CENTRO DE ESTUDOS DO HUMANISMO CRÍTICO Portugal & América Latina
MANUEL REIS
A HUMANIDADE PRECISA, URGENTEMENTE,
MUDAR DE DEUS ‘We, All, must change our God!’ Quickly: The Good Luck of our destination depends on that!... (Now, it is time for the burning and destroying of quasi all the biblical Sagas!...) *** Nosotros carecemos de Otro Dios! Nós temos necessidade de um Novo Deus! Wir brauchen ein neu Gott! Noi abbiamo bisogno di un nuovo Dio!
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Prof. Dr. Manuel Reis
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● N.B.: Numa Era (como a de hoje) em que, para além da Física Clássica de Ptolomeu e Copérnico, de Galileus Galilei e de Isaac Newton, emerge, com toda a pujança a chamada ‘Física Quântica’ (ou das ‘Micropartículas) as Divindades bíblicas e outras, que tradicionalmente nos têm assistido, na sempre crescente e inacabada Antropogénese, já não nos bastam; deixaram, definitivamente, de cumprir as suas funções. Com o advento, no mundo das panóplias das Tecnologias, dos novos computadores quânticos e dos smartphones, estamos a precisar, urgentemente, de mudar o nosso Guarda-Roupa religioso, desde logo, mudando de Divindade, uma Divindade mais apropriada e a funcionar, adequadamente, para os usos e costumes próprios ‒ já não do ‘Homo Sapiens tout court’ ‒ mas do ‘HOMO SAPIENS//SAPIENS’. A do primeiro tipo é a Divindade do ‘livre arbítrio’ (que tem sido ensinada por todos os Próceres da Cristandade, ao longo de dois milénios, ‒ a lei do pêndulo de Foucault. Ora, o ‘livre arbítrio’ encontra-se nos antípodas da Liberdade Responsável primacial e primordial, que é própria do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Desta sorte, impõe-se-nos, absolutamente, o desbravar de Novos Caminhos antropogenésicos, com vista a uma saudável e escorreita Teologia, criteriada e balizada pelo chamado Humanismo Crítico! O grande Filósofo (existencialista-ateu) que foi Jean-Paul Sartre (1905-1980) sobremaneira in Les Chemins de la liberté, L’Étre et le Néant, e na Revista Les Temps Modernes (1945), por ele fundada, espalhou e difundiu o novo conceito de Liberdade sem ambiguidades: evocou para tal o Dilema clássico: Se Deus existe, o Homem não pode ser livre! Logo, para que eu possa ser veramente Livre, Deus não pode existir. Tratou-se da Liberdade Responsável (não da ‘lei do pêndulo’…). Como bom existencialista (mais e melhor que M. Heidegger), para quem o primado ontológico era o da praxis, não o da theoresis; por total discordância rompeu definitivamente com o Partido Comunista, em 1956. ‘Caminero, no hay camino; se hace camino ao andar’ (Antonio Machado). Tudo emerge e desparece!... É a Lei incontornável da Evolução cósmica. … Também evolui a Teologia! Nunca esquecer o apotegma: Tudo o que dizemos de Deus foi, é, e será sempre um Ser Humano que o diz!... Na nova era, inaugurada pela Física quântica, carecemos, pois, de uma nova noção/concepção da Divindade, que nos há-de servir e proteger como Espécie. Sem esta metamorfose ‒ do ‘Sapiens tout court’ para o ‘Sapiens//Sapiens’ ‒ é certo e sabido ‒ a História das Culturas e das Civilizações tem dado sobejas provas do Fenómeno… ‒ as Culturas e as Civilizações não terão outro destino senão a sua decadência e desaparecimento completo!... * ● Nos processos civilizacionais, que a História humana tem registado, a Teologia e as Artes e os Sistemas Educativos jamais serão capazes de se libertar, radicalmente, do seu carácter inercial da Ideologia. (A Ideologia, que decorre sempre da Potestas d’abord, enregela e mumifica as ideias vivas!...). Uma tal prerrogativa só poderá ser concretizada e praticada pela Filosofia e pelas Ciências enquanto tais, ‒ i.e., se elas forem concebidas e balizadas, acrisoladamente e com acribia, segundo a gramática corrente do mais rigoroso Criticismo! Não dizemos nós, em
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Antropogénese, que os Humanos, qua tais, são Seres que sabem que sabem?! O que denota e implica que detêm Consciência própria a funcionar! Se a Filosofia Criticista e a Boa e Honesta Ciência nos asseveram, nos contrastes estabelecidos, que a Física Quântica é toto coelo diferente da tradicional (e newtoniana) Física Clássica, porque razões não haveríamos nós de acompanhar as novas atmosferas filosófico-científicas, a bem da Antropogénese?! ‘Entes Viatores’ ‒ é, ainda a Recomendação incontornável, que nos advém da Bíblia!... Albert Einstein, depois de estabelecer a principiologia da Relatividade Restrita (1905), não descansou a sua mente prodigiosa enquanto não veio a estabelecer a axiomática da Relatividade Geral (1915). Esta conclusão era como o ouro sobre o azul: unificava as duas noções/ /realidades do Espaço e do Tempo; e moldava as realidades/volumes em 4 dimensões, transbordando os limites do estritamente físico e abrindo caminho para as realidades do vivo. O ainda vivo Astrofísico inglês Stephen Hawking, adepto da chamada ‘teoria das Cordas’ expandiu esta nova conceptualização sobre o Cosmos em Evolução até ao nº 11 das cordas em vibração no Universo… como se fora um Grande Ser Vivo!!! Dir-se-ia que Espaço/Tempo e Eternidade se fundem numa só Realidade incontornável e indivisível: O Tempo definido por Aristóteles e transmitido em latim, pelos filósofos árabes, como segue: ‘numerus motus secundum prius et posterius’. O Espaço, desde logo, cissiparizado em locus (exterior) e situs (interior), enquanto dois dos 10 predicamentos ontológicos do Filósofo de Estagira, preceptor de Alexandre Magno. E a Eternidade definida, por Tomás de Aquino, na Iª Pars da Summa Theologiae, de tal maneira concentrada no Bios, que nem sequer se pressente o Tempo a assomar na definição. Veja-se só: ‘Interminabilis vitae tota simul ac perfecta possessio’: a posse perfeita e simultânea de uma Vida interminável. Da Physis operou-se o trânsito para o Bios; e deste para a Psychè ou Mens (em Latim). É desde já pertinente e oportuno estabelecer no frontispício do Templo da Física e Astrofísica o lábaro de Niels Bohr: ‘É difícil fazer previsões. Especialmente acerca do futuro’. Isto mesmo foi exarado na titulação do seu artigo ‘A Física em 2042’, pelo prof. de Física na Univ. do Minho José Luís Ribeiro (in Rev.. nº 25, Maio de 2017: ‘De Facto’, pp.44-49). O Universo evolui… como a Vida!... Assim, evoluíssem os Seres Humanos’. Deste belíssimo trabalho, vamos transcrever um parágrafo significativo e relevante: “A computação quântica desenvolveu-se num fascinante ramo das ciências da computação, que explora o entrelaçamento e sobreposição quânticas para ler, escrever e operar informação. Em vez de estados binários bem definidos, 10> ou 11> (bits) usam-se sobreposições quânticas coerentes destes dois estados, a|0> + B|1> (qbit; a e B são números complexos, |a|2+|B|2=|). Foram desenvolvidos algoritmos quânticos como o algoritmo de Daniel Simon (1994), que são manifestamente mais rápidos do que qualquer análogo clássico. Hoje, o desenvolvimento de um computador quântico é um dos mais excitantes campos de desenvolvimento experimental. Um computador quântico concretizaria uma máquina quântica de Turing capaz de realizar tarefas inimagináveis em sistemas clássicos, e com impactos imprevisíveis no estudo de sistemas complexos (de muitos corpos), no desenvolvimento conceptual da mecânica quântica, ou simplesmente em tarefas civis e militares. Até hoje conhecemos apenas pequenos exemplos concretos e preliminares, envolvendo o manuseamento de poucos qbits. Mas governos, sistemas militares e empresas privadas investem neste momento fortunas no seu desenvolvimento” (ibi, p.48). Quanto podemos nós, ainda, saber da Física Quântica e dos seus dois domínios (principais) de Desenvolvimento: o das Altas Energias e o da Matéria Condensada?!... Que sabemos nós da Energia escura ou negra e, bem assim, dos chamados buracos escuros ou negros, num cosmos configurado, mutatis mutandis, à boa maneira dos bem esburacados ‘queijos suícos’?!... A matéria do Universo, que secamente nos é dada a conhecer, não ultrapassará muito os
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5% da Matéria empiricamente observável… Restar-nos-iam, ainda, 94% da Matéria/Energia do Universo, que nos é, por enquanto, activa ou passivamente incognoscível, não desvendável!... Em tudo, il y a ses ruses!... E as ciências do Cosmos não são excepção. Convirá, pois, nunca esquecer que foi a partir da descoberta, por A. Einstein, da Lei da Relatividade Geral (1915), e das suas naturais implicações na descoberta das 4 dimensões, que nos foi dada a oportunidade de aceder às Portas Oclusas da Física Quântica e, posteriormente, ao Universo das 11 dimensões de Stephen Hawking e da célebre ‘teoria das cordas’!
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MUDAR DE DEUS! (Tema central do Livro)
É o Tema e o Problema mais difícil do Mundo Humano: da sua Cultura e da sua Civilização. Porquanto, ele condiciona, holisticamente, toda a vida dos Humanos integrados na sua respectiva Sociedade… Do próprio Tema e do respectivo Problema procedem logo duas espécies distintas de Humanos: A) Os que se congregam e obedecem (fielmente…) ao catecismo ministrado pela Cultura do Poder-Dominação d’abord, onde a Autoridade/Poder se acha, societariamente, distinta e separada da Liberdade, a qual, por seu turno, se encontra reduzida, tradicionalmente, ao ‘livre arbítrio’, ‒ a famigerada ‘lei do pêndulo’ foucaultiano. O parentesco evolucionário destes humanos filia-os no padrão ancestral do ‘Homem de Neanderthal’ (há ca. de 170.000 anos). São, por definição, de obediência verticalista, submetidos que estão a uma Potestas sacra. B) Os que se reúnem societariamente, segundo o preceituado por leis generosas, democráticamente estabelecidas, e são subscritores conscientes da Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial, onde Autoridade e Liberdade se procuram constituir como irmãs gémeas. Como a sua Liberdade é usufruída em plenitude, a sua fidelidade é horizontalista e mobilizada para o comum primacial e primordial. O padrão evolucionário, que eles seguem, na sua antropogénese, é o do bem conhecido ‘Homem de Cro-Magnon’, que data de uns 70.000 anos e surgiu, no Planeta, após a extinção do último exemplar do ‘Homem de Neanderthal’. Há, portanto, boas razões para que a Espécie e as actuais Sociedades humanas não hesitem em prosseguir nos caminhos do segundo Tipo Evolutivo!... Quando apostrofamos, com veemência e solenemente, que é urgente e imperioso MUDAR DE DEUS, pretendemos dizer que é preciso romper com o odre tradicionalista do ‘Homo Sapiens tout court’ e sua cartilha bífida, de modo que, na sua Evolução performativa, possa emergir o ‘Homo Sapiens//Sapiens’ em toda a sua plenitude, dotado da sua Consciência Reflexiva e Crítica (onde, dentro do seu organismo vivo surge a Luz de Deus como terceiro elemento ‒ a testemunha da Verdade configurada no objecto produzido pelo Sujeito Humano). ‘Voltar à escola com a minha filha pela mão’ ‒ proclamou a profª Fabiola Lopes (in ‘De Facto’, Rev. cit., p.51): ‘Acabar com a educação carceral e a castração do desejo’. ‘Só quem disponha de liberdade de acção, sabendo decifrar o sonho, poderá abrir a escola para uma sociedade aberta.’ ‘A escola que entrava o desejo estimula a agressividade’. ‘Aprender sem desejo é desaprender a desejar’. ‘Erro não é culpabilidade’ (ibi, p.50). “A Europa é o lugar onde o jardim de Goethe faz fronteira com Buchenwald”. Disse o velhinho de 89 anos George Steiner, na sua casinha em Cambridge (Entrev. In ‘Exp./Rev.’, 3.6.17, p.31): “Toda a minha vida foi dominada pela pergunta: como é que aquilo pôde acontecer na Europa? Como é que por trás da casa de Goethe existe um campo de concentração? Como é que o país mais educado do mundo se tornou nazi? Nunca se esqueça de que a educação
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na Alemanha era provavelmente a mais avançada, mas não foi suficiente para travar Hitler. Toda a minha vida me interroguei sobre se as humanidades realmente humanizam. Deixe-me colocar a questão desta forma: passo o dia todo com os meus alunos a ler o ‘King Lear’, e, ao voltar para casa estou tão possuído interiormente por este texto que não ouço os gritos de alguém na rua. Alguém grita por ajuda e eu não ouço. Sempre me intrigou até que ponto a ficção ‒ e ‘ficção’ é a palavra-chave ‒ pode ser mais poderosa do que a realidade. Passei a vida a ensinar a pessoas a ler e a amar o que lêem. Mas questiono-me a mim próprio sobre o perigo imenso de nos identificarmos com a ficção”.!... Acrescentou ainda o Prof. (ibidem): “A retórica política é capaz de matar. A política pode assassinar por meio da linguagem. O horror do movimento nazi foi largamente baseado na retórica, na propaganda. Muito mais poderosas do que qualquer exército são as mentiras do totalitarismo. O totalitarismo funciona através da linguagem”. ‒ Há dois Grandes Pecados Originais na Cultura do Ocidente: a Muralha divisória entre a Teoria e a Prática; e o Monismo Epistémico, incapaz de distinguir e criteriar, epistemologicamente, as verdades das ciências físico-naturais e as das ciências psico-sociais e/ou humanas!... O Ocidente tem andado por caminhos tão transviados, que muito dificilmente irá encontrar o seu rumo definitivo, ‒ o que resulta tanto mais grave, quanto, desde há meio milénio, ele se alcandorou ao estatuto de ‘mestre e condottière’ de civilizações!... *
● O Equilíbrio no Trapézio, dos 4 Elementos fundamentais, para que o Sistema capitalista se mantenha seguro e a funcionar (adequadamente), sem Crises nem assaltos vindos do exterior do Quadro do Estado/Nação. A formatação é constituída pelo fundador padrão liberalóide, erguido numa atmosfera de empíreo-criticismo (que Marx e Lenine tinham boas razões para criticar: a verdade e a falsidade andam à mistura!...). Estado//Liberdade//Sociedade//Mercado. Ninguém ousa enfrentar e discutir a ‘Quadratura do Círculo’!... Vamos servir-nos, como painel ilustrativo, de um texto do jornalista Henrique Monteiro, subordinado ao título: ‘Liberdade, Sociedade e Mercado’ (in ‘Expresso’, 1º Cad., 17.6. 2017, p.39): “A democracia (menor restrição possível da liberdade individual para vivermos colectivamente em paz) não é contrária ao espírito do capitalismo [Weber dixit!], que funciona muito melhor em sociedade abertas [Popper dixit!]. As regras do mercado são, por sua vez, essenciais ao desenvolvimento do capitalismo e ao aumento da riqueza, mas se transpostas para o plano social podem revelar-se desastrosas na criação de desigualdades e de ressentimentos sociais insuportáveis, ou na total subversão da solidariedade do tecido social. Basta ver que uma regra pura de mercado dita que um velho é um inactivo, a quem contabilisticamente se faria um write off, forma eufemística para o matar. As regras do mercado não podem ser utilizadas na gestão do Estado, tal como as regras democráticas não fazem sentido nas empresas e nos mercados. Seria um contrasenso absoluto as empresas que mais ganham distribuírem lucros pelas empresas falhadas. Enfim, o espaço é curto, mas suficiente para ver que o Estado só deve intervir na Economia e nos mercados através de esquemas regulatórios ou em casos de monopólio natural. A confusão entre meios (mercado e democracia) e fins (sociedade livre, mais justa) tanto leva à privatização da REN como à nacionalização do BPN, erros sem sentido. Onde se devem encontrar os dois campos é nos valores universais em que ambos têm de se fundar: liberdade, transparência, rigor, justiça, humanismo. De resto, devem conviver e não subordinar-se um ao outro.
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‘Mercado sempre que possível, Estado quando é necessário’. Os pais da social-democracia e dos cristãos-democratas dizem-no há mais de 100 anos. Ainda não percebemos”. ‒ A bendita ‘Mão Invisível’ da Divindade de A. Smith não faltará, com a sua providência, a concertar todas as acções e operações, passivas e activas, para que toda esta ‘geringonça’ corra pelo melhor. As Sociedades, assim calibradas, não são Sociedades de Seres Humanos… são sociedades de Pastores e animais de rebanho (elites e chefes, de um lado; e massas/multidões, do outro. Platónica e paulinamente, dividem e separam a Sociedade em duas: o natural e o sobrenatural; a vida terrestre e a vida post mortem. Pertencem, todos, ao paradigma ancestral do ‘Homo Sapiens tout court’, onde Poder/Autoridade se encontram separados da Vida Real. A sua liberdade não passa de ‘livre arbítrio’ ‒ a estafada lei do pêndulo de Foucault. Tais sociedades emergem e são construídas a partir da exterioridade, de fora para um dentro (espiritual!...), que nunca foi assumido. Nas suas relações recíprocas, são verticalistas, por definição; e acham-se ab initio ancoradas na noção de Potestas sacra (ou divina). Quem as caracterizava bem eram os GNÓSTICOS judeo-cristãos primevos (designadamente os evangelhos de Tomé e de Filipe), os quais, admirando e aprendendo muito com o Jesus nazireu, nunca o consideraram filho de Deus, dotado de duas naturezas (como pressupôs o ‘Credo’ de Atanásio, definido no Concílio de Éfeso/325, presidido pelo Imperador Constantino). Quão diferente é a outra espécie de Humanos: Desde logo, fraternos e horizontalistas, nas suas relações. A sua humanitas real é edificada de dentro (da sua própria consciência) para fora. São hilemorficamente inteiros e indivisos. É a sua Lei, bem assumida, que os constitui. Para eles, não funciona a Tradição que faz a Grei. Eles são do paradigma próprio e específico da Espécie Humana, na sua Evolução consumada: Eles são ‘Sapientes//Sapientes’: Sabem que Sabem! São triadicamente constituídos por um Sujeito Cognoscente; um Objecto Conhecido; e a Testemunha (a Luz do Espírito Santo, que lhes confirma a Verdade e os impede de errar!...). Riem-se do axioma de S. Paulo (Rom., 13,1: ‘Non est potestas nisi a Deo!’). Riem-se inocentes e saudavelmente, porque já conheciam essa doutrina. E mais: Já sabiam o que, no A.T., estava exarado, saído da boca de Iahwé, no Salmo 81,6: ‘Ego dixi: Dii estis et Filii Excelsi omnes’!... Por isso tudo, eles ‒ os verdadeiros Humanos, que prosseguem, evolucionariamente, o filão autêntico da Espécie ‒ entregam-se, denodadamente, ao seu Estatuto e Missão: Dar testemunho da Liberdade Responsável primacial e primordial, visto que essa é a sua gramática de vida! *
● Sejamos claros e cristalinos, como a Água límpida que jorra das Torrentes das Montanhas: Não há dois mundos: o das religiões e o das Sociedades civis/políticas! O Mundo, que dizemos ‒ tantas vezes hipocritamente e sob perjúrio!... ‒ é um só: a caminho da Justiça e da Verdade ou, trocando as voltas, a caminho da injustiça e da falsidade. Os que dizem que há duas gramáticas: a das práticas religiosas e a das sociedades civis/políticas… são trafulhas e filhos do Diabo!... Com toda a Verdade e Peso semânticos que as Palavras humanas podem envolver, o Papa Francisco (com a chancela da Bertrand Editora, Lisboa, 2016) publicou um Livro de 223 pp., com este título rotundo: ‘ESTA ECONOMIA MATA’, referindo-se, precisamente, às duas temáticas antagónicas: Capitalismo e justiça social. E não se venha, mais uma vez, argumentar, pour épater le bourgeois, que a justiça social é do domínio da ‘Doutrina Social da Igreja’ (que Deus já lá tem…). Ela faz inteiramente parte da chamada Economia política, estudada por Smith, Ricardo, e tutti quanti. Por outro lado, Esta Economia Mata (o Sistema capitalista… tal
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como está estruturado e aceite ou suportado pelas massas/multidões): mata mesmo de mil e uma maneiras. O cinismo é moeda de troca para esquecer o verdadeiro!... No Prólogo do Livro, foi inscrito: ‘HÁ UM PAPA MARXISTA NO VATICANO? e em subtítulo: ‘Francisco, a economia que ‘mata’ e as amnésias dos católicos’. Só? Logo a seguir, para politizar q.b., uma bandeira do bispo do Recife: D. Helder Câmara: “Quando dou de comer a um pobre, me chamam de santo. Mas quando pergunto porque razão os pobres não têm comida, me chamam de comunista”. Decididamente, o Capitalismo foi, é e será sempre ‘a Economia da Exclusão e da Desigualdade’ (ibi, pp.7 e ss.). O 2º Livro em torno do Papa Francisco (de que pretendíamos fazer menção especial) foi elaborado por dois Jornalistas distintos e eméritos (António Marujo e Joaquim Franco) e tem por título: ‘PAPA FRANCISCO: A REVOLUÇÂO IMPARÁVEL’ (Pobreza, economia, clima, justiça, família, Vaticano, as reformas e as oposições). Manuscrito, Lisboa, 2017. Se dúvidas eu tivesse sobre a teimosa visão platónica e paulina do Cristianismo, depois dos 6 ou 7 livros já lidos sobre o Papa Bergoglio (que veio lá do Sul, da Argentina, Buenos Aires), este livro que temos em mãos desfez-nos todas as ambiguidades: o Papa é, em termos filosóficos, um bom hilemorfista/aristotélico. Não estaria, por conseguinte, nos seus intentos, condenar, cerce, a ‘Teologia da Libertação’ na América Latina e nas Índias e degolar a Revolução Sandinista na Nicarágua, ‒ como vieram a fazer os dois papas anteriores, João Paulo II e Clemente XVI, nos concílios regionais de Medellin e Puebla. O Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo parece, em boa verdade, que não faz parte da sua culinária ou sequer da sua biblioteca actancial. Ainda bem! Se quiséssemos proceder a um resumo acabado da personalidade e das características principais do Papa Francisco, poderíamos glosar o título do 1º cap. deste Livro: ‘Um pensador em Acto à escuta do mundo’ e adicionar o limiar da nossa interpretação: ‘Observatório, atento e com muita acribia, dos Humanos integrais e do seu Mundo, constituído, finalmente, em função das suas percepções e avaliações qua Sujeitos, e não apenas objectos’ (p.23). “É na sua encíclica sobre a questão ecológica ‒ Laudato Sé (Louvado Seja). Sobre o cuidado da casa comum ‒ que o Papa leva mais longe a sistematização das suas críticas a um sistema que submete a política à finança, relacionando diferentes factores e realidades: crise ecológica e ambiental, pobreza e subdesenvolvimento, depredação e esgotamento de recursos, concentração de grandes grupos financeiros e dívida externa, natalidade e fim da biodiversidade, privatização da água e dívida ecológica, ecologia social e desigualdade. “O Papa entende que “uma verdadeira abordagem ecológica” exige “uma abordagem social”, ouvindo em simultâneo “o clamor da terra” e o “clamor dos pobres”. Francisco repropõe alguns princípios, que vêm dos primeiros séculos do cristianismo, como o destino universal dos bens e a sua primazia sobre a propriedade privada. Mas, precisamente por causa de tais argumentos, este foi o seu documento que mais críticas suscitou, nalguns sectores católicos e político-financeiros”. (Ibi, p.38). ‒ Por quê? A Doutrina Social da Igreja, ao longo de 2 milénios, uma vez vasada no molde dualista platónico-paulino, ou foi assumida como pura caridade (gratuita), ou uma simples performance cultivada por alguns cristãos!... Mas, em Bergoglio, a D.S. da I. encontra-se solidamente articulada em três pilares fundamentais: “Esta relação tripartida entre a pobreza e o (subdesenvolvimento), os atentados ao meio-ambiente e o problema da paz está por detrás da ideia da ecologia integral, inspirada em Francisco de Assis, em quem se notava “até que ponto são inseparáveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenhamento na sociedade e a paz interior. E acrescenta o Papa, de novo sobre a realidade contemporânea, que “não podemos deixar de reco-
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nhecer que uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres” (ibi, p.199). *
● A propósito de dois Livros (muito embora porfiados em Fazer Luz!...), mas, tristemente, mal concebidos e mal orientados: ‒ Um é do nosso já conhecido Autor (historiador na Univ. Hebraica de Jerusalém) (e já autor de um Livro anterior titulado ‘Sapiens’), de seu nome Yuval Noah Harari. Tem por título: ‘HOMO Deus: História Breve do Amanhã’. (Ed. Elsinore, Braga, 2017). Celebrado pelo Guardian como Livro do Ano: Evening Standard. Na contracapa, o Livro está pejado de lembretes chamativos, qual deles o mais surpreendente: ‒ A guerra desapareceu… É mais provável cometer um suicídio do que morrer num conflito armado; ‒ A fome está a desaparecer’… É mais alto o risco de obesidade do que de fome; A morte tornou-se um simples problema técnico… Não alcançámos a igualdade, mas estamos perto de alcançar a imortalidade; O que nos reserva o futuro? Homo Deus explora os projectos, sonhos e pesadelos que darão forma ao séc. XXI, desde o vencer da morte à vida artificial. Sucessor do bestseller internacional Sapiens. História Breve da Humanidade, coloca as questões fundamentais: para onde seguir a partir daqui? Como proteger o mundo dos poderes destrutivos do ser humano? Chegámos ao próximo passo-evolucional: Homo Deus. Mas o lembrete mais assisado é o 1º: “A história começou quando os homens inventaram os deuses e terminará quando os homens se transforarem em deuses”. N.B.: Curiosamente, o Autor desconhece (nunca empregou a fórmula nos seus dois livros referidos…) a expressão ‘Homo Sapiens//Sapiens’, que as Ciências da Evolução me ensinaram, desde os meus 15 anos!... O que se passa é que o próprio mundo da Experiência e o da experimentação positiva estão separados, segundo a cartilha do Dualismo platónico-paulino. Foi o que, em René Descartes, foi designado de Mecanicismo cartesiano. Em resultado disso, é completamente desconhecida a raiz e o grau coeficiente da Experiência que residem no mundo do Sujeito. O autor descreve-nos o painel do que chamou a Equação da Vida (segundo o catecismo do ‘Homo Sapiens tout court’. Para nos darmos conta destas aporias, vale a pena relermos, atentamente a página 130 do Livro em questão, que baliza o Quadro do funcionamento científico esperado: “Os cientistas não sabem como é que um conjunto de sinais eléctricos no cérebro cria as experiências subjectivas. Mais importante ainda é que nem sabem quais são as vantagens evolutivas desse fenómeno. É a maior lacuna para a nossa compreensão da vida. Os humanos têm pés porque ao longo de milhões de gerações isso permitiu que os nossos antepassados perseguissem coelhos e fugissem de leões. Os humanos têm olhos porque no decorrer de milénios os olhos permitiram aos nossos antepassados ver para onde iam os coelhos e de onde vinham os leões. Mas porque é que os humanos têm experiências subjectivas como a fome e o medo? “Até há bem pouco tempo, a resposta dos biólogos era simples. As experiências subjectivas eram essenciais para a nossa sobrevivência, porque, senão tivéssemos fome ou medo, não nos daríamos ao trabalho de caçar coelhos e fugir de leões. Porque é que os homens fugiam ao avistar um leão? Bem, faziam-no porque tinham medo. As acções humanas eram explicadas pelas experiências subjectivas. Porém, actualmente, a explicação dada pelos cientistas é mais pormenorizada. Quando um homem avista um leão, o olho emite sinais eléctricos para o cérebro.
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Esses sinais estimulam determinados neurónios, que reagem disparando outros sinais. De caminho, estes estimulam outros neurónios que, por sua vez, disparam outros sinais. Se um número adequado de certos neurónios disparar a um ritmo suficientemente rápido, as glândulas adrenais recebem ordens para inundar o corpo de adrenalina, o coração recebe instruções para bater mais depressa, enquanto os neurónios situados no córtex motor enviam sinais para os músculos das pernas, que por sua vez se contraem e distendem fazendo com que o homem fuja do leão. “É irónico que quanto melhor descrevemos este processo mais difícil se torna explicar as sensações da consciência. Quanto mais compreendemos sobre o cérebro, mais a mente nos parece redundante. Se todo o sistema funciona com sinais eléctricos a passarem de um lado para o outro, então por que raio também temos de sentir medo?”. ‒ Entrámos na galáxia do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo… e o resultado foi a adulteração de todo o Cosmos segundo a cartilha do Mecanicismo cartesiano. É ainda neste Universo que nós sobrevivemos!... Como é tão diferente o quadro da Vida descrito e apercepcionado segundo a gramática do Hilemorfismo aristotélico?!... O segundo Autor, que desejamos arrolar, aqui, é de outra índole. É venezuelano de origem, doutorado pelo M.I.T. e investigador no Carnegie Endowment for International Peace. F. Fukuyama faz-lhe justiça em considerá-lo como ‘um dos observadores mais argutos da cena mundial’. De seu nome Moisés Naím, é autor de um Livro sério, que merece ser lido com atenção e urgência, mas, igualmente, com o sal e o tempero do costume. O título maior é muito simples: ‘O FIM DO PODER’! O subtítulo (genitivo de objecto…) vem a seguir: “Dos Campos de batalha às Administrações, aos Estados e às Igrejas. Porque ter Poder já não é o que era”. (A edição em port. é da Gradiva, 2014). É, sem dúvida, um livro pertinentíssimo e que ensina muito aos incautos cidadãos comuns. Não podemos, no entanto, deixar de lamentar a sua típica lógica monolinear. Aprender a ler as coisas do direito e do avesso foi a 1ª Lectio que nos ensinaram os Gnósticos judeo-cristãos primevos (designadamente o evangelho de Tomé e o evangelho de Filipe). Para eles, em Jesus, o que mais importava era a sua qualidade de Novo Profeta e o Significado de Libertação social da sua ‘ressurreição’!... De igual modo, o que neste Livro de M.N. mais nos deveria interessar era, no cruzamento das duas dialécticas, a que alimenta a Liberdade Responsável, perante a que vai diminuindo ou enfraquecendo o Poder-Dominação d’abord. Por isso mesmo, os Gnósticos ‒ contra o ensinado pela Igreja católica oficial, nunca queimaram incenso ao Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo. A vida é uma só! E importa vivê-la, socialmente, da forma mais digna e salubre possível! Todavia, o Livro em causa é utilíssimo. Na contracapa, pode ler-se como bandeira: “Numa investigação original e muito bem fundamentada, Naím mostra como o impulso anti-establishment dos micropoderes pode derrubar tiranos, desalojar monopólios e abrir novas e extraordinárias oportunidades, mas também levar ao caos e à paralisia. Naím cobre habilmente as mudanças sísmicas em curso no mundo dos negócios, da religião, da educação, das famílias, com exemplos retirados de todas as áreas da actividade humana. Acessível e convincente, O Fim do Poder constitui um olhar revolucionário sobre o fim inevitável do Poder ‒ e sobre como esse fim irá mudar o nosso mundo”. ‒ Se tudo vier a correr certo e bem, o que pode configurar-se, nas nossas expectativas, é a necessária e iniludível emergência do paradigma justo da Espécie Humana: O ‘Homo Sapiens//Sapiens’, contra o ancestral e decrépito ‘Homo Sapiens tout court’. Bill Clinton (o ex-presidente dos U.S.A.) ousou deixar, igualmente, na contracapa o seu bom presságio: “ ‘O Fim do Poder’ vai mudar a maneira como lê as notícias, como pensa na política e como olha para o mundo”.
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Há um capítulo (no Livro) sobre o qual o Autor estrutura a sua investigação. É o cap. 4, que ele titula como segue: ‘Como o Poder perdeu a influência ‒ As revoluções do Mais, da Mobilidade, e da Mentalidade ………………………………………………………………84» Então, o que mudou? …………………………………………………………………86 A revolução do Mais: esmagar os meios de controlo ………………………………..88 A revolução da Mobilidade: o fim das audiências cativas …………………………...94 A revolução da Mentalidade: já nada está garantido …………………………………103 Como funciona? ………………………………………………………………………104 Consequências revolucionárias: minar as barreiras ao poder ………………………..111 Barreiras em baixo: a oportunidade dos micropoderes ……………………………..117»
N.B.: A tríade é astuta e pertinente e, em termos epifenoménicos, dá conta da realidade humano--social à escala universal, no período que se seguiu à ‘guerra fria’. O delicado em tais matérias, contudo, é que as duas dialécticas contrárias ‒ Autoridade/Poder e Iniciativa Livre ‒ não se po-dem somar ou subtrair, visto que as suas intenções podem carrear semânticas diferentes, não homólogas e até contrárias!.
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HOMO SAPIENS TOUT COURT (Não tem consciência… Nem sabe que sabe!...)
SISTEMA CAPITALISTA (Ninho viperino de contrários e contradições, sem resolução a não ser pela luta.) (Por um que ganha, há sempre dois que perdem!...)
Exergo: “Para que serviram os Saberes e as Ciências positivas e experimentais, numa Cultura Contraditória, bastarda, machista-patriarcal e esquizofrénica?!...” (M.R.: 2017).
N.B.: A Cultura da Potestas (sacra) d’abord (mesmo nos regimes Republicanos e Democráti-cos…) ainda perdura, hoje (= na Idade dita moderna), desde que o processo histórico/civili-zatório patriarcal-machista teve a sua origem, desde há mais de cinco milénios e meio ‒ instau-rando as Divindades iranianas e pondo termo a quatro milénios de GILANIA (onde a Igual-dade social embora com funções distintas, entre Homem e Mulher, era prática corrente). Foi na galáxia patriarcal-machista, que ainda hoje vige e impera, que se edificou, na Cultura e nas Ciências, o que o C.E.H.C. tem chamado o primado absoluto dos Objectos sobre os Sujeitos: a Metodologia e a Epistemologia do Objectivo-Objectualismo. Neste horizonte, como é óbvio, os Objectos (Mercadorias) no Processo do Conhecimento, como no mundo da Economia políti-ca, estão em equilíbrio operacional total, por sua natureza e estrutura societária, com o que os economistas e toda a gente chamam e sempre têm designado, sem resistências, Capital. Nem o próprio Karl Marx e seu Amigo e companheiro de Luta, F. Engels, tiveram esta intuição e procederam ao respectivo exame crítico (como Lutero havia reivindicado para cada cristão, sobre a leitura das Escrituras Sagradas): Objecto (do Conhecimento) = Capital (em Economia políti-ca). “Do ponto de vista histórico-directo, o Tema é relativamente recente; no Ocidente co-meçou, aberta e universalmente a ser explorado, a partir dos alvores da chamada (1ª revolução industrial: 1720); mas o seu embrião medieval já se encontrava nos ‘juros’ sobre os emprésti-mos de Dinheiro às Hansas e às Guildas: os chamados ‘prestami all’interesse’ (que a I.C.R. aceitou e legitimou, logo nos sécs. XIII/XIV). (O Islão ‒ como se viu ‒ só veio a legitimar isso, em finais do séc. XIX)”.
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● A Cultura do Poder/Dominação d’abord, na sua grande Arquitectura, pode esquadrinhar-se no esquema seguinte: 1º Tudo começa na Teoria platónica-paulina do Dualismo metafísico-ontológico, que nos entrega, na bandeja: duas vidas ‒ a temporal/histórica e a eterna. 2º Essa Dualidade de Vida encontra-se respaldada, em termos gnoseológicos, no Monismo Epistémico, conseguido por meio dessa híbrida/falsa ciência que se chama Metafísica (já ultrapassada a partir de I. Kant). 3º A estrutura arquitectónica processa-se em Hierarquias substantivas (à semelhança dos zigurates persas, onde a Arquitectura piramidal procede do Vértice: a Divindade, que é a fonte de todo o Poder/Autoridade. ‘Non est potestas nisi a Deo’ (Rom. 13,1). 4º Esse Poder/Autoridade (divino) é caracterizado, no catecismo das 3 religiões monoteístas, no seu supra-sumum: Ele é criador (a partir do néant) de todo o Universo: por isso, é-lhe extrínseco e transcendente. 5º Ora, todos os Deuses ou Divindades foram inventados por humanos. Aporética e paradoxalmente, o Objecto (criado pelos sujeitos humanos) sobrepujou os próprios Sujeitos!... (Não se passa este contrasenso com a Divindade de B. de Espinosa: o Deus sive Natura; nem com a Divindade de T. de Chardin: Deus (evolutor)/Ponto Omega). 6º Segundo a Arquitectura (ideológica) bíblica tradicional, Todo o Poder vem de Deus (‘Omnis Potestas a Deo!’): é, por isso, sacro, sacrossanto. Em meados do séc. XVII, o teólogo jesuíta, Francisco Suarez, já cheirando os alvores da Modernidade, encontrou uma fórmula mais adequada aos novos tempos: ‘Omnis Potestas a Deo per populum’!... Como se pode ver, esta é ainda uma formulação híbrida, que não rompeu o odre ancestral da origem divina do Poder. 7º Eis por que uma tal solução, parecendo embora que sim, não alterou, substantivamente, a arquitectura da velha Cultura. Nos Tempos Modernos (como lhe chamou R. Guardini), tivémos monarquias absolutistas, as lado de monarquias constitucionais; sem esquecer as Repúblicas, oficialmente iniciadas pela França (não sem a implicada decapitação do rei Luís XVI). 8º No contexto desta Arquitectura ideológica em causa, não havia cidadãos reconhecidos em pé de Igualdade por um qualquer Regime Democrático. Havia elites e governantes (dum lado), e do outro, as massas/multidões: rebanhos conduzidos por pastores, ‘carneiros de Panúrgio’, como diria Molière. É indiscutível que os Regimes (políticos) caracterizam os Humanos e estes caracterizam os seus regimes políticos… 9º As Sociedades, constituídas por Humanos/cidadãos/ãs dignos do Nome, pertencem ao paradigma evolucionário específico do ‘Homo Sapiens//Sapiens’; as Sociedades, constituídas por massas/multidões, seguidoras obedientes dos seus Chefes, são semelhantes a Rebanhos conduzidos por pastores (sociedades dualistas) e pertencem ao padrão pré-específico do Homo Sapiens tout court. 10º Estas sociedades ‘de pastoreio’ enchem a boca de palavras que soam liberdade, sempre conduzidas, demagogicamente, pelas elites/chefes, mas não passam de récuas de camelos. A liberdade, de que tanto falam (chefes e súbditos) não é outra coisa senão a triste e trágica realidade da lei do pêndulo de Foucault. N.B.: Uma Advertência muito importante, em toda esta Arquitectónica religiosa/ideológica: o martelo pilão/o Big Ben é a Potestas Sacra, oriunda directamente da Divindade e dos seus predicamentos extrínsecos e transcendentes ao Universo. Uma pura fantasmagoria, à luz da Razão e do Direito Naturais. A História das Sociedades humanas já nos ensinou as perversidades suficientes acerca de todas estas conjunturas!... Mas é, efectivamente, a partir de tais fantasmagorias ideológico-religiosas, que as sociedades ditas humanas constróiem os seus heróis e
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super-homens, capazes de ultrapassarem todos os limites!... Foi totalmente esquecida a Regra aristotélica do Mesótes, da justa medida!... E, curiosamente, é nessa Regra biológica universal que se fundam os princípios geminadas da Igualdade e da Liberdade Responsável. De facto, quanto mais diferentes, em termos biológicos, se apresentarem os indivíduos humanos, no seu vis-à-vis, tanto mais difícil, senão impossível, edificar a Sociedade humana dos Iguais, Livres e Fraternos.
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A MENTIRA nos comportamentos e na Vida corrente N.B.: Não se trata, aqui, da Arte dramática, encenada em palco, numa qualquer peça de teatro, onde a Linguagem, nas suas variantes, detém a sua importância semântica própria e chega mes-mo a tirar partido das suas performances em torno da magna quaestio da Verdade e da Menti-ra!...
A Rev. ‘National Geographic’ de Junho de 2017 traz um longo artigo sobre a temática da MENTIRA, pp.30-52, subordinada ao título: ‘WHY WE LIE’ ‒ meio a sério, meio divertido, como é seu costume… mas tudo somado, diremos, muito mais divertido e sem qualquer propósito de intencionalidade disruptiva, em busca de um Mundo Alternativo!... O Tema veio mesmo anunciado na capa exterior, em plano central: ‘WHY WE LIE’, com uma legenda semântica a enquadrar-lhe o significado preciso, não vá o leitor em demanda de mais do que é oferecido, dentro da gramática do nosso mundo comum: ‘The science behind our complicated relationship with the truth’. ● O princípio de que se parte é o seguinte: Estamos todos (os Humanos) dentro do odre sacrossanto e unificado das ciências físico-naturais, onde o catecismo é ternário (não binário): positivo, negativo, neutro. O hemisfério das ciências psico-sociais e/ou humanas é completamente desconhecido: aí a palavra (a palavra pessoal de cada Indivíduo-Pessoa) é enunciada por Jesus segundo Mateus (5,37) tal como segue: ‘Sit autem sermo vester, est, est; non, non; quod autem his abundantius est, a malo est’: ‘Que a vossa linguagem seja: ‘Sim? sim’, ‘Não? Não’: o que se diz a mais vem do Mau’. Foram os Gnósticos judeo-cristãos (dos inícios da Era comum), aos quais pertenceu Jesus, o nazoreu, que nos ensinaram e transmitiram: não o Monismo epistémico; mas a dualidade epistemológica, onde o que avulta é a díade do sim e do não, do bem e do mal. Só nesse pressuposto é possível formar e formatar, adequadamente, as consciências humanas para o bem e para o mal: i.e., para a Liberdade Responsável que nada tem a ver com a estafada lei do pêndulo ou do simples livre arbítrio (como nos têm ensinado todos os doutores da lei e da Igreja, desde Paulo e Agostinho e Lutero e Erasmo, até Stuart Mill). As possíveis e muito raras excepções só confirmam a regra. O teor do estudo/investigação, que é levado a cabo nesta Revista, pode condensar-se na máxima seguinte (ibi, p.31): “Honesty may be the best policy, but deception and dishonesty are part of being human”. Como manda a boa Regra do discurso ‘científico’, com uma só paulada matam-se dois coelhos: Mentira/Sim; Mentira/Não. Honestidade/Sim; Desonestidade/Sim. Esta Ciência nunca servirá para balizar e orientar os bons comportamentos ou condutas. Diz-se o ideal, na teoria… e o seu contrário na praxis. Esquecemo-nos de que no hemisfério das ciências físico-naturais, o esquema epistémico a adoptar é triádico, sim; mas no hemisfério das
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ciências psico-sociais e/ou humanas, o esquema epistémico a adoptar não pode ser outro senão o esquema binário. De contrário, não sairemos dos varais dos animais comuns, dos Rebanhos conduzidos por Pastores. Por que é que as crianças aprendem a mentir, desde a 1ª e a 2ª infâncias?!... Dentro da Cultura do Poder-Dominação d’abord, a arte de mentir constitui, mesmo, a grinalda para receber a esperada guloseima, sem o menor esforço psico-fisiológico… As pessoas mentem por simples brincadeira, sempre julgada inocente e sem malícia. As pessoas mentem, muitas vezes, para dar cobertura polida aos seus maus comportamentos!... (p. 36). Assevera o investigador Tim Levine: “We all lie, but not all lies are the same. People lie and tell the truth to achieve a goal: ‘We lie if honesty won’t work’. ‒ 36% mentem para se protegerem a si próprios; ‒ 44% mentem para se promoverem a si próprios. ‒ 11% mentem para exercer impacto sobre os outros. ‒ 9% sem posição precisa. (cf, ibi, p.39). Mas há, sempre quem prefira dar ‘curvaturas à verdade’ (bending the truth): “The truth comes naturally’, says psychologist Bruno Verschmere, ‘but lying takes effort and a sharp, flexible mind’. Lying is a part of the developmental process, like walking and talking. Children learn to lie between ages two and five, and lie the most when they are testing their independence”. ‒ O que só acontece ‒ curiosamente ‒ na sempiterna Cultura do Poder-Dominação d’abord! Que ninguém tem a coragem de discutir!...
AS DUAS CULTURAS SÃO DIFERENTES E DIAMETRALMENTE OPOSTAS: A) A CULTURA DO PODER/DOMINAÇÃO D’ABORD E B) A CULTURA DA LIBERDADE RESPONSÁVEL PRIMACIAL E PRIMORDIAL
N.B.: A) segue o padrão da pré-espécie humana, que ainda não amadureceu; e tal padrão leva o nome adequado: o do ‘Homo Sapiens tout court’. São os exemplares das massas/multidões, conduzidas e guiadas por Pastores/Elites, que detêm os Poderes do Comando e das Chefias. Nas massas/multidões, não é a razão e a inteligência que predominam; são os instintos e os hábitos adquiridos. Essas são Sociedades inexoravelmente escandidas em hierarquias substantivas. O Poder supremo é atribuído e reconhecido numa Divindade uraniana, que, para que a auréola atinja o máximo, essa Divindade é assumida como criador (do nada…) de todas as coisas e se-res contidos em todo o Universo. Por isso, é considerada Omnipotente e Omnisciente. Essas são Sociedades, por definição, dualistas metafísico-ontológicas, como foram en-gendradas pelo filósofo helénico Platão, e, pelo seu sequaz, o fariseu Saulo/Apóstolo Paulo, que embora espúrio, fez questão em considerar-se apóstolo de Cristo Jesus e é o vero fundador do Cristianismo messiânico. B) segue o paradigma da Espécie (evolutiva) humana, já definitivamente amadurecida. O nome do paradigma adequado, que lhe cabe, é o do ‘Homo Sapiens//Sapiens’: o Homem (ou mulher), que é duplamente sábio: sábio como Sujeito activo, que é capaz de conhecer; e sábio no concernente ao objecto do Conhecimento. Na sua Consciência crítica/criticista, o Saber vai a tal ponto, que, além do Sujeito Cognoscente e do Objecto conhecido, emerge, natural e pro-cessualmente, um terceiro elemento da tríade da Consciência, que dá pelo nome de Testis/Tes-
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temunha da Verdade conhecida e afirmada. Trata-se da Luz de Deus ou do Espírito Santo, como lhe tem chamado o C.E.H.C.. Os Humanos desta Espécie (qualificada) são, por sua natureza, iguais e fraternos dota-dos de Liberdade Responsável; dispensam, completamente, as hierarquias substantivas. Não têm outro regime de Organização societária senão a mais rigorosa e exigente DEMOCRACIA. A sua divindade ‒ como diria Aurélio Agostinho ‒ é o ‘intimior intimo meo’: é mais íntimo a mim do que eu me sou a mim próprio. Não há dois mundos para as gentes desta Espécie Humana: a histórico-temporal e a eterna. O seu Projecto e Desejo activos são o de sempre transformar in melius a Sociedade pre-sente, que tanto carece disso e que é tão menosprezada (até ecologicamente…). Que não há, no horizonte das Escrituras dos Gnósticos judeo-cristãos primevos, quais-quer indícios de Dualismo metafísico-ontológico platónico/paulino, pode ser perfeitamente ar-gumentado, designadamente, a partir do Evangelho (gnóstico) de Tomé (v.100): “Dai a César o que é de César; a Deus o que a Deus pertence; e a mim o que é meu”. Há, assim, três hemistí-quios, não apenas dois, ‒ o que, desde logo, na atmosfera gnóstica, dissolve, por completo o Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo. De facto, os Gnósticos judeo-cristãos prime-vos mantinham e prezavam uma concepção holística (indivisível) do Psico-Sócio-Ânthropos integral!
● É surpreendente como a narrativa do Gén. (sobretudo até ao cap. VI, onde se fala da corrupção da humanidade e da preparação de um dilúvio para a corrigir), ostente uma tonalidade épico-trágica moderada. Até nos pode causar surpresa como e por que motivo Paulo, Agostinho e Lutero foram capazes de auscultar, aí, indício seguros para o que chamaram ‘pecado original’ e argumentação séria para o advento de um Futuro Messias, com todo um Programa de Messianismo salvador. É que todos os messianismos são de mau agoiro, se pensarmos na espécie própria do ‘Homo Sapiens//Sapiens’! Pior a emenda que o soneto… Podemos até concluir que a narrativa genesíaca, com o seu estro épico moderado, não nos estimula a sensibilidade para a concepção de um Deus, omnipotente e omnisciente, extrínseco ao Universo e criador supremo do Cosmos. Se a dimensão histórica tem significado e razão de ser, nestas questões de Deus, ela aplica-se por inteiro ao Deus do A.T. e, à fortiori, ao Filho primogénito da Divindade neotestamentária. Um diferendo da ‘Bible de Jérusalem’ (Desclée de Brouwer, 1955), em confronto com a ‘Vulgata Clementina’ (Madrid, 1953). Ex. 3, 14-15: “Dieu dit alors à Moïse: ‘Je suis celui qui suis’. E il a jouta : ‘Voici en quels termes tu t’adresseras aux enfants d’Israël : ‘Je suis, m’a envoyé vers vous ; Dieu dit encore à Moïse : ‘Tu parleras ainsi aux enfants d’Israël !: Yahvé (v), le Dieu de vos pères, le Dieu d’Abraham, le Dieu d’Isaac et le Dieu de Jacob, m’a envoyé vers vous. C’est le nom que je porterai à jamais, sous lequel m’invoqueront les génération futurs ». Ex.3, 14-15 : « Dixit Deus ad Moysen : Ego sum qui sum. Ait: Sic dices filiis Israel: Qui est, misit me ad vos. Dixitque iterum Deus ad Moysen : Haec dices filiis Israel : Dominus Deus patrum vestrorum, Deus Abraham, Deus Isaac et Deus Iacob misit me ad vos : hoc nomen mihi est in aeternum et hoc memoriale meum in generationem et generationem ». ‒ Esta identidade divina está mais generalizada na história do que a primeira. Mas a 1ª não fez a transição ‘metafísica’ que se tornou proverbial na história de ca. de 3 milénios!... A citada Bíblia de Jerusalém fez este comentário muito precioso à perícopa em causa: “Yahvé. Ce nom (cf. 6,2) est sans doute une forme archaïque du verbo être (einei, no grego). On peut penser que Dieu refuse de livrer son essence : ‘Je suis qui je suis’. Mais la Tradition a préféré en générale comprendre ‘Je suis celui qui est’ : ce qui afirme l’éxistence plénière de Dieu, sinon encore son Être absolu tel que les philosophes et théologiens le définiront. Pour Israël, ce nom qui oppose Yahvé au néant des autres dieux, évcoque toute la geste divine de la délivrance du Peuple avec les attributs qu’elle met en jeu. Jesus s’appliquerá à lui-même l’expression ‘Je suis’, cf. Jo. 8,24+. ‒ O diferendo real no sentido da Tradição cristã consagrada postularia o verbo ser na 3ª pessoa gramatical, com o significado do infinitivo, à boa maneira dos filósofos
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e teólogos. Mas, curiosamente, o que se lê é a 1ª pessoa do indicativo, como quem evoca um ser como outro qualquer, praticante de actos e actuações correntes a favor do seu Povo. ● E se o vocábulo ‘El Chaddaï’, em hebraico, não pretende dizer outra coisa senão ‘Aquele que diz chega’, ‘Aquele que estabelece limites’?! Na época da ‘física quântica’, isto mesmo tem um sabor especial!... Esta notio, atribuída a Yahwéh está muito próxima daqueloutra, que nós próprios colhemos nas ‘Confissões’ de Aurélio Agostinho, e que ele próprio enunciou como segue: ‘O intimior intimo meo’!!! Aquela noção nasceu na cabeça da holandeza Etty Hillesum, no período do Holocausto. Não resistimos, a propósito do tema, em transcrever a p. inteira do Apêndice de Maria Filomena Molder (p.171), no seu artigo titulado ‘ETTY HILLESUM: A DIFERENÇA ENTRE SALVAR [zu retten] E LIBERTAR [zu erlösen] A EXISTÊNCIA PESSOAL’ (pp.155-172). (in ‘Marginalidade e Alternativa/Vinte e seis Filósofas para o século XXI’, Edições Colibri, Março, Lisboa, 2016). “Em 1984, ao receber o prémio Leopoldo Lucas, atribuído pela Univ. de Tübingen, Hans Jonas proferiu uma conferência intitulada ‘O conceito de Deus depois de Auschwittz’ (na qual retomava, desenvolvendo-a de modo particular, uma tese já formulada em texto anterior) conceito que transtorna as nossas expectativas em relação à sua omnipotência ‒ o que, aliás, não tem correspondência no texto bíblico original, já que omnipotência é uma escolha dos tradutores, gregos e latinos, para o termo hebraico El Chaddaï, que significa literalmente ‘Aquele que diz ‘chega’, ‘Aquele que estabelece limites’. Estamos diante da aceitação de que Deus tem, por assim dizer, de ser ajudado pelo ser humano. Desde os grandes Profetas que o silêncio de Deus se faz ouvir de modo angustiante e o único modo de tornar Deus presente é a oração que aceita o silêncio, um sinal de que agora, desde que ouvimos o silêncio divino, temos de o coadjuvar. Numa nota final, Jonas revela que houve alguém que contribuiu decisivamente para a reformulação e o aprofundamento da sua tese, uma jovem holandesa, morta em Auschwittz, de quem ele teve o privilégio de ler os Diários, com tradução inglesa acabada de sair nos Estados Unidos. Citemos Jonas: A ideia de que somos nós que podemos ajudar Deus em vez de ser Deus a ajudar-nos, encontrei-a expressa de maneira comovente numa das próprias vítimas de Auschwittz, uma jovem judia holandesa, que a validou fundando sobre ela a sua acção até à sua morte […]. Os seus diários sobreviveram, mas só foram publicados recentemente […]. “Tentarei ajudar-vos, Deus, a impedir o declínio das minhas forças […]. Mas há uma coisa que se torna cada vez mais clara aos meus olhos, a saber, é que Vós não nos podeis ajudar, que nós devemos ajudar-Vos a ajudar-nos […]. Devemos proteger o Vosso lugar de habitação em nós até ao fim”. A leitura destas linhas foi para mim uma confirmação perturbante, através de um testemunho autêntico, das minhas meditações muito ulteriores e bem a salvo ‒ assim como uma consoladora correcção das minhas declarações demasiado generalistas, segundo as quais, não teríamos tido mártires. “Indiquemos que a passagem do Diário tem a data de 12 de Julho de 1942 e Jonas não cita nem o resto da entrada diarística nem outras passagens e, portanto, ignorava, indissociável da sua poderosa concepção religiosa, o calibre intelectual de Etty Hillesum, em particular, um sentido crítico que não conheceu vacilações (por exemplo, na apresentação que ela fez do Conselho Judaico holandês e da sua própria participação nele) um esforço de testemunhar e de se elevar, mediante o testemunho, à clareza da compreensão. A palavra mártir talvez não seja a melhor para esta mulher”. ‒ Martir e Profeta (geminadas).
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● Quando pensamos, globalmente e a sério, começando pela Ciência que nos é dada a conhecer sobre a história arqueológica da Humanidade de há mais de 4 milhões de anos, impõe-se-nos, absolutamente, discernir e caracterizar: primeiro, uma subespécie (ainda próxima dos Primatas e que podemos configurar, polarizada, no ‘Homo de Neanderthal’, que chegou a conviver no tempo (durante poucos milénios) com o ‘Homem de Cro-Magnon’, o paradigma reconhecido da Espécie Humana qua tal. Deve, aqui, advertir-se, que, em virtude do Quociente mental mais elevado deste, das suas destrezas mais adequadas e dos sítios mais fecundos e aprazíveis, em termos ecológicos, o paradigma da espécie humana pode evoluir razoavelmente, desde há 80.000/70.000 anos, criando condições para a completa extinção da subespécie humana anterior. Antes do advento das civilizações patriarcais e sob a abóbada dos Deuses uranianos (por volta de 3.500 antes da nossa Era comum), os exemplares do ‘Homem de Cro-Magnon’ até cometeram a proeza de constituir Sociedades igualitárias e fraternais, sob a BANDEIRA DA GILANIA, onde homens e mulheres (com naturais funções vitais e sociais diferentes), viviam em harmonia e paz durante 4 milénios, numa perspectiva horizontalista e igualitária, porque as divindades femininas tinham outras funções que não as de estabelecerem hierarquias substantivas!... O ‘Homo Sapiens//Sapiens’ fez o seu advento histórico-cultural, vivendo em harmonia e paz, ao longo de uma Era de quatro milénios, desenvolvendo as suas capacidades harmoniosamente e pondo em exercício feliz os seus dons e predicamentos. O seu cumprimento holístico do Psico-Sócio-Ânthropos era percepcionado a partir de dentro para fora, da mens para o seu organismo (ou corpo orgânico); em contraste com esta formação, elaborada ab intus ad exteriora, começou a desenhar-se a realização arquitectónica do ‘Homo Sapiens tout court’, nos inícios da Era do Patriarcalismo machista, onde os emergentes Deuses masculinos uranianos era, afinal, quem ditava as ordens e estabelecia os ordenamentos. A Liberdade que os Humanos detinham e eram proprietários, manteve-se plenamente responsável, enquanto perdurou o padrão específico do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Quando, porém, se deu a mudança ‘civilizatória’, com os inventados Deuses masculinos uranianos, deu-se um vero zunami no tipo (horizontalista) da organização das Sociedades humanas: as ordens não são forjadas pelos iguais e fraternos; mas, outrossim, há comandos forjados pelos Deuses machistas e pelas sucessivas hierarquias de linhagem paterna, em lugar da linhagem materna. Como se trata de duas culturas diferentes e diametralmente opostas ‒ a do ‘Homo Sapiens tout court’ e a do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, a liberdade do 1º volveu-se em ‘livre arbítrio’ (a simples lei do pêndulo de Foucault), ao passo que a do 2º se manteve, originalmente, como era: uma Liberdade plenamente responsável. Eis por que as Sociedades do ‘Homo Sapiens//Sapiens’ são pacíficas e harmoniosas, por definição e estrutura; a grande Regra que aí vige é a da completa Integração dos neonatos bem como dos estrangeiros que pedem asilo ou o seu acolhimento. Em contraste com esse tipo de organização das Sociedades humanas, as do ‘Homo Sapiens tout court’ e do estrito ‘livre arbítrio’ são sociedades belicosas por definição, são incapazes de manter uma paz duradoura. Até lavraram na pedra mármore dos seus Templos, a Regra cínica e perversa: ‘Si vis pacem para bellum’!... As Sociedades da Cultura do Poder-Dominação d’abord e do ‘Homo Sapiens tout court’ engendraram uma panóplia de Regimes políticos, desde as monarquias e oligarquias às nobrezas e democracias liberais, ‒ tudo artimanhas para manterem as ‘sociedades de classes’, onde impera sempre o princípio da exclusão do que não serve ou não é bem-vindo. Em contrapartida, para as Sociedades regidas pela Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial, criteriadas segundo a gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, só há, em
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definitivo, um único Regime político digno do nome e adequado à sua natureza: o Regime político, construído da base para o topo, de baixo para cima. Quando se fala no princípio de subsidiariedade, invocado em determinadas circunstâncias de ajuda ou socorro face a calamidades, é nessa gramática que tudo se funda. Assim, para a Espécie Humana qua tal, não há outro Regime político senão o verdadeiramente democrático. Nestas matérias políticas, a Geometria diz tudo: a boa e adequada Ordem Democrática edifica-se de dentro para fora: ab intra ad exteriora, o contrário ‒ ab extra ad interiora ‒ é o que se passa nas sociedades mais formadas e malformatadas, cujas actuações e comportamentos seguem as pautas dos instintos e dos hábitos, e prescindem da mente crítica e judicativa para as boas acções. Quando, no horizonte do Psico-Sócio-Ânthropos, tudo é, em última análise, edificado e procedente do Interior da Consciência Identitária, há, efectivamente, condições e oportunidades para que a Verdade vingue sobre a Falsidade e a Justiça sobre a Injustiça. Semper omnes includentes! Os seres humanos bem formados e completos levam um quarto da sua Vida a formarem e a formatarem a sua Instrução/Educação: 3/10 de Sensorium; 3/10 de Inteligência; 4/10 de Imaginação. Até aos 24/25 anos, quando a rede dos neurónios cerebrais se encontra concluída. Depois, é a Tríade da Consciência reflexiva e crítica a funcionar: Sujeito cognoscente//Objecto conhecido//Testemunha. (A Testemunha é a Luz do Espírito Santo, que atesta a Verdade conhecida, como tal, pelo Sujeito. Por isso é que o catecismo nos dizia, aos 7 anos, que o pecado contra o Espírito Santo não tem possibilidade de remissão!...). Como já dissémos, no nosso ‘memo-pad’, o aforisma de Aurélio Agostinho, nas suas ‘Confissões’, é suficientemente revelador, quer de Deus e sua natureza psíquica, quer das funções de testemunha que Ele mesmo exerce, com a sua Luz, para nos confirmar na verdade pensada como objecto de um Sujeito pensante: Aí, estabelecia o bispo de Hipona a sua máxima predilecta: Deus é o intimior intimo meo: mais íntimo a mim do que eu me sou a mim próprio!... Está certo e bem achado o título de E. Lourenço no seu artigo: ‘Como se Deus não existisse…’ (in ‘JL’ 21.6-4.7.2017, p.25). Desde que não invoque as elocubrações platónicas e paulinas. Também ele descobriu o ‘segredo’ de Agostinho. Começa assim: “De ‘Deus’ como realidade e enraizamento do ‘homem’ na sua humanidade nenhuma fórmula superou, ou pode facilmente superar, a versão agostiniana de Deus na sua relação como homem e do homem com Deus. Deus é aí descrito e visado como a presença que é mais interior ao que chamamos ‘homem’ que a ficção da sua autonomia e já ‒ por assim dizer ‒ divina identidade. “Assim traduziu o autor das Confissões a primeira versão ocidental de uma transcendência imanente ao homem e de uma imanência inclusa em Deus. Quer dizer, a nova auto-revelação, que no Cristianismo se manifesta de um Deus que se faz homem para que o homem a si mesmo se transcenda humanizando-se”. No termo do seu artigo, E.L. conclui como segue: “Jesus nunca se referiu a si mesmo como Deus, embora tenha sido crucificado por essa pretensão blasfema. Reclamou-se apenas de uma filiação divina, intrinsecamente humana: Filho do Homem. Foi como ‘filho do homem’ que se ofereceu à Morte no lugar de um Deus, que não pode morrer e identificar-se connosco. Que maior prova de amor existe que morrer no lugar dos que amamos?”. ‒ Até acresce, neste naco de texto de E.L., a ilusão falsa, em termos de código jurídico, de qualquer messianismo a justificar a posteriori!... O Cristianismo tornou-se a religião (etnocida) do Pecado e daí → do Medo e da Culpa. Embora assimétrico com o tópico anterior de E.L., saiu, recentemente (pela Ed. D. Quixote, o Livro de Miguel Real que dá pelo título: ‘Nova teoria do Pecado’ (2017). Se a Europa tem
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abandonado a vivência do pecado, não abandonou, em igual grau, a vivência da Culpa e do Medo! Vale a pena respigar estes dois parágrafos de Miguel Real, na Entrevista (ibi, p.23): “No livro que agora publiquei destaca-se o supremo pecado do Cristianismo, o ter-se transformado de religião e vivência europeias do sagrado em Poder político institucional, negando e oprimindo, ao longo de 1500 anos, as restantes religiões e complexos comportamentais (os costumes), substituindo-os por uma mentalidade virtuosa segundo os preceitos evangélicos ou bíblicos, impostos por um Estado opressivo e totalitário. Com o pretexto da eliminação do paganismo latino (mediterrâneo) e celta (os povos ditos ‘Bárbaros’), inclusive dos deuses presentes milenarmente na Península Ibérica, o Cristianismo constituiu-se como uma genuína máquina de eliminação civilizacional daqueles povos, o que hoje designaríamos por etnocídio cultural. Supremo inimigo cultural do Cristianismo: o corpo e as suas emoções, ditos sede do Demónio entronizado miticamente como figura universal do Mal. Em Nova Teoria do Pecado não desenvolvo a teoria do Corpo na Europa ao longo do poderoso domínio do Cristianismo porque… ‒ já o tinha feito noutro livro, de 2015, O Manifesto em Defesa de uma Morte Livre. Mas dizia… porque as emoções/paixões se constituem como o supremo inimigo do Cristianismo, o pecado constitui a categoria filosófica e religiosa, sobre a qual a Europa cristã assentou as suas constantes culturais e civilizacionais. Ou seja, a categoria sobre a qual edificou o Poder, o poder religioso, mas sobretudo o poder político e social. Quando se refere que a Europa cristã ergueu a sua civilização com base na categoria religiosa de pecado diz-se, consequentemente, que ela a ergueu sobre o modo singular de viver com a emoção primário do Medo e com o sentimento da Culpa. Medo e Culpa constituem as duas colunas ético-morais, que sustentam o edifício do Pecado. Por isso, Pecado, Medo e Culpa constituem o triângulo ético-religioso abordado neste ensaio”.
EM DEFESA DO ‘HOMO SAPIENS//SAPIENS’ DA LIBERDADE RESPONSÁVEL PRIMACIAL E PRIMORDIAL DAS CLASSES SOCIAIS E DAS NAÇÕES. OS IMPÉRIOS SÃO INÚTEIS E NEFASTOS ● Glosando R. Barthes: ‘Os males dos Humanos encontram-se quase sempre entre as mãos e os guarda-roupas dos Humanos’. 1ª Tese: Todos os Saberes científicos ou filosóficos que, ao longo de séculos e milénios, a Espécie Humana, qua tal, tal como uma Grande Nave em Viagem, adquiriu e pôs em prática, em cada época, assumiu e guardou como verdadeiros, estão sempre e estruturalmente dependentes de duas condições ou factores condicionantes, uma vez (e na media em que…) que se destinam à PRAXIS sócio-existencial: A) a ratificação da Verdade, através do implicado Se, formulado nos próprios princípios ou axiomas… que, por essa mesma razão nos levam a distinguir a Verdade científica e as Teorias verosímeis… B) a prova (comprovação: societária), mediante um 2º Se, decorrente da esfera da sua funcionalidade e utilidade efectivas, para o bom e completo desempenho na vida dos Indiví-
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duos, Grupos ou Classes sociais; e, cumulativamente, com vista ao Bom Funcionamento panenvolvente da Sociedade inteira, que justamente almeja o adequado Funcionamento da Humanidade holística. 2ª Tese: Num Tempo, como é o nosso actual, em que a Humanidade, no seu conjunto, espalhada por todo o Planeta Terra, se deu seriamente conta e começou a tomar Consciência activa e comprovada de, através das Alterações Climáticas e Ecológicas, a própria Vida humana, Terra e de todos os restantes seres vivos, se encontrarem severamente ameaçados de ruína e extinção, por culpa (directa ou indirecta) da acção hostil, predatória e perversa dos próprios seres humanos (desde 1953, já se fala na chamada ‘era do Antropoceno’, na escansão das Idades Geológicas!...), ‒ impõe-se-nos a Razão e a Lógica (decorrente do sentido da Responsabilidade, que ainda resta…) clamando e proclamando que é tempo de MUDANÇA: mudar, por completo, as nossas mundividências (Weltanschauungen) filosóficas e teológicas e científicas sobre Deus e a Divindade… que ainda persistem estereotipados e anquilosados no vasto Universo do Imaginário humano. 3ª Tese: Em termos criticistas, as Religiões Institucionalizadas não carecem, hoje em dia, de ser recauchutadas para continuarem a subsistirem como tais e a exercerem as suas funções arqueologicamente habituais. Neste sentido, todas elas não apregoam nem promovem outro programa senão o do ‘Homo Sapiens tout court’, o que se limita com o ‘livre arbítrio’ e o tipo de sociedades de ‘Rebanho’. As mais ‘ilustradas’ dentre elas (em contraste com as ‘primitivas’ de natureza supersticiosa…) têm a sua ancoragem (ostentatória) na divina Metafísica ontológica de Platão e Paulo; e constituem-se, ipso facto, como intrinsecamente Dualistas: apoiadas nas Ideias (objectivo-objectuais) ônticas do Hiperurâneo. Paulo (Saulo de Tarso), o criador histórico do Cristianismo seguiu por essa mesma via, multiplicando Ilusões sobre Ilusões… Categorias ideológico-metafísicas, que não passam de falácias discursivas. Ora, uma vez estilhaçadas, combatidas e postas de parte as Ideias esquizofrénicas do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo, é a HORA de as energias humanas (todas elas… mas as monoteístas, em primeiro lugar) psíquicas das Religiões Institucionalizadas serem, adequadamente, aproveitadas e investidas em dois caminhos essenciais e recíprocas: A) Recuperar, em toda a sua plenitude, o Planeta Terra; B) Juntar e reunir todas as energias necessárias e indispensáveis, para ajudarem as Sociedades humanas a Humanizarem-se segundo a gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’ foncièrement. Já não basta o ‘Homo Sapiens tout court’: o que nós inscrevemos, nos anos da rev. port. de ’74, no título (irónico) do nosso Livro ‘Camelo ou Animal político’! As Constituições políticas modernas, balizadas pelo Iluminismo oitocentista, souberam que todos os Humanos nascem livres e iguais, da mesma fonte dupla (pai//mãe), união fraternal de espermatozóide e óvulo. Sabe-se, entretanto, que todo esse discurso, à força de repetição malsinada, ficou enredado na pura teoria; e logo se deu conta, que a realidade real é bem diferente: toto coelo diferente!... É claro que, também aqui, se fazem sentir os efeitos, atmosferas e consequências do Dualismo ontológico de Platão e Paulo. As Sociedades continuam a ser organizadas segundo os esquemas estafados do Centralismo monárquico e hierárquico (mesmo quando se invocam de republicanos). Os Impérios estão longe de manterem e assegurarem a consistência das Nações bem formadas. Os 1os dissolvem-se ao primeiro sopro dos ventos suões!... ‘Poussières d’empire’: “En 1920, Londres regne sur un quart de la population mondiale. Il s’agit du plus grand empire de l’histoire de l’humanité. Un siècle plus tard, la geographie britannique a changé. Le Rayonnement de la Couronne demeure néanmoins considérable, notamment à travers le Commonwealth, tout comme celui de la langue anglaise, souvent considéré comme l’idiome de la mondialisation » (Cf. ‘Manière de Voir’, Juin-Juillet, 2017, p.14).
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« Dans un article de 1993, l’intellectual américain David Bieff interrogeait : ‘Les multiculturalistes n’ont-ils pas remarqué que leurs slogans préférés ‒ ‘diversité culturelle’, ‘différence’, ‘abolition des frontières’ ‒ ressemblement à ceux des grandes entreprises : ‘diversifications des produts’, ‘marché global’ et entreprise sans frontière’ ? » Dans cette vision du monde, les classes sont escamotées. Elles n’ont pas disparu pour autant, comme l’ont démontré les résultats lors du vote sur le Brexit : plus on était riche, plus on se proclamait attaché à l’Union européenne. «La remise en cause du binôme néoliberalisme-multiculturalisme s’accompagne d’un regain de ferver pour le concept de nation, voire d’identité ‒ une évolution qui menace à nouveau l’intégrité territoriale du royamme. Elle se coractérise également par un retour de la question sociale, que Le New Labour s’était employé à noyer sons la promotion des différences. Le premier de ces deux mouvements souffle actuellement dans les voiles des populistes de droite. La gauche saura-t-elle profiter du seconde pour avancer sa propre définition du Brexit ? » (Renaud Lambert, p.4, dans son art. d’ouverture Émiettement du nº 153 de ‘Manière de Voir’). O Declínio e a Inércia do Império Britânico (das suas auras de 1920), em termos políticos, foi, na sua escansão, pontuado por três momentos típicos bem assinalados, os quais ‒ todos eles ‒ não estiveram longe de seguir a cartilha comum, em todas estas circunstâncias: ‘a célebre lei rude e rudimentar dos chamados ‘macacos de imitação’. A) A Vaga alterosa dos conservadores ao Poder foi preparada, na década de 1970, pelos estudos laboratoriais e Friedrich Hayek e Milton Friedman. Escreveu Bernard Cassen (ibi, p. 69): “Dans les années 1970, la diffusion massive des thèses néolibérales de Friedrich Hayek et Milton Friedman avait préparé le retour des conservateurs au pouvoir. Élue en 1979, Margaret Thatcher décline cette hégémonie culturelle et intellectuelle en politiques gouvernementales. Avec un objectif : en finir avec une concepcion solidaire et égalitaire de la société ». A visão do Mundo e o sentido da responsabilidade pessoal de M.T. pode condensar-se neste estupidificante paradoxo: ‘A sociedade não existe. Há, apenas, homens e mulheres; há as famílias, e nenhum governo pode fazer o que quer que seja senão através das gentes. Mas as gentes ocupam-se de si mesmas antes de tudo’. De M.T. é bom conhecido o aforisma: TINA: ‘There is no Alternative’!... A Sociedade entrou em curto-circuito total!!! (Cf. ibi, p.83). B) Como não há uma sem duas, o Blairismo tentou igualmente a sua sorte. “Importé des États-Unis du temps de William Clinton sons l’appellation de ‘troisième voie [hibride], le blairisme (du nom du premier ministre Anthony Blair) prétendait conjuguer économie de marché et justice sociale. Une manifestation de plus de l’alignement du leader travailliste sur les politiques de Washington, notamment en matière de politique étrangére” (Richard Gott, ibi, p.76). ‒ Ora, o desígnio de conjugar a economia de mercado com a justiça social… não passa de uma quimera… a menos que se dê a volta inteira à Economia politica (como fez o CEHC), dividindo em dois hemisférios a Economia das Mercadorias e a Economia da Satisfação das necessidades primárias das pessoas (= ‘salário mínimo’ para todos os Maiores de 18 anos). C) “Par trois fois au cours des quarante dernières annés, les Britanniques ont fait figure de pionniers en Europe. En transformant leur pays en laboratoire du néolibéralisme occidental à la suite de l’élection de Margaret Thatcher, en 1979. En inaugurant la mutation ‘sociale-libérale’ des forces anciennement progressistes, sans l’égide de M. Anthony Blair, elu en 1997. Puis en ouvrant la perspective d’une refondation de le gauche, avec l’élection de M. Jeremy Corbyn à la tete du Labour, en 2015 ». (Ibi, p.63). Os Anglossaxónicos habituaram-se a mandar no Mundo e a ditar as suas ordens, numa espécie de ‘Santa Aliança’. (Cf. Sainte-Alliance Londres-Washington: ibi, pp.42-44). Como o tamanho, o volume e a importância estratégica também contam, não há outro remédio senão o mais fraco ceder ao mais forte!...). Eis por que nos conflitos habituais, designadamente, no que
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tange à problemática do Brexit, a magna quaestio da immigration vem sempre à tona (cf. ibi, pp. 58-62).
● Para evitar a Queda no MONISMO EPISTÉMICO e na sua consorte Cultura do Poder-Dominação d’abord, há que observar, com rigor, uma Regra Simples: A) Distinguir e não confundir os dois hemisférios das Ciências: ‒ o das ciências físico-naturais e ‒ o das ciências psico-sociais e/ou humanas. Tudo está ligado a todas as coisas. E o nosso Raciocínio deve comparar e aquilatar sempre os dois lados das coisas: o verso e o reverso. Convém nunca esquecer que o sempre condenável Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo (que se configura, nos antípodas do Hilemorfismo Aristotélico… por isso lhe chamaram ‘o Filósofo’, ao longo da História da Filosofia, no Ocidente), dá sempre origem, por sua própria definição, ao universo ideológico do Objectivo-Objectualismo, ‒ o qual, por seu turno, tanto desembocou nos usos e costumes eleitos, contra outros, como no tipo das chamadas democracias liberais (modernas e contemporâneas), as quais estão longe de alterar, substantivamente, a incontornável índole monárquica e hierárquica dos Poderes Estabelecidos. Nesta aproximação criticista, é óbvio que as Sociedades humanas se encontram organizadas segundo esquemas ideológicos mistificadores e possidónios. É, de resto, aí, que céus e terras são, desde logo, configurados/engendrados pelos primevos terratenentes: é o grito do Hipiranga do Anarca que desfralda a sua bandeira no 1º terrunho que pisou!... As elites societárias que plasmaram o paraíso e o inferno, exerceram as suas funções como o Anarca, supostamente em nome do Povo!... Ora, isto teve livre curso, uma vez terminada a Era da Gilania, que transcorreu, em paz e harmonia, desde 7.500 a 3.500 a.E.c.. O Dualismo metafísico-ontológico virou tudo às avessas. Os supremos Objectos (v.g., Justiça, Verdade, Bem, Beleza, etc.) conhecidos converteram-se em Sujeitos originais/originantes… advieram, assim, as categorias mentais designadas por enteléquias eternas ou Hipóstases, que os representantes das classes dominantes congeminaram nos Céus: Com esse Fecho d’abóbada em todo o Edifício humano, ficou estabelecida a Ordem societária e as classes inferiores acharam bem a sua sujeição e ratificaram a sua eterna submissão. Ilusões e mistificações, que têm a consistência das Grandes Muralhas da China divisórias; e que podem bem assumir a semântica, dum lado representando as elites/classes dominantes, e do outro, as classes dominadas e o povo da arraia-miúda misturado com os estrangeiros. Nessa galáxia, o reino esperado da Igualdade e da Fraternidade, que é intrínseco à Espécie humana qua tal, nunca mais verão a luz do dia. Polarizemos, agora, as nossas atenções no jogo da trindade da CONSCIÊNCIA (na sua vertente psíquica e, eoipso, moral. Tudo começa com o Sujeito Cognoscente (realidade individual incontornável). Advém, logo, o Objectivo Conhecido (pelo Sujeito). A Testemunha emerge como Luz a certificar a Verdade ou a Justiça formulada pelo Sujeito. Mas esta é a Espécie bio-psico-genésica a funcionar, ou seja, os Humanos actuais duplamente sapientes. É a essa Luz que se torna claro o discernimento entre a Verdade e a Falsidade, entre a Justiça e a Injustiça. Efectivamente e, para todos os efeitos, há, aí, duas comprovações que são feitas: Comprova-se, intrínseca e apodicticamente: A) a existência, ipso facto, da Consciência humana qua tal, i.e., reflexiva e crítica; B) O Caminho segundo o qual se deverá fundar e constituir a Humanitas da Espécie Sapiens//Sapiens. Já vemos George Steiner lançar impropérios à retórica política e às mentiras descaradas do Totalitarismo. Agora vemo-lo surpreendido com o facto de o Jardim de Goethe (na mesma Europa) confina com Buchenwald!... Ouçamos como reagiu o nonagenário: (in ‘Exp.’, 3.6.17, Rev., p.31): Toda a minha vida foi dominada pela pergunta: como é que aquilo pôde acontecer
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na Europa? Como é que por trás da casa de Göthe existe um campo de concentração? Como é que o país mais educado do mundo se tornou nazi. Nunca se esqueça de que a educação na Alemanha era provavelmente a mais avançada, mas não foi suficiente para travar Hitler. Toda a minha vida me interroguei sobre se as humanidades realmente humanizam. Deixe-me colocar a questão desta forma: passo os dias com os meus alunos a ler o ‘King Lear’ e, ao voltar para casa estou tão possuído interiormente por esse texto que não ouço os gritos de alguém na rua. Alguém grita por ajuda e eu não ouço. Sempre me intrigou até que ponto a ficção ‒ e ‘ficção’ é a palavra-chave ‒ pode ser mais poderosa do que a realidade. Passei a vida a ensinar as pessoas a ler e a amarem o que lêem. Mas questiono-me a mim próprio sobre o perigo imenso de nos identificarmos com a ficção”. ‒ O CEHC tem respostas para tais inquietações: A) A Cultura do Ocidente separou, por muralhas da China, a Teoria e a Praxis. B) Pior: Adoptou como esquema epistémico o Monismo epistemológico. C) Só nas situações/limite, admitiu a Práxis e as Práticas como algo vital, primacial e primordial. D) Por isso, o seu catecismo, num mundo estilhaçado, não pode ser outro senão o do Objectivo-Objectualismo. Em virtude dos caminhos mal trilhados na senda da Cultura do Poder Dominação d’abord, onde fomos vítimas do ‘livre arbítrio’ em vez do remédio santo da Liberdade Responsável, nós encontramos muitas dificuldades, na adopção da estratégia adequada, para seguirmos a Estrada real da Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial do ‘Homo Sapiens//Sapiens. É que tal como se correlacionam os direitos e os deveres, assim devem correlacionar-se os poderes e as liberdades. Em tudo e sempre, na órbita da Humanidade, é uma Questão de Moral ou de Direito. Eis por que não podemos julgar como suficiente o diagnóstico dos Poderes que, no nosso ‘Zeit Geist’ estão em franco declínio… Se não procedermos à discriminação dos laços e sequelas do Quadro Societário completamente urdido, acabaremos por ir em peregrinações à ‘Senhora do Engano’, uma vez que o Mundo é, de facto, muitíssimo mais complexo do que imaginamos!... E tanto a nossa análise como os remédios recomendados dão-nos o fraco sabor do mecanicismo cartesiano. Escreveu com bom ânimo, mas, igualmente, com algum desencanto, o nosso arrojado mestre (in ‘O Fim do Poder…’, de Moisés Naím, Gradiva, Lisboa, 2014, p.282): “É por isso que o nosso programa da grande mudança, que está agora a ocorrer no funcionamento do poder, precisa de ser alargado para além da economia, da política e da guerra. Não queremos ser exaustivos. No entanto, examinaremos aquilo que aconteceu ao poder de organizações há muito dominantes, em quatro áreas que afectam directamente grande parte da humanidade: a religião, o sindicalismo, a filantropia e os media”. Referindo-se aos ‘9.000 milhões de nomes de Deus’, o Autor começa a exercer os seus lamentos sobre os chamados ‘evangelistas’ (cf. ibi, p.283 → p. 398), que estão a roubar-nos as nossas ovelhas!... Se a problemática principal for só desta ordem, o Mundo pode, afinal, continuar na mesma, mesmo com ‘mudança de poderes’!... Mas é claro que tudo dependerá de até onde nos levar a decadência de tais poderes!... “Que acontecerá quando o mosaico da fé se dividir em mil ou em um milhão de cacos? Quando a busca do bem comum se transformar em generosidade concebida para promover uma causa particular para uma pessoa particular? Ou quando os cidadãos desprezarem as notícias que devem ser lidas em proveito apenas daquelas que querem ouvir? Tudo isto apela a um esforço de acção colectiva. E, desde as alterações climáticas à desigualdade crescente, os desafios enormes que enfrentamos exigem acção colectiva e uma forma nova partilhada de pensar sobre a obtenção e a utilização do poder” (idem, ibi, p.315). Se houver discrição e bom senso criticista, talvez a emergência de um Mundo Novo se concretize. Mas os bons caminhos têm de preparar-se!
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● QUE É A RETÓRICA? ‒ O conjunto de regras e princípios que, enquanto Arte ou Ciência, nos asseguram, na Linguagem (falada ou escrita) uma boa e adequada Eloquência na Comunicação inter-humana. Esta definição já procura secundarizar as duas dimensões naturais da Retórica: a pública e a privada. E se a Boa Retórica nos ensinasse, na Família e nos Sistemas Educativos, a falar sempre, e por princípio, a Verdade, e a defender sempre, e por princípio, a Justiça?! Que Sociedades Novas emergiriam de tais operações e processos!... Por que vemos e temos de lidar com os ‘sem tecto’, os ‘excluídos’ ou ‘expulsos’ das nossas Sociedades e Comunidades?!... Escorraçados da terra comum, a que todos, por simples nascimento, têm o pleno direito ao seu quinhão?!... Por que mentimos?! Why do we lie? (Por que temos a boca cheia de lixívia de soda cáustica?...). Até parece que a Linguagem não serve para proclamar a Verdade e defender a Justiça!...): Essa pergunta anódina e ad hominem apareceu, há pouco tempo, num dos Canais televisivos da T.N.A.. Pergunta pertinente e acertada, até para, como muleta, nos incitar a mudar de Mundo. O CEHC poderia dar esta Resposta estereotipada (que não é menos verdadeira por sê-lo…): Uns (os senhores que se julgam donos do mundo e de tudo, e o que pretendem é submeter e dominar os outros) falam a verdade e defendem a justiça seguindo as suas conveniências e códigos classistas; quanto aos restantes, (os servos ou escravos, que não têm para oferecer a sua força de trabalho), preferem ficar calados à espera da primeira esmola, que aparecer… E, assim, prossegue o nosso mundo triste e estúpido!... ● É triste, dramático e cínico… uma Humanidade (uma Sociedade), que faz exibição ostentatória de saber quase tudo, e que não é capaz de praticar uma só das 14 obras de misericórdia (7 corporais e 7 espirituais)… Elucubrações respigadas nas geniais Descobertas de Albert Einstein, em torno das duas Leis físicas: A) Relatividade Restrita (1905); B) Relatividade Geral (1915). Espaço é uma realidade finita e limitada. Curiosamente, Aristóteles já intuía essa Realidade, e porventura com mais acribia, quando elencamos, no latim dos filósofos árabes (que traduziram as obras de ‘O Filósofo’, para os Escolásticos medievais), os 10 predicamentos metafísicos de Aristóteles: ‘Substantia, Qualitas, Quantitas, Actio, Relatio et Passio, Locus, Tempus, Situs et Habitus’. Destaquemos os três, que giram em torno do Tempo: o Locus é o lugar do Espaço, caracterizado do exterior, onde se aloja ou apoia a coisa (res); o Situs, por seu turno, constitui o molde que, em razão da sua situação no Espaço, a res fabrica ou assume. O Habitus é o resultado, em acções repetidas, do espaço-tempo ocupado pela res, na sua condição activa. Como definia Aristóteles o Tempo? ‒ ‘Numens motus secundum prius et posterius. A.E. não precisou de corrigir esta definição. Aurélio Agostinho sobre o Tempo, tinha duas definições, que A.E. também não corrigiria: ‘Si Aliquis a me quaerit… nescio’; ‘Si quis a me non quaerit, scio’!!! Que sabedoria!... Curiosa e metodologicamente, em 1905, quando se tratava de definir a Relatividade Restrita, Albert Einstein teve necessidade de socorrer-se de uma noção de Tempo como realidade absoluta… ligada à Duração, sempre melhor percepcionada no infinitivo verbal. No 2º momento (1915), quando se tratou de balizar e definir a Relatividade Geral, A.E. teve, por força, de conjugar as duas realidades (Espaço/Tempo) como uma mónada indissolúvel: uma unidade indivisível. Que se interpôs entre A. Einstein e Aristóteles?! A ponte, que os ligou aos mesmos elementos. A. Einstein prosseguiu a mesma mundividência de Aristóteles, que I. Kant formulara de
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novo e com maior acuidade, atendendo à época iluminista em que viveu: as chamadas fôrmas a priori de espaço e de tempo confinam, e panenvolvem todas as nossa formas de Conhecimento. Como o próprio Kant demonstrou no seu último livro ‘Prolegomena zur Alle Metaphysik der Zukunft’. Bem observadas e advertidas as coisas, a mundividência criticista desta obra de I. Kant constitui, afinal, o prosseguimento da Via aristotélica, em Filosofia, da célebre (e tão esquecida) Teoria/Doutrina do HILEMORFISMO de toda a Realidade Cósmica e do nosso próprio Conhecimento. (Contra todas as fantasiosas elocubrações do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e de Paulo, que têm, proh dolor! chancelado e corrompido toda a Weltanschauung filosófico-cultural da Cultura do Ocidente). ‒ Para Aristóteles, a Hylé é infinita, ilimitada; como para A. Einstein, o Espaço é limitado. Para o 1º, a Morphè é que delimita e configura a res. Para o 2º, o Tempo é absoluto = é o infinitivo de Durar; e é o Espaço que o aprisiona numa entidade determinada. Num segundo momento, A.E. considera que o Espaço e o Tempo eram e constituem uma só realidade indivisível. ● Tomás de Aquino e a sua definição de ‘eternidade’. Salvaguarda, ainda, a via aristotélica: ‒ a sua noção não é platónica nem aristotélica; situa-se a meio caminho entre os dois. Por isso, a mundividência eclesial considera Tomás de Aquino como o ‘Doctor Angelicus’, como o padroeiro cristão do catolicismo. O filósofo francês (cristão) da 1ª metade do séc. XX, Jacques Maritain, foi, em virtude da sua obra filosófica e teológica, o corifeu máximo do Hilemorfismo aristotélico-tomista. I. Kant, A. Einstein e Aristóteles fizeram, os três, outra Estrada (juntamente com Baruch de Spinoza e Teilhard de Chardin)… que é, afinal, a que deve seguir-se. ● Cultura do Poder-Dominação d’abord! (A expressão Poder-Dominação já havia sido cunhada por Max Weber, nos anos ’20 do séc. XX). Estará, hoje, o Poder, qua tal, em decadência?! As dúvidas são muitas, se entrarmos em jogo com todos os factores típicos no exercício das diversas formas de Poder. O que, de facto, podemos afirmar, sem hesitações, é que está em marcha um ‘trabalho de parto’ de diversos tipos e formas de Poder, as quais, por seu turno, constituem o reflexo de uma certa ‘evolução’ pacifista dos Humanos e das Sociedades no seu conjunto. Este é um dado de saudar vivamente, no processus da psico-sócio-antropogénese. (Cf. Moisés Naím, ‘O Fim do Poder’, op. cit., Gradiva, Lisboa, 2014, pp.15 e ss.). Pelas razões já aduzidas, convém não embandeirar em arco com a nova Saga!... Que no imenso exercício dos Poderes está a operar-se alguma metamorfose ‒ parece um dado irrecusável: em lugar da Potestas hard, prefere-se a Potestas soft… e os efeitos até são preferíveis e melhores, psico-sociologicamente falando. O pressuposto de que havia partido T. Hobbes era, sem dúvida malsinado e, até, errado, para a sua própria época histórica: ‘Bellum omnium contra omnes’!... A ‘Vontade de Poder’ de Zaratustra é diferente da comum capacidade de orientar ou prevenir as acções presentes ou futuras de outros países ou grupos… A definição prática (corrente) do Poder, enunciada pelo nosso Autor é a que referimos acima. Mas o mais importante, nesta problemática, é a cuidadosa definição dos instrumentos do Poder, tais como: a força ou ameaça de força; os códigos praxeológicos; as promoções oferecidas; as recompensas prestadas; as manipulações de dupla sorte (pp.45-51). O poder de mercado é, na sua origem, uma espécie de barreira à entrada, desde logo, por causa dos direitos de alfândega e, depois, porque há uma espécie de princípio da reciprocidade na operação da troca (ibi, pp.55-61), que procede dos tempos em que nem sequer havia meios de troca. O engrandecimento do Poder não é um fenómeno natural: são as buscas e a procura do necessário que põem os comerciantes e os homens em movimento. Depois, mais no concernente
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às instituições, o Poder torna-se grande a partir da presunção dos seus detentores, em ascensão incontestada: os ingredientes são a disciplina e a obediência dos escravos, servos e seguidores (cf. ibi, p.62…). As próprias Revoluções modernas (1789, 1776, 1917…), que haviam traçado caminhos novos, foram forçadas a recuar nos seus ideários, a manter hierarquias e Poderes mais ou menos Estabelecidos. O Estado-Nação propriamente dito só foi inaugurado, em 1648, com a Paz de Westefália, no termo da guerra dos cem anos. O desenvolvimento das ‘Great Corporations’ (como a Standard Oil), nos USA, em 1882, só se pôs em marcha segundo a mesma lógica dos novos Estados-Nações, que desbarataram as antigas cidades-estados da Idade Média e do Mundo Antigo. As duas mãos lavavam-se uma à outra: a visível dos estados a invisível das ‘corporations’ e vice versa (p.65). Dos três poderes assinadas por M. Weber ‒ o tradicional, o carismático e o burocrático-racional, o mais incrementado e desenvolvido foi, sem dúvida o último, em virtude da ascensão vertiginosa do sistema capitalista, no séc. XIX (ibi, p.69…). As últimas duas décadas do séc. XX abriram caminho para um processo imparável de globalização (desatinada…): com os Estados-Nações a perder o pé; e as ‘Corporations’ multitransnacionais a beneficiarem dos favores dos Estados (p.82-83). As chamadas revoluções do mais, da mobilidade e da Mentalidade fizeram o que faltava, para juntar os fragmentos, num Mundo heteróclito (pp. 86 e ss.; p.88; p.114). Apesar dos avanços, que não correm sempre de feição, “nem sequer as pressões esmagadoras produzidas pela crise económica na Europa, permitiram que os líderes garantissem o poder de que necessitam para reagir de forma rápida e eficiente. De facto, aconteceu o contrário: ao mesmo tempo que a crise económica alimentou ainda mais a polarização e a fragmentação política, enfraqueceu também aqueles que estão no poder e os que estão na oposição. Ninguém parecia ter a capacidade de fazer as mudanças que eram desesperadamente necessárias. De facto, é o fim do poder” (ibi, p.324). ‒ Dos poderes conhecidos como estabelecidos!... “No entanto, a mensagem central é que a diluição excessiva do poder e a incapacidade de liderança dos principais agentes são tão perigosas quanto a concentração excessiva de poder em poucas mãos. O declínio excessivo do poder, quando qualquer agente significante pode vetar a iniciativa de outros, mas nenhum deles tem poder para impor a sua vontade, é um risco tanto para o sistema político de uma nação, para uma sociedade, comunidade ou família, quanto para o sistema das nações. Quando o poder se torna assim tão condicionado, ocorre a paralisia, que prejudica a estabilidade, a previsibilidade, a segurança e a prosperidade material” (idem, ibi, pp. 325-326). Pode aceitar-se, laboratorialmente, o princípio de que as Revoluções do Mais, da Mobilidade e da Mentalidade podem contribuir para o declínio das influências do Poder!... (Cf. idem, ibi, pp.84 e ss.). E é sempre positivo, na nossa estratégia, atentar nisso. Convém, ainda, fazer outra pergunta, para atingir a substância das coisas e dos processos! ‘Porque são as vitórias esmagadoras, e as maiorias e os mandatos fortes espécies (cada vez mais) em perigo’?!... Os efeitos desses fenómenos devem discernir-se na decadência do poder nas políticas nacionais. (Cf. idem, ibi, pp.119 e ss.). Que se pode notar pelo meio do Processo? Que há mais discussão e comunicação críticas entre os cidadãos, tidos e havidos como Indivíduos-Pessoas. Isso é muito Bom! Nas últimas pp. do Livro, o nosso Autor acrescentou um Apêndice de um Amigo seu, (Mario Chacon, doutorado em Yale e prof. na U.N.Y). O título do apêndice suscita curiosidade, pelo seu simples enunciado: Democracia e Poder político: principais tendências durante o perigo do pós-guerra (cf. ibi, pp.353…). Tem razão o nosso Autor, Moisés Naím, ao advertir no início do Apêndice, que o estudo de Chacon se aplica especialmente ao cap. 5º (pp.119 e ss.). É que o que está em causa é, justamente, aquela linha divisória, que na política das nações, é capaz de separar e evitar a confusão entre a demagogia e a vera democracia.
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M. Chacon serve-se de dois modelos para discernir e caracterizar as democracias: o que foi levado a cabo pela Freedom House (2008), e o que é arquitectado com base na proposta de J. Schumpeter (1964). Na classificação de Schumpeter, M.C. adverte que “uma democracia é um regime no qual o governo é escolhido por eleições disputadas. Assim, nesta classificação a concorrência livre e justa é a faceta fundamental de qualquer regime democrático” (cf. ibi, p.354). Preferimos, indiscutivelmente, a 2ª classificação, que faz entrar em linha de conta e articulação variáveis diferentes: avalia, desde logo, as duas evoluções contrárias, a da democracia e, por contraste, a da ditadura (cf. ibi, p.353): A taxonomia reporta-se às últimas 4 décadas. “A primeira taxonomia dos regimes é fornecida pelo estudo Freedom in the World, realizado pela Freedom House (2008). Neste estudo, os regimes são classificados como ‘não livres’, ‘parcialmente livres’ e ‘livres’. Cada país é classificado em função de uma escala que mede os direitos políticos e as liberdades civis. As subcategorias avaliadas na escala são a liberdade dos processos eleitorais, o pluralismo político, o funcionamento do governo, a liberdade de expressão e de crença, e liberdade de associação e de organização, o Estado de direito e os direitos pessoais. Para os fins da análise, categorizo os países ‘livres’ como democracias completas e os países ‘não livres’ e ‘parcialmente livres’ como não democráticos” (Cf. ibi, p.353). Antes do Apêndice (p.353), o nosso Autor, Moisés Naím não se esqueceu de rememorar os grandes achados institucionais dos sécs. XVIII/XIX, segundo o historiador Henry Steele Commenger: “Inventámos praticamente todas as instituições importantes que temos, e, desde então, não inventámos mais nenhuma. Inventámos o partido político, a democracia e o regime representativo. Inventámos o 1º sistema judicial independente da História… Inventámos o controlo judicial. Inventámos a superioridade do poder civil sobre o poder militar. Inventámos a liberdade religiosa, a liberdade de expressão, a Carta dos Direitos ‒ bem, podíamos continuar… É uma grande herança. No entanto, desde então, o que é que inventámos de importância comparável?” (Idem, ibi, p.353). “Após a Segunda Guerra Mundial, passámos por outra onda de inovações políticas, concebidas para evitar mais um conflito global. Essa onda levou à criação da Organização das Nações Unidas e a uma pletora de agências internacionais especializadas, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, que transformaram a paisagem internacional do mundo. [É urgente que a O.N.U. seja, ela própria, urgentemente reformada e actualizada, por forma a que todas as quase 200 Nações/Estados, que dela fazem parte, se considerem, de pleno direito, em pé de igualdade societária.] “Está a formar-se outra onda ainda mais vasta, que promete mudar o mundo, tanto quanto o fizeram as revoluções tecnológicas das duas últimas décadas. Não será uma mudança do topo até à base, não será ordeira nem rápida, produto de cimeiras ou de reuniões, mas antes turbulenta, dispersa e aos solavancos. Mas é inevitável. Impulsionada pela transformação na aquisição, utilização e conservação do poder, a humanidade tem de encontrar e encontrará, novas formas de se governar” (idem, ibidem). Alerta, contudo: É preciso que o Império da Paz emirja dapertutto!... Que os conflitos bélicos parem de vez! Que a Inteligência (Natural) dos Indivíduos-Pessoas Humanos evolua mesmo para as praxis do Paradigma Sapiens//Sapiens. Que os Humanismos criticistas aumentem e se desenvolvam o suficiente para travarem a corrida apocalíptica do que muitos continuam a chamar vesgamente ‘Inteligência Artificial’!... Estes não passam de cegos e guias de cegos!... Este será o ‘deslumbramento’ mais estúpido do Planeta!!!...
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REFLEXÕES AVULSAS, MAS SUBSTANTIVAS
● O Cientismo Moderno transformou-se (no. séc. XX) no que se pode chamar, desde o N.T. paulino, na Cultura do Ocidente, a Santa Religião laica do Objectivo-Objectualismo. Esta religião é o denominador comum de todas as outras religiões institucionalizadas. Não é a religião que é o ópio do Povo… ‒ como pressupôs K. Mrax. É isso, outrossim, toda e qualquer religião institucionalizada. Mais próximos ou mais remotos, todas as coisas ou processos têm os seus inícios embrionários. Falamos, agora, do Deísmo Moderno. O seu Pontífice: Tindale Mattew (ca. 1653-1733). É considerado, desde há 4 sécs., o Pai do Deísmo moderno. Graduado em Letras pela Univ. de Oxford. Em 1685 foi feito procurador no Doctor’s Commons. De 1685 a 1688, praticou, com alento e devoção, o capitalismo, tendo regressado, depois disso, ao anglicanismo. A sua Teoria/doutrina acha-se condensada no Livro ‘Christianity as Old as Creation, or the Gospel a Republication of the Religion of Nature’ (1730). Esta obra exerceu uma influência enorme em toda a Europa; e, sobretudo, na Alemanha, onde era considerada e estudada, no séc. XVIII, como a mais fiel Bíblia do DEÍSMO. O Deísmo nasce e desenvolve-se, inicialmente, na Inglaterra, onde teve a sua máxima expressão e esplendor no séc. XVIII (The Century of Enlightenment). Apresentou-se, aí, como a fina flor da religião dos Iluministas e dos chamados livres pensadores, os quais não quiseram ‒ como alguns ateus ou agnósticos ‒ romper, definitivamente, com todas as crenças religiosas, que advinham, por tradição, dos seus avoengos ancestrais. Iniciadores deste movimento: Herbert de Cherbury, David Hume, John Toland, Samuel Clerke, Matthew Tindade. No que toca a alta antiguidade das Crenças, que a Paleo-Antropologia já tem estudado (sistemicamente), já nos tempos de Literatura oral, que passa de geração em geração, sejam, aqui, recordados os trechos sobre as crenças na ‘Odisseia’ de Homero (ou a ela atribuídos pelos aédoi). ‘Campos Elysios’ → vd. ‘JL’, 26.4 – 9.5.2017: pp.10 + p.27. → A noção de bem-aventurança no além, tudo de índole intelectual: utopias engendradas no Futuro post-mortem. Uma Nota importante: Como a Vida no tempo histórico, não nos traz grande felicidade, é natural que as projecções se configuram na forma de utopias no Futuro. ● MARXISMO/LENINISMO: Revol. soviética de Out./Nov. de 1917. Como tem andado enganado o Mundo das sócio-políticas Sociedades humanas!... ‒ Não houve Socialismo e Revoluções socialistas, até ao presente. Essa Tese foi definitivamente desmascarada pelo Economista/Assessor de John Kennedy, John Kenneth Galbraith, no seu Livro ‘O Novo Estado Industrial’ (Ed. Civ. Brasil), 1962. Aí, estabeleceu o seu veredicto o economista genial: J.K.G.: A isso chamou ele ‘Capitalismo monopolista de Estado’, a outra forma menos conhecida do moderno Sistema Capitalista.
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‒ Duas teses controversas dentro da clássica/tradicional teoria do Marxismo. A) A Ditadura do Proletariado: enquanto meio/ponte necessário para operar a transição para o Sistema Socialista, dentro do que Marx chamava ‘o socialismo científico’, ‒ essa tese foi a própria historia dos Processos Revolucionários que a demonstrou falsa!... Ocorre outra razão de tomo: como Democracias e Ditaduras são vitalmente posições extremas e contraditórias, não é fácil passar do pior para o melhor, embora se posse passar do melhor para o pior. B) Outra tese largamente controversa, nas teorias tradicionais de construção das Sociedades Socialistas: o chamado Plano Central ou Centralista (de onde, do topo à base, tudo vem a decorrer taumaturgicamente, por obra e graça dos Comandos… Sempre a ‘Mão Invisível’ smitheana ou a Divina Providência de uma Divindade extrínseca e transcendente ao Universo!...). É sabido como esse ‘Plano Central’ funciona como Estaleiro de todas as obras do Estado/ /Nau: é aí que a Economia política do País toma forma, ‒ sempre em oposição ao Mercado, que tudo logo arruína… visto que é o cincho ‒ é o pressuposto da crença ‒ em que se apoia e constrói o Sistema capitalista. Tão diferentes que elas são e tão semelhantes, as duas Teses!... É que elas decorrem, ambas da adopção como prática corrente do Monismo Epistémico, que é a chancela suprema da sempiterna Cultura do Poder-Dominação d’abord. Eis por que o vero e autêntico Socialismo só se constrói, em Democracia, por obra e graça dos Sujeitos Humanos Livres e Responsáveis: o HOMEM NOVO!... Que nunca veio, apesar de anunciado, até ao presente!...
● PAPA FRANCISCO ‒ A Revolução que se deseja imparável!... ‒ Se me pedissem por três Documentos dos mais importantes e decisivos do bem-vindo à Igreja que é Papa Francisco, eu pessoalmente apontaria quatro: • Carta Encíclica Lumen Fidei (2013); • Carta Encíclica Laudato Si (2015); • Exortação Apostólica Evangelii Gaudeum (2013); • Exortação Apostólica pós-sinodal Amoris Laetitia (2016). Não foi sem uma profunda e omniabrangente semântica que o Arcebispo de Buenos Ayres, Giorgio Bergoglio, fez a sua opção pelo glorioso epónimo Francisco di Assisi (um santo da predilecção minha e do Mundo). Lemos, a partir de Março de 2013, muita Literatura sobre a História, a Figura e a Personalidade do novo Papa. Só no concernente a Livros, mais de uma boa meia dúzia, bem seleccionados, que o tempo não dá para tudo. Conhecemos e estimámos outros Pontífices, como Joâo XXIII, o pregoeiro do Concílio Ecum. ‘Vaticano II’, Renovador da Igreja Católica (que bem carecia disso); Paulo VI; João Paulo I (o que fora envenenado…). Depois… vieram dois que, cada um no seu género, não passaram de ‘gente comum’!... (Que nós criticámos no C.E.H.C.). Depois das várias leituras que fizémos em torno da nova Figura do Papa Francisco, e até para desfazer as últimas dúvidas que ainda tínhamos acerca da personalidade de Bergoglio, muito especialmente, em torno do seu sim ou não à tão malsinada ‘Teologia da Libertação’, condenada em Medellin e Puebla pelos dois papas antecessores, a leitura do célebre e bem urdido Livro de dois genuínos e geniais Jornalistas portugueses (António Marujo e Joaquim Franco) acabou por desfazer-nos todas as dúvidas que restavam. 1º É que a Teologia do Papa Francisco não é Platónica nem Paulina (apoiada no Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo); 2º Por isso, ele apoia a Teologia da Libertação, com todas as implicações e consequências, visto que a sua Weltanschauung não é platónica, mais lidimamente aristotélica, como de resto a do nazirita Jesus que, sendo ‘gnóstico’, erigiu todo um Sistema/Doutrina Jesuânica, que muito pouco ou nada tem a ver com os Cristianismos tradicionais.
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A dizer toda a Verdade, o que mais nos surpreendeu na Personalidade holística e no seu modo de actuar inteiro e sincero, foi a sua enorme capacidade de, paradoxalmente, juntar os contrários (e, por vezes, contraditórios): Como Chefe da Igreja Católica Romana, ele é, também, o 1º Responsável pela Tradição Apostólica e Arquitectura dogmática da Ecclesia. Isso, porém, não o impediu de se comportar como o Pastor ‘amorebole’ di tutti i fedeli!... A ponto de contrariar, ostensivamente, a própria Doutrina dogmática tradicional. Dir-se-ia que escolheu o Evangelho (e a Misericórdia) em vez da Lei; as pessoas vivas e reais (com os seus problemas…) em lugar da cápsula das verdades dogmáticas. Esteve tão certo na sua feliz opção, que parece ter dividido a Igreja Católica em duas: a que está com o Papa e a que o recusa!... Nada, afinal, de importância: Já nos revelava a Divindade egípcia, há 5,5 milénios: ‘um divide-se em dois é sinal de vida; dois fundem-se em um é sinal de morte’!... De resto, o pecado original do Catolicismo e dos Cristianismos tradicionais é o inveterado Platonismo na Cultura do Ocidente, que impediu, por todas as formas e feitios, que o Aristotelismo (e o Jesuanismo, com ele), vingasse, de facto, na Cultura do Ocidente. Não resistimos a citar alguns nacos de texto, a partir do Livro acima citado: ‘PAPA FRANCISCO: A REVOLUÇÃO IMPARÁVEL’. Fustigando o sempiterno preconceito romano/latino da hegemonia mecanicista da Lei (que é a mesma do Monismo Epistémico da Cultura Ocidental), escrevem os dois jornalistas glosando o discurso do Papa (p.139): “Não aceitar a misericórdia de Deus é o risco, alertou, exortando a não manter a teimosia ou a rigidez de considerar mais importantes a pregação, o pensamento, a ‘lista de mandamentos’ a observar do que a misericórdia. Pegando nas leituras do dia, lamentou a ‘dureza que não deixa entrar a misericórdia de Deus’. Um drama ‘vivido também por Jesus com os doutores da lei, que não entendiam porque não deixou lapidar a mulher adúltera’ ou porque ‘ia comer com os publicanos e com os pecadores’. Qual era o problema? ‘Não entendiam a misericórdia’. Em jeito de derradeiro apelo, pediu orações para que se entenda ‘o que significa misericórdia’ ”. “A partir do que se passou com este processo, pode dizer-se que se projectam pelo menos dois modelos de Igreja. Resumindo muito, estamos perante quem insiste no cristianismo sobretudo como um conjunto de deveres religiosos e normas morais a quem, fazendo de Jesus uma referência, procura actuar no seu seguimento, mesmo sabendo que os caminhos podem ser múltiplos” (iidem, ibidem). Pela nossa parte, diríamos que Papa Francisco está a abrir, claramente o caminho para o Jesuanismo: “Mais do que uma doutrina, Francisco tenta colocar Jesus e o seu Evangelho perante a vida dos crentes e da Igreja, de modo a fazer deles o centro. Para ele, a doutrina não é um museu de normas que deva condicionar o acesso ou promover a segregação, antes devendo servir para não fechar portas e aceitar a fragilidade humana” (iidem, ibi, pp.139-140). Dir-se-ia que a Igreja actual está ao serviço da enculturação primeva. Leva-nos esta nova Mentalidade ‒ mais uma vez ‒ à Mundividência aristotélico-socrática e jesuânica, contra os dualismos platónico-paulinos do N.T.. Por que anuncia o Papa uma política de Justiça e Misericórdia?! (Cf. ibi, p.145). O Papa respondeu com um desafio inesperado: ‘Para o cristão, é uma obrigação envolver-se na política. Nós cristãos, não podemos ‘brincar a fazer de Pilatos’, lavar as mãos. Não podemos. Devemos envolver-nos na política, pois a política é uma das formas mais altas da caridade, porque busca o bem comum. E os leigos cristãos devem trabalhar na política. Dir-me-ás: ‘Não é fácil!’ Também não é fácil tornar-se padre. Não há coisas fáceis na vida. Não é fácil; a política está muito suja; e ponho-me a pergunta: mas está suja porquê? Não será porque os cristãos se envolveram na política sem espírito evangélico? Deixo-te esta pergunta: é fácil dizer que ‘a culpa é de fulano’, mas eu que faço? É um dever! Trabalhar para o bem comum é um dever do cristão! E, muitas vezes, a opção de trabalho é a política. Há outras estradas: professor, por exemplo, é ou-
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tra estada. Mas a actividade política em prol do bem comum é uma das estradas. Isto é claro” (iidem, ibidem). “Para Francisco, o exercício da política, com tudo o que implica, é um caminho que deve ser feito pelos cristãos tendo como critérios essenciais a busca de coerência com o Evangelho e o bem comum. E isso deve passar pelo combate às desigualdades e às condições de miséria em que tantas pessoas vivem, por critérios de desenvolvimento económico que não ponham em causa as pessoas nem o ambiente, fundadas na justiça e na misericórdia como duas faces inseparáveis” (iidem, ibi, pp.145-146). Ao referir-se directa e expressamente ao Capitalismo, o Pontífice não hesita: ‘Esta Economia Mata!’ “Na encíclica ‘Laudato Si’ (Louvado Sejas), ‘sobre o cuidado da casa comum’, de Junho de 2015, o Papa argentino desenvolve a ideia de uma nova cidadania, quando apresenta o paradigma de um ‘amor civil e político’. O desafio não é dirigido apenas aos crentes, uma vez que, explica o Papa, a encíclica é dirigida a ‘cada pessoa que habita neste planeta’. Não é um documento apenas para a Igreja, mas para toda a família humana. Diz ele que ‘o amor, cheio de pequenos gestos de cuidado mútuo’, é também civil e político, manifestando-se em todas as acções que procuram construir um mundo melhor, como ‘amor à sociedade’ e ‘compromisso pelo bem comum’” (iidem, ibi p.147). “Num documento publicado para defender a Criação e o ambiente, Francisco reafirma que ‘a política não deve submeter-se à economia e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma da eficácia da tecnocracia’. Dando como mau exemplo disso mesmo ‘a salvação dos bancos a todo o custo, fazendo pagar o preço à população, sem a firme decisão de rever e reformar o sistema financeiro, todo inteiro’. Compete à política e às várias associações um esforço de formação das consciências da população. […] Todas as comunidades cristãs têm um papel importante a desempenhar nesta educação’. Este ‘amor à sociedade’ passa, na perspectiva de Bergoglio, por reformas corajosas e medidas correntes de combate à pobreza e às desigualdades sociais, que reformulem a economia, no respeito pela Criação e pelo meio ambiente” (iidem, ibidem). Agora, e de algum modo a propósito, 4 pequenas controvérsias a partir dos 2 vols. (1º vol. 2016/Quetzal; 2º vol. 2017/Quetzal) já publicados da Bíblia Grega de Alexandria, por parte de Frederico Lourenço, e suscitadas pelos comentários pouco apropriados e insensatos do historiador Vasco Pulido Valente (in Observador, 18.6.2017) subordinados ao título ‘Onde se meteu a ‘correcção política’. A) A 1ª Controvérsia prendeu-se com a qualidade do texto português, salientando a preferência pela Bíblia dos Capuchinhos. Ora, tanto a qualidade da tradução como a qualidade literária (carácter castiço e esclarecido dos vocábulos é, igualmente, de um bom lusitanista e de um bom helenista. B) A 2ª Controvérsia prende-se com a ordem tradicional dos 4 evangelhos canónicos, sem atender à ordem histórico-cronológica da sua escrita; ou seja: mantém o ordenamento da Bíblia Vulgata ou Clementina. Quem solicitou a F.L. o cumprimento dessa exigência histórico-cronológica?!... Era ela, sequer, atendível, na praxis?!... C) A 3ª Controvérsia quis implicar com a nova expressão ‘Filho da Humanidade’, para traduzir a expressão corrente ‘Filho do Homem’. Quanto a nós, até achámos a opção de uma extrema sensatez e espírito crítico. Redarguindo: a) a expressão ‘Filho do Homem’ (aplicada a Jesus) não se opõe semanticamente a ‘Filho de Deus’. Este enunciado é, de resto, aplicado a todos os seus humanos (vd. Salmo 81,6). ‘Filho da Humanidade’ produz uma bela extensão semântica ao enunciado tradicional. Lembrar, aqui, o pai adoptivo, seria, implicitamente, chamar ‘filho da puta’ a Jesus!?...
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D) A 4ª Controvérsia surge da denúncia de V.P.V. de o tradutor, quando aparece o termo mulher, preferir o enunciado ser humano, o que o censor considera uma conformidade estúpida ‘ao politicamente correcto’. N.B.: Honra e glória ao Tradutor desta Bíblia (Rom. 5,12): O que o próprio M. Zerwick, S.J. (in ‘Analysis Philologica Novi Testamenti Graeci’, (1953) traduziu por ‘peccatum quasi personificatum’ em Adão, F.L. (Rom. 5,12) traduziu, verdadeiramente, por erro (hamartía = erro). Na verdade, o dicionário de Isidro Pereira, S.J. ‘Dicion. Greco-Português e Português-Grego’, na palavra Amartía, traz como sinónimos: erro, falta. Efectivamente, toda a Questionação de V.P.V. e quejandos entronca aqui: Manter separadas por muralhas da China a Theoresis e a Praxis. Ora, o que o platonismo pressupõe e admite, é rejeitado rotundamente pelo Socratismo e pelo Aristotelismo. Não há pecado, ordem ética-moral, sem um erro no juízo lógico. Aqui começa e acaba tudo!... Mas nesta Quaestio implícita, não quis meter prego nem estopa V.P.V..
ENQUADRAMENTO GENÉRICO
• GLOBALIZAÇÃO!... Que Adamastor é esse?... Quais as causas que ele está servindo?!... Os efeitos e atmosferas, que há ca. de duas décadas, estava produzindo, no Planeta, o Multiculturalismo (generoso mas interessado...), está, actualmente, a produzi-los isso a que dão o nome fácil e enganador de Globalização... Para complicar tudo, até assinalam o Processo de Globalização com o estigma da Ideologia, ‒ sempre a ideologia que tem constituído o instrumento incontornável da sempiterna Cultura do Poder-Dominação d’abord, sem a qual o Sistema Capitalista fenece e morre. Quando Fernando Henrique Cardoso (F.H.C.) passou por Lisboa, no Funeral a Mário Soares, deu duas entrevistas no ‘Expresso’ (1ª Cad. 22.4.2017, pp.5 e ss., sob o título ‘Memórias de ‘um político sem medo’’; e no ‘Exp./Rev., da mesma data, pp.28 e ss.). São proverbiais a sensatez e a capacidade criticista do ex-Presidente brasileiro. Em termos sucintos, dizia ele do Mário (ibi, p.5): “O Mário tinha uma visão do Socialismo mais pré-globalização, que manteve até ao fim da vida. Com a globalização muita gente ficou confusa, acreditando que ela era uma ideologia, mas não é, é um modo de produção e de como se organiza o mundo. Queiramos ou não, é assim, E temos que ver como se domina essa fera, visto que há problemas enormes. A produção contemporânea aumenta a produtividade, concentra a renda e não dá emprego”. – A produção contemporânea, ao aumentar a produtividade do trabalho, produz dois efeitos economicamente negativos: concentra o rendimento do trabalho e não dá empregos, como era suposto antes; antes, reduz o emprego, pelo simples facto de que a mão d´obra operária é substituída por novas tecnologias. Eis por que, em termos da gramática económica, há razões e factores que sobejam para, no estado actual das coisas, fundar e garantir, para todos os cidadãos maiores de 18 anos, um salário mínimo garantido, enquanto o cidadão, ou estuda, ou se prepara para ingressar num novo emprego. Entretanto, há, aqui, um pequeno paradoxo: FHC diz-nos
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que o processo de globalização, se, por um lado, acentua as desigualdades sociais, reduz, em boa parte, a pobreza em bruto. É o efeito de escala... que está a postular o que acima referimos: o ‘salário mínimo garantido’ para os desempregados. É neste horizonte criticista que pensar, a sério, num salário mínimo garantido, para cidadãos adultos de cada país, não constitui, hoje, nenhuma fantasia inimaginável: Veja-se a problemática séria da nova Sociedade Francesa... Se não for a bem, com o novo Governo Macron, põe-se em marcha o que chamaram ‘L’ubérisation du Code du Travail [qui] n’est pas une fatalité’: Imaginer un salariat sans subordination’!... (In ‘Le M.D.’. Juillet, 2017, pp.20-21. (Art. da socióloga do trabalho Danièle Linharté). Na janela do Artigo, pode ler-se, como bússola de orientação: “Esperando sensibilizar os opositores à sua reforma do código do trabalho, o governo planifi-cou nada menos de 48 reuniões com os sindicados, desde agora até Setembro. Mas consultar não é negociar, e ainda menos co-escrever a lei. Ainda não chegou o tempo de assumir outro caminho, para acabar com as relações de subordinação próprias do contrato de trabalho, reforçando, pelo contrário, os direitos sociais?” No penúltimo parágrafo, pode ler-se esta recomendação positiva: “Para que o trabalho constitua uma actividade socializadora e cidadã, que venha a criar empregos e alimente lógicas de consumo, respeitadoras das pessoas como da natureza, é-nos preciso, imperativamente, começar a enfrentar a subordinação através de um outro prisma, ‘desnaturalizando-as “ (p.21). Não é nenhuma Ideologia: certo F.H.C.. Labora segundo o Zéfiro dos ventos imperialistas e dos países tecnologicamente mais desenvolvidos. Isso é tudo. Não ser ideologia é o seu modo próprio de se promover e insinuar sem ser de modo pesporrente e fascista!... Como a ‘Third Way’ de A. Blair, no fim da última década de ’90 do séc. passado, também a ‘globalização’ como ideologia não passa de um embuste. São instrumentos ao serviço da expansão do Neoliberalismo capitalista global. Os Partidos actuais (a avaliar pelo que se passou nas últimas eleições presidenciais na França) parece que giram em roda livre: de há ca. 30 anos, passaram de 40 a 422... Benoît Háman, o candidato que defendia um salário mínimo nacional, acima dos 18 anos, tinha a sufragá-lo uma percentagem muito reduzida do P.S. francês. “Sinal da crise dos partidos, até a esquerda de origem marxista teve de desligar as amarras orgânicas. A França insubmissa, base de apoio de Jean-Luc Mélenchon, conta com 2800 grupos espalhados pelo país, 290 mil signatários e uma impressionante e crescente capacidade de mobilização” (F.H.C., ibi, p.28). “’Macaco de Imitação’ de F.H., É. M. conseguiu o feito de ter contribuído, de forma decisiva, para a decadência eleitoral e ideológica do P.S. e depois beneficiar dela” (FHC, p.30). Dos principais 5 grupos de símios ou antropoides pré-hominídeos destacam-se como os mais inteligentes: no Velho Mundo os simióides catarrinenses; no Novo Mundo, a superfamília dos primatas hominóides. É apenas o ‘livre arbítrio’ que conta!... O resto não interessa. Qual é o realismo que comanda todos estes candidatos? O mantenimento da U.E. tal como ela está!... Com as suas instituições e as regras espartilhadas do euro. Macron é diferente de Schroder e de Blair... É o menino de Schäuble!... “Macron é apenas mais audaz: liberta-se das raízes do Partido Socialista, da sua militância e da sua história e assume de uma vez por todas a aliança entre a terceira via e os neoliberais. Deste ponto de vista, Macron é uma clarificação e apenas nisso, e não num discurso tecnocrático que até já passou de moda, uma novidade: ele assume que o ‘sistema’ não é uma invenção de quem o diz combater. Ele é o sistema” (FHC, ibi, p.30). Continua o depoimento de F.H.C., visto que o seu discurso mostra à saciedade como a ideologia saiu do campo e ajudou a baralhar tudo (ibi, p.32): “Antes de falarmos de movimentos antissistema, (coisas tão diferentes como França Insubmissa, Frente Nacional, Podemos, Movi-
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mento 5 Estrelas, UKIP ou Syriza), temos de concordar sobre o que é sistema. É a democracia? É o capitalismo? É a União Europeia? O historiador Perry Anderson defende que o ‘sistema’ a que estes movimentos se opõem é a ordem política e económica aceite de forma quase indistinta por governos de centro esquerda e de centro direita. Aquilo a que temos chamado [no encalço de Thatcher] TINA (= ‘There Is No Alternative’): desregulação dos mercados financeiros, privatização dos serviços públicos e adaptação quase acritica ao processo de globalização. E o TINA tem, desde os inícios dos anos 90, um nome por estas bandas: União Europeia. Os movimentos que contestam este processo têm sido postos debaixo do mesmo chapéu: o do populismo. Se imaginarmos que o populismo é apenas uma forma de demagogia, não tem qualquer valor como definição política. É possível encontrá-la nos discursos de políticos de todas as áreas. Mas se o populismo se baseia na ideia de que há uma elite e um povo, e que isso implica um confronto entre os estratos inferiores e a elite económica, política e mediática, então poderiamos falar de um populismo de direita e de um populismo de esquerda. O de esquerda nada teria de novo: chamavam-lhe luta de classes. Concorde-se ou discorde-se desta leitura de realidade, ela distingue-se do populismo xenófebo de forma radical e inconciliável: superando a identidade étnica, a classe é um conceito inclusivo, que transcende os ódios nacionais, étnicos e religiosos. Não é por acaso que quando este discurso desapareceu do imaginário popular, a xenofobia, sempre presente mas secundarizada por outro sentimento de pertença, ressurgiu de forma gloriosa”. • Ora, na Arquitectura societária (ou Geometria...), quanto mais separadas e disjuntas (por muralha chinesa) se mantiverem a Praxis e a Theorésis, tanto mais se avolumarão e enfurecerão aqueles vícios/estigmas, que dão pelos nomes aparentemente extremados de populismo de direita e populismo de esquerda. São vícios próprios e típicos das ‘democracias liberais’, aquelas mesmas que se dispensam de governações substantivas, (para amansar a ‘fera’ do Capitalismo) e, mediante as suas ‘governações’, dão rédea solta aos animais ferozes!... Por que há tanta corrupção nas áreas (mundializadas) do Sistema capitalista, comandadas sob a bandeira da chamada ‘democracia liberal’?!... A Encíclica do Papa Francisco ‘Laudato Si’, sobre a Problemática das Alterações Climáticas e não temendo afirmar, rotundamente, que ‘O Capitalismo Mata’, impunha, como ordenamento político/ético-moral, que a Economia deverá subordinar-se à Política, não o contrário. Isto mesmo é o que ensina os Evangelhos de há 2 milénios, e, mais recentemente, a Encíclica ‘Rerum Novarum’ de 1891, do papa Leão XIII, que inaugurou a moderna Doutrina Social da Igreja. Onde se funda este Quadro da Doutrina Social da Igreja? Precisamente, no princípio do Primado absoluto das Pessoas sobre as Coisas e as Mercadorias. Sobre a problemática da Identidade dos Povos — que deve ser, hoje, trabalhada com o maior rigor e atenção possíveis, há, publicado, recentemente, um Livro excepcional, com o título ‘A Obsessão da Portugalidade’, de um académico de São Miguel (Açores), prof. nos U.S.A., o qual foi concebido e percepcionado, criticamente, no encalço e sob a bandeira do discurso anteriano de 1871, em torno da ‘As Causas da Decadência dos Povos Peninsulares’. É um livro que vale a pena reler, até em virtude da frutuosa meditação, que sobre o mesmo fez (in ‘JL’, 24.4-9.5. 2017, p.28) o nosso amigo João Maurício Brás. Trata-se de um novo Quadro criticista (anti-essencialista e anti-objectivo/objectualista). Aí, as pessoas são, incontornavelmente, postas em 1º lugar. Para além de enquadramentos doutrinais/institucionais. Dir-se-ia que a tessitura do texto constitui o eco salutar da Mensagem do Papa Francisco, capaz de vituperar toda ‘a economia que mota’, ‘a cultura do descartável’, e essa abóbada celeste da ‘globalização financeira’, (através das supostamente ‘democráticas’ agências de rating...). Nunca se poderá esque-
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cer, em nome da gramática da Boa Economia, que uma Casa bem ordenada e regida, começa pela boa e adequada distribuição das funções do espaço disponível e dos próprios cantos. Hoje, em dia, v.g., o preço dos imóveis nas cidades de Lisboa e do Porto começam a sofrer uma inflação acentuada, por força da indução externa: forte procura por residências para estudantes, oriundos do estrangeiro!... Escreve, aí, João Maurício Brás (em jeito de resumo do seu artigo: p.28): “Uma das mais abrangentes problematizações sobre as percepções e representações dos portugueses sobre si e os outros, e dos outros sobre nós, com um rigor conceptual raro no pensamento em Portugal”. Escreve aí o nosso redactor: “No campo dos valores e dos comportamentos, as políticas identitárias e pós-identitárias radicadas na etnia, raça, sexo e género estão no cerne dos debates políticos e culturais no Ocidente. Conflitos religiosos e culturais regressaram de um modo impensável no fim do séc. XX. As lutas identitárias já não são principalmente de geografia ou classe, mas maioritariamente culturais. O problema da identidade complica-se devido à polissemia do termo e a equívocos vários. Num registo cativante e acessível, Onésimo indaga acerca das condições de pensabilidade e investigação do conceito e destrinça os emaranhados conceptuais da temática, confronta lugares comuns, preconceitos, generalizações, estereótipos e as manipulações que inquinam o debate. Por exemplo, conceitos como patriotismo, nacionalismo, confundem e misturam-se com o de identidade. Num outro plano, estamos perante uma das mais abrangentes problematizações sobre as percepções e representações dos portugueses sobre si e os outros, e dos outros sobre nós, com um rigor conceptual infelizmente raro no pensamento em Portugal. As confusões sobre a identidade não deixam de ser determinantes e por vezes até utilizadas no plano da justificação política e comportamental. Para Onésimo, a boa clarificação conceptual ajuda na construção de melhores políticas, juízos errados geram políticas erradas: ‘... determinadas concepções de (ou acerca de) um grupo cultural, independentemente de serem objectivas, ou não, [podem] ter reflexos no seu comportamento. E é isso justamente, que nos leva de novo à importância de se corrigir, se necessário, as visões ou concepções que um povo tem de si, e os outros dele”. Onésimo Teotónio Almeida é um homem que, no seu pensamento e escrita, nunca abandona o mandato evangélico da inclusão social/societária, que podemos lobrigar em Mt. 9, 9-13, a propósito da vocatio Matthaei e da disputa de Jesus com os Fariseus: “E passando Jesus por ali, viu alguém chamado Mateus sentado à mesa da cobrança dos impostos; e diz-lhe: ‘Segue-me’. E <Mateus>, levantando-se, foi atrás dele. “E aconteceu que, estando Jesus reclinado a jantar na casa <de Mateus>, eis que tinham vindo muitos cobradores de impostos e pecadores e jantavam com ele e com os seus discípulos. E os fariseus, vendo <isto>, disseram aos discípulos dele: ‘Por que razão come o vosso mestre com cobradores de impostos e com pecadores?’ Jesus, porém, ouviu e disse: ‘Os saudáveis não têm necessidade de um médico, mas sim os doentes. Mas ide e aprendei o que é isto: quero misericórdia e não sacrifício. Não vim chamar os justos, mas sim os pecadores”. (Bíblia de F. Lourenço, Quetzal, Lisboa, 2016). • É preciso saber cruzar, em nome da gramática da Espécie Sapiens//Sapiens, os dois tipos de tempo: o histórico e o existencial, de contrário, os Humanos não sairão da sua condição estatutária de Rebanhos do Panúrgio. É o que nos ensina Ant. Tavares, no livro: ‘Todos os dias morrem deuses’ (D. Quixote, 2017). Disse o A. em entrevista (in ‘JL’, 15-18.7.17, p.16): “Todos os dias morrem deuses, é isso. E este romance ensinou-me também que há um mundo dos factos e outro, paralelo, da narrativa que circula sobre eles. E muitas vezes, não colam. Comprovei-o na pesquisa que estou a fazer sobre o Verão Quente”.
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As próprias Lógicas, que nós utilizamos no Discurso, são várias, diversas, variegadas. Nos tempos actuais, em que predomina hegemonicamente o Neoliberalismo capitalista global, a lógica prevalecente é uniforme e impessoal, de acordo com os clichés pré-estabelecidos, confirmando as ensinanças aprendidas no Catecismo do Objectivo-Objectualismo. Onde páram as Lógicas dialécticas, Dialógicas (onde os partners que discorrem são existenciais, e não palhaços de circo, na medida em que não são animais domesticados...)? O Autor Manuel Couret Branco, no seu livro titulado ‘Economia Política dos Direitos Humanos’, Silabo, Lisboa, 2012, p.15) proclama solenemente, com justeza e razão, a tese: “De acordo com a lógica dominante, hoje em dia, a economia não tem por objectivo a criação, nem sequer, a manutenção dos empregos, mas, outrossim, a mais feroz afectação possível dos factores de produção, por outras palavras, criar um máximo de riqueza desejavelmente com um mínimo de recursos. Ora, um desses recursos — é preciso lembrá-lo — é, precisamente, o Trabalho, ou, como se diz na gíria, os Recursos humanos”. O Neoliberalismo capitalista global aplica o Catecismo do Objectivo-Objectualismo (e a sua lógica neutra/impessoal...), em todo o seu esplendor. Enquanto factores de produção, os Sujeitos Humanos, as Pessoas, qua tais, não contam para nada. Se há tecnologia, disponível, capaz de operar a substituição, o pessoal é perfeitamente descartável, como denuncia — muito bem — o glorioso Papa Francisco. — Egipto: Viagem do Papa Francisco (28-29.4.2017) às antigas plagas dos Faraós e o País de onde o povo Hebreu, sob o comando de Moisés, fez o seu Exodus de Libertação, por volta de 1.200 a.E.c.. Um país, hoje, de mais de 60 milhões de habitantes, onde os cristãos coptas (um dos primeiríssimos grupos de cristãos, historicamente constituídos em torno de Jesus, ao lado dos seus irmãos siríacos) contam com uma percentagem reduzida, na ordem dos 10%, ao lado de 90% de muçulmanos, com uma liderança islâmica aguerrida, onde avulta a Comunidade dos ‘Irmãos Muçulmanos’. Um Papa Romano, que ousa empreender uma Viagem missionária destas a um País (dos mais antigos do Mundo) de uma maioria absoluta de islâmicos, não presta só atenção às ‘ovelhas’ do seu Rebanho cristão/católico. Por isso, ele deve ser glorificado! Desde o Conc. Vat. II (1962-1965), os Padres Conciliares começaram a abrir os sentidos para o que se chamou Movimento Ecuménico entre as diferentes Religiões Institucionalizadas. Mas o Ecumenismo, enquanto movimento de pacificação e de união entre as religiões, quase estagnou. Não tem havido iniciativas de tomo... e, por isto, o funesto e pervertido jihadismo islâmico, tem continuado a não dar tréguas, quer às suas ‘ovelhas’, quer às outras religiões!... Sobre a Iniciativa do Papa Francisco: Na presente circunstância de perseguição de cristãos coptas e da Presidência de Sisi na Chefia da República, o Egipto constituiu o lugar geométrico ideal para a Proclamação solene do novo papa de Roma, FRANCISCO, de seu nome. Que disse Ele? — “Não pode ser em nome de Deus (Ihaweh ou Allah); não se pode invocar o Nome de Deus para perpetrar actuações de Violência, Guerra, Ódio e Carnificina!... Na verdade o que o Ecumenismo religioso, ao longo de 52 anos, não tem conseguido obter, podemos dizer que o fez o Papa Francisco, numa só Viagem ao Egipto dos Faraós!... Parabéns à iniciativa do Papa e glória e vida a quem teve a ousadia de o fazer. Este Mandamento da Paz activa e consequente e do Amor entre os fiéis de todas as Religiões Institucionalizadas, proclamada solenemente pelo Papa Francisco no Cairo, assenta em duas bases, hoje inadiáveis e incontornáveis. Não é o próprio Dalai Lama (14º do Budismo) que nos convida, constantemente, na televisão, ‘All must live together!?... É que não há mesmo outra saída... A Evolução Doutrinal/Cultural constitui um Factum inelutável em todas as plagas e nações do Mundo: este Datum atinge, felizmente, todas as Sociedades humanas e as reli-
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giões institucionalizadas do Mundo; e impõe-nos, a todos, obrigações éticas e morais, por forma a transformar o nosso mundo desumano num Mundo veramente humanizado. B) Ao assumir esta proclamação solene, o Papa Francisco, uma vez que fala, históricamente, urbi et orbi, não pode esquecer-se que está, igualmente, a censurar e a condenar todas as doutrinas passadas das próprias cristandades, incitadas, também elas, para o ódio e a matança dos seus supostos inimigos. (Sejam, aqui, lembradas, as Cruzadas e as Inquisições de tristíssima memória). A Proclamação do Papa deve ecoar em todos os mundos religiosos, presentes e passados. Não é apenas o actual jihadismo islâmico ou ‘radicalismo’ islâmico, que é atingido na condenação do Papa. Não se prepara um presente positivo e de Bom Entendimento, entre todos, sem libertarmos as histórias passadas de todas as religiões institucionalizadas. Todas cometeram os seus erros e/ou pecados... visto que, à luz da gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, os dois são as duas faces da mesma cara!... No seu comentário de 9.7.2017 (agora enviado por e-mail) o Padre Mário insta, justamente, a que todos os cristãos se expandam e desenvolvam plenamente em HUMANIDADE. Glosando, agora, e corrigindo o resto do período: “E censura e condena cristãos e dignitários eclesiásticos, que, na sua douta erudição, ignoram que o DIVINO é compatível com o HUMANO. E que só no HUMANO, Deus, que nunca ninguém viu, se dá a conhecer. De tal modo que quem diz que conhece-ama Deus que não vê e não conhece-ama os HUMANOS que está sempre a ver é MENTIROSO. É por isso que, para JESUS, o nazirita, filho de Maria, todas as religiões e todas as fés religiosas e judeo-cristãs-islâmicas são, objectivo-objectualisticamente, más e fazem más quantas, quantos de nós insistimos, demencialmente, em ir por elas, em lugar de vivermos, cada vez mais maieuticamente relegados umas às outras, uns aos outros e ao cosmos ainda em expansão desde há ca. de 13 mil e 700 milhões de anos”. O Islão, em confronto (dogmaticamente...) com o Catolicismo e os cristianismos. Num abrégé muito sumário, que é conveniente não ser esquecido. (Maomé: 570-1632) ‒ É a própria grande estudiosa e erudita, no Islamismo, a freira inglesa Karen Armstrong (secularizada) quem nos afirma e argumenta que os 4 primeiros séculos do Islão (do VIII ao XII) são, culturalmente, séculos dourados e de um expansionismo decente e relativamente pacífico. Encratismos de todos os matizes, exageradas e perversas mortificações da carne, dogmas doutrinais, como o ‘Deus Uno e Trino’ dos cristãos dos 5 primeiros sécs.. Tudo isso, que foi abundantemente produzido no campo dos cristãos... veio a ser objecto e matéria da correcção por parte dos islâmicos. Foram eles (Avicena e Averróis, entre outros), que traduziram para latim e ensinaram aos Escolásticos medievais os filósofos e os poetas helénicos. Se, em vez de Ireneu (de Lyon), séc. II, que foi o 1º a balizar o cânone cristão, se tivesse expandido toda a sorte de escrituras gnósticas, procedentes dos Gnósticos judeo-cristãos primevos e do Jesuanismo autêntico. (Jesus era gnóstico!...), provavelmente, outro galo cantaria na História Cultural do Ocidente. Mas os processos históricos tiveram caminhos e desfechos muito diferentes!... Maomé (e suas tribos) andou quase sempre em guerra. Era general de formação militar. Entre Meca e Medina, as sortes das guerras eram tais, que a gente se pode espantar e admirar como é que o Profeta, em 62 anos de vida, ainda encontrou tempo disponível para ouvir o dictatus do Anjo Gabriel e passá-lo a limpo em texto árabe, que as populações pudessem entender. Os cristãos e os judeus, no concernente à Bíblia, falam de textos inspirados; os islâmicos falam de textos ditados textualmente ao Profeta. As diferenças são, logo, de tomo! Neste universo, foi muito mais fácil surgirem, ao longo da história, os chamados ‘hadiths’ (= enunciados pronunciados pelo próprio Profeta, e que foram escritos pelos seus seguidores.). O que valeram, decisivamente, ao Catolicismo e aos Cristianismos (primeiro, ocidentais), (e depois médio-orientais, ortodoxos, eslavos e de outras plagas do Mundo), em contraste com a fixidez e o carácter estagnado das respectivas sociedades muçulmanas, foram a ladaínha
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das revoluções que se foram seguindo e empurrando-se umas às outras: revoluções agrárias/feudais, revoluções políticas destinadas a confinar os novos Estados, revoluções científicas de grande alcance, revoluções tecnológicas e, pelo meio, as descobertas transoceânicas de mundos outrora ignorados por quase todos os povos da Terra (onde foram protagonistas portugueses e espanhóis). Mesmo em termos doutrinários/dogmáticos, entre os textos sagrados do Corão e as Escrituras cristãs, há balizas/orientações diferentes que, sendo importantes, têm naturalmente, as suas consequências psico-sócio-antropológicas e os seus postulados pressupostos. Consideremos, tão-só duas áreas essenciais: Questão do Matrimónio (ou a União legítima entre um Homem e uma Mulher): No ‘Enchyridion Symbolorum’ (Index Systematicus, p.50), diz-se que ‘Matrimonium est consociatio viri et mulieris, divinitus instituta, et est signum unionis Christi et Ecclesiae’. Trata-se, pois, da união entre um homem e uma mulher, com dois objectivos: a) a procriação; b) o mutuum adjutorium... Enquanto forem vivos os dois. A Individualidade/Personalidade dos dois Seres humanos, qua tais, é plenamente respeitada. Já não se passa o mesmo nos textos corânicos: na Sura IV, o marido (desde que tenha posses...) pode chegar a ter até 4 esposas!... Para além do resto, pergunta-se: como pode ser respeitada a questão da Igualdade entre as duas criaturas?!... B) A Quaestio Potestatis: Os textos corânicos nunca discutem expressamente esta Questão, por ex., para averiguar da sua legitimidade. Ora, há dois lóguia clássicos, a este respeito, no N.T.. A) Em Mt. 22,21: Jesus, na réplica com os Fariseus, diz taxativamente: ‘Dai a César o que é de César; e a Deus o que é de Deus’. Há duas Autoridades com legitimidades próprias: a divina e a humana. B) No evang. apócrifo de Tomé (v.100), a resposta de Jesus aos Fariseus é ainda mais completa: ‘Dai a Deus o que a Deus pertence; a César o que lhe pertence; e a mim o que é meu’. Duma só assentada, é fustigada e posta de parte a doutrina do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e de Paulo. Quase em jeito de abcissas e ordenadas, o Discurso essencial do Papa Francisco, nos dias referenciados da sua visita ao Cairo, inscreveu-se plenamente nos pródromos do que nós chamamos, no C.E.H.C., a DUALIDADE EPISTEMOLÓGICA (a única via que poderá salvar a Humanitas, contra o objectivo-objectualista Monismo Epistémico). A metodologia axiomática é simples: não se deve misturar e confundir Pessoas e Coisas; Sujeitos e Objectos. O Papa Francisco não receia, na sua Linguagem, uma Crítica severa ao ‘Capitalismo Selvagem’ (cf. ‘Exp.’/1º Cad. 29.4.2017, p.21). “O pensamento liberal que retira o homem do centro e ali coloca o dinheiro, não é o nosso. A doutrina da Igreja é clara e é preciso avançar neste sentido”. Pelo contrário, o cristianismo deve dar ‘particular atenção’ aos mais ‘marginalizados, à defesa dos que têm mais necessidade de ser protegidos’. E acrescentou: ‘E isso ‒ que fique claro ‒ não é ser comunista: é, simplesmente, estar verdadeiramente envolvidos com a realidade”. Quantas falácias e discursos mentirosos o séc. XX engendrou sobre o tema do Comunismo, dapertutto no Mundo. O Cardeal Bergoglio e o seu amigo Figuera de Novaes sabiam, muito bem, que o séc. XX não tinha conhecido o Comunismo em qualquer parte do Mundo. O Tema era criticamente exposto e aprendido no Livro ‘O Novo Estado Industrial (de John Kenneth Galbraith, assessor de J. Kennedy para os assuntos económicos), que nós tivémos a sorte de adquirir numa edição da Civilização Brasileira, S. Paulo, 1962. A Marta Novaes, sobrinha de F. de N., era a emissária, com indicações e trabalhos próprios, que eram editados, desde a última década do séc. XX, no âmbito do ‘Centro de Estudos do Humanismo Crítico’, na Cidade de São Paulo/Br., via electrónica e em edições de papel. Nesta problemática, o que ela sabia e o seu Tio e o Cardeal Bergoglio tê-lo-ão, todos, lido e aprendido nos nossos Livros,
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aí editados pela Edicon e pela Noética. Dizia, pois, com todo o acerto J.K.G.: Comunismo — o que foi conhecido no séc. XX — não era senão a outra face da mesma Moeda: ‘Capitalismo monopolista de Estado, ao lado da sua outra versão conhecida: Capitalismo liberal. Ou a T.I.N.A. ou o fascismo?!... Será inevitável a lógica do mal menor, que nos impõe, apenas 2 lados para escolher?!... Daniel Oliveira faz bem o ponto da situação, ao escrever (ibi, p.35): “O centrão que impôs, também através da U.E., a contrarreforma social de que a Lei/ /Macron, aprovada por decreto contra parlamento, foi só mais um episódio. Macron representa a derradeira aliança entre a terceira via e os neoliberais num reduto final e unificado de resistência do ‘sistema’ ao cerco em que hoje vive. Para reconstruir este espaço interessa-lhe, mais do que uma frente democrática, uma capitulação do flanco esquerdo. Aquele que não desistiu de representar os excluídos da globalização e tem de gerir uma posição muito delicada nesta segunda volta: nem ser responsável pela vitória de Le Pen, nem legitimar o programa de Macron. “Ao se resumir tudo a uma clivagem entre ‘Nação’ e ‘Europa’, não se põe apenas a esquerda eurocéptica no mesmo saco que a extrema-direita. Põe-se a esquerda europeísta no mesmo saco que a direita liberal”. O círculo fechou-se!... Ou neoliberalismo ou xenofobia desbragada. A política do empíreo-criticismo é nisto que dá... • No concernente às políticas económicas contemporâneas e ao Problema central da dinâmica de uma (falsa e perversa globalização), Miguel Sousa Tavares põe os problemas e baliza as soluções com muita acuidade e rigor (cf. ibi, p.6). Vale a pena lê-lo com atenção. “Qual é o problema? É que a Whirlpool é americana, mas actua num mercado planetário [é sempre o problema da escala e do dinheiro...], em busca da rentabilidade e do lucro máximo. Os 300 trabalhadores de Amiens são uma gota de água insignifi-cante no universo dos seus 93 mil assalariados. Por vontade e promessa de Marine, a fábrica ficará em França; por vontade e ameaça de Trump, irá para os U.S.A.. Mas nem uma coisa nem outra: a Whirlpool não levará a sua fábrica de volta para os U.S.A. nem a deixará em França — irá para onde tiver de pagar menos salários e menos impostos. O grande capital não tem estados de alma nem assomos patrióticos, tem apenas Relatórios e Contas, dividendos para pagar aos accionistas e prémios de gestão para os administradores que garantirem mais dividendos aos accionistas. “O problema da globalização não é o do seu princípio — que tantos, como os U.S.A. à cabeça, defenderam insistentemente durante décadas. O comércio, a liberdade de comércio e das trocas comerciais fez a prosperidade dos povos ao longo dos séculos, aproximou culturas e civilizações e evitou as guerras, desprezando os nacionalismos e a imbecilidade extrema dos fanatismos religiosos. Nos dias de hoje, pondo termo a um sistema pós-colonial profundamente iníquo, que condenava os pobres à miséria eterna, a globalização arrancou dezenas de países e centenas de milhões de miseráveis à sua condição sem esperança. [É preciso enaltecer, positivamente, o benefício 1º da Globalização em nome dos povos!] Mas quando se estabelece algum equilíbrio, é fatal que alguém perca para que alguém possa ganhar. [Isto não é matéria de ‘ciências físico-naturais’...] Ganharam os pobres, perderam os ricos; ganharam os operários dos países pobres, perderam os dos países ricos. Fábricas, negócios, indústrias inteiras dos países ricos tornaram-se economicamente insustentáveis, face à mão-de-obra mais barata dos emergentes. Esses perdedores são o eleitorado natural de Marine Le Pen, de Donald Trump, dos defensores do ‘Brexit’ e dos comunistas, convertidos em seus compagnons de route. São eles os inimigos da Europa e, em geral, de qualquer tratado de comércio transfronteiriço”. No atinente às Soluções, o nosso Autor divisa duas, a que podemos chamar A e B. A Solução A enquadra-a do seguinte modo: (ibidem) “A nível político, o problema não é o de excesso de regras comuns, como julgam os ingleses, mas justamente o contrário:
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uniformização fiscal para as empresas, combate ao dumping social e laboral, fim dos offshores, mais apertado controlo sobre a banca e o sector financeiro, tributação das transacções financeiras não correspondentes a criação de riqueza efectiva, políticas comuns nos sectores de energia e ambiente, cooperação nos domínios da ciência e da investigação científica, reflexão comum sobre as questões de natalidade e do envelhecimento populacional. No concernente à Solução B, o Autor esquadrinha-a como segue (ibidem): “A outra alternativa é a da Le Pen, de Trump, dos ingleses nostálgicos do império, do sultão Erdogan e do czar Putin. É a alternativa do restabelecimento das fronteiras, do proteccionismo, do chauvinismo de raça, de religião ou de nascimento. O nacionalismo de merceeiro. Naturalmente, pressupõe um discurso de lei e de ordem, em nome da pátria e da segurança. E naturalmente, é o primeiro passo no caminho das ditaduras. É por isso, também, que eles não gostam da Europa [Que Europa?!...]: porque, teoricamente, não lhes permite a liberdade de escolherem a ditadura ‒ mesmo que o povo a queira. É por isso que o discurso da extrema direita e o dos comunistas nunca esteve tão próximo. Une-os o mesmo desprezo pela liberdade e pela democracia e a mesma criminosa convicção de que a história não se repetirá como tragédia. Querem de volta a velha Europa, com o longo repertório dos seus nacionalismos, dos seus ódios, dos seus ditadores, das suas guerras”. Nas duas Soluções, configuradas por M.S.T., há uma misturada confusa de aspectos e dimensões positivas e outros tantos negativos. Não é esse o caminho das rectas e justas soluções que a ‘Recta Ratio Agibilium’ muito desejaria encontrar. Vemos a ‘Arquitectura’ societária em ruínas, de um lado e do outro!... Carecemos, pois — vindos de fora/dentro do ‘Mundo que há’ ‒ de Anjos/Ajudantes Auxiliares, que nos permitam levar a bom porto o nosso Empreendimento. Resumo/Esquema: 1º — A Psico-Sócio-Antropologia da Espécie Sapiens//Sapiens não nos fala de ‘livre arbítrio’ (individual...) sempre separado (queira-se ou não...) dos Poderes ditatoriais. 2º — De igual modo e segundo a mesma Gramática (a nossa), que é a da Liberdade Responsável primacial e primordial, as Nações/Estados deverão constituir-se em absoluto pé-de-igualdade ético-jurídico, uns em confronto com os outros. 3º — Primeiro as Pessoas/os Sujeitos Humanos; só depois virão as coisas e as mercadorias. 4º — As linhas doutrinárias para todo este universo de mundividências emergem de duas fontes principais: A) O Jesuanismo (ilustrado pelo C.E.H.C.) e o tão ignorado Neo-Paganismo de Alberto Caeiro (o 1º e o mais personalizado dos Pseudóminos de Fernando Pessoa). O Neo-Paganismo de Alberto Caeiro é a 2ª versão do vero Jesuanismo dos nossos irmãos judeo-cristãos gnósticos primevos. 5º — A Doutrina social da Igreja (não apenas a reiniciada por Leão XIII e a ‘Rerum Novarum’, mas, igualmente o filão jesuânico que ainda ecoa nas escrituras do N.T.). O Papa Francisco, com as suas encíclicas e exortações tem constituído uma boa bússola, nesta constelação. 6º — A Re-organização oficial da O.N.U. (em todas as suas agências e organismos), por forma a constituir-se como a cúpola necessária e indispensável, para dirimir e julgar os conflitos e diferendos, que possam surgir entre as Nações/Estados. Que o nosso muito querido e estimado Amigo e Camarada Socialista, António Guterres, actual Secretário-Geral da O.N.U., saiba acolher, dinamizar e promover esse Grande Empreendimento. A necessáeria e indispensável Reforma da O.N.U..
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• Perante ‘uma Economia que mata (o lóguion corrente do Papa Francisco) —, o que é necessário e urgente, segundo a gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, é mesmo reconstruir a inexpugnável fortaleza da sua Consciência crítica, activa e em acção. “É na sua encíclica sobre a questão ecológica — ‘Laudato Si’ (Louvado Sejas) Sobre o cuidado da Casa comum — que o Papa leva mais longe a sistematização das suas críticas a um sistema, que submete a política às finanças, relacionando diferentes factores e realidades: crise ecológica e ambiental, pobreza e subdesenvolvimento, depredação e esgotamento de recursos, concentração de grandes grupos financeiros e dívida externa, natalidade e fim da biodiversidade, privatização da água e dívida ecológica, ecologia social e desigualdade. “O Papa entende que ‘uma verdadeira abordagem ecológica’ exige uma ‘abordagem social’, ouvindo em simultâneo ‘o clamor da terra’ e o ‘clamor dos pobres’. Francisco repropõe alguns princípios, que vêm dos primeiros séculos do cristianismo, como o destino universal dos bens e a sua primazia sobre a propriedade privada. Mas, precisamente por causa de tais argumentos, este foi o seu documento que mais críticas suscitou nalguns sectores católicos e político-financeiros”. (Ant. Marujo e Joaquim Franco: ‘Papa Francisco: A Revolução Imparável’, op. cit., p.38). É preciso, pois, repisar a tese, para os surdos ou mentecaptos: A mais antiga Tradição cristã sempre estabeleceu que ‘o direito à propriedade privada está subordinado ao direito ao uso comum, subordinado ao destino universal dos bens’. Esta doutrina está expressamente exarada no Compêndio da Doutrina Social da Igreja (nº294). Nos nos 176-181 da mesma obra, fazem eco os mesmos princípios doutrinais inscriptos na Constituição conciliar (Vat. II) ‘Gaudium et Spes’. Os que pretendem argumentar o contrário, ou são supinamente ignorantes, ou confundem o ‘comunismo’ com o capitalismo monopolista de Estado!... As Sociedades humanas estão a ser reconstruídas, (dis)funcionando), às arrecuas!... → de cima para baixo; não de baixo para cima; de trás para a frente e não de frente para trás; a partir do colectivo e da Força telúrica e não do individual/subjectivo, da Anima individualis personalis, da Inteligência e do Coração, de onde advêm os projectos válidos e fecundos. “Não será a chamada ‘crise da família’ ou ‘de valores’ também uma consequência da sociedade da frustração (Gilles Lipovetsky) e da incerteza? O definitivo é hoje reequacionado, relativizam-se as relações e as instituições — a experiência concreta é mais importante do que a ideia —, privilegia-se o direito à perenidade quando estão em causa as liberdades individuais e o direito à felicidade” (iidem, op .cit., p. 130). O farol do Papa ficou bem balizado numa narrativa que desinstala (cf. op. cit., p.92): “A exortação apostólica Evangelii Gaudium foi a primeira grande marca dessa abertura do horizonte. No documento, o Papa acusou o sistema capitalista de desenvolver uma economia que ‘mata’ e denunciou os lucros ‘de poucos’, que ‘crescem exponencialmente’, enquanto a situação da maioria fica ‘cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz”. É preciso e urgente, para o ‘Homo Sapiens//Sapiens’, recuperar o espaldar doutrinal, que molda a fortaleza da sua Consciência Individual/Pessoal. Ouçamos o tema bem desenvolvido e esmiuçado no parágrafo seguinte (op. cit., p.131): “Neste percurso, é marcante o texto do Vaticano II sobre a consciência. Na constituição sobre a Igreja no mundo actual, a Gaudium et Spes, apresentada em Dezembro de 1965, lê-se: ‘No fundo da própria consciência, o homem descobre uma lei que não se impôs a si mesmo, mas à qual deve obedecer; essa voz, que sempre o está a chamar ao amor do bem e fuga do mal, soa no momento oportuno, na intimidade do seu coração: faz isto, evita aquilo. O homem tem no coração uma lei escrita pelo próprio Deus; a sua dignidade está em obedecer-lhe, e por ela é que será julgado. A consciência é o centro mais secreto e o santuário do homem, no qual se encontra a sós com Deus, cuja voz se faz ouvir na intimidade do seu ser. Graças à consciência, revela-se de forma admirável aquela lei, que se realiza no amor de Deus e do próximo. Pela fidelidade à voz da consciência, os cristãos estão
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unidos aos demais homens, no dever de buscar a verdade e de nela resolver tantos problemas morais, que surgem na vida individual e social. Quanto mais, portanto, prevalecer a recta consciência, tanto mais as pessoas e os grupos estarão longe da arbitrariedade cega e procurarão conformar-se com as normas objectivas da moralidade. Não raro, porém, acontece que a consciência erra, por ignorância invencível, sem por isso perder a própria dignidade. Outro tanto não se pode dizer, quando o homem se descuida de procurar a verdade e o bem, e quando a consciência se vai progressivamente cegando, com o hábito do pecado”. Hodiernamente, fora e mesmo dentro dos espaços das religiões institucionalizadas, há toda uma mentalidade/atmosfera espalhada e difundida como um tzunami, no sentido da hegemonia absoluta do Direito Positivo, do Positivismo jurídico, segundo a escola jurídica do austríaco Hans Kelsen. Ora, se, por um lado, escasseia, cada vez mais, o estudo do Direito Natural, como instância de base de todas as práticas do Direito, e, se, por outro lado, as Sociedades humanas se acham amofinadas pelo catecismo do Objectivo-Objectualismo, são as próprias Sociedades humanas, que, em tal situação, entram em colapso, essencial e fundamental, justamente por falta de DIÁLOGO vital e humanizador. A actuação pastoral do Papa Francisco parte sempre desta premissa irrenunciável: é forçoso partir sempre do princípio de que diante de uma pessoa, está outra pessoa; por isso, ele pode afiançar-nos com alguma ironia: (cf. iidem, op. cit., p.113): “A misericórdia e a justiça sempre foram um drama na Igreja e só há comunidade cristã na medida em que, pela consciência da acção individual e pela capacidade comunitária de exercer a misericórdia e a justiça, ela se revele fiel ao seguimento de Jesus”. Kalós ó kúndunós: é belo o difícil!...
Fundamentos e Desígnios: • As Fórmulas Físicas das Quatro Matérias/Dimensões, que compõem e arquitectam o Planeta TERRA: Terra, Ar, Água e Fogo (segundo a geometria de Arquimedes: 287-212 a.E.c.). Correspondências, a partir dessa base: • Os 4 Pontos cardiais, que funcionam como quadrantes geométricos de orientação. • Na área da Antropologia ( Psico-Sócio-Antropologia): Pensamento// Sentimento// //Sensação//Intuição. • Foi na base da Realidade Quadridimensional ‒ ultrapassada a Realidade tridimensional (que serviu como quadro para a descoberta da Relatividade Restrita) ‒ que Albert Einstein percepcionou e estabeleceu o princípio/lei da chamada Relatividade Geral. No cosmos/Universo, tout se tient: tudo está ligado a todas as coisas! A maravilha consiste na nossa Atenção desperta, para as descobrirmos e identificarmos. O C.E.H.C. (como a Obra de J. Saramago e a Fundação José Saramago, na chama-da ‘Casa dos Bicos’, em Lisboa), trabalha e luta, antes de tudo, contra as Indiferenças no Pensamento e nas Sensibilidades, para, sobre Novas Bases, edificarmos um Mundo ecologicamente saudável e tranquilo, segundo a gramática própria da Espécie Humana actual: a do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Sabendo que, no universo Humano, tudo se encontra articulado com todas as coisas, apesar dos mares de fracturas e separações (... como as de Thomas Hobbes ou de Yval Hárari), o nosso empreendimento consistirá em esforçarmo-nos, denodadamente, por Arquitectar um Projecto Global holístico e criticista, que não exclua nem rejeite a beleza das ‘pequenas coisas’. Este será um Mundo Humano, que nada de Humano deixará de fora. Como na frase icónica de Terêncio Varrão: ‘Homo sum, humanum nihil a me alienum puto’!
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Como bússola de orientação, sabemos que, às nossas Sociedades (que foram ensinadas/ /domesticadas a caminhar ‘às arrecuas’, sempre ‘às arrecuas’, comandadas por condottieri, que se enganam com frequência e são, por isso, forçados a voltar às calendas gregas...) faltam, absolutamente, transformações revolucionárias (dignas do nome!) (se ainda houver espaço/tempo para tal!...), nos comportamentos e posturas dos Humanos (ditos civilizados...) e nas próprias Instituições da HUMANIDADE. É a própria Curadora da ‘Fundação José Saramago’, Pilar del Rio, que, a propósito dos seus principais desígnios — Lutar ‘contra a indiferença’ — se exprime, em entrevista, (in ‘JL’, 24.5-6.6, 2017, p.24), nos seguintes termos: “Sim. É que os livros de Saramago são sempre contra a indiferença. É literatura pura ‒ aliás, recentemente um conjunto de universidades anglo-saxónicas elegeu 100 obras fundamentais da literatura universal e considerou que, na Península Ibérica, havia dois romances a destacar: Dom Quixote, de Cervantes, e Ensaio sobre a Cegueira. Não há dúvida de que Saramago faz literatura pura, mas é sempre uma literatura contra a indiferença; que reflecte sobre a responsabilidade, o erro, a História, o factor Deus. Isso está em todos os seus romances. Por exemplo, em A Jangada de Pedra”. ‒ O refrão clássico apostrofava: ‘Antes fosses frio... mas porque não és quente nem frio, vomitar-te-ei da minha boca’!... Os textos de Saramago ‒ nós conhecemos bem a sua Obra ‒ são quentes ou gelados: Desencadeiam desafios intelectuais e emocionais... não deixam os leitores indiferentes, nem são pasto de ‘passa tempo’!... A propósito de A Jangada de Pedra, escreveu, com verve e humor Pilar del Rio (ibidem): “A Jangada de Pedra é uma proposta de ‘Ibéria-exit’, mas é uma saída que vai ao encontro de outros povos e civilizações, no sentido de (re)tirar a Península Ibérica da Europa, que está mergulhada num tremendo egotismo, dizendo-lhe: estamos aqui para contar que o mundo existe não para servir de ponte a determinados interesses. A literatura de Saramago é uma maravilha”. Para que têm servido montanhas de Estatísticas, v.g., nos Sistemas Educativos e sobre a problemática da Educação e dos Ensinos profissionais, se uma vez parado o chinfrim da Banda, a atmosfera corrente volta sempre ao ram-ram da rotina que se impõe... ou, nos casos em questão, só lhes interessam Disciplinas tecnológico-tecnocráticas?!... Por que, nas Sociedades Humanas, não se começa a adoptar a estratégia Adequada das Duas Epistémes: a) a das Ciências físico-naturais; b) e a das Ciências psico-sociais e/ou humanas. Sabem que o Monismo Epistémico é a fábrica cúmplice de todas as Ditaduras?!... O Constat, que tudo desarma, é da própria Realidade que procede: Paradoxalmente, as Estatísticas favorecem mais o ‘status quo’, o ‘Establishment’, do que os veros Projectos de Renovação e Transformação das Sociedades humanas. E tudo isso ocorre pela simples razão de que as estatísticas servem a ‘religião dos factos’: a religião sagrada do Objectivo-Objectualismo!... Na melhor das hipóteses, as estatísticas promovem a atmosfera do ‘nonsense semântico’ entre os que escrevem e os que lêem. É o sentido do que, perspicazmente, escreveu Paulo Guinote, no seu art. ‘Educação, Estatística e Política’ (in ‘JL’, 24.5-6.6, 2017, p. 5 Ed.): “Infelizmente, é essa a situação em que vivemos; é mais do que falta de sentido, as estatísticas e os números, na sua aparente neutralidade, têm servido para criar sentidos falsos, e construir uma realidade alternativa [falsa... também ela].
O ‘Livre Arbítrio’ e o Fim do Poder. O ‘Livre Arbítrio’ (de que nos têm falado todos os grandes pensadores da Cultura Ocidental: Paulo, Agostinho, Lutero, Calvino, Erasmo, Descartes e o próprio Stuart Mill, entre
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outros) não é mais do que a ‘Lei do Pêndelo’ ‒ do Pêndulo de Foucault. A uma tal realidade não se pode dar o nome de Liberdade, como fonte e centro de Responsabilidades: tudo é ordenado segundo duas categorias opostas... ‘tertium non datur’, por definição. A Potestas societária e a sua consistência estão arrumadas num outro espaço separado, e à parte, ‘vis-à-vis’ as ‘liberdades’ individuais/pessoais. Não há ‒ não pode haver ‒ correspondência veramente biunívoca entre os dois campos de realidades. Por isso mesmo, não se conhecem as práticas psicosociais do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, nem se cuida de pôr em prática a sua gramática!... Já falámos (com algum interesse e justiça) do Livro, em boa hora aparecido, do estudioso venezuelano Moisés Naím: ‘O Fim do Poder...’ (bem concebido, até nas suas exigências de concretude, que surgem logo no título). Mas nunca se deu ele conta, ao longo de todo o Livro, de que, na sua mundividência, não há realidades ‘biunívocas’ entre a ‘Liberdade’ e o ‘Poder’, no seu universo mental. Por isso, a sua estratégia criticista global pode resultar, substantivamente, gorada... completamente falaciosa!... Se, em toda esta odisseia criticista de Moisés Naím, se não conseguirmos fazer emergir o vero Homem Novo, o ‘Homo Sapiens//Sapiens’, e a prática assídua da sua gramática, todo o nosso empreendimento glorioso resultará falhado. Sem apelo, nem agravo!... Não se tomou, ao longo do séc. XX, o ‘sistema comunista’ como uma ‘3ª realidade’ diferente do Capitalismo, quando, na verdade, o sistema em causa não passava de ‘capitalismo monopolista de Estado’ (J.K.G. dixit), a outra face do mesmo Sistema Capitalista?!... Mais (e ainda relativamente ao extenso título explicativo...): M.N., no subtítulo, faz referência a uma ladaínha de áreas (onde supostamente, para ele, o Poder entrou em declínio). Mas, se ele procurar, aí, um Quadro Geral cosido, bem concebido e aparelhado, afinal, não é da Cultura (estabelecida) da Potestas-Dominação d’abord, que ele pretende construir a sua Crítica... Ao contrário do que se passou com Max Weber, o pé não lhe chegou à pègada!... Eis por que, se de alguma coisa de útil se pode falar, é da desconcentração do Poder hegemónico; não dos veros movimentos de descentralização dos diferentes Poderes Estabelecidos. Como bom tempero para o Livro de M.N., constituiria, sem dúvida, uma boa e eficaz leitura a da ‘Economia do Bem Comum’ (Ed. Presença, 2017), de Christian Felber, Prof. de Economia em Viena e bailarino; ‘a singularidade do Autor está também em defender, que há mais mundo para além do capitalismo e do socialismo: o que chama de Economia do Bem Comum, enquanto ‘modelo alternativo de economia de mercado ético’, pelo qual se vem batendo na teoria e na prática’. (Cf. ‘JL’, 24.5-6.6,2017, p.28). De acordo com a Declaração fontal de 1789 (que desencadeou o Grande Movimento da Revolução Francesa de 1789-1795), deve advertir-se que a noção de Liberdade aí adoptada já tinha gorgulho na semente: Era aí afirmado que a Liberdade era o principium e a sua restrição a excepção. Daqui, era óbvio e fácil extrair o postulado, que veio a comandar todo o Processus revolucionário da R.F. e o seu lídimo carácter burguês: Sendo assim, a melhor maneira de proteger as liberdades fundamentais dos indivíduos consiste em não legislar (nada) sobre a excepção!... O que, em 1ª apercepção crítica, se deve, aqui, anotar é que há, aí, uma gramática (implícita) de ‘excepção’, que exclui do seu campo (de cidadania) todos quantos ficam de fora. As sociedades, assim constituídas, balizaram dois campos: os que estão dentro (com plenos direitos) e os que ficam de fora (sem direitos nem meios de vida). Ora, essa não é a gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’ (que estabeleceu uma gramática de Inclusão para todos). É, tão só, a gramática do ‘Homo Sapiens tout court’, que separou, por muralhas da China, o campo dos Poderes e o campo das ‘liberdades’, reduzidas ao simples ‘livre arbítrio’. Eis por que, para o CEHC, há uma oposição de abismos entre as duas
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Culturas: A do Poder/Dominação d’abord; e a da Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial.
• A Humanidade segundo a odisseia do ‘Homo Sapiens tout court’. A Obra histórico-filosófica (de nosso conhecimento), que melhor pode representar a mundividência emblemática dessa odisseia é a do já citado Autor (prof. na univ. Hebraica de Jerusalém) Yuval Noah Harari: ‘Homo Deus: História Breve do Amanhã’, Ed. Elsinore, Amadora, 2017/Portugal). Já se nota, no próprio título: a Saga termina o seu processus na formatação dos Humanos convertidos na Divindade: uma Divindade concebida e praticada por ‘novas religiões’. O ‘Homo-Deus’ começa, agora, a ser edificado nas Oficinas metalúrgicas da nova Tecnociência prometeica. Ao longo do vasto caminho histórico, percorrido pela Humanidade, a Consciência como Fenómeno incontornavelmente Humano dissolveu-se, por completo, ao longo do caminho. (Cf. ibi, pp.393...). A consciência humana foi, definitivamente, eclipsada nas duas Revoluções operadas (a 1ª na Evol. nat.; a 2ª na Evol. artif.): a 1ª formou-se e desenvolveu-se no acesso à inter-subjectividade; a 2ª não sairá das balizas do Tecno-Humanismo (ibi, pp. 393-4): refractário ao humano e, em última instância, barbarizado. Do que o Autor pretende falar é das ‘novas tecno-religiões’, engendradas em oficinas e laboratórios tecnológicos. “Estas novas tecno-religiões podem ser divididas em dois grupos principais: o tecno-humanismo e a religião dos dados. Segundo esta última, os humanos concluíram a sua tarefa cósmica e chegou a hora de passarem o testemunho a entidades de um género completamente novo. No próximo capítulo, analisaremos os sonhos e os pesadelos da religião dos dados. O presente capítulo é dedicado à crença mais conservadora do tecno-humanismo, que continua a ver os seres humanos como o auge da criação e ainda mantém muito dos valores tradicionais do humanismo. O tecno-humanismo concorda que o Homo Sapiens, tal como o conhecemos, já terminou o seu trajecto histórico e que, no futuro, deixará de ser relevante, mas conclui que, por isso mesmo, devemos usar a tecnologia para criar o Homo Deus ‒ um modelo humano bastante superior. O Homo-Deus manterá algumas características humanas essenciais, mas também beneficiará de capacidades físicas e mentais melhoradas que lhe permitirão defender a sua posição, mesmo em relação aos mais sofisticados algoritmos não-conscientes. Visto que a inteligência se está a separar da consciência, e que a inteligência não-consciente está a avançar a um ritmo vertiginoso, os humanos terão de promover activamente a melhoria das suas mentes, a fim de se manterem em jogo” (idem, ibi, pp.393-394). (o itálico é meu). O que destacámos em itálico consideramo-lo fantasmagorias do A., sem qualquer credibilidade científica (como explicaremos adiante...). A seguir, N.H. fala dos 1os primatas africanos (a partir de uma Rev. Cognitiva, que ele data de há 70 mil anos), os quais adquirem as características essenciais dos hominídeos, desembocando no que ele chama o campo da intersubjectividade. A 1a Rev. Cognitiva evoluiu para uma 2a, mais de ordem mental, que estabeleceu o patamar evolutivo do ‘Homo Sapiens’. E conclui o A. o seu Quadro (ibi, p.394): “A remodelação mental da primeira Rev. Cognitiva deu ao Homo Sapiens acesso ao campo da intersubjectividade; uma segunda revolução cognitiva talvez dê ao Homo deus acesso a novos domínios inimagináveis e faça de nós os donos do universo”. Três Anotações necessárias e indispensáveis se impõem ao texto (pretensamente científico...) de N.H.: A) A premissa da Intersubjectividade, que ele considera como um campo bali-
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zado, perfeitamente substantivo e autonomizado... quando o seu carácter essencial e decisivo é de ordem adjectiva e heterónoma. Estamos a brincar com os cegos?!... Agora, dois corolários fundamentais: 1. ‒ o da separação (pressuposta) da Inteligência do Fenómeno (husserliano) da CONSCIÊNCIA. Chamar ‘inteligentes’ aos ‘aparelhos inteligentes’ da Robótica, constitui um ERRO de palmatória. A dita Inteligência Artificial é um fenómeno mal caracterizado. Há, desde logo, aí, um Erro de categoria ontológica. Não há Consciência sem Objecto de Conhecimento; e, para que tal aconteça, carecemos de um Sujeito pensante. Quanto ao 2º corolário: ‒ quando se afirma que a inteligência não-consciente está a avançar a um ritmo vertiginoso... primeiro, estamos a supor como real o que é apenas irreal; depois, ao medir a velocidade dessa ‘inteligência’, estamos, tão só, a falar da Inteligência robôtica ou cibernética. Ao falar da ‘Grande Separação’ (que da 1ª Rev. pode dar acesso à 2ª Rev.), o Autor até me fez lembrar Thomas Hobbes e o seu ‘Leviathan’. Mas o Projecto de N.H. é diferente: ele considera, até, que os humanos hão-de, um dia, ser dispensados das suas actuações nos dois planos: militar e económico (cf. ibi, p.341). Mas, em todo o caso, tem de perguntar-se à puridade: Que pretende ele fazer do Pensamento democrático e liberal, bem como das noções-chave de Indivíduos-Pessoas, livres e fontes de escolhas (que ele toma como obsoletas...)?!... Eis o que ele, aí, escreve (p.341): “1. Os seres humanos irão perder utilidade económica e militar e, por conseguinte, o sistema político económico não lhes dará tanto valor. 2. O sistema dará valor à humanidade enquanto um todo, mas não aos indivíduos. 3. O sistema continuará a valorizar alguns indivíduos, mas estes serão uma elite de superhomens aperfeiçoados e não a grande parte da população”. Um A., com tais enteléquias: 1º Não acredita nos Seres Humanos, qua tais; 2º Manifesta um ódio profundo em confronto com a exigência da Igualdade social dos Indivíduos (um dos dois predicados essenciais da Espécie); 3º Acredita de tal modo e em tal grau nas potencialidades da Tecnociência de Aparelho, que o desenvolvimento desta impede o cumprimento da Igualdade social. O Autor parece mesmo paradoxal e obnóxio, quando escreve o seguinte a respeito da religião do humanismo (ibi, p.81): “Para que tudo isto seja compreensível, temos de ir ao passado e investigar quem é realmente o Homo Sapiens, ‒ como é que o humanismo se tornou na religião dominante e porque é que a tentativa de concretizar o sonho humanista pode resultar na sua destruição. É esse o plano resumido do livro”. A esta questionação, o A. só tem uma resposta séria e honesta ‒ a do C.E.H.C.: Conceber e projectar o ‘Homo Sapiens//Sapiens’ (e a implicada superação da religião do ‘Homo Sapiens’...) e actuar em consequência!... A Tecnociência de Aparelho hodierna está muito longe de constituir uma sorte de Religião de Salvação para o ‘Homo Sapiens’ do Autor. E se a Revolução humanista (ibi, pp.249 e ss.) fracassou, ao longo de dois milénios, foi justamente por ser gravemente prejudicada pelas religiões institucionalizadas, a começar pelas três religiões monoteístas. Eis por que as soluções de Libertação não poderão advir dos novos horizontes tecnológicos, congeminados pelo nosso Autor... que, de resto, nem, ao que parece, sabe caracterizar adequadamente a Espécie ‘Sapiens//Sapiens’. O Antropoceno (constituído como idade geológica, já na década de ’50 do séc. XX) foi, sem dúvida, o resultado de todos os desmandos e erros, cometidos ao longo do Processo civilizatório, procedentes de actuações ditas humanas, praticadas segundo o catecismo do ‘Homo Sapiens tout court’. O ‘Sapiens//Sapiens’ é, por natureza, um ser prudente e equilibrado: Sabe que sabe; é criticista, por sua própria índole.
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O Mercado Bolsista (cujo ‘trapézio de circo’... é medido pelas Agências de Rating, espalhadas pelo Planeta) não se poderá dizer que ele tenha Consciência (a humana, que interessa!...). (Cf. ibi, pp.124 e ss.). Ele não tem, efectivamente, consciência, porque vê e analisa tudo sob a perspectiva incontornável do Objectivo-Objectualismo. Mas, a olho desarmado, vê-se, logo, que a vera consciência (psíquica e moral) já emerge na resposta certa a esta Questão: ‘Os Estados Unidos são bem mais poderosos do que o Afeganistão. Significa isto que as vidas dos americanos têm um valor intrínseco superior às dos afegãos?’ (cf. ibi, p.119). O Mito extraordinário da alma imortal dos humanos!... Só que os postulados e as conclusões do Mito sobre a Igualdade humana não são cumpridos, básica e elementarmente. Se os monoteístas (religiosos) recusam a Evolução, fazem-no, obviamente, em nome da defesa doutrinal da Antiga Igreja, no quadro ‒ que lhes ensinaram ‒ do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo. Quem, afinal, ainda tem medo de C. Darwin?!... Dado que a teoria evolucionista de Darwin se baseia, precisamente, no princípio claro da sobrevivência do mais apto, por que não ensinam estas matérias às crianças?!... E por que ninguém (ou muito poucos...) se preocupam com a relatividade (restrita e geral) de A. Einstein, com a Física quântica? E por que não ensinam, igualmente, às crianças, teorias alternativas sobre a matéria e a energia, sobre o espaço e o tempo? (cf. ibi, p, 121...). ‒ Daqui advêm todos os obstáculos, para erguer os novos parâmetros axiológicos e epistémicos, no sentido de a Espécie humana, no seu conjunto, possa, de facto, dar o salto de gigante do ‘Sapiens tout court’ para o ‘Homo Sapiens//Sapiens’! Mas este Diapasão é aplicável a todos os Indivíduos humanos. ‒ É bom que o nosso Autor não se esqueça desta exigência. O Autor é um pensador complexo/perplexo, entre a sensação/percepção e o desejo de um Projecto. Considera que na alma eterna, há uns que acreditam; outros não... Mas o ‘fluxo de experiências’ que é, para ele, a Consciência, onde ele discerne à lupa sensações, emoções, pensamentos… Quanto ao ‘fluxo de consciência’, ele define-o como segue (ibi, p.125): “é a realidade concreta que a cada momento testemunhamos directamente. É o que de mais certo há no mundo. Não é possível duvidar da sua existência. [Impressionante!... mas nada de conclusões...]. Mesmo quando as dúvidas nos consomem e nos perguntamos a nós mesmos: “Será que as experiências subjectivas existem mesmo?”, ‘podemos ter a certeza de que estamos a viver uma experiência subjectiva de dúvida’. [...] “Todas estas experiências têm duas características fundamentais: sensação e desejo. Apesar das suas múltiplas capacidades, os robôs e os computadores não têm consciência porque nada sentem ou desejam”. Duas observações: A) ‘experiência subjectiva de dúvida!... ‘ ‒ Só isto, para ditadores, autocratas... e até gente a quem fora recusada a justiça como direito!... B) Se os robôs e computadores ‒ foi dito!... ‒ não dispõem de consciência, por que lhes é atribuída inteligência (que dizem ‘artificial’...), quando, no cosmos que nós conhecemos, inteligência (nat.) e alguma consciência constituem predicamentos ontológicos?!... A mente e a consciência não têm nada a ver com a ‘inteligência artificial’, ‒ o A. concede-nos, pelo menos, a legitimidade deste asserto (cf. ibi, p.127). Nas notas de rodapé (no fim do Livro, ord. por caps.), o Autor faculta-nos algumas indicações/dados, a partir do Inst./Agência Gallup (ibi, p.459), em torno da temática ‘Evolução, Criacionismo, Design inteligente’ (a partir de acesso à www. em 20.12.2014). Trata-se de um Quadro parabólico, segundo uma semântica situacionista/convencional, e de acordo com a gramática historicista do que nós chamamos o ‘Homo Sapiens tout court’: 15% evolucionistas; 32% evolucionistas mas sob o controlo de Deus; 46% criacionistas: Deus criou o homem a partir dos últimos 10 mil anos, segundo a Bíblia. 46% dos licenciados acreditam na Bíblia, (no atinente à criação do homem). Só 14% aceitam que não houve supervisão divina. Gente com mestrado e doutoramento: 25% acreditam na Bíblia; 29% reconhecem a Evolução por selecção
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natural. Sempre e tudo, sob a Bigorna/Baliza do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo. Numa palavra, somos forçados a concluir que, na Mundividência do Ocidente (que se toma, actualmente, por protagonista da Globalização), não existe mesmo, de corpo inteiro, o que nós chamamos, no C.E.H.C., o ‘Homo Sapiens//Sapiens’. • O Trinómio passe-partout!... Há três espécies ou níveis de Realidade: o Universo das objectividades e o Mundo incontestavelmente objectivo; o Mundo da Subjectividade; e o Mundo da Intersubjectividade e das realidades ‘imaginárias’, muitas das quais só o são, por que o colectivo dos Humanos lhe atribui valor real!... (Cf. op. cit., pp.164…). Ora, desde logo, a maior parte das realidades do mundo da Intersubjectividade constitui o produto das experiências e das consciências individuais-pessoais. Harari concede-nos, substantivamente, esta tríade do Real. Mas as suas confusões são mais que muitas. Por duas razões fundamentais: A) O Universo/Cosmos é por ele considerado dualista: há matéria e há espírito: há a Força física do Poder e o ‘livre arbítrio’ que, ao determinar-se, ou se anula ou se submete ao Poder/Autoridade. Para esta gente, o Dualismo metafísico (ou físico) reduz-se ao Monismo. B) Ora, a inteira e plena 3ª Realidade é-nos, justamente, facultada pelo Processo da Evolução (darwiniana/lamarckiana). Eis por que o Processo científico civilizacional da Humanidade nos faculta, afinal, três realidades bem distintas (que nos ensinaram os Gnósticos judeo-cristãos primevos) e que não nos é lícito misturar e confundir. É por tudo isso que temos imensa dificuldade em sair do ôdre da Cultura do Poder/ /Dominação d’abord e penetrar no nosso novo (e próprio dos Humanos) Universo da Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial. O mesmo é dizer: operar a transição do ‘Homo Sapiens tout court’ para o estádio do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. No espaldar da cathedra do Erudito Iluminista e das pessoas comuns, que têm dificuldade em aceder ao conceito de ‘ordens imaginárias’, só há, afinal, duas realidades: as objectivas e as subjectivas (a fons et origo do Cartesianismo residiu aí!...). Ora, este é um pressuposto típico e congénito, decorrente do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo, bem como de toda a mundividência do Ocidente, em vias de mundialização. Nesse horizonte, o mundo da Intersubjectividade (das culturas, civilizações, hábitos e costumes, divindades e nações), ‒ ou é redutível à religião laica do Objectivo-Objectualismo, ou não passa de uma montanha de ilusões, próprias do universo exclusivo do Imaginário humano’. ‘Tertium non datur?!’… Sim, claro: datur, em todos os azimutes possíveis. Mas, para que possa emergir, adequadamente e sem fantasmagorias, essa Terceira Realidade, é absolutamente necessário partir do pressuposto do Hilemorfismo Aristotélico, onde, na sua origem, se lobrigam bem juntas e unidas a Hylé e a Psyché: a matéria e a forma. Sem a admissão desta Dualidade primacial e primordial, a ‘Terceira Realidade’ (que dizemos que se dá) não passam de ilusões e fantasmagorias,…ou redução ao objectivo-objectualismo tecnológico/tecnocrático!... A nossa Doutrina é a que decorre, directamente, dos Gnósticos judeo-cristãos primevos: Nas origens, há um mundo Interior, onde a Interioridade reside e fez sua habitação; depois, veio o mundo exterior, das Objectividades exteriores (todas: as naturais e as imaginárias). A Terceira Realidade resulta da interacção e da união, sempre perfectível, entre as duas realidades originais (a Hylé e a Psyché). A completa embrulhada do nosso A. percebe-se bem, quando ele acede a toda a sorte de misturas (ibi, pp.393-4): “O tecno-humanismo (a outra religião que não ‘a dos dados’) concorda que o Homo Sapiens tal como o conhecemos já terminou o seu trajecto histórico e que, no futuro, deixará de ser relevante, mas conclui que, por isso mesmo, devemos usar a tecnologia
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para criar o Homo deus ‒ um modelo humano bastante superior”. ‒ Por outras palavras: o Autor: A) recusa, cerce, o modelo do ‘Homo Sapiens//Sapiens’; B) para cair na inanitas da ‘religião dos dados’. Mais: o seu modelo do ‘Homo deus’ é uma patética robótica!... Nada mais… O quadro/horizonte absurdo, em que o A. se mete, podemos lobrigá-lo no painel seguinte (ibi, p.444): “1. A ciência está a convergir para um dogma abrangente, segundo o qual os organismos são algoritmos e a vida consiste no processamento de dados. 2. A inteligência e a consciência estão a seguir caminhos separados. 3. Em breve, alguns algoritmos não conscientes mas de inteligência superior poderão conhecer-nos melhor do que nós próprios”. Segundo o Autor, a religião do Tecno-Humanismo só tem, hoje, uma saída: desafiar e apostar nas sucessivas avalanchas das novas tecnologias; e, nessa medida, na Porta do Templo (laico…) estabelecido, o princípio axiomático da Separação da Inteligência e da Consciência promoveu, a todo o vapor, os robôs cibernéticos não-conscientes, mas, aos quais, oximoricamente, conferiu o atributo de ‘inteligência artificial’. Ora, (digamo-lo de verdade e uma só vez!...), a ‘Inteligência Artificial’ (tão proclamada e incençada nas máquinas de som correntes) não passa de uma falácia e uma ilusão… Na justa medida em que não há, no Mundo real, INTELIGÊNCIA sem COINSCIÊNCIA (a não ser em situações ou tipos psiquicamente patológicos). A estrutural situação hodierna (desde o fim da G.F.: 1989-1991), e a partir da última vaga das Revoluções cibernéticas, acha-se entrosada em três parâmetros fundamentais: 1. Organismos = algoritmos; 2. Inteligência e consciência separadas; 3. Inteligência artificial = algoritmos não-conscientes (cf. op. cit., p.444). Para o CEHC, as Revoluçôes humanistas dos Tempos Modernos fracassaram todas, porque não foram capazes de admitir a evolução dos Humanos para o seu vero e autêntico estádio superior: o do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Para o ‘iluminado’ Autor deste livro, “a revolução religiosa crucial da era moderna não foi deixar de acreditar em Deus, mas passar a acreditar na humanidade”. O Autor, em suma, não é capaz de sair das Forcas Caudinas, que ele próprio se instituiu: “Em 2016, o mundo é dominado pela esfera liberal, que junta individualismo, direitos humanos, democracia e mercado livre. Porém, a ciência do séc. XXI ameaça os alicerces da ordem liberal. Dado que a ciência não lida com questões de valor, não pode determinar se os liberais têm razão quando valorizam a liberdade em detrimento da igualdade ou o indivíduo em detrimento do colectivo” (idem, ibi, p. 315). ‒ Como o A. não conhece o estatuto do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, é-lhe impossível olhar para dentro (para o Interior do próprio ‘intus-legere – inteligência e da Consciência). O Projecto (estrutural e elementar) da Igualdade Social dos Humanos, baseado justamente nos vectores, que fluem da Interioridade para a Exterioridade, abalroou, definitivamente, para Yval Harari. • Nestes tempos ominosos de desespero e ruínas… Nunca será supérfluo e perfunctório relembrar e recuperar alguns dos mais significativos e perturbantes ideários filosóficos do Passado, designadamente: o Diálogo Socrático (com as duas funções essenciais: a heurística (da descoberta dos conceitos) e a hermenêutica (da descoberta dos significados); a Dualidade ontológica primigénia, expressa no Hilemorfismo aristotélico (que, por sua vez, cauciona a Dialéctica Interior//Exterior, tão própria e típica da mundividência dos Gnósticos judeo-cristãos primevos). E a célebre Revolução Coperniciana, operada por Immanuel KANT (na transição, falhada, da 1ª para a 2ª modernidade), e, luminosamente, centrada no seu famoso Imperativo categórico, que instituiu a vera e autêntica Igualdade Social entre todos os Seres Humanos. I. KANT é o Filósofo mais conhecido e revolucionário de toda a Modernidade Cultural do Ocidente. As suas obras principais fizeram dele o Aristóteles da Modernidade Ocidental:
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‘A Crítica da Razão Pura’ (1781); ‘A Crítica da Razão Prática’ (1788); ‘A Crítica do Juízo’ (1790); ‘A Paz Perpétua’; e ‘Os Prolegómenos a toda a Metafísica Futura’. Quatro Axiomas são, para nós, os mais importantes: A) O Imperativo Categórico: essa ‘geometria enigmática’ (do ‘Sapiens//Sapiens’), onde o legislador deixou de estar acima da lei, visto que é ele mesmo a fonte e o dicionário da própria lei. B) O primado (absoluto) da Razão Prática sobre a Razão Pura. C) O Projecto, bem justificado, do reino da Paz Perpétua. D) O fim de to-da a Metafísica, enquanto forja dos saberes do ‘Homo Sapiens tout court’; e, assim, se desenha a via de acesso ao novo Estatuto dos Humanos: o do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Na rubrica ‘Iniciativas’ (in ‘Público’, 15.7.2017, p.51) pode ler-se, interessadamente, sobre a odisseia kantiana, o seguinte: “ ‘A Crítica da Razão Pura’ (1781) marcou uma cesura com toda a tradição da filosofia teórica, ao inverter as relações epistémicas do sujeito com o objecto: aquilo a que o próprio filósofo chamou revolução coperniciana da filosofia? Mas a ‘Crítica da Razão Prática’ (1788) não é menos revolucionária no plano moral’, ‒ continua Sousa Dias, citando Gilles Deleuze: a primeira obra ‘consistia em fazer girar os objectos do conhecimento à volta do sujeito; mas a da Razão Prática, que consiste em fazer girar o Bem à volta da Lei, é sem dúvida muito mais importante’, explica. “Com efeito, segundo Kant, o valor moral de uma acção humana não está, numa bomdade do sentimento do agente, nem nos efeitos benéficos para outros dessa acção, mas decorre de um interesse sensível, por mais louvável, do sujeito. Decorre do seu ‘interesse moral’ como pura intenção de agir, em conformidade com a lei prática da razão. Esta lei não nos diz o que fazer em cada caso, diz-nos ou, antes, exige-nos que, seja o que for que façamos, a regra da nossa acção pessoal possa transformar-se idealmente numa lei universal da acção humana: ‘age segundo a máxima que possa simultaneamente fazer-se a si mesma lei universal’. Há moralidade, mérito, moral do sujeito, se, e só se, a máxima subjectiva do agir pode sem contradição ser válida para todos os seres racionais, incluir-se numa ideal ‘legislação moral universal’ ” (ibidem).
• O Primeiro Revolucionário (ideológico cultural) procede do Egipto. Ca. de 3.500 anos a.E.c., entrou em declínio a Era do Matriarcado ou Gilania, que teve uma duração saudável e feliz durante 4 milénios, vivendo em regime de Paz e sem guerras. A partir daquela data, com as primeiras revoluções na Agricultura e na formação das primeiras cidades fortificadas (como a Jericó bíblica), os resultados da Era do Bronze e do Ferro, as atmosferas civilizatórias começaram a mudar: da Hegemonia do Matriarcado, passou-se à Hegemonia do Patriarcado e dos Deuses/Divindades Uraneanas, celebradas como ‘mestres e senhores do Cosmos, ca. de dois milénios depois, por Platão e a escola filosófica helénica dos Eleatas. Se a época dessa evolução foi lenta, nem por isso ela deixou de carrear consigo elementos substantivos de transformação das Regras comuns de vida. As Sociedades, por seu turno, já haviam deixado a condição de ‘tribo’, generalizadamente, uma vez polarizadas em centros urbanos. É nesta época e circunstâncias, que, no Antigo EGIPTO, emerge o 1º Revolucionário (político-religioso) da História, chamado AKENATON (= Deus do Sol), de seu nome próprio Amenophis III (1390-1353 a.E.c.) (séc. XIV a.E.c.). A noção de Trindade divina, com os nomes de Osiris/Isis/Horus, é-lhe atribuída, originalmente. Não dispensava o seu séquito de sacerdotes e ajudantes. (Cf. ‘National Geographic’, Maio de 2017, pp.120-143).
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Prenhe de semântica é o título do artigo de Peter Hessler: ‘Sometimes the most powerful commentary on a king is made by those who are silent’ (ibi, p.124). Ruínas cuidadosamente preservadas na antiga Cidade real de AMARNA: palácios, templos, casas, rio. Antes de Akenaton, eram duas as capitais: Memphis e Tebas. Com a nova Divindade Solar emergente, o novo rei Amenophis III inaugurou a nova capital do Egipto em Amarna (cf. ibi, p.127). ATON, na verdade, veio a corresponder ao antigo deus solar RE; mas, agora, a metamorfose ideológica tornou a Divindade mais realista: Aton é mesmo o Disco Solar!... Ingredientes das transformações psico-culturais/sociais: (vd. uma leve panorâmica sobre as artes no reinado de Aknenaton (cf. ibi, pp.128-131). Uma intuição sobre o modo como surdiu a nova ‘fé’: as casas (particulares) eram construídas com pequenos adobos (talatat), extraídos das areias abundantes, que se amontoavam em cordilheira nas enchentes do Nilo (= a vera madre do Egipto). Outras vezes, os adobos eram feitos de cal e areia do deserto, argamassada e cozida, ou seca ao Sol. Mesmo nas Casas reais, não faltam as dissidências… Akenaton e a rainha Nefertiti. Tutankamon (filho de Akenaton e Nefertiti) não fez, literalmente, caso da revolução política e religiosa dos seus pais; ao longe e ao largo de todo o Egipto, forjou, em torno dos Acontecimentos recentes, uma sorte de ‘damnatio memoriae’. Foi notável a acribia e a teimosia mentais de Akenaton. Segundo o arqueólogo Kamp, Akenaton terá dito um dia: ‘The danger of being an absolute ruler is that no one dares tell you that what you have just decreed is not a good idea’. = O respeito absoluto do Outro pelo Eu (incluindo o do rei!...). (Cf. ibi, pp.134-135). O sentido (auréola…) divino e sagrado do Rei foi instaurado por Akenaton, o que, de resto, constitui a Regra do absoluto de toda a Realeza antiga. O sistema de Realeza dos egípcios (antigos, médios e novos) perdurou durante mais de três milénios (até aos tempos de Cleópatra e Marco António). Escreveu Peter Hessler (ibi, p.143): “[Os antigos egípcios] introduziram-nos na concepção do reinado divino, bem como nos muitos símbolos universais do poder, incluindo a coroa e o ceptro. A arte de Asmarna funcionou frequentemente como propaganda, configurando Akenaton dando prémios aos sicofantas e em paradas à volta da cidade, com guardas de honra bem aparelhados”.
• Origens: Ponto de Partida da Humanitas = Dualismo metafísico-ontológico de Platão, ou HYLEMORFISMO aristotélico?!... A Resposta, clara e lúcida, a esta Questio, já foi dada, inúmeras vezes, pelo CEHC. Nunca, porém, é demais voltar à carga!... Como já se verificou na obra citada ‘HOMO/Deus’, de Yuval N. Harari, constitui, hoje, quase um lugar comum entre os cientistas e a Tecno-Ciência de Aparelho, o catecismo, cada vez mais generalizado, em torno da Dogmática, cada vez mais intensa, entre Inteligência e Consciência. Até a muito respeitada Revista ‘National Geographic’, através do seu bem conhecido Documentário televisivo, titulado ‘ORIGINS’ ‒ : ‘A Jornada da Humanidade’, embarcou na mesma Nau de Harari. A Resposta sumária, que alega, é simples: ‘Ainda não temos resposta para o problema da Dualidade da Natureza Humana’!... Mas… a Resposta, autêntica e genuína, já foi dada por ARISTÓTELES, há 2.300 anos!... De tal modo o Ocidente se encontra embrutecido com a doutrina de Platão e Paulo, que não a conhece, não dá conta dela… Mesmo que ela seja francamente errada.
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No artigo titulado ‘Beyond Human’, o nº de Abril de 2017 da mesma Revista tem um trabalho balizado e orientado no mesmo sentido (ibi, pp.40…). Tudo ‒ em resumo ‒ sob a égide da cartilha do ‘Homo Sapiens tout court’: no livro de Yuval Noah Harari: ‘Homo Deus’ (Ed. Elsinore, 2017): Vide, em especial, caps. 9-10-11 (pp. 341-444): Tudo conduzido e bem orquestrado sob o signo da Grande Separação (pp. 341 e ss.). O que teria de concluir-se e proclamar-se é que as novas religiões fizeram a sua habitação em Silicon Valley (ibi, pp.393…). A Great Separation, aqui, não é a de T. Hobbes (entre o Poder espiritual e das Igrejas, e o Poder histórico-temporal e dos Estados). É efectivamente, e para todos os efeitos, a Grande Separação entre a Inteligência (da Robótica) e a Consciência (dos que ainda se dizem humanos) (cf. ibi, p. 394). De que se fala, afinal? Dessa ‘espécie híbrida’, a que chamaram ‘super-homens’ . Escreve Y.N.H. (op. cit., ibidem): “Esta ideia é uma versão actualizada dos velhos sonhos do humanismo evolutivo, que há já um século reclamava a criação de super-humanos. Contudo, enquanto Hitler e a sua pandilha planeavam criar super-humanos, através da procriação selectiva e da limpeza étnica, o tecno-humanismo do séc. XXI pretende atingir esse objectivo de um modo bastante mais pacífico, com o auxílio da engenharia genética, da nanotecnologia e dos interfaces cérebro-computador”. Desta sorte, estão a emergir, segundo o A., dois novos tipos de religiões: o tecno-humanismo e a chamada religião dos dados (a mais objectualista de todas as religiões!...). (Cf. ibi, p.393; pp.411 e ss.). Para abreviar, à 2ª dar-se-á o nome de Dataísmo!... Definitivamente, e em tal horizonte, a Humanidade ainda não saiu do ôdre do ‘Homo Sapiens tout court’. Assim, cada um dos 24 ícones do Ânthropos, os referenciados ao ‘Ritual burial’ (in ‘N.G.’, April, 2017, p.54) poderá encontrar a sua respectiva figuração e sentido: “The evolution of symbolic behaviors to accompany death signaled self-awareness and thoughts about a possible after life.” Convirá observar e advertir, em todo o caso: Vidas viradas para o Passado… não para o Futuro, na base de um Projecto partilhado por muitos e decorrente, naturalmente, das Consciências Individuais-Pessoais. Curiosamente, há ainda uma Via com Sentido: paradoxalmente, a da Doutrina Social da Igreja que, apesar dos seus dois mil anos, que a votaram ao desprezo e ao esquecimento, foi finalmente recuperada por Leão XIII (na Enc. ‘Rerum Novarum’), em 1891; e estendida e alargada durante o Vaticano II (1962-1965); e intensamente sustentada pelo Papa (actual) Francisco, na Obra dos dois Jornalistas que souberam resumir, com acribia, as Mensagens de Francisco com o título adequado: ‘A Revolução Imparável’ (2016). Estão, aí, presentes, os 3 factores fundamentais, que nunca poderiam ser atraiçoados: A) a preocupação assídua com a Natureza; B) a justiça para com os pobres e necessitados; C) e uma ordem justa e pacífica para com os sócios/irmãos integrados nas suas Sociedades. Numa súmula bem conseguida, poderá ver-se tudo isto nas pp.199-217 do Livro citado ‘Papa Francisco ‒ A Revolução Imparável’. Globalmente, constitui todo um Bom Programa de ECOLOGIA.
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● VIAS ERRADAS NA CONCEPÇÃO DE DEUS; NO PROCESSO DA GLOBALIZAÇÃO; E NO SENTIDO DA LIBERTAÇÃO/SALVAÇÃO. Em matéria de conceptualização adequada de Deus, há que estar permanentemente em guarda, para podermos discernir, com a prudência e a acribia necessárias, as certas e as erradas. O contemporâneo processus de Globalização, ancorado nas multi-transnacionais enferma das mesmas maleitas próprias da conceptualização de Deus. Desde logo a omnipotência (econ. e fiscal) e a omnisciência, que lhes são atribuídas, caem nessa rede que só faz vítimas. De resto, o vero Deus de Israel ‘Yhawé’ = o que é =’El Shaddai’ = o que diz Basta!... Não pretende outra coisa senão regular, ‘pôr nos eixos’ os extremos do ‘mesótes’ aristotélico. Mas, para além ou para aquém deste criticismo negativo, há uma Crítica positiva, atribuída a três personalidades acerca da Notio Dei: Neste horizonte, podemos fixar a nossa atenção criticista em torno de três noções mais criticamente aproximadas, e que foram explanadas e desenvolvidas, uma vez encerrada a Traditio bíblica do A.T. e do N.T.. A) A Noção do chamado ‘Deus/Ponto Omega’ de todo o Universo criado em Evolução, que era o Deus em que acreditava o jesuíta arqueólogo Pierre Teilhard de Chardin. B) A Noção do ‘Deus sive Natura’ de Benedictus de Espinosa. A sabedoria dos dois, nesta problemática assaz delicada, consiste, muito simplesmente no seguinte: Além de manterem todo o sabor evolutivo (que é a Lex Temporis), essas noções são concebidas e construídas a partir dos Sujeitos Cognoscentes, e não a partir dos Objectos conhecidos. C) A terceira noção aqui arrolada (sendo a mais antiga, historicamente…) é, porventura, a mais precisa e incisiva: é de Aurélio Agostinho (que foi bispo de Hipona) e deixou-a exarada no seu Livro ‘mais livre’, com o título ‘Confissões’. A ideia de Agostinho era certeira e profunda: Deus é ‘o intimior intimo meo! Ele é-me, de facto, mais íntimo a mim do que eu me sou a mim próprio! Para o C.E.H.C., a Notio augustiniana pode, perfeitamente, identificar-se, na tradição cultural intelectualista do Ocidente, com a 3ª parte do Trinómio da Consciência (psíquica) Individual-Pessoal. Na Consciência efectiva e normal dos Humanos, há uma 1ª parte que se chama Sujeito Cognoscente; uma 2ª parte a que se dá o nome de Objecto conhecido. E, atestando a verdade do juízo (kantiano), a condição da Testemunha interior. Quando o Sujeito se engana, de livre vontade, neste 3º momento, nem Deus lhe perdoará!... Ora, é evidente que estas três noções do Trinómio da Consciência, são procedentes e configuram-se a partir do horizonte dos próprios Sujeitos e da sua Vis (cognitiva) que, espontaneamente, decorre do Fenómeno do Bios-Vida. O Papa Francisco ‒ convém assinalá-lo ‒ conhece, muito bem as ‘novas escravaturas das Idades Moderna e Contemporânea; e, dessa feita, ele próprio coloca a ‘Teologia da Libertação’, no corrente lugar comum do marxismo, enquanto, nos seus devidos termos, prática exímia da ‘misericórdia cristã’ (in ‘Expresso’, 29.4.2017, p. 21). Tout se tient! Esse marxismo, como tal, só ganhou em verdade. No atinente ao Processo de Globalização, há que dizê-lo sans ambages: Ele foi posto em marcha e está a fazer o seu curso por Vias Erradas: acumulação sem parar; obediência servil à Lei do Lucro sempre maior!... Tripudiando sobre o Fisco, nas bem conhecidas off-shores.
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Tudo sob o signo e a simbologia da Grandeza… como a Divindade omnipotente/omnisciente!... Não esquecer que as Vias Erradas da Globalização são exactamente da mesma índole das Vias Erradas das institucionalizadas Religiões monoteístas, com o objectivo de confirmarem a configuração da sua concepção da Divindade, chancelada pelos conhecidos predicados transcendentes e extrínsecos ao Cosmos. • ‘Eu//os Outros’ (a problemática da integração e da exclusão…). Em Etnologia e em Sociologia ou em Política, as Sociedades actuais enfermam dos mesmos vícios (decorrentes do Egoísmo foncier). ‒ Globallizazione Alternativa ci vuole!... Como se faz?! Em Regime Democrático, levado até às suas últimas consequências. A Globalização Alternativa é concebida e edificada a partir dos Sujeitos individuaispessoais, em todos os Humanos. Nesta área de temas e problemas, (os concernentes aos modos e procedimentos da Globalização sócio-económica), é preciso que se tenha em conta o caminho certo e justo, ‒ o mesmo caminho balizado criticamente pela Teologia e pela Ética/Moral. Entrevêem-se, agora, alguns dos problemas por que a Sociologia e a Politologia estão, agora, a baralhar e confundir as posições tradicionais da Esquerda e da Direita. ‘Os perdedores da globalização são o eleitorado natural de Le Pen, de Donald Trump, dos defensores do Brexit, bem como dos comunistas convertidos em seus ‘compagnons de route’ ’. (M. Sousa Tavares, in ‘Exp.’, 29. 4.2017, p.6, pp.20-21). ● A ‘Via Scientifica’ para a ‘Salvação/Libertação’ da Humanidade e a sua gramática incontornável para o Processo Histórico, honesta e sabiamente entendido e assumido (em chave não religiosa). ‒ VIA (Act.9,1-2). Saulo (o fariseu) (e o 1º perseguidor dos cristãos), uma vez ‘convertido’ e nomeado Paulo, e feito Apóstolo por opção sua, transformou o Jesuanismo no Cristianismo (uma religião de Salvação… exactamente ao contrário da escritura gnóstica, que dá pelo nome de ‘Evangelho Siríaco’ com o título críptico de ‘José e Assenat’). ‒ A crença na Ressurreição (= Libertação) tem de ser observada e assumida, em contraste com David (Act.2,34-36; 4,12). Ou seja, segundo a interpretação, que se encontra no evangelho gnóstico de Tomé. Ah!... Quantas Coisas nós precisávamos de esquecer e deixar sepultadas nas histórias dos Cristianismos e das Igrejas (dogmas estereotipados, que deixaram de cumprir as suas funções; Hegemonia absurda da Lei e do Autoritarismo da Letra sobre a respiração franca e espontânea do EVANGELHO; Cruzadas tantas…; Censuras múltiplas… Inquirições de horror e cegueira, quando só a Luz pode salvar/libertar!... O que o cristão ilustrado poderá dizer criticamente e, erigido em protótipo no julgamento da História e seus processos até ao presente, proclamar, só poderá ser o referenciado no Livro citado ‘Papa Francisco: a Revolução Imparável’, colectânea de textos seleccionada e organizada pelos dois Jornalistas lusos, António Marujo e Joaquim Franco (Ed. Manuscrito, Presença, 2017, p.139). De facto, o Cristianismo (de salvação messiânica: o Cristo-Jesus de Saulo/ /Paulo) só tem, no presente, de começar a experienciar a sua ‘kénosis’, a sua longa e dura metamorfose, rumo ao vero e autêntico JESUANISMO, tal como este tem sido configurado e plasmado no C.E.H.C.. O Papa Francisco, ao procurar, denodadamente, recuperar o Evangelho (genuíno), em contraste com a Lei, e ao demandar as Pessoas e o seu primado, em detrimento da Doutrina dogmática, pode muito bem ser interpretado como um novo ‘João Baptista’ (Precursor/Advento), perante o vero JESUANISMO, que está emergindo, e que irá transformar, de fond en comble, o que resta de positivo nos Cristianismos paulinos. Desde logo, a gramática do Jesua-
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nismo está emergindo nas proclamações/exigências de Misericórdia e Discernimento: no que se poderá chamar a Vertente dos Sujeitos-Individuais/Pessoais, que o Papa Francisco tem enfatizado (cf. op. cit., p. 132). O JESUANISMO ‒ esse sim ‒ poderá vir a cumprir a vera e autêntica Mensagem e Semântica, exigidas pela condição do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, por veros e autênticos Seres Humanos (autónomos), que sabem que sabem: porquanto é esse o seu estatuto. Com ele, cumprir-se-á a chamada ‘Via scientifica’: ‘ciência com Consciência’ (como exigia o filósofo francês Edgar Morin, no seu livro homónimo, edit. por Europa-América, Lisboa, 1982). Assim, ultrapassadas todas as Religiões Institucionalizadas, o Processo da unificação das Sociedades humanas, embasadas nas singularidades pessoais dos cidadãos, será cumprido sem obstáculos, porque ‒ como nos ensinavam os Gnósticos judeo-cristãos primevos, toda a dinâmica vital procede de Dentro para Fora, irradia da Interioridade para a Exterioridade, ‒ e não ao contrário!... Péricles (o Chefe do Governo Democrático de Atenas (séc. V a.E.c.) tinha um parergo cheio de sabedoria, que rezava assim: ‘Não há Felicidade sem Liberdade’, e ‘não há, igualmente, Liberdade sem Coragem’! No atinente ao 1º hemistíquio, não há correcções a fazer: a Felicidade faz parte básica e integrante da vida humana. No concernente ao 2º hemistíquio, há uma distinção a fazer: há a coragem louca e insensata; e a coragem sensata e saudável, que respeita a regra aristotélica do ‘mesótès’ (equilibrium) e que, mesmo assim, é capaz de gestos heróicos. Eis por que o C.E.H.C. atribui o grau mais excelente à Liberdade (individual/pessoal) responsável. Recordam-se: havia o chamado ‘Conselho dos Quinhentos’, que eram ouvidos sobre o cumprimento das leis e as elaboravam e ratificavam. Ca. de ¾ da população helénica não eram cidadãos da Democracia ateniense: a sua condição era a dos ‘metecos’ e ‘periecos’, entregues aos trabalhos servis!...
● Leis Naturais//Leis positivas diferenciadas culturalmente (nos respectivos quadros linguísticos-nacionais.). As duas noções contrapostas: ‘as obras da lei’ e ‘a justificação pela fé’ são bem conhecidas no âmbito das Cristandades. Desde logo, a contraposição (discutida no 1º Concílio dos Apóstolos, registada por Lucas, nos ‘Actos’) entre a noção de fé paulina (com a sua correspondente ‘justificação pela fé’ (‘sola fide’) (Rom.3, 28) e a doutrina de Tiago (‘The Brother of Jesus’), explanada na sua 1ª Carta, onde são urgidas as obras prescriptas na Lei para se poder adquirir a justificação pela fé. O axioma de Tiago é célebre: ‘fides sine operibus mortua est in semetipsa’. Frederico Lourenço, (na sua bem conseguida Tradução da ‘Bíblia Grega’: II Vol. do N.T., Quetzal, 2017, pp.160 + p.176) dá-se conta desta Quaestio, com muito senso e tino. O fundo da Questão decorre do necessário confronto crítico entre as posições de Paulo e de Lutero: ora, o que, na sua base, no contraste entre as formulações dos dois, está em causa, é essa fundação incontornável da Lei Natural (qua tal), a qual deveria (deverá…) ser a base constitutiva de todas as leis positivas; esta é a única forma de poder caucionar a sua legitimidade. De resto, é a esta mesma luz, que se pode compreender e legitimar a vera e autêntica ‘objecção de consciência’, agendada nos manuais de Moral. Quanto à própria Ideia de ‘Pecado Original’ (que, até nos 1os 3 caps. do Génesis não é tema líquido, em si mesmo), deverá saber-se que nunca passou pela cabeça de Jesus. (Cf. Fred. Lourenço, ibi, p.160). Mesmo no concernente aos textos da Carta de Paulo aos Romanos
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(5,12), ‒ muito embora uma tal ideia entre perfeitamente no painel doutrinário da soteriologia e do messianismo paulinos, sabe-se que essa ideia foi introduzida adventiciamente no texto paulino, em finais do séc. IV, no Ocidente latino. A comprovação foi encontrada, por F.L., do seguinte modo oblíquo: Cf. ibi: p.160 → p.181 (5,12): o texto grego de Paulo tem exarado o verbo hêmarton = erraram; o texto latino já ostenta, na tradução, outro vocábulo: peccaverunt = pecaram. Se formos a um Dicionário de Grego/Português, é fácil dar-se conta de que entre os 5 sinónimos, 4 têm parentesco com erro e só um com pecado. Outro dado fundamental, que F.L. aí descobre, é que não há, mesmo, ‘povo eleito’, o que há são ‘pagãos’… pois o mesmo Senhor, de quem se fala, é de todos! (Ibi, p.161). Desta sorte, a Igualdade fundamental de todos os Humanos perante Deus, é um Factum irrecusável. O contraste entre o Direito Natural e os direitos positivos das Nações é suficientemente óbvio, para F.L., quer no sentido da Afirmação da Igualdade fundamental de todos os Humanos, quer no sentido da afirmação da sua condição de Sapientes//Sapientes (como, de resto, se pode, ainda, comprovar, em Rom.1,20, pelas capacidades naturais do Uso da Razão Natural, para os Humanos, mesmo ‘pagãos’, acederem ao conhecimento e respeito de Deus. O aspecto da positividade do direito divino surge no Plano final da Globalidade das Nações (Rom.11,32): ‘Deus fecha a Aliança, usando com todos de misericórdia’. → Paternalismo panenvolvente. Conclusão: Venceu, definitivamente, a Misericórdia, em lugar do Juiz severo da Antiga Aliança. • Organização económica//Organização política. São duas organizações diferentes: o tipo da 1ª refere-se aos meios de trabalho e, em geral, ao quadro da subsistência, encarado do ponto de vista dos indivíduos. O tipo da 2ª refere-se à congregação arregimentada dos cidadãos e aos seus meios de vida e recursos alimentares. Eis por que, não sabendo ou não podendo cumprir o Socialismo de corpo inteiro: a Democracia Socialista edificada a partir dos Sujeitos (Cidadãos) Livres e Responsáveis, ‒ a Solução, que já anda nos ‘Sinais dos Tempos’ impõe-se absolutamente: acima dos 18 anos, cada cidadão(ã) deve usufruir de um salário mínimo de subsistência (como já foi proposto pelo socialista francês Benoît Hamon (nas últimas eleições presidenciais)). As Sociedades ocidentais acham-se em graves e profundas transformações, do ponto de vista político. Na década de ’90 do séc. XX, havia a funcionar em França ca. de duas dezenas de partidos políticos. Em 2017, contavam-se 451!... Que se passou? Mudança de condições sociais e mudança de sensibilidade! Comentário algo pertinente do paradigmático ‘Caso Macron’ (que rodeado de uma troupe de amigos atrás de uma Bandeira Fr.: ‘La Marche’!...) consegue uma vitória eleitoral de ca. de 60%, com ca. de metade abstencionista da população. E a Comissária Europeia da Concorrência, Margrethe Vestager tomava o pulso à situação com esta perspectiva crítica: as pessoas/cidadãos começam a envolver-se, nas áreas públicas e decisórias, mais activamente do que acontecia antes, chegando mesmo a distanciar-se dos quadros partidários convencionais… Como se os partidos, que ainda subsistem, estivessem a mais!... (Cf. ‘Expresso’, 13.5.2017, 1º Cad., p.18). Numa palavra, os políticos de carreira são normalmente preteridos, na medida em que se acham ligados aos partidos tradicionais. Por outro lado, vão emergindo militantes de base dos partidos convencionais e, mesmo, de novas formações partidárias, descontentes com o passado. Em que consiste esta mudança de eixo em curso?! O descontentamento e o fracasso ocorrem, precisamente, sobre os tradicionais partidos maiores e mais celebrados. Tais como os que seguem o modelo ‘Democrático/Republicano/Liberal’. O S.P.D., na Alemanha, também não irá escapar à rasoira… (Cf., ibi, pp.26-27). Além do que já se disse sobre o líder francês socialista Benoît Hamon, deverá ser assinalada a novidade, que ele trouxe a público: o ‘imposto
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sobre a robotização’!... Esta não é uma questão de somenos importância, dado que as tecno-ciências de aparelho, à escala das multinacionais, estão num crescendo imparável. Além disso, deverá falar-se do ‘esprit de notre temps’, bem como a ‘Sociedade da Distracção’, ‒ dois factores que, seguramente, trouxeram, com facilidade a vitória a Macron (cf. M. Monjardino, ibi, p. 29). No que toca ao Irão e ao Shiismo, resultante da revolução do Ayatollah Komeiny de 1979, que se há-de esperar? Que ele se adapte à divisão tripartida dos Poderes à Montesquieu, como se passa no mundo ocidental?!... É complexo o organigrama do ordenamento político-jurídico e religioso do Xiismo. São difíceis de estabelecer os pilares consensuais na República Islâmica do Irão. O que vemos e sabemos é que não há, na Estrutura Organizativa da Sociedade político-religiosa do Irão, a ordinária divisão dos três Poderes segundo a cartilha ocidental do Barão de Montesquieu (cf. ‘Exp.’, 13.5.2017, p.18). Não é nada de estranhar, uma vez que nem uma só vez no Corão, ou nos Haddiths ocorre a díade política que se encontra em Mt.22,21, ou a tríade do v.100 do Ev. de Tomé. O que nos textos sagrados do Islão abunda, infrene, é o Dualismo metafísico-ontológico de Platão e uma Ética incontornavelmente dualista. As O.N.G.s têm pouca actuação nos Governos islâmicos. Governo e ajudas não-governamentais: A ajuda governamental não pode ser substituída pela filantropia. Quando um Governo deixa uma área tão importante como esta, não há uma alternativa veramente real. (Bill Gates, o bilionário e filantropo, representa, americanamente, o que o Estado deveria fazer e não faz!...). O seu comportamento, o que comprova, é que a cartilha do neoliberalismo capitalista global é falaciosa e não cumpre o preceito elementar da Integração/Não-exclusão. Pobreza e Miséria é a Regra do Sistema!... No C.E.H.C., aprendemos e ensinámos que os Problemas da Inclusão da Pobreza e da Miséria não se resolvem a não ser dentro da Economia Política a dois planos (o das Pessoas/Cidadãos e o dos Objectos/Mercadorias. Por isto mesmo, houve, sem dúvida, alguma evolução nas pautas da Sensibilidade vis-à-vis de ‘Os Miseráveis’ de Victor Hugo, no séc. XIX cristão… Escreve C. Ferreira Alves in ‘Exp.’/Rev., 30.4.2017, p.3: “Os vilões de Hugo são destituídos de cinismo ou de maquiavelismo. São grossas caricaturas do que chamamos largamente o mal, vilões que nem conhecem a malícia, formulação menos nefasta. Os bons miseráveis são maltratados pelos maus no mundo maniqueísta do séc. XIX, que era real e que o avanço civilizacional e as grandes marchas revolucionárias quiseram extinguir. No tecnológico séc. XXI, se tudo corresse bem no mundo ocidental avançado, nas sociedades laboratoriais do altruísmo, os miseráveis deixariam de existir. Ou existiriam para efeitos de entretenimento das massas, em musicais como o de Andrew Lloyd Webber”. ‒ Mas tudo isso é desregulado pela simples existência das ‘Multinacionais’ = Estados dentro dos Estados!... ‒ Acerca dos Génios… Leonardo Da Vinci, Albert Einstein!... Etc…. Que fique claro, claríssimo: não vamos aqui proceder à defesa da cartilha da mediocridade, nem do catecismo tradicional do ‘in médio virtus’! Muito menos aspiramos por um tipo de Humanos ‘geométrica e sociologicamente’ uniformes. É sabido que o nosso Grande Propósito é promover os Indivíduos Humanos ao Estatuto de Sapiens//Sapiens, ‒ superando, de vez, a sua triste tradicional condição de ‘Homo Sapiens tout court’, onde a Liberdade/’livre arbítrio’ e a Autoridade/Poder estão separadas por muralhas da China. Se quisermos aquilatar do padrão dos Génios, pensaremos logo em quatro predicados essenciais: ‒ inteligência; ‒ criatividade; ‒ perseverança; ‒ e boa sorte (buona fortuna). (Cf. ‘National Geographic’, Maio de 2017, pp.42 e ss.). Faz-nos cócegas a banalidade do título deste nº da conhecida Revista!... ‘GENIUS: Why some people are so much smarter than the rest of us?!’...
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QI: à volta de 140 (média) e acima de, ‒ dizem os psicólogos experimentais; a inteligência pode ser desenvolvida e maturada, com o tempo, o estudo e a experiência; a criatividade pode ser fomentada e desenvolvida por indivíduos comuns, desde que lhe sejam facultadas oportunidades especiais; a perseverança nas funções/operações pode ser reforçada mediante a formação e a educação. Toda esta problemática gira em torno do que os alemães designam por Reinische Vernunft (= a Razão Pura, própria da definição dos Objectos e operando segundo a cartilha do Objectivo-Objectualismo). Muito poucos (à excepção da 1ª G. Excepção: Immanuel Kant, de quem já falámos) se dão conta da existência da Praktische Vernunft e da sua estrita e primeiríssima necessidade vital. É caso para retorquir: Se no conjunto dos Humanos houvesse um terço que fosse de experts nesta área, em breve a Humanidade daria o salto necessário do ‘Homo Sapiens tout court’ para o ‘Homo Sapiens//Sapiens’ e sua nobre e promissora condição. Sempre essa sempiterna religião sacra/laica do OBJECTIVO-OBJECTUA-LISMO, a inibir-nos e a massacrar-nos, a juncar-nos o caminho de obstáculos e entra-ves!...Uma triste lamentação de um sábio, que não chegou a penetrar na nossa proble-mática: Trata-se do historiador Darrin McMahon, que reflecte e pensa como segue: ‘If you believe that genius is that thing that can be cultivated and nurtured, what an incredible tragedy that thousands of potential geniuses have withered and died’ (cf. ibi, p.14). ‒ Se os génios da ‘Razão Pura’ têm, de facto, a sua importância real, os génios da ‘Razão Prática’ não são menos importantes, decisivos e fecundos. A Humanidade, sua civilização e culturas, continua a ser um Grande Enigma por decifrar!... Mais que a Esfinge de Tebas!... É curioso que os caminhos… quando bem pensados e bem escolhidos, ‒ também eles fazem luz e iluminam. É que não há vero acabamento performativo dos próprios génios (correntes) sem o pleno cumprimento de dois pressupostos essenciais: a) a escolha precisa da área disciplinar em que se pretende trabalhar; b) o seu aperfeiçoamento ou ‘maestrança’ nela o mais cedo possível (cf. ibi, p.45). Em boa parte, o problema e o mistério dos génios continuam a surpreender-nos como as estrelas do céu e o adequado funcionamento de todo o universo. Sem dúvida, que os genes e o meio ambiente lamarckiano são parte importante e decisiva. Mas sem a ‘força de Vontade’!... (Cf. ibi, p.55). Negativamente, porém, perante a emergência multitudinária dos génios…, o que acaba por inibir e entravar o seu surto e formação, é a Society, em que sobrevivemos, padronizada e uniformizada em termos rígidos (à maneira de ‘clichés’ mecânicos), balizada, em suma, por normas universais estereotipadas. Entretanto, como nos dói, da parte das atmosferas sensíveis das Cristandades… Casos como o da Carta de Paulo ao escravo Filémon: (resignações: cf. F.L.: Bíblia II vol. do N.T., p.432); ou o caso da obediência e menoridade das mulheres: (ibi, p.156). A Babilónia capitalista e plutocrata exurberantemente expressa no Apocalipse de João: (II vol. N.T., p..554 e p.596). A cumplicidade descarada com a submissão dos escravos bem como da mulher ao homem, na 1ª Carta de Pedro (cap. 3). Felizmente, a Carta de Tiago, que procura fazer a ponte entre o judaísmo e o 1º cristianismo. (Cf. F.L., ibi, p.326; p.396; p.473). Robert Reich (Sec. do Trabalho de Bill Clinton, activista anti-Trump e autor célebre do livro ‘Saving Capitalism’) tem um artigo no 2º Cad. do ‘Exp.’ de 13.5. 2017, p.44, com este título curioso: ‘Desde o Vietname que não via tanto activismo’, sem populismos… Vamos destacar os pontos mais importantes do artigo: ‒ “Os mercados precisam de ser regulados e controlados. A questão é: quem faz as regras?” (p.44). ‒ “Quanto maior é a desigualdade, maior poder têm as elites para influenciar as regras. É um círculo vicioso no qual o poder econômico cria as regras que o favorecem” (ibidem).
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‒ “A maioria das pessoas pensa que o sistema está contra elas e votará por homens fortes ou numa nova era de autoritarismo” (ibidem). ‒ “O rendimento básico universal não é politicamente possível agora, mas à medida que a tecnologia eliminar mais empregos, terá de ser” (ibidem). ‒ Sobre os casos da Polónia, da Hungria, da Rússia, da Turquia, escreveu o economista (ibidem): “É aqui que a política e a economia se juntam. Porque o mercado livre não existe, depende de regras. Os mercados precisam de ser regulados e controlados, através de legislação sobre propriedade intelectual, falências, regras antimonopolistas. A questão é: quem faz as regras?” ‒ “Ando na política há 50 anos, e depois de ter passado por quatro administrações, cheguei à conclusão dolorosa que isto não tem nada a ver com a economia ou com as políticas. Tem tudo a ver com os políticos” (ibidem). No mesmo nº do ‘Exp.’/1º Cad., p.29, a propósito do horizonte de restauração do Labour, no Velho Continente, escreve M. Monjardino: “As consequências da evolução tecnológica e da globalização, o regresso da competição estratégica, a pressão migratória nas fronteiras da Europa, entre outros factores, vão continuar a questionar a cultura e a identidade de importantes sectores sociais no Velho Continente. “Esta situação é estrutural e sugere que os próximos anos serão turbulentos. Sob este ponto de vista, Macron não representa um momento de travagem, mas sim o intervalo que poderá preceder nova aceleração ao nível tecnológico, económico, social. O que falta então? Uma ideologia política que demonstre a falta de capacidade das democracias liberais, para resolver os problemas económicos e sociais e proponha uma nova ordem internacional multipolar. Esta ideologia não existe ‒ ainda”. ‒ Para onde nos empurra o espírito do nosso tempo?!... Dos princípios basilares: Não há justiça cognitiva (entre saberes); não há justiça social global sem justiça cognitiva global. Esta dinâmica é procedente, geminadamente, do socratismo e do jesuanismo. Em vez do Uniformismo dogmático e do Monismo Epistémico, a opção de hoje é a Diversidade: É preciso promover os conhecimentos e os reconhecimentos e sua fusão, “para, a partir de uma maior justiça cognitiva (justiça entre saberes) permitir que se reconheça a existência e o valor de outros modos de conceber o mundo e a natureza e de organizar a vida, que não se pautam pela lógica capitalista, colonialista e patriarcal, que tem sustentado o pensamento eurocêntrico dominante. Não há justiça social global sem justiça cognitiva global. Só assim será possível criar a interrupção que permita imaginar e realizar novas possibilidades de vida colectiva, identificar alternativas reprimidas, descredibilizadas, inviabilizadas, que, em seu conjunto, representam um fatal desperdício de experiência. “Daí o terceiro des-pensamento: não precisamos de alternativas, precisamos de um pensamento alternativo de alternativas. Esse pensamento, ele próprio internamente plural, visa reconhecer e valorizar experiências, que apontam para formas de vida e de convivência que, apesar de pouco familiares ou apenas embrionárias, configuram soluções para problemas que cada vez mais afligem a nossa vida colectiva, como, por exemplo, os problemas ambientais. Tais experiências constituem emergências e só um pensamento alternativo será capaz de, a partir delas, construir uma sociologia das emergências”. (B.S.S., in ‘JL’, 19.7-1.8.2017, p.27). É preciso e urgente resolver, definitivamente, a aporia contraditória: ‘Nós’//‘Os Outros’! Abaixo, pois, todos os Resultados, procedentes dessa Mundividência ocidental, baseada no Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo e na consequente Ética dualista (dos dois pesos e duas medidas!...).
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PELÁGIO E AGOSTINHO (Dois Grandes Cérebros na Cultura do Ocidente cristão) São contemporâneos: sécs. IV/V. Pelágio era monge cristão das Ilhas Britânicas; e mais tarde veio ensinar para a capital da Cristandade, onde foi bem sucedido. Agostinho (Aurélio) foi o 1º Grande Filósofo cristão, na escrita da filósofa alemã, Hannah Arendt. Mais tarde foi bispo de Hipona (na Tunísia). O Pelagianismo constituiu uma concepção/mundividência da Humanidade, considerada desde cedo como doutrina herética segundo os concílios e os cânones da Cristandade católica (Conc. Cartaginense: Denz. nº101…). (Cf. ‘Os inimigos íntimos da Democracia’, de Tzvetan Todorov, Ed. 70, 2017 (o A., uma vez licenciado em Sófia, teve uma bolsa de estudos e rumou a Paris: vd. ibi, p.156: o Confronto…, pp.41 e ss.). Confrontado, sumariamente, com o Agostinianismo e a sua esquisita Doutrina sobre a Graça, em especial, ele quase nos ressoa como uma espécie de ‘Neopaganismo’ do 1º heterónimo de F. Pessoa (Alberto Caeiro, o Guardador de Rebanhos). Pelágio ressumbra de uma Energia criadora, oriunda de uma nata Vontade Livre; em contrapartida, é avesso ao mandato alheio, mostra-se contra a submissão à Graça divina e à Providência, enquanto meios ou vias de correcção da chamada Natureza caída!... (Como pretendia o bispo de Hipona). Autores houve, sobremaneira na 1ª parte do 1º milénio cristão, que diziam que o Cristianismo monacal era outro Cristianismo. Entre Pelágio e Agostinho, o confronto tira a prova real entre os dois. A índole de Pelágio estava marcado pela Psicologia prática, viva e equilibrada. A vida de Agostinho foi estigmatizada, na juventude, pela luxúria e convívio com mulheres. Pelágio era naturalmente afectado pela sua dimensão monacal; Agostinho, como bispo e hierarca eclesiástico, estava metido na rede da Potestas Ecclesiae. Pelágio, mais crítico, era propenso a pensar que as religiões foram elaboradas e criadas por humanos. Agostinho, devido às funções que exercia, era menos propenso a isso. Dir-se-ia que era um specimen da Cultura do Poder-Dominação d’abord. Pelágio, ao contrário, poderia ser o 1º paradigma da Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial, segundo o C.E.H.C.. Os sentidos e o aroma da História variam, como é óbvio. Se nos tempos de Aurélio Agostinho, os tempos eram outros (Pelágio foi condenado em concílios; Agostinho, não…); é no Iluminismo auroral do séc. XVI, que desponta e faz o seu enquadramento esta Ideia voluntariosa e racional de uma Liberdade humanamente Responsável: foi, então, que essa Ideia começou a emergir de corpo inteiro. (Cf. Idem, op. cit., pp.41. e ss.). Tudo tem o seu preço; entretanto, começaram a ser banidas as superstições religiosas, a começar pela superstição do ‘pecado original’ (cf. idem, ibi, p.43), de que era um aficionado adepto o bispo de Hipona. Outro facto psico-sócio-histórico, que emerge: a constatação de que os messianismos políticos ou religiosos conduzem, quase inevitavelmente, às práticas da tortura e do terror (cf. ibi, p.44…). Sintomático é o modo como o historiador Condorcet pretende chegar à ‘paz perpétua’ (cf. ibi, p.46): ‘o anjo exterminador da liberdade fará cair esses satélites do despotismo’ (Danton). Dir-se-ia, aqui, que Condorcet era um adepto do determinismo físico e desconhecia por completo a doutrina da Dualidade Epistémica, que só emergiu na 2ª metade do séc. XX, pelas mãos e obras do C.E.H.C..
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Na 1º vaga, serão repelidas as populações estrangeiras, através de guerras revolucionárias e coloniais (p.45…). Na 2ª vaga, começarão a tomar corpo os projectos comunistas (pp.49…). Nisto se resumia o ‘credo’/’crença’ laicizado de Condorcet (p.48). Do ponto de vista científico, já se vê no que se pensava: Tudo no Mundo e no Universo era balizado e conduzido sob a bandeira do Monismo Epistémico (fulcrado nas ciências físico-naturais). (Cf. ibi, pp.50-51). Tudo e todos sob o estandarte do Monismo epistemológico: capitalistas e marxistas; revolucionários burgueses e proletários revolucionários rumo ao comunismo futuro (p.51). Na 3ª vaga, a democracia é, finalmente, imposta pelas ‘braças’ ou bracamartes (pp.57 e ss.). Hoje, é a hegemonia guerreira dos USA, que se impõe e empunha a bandeira do messianismo político, na fórmula construída e mais ou menos aceite: democracia, desenvolvimento, mercado e comércio livres (ibi, pp.60…). É sabido, entretanto, que é sempre perigoso e ameaçador impor o bem de armas na mão!... (cf. ibi, p.61). É claro que estão contra a tradição cristã e o humanismo laico todos os projectos que pretendem fazer triunfar pela força ‘a liberdade sobre os seus inimigos’ (ibi, pp.61-62). De resto, só as heresias milenaristas e as utopias revolucionários alimentaram essa esperança insana!... Ora, produzir um Mundo diferente requer, absolutamente, a mudança de Espécie; a vera e profunda mudança dos Humanos (cf. ibi, p.62). Para vencer adequadamente a distinção/oposição entre o ‘Nós’ e o ‘Eles’ (sem eliminar o Allótrios!...). É preciso vencer os dois caminhos errados e, aparentemente, opostos: a) submeter pela guerra a violência; b) pedir que os inimigos ou os outros assumam uma liberdade uniformista. (Cf. ibi, p.85). Mesmo assim, nada feito, se não se puser em prática o Diálogo socrático e a Justiça jesuânica. Um último apontamento sobre as três fases do Sistema Capitalista: Liberalismo, Neoliberalismo e Ultraliberalismo. O neoliberalismo e a ultraliberalismo desembocam no integrismo economicista, bem representado na fórmula de F. Hayek: ‘Os únicos bens que mantêm toda uma grande sociedade são puramente económicos’. (Cf. ibi, pp.106 e ss.). Claro, dentro da Cultura da Potestas/Dominação d’abord. Outra frase para meditar é a de Montesquieu: ‘Nenhum poder sem limites pode ser legítimo ou legitimável’ (ibi, p.113). A maior caterva de preconceitos contra o ideário da DEMOCRACIA reside nos factos de esta muito raramente ser tomada a sério. Vd. o livro de Jason Brennam: ‘Contra a Democracia’ (Gradiva, 2017). O Autor, em nome da honestidade de processos, chega aí a concluir que ‘as melhores formas de exercer a virtude cívica ocorrem fora da política’, e que ‘a maioria dos cidadãos têm a obrigação moral de se abster de votar’. Com efeito, a Democracia só é incontornavelmente resistente às críticas, se ela se basear nas duas funções essenciais para que é vocacionada segundo a gramática de Sócrates: A) Diálogo com o objectivo da descoberta do conceito (em comum), claro e distinto; B) Diálogo com o objectivo de, a partir do painel ou leque seleccionado de conceitos, escolher, em comum, o que for melhor para a vida da colectividade democrática. É assim, que funcionam, hoje, as Nações, e pior, as Multinacionais?!... • Scenario em torno das actuações das Figuras: O Cristianismo foi feito Religião oficial do Império, contra o Mitraísmo, por decisão do imperador Constantino no Edicto de Milão/212, em resultado da Victória obtida. Tudo se passa há ca. de 1600 anos. A religião cristã ficou colada ao Poder do Império. É o imperador Constantino que preside ao Conc. Ecum. de Niceia/325 e, ao morrer em 338, pede o baptismo para que todos os pecados lhe sejam perdoados. O bispo Atanásio de Alexandria, no dito Concílio, não passou de lugar-tenente do impera-
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dor (que não fora ainda baptizado). Teodósio, o sucessor de Constantino no Império, fez do Cristianismo a religião oficial e proibiu todos os ritos pagãos. O monge das Ilhas Britânicas, Pelágio, terá nascido por volta de 350 e chegado a Roma, para pregar e dar as suas lições ca. de 380. Em vez da obediência e da humildade, Pelágio era adepto da autonomia e da autenticidade Pessoal; em vez de Paulo que argumentava (Rom.5,19): “que a desobediência de um só homem constituiu muitos pecados”. Agostinho, Ambrósio e Jerónimo eram os três homens das Escrituras sacras mais ilustres do seu tempo. O pomo da discórdia entre Pelágio e o bispo Aurélio Agostinho de Hipona (395) começa com uma intervenção sobre o Cristianismo, que logo foi condenada no Concílio de 411. “Em 415, um sínodo inocenta-o de todas as acusações de heresia. Agostinho é informado disso e decide participar na discussão. Nesse mesmo ano, escreve um tratado contra Pelágio, intitulado A Natureza e a Graça; muitos outros textos sobre o tema aparecerão durante os anos seguintes. A controvérsia pelagiana irá ocupá-lo até à sua morte em 430. Este é, sem dúvida, um dos conflitos mais profundos de toda a história do Cristianismo, e as suas repercussões continuam vivas entre nós. De que se trata?” (T.T., op. cit., 23).
● Sumário dos Passos Dados N.B.: O Centro da Controvérsia: P. na defesa da Boa Natureza Humana; A. na defesa da Graça, como adjutorium à má Natureza humana. A. posiciona-se do lado da Cultura do Poder-Dominação d’abord. (Nitidamente). P. posiciona-se do lado do que, hoje, o C.E.H.C. designa por Cultura da Liberdade Responsável primacial e primordial.
1. Não há Natureza má, para o monge Pelágio… Pois se Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança!... (Gen.1,27). E aí é boa a vontade humana e a vontade divina. “Temos também a confirmação empírica disso: quando realizamos actos vis, temos a consciência de ter feito mal, coramos, sentimos arrependimento ou vergonha. Esta consciência é específica a todos os seres humanos e é do lado do bem; é uma espécie de tribunal moral que temos em nós, e não depende das doutrinas em que acreditamos: os pagãos possuem-na tanto quanto os cristãos” (idem, op. cit., p. 23). 2. Se, para Pelágio, não há pecado original dependente da vontade, visto que a Natureza humana, criada por Deus, é boa, para Agostinho, o pecado original depende das próprias más inclinações da Natureza humana (cf. ibi, p.24, p.25, p.26, p. 28). Poder-se-ia, até, dizer e argumentar que Agostinho é o grande arauto na defesa do pecado original (mais ainda que o próprio Paulo… é ele que acaba por esclarecer um certo hibridismo que emerge nos 1os três caps. do Génesis). 3. “Deus criou o homem e deixou-o no poder da sua própria decisão” (Eclesiastes, 15,14); e, no original hebraico, até se fala, aí, ‘da sua própria inclinação’. Escreve T.T. (op. cit., p.24): “E, como a vontade divina não conhece limites, a vontade humana pode ultrapassar todos os obstáculos. É porque dispomos de uma vontade que podemos dirigir os nossos actos e distinguimos o bem do mal”. “Não podemos fazer nem o bem nem o mal sem o exercício da nossa vontade, e tivémos sempre a liberdade de fazer um dos dois” [A Demétria, 8.1]. Um ser inteiramente determinado pela sua natureza não pode ser objecto de um juízo moral. A dignidade do homem decorre-lhe da capacidade de escolher, e é por esta faculdade deliberativa que se distingue dos animais”. ‒ A um amigo mais velho, Pelágio responde claramente: “A fonte do pecado do homem não está na sua natureza, mas na sua vontade” (ibidem).
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4. Entretanto, no concílio regional de 418, Pelágio foi condenado como herético (cf. op. cit., pp.31-32). Era claramente de prever o resultado do famoso Debate entre Pelágio (que estava com o Jesuanismo!...) e Agostinho (que estava com o Cristianismo de Paulo). “Nos debates públicos organizados na época, a argumentação de Agostinho triunfa sobre a de Pelágio. [A hegemonia era a do ‘Homo Sapiens tout court’]. Em 418, as ideias de Pelágio são declaradas heréticas, os seus discípulos são condenados, excomungados e expulsos; até os traços de Pelágio se perderam, morrendo certamente pouco depois. A controvérsia reacende-se alguns anos mais tarde, quando um discípulo de Pelágio, Juliano de Eclano, ataca Agostinho, que se defende com eficácia. Em 431, após a morte do bispo de Hipona, um novo concílio condena firmemente, e assim se esperava, em definitivo, o pelagianismo: a heteronomia ou submissão à lei vinda de fora, triunfa sobre a autonomia, a lei que damos a nós próprios” (idem, ibi, p.31-32). • A Quaestio central era dupla: A) A eterna confusão entre ‘inclinações naturais’ e ‘inclinações adquiridas’ mediante os hábitos praticados!... Antes dessa confusão, é preciso cada um dar-se conta de que a pertença cultural e a vida em sociedade fazem, igualmente, parte integrante da ‘natureza humana’. B) Não é Deus que nos ajuda com a sua graça, através, pelo menos, do ‘livre arbítrio’?! (Idem, ibi, pp.24-32). O pecado original de Agostinho e Paulo (e Lutero) constitui a rasoira de todas as humanas humilhações, a demissão radical da Autonomia dos Humanos e a completa submissão à heteronomia da Lei. Toda esta Questionação só será, definitivamente, resolvida, quando a Espécie Humana transitar adequadamente do paradigma do ‘Homo Sapiens tout court’ para o novo paradigma do ‘Homo Sapiens//Sapiens’; e, ao mesmo tempo, tomar consciência crítica de que todas as Religiões institucionalizadas são obra dos Humanos, e não de qualquer Deus, supostamente verdadeiro. Escreve o nosso Autor, como segue (ibi, p.32): “No entanto, podemos perguntar se a lagarta não ficou dentro da fruta. Regressando ao ponto de partida da reflexão pelagiana, Deus criou o homem à sua imagem. Ora, o Deus do monoteísmo tem uma particularidade que o distingue radicalmente dos deuses das religiões pagãs: não encontra um universo já existente no qual introduziu ordem, mas é o próprio criador do universo; este é o resultado de um acto livre da sua vontade. O homem de Pelágio é mais parecido com Deus do que o de Agostinho. De resto, Deus ordena ao homem que se comporte como senhor e possuidor da natureza, que submeta o resto do universo à sua vontade: ‘Sejam férteis e cresçam; encham a terra e dominem-na; dominem sobre todos os peixes do mar e as aves do céu e sobre todos os animais que andam sobre a terra.’ (Gén.1,28: uma recomendação muito pouco ecológica…). E Deus age sozinho, sem interacção com semelhantes (pois não existem…); portanto, o homem também está destinado a fazer isso, sem se preocupar com o seu meio humano ou com a sociedade que o forma. Ora, o que os pelagianos querem dizer, em suma, é o seguinte (idem, ibi, p. 33): “Não só o homem cria Deus à sua imagem, como também quer formar o homem à imagem de um criador livre. A autonomia atribuída a Deus é uma primeira forma de autonomia que o homem reivindica para si próprio. A expressão do Génesis faz-nos compreender, num espírito muito pelagiano, que o homem se cria a si mesmo e que a sua vontade não tem limites. É por isso que, apesar da vitória dos agostinianos, o debate destes com os pelagianos nunca poderá acabar: a religião exige que os homens se submetam a Deus (e aos seus servos na terra, ou seja, à Igreja) e que se esforcem por se assemelhar a Deus, ou seja, que se comportem como sujeitos livres e voluntários, que modelam o seu próprio destino”.
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No ninho de todas as religiões institucionalizadas, o mais essencial e fundamental é a dinâmica vectorial correcta entre os Sujeitos (humanos) e os Objectos (humanos). Calvino está do lado de Pelágio (ibi, pp.33). Montaigne, Montesquieu, J.J. Rousseau, e, acima de todos, o filósofo alemão Johann Salomo Sembler, ‒ estão todos com o mesmo espírito dos genuínos Pelagianos (ibi, pp.34-38). E o C.E.H.C., igualmente, como é sua determinação a conclusão práxica do próprio JESUANISMO.
PÓS-FÁCIO PARA MEDITAR!... A)
A INDÚSTRIA NASCEU NOS MOSTEIROS! (NA CULTURA DO OCIDENTE) Pelo Prof. Pierre Musso (Univ. de Rennes-II) (extracto de ‘Le M.D.’, Juillet, 2017, p.3) Resumo: Fazer da Empresa o coração das sociedades: este projecto (esclarecido por M. Émmanuel Macron) é ordinariamente identificado ao neoliberalismo contemporâneo. Ele marca, na realidade, o acabamento de uma longa história. A da racionalização do trabalho e do tempo, que começa nos mosteiros do séc. XIII. Bem como a da edificação de uma crença comum na salvação mediante o progresso industrial. ● Num discurso de campanha, em Abril último, M. Emmanuel Macron afirmava que ‘a verdadeira alternância é a da eficacidade’, referência a que se cose desesperadamente o mundo político. Este último sofre de uma dupla crise: a sua tecnocratização, e a delapidação das suas fundações simbólicas, ligadas à soberania popular. Desde logo, ele procura bengalas no campo empresarial, daí a homenagem permanente às start-ups, as declarações de amor à empresa ou as genuflexões diante da Silicon Valley. Mas para que serve a eficacidade, e poder-se-á fundar uma sociedade sobre essa exigência? • Para todas as respostas, o olhar antropológico que o Ocidente carreia sobre si mesmo, reenvia-nos para a industrialização ocorrida depois de 1800. Todavia, para operar uma tal revolução industrial, foi preciso previamente construir uma visão do mundo partilhada, excluindo qualquer referente transcendente, para celebrar a humanidade criadora e produtora. Este processo, que nós designamos por ‘industriação’ precede a industrialização. Ele toma lugar no interior da matriz cristã e estabelece as bases de uma religião secular. • A geneologia da religião industrial desdobra-se, no Ocidente, no termo de três bifurcações (A,B,C). A primeira é a da reforma gregoriana, que arrasta consigo, nos sécs. XII-XIII, uma ‘primeira revolução industrial’, ligada à mudança de procedimento da imprensa da pasta de papel, com os moinhos situados ao longo das ribeiras, prefigurando as oficinas. A segunda bifurcação intervém com o nascimento da ciência moderna e o programa de René Descartes,
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que visava ‘tornar-nos como senhores e possuidores da natureza’, em nome do progresso. A terceira bifurcação, maior, é a da escolha industrialista de 1800 e a formação simultânea de um ‘novo cristianismo’ terrestre e científico. A cada uma destas bifurcações, a industriação metamorfoseia-se, e a instituição de produção que a incarna reorganiza-se: mosteiro, manufactura, oficina e empresa. Cada uma destas instituições articula uma fé que dá sentido e uma lei que organiza uma comunidade de trabalho. • Tudo começa nos mosteiros, lugares de contemplação, de leitura, mas também de trabalho. A comunidade comunga na oração (ora) e organiza o trabalho manual (labora) segundo a Regra de S. Bento, com uma estrita liturgia de horas. O relógio de pêndulo, instalado progressivamente a partir do séc. XIII no cimo das igrejas, permite ser mais ‘eficaz’ e libertar o tempo para a oração. O mosteiro é a instituição que dá o nó no mistério da Incarnação (1) com a racionalização através do cálculo e a medida do tempo. Assim, o relógio acompanha toda a história da indústria ocidental, porquanto ele estabelece o ritmo e a cadência do trabalho, do atelier e da cidade. Hoje, ele é substituído pelo computador, supercalculador e super-Relógio. ‘A mais velha multinacional do mundo’ (Se assim podemos falar!...) • O monaquismo reconhece o ‘valor trabalho’ como complemento da oração e da contemplação. O trabalho representa, a um só tempo, um instrumento de ascese, um meio de combater a ociosidade, uma actividade produtiva e uma resposta à obrigação da caridade. Ainda hoje, a organização regulamentada da vida colectiva segundo a Regra de S. Bento constitui modelo de gestão, ao ponto de que certos meios de negócios consideram os mosteiros beneditinos como pioneiros da governança eficaz. Assim, Dom Hugues Minguet, monge beneditino, co-fundador do instituto Sens et croissance em 2001, declara: ‘O monaquismo beneditino é, sem dúvida, a mais velha multinacional do mundo. O que prova que a nossa técnica de mongerização ‒ a Regra de S. Bento ‒ deve ser performante’. • No fim do séc. XI, a aceleração da circulação monetária e a multiplicação das trocas transforma a organizaçõao monástica. Emergem dois modelos em confronto: Cluny e Citeaux. O primeiro prospera, desenvolve as suas operações comerciais; os seus monges vivem na opulência. Mas, logo a seguir, a ordem desagrega-se: a complacência com o luxo e a acumulação financeira fazem com que os doadores se retirem do mosteiro. Em Citeaux, recusa-se o luxo, gasta-se pouco. Mas, ao mesmo tempo, o capital de fundo acumula sempre mais, provocando um enriquecimento que contrasta com o ascetismo dos monges. Aí, são postas em marcha todas as infraestruturas da produção ‒ redes de drenos, moinhos, caminhos com mesas de serviço, ateliers, forjas, prensas, celeiros, casa dos conversos ‒ que fazem da abadia uma ‘fábrica’. • Quando ele não deveria ser senão um lugar de oração, hostil à economia, o mosteiro torna-se um ‘centro de produção’, o ancestral da manufactura, depois, da oficina. Cistercienses e franciscanos contribuem, igualmente, a fazer nascer um pensamento económico e uma acção técnica. O espírito de produção junto dos monges de Citeaux desenvolve-se desde o séc. XII, e, no séc. XIII, desenvolve-se o espírito comerciante com os discípulos de Francisco de Assis. Os primeiros propagam novas culturas, técnicas e redes comerciais em toda a Europa. Os segundos condenam o dinheiro dos usurários, mas não o dinheiro circulante dos mercadores, destinado à troca e ao investimento. Desta sorte, a tradição franciscana codifica o mercado e reconhece a utilidade do actor económico que reinvestiu a riqueza. Paradoxalmente, foi, assim, mediante a sua figuração inversa, que o espírito industrial se formou: através do primado da oração na Regra beneditina, e através do culto da pobreza, nos cistercienses e nos franciscanos. • Uma segunda bifurcação (B) intervém no séc. XVI, com a Reforma e depois a revolução científica. A natureza devém o novo ‘grande Ser’, acolhedor do mistério da Incarnação, co-
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mo a ilustra a alquimia, que explora as suas transmutações internas. Até aqui associada a Deus, a própria ideia de Natureza modifica-se: o homem já não está em mas diante da natureza, e ele empenha-se em conhecê-la, matematizando-a. Por volta de 1620-1630, uma nova concepção do mundo, mecanicista, constrói-se, o conhecimento já não é contemplação, mas experimentação e fabricação. Pensar é fazer. Profeta da religião industrial, o filósofo Francis Bacon anuncia que é preciso ‘triunfar da natureza para a indústria. Este ideário vai ser realizado pela Royal Society, Sociedade de sábios criada em Londres, em 1660. • A grande viragem que preludia à transformação da industriação em industrialização articula-se por volta de 1750 com o nascimento da Economia política e os afrontamentos entre liberais industrialistas, fisiocratas (para os quais todas as riquezas procedem da terra) e os mercantilistas (que atribuem a prioridade ao comércio exterior). • Nos bastidores, produz-se uma confrontação maior e directa entre dois gigantes da filosofia, Jean-Jacques Rousseau e David Hume. Rousseau defende a indústria como uma construção de si por um trabalho sobre si, ao passo que Hume e o seu amigo Adam Smith pleiteavam a favor de uma indústria entendida como uma construção mundana através do trabalho e na manufactura, onde reina a divisão do trabalho. Nos seus ‘Political Discourses’ (1752), Hume afirma que ‘toda a realidade do poder e das riquezas’ consiste em ‘excitar o espírito da indústria e aumentar o fundo de trabalho’. • A terceira bifurcação (C) da industriação cumpre-se, nos sécs. XIX e XX, em dois momentos: por volta de 1830, com a revolução industrial, e entre 1880 e 1940, com a revolução managerial [gestionária]. A primeira formula a lei tecnocientífica e a segunda fixa a lei da organização do trabalho. A oficina-empresa conecta-as solidamente. A crença em um novo ‘grande Ser’, i.e., a humanidade, reinvestiu o mistério da Incarnação, tal como o instituiu o filósofo Auguste Comte (1798-1857), pontífice desta nova religião. Em 1848, o jovem Ernest Renan propõe ‘organizar cientificamente a humanidade (3)’. • Enquanto se multiplicam as oficinas, os primeiros socialistas formulam a nova religião. Henri Saint-Simon anuncia o ‘sistema industrial e científico, que não é outra coisa senão o pôr em marcha o princípio divino’ (1821). O criador omnipotente já não é um Deus supraceleste, mas o próprio homem auto-cumprindo-se. Esta visão faustiana de uma religião terrestre e racional tem por guia o progresso e a promessa de um bem-estar futuro. Assistimos, então, a Exposições universais, que teatralizam essa fé e o seu credo. ‘A ciência encontra ou descobre a indústria aplicada, e o homem segue’ (Chicago, 1933). • Em torno dos anos de 1900, a religião industrial adquire uma normatividade, com o gestionarismo que é inventado pelos engenheiros, designadamente Frederick Taylor e Henri Fayol. A mecânica encontra a sua mística no evangelho da eficiência (‘o evangelho da eficacidade’), celebrado em Abril de 1909 em The Engineering Magazine. Em 1941, James Burnham, ex-dirigente trotskista, publica The Managerial Revolution (4), obra difundida em França por Raymond Aron, com um prefácio de Léon Blum. O autor defende, aí, a ideia de que os poderes dos managers e das empresas ultrapassou o socialismo e o capitalismo. A revolução managerial afirma a superioridade da empresa sobre o Estado e sobre o político, que vieram a cair na sombra no decurso das duas guerras mundiais. É preciso, por conseguinte, substituir o poder político pelo poder dos directores de empresa. Esta visão era destilada junto dos anarquistas como William Godwin ou Pierre Joseph Proudhon e Saint-Simon havia afirmado que ‘a verdade da política é a ciência da produção’. • Depois da segunda guerra mundial, a cibernética, doutrina da acção eficaz graças ao computador, associa-se ao management. Comparando os homens e as máquinas, o cérebro e o computador, ela visa o governo dos homens pela pilotagem automática, os números e os algoritmos, como é hoje ilustrado pelos mercados financeiros. Tendo falhado a política, o reencontro
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do dogma managerial e do modelo cibernético ‒ o cybermanagement ‒ pretendem aportar, consigo, a racionalidade absoluta nas decisões. Cumprindo o sonho de Renan, o cybermanagement fixa uma só medida para a administração dos homens e o governo das coisas. • Assim, a empresa torna-se a nova instituição dominante. Ela é um lugar alto de produção material e intelectual; muitas vezes reduzida a uma organização sócio-económica, ela vê a sua dimensão político-cultural frequentemente ignorada. Antonio Gramsci, contudo, havia sublinhado que a ‘hegemonia nasce da oficina’, e desde 1817, Saint-Simon lançava: “Olhai para uma nação como um vasto atelier industrial” (5). Esta visão é reactivada por M. Macron, que pretende construir ‘une start-up nation (6)’. Para além da importação da nova língua managerial em política e do presidente da ‘empresa França’, é a religião industrial que triunfa. • Assim, no Ocidente cristão, uma religião tem podido esconder a outra! A sacralização do político e do Estado tem ocupado a frente da cena. Mas, enquanto uma e outro lutavam pela ‘secularização’ e o ‘desencantamento do mundo’, desenvolvia-se, nas fraldas, uma ‘dessecularização’ por via da metamorfose do religioso. Depois de uma longa gestação nos claustros, a religião industrial manifesta-se de modo fulgurante, por ocasião das revoluções industriais, que se sucedem desde há dois sécs., atingindo o seu top com a revolução computacional hodierna. • Num discurso recente, na Univ. de Harvard, o fundador da Facebook, M. Mark Zuckerberg, apresentou um projecto para a sociedade mundial. Ele pugna pelas comunidades empresariais capazes de libertar o sentido: “O sentido é o que cria a vera felicidade (…). Quero evocar três modos de chegar aí: empreender grandes projectos; redefinir os seus objectivos, redefinindo a igualdade de oportunidade, para que cada um tenha a liberdade de prosseguir os seus objectivos; e edificar uma comunidade através do mundo”. E o fundador acrescentou: “Todos nós somos empreendedores (…). É formidável. A nossa cultura de empresarialismo permite-nos gerar novos projectos” (7). • Numa sorte de moto contínuo, M. Macron adopta a lógica da empresa para tentar regenerar a política, enquanto Zuckerberg exporta a sua visão industrialista, a fim de orientar a sociedade mundial. Um dos gurus da Silicon Valley, co-fundador da Singularity University, financiada pela Google, M. Peter Diamandis, esclareceu esta troca de hegemonia: “Eu creio muito mais no poder dos empresários do que no dos homens políticos, e mesmo da política tout court (8)”. O ‘Siliconismo’ incarna, assim, a última variante liberalo-libertária da absorção do político pela indústria. *** (1) Conceito cristão segundo o qual a palavra divina fez-se carne através do corpo de Jesus Cristo, homem e Deus numa só pessoa. (2) Citado por Michel Feltin, ‘Les hommes d’affaires à l’école du ‘moine-agement’ . La Croix, Paris, 8.12.1998. (3) Ernest Renan, L’Avenir de la science, Flammarion, coll. ‘GF’, Paris, 2014 (1ª ed. Calman-Lévy, Paris, 1890. (4) James Burnham, The Managerial Revolution. What Is Happening in the World (1941), traduit sons le titre L’Ère des organizations, Calman-Levy, 1947. (5) Henri Saint-Simon, ‘L’Industrie’ (1817). Oeuvres completes. Presses Univ. de France, Paris, 2013. (6) Au deuxième ‘Sommet des start-up’, Paris, 13.4.2017. (7) Le Monde, 28-29 mai 2017. (8) Fabian Benoît, ‘À Palo Alto, au rayaume des radieux’, Libération, Paris, 9.1.2017.
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PÓSFÁCIO//MEDITAR : B) NOTAS ESCANDIDAS SEGUNDO A CRONOLOGIA EVOLUTIVA DA REVOLUÇÃO FRANCESA (1789-1804) • Ideário genérico inicial (instruído pelos três Estados: Povo, Nobreza, Clero), com o objectivo de instaurar uma República em Regime Democrático: Estado do Povo, pelo Povo e para todo o Povo (sem exclusão): Os 3 Estados incluídos e, aí, representados: clero, nobreza e campo popular. A Monarquia do último Rei, Louis XVI, foi guilhotinada na própria pessoa do Rei. Unidade e Indivisibilidade da República. Lábaro: Liberté, Égalité, Fraterni-té. Ou la mort!... Era o que se lia nas pancartas!... Les phylosophes, muito em especial, acabaram de pôr em dúvida, em processo de demolição, a Religião e as Instituições político-societárias, começando pela nobreza e acabando na monarquia. Convulsões e Desordem por toda a Geografia do Exágono francês!... ● Escansão dos Momentos principais: A) Luta pela Constituinte: convocação dos ‘Estados Gerais’, onde se haviam salientada, com despudor, a reacção/odisseia do Clero e da Nobreza, contra o Povo ‒ o ‘Terceiro Estado’ (1787-1789). B) Assembleia Nacional Constituinte (1789-91). É, de facto, como cumpria, o ‘Terceiro Estado’ que se proclama, a si mesmo, Assembleia Constituinte. Perante a possível mas impensável Discussão do quadro da Constituição pelo monarca Louis XVI, a Revolução ‒ como procissão unificada, saiu para a Rua com todo o Povo! C) A 14 de Julho de 1789, a Velha Prisão (monárquica) da BASTILHA foi assaltada, aberta e tomada por todo o Povo em revolta, até como símbolo do absolutismo régio em estilo de execução final. D) A nova Constituição foi votada a 4 de Setembro de 1791; e o rei fora, nates, pressionado a assiná-la. É nesta data, gloriosa, que é aprovado e dado a público o Decreto dos Direitos do Homem e do Cidadão. Os bens da Igreja são postos à disposição do Estado, e os títulos nobiliárquicos extintos. É, entretanto, declarada a Liberdade de Imprensa. E) Assembleia Legislativa (1791-1792). O Rei recusa-se a subscrever o novo Quadro Político; e dá-se, de imediato, o assalto ao Palácio Real das Tulherias, para depor, finalmente, o Rei em exercício e aprisionar a família real. O Rei foi, então, confrontado com a obrigação de jurar a Constituição. Terminou a Monarquia absoluta e deu lugar à ‘monarquia constitucional’. Com a Assembleia Legislativa constituída no Órgão principal da República. F) Começa a Guerra e os Estados vizinhos, assanhados contra a França Republicana: sobretudo, a Áustria e a Prússia de Francisco II. O rei chama ao Poder (para obviar à situação) os Girondinos (moderados); estes são forçados a aceitar as medidas revolucionárias dos Montanheses (radicais). Inicia-se o processo do alistamento para a guerra. O exército prussiano de Bismarck ameaça invadir a capital de França, se fizerem mal ao rei. Bandos armados prendem o rei e, depois, veio a matança de Setembro, onde foram chacinados ca. de 1.600 prisioneiros.
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G) A 21 de Setembro de 1792, foi aberta a Convenção, que baniu a Monarquia, proclamou a República e condenou o rei à morte na guilhotina. A França declara guerra à Inglaterra e à Holanda. H) Convenção Montanhesa (1793-94): Enquanto a Convenção é dominada por Robespierre, o exército da República é atacado e derrotado por ingleses, prussianos e austríacos. La Terreur é instalada na capital da República, executando girondinos e os indulgentes. Robespierre é também executado. A partir de Outubro de 1793, os exércitos franceses recuperaram algumas posições perdidas e venceram importantes batalhas. I) Convenção moderada (1794-1795): a guerra evoluiu a favor dos franceses; são reprimidas rebeliões populares e o clube dos Jacobinos é encerrado. J) Directório: a Convenção é dissolvida e o Poder é entregue a um Directório, composto por cinco membros. K) Consulado (1799): até que Napoleão Bonaparte (general/chefe do exército francês em Itália derruba o Directório com um golpe de Estado e institui, finalmente, o Consulado, (que durou até à sua coroação como imperador de França). N.B.: As Revoluções colapsam ou abalroam: A) de dentro: por falta de entendimento ou união suficiente entre as partes/partidos. B) de fora: por oposição cerrada dos seus adversários/inimigos externos.
SOB O SIGNO DAS ESTRATÉGIAS (Comentários ao Texto, traduzido e aqui inserido, do Prof. Pierre Musso)
N.B.: Foi um texto que nos afectou, paradoxalmente, de Amor e Ódio. É que, no nosso modo actual de olhar o Mundo, todas as Religiões Institucionalizadas, a começar pelas mono-teístas, deverão ser ultrapassadas… transfiguradas: porque há humano interesse em manter uma Mística, holisticamente humana. Mas o sentimento do Ódio prevalece, ainda, visto que todas as Religiões Institucionalizadas procederam a exclusões, matanças, chacinas, mortandades sem no-me… umas contra as outras. Sobremaneira, as monoteístas.
Fernando Pessoa foi o Grande Poeta/Drama em Gente. O seu heterónimo (dos 4 mais conhecidos), Alberto Caeiro é justamente o mais completo e glorificado, porque é o humano pensador mais arguto e profundo e incontornável: é o mais criador, demonstra uma capacidade inaudita de transformar o Mundo, de criar um Mundo Novo, finalmente digno da Espécie ‘Sapiens//Sapiens’, ‒ aquela mesma, cuja Identidade Singular nunca pode ser obstruída. Se os Humanos são Unidade e Multiplicidade, o Poeta escolheu o segundo, por que sabe, de ciência fir-
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mada, que a Identidade Singular não se pode anular. Daí, o postulado inaugural: Diante do Múltiplo, toda a tentativa serena e saudável é a da INCLUSÃO, não a da EXCLUSÃO. Esta recorre, logo, à tirania e ao despotismo. Por isso, Alberto Caeiro é o Mensageiro do Neo-Paganismo e da INCLUSÃO e de todo o universo da Multiplicidade, que o Neopaganismo autêntico é capaz de envolver. ‘Ego dixi: Dii estis et Filii Altissimi Omnes’!... (Ps.81,6). É preciso e urgente cumprir, até ao fim, o Mandato da Subjectividade Individual-Pessoal, ‒ esse mandato subjectivo ‘criador de civilização’ de que F.P. sempre se quis e soube investido. Ele sabe, igualmente, que esse é um ‘espírito criticamente luciferino’, na medida em que não aceita cumplicidades nem corrupções; e, por sua vez, sabe que ele é filho dilecto do DIÁLOGO socrático. Como ensinavam os Gnósticos judeo-cristãos primevos, que não alinhavam em falsos triadismos!... ‘Vita in motu immanenti consistit’. ‒ Dizia ‘O Filósofo’ grego de Estagira, pela boca dos Escolásticos. Eis por que a Dinâmica (da Vida) e o Movimento levam a palma sobre as noções e os conceitos fixos. Em termos sociais/societários, qual é, pois, a Estratégia mais autêntica e produtiva/eficaz? Sem dúvida, a que envolve a Vida em acção e a Dinâmica própria da Vida!... ‒ Quaestio Prima: as cinco pp. de texto de Pierre Musso, que traduzimos e transcrevemos, encerram e procuram assinalar uma única Estratégia, ou seja, a que adoptou, estatutáriamente, o molde unificado da Religião e da Política (economia…)?! Se assim for, até se poderá dar o caso de estarmos perante a mais grandiosa odisseia de um caminho unificado de Política e Religião institucionalizadas, como terá sido o caso, no A.T., do reino de Israel comandado, em simultâneo (cada um exercendo as suas funções), pelo Patriarca/Condotiere Moisés e o Sumo Sacerdote Aarão, seu irmão. Na Tradição cristã, (pelo menos, aparentemente), as coisas começaram a ser diferentes: se tivermos em conta o lóguion de Jesus, na réplica aos fariseus (Mt. 22,21): ‘Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus’!; e a outra versão mais completa, que surge no Ev. apócrifo de Tomé (v.100): ‘Dai a Deus o que a Deus pertence, a César o que é de César, e a Mim o que me pertence’!... ‒ Quaestio Secunda: A partir da 2ª metade do séc. XVII, na História da Cultura e da Civilização Ocidentais, o eixo e o molde da Organização societária começaram a funcionar de modos diferentes, aliás com alguma base real nos lóguia evangélicos (orientação que o Corão e os islâmicos ignoram motu proprio… e os israelitas/israelenses habituaram-se a não considerar!...). Os 2 Grandes Acontecimentos, que ajudaram, decisivamente, a alterar o status quo da Organização societária: 1. ‒ O Filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679), que hasteava a bandeira conhecida do ‘homo homini lupus’ e, através da sua Obra célebre ‘Leviathan’ instaurou a doutrina seguida (posteriormente…) da ‘Great Separation’, entre a Administração da Religião e a Administração da Política e da Economia. A Obra de Adam Smith: ‘The Wealth of Nations…’ contribuiu, enormemente, para o desenvolvimento dessa mundividência secularizada e laica. 2. ‒ Em meados do séc. XVIII, por obra e graça de Montesquieu, surgiu a obra famosa que deu pelo título (1748): ‘Esprit des Lois’. Nessa obra, o Autor discerne as diversas formas de comportamento e de governação das populações e sociedades, prestando toda a atenção às leis, maneiras, costumes e instituições sociais. São conhecidas as três partes, em que o Barão de La Brède Montesquieu divide o exercício efectivo do direito: Legislativo, Executivo e Judiciário. Entretanto, para o Barão, a administração da Cristandade e da Governação continuam unificados segundo o mesmo espírito!... ‘Les beux esprits se rencontrent’!... *
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N.B.: CRITÉRIO para entender e perceber o modus operandi do ‘Aparelho Físio-Psico-Sociológico-Cultural, que deveio, evolucionariamente, ‘Homo Sapiens//Sapiens’ (na Idade Moderna). • Três Noções Básicas, que é mister ter em conta: A ‒ A Noção de Estratégia (origem helénica em Temístocles): a Vis vital, que aí funciona, absorve, em unidade indistinta/indiscreta, o inconsciente//o sub-consciente e o consciente. (NB: Temos em conta os contributos evolucionários de B. de Espinosa, de Lamarck, de Darwin e de Teilhard de Chardin). Até ao advento dos Primatas e aos 5 specimena que melhor os definem, são as forças da Estratégia vital que estão no comando das operações, em função de um centro ‘egótico’ que por vezes não leva a melhor. A lei do ‘mais apto’ não leva sempre a melhor, como supôs o Darwinismo clássico. A lei de Talião não é uma lei da Cultura/Civilização; é, por definição, natural… Pode pertencer à ordem da Estratégia; não da Cultura. B ‒ A partir da formação do ‘Homo Sapiens tout court’, o que vem a predominar é a Ética, e não a Estratégia: a Ética de ordem objectiva/objectualista (os ataques//defesas têm carácter instintivo). Mas a Ética (substantiva) constitui um corpo de orientações dinâmicas que, por não se confundirem com os hábitos, preparam o estádio anímico-psíquico para que os códigos morais se possam configurar plenamente. C ‒ Isto acontece quando se é capaz de discernir, no conflito, entre a acção de ataque e a acção de defesa. É por isso que a Moral se constitui, em contraste com a Ética, numa área mais ‘souple’/flexível. De qualquer modo a Ética (substantiva) e a Moral (flexível) constituem-se predicados específicos do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Este distingue-se, essencialmente, do ‘Homo Sapiens tout court’, porque não é vítima da Lei de ferro do Objectivo-Objectualismo, que é uma espécie de religião laica: o rei Clovis (dos Francos) matou o seu inimigo e todos os seus súbditos fizeram o mesmo. Assim surgiu, por antonomásia, a ‘espada de Clóvis’. • DINÂMICAS: As Dinâmicas configuram-se em duas espécies ‘técnicas’ substancialmente distintas: A) A que procede e decorre de uma fonte singular ou unificada. Nestas situações, as funções da ESTRATÉGIA são condensadas, de modo a operarem sob um único impulso (de ataque ou defesa). Nesse horizonte, Moral e Ética são subsumidas sob uma única e indivisível Dinâmica. B) A que procede e decorre dos Indivíduos-Pessoas singulares e concretos, com capacidade jurídica para actuarem: nestes casos, os seus actos ou actuações são caracterizadas pela legitimidade ou ilegitimidade, pela bondade (ou maldade) moral ou ética das acções. Estamos no plano do primado dos Indivíduos-Pessoas: Seres que sabem que sabem.
● Anotações ao Texto supra de Pierre Musso: ‒ O que está sob o seu olhar (histórico) é o Paulinismo, os diferentes Cristianismos paulinos, moldados nas sempiternas formas platónicas. ‒ Como foi possível a completa Inversão de uma Religião moldada em categoremas metafísico-ontológicas de natureza dualista, conseguir empenhar-se na ‘Salvação na Terra’?!... As inultrapassáveis instâncias da PRÁXIS societária. Ao ponto de, no discurso do Autor, elevando as multinacionais aos cornos da Lua, ele celebrar, como um non plus ultra, o princípio da éfficacitée como a sua auréola suprema.
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‒ O trabalho/estudo de P.M. está cauterizado pelo que o C.E.H.C. designa como princípio máximo do Objectivo-Objectualismo (já esclarecido do que se trata). ‒ A tese deste Estudo é comparável, por nós, à Encíclica ‘Charitas in Veritate’ do Papa alemão Bento XVI (de Março de 2007) que, no seu enquadramento, como difusor, à escala mundial, do Neocapitalismo liberalista global, o Ocidente (a Civiliz. Cristã do Ocidente) cumpriu, taxativamente, o Mandato evangélico (Mt.28,18-20) sobre todas as outras Grandes Religiões do Mundo.
TRÊS POSFÁCIOS NUCLEARES
A ‒ POSFÁCIO: Gramática das Luzes + ‘Lumières’ (Enlightenment/Aufklärung/Alumbrados/Iluminismo: Movimento de Auto/hétero-Esclarecimento, que fez a sua emergência mais acentuada e notória, em termos culturais-sociais, na 2ª metade do séc. XVIII, no Ocidente; e teve consequências: umas positivas, outras negativas. Essa foi a Grande Bandeira da Modernidade ocidental, a partir de então até ao presente.
Il faut repenser ‘les Lumières’, et repenser l’Âge des Lumières en termes critiques : N.B. : a) Na Cultura do Ocidente, ao longo de 2,5 milénios (desde Sócrates e Péricles e a novidade da ‘Democracia Ateniense’), não se conheceu outra realidade psico-sócio-antropológica senão a lei do pêndulo do ‘livre arbítrio’ e a sua correspondente montagem motora da ‘Potestas sacra’. b) Sociedade dividida em classes… Repressão, enquadramento pelas forças policiais e por exércitos de Estado. Servidão e Escravatura… só foram metamorfoseadas a partir dos ‘abolicionistas’ do séc. XIX!... A partir de 1867. c) Monismo Epistémico como gramática psico-pedagógica e política; e como cartilha tanto cultural como científica e tecnológica. Deste odre não saíram as Sociedades humanas até ao presente: no Ocidente, e, por ricochete, à escala do Mundo inteiro, em virtude das acções hegemonicamente protagonistas do Ocidente à escala planetária, desde as iniciativas das viagens dos Descobrimentos transoceânicos, desencadeadas pelos dois povos ibéricos (Espanha e Portugal), a partir dos sécs. XV/ /XVI.
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---------- * ---------• Revolução Francesa (1789-1795-1804): ‒ Instauração da República em regime democrático; ‒ período do Terror; ‒ consulado napoleónico; ‒ expansão/difusão/ /imposição do Ideário da República Democrática (na base dos 3 estados unidos sob a chefia do Povo (= massas populares) maioritário), mediante os exércitos de Napoleão Bonaparte (a partir de 1799 até ao seu ‘apocalipse’ em 1815). Regime Democrático da 1ª Nação promotora gerou o programa da legitimação do Colonialismo moderno/ /contemporâneo. Emergiram, aí, as 2 Nações/Estados reitoras do Colonialismo e do Imperialismo advenientes: Reino Unido e França. A cartilha justificadora destes 2 movimentos, sempre dentro da Ec. política capitalista, foi, doutrinal e ideologicamente, a Revolução Fr. liderada pela Burguesia nacional emergente. A instauração do Regime Democrático Republicano com a carta dos Droits de l’Homme foi obra da 1ª fase da Revolução (1789-1792). A seguir, as boas ideias foram impostas pela força dos Exércitos, que o período de ‘la Terreur’ servira de ‘exame probatório. ……… * ……….
Problemática global do Emprego//Desemprego, à escala de cada Estado-Nação, suas condições de funcionamento estrutural em função da saúde fisiológica e mental de cada Estado-Nação… Precisamente, porque o Emprego efectivo faz parte da cidadania efectiva, no Quadro do Estado-Nação. (Até ao presente). Essa Problemática conduz a soluções concretas que são (ou não) viabilizadas. Afloram, assim, as diferentes percentagens de desemprego no quadro das Nações (actualmente em Portugal, como na França, a percentagem de desempregados ronda os 10%). Atendendo à importância do Trabalho profission para a plena realização das pessoas/ /cidadãos, na Gramática política das Nações (que prezam a sua Dignidade e autonomia administrativa), impõe-se, hoje, a instauração de um Rendimento universal garantido pelo Estado, para todos os cidadãos maiores de 18 anos, como base para obviar à falta de Emprego ou Empregabilidade (facultado pelo Sistema Educativo de cada Estado-Nação). Esta solução impõe-se, tanto mais, quanto maior e mais rápida é a inovação tecnológica que vai substituindo e eliminando os postos de trabalho existentes, aumentando o número de desempregados. A isto se poderá chamar ‘imposto tecnológico’, se pensarmos na justificação orçamental, que preside à implantação dessa solução. Se no plano da Política se progrediu na via da Emancipação e da Democracia, no plano da Economia, com o advento dos mecanismos e automatismos das Máquinas/Instituições, outras servidões e constrangimentos vieram a implantar-se, desfeiteando os programas dos abolicionistas da escravatura, no séc. XIX. (Cf. TZVETAN TODOROV: ‘Os Inimigos Íntimos da Democracia’, pp.134-156). ● O que o Iluminismo oitocentista ocidental não fez nem nunca quis pensar nisso foi a Tese essencial/fundadora e decisiva da Humanidade qua humanitas da Espécie ‘Sapiens//Sapiens’: A) a Dualidade Epistémica, capaz de discernir e distinguir, sistemicamente, as realidades do Sujeito e do Objecto; B) o que pressupõe e implica a distinção nítida entre os dois hemisférios das Ciências: ‒ o das físico-naturais ‒ e o das psico-sociais e/ou humanas. É que só a Dualidade Epistémica, adoptada como grelha metodológica, permite rechaçar o Progresso
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uniformista e objectiva/objectualista e recusar, in limine, a Teoria fantasiosa e prometeica das Tecnociências de Aparelho e a progressão historicista in aeternum do capitalismo sistémico, que, enquanto tal, vai matar a Humanidade!... Eis por que é importante e decisiva a leitura do romance histórico: ‘O MISTÉRIO da FELICIDADE SUPREMA’ da escritora Arundhati Roy (nascida em Myanmar e residente em Deli, capital da Índia). (ASA, Lisboa, 2017). Ela é a Autora célebre de ‘O Deus das Pequenas Coisas’, que lhe grangeou o Booker Prize em 1997. Entre os seus Ensaios, são de destacar ‘O Fim da Imaginação’ e ‘Pelo Bem Comum’. A temática da Obra, agora referenciada, centralmente, é a da guerra e da paz, que ela urge sejam separadas intelectual e realmente, por forma a que não se cumpra o adágio malfeitor/ /histórico: ‘Si vis pacem para bellum’: em termos específicos, os temas principais são o conflito indiano-paquistanês e problemática dos conflitos bélicos no Caxemira, que, além de outros, chegou a ser cobiçado pelo império chinês. (Tudo isso caldeado com os problemas humanos dos/das Hijras). O que a ocupa é a Vida real dos Povos dessa Grande Região planetária Indo-Paquistanesa, bem como a problemática dos Conflitos múltiplos no Caxemira. (Na cidade de Shrinagar, há um Túmulo, que a Tradição milenar atribui a JESUS!...). Et pour cause!... O seu verismo (humanizado) da Escrita é tão pungente que se pode muito bem dizer, na contracapa: “Os seus heróis, presentes e defuntos, humanos e animais, são almas que o mundo quebrou e que o amor curou. E, por esse motivo, nunca se renderão”. Tilo Madame (uma das personagens centrais) chega a reagir com emoção e profundidade (p.456 e badana da esquerda): ‘Como//contar//uma//história//destroçada?’ ‒ ‘Tornando-me//lentamente//todos. Não.//Tornando-me lentamente//tudo’!... É que nós (por mais que queiramos) nunca nos tornaremos os outros, enquanto Sujeitos/Pessoas. Foi tudo isto que a Cultura (identitária/solipsista do Ocidente) nunca foi capaz de entender. Tilo aprendera com o doutor Azad Bhartiya um poema que escrevera no seu caderno. Traduzindo do urdu, reza assim o poema: “Ela morreu na gaiola [Casa dos Hóspedes], a bulbull. E deixou estas palavras para o seu dono: //Por favor pega na colheita da primavera//E enfia-a no traseiro dourado” (op. cit., p.455). “‒ Parece o hino de um bombista suicida ‒ disse Musa”. (Ibidem). Uma antiga oração hindu, que Zainab aprendera na infância, por Anjum e decidiu recitá-la, em público, ao acender a pira crematória, no funeral do seu falecido sogro e pai: “Om bhur bhuvah svaha Tat savitur varenyam Bhargo devasya dhimahi Dhiyo yo nah pracodayat” (p.432). Tradução: “Ó Deus, sois a fonte da vida/Eliminais a dor e o sofrimento/Concedeis a fe-licidade/Ó Criador do Universo/Dai-nos a vossa luz suprema destruidora do pecado/Guiai o nosso intelecto na direcção certa!”. N.B.: Tudo entendido, sem as fatais e letais metafísicas bíblicas ocidentais, que reduziram, 1º os humanos a escravos; 2º, a prometeus/fáusticos, inca-pazes de gerar um Mundo Fraterno!!!
O Gayatri Mantra é uma espécie de ícone/bandeira do Hinduísmo. Vamos transcrevê-lo já em português (cf. ibi, p.119): “Ó Deus, que nos dás a vida, Que nos livras da dor e do sofrimento, Que nos trazes a felicidade,
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Ó criador do universo, Que recebamos a Tua luz suprema que aniquila o pecado, Que possas guiar o nosso intelecto na direcção certa”. Não há, aí, metafísicas dogmáticas nem messianismos de intermediação. Há, tão só, uma relação dual entre o fiel/humano e a sua Divindade de estimação. Esta pode, muito bem, ser uma Divindade para todos os Humanos, em paz e harmonia! Nesse quadro, não há lugar para que alguém possa, com justeza, reclamar: ‘Alguém tem de pagar o preço do Progresso’!... (ibi, p.111). As doutrinas e as práticas do Hinduísmo procuram promover e enaltecer a mensagem/refrão da Unidade na Diversidade… Quanto ao sistema de castas, só eles é que o podem entender; e costumam fazê-lo segundo a fórmula: “Cada casta deve fazer o trabalho que nasceu para fazer, mas todo o trabalho deve ser respeitado”. (Ibi, p.115). ‒ Dir-se-ia, aqui, que a identidade do indivíduo se revela equivalente ao seu tipo de trabalho!... O que, desde logo, é real e universalmente contraditório. Num carro de luxo (Honda), que estava ali parado na praça, ainda há quem escreva ironias e impropérios do género: ‘Roubaram o pão de cada dia aos pobres E ainda taxaram a merda deles”!... (Ibi, p.125).
B ‒ POSFÀCIO: PODER E RESPONSABILIDADE ● Não se deve misturar ou confundir Poder e Responsabilidade: São duas noções diferentes. Toda a Modernidade ocidental (dando continuidade às mundividências das Idades ‘Antiga e Medieval’) apesar dos Iluminismos (que desabrocharam no séc. XVIII) laborou e foi vítima da cartilha, que estabelecera essa confusão: a Cultura (ocidental, mundializada…) do Poder-Dominação d’abord. A Liberdade, que aqui funciona, é uma falácia… na medida exacta em que está reduzida à condição do ‘livre arbítrio’ (a ‘lei do pêndulo’ de Foucault), ‒ o que pressupõe, inexoravelmente, Autoritarismo/Ditadura e subordinação/submissão. Em suma, as fatais e inexoráveis Hierarquias (sacras?!...) substantivas. Pode, assim, aquilatar-se como e por quê essa confusão é própria e específica da sempiterna Cultura do Poder-Dominação d’abord, que vigorou, hegemonicamente, ao longo de milénios, na Cultura do Ocidente, com toda a sua pesporrência e paternalismo (os quais desencadearam a civilização e a sociedade do Imperialismo e do Colonialismo), até ao Concílio Ecuménico Vaticano II (1962-65) e à movimentação revolucionária do ‘Maio ‘68’ em França e, em geral, na Europa. Durante os chamados ‘Trinta Gloriosos’ (1945-1975), o trending dessa Cultura hegemonicamente substantiva foi amainando, graças à consciência colectiva dos malefícios da IIª G.G. e às novas orientações sábias, emanadas do Vaticano II e da Revolução do ‘Maio ‘68’. A Nova Era da Pós-Modernidade (ocidental!...), que o C.E.H.C. tem, para evitar confusões, de qualificar de positiva e crítica, só começou a esboçar-se a partir da Queda do Muro de Berlin (1989) e do Colapso da União Soviética (1991). A partir de então, até aos dias de hoje, tudo se foi processando à Tatonnements, numa atmosfera de muita confusão e ambiguidade, muita desorientação… É sabido que a tradicional
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Cultura do Poder-Condomínio funciona e procede, estruturalmente, a partir da mó-de-cima dos Poderes Estabelecidos, i.e., dos detentores do Poder e das elites hierarquizadas (em termos políticos, económicos e religiosos). Se os poderosos e as elites bendizem e apregoam o regime democrático, deverá saber-se que se trata, aí, tão só, da Democracia liberal, (exclusiva, não inclusiva); se, aparentemente, se apresenta como verdade, é só meia-verdade, porquanto ‘bonum est ex integra causa, malum ex quocumque deffectu’!... Eis por que distinguir (e separar criticamente…) aquelas duas realidades ‒ o Poder e a Responsabilidade ‒ constitui, de facto, a Porta Aberta para se poder entrar na novel Cultura democrática da Liberdade Responsável primacial e primordial, a instaurar no Presente e no Futuro. Não há, efectivamente, em termos de principiologia ética e jurídica, direitos sem obrigações. O Mit-Sein de M. Heidegger deve aqui ser recordado como o primeiro e último estatuto ontológico dos Humanos: ‘Ser com os Outros’! Estamos, pois, numa encruzilhada vital: Se as Sociedades humanas não forem capazes de seguir esta gramática estrutural/estruturante, de Solidariedade e de Socialização, não haverá mesmo Futuro para a Humanidade: tanto em termos objectivo-objectuais (Alterações Climáticas e problemática Ecológica), como em termos dos próprios Sujeitos Humanos, qua tais, que o deixarão de ser inevitavelmente. Basta de Mentir aos Outros e a Nós próprios!... Compreende-se, assim, que os princípios da Honestidade e da Autenticidade identitária, individuais-pessoais, deverão constituir o farol e a bússola da Nova Humanidade e da Nova Sociedade. (Cf. nosso Livro: ‘Nova Humanidade//Nova Sociedade’ Segundo o ‘Homo Sapiens//Sapiens’, Edicon, São Paulo, 2016). A própria Estética e as Artes, em geral (as que têm o seu locus no Espaço e as do seu situs no Tempo), deverão orientar-se e balizar-se segundo essa Gramática, em busca do Genuíno e do Autêntico, em termos individuais-pessoais. Por exemplo, os dois irmãos, artistas esmerados e exímios, Luísa e Salvador Sobral, que, em Maio de 2017, em Kiev (Ucrânia), venceram, na Votação final, o 1º Prémio do Festival Europeu da Canção, podem, muito bem, constituir o padrão da Arte genuína e autêntica, contra todas as outras modalidades bastardas e perversas da ‘pseudo-arte’ de puro entretenimento (mercantil…). Quando os Sujeitos Humanos, livres e responsáveis, abdicam do seu estatuto (criador autónomo!...), individual-pessoal, directa ou indirectamente, o resultado é sempre o mesmo: a Entropia inercial para esse Mundo louco e desumano, tantas vezes bárbaro, em que ainda sobrevivemos!... Felizmente, foi esta Orientação criticista que pudemos observar nas intervenções havidas, no programa ‘Prós & Contras’ da RTP 1, em 29 de Maio de 2017, com ca. de 2 centenas de presenças na Fundação Champallimaud. Até foi aí, em boa hora, severamente fustigado esse híbrido que é o ‘espírito de competição’, o qual só adultera e perverte, na medida em que sucumbe, na 1ª e decisiva determinação da vontade e do propósito, à lei insana do ‘entretenimento populista’. ‘Panem et Circenses’: era o lema/bandeira do antigo Império Romano, para distrair as massas populares e assegurar o Despotismo dos Poderes (hierarquicamente) Estabelecidos!... Em termos psico-pedagógicos (inclusive ao nível primordial da Família constituída), poder-se-á traduzir toda esta Mensagem, na sua base infra-estrutural) na tese do Psicólogo Mário Cordeiro (in ‘Exp.’/Rev., 20.5.2017, p.45): ‘Não há amor sem educação e sem disciplina. Um amor que permite tudo não é amor. Amor é estabelecer uma relação com o outro com uma enorme educação bidireccional’. (O que pressupõe e implica, na relação entre pais e filhos, como na relação entre professores e alunos, a união paradoxal dos dois princípios aparentemente opostos: a igualdade e a desigualdade!).
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● É preciso readoptar um método de Pensar/Agir, com estas três características interligadas e indissolúveis: a) percepção singular/localista; b) visão globalizada; c) visão criticista. É isto que falta, designadamente, em pensadores/padrão como Boaventura de Sousa Santos. (Vd. art. ‘As formas de Luta’, in ‘JL’, 13-26.9.2017, p.27). Há, aí, 3 momentos: vejamos o 1º, onde se espraia a kantiana ‘Razão Pura ou Teórica’: “Em termos de debate filosófico e político, o nosso tempo é simultaneamente infantil e senil. Gatinha por entre ideias que o atraem pela novidade e lhe conferem o orgulho de ser protagonista de algo inaugural (autonomia, competição, empoderamento, criatividade, redes sociais). E, por outro lado, deixa-se perturbar por uma ausência, uma falta que não consegue nomear exactamente (solidariedade, coesão social, justiça, cooperação, dignidade, reconhecimento da diferença), uma falta obsoleta mas suficientemente impertinente para o fazer tropeçar na sua própria ruína. Como a luta, a resistência, a rebeldia, a desobediência, a revolução continuam a constituir a experiência quotidiana da grande maioria da população mundial, que, aliás, paga um preço muito alto por isso, a disjunção entre o modo como se vive e o que é dito publicamente sobre ele faz com que o nosso tempo seja um tempo dividido entre dois grupos muito assimétricos: os que não podem esquecer e os que não querem recordar. Os primeiros só na aparência são senis e os segundos só na aparência são infantis. São todos contemporâneos uns dos outros, mas reportam-se a contemporaneidades diferentes” (ibidem). ‒ Tudo parece ficar como um zigurate de castas societárias no Hinduísmo!... Consideremos, agora, o 2º momento: “Tudo mudou em 2011 com a onda de movimentos de protesto em diferentes países: as diferentes primaveras de revolta, o movimento Occupy Wall Street, os movimentos dos indignados, etc.. Porquê esta mudança? Suspeito que a crise da democracia liberal se tem vindo a aprofundar, de tal modo que movimentos e protestos fora das instituições podem passar a ser parte da nova normalidade política” (ibidem): até às calendas gregas!... Atentemos, agora, no 3º momento: “Um dos revolucionários que mais admiro, e que pagou com a vida a sua dedicação à revolução socialista, o Padre Camilo Torres da Colômbia, doutorado em sociologia pela Univ. de Lovaina, respondeu assim em 1965 à pergunta de um jornalista sobre a legitimidade da luta armada: ‘Os fins não justificam os meios. No entanto, na acção concreta, muitos meios começam a ser impraticáveis. De acordo com a moral tradicional da Igreja, a luta arruada é permitida nas seguintes condições: 1) terem-se esgotado os meios pacíficos; 2) ter uma probabilidade bastante alta de obter êxito; 3) que os males resultantes dessa luta não sejam piores que a situação que se quer remediar; 4) que haja um grupo de pessoas com critérios ilustrados e correctos sobre o cumprimento das condições anteriores” (ibidem). ‒ Tomás de Aquino já conhecia esta Doutrina na luta contra as ditaduras e os ditadores!... O que não poderia ser conhecido, no séc. XIII, na Cultura do Ocidente, era a distinção substantiva entre a Razão Pura e a Razão Prática (Die Rheinishe Vernunft e Die Praktische Vernunft), ‒ em suma, a Grande Lectio de IMMANUEL KANT, que nos conduziu, ao mesmo tempo, ao Projecto de uma Sociedade harmoniosa e pacífica (de acordo com a gramática do ‘Homo Sapiens//Sapiens’) e ao Programa político da ‘Paz Perpétua’. Ele esclareceu, ainda mais: O Primado, entre as duas, é da boa Razão Prática. O Sistema capitalista, tal como evoluiu, historicamente, até ao hodierno Neoliberalismo capitalista planetário, não é reformável, é homicida dos Humanos; ‘O Capitalismo mata’ ‒ diz-nos e proclama, nas suas encíclicas, o abençoado e iluminado Papa Francisco. Quanto ao Socialismo, desde as malogradas revoluções dos sécs. XIX e XX, o que sabemos é o que disse J.K.G.: capitalismo monopolista de Estado.
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Ora, a Lição de Kant é clara e luminosa: Ele estabeleceu, para todos os efeitos, o humano Primado absoluto da Razão Prática sobre a Racionalidade teorética. De facto, o labor fecundo da Razão Pura ou Teórica funciona (deve funcionar!) como uma sorte de catarsis psicanalítica sobre a Praxis societária, que tantas vezes cai em contradições e hábitos e rotinas negativas e destrutivas. Tinha, pois, toda a razão o filósofo de Könisberg em vislumbrar e apontar o fim próximo da Metafísica, na sua última obra célebre: ‘Prolegómenos a toda a Metafísica do Futuro! (Prolegomena für Alle Metaphysic des Zukunft). Não há, efectivamente, qualquer endogamia (legítima) entre as duas áreas específicas da Razão: a Pura (teórica) e a Prática. Quando, por negligência, tal acontece, isso ocorre sempre em detrimento da Razão prática, que fica petrificada, incapaz, por definição, de se configurar como plural e comum. Eis por que, o bom método das (duas) Razões (da prática, sobretudo) é sempre o de proceder do microcosmos para o macrocosmos, e não vice-versa. Reacções correntes (pela voz da cineasta Teresa Villaverde, na entrevista sobre o seu filme ‘Colo’ (in ‘JL’, 13-26.9.2017, p.14): “Sempre me interessou esta coisa da surpresa, de como se reage, quando nos acontece na vida uma surpresa com que não contávamos. Ficar, de repente, sem trabalho é um grande murro no estômago, e cada pessoa reage à sua maneira. Não haver outro trabalho para procurar é ainda pior”. O que faz falta a todas estas personagens ‒ diz T.V. (ibi,, p.15) ‒ “é um pouco de colo e direito ao silêncio, à pausa, à reflexão. Quem sabe isso era o quase nada que faria uma grande diferença”! Em suma. Encontrar o espaço/tempo, para permitir a emergência da resistência, da indignação; pôr em prática a razão teórica individual/pessoal, para estilhaçar todas as rotinas e maus hábitos da Práxis societária!...
C ‒ POSFÁCIO ESPELHOS & SOCIALISMO ● Sobre o Espelho e suas funções. Cf. Maurice Merleau-Ponty (o Gr. Psicólogo francês da 1ª metade do séc. XX), in ‘L’Oeil et l’Esprit’ (Gallimard, Paris, 1964). Axioma sobre o Espelho: “Quant au miroir, il est l’instrument d’une universelle magie, qui change les choses en spectacles, les spectacles en choses, moi en autrui et autrui en moi”. (Maurice Merleau ‒ Ponty). • O Espelho é o ‘Adamastor’ do nosso Imaginário humano. ‒ Sobre a Série televisiva inglesa ‘Black Mirror’: (cf. ‘Science et prescience de ‘Black Mirror’ (cf. in ‘Manière de Voir’, Août-Septembre, 2017, pp.55-58). A. Thibault Henneton. Esta Série televisiva inglesa traz-nos, em tonalidades dramáticas e lúgubres/cómicas, a ciência e a presciência da actuação e do funcionamento dos duplos… porque, em última análise, tudo se passa entre o cidadão (vivo) e o ciborgue.
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A emergência do contraste referido deu-se por uma pura casualidade de atenção humana: “Une vision de l’espionnage oû l’intelligence humaine compte plus que la technologie”. Akram Belkaïd, ibi, p.61). O fortalecimento dos nossos Imaginários através dos écrans. • O Socialismo, tal como o conheceu o séc. XX, e bem passado à joeira da crítica por J.K. Galbraith, na sua Obra ‘O Novo Estado Industrial’ (Ed. Civil. Brasil, Rio de Janeiro, 1962), que o definiu como ‘capitalismo monopolista de Estado, desapareceu no séc. XXI. • A República socialista do Vietnam ressurge, hoje, como caso de nota e exemplar de algum sucesso relativo ao que se convencionou chamar, em cliché, ‘o mundo comunista'. Uma população de 90 milhões de habitantes: mistura de budistas e cristãos. O que os envolve e sobredetermina é o Projecto assumido contra o colonialismo e o imperialismo. A via é estreita… mas certa!... (Cf. ‘JL’, 19.7-1.8.2017, p.31). • Sobre a Série ‘Black Mirror’ (p.55) Autor: “Proposant à chaque épisode un récit indépendant des autres, la série britanique ‘Black Mirror’, rachetée par Netflex en 2016, explore les conséquences vertigineuses de l’invasion de nos vies par la technologie. Sans optimisme excessif, et avec des intuitions souvent troublantes… ».
● PUBLICIDADE TRAIÇOEIRA Sobre as Obras dos Grandes Filósofos/Autores da IDADE MODERNA (in ‘Público’, 2ªf., 31.7.2017, p.5), (com o apoio de ‘Público’, entre outras entidades). ‒ Dois Temas centrais em Dilema, que partem da premissa pressuposta da ‘Dúvida Metódica de Descartes’: No original das suas obras: ‘cogito, ergo sum’: ‘Je pense, donc je suis’. • N.B.: Não são dois dilemas teóricos, muito menos com a possibilidade da reversibilidade. N.B.: É uma asserção axiomática de índole existencial. • N.B.: Não nos dá o Texto autêntico de R.D. a autoridade lógica ou moral de fixar, assim, o dilema ‘teorético/escalabrado’: “EXISTO SEM PENSAR OU PENSO SEM EXISTIR?//DESCARTES DUVIDA”.
………. * ………. • Enquadramento genérico da PUBLICIDADE em causa: ‘As Grandes Questões da Actualidade, segundo os Grandes Pensadores da História’: Vol. 12: ‘Discurso do Método de Descartes’: “Numa época espiritualmente conturbada, entre o fim da Idade Média e o início dos Tempos Modernos; Descartes decidiu recomeçar toda a Filosofia: Em Discurso do Método. O Autor expõe uma experiência de pensamento, a sua procura das fundamentos absolutamente certos do Conhecimento. Esta é uma das mais famosas obras filosóficas e a mais conhecida do Grande Iniciador da Filosofia Moderna. Se o mundo actual dá tanto que pensar, não pense duas vezes para adquirir esta colecção de 15 vols. de capa dura.
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A) Aqui, a Publicidade mente duplamente: na hermenêutica do texto e na semântica do texto. B) Elidiu, completamente, a dúvida metódica cartesiana e o seu sentido métodológico: existencial. C) Manteve o pensamento fechado dentro do odre do Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo. D) Assim se pressupôs, na base do Esquema/fantasma, que o Ciborgue é dotado de Inteligência (Artificial); não de Consciência. ● No horizonte criticista de Ulrich Beck, expresso no seu livro, editado em 2014 (em Portugal), subordinado ao título ‘A EUROPA ALEMÃ (De Maquiavel a ‘Merkievel’: ‘Estratégias de Poder na Crise do Euro’/, ‒ o que na realidade se pode desejar, criticamente, é uma Alemanha Europeia numa Europa alemã. Para acabar com os últimos resquícios da ‘Austeridade’ e edificar uma constelação de Países unidos pelas malhas da ‘Social-Democracia’ e da boa harmonia societária. (Cf. ‘Seara Nova’, Verão de 2017, pp.5253). Não se faz outra coisa senão aumentar e aprofundar o universo humano da hipervigilância no trocadilho dos ecrãs!!! (ou ‘schermi’!). • A inteligência humana conta mais do que a tecnologia. Bem estendida! Claro. Ou queremos repúblicas cibernéticas de solidões?!... • Sobre a percepção e a adopção dos messianismos. O Messianismo é um fenómeno, próprio e típico da Sub-Espécie humana que dá pelo nome de ‘Sapiens tout court’!... Dir-se-ia que é o ‘cancro’ dos Humanos, no atinente ao desenvolvimento da sua Autonomia, da sua Liberdade Responsável. Marco Polo ‒ o protagonista do Livro de Augusto Cury: ‘O Homem Mais Inteligente da História’ (Pergaminho, Lisboa, 2017, 1ª ed., p.58) ‒ lança imprecações sobre o messianismo, que são, arguta e sensatamente, do estilo: “ ‒ Desculpem, mas em qualquer época em que a tirania impera, o povo busca um salvador. Além disso, como [os essénios] esperavam a vinda do Messias se, ao mesmo tempo, fizeram inúmeras cópias para serem encontradas por outras gerações? Não parece racional! “ ‒ Mas o que é racional? A esperança, a motivação, a transcendência, a fé dessa casta? Os Essénios, com medo de perseguição política, podiam ter feito cópias para si próprios ou para os seus filhos”. • O ‘sermão da montanha’ constitui a ante-câmara propedêutica, para edificar a Sociedade do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. (Cf. idem, ibi, pp.269-280). • Em grande convergência com a mundividência criticista do C.E.H.C., recomenda-se a lei-tura, profícua e fecunda, quase propedêutica, do Livro supra-citado do Dr. Augusto Cury. Aí ensina, com clareza, o psiquiatra brasileiro a doutrina seguinte, partilhada pelo C.E.H.C.: O nosso pensamento consciente sobre os outros é virtual, não real: Não é real no sentido semântico, objectivo-objectual, pressuposto na axiomática da Objectividade científi-ca (cf. ibi, pp.129-130).
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POSFÁCIO D FILOSOFIA DO CUBO N.B.: Introdutório: Sim, é o CUBO, que nos interessa e estimula, ‒ claro, como ensaio, em 1º lugar; e depois, também como romance, mas bem urdido e entendido.
• A Filosofia do Cubo Geométrico, que, cientificamente, procura representar: ‒ as duas Grandes Áreas da FÍSICA (clássica + quântica); ‒ as 3 Dimensões espaciais + a Dimensão temporal = 4D., ‒ sobre cujo esquema A. Einstein edificou as leis e a noção da Relatividade Restrita (1905), não as da Relatividade Geral (1915), apoiada, vectorialmente, no próprio Esquema do Tesserato (4 + n. dimensões: depois explorado pelo Físico inglês famoso Stephen Hawking, na sua teoria dos multi-universos… que chegará às 11 Dimensões). • Aquelas duas Partes da Física (Clássica e Quântica) precisam, obviamente, de articular, (na sua objectividade/subjectividade real), dois fenómenos fundamentais do Universo (fora da ‘epokhé’ husserliana, para qualquer dos dois…): A) o da Sobreposição dos elementos (do lado objectivo) e o da engrenagem composta/compósita de todos os elementos universais. Foi esse Projecto que o Autor (Blake Crouch) (que no seu romance é Jason, o protagonista!...) do Livro/romance ‘MATÉRIA ESCURA’ (1ª ed. de 2016: SUMA/Sob Suspeita/Thriller), que tem como subtítulo: ‘Estás feliz com a tua vida?’, e que foi, ao que parece, um grande sucesso de vendas, e que já está destinado a uma ‘Série’ no Grande Écrã no canal da Fox!... O Autor pretendeu desenvolver esse Projecto, mas não o conseguiu; pelas simples e elementares razões: a) de não adoptar, minimamente, as Leis universais (darwinianas) da Evolução cósmica, a 1ª das quais é: ‘o menos dá o mais’; b) a de pôr entre parênteses o fenómeno evolutivo da Consciência humana e, por essa mesma razão, se enquadrar no padrão da chamada ‘Inteligência Artificial’ (I.A.), tal como é, hoje, estereotipadamente nocionada e conhecida para uso das ‘Tecnociências de Aparelho’!... Estamos, assim, dentro do odre do ‘Homo Sapiens tout court’, como o C.E. H.C. tem explorado e desenvolvido nos seus inúmeros livros. Para nos deixar líquida a ideia sumária do Livro em causa, baste-nos, tão só, citar o último parágrafo que se acha escrito na contra-capa do Livro: “MATÉRIA ESCURA é um thriller com um argumento brilhante, ao mesmo tempo universal e íntimo, complexo, estranho, e profundamente humano. Um Livro implacavelmente surpreendente, sobre opções, caminhos não escolhidos e sobre quão longe somos capazes de ir para reivindicar a vida com que sonhamos”. Em resumo e criticamente: seguiu-se por caminhos errados!!!... Decididamente, não é o caso de concentrar a Atenção sobre as mais variadas hipóteses de outras vidas ou experiências… Muito mais importante que esse Problema é, seguramente, o das Identidades Pessoais, o da Identidade individual-pessoal de cada Ser Humano qua tal, de outra maneira, os humanos
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nunca passarão da condição de ‘Bonecos de Stº Aleixo’, ou de mascarados em baile de Carnaval!... De facto, só nesta perspectiva se poderá dar a Resposta Adequada ao Autor que é, desde logo, formulada na contra-capa do Livro: ‘Estás feliz com a tua vida?’… O corredor é fundo e imenso, tem muitas portas de todos os lados… Escreve o Autor (ibi, p.195): “Nalgumas apresentações de mecânica quântica, chama-se ‘função de onda’ àquilo que contém toda a informação do sistema… antes de este colapsar devido à observação. Acho que este corredor é a forma que a nossa mente encontrou, para visualizar o conteúdo da função de onda, isto é, todos os resultados possíveis para o nosso estado quântico de sobreposição”. • De resto, advirta-se como tudo se mistura e confunde trivialmente (ibi, p. 271): “Existe uma teoria no domínio da Estética chamada ‘Vale da Estranheza’. Segundo esta teoria, quando uma coisa é quase idêntica a um ser humano ‒ um manequim ou um robô humanóide ‒ gera-se um sentimento de repulsa no observador, devido ao facto de o aspecto ser tão próximo ao do humano, mas suficientemente diferente, para evocar uma certa estranheza: a de se estar perante algo que é, ao mesmo tempo, familiar e desconhecido”. ‒ Humanos à mistura com humanóides. Quando as diferenças (ou as semelhanças…) são mal percebidas e levam ao engano… É o que se passa no padrão do ‘Homo Sapiens tout court’!!!... • A falsa ideia das supostas identidades binárias… (p.284). O casal Jason e Daniela e o filho Charlie. “… Apesar de ter experimentado o maior sucesso profissional [como Prof. de Física], a realização total enquanto homem de família era-lhe tão alheia quanto a sua vida o foi para mim. Tudo aponta para o facto de a minha identidade não ser binária. [L.G.B.T.: não é destes tipos sexuais, que se trata nesta obra em análise.] E, sim, multifacetada”. Ora esta gramática de vida é aprendida com as experiências múltiplas e democráticas do ‘Homo Sapiens//Sapiens’, que sabe, igualmente, que tudo quanto faz o realiza com uma finalidade bem determinada. O ‘Livre Arbítrio’ ou Lei do Pêndulo de Foucault é próprio do ‘Homo Sapiens tout court’, ‒ não do ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Como já temos explanado em muitos dos estudos enquadrados no ambiente crítico-cultural do C.E.H.C.. • Sobre a FELICIDADE (normal dos Seres Humanos): “Que milagre é ter pessoas para quem voltar todos os dias: Ter alguém que nos ama; ter alguém à nossa espera em casa. Pensava que apreciava cada momento mas, aqui sentado ao frio, percebo que tomei tudo por garantido. E como não o fazer? Até o nosso mundo se desmoronar, não fazemos ideia daquilo que realmente temos, de como tudo se harmoniza de modo precário e perfeito! (ibi, p.288). Como se torna evidente, para a grande maioria das criaturas humanas bem formadas, a Felicidade de todo e qualquer SER HUMANO não pode resumir-se e condensar-se no Conhecimento qua tal (centrado num dado Objecto…). Ela é Função biológica/psicológica + Conhecimento positivo. É daí que advém o seu coeficiente psico-sócio-cultural: Conhecimento/Informação objectiva/subjectiva, a facultar aos outros. • Por sua definição e natureza, o CUBO tem 4 Dimensões; não é, pois, uma unidade geométrica, do mesmo tipo dos volumes geométricos com três dimensões. Esquema ilustrativo do Facto: ‒ física; ‒ (alquimia) química; ‒ bioquímica; → Biogénese. A noção einsteiniana de espaço/tempo deu-se, desde logo, conta da natureza do Cubo: de contrário, como poderia pensar, criticamente, a Notio da Evolução darwiniana da Natureza, do Cosmos e do Universo?!...
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• Os três Patamares imbricados dos Seres Humanos, qua tais, e o seu Coeficiente fundador da CONSCIÊNCIA. São três os Patamares fundamentais, que compõem e constituem os Seres Humanos enquanto tais; eles, evolucionariamente, já se encontram, na sua raiz, nos indivíduos/exemplares da Sub-Espécie ‘Sapiens tout court’. Todavia, só se vêm a desenvolver plenamente na Espécie evolutiva, que dá pelo nome de ‘Homo Sapiens//Sapiens’ (= que sabe que sabe!). Assim, na Espécie humana (que procede do ‘Homem de Cro-Magnon’: de há ca. de 70 mil anos), os três Patamares encontram-se funcionalmente doseados, segundo as seguintes percentagens: A) Sensorium (= o leque das funções/operações referenciadas aos Sentidos (externos): à escala de 3/10. B) Inteligência/Razão: à escala de 3/10: Aí tem lugar a Intuitio (interna) e o Argumentum da Ratio. C) Imaginatio: exercida à escala percentual de 4/10. No ‘Sapiens//Sapiens’, avulta, ainda, um Quarto Patamar, a que se dá o nome de CONSCIÊNCIA: é a bússola de orientação e de responsabilidade, para a Liberdade, que é atribuída ao ‘Homo Sapiens//Sapiens’. Não é fácil atribuir-lhe percentagens no exercício das suas funções… visto que, o factum mais importante e decisivo é o de saber se ela existe e funciona ou não. • Será que o nosso Autor deixou, pelo menos, assomar indícios da Consciência (individual-pessoal)?!... Há muitas dúvidas a este propósito. O Labirinto do Cubo, tem uma infinidade de portas e de espaços diferenciados nos seus habitáculos… os indivíduos como que emergem aí em mundos à parte. “Por um instante fugaz, sou atingido por um sentimento de perda esmagador. Não se trata de luto nem de dor, é algo de mais primário. Uma tomada de consciência e o horror que se lhe segue ‒ o horror perante a indiferença ilimitada que nos rodeia. Não sei se é essa a mensagem que Daniela pretende passar com a instalação, mas é, sem dúvida, aquela que capto” (idem, ibi, p.114). Na p. seguinte (115), o protagonista Jason começa por redigir o seguinte: “À saída do labirinto, há uma última imagem em repetição ‒ um homem e uma mulher seguram, um de cada lado, uma criança pelas suas mãos minúsculas, enquanto sobem a correr um monte coberto de relva, debaixo de um céu azul e límpido ‒, sobre a qual aparecem lentamente no painel as seguintes palavras”: • “Nada existe. É tudo um sonho. Deus ‒ o homem ‒ o mundo ‒ o Sol, a Lua, a imensidão de estrelas ‒ um sonho, tudo um sonho. Nada existe. Nada mais existe a não ser o espaço vazio ‒ e tu… E tu não és tu ‒ não tens corpo, nem sangue, nem ossos, não passas de um pensamento. Mark Twain” … Até parece que voltámos ‒ todos ‒ ao Universo de Descartes e Platão, de todos os idealistas registados, e com patentes, na História da Filosofia!... Mark Twain ‒ que aqui é escrito em bold reforçado ‒ como que a lembrar ou evocar que este mesmo escritor norte-americano constitui o ícon ou bandeira ideológico-literária de todo o Livro de Crouch, ‒ M.T. (1835-1910) é um grande escritor anglófono/norte-americano,
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cuja obra mais importante e decisiva (para a sua sagração) dá pelo título: ‘The Adventures of Tom Sawyer’ (1876). Paradoxalmente, o oposto semântico-ideológico, em termos profissionais, de todo o sentido supostamente ‘construtivo’ da obra em análise. O que ressalta, em todas as emergências possíveis, na leitura desta escrita, é a dissolução lacónica e cínica de todos os Sujeitos Humanos, que, de uma só penada, são destruídos por falta de Conhecimento (objectivo-objectualista…) e da sua respectiva Consciência pessoal, que subjaz à personalidade de cada Sujeito em causa. A Identidade (psicológica) não é, efectivamente, a CONSCIÊNCIA, mas esta constitui a base incontornável, onde se ergue e edifica o leque de todos os predicados constituintes da Identidade individual-pessoal de cada Ser Humano. Em termos objectivo-científicos, que conhecemos nós do Universo?... Para concluir e afirmar que ‘NADA EXISTE’!... Por que teimamos em ser mais platónicos e paulinos do que hilemorfistas e aristotélicos?!... Quando, em termos científicos, e considerando o Universo em Evolução como um Cubo, a Humanidade, historicamente, só terá conhecimento objectivo e científico de ca. de 4º a 6º do Cosmos?!... Os restantes 94º ou 96º continuam à espera do nosso Conhecimento!... um Conhecimento em progresso, in itinere, tem de partir sempre deste pressuposto básico: Há o visível e o invisível! E a caminhada tem de progredir da visibilidade para a invisibilidade.
IDENTIDADE E CONSCIÊNCIA • Somos ‒ os Humanos ‒ seres de actos, hábitos e reflexões, que deveriam orientar e balizar os nossos comportamentos e acções. Entretanto, a odisseia e a história de cada Indivíduo-Pessoa são, por vezes, complexas e saturadas de problemas… E as Sociedades de guerras e conflitos, em que a Humanidade tem sobrevivido, não ajudam nada!... Ora, “a fronteira entre a identidade e a consciência será tudo quanto separa os nossos sentidos da compreensão dos significados do universo que eles apreendem. Entre a fatalidade identitária e a fatalidade da inconsciência pouco ou nada sobra”… “talvez porque assim é menos doloroso o confronto com a realidade. E mais agradáveis as mentiras, que são dadas a beber aos homens simples.” (Luís Videirinho, in Revista ‘A Página da Educação’, nº209/2017, p.92). O nosso Problema central é a incapacidade de Lucidez e Diálogo, com os Outros, para nos desviarmos, o mais possível, das fatalidades. As igualdades e as desigualdades são, igualmente, problemas substantivos e estruturais; mas, com uma Consciência crítica e uma Inteligência atenta aos problemas, os caminhos sociais abrir-se-ão para que aquelas possam ser resolvidas, entre todos, de modo adequado. Há muita coisa que, hoje, nas escolas, se pede ou exige a professores e alunos de modo insensato e cruel. Escreveu, acertadamente, Manuel Matos (in ‘Rev.’ cit., p.25): “A heterogeneização dos públicos, na sequência do alargamento da escolaridade obrigatória, e a força compressora da avaliação sem limites (sobre os resultados escolares e sobre os professores por eles responsáveis) submetem o tempo escolar a contradições pedagógicas insanáveis”. ‒ À luz da gramática do Renascimento, a Escola de hoje é insuportável!... Quando o Bom Senso psico-pedagógico impera, é justo e legítimo pensar segundo os padrões de David Rodrigues (ibi, p.23): “Os contextos em que se desenrola a inclusão têm de ser encarados como contextos de desigualdade, conflito e exclusão. Pensar a inclusão, ignorando qual o pano de fundo, em que ela se move, é um grave erro de análise; pode conduzir à adopção de políticas assistencialistas, mas não a políticas inclusivas”. E, juntamente com o Ca-
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pitalismo e a escravatura, o Colonialismo e o Patriarcado… Tudo isso já deveria ter sido revolucionado por um Processo histórico inteligente e digno!... Escreveu, com acribia e força intelectual/moral, Licínio C. Lima (ibi, p.21): “A meritocracia, enquanto governação das desigualdades sociais, terá já reformado a educação escolar, adoptando o modelo da empresa e os seus modos racionais de gestão. A maior reforma, porém, será a da pedagogia: transmissão do conhecimento exigido pela economia do conhecimento, treinamento de competências, assertividade individual, competição sistemática e de alto nível, orientação para a performance. Quem falhar poderá sempre submeter-se a novos testes. O lema ‒ competir para progredir através de uma pedagogia contra o outro”. ‒ Essa é a única maneira de as Liberdades individuais se poderem impor, com toda a sua energia lógica; desde que não seja excluído, mas integrado, o princípio da cooperação.
• As três Grandes Religiões de ‘O Livro’ não são todas da mesma índole. Se há um parentesco mais próximo entre Judaísmo e Cristianismo, a distância alarga-se, face à 3ª Religião surgida cronologicamente. Se me perguntarem por que razão (ou razões) essa grande Obra, titulada ‘O Livro das 1001 Noites’, onde sobressai a arte e o engenho de Xerazade (até como protagonista da escrita), (estamos a citar a obra saída na edição de A Casa do Livro, que, actualmente, está a ser distribuída, em fascículos, gratuitamente, com o jornal semanário ‘Expresso’), excele as Escrituras clássicas do Islão (designadamente, o Corão e a conhecida colectânea tradicional, os chamados ‘Haddith’ ou ‘Ditos do Profeta’, ‒ a nossa Resposta pode começar com o excerpto do texto de Walter Hugo Mãe, com o título sintomático ‘Ser Alguém’, que emerge na introdução ao IV Vol. (pp.3-6), e do qual vamos referenciar o 2º parágrafo e o 3º (pp.3-4), recheado de uma sabedoria apurada: “A arte de Xerazade é pura construção, é uma humanização. Usa a maravilha para justificar a vida, ou seja, reclama que a vida seja justa, que ostente sua justiça, Elogia, por esplendor, a inesgotável narrativa da peripécia humana, com seus matizes de sensibilidade e dor, mérito e generosidade, medo e cuidado, adiamento e assunção, avidez e falha. Concretamente, salvando-se Xerazade salva também o seu interlocutor. Contar histórias redime, depura, apazigua, cura. Atravessando séculos, este livro, mudando, reorganizando-se, desaparecendo e ressurgindo inúmeras vezes, é um manifesto acerca da importância de narrar e ficcionar, em que contar é a elementar arma da sobrevivência. Se Natália Correia deixou claro que ‘a poesia é para comer’, os ‘subalimentados do sonho’ existem desde sempre à escuta do deslumbre e da fantasia. A vida como é não basta. Os confins do tempo guardam provas de que as pessoas imaginavam aventuras psara preservar identidades, manifestar aprendizagens, suscitar viagens, aludir ao invisível e ao impossível, adorar e agradecer. As pessoas contam e escutam histórias para se completarem e para serem felizes. De certo modo, contar e ouvir contar é alimento, sustento muito claro de Xerazade e de seu sultão, progressivamente rendido a essa fome pelo imaterial que ela sabe revelar”. Se, de facto, compararmos, crítica e semanticamente, os textos das Escrituras sagradas do Islão (muito especialmente, os já referidos Corão e Haddiths, é muito fácil darmo-nos conta da crueldade e da intolerância que eles encerram, em contraste com a harmonia e o desejo do bom viver, a humanização, em suma, que vamos encontrar nas ‘novelas’ maravilhosas das
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‘Mil e uma Noites’. Na verdade, o ‘Livro das 1001 Noites’ constitui, na atmosfera cultural do Islamismo, uma sorte de 2ª religião’ egregiamente bem redigida e criteriosa e performantemente organizada. Maomé, ‘o Profeta’, era profissionalmente um general, ‘um homem de armas’. V.g., na Sura IV, um homem pode, perfeitamente, ‘casar’ com 4 ‘concubinas’, se tiver posses e meios para as sustentar. Para ele, o Poder só é conhecido e identificável ‘in actu exercito’. Nas Escrituras sagradas do Islão, não há lugar para a compreensão e a noção explícita do ‘Poder in actu signato’. Exactamente ao contrário do que se passa nos textos do Cristianismo, quer nos canónicos, quer (com mais vigor!...) nos apócrifos. Veja-se Mt.22,21: “Dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (foi a resposta de Jeoshua à réplica levantada pelos fariseus hipócritas). Veja-se o Evang. de Tomé (v.100): “Dai a Deus o que é de Deus; a César o que per-tence a César; e a mim o que me pertence”. (Uma resposta super-esclarecedora, que até põe termo à religião cristã/paulina, balizada pelo Dualismo metafísico-ontológico de Platão e Paulo). Quanto ao Messianismo, ele foi adoptado pelas três religiões de ‘O Livro’: de forma oficialíssima, pelo Cristianismo Paulino, que se encontra nas 7 Cartas de Paulo (ou nas outras a ele atribuídas), mas não só… visto que o Chefe d’Orquestra do N.T. (à escala de 75%) é da lavra, inspiração e escrita de Paulo de Tarso (o apóstolo ‘convertido’, que nunca abandonou as suas matrizes farisaicas). Quanto aos muçulmanos, eles apostaram, historicamente, em quatro ou cinco, mas tão só, oficiosamente e em esquema temporário, eles configuraram a sua Figura do Madi!... Quanto aos judeus, eles vieram a admitir, oficiosamente, ca. de meia dúzia de ‘meshiai’. Só o Jesuanismo (professado pelo C.E.H.C.) fez a devida excepção à Regra!... Por que é que o C.E.H.C. se empenhou em estabelecer esta Excepção à Regra? Por argumentos do carácter da Crítica histórica. Em segundo lugar, porque atraiçoa a Missão e o Testemunho de Jesus. (O chamado ‘evangelho cirílico’, descoberto recentemente, no Museu Britânico, é a prova incontornável da nossa Tese.) Em terceiro lugar, o ‘aparelho religioso’ do Messianismo é próprio do ‘Homo Sapiens tout court’; não do padrão da Espécie humana, que é identificado com o ‘Homo Sapiens//Sapiens’, inaugurado por Sócrates e Jesus.
• EDGAR MORIN: Autor de uma Obra imensa, para a Renovação dos Saberes científicos e para a Renovação das desumanizadas Práticas do Humanismo. O seu título genérico dá pelo nome de ‘La Méthode’. A maior parte desta Obra (ainda legítima e válida) é de 1960 a 1985. É uma Obra indispensável para a correcção dos Erros da História das Sociedades e para a necessária Renovação da Humanidade. De todo esse manancial, a obra que nós, aqui e agora, mais gostaríamos de destacar, tem por título (na tradução port. da Ed.Europa/América: Lisboa, 1982) ‘Ciência com Consciência’. Para o nosso Autor, um Saber (dito) científico, que não seja assegurado e respaldado pela Consiência humana (bem formada) do Investigador, constitui um absurdo e um ardil de enganos!... Uma afirmação de Charles Townes (especialista em Electrónica Quântica), que dá sempre que pensar sobre os caminhos em torno do Conhecimento: “Se olharmos para aquilo de que a religião se ocupa, verificamos que ela visa compreender o propósito e o significado do universo. A ciência tenta compreender funções e estruturas. Se existe algum significado, a estrutura terá muito que ver com esse significado. A longo tempo chegarão a convergir”. ‒ Se os caminhos de ambos os lados forem, exigentemente, honestos e tersos!... Acrescentamos nós. Praticar a dignidade Humana e dignificar a Natureza… Quem se atreve e tem a coragem para o Grande Empreendimento?! Esse é um vero Democrata. Esse é, afinal, o Homem
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de Hamlet, como nos ensina Bertrand Russell: “Será o homem aquilo que parece ser para um astrónomo, uma massa disforme e minúscula de carbono impuro e água que se arrasta, impotente, por um pequeno e insignificante planeta? Ou será o Homem aquilo que parece ser para Hamlet?”. Há ca. de uma década, escrevemos para a Rev. Electrónica ‘Noética’ (que difunde a partir de São Paulo (Br.), um Artigo (ca. de 10 pp.) radical sobre o pensamento de Boaventura de Sousa Santos (B.S.S.), em contraste com o Pensamento criticista globalizado do C.E.H.C.; e o painel, então observado, fazia referência a 4 ângulos rectos: em dois deles, havia convergência; nos outros dois, não. Mas, com o artigo de B.S.S. subordinado ao tema ‘Contra a Dominação’ (in ‘JL’, 16-29.8.2017, pp.27-28), as perspectivas e os percursos assinalados dão sinais de aproximação entre os dois Centros. Destacado ‘em janela’, pode ler-se o seguinte (ibi, p.27): “O século XX foi dos séculos mais violentos da história, mas também se caracterizou por muitas conquistas positivas: dos direitos sociais e económicos dos trabalhadores à libertação e independência das colónias, dos movimentos dos direitos cívicos das populações afro-descendentes nas Américas às lutas das mulheres contra a discriminação sexual”. E um segundo passo sobre a miserável condição do regime (dito) democrático hodierno (ibidem): “A democracia é hoje, subserviente dos interesses imperiais, se não mesmo um dos seus instrumentos. Para a impor, destróiem-se países inteiros, sejam eles o Iraque, a Líbia, a Síria, o Yemen, o Afeganistão”. Mas encontram-se, nesse Artigo titulado ‘Contra a dominação’ (sintomaticamente), duas Teses fundamentais (sócio-históricas), que estão em plena convergência com o ideário e a Cultura criticista do C.E.H.C.: A) Os factores, que estão na base da dominação variam de época para época. Na época moderna, digamos, desde o século XVI, os três factores principais têm sido: capitalismo, colonialismo e partriarcado [que é já oriundo de há 5,5 milénios]. O primeiro é originário da modernidade ocidental, enquanto os outros dois existiram antes mas foram reconfigurados pelo capitalismo. A dominação capitalista assenta na exploração do trabalho assalariado, por via de relações entre seres humanos formalmente iguais. A dominação colonial assenta na relação hierárquica entre grupos humanos, por uma razão supostamente natural, seja ela a raça, a casta, a religião ou a etnia. “A dominação patriarcal implica outro tipo de relação de poder, mas igualmente assente na inferioridade natural de um sexo ou de uma orientação sexual. As relações entre os três modos de dominação têm variado ao longo do tempo e do espaço, mas o facto de a dominação moderna assentar nos três é uma constante. Ao contrário do que vulgarmente se pensa, a independência política das antigas colónias europeias não significiou o fim do colonialismo, significou apenas a substituição de um tipo de colonialismo (o colonialismo de ocupação territorial efectiva por uma potência estrangeira) por outros tipos (colonialismo interno, neocolonialismo, imperialismo, racismo, xenofobia, etc.). Vivemos hoje em sociedades capitalistas, colonialistas e patriarcais. Para ter êxito, a resistência contra a dominação moderna tem de assentar em lutas simultaneamente anticapitalistas, anticoloniais e antipatriarcais. Todas as lutas têm de ter como alvo os três factores de dominação, e não apenas um, ainda que as conjunturas possam aconselhar que incidem mais num factor que noutro” (ibi, p.27). B) Sobre os modos de funcionamento das chamadas ‘democracias liberais’, que, desde há dois milénios [uma vez corrompido o Socratismo e atraiçoado o Jesuanismo pelas Igrejas…], os sistemas políticos vigentes sempre têm recomendado como a melhor cartilha de funcionamento convergente com o Sistema capitalista e suas variantes históricas. “Sabíamos que a democracia se defende mal dos antidemocratas, pois, de outro modo, Hitler não teria ascendido ao poder por via de eleições. Mas note-se que, ainda que de modo
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fraudulento, o seu partido ostentava a palavra ‘socialismo’ no seu nome. Hoje, a democracia está a ser sequestrada por forças económicas poderosas (Bancos Centrais, Fundo Monetário Internacional, agências de notação de crédito) não sujeitas a qualquer deliberação democrática. E as imposições podem ser legais (e legítimas?...) juros de dívida pública, imposição de tratados de livre comércio, políticas de austeridade, rules of engagement das multinacionais, controlo corporativo dos grandes meios de comunicação social; e ilegais: corrupção, tráfico de influências, abuso de poder, infiltração nas organizações democráticas, incitamento à violência”. (Idem, ibi, pp.27-28).
• INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL!... CIBERNÉTICA: Será que os robots e as máquinas (ditas) inteligentes irão desempenhar, no próximo futuro, tarefas e funções que, até ao presente, eram operadas, tão-só pelos humanos?!... Desde 1948 (saída a público do célebre livro ‘Cybernetics’, por Norbert Wiener, sobre o que vieram a chamar, estereotipadamente, ‘investigação em Inteligência Artificial’, o mundo humano parece ter ficado transtornado. Em 1950, Isaac Asimov, com crítica e sensatez q.b., enunciou as divulgadas três leis da Robótica. Em 1956, um “grupo de cientistas encontrase no Dartmouth College (New Hampshire) e cria o conceito de inteligência artificial. Dois anos depois, John McCarty, cientista do Massa-chusetts Institute of Technology (MIT), cria linguagem de programação LISP” (in ‘Exp.’, 2º Cad., 19.8.2017, p.20). Ciclos cronológicos das investigações: ‒ 1990: o Japão dá por terminado o projecto da 5ª geração de computadores sem ter conseguido criar computadores inteligentes. Com o advento da Internet ao grande público, em 1994, a investigação na área da Inteligência Artificial muda de fuso: aposta, agora, na exploração de agentes que são motores de pesquisa de compras on line. Em 2007, o supercomputador IBM Watson dá o início à era da inteligência artificial cognitiva. Trata-se de uma máquina que ‘autoaprende [não se diz: auto-apreende!...] em linguagem natural, a partir da conjugação de um enorme aumento da capacidade de processamento de big data. (Cf. ibi, p.21). Estaremos perante uma revolução? O especialista na área, Philipp Gerbert, dá-nos uma resposta lacónica e complexa: “A organização e a forma como trabalhamos vai mudar drasticamente. Relativamente a processos, podemos escolher entre alcançar a excelência ou produzir inovação. Naquilo a que hoje chamamos ‘processos ágeis’, o que importa é melhorar a produtividade e a continuidade, e esse objectivo irá fundir-se cada vez mais profundamente com a inovação. A segunda parte terá que ver com as estruturas, em que assistiremos a um incrível protagonismo da flexibilidade [do trabalho e do emprego]” (cf. ibidem). Desde 2012, tem-se assistido a um frenesim das grandes empresas em investir capital em start ups de inteligência artificial (cf. ibi, p.20). Noções elementares com que se opera: ‒ Inteligência Artificial: ‘inclui as técnicas que permitem, aos computadores, imitar comportamentos humanos’; ‒ Sistemas cognitivos: ‘Aprendem, raciocinam e interagem com os humanos em linguagem natural, interpretam dados, incluindo texto não estruturado, imagens, áudio e vídeo (deep learning)’; ‒ Machine learning: “subconjunto de técnicas de inteligência artificial, que usa métodos estatísticos, para permitir às máquinas ‘aprenderem’ [não apreenderem…] com as experiências”. (Ibidem).
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• Género; Espécie; Diferença específica. Aristóteles, ‘O Filósofo’ por antonomásia, utilizava estes categoremas para as boas definições. O Humano pertence ao género comum dos Animais; e o que o enquadra, mesmo, na sua Espécie é a faculdade da Racionalidade ou Razão. Essa é a sua diferença específica. É, justamente, por essa via, que os Seres Humanos são concebidos e assumidos, pelo C.E.H.C., como uma Tríade constituída e enunciada como segue: ‒ Sensorium (já Hobbes assim o enunciava), ‒ Inteligência/Intuição; ‒ Razão ou Racionalidade. E, para completar a vera Notio dos Humanos, era indispensável e incontornável, acrescentar o Coeficiente de Consciência. É por isso mesmo que dos Humanos se diz, mesmo ao nível dos Sentidos Externos, que eles ‘apreendem’; e das máquinas se pode dizer, tão-só, que elas ‘aprendem’ (tal como os ‘especialistas’ escreveram acima). Desta sorte, apreensão e aprender constituem-se como duas unidades lógicas e semânticas absolutamente inconfundíveis. Nada, pois, de confusões entre humanos e máquinas!... No mesmo leque psico-sócio-antropológico, não se pode esquecer, em todos os campos ou áreas do Conhecimento, o fenómeno da Consciência (= o humano é um ser-que-sabe-que-sabe). E, de tal maneira o fenómeno da Consciência está, ipso facto, integrado no Processo global do Conhecimento, que a própria Consciência só existe in facto esse, quando se acha polarizada num objecto qualquer. A Objectividade não pode, por conseguinte, obter a sua consistência enquanto separada da Subjectividade e do Mundo Subjectivo dos Humanos. Este é mesmo o postulado matricial da Consciência Humana. Nesta nossa órbita criticista, não há, não pode haver qualquer ‘Inteligência Artificial’, em contraste e desafio com a chamada Inteligência Natural. Uma tal línguagem ou discurso não passam de um estrondoso absurdo… é, afinal, a concubina rameira das ‘democracias liberais’, que fazem passar por ‘Liberdade’ esse nado-morto a que se tem dado o nome de ‘livre arbítrio’. Assim, enquanto não levarmos a nossa reflexão crítica até à sua base psico-sócio-antropológica, não seremos capazes de sair do odre do ‘Homo Sapiens tout court’, para o vero paradigma humano do ‘Homo Sapiens//Sapiens’.
* • Que é mais importante na Vida?... Consumir ou Comunicar?!... (É uma Tristeza Letal, quando a Reflexão Responsável chega a este ponto!...): (Cf. ‘Manière de Voir’, nº 154, pp.94-97). • Consumir ou Comunicar!... ‒ Este é, nas sociedades actuais, um partenariado veramente infernal!... Que implica um tal Factum? A) Que os Sujeitos já não têm possibilidade de escolha; B) que as Sociedades estão reduzidas a fenómenos sistémicos objectivo-objectuais. (Era o que eu replicava, numa charla breve, ontem, a uns amigos espanhóis da Galiza). “O planeta tornou-se indivisível, ‒ é assim que o proclamam, justa e grosseiramente, os especialistas” (John Berger, no art. ‘Mauvaises Nouvelles’, in Rev. ‘Manière de Voir’, nº154, pp.9497).
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Na janela do artigo, pode ler-se o resumo: (p.94): “Tristesse, révolte, impuissance, tels sont les affects dans lesquels macèrent les téléspectateurs des pays riches devant l’afflux des nouvelles portées à leur connaissance. Mais ce défilé offre-t-il un reflet fidele et innocent du monde ? Et par quels moyens peut-on lui résister, échapper au système qui le produit, rompre ce cercle vicieuxs ?” Condensa muito bem o nosso Autor/artista crítico o seu pensamento sobre esta problemática (complexa e grosseira), ao afirmar (ibi, p.94): “Consumo e Comunicação encontram-se, desde logo, encadeados num partenariado infernal, e é este partenariado que constitui a realidade mediática que nos panenvolve. Em primeiríssimo lugar, os media representam um contrato económico, mediante o qual tudo o que advém no mundo já se encontra ligado ao acto de venda. Ora, num mundo, onde a maioria das pessoas vivem ou morrem, numa inanição total, há fortes oportunidades de que o consumo galopante das minorias relativamente privilegiadas arraste ‒ e garanta ‒ más notícias em número igualmente crescente”. A situação do Sistema Capitalista moderno levou-nos a uma total inversão dos modos de vida: “Os concorrentes adultos são, aí, constrangidos, segundo a cartilha do próprio jogo, a comportarem-se como crianças mimadas, no meio dos armazéns dos brinquedos. As primeiras vítimas, num mundo de total desnudamento, são em geral as crianças. O sistema mediático prospera ele próprio, sempre e quando ele consegue juntar os seus adultos na condição de crianças” (idem, ibi, p.95). Observação a propósito: a Ideologia liberal do Ocidente ‒ que sempre teve o vezo de censurar severamente o ‘comunismo’ soviético, sem saber o que isso era…, está, agora, a debater-se com os péssimos efeitos da mesma problemática: Segundo J.K. Galbraith (1962), nos U.S.A., funcionava o Capitalismo liberal; na U.R.S.S., operava a outra face da mesma medalha: ‘Capitalismo monopolista de Estado’!... Qual é a solução de remédio para tais males estruturais? A) Banir o Sistema capitalista; B) Atribuir o primado (absoluto) às pessoas contra os objectos/coisas. Sem o controlo do Sistema capitalista, nada feito. Sem uma Instrução/Educação adequada, para crianças, jovens e adultos, não haverá soluções eficazes. Como se esqueceu, tão fácil e depressa, os modos como a Democracia Ateniense fora inventada, na Grécia, séc. V, na época de Péricles e Clístenes?!... Ao acordar do seu sonho, em noite bem dormida, o nosso Autor lembrou-se de evocar o sonhado, o encontro com amigos conhecidos, na tentativa de conhecer coisas e casos deles: em francês: ‘Dans l’attente d’incarner quelque chose de toi’; em inglês: ‘Waiting now to be with you and receiving something of you.’; em alemão: ‘Jetzt daran wartend dich zu erfahren’ (ibi, p. 95). “Este título estranho e algum tanto inaugural levou-me a reflectir sobre o coro nas tragédias gregas: O coro aguardava poder participar, poder acompanhar a experiência daqueles que, à boca de palco, se ocupavam em agir. No fim da Édipo-rei, depois de haver acompanhado tantos factos e gestos, o coro faz o comentário seguinte: ‘Não há qualquer mortal, seguindo-o com os olhos até ao seu último dia, que haja necessidade de felicitar, antes de ele chegar ao fim, sem ter conhecido o sofrimento’ (idem, ibi, p.95). Voltando à nossa estereotipada situação contemporânea (onde o mundo nos emerge, cada dia, como se estivera à beira do Apocalipse…): a grande e terrível desgraça é o axioma formulado e argumentado pelo nosso Autor (ibi, p.96): “A recusa, por parte dos media, de admitir que o público [as pessoas], no seu coração, conheça o mundo”!... Este é o cinismo oximórico de que se vive, na Aparelhagem ideológico-cultural da Society!...
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É, pois, preciso e urgente re-instaurar a honesta (e crítica) Dignidade Humana. Saber, desde logo, que a realidade (virtual) da fantasia, no ecrã, por deter, indiscutivelmente, semelhanças com a real, tem, antes de tudo, de ser interpretada e trabalhada com ética e moralidade. E, aqui, a sabedoria das diferenças entre a Física Clássica e a Física Quântica pode, de facto, ensinar-nos muita coisa sobre as imagens do ecrã e as realidades reais do Mundo. É que as próprias memórias fazem parte da nossa Identidade bio-psico-sociológica!... B. Crouch, in ‘Matéria Escura’ (op. cit., p.147): “A maior parte dos astrofísicos acredita que a força, que sustenta as estrelas e as galáxias ‒ aquilo que faz todo o nosso universo funcionar ‒ advém de uma substância teórica que não conseguimos medir nem observar directamente. Algo a que eles chamam matéria negra. E essa matéria negra constitui a maior parte do universo conhecido. “ ‒ Mas o que é ao certo? “ ‒ Ninguém o sabe. Os físicos têm tentado conceber novas teorias para explicar a sua origem e em que consiste. Sabemos que possui gravidade, como a matéria normal, mas deve ser feita de algo completamente novo. “ ‒ Uma nova forma de matéria. “ ‒ Exacto. Alguns defensores da Teoria das Cordas acreditam que pode ser um indício da existência de universos paralelos”. Imaginação e Pensamento. O 1º faz parte integrante do Pensamento real e crítico. O Psico-Sócio-Ânthropos completo e autêntico não permite dissociá-los, em absoluto, porquanto são, ambos, necessários operativamente, um ao outro. Restaurar a Dignidade dos Humanos implica, antes de tudo, ser capaz de associar, criticamente, esses dois níveis de realidade!... É, pois, preciso, que os media sejam, antes de tudo, sérios e honestos e, sobretudo, capazes de discernimento entre a virtude e o vício. Assim, a recusa, por parte dos media, de admitir que as pessoas (o público), no seu coração, sejam capazes de conhecer (criticamente) o mundo, ‒ além de expressar uma actuação antidemocrática, acaba por sancionar um voto-protesto do desprezo por toda a gente e pela Sociedade inteira. Os multiversos e o conceito/princípio de Identidade bio-psico-social. Se os Indivíduos abandonarem a sua noção de Sujeitos identitários, tudo poderá acontecer, até a dissolução da Identidade própria… com a existência de multiversos ou sem ela. “ ‒ Falaste acerca do conceito do multiverso e que tudo o que pode acontecer acontecerá, e disseste que havia algures uma versão de ti e de mim, que não tinha conseguido entrar no cubo. Momentos depois, abriste a porta e assistimos ao desenrolar dessa mesma cena”. (Cf.: op. cit., p.223). O importante e decisivo é manter e alimentar o Princípio de Identidade bio-psíquica dos Indivíduos-Pessoas.
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………. ● ……….
• “Este livro é um só estado de alma, analisado de todos os lados, percorrido em todas as direcções” (Fernando Pessoa, in ‘Livro do Desassossego’, Ed. de Richard Zenith/Assírio & Alvim, Lisboa, 2017, p.395). • “Não escrevo em português. Escrevo eu mesmo”. (Idem, ibi, p.350). ‒ O que é substancialmente diferente. Porque, entre a fala e a imagem há uma diferença de abismos. • “Que de infernos e Purgatórios e Paraísos tenho em mim ‒ e quem me conhece um gesto discordando da vida… a mim tão calmo e tão plácido?” (Idem, ibidem). • “A consciência da inconsciência da vida é o maior martírio imposto à inteligência. Há inteligências inconscientes ‒ brilhos do espírito, correntes do entendimento, mistérios e filosofias ‒ que têm o mesmo automatismo que os reflexos corpóreos, que a gestão que o fígado e os rins fazem de suas secreções”. (Ibi, p. 91). • N.B. Estas frases de F.P. assumo-as eu, enquanto Presidente Fundador do C.E.H.C., em 1995, como chancela talismânica deste LIVRO, que marca o ano 22º da fundação do CEHC.
• Instaurem a vera e autêntica DEMOCRACIA nas instituições das Religiões institucionalizadas, e elas dissolvem-se completamente qua tais!... • “Todo o poder é um poder sobre alguém. Por muito total que seja, nunca é criação de si próprio, algo que planasse no vácuo, não se sabe onde, fora deste mundo. Todo o poder é
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também, até certo ponto, obra daqueles que ele próprio rege”. (Václav Havel). Cuidado, !..., com ‘A Servidão Voluntária’ de La Boétie. • Não ligues ao labéu de ‘anarquista’!... Essa é a acusação/anátema controleira dos que usam e abusam dos Poderes Estabelecidos!...
Guimarães, 25 de Agosto de 2017. Manuel Reis: Presidente/Fundador do C.E.H.C. Lillian Reis: Secretária do C.E.H.C.
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ÍNDICE • Introdução: âmbito e sentido da Obra …………………………………
p. 3
● MUDAR DE DEUS (tema centrípeto) ………………………………
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‒ O Equilíbrio no Trapézio, dos 4 Elementos, para que o Sistema capitalista se mantenha seguro e a funcionar (adequadamente) sem Crises nem assaltos vindos do exterior, no Quadro do Estado/Nação ……………………
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‒ Não há dois mundos: o das religiões e o das Sociedades civis/políticas!...
p.10
‒ A propósito de dois livros, que precisamos de criticar …………………
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● ‘HOMO SAPIENS TOUT COURT’ → Sistema capitalista ……………
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‒ Características estruturais/funcionais da Cultura do Poder-Dominação d’abord ………………………………………………………………………
p.16
‒ A MENTIRA nos comportamentos e na Vida Corrente …………………… p.17 ● A CULTURA DO PODER/DOMINAÇÃO D’ABORD E A CULTURA DA LIBERDADE RESPONSÁVEL PRIMACIAL E PRIMORDIAL SÃO DIFERENTES E OPOSTAS ……………………………………… p.19 ● EM DEFESA DO ‘HOMO SAPIENS//SAPIENS’, próprio e específico da LIBERDADE RESPONSÁVEL PRIMACIAL E PRIMORDIAL … p.25 ‒ É preciso e urgente impedir a queda no Monismo Epistémico …………… p.27 ● QUE É A RETÓRICA? …………………………………………………
p.30
‒ Esquadrinhamento crítico da Cultura do Poder-Dominação d’abord ……. p.31 ● REFLEXÕES AVULSAS …………………………………………………... ‒ PAPA FRANCISCO e a Crítica do Sistema Capitalista ………………
p.35
p.36
● ENQUADRAMENTO GENÉRICO, criticista, do Processo de GLOBALIZAÇÃO …………………………………………………………………… p.41 ‒ Verdadeira e Falsa Globalização ……………………………………………. p.42 • O Sistema capitalista é uma ‘Economia que mata’ …………………………. p.43 • FUNDAMENTOS E DESÍGNIOS NO HORIZONTE DO PSICO-SÓCIO-ÂNTHROPOS …………………………………………………………………
p.52
• O ‘LIVRE ARBÍTRIO’ E O FIM DO PODER D’ABORD ………………. p.54 • A HUMANIDADE SEGUNDO A ODISSEIA DO ‘HOMO SAPIENS TOUT COURT’ …………………………………………………………… p.55 • O TRINÓMIO PASSE-PARTOUT!... ……………………………………… p.58 ‒ O Primeiro Revolucionário (ideológico-cultural) procede do Egipto …… p.61 ‒ Origens: Ponto de Partida da Humanitas = Dualismo metafísico-ontológico de Platão ou Hylemorfismo Aristotélico?!... …………………………………… p.62 ● VIAS ERRADAS NA CONCEPÇÃO DE DEUS; NO PROCESSO DA GLOBALIZAÇÃO; E NO SENTIDO DA LIBERTAÇÃO/SALVAÇÃO ……… p.65 ‒ A ‘Via Scientífica’ para a ‘Salvação/Libertação’ e o Processo Histórico …
p.66
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• LEIS NATURAIS//LEIS POSITIVAS ………………………………………… p.68 ‒ Organização económica//Organização política ……………………………
p.69
● PELÁGIO E AGOSTINHO: as duas vias (culturais/civilizacionais) opostas
p.73
‒ Sumário dos Passos Dados ………………………………………………… p.75 • A DUPLA QUAESTIO central ………………………………………………
p.76
● PÓS-FÁCIO PARA MEDITAR!... A): A Indústria nasceu nos mosteiros! (na Cultura do Ocidente) …………………………………………………………p.79 ‒ O monarquismo (se assim se pode falar!...) é ‘a mais velha multinacional do mundo’ …………………………………………………………………………
p.80
● POSFÁCIO//MEDITAR: B): NOTAS ESCANDIDAS: → E para onde foi a hobbesiana ‘Great Separation’ (entre o Poder temporal e o Poder espiritual; entre a política/economia e as religiões institucionalizadas)?!... A Laicidade nasceu aí! ………………………………………………………………………
p.85
● SOB O SIGNO DAS ESTRATÉGIAS: Comentários criticistas ……………
p.87
‒ Três Noções Básicas, para compreender como emergiu, na Modernidade Ocidental, o ‘Homo Sapiens//Sapiens’! ……………………………………………
p.89
‒ Anotações (críticas) ao Texto supra de Pierre Musso ……………………… p.89 ● TRÊS POSFÁCIOS NUCLEARES …………………………………………
p.91
‒ A) Posfácio: Gramática das Luzes ……………………………………………
p.91
‒ B) Posfácio: Poder e Responsabilidade ………………………………………
p.95
‒ C) Posfácio: Espelhos & Socialismo …………………………………………
p.99
● POSFÁCIO D: FILOSOFIA DO CUBO ……………………………………
p.103
● IDENTIDADE E CONSCIÊNCIA …………………………………………
p.106
‒ As três Grandes Religiões de ‘O LIVRO’ não são todas da mesma índole … p.107 ● INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL: Cibernética ………………………………
p.110
‒ Que é mais importante na Vida? ‒ Consumir ou Comunicar?! ………………
p.112
‒ Notas Finais ……………………………………………………………………
p.114
“HOMEM, AJUDA-TE A TI MESMO” (L. V. BEETHOVEN)
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