
11 inches (from 9 to 13 inches)
9.5 inches
from 21.65 to 30.31 inches
up to 33.5 inches
WEIGHT
between 15 lbs and 40 lbs
from 66 to 154 lbs (adult males, between 99 and 154 lbs, adult females between 48 and 99 lbs)
6.6 lbs (from 5.5 to 8.8 lbs)
8.8 lbs
8.8 lbs (from 4.4 to 17.6 lbs)
5.3 lbs (from 3.3 to 6.6 lbs)
between 8.8 lbs and 19.8 lbs
from 66 lbs (Caatinga female) to more than 300 lbs (Pantanal male)
COAT PATTERNS
from yellowish gray to bright yellow, or ochre brown
grayish brown to reddish brown
color can range from grayish yellow to ochre brown
from yellowish gray to dark brown, covered with brown fringes
from gray to ochre yellow, with melanism common to the species
yellowish, ranging from light yellow to yellowish brown
uniform on a single color that may be reddish orange, gray or black
golden yellow with rosettes of different sizes, but usually large and featuring one or more black spots inside
SPOTS
longitudinal stripes formed by the spots
no spots, except from birth to 1 year of age
variable with large solid dots, but the rosettes are typically broad, complete and well spaced on the sides
variable presence of spots
0.6 inches diameter, always solid dots
no solid spots, only small, open or closed rosettes, on the side of the body, at the base of the tail
no spots
the body is covered with black spots
FOOTPRINT
2.2 inches long x 1.96 inches wide; rounded pad and four toes without claw marks
from 2.5 to 3.3 inches in length, and 2.1 to 3.14 inches in width, triangularshaped pads and indentations turned inwards
0.9 inch long x 1 inch wide
0.7 inches long x 0.55 inches wide
1.4 inches long x 1.7 inches wide
1.2 inches long x 1.2 inches wide
inverted heart shaped pad, with 1.4 inches in length and 1.2 inches in width
round shape, 4.7 inches long x 4.5 inches wide. Large round pad and toes in the same shape
LIFE EXPECTANCY
up to 12 years in the wild and 18 years in captivity
up to 13 years old in nature and 20 in captivity
13 years in the wild and 21 years in captivity
9 to 16 years in the wild
10 years in the wild and 14 years in captivity
11 years in the wild
15 years in the wild
12 to 14 years in the wild, and up to 22 years in captivity
GEOGRAPHIC DISTRIBUTION (BR)
the entire country, except the Pampas region in the state of Rio Grande do Sul
the entire national territory
forests throughout Brazil, except for the Pampas in Rio Grande do Sul and the northeastern Caatinga
besides the Pampas of Rio Grande do Sul, it is present in the north of the state of Mato Grosso and in the state of GoiĂĄs
south of Rio Grande do Sul
the entire country, except for the extreme south of Rio Grande do Sul and a few areas of the Amazon
almost in the entire country, but usually at low densities
in the center, north and southeast regions and in the states of BA, PI and MA. In the state of RS, restricted to a small state park at the northwest corner of the state
GESTATION AND LITTER SIZE
77 days and an average of 1 to 4 cubs
90 and 96 days, 3 to 4 cubs
from 81 to 84 days and 1 young
75 to 85 days and an average of 2 young
74 days and an average of 2 young, but it can have a litter of up to 3
72 days with an average of 1 cub
63 to 75 days, with an average of 2 young
from 90 to 105 days, with an average of 2 cubs per litter
MAIN PREY
birds, snakes, small and medium-sized mammals
wild mammals such as deer, armadilos, capybaras and other smaller rodents
birds and small mammals, mainly arboreal rodents
reptiles and small mammals
birds and small to medium-sized rodents, including hares
rodents
birds, small mammals, reptiles, amphibians and fish
small and mediumsized vertebrates, including mammals
ACTIVITY PATTERN
dusk and nocturnal
dusk and nocturnal
essentially nocturnal
crepuscular and diurnal
dusk and nocturnal
nocturnal
early in the morning and late afternoon
dusk and nocturnal
178 FELINOS - A LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA WILD CATS - THE STRUGGLE FOR SURVIVAL FICHA TÉCNICA INFORMATION CARD EDITOR EDITOR: Alberto deC. Alves PRODUÇÃO EXECUTIVA EXECUTIVE PRODUCER:
Abook – Editora AUTORIA AUTHORS: Adriana Teixeira e Patricia Broggi CURADORIA TÉCNICA TECHNICAL CURATOR:
Peter Crawshaw Jr. COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO PRODUCTION COORDINATORS: Dina Faria e Rodrigo Padin EXECUÇÃO EXECUTION: Neoânima Comunicação TRADUÇÃO TRANSLATION: Fernanda Sampaio REVISÃO DE TEXTO REVISION:
Dina Faria, Peter Crawshaw Jr e Allison Devlin PESQUISA ICONOGRÁFICA ICONOGRAPHIC RESEARCH:
Rodrigo Padin ASSESSORIA CONTÁBIL ACCOUNTING ADVISOR:
Beth Ceconi PR OJETO PROJECT
ASSESSORIA JURÍDICA LEGAL COUNSEL:
Cesnik, Quintino & Salinas Advogados PROJETO GRÁFICO E DIREÇÃO DE ARTE GRAPHIC PROJECT AND ART DIRECTOR: Stella Prada Ramenzoni FOTO DE CAPA COVER PHOTO: Paulo Fridman REALIZ AÇÃO ACCOMPLISHMENT
FOTOGRAFIA PHOTOGRAPHERS: Adriano Gambarini, Alberto deC. Alves, Araquém Alcântara, Fábio Colombini, Luciano Candisani, Luiz Cláudio Marigo, Marcos Amend, Paulo Fridman e Zig Koch TRATAMENTO DE IMAGENS & PRODUÇÃO GRÁFICA IMAGE TREATMENT & GRAPHIC PUBLISHING PRODUCTION: Estúdio Matiz – Maurílio Garcia de Araújo
Felinos: a luta pela sobrevivência. Abook – Editora, São Paulo, 2014 176 p. Autor: Patricia Broggi e Adriana Teixeira ISBN 978-85-86664-36-6 1. Jornalismo; 2. Editoração e imprensa documentária e educativa. Proibida a reprodução sem autorização expressa. Todos os direitos reservados à Abook – Editora.
PRÉ-IMPRESSÃO & IMPRESSÃO PREPRESS & PRINTING: Ipsis AGRADECIMENTOS ACKNOWLEDGEMENTS: Adriano
Gambarini, Adriana Teixeira, Allison Devlin, Araquém Alcântara, Beth Ceconi, Caio Cestari, Cecília Marigo, Cristina Adania, Dina Faria, Fábio Dias Mazim (Ka’aguy Consultoria Ambiental Ltda), Fernanda Sampaio, Fernando VonZuben, Luciana Raposo, Maurílio Garcia de Araújo, Paulo Fridman, Patricia Broggi, Peter Crawshaw Jr., Rafael Luvizetto, Renata Fernandes, Roberto Klabin, Rodrigo Padin, Rony Puglia, Stella Prada, Tatiane Campos Trigo (Setor de Mastozoologia, Museu de Ciências Naturais Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul). E a toda equipe da Mata Ciliar, tratadores, técnicos, voluntários e equipe de apoio.
Com olhar incomparável, sinuosidade nas passadas e a cauda dançando no ar, os felinos silvestres são pura elegância. Além da onça-pintada, onça-parda e jaguatirica, mais cinco outros felinos compõem a biodiversidade brasileira. Esses magníficos predadores são pouco conhecidos do grande público. São espécies selvagens, dispersas e desprotegidas em nossas paisagens. Vivem ameaçados pelo homem, espreitam em busca da caça escassa e tentam sobreviver ilesos aos atropelamentos às margens das estradas que cortam seu habitat. Este livro procura apresentar esses animais e revelar como a ameaça a eles é uma ameaça à vida humana. Há boas notícias também: pesquisadores, cientistas e associações de defesa animal trabalham para reverter esse processo. Uma iniciativa pequena diante da urgência em salvar essas espécies. Uma leitura urgente diante da importância em preservá-las e garantir que sejam conhecidas pelas futuras gerações.
Wild cats are the epitome of elegance with their distinctive eyes, supple stride and tail dancing in the air. In addition to the jaguar, the puma and the ocelot, five other felids are an important part of Brazilian biodiversity. These splendid predators are little known to the general public. They are wild, unprotected species, usually found in the wild habitats of our landscapes. They are threatened of extinction as a result of many of man’s actions, including the reduction of their prey and space, and the frequent road kills on roads that cut through their habitat. This book aims to present these animals and reveal how the threats we pose to them is a threat to human life itself. Still, not all is bad news, as we also show the work of dedicated researchers and scientists, and animal protection institutions that are tirelessly working to reverse this process. However small, considering the urgency of the plead, we hope that the book will contribute in changing attitudes towards the conservation of wild cats, so that our future generations can also share the benefits that these species bring to the planet.