meu corpo estava t達o acostumado ao o seu
até a echarpe lilás a gravata rosa cintilante voando do guarda-roupas até a estante
era quando a gente parava naquele silĂŞncio de morte - uma morte tĂŁo bonita e breve
e ficávamos quatro cinco ou seis horas qui e tos co la dos e só o farfalhar das páginas a minha e a sua respiração
numa comunh達o sem palavras sem desejos sem nada
era eu e era vocĂŞ
entĂŁo vocĂŞ me olhava de ladinho dava os seus risos que diziam
eu sinto o teu beijo Hollie eu tambĂŠm te quero Hollie
e deixรกvamos a echarpe lilรกs a gravata rosa um livro de poemas
a poesia t達o nua t達o nua
e eu ria com a tua boca pegada na minha esse outro que vocĂŞ era
para os outros – tão longes o outro que desconheço
- e que era meu
olho
o amontoado de louças na pia
aos longes tĂŁo limpa familiar
e me detenho na fruteira com esses novos legumes org창nicos e esse leite que n찾o tem leite
prontos a apodrecer e aprendo a cozinhar e vou a consertar a bomba da privada
e trocar os fusĂveis da velha tevĂŞ que estava encaixotada
e vou a dançar pra você um tango com as juntas estropiadas e a barriga que conta a história
de todos esses anos a cerveja que vocĂŞ me fez descobrir gostar
e as estrias que você lambia em êxtase -não há nada mais feminino
sussurrava e eu me esbaldava ser mulher
vou a danรงar esse tango como quem tenta desacostumar um corpo
se o seu psiquiatra me visse agora me daria outro sedativo
eu n達o choro
eu me movo e n達o vou descansar em uruburetama em buenos aires
eu não tenho passagens eu não tenho nada - nem uma echarpe lilás
ela vai continuar amarrada em seu pescoรงo suavemente
- como a minha lembranรงa do teu nariz quebrado eu adorava o teu nariz quebrado
atĂŠ que eu pare reaprenda a chorar como naquele poema que vocĂŞ repetia
atĂŠ que reaprenda meu corpo
t達o seu t達o seu
e vou a fazer todas as coisas que vocĂŞ fazia todas as coisas de uma mulher
impor minha presenรงa - continuidade da tua sem a tua
ao caixa do mercado ao gerente do banco aos filhos e netos que n達o tivemos
ao psiquiatra que diz que se quando la pareja morre se o outro morre junto n達o pode ser amor
esta presença minha sem a sua que eu não sei não como é
visto sua gravata rosa silenciosamente
caminho caminho atĂŠ o seu outro
atĂŠ encontrar o corpo tĂŁo acostumado
n達o sei se rio ou sintra
3
Somente a sede
o silĂŞncio
nenhum encontro
cuida de mim meu amor
cuida da silenciosa no deserto
da viajante com o vaso vazio
e da sombra de sua sombra.
- Alejandra Pizarnik; tradução Nina Rizzi
HOLLIE Nina Rizzi
Iconografia/ Capa e contracapa: Nina Rizzi, grafite e hidrocolor sobre canson
Página Oficial: www.ellenismos.com Endereço eletrônico: ellenismosrevista@gmail.com
© 2014 Ellenismos - Diálogos com a Arte ISSN: 2316-1779.