Benfica: Um reduto cultural que está se perdendo
O Benfica é um dos bairros mais charmosos de Fortaleza, localizado no centrooeste da cidade e ocupando uma área de 143,1 hectares, ainda preserva edificações antigas sendo um reduto cultural da Capital. Bares já tradicionais tornam-se ponto de encontro de diferentes gerações. Ele é também um dos bairros mais plurais de Fortaleza. Gente de diferentes classes sociais, profissões e nacionalidades passam por lá todos os dias. Além disso, tem o privilégio de abrigar um dos campus da Universidade Federal do Ceará (UFC) e do Instituto Federal do Ceará (IFCE) e é conhecido por ter um dos mais animados pré-carnavais de Fortaleza.
Entretanto, alguns desses espaços estão ficando esquecidos pela população local, como teatros, casarões antigos, praças, entre outros não estão tendo o devido cuidado de anos atrás. Para os moradores antigos, é difícil lembrar quando o bairro deixou de ser importante para a elite da época. Afinal, como disse o memorialista Marciano Lopes (que morreu em setembro deste ano) em entrevista ao jornal Diário do Nordeste, seria compreensível uma degradação natural, tendo em vista que os ricos sempre migram para outras áreas da cidade, à exemplo do que aconteceu com o Jacareacanga e a Aldeota, diante do processo de valorização imobiliária do Meireles. O professor aposentado de Comunicação Social Gilmar de Carvalho, também em entrevista ao Diário do Nordeste, reconhece que o Benfica está perdendo o brilho que um dia já teve, ele diz que o bairro está sendo mantido pela presença da UFC, caso contrário, conforme salienta, já teria se “favelizado”. Ele disse, “Fala-se tanto em polo cultural do Benfica, mas não tem sido uma prática até então”.
O Vereador Acrísio Sena contou que existe um projeto para requalificação desses espaços dentro do bairro, porem ele não foi adiante por falta de apoio do poder público e privado. “Nós não avançamos, porque o diálogo que existia entre nós não foi mais adiante, chegamos a fazer alguns fóruns, eventos mas não conseguimos seguir em 1
Vereador Acrísio Sena na Câmara Municipal de Fortaleza. Foto: Diário do Nordeste.
frente. Faltou também acho um discernimento melhor sobre o que era o projeto”. O Vereador ainda diz que para a proposta ir adiante, teria que partir de comprometimento da Prefeitura “O nosso entendimento é que o projeto teria que ser de responsabilidade da Prefeitura que tem o poder normativo, o nosso é legislativo. O poder normativo de intervenção, de centralização das ações de Fortaleza e no espaço urbano é da Prefeitura, e infelizmente não vingou”. Acrísio fala que a ideia ainda está de pé e que espera que a Capital Cearense possa ter um gestor que abrace-a algum dia.
Sobre o projeto A proposta que criaria um Polo Cultural e Gastronômico do Benfica delimitaria as ações no quadrilátero que corresponde entre as avenidas Carapinima, Luciano Carneiro, Domingos Olímpio e Eduardo Girão. Dentre os objetivos do projeto, estaria a promoção do desenvolvimento sustentável das atividades econômicas, já instaladas no bairro; a atração de novos investimentos dentro do perfil vocacional da área; o controle e o ordenamento do uso do solo, com ênfase ao combate à poluição sonora, do ar e visual; a realização de campanhas publicitárias para divulgar o corredor e o patrocínio de festivais e encontros gastronômicos e culturais.
Os relatos dos estudantes Em pesquisa realizada com estudantes da UFC, eles falaram um pouco de suas experiências e contribuição cultural da universidade no bairro: O espaço cultural oferecido pela universidade tem incentivo sobre o bairro? “Acreditamos que não diretamente. Nós sentimos o bairro por uma questão indivíduo-contexto, ou seja, o incentivo é contextualizado em cada estudante por meio das experiências compartilhadas com o espaço. Acreditamos que os possíveis espaços culturais promovem debates que não tocam ao bairro ou à comunidade do bairro, mas, assuntos mais amplos como política e cidade”. De que forma vocês como alunos costumam ocupar os espaços culturais do bairro Benfica? E como os veem? “Conforme suas programações, quando nos cabem. Por exemplo, o Teatro Universitário e a Concha Acústica. São veículos de ideias que tomam como monte a sensibilidade de quem os organiza em prol de algum evento”. Pontos a serem melhorados na universidade e bairro? “Com certeza a segurança e o custo de vida que não correspondem à realidade de um estudante”. 2
Com que frequência vocês costumam frequentar os espaços culturais da universidade? “Costumamos percorrer o Bosque Moreira Campos, no Centro de Humanidades, e o CH2 onde situam-se os cursos de comunicação social. Mas, só os exploramos em casos de saraus e dependendo do público, pois, acreditamos que algumas vezes a essência de alguns projetos é ofuscada por desinteresse intelectual dos espectadores”. A insegurança que hoje existe no Benfica é um dos empecilhos de se frequentar esses espaços? “Com certeza. Além da insegurança, os projetos culturais são, algumas vezes, confundidos por “festas a Baco” (bacanais), o que pode não ser atrativo para pessoas interessadas no “miolo” da cultura”. Vocês acham que o poder público poderia investir mais nestes espaços? De que forma? “Sim. Além de promover a segurança no bairro, seria ideal que houvessem investimentos nos projetos de cunho social-ideológico. Porém, acreditamos ser um risco para o poder público dar impulso às manifestações culturais que conscientizam as pessoas da realidade. Realidade essa que reflete a omissão do governo e a manipulação das massas. No mais, ao menos segurança. Policiais treinados e conscientizados que o bairro é um acolhedor de minorias. Portanto, que fossem tomadas medidas que traçassem respeito à todos e não discretas guerras declaradas”.
Inserção da UFC nos movimentos culturais Em entrevista com o Secretário de Cultura Artística da Universidade Federal do Ceará Elvis Matos, ele fala sobre a relação do bairro com a universidade. De que forma a universidade está contribuindo para o âmbito cultural e artístico do bairro? “A missão da UFC hoje é formar profissionais que possam através das graduações formar uma massa crítica que dinamize a vida cultural da cidade, como do próprio bairro. O Benfica é um bairro privilegiado por possuir todos esses equipamentos culturais, (teatro, concha acústica, museu de arte...) a própria universidade é um deles”. Elvis Matos, Secretário de Cultura Artística da UFC. Foto: Divulgação.
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O espaço cultural hoje está sendo utilizados de forma satisfatória a somar para o âmbito cultural do bairro? “Estamos trabalhando uma articulação com a secretária de cultura do estado, para nos fortalecemos mutuamente para produção de arte. Existe um projeto de reforma do teatro universitário, para acolhermos melhor a comunidade. Sempre buscamos essa interação com o bairro/moradores. Apesar de hoje em dia ser um pouco complicado atrair pessoas em determinado local no mundo que a gente vive, até mesmo por motivos de segurança, as pessoas têm medo de sair de casa”. Sobre o Festival de Cultura UFC “Ele é um festival que acontece anualmente, está em sua oitava edição. Começou como uma promoção da coordenadoria de comunicação e marketing institucional. Quando não havia a secretária de cultura artística. Este ano o evento não aconteceu, mas ouve a mostra de bandas, que abriria o evento, acontecendo no campus do Picí”.
Benfica e Gentilândia, um bairro dentro do outro Historicamente, o Benfica se apresenta como o primeiro bairro da elite de Fortaleza. Essas lembranças estão estampadas em vários prédios, sendo que a maioria pertence ao campus do Centro de Humanidades da UFC. Um destaque é o Palacete Gentil, do Imagem do Sítio Benfica em 1920. Foto: Divulgação. banqueiro José Alves de Carvalho “Gentil”, no Boulevard Visconde de Cauípe (hoje, Avenida da Universidade), em frente à Igreja de Nossa Senhora dos Remédios. Com a saída da família Gentil do local, foi adquirido pelo Governo Federal. Ali funciona atualmente a Reitoria da UFC. Em 1909, a chácara localizada na Avenida Visconde de Cauípe, foi adquirida pelo empresário José Gentil, que ergueu no local, em 1918, um palacete para sua moradia. Em torno da casa construiu vilas e ruas com residências de vários tamanhos e estilos, praças e áreas verdes, lugar que ficou conhecido como Gentilândia. A Gentilândia tornou-se uma verdadeira cidade modelo que serviu de padrão às novas construções e vilas da cidade. Até meados da década de 1940, o bairro esteve em evidência com a execução das obras da Gentilândia, até que o plano de edificação da Imobiliária José Gentil começou a ser gradativamente desativado.
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No início da década de 1950, o lugar começou a entrar em decadência; antigos moradores começaram a deixar o bairro em busca de novos espaços, esvaziamento acentuado em razão da tendência de crescimento da cidade para a Aldeota e para o litoral. Com a debandada dos ricos, o palacete de José Gentil foi posto à venda e adquirido pelo Av. Visconde de Cauípe (atual Av. da Universidade) reitor da Universidade Federal do Ceará, em 1931. Foto: Divulgação. em 1956. Posteriormente em 1959, foi construída a Concha Acústica, o maior auditório ao ar livre do Ceará, com capacidade para 3.000 pessoas. Ao longo dos anos a vila de casas construída em 1931, sempre foi enquadrada pelos mapas da cidade como parte do Benfica. No entanto, em julho de 2000 foi aprovada a Lei Municipal n° 8480, criando o bairro da Gentilândia, englobando o quadrilátero urbano compreendido entre as avenidas da Universidade, Treze de Maio, Expedicionários e Eduardo Girão, se constituído no menor bairro de Fortaleza. Mas o nome Gentilândia não foi reconhecido pela população, e as ruas que estariam dentro da área do bairro, são consideradas como pertencentes ao Benfica.
O Benfica acolheu a primeira universidade e os primeiros estádios de futebol da cidade, o Campo do Prado e mais tarde o Presidente Vargas, inaugurado em 21 de setembro de 1941, cujo o último é o único estádio da capital para jogos de médio porte, com capacidade para pouco mais de 20 mil pessoas.
Foto do bairro da Gentilândia e ao centro o Estádio Presidente Vargas. Foto: Fortaleza em Fotos.
Bares Há décadas uma fonte de comércio próspero do bairro são os bares. O bar mais antigo do bairro é o “bar do Chaguinha” Desde 1956 funcionado é administrado por Francisco Ferreira Neto, é um dos bares mais tradicionais do Benfica, aberto às sextas e sábados. Há tantos outros bares no bairro que costumam receber em suma o público universitário. Esse público migrou de certa forma dos equipamentos universitários Concha acústica um exemplo, para os barzinhos que surgiram ao redor da UFC. O maior movimento é durante às sextas feiras. Aos fins de semana há certo público, porém em número menor em razão dos equipamentos da universidade não funcionarem durante os fins de semana. 5
Reportagem: Tiago Oliveira. Matr.: 201307075452 Andressa Rios. Matr.: 201308364891
Fontes: Diário do Nordeste. Blog Fortaleza em Fotos e Fatos. Entrevistados: Vereador Acrísio Sena e o Secretário de Cultura Artística da UFC, Elvis Matos.
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