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NOSSA CAPA "Os fiéis se atrelavam às can·ocin has que transportavam pedras e as pttxavam desde as pedreiras até a catedral. Seu entusiasmo se espall1ou por todo o país. I-Io111e11s e 1nulheres virlhatn de n1t1ito longe, carregados de pesados ballots de provisões para os traball1adores: ,1inl10, óleo, e trigo. Senhores e damas nobres pt1xavam as charretes com todos os outros. A disciplina era perfeita e o silêncio profundo. Todos os corações estava111 unidos e cada qual perdoava a seus i1m:nígos" (Kenneth Clark, Civilisation, in Painton Cowen, Roses Medievales, Seuil, Paris 1979, p. 13).
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O Idealismo, nobreza de alma que a todos convĂŠm
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O Idealismo nobreza de alma que a todos convém
Excertos do pensamento de
Plinio Corrêa de Oliveira recolhidos por Leo Daniele
Edições Brasil de Amanhã São Paulo, 2010
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Seleção e notas: Leo Daniele Revisão: Francisco Leoncio Cerqueira
Edições Brasil de Amanhã
Impressão: Artpress Industria Gráfica e Editora Ltda. Rua Visconde de Taunay, 364 CEP 01132-000 – São Paulo-SP Fone: (11) 3331-4522 e-mail: artpress@artpress.com.br site: www.artpress.com.br
© 2010 – Todos os direitos reservados
ISBN 978-85-7206-204-6
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“Canticum Novum” Excertos do pensamentos de Plinio Corrêa de Oliveira Recedant vetera, nova sint omnia*
Já publicados:
O Universo é uma Catedral Uma visão maravilhosa, nobre e catolicíssima da ordem do Universo À procura de Almas com Alma A admiração como possante valor social – A música das almas A Cavalaria não morre Numa época de anti-heróis, a beleza, a nobreza, a urgência do heroísmo
* “Retroceda o velho ranço. Que todas as coisas sejam novas!” (Cântico litúrgico “Sacrum Solemnis”)
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Índice Ao Leitor..............................................................................9 1. Idealismo, a felicidade possível nesta Terra........................13 2. Desinteresse, a marca d’água do idealismo.........................27 3. O idealista e a sinfonia do Universo....................................47 4. O idealista e a cristianíssima virtude da admiração.............59 5. Alguns tipos... nada idealistas!...........................................77 6. Velhos sempre acomodados? Jovens sempre idealistas?....97 7. O idealista e a realidade....................................................113 8. De si, o dinheiro e o vinho não são obstáculo ao idealismo.............................................................125 9. O idealista e o egocentrismo.............................................133 10. Em nossos dias, não basta o idealismo de épocas normais.....................................................143 11. O idealista pode ser perseguido.......................................151 12. O auge do idealismo: os três cansaços.............................167 13. O idealismo e a nobreza de alma....................................187 14. Idealismo, sim, mas qual ideal?......................................201 Conclusão: O prêmio do idealismo é a verdadeira alegria...207 Notas....................................................................................215
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Plinio CorrĂŞa de Oliveira
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Ao Leitor
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a fuligem de um Brasil submerso em uma nuvem de corrupção obsedante, dentro de um mundo de cor cinza dominado pelo prosaísmo, pela ambição e pelo vício, há bem no fundo de muitas consciências um sentimento de mal estar. Ao mesmo tempo, um desejo de algo mais elevado, que explique o que está acontecendo no mundo. Em última análise, existe uma espécie de saudade do idealismo. O verdadeiro idealismo é uma maneira de ser não egoísta, não interesseira, generosa, elevada. Ou seja, o contrário da nuvem cinzenta maldita que assola o Brasil e o mundo. Em uma palavra: uma maneira de ser nobre. Nobre! Esta palavra, mesmo neste tempo de democracia, é prestigiosa. Horário nobre, bairro nobre, metal nobre, prato nobre etc., são expressões que atestam a saliência da palavra. Existe, entretanto, nobre e nobre. O substantivo nobre tem um matiz muito diverso do adjetivo nobre. O substantivo nobre é sinônimo de fidalgo, de aristocrata. É palavra adequada para poucos, que foram enaltecidos por exemplo na obra “Nobreza e elites tradicionais análogas”, de Plinio Corrêa de Oliveira. Já o adjetivo nobre independe do nível social da pessoa: até o último dos plebeus pode ter um sentimento nobre, um gesto nobre.
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Que qualificativo utilizar, por exemplo, para o sentimento do humilde soldado que, na Primeira Cruzada, substituiu Tancredo, filho de Bohemonde? Ao vêlo tomar uma escada nas muralhas de Jerusalém, para ser provavelmente o primeiro a morrer naquele ataque, destroçado pelas espadas e lanças do inimigo que o aguardavam no alto, exclamou com sublime idealismo: “Senhor, deixai que eu vá em seu lugar, pois vossa morte será mais chorada que a minha!”. Tancredo era nobre de nascimento. Já o humilde guerreiro que pediu para morrer em seu lugar tinha nobreza de alma, mas provavelmente não de nascimento. Nesta narrativa podem ser vistos, lado a lado, os dois sentidos da palavra: a fidalguia e a nobreza de sentimentos. Foi um gesto nobre de alma. Poder-se-ia dizer também: idealista. Dizia Dr. Plinio: “A matriz de tudo quanto é nobreza está nesse fundo da alma humana, pelo qual ela é capaz de amar tudo pelo amor de Deus, e até a si mesma pelo amor de Deus. De maneira a adquirir um destacar-se deste amor animalesco que o homem tem por si mesmo, que é a matriz de toda a vulgaridade, de toda a baixeza de alma, de toda a torpeza” (ver p. 193). O verdadeiro idealismo — e não o idealismo espúrio de um guerrilheiro subversivo ou do fundamentalista de uma falsa religião — parte de uma visão do mundo como ele realmente é: com aspectos belos e lados torpes. Aspectos belos que
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devem ser apreciados e enaltecidos. Lados torpes, que devem ser rejeitados e combatidos. Além de nobre, o idealismo verdadeiro é jovem, em todas as idades. “É uma das mais notáveis características da segunda fase da adolescência; o idealismo do jovem é lendário. O zelo, a convicção, o ardor e o sacrifício são virtudes comuns na luta pelos ideais, e isso explica em grande parte a possibilidade de que certa mudança cultural seja estimulada e até mesmo iniciada pelo adolescente”.1 Mas esta chama pode ser conservada acesa, e deve mesmo ser aumentada ao longo de toda a vida. A chamada “venalidade da idade madura” deve ser repelida com desdém. Plinio Corrêa de Oliveira observou que, “se uma vela pudesse pensar, o momento de maior alegria seria aquele em que ela acabasse de se consumir nas mãos de quem a carrega. Ela pensaria: ‘Fui criada para iluminar, e nas mãos de quem tem a vocação de me conduzir. Meu pavio, minha cera, meu fogo, tudo queimou. Eu vivi!’”.2 A imagem da chama e da vela, aliás, é muito própria para representar a biografia desse ilustre católico brasileiro, o que faz dele um homem especialmente indicado para discorrer sobre o tema. Ele foi um idealista. Ele teve nobreza de alma. São dele todos os excertos que transcrevemos a seguir, com rápidas introduções, convenientemente assinaladas por apresentação gráfica distintiva.
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Nunca um homem faz, por egoísmo, tanto quanto faria por idealismo. Plinio Corrêa de Oliveira, Reunião em 23.8.1973
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Neste capítulo Quando se fala de desinteresse, geralmente se pensa em desinteresse financeiro. Por exemplo, elogia-se alguém por ser um dirigente desinteressado: ele não faz o que faz só para ganhar dinheiro. O que é uma grande qualidade, sobretudo em nossos dias! Mas o desinteresse deve ir além disso, e se estender aos mais diversos campos. Por exemplo, em matéria de aplausos, no campo de nossa amizade e até de nossas relações com Deus, como expõe Plinio Corrêa de Oliveira neste capítulo.
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“Ideal”, palavra que é uma música
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dealismo! Os prêmios do idealismo! As provas do idealismo! As glórias do idealismo!
As palavras vão tendo transformações ao longo das gerações. E às vezes elas significam uma coisa, mas musicalmente tomam um simbolismo um pouco diverso. Elas se afastam do primeiro significado, passam para outro, passam para outro, e assim se vão transformando. É o que ocorre com a palavra ideal, com a palavra idealismo. Mesmo a geração mais nova percebe que a palavra ideal tem certa ressonância, tem certa luminosidade, conduz a certa harmonia sonora, quase eu diria visual, que lhe dá um significado especial. O próprio modo de dizer a palavra ideal obriga quase a cantá-la! É uma palavra que de algum modo força o menos poético dos homens a dizer como um cântico: “O ideal!” Quando se diz “fulano tem um ideal”, entende-se que não é o simples e vil desejo de uma vantagem pessoal. Por exemplo, não se pode dizer no sentido próprio e pleno da palavra que o ideal de fulano é
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tornar-se riquíssimo. Tornar-se riquíssimo é uma meta, um objetivo, uma ambição. Não é um ideal. Pode-se dizer: “fulano é um homem ambicioso, quer fazer grandes coisas”. Em certo sentido, esta afirmação pode até ser um elogio. Porque querer fazer grandes coisas, ainda que seja na ordem das pequenas, é alguma coisa. Mas não é um ideal.3
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Amigos, amigos, negócios à parte...
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maginem que eu tenha um amigo, e ele me diz:
— Como gosto de você! Acho sua pessoa notável. Pouco depois eu lhe peço: — Eu precisaria de um favorzinho seu. — Ah, não! Isso já é outra coisa. Amigos, amigos; negócios à parte. Concluo então que, ou essa amizade que ele me tem leva-o a se dedicar por mim, ou não é amizade. Há um dito de um clássico romano que constitui um jogo de palavras interessante: “Amicus certus in re incerta cernitur” — O amigo certo se discerne nas ocasiões incertas. E isto é inteiramente verdadeiro.
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Dois cegos em Veneza... (Reconstituição livre de trecho de palestra proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira nos anos 60, com extratos de conferência de 2-12-1988).
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endo diante de si o magnífico cenário da Praça São Marcos e do Palácio dos Doges, dois cegos imersos em suas trevas, mas loquazes, conversavam sentados num banco. — Você se lembra do tempo em que víamos os palácios de nossa cidade, que pareciam descer de nuvens que baixaram na terra...
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— Se me lembro! E dos canais ornamentados pelas gôndolas... — A Basílica parece trazida do Oriente por anjos. — E o Campanile, que sobe para o céu quase como um desafio... Diz o outro cego, com saudades: — As cores de Veneza! Lembra-se? É a cidade das cores... — Quem define a cor do mar? É verde? É azul? Entra aí outra cor além do verde e do azul? — Tudo era luz naquela cidade maravilhosa. Agora... dentro de nossos olhos, apenas o negrume das mais áridas e completas trevas...
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Num tom de voz propositadamente indiferente, diz o outro cego: — Sabe, ouvi dizer que Veneza vai desaparecer, devido a um grande maremoto. — Como é?! O outro cego repete, e dá pormenores de como imagina a potencial catástrofe. Embora nada enxergasse, os olhos do ouvinte se esbugalham dentro de suas órbitas, exprimindo todo seu espanto. — Já não basta a desgraça desta cegueira! Ah! Querida, maravilhosa Veneza... A voz do cego se altera. Um véu de tristeza cobre seu rosto; e seus olhos, apagados para sempre, se umedecem. Pragmático, diz o outro cego: — Fulano, não se esqueça de que somos cegos, e de que para nós, que não mais podemos ver, pouco se nos dá se Veneza desaparecer ou não, contanto que consigamos nos salvar do maremoto! — Não, jamais! Amo Veneza, não porque a posso ver, mas porque ela é o que é. Deixe-me lamentar esta beleza que o mundo vai perder! E o desconsolo toma conta de sua alma.
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Qual dos dois cegos tinha idealismo? O amor de um deles por Veneza era isento de egoísmo. Ele não pensava em si. Veneza, a rainha dos mares, valia pelo que era e continuava sendo uma maravilha, ainda que ele não a visse. O outro cego era um egoísta. A cidade valia enquanto ele a podia ver. A partir do momento em que não mais o conseguia, para ele perdera completamente o interesse. Ele era duplamente cego. Mas o amor do primeiro cego por Veneza era generoso, idealista e nobre de alma.4
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-11 Sem idealismo, uma espiritualidade contábil
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em o amor desinteressado, todos os impulsos para se cumprir os Mandamentos morrem, e se passa para a vida espiritual contábil; como numa balança, aqui estão os meus defeitos, ali minhas qualidades . A maior oblação é aquela em que há maior desinteresse. Abraão com Isaac, por exemplo.5 Aquele desinteresse é fabuloso, é puro amor. Pode-se lutar por puro amor, por exemplo, indo à Cruzada. Do mesmo modo como Isaac esteve para ser morto pelo pai. Isto é perfeitamente possível.6
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Fazendo um negócio com Deus...
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comum se rezar como quem diz: “De repente desaparece meu dinheiro, e é bom eu ter Deus próximo de mim. Há que fazer com Deus um negócio: Vou à igreja e rezo, para ver se assim compro a boa vontade d’Ele”. É uma providência para garantir o meu destino, mas não é amor desinteressado. É um desafio à Providência.
O contrário foi, no Evangelho, o caso da Cananéia,7 aquela mulher que foi pedir a Nosso Senhor um milagre. Ele disse que o pão era para os filhos, e não para os cães.8 Resposta da mulher: Assim é, Senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos. Nosso Senhor disse a ela: “Mulher, grande é tua Fé! Faça-se segundo queres”. Esta disposição eu preciso ter. Nossa Senhora exige da minha parte o estado de espírito de aceitar as migalhas... e às vezes nem migalhas.9
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Devoção interesseira
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ão Luís Grignion chama de devoto interesseiro10 aquele que pede a Nossa Senhora graças sobretudo de caráter temporal, ou que somente reza à Santíssima Virgem para conseguir favores: não por amor, somente desejando vantagens pessoais.
Nos lugares de peregrinação a Nossa Senhora se vê grande quantidade de velas e ex-votos de pessoas que apenas pediram, com um fervor insistente, graças temporais, o mais das vezes curas de doenças. Graças espirituais, raríssimas vezes são pedidas. A pureza, a fé, o desapego, quem os pede? Não se vê. Apenas a cura de uma ferida, de uma moléstia incurável. E depois coloca-se o ex-voto. A apetência pelos bens espirituais é insignificante. O amor desinteressado a Nossa Senhora, quase nenhum.
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São Luís Grignion aos pés de Nossa Senhora
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Um rei — São Luís — lava os pés dos pobres: desinteresse completo, nenhuma vantagem, puro idealismo.
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Só quando o homem se gasta inteiramente é que ele sente o alívio das energias que sobram dentro dele. Plinio Corrêa de Oliveira, reunião em 5.8.1975
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Neste capítulo A felicidade honesta é menos intensa do que a desonesta? Mais mitigada? Mais passageira? É a pergunta que não poucos se fazem, geralmente respondendo equivocadamente. Mas, de fato, pode-se dizer dela o que São Bernardo disse sobre o aspecto fugidio da glória. É o assunto deste capítulo.
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O jovem de peito forte Está surgindo um tipo novo de jovem. Não é o jovem revoltado, inconformado, preguiçoso. Não tem medo de se afirmar, não é indiferente e não vive exclusivamente para o trabalho e para a carreira. É o jovem idealista. O jovem enérgico, realizador, corajoso, abnegado. Ele gosta de pensar, gosta de analisar os acontecimentos e os fatos para formar sua própria opinião à luz da doutrina católica. É sobretudo o jovem que não se incomoda com a gargalhada e a incompreensão dos outros, nem de sair à rua para receber muitas vezes um ultraje ao qual, com toda superioridade, ele não responde. Para receber uma agressão que, sendo física, ele responde com a altaneria e a eficácia de quem sabe defender sua honra. É o jovem que, por esta forma, tem destruído no Brasil uma imagem velha e errada do que é o bom jovem. Esta imagem falsa do jovem bom é o funeral da própria bondade. Se, para ser bom, um jovem tivesse que ser esse sub-jovem; se tivesse que renunciar a tudo quanto forma o brilho da juventude; se não tivesse que ser combativo, não tivesse que ser intransigente, não tivesse que ser verdadeiramente homem, não tivesse a coragem de falar alto e bom
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som, não tivesse que discutir, não soubesse argumentar, não soubesse apresentar-se diante de um auditório onde todo mundo pensa de um modo diferente, e não soubesse proclamar as virtudes que ele pratica — se um jovem, para ser bom, não devesse ser assim, mas devesse ser um sub-jovem, seria o caso de dizer que a bondade não é bondade. Ele sabe que tem responsabilidades, tem sua dignidade pessoal, tem suas convicções ensinadas pela fé, e dessas convicções se ufana. Ele se ufana de ser católico, ele se ufana de ser puro. Compreende que a impureza é uma vergonha, e que a pureza é uma glória. Ele compreende que não crer é ser cego, e que aqueles que crêem são verdadeiramente os que vêem. Ele compreende que aquele que tem um ideal e luta por um ideal vale muito mais do que aquele que tem carreira e luta por uma carreira; porque aquele que luta por uma carreira, no máximo merecerá respeito, e aquele que luta por um ideal merece veneração. E ele sabe dizer claramente as verdades para cada um; sabe falar mais alto, mais grosso, colocar-se no centro da luta e enfrentar quem quer que seja. Ele divide a cidade. Ele é como um peito forte contra o qual as águas da opinião pública se rompem em duas caudais diferentes. Ele separa os bons dos maus, seguindo a Nosso Senhor Jesus Cristo, do qual disse o profeta Simeão que veio a esta terra para que se conhecessem as cogitações de muitas almas.
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Na promessa de Fátima Nossa Senhora diz: “Por fim o meu Imaculado Coração triunfará”. Pois sejam estes os nossos votos: que o triunfo do Imaculado Coração de Maria seja o erguer-se de toda a América de Nossa Senhora. Ela terá realizado por nosso intermédio o impossível.11
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A parábola do pintor
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maginem alguém que tivesse como ideal ser um pintor fantástico.
É nobre querer ser pintor, e querer ser grande pintor por amor à arte pode até ser santificante. Se esse alguém nunca em sua vida se tornasse pintor, uma tristeza nimbaria de uma luz especial sua vida, se santamente resignada. Esse lado nobre e bonito sublimou-se, depurou-se, elevou-se e o marcou. Ao aparecer diante de Deus, ele teria pintado na alma todas as pinturas que não fora capaz de pintar em tela alguma.12
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O paradoxo da tragédia
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ada um de nós tem na vida um sofrimento magno, que não é um lance da vida. Não! É uma determinada cruz que acompanha a vida inteira.13 Muitas vezes é na tragédia que o homem verdadeiramente se realiza. A tragédia contém uma espécie de sublimação que eleva o homem a uma altura não imaginável, e o mistério da vida humana é realmente uma verdadeira beleza. Este é o lado nobilitante desta renúncia firme, íntegra, completa, e desse ideal sobrenaturalizado.14
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Muito de errado e alguma coisa de certo
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lgo que se desejou e que não se tem, algo que se queria ser e que não se é, etc. — são anseios que produzem na alma um efeito muito curioso. Nesses desejos do homem, que ele não realiza, há muito de errado e alguma coisa de certo. E essa coisa de certo que o homem quereria ter, e que não tem, gera algo de sublime que chora dentro dele; que chora um hino, e que constitui uma espécie de luz que ilumina a vida dele inteira15.
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A mediocridade e o idealismo
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i uma vez uma pessoa dizer: “Sou muito feliz”.
Ninguém na sala tinha idéia de por que ela era tão salientemente feliz. Que ela fosse comumente feliz, ou seja, comumente infeliz, entrava pelos olhos. Então alguém lhe perguntou, por amabilidade: — Mas por que você é tão feliz assim? — É porque tenho muitos filhos, e são todos medíocres. Um pouco surpreendente, não é? Ela completou: — O prazer na vida está na mediocridade. Se eu tivesse um filho muito inteligente, uma filha
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muito bonita, uma qualquer coisa assim, já começava a “torcida”. Meus filhos, não. Todos se instalaram em uma situação medíocre e sólida, e todos vivem mediocremente. Eu não tenho susto nem esperança, eu vegeto. A vida é vegetar. Meus filhos vegetam também, meus netos vegetam também, viver é vegetar. Quem não percebe que por detrás se exalava uma tristeza? E que aquela atitude era um modo de tirar uma desforra da mediocridade própria e da mediocridade dos seus? Quem não percebe uma coisa dessas, e que havia no fundo um pranto pela mediocridade? Todo mundo compreende que a inteira mediocridade, com o espetáculo da felicidade dos outros, não pode produzir felicidade.16
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Algo que o homem quereria
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mediocridade não sacia o homem. Ela pode evitar ao homem muitos dissabores, mas deixa uma porção de apetências insatisfeitas. Podemos imaginar as mais variadas formas de vida, elas sempre fazem transparecer algo que o homem quereria, que não tem, e com o que sonha.17
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A taça amarga da infelicidade
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s vezes se vêem nesta existência pessoas cercadas de tudo quanto pode tornar a vida agradável. Tenho pena quando vejo uma pessoa assim. Porque, em geral, toda a infelicidade que não lhe foi distribuída ao longo da vida fica à espera dela, como uma taça amarga. Em certa hora a pessoa tem de beber aquela taça.18
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Muitas felicidades!
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onheço o caso de uma senhora que dava gargalhadas saborosíssimas. Era muito engraçada, muito animada, muito alegre. Ela parecia nada ter a não ser felicidade. Inclusive a felicidade rara de ser casada com um marido tão bom que ela dizia preferir perder todos os filhos a perder o marido. Ora, encontrar um marido assim — digamos, para a penitência do sexo masculino — não é coisa freqüente! Um dia, os infortúnios começaram a cair em cima dela. Numa ocasião, por questão de cortesia, tive de lhe dizer: — Desejo-lhe muita felicidade, etc. Ela estava de luto cerrado, e respondeu: — “Nunca me deseje felicidade. Depois do que me tem acontecido, meu coração é negro como este vestido de luto. Para ele não existe mais felicidade alguma. É a tristeza até o fim dos meus dias”. Disse de tal maneira, que eu não tive jeito de responder com uma dessas banalidades: Não, isso passa, melhora. Porque ela e eu sabíamos que a vida dela nunca mais seria como antes. Seria grosseiro, seria pouco amável, seria estúpido usar uma dessas fórmulas de cortesia que todo mundo, aliás, sabe que não são senão cortesia.
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Muitas e muitas vezes na minha vida eu tenho assistido a cenas desse gênero. Cheguei à conclusão de que, em certo sentido, nada faz mais mal aos homens do que a convicção de que a felicidade se pode obter nesta Terra. Se esse sonho é impossível, se essa meta não se realiza, tenho de tomar a minha vida como ela é. Tenho de me tomar a mim mesmo como eu sou, com as limitações que tenho, com as impossibilidades que me cercam, e tenho de levar esta vida sem nostalgias vãs, sem apetências tontas, arcando com a aceitação deste destino que é o meu, mas não me satisfaz. Arcando com essa aceitação corajosamente, é possível realizar o bem, cumprir o dever e ser o que Deus quer que eu seja, e não o que meus sonhos quereriam. Para depois, na outra vida, ter a plena e completa realização de tudo quanto eu quereria.19
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Uma carreira promissora
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ma vez me aconteceu algo que faria sonhar e delirar quase todos os moços de minha geração: fui eleito deputado aos 24 anos; todo rapaz de 24 anos no Brasil olhou para mim: 24 anos, 24 mil votos! Para a população eleitoral do Brasil daquele tempo, era um colosso.20
Vitória limpa de homem de consciência tranqüila, que tinha enfrentado, tinha vencido a impiedade e era elevado aos galarins da glória. Mais ainda: parecia que um futuro brilhante me esperava. A grande tragédia do homem consiste em desapegar-se de tudo isso e dizer: “Não senhor, o desígnio de Deus a meu respeito é assim, esse desígnio eu cumprirei. E passarei a minha vida inteira só pensando naquilo que devo fazer”. A realidade é esta, e o que não for isto é lorota. Mas isto é um sacrifício de todos os instantes, é um sacrifício de todos os dias, de todos os meses e de todos os anos, que só cessa no momento em que o homem expira.21
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A “sofretiva”
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ó quando o homem se gasta inteiramente, ele sente o alívio das energias que, então, não sobram dentro dele. Nada faz o homem sofrer tanto quanto ter sua capacidade de sofrer não esgotada. Muitas vezes o homem que sofre se sente realizado, porque soltou de dentro de si essa super-capacidade de sofrer. Quando chega em casa extenuado, ou quando se deita exausto, pode dizer: “Meu Deus, gastei tudo por vós, estou sem fôlego”. Ele está muito melhor do que alguém que tenha passado todo o dia sem fazer nada. Não adianta estar se poupando. O verdadeiro é o contrário, é gastar-se.22
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Então a vida é um inferno?
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ode-se então perguntar: “Mas o que resta da vida? A vida então é um inferno?”
Não. É o contrário. Quando se agüenta tudo e se tem a consciência de estar fazendo o que se deve, há no fundo — e apesar de todos os horrores pelos quais se possa passar — uma sensação de algo que está realizando o fim para que existe; de algo que está atingindo o termo a que deve chegar. Há uma sensação profunda de ordem, de asseio, de lógica e de coerência, que dentro de todo o mal estar e de todas as provações produz um fundamental bem estar: a idéia de que somos segundo Deus, de que Deus no alto do Céu nos ama, de que Nossa Senhora nos ama, e de que um dia os veremos por toda a eternidade.23
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São Bernardo de Claraval
A felicidade dada pelo idealismo
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ode-se dizer da alegria o que São Bernardo disse da glória, ou seja, que é como uma sombra: se corremos atrás dela, ela foge; se corremos dela, ela corre atrás de nós. Quem dá, é alegre. Quem conserva, aquilo azeda e fica triste. Se quereis ser alegres, dêem tudo.24
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Na Serra dos Órgãos (RJ), o “Dedo de Deus” aponta para o alto
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A beleza de Deus se reflete no conjunto hierárquico e harmônico de todos os seres, de tal maneira que não há, em certo sentido, modo melhor de conhecermos a beleza infinita e incriada de Deus do que analisando a beleza finita e criada do universo, considerado não tanto em cada ser, mas no conjunto de todos eles.25 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo As desigualdades — por exemplo, as desigualdades sociais — são um bem ou um mal? Ou apenas um fato consumado? Como deve vê-las um idealista? O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, que já foi denominado pelo pensador italiano Giovanni Cantoni “o teólogo das desigualdades sociais”, ilustra o tema em suas verdades e suas belezas.
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As desigualdades: uma oração
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eu Deus, como vos agradeço de me terdes criado, de me terdes destinado a um lugar no conjunto de vossa criação! Como vos agradeço que nesse lugar me tenhais posto de modo a haver tantos superiores e tantos inferiores a mim, que não haja ninguém igual a mim! Em rigor do termo, nenhum homem é igual a outro; assim, na minha mediania, nas minhas lacunas, nas minhas insuficiências, sou entretanto diante de Vós, meu Senhor, único. De maneira tal que, se eu não existisse, vos faria falta; se eu não existisse, Vós me criaríeis como criastes todas as pedras preciosas dentro da câmara de preciosidades da qual faço parte. Como amo os maiores! Como amo os menores! E tenho uma mensagem única a dar a quem queira prestar atenção nela.26
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A grande e nefasta utopia
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m mundo em cujo seio as pátrias unificadas numa República Universal não sejam senão denominações geográficas, um mundo sem desigualdades sociais nem econômicas, dirigido pela ciência e pela técnica, pela propaganda e pela psicologia, para realizar, sem o sobrenatural, a felicidade definitiva do homem: eis a utopia para a qual a Revolução nos vai encaminhando.27 Cidade das Artes e das Ciências, Valença, Espanha
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Igualitarismo e ateísmo
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om as desigualdades, que Deus criou harmônicas entre si e benfazejas para cada categoria de seres como para cada ser em particular, quis Ele prover o homem de abundantíssimos meios para ter sempre presentes as infinitas perfeições d’Ele. As desigualdades entre os seres são ipso facto uma escola sublime e amplíssima de anti-ateísmo. É o que parece ter compreendido o escritor comunista francês Roger Garaudy (posteriormente “convertido” ao islamismo), quando realçou a importância da eliminação das desigualdades sociais para a vitória do ateísmo no mundo: “Não é possível, para um marxista, dizer que a eliminação das crenças religiosas é uma condição sine qua non para a edificação do comunismo. Karl Marx mostrava, pelo contrário, que só a realização completa do comunismo, ao tornar transparentes as relações soRoger ciais, tornaria possível o desapareciGaraudy mento da concepção religiosa do mundo. Para um marxista, pois, é a edificação do comunismo que é condição sine qua non para eliminar as raízes sociais da religião, e não a eliminação das crenças religiosas a condição para a construção do comunismo”.28
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Querer destruir a ordem hierárquica do Universo é, pois, privar o homem dos recursos para que ele possa livremente exercer o mais fundamental dos seus direitos, que é o de conhecer, amar e servir a Deus. Ou seja, é desejar a maior das injustiças e a mais cruel das tiranias.29
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O igualitarismo se infiltra no ambiente católico
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a crise progressista de nossos infelizes dias, em que se encontra a Santa Igreja de Deus, as coisas se passam muitas vezes de modo tão, tão e tão irregular. Na voz de muitíssimos católicos, vemos muitas vezes afirmações sobre as desigualdades sociais, que são uma verrina quase incessante contra os exageros delas. É evidente que, onde há o exagero, pode haver facilmente uma injustiça. Mas a questão é saber se em si a desigualdade social é legítima ou não. E isto é o que os Papas nos ensinam com grande abundância de argumentos. O pensamento anti-igualitário da doutrina da desigualdade harmônica e proporcionada é ensinado pela Igreja através de Papas, de doutores, de santos, de uma torrente incontável de moralistas e teólogos. Trata-se portanto, e eu não hesito em dizer, de um pensamento celeste. As classes desiguais, portanto, existem para viver — sem desigualdades excessivas, aberrantes — em harmonia e mútua colaboração.30
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A tristeza invejosa
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or vezes, o homem de tal maneira se ama a si próprio, que recusa maravilhar-se com as coisas de Deus e servi-lo. Entende que esta vida terrena lhe foi dada para viver agradavelmente, e portanto vai tratar de viver agradavelmente. A partir desse momento, é inevitável que se forme no espírito do homem uma tristeza pelo fato de que os outros possuem bens que ele não possui. Uma apetência de possuir tudo para si. E portanto um desejo de igualdade completa. O ponto de partida está em que a vida foi dada para ele existir, e deve ser utilizada em seu benefício. Não deve ser usada abnegadamente para contemplar a Criação.31
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A inveja é uma injustiça
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esde que um homem tenha o que é necessário à subsistência e prosperidade sua e de sua família, e receba a justa remuneração de seu trabalho, não tem direito a deplorar que outras pessoas ou famílias possuam mais. Se o deplorar, peca por orgulho e por inveja. Por orgulho, não aceitando a vontade de Deus, que criou homens de capacidade física e intelectual desiguais, dando assim origem à desigualdade de bens. Por inveja, ao sentir-se triste ou revoltado ante o fato de alguém possuir legitimamente maiores bens, de qualquer natureza que estes sejam. O amor ao próximo preceitua, a quem tem menos, que se alegre porque outro tem mais. E que aceite suas próprias condições alegremente, se são justas e condignas.32
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A magnanimidade é uma virtude
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m todas as classes nascem por vezes indivíduos de um valor que — em medida maior ou menor — supera o da média. Eles têm uma justa e sensata noção de sua capacidade, noção esta muito diversa das ilusões que algum fátuo forme sobre si mesmo. Eles estão em seu direito, desejando elevar-se. Não os move o orgulho, pois querem o que merecem — porque sentem em si o latejar de sua própria capacidade — e não o que não merecem. Não os move a inveja, tanto que não querem lesar nem despojar ninguém. A virtude que leva o homem a aspirar às honras no convívio social se chama, na saborosa exSão Tomás pressão de São Tomás de de Aquino Aquino, “magnanimidade”, isto é, grandeza de alma.33 O desejo de ascensão social participa dessa virtude.34
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Luís XIV, rei da França
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O Cristo Redentor contempla a BaĂa de Guanabara
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Tudo aquilo que admiramos, nos entra dentro da alma. Aquilo que admiramos penetra em nĂłs. 35 Plinio CorrĂŞa de Oliveira
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Neste capítulo Deus admira! Essa admiração por suas criaturas refulge, por exemplo, quando Nosso Senhor diz: “Olhai os lírios do campo”. Se assim é, por que havemos nós, pobres criaturas, de não admirar? É o tema do presente capítulo.
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Admiração, amor, idealismo O primeiro elemento do amor é a admiração. O mandamento “amar a Deus sobre todas as coisas” inclui “admirar a Deus sobre todas as coi-sas”. É reconhecer a sublimidade, a excelsitude de Deus acima de todas as excelsitudes, e como fim do caminho de todas as sublimidades e de todas as excelsitudes que se considerem.36
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Deus se debruça sobre a criação
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lhai os lírios do campo; eles não trabalham nem fiam. E digo-vos todavia que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu jamais como um deles”.37 Eu percebi de repente, nessa frase, que Nosso Senhor, quando falava do lírio, admirava o lírio. Eu O via admirar o menor do que Ele. Mas, ao pé da letra, admirar e cantar a glória do menor do que Ele, quando diz: olhai os lírios do campo; eles não tecem nem fiam. Agora vem a glorificação: “nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles”! Os senhores notam a infinitude d’Ele que se debruça. Como seria belo vê-Lo dizer “olhai os lírios do campo” e, tomando uma pétala de um lírio, passar os dedos d’Ele em cima. Uma cena extraordinária! E uma lição para nós! Quase não há palavras para qualificar essa lição. O vocabulário se esgota, e não sabemos o que dizer.
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... e se inclina para os pequeninos
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ue coisas imensas podem nascer da análise admirativa de uma coisa pequena!
Completa-se o ciclo de Nosso Senhor admirando o Padre Eterno; de Nosso Senhor admirando Nossa Senhora; de Nosso Senhor admirando os outros homens enquanto iguais a Ele na natureza humana. Depois, debruçando-se sobre os pequenos e olhando as crianças. E então se compreende aquele “deixai vir a mim os pequeninos, porque deles é o Reino do Céu”.38 Além da proteção, do respeito, da dedicação, havia admiração! “Que almas limpas! Que almas puras! Eu, Deus, autor de toda pureza e foco de toda pureza, me contemplo na vista deste menino. E vejo neste menino um reflexo criado de Mim mesmo”.
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Admirando o inferior
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le não se contenta em admirar só o que é superior. Mas sabe voltar-se também para o inferior, com respeito e com ternura. Sem igualitarismo, mas com algo que vale incomparavelmente mais do que o igualitarismo: saber ver uma figura de Deus nas menores coisas e dar glória a Deus porque Deus quis manifestar-se nessas coisas. Nosso Senhor andando sobre as águas admirava a água! Admirava o ar e sentia-se refletido na água e no ar. E dizia: que magnificência! Imita a minha magnificência. Como é bela esta água, como é belo este ar, que Eu criei! Assim se pode compreender como o ciclo da admiração se perfaz.
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As moedas da rainha
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maginem uma rainha prodigiosamente rica. Ela tem tudo. Ela vê de repente, rolando sobre uma mesa de seu régio palácio, uma moeda. É a menor das moedas em circulação no seu reino. Uma moeda de cobre ou de níquel, portanto um metal não nobre. Ela pega a moedinha, olha e vê a efígie do filho dela, o rei, que está cunhada lá. Olha para a moedinha e diz: meu filho! Assim devemos ser para as coisas de Deus. Ele pôs em circulação “moedas” tais, que uma delas é o sol. Todas as estrelas do céu são manifestações da glória de Deus. Mas Ele pôs também em circulação os homens, tão mais fracos do que tudo isso, mas dotados de alma imortal. E, por causa disto, parecendo-se com Ele muito mais do que qualquer sol.
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Um exercício de maravilhamento
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le admira as almas que criou, e as admira tanto, que morre para salvá-las.
Tudo aquilo que vemos, portanto, é para nós um exercício de maravilhamento. Não existe a palavra em português. Em francês se diz: émerveillement. Cada coisa convida o homem a imaginar como é que ela seria se fosse maravilhosa. Deus admira! Ele que disse: olhai os lírios do campo, não tecem nem fiam, etc., quanto amará aquilo que o homem compôs num élan de alma! E que se volta para Ele porque, de maravilha em maravilha, no alto está Ele!
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O olhar admirativo do próprio Deus
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ompreende-se facilmente como o exemplo de Nosso Senhor admirando as coisas, até as pequenas, e amando-as com uma ternura especial, é uma lição para termos a alma propensa, fácil à admiração. O olhar admirativo de Deus, o olhar admirativo de Maria, pousa sobre o medíocre. Pousa sobre um sórdido, e aquilo começa a viver como as águas da piscina de Siloé. A admiração chegou ao mais baixo e chegou ao fim de sua própria história. A admiração que desce é simétrica à admiração que sobe. Assim termina a “história da admiração”.39
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O que admiramos penetra em de nós
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udo aquilo que admiramos nos entra dentro da alma. Aquilo que admiramos penetra em nós. Penetra mais ou menos fundamente, mas penetra. É impossível não penetrar em nós algo que admiramos. Portanto, o que temos que fazer é, diante de algo mau, conhecer o oposto, o bem, e admirar esse bem. Com a admiração, o bem entra em nós. Nada nos faz sofrer tanto quanto jazermos de modo inglório no desprezo de nós mesmos, por causa da nossa mancomunação com nossos defeitos. E a política com nossos defeitos consiste em olhá-los, inteiros, até o fim. Não ficar no meio termo. Se não considerarmos o extremo a que eles podem nos levar, nunca nos corrigiremos.40
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Admirando no quotidiano
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ertas nuvens, uma noite de luar muito bonita...
São coisas correntes da vida. Mas estão recheadas de grandes belezas e de grandes valores, para os quais o homem deve ter a atenção posta, para os quais deve ser muito receptivo, muito sensível, sob pena de não apreciar as coisas mais altas. Uma das coisas que constituem a categoria da civilização européia é o excelente nível do quotidiano. Não é só, por exemplo, dizer que a Europa tem o castelo de Chenonceaux. O castelo de Chenonceaux, sem dúvida, é uma beleza. Mas a casa de guardas de Chenonceaux, que o castelo eclipsa completamente, é uma belezinha. Casa dos guardas de Chenonceaux
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Algo análogo existe em certos panoramas ingleses. Riozinho correndo num paredão com pedras, cisnes nadando dentro, patinhos embaixo da pontezinha, de onde pende uma trepadeira com flores azuis ou vermelhas — são coisinhas da vida quotidiana que a civilização européia apurou de modo esplêndido. Assim se povoa a vida de algo mais necessário ao homem, em algum sentido, do que o maravilhoso super-sublime. Por exemplo, o sol. Posso ver grandezas numa estrela que está a uma distância fabulosa. Há grandeza nisso. Mas, para a vista humana, para a mente humana, não se pode dizer que a grandeza está ali “em sede própria”, como no sol. O astro-rei apresenta uma espécie de apogeu de todas as perfeições, que é irresistível a tudo que está abaixo. Ele como que concatena e coordena tudo, com direito e força. Nisto está sua grandeza.41
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Sentir-se pequeno. Sentir-se bem diante do mistério
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ma incerteza pode ser muito bela. É preciso dizer: Que maravilha! Vai além do que eu entendo! O que entendo é belo, mas esta bruma vai além do que entendo. Como é bela esta bruma! Reverente diante da bruma, é preciso dizer: Que imagem de Deus misterioso e insondável!
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É preciso ter o gosto de se sentir pequeno. O gosto de se sentir enormemente ultrapassado, superado a perder de vista. É por meio de um tom de humildade assim que se compreende e degusta a beleza das brumas. Assim se adquire o verdadeiro espírito católico. Porque o espírito católico é feito de admiração. Quem não tem a alma voltada para a admiração, não tem espírito católico. É preciso notar que objetivamente se é pequeno. Não é literariamente pequeno. Não se é pequeno de literatura. É que cada um de nós é zero, e quando se sente zero, tem uma alegria enorme em ver Aquele ou Aquela — Aquele por excelência, Aquela por participação — que não é zero. Não admira quem não tem a alegria em sentirse pequeno, quem entra logo em disputa: será que aquele é mais do que eu em tal ponto? Será que é menos em tal outro? Este que entra logo em disputa não conhece nem a vida nem a alegria de viver. E não é capaz da admiração. Quem assim se sente pequeno acha natural esse mistério. E se sente bem dentro do mistério.42
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Para praticar a virtude, admirá-la
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s pessoas são mais ensinadas a praticar a virtude do que a admirá-la. Mas, em relação a toda virtude, é preciso que se tenha uma admiração profunda, uma admiração razoável que proceda da razão, da inteligência iluminada pela Fé. E é depois de prestar à virtude esse preito de admiração — depois logicamente, não cronologicamente — que se tem a disposição de ânimo necessária para praticá-la. É só depois que se admirou a virtude como se deve, que ficamos em condições de compreender a malícia que existe no pecado; e é só depois de admirar a virtude e tratar de praticá-la, que se é capaz de compreender a gravidade do pecado, a reparação que ele merece, e a necessidade de repará-lo diante da justiça de Deus. Por isso é comovente ver, por exemplo, nas sepulturas medievais aqueles gisantes. Às vezes esposo e esposa deitados lado a lado sobre aqueles leitos de pedra, com uma almofada de pedra. Se eram nobres, com a coroa na cabeça e com as mãos postas. Tem-se uma sensação de castidade conjugal, que nos empolga.43
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A admiração e o sacrifício
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á na alma humana, quando procura viver na graça de Deus, uma forma de retidão perante Deus, Nossa Senhora e a Igreja, pela qual a pessoa, de tanto admirar, quer sacrificar-se. O desejo do sacrifício não é algo que Deus impõe, e que se considera uma aberração dentro da vida. Assim, seria um absurdo ter que passar pelo sacrifício, e o normal seria não sacrificar-se. As almas que pensam assim estão num estado incompatível com o amor. O verdadeiro amor pede o sacrifício. E haveria uma frustração e um vazio na vida se não houvesse sacrifícios.44
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Dom Quixote e Sancho Pança: é óbvio que, para além da alternativa posta por Cervantes, estão as vias sacrossantas do heroísmo cristão.
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Nenhum amor ao bem é efetivo se, diante de ações clamorosas contra esse bem, a pessoa não se levanta num protesto e numa incompatibilidade terrível contra o mal. 45 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo Dom Quixote de la Mancha, sonhador caricato criado pelo espanhol Miguel de Cervantes, estava sempre à procura de fantasias inacessíveis, e nunca lembrado das exigências da vida material. Era um falso idealista. A seu lado estava o guloso Sancho Pança, contrastando com Dom Quixote, de quem é o escudeiro. Este, pelo contrário, só pensa no quotidiano. Ele é um típico não idealista, ao passo que o fogoso e desequilibrado cavaleiro é um falso idealista. Em torno da problemática do idealismo vão girar, neste capítulo, diversos personagens, desde Che Guevara, típico falso idealista com metas abomináveis, até os avestruzes de nosso tempo, que não querem ver os perigos que os ameaçam. De passagem, vários outros espécimes, todos aberrantes em relação ao verdadeiro idealismo.
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Dom Quixote, ridículo e demente
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ntre os romances de cavalaria do fim da Idade Média e os do seu apogeu há uma enorme diferença. O cavaleiro da época áurea é um cruzado. Luta por uma causa, sempre relacionada com a da Igreja Católica. Ora é um cavaleiro andante, que vai percorrer vales e montes para a defesa das viúvas e dos órfãos, com o espírito de praticar uma obra de misericórdia; ora é um cavaleiro que vai lutar nas cruzadas, para libertar o Sepulcro de Cristo. Mas o que sempre caracteriza seu espírito é a abnegação, a renúncia. Luta, mas por amor à cruz. Os romances de cavalaria lentamente os transformam: o cavaleiro deixa de ser um idealista para ser um homem vaidoso. Relatam-se fábulas absurdas, por exemplo a de um deles que com uma espada fura ao mesmo tempo cinco mouros, como se fossem cinco salsichas; ou então a de outro que saiu lutando contra um rochedo, e que o espatifou de um só lance. É o espírito desses fatos que Cervantes ridiculariza na pessoa de D. Quixote.
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Ao mesmo tempo que o ideal já não é mais o de servir à Cruz, mas fazer uma manifestação de força e de coragem, aparece no romance outra figura, que é a dama. Esta, ainda muito diáfana e pura, já é a dama romântica pela qual ele tem entusiasmos, pela qual luta para satisfazer seu amor. E a causa do cavaleiro não é mais a de Cristo, mas a do sentimentalismo, da sensualidade. A dama substitui a Cruz. A cavalaria passa a ser um elemento de gozo da vida.46 Em um nível supremamente elevado, é óbvio que, para além da alternativa posta por Cervantes, estão as vias sacrossantas do heroísmo cristão. Sim, do heroísmo cristão como a Igreja sempre o ensinou, e ao qual a História deve seus lances mais sábios, mais esplendorosos e mais propícios ao bem espiritual e temporal dos homens.47 Porque Lepanto48 causou um reviver colossal do espírito de cavalaria, encomendaram a Cervantes o Dom Quixote... para acabar com o espírito de Lepanto.49 Cervantes é uma espécie de Voltaire espanhol.50
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Sancho Pança, mais perigoso que Dom Quixote
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screvendo a história de Dom Quixote, Cervantes lhe associou um personagem secundário, que nunca abandonou o herói da Mancha. Este homem se chamava Sancho Pança.51
Que surpresa sentiria Cervantes, se um telescópio profético lhe pudesse desvendar os acontecimentos futuros e lhe mostrasse que, enquanto o valente Dom Quixote entraria definitivamente para a galeria dos dementes inofensivos, com sua lança, sua couraça e seu esquelético Rossinante, Sancho Pança, o tímido Sancho Pança, o medíocre Sancho Pança, o desprezível Sancho Pança, haveria de acometer dentro de alguns séculos uma grande nação e atirá-la, ele sozinho, às beiras do mais negro precipício.52 Foi, no entanto, o que se deu com o Brasil. Se nosso País não estivesse sob uma proteção especial da Virgem Aparecida, não duvidaríamos muito que, dentro de algum tempo, se lhe pudesse cavar sepultura em sua terra fecunda. Como justo epitáfio, poder-se-ia escrever no túmulo estes tristes dizeres: Aqui jaz uma nação fundada por heróis, civilizada por santos e destruída pelo comodismo imprevidente de alguns de seus filhos.53 Sancho Pança? — perguntarão alguns leitores. Mas Sancho Pança não morreu? Que tem ele a ver, pois, com a crise brasileira?
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Não, Sancho Pança não morreu. Sancho Pança revive em espírito. Inspirando milhares de mentalidades, dita as atitudes de seus filhos espirituais nos parlamentos, nas cátedras, nos bancos, na alta administração.54 Sancho Pança revive no comodismo dos imprevidentes que fecham os olhos às nuvens de hoje, que serão tempestades amanhã. Ele fecha os olhos, não porque confie na Providência, não porque tenha qualquer motivo sério para negar o perigo, mas simplesmente para gozar em paz o momento que passa. Julga que o perigo não existe, simplesmente porque não lhe atacou o pelo.55 Sancho Pança revive na incúria comodista de muitos cidadãos a quem o Brasil havia confiado a missão sagrada de defender a Religião, a Família, a Propriedade, e que não se pejavam em designar para cargos de máxima responsabilidade os mais encarniçados inimigos dos princípios cuja custódia lhes incumbia como dever sagrado.56
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Ouve, ó Sancho Pança
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h! Sancho Pança! Tu que, vestindo farda, beca, toga ou casaca, brincas com o fogo ou foges diante do adversário; tu que simbolizas a imprevidência, a incúria, o comodismo, a cupidez imediatista, o medo — tu infeccionaste profundamente o Brasil. Tu brincas hoje, tu chorarás amanhã. Mas ouve: aqueles mesmos revolucionários cujo caminho preparas, porque és imediatista ou porque és poltrão, eles mesmos te dirão agora, pela boca de um grande anarquista, o futuro que te aguarda se não te emendares.57 Quando o perigo ruge, tu foges e taxas de quimérico nosso esforço para organizar a reação. Mas, se não te impressiona a voz dos que lutam por Deus, ouve a voz de alguém que lutou pelo mal, ouve Proudhon: 58
Já vimos isto... “Quando a primeira colheita tiver sido pilhada, a primeira casa forçada, a primeira igreja profanada, a primeira tocha incendiada, a primeira mulher violada; “Quando o primeiro sangue tiver sido derramado;
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“Quando a primeira cabeça tiver caído; “Quando a abominação da desolação reinar em toda a França; “Oh! Então sabereis o que é uma revolução social!” Proudhon
Também já vimos... “Uma multidão desencadeada, armada, ébria de vingança e de furor; espetos, machados, espadas nuas, martelos; a polícia no seio dos lares, as opiniões suspeitas, as palavras delatadas, as lágrimas observadas, os suspiros contados, o silêncio espionado, as denúncias, as requisições inexoráveis, os empréstimos forçados e progressivos, o papel moeda depreciado, a guerra civil e o estrangeiro nas fronteiras, os proconsulados implacáveis, um comitê de salut public, um comitê com o coração de aço. “Eis aí os frutos da revolução dita democrática e social”. Proudhon Eis aí, Sancho Pança, o futuro que nos preparas. Mas tu não vencerás o Brasil. Não é possível que uma coorte de míopes destroce uma grande nação.59
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Hitler, a nosso ver, nada tem de heróico senão as aparências que, segundo as necessidades do momento, sabe tomar, como hábil comediante que é. A nosso ver, ele é um Sancho Pança que representa bem o papel de Dom Quixote.60 Deixemos, pois, de lado a pessoa de Hitler como a vemos, na nudez de sua personalidade psicológica pequenina e velhaca.61 Enquanto católico, contesto terminantemente que o gênero humano se reduza a um conjunto de Quixotes e de Sanchos. E que diante dos passos dos homens, só duas vias se abrem: a do esquálido e desvairado “herói” manchego, e a de seu abdominal e vulgar escudeiro.62
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O avestruz do século XX é fundamentalmente um egoísta
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s avestruzes, que agora “não vêem” o perigo, tirarão a cabeça de dentro do monte de areia, abrirão grandes olhos espantados e ponderarão: “Está tudo perdido, é mau negócio resistir”.65
O avestruz continuará com a cabeça metida na areia, levando sua vidinha e recitando o seu credo: “Creio num só Deus, o dinheiro onipotente, criador da fartura e da tranqüilidade”, etc.66 Os setores de opinião dominados pelo avestruzismo são, pois, o ponto fraco de um país, a zona mental própria a ser penetrada e explorada pelo adversário, para arrastar a vítima à derrota e à capitulação.67 A maioria vai entrando nesse mundo novo fascinada, arrepiada, hipnotizada, como o passarinho entra na boca da cobra.68
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A Luíza destronca o pé...
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ntre os “Bilhetes de Paris”, de Eça de Queiroz, encontramos um intitulado “As catástrofes e as leis da emoção”. Nele Eça de Queiroz sustenta que, quanto maior a distância no espaço e no tempo, menor a emoção que um fato causa. Para tentar demonstrar sua tese, o autor dá vários exemplos. O mais característico é o caso do pé da Luíza Carneiro. Conta ele que, numa noite, uma senhora lia para uma roda de pessoas um jornal repleto de notícias calamitosas. As catástrofes eram lentamente comunicadas. Primeiro, um terremoto em Java destruíra vinte aldeias e matara duas mil pessoas. Ninguém se interessou por tão longínqua desventura. Depois, mais perto, na Hungria, uma inundação destruíra vilas, searas, homens e gado. Alguém então murmurou, num lânguido bocejo: “Que desgraça!”. Em seguida foram relatados uns tumultos na Bélgica, nos quais haviam morrido quatro mulheres e duas crianças. Vozes mais interessadas exclamaram brandamente: “Que horror!”. A leitora virou a página do jornal e procurou noutra coluna. De repente soltou um grito, levou as mãos à cabeça e exclamou: “Santo Deus!” Todos se ergueram, sobressaltados, e perguntaram o que
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havia acontecido. A leitora balbuciou: “Foi a Luíza Carneiro, da Bela-Vista!... Esta manhã!... Destroncou um pé!”. As senhoras largaram a costura, os homens esqueceram charutos e poltronas, e todos se debruçaram, reliam a notícia amarga no jornal e se repastavam da dor que ela exalava: “A Luizinha Carneiro! Destroncou o pé!”. Já um criado correra furiosamente para a BelaVista, a buscar notícias. Sobre a mesa, aberto, o jornal parecia todo negro com aquela notícia, que o enchia todo e o enegrecia. Dois mil javaneses sepultados no terremoto, a Hungria inundada, soldados matando crianças, fomes, pestes e guerras, tudo desaparecera, era sombra ligeira e remota. Mas o pé destroncado da Luíza Carneiro esmagava os corações. Pudera! Todos conheciam a Luizinha, e ela morava adiante, no começo da BelaVista, naquela casa onde a grande mimosa se debruçava no muro, dando à rua sombras e perfume.
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O “centro do Universo”
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eder ao espontaneísmo descrito por Eça é colocar-se como centro do universo, é afirmar que as coisas importam na medida em que nos tocam, e não enquanto se referem a Deus. Com esta mentalidade, não teria havido cruzadas nem missões. Com efeito, ninguém se teria movido por um problema tão distante como libertar o Santo Sepulcro ou converter selvagens americanos. Essas coisas se fizeram porque havia um interesse, que nada tinha a ver com a emoção sensível. É possível que nós tomemos ante os acontecimentos internacionais essa mesma atitude, se nos preocuparmos com nossas coisinhas e formos pouco impressionáveis por um castigo anunciado em Fátima, e que se deve deduzir de argumentos teológicos e históricos que ninguém vê de modo palpável e imediato. Isto é uma tal desordem mental, uma tal incapacidade de dar às coisas o valor que elas têm, que nossa formação e nossas perspectivas ficam completamente adulteradas. A pessoa que é assim tem que retificar-se, tem que adquirir uma segunda natureza para julgar as coisas de acordo com seu valor, e não na medida em que toca seu egoísmo.69
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“Che” Guevara, ou a máscara para velar a violência
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rnesto “Che” Guevara, o argentino transplantado para Cuba, exprime autenticamente o cunho marxista da revolução cubana. Os cabelos, que parecem não ser de há muito nem cortados nem lavados, um bigode ralo e esfiapado cujas extremidades acabam por se unir a uma barbicha de contornos incertos, formando tudo para o rosto uma só moldura de desalinho e desordem, causam repulsa instintiva, mas visam despertar uma impressão de naturalidade e despretensão, levada ao extremo. O olhar, de uma luminosidade incomum, e o sorriso procuram dar uma certa idéia de bonomia e afabilidade um pouco mística. A fisionomia de “Che” Guevara representa uma das máscaras mais recentes da Revolução, isto é, a bonomia insincera, a velar a pior das violências.70
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O violinista — ou a imprevidência e a inércia
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arra-se que, quando Bizâncio foi invadida pelas tropas turcas, em um suntuoso edifício se encontrou um bizantino, cidadão prestante que em lugar de empunhar a espada na defesa da pátria, tocava violino enquanto seus compatriotas morriam no cumprimento do dever. Com um golpe de espada, foi morto sob o riso sarcástico dos adversários e entrou para a História como símbolo da imprevidência e da inércia. Parece, em todo o caso, que o violino exerce atrativo maior que a espada.71
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Mornos, ou o vômito merecido
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e muitos homens acabam seguindo uma orientação uniforme, para o alto ou para baixo, muitos outros, pelo contrário, ficam eternamente na situação intermediária, na zona limítrofe entre o bem e o mal, sem arderem de vida sob a ação da graça nem estarem inteiramente gélidos na morte do pecado. Aquele desprezo específico que se tem pelo mole, pelo medroso, pelo poltrão, não se tem pelo filho das trevas que é um terrorista. Podemos até hostilizar muito mais o terrorista, mas Nosso Senhor disse: “Oxalá fosses frio ou quente; mas, porque és morno, e nem frio nem quente, começarei por vomitar-te de minha boca”.72 O homem morno provoca vômito; o homem varonil, não. Devemos ser homens do sim e do não. Disse Nosso Senhor no Evangelho: “Seja vossa linguagem sim sim, não não.73 Não devemos ser homens do talvez e do “deixa disso”.74
l O amortecimento do princípio de contradição gera o gosto, a mania das soluções intermediárias. Eu quase diria: a servidão às soluções intermediárias. Dados dois caminhos, escolher sempre o do meio — o que não é carne nem peixe — é no que se cifra para muita gente toda a sabedoria.
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Ora, se é um erro rejeitar por princípio as soluções intermediárias, erro também é adotá-las por princípio. Pois há casos em que a sabedoria as condena formalmente. A pessoa viciada em soluções intermediárias é a vítima ideal de todos os velhacos. Pois a habilidade do velhaco consiste precisamente em fazer com que o ingênuo aceite, com algum disfarce, aquilo que, a nu e sem maquilagem, ele repudiaria.75
l A adesão ao princípio não é apenas uma firme convicção de determinada verdade, mas é uma convicção tal que repelimos o que a contraria, porque daquela verdade fazemos um bem nosso, uma coisa nossa. Aquilo que a contradiga, nós rejeitamos por ofender a nós. E tornamo-nos, portanto, dedicados àquele princípio, tornamo-nos combativos por ele, porque se transforma para nós num bem de nosso ser. Cortar aquilo é como tirar o nosso ser. 76 Mas há muitos meios de se ser morno. Não são mornos somente os que vivem ora no pecado ora na virtude. Também são mornos, se bem que de modo menos grave, aqueles que, vivendo habitualmente na virtude, a arrastam penosamente como um fardo, estritamente colocados no terreno do minimalismo, e firmemente deliberados a não elevar suas preocupações além da esfera do simples combate ao pecado mortal.
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Na ordem moral, há muitos mornos assim.
l Pieguismo não é bondade. Estupidez não é generosidade. Inocentes como as pombas, nem por isto deixemos de ser astutos como as serpentes. É Nosso Senhor que, em termos expressos, no-lo impôs.77 Queremos porventura ser melhores do que Ele? A mediocridade tem o charme ilusório da tranqüilidade, da segurança, mas também implica na ausência de qualquer progresso. Isso é incontestável. Quando chega a ocasião de se dedicar, de fazer alguma coisa por Nossa Senhora, a posição de alma do medíocre é: satisfeito quando Ela fazia algo por ele, retraído quando se trata de fazer alguma coisa por Ela. Não queremos nos sacrificar. Esta é a miséria do espírito humano, a alma humana é continuamente assim. Em Pentecostes, dia de fogo e de amor, o afeto sobrenatural se abrasou e inspirou atitudes tão veementes e radicais que chegaram a sugerir a idéia da ebriedade. Peçam os mornos e os tíbios um pouco daquela centelha. Ela os ressuscitará para a vida plena da graça e da verdade.78
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Pentecostes
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Sebastião Veniero (acima), aos 70 anos, foi um dos heróis vencedores da batalha de Lepanto, junto com Andrea Doria (no meio) e Dom João de Áustria (embaixo). Belo exemplo da soma das idades.
Pensa o jovem: “Será possível que se leve a vida inteira para chegar a essa idade e ficar desse jeito? É uma coisa pavorosa, eu não quisera isto nunca!” Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo Uma juventude ardorosa e idealista, uma idade madura ponderada e venal, uma velhice arrastada: este é o pensamento mais freqüente a respeito das idades do homem. Essa concepção é a expressão da verdade? É o que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira analisa nos pensamentos recolhidos neste capítulo.
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Ideal e idades
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apoleão se referia com freqüência à venalidade da idade madura.
Ele parecia insinuar que toda idade madura é necessariamente venal, e que toda juventude é necessariamente abnegada e altruísta. Que toda idade madura é sem ideal, sem vôo. O idoso não veria o maravilhoso, não veria os imponderáveis.79 A vista se torna fraca no sentido material da palavra, e ao mesmo tempo a mente fica cada vez mais circunscrita às coisas imediatas, preocupando-se com o momento imediato, com o prático, com o concreto. Um casal meu velho conhecido, de uns 60 anos mais ou menos, tem duas preocupações exclusivas.
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Uma é tocar uma chacarazinha onde moram: galinha, bomba de água, para eles são um acontecimento. Outra é a fiscalização da saúde. De manhã comentam se o coração palpitou durante a noite, e vivem num pavor da próxima peça que a doença lhes possa pegar. Vendo chegar com a velhice a doença e as sombras da morte, vão se defendendo freneticamente. Não têm outra preocupação. Uma pessoa mais jovem poderia pensar: Será possível que a gente leve a vida inteira para chegar a essa idade e ficar desse jeito? É uma coisa pavorosa, e eu não quisera isto nunca! Mas eu vou afundando nuns horizontes e numas coisas que acabam dando nisso”.80
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Luta de classes, luta de idades
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xiste a respeito das várias idades do homem uma espécie de concepção ao modo da luta de classes. A pessoa mudando de era na vida perde as qualidades e os defeitos da era anterior, e entra em qualidades e defeitos diversos.
A infância sonha com o maravilhoso: ela é fraca, débil, pequenina, mas ela é pura. Então o puro e o maravilhoso são próprios do menino. Depois vem o moço. Puro, já não ouso afirmar, mas é idealista, forte, romântico, amoroso. As más tendências entram com o romântico e o amoroso.
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Depois começa a maturidade. Ele perdeu o idealismo, perdeu o élan. A força dele é uma força de estabilidade, de fixação. Ele vê a realidade mais concreta, ele manda, ele governa. Não tem mais a força de um soldado de vanguarda, mas tem o vigor de um general. Depois começa a velhice. É outra forma de “sabedoria”, é o desencanto. “Nada é nada. Meu egoísmo é tudo. Fico chupando minha boca vazia de dentes, tolerando minha cabeça vazia de idéias, carregando meus olhos vazios de luz e os meus ouvidos vazios de som. Posto na minha poltrona, no meu chinelo, contemporizando com a morte e gozando um pouco a vida, até que a morte chegue. Quando chegar o fim, não há mais remédio, morro blasfemando”. É a trajetória de uma vida. É uma luta de classes de uma época contra outra na vida. Essa concepção faz parte do evolucionismo, que é sempre a destruição de uma coisa em nome da outra, dando a isto o nome de continuidade, embora sendo a descontinuidade por excelência.81
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As idades não se opõem, se somam
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teoria correta a respeito das várias idades é que, no homem fiel, as qualidades das várias idades se somam. Ele deve conservar até a velhice todas as qualidades da infância. Na juventude, deve ter as qualidades da infância. Na idade madura, as da juventude e da infância. Na velhice, um requinte por onde tenha todas as qualidades das idades anteriores. Quando morre, ele entrega sua alma a Deus com as riquezas de toda a vida que ele teve. Assim, é muito mais bonito exalar o último suspiro. A pessoa entrega-se a Deus como quem entrega o conjunto dos tesouros que Deus lhe deu, implorando a misericórdia para aquilo que não esteja completo. Esta é a morte do varão católico.82
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-11 As idades anteriores enriquecem o presente
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evemos ter como pressuposto, nas várias idades, os dons da idade anterior.
É preciso conservar a vida inteira, como pressuposto básico inicial, as qualidades do tempo de criança. Uma boa criança tem uma forma de abertura de alma por onde ela é muito pouco interesseira. Ela é desinteressada, é meiga, é afável; com facilidade dá o que tem. Toda criança boa faz pequenos desenhos que procura dar aos outros. Tem um senso de admiração muito grande em relação aos mais velhos. Procura vê-los sob os melhores aspectos e se encanta com esses aspectos.83
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O idealismo infantil
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criança boa é movida pelo princípio de que a vida dá certo, e de que vale a pena viver porque é algo grande. Embora tenha sofrimentos, tudo no fim tem sua explicação, e ela é verdadeira. Resulta daí aquela espécie de otimismo que caracteriza a infância. Ela é cheia de esperança, crê com facilidade no que lhe contam, e é toda voltada para entregar-se, para servir, para admirar. O contrário é o sovina qüinquagenário que diz: “não, a época de invalidez está chegando, agora quero acumular dinheiro, dinheiro, dinheiro, para não ter perigo de ficar pobre”.84
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A criança boa não crê na descrença
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criança boa nada tem a ver com criança boba, cretina.
Por ser muito pura e ter muita candura, sempre que o mal aparece, ela o recusa. Ela se torna contestatária contra o mal. Ela não crê na descrença. Se alguém lhe diz: “Ora, Deus não existe...”, nesse alguém a criança não crê. No fundo, a criança tem virginalmente um senso de distinção entre a verdade e o erro, o bem e o mal, que depois pode ir-se embotando ao longo da vida.85
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Apogeu, “des-apogeu”...
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or causa das graças do batismo, a infância é um apogeu. Trata-se de saber se a vida do homem cresce depois, de apogeu em apogeu até a ancianidade, ou se tem “des-apogeus”... Daí vem o fato de as pessoas conservarem uma espécie de nostalgia do seu tempo de criança, que é uma nostalgia meio parecida com a de um paraíso perdido. Ninguém tem saudades dos seus 20 anos como tinha do seu tempo de criança!86
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O ancião idealista
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e um homem soube crescer durante toda a vida, não só em experiência, mas em penetração de espírito, em bom senso, em sabedoria, sua mente adquirirá na velhice um esplendor e uma nobreza que transluzirá em sua face e será a verdadeira beleza de seus últimos anos. Seu físico poderá sugerir a lembrança da morte que se aproxima, mas em compensação sua alma terá lampejos da imortalidade.87 Qüinquagenários, sexagenários, poderiam pensar: “Como é bela a juventude! Tenho saudades da minha inocência. Daquela candura de alma, daquele frescor”. “Não quero morrer sem ter readquirido minha infância, de maneira que, quando me apresente diante de Nossa Senhora, eu possa dizer: Minha Mãe, minha vida inteira está posta em vossas mãos. De tudo quanto me destes, não perdi nada. Vós me fizestes fortificar tudo quanto me destes. Mas houve algumas coisas que me foram dadas nos meus primórdios, que assim nunca mais tive, e que preciso recuperar”.88
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A inocência medieval
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Idade Média, a meu ver, foi a era em que os homens conservaram este espírito de infância.
Eles eram corajosos, leais, honrados, piedosos; criam, mas criam com este espírito, que nada tem de comum com o que por aí se vê. Por exemplo, São Luís rei, todo armado com uma armadura de ouro, mais alto do que todos os homens do seu exército, pulou para dentro das águas do Mediterrâneo e entrou pela praia adentro, cheio de entusiasmo, porque tinha chegado ao lugar da batalha. Um rei que pula fora da sua barca, e que é o primeiro! E São Tomás de Aquino? Ele acreditou no raciocínio com todo frescor com que uma alma assim acredita na verdade. Ele acreditou inteiramente na lógica, na fé. Ele conseguiu a perfeita conciliação entre a lógica e a fé. E voou — porque aquilo já não é andar, é voar — nos horizontes do raciocínio, com uma pureza de serafim. A lógica dele é tão pura quanto é puro o azul, o vermelho ou o dourado dos vitrais de uma catedral! Nele, os conceitos de pureza, de sublimidade e de radicalidade se unem.89
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Resumindo: somar as idades
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udo isto não significa que não devemos amadurecer, mas sim que precisamos somar as perfeições próprias de cada idade. E chegar à extrema idade com o idealismo da infância e com todas as características das idades anteriores. Isto, o homem do século XIX habitualmente não fazia: era uma maturidade sem infância. Em sentido contrário, por exemplo, Monsieur Martin, pai de Santa Teresinha, tinha um esplendor de maturidade, mas com infância no olhar. Maior esplendor ainda, a meu ver, é o Beato Charbel Macklouf .90 É um homem virgem, aquele. Mas que catedral... São Pio X, que maravilha! Tinha um olhar de criança, mas era um leão!91
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Monsieur Martin, pai de Santa Teresinha
São Charbel Macklouf
São Pio X
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Se algo pode afundar, o idealista encara o perigo de frente
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Deixar de formar juĂzo ou suspeita quando o caso se apresenta, pode ser defeito, e grave defeito.92 Plinio CorrĂŞa de Oliveira
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Neste capítulo “Ele é um idealista, vive com a cabeça nas nuvens”. É uma crítica que se ouve com freqüência. Mas, se é um verdadeiro idealista, dáse o contrário: ninguém o ultrapassa no sentido da realidade. Ao mesmo tempo, tem aquela nobreza de alma característica do idealista.
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Idealismo e perspicácia
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uitos católicos se terão por certo espantado quando afirmamos que o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo é uma inigualável escola de energia e heroísmo, no sentido mais belicoso da palavra. Sua surpresa não será menor se lhes dissermos hoje que o Evangelho é uma inigualável escola de perspicácia, e que Nosso Senhor Jesus Cristo inculcou reiteradamente esta virtude. O que vem a ser perspicácia? É a virtude pela qual nosso olhar, transpondo as aparências enganosas apresentadas pelas pessoas com que lidamos, penetra até à realidade mais recôndita de sua mentalidade. Assim, diz-se de uma autoridade eclesiástica ou civil que é perspicaz se, através da prolixidade dos conselhos e informações que recebe, sabe discernir a verdade do erro, adotando em conseqüência uma linha de conduta conforme aos interesses que tem em mãos. Dentro da mesma ordem de idéias, pode-se dizer que é perspicaz um médico que sabe discernir a existência de uma moléstia através dos mais ligeiros indícios. E se chamaria perspicaz o detetive que sabe interpretar as circunstâncias aparentemente mais insignificantes, delas deduzindo com segurança qual foi o autor de um crime.
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Difícil seria imaginar uma profissão ou condição social em que a perspicácia não fornecesse ao homem os mais inestimáveis recursos para o cumprimento de seus deveres. O pai de família, o professor, o diretor de consciências precisa discernir em seus alunos, dirigidos ou filhos, os mais ligeiros sintomas das crises que se esboçam, a fim de prevenir o que de futuro seria talvez impossível remediar. O homem de Estado não pode deixar de distinguir, por entre as múltiplas manifestações de amizade que seu alto cargo suscita, os amigos sinceros dos insinceros: todo o êxito de sua carreira política está condicionado a esta aptidão. Os advogados, militares, industriais, comerciantes, banqueiros, jornalistas, etc., não podem exercer convenientemente suas funções, nem poupar os mais graves sacrifícios aos interesses que têm em mãos, se não estiverem munidos de uma perspicácia hoje mais necessária do que nunca. Nosso Senhor não se limitou a pregar a perspicácia, mas deu dela exemplos insignes e memoráveis. Assim, quando o Divino Mestre denunciava os fariseus, o que fazia senão estimular a perspicácia de seus ouvintes, desmascarando aqueles sepulcros caiados, brancos por fora e por dentro cheios de podridão?93
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Abulia da inteligência
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bulia é a completa inércia da vontade. Um autor diz: há uma abulia da vontade, mas também outra muito menos mencionada: a abulia da inteligência. É a preguiça de a inteligência dar-se conta da realidade, e a preguiça de formar um juízo arquitetônico a respeito dela. É a preguiça de se dar conta de quanto a realidade é alta em cores vivas, magníficas, e convida a estados de alma também imensos.94
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A objetividade é seriedade
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ma inteira objetividade consiste em ver a realidade inteiramente como ela é, sem véus nem preconceitos, nem torcidas, nem distorções. A objetividade de espírito é a posição da alma por onde ela, por honestidade, por probidade, procura ver as coisas absolutamente como são, sem nenhuma dessas fraquezas, como a de não olhar de frente a realidade.
Eu me lembro do choque que tive certa vez quando, pouco antes de se ter afastado da religião, uma pessoa me fez a seguinte queixa a respeito do Legionário:95 “É um jornal que a gente abre e não encontra nenhuma notícia que alegre, que alente. Acaba-se desanimando”. Eu caí de várias nuvens. Porque, se as notícias são ruins, eu digo que são ruins. Ele diz: “A gente lendo o jornal, acaba desanimando”. Isso é outra coisa. Há um remédio chamado “Calmina”. Tome “Calmina”, tome outras coisas, trate-se, mas não venha querer que num quadro sério eu diga: “Caiu o Império Britânico, foi morta a rainha da Inglaterra. Uma pequena compensação, o lulu da Pomerânia da rainha Fabíola teve crias”. Isso é uma falta de seriedade fundamental, de cretino!
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A seriedade, exatamente, é a disposição de espírito de ver a verdade de frente, por inteiro, como ela é, e em sua hierarquia. Portanto, dando maior valor às coisas altas do que às que não o são.96
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Nem otimista nem pessimista, mas pessimólogo
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ão sou propriamente pessimista. Sou “pessimólogo”, o que é diferente.97
A despreocupação não suprime os problemas nem os resolve, muitas vezes até os agrava tragicamente, pois é a grande adormecedora dos sentinelas.98 O otimismo fraco e fácil — “tudo vai muito bem, vai no melhor dos mundos” — não corresponde à verdade; em segundo lugar, amolece, degrada e dissipa tudo.99
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O clamor dos indícios veementes
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ustiça é retribuir a cada qual segundo seus méritos. E não retribuir de modo igual a gênios e medíocres, heróis e pusilânimes, homens beneméritos ou egoistarrões. Um homem de caráter firme e varonil sente uma dissonância interior cada vez que nota que, em torno de si, as coisas se passam de modo contrário à glória de Deus, à exaltação da Santa Igreja e à doutrina católica. Deixar de formar juízo sobre o que é evidente, deixar de ouvir o clamor dos indícios veementes, ou é imbecilidade ou fraqueza de princípios. Não há por onde escapar. Deixar de formar juízo ou suspeita, quando o caso se apresenta, pode ser defeito, e grave defeito.100
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Pieguismo não é bondade. Estupidez não é generosidade
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ngênuos como crianças de berço até o dia em que não cai sobre os ombros uma função de responsabilidade, o que faremos quando depender de nós a defesa dos mais importantes interesses espirituais ou temporais, contra os lobos disfarçados na pele da ovelha? A este respeito, queremos insistir muito especialmente: todo mundo tem, em certas circunstâncias, o direito de arcar com prejuízos que afetem seus interesses individuais. Ninguém, entretanto, tem o direito de expor os interesses de terceiros. Haverá situação mais ridícula do que a de alguém que declare romanticamente haver comprometido os interesses de terceiros que lhes estavam confiados, porque “foi bom demais e confiou excessivamente na bondade alheia”? “Bom demais”? É realmente ser “bom demais” sacrificar ao amor próprio de uma meia dúzia de aventureiros os interesses sagrados confiados à pessoa que assim procura se inocentar? Quem não percebe que essa “bondade” fora de propósito redundou em uma injustiça cruel para com os terceiros prejudicados no caso? Decididamente, renunciemos a toda esta pieguice. Ela só serve para prejudicar a Igreja, dando a
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entender que a descrição que seus adversários fazem do “carola”, tipo imbecil de um sentimentalismo romântico e estúpido, é produto genuíno de seu espírito. Sursum corda.101 Pieguismo não é bondade. Estupidez não é generosidade. Inocentes como as pombas, nem por isto deixemos de ser astutos como as serpentes.102 É Nosso Senhor que, em termos expressos, nolo impõe. Queremos porventura ser melhores do que Ele?103
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Diz a Escritura que “o vinho alegra o coração do homem” (Ecli, 31, 36)
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O mal do ébrio está em si mesmo, e não no vinho precioso com que se embriaga. Tanto é assim, que muitos são os que bebem vinhos da melhor qualidade e deles não abusam. O mesmo se pode dizer dos outros bens terrenos.104 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo Muitos pensam, com engano, que o idealista vive fora da realidade e tem diante de si o espectro do fracasso financeiro. Eles advertem: “Se você quer ser idealista, renuncie a qualquer desejo de juntar dinheiro, prepare-se para ser enganado pelo primeiro espertalhão e morrer na miséria”. Mas, para o Autor, o idealista não despreza o dinheiro por princípio: o mal não está na riqueza, mas no apego, assim como o mal do ébrio não está no vinho precioso com que se embriaga, mas em si mesmo. E se o mal não está no dinheiro, o idealista pode desejá-lo, desde que considerando os limites indicados pela moral cristã.
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O mal do ébrio está nele, não no vinho
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Evangelho recomenda o desapego dos bens da terra. Esse desapego não significa que o homem deve evitar o uso deles, mas apenas que os deve usar com superioridade e força de alma, bem como com temperança cristã, em lugar de se deixar escravizar por eles. Quando o homem não procede assim, e faz mau uso desses bens, o mal não está nos bens, mas nele. Assim, por exemplo, o mal do ébrio está em si mesmo, e não no vinho precioso com que se embriaga. Tanto é, que muitos são os que bebem vinhos da melhor qualidade e deles não abusam.
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O mesmo se pode dizer dos outros bens. A música, por exemplo, tem sofrido muitas deformações abomináveis nas épocas de decadência. Não é o caso, por isso, de renunciar a ela sob pretexto de que corrompe. Cumpre fazer boa música, e da melhor, e usá-la para o bem.105 Uma das vantagens de uma harmoniosa desigualdade de bens está precisamente em permitir nas classes mais altas um florescimento particularmente esplêndido das artes, da cultura, da cortesia etc., que delas promana depois para todo o corpo social.106
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Cuba é uma empresa podre porque lhe falta “o olho do dono”, o estímulo de ganho individual crescente. Todo o mecanismo de produção da Ilha está a cargo de uma imensa pirâmide de funcionários públicos mal pagos, e sem possibilidade de enriquecer. E não se pode pedir ao funcionário público — máxime em tais condições — mais do que a simples correção. O dinamismo estuante, entusiasmado, heróico, este só se pode esperar, em via de regra, dos homens estimulados pelo desejo legítimo de lucro e considerável ascensão.107 Seria estúpido ver no lucro individual, comedido e legítimo, um prejuízo para o bem comum. Mas compare essa posição legítima e proveitosa com o entusiasmo desses jovens de bolso furado que lutam pela propriedade (refere-se aos caravanistas da TFP) e continuam de bolso furado. Não é verdade que eles levam a cabo uma gesta, uma epopéia? Esses jovens, que vivem só para o ideal, foram tocados pela palavra de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”.108
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Ser dono do panorama
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m literato foi levar outro para ver uma aldeia, do alto de uma montanha. Disse-lhe então: “aquela é a casa de fulano, aquela outra de beltrano, a outra de sicrano”. O outro lhe perguntou: “E seu, o que é?” “Eu não tenho nada, só tenho o panorama” — respondeu ele. Mas quem tem o panorama tem muito mais do que o casario, porque tem o enlevo. Assim se olha a paisagem sem vantagem própria, apenas pelo gosto desinteressado do panorama pelo panorama.109
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Melhorar é necessário
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ender a uma melhoria é inerente a tudo quanto tem vida.
A primeira ascensão a que cada um deve tender é a espiritual e intelectual. Assim, à medida que o homem vive, deve ir crescendo em virtude e inteligência. Ao mesmo tempo, nasce nele um desejo reto de introduzir mais decoro e bem-estar em sua existência. Pelo trabalho, consegue os meios econômicos para esse fim. E com a elevação de seu nível pessoal e do ambiente em que vive, sua consideração social também cresce. Vezes há em que o homem, à procura de meios de subsistência, encontra abertas as vias de acesso à fortuna. É sua situação material que melhora. Mas ele deve sentir o desejo de se pôr à altura da situação granjeada, elevando-se e aos seus em virtude e cultura, que lhes servirão de base mais preciosa e respeitável que o simples fato material da posse do ouro. Em agir assim não vai inveja, pois não há pesar pelo que os outros têm. Nem vai orgulho, porque o homem não quer mais do que lhe cabe. Ele vai merecendo mais, e nesta medida vai tendo mais. Ou, se vai tendo mais, vai cuidando de se pôr à altura do que tem. Na história, tal movimento ascensional é lento, profundo, fecundo. Em geral, ele se transmite de pai para filho, e assim vão subindo as famílias.110
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São Maximiliano Kolbe (1894-1941) foi um frade franciscano que, em nosso tempo, se ofereceu para morrer de fome em lugar de um pai de família num campo de concentração nazista
Ouve-se o som do passo cadenciado, rumo ao cocho, sob o manto da vergonha.111 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo O egocentrismo é a obsessão de se colocar no centro de todas as coisas. Numa formulação famosa, diz Santo Agostinho que dois amores fizeram duas cidades: o amor de si até o desprezo de Deus e o amor de Deus até o desprezo de si.112 Assim sendo, poderíamos dizer que, ou seremos habitantes da cidade do idealismo ou da acanhada aldeia do egocentrismo. Nesta última vegetam aqueles que se põem a si mesmos como centro de todas as coisas. Os exemplos são abundantes.
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A Catedral e a melancia
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uando estive em Notre Dame pela primeira vez, o guia contou que tinha estado ali uma caravana de turistas. Era dia muito quente, e entraram todos comendo pedaços de melancia gelada que estavam sendo vendidos na entrada. Eles visitaram boa parte da Igreja comendo e jogando as cascas no chão. E como era uma multidão de gente, quando saíram foi preciso varrer a Igreja para tirar fora as cascas de melancias.
Como mostrar Notre Dame? Como mostrar essas maravilhas? Não é fácil, porque está cada um agarrado à sua melancia. E mesmo quando acabou a melancia, a alma está “melanciática”...113
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Caim não foi idealista
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ó existe verdadeiro amor, verdadeira dedicação, verdadeira amizade, verdadeiro idealismo, onde há espírito de sacrifício. Quando não há disposição de se dedicar, de se sacrificar, qualquer dito de amizade ou declaração de afeto não passa de relambório. Ou a pessoa prova seu afeto, sua amizade e seu idealismo com obras, e com obras que lhe custem, ou fica provado que não tem verdadeiro afeto, verdadeira dedicação.114 Um amor não sério a Deus é como o sacrifício de Caim: um sacrifício não sério, de frutas podres, que exala uma fumaça que não sobe até o Céu. O amor sério a Deus é como o sacrifício de Abel: queima a oferenda, cujo perfume se estende aos circunstantes, e cujo fumo sobe ao trono do Altíssimo.115
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Quando o horizonte é grande, é preciso saber ficar pequeno
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m autor fala de certo gênero de gente que só quer ter alma na medida necessária para que o corpo não apodreça. Não conheço expressão melhor e mais pontiaguda para caracterizar certo estado de espírito. O homem contemporâneo pensa: “Estou levando minha vidinha que tem minha proporção, da qual sou dono e que guio como eu quero. Não quero um horizonte muito maior, diante do qual fico pequeno, e que me obriga a não prestar atenção em mim, mas em algo superior que devo admirar e a que devo me dedicar”.116
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“O passo cadenciado rumo ao cocho, sob o manto da vergonha”
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á milhões e milhões de homens que, no silêncio da indiferença, emitem o único som que se pode ouvir. É o passo cadenciado rumo ao cocho, sob o manto da vergonha. Todos com o manto da vergonha por cima, num passo cadenciado, rumo ao cocho. Vamos comer, vamos comer, vamos comer! Tendo comida, está tudo acabado. Comida e, bem entendido, sexo.117 Uma poesia [de 1971] ficou popular entre alunos da universidade de Moscou, e circulava em boletins clandestinos apreendidos pela polícia. É interessante que as coisas russas, por causa já do bafo do Oriente que penetra no país, têm uma conotação poética muito grande. “Quanto a mim, não sei para onde ir. Perguntar qual deve ser o caminho, a quem e como? Minha voz ainda é muito fraca e tímida. Meus amigos, por agora, o que temos a fazer é ajudar outros cegos a atravessar a rua”. No que o estado de espírito deles se diferencia
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da podridão mefítica — porque não há outra palavra — do Ocidente? É que eles são gente que pergunta para onde ir. Quem não pergunta para onde ir, é como um bicho que vai para o cocho; farejou que tem comida, e lá vai sem raciocinar. Caminha ao apelo do estômago. Aqui está a diferença. E quem pergunta para onde vai, este pode encontrar Nosso Senhor no caminho. O autor pergunta: qual é nosso dever no momento? Somos cegos e temos que atravessar uma rua com todos os riscos. Ajudemo-nos uns aos outros, pois nossa voz ainda é tímida e fraca demais para perguntar aonde iremos. É possível ter entranhas cristãs sem ter vontade de ir ao socorro destes cegos e dizer: “Olha! Aqui está a luz”?118
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Eu sou o foco de tudo!
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ma pessoa entregue ao vício do egocentrismo tem como prazer fundamental não só estar desfrutando sempre a vida, mas estar sentindo-se sempre a si próprio. No que consiste esse sentir-se a si próprio? Em algumas afirmações interiores: “Sou a causa, o foco, a sede de tudo quanto há de extraordinário em mim. Tudo isto está em mim como uma propriedade minha, e isto ninguém me tira, porque é co-idêntico com minha personalidade”. É uma espécie de embevecimento de pegar, de sentir, de chupar a si próprio. Imaginem um homem sedento a quem se dá uma esponja embebida com água: ele chupa aquilo. Assim é o vaidoso em relação às suas coisas: “eu sou...”, “eu sou...”, “eu sou...”. Cada pessoa é realmente algo de inefável que os outros não percebem bem. Isso existe em todo o mundo, até no último dos homens. Ele tem um atrativo que Deus percebe e os outros não percebem bem, mas ele percebe. Ele dirá: “Sou uma obra-prima”. E é verdade, porque cada homem é uma obra-prima, sabendo-se ver bem as coisas. O sujeito a isso acrescenta: “Se sou isto, não quero dever isto a ninguém. E a suprema alegria da
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vida tem que ser que eu me sinta a mim próprio e sempre me rejubile com isto”. Mas essa alegria é uma alegria inquieta. Por quê? A pessoa sente que isto tem um traço de verdade, mas é sobretudo uma enorme mentira. A pessoa sente falhas, sente lacunas, sente insuficiências, e sobretudo sente inveja. Vive numa espécie de nostalgia daquilo que não tem; e essa nostalgia produz inveja. Portanto, ao lado desse prazer, uma frustração contínua e universal. Esta angústia e frustração contínua é o que fez Salomão dizer — no Livro da Sabedoria — que todas as coisas não são senão vaidade, mas vaidade no sentido etimológico da palavra, quer dizer, aquilo que é vão. Todas as coisas são uma ilusão impalpável, não têm realidade; “vaidade e aflição do espírito”. Não passam disso.119
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Na praça da Paz Celestial, em Pequim (1989), um homem enfrenta uma coluna de tanques e os detÊm
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O homem que luta por seus direitos merece respeito. O que luta por princípios e ideais verdadeiros merece, mais do que isto, admiração.120 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo Na primeira cruzada, o exército regular — o dos cavaleiros que tomaram a cruz em 1095 para libertar o Sepulcro de Cristo — atingia talvez um milhão de homens. Foram o exemplo imorredouro de amor desinteressado e sacrificado a um ideal. Amor, aliás, levado até o holocausto de suas vidas, pois, quando da tomada de Jerusalém em 1099, só restavam 40 mil cruzados extenuados: os outros haviam morrido antes. O tempo das cruzadas medievais já se foi, mas resta o espírito de luta, o espírito de cruzada. Neste capítulo, depois de discorrer sobre a dedicação, Plinio Corrêa de Oliveira — o “cruzado do século XX” — nos fala sobre algo de que foi um mestre ilustre: a luta.
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Viver é lutar
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epois do pecado original, a luta não é o tempero da vida, a luta é o sentido da vida.
Na situação em que vivemos, mais do que em qualquer outra, o homem que ama a Deus deve compreender que não nasceu para si mesmo. Não tem o direito, portanto, de viver com a preocupação de fazer a sua vontade e de levar a vida que acha gostosa. Se tiver essa preocupação, será indigno de ter nascido no século em que nasceu.
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Ou compenetração da luta, ou frustração
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oda a vida de um homem que não luta é uma vida de frustrado. Estamos aqui na Terra para lutar. Se não lutamos, vem a frustração. Não é o prazer nem o descanso que evitam a frustração. Acrescento mais: uma oração sem espírito de luta também não evita a frustração. A coragem é pacífica. O homem corajoso tem paz, porque resolveu correr o risco, e portanto enfrenta o risco pela determinação que tomou. Mas isso supõe que ele esteja numa luta contínua contra o medo. Porque o corajoso não é o que não tem medo; não tem medo o estourado. O corajoso tem medo... mas vence o medo! No desânimo vem o mais perigoso dos sentimentos, aquele que mais profundamente mina um homem: é a pena de si próprio. É como um verme roedor interno que liquida. Quando alguém começa a ter pena de si mesmo, deve desconfiar de tudo, porque não há onde ele não possa ser levado.121 O homem, passando para a terra, perdeu tudo quanto perdeu, mas em certo sentido ganhou algo a mais. É que a luta se tornou para ele muito mais dura. Na possibilidade dessa luta há muito mais sofrimento, e no ápice dessa luta está o Verbo de
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Deus que morreu por nós e nos resgatou: a luta das lutas, a tragédia das tragédias, o sublime do sublime: a Redenção do gênero humano. Oh! felix culpa!122 É a batalha, e a guerra, e a oposição, e a inconformidade, e tudo o mais.123
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A paz não deve ser o império da vergonha, mas a tranqüilidade da ordem
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ucidez e coragem... não sei qual destes predicados é mais raro nos dias que correm.
Às vezes é preciso mais coragem para elogiar do que para atacar. Não desanimar, às vezes, supõe mais coragem do que avançar. O desânimo é um inimigo mais insidioso do que o externo. Não se incomodem com os inimigos, tenham coragem e vão para frente, pois minha experiência é esta: eles gritam alto porque a gente fala baixo; se a gente fala alto, eles se calam. O riso da coruja não consegue retardar a aurora que se levanta. O remédio não é ir matando coruja por coruja; o remédio é não criar obstáculos ao brilhar do sol e apressar o nascer do sol.124 Eu compreendi que ao verdadeiro católico muitos admiram, embora não tenham coragem de ir para frente; muitos silenciam quando ele é perseguido; outros acompanham de longe, com olhares de simpatia; poucos o ajudam a carregar a cruz. Ele pensa que está isolado, mas — oh engano! — até entre os que o vaiam há aqueles que o admiram.
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Santo Agostinho
Quanto à paz, que Santo Agostinho definiu como a tranqüilidade da ordem, tenho-a em conta de um bem inapreciável. E por isto detesto, também de todo o coração, o contrário dela: a tranqüilidade da vergonha sob a vara de ferro da impiedade.125
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Santo Estêvão, o primeiro martir, é apedrejado
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Os grandes sofrimentos da alma, comparados aos grandes sofrimentos do corpo, sĂŁo ainda mais terrĂveis.126 Plinio CorrĂŞa de Oliveira
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Neste capítulo “Se alguém está sendo perseguido, é porque está sendo rejeitado. Se está sendo rejeitado, alguma coisa deve haver...” Esta prevenção simplória é uma das principais objeções, conscientes ou subconscientes, em relação ao idealista. Veja neste capítulo como muitas vezes o verdadeiro é exatamente o contrário: “Bem-aventurados os perseguidos por amor à Justiça, pois deles é o Reino dos Céus” (Mt. 5, 10).
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O perseguido, um escolhido
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ão é qualquer um que sofre perseguição por amor à Justiça. São as pessoas escolhidas por Deus que a sofrem. É uma honra, uma glória individual, o indivíduo ser perseguido por amor à Justiça. Deus dá uma prova especial de seu amor quando escolhe alguém para ser perseguido, para fazer às vezes de Cristo. Nosso Senhor diz: dele será o reino dos Céus. E os anjos desde já aclamam o momento em que transpuser os umbrais da morte e entrar no Céu. A música magnífica do coro dos vencedores e dos triunfadores o acolherá nos umbrais do paraíso e o levará até os pés de Nossa Senhora. E Ela, em uníssono com esse coro, o mostrará a Nosso Senhor Jesus Cristo. Nosso Senhor Jesus Cristo olhará para ele e dirá: Este é meu, porque este é como Eu: ele sofreu perseguição por amor à Justiça.127
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A perseguição psicológica e moral
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em-aventurados os que sofrem perseguição por amor à Justiça, que deles é o Reino dos Céus”,128 diz o Evangelho. Desde o começo do mundo, desde Abel morto por Caim até o último mártir que deva morrer antes do fim do mundo, todos aqueles que sofrem perseguição por amor à Justiça têm a promessa do reino dos Céus.
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Mas sempre fica nos nossos espíritos a idéia de que a perseguição deve ser cruenta, e de que a verdadeira perseguição é aquela que tira a vida a alguém, ou ao menos lesa seu corpo. Ao passo que a perseguição psicológica, a tortura moral infligida a uma pessoa porque ela ama a Justiça, raramente é vista como sendo perseguição. Ora, por mais duro que seja o sofrimento do corpo, a parte mais nobre do homem é a alma. E os grandes sofrimentos da alma, comparados aos grandes sofrimentos do corpo, são ainda mais terríveis. O homem sofre mais na alma do que no corpo. Esta é a razão pela qual, de todos os lances e de todos os episódios da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, tenho veneração mais profunda pela agonia no Horto. Ele ali, a bem dizer, sofreu sua crucifixão psicológica, sua crucifixão moral.
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Esse sofrimento moral, ao longo de toda a Paixão, foi maior do que o sofrimento físico. A tal ponto que, tendo os sofrimentos físicos sido inenarráveis, Nosso Senhor no fim ainda fez uma queixa do sofrimento moral: a aridez em que a Providência O deixou, o abandono em que ficou sua humanidade santíssima: “Meu Pai, meu Pai, por que me abandonaste?”. Ele se viu numa aridez completa, sentiu-se completamente abandonado. Passou por este sofrimento específico, que é o abandono. E pergunta a Deus: Meu Pai, meu Pai, por que me abandonaste?129
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A alegria na arena com as feras
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lguns mártires do tempo do Império Romano, quando eram mortos, compareciam à arena tão alegres, que se diria que já estavam sentindo sua entrada no Céu! É que o sofrimento de alma lhes estava poupado por um desígnio de Deus. Estavam inundados de consolação. E isto na hora de serem vítimas de um jaguar, de um tigre, de um leão! Nessa hora eles estavam resplandecentes de alegria, deixando abismados os pagãos que assistiam ao martírio, sem compreender que, num lance terrível como aquele, a pessoa pudesse estar tão alegre. Por que esta alegria? O sofrimento do corpo estava presente, mas o sofrimento da alma estava ausente. A principal forma de perseguição é a perseguição da alma. É tentar a alma, arrastá-la para o pecado e fazê-la sofrer, se não consentir em pecar.130
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Uma grande razão para amar
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ato oposto ao pecado de Judas, e que dá a Nosso Senhor e Nossa Senhora a glória oposta também, é ser fiel no momento em que todos forem infiéis. Ser fiel de uma fidelidade sem fissuras, sem rachaduras, sem conformes, sem covardias. De uma fidelidade heróica, declarada, peremptória, e que vai para frente de qualquer jeito. Ser fiel sem interesse, sem ambição, sem lucro, mas por puro amor a Nossa Senhora e a Nosso Senhor Jesus Cristo. Para ter esta fidelidade, devemos ter um grande amor a Deus Nosso Senhor e a Nossa Senhora. Como se pode ter um grande amor? É só tendo uma grande razão de amar. O verdadeiro modo de amar é considerar a sublimidade de Deus Nosso Senhor e de Nossa Senhora: inimaginável, inexcogitável, magnífica. Uma superioridade que Os coloca acima de tudo. Imaginando-Os assim, sentimo-nos cheios de entusiasmo e produzimos a fidelidade sem jaça”.131
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“Quando chegar o meu Natal...”
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noite de Natal. Nosso Senhor está numa manjedoura.
O Menino Jesus, pela graça, visita todas as almas. E faz o papel não só de quem recebe a visita, mas daquele que vai atrás dos homens. De todos os homens, de todas as idades, de todas as línguas, de todas as condições sociais. Ele lhes diz alguma coisa que lhes toca o coração de modo especial. O Natal leva sua alegria também aos lugares onde está a tristeza. O Natal não é só o Natal dos alegres. O Natal é também, em larga medida, o Natal dos tristes. Imaginemos um prisioneiro na Lubianka — a sinistra prisão comunista da Rússia — que ouve tilintar muito longe um sininho e percebe que aquela é a noite de Natal. Do fundo de sua prisão, de seu isolamento — num lugar onde só o cercam ódio, perseguição, necessidade, tristeza, onde todo momento é de aflição — esse homem, se tem fé, se ajoelha e diz: “Senhor, é vosso santo Natal”. E uma alegria penetra através daquelas pedras intransponíveis. Então o homem reza, e se lembra: “Stille Nacht, heilige Nacht, alles schläft, einsam wacht, nur das traute, hochheilige Paar...”132
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Meu Deus, não é só o santo casal que está vigiando, mas também este prisioneiro. Olhai, meu Deus, para meus pulsos: estão carregados de grilhões. Meu Deus, por quanto tempo ficarei aqui? Não sei. Uma só coisa sei: é que quando chegar a noite do meu Natal, Vós vireis e me chamareis, e eu nascerei para o Céu. Quanta esperança, quanta alegria, quanta resignação, quanta solidão, quanta dor!133
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Um menino idealista já é vítima de incompreensões
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ão as incompreensões dos de sua própria casa ou do amigo, é o isolamento, o abandono, porque ele não pronuncia palavras sujas, não diz graças imundas, não lê revistas indecentes. Porque ele é sério, não vive de brincadeiras estúpidas. Por isto se vê isolado, marcado, desprezado, e um véu de tristeza baixa sobre sua infância que normalmente deveria ser alegre. Mais tarde começa a adolescência, e vê às vezes levantar-se contra ele todo o seu ambiente. Ou na escola, ou em casa, ou em qualquer outro lugar, existe uma muralha formada contra ele. Comentam que ele é como um velho, que não se diverte, que é retrógrado, anacrônico, antipático, orgulhoso, sei lá o quê. Isso causa sofrimento, e esse sofrimento é uma forma de perseguição. “Bem-aventurados os que sofrem perseguição por amor à Justiça”. Mas o que é a Justiça? Não é só o que se chama a virtude da Justiça, pela qual se dá a cada um aquilo a que tem direito. A palavra Justiça também é usada no Antigo e no Novo Testamento para indicar a virtude como um bloco. São todas as virtudes; é este conjunto que se chama Justiça.
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O indivíduo que sofre perseguição por amor à Justiça intui perfeitamente que está sendo perseguido por isto. E que, portanto, se deixar de amar a Justiça, deixar de praticar a virtude ou de promover a virtude dos outros, ele deixará de ser perseguido. O menino do qual os companheiros caçoam porque é casto sabe bem que é só se pendurar em uma mulher imoral, que toda antipatia contra ele acaba. Pois todo aquele que é perseguido conhece, de um modo mais ou menos confuso, a razão de sua perseguição. Ora, apesar disso ele prefere aceitar uma vida difícil a deixar a virtude.
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Não é pior o sofrimento de um doente?
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um hospital a pessoa sofre, pode oferecer as suas dores, o que é muitíssimo meritório, e pode santificar-se com isso. Mas o doente nem sempre tem a possibilidade de dizer a Deus: eu poderia fazer cessar a minha cruz, não o faço por fidelidade a Vós. O que é perseguido por amor à Justiça pode dizer: “Eu podia fazer cessar essa cruz, mas não o faço por fidelidade a Vós”. Ele tem essa possibilidade, e cada minuto de fidelidade que vive é um minuto em que renova inteiramente a aceitação da dor que lhe foi imposta. Quem faz isto terá vivido dias dos mais belos de sua vida.134
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Conquistar os perseguidores pelo sorriso?
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iz alguém: “O homem é visceralmente bom. Quando ele se extravia, é porque da parte dos bons houve uma inabilidade. Se os bons fossem hábeis, sempre conquistariam os adversários pelo sorriso e pelas concessões. Assim, nunca haveria perseguição religiosa. De sorriso em sorriso, a Igreja Católica conquistaria os homens”.
Cardeal Mindszenty
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Este modo de pensar levantaria a seguinte objeção: “Se a culpa está do lado dos bons sempre que os maus se erguem contra os bons e os perseguem, Nosso Senhor Jesus Cristo teve culpa, que o levou a ser perseguido e até crucificado”! Ele também não teria sabido aplicar a tática do sorriso. “Do contrário, teria aproveitado o momento de popularidade do Domingo de Ramos e levado aquele povo todo a uma grande reconciliação. Nunca teria acontecido o que aconteceu depois”. “Como Ele foi muito intransigente nos seus princípios, nunca cedendo, daí Lhe adveio toda a impopularidade e toda a tragédia”. Ceder, sorrir, não ter princípios e pagar qualquer preço doutrinário ou ideológico para evitar a guerra, colocar a morte física como o mal supremo e o pecado como nenhum mal, eis a mentalidade que deu no progressismo de hoje e em quantas aberrações há por aí.
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O prêmio
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e nesta vida alguém de tal maneira se apegou ao que é eterno e sobrenatural, que sacrificou a alegria de viver a vida terrena, receberá como prêmio aquilo que ele amou: dele é o reino dos Céus.135 O reino dos Céus é dado como recompensa àquele que, sofrendo perseguição, perseverou. Mas o reino dos Céus não existe apenas na outra vida. O reino dos Céus já se realiza nesta terra. Aquele que é perseguido por amor à Justiça tem uma paz, uma tranqüilidade de consciência, uma ordem interior que o pecador não tem.136 Martírio de São Pedro Borie
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Três quedas, três gêneros de cansaço
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Dar algo que nós mesmos não sabíamos que podíamos dar.137 Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo O desinteresse, a generosidade, e portanto a nobreza de alma, quando postos a serviço de uma causa verdadeira, estão ao alcance de todos os homens, também no tramtram quotidiano. É a luta contra o egoísmo, a mediocridade, a curteza de vistas. Sim, o egoísmo, como um fantasma negro — ou talvez pior, cinzento —, se apresenta a todo momento como o oposto da nobreza de alma, com estados de espírito aparentados como a ambição, a indiferença, o comodismo. Mas o auge do idealismo é chegar ao heroísmo do terceiro cansaço.
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A teoria dos três cansaços
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osso Senhor teve três quedas. Esse número três levanta altas considerações, altas digressões a respeito do cansaço, do sofrimento. Pode-se perguntar, portanto, se nós, que tantas vezes sofremos o peso do cansaço, o peso da fadiga, temos alguma coisa a tirar do fato de o cansaço de Nosso Senhor Jesus Cristo, carregando sua Cruz, se ter manifestado em três quedas. Não dou uma resposta de exegeta, mas apenas de um homem de bom senso que procura responder esta pergunta com considerações comuns.
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Primeira queda
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primeiro grau de cansaço se dá quando uma pessoa carrega um fardo, e depois de o arrastar, chega a determinado momento em que considera que todas as energias comuns de que dispunha estão esgotadas, e então cai debaixo do fardo. Quando a pessoa cai debaixo do fardo e pára, ela não só se recompõe de um pouco do cansaço. Há uma espécie de segundo movimento da alma através do qual, por um admirável império sobre o corpo, a alma faz uma mobilização de todas suas energias mais profundas, de todas as energias que estão latentes, e que o homem na vida habitual não está acostumado a mobilizar. Na primeira queda o homem faz este raciocínio: “Mas que peso duro! Que coisa tremenda! Não consigo, entretanto é necessário, e quero absolutamente levar este fardo, este esforço, este ato de dedicação até o último ponto”. Então diz: “Mas — mais analisada, mais examinada a situação — não terei em mim razões para um novo alento, um novo impulso em que tiro de dentro de mim insuspeitadas energias para levar a cabo aquilo que eu queria levar?” Então há uma espécie de segunda reflexão e uma segunda mobilização de todas as energias da alma. Então a alma deita um segundo empenho e toca até outro baque: é o segundo cansaço.
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A segunda queda
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a segunda queda a alma carrega um peso, que é o seguinte: “Eu mobilizei tudo quanto tinha; fiz tudo quanto podia, e eis que estou caído, vergado sob o peso desta dor. Minhas energias estão mais gastas do que na primeira queda; eu tirei de mim aquilo que não imaginava, entretanto quero continuar para a frente: não quero parar”. Medito mais uma vez: “Como é nobre e santo o que eu quero; como é digno de ser atingido esse objetivo que tenho em vista! Entretanto, além do peso anterior, sinto mais um peso: o do desalento, da perplexidade; não tenho mais energias, não dá mais jeito. Então rezo. Rezo mais do que rezei nas outras vezes, e digo a Nossa Senhora: “Minha Mãe, Vós vedes que eu dei tudo quanto podia. Ou Vós me ajudais particularmente agora, mais do que na etapa anterior’, ou não serei capaz de fazer aquilo que quereis de mim”. Mas, observando-me bem honestamente a mim mesmo, encontro que ainda há o que imolar; que ainda há o que sacrificar; e vejo que minha oração foi ouvida. Ao lado de energias que estavam ignotas de mim mesmo, e que eu não apliquei, acabam aparecendo também forças sobrenaturais novas que podem me levar ao que eu queria. Então me levanto uma segunda vez e continuo.
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É uma coisa tremenda, mas percebo que tinha mais alguma coisa para dar. Arrasto-me mais do que ando; mas resolvi, eu chego atÊ o meu fim. E ainda que tenha de pedir a Deus um milagre completo, realizarei aquilo que devo realizar. Então, ando mais um tanto.
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A terceira queda
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a terceira etapa caio mais uma vez. Sou um mulambo, percebo que em mim não existe mais nada capaz de resistir. Digo: Bem! tenho ainda comigo o esperar contra toda a esperança. Pôr-me de pé, porque só tenho energia para ficar de pé. Vou pôr-me em pé e dar um passo, e o resto é a confiança cega, é a noite escura, é o despojamento total. Dei algo de interior de mim, que eu nunca imaginaria que pudesse dar. Então, sai de mim algo que é realmente o último fôlego de minha alma, mas também é a mais lúcida visão de meu ideal. E é o ato mais completo de meu amor. Então me dei completamente. É quando me levanto do terceiro tombo, quando dou mais alguns passos cambaleantes e chego até o sacrifício, em que sou pregado na cruz e me deixo imolar. Estes são os três cansaços, que correspondem às três etapas da dedicação humana. Na primeira etapa, dá-se as energias que se conhece e se sente; e pede-se o auxílio de Nossa Senhora dentro da assistência comum da graça. Na segunda etapa, dá-se energias que se entrevia, mas não se conhecia bem; e se pede a Nossa Senhora com maior instância que nos dê socorros
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especiais, porque se duvida que a economia comum da graça nos faça andar. Na terceira etapa, damos algo que nós mesmos não sabíamos que podíamos dar: uma capacidade de dedicação, de esforço que não sabíamos que tínhamos, que nunca tínhamos suspeitado que tínhamos. Quer dizer, aí estamos completamente unidos ao sobrenatural.
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A beleza inconfundível da abnegação
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ois bem, a alma humana se levanta de cada queda, de cada prostração — não é uma queda moral, mas é uma prostração. À medida que se levanta, ela vai deitando de si uma beleza maior: a beleza incomparável da abnegação. Porque o homem, para atrair, precisa ser abnegado. Um homem egoísta não atrai ninguém; todo mundo tem horror ao egoísmo e foge do egoísmo. Quando a alma chegou ao último ponto da destilação de sua abnegação, quando ela deu tudo quanto podia dar, ela está preparada para atrair a si todas as almas. E é por causa disso que, depois de ter tido as suas três quedas, Nosso Senhor estava pronto para ser mostrado do alto da Cruz para todos os povos.138
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Idealismo, com entusiasmo ou sem ele
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homem pode enfrentar as dificuldades com dois estados de espírito diversos.
De um lado, com entusiasmo. Ele se vê numa contingência de sofrer muito por uma alta finalidade, e resolve com animação: “vou dar!” E vai para a frente. Outras vezes, não tem nenhum entusiasmo sensível para o que vai fazer. Compreende como deve agir, e o deseja, mas sua sensibilidade não está afinada com o objetivo. Ele está fraco e abatido, e deve atingir aquela meta, apesar de sua sensibilidade estar rumando para o sentido oposto. A coragem na dor, na desolação, na agonia, é uma forma de intrepidez. É a coragem da qual nos deu exemplo Nosso Senhor Jesus Cristo.139 E é por causa disso que sempre tive uma devoção especial a Nosso Senhor no Horto, porque é o episódio prototípico da vida d’Ele dentro deste gênero: Ele fica completamente na aridez e tem aquela prece: Pater, si fieri potest transeat a me calix iste; se for possível, afastai de mim esse cálice, mas fiat voluntas tua, faça-se vossa vontade. Quer dizer, “se for preciso, Eu vou”.140 E toda a Paixão, toda a vida de Nosso Senhor foi assim.141
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Que é a aridez A aridez, como se define? É uma completa dissociação entre o que estamos dizendo a Deus e nossa sensibilidade. Nossa atenção não se concentra em nossas palavras, e nossos sentidos não o sentem.142 Que é a consolação? É o contrário da aridez; é o sentimento de piedade, de fervor, de entusiasmo.
A aridez é normal Não se deve pensar que o normal é ter consolação. É o contrário que é verdade. O comum é a aridez, mesmo para as pessoas muito fervorosas. Fora do comum é a consolação. Uma alma árida pode estar em condições verdadeiramente santas. O fato da pessoa sentir aridez, absolutamente não significa que vai andando mal. Também não quer dizer que esteja andando bem. Tanto pode estar indo muito mal como muito bem. Mas o certo é que, de si, aridez não é sinal de decadência.143
Polidez, caprichos e aridez Se fôssemos atender nossos caprichos, em inúmeras horas seríamos levados a evitar certas pessoas, e
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em outras horas seríamos levados a procurar de modo intemperante certas outras. Por quê? São impulsos que se põem em nós de modo irregular, caprichoso, anárquico. Quando estamos tratando com algumas pessoas, não temos vontade de ter a amabilidade devida. Em conseqüência, somos obrigados a um trato que dissimula aos olhos dos outros o que nossa sensibilidade quereria. O trato católico leva por vezes a disfarçar. Não é um fingimento, porque se está mostrando o que está no mais fundo de nossa alma, a qual é feita de inteligência e de vontade. A arte de disfarçar é exatamente a origem de todo o protocolo, toda etiqueta e toda cortesia. Ouvindo de alguém: “Prazer em conhecê-lo”, ninguém julga que esse alguém está sentindo prazer sensível em nos conhecer. Quando se diz: “Muito gosto em vê-lo!”, só um tonto pode achar que sempre está presente o sentimento.144 É preciso não cair em dois extremos simétricos: o trato sentimental — só tratar com quem se tem afeto e fazê-lo sentimentalmente; o trato frio — nunca ter sentimentos e tratar os outros metalicamente.145
Lages escuras e lages coruscantes Nunca se deve desdenhar o sentimento, mas também é preciso não se escravizar a ele. E ora com ele, ora sem ele, é preciso caminhar para o Céu por
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uma estrada que está calçada por longas lages obscuras de aridez, e depois por uma ou outra lage coruscante de consolação. Há dois extremos no tentar resolver o problema da aridez. Um extremo consiste em julgar que o caminho que vai para Deus é o feito de sentimentos e sensações. Que, portanto, o verdadeiro apogeu da vida espiritual é a união mística. E que, pelo contrário, uma pessoa que está na aridez tomou rumo no caminho errado, e precisa fugir da aridez por meio do sensacionalismo. O contrário consiste em expulsar a sensação, excluir o sentimento da oração e da vida, para fazer um culto exclusivamente racional. O sentimento para estes é uma coisa efeminada, maluca, que não deve ser tomada em consideração. A única coisa que vale é a razão. A posição correta consiste em julgar que o sentimento é algo de precioso. Sempre que possa, ele deve ser utilizado, como meio de nos conduzir a Deus. É pena que não possa ser utilizado sempre. Mas como é fugaz, não podemos viver apenas em suas asas, porque quem vive nas asas dos sentimentos cai, como de vez em quando cai o sentimento. Devemos continuar a crer naquilo que não sentimos. Devemos continuar a dizer e a fazer aquilo que não sentimos. Por vezes, a pessoa anda nas trevas e não entende
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o que está se passando consigo mesma. Ela parece morta a si mesma, mas deve fazer sem nenhum sentimento o mesmo que fazia no auge da consolação. É preciso nunca desdenhar o sentimento, mas jamais se escravizar a ele. Consolação ou não consolação, aridez ou não aridez, no fundo tanto faz para a alma: ela caminha para Deus de um modo ou de outro.146 É preciso fazer este tremendo sacrifício de ter uma alma sensível que não despreza o sentimento, mas sabe viver na noite da insensibilidade.147
A aridez na vida espiritual Santa Teresinha era muito bonita, e dava a impressão de uma pessoa repleta de felicidade. Certa vez ela mostrou a uma pessoa, na mesa de sua cabeceira, um remédio de cor muito bela, e disse: “A minha vida é assim, tão bonita de olhar, tão amarga de beber”. Essa alma andava na dura galeria da aridez. Na aparência, abandonada. Pior ainda, assediada por tentações contra a Fé.148 Todos os autores de vida espiritual são unânimes em afirmar que, quando a pessoa começa a vida de piedade, é freqüente ter essas consolações. Por exemplo, na comunhão diária. As consolações, depois de certo tempo, vão desaparecendo como uma
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nuvem dourada que vai se desfazendo. E isso, mais ou menos sem culpa. Não se pode viver de consolação nesta vida. Seria um paraíso, e aqui é um vale de lágrimas. É com a noite da aridez que se assimila a consolação recebida.149
Um contraste Os senhores vejam o contraste entre Santa Teresa, a Grande, e Santa Teresinha. Santa Teresa: visões, revelações, uniões místicas prodigiosas. Santa Teresinha, a via da aridez. A aridez a acompanhou durante a vida inteira. Ela conta que chegava a dormir durante o Rosário, dormir durante os ofícios, de aridez. Compreende-se bem o tormento dessa aridez. Ambas as vias — a de Santa Teresa, a Grande, e a de Santa Teresinha, são legítimas.150
O idealismo e o absoluto “Ah! O absoluto é assim? Sei que daqui a pouco já não terei essa impressão. Mas eu amo tanto o absoluto, que faço o propósito de, quando essa sensação do absoluto passar, continuarei inteiramente sério, coerente, e entregue ao absoluto completamente. Ainda que ele se esconda de mim, eu serei dele.
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Sei que a mão dele me ajudará, sem eu ver e sem eu saber, do contrário eu não seria capaz de nada. E por causa da ajuda invisível dele, minha voz cujo timbre eu não ouço bradará, e percorrendo as distâncias dirá: Deus, absoluto, conservai-me na fidelidade à vossa absoluta excelência, por meio de Maria vos suplico”. É como uma torre. Bate o sol nela durante o dia, ela é linda; anoitece, a torre imerge nas trevas mas continua de pé. Vêm por cima dela todos os ventos e as tempestades, vêm as aves noturnas, pode acontecer o que se quiser. A torre nem se sente a si mesma, nem se vê a si mesma dentro da noite, mas continua de pé. De maneira que, quando vier a aurora, ela não terá surpresa de estar de pé nem a aurora terá surpresa de encontrá-la. A aurora conhece a fidelidade da torre. Dia e noite, noite e dia, vamos ficando como essas torres que tomam ar de eternidade, e que nada derruba. Assim se deve ser fiel ao absoluto.151 A alma verdadeiramente idealista, em certo momento faz o seguinte raciocínio: “Estou assim porque estou inundado de graças de consolação. Mas no momento da aridez devo lembrar-me dos princípios secos, que estou reconhecendo como verdadeiros. E devo ser fiel a eles, mesmo que custe muito”. É o pagamento que damos por esse vôo dentro do azul.
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O idealismo do cantor surdo São Francisco de Sales, sempre exímio nas comparações, imagina um cantor que está cantando para um rei ouvir. Ele canta muito bem e ouve a sua própria voz; assim, sabe que está se apresentando bem e se deleita por ver que o rei o está apreciando. Mas o santo imagina que, de repente, esse cantor ficasse surdo. Mesmo surdo ele continua a cantar porque sabe que o rei ouve, agradado, sua voz. Entretanto, ele não ouve o que executa. Há mais mérito em um surdo cantar para deleitar o rei, do que se fosse um cantor que ouve sua própria voz. Assim é quem louva a Deus com aridez.152
Definição de aridez religiosa A aridez religiosa, como se define? Como uma completa dissociação entre o que estamos dizendo a Deus e nossa sensibilidade. Nossa atenção não se concentra na coisa que estamos dizendo, nossos sentidos não o sentem, e somos, em relação a nossa própria oração, verdadeiros bonecos de pau, que dizem algumas coisas a Deus mecanicamente e sem a menor sensibilidade. Dentro da aridez, dentro da recusa completa dos sentidos, nossa alma deve continuar a crer, a dizer, a fazer aquilo que não sente.
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Quando, por acaso, o sentimento coincide com a inteligência e a vontade, se prepara na alma um verdadeiro festim. Mas, enquanto isso não existe, a alma anda no escuro, sem entender o que está se passando consigo mesma. Ela parece morta a si mesma, mas fará sem nenhum sentimento o mesmo que fazia no auge da emoção.153
A hora do deserto Deus ama os que atravessam o deserto. Por isso Ele quer que, aqueles a quem ama, atravessem o deserto! No primeiro passo da vida espiritual, tudo é encantamento e entusiasmo. Mas pode haver um momento em que deixe de ser assim. Quando estamos encantados, entusiasmados, devemos dizer: “Ó minha Mãe, uni-me cada vez mais a Vós, e uni-vos cada vez mais a mim! Nas horas da vitória, da alegria, também nas horas da aridez, uni-me cada vez mais a Vós, uni-vos cada vez mais a mim!”154
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O venerĂĄvel Pierre Toussaint (1766-1853) foi um ex-escravo que certamente possuĂa nobreza de alma. Depois de livre, com impressionante idealismo, chegou a ajudar pecuniariamente sua ex-senhora, em dificuldades finaceiras.
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Qualquer preocupação de projeção pessoal mina, aniquila, arrasa o idealismo de um trabalho. Plinio Corrêa de Oliveira
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Neste capítulo O Pai Nosso, a oração que Nosso Senhor nos ensinou, é um sublime apelo ao desinteresse, e portanto ao idealismo. Porque em primeiro lugar se implora que o nome de Deus seja santificado, que o Reino d’Ele venha a nós, que seja feita a sua vontade. Só depois se pede o pão e o perdão dos próprios pecados, para não cair em tentação, e a graça da boa morte. Assim, mesmo as graças de vida espiritual pessoais devem ser desejadas depois do anseio pela glória de Deus. É esta a ordem de prioridades que devemos querer ter em nossa vida, se desejamos a verdadeira nobreza de alma. O Pai Nosso é uma lição de desinteresse, e o desinteresse é o assunto do presente capítulo.
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Para meditar: o albatroz no tombadilho...
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albatroz, ave marítima de grande categoria, é uma espécie de águia desse setor privilegiado da natureza em que o ar e a água se tocam. Ele tem um corpo imenso, mas pezinhos pequenos. Anda de modo ridículo, pois foi feito para voar. Há uma poesia155 descrevendo um albatroz que caiu no tombadilho de um navio, por estar ferido. Os marinheiros, ignobilmente, vão dando pontapés nele, insultando, judiando. E o albatroz procura fugir.
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O católico fiel, queira ou não queira, é um albatroz e vai ser albatroz até o fim da vida. Queima-me a boca dizer, mas ele vai ser albatroz até no inferno, se se perder. Qual é o resultado? É que, quando o católico fiel se entrega a uma vidinha ridícula, merece o desprezo que se tem pelo albatroz no tombadilho. Ele produz uma sensação de frustração e de tristeza. Como é atroz! Esse homem, feito para fitar os maiores horizontes, para os maiores desígnios, para ver os maiores heroísmos, de repente se vê todo preocupado com uma questiúncula. Meu Deus do céu, como isto é pequeno, como isto é constrangedor! Um homem comum, nesta postura, fica menos ridículo que um católico fiel. Quando a graça sopra e convida o albatroz para voar, ele quereria voar num esplêndido bando de aves, mas sente que os albatrozes amigos estão grasnando e andando pelo chão.156
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O fracasso do interesse
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o Livro dos Macabeus há um muito bonito texto,157 que diz respeito à luta que eles desenvolviam contra os dominadores estrangeiros, que estavam procurando reduzir o povo à idolatria. Eles tinham levantado uma revolta, e a revolta estava coroada de êxito. Era uma verdadeira cruzada contra os estrangeiros dominadores. Ao mesmo tempo, e sobretudo, idólatras. Vendo o êxito dos Macabeus, dois indivíduos acharam que era uma bonita oportunidade para eles também se assinalarem, fazerem carreira, granjearem consideração. E eles então iniciaram também a luta contra o inimigo maldito, mas em nome de um princípio diverso do que o princípio que tinha levantado os Macabeus.
O brado dos Macabeus era: “Melhor é morrer do que viver numa terra sem honra e devastada”.158 Eles eram levados por mais do que amor à terra. Tinham amor à honra da terra, e o que consideravam a honra da terra era a religião. A religião devastada representava para eles o sumo sofrimento, a suma tortura. A vida perdia para eles a razão de ser, se fosse para contemplar com braços cruzados a devastação do povo de Israel, prefigura da Igreja Católica. O resultado é que esses homens despretensiosos e desinteressados foram abençoados por Deus;
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e salvaram, com seu heroísmo, com sua coragem, o povo de Israel da dominação dos gentios opressores. Mas alguns se levantaram com outra preocupação: já não era de defender o povo de Deus, mas era de propagar o seu próprio nome; eles eram pretensiosos; eles queriam utilizar, para fazer carreira, o zelo que alguns judeus ainda conservavam pela religião. O resultado é que foram abandonados por Deus; foram derrotados, esmagados; e carregaram perante o juízo de Deus a responsabilidade pela morte de dois mil de seus conterrâneos. Qual é a aplicação que disto se tira? Qualquer preocupação de projeção pessoal mina, aniquila, arrasa nosso trabalho. Deus não abençoa o apostolado do ambicioso. Deus só abençoa quem faz o trabalho por amor a Ele, e não quem faz o apostolado por amor a si mesmo.159
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A nobreza de alma idealista
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matriz de tudo quanto é nobreza está nesse fundo da alma humana pelo qual ela é capaz de amar tudo pelo amor de Deus, e até a si mesma pelo amor de Deus. De maneira a destacar-se deste amor animalesco que o homem tem por si mesmo, que é a matriz de toda a vulgaridade, de toda a baixeza de alma, de toda a torpeza.160 Devemos procurar amar a Deus sem amor de nós. Não sermos egoístas, não querermos nada para nós, nem cargos, nem posições, nem admirações, nem situações. Só nos interessarmos pela Causa de Deus. Se for assim, nosso olhar como que vê a Ele, e nossa vista O mostra. Nós não amamos a Deus porque Ele nos dará o êxito. Nós amamos a Deus porque Deus é Deus! Nesta época de ambição, de interesse, de depravação, devemos ser os idealistas em estado puro; que nos movemos por um ideal que é o mais idealista dos ideais. Essa nossa posição inteiramente desinteressada não pede nenhuma forma de recompensa. Pelo contrário, torna-se mais radical no momento em que o risco é grande. Assim, temos o idealista na sua mais alta acepção: o idealista corajoso.
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Aumentando o “crédito” junto a um santo...
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modo de considerar determinadas devoções, por exemplo, é muito significativo.
Alguém resolve espalhar a devoção a São Judas Tadeu, ou a devoção a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Em geral tais resoluções são expressões de sentimentos puramente individuais. Uma pessoa recebeu uma graça de determinado santo — ou ao menos julga ter recebido — e, movido por um sentimento de gratidão, empreende uma campanha com o fim de divulgar a sua devoção. Pode existir certo “do ut des” ou “facio ut facias”161 nessas atitudes. Como tal santo me fez um favor, divulgo a devoção a ele. Estou assim aumentando meu crédito, com melhores possibilidades de obter futuros favores. Não se pode afirmar que tal modo de agir seja sempre mau. Mas é em função disto que, não raras vezes, certos católicos do momento organizam suas atividades de piedade.162
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“Por serdes Vós quem sois...”
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posição sentimental e sem idealismo nos faz amar a Deus exclusivamente porque Ele nos ama, e assim nos colocamos no centro do amor. Em última análise, é por egoísmo que amamos a Deus. Diz o ato de contrição: “por serdes Vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado”. Mas a piedade sentimental não nota isso. Ela só nota o “sumamente bom”! Quer dizer, o sumamente bom para comigo, bom aqui para com o degas. Mas mil vidas que eu desse não bastariam para agradecer o benefício da Redenção! Vamos ao fundo: é que Deus é Deus.163
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A glória de Deus, favor que Ele faz para mim
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o Gloria in excelsis, esta idéia está expressa muito bem:
“Gratias agimus tibi propter magnam gloriam tuam”:164 eu Vos dou graças, ó meu Deus, por vossa imensa glória. É magnífico! Quer dizer, amo tanto a Deus porque Ele é Deus, que agradeço a Ele de ser Deus, como se fosse um favor para mim.165
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Idealismo de mãe
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minha querida e inolvidável mãe, Lucilia, que me ensinou a dizer “Jesus” antes mesmo de “mamãe”, e a colocar a devoção à Fé Católica e à Santa Igreja acima de todos os bens terrenos, com uma gratidão transbordante de afetuosas saudades e sobretudo de esperança,
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Plinio”166
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Cardeal Merry del Val
Ladainha da humildade
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Ladainha da Humildade é de autoria do ilustre e venerado Cardeal Merry del Val. Transcrevemos dois trechos com aplicações de Plinio Corrêa de Oliveira, estas últimas em itálico. — Do desejo de ser louvado, livrai-me, ó Jesus. O desejo ardente e eficaz de que a Igreja militante seja louvada acima de todas as coisas pelos homens, dai-me, ó Jesus. — Do receio de ser esquecido, livrai-me, ó Jesus. A santa indignação por ver a Igreja militante ser objeto de esquecimento dos seus adversários internos ou externos e de seus filhos tíbios, dai-me, ó Jesus.
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Santa Teresa e o puro amor idealista
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total desinteresse expresso nesta poesia de Santa Teresa d’Ávila pode ser aplicado a todos os campos da vida de uma pessoa. Teríamos então um perfeito idealista, como Plinio Corrêa de Oliveira explanou nas páginas deste capítulo. Não me move, Senhor, para querer-Te, Aquele Céu que me tens prometido. Nem me move o Inferno tão temido Para que, assim, eu deixe de ofender-Te. Tu me moves, Senhor. Move-me ver-Te Cravado numa Cruz e escarnecido. Move-me ver teu corpo tão ferido Movem-me tuas ofensas e tua morte. Move-me, por fim, teu amor, e de tal maneira Que ainda que não houvesse Céu, eu Te amaria; e ainda que não houvesse Inferno, Te temeria. Nada tens de me dar porque Te queira. Ainda que o que espero não esperasse, O mesmo que Te quero, Te quereria.
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“O Senhor, pois, desceu sobre o Monte Sinai, no cimo do mesmo monte, e chamou Moisés ao mais alto dele” (Ex. 19, 20)
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Por ordem, entendemos a paz de Cristo no reino de Cristo.167 Plinio CorrĂŞa de Oliveira
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Neste capítulo Examinamos neste livro vários tipos de falso idealismo, e todos eles são falsos idealismos porque se referem a um falso ideal. Qual é, então, o ideal verdadeiro que acalenta em sua alma o verdadeiro idealista?
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O objeto da fidelidade e do idealismo
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fidelidade é uma grande qualidade? Sim e não. Depende daquilo a que se é fiel.
Se se trata de ser fiel a algo muito grande, a fidelidade é uma muito grande qualidade. É uma excelência do amor a essa coisa. Mas se se trata de ser fiel a algo de segunda ordem, aquilo não é muito grande qualidade. Entretanto, se se trata de ser fiel a tudo aquilo a que se deve ser fiel, então é uma grandíssima qualidade.168
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O código perfeito da conduta humana está nos Dez Mandamentos
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código perfeito da conduta humana está nos Dez Mandamentos da Lei de Deus. Se todos os homens seguissem integralmente esta Lei, todos o problemas ideológicos e morais da humanidade se resolveriam a fundo. Se, pelo contrário, todos os homens violassem integralmente essa Lei, a humanidade se autodestruiria em tempo não muito longo.169
Se a Revolução é a desordem, a Contra-Revolução é a restauração da ordem. E por ordem entendemos a paz de Cristo no reino de Cristo. Ou seja, a civilização cristã, austera e hierárquica, fundamentalmente sacral, antiigualitária e antiliberal.170 Onde há ordem, há verdadeira paz. Onde há simplesmente uma ausência de desordem, não existe paz; existe apenas uma desordem velada, uma ordem simulada.171 Cristandade não é de nenhum modo a sociedade idealmente bem organizada, em que tudo funciona bem, mas é muito mais. É a ordem de coisas em que o espírito humano subiu tão alto que ele se exprime em símbolos nos quais o homem julga superada toda a beleza contenível nesta terra e se lembra do Paraíso — julga superada qualitativamente a própria beleza do Paraíso e se lembra do Céu.172
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Um impulso para o alto
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inda nas primeiras décadas do século XX, a tendência dominante da sociedade temporal, pelo menos em suas linhas gerais, consistia num impulso para melhorar sempre. Afirmação esta que, em se tratando da religiosidade e da moralidade, seja pública, seja privada, precisaria ser fortemente matizada.173 O conjunto desses fenômenos [de decadência do mundo moderno] traz consigo um sinal acentuadíssimo de proletarização, tomado este termo no seu sentido mais pejorativo.174 Contudo, nem por isso morreu o velho impulso para todas as formas de elevação e de perfeição, nascido na Idade Média e, sob certos pontos de vista, desenvolvido nos séculos sucessivos.175 Pelo contrário, esse impulso trava nalguma medida a rapidez da expansão do impulso oposto. Em vários ambientes, ele consegue até uma tal ou qual preponderância.176
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“Combati o bom combate, acabei a minha carreira, guardei a fé” (2Tim 4:7)
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Se alguém quiser ter o inferno na vida, seja egoísta. Viva para o dinheiro, para coisas gostosas e para sugá-las: terá a ilusão de que foi feliz, mas viveu num inferno. Plinio Corrêa de Oliveira
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Se a felicidade é o que todos querem, é legítimo perguntar se o idealismo trará a felicidade. E a resposta é: sim. Não só a felicidade, mas também a alegria. De outro lado, levar uma vida voltada para o egoísmo é o caminho mais curto para a tristeza; é, como diz o autor, “o inferno na vida”.
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A autêntica alegria é o prêmio
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omo é bela a vida de um homem que, quando era jovem, recusou toda espécie de prazeres e se empenhou desinteressadamente na luta; e, na orla da maturidade, vê que tem ainda um largo cabedal de forças, de possibilidades para empenhar, a fim de que a luta chegue até à vitória!177 Não existe verdadeira alegria senão em Nosso Senhor Jesus Cristo, ou seja, à sombra da Cruz. Quanto mais o homem se mortifica, tanto mais fica alegre; quanto mais procura os prazeres, tanto mais se torna triste. É por isso que, nos séculos de apogeu da Civilização Cristã, ele era alegre: basta pensar na Idade Média. Hoje, quanto mais se vai ‘descatolicizando’, tanto mais se torna triste. Esta transformação se vai acentuando de geração em geração. O homem do século XIX, por exemplo, não possuía mais a deliciosa “douceur de vivre”178 do século XVIII. Mas como era mais cheio de paz e bem-estar interior que o de hoje!”179
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Hino do idealista Quem somos nós?
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s que não dobram os dois joelhos, e nem sequer um joelho só, diante de Baal.180
Os que temos a vossa Lei escrita no bronze de nossa alma, e não permitimos que as doutrinas deste século gravem seus erros sobre este bronze, que sagrado vossa Redenção tornou. Os que amamos como o mais precioso dos tesouros a pureza imaculada da ortodoxia, e que recusamos qualquer pacto com a heresia, suas obras e infiltrações. Não poupamos a impiedade insolente e orgulhosa de si mesma, o vício que se estadeia com ufania e escarnece a virtude.181
Quem somos nós?
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omos filhos e seremos heróis da confiança, os paladinos desta virtude! Quanto mais os acontecimentos parecerem desmentir a voz da graça que nos diz — “vencereis” —, tanto mais acreditaremos na vitória de Maria!182
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Quem somos nós?
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a tormenta, na aparente desordem, na aparente aflição, na quebra aparente de tudo aquilo que para nós seria a vitória, somos aqueles que confiaram, que jamais duvidaram, mesmo quando o mal parecera ter vencido para sempre.183
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Oração do idealista
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Virgem Mãe Nossa Senhora de Fátima, que anunciastes ao mundo tão extremas aflições e tão extremas alegrias, revelando os terríveis castigos e os grandes triunfos por que passará a Cristandade; Vós que denunciastes com tanta clareza os extremos de abominação moral a que chegamos, e ao mesmo tempo nos fizestes ver a plenitude de vossa insondável santidade, eu Vos suplico que mudeis meu espírito. Não permitais que eu continue sendo uma dessas incontáveis pessoas de horizontes curtos e de interesse circunscrito à pequena esfera de seu próprio eu. Fazei, pelo contrário, com que, pela despretensão e pela abnegação, eu seja uma alma aberta e ardente, capaz de medir em toda a sua extensão os extremos que em Fátima se divisam. E de tomar posição intransigente e completa a favor do extremo sacrossanto que sois Vós, ó minha Mãe. Extremo de amor de Deus, extremo de pureza, extremo de humilde despretensão, extremo de inquebrantável combatividade!184
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Aos pĂŠs do altar, o cavaleiro reza
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Notas 1. Comitê sobre Adolescência do Grupo para o Adiantamento da Psiquiatria (EUA), Dinâmica da adolescência, Ed. Cultrix, São Paulo, 2a. ed., 1974, pp. 105-107. 2. Em 2-1-1994. 3. Reunião para jovens em 20-10-1984. 4. Aqui termina a reconstituição. 5. Gen. 22, 2 ss. 6. Em 12-12-1976. 7. Mt. 15, 21-28. 8. Pois ela era uma pagã. 9. Em 21-10-1970. 10. São Luís Maria Grignion de Montfort, Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, tópico 103. 11. Em 2-11-1971. 12. Em 5-8-1975. 13. Em 12-8-1979. 14. Em 5-8-1975. 15. Em 5-8-1975. 16. Em 5-8-1975. 17. Em 5-8-1975. 18. Em 5-8-1975. 19. Em 5-8-1975. 20. Mais ainda: Plinio Corrêa de Oliveira foi o mais votado, sua votação era o dobro da do segundo colocado, e até hoje, passados mais de 70 anos, só houve um deputado federal com votação percentualmente maior que a dele. 21. Em 5-8-1975. 22. Em 5-8-1975. 23. Em 5-8-1975. 24. Não se trata aqui da doação de objetos materiais, mas um dar espiritual, de dedicar-se por algo na linha da consagração a Nossa Senhora. 25. “A estética do universo e a consagração a Nossa Senhora”, palestra de Plinio Corrêa de Oliveira em Congresso da Ordem Terceira do Carmo. 26. Em 23-2-1990. 27. Revolução e Contra-Revolução, I, XI. 28. L’homme chrétien et l’homme marxiste, Semaines de la pensée marxiste – Confrontations et débats, La Palatine, Paris-Génève, 1964, p. 64. 29. Plinio Corrêa de Oliveira, Nobreza e elites tradicionais análogas, (Ed. Civilização, Porto, 1992) pp. 300-301. 30. Em 22-2-1995. 31. Em 14-4-1974. 32. Reforma Agrária – Questão de Consciência, Editora Vera Cruz, São Paulo, 1960, pp. 76-77. 33. São Tomás de Aquino, Suma Teológica, IIa., IIae.q. 129. 34. Reforma Agrária – Questão de Consciência, Proposição 3. O livro citado
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é célebre, escrito por Plinio Corrêa de Oliveira em colaboração com Dom Geraldo de Proença Sigaud, Arcebispo de Diamantina, Dom Antonio de Castro Mayer, Bispo de Campos e o economista Luis Mendonça de Freitas (Ed. Vera Cruz, São Paulo, 1960). 35. Sem data. 36. “Folha de S. Paulo”, 7-2-1971. 37. Mt. 6, 28. 38. Mt. 19, 14. 39. Em 27-9-1970. 40. Em 15-1-1969. 41. Em 2-2-1975. 42. Em 15-5-1976. 43. Em 16-8-1968. 44. Em 18-4-1981. 45. Sem data. 46. Circular 1-3 (esgotada). 47. “Folha de S. Paulo”, 16-10-1983. 48. Lepanto: batalha naval contra os muçulmanos, vencida pelos cristãos comandados por Dom João d’Áustria. Em 1571, próximo à Grécia. 49. Em 1-9-1989. 50. Em 21-1-1990. 51. “O Crime de Sancho Pança”, “Legionário” n.º 186-2, 8-12-1935. 52. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 53. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 54. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 55. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 56. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 57. “Legionário”, n.º 186-2, 8-12-1935. 58. Proudhon, Pierre-Joseph (1809-1865): publicista francês socialista, propulsor da luta de classes e autor da famosa frase “a propriedade é um roubo”. 59. “Legionário”, nº 186-2, 8-12-1935. 60. “Legionário”, 2-13-1944. 61. Escrito estando Hitler ainda em vida. 62. “Legionário”, 2-13-1944. 63. “Folha de S. Paulo”, 14-12-82. 64. “Folha de S. Paulo”, 7-2-1971. 65. “Folha de S. Paulo”, 7-2-1971. 66. “Folha de S. Paulo”, 31-1-1971. 67. “Folha de S. Paulo”, 7-2-1971. 68. “Folha de S. Paulo”, 20-3-1969. 69. Em 27-8-1971. 70. “Catolicismo”, janeiro de 1961. 71. “Legionário”, n.º 184, 10-11-1935 72. Apoc., III, 15, 16. 73. Mt. 5, 37. 74. Circ. 4-07 (esgotada). 75. “Catolicismo” nº 37, janeiro de 1954.
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76. Circ. 3-05 (esgotada). 77. Mt. 10, 16. 78. “Legionário”, 24-05-42. 79. Imponderável: “pondus” em latim é peso. Imponderável, literalmente seria o que não tem peso: sutil, indefinível, impalpável. Por exemplo, um pôr-do-sol pode ter um imponderável alegre, melancólico, trágico, animador, esplendoroso. 80. Em 2-2-1972. 81. Em 2-2-1972. 82. Em 2-2-1972. 83. Em 2-2-1972. 84. Em 2-2-1972. 85. Em 2-2-1972. 86. Em 2-2-1972. 87. “Catolicismo”, n° 12, dezembro de 1951. 88. Em 2-2-1972. 89. Em 2-2-1972. 90. Hoje santo canonizado. 91. Em 2.2.1972. 92. “Legionário”, n.º 476, 26-10-1941. 93. “Legionário”, n.º 475, 19-10-1941. 94. Em 20-10-1974. 95. O “Legionário”, na origem jornalzinho paroquial de Santa Cecília, em São Paulo (Capital), transformou-se, sob a direção de Plinio Corrêa de Oliveira até 1947, em jornal oficioso da Arquidiocese de São Paulo, recebendo dele e de vários futuros membros da TFP numerosas colaborações. 96. Em 29-4-1967. 97. “Catolicismo”, nº 501. 98. “Folha de S. Paulo”, 28-10-1978. 99. Em 15-6-1995. 100. “Legionário”, n.º 476, 26-10-1941. 101. “Corações ao alto!” Do prefácio da Missa. 102. Cfr. Mt. 10, 16. 103. “Legionário”, nº 476, 26-10-1941. 104. Reforma Agrária, Questão de Consciência, op. cit, p. 84. 105. Reforma Agrária, Questão de Consciência, op. cit, p. 83 ss. 106. Reforma Agrária, Questão de Consciência, op. cit, p. 83 ss. 107. “Folha de S. Paulo”, 28-11-1971. 108. “Folha de S. Paulo”, 20-9-1970. 109. Em 27-5-1967. 110. Reforma Agrária, Questão de Consciência, op. cit, p. 84. 111. Em 20-10-1974. 112. A Cidade de Deus, cap. VIII, 11°. 113. Em 20-10-1974. 114. Em 21-8-1971. 115. “Folha de S. Paulo”, 14-12-1982. 116. Em 20-10-1974. 117. Em 12-7-1971.
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118. Em 3-7-1971. 119. Em 22-1-1976. 120. Reforma Agrária, Questão de Consciência, op. cit, p. 200. 121. Em 25-3-1973. 122. Da liturgia católica (Precônio Pascal). 123. Em 16-5-1981. 124. “Legionário”, no 409, 14-7-1940. 125. “Folha de S. Paulo”, 7-2-1971. 126. Em 2-6-1975. 127. Em 2-6-1975. 128. Mt. 5, 10. 129. Mt. 27, 46. 130. Em 2-6-1975. 131. Em 17-3-1992. 132. Letra original da popular canção natalina “Noite Feliz”. 133. Em 22-12-1984 134. Em 2-6-1975. 135. Mt. 5, 10. 136. Em 2-6-1975. 137. Em 20-9-1970. 138. Em 20-9-1970. 139. Em 4-9-1989. 140. Em 12-4-1976. 141. Em 12-4-1976 142. Em 28-11-1966. 143. Em 14-1-1964. 144. Em 28-11-1966. 145. Em 28-11-1966. 146. Em 28-11-1966. 147. Em 28-11-1966. 148. Em 3-9-1983. Era Santa Teresinha do Menino Jesus. 149. Em 1º-2-1973. 150. Em 29-8-1966. 151. Em 12-9-1974. 152. Em 14-8-1966. 153. Em 28-11-1966. 154. Em 16-8-1983. 155. O Albatroz, Charles Baudelaire, tradução de Guilherme de Almeida: Às vezes, por prazer, os homens de equipagem Pegam um albatroz, enorme ave marinha, Que segue, companheiro indolente de viagem, O navio que sobre os abismos caminha. Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas, Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado, Deixa doridamente as grandes e alvas asas Como remos cair e arrastar-se a seu lado.
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Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo! Ave tão bela, como está cômica e feia! Um o irrita chegando ao seu bico em cachimbo, Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia! [...] Exilado no chão, em meio à corja impura, As asas de gigante impedem-no de andar. 156. Em 12-9-1973. 157. 1º Livro dos Macabeus, 5, 55-62. 158. Citado de memória. O texto exato é: “Por que nasci eu para ver a ruína de meu povo? De que nos serve pois o viver ainda? (I Mac. II, 7 e 13). 159. Em 6-7-1968. 160. Em 4-5-1988. 161. Do latim. “Do ut des”: dou para que dês. “Facio ut facias”: Faço para que faças. O interesse para quem assim pensa é o fundamento do ato de dar ou de fazer. 162. Circ. 7-05 (esgotada). 163. Em 23-7-1966. 164. Do Glória da Missa. 165. Em 21-10-1970. 166. Dedicatória do livro Nobreza e elites tradicionais análogas, de Plinio Corrêa de Oliveira. 167. Revolução e Contra-Revolução, II, cap. 2. 168. Em 16-6-1988 . 169. “Folha de S. Paulo”, 5-4-1970. 170. Revolução e Contra-Revolução, traduzida para muitas línguas e qualificada de “profética” pelo renomado teólogo Pe. Anastasio Gutiérrez C.M.F., é a obra que contém a súmula do pensamento de Plinio Corrêa de Oliveira. 171. Em 18-12-1992. 172. Em 27-3-1981. 173. Nobreza e elites tradicionais análogas, de Plinio Corrêa de Oliveira, 137. 174. Nobreza e elites tradicionais análogas, de Plinio Corrêa de Oliveira, 137. 175. Nobreza e elites tradicionais análogas, de Plinio Corrêa de Oliveira, 137. 176. Nobreza e elites tradicionais análogas, de Plinio Corrêa de Oliveira, 137. 177. “Legionário”, 1-1-44. 178. Do francês: doçura de viver. 179. “Catolicismo”, n. 29, maio de 1953. 180. Baal: em sentido próprio, ídolo dos fenícios. Na frase, Baal é o ídolo do mundo moderno, a Revolução. 181. “Legionário”, 22-10-1946. 182. Em 20-12-1991. 183. Em 9-8-1995. 184. Em 8-5-1971.
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Não n1e rnove, rneu Deus, para querer-Te, Aquele Céu que 1ne tens pron1etido. Nen, me n1ove o Inferno tão temido Para que, assiin, eu deixe de ofender-Te. Tu me inoves, Senhor. Move-n1e ver-Te Cravado nun1a Cruz e escarnecido. Move-n1e ver teu corpo tão fe1ido Movem-1ne tuas ofensas e tua 1no1te. Move-n1e, por fim, teu amor, e de tal n1aneira Que aü1da que não houvesse Céu, eu Te a1naria; e ainda que não houvesse Inferno, Te te1neria. Nada tens de 1ne dar porque Te queira. Ainda qt1e o que espero não esperasse, Te quere1ia o n1esn10 que Te quero. ' Santa Teresa de Avila
Cristan.dade não é de 11enhLu11 1nodoasociedade idealtnente bem organizada, em que tudo funciona bem,, mas é mLiito 111ais. E a ordem de coisas em que o espírito hun1ano subiu tão alto que ele se exprime em símbolos nos qt1ais o homen1 julga superada toda a beleza contenível nesta Terra e se lembra do Paraíso - julga superada. qualitativamente a própria belez~1 do P~traíso e se lembra do Céu. Plinio Corrêa de Oliveira
[SBN 978-85-7206-197-1