Praler #27

Page 1

27 número

AGOSTO DE 2014

UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO - FACULDADE DE ARTES E COMUNICAÇÃO - CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO

Solta o

verbo A entrevista é a base do jornalismo. Ela fundamenta a notícia ou é o texto da notícia em si. Reunimos o que de melhor o NEXJOR extraiu delas em 2013 em uma só edição


2 SUMÁRIO 3. Ignácio de Loyola Brandão

A inestimável contribuição de um “simples cronista”

10. Ana Márquez / Andrea de la Puente

4. Maria Luisa Camozzato

11. De Madrid para Passo Fundo

5. Laurindo Ferrão

12. Emanuele Colussi Pelo fim dos rótulos

“Nós vamos fazerum Brasil sem Frestas” Da fotografia analógica para a digital 6. Vinícius Campos

Pensamiento español en la abertura de la Jornada

13. Duda Rangel, Emerson e Anderson Corso

Com vocês, o sonhador

Duda, os irmãos Couto e as desilusões

7. Laura Muller

14. Marcello Canellas

Vamos falar sobre sexo? 8. iana Lichtenstein Corso

Por um jornalismo mais humanizador

9. María Rosal Nadales

15. Giovani Grizotti/ Fábio Almeida O trabalho de quem vai além da notícia

Olhares de Diana

“El elemento erótico es lo que vende.”

O jornal PraLer/Zer é uma publicação do Núcleo Experimental de Jornalismo da Agecom/UPF. Toda a produção textual é composta por contribuições voluntárias dos alunos da Faculdade de Artes e Comunicação e estagiários no Núcleo Experimental de Jornalismo.

REDAÇÃO n Supervisão geral Bibiana de Paula Friderichs n Editor Fábio Luis Rockenbach n Edição de arte Marcus Vinícius Freitas n Diagramação Marcus Vinícius Freitas ATENDIMENTO AO LEITOR Nathalia Dall’Agnol

Conselho Editorial: Bibiana de Paula Friderichs, Fábio Luis Rockenbach, Luis A. Hofmann, Cassiano Del Ré, Sônia Bertol, Olmiro Cristiano Lara Schaeffer, Otávio Klein e Arthur Ferraz. Projeto Gráfico Editorial: João Carlos Tiburski (in memorian), Luis Hofmann e Fábio Rockenbach. Universidade de Passo Fundo: Reitor: José Carlos Carles de Souza; Vice-Reitora de Graduação: Rosani Sgari; Vice-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Leonardo José Gil Barcellos; Vice -Reitora de Extensão e Assuntos Comunitários: Bernadete Maria Dalmolin; Vice-Reitor Administrativo: Agenor Dias de Meira Júnior. Diretor da Faculdade de Artes e Comunicação: Cassiano Del Ré; Coordenadora do curso de Jornalismo: Bibiana de Paula Friederichs

As opiniões expressas em artigos assinados por colaboradores não representam a opinião da Nexjor e são de responsabilidade única de seus autores. ENTRE EM CONTATO CONOSCO NEXJOR - AGECOM Universidade de Passo Fundo - BR 285, Bairro São José - Faculdade de Artes e Comunicação - Prédio D2 - Passo Fundo/RS - CEP: 99052900. Fones: (54) 3316 8489 / (54) 3316 8487 nexjor@upf.br - www.upf.br/nexjor


3

A inestimável contribuição de um “simples cronista” Impulsionador obstinado das letras e um apaixonado pela Jornada Nacional de Literatura desde 1985, Ignácio de Loyola Brandão esbanja bom humor e lamenta os próximos “dois anos de abstinência”.

Fabio Rockenbach Professor - NEXJOR

Loyola: “Eu não entendo a vida, por isso que escrevo. E vou continuar escrevendo, porque nunca vou entender.”

N

ão havia sequer emissoras de televisão na coletiva final da segunda edição da Jornada de Literatura em 1985. Se tanto, três jornalistas conversando com Tania Rösing para uma avaliação da Jornada. Mesmo assim, o paulista Ignácio de Loyola Brandão, que pela primeira vez acompanhava a manifestação literária, fez uma promessa à nova amiga, coordenadora das jornadas: “Vou usar isso em todas as entrevistas que eu der nas próximas semanas, e vou falar da jornada”. “Isso”, em questão, era um moletom que havia sido concebido naquele ano, ideia interna dos envolvidos, com os escritos LITERATURA NO PEITO. E Loyola cumpriu a promessa: falou da Jornada no programa de Jô Soares e no programa Roda Viva, da TV Cultura. Da promessa cumprida até 2013, foram outras 13 edições de Jornada, e a importância de Loyola para o sucesso não é desprezado por ninguém. Muito menos por Tania Rösing, que credita o crescimento e o reconhecimento, em boa parte, graças à parceria, ideias e a colaboração do consagrado escritor. Loyola acompanha Rösing, também, quando lembra da pouca repercussão das primeiras edições, do cerco da mídia nos tempos atuais e de certos absurdos envolvendo as verbas destinadas à cultura no Brasil. - Hoje me sinto no festival de Cannes, de Gramado. Minha primeira grande surpresa nesse ano foi o novo portal. Tania sonha um novo portal em alvenaria, e está lutando por isso. Mas veja só: o governo liberou que um filho de um estilista de São Paulo possa levantar 2 milhões de reais para fazer desfiles em Paris. Para a cultura, para a jornada, NADA. É JorNADA mesmo, bem explícito. - alfineta, com um humor peculiar que já é marcante. É o humor, aliás, que torna Ignácio um dos grandes sucessos da Jornada, a cada edição. Um humor que mescla ironia, sarcasmo, tiradas geniais e

tido, para o público. Não era só um coordenador, era um mediador, um mestre na arte de enrolar.” diz, emocionado, após relembrar o balão que subiu ao palco durante um debate e posicionou-se ao seu lado, um episódio que o marcou na edição de 2013.”Era a alma do Alcione conosco ali, no palco.” Loyola partiu, no sábado, para um novo período de abstinência até 2015, quando os palcos e corredores da Jornada receberão mais uma vez o autor das bem humoradas frases que ajudam a embalar a Jornada a cada edição. Um pequeno punhado dessas frases, ditas em pouco mais de meia hora, exemplificam o que é sentar em frente a esse senhor que se diz um “mero” cronista desses anos de convívio entre as letras e o público.

Loyola em trinta minutos “A gente faz porque gosta do que faz, da literatura, da jornada... e ama e odeia a Tânia” Entre risos, sobre o prazer de vir à Jornada “Guto Lins criou a transmidia do livro.”

uma simpatia que encanta o público e se torna o grande fio condutor dos debates. Apesar do humor, não deixa de lado a oportunidade de fazer críticas a quem ainda não entendeu a grandeza da Jornada. Criticou sem citar nomes - autores que se comprometem com meses de antecedência e, na última hora, “dão para trás”. Rasga de elogios o caráter formador de leitores e de opinião da Jornada e sua capacidade de dialogar com a realidade contemporânea. ”O tema da Jornada foi pensado um ano atrás, em cima da juventude. E o que a juventude fez esse ano? Foi às ruas. A Jornada tem antecipado temas.” A ligação com a Jornada e com as milhares de pessoas que prestigiam e participam da jornada criou um vínculo de Loyola com Passo Fundo que foi premiado, em 2013: Loyola é, oficialmente, detentor do mais

recente título de Cidadão PassoFundense. “Sou cidadão passofundense e já comprei o livro do Fischer para aprender a falar em gaúcho. Só preciso aprender o tom do “bah”, que eu ainda não peguei bem” explica, bem humorado. O papo com Loyola, após a coletiva final de Tania Rösing no último dia da jornada, é um contagiante tempo passado ao lado de tiradas espontâneas e lembranças dos anos de parceria com a Jornada, “um vício sério”, segundo ele. “A abstinência de dois anos é complicada pra mim.” Complicada, a partir de agora, também é a ausência de Alcione Araújo, parceiro de anos no palco e nos dias de Passo Fundo. “A ausência do Alcione Araújo foi complicada. Ele levantava elétrico, já pensando no que fazer no palco, em relação à brincadeiras, a algo diver-

“É uma nova categoria de parlamentares no Brasil.” Sobre a manutenção do mandato do deputado Natan Donadon, condenado a 13 anos e 4 meses de prisão “Aqui (em Passo Fundo) a gente compra um livro e a moça diz “vinte mais sessenta”. A partir de hoje passo a dizer minha idade como “cinquenta mais vinte” “Essa é uma jornada de formação, mas que está sempre em formação.” “Eu não entendo a vida, por isso que escrevo. E vou continuar escrevendo, porque nunca vou entender.” “Vocês jamais saberão o que tem dentro daquela xícara.” Sobre a xícara que mantém ao seu lado durante a mediação no Palco de Debates


Entrevista

4

“Nós vamos fazer um Brasil sem Frestas” Idealizadora do movimento que usa embalagens TetraPak para melhorar condições térmicas de casas em bairros pobres de Passo Fundo, Maria Luisa Camozzato relembra como surgiu a iniciativa e fala dos planos para o futuro do projeto. te as que são cheias de frestas. Eu achava que tinha que ter uma solução. Era impossível ficar esperando que alguém doasse madeira, ou que os moradores conseguissem comprar, já que eles têm dificuldade até para comprar comida. Fiquei durante duas horas pensado numa solução. Como estudei química industrial, já tinha uma noção de como é feita a embalagem Tetrapak e vi que era o material ideal.

Daniel Santos

Acadêmico do Curso de Jornalismo

H

á cinco anos as noites geladas do inverno de muitas famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social em Passo Fundo são aquecidas pela generosa iniciativa da professora aposentada do curso de Química da UPF, Maria Luisa Camozzato. Foi ela quem liderou um movimento chamado Brasil Sem Frestas, que prega que o lixo pode se transformar em solução. O material que faz toda essa diferença são as caixas de leite, também conhecidas por embalagens TetraPak, que com a ajuda de voluntários se transformam em chapas que são fixadas nas paredes das casas, tapando buracos e frestas. O reconhecimento desenvolvido junto à comunidade de Passo Fundo veio através de prêmio. Maria Luisa foi premiada, em março deste ano, com o Troféu Mulheres 2014 na categoria Ações Sociais/Filantrópicas, que reconhece personalidades femininas em diversas áreas. Dona de um sorriso largo e de um abraço acolhedor, aos 57 anos, mãe de duas filhas, uma médica e a outra dentista, ela é incansável quando o assunto é a solidariedade e os olhos claros brilham de entusiasmo quando enxerga o que construiu. Numa quinta-feira do mês de abril, véspera de feriado, ela me recebeu em seu apartamento, que fica na frente da Praça da Igreja Santa Terezinha, no bairro São Cristovão. E foi com generosidade que perguntou: “Aceita um chá, um café ou uma água?” Nosso tempo era curto, pois tinha que cumprir minha jornada na UPFTV, e Maria Luisa se preparava para passar o feriadão de Páscoa com as filhas e esposo. Mas o saboroso chá, preparado pelas mesmas mãos que colam caixas de leite, formando uma chapa térmica, deu tempo de provar.

Praler: Você tem uma dimensão do que significa o trabalho do Brasil Sem Frestas para a comunidade de Passo Fundo? Maria Luisa Camozzatto: Bom, eu não trabalho sozinha nesse projeto. Temos o empenho de dez voluntários, que ajudam, coletam as caixas de leite, cortam e colam uma a uma. Montei o grupo, fizemos alguns testes e a ‘coisa’ começou a funcionar. Consigo ter uma dimensão, sim! No início pegamos casas menores. Às vezes era necessário forrar uma parede só. Hoje, pegamos casas inteiras e colocamos forro também. É um trabalho demorado, mas gratificante. PL: E como surgiu a ideia de criar o Brasil Sem Frestas? MLZ: Foi em setembro de 2009. Chovia muito e era bastante frio. Fiquei com muito medo dentro da minha casa e me dei conta de que havia pessoas em situação de risco em suas casas, principalmen-

A equipe em uma das diversas ações já realizadas em Passo Fundo.

PL: Certamente você conhece muitas histórias destas pessoas que já tiveram suas casas revestidas. Tem alguma que lhe chamou mais a atenção? MLZ: No final de 2013 recebi um telefonema: “Este telefone é de quem é responsável pelo projeto das caixinhas de leite?” Respondi que sim e me identifiquei. No outro lado da linha era a Janete. Ela foi logo falando que tinha visto uma reportagem no Jornal da Uirapuru e ficou pensado se poderia aplicar as caixinhas em parede de tijolo, pois o quarto era muito frio e pensei que talvez estas embalagens pudessem ajudar. Disse que seria possível e que existiam duas maneiras: colar com cola de sapateiro ou fazer uma armação com ripas de madeira na parede e depois fixar as embalagens. Expliquei que o melhor seria colocar o alumínio virado para dentro da casa, já que o problema era o frio e não a umidade. Pedi que depois de testado me desse um retorno. No início de 2014 a notícia: “Deu certo com a cola!. A senhora tem mais embalagens? E depois podem fazer o forro para min?”. Eu disse que sim. Qual foi a minha surpresa quando conheci a Dona Janete Xavier Mignoni, 71 anos, e seu marido, Luís Mignon, 69 anos. Pessoas extremamente dispostas e com uma vontade imensa de lutar para solucionar seu problema com o frio e a falta de conforto térmico. O entusiasmo dos dois era tanto que fornecemos as chapas térmicas prontas, pois eles mesmos se dispuseram a fazer o forro com o nosso empréstimo e também de um grampeador de estofaria. Terminado o trabalho, fui visitá-los. A emoção foi imensa, o capricho do trabalho deles foi

insuperável. Eles, com a ajuda filha, reciclaram, ajudaram o meio ambiente, proporcionaram maior saúde à sua família pelo aumento de conforto térmico em sua casa. PL: O projeto está se expandido, na semana passada vocês foram a Sertão. Como foi a experiência lá? MLZ: A convite da Secretária de Assistência Social de Sertão, Nadir Nardi Dall’ Agnol, nos deslocamos àquela cidade para ministrarmos um curso sobre o Projeto Brasil Sem Frestas, visando à aplicação do mesmo em Sertão. Este convite representa atingir as metas do Brasil Sem Frestas, isto é, espalhar a ideia do projeto para outras localidades, a fim de aumentar o número de pessoas favorecidas.

Me inquietava, pois queria encontrar alguma alternativa que solucionasse esses problemas. E acho que está dando certo, né? PL: E a Maria Luisa Camozzato criança imaginava que faria o bem quando crescesse? MLZ: Quando criança, me preocupava muito com o bem estar das pessoas e do nosso planeta. Me inquietava, pois queria encontrar alguma alternativa que solucionasse esses problemas. E acho que está dando certo, né? PL: Recentemente você foi premiada com o Troféu Mulheres, e no ano passado o Projeto Brasil Sem Frestas conquistou a 2° colocação no Green Project Awards Brasil 2013, na categoria Mobilização. Como você avalia esse reconhecimento? MLZ: São importantes, pois nos dão ainda mais vibração, coragem e entusiasmo. Nós vamos fazer um Brasil sem frestas.


Entrevista

5

Da fotografia analógica para a digital “Quando percebemos que essa nova tecnologia tinha se estabelecido de vez, também veio a dúvida, se os estúdio fotográficos ainda tinham chance no mercado”, lembra Laurindo Ferrão

Luana Hemerich Estagiária NEXJOR

A

s pessoas que foram introduzidas à fotografia nos últimos anos se depararam com uma nova era, a fotografia digital. Aos fotógrafos da era anterior restou somente a adaptação e o reaprendizado. Laurindo Ferrão fundou a empresa Ferrão Fotografias (hoje Grupo Ferrão) em 1975, e indiscutivelmente passou por essa transição. No seu princípio, a Ferrão Fotografias era analógica. Hoje é equipada por câmeras digitais, duas impressoras e vários computadores. Ferrão aceitou falar sobre o momento da fotografia em que nos encontramos hoje, e o que ele passou quando iniciou. Você iniciou na “era analógica”, na fotografia com filme. Como era fotografar nessa época? Ferrão: Em comparação com o hoje, era sim mais complicado, mais demorado. As câmeras eram muito mais simples e muito mais baratas. A fotografia analógica é mais física e não havia o luxo de ver a imagem logo após captura-la. E as câmeras também tinham maior durabilidade no mercado, hoje elas são superadas tecnologicamente muito rápido. Praler: Qual foi o principal motivo que o fez considerar a fotografia digital? E como ocorreu a adaptação de equipamentos e dos profissionais que trabalhavam com você? Ferrão: Adaptação com certeza foi a palavra chave. Foi necessário se adaptar ao mercado, adaptar os equipamentos e principalmente os funcionários. Quando a fotografia digital surgiu tudo era muito caro e diferente, ninguém sabia onde ia parar, ou se ela ia realmente prevalecer sobre e fotografia analógica. Quando percebemos que essa nova tecnologia tinha se estabelecido de vez, também veio a dúvida, se os estúdio fotográficos ainda tinham chance no mercado.

Praler: E com essa dúvida, em que momento vocês perceberam como permanecer no mercado, já que as fotografias se tornaram mais caseiras. Todos possuem uma câmera compacta ou um celular com câmera fotográfica. Ferrão: As pessoas têm sim câmeras, mas as fotografias que elas fazem em casa não são fotografias que elas realmente vão guardar e colocar em álbuns. A não ser fotos de viajem, mas mesmo assim mesmo elas vem até aqui para “revelar as fotos”. Nos adaptamos á isso também, os clientes podem trazer o telefone ou o cartão de memória e imprimimos a foto na hora. Mas eles ainda fazem fotos em estúdio, com a família ou apenas para mostrar para a família depois, com a foto manipulada e até mesmo ampliada. Praler: A edição e a manipulação surgiram com a fotografia digital, foi necessário contratar um novo profissional para esse trabalho? Ferrão: Sim, agora existe um profissional capacitado especialmente para isso. Esse processo é mais demorado do que fotografar, é nele onde é corrigida a cor da foto, e alteradas pequenas imperfeições na pele dos clientes. Com esse processo também poupa tempo na hora de fotografar, o fotógrafo já não precisa mais pensar tanto nos detalhes de exposição, o que facilita muito apesar tirar toda a aura da fotografia que é estudar o ambiente e explorar deferentes possibilidades. Praler: Esse processo mudou a forma de fotografar, a forma de pensar na fotografia. Em comparação com o antes e o agora, como a manipulação de imagens chegou ao mercado e como ela foi recebida pelo fotógrafo? Ferrão: Exato, com a manipulação das imagens a fotografia não precisa mais ser pensada. O fotógrafo muitas vezes se descuida na hora de capturar a cena, pois sabe que pode ser corrigido depois. O profissional deixa a criatividade de lado, pois sabe que

Ferrão fundou a empresa de fotografias há quase quatro décadas e, de acordo com ele, a era digital da fotografia mudou totalmente a forma de se fotografar.

até mesmo o enquadramento da foto pode ser melhorado depois. Tornando-se muitas vezes preguiçoso e dependente da manipulação. Praler: E os equipamentos? Foi necessário investir em mais computadores? Ferrão: A fotografia digital só estará completa se estiver acompanhada de computadores, onde as fotos são armazenadas e manipuladas. Para um produto de qualidade é necessário um computador com muito espaço no HD e monitores calibrados, para que as imagens impressas saiam das mesmas cores que às vemos no computador. É necessário um investimento pesado em servidores e HDs externos com muito espaço. Praler: E quanto ao armazenamento das fotos? Ferrão: Hoje armazenar as fotos pode ser tanto mais fácil, pois as fotos não ocupam espaço físico,

não ficam trancadas nas gavetas, mas também se tornou mais difícil, pois os arquivos precisam ser catalogados e organizados, fazemos back up diário para que nada se perca, os arquivos se tornaram mais frágeis, pois por qualquer descuido podem ser apagados. Praler: A fotografia analógica ainda tem vez no mercado? Ferrão: Não. Como um hobby talvez, mas o processo da fotografia analógica é muito demorado, as pessoas já se acostumaram com a era digital, não só com a fotografia, mas com tudo sendo feito e recebido muito rápido. Elas não querem esperar para ver as fotos. Tanto os fotógrafos profissionais quanto os amadores já estão acostumados com a experiência digital, onde você vê, fotografa, visualiza, delega e fotografa novamente. Na fotografia analógica o fotografo precisa garantir a foto no momento em que está tirando.


Entrevista

6

Com vocês, o sonhador Vinicius Campos! Falar sobre amor em tempos de blogs é uma especialidade do jornalista, escritor e ator Vinícius Campos

Eduarda Ricci Perin Estagiária NEXJOR

O

amor nos tempos modernos, para o sociólogo Zygmunt Bauman, é rápido e intenso. Assim, também foi nosso bate -papo (sobre o amor) com Vinicius Campos! Confere aí: PL: No O amor nos tempos de blog, você fala sobre os surdos. Qual é a tua relação com eles e por que você diz que os surdos te fizeram enxergar o mundo com outros olhos? VC: Em um carnaval, há muitos anos atrás, eu tinha terminado um namoro e estava meio deprê e fui para o Recife. No Recife, minha prima falou: A gente vai para Olinda na casa com uns amigos. Eu cheguei lá e eram todos surdos. Foi um impacto, porque eu e minha prima eramos os únicos ouvintes e eu não conhecia surdos. Eu descobri um mundo novo. [..] Conhecendo os surdos descobri o silêncio, que não é um silêncio da alma, é um silêncio auditivo. A alma tem muita coisa para comunicar, e o surdo tem um jeito de ver e viver a vida intensamente, um jeito que as vezes um ouvinte não tem. O surdo te olha e sabe o que se passa na tua alma. [...] Eu sempre vou ter personagens surdos porque é um universo que me apaixona. PL: Gabriel García Márquez, em O amor nos tempos do cólera fala de um amor duradouro. Você escreve sobre um amor que a gente não sabe se vai durar ou não. Você acha que o amor já não é como no tempo de Gabriel? VC: O amor, infinito ou não infinito, não é de agora ou de antes. Ele é da vida, próprio do amor. O amor é uma transformação. E é como falou Vinicius de Morais, eterno enquanto dure, não importa o quanto dure. Tomara que a gente tenha, ao longo da vida, a possibilidade de ter vários amores. Tomara que o Ariza (personagem do livro O amor nos tempos de blog) tenha um amor aos 13, depois aos 15, depois aos 16 até encontrar a pessoa que vai acompanhar ele o tempo que for possível. O amor é eterno. [...] O amor pode não funcionar como casal,

mas o amor pela pessoa não desaparece. PL: Você diz que é um sonhador. Você sonha em ter ou tem um amor como nos livros que você escreve ou nos livros de Gabriel García Marquéz? VC: Eu tenho um amor. No momento eu estou apaixonado. Que seja eterno enquanto dure, tomara que dure muito tempo e se não durar, é próprio do amor! [...] Eu acho lindo me apaixonar e estar apaixonado por uma só pessoa, mas eu também acho linda a possibilidade de conhecer novas pessoas e voltar a me apaixonar, e voltar a me apaixonar. [...] Eu quero viver apaixonado a vida inteira. Com um só amor, ou vários, mas apaixonado.

Eu quero viver apaixonado a vida inteira. Com um só amor, ou vários, mas apaixonado.

Um pouco sobre o Vini… Vinicius é jornalista, escritor, ator e apresentador. Ele vive na Argentina há oito anos, mas nasceu em São Paulo onde começou sua carreira atuando em comerciais de TV. Apaixonado pela comunicação, Vini formou-se como ator no Studio Fátima Toledo e trabalhou com atuação e produção de teatro. Desde 2008, apresenta o programa Casa do Disney Jr. do Disney Channel. Vinicius Campos veio para debater sobre faces na rede e falar sobre seu livro: O amor nos tempos de blog. Durante o bate-papo no Palco de Debates de sexta-feira e sua estadia na Jornada, Vini – viciado em internet, principalmente Instagram, Twitter e Facebook - postou várias fotos da Jornada no Instagram e tuitou muito!

Inspirado na obra O amor nos tempos do cólera de Gabriel García Márquez, Vinicius Campos escreve O amor nos tempos de blog. Um menino que acabou de chegar à nova escola, está apaixonado por uma garota que encontrou na biblioteca e decide escrever um blog para contar sobre o seu amor e sua vida. E, de blog em blog, a história se enrola e desenrola!


7

Entrevista

Vamos falar sobre sexo? Discussão sobre sexo, afetividade e o corpo esteve entre as mais prestigiadas pelo público jovem, e contou com a participação de Laura Muller

Eduarda Ricci Perin Estagiária Nexjor

S

exo, corpo e afetividade são temas que a Jornada, preocupada com as leituras jovens no mundo, discute. Quando pensamos em alguém que fale sobre esses assuntos sem preconceitos, tabus e de jeito jovem e acessível, lembramos de quem? Certamente, muitos pensaram em Laura Muller! O sucesso da jornalista e psicóloga no programa Altas Horas, principalmente entre os jovens, fez com que a Jornada de Literatura que é espaço também de debate, convidasse a sexóloga para um bate-papo com os leitores. Com um sorriso no rosto e seu jeito espontâneo e jovem, Laura Muller bateu um papo com a gente e você confere tudinho: PraLer: A Jornada tem como tema a leitura jovem, como você acha que o jovem vê o sexo? Laura Muller (LM): O mundo jovem está cada vez mais buscando informações sobre sexualidade e isso é muito positivo. O jovem adora participar do programa Altas Horas, as perguntas. E, cada vez mais, salões literários, escolas e eventos em geral falam do mundo jovem. Praler: O que o jovem quer saber sobre sexo? (LM): Três grandes eixos: como evitar e lidar com gravidez fora de hora, doenças sexualmente transmissíveis e sobre a prática do sexo em si, que inclui o afeto, o prazer e a diversidade. Praler: Algumas mulheres têm receio em falar sobre orgasmo. Sobre o assunto, você acha que o homem tem mais facilidade em atingir o orgasmo do que a mulher? (LM): O homem tem mais facilidade em atingir o orgasmo e isso tem a ver com a nossa educação sexual muito opressora. Na época de nossas avós e bisavós, por

exemplo, a mulher direita não poderia sentir prazer, ter orgasmo. Hoje, a gente sabe que as mulheres têm direito ao prazer, mas vivemos uma repressão sexual muito forte em cima da sexualidade feminina, então chegamos a um novo milênio com algumas dificuldades. Um terço das mulheres tem dificuldades em chegar ao orgasmo, mas buscando informação e ajuda quando necessário, a sexualidade sai ganhando. Praler: Sobre o livro, Altos Papos sobre sexo: dos 12 aos 80, como surgiu à ideia de escrevê-lo? (LM): Ele é inspirado nos bate -papos do Programa Altas Horas. Eu iria falar só para o mundo jovem, mas como o programa é assistido por todas as idades, eu acabei estendendo até a terceira idade e com o conceito de que a gente pode viver a sexualidade a vida inteira, basta sentir desejo e estar aberto a isso. Nada como buscar informação para a sexualidade ser vivida de uma forma

Laura Muller com seu livro: Altos papos sobre sexo: dos 12 aos 80, inspirado no bate-papo do Programa Altas Horas

mais saudável, mas responsável e mais prazerosa. Praler: Como você vê o sexo na mídia? (LM): A mídia tem abordado cada vez mais esse assunto. Existe até um bombardeio dessas questões sexuais. A mídia é um veículo poderoso para levar informações das mais variadas. Tem muito conteúdo que não é legal, como a pedofilia. Como um todo, a mídia, incluindo a internet, pode ser usada de maneira positiva. Buscando conteúdos bons e transformando sexualidade que é um assunto tão tabu, em um assunto mais tranquilo para que possamos viver bem com esse tema. Praler: Porque você decidiu se especializar no tema sexualidade? (LM): A minha primeira formação é jornalismo. Me formei nos anos 90 e logo depois surgiu uma vaga de editora de sexo na revista Cláudia. Eu topei o desafio e achei que seria fácil, mas não foi. Tive

que estudar para isso e fiz uma especialização em Educação Sexual. Ao final da especialização, lancei meu primeiro livro e saí dando palestras pelo Brasil a fora. Nas palestras do mundo adulto, as pessoas pediam para que eu atendesse em consultório. E, para isso é preciso ser médico ou psicólogo. Então, fiz psicologia como segunda formação. Conseguiu tirar as suas dúvidas e conhecer um pouco melhor a Laura? O bate-papo termina aqui. Se você quer saber mais é só acessar o site da sexóloga: http://www.lauramuller.com. br/ e ler suas obras: Educação Sexual em 8 lições é um guia para pais e professores sobre como lidar com o tema sexo. Já Altos Papos sobre sexo: dos 12 aos 80 é inspirado no Programa Altas Horas, e é para todas as faixas etárias, indo desde as primeiras mudanças no corpo e as dúvidas que surgem na adolescência, até as relações sexuais e a afetividade dos adultos e idosos.


Entrevista

8

Olhares de Diana Psicóloga e psicanalista, Diana Corso uniu o amor pelos livros com a curiosidade sobre os contos de fadas para entender as transformações de cada época

Edivane Bloedow

Ex-estagiária Nexjor

N

ão são apenas os pés que movem Diana Lichtenstein Corso. Os mistérios dos Contos de Fadas também a fazem viver. A psicóloga formada pela UFRGS e psicanalista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre descobriu na análise de histórias infantis um grande dom: o de entender como a fantasia age em cada um de nós. A mãe de Fadas no Divã: psicanálise nas histórias infantis, de 2005, e Psicanálise na Terra do Nunca: ensaios sobre a fantasia, de 2010, esteve presente na 15° Jornada Nacional de Literatura e conversou com a equipe do Nexjor. Confere aí:

Inserir olho

Diana Corso trabalha com crianças e adolescentes e veio até a 15° Jornada Nacional de Literatura para debater o tema: Corpo, sexualidade e afeto

PL: Primeiramente, você como psicóloga, decidiu analisar Contos de Fadas. Por que essa escolha? DC: Porque existem duas coisas que são eternas e tomara que continuem sendo: os contos de fadas e os livros. Os contos de fadas são muito especiais, porque eles foram se transformando ao longo dos tempos, então eles têm um fator de permanência, a criança conhece, a vovó e a bisavó também conhecem. E o fator de mutação, porque eles foram se transformando para dar conta de outras épocas e nessas transformações podemos descobrir coisas sobre o nosso tempo, já que eles se transformam para responder a cada época.

catástrofe. E a segunda, porque é direito da mulher. Agora, por outro lado, o fato de que eu defenda não quer dizer que a gente deve ignorar o caráter traumático do aborto. É uma experiência dolorosa, é uma experiência que vai fazer aniversário para o resto da vida. Pior teria sido se não pudesse ter sido feito, mas uma vez feito, deixará suas marcas.

PL: Em um trecho do seu livro A Psicanálise na Terra do Nunca você fez um breve discurso sobre o aborto. Você, como mãe e mulher, o que acha dessa polêmica questão? DC: Penso em duas coisas. A primeira é a defesa incondicional do direito do aborto. Gestações acontecem de forma absolutamente indesejada e isso destrói a vida, não só da mulher, mas também de uma criança que vai nascer sem um lugar digno no mundo. É o prenúncio de uma

PL: Hoje nós temos contos de fadas que não são tão de fadas como, por exemplo, o Shrek. Você acha que eles seriam um espelho da realidade, dessa mudança que diz que nem tudo que é bonito pode ser perfeito? DC: Nós escrevemos um capítulo para provar que Shrek é um conto de fadas. Nesse ponto, discordamos de Bruno Bettelheim que escreveu o livro A psicanálise dos contos de fadas. Ele diz que os contos de fadas eram apenas os escritos pelos irmãos Grimm,

dentro daquele cânone. Acreditamos que os contos de fadas se transformam para continuar existindo e Shrek é uma dessas transformações. PL: Você é mãe de duas meninas. Quando contava histórias para elas, como eram suas abordagens? Elas escutaram os contos tradicionais? DC: Pessoas da geração de vocês, que hoje são jovens adultos e a primeira geração purinha internet, se relacionam com a tradição de uma forma interativa, então não existe aquela coisa da escuta passiva. Para as gerações multimídia, é preciso intervir em tudo e isso é uma linda herança da revolução de costumes da década de 60 e veio para ficar. PL: Em seus livros você retrata, de certa forma, a diferença entre os sexos. Diante de todas as questões abordadas em suas

obras, como é trabalhar com o seu marido? DC: A gente briga bastante (risos), é horrível trabalhar comigo, mas ele tem muita paciência e a gente sempre se entende. PL: E pra finalizar: como seria um conto de fadas escrito por você? DC: Se eu tivesse competência, escreveria “Valente”. Retrataria como nunca a jovem mulher, o tornar-se mulher hoje, tendo que se fazer mais mulher. Daria uma trabalheira.


Entrevista

9

“El elemento erótico es lo que vende.” El lector cómplice, y la reescritura y actualización de los cuentos infantis, por María Rosal Nadales

Ana Márquez

Intercambista espanhola - estudante de Jornalismo

M

aría Rosal Nadales, profesora titular en Lengua y Literatura en la Universidad de Córdoba (España). Licenciada en Filología Hispánica y doctora en Teoría de la Literatura y el Arte por la Universidad de Granada. Escritora y poeta, galardonada con varios premios de literatura, entre ellos el premio Carmen de Burgos. En esta 15° edición de la Jornada Nacional de Literatura de Brasil, María Rosal ha participado en el 12° Seminario Internacional de Investigación en lectura y patrimonio cultural, junto a Eloy Martos Nuñez. En su ponencia ha hablado de la reescritura y la evolución del cuento infantil “La Caperucita Roja” de Perrault hasta la actualidad, desmembrando sus significados y significantes. Después de la conferencia nos ha concedido una pequeña entrevista en la que seguimos hablando sobre el tema de la reescritura y la actualización de los cuentos infantiles. PL: La recarga de las producciones artísticas de los últimos años, ¿suponen una distorsión del contexto, cultura y mitología clásica? MRN: Estas nuevas lecturas necesitan de un lector cómplice. Un lector que se preocupe por conocer qué había antes de lo actual, debe conocer los hipotextos: la lectura base sobre la que se reescribe. No produce una distorsión, le provoca un enriquecimiento. PL: ¿Estas reescrituras son producidas por un cambio en la sociedad? MRN: Una reescritura dialoga con el texto del que procede y la sociedad actual. Actualiza el mito desde la actualidad. Puede tener diferentes enfoques, a veces para criticar el hipotexto, para parodiarlo, para reclamar ideas… En el campo del femi-

El problema llega con la eterna obsesión de la mujer por la belleza, vivimos en una tiranía estética.

” nismo, se produce una reescritura para cambiar el estereotipo de la mujer, que ya sabe salir al “bosque de la sociedad”. Cada reescritura tiene un matiz diferente, pero lo importante es que dialogan con el momento contemporáneo pero no deja a un lado el mito. PL: ¿Cómo se produce el cambio de los estereotipos en los mitos? En el caso de Caperucita, ¿por qué se ha introducido un matiz erótico? MRN: En mi opinión, ahora mismo,es una estrategia para atraer a esa lectura. Da igual que mito sea, la mujer sigue siendo una mujer-florero, sólo se pretende vender.

a la normalidad. El disfruzarse de Caperucita tiene que preocupar, los hombres también pueden vestirse de mujeres. El problema llega con la eterna obsesión de la mujer por la belleza, vivimos en una tiranía estética.

PL: ¿Somos muchas veces las mujeres las que provocamos los pensamientos misóginos? ¿Por qué en Carnaval esa tendencia a disfrazarse de “Caperucita sexy”? MRN: El Carnaval es otra cuestión, merece un punto y aparte. En el Carnaval, con la teoría carnavalesca, el mundo cambia las normas, todos podemos hacer lo que queramos esos días pero este acaba, y todo vuelve

PL: ¿Convivimos una sociedad machista en el punto también de la metáfora literaria? MRN: Los medios de comunicación así lo implanta, la mujer siempre tiene que estar bella. En la literatura también se ve sea denigración en la mujer sabia, sólo hay que leer a Moliere, a Quevedo… Tenemos toda una tradición cultural, sobre todo en España, “mujer que sabe latín, no tiene marido ni buen

fin”, dice el refranero. En todo se deba ver el sustrato del patriarcado. PL: ¿Qué otros cuentos, desde la cuestión de la reescritura, tienen una carga interesante? MRN: En Cenicienta, hay un librito desde la reivindicación, “La Cenicienta que no quería comer perdices”, desde una visión fuertemente feminista. Sus ilustraciones son muy agresivas, una Cenicienta fea, alejándonos de la belleza impuesta. La compañía Disney ha participado en esta estandarización de los cánones femeninos, manteniendo una cultura patriarcal que marca los límites de la feminidad dentro de la sociedad.


Depoimento

10

Pensamiento español en la abertura de la Jornada Convidadas a manterem um blog durante a cobertura da Jornada, duas intercambistas espanholas do curso de jornalismo surpreendem-se com uma movimentação que, elas imaginavam, não fosse tão grande: “será que, afinal, a sociedade brasileira não pensa só em futebol?”

Ana Márquez Andrea Gómez de la Puente

Intercambistas do curso de Jornalismo

J

oder, ¡que frio! Brasil, Brasil, calor por los cojones. A este paso acabamos todos convertidos en cubitos de hielo antes de que empiece la abertura. Bueno, ya solo quedan veinte minutos para que empiece. Mejor ir ya para allá... Andrea: “Salir de los bastidores, de la sala de redacción, y entrar en la imponente carpa, como si de un gran festival de música se tratase, buscar un lugar desde donde admirar lo que ahí está sucediendo y sentarse. Ver que en pocos minutos la carpa está repleta de personas expectantes de lo que allí dentro va acontecer. Ana: “Menuda cola, menos mal que con el pase de prensa no hay que hacer esa fila. Esos si que van a ver futuros bloques de hielo como no entren rápido. Aunque dentro tampoco es que haga mucho calor. Al final sí que se ha llenado esto. Apagan las luces…” Andrea: “Estaba estupefacta, iba adquiriendo conocimiento de la dimensión del evento, gracias a las vivencia, relatos, que compartían nuestros compañeros de NexJor, pero nunca imaginé que fuese tan increíble”. Ana: “Una pequeña orquesta comienza a tocar una música ligera, avisando a los espectadores

Estaba estupefacta [...] nunca imaginé que fuese tan increíble.

Ana e Andrea: as intercambistas da terra de Cervantes empolgaram-se com o tamanho da Jornada e a participação do público, principalmente das crianças

del comienzo de la abertura de la jornada. El ritmo se va acelerando y, con él, el silencio de la sala. Una ensoñación, visual, musical, escenográfica, con un juego de luces abundante”. Andrea: “Comienza con la actuación del grupo Coral y Cênico junto con el grupo de danza de la universidad, la aparición en escena de las princesas Disney, así como un gran Rey León y el caballo de Hércules, Pegaso. Todo acompañado de una sinfonía pegadiza que ameniza el frío. Después, Humberto Gessinger nos hace bailar con la

melodía que se ha convertido en el tema de esta jornada, Leituras”. Ana: “Desaparece la música, los bailarines, el Pegaso de cartón-piedra, las luces. Aplausos. Ahora es la entrega del premio Zaffari & Bourbon… Como si dieran un premio Mercadona & Eroski. Proclaman a la premiada Ana María Machado. No hay mucha sorpresa, los 150.000 reales del premio ya estaban ingresados en su cuenta corriente”. Andrea: “Tras repartir el pre-

mio Zaffari & Bourbon a Ana María Machado, por su obra Infâmia, y demás presentaciones y agradecimientos de cortesía, llega el turno de cantar el himno nacional, el himno de Brasil. Si creía que lo había visto todo, estaba equivocada. De repente, toda la carpa se pone en pie, la bandera de Brasil luce en las pantallas y todos cantan el himno al unísono. Me parece muy emotivo, en España es impensable que en un acto cultural suene el himno. Como nota curiosa, me sorprendió que el acto este traducido al lenguaje de signos simultáneamente. En Brasil he encontrado que tienen mucha cultura de ello, es muy gratificante saber lo implicados que están en temas como este”. Ana: “Es increíble la consciencia que tienen en esta ciudad por las personas con problemas auditivos”. Andrea: “Después de la ceremonia, volvemos a la redacción con la satisfacción de haber vivido la jornada desde dentro. Como dice la coordinadora del evento, Tânia Rosing, “agradecimiento es la palabra de esta jornada”. Agradecimiento por vivir esta experiencia junto a personas maravillosas”. Ana: “Será que la sociedad brasileña no sólo piensa en fútbol”.


Entrevista

11

De Madrid para Passo Fundo Ao falar sobre intercâmbio, estamos acostumados a entrevistar brasileiros que foram realizar intercâmbio no exterior, desta vez conversamos com duas espanholas que que fizeram um ano de intercâmbio em Passo Fundo, entre a metade de 2014 e a metade deste ano. Ana Márquez e Andrea Gómez Puente têm 20 anos, são acadêmicas do curso de Jornalismo, ou melhor, Periodismo, que cursavam na Universidade Carlos III de Madrid, na Espanha. Entre se acostumar com o novo idioma, a diferença entre uma capital nacional, de mais de três milhões de habitantes para Passo Fundo com quase 200 mil e a diferença de fuso horário de cinco horas elas estão adorando o Rio Grande de Sul e pretendem viajar para grande parte do Brasil. Elas nos tiraram algumas dúvidas: Por que vocês escolheram o Brasil? Andrea: Eu gostava de olhar a América Latina e como o Brasil é o único país que fala um idioma diferente do nosso, meus pais também não queriam que eu fosse para um país onde falassem espanhol também. Gosto da cultura brasileira. Ana: Como Andrea, sempre quis visitar a América Latina, gostaria de aprender um idioma e conhecer a cultura brasileira. Além disso, no Brasil posso ficar um ano diferente dos outros destinos, que só poderia ficar um semestre. Por que Passo Fundo? Andrea: Quando vimos outra cultura dentro do próprio país, isso é totalmente diferente. E também aqui temos a oportunidade de viajar para o Rio e para São Paulo, Se estivéssemos lá nunca saberíamos que o Brasil não é só isso. Ana: Nós queríamos ir para outro lugar e nossas opções foram Rio de Janeiro, São Paulo e Passo Fundo. Mas fizemos os cálculos e falamos com nosso orientador e viemos para cá. Gosto muito de Passo Fundo, porque não tem o estereótipo do Brasil, todos perguntam: Tem praia, tem samba, tem caipirinha? E eu digo: “Não, eu tenho mate e frio”. Mas gosto muito disso, porque tem outro turismo do Brasil.

2

1

3

Qual foi a primeira impressão que vocês tiveram do, país? Andrea: Que nós iriamos morrer! Quando descemos em Porto Alegre, entramos no táxi nossa primeira impressão ao ver tantos carros, tanta loucura, sem respeito com os pedestres. Eu achava que Porto Alegre era uma cidade com mais infraestrutura, mais organizada. Ana: Foi muito diferente do que achávamos. Quando pesquisei Passo Fundo na internet na Espanha, não encontrei muitas informações, somente sobre a universidade. Assim pensava que era uma cidade pequena, mas vi que é muito maior. O que estão achando da cultura brasileira, a alimentação, a música? Andrea: Bom morava em Madri, uma capital. Lá as cidades são mais organizadas, o transporte público também. Estamos bem em Passo Fundo. Ana: Como antes de Madri eu

morava em Cáceres, uma cidade pequena, tenho a impressão de ter voltado a morar lá, com pessoas muito gentis que ajudam, isso é o principal. Na cultura, sinto que os brasileiros são muito mais gentis que os espanhóis, essa foi a primeira impressão. E as diferenças entre o curso na UPF e na Universidade Carlos III de Madrid? Andrea e Ana: Lá temos uma matéria que se divide em teórica e prática, mas lá a prática não é prática. São muitos alunos, é mais teoria aplicada a um grupo pequeno. Aqui é melhor, as matérias são mais divididas em teoria e prática, são menos alunos em sala, melhor de trabalhar e aprender. Até porque jornalismo é mais prática do que teoria. Aqui os equipamentos e a infraestrutura são melhores. Na Espanha é impensável trabalhar sem se formar, aqui já se pode praticar durante o curso. Lá não somos obrigados a participar

das aulas. A diferença de fuso horário entre Passo Fundo e Madrid é de cinco horas. Como está sendo a adaptação? Andrea: Para falar com nossos pais é mais difícil, mas assim está sendo fácil se adaptar. Mas ainda não nos adaptamos ao horário brasileiro, comemos no nosso horário espanhol. Almoçamos pelas 14h, 15h jantamos 22h, mas isso não importa em que lugar do mundo vamos estar sempre será o mesmo. Eu não posso comer feijoada ao meio-dia, pois tomamos café nesse horário. Ana: Na alimentação, no primeiro dia em que fomos no supermercado foi horrível, não sabíamos o que comprar. Frango, arroz e feijoada, muito churrasco. Sentimos falta de um lugar para comprar peixes frescos. Aqui tudo tem carne, até a salada. Mas gostamos muito de churrasco. Acho que a cultura gaúcha, não podemos dizer que é cultura brasileira. Vocês são gaúchos e não brasileiros (risos) O que buscam principalmente com o intercâmbio? Andrea: A experiência pessoal, sobretudo, além do novo idioma. Ana: Acho que o melhor de fazer um intercâmbio é conhecer muitas pessoas e com isso aprender muito mais. Através do convívio aprende-se mais sobre a mentalidade, informações novas, só o intercâmbio é capaz de oferecer isso.

A dupla em ação: com colegas da UPF durante a cobertura da Jornada Nacional de Literatura (1), em Foz do Iguaçú (2) e conduzindo o Seminário de leituras Brasil Espanha (3) no Mundo da leitura. Passagem de um ano no Brasil trouxe experiências para a vida inteira


Entrevista

12

Pelo fim dos rótulos: uma conversa com Emanuele Parte importante na história contra o preconceito, Emanuele Colussi luta diariamente por um direito simples: ser ela mesma.

Eduarda Ricci Perin Estagiária Nexjor

S

erá que ainda existem padrões na sociedade? E a família tradicional, ainda é aquela em que o pai sustenta a família e a mãe cuida da casa? A modernidade acaba com os padrões e, se eles ainda existem, Emmanuele Colussi não os segue. Antes Emanoel, a estudante de Design de Moda foi a primeira transsexual de Passo Fundo a mudar o nome judicialmente sem a cirurgia de troca de sexo. E, a família dela foi muito importante nesse processo. “Tudo o que conquistei devo ao apoio do meu pai, mãe e da minha irmã” conta. “A conquista de si próprio é a maior das vitórias”. Para Emmanuele, a frase que encontrou em seu livro preferido define a sua vida. A infância da Emmanuele não foi das mais normais, como ela mesmo diz. Desde cedo ela se sentia diferente, mas não sabia exatamente o porquê. Sempre se identificou mais com meninas, mas não tinha essa história de preferencia por rosa ou azul. “Gostava de todas as cores, não tinha problema com isso.” ela conta. Já na adolescência, toda as incertezas que Emmanuele tinha fizeram com que ela adotasse um estilo de se vestir diferente da maioria. “Eu usava roupas mais femininas, bem justas e bastante maquiagem” conta. Sem referências e exemplos de transsexuais na época, Manu não sabia como agir e passou por um momento difícil de drogas, prostituição e de incertezas. Com 16 anos, Emmanuele descobriu que existia a possibilidade de mudar o corpo e então a família a apoiou. Desde lá, Manu espera pelo dia da cirurgia, que está marcada para julho do ano que vem, mas não considera esse o melhor dia da sua vida. “Tem transsexuais

que colocam muito expectativa em cima desse dia, para mim é só mais uma etapa que eu vou enfrentar.” disse. Além de conquistar seu espaço no mercado de trabalho como estilista ou de ser aceita como transsexual, a luta da Emmanuele é pela igualdade, pelo fim dos rótulos e das classificações. “Quando classificamos alguém, estamos o afastando, o excluindo” falou Manu. Assim como a Emmanuele, muita gente luta pelo direito dos LGBTs. A Semana da Diversidade, que aconteceu em Passo Fundo é exemplo disso. Organizado pelo Plural Coletivo Sexodiverso, a Semana teve como tema: “Em defesa das famílias”. Um dos coordenadores do Plural, Oscar Santos explica: “Ainda existe um conceito que defende apenas um modelo de família e diz que apenas o tradicional é digno de respeito. Queremos mostrar que todos os tipos e modelos de família merecem respeito.” diz Oscar. Colocar um S nas famílias, pluralizar e acabar com todos os mitos e preconceitos da sociedade em relação ao movimento LGBT são alguns dos desejos de todos os que estiveram envolvidos na Semana da Di-

Em defesa das famílias de todos os modelos e estilos. Essa foi a principal luta da 2ª Parada da Diversidade, da qual Emanuele participou ativamente (acima)

versidade. “Não é doença, não é pecado, não é uma opção, não é escolha” explicou Oscar Santos. 2ª Parada da Diversidade O estilo da Parada que aconteceu no encerramento da Semana da Diversidade é bem diferente do que acontece no Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo. Como explicou Oscar Santos: “Não aconteceu apenas uma grande festa, mas também um momento de luta pelos direitos pelas famílias e dos LGBTs” explicou.

“ ”

A conquista de si próprio é a maior das vitórias Para Emmanuele, a frase que encontrou em seu livro preferido define a sua vida.


Entrevista

13

Duda, os irmãos Couto e as desilusões “Quem um dia irá dizer que existe razão quando se escolhe essa profissão?” Duda, Anderson e Emerson e a vida de jornalista como ela é.

Thaís Viacelli Biolchi

pode mudar muito. O importante é que a essência do jornalismo vai continuar. Sempre vai ter gente atrás de informação. O bom texto vai persistir em qualquer plataforma. E, além de uma transformação tecnológica, há uma questão econômica que muda a forma de encarar a profissão. Vai sobreviver quem conseguir se adaptar melhor, mesmo sendo um grande jornal ou um jornalista.

Estagiária NEXJOR

D

uda Rangel é um jornalista desiludido, profissional e amorosamente. No blog Desilusões Perdidas ele expressa – com humor e críticas – seus pontos de vista sobre o dia-a-dia da profissão. Duda pode ser considerado um típico profissional do Jornalismo, mas ele não é. Duda Rangel não passa de um personagem, criado pelos gêmeos Anderson e Emerson Couto, que uniram suas duas paixões, jornalismo e humor, para a criação da página que conta a vida do jornalista como ela é. Os irmãos Couto são paulistas de Santo André, graduados em Jornalismo pela Universidade Metodista de São Paulo e já somam 20 anos de profissão. Emerson e Anderson têm uma carreira profissional e acadêmica parecidas. Os dois já passaram pelo Jornal O Estado de São Paulo, realizaram trabalhos em comunicação corporativa e escreveram diversas outras publicações. Hoje, os gêmeos atuam como jornalistas independentes, comandando o blog Desilusões Perdidas e fazendo parte da equipe de roteiristas do programa de humor Sensacionalista, no canal Multishow. Em 2012, o blog que conta os encantos e desencantos da profissão ganhou uma versão impressa, “A vida de jornalista como ela é”. Praler: Por que abandonar jornais de renome, nos quais vocês trabalhavam, para criar um blog? Anderson: - Os motivos para a criação do blog “Desilusões perdidas” foram basicamente a união de duas de nossas paixões, o jornalismo e o humor, combinação que em jornais convencionais não eram muito aceitas. Emerson: - O blog entrou no ar em janeiro de 2009, sendo que começamos a escrever no final de 2008. Ele não é um blog jornalístico e sim de ficção. A vivência

Em 2014, o blog Desilusões Perdidas passa a refletir sobre os sabores e dissabores da vida em geral, sem deixar de lado o jornalismo.

de 20 anos em jornalismo diário foi um dos fatores que levaram à criação da página. E por ser um blog de ficção, precisávamos de um personagem, um narrador para contar as histórias. Foi assim que criamos o Duda Rangel. No começo o blog era só para amigos e aos poucos foi crescendo e ampliando nosso público. PL: Como foi a reação da família quando optaram pelo jornalismo? A: - A gente teve bastante sorte nesse ponto. Nossos pais foram tranquilos. Deve ser porque temos um irmão mais velho que é engenheiro. Talvez por causa disso o jornalismo já estivesse liberado. Além de apoiar na escolha da profissão, eles apoiaram, inclusive, todas as nossas loucuras realizadas pelo jornalismo. PL: Vocês tiveram inspirações para a atuação do blog e na escolha do jornalismo? E: - Tem muitas pessoas que trabalharam com a gente, chefes, que ajudaram muito, então admiramos eles. Para o blog, tivemos algumas referências de humor, como Veríssimo, mesmo o humor de televisão, Casseta & Planeta, Monty Python, Nelson Rodrigues. A gente sempre consumiu muito isso. Então estes caras foram os responsáveis pela gente gostar de escrever humor e o que fazemos hoje. Já para o jornalismo em si, o grande responsável foi o contato com o produto e não com uma pessoa em especial.

PL: Como era a recepção dos meios de comunicação em que vocês já trabalharam quanto ao uso de humor para informar? E: - As pessoas têm muito medo de ousar, fazer coisas novas, leves, porque acham que não vão funcionar. Mas tem de experimentar! Às vezes a gente consegue um tipo de linguagem mais atraente. Já trabalhamos em muitos lugares e o tipo de linguagem utilizada variava, mas usar o humor sempre foi um problema. A: - Quando a gente entrou no Estadão, éramos recém-formados e gostávamos de escrever humor, porém o jornalismo é uma coisa séria, ainda mais no Estadão que é um jornal conservador. Então não tínhamos como usar o humor no nosso dia-a-dia. Eu acho que o Estadão foi uma experiência legal. Vivemos o jornalismo diário e dessas histórias que a gente conta hoje, muitas vieram dessa época. Eu nunca me senti censurado. PL: Como vocês vêm o jornalismo atualmente? A: - Adaptação é a palavra que define o jornalismo de hoje. Com um novo perfil de leitores e novas formas de passar a informação adiante, os profissionais estão tendo que se moldar às transformações. O jornalismo como um todo está passando por um processo de mudança muito grande, principalmente o jornalismo tradicional, impresso. Já o jornalismo online, ele é muito novo ainda. Começou na metade da década de 1990, está sendo testado e ainda

PL: Qual é o gênero que vocês mais gostam de escrever? E: - Escrevemos texto corporativo, texto ficcional que é o mais literário, escrevemos roteiro de TV. A gente escreve tanta coisa, mas é tudo texto, a palavra escrita e é isso que a gente gosta muito. PL: Algum de vocês já sofreu as desilusões do Duda? A e E: - Os perrengues da profissão são comuns a muita gente. Essa coisa de ralar pra caramba desde o começo da profissão, como estagiário e mesmo depois quando você não é mais estagiário, isso é uma coisa normal. O Duda é assim, tem 43 anos, mais ou menos da nossa faixa etária, e a gente já passou por alguns momentos da nossa profissão em que ficamos cansados, queremos mudar. Isso a gente já passou muito. Muitas histórias do blog são situações que a gente já viveu. Tem histórias de amigos, coisas que a gente ouviu, mas, sim, têm muitas experiências nossas ali. Muitas situações difíceis que o Duda enfrenta, a gente já enfrentou. Dá uma desanimada, às vezes, mas também tem as coisas legais. Então tem muita coisa nossa lá, sim.

Vai sobreviver quem conseguir se adaptar melhor, mesmo sendo um grande jornal ou um jornalista.


Entrevista

14

Por um jornalismo mais humanizador Um profissional a moda antiga que acredita na importância do fator humano na transformação da realidade,é assim que Marcello Canellas se define como jornalista.

Bárbara Born

dão com a ética do jornalista”. Para ele , só o tratamento muda: ” O jornalístico investiga, busca entender porque aquilo acontece para poder contar direito o que está acontecendo”.

Ex-estagiária Nexjor

E

le se define como um repórter peregrino, que busca no Brasil e no mundo histórias capazes de mudar pensamentos e opiniões. Por outro lado, se define como um cronista provinciano que traz em suas crônicas o que passa despercebido em nossas vidas. Sua simplicidade, poeticidade, leveza são claras tanto em suas crônicas quanto em suas matérias sendo capazes de tocar até a alma do leitor e do telespectador. Marcello Canellas nasceu em 1965 em Passo Fundo e aos dois anos de idade se mudou para Santa Maria. Prestou vestibular para Agronomia, mas acabou abandonando o curso para fazer Jornalismo. Em 1987, formou-se na Universidade Federal de Santa Maria e começou a carreira como repórter de Polícia do jornal A Razão. Depois, fez um teste e foi contratado pela afiliada da RBS em Santa Maria. Em 1980, foi indicado para a emissora afiliada da TV Globo em Ribeirão Preto, São Paulo. Desde 1990, trabalha como repórter especial na TV Globo do Rio de Janeiro. Fez questão de que a segunda cidade em que lançasse seu primeiro livro “Provínicas: crônicas de uma alma interiorana” fosse sua cidade natal a qual segundo ele sente uma relação muito forte. O Nexjor aproveitou a participação do jornalista na Semana Acadêmica da Faculdade de Artes e Comunicação e tirou algumas dúvidas. ABORDAGEM DE TEMAS DELICADOS Marcelo Canellas optou, nos últimos anos, por tratar de temas mais delicados que envolvam problemas sociais e os direitos humanos. “Eu sempre me preocupei com essas questões como jornalista, porque eu sempre me preocupei como pessoa, como cidadão”, afirma. Cita o texto “O jornalismo e a ética do marceneiro” do jornalista Cláudio Abramo e defende: “Você não separa a ética do cida-

QUALIDADES DO BOM JORNALISTA Diante dos mais de 40 prêmios nacionais e internacionais no jornalismo Canellas é a pessoa certa para dizer as qualidades que os futuros jornalistas devem desenvolver para serem bons profissionais. “Nunca devemos esquecer da independência intelectual, da própria capacidade de crítica, de questionar e desconfiar das aparências”, cita. Salientou que não se pode esquecer as questões técnicas, as ferramentas necessárias, aquelas que irão impedir que o repórter seja enganado pelas aparências e por pautas furadas. Além de dominar principalmente a língua: ” Esse domínio que vai permitir a construção de narrativas e contar histórias”.

Temas delicados sempre foram o foco de Canellas

UM JORNALISMO MAIS PENSANTE Hoje em dia, nota-se um jornalismo mais informativo e objetivo. Para Canellas, falta um jornalismo mais aprofundado, com grandes mergulhos em grandes assuntos. “Em geral não existe uma rotina da grande reporta-

gem”. Para ele, uma das razões desse jornalismo mais objetivo é o enxugamento das redações, o que em sua opinião é uma economia burra. “O que dá prestígio para uma empresa de comunicação, é o grande tema, a grande reportagem, o grande assunto, que o jornalista descobriu, assim conquista-se leitores e audiência”. Além disso, para ele há uma tendência geral para sintetizar tudo. “As pessoas tem tempo para ler quando acham uma reportagem bacana, sem clichês, feita de uma maneira diferente e criativa”.

Tenho uma caixa cheia de caderninhos. Sou repórter à antiga, dos que ainda rabiscam num papel

CRÔNICAS Com uma carreira de mais de 25 anos na televisão, há alguns anos atrás foi convidado pelo jornal Diário de Santa Maria a ter uma coluna semanal. Optou pelo gênero crônica que lhe mostrou uma nova realidade. “A crônica me permite fazer exercícios narrativos, que o jornalismo não me permite”, afirma Canellas. Para ele, a crônica ganha seu valor quando atinge a subjetividade das pessoas. PROFISSIONAL X EMOCIONAL A profissão de jornalista, como tantas outras, coloca os profissionais diante de tragédias e momentos de extrema emoção, como o incêndio da Boate Kiss em Santa Maria. Canellas diz que em situações como essas é impossível conter a emoção, seria desumano não senti-la. “A emoção é necessária. O que eu acho que não é adequado é você tornar a sua emoção tão notícia quanta a emoção legítima do entrevistado” justifica. Como Canellas cresceu e estudou em Santa Maria sentiu ainda mais a tragédia. “Eu me vi naqueles meninos, porque eu fazia isso, me divertia como eles, iá para a boate. Então há uma projeção daquilo que você foi”. É muita frieza pensar que vai ter uma postura distanciada daquilo ali é desumano.


Entrevista

15

O trabalho de quem vai além da notícia O dia a dia de Giovani Grizotti e Fábio Almeida, dois profissionais que trabalham com o jornalismo investigativo no Rio Grande do Sul

Vinícius Coimbra

aças. Para Fábio, o profissional que trabalha nessa área precisa ciência dos limites da ética. “Lidamos com assuntos sérios e tensos a cada reportagem. É necessário saber também até onde vale correr o risco. Nenhuma reportagem vale a vida”.

Estagiário Nexjor

Minha imagem não está em lugar nenhum. Já ‘vazaram’ fotos minhas do banco de dados da polícia e foram parar até em mãos de bandidos. Cheguei a encontrar uma, numa parede, no escritório de um golpista”. O relato feito ao Nexjor é uma passagem da carreira de Giovani Grizotti, repórter investigativo da RBS TV há 15 anos. É verdade que todo o jornalismo é investigativo. Ou melhor: deveria ser, porque a pesquisa e checagem de informações deve ser a base para elaboração de qualquer notícia. Mas tratemos aqui por jornalismo investigativo aquele que trabalha com denúncias, que usam de câmera escondida a disfarces e nomes fictícios, e que, principalmente, põe em perigo profissionais que escolhem esse caminho. Os casos mais complicados e que podem até colocar em risco a vida são feitos por jornalistas que não podem revelar a própria identidade. E não é para menos: traficantes de drogas, esquemas de lavagem de dinheiro e contrabando são pautas recorrentes nesse ramo onde a denúncia de um esquema atinge muita gente importante e perigosa. Grizotti conta que já foi ameaçado diversas vezes por telefone, carta e, ao realizar uma investigação sobre funerárias, teve seu carro interceptado pela Polícia Rodoviária Federal. Além disso, precisou sair duas vezes do estado devido às ameaças. “Tem que gostar, querer descobrir coisas, não temer riscos. E, não posso negar, há uma adrenalina por trás disso, de buscar o desconhecido”. Seus rostos não estão gravados na retina do grande público. Talvez, o telespectador menos atento nem se dê ao trabalho de ler o nome do autor da reportagem que acaba de denunciar um grande problema da sociedade. “Não tenho menor preocupação

com isso. Não quero ser reconhecido na rua, dar autógrafos. Quero só ser reconhecido pelo meu trabalho. E isso o anonimato de imagem não prejudica”, conta Giovani Grizotti, que iniciou a carreira na Rádio Horizonte, de Capão da Canoa. REPERCUSSÃO Tratado como herói por alguns admiradores, Grizotti rechaça o rótulo e acredita que as reportagens são apenas o seu trabalho. Mas é um trabalho que repercute. Em 2006, a reportagem intitulada “A farra dos vereadores”, exibida no Fantástico da TV Globo, denunciou um esquema de servidores públicos que deveriam participar de cursos em outros estados, mas, na verdade, usavam o dinheiro das diárias para fazer turismo. A reportagem gerou uma série de denúncias e processos. Em 2011, Giovani Grizotti denunciou a “Fraude dos pardais”, um esquema ilícito de compra de controladores de velocidade por prefeituras. Ameaças de torcidas de futebol e de grupos neonazistas fazem parte do currículo de Fábio Almeida, repórter da RBS TV de Porto Alegre. O jornalista segue uma linha parecida com a do seu colega Giovani Grizotti: preserva o rosto como artifício para não atrapalhar a reportagem, entretanto diz não temer ame-

Tenho uma caixa cheia de caderninhos. Sou repórter à antiga, dos que ainda rabiscam num papel

“TENTAR MOSTRAR O ILEGAL, O QUE ALGUMAS PESSOAS TENTAM ESCONDER” A frase adapta-se perfeitamente ao tema de um dos trabalhos realizado em 2011. Em parceria com Cid Martins, Fábio Almeida conduziu uma reportagem sobre o comércio ilegal de explosivos. Os jornalistas foram até Ciudad de Leste, no Paraguai, e a diversos municípios gaúchos para checar a denúncia, que se confirmou. O material entrava pelo Rio Grande do Sul e seguia para outros estados brasileiros, a fim de auxiliar bandidos no assalto a bancos e em explosões de caixas eletrônicos. Escute aqui. “O lado bom é a repercussão que reportagens desse estilo acabam trazendo. Muitas vezes, conseguimos contribuir com a sociedade com as mudanças provocadas pelas matérias investigativas.” Fábio Almeida conta que um dos pontos negativos desse segmento do jornalismo é o tempo de elaboração das reportagens, pois é preciso identificar flagrantes, confirmações e apurar os dados obtidos. Em 2013, a reportagem Im-

pério da Areia: a dragagem que mata o Jacuí exigiu bom tempo de trabalho: “Foram quase seis meses de investigação, mais de 20 entrevistas, muitas horas de navegação e estudo de mapa e licenças ambientais. Mas houve um grande retorno social e jornalístico.” Além da importante denúncia sobre o descaso ambiental, a reportagem recebeu diversas premiações, incluindo um dos mais prestigiados do mundo, o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha. FONTES Para que as denúncias virem reportagens, o jornalista precisa contar com boas fontes. Giovani Grizotti iniciou na Rádio Gaúcha como repórter policial. Assim, passou a trabalhar com diversas pessoas da área, o que contribuiu para obter bons contatos e informações privilegiadas. “Hoje as principais matérias têm surgido da observação do dia adia. Às vezes, por exemplo, tem um assunto que está no canto de página de um jornal e que pode ser o ponto de partida para uma matéria nacional”. Fábio Almeida usa as redes para divulgar seu trabalho e manter contato com fontes. “Boas pautas surgem pelas redes sociais. Um exemplo foi a matéria sobre a extração de Areia do Jacuí [citada anteriormente]. O estopim com dicas e a denúncia veio do Twitter, do sócio de uma ONG de defesa ambiental. Ele me enviou documentos e muitas informações que deram start na reportagem”. A morte de Tim Lopes em 2002 chamou a atenção aos perigos desse nicho de reportagens. O jornalista da Rede Globo, famoso por apurar assuntos de alto risco, foi sequestrado e assassinado por traficantes no Rio de Janeiro. O episódio é uma das faces desse segmento do jornalismo. Entre a grande matéria que instiga a sociedade a cobrar providências e a câmera escondida que, ao ser descoberta, põe em risco a própria vida, há um profissional empenhado em mostrar aquilo que muitos desejam silenciar.


Novo currículo no jornalismo

A

aprovação das novas diretrizes do MEC para os cursos de jornalismo, em 2013, foi o ponto de partida para um trabalho de reformulação do atual currículo do Curso de Jornalismo da UPF. Dividido em três grandes linhas do conhecimento, com mudanças importantes em sua estrutura, novas disciplinas, reordenação de outras já existentes, implementação do estágio curricular obrigatório e transformações nas ementas de várias outras disciplinas já existentes, o currículo que será implementado a partir do primeiro semestre de 2015 adequa o Curso de Jornalismo da UPF à uma concepção de ensino que visa destacar o jornalismo dentro da grande área da comunicação social - uma tendência que já começa a ser debatida e seguida por vários outros cursos do Brasil. Na edição de OUTUBRO do PRALER, você poderá tirar todas as dúvidas acerca das importantes mudanças que estão por vir

n AS NOVAS DIRETRIZES O que o MEC pretende com as transformações nos cursos jornalismo? n A NOVA ESTRUTURA CURRICULAR Como se dividirão as disciplinas dentro da nova estrutura de 4 anos do curso? n AS NOVAS DISCIPLINAS As mudanças curriculares em detalhes: o que foi mantido, quais são as novas disciplinas e quais sofreram transformações n MIGRAÇÃO As dúvidas referentes à migração dos atuais alunos para o novo currículo n O ESTÁGIO Informações sobre a grande mudança instaurada pelo MEC: o estágio curricular obrigatório


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.