ARTES A Libertação do Espírito Pinturas de uma menina judia na clandestinidade Por Eliad Moreh-Rosenberg
“Um, eu nunca conheci minha avó. Dois, meu nome é Danielle Rina Cohen Levy. Três, o nome da minha avó era Renata Braun, mais tarde Rina Levy. Quatro, minha avó morreu aos 38 anos. Em 12 anos, eu serei mais velha do que ela era. Cinco, ela morreu de câncer de mama. É por isso que, todo ano, tenho sido examinada. Seis, por quarenta anos meu avô manteve um segredo em seu sótão. Sete, tudo o que estou lhes dizendo agora é a verdade”. Estas foram as palavras de abertura da apresentação de Danielle Cohen Levy, realizada durante uma cerimônia no Yad Vashem em julho, para homenagear sua falecida avó Renata Braun. Sete obras de arte criadas por Braun quando era uma menina escondida em Lwów entre 1943 e 1944 foram recentemente doadas pelo marido e filhos para a coleção de arte do Yad Vashem. A história por trás das obras de arte veio à tona quase que por acidente. Cerca de quatro anos atrás, um artigo no jornal israelense Haaretz chamou a atenção de Yehudit Inbar, diretor da Divisão de Museus do Yad Vashem. O artigo, dedicado à artista contemporânea Maya Cohen Levy, mencionou sua mãe Renata, que tinha pintado quando era criança durante o Holocausto. Inbar, cujo campo de pesquisa lida com as experiências das crianças e sua criatividade durante a Shoah, contactou Cohen Levy para saber mais sobre sua mãe e os desenhos que ela deixou para trás. Durante a Segunda Guerra, Renata Braun ficou escondida no porão da casa de uma senhora Vo18
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gel, a viúva de um médico polonês, em Lwów. A princípio, Renata, com onze anos, conseguiu
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manter contato com seus pais no gueto graças a Vogel, que passou adiante suas cartas. No entanto, no final de maio de 1943, todo o contato foi perdido. Os pais de Renata, Dr. Karol e Luzia Braun, não conseguiram escapar como o planejado para o “lado ariano”. Eles provavelmente foram assassinados no Aktion para liquidar o gueto, que começou em 1o de junho de 1943. Renata permaneceu escondida na casa de Vogel até o final da guerra. Nas longas horas no porão, a jovem encontrou refúgio do terror e da solidão nas profundezas de sua imaginação, através da intensa leitura e pintura. Ela expressou a saudade de sua família em retratos de sua mãe com base em fotografias que ela tinha carinhosamente mantido. Após a libertação, a comunidade judaica ajudou Renata a chegar em Kraków. De lá, ela emigrou para Eretz Israel, onde estudou arte em tempo integral. Ela casou-se com Chasid Levy e o casal teve três filhos. Renata - agora Rina – encontrou trabalho como professora de pré-escola, mas continuou pintando até sucumbir ao câncer aos 38 anos. As pinturas e desenhos de guache de Renata que foram dadas ao Yad Vashem estavam todas em papel e em más condições. Elas foram submetidas a um longo processo de limpeza e conservação em laboratórios de conservação do Yad Vashem. Na parte de trás de uma das obras, notas musicais, provavelmente cantaroladas por Renata enquanto ela estava pintando, foram descobertas. Três das obras de arte foram identificadas pela equipe do museu como cenas do Pan Tadeusz, o famoso poema épico polonês de Adam Mickiewicz, enquanto uma quarta foi baseada em uma obra de arte clássica de Jan Matejko, um proeminente artista polonês do século 19. Enfrentando a destruição de seu universo, Renata segurou firme as âncoras da literatura, arte e música que ela tinha aprendido a amar em casa durante os breves anos felizes antes da guerra.
Durante a visita ao Yad Vashem, a família de Renata ficou emocionada ao conhecer a pesquisa realizada e ver quatro das obras que haviam doado exibidas no Museu de Arte do Holocausto. “As obras de arte penduradas aqui são testemunhas de uma vitória sobre o sofrimento horrível”, disse Maya Cohen Levy, que falou em nome da família. “Estas inocentes obras representam um raio de luz emergindo daquele lugar escuro, e dão evidência ao poder ilimitado do espírito humano”.
As obras de arte e história de Renata Braun farão parte de uma exposição sobre os sonhos e esperanças de crianças durante o Holocausto, com curadoria de Yehudit Inbar, apresentado pelo Yad Vashem na ONU sobre o Dia Internacional de Recordação do Holocausto, em 27 de janeiro de 2012. O autor é curador de arte na Divisão de Museus.
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