lauren ipsum
Uma história sobre ciência da computação e outras coisas improváveis Carlos Bueno
novatec
CAP Í T U LO 1
Um aliado oculto
Não foi tão ruim assim – Laurie disse para si mesma quando alcançou a placa do km 1. Um quilômetro parece um caminho longo a percorrer, mas será mais fácil se o dividir em partes – ela se lembrava de que em Hamilton havia oito quadras para cada quilômetro, então se forçou a imaginar andando uma quadra de cada vez. – Ah, olhe, mais uma – disse uma voz. – Olá? – Laurie olhou ao redor, mas não havia muito para ver: alguns campos com plantações estranhas, uma estrada vazia e a placa. – Ela é meio baixinha, não é? Foi nesse momento que percebeu um lagarto minúsculo pendurado na placa. Ele tinha a coloração mais esquisita que Laurie já vira: onde a placa era verde, o lagarto era avermelhado; onde ela era branca, o lagarto era preto. – Olá, quem é você? – ela perguntou. – Sou Xor – o lagarto chiou. Seu rabo se contorceu e de amarelo ficou azul. – Espere um pouco. Você consegue me ver? Um aliado oculto
19
– É claro que consigo ver você! – respondeu Laurie. – Ah – Xor pareceu muito triste e corou num roxo brilhante. – Você é o primeiro lagarto falante que conheci – disse Laurie. – Como aprendeu a falar? – Que pergunta boba! – resmungou a criatura. – Aprendi quando era bebê, como todo mundo. – É mesmo? – Claro. Por quê? Como você aprendeu a falar? – Bem... – ela sempre soube falar, não é verdade? – Acho que aprendi quando era bebê também. – É lógico. Primeiro, você aprende a falar e, depois, a pensar. É uma pena que não seja o contrário. – O que você está fazendo na placa? – perguntou Laurie. – Outra pergunta boba! O que parece que estou fazendo? Estou me camuflando – respondeu Xor. Naquele momento, ele ficou rosa e violeta. – Você disse alguma coisa? Ela balançou a cabeça. – Onde eu estava? Ah, sim. A camuflagem é uma arte honorável e ancestral. Requer anos de prática. Você deve ter um olhar aguçado para conseguir me encontrar – Xor marchou ao longo da placa enquanto falava, ficando branco com grandes bolinhas laranja. Laurie mordeu a língua, tentando não rir. – Não é todo dia que você vê um lagarto como eu! – ele ficou amarelo-rosado e azul-violeta. – Mas, às vezes – falando em particular, aqui entre nós, é claro – às vezes... – ele se entristeceu novamente e se calou. – Às vezes o quê? – Às vezes, fico preocupado se estou fazendo direito ou não. – Não, se você quer se esconder! – Laurie disse, incapaz de se conter. – Suas cores não param de mudar. 20 CAPÍTULO 1
– Eu tinha certeza de que tinha aprendido dessa vez – respondeu Xor, virando a cabeça para olhar melhor para si mesmo.
– Minha perna esquerda está verde – ele disse. – Verde? Não. Está vermelha. – Sério? – Sério. E agora está violeta. Um aliado oculto
21
Xor suspirou: – Camuflagem é muito mais difícil do que parece. Estou grato por ter sido você quem me viu e não um pássaro faminto. Sabe, sou um pouco daltônico. – Afinal, que tipo de lagarto é você? – ela perguntou. – Eu sou quase totalmente um camaleão. Sou parte dinossauro no lado da minha mãe. – Parte dinossauro? Isso é impossível. – É verdade! – Xor aprumou o pequeno corpo orgulhosamente. – Por exemplo, minha Tia Vana é um esteganossauro. Ela pode se esconder em qualquer lugar, até mesmo atrás de um selo postal. Laurie não sabia se acreditava em Xor, mas não quis ferir os sentimentos dele. – Talvez sua tia possa ensiná-lo a se esconder melhor. – Adoraria isso, mas não sei onde ela está. A última vez que a vi, nem sequer a vi! – ele disse. – Mas... – Ei – interrompeu Xor. – Que tal se eu for com você? Se você pode me ver, talvez consiga vê-la também. – Não acho que... – Vai dar tudo certo! Conheço bem essa região. Posso guiá-la. – Está bem. Posso carregar você no meu bolso – disse Laurie. – Você já ouviu falar de Hamilton? – Eu não sei. É de comer? – Esquece. Vamos lá.
22 CAPÍTULO 1